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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do Regime Remuneratório Experimental
Grupo de Trabalho da
Associação Portuguesa de Economia da Saúde1
1 Composto por Miguel Gouveia, Sofia Nogueira da Silva, Pedro Oliveira e Luís Silva Miguel.
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Sumário Executivo
1. No respeito integral pelos Termos de Referência, o objectivo do estudo é avaliar
o impacto orçamental do lançamento e implementação das Unidades de Saúde Familiar
(USF). Numa primeira fase, a que este Relatório corresponde, a avaliação diz respeito
ao último trimestre do ano de 2006 e, numa segunda fase, a desenvolver posteriormente,
dirá respeito ao ano de 2007. A segunda fase do estudo deverá também incluir uma
proposta de um sistema de incentivos para os enfermeiros e funcionários
administrativos que integram as USF.
2. Neste Relatório começamos por caracterizar, do ponto de vista económico, o
funcionamento actual dos centros de saúde. Para tal, são analisados os seus custos e
níveis de produção, sendo também avaliada a existência de economias de escala. Foi
dado destaque especial ao impacto do Regime Remuneratório Experimental (RRE) nos
custos por utente e por consulta e, em particular, aos custos com medicamentos e meios
complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT). Finalmente, foi realizada uma
estimativa preliminar dos custos para o sistema devido ao aumento do número de
unidades em RRE. Nestes cálculos foi dada particular atenção à questão da causalidade
e da auto-selecção.
3. Os dados utilizados na análise dos centros de saúde foram obtidos, sempre que
possível, nos Tableaux de Bord do ano 2005 para as ARS do Norte, Centro, Lisboa e
Vale do Tejo, e Alentejo. O facto de as várias sub-regiões de saúde usarem diferentes
critérios contabilísticos implicou que os métodos usados se adaptassem a esta realidade.
4. A unidade base de análise foi o centro de saúde, incluindo as suas extensões. No
entanto, as unidades em RRE do Norte também são tratadas como centros de saúde,
uma vez que são centros de custo, dispondo de informação económico-financeira
separada.
5. Em 2005, cada centro de saúde tinha, em média, 30.834 utentes. Destes, 10,8%
não tinham médico de família e apenas 19.792 eram utilizadores. Trabalhavam em cada
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centro de saúde 20,9 médicos e 20,6 enfermeiros, tendo sido realizadas 97.315
consultas. Assim, havia 1478 utentes por médico, 4663 consultas por médico, 3,2
consultas por utente, e 4,9 consultas por utilizador.
6. Os custos totais ascenderam a €6.674.690 por centro de saúde, com um custo
médio por utente de €216,5. Este custo resultou de €34,8 relativos a vencimentos dos
médicos, €14,0 relativos a vencimentos de enfermeiros, €18,6 relativos a custos
administrativos e de direcção, €40,9 relativos a custos com meios complementares de
diagnóstico e terapêutica (MCDT), €84,3 relativos a custos com medicamentos, e €24
relativos a outros custos.
7. O custo médio por consulta foi de €68,6. Tal é consequência de €11,0 relativos a
vencimentos de médicos, €4,4 relativos a vencimentos de enfermeiros, €13,0 relativos a
custos com MCDT, e €26,7 relativos a custos com medicamentos.
8. O custo médio por utilizador foi de €337,3. Este valor inclui €54,2 relativos a
vencimentos dos médicos, €63,7 relativos a custos com MCDT, e €131,4 relativos a
custos com medicamentos.
9. O aumento do volume de actividade dos centros de saúde provoca uma
diminuição dos seus custos médios. Tal significa que existem economias de escala que
poderiam ser aproveitadas com um aumento de dimensão nos centros de saúde mais
pequenos. Estas economias verificam-se para todos os tipos de custos, à excepção dos
custos com MCDT. Note-se, no entanto, que apenas há ganhos substanciais em
aumentar a escala de operações até cerca de 50.000 utentes por centro de saúde.
10. Tendo em vista a comparação de custos entre unidades em RRE e centros de
saúde convencionais, foram realizadas duas análises. A primeira análise, de carácter
mais exploratório, controla apenas para a dimensão das diferentes unidades, retirando o
impacto dessa dimensão na diferença de custos entre RRE e centros de saúde
convencionais. A segunda análise, mais detalhada, controla também, na medida do
possível dados os dados disponíveis, para o perfil demográfico da população, o nível de
acesso aos cuidados primários, a intensidade no consumo de cuidados, a qualidade
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
organizacional, e a heterogeneidade nos métodos de contabilização de custos entre as
diversas Sub-Regiões de Saúde.
11. A análise exploratória permite concluir que uma unidade em RRE tem um custo
por utente €93 mais baixo que um centro de saúde convencional semelhante.
Controlando por outros factores, a estimativa de custo por utente é inferior em €104 nas
unidades em RRE. No entanto, se considerarmos apenas as diferenças relacionadas com
custos por vencimentos de médicos e de enfermeiros, com MCDT e com medicamentos,
a poupança associada aos RRE é de €59. Nos centros de saúde nas ARS de Lisboa e
Vale do Tejo e Alentejo que incluem sub-unidades em RRE (sem informação
económica separada) também há indícios, embora ténues, de vantagem nos custos.
12. A diferença entre os custos das unidades em RRE e as restantes não resulta de
uma redução da oferta de cuidados. De facto, não se observam diferenças no número de
consultas por utente, e a percentagem de utilizadores nos RRE é mesmo 5,8% superior à
dos centros de saúde convencionais equivalentes. Ainda assim, as consultas anuais por
utilizador são, em média, inferiores em 0,4 nas unidades em RRE.
13. Os resultados da análise exploratória mostram que uma consulta numa unidade
em RRE tem um custo médio inferior em €23 face a uma consulta num centro de saúde
convencional. Na análise mais detalhada, que controla para factores adicionais, a
redução dos custos nos RRE é ligeiramente superior: menos €28 por consulta.
Considerando apenas custos com médicos, enfermeiros, MCDT e medicamentos a
diferença é de €15,8.
14. Um problema importante na análise do impacto dos RRE é conseguir distinguir
entre efeitos de modificação do desempenho e efeitos de auto-selecção. Por outras
palavras, há que saber se os médicos que integram unidades em RRE, ou que se
candidataram nesta fase a integrar uma USF, se distinguem dos restantes porque são
influenciados pelo enquadramento diferente em que trabalham, ou porque já eram
distintos dos colegas – nomeadamente, em termos de produtividade, e propensão para a
prescrição de medicamentos e MCDT - à partida. A análise que foi possível realizar
confirma a existência de auto-selecção. Os médicos que tendem a candidatar-se a
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
integrar uma USF fazem, já hoje, em média, mais 410 consultas, e gastam menos €2,3
por consulta em medicamentos e menos €1,3 por consulta em MCDT, quando
comparados com médicos em que tudo o mais é semelhante.
15. Usando os resultados anteriores, podemos expurgar as estimativas das vantagens
do RRE dos efeitos da auto-selecção. Ainda assim, depois de o fazer, a vantagem
líquida do RRE por consulta, em termos de custos médios em medicamentos e em
MCDT , é de 29%. Em termos do custo médio de uma consulta, a vantagem líquida
global do RRE é de €9,9, ou seja, cerca de 14,4%.
16. O cálculo do impacto orçamental foi realizado considerando toda a população de
utentes dos centros de saúde onde irá haver novas USF, a funcionar em RRE (Tipo III).
Entende-se aqui como impacto orçamental a diferença entre as despesas totais ocorridas
em 2005 e as despesas que teriam ocorrido em 2005 num cenário contrafactual,
simulado, em que as USF estariam já em funcionamento. A avaliação inclui os custos
das USF, mas também o impacto nos custos de funcionamento dos centros de saúde
convencionais remanescentes. O impacto orçamental traduz-se numa poupança anual de
€4,3 por utente, resultantes de um aumento em €2,4 de vencimentos de médicos,
compensado por poupanças de €1,9 em MCDT e de €4,9 em medicamentos.
Considerando um universo de 32 centros de saúde, com 2.056.819 utentes, onde serão
criadas 37 USF de Tipo III, o total da poupança que teria existido em 2005 teria sido de
8,9 milhões de euros. Para os meses de Outubro a Dezembro, a poupança estimada teria
sido de €1,1 por utente, ou de 2,3 milhões de euros no total.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Índice
Sumário Executivo ____________________________________________________ 2
Índice _______________________________________________________________ 6
Índice de Quadros _____________________________________________________ 8
Índice de Figuras______________________________________________________ 9
Abreviaturas utilizadas ________________________________________________ 10
1. Objectivos e Metodologia_____________________________________________ 11
2. Notas sobre a História Recente da Política de Cuidados Primários ___________ 14
2.1 A Evolução dos Centros de Saúde em Portugal_______________________ 14
2.2 As Avaliações do Regime Remuneratório Experimental _______________ 20
2.3 Diferenças entre a Avaliação do RRE pela DGS e a Presente Avaliação __ 25
3. Fontes dos Dados e Valores Agregados _________________________________ 28
4. Caracterização Básica dos Custos _____________________________________ 32
4.1 A Distribuição Estatística dos Custos Médios________________________ 32
4. 2 Relação entre Custos Médios e Número de Utentes __________________ 35
4. 3 Relação entre Custos Médios e Número de Utilizadores ______________ 39
4. 4 Relação entre Custos Médios e Número de Consultas ________________ 41
5. Funções Custo por Utente e o RRE ____________________________________ 47
5.1. Análise exploratória ____________________________________________ 47
5.2 Estimativa da Função Custos Médios por Utente_____________________ 49 CAIXA 1 O Caso da ULS de Matosinhos______________________________ 54
5.3 Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos ____________________ 56
6. Utilização, Custos e RRE____________________________________________ 59
7. Custos, Consultas e RRE_____________________________________________ 61
7.1 Estimativa da Função Custos Médios por Consulta___________________ 61
7.2 Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos das Consultas ________ 64
8. A Auto-Selecção de Médicos e as Vantagens do RRE _____________________ 66
8.1 A Relevância da Auto-Selecção na Avaliação dos RRE ________________ 66
8.2 Determinantes da Candidatura a uma USF__________________________ 69
8.3 Caracterização Quantitativa dos Candidatos a uma USF ______________ 71
9. Resultados Globais _________________________________________________ 77
10. Estimativa do Impacto Orçamental ___________________________________ 79
11. Conclusões ______________________________________________________ 84
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ANEXO ____________________________________________________________ 86
A1: ROBUSTEZ ECONOMÉTRICA DOS RESULTADOS_______________ 86
A2: UTILIZAÇÃO, CONSULTAS POR UTENTE E POR UTILIZADOR __ 90
A3: CENTROS DE SAÚDE E USF NA ANÁLISE DE IMPACTO ORÇAMENTAL___________________________________________________ 91
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Índice de Quadros
Quadro 1. Último Mês com Dados Reais___________________________________ 29 Quadro 2. Valores Agregados da Base de Dados ____________________________ 30 Quadro 3. Estatísticas dos Centros de Saúde________________________________ 31 Quadro 4. Custos Médios por Utente nos Centros de Saúde ____________________ 32 Quadro 5. Custos Médios por Utente nos Centros de Saúde, ___________________ 33 Quadro 6. Custos Médios por Consulta nos Centros de Saúde __________________ 34 Quadro 7. Custos Médios por Consulta nos Centros de Saúde, _________________ 34 Quadro 8. Custos Médios por Utilizador nos Centros de Saúde, ________________ 41 Quadro 9. Consultas por Utente e por Utilizador ____________________________ 42 Quadro 10. Modelo Exploratório - Custos dos Centros de Saúde e RRE __________ 47 Quadro 11. Estatísticas Descritivas das Variáveis Explicativas _________________ 50 Quadro 12. Estimativa da Função Custo por Utente dos Centros de Saúde ________ 51 Quadro 13. Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos__________________ 57 Quadro 14. Estimativa da Função Custo por Utilizador dos Centros de Saúde _____ 60 Quadro 15. Modelo Exploratório – Custo Médio das Consultas ________________ 61 Quadro 16. Estimativa da Função Custo por Consulta________________________ 63 Quadro 17. Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos nas Consultas ______ 64 Quadro 18. Estatísticas Descritivas do Painel de Médicos de LVT_______________ 68 Quadro 19. Determinantes da Probabilidade de Candidatura a uma USF_________ 69 Quadro 20. Modelo Explicativo do Número de Consultas______________________ 72 Quadro 21. Modelo Explicativo das Despesas em Medicamentos________________ 74 Quadro 22. Modelo Explicativo das Despesas com MCDT_____________________ 76 Quadro 23. Consultas: Vantagens Líquidas do RRE no modelo de base __________ 77 Quadro 24. Estimativas dos Efeitos Orçamentais, Contrafactual em 2005_________ 82 Quadro 25. Estimativas dos Efeitos Orçamentais Relevantes para 2005 __________ 83 Quadro 26. Anexo. Regressão da Mediana dos Custos por Utente _______________ 86 Quadro 27. Anexo. Regressão da Mediana dos Custos por Consulta _____________ 87 Quadro 28. Anexo – Decomposição do Efeito RRE nos Custos por Utente ________ 88 Quadro 29. Anexo – Decomposição do Efeito RRE nos Custos por Consulta_______ 88 Quadro 30. Anexo - Consultas: Vantagens Líquidas do RRE no modelo DAM _____ 89 Quadro 31. Estimativas DAM dos Efeitos Orçamentais, Contrafactual em 2005____ 89 Quadro 32. Estimativas DAM dos Efeitos Orçamentais Relevantes para 2005 _____ 89
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Índice de Figuras
Figura 1. Distribuições dos Custos por Utente ______________________________ 33 Figura 2. Distribuições dos Custos por Consulta ____________________________ 35 Figura 3. Custos Totais ________________________________________________ 36 Figura 4. Custos por Utente_____________________________________________ 37 Figura 5. Custos por Utente: Componentes I________________________________ 38 Figura 6. Custos por Utente: Componentes II _______________________________ 38 Figura 7. Custos por Utente: Componentes III ______________________________ 39 Figura 8. Relação entre Utilizadores e Utentes______________________________ 40 Figura 9. Custos por Utilizador __________________________________________ 40 Figura 10. Custos e Consultas Totais _____________________________________ 42 Figura 11. Utentes, Utilizadores e Consultas _______________________________ 43 Figura 12 Custos e Consultas por Utente __________________________________ 43 Figura 13 Custos por Consulta __________________________________________ 44 Figura 14. Custos por Consulta: Componentes ______________________________ 45 Figura 15. Função Custos Médios por Utente_______________________________ 48 Figura 16. Função Custos Médios por Consulta ____________________________ 62
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Abreviaturas utilizadas
ARS - Administração Regional de Saúde
CE – (Médicos) Com (Regime de) Exclusividade
CS - Centro de Saúde
DGS – Direcção-Geral da Saúde
IGIF – Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde
INFARMED - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento
LVT – Lisboa e Vale do Tejo
MCDT - Meios Complementares de Diagnóstico e Terapêutica
MCSP - Missão para os Cuidados de Saúde Primários
RRE - Regime Remuneratório Experimental
SAP – Serviço de Atendimento Permanente
SNS – Serviço Nacional de Saúde
SRS- Sub-Região de Saúde
SRSP - Sub-Região de Saúde do Porto
ULS – Unidade Local de Saúde
USF – Unidade de Saúde Familiar
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
1. Objectivos e Metodologia
No respeito integral pelos Termos de Referência, o objectivo deste Estudo é avaliar
o impacto orçamental do lançamento e implementação das Unidades de Saúde Familiar
(USF). Numa primeira fase, a que este Relatório corresponde, a avaliação diz respeito
ao último trimestre do ano de 2006 e, numa segunda fase, a desenvolver posteriormente,
dirá respeito ao ano de 2007. A segunda fase do estudo deverá também incluir uma
proposta de um sistema de incentivos para os enfermeiros e funcionários
administrativos que integram as USF.
Em reuniões com a Missão para os Cuidados de Saúde Primários, foi definido
expressamente que uma parte importante do trabalho deveria ser caracterizar, do ponto
de vista económico, o funcionamento dos centros de saúde bem como identificar e
avaliar eventuais diferenças de desempenho entre os centros de saúde convencionais e
as unidades em Regime Remuneratório Experimental (RRE). Por sua vez, os Termos de
Referência explicitam que o trabalho deverá adoptar como unidade básica de análise os
custos anuais por utente, e pôr a ênfase nos componentes dos custos associados ao
consumo de meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) e de
medicamentos.
As linhas de orientação contidas nos Termos de Referência especificam ainda que
a avaliação do impacto orçamental deverá ter em conta as condições de funcionamento
das USF, as quais incluem o regime retributivo experimental dos médicos, o horário
acrescido dos enfermeiros, o recurso a trabalho extraordinário dos administrativos e o
prolongamento de horário de cobertura assistencial. Para efeitos da avaliação do
impacto orçamental em 2006, estas condições correspondem àquelas que vigoram nas
unidades que já estão a funcionar em Regime Remuneratório Experimental. Em
consonância com as linhas de orientação referidas, a nossa estratégia metodológica
assentou na utilização de modelos econométricos que capturassem os custos de
funcionamento dos centros de saúde e das unidades em RRE, e na utilização de tais
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
modelos para simular as alterações introduzidas com a criação das USF e para gerar as
estimativas do impacto orçamental.
A estimativa do impacto orçamental assentou num trabalho extenso de
caracterização quantitativa, do ponto de vista económico, do funcionamento actual dos
centros de saúde, e em particular de:
• Analisar os seus custos, e a relação entre estes e a produção de cuidados de saúde;
• Aferir da existência de economias de escala;
• Explicar a variabilidade observada nos custos, estimando o impacto dos factores
escala (número de utentes), necessidade de cuidados (relacionada com as proporções
relativas dos diversos grupos etários), medidas de acesso (medido pelo número de
utentes sem médico de família, e percentagem de utilizadores), medidas de
qualidade, medidas de produção (medidas pelo número de consultas por utente ou
por utilizador), e especificidades de cada Sub-Região de Saúde (SRS);
• Estimar até que ponto o Regime Remuneratório Experimental (RRE) explica
diferenças nos custos por utente e por consulta;
• Gerar um estimativa preliminar dos custos para o sistema de um aumento do número
de unidades em RRE.
O trabalho incluiu também uma análise da questão da auto-slecção. Na primeira
etapa do trabalho, os resultados indicaram a existência de menores custos nas RRE. No
entanto, tal não é suficiente para provar a existência de uma vantagem económica do
RRE. Por essa razão, numa segunda etapa do trabalho, pretendeu-se averiguar se as
unidades em RRE são mais económicas porque há mudanças no comportamento dos
médicos ou porque nas unidades em RRE há uma auto-selecção dos médicos com
propensão para gerar menores custos, sem que haja necessariamente uma mudança de
comportamento destes e, logo, sem que haja ganhos reais para o sistema de saúde como
um todo. Como não dispomos de dados longitudinais, que acompanhem os médicos e os
centros de saúde ao longo do tempo, não pudemos fazer uma análise rigorosa. No
entanto, pudemos utilizar as candidaturas a USF na região de Lisboa e Vale do Tejo
(LVT), para a qual obtivemos dados sobre médicos ao nível individual, para obter uma
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
estimativa quantitativa sobre até que ponto a auto-selecção é responsável pelos
resultados obtidos no estudo dos custos dos centros de saúde e das unidades em RRE.
O resultado final desta sequência de etapas foi a obtenção de estimativas dos efeitos
líquidos do RRE. Os resultados econométricos corrigidos por estas estimativas do efeito
de auto-selecção foram depois usados para gerar as estimativas do impacto orçamental.
Um trabalho desta natureza, feito em condições de grande pressão de tempo, só é
possível quando outros colaboram generosamente na obtenção da matéria prima
estatística e com a sua ajuda, dando informação e contribuindo com a sua expertise no
entendimento das questões mais complexas. Ficamos gratos a todos os que nos
ajudaram, e não queremos deixar de nomear aqueles sem os quais este trabalho não teria
sido possível. Na Missão para os Cuidados de Saúde Primários, o seu Presidente, o Dr.
Luís Pisco bem como o Dr. Carlos Nunes. Na ARS de Lisboa e Vale do Tejo, o Dr.
Manuel Schiappa, o Engº Carlos Pires e a Dra. Maria do Céu Tomé Valentim. Na ARS
do Norte, a Prof. Suzete Gonçalves e a Dra. Lúcia Barbosa. No IGIF (RHV), a Dra.
Emília Marques. A todos os nossos agradecimentos. Por último, gostaríamos de
agradecer o encorajamento e apoio que recebemos do Presidente da Associação
Portuguesa de Economia da Saúde, o Prof. João Pereira.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
2. Notas sobre a História Recente da Política de Cuidados Primários
2.1 A Evolução dos Centros de Saúde em Portugal
Com a chamada reforma de Gonçalves Ferreira em 1971 e a publicação do
Decreto-Lei nº 413/71, de 27 de Setembro, foram criados os primeiros centros de saúde,
ou a denominada “primeira geração” de centros de saúde. A sua actividade estava
principalmente centrada na prevenção de doenças infecto-contagiosas, através de
campanhas de vacinação; na prestação de assistência a grupos considerados mais
vulneráveis, como grávidas e crianças; em serviços relacionados com a saúde escolar; e
no seu papel enquanto autoridade sanitária. Co-existiam com estes centros de saúde os
postos dos Serviço Médico-Sociais das Caixas de Previdência, que prestavam
assistência aos trabalhadores e às suas famílias (Branco e Ramos, 20012).
Em 1983, já depois do surgimento do SNS e da carreira de médico de clínica
geral, são criados pelo Despacho Normativo nº 97/83 os chamados centros de saúde de
“segunda geração”. Estes resultam da integração dos serviços de assistência extra-
hospitalares existentes na altura - a geração anterior de centros de saúde, os postos dos
Serviço Médico-Sociais das Caixas de Previdência, e os hospitais concelhios, pelo que
são habitualmente denominados de centros de saúde integrados. Este processo de
integração veio ainda a reflectir-se na estrutura orgânica do Ministério da Saúde, que
passou a incluir uma Direcção Geral dos Hospitais e uma Direcção Geral dos Cuidados
de Saúde Primários (Branco e Ramos, 2001; DGS-Comissão, 20043).
Apesar de ter permitido uma maior racionalidade na prestação de cuidados de
saúde e uma optimização dos recursos utilizados, esta geração de centros de saúde não
melhorou nem a acessibilidade nem a prossecução de objectivos de saúde.
Progressivamente, este modelo revelou-se incapaz de responder às expectativas e
necessidades dos utentes. O modelo contribuiu ainda para uma crescente desmotivação
2 Branco, António G. e Ramos, Vítor. Cuidados de saúde primários em Portugal. Revista Portuguesa deSaúde Pública. 2001; Volume Temático 2: pp. 5 a 12. 3 Direcção-Geral da Saúde. Regime Remuneratório Experimental dos Médicos de Clínica Geral. Lisboa,2004.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
e insatisfação dos profissionais, em parte devido à gestão centralizada nas sub-regiões e
nas administrações regionais de saúde (Branco e Ramos, 2001).
Neste contexto, foi criado, pelo Decreto-Lei nº 117/98, de 5 de Maio, o Regime
Remuneratório Experimental (RRE) dos Médicos da Carreira de Clínica Geral, numa
acção sem precedentes no contexto do funcionalismo público (Sousa e col., 20014). Este
Decreto deu início a uma experiência organizacional inovadora, cuja implementação
veio a ser suportada pela Portaria nº 993-A/98, de 24 de Novembro, e pela Circular
Normativa da Direcção Geral da Saúde (DGS) n.º 9/GAB/DG, de 28 de Dezembro de
1998, que viria a ser revogada pela Circular Normativa n.º 6/GAB/DG, de 10 de Abril
de 2002.
Tal como atesta o preâmbulo do Decreto-Lei nº 117/98 a implementação deste
novo regime vem na sequência de experiências previamente realizadas em centros de
saúde que visavam procurar novas formas de organização dos cuidados de saúde
primários e cujos resultados permitiam identificar melhorias ao nível da acessibilidade e
da qualidade. Assim, o RRE tinha como objectivo discriminar positivamente os médicos
da carreira de clínica geral cujo desempenho contribuísse para uma maior acessibilidade
e qualidade dos serviços prestados.
Já em 1996 tinham surgido algumas experiências locais com o objectivo de
combater a rigidez e burocratização presentes nos centros de saúde de “segunda
geração”, sem gestão autónoma e sem incentivos que levassem a uma melhoria em
termos de acessibilidade e qualidade. Os projectos Alfa representaram a primeira
tentativa de implementar novos modelos de trabalho em equipa, tendo 15 grupos
conseguido alterar o seu modo de funcionamento (Branco e Ramos, 2001).
Essas experiências, tal como o RRE, visavam encontrar formas de combater os
problemas identificados por sucessivas avaliações dos cuidados de saúde primários:
deficiente acessibilidade, comprovada pela proporção de utentes sem médico de família
4 Sousa, JC e col. Os cuidados de saúde primários e a medicina geral e familiar em Portugal. Revista Portuguesa de Saúde Pública. 2001; Volume Temático 2: pp. 63 a 74.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
designado; inadequação de horários e deficiente sistema de marcação de consultas com
consequências no tempo de espera dos utentes; e recurso à chamada “medicina
defensiva”, com excessivo recurso à prescrição de meios complementares de
diagnóstico e terapêutica (MCDT) e de medicamentos (DGS, 2004).
A adesão ao RRE foi voluntária, embora limitada anualmente por despacho
conjunto dos Ministros das Finanças e da Saúde. Paralelamente, a adesão foi
condicionada ao preenchimento de várias condições:
- Integração de pelo menos três médicos, com acordo de intersubstituição que
garantisse atendimento no próprio dia aos utentes da lista de qualquer médico.
- Cumprimento do horário das 8 às 20 horas nos dias úteis, com possibilidade de
atendimento ao fim-de-semana e até às 24 horas durante os dias úteis, conforme as
características sócio-demográficas da área e a dimensão das listas de utentes.
- Existência de um plano de acção anual, delineado com base nas orientações das
administrações regionais de saúde e nos critérios da DGS, e de um sistema de
informação que permitisse não só avaliar o cumprimento desse plano como também
monitorizar a vigilância de grupos vulneráveis e a prestação de assistência domiciliária.
Este plano de acção é um instrumento que deve conter os compromissos do RRE
no que respeita à prestação de cuidados, ao desenvolvimento profissional e à
cooperação interdisciplinar dos profissionais. Adicionalmente, deve incluir as
estratégias definidas com vista a garantir a qualidade e custo-efectividade dos cuidados
prestados, nomeadamente a utilização de formulários por patologia e a prescrição de
MCDT segundo critérios de racionalidade técnico-científica. Naturalmente, a
obrigatoriedade deste plano de acção constitui um incentivo a um aumento qualitativo
do planeamento e da gestão dos centros de saúde.
No que respeita à lista de utentes, o Decreto-Lei nº 117/98 especifica que cada
lista de utentes deve privilegiar a estrutura familiar, pelo que é dada uma maior
importância relativa à inclusão de crianças até aos 4 anos e de pessoas com 65 ou mais
anos. Assim, a lista de utentes tem como limite mínimo 1852 unidades ponderadas, em
que as crianças entre os 0 e os 4 anos representam 1,5 unidades e as pessoas com 65 ou
mais anos representam 2 unidades.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Relativamente à remuneração dos médicos que adiram ao RRE, o Decreto-Lei
estabelece a sua divisão numa componente fixa e numa componente variável. A
primeira é baseada na categoria e no escalão do médico (assumindo um horário de trinta
e cinco horas semanais em dedicação exclusiva), e na dimensão da lista de utentes. A
segunda depende da prestação de cuidados domiciliários, do alargamento do período de
cobertura, e do seguimento de grávidas, de crianças no primeiro ano de vida e do
acompanhamento em planeamento familiar de mulheres em idade fértil.
Note-se que, apesar da realização de cuidados domiciliários apenas ter reflexo na
remuneração do médico que os pratica, o alargamento de período de cobertura e o
seguimento dos grupos referidos acima têm impacto na remuneração de todos os
médicos da equipa. Aliás, a implementação do RRE está associada a uma tentativa de
fortalecimento do trabalho em equipa entre médicos, visível também no facto da
contratualização e respectiva avaliação do desempenho e do cumprimento do plano de
acção serem realizadas relativamente ao grupo, e na obrigatoriedade de
intersubstituição.
Posteriormente, com a publicação de Decreto-Lei nº 157/99, de 10 de Maio,
pretendeu-se criar os chamados centros de saúde de “terceira geração”. O objectivo era
rever o enquadramento normativo dos centros de saúde, nomeadamente conferindo-lhes
autonomia administrativa e financeira, e incentivando o desenvolvimento de hierarquias
técnicas. Cada centro de saúde deveria incorporar: quatro a dez unidades de saúde
familiar, com vista à prestação de cuidados de saúde e à garantia de acessibilidade,
continuidade e globalidade dos cuidados, uma unidade operativa de saúde pública, cuja
responsabilidade seria a de garantir a protecção e promoção da saúde na comunidade; e
uma unidade de cuidados na comunidade, para prestar serviços de enfermagem e de
apoio psicossocial (Campos5, 1999).
Campos, A. Sistemas locais de saúde e centros de saúde – início da reforma do sistema de saúde?. Revista Portuguesa de Saúde Pública. 1999; 1: pp. 65 a 68.
17/91
5
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Devido a dificuldades de implementação destes centros de saúde foram criados
pelo Despacho nº 25521/2001, de 22 de Novembro, o grupo nacional e os grupos
regionais de “Apoio à Implementação dos Centros de Saúde de Terceira Geração”.
Os centros de saúde de terceira geração assentam, por um lado, nas vantagens da
descentralização da gestão e da aproximação da decisão ao local da acção e, por outro
lado, na contratualização e avaliação do cumprimento de orçamentos-programa (DGS,
20026).
Segundo o “Manual para a Mudança” (DGS, 2002) a passagem para a “terceira
geração” visava fundamentalmente melhorar ou implementar sete aspectos: autonomia;
gestão; orientação para os utentes; motivação dos profissionais; hierarquia técnica;
trabalho em equipa; e participação da comunidade e cooperação intersectorial e
interinstitucional.
A autonomia, viabilizada pela personalidade jurídica, tinha como objectivo
garantir que as competências de gestão administrativa e financeira seriam
descentralizadas, passando das sub-regiões distritais para os centros de saúde. Tornar-
se-ia também possível a elaboração de orçamentos-programa reais, discutidos e
avaliados por agências de contratualização. Finalmente, passando os centros de saúde a
ter um estatuto idêntico ao dos hospitais, seria mais fácil criar sistemas locais de saúde.
A existência de uma equipa de gestão de recursos local, aliada ao
estabelecimento de uma hierarquia técnico-científica, desenvolveria uma maior
responsabilização local, criando condições para o aumento da qualidade dos serviços
prestados por pequenas unidades multiprofissionais.
No entanto, o Decreto-Lei 157/99 acabou por nunca chegar a ter aplicação
prática, tendo sido revogado pelo Decreto-Lei 60/2003, de 1 de Abril, que veio
apresentar um novo modelo para a organização dos cuidados de saúde primários.
6 Direcção-Geral da Saúde. Centros de Saúde da Terceira Geração – Manual para a Mudança. Lisboa, 2002.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
De acordo com este diploma, a nova rede de cuidados de saúde primários teria
como objectivo não só a garantia de cuidados de saúde tendencialmente gratuitos,
abrangentes e continuados, mas também a articulação permanente com os cuidados de
saúde secundários e terciários.
A reforma introduzida previa ainda a possibilidade de serem celebrados
contratos de gestão de centros de saúde (e suas extensões ou partes funcionalmente
autónomas) com entidades públicas, sociais ou privadas, com ou sem fins lucrativos,
desde que estas provassem possuir capacidade e competência técnica. Neste novo
contexto, o sistema de incentivos seria baseado em critérios objectivos e parâmetros
mínimos de produtividade e qualidade de desempenho, a regulamentar em decreto
próprio (Campos e Faria, 20037).
No entanto, com a publicação do Decreto-Lei nº 88/2005, em 3 de Junho, é
revogado o Decreto-Lei nº 60/2003 e repristinado o Decreto-Lei nº 157/99, entretanto
alterado pelo Decreto-Lei nº 39/2002, de 26 de Fevereiro.
Segundo o preâmbulo do Decreto-Lei nº 88/2005, tal deveu-se ao facto da rede
de cuidados de saúde primários que se havia tentado implementar não ter tido qualquer
sucesso no que respeitava à melhoria de acessibilidade. Aliás, segundo o legislador, o
insucesso estaria garantido “já que o respectivo normativo não tem em conta a enorme
diversidade das dimensões do centros de saúde, nem lhes confere qualquer autonomia”.
No entanto, a repristinação do Decreto-Lei nº 157/99 foi de aplicação
temporária, dada a criação de um grupo técnico para a reforma dos cuidados de saúde
primários que tinha em vista formular um novo instrumento normativo. Neste contexto,
o RRE que tinha vindo a ser sucessivamente prorrogado até 31 de Dezembro de 2005,
foi novamente prorrogado até 30 de Junho de 2006 pelo Decreto-Lei nº 23/2006, de 2 de
Fevereiro.
7 Campos, Alexandra P. e Faria, Paula L. O Decreto-Lei nº 60/2003, de 1 de Abril – nova tentativa de reforma dos cuidados de saúde primários em Portugal. Revista Portuguesa de Saúde Pública. 2003; 2: pp. 73 a 76.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Finalmente, com a publicação do Despacho Normativo nº9/2006, de 16 de
Fevereiro, regulamentaram-se “os termos, condições e procedimentos conducentes ao
lançamento e implementação das USF [Unidades de Saúde Familiar]”. As USF deverão
ser unidades com autonomia organizativa, funcional e técnica, baseadas em equipas
multiprofissionais, com médicos, enfermeiros, administrativos e outros profissionais de
saúde, tendo em vista uma maior acessibilidade e a reconfiguração dos centros de saúde
enquanto unidades enquadradoras de USF.
2.2 As Avaliações do Regime Remuneratório Experimental
A primeira auto-avaliação do Regime Remuneratório Experimental (RRE) 8 foi
finalizada por um grupo de médicos responsáveis pelas unidades em RRE em 2003,
com base em dados de 2001. Foram incluídos as unidades em RRE de Aguda, Amadora,
Canelas, Coruche, Fânzeres, S. Félix da Marinha, Horizonte, Monte de Caparica,
Oceanos, Ramalde, Samora Correia, Serpa Pinto, Sete Caminhos e Vialonga.
O estudo pretendeu avaliar áreas como Profissionais e População Inscrita,
Organização e Gestão, Organização Formal, Direitos dos Cidadãos, Promoção da
Saúde, Prestação de Cuidados de Saúde, Educação Contínua e Avaliação de Qualidade,
Instalações e Equipamentos, Indicadores e Taxas, e Custos em Medicamentos e Exames
Auxiliares de Diagnóstico. Para tal, foi elaborado um questionário a preencher por cada
RRE com o nível de alcance de vários objectivos. Relativamente a indicadores e taxas
mensuráveis foram utilizados dados estatísticos. Os dados obtidos foram então
avaliados em comparação com a realidade da Sub-Região de Saúde do Porto (SRSP).
O questionário foi enviado para todos os 20 RRE mas apenas 14 responderam.
Nestes 14 RREs trabalhavam 287 profissionais: 106 médicos, 91 enfermeiros
(correspondentes a 94,1 unidades de enfermeiro equivalente9), e 90 administrativos. A
8 Varela, A. e col. Auto-Avaliação do Regime Remuneratório Experimental – Ano de Avaliação 2001.Lisboa, 2003. 9 O número de enfermeiros equivalentes resulta da divisão do total de horas de enfermagem pelas horas resultantes de um horário semanal de 35 horas.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
população inscrita nestes RRE é 191042, a que correspondem 225190 unidades
ponderadas10.
O número médio de utentes por médico era de 1801 (com um desvio-padrão (dp)
de 146), variando entre 1612 e 2215. Paralelamente, havia 1935 utentes (dp: 289;
mínimo: 1580; máximo: 2639) por enfermeiro equivalente e 2234 utentes (dp: 467;
mínimo: 1069; máximo: 3096) por administrativo. No entanto, não foi possível avaliar
comparativamente estes valores, dado não haver valores equivalentes para a Sub-região
de Saúde do Porto (SRSP).
A taxa de utilização global - ou seja, o quociente entre o número total de
primeiras consulta e a população inscrita - nos 14 RRE em análise foi de 0,73 (dp: 0,08;
mínimo: 0,61; máximo: 0,92), sendo de apenas 0,65 na SRSP. Já a taxa de utilização
média, ou o número de consultas por utilizador foi de 4,7 (dp: 0,6; mínimo: 3,8,
máximo: 5,9), em comparação com 3,7 consultas nos centros de saúde da SRSP.
Finalmente, a produtividade global por médico – isto é, o número de consultas
realizadas por um médico num mesmo dia11 - foi de 29,4 (dp: 7,0; mínimo: 18,4;
máximo 40,2). Também não há dados da SRSP que permitam avaliar comparativamente
este valor.
Relativamente aos custos com medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico,
não foi possível obter dados dos RRE de Horizonte, Oceanos e Vialonga. Para os
restantes, o custo médio por consulta foi de €28,6 (dp: 4,2; mínimo: 17,8; máximo: 34),
sendo de €28,8 (dp: 5,3) se considerarmos apenas os RRE da SRSP. Já na totalidade da
SRSP, o custo médio com medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico por consulta
foi de 39,2. Este valor é quase €10 superior ao custo associado aos RRE.
Já o custo médio por utente inscrito foi de €100,3 (dp: 20,9; mínimo: 76,7;
máximo: 140,6) para os RRE e de €94,7 para os centros de saúde da SRSP.
10 O número de unidades ponderadas obtém-se somando a multiplicação do número de utentes dos 0 aos 4anos por 1,5 com o número de utentes dos 5 aos 64, e com a multiplicação do número de utentes com 65anos por 2. 11 Considerando 220 dias de consulta por ano.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Considerando apenas os RRE da SRSP, o custo médio por utente desce para €92,9 (dp:
11,4).
Finalmente, o custo médio por utente utilizador nos RRE foi de €131,0 (dp:
16,9; mínimo: 118,7; máximo: 157,9) em comparação com €145,3 na SRSP. Nos RRE
da SRSP, o custo médio foi praticamente igual à totalidade dos RRE avaliados, sendo
de €131,3 (dp: 18,9).
Os autores desta auto-avaliação salientam a não existência de dados para seis
RRE (30% do total), embora considerem que tal não terá afectado os resultados. No que
concerne à avaliação de custos com medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, a
falta de informação estende-se a mais três RRE, pelo que os custos médios apresentados
representam apenas 55% do universo em análise. Os autores reconhecem também que a
utilização da SRSP como grupo comparador poderá não ser o método mais apropriado,
justificando a sua utilização pela necessidade de operacionalizar o processo.
Segundo os autores, os “resultados positivos aqui apresentados apontam para um
melhor desempenho dos RRE em relação aos centros de saúde clássicos”, considerando
ainda que a “satisfação dos utentes, dos profissionais e uma boa relação custos-
benefício (eficiência) demonstram que o RRE é uma experiência inovadora positiva”.
Posteriormente, através do Decreto-Lei nº 209/03, de 15 de Setembro, e do
Despacho nº 5077/04, de 19 de Fevereiro, foi criada uma Comissão de
Acompanhamento e Avaliação. Esta comissão acabou por, em Novembro de 2004,
concluir o seu relatório de avaliação12do RRE com possíveis adaptações e melhorias.
Nesta avaliação foi possível alcançar um maior rigor na escolha do grupo
comparador, escolhendo centros de saúde com a mesma dimensão, em termos de
quantidade de médicos, e com características demográficas semelhantes às do grupo em
RRE. Assim, para cada um dos 18 RRE em análise procurou-se encontrar um
comparador que fosse o mais adequado possível. Pretendeu-se igualmente não comparar
12 Ver nota 3.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
os grupos a nível nacional, mas também a nível da sub-região de saúde a que
pertencessem.
Foram avaliadas as seguintes dimensões: Disponibilidade, Acessibilidade,
Produtividade, Desempenho/Qualidade Técnico-Científica, Eficácia/Ganhos em Saúde,
Custos/despesas, e Qualidade/satisfação.
A média de inscritos por médico nos RRE era de 1774 (mínimo: 1555; máximo:
2025), sendo de 1639 no grupo comparador (mínimo: 1548; máximo: 1814) e de 1273 a
nível nacional. Nos 18 RRE analisados, apenas num caso a média de inscritos por
médico era inferior à do comparador.
No que respeita a utentes não apenas inscritos mas utilizadores dos serviços, os
dados de 2003 revelam a existência de 1343 utentes utilizadores por médico nos RRE e
de apenas 1215 no grupo comparador.
Quanto à percentagem de utilização - a proporção de utentes inscritos que
tenham tido pelo menos uma consulta - as diferenças entre o RRE e o grupo comparador
foram menores: a percentagem de utilização foi de 75,7% para o RRE e de 74,1% para o
grupo comparador, sendo que em apenas 4 dos casos em comparação surgiram valores
superiores para o grupo comparador.
A média de consultas por utilizador foi de 4,53 no RRE e de 4,11 no grupo
comparador, sendo a média nacional de 4,1. Na comparação por par RRE/comparador,
só em 3 casos é que o grupo comparador foi superior.
A média de consultas anuais por médico foi também superior no RRE. Neste
regime, os médicos realizaram 6085 consultas, tendo os médicos do grupo comparador
realizado apenas 4989. Realce-se ainda que a média nacional foi de 3919. Mais uma
vez, a vantagem do RRE em termos médios resulta de uma vantagem uniforme do RRE
e não de casos extremos: os médicos em RRE fizeram mais consultas do que os médicos
do grupo comparador em 16 dos 18 casos.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Relativamente a consultas médicas por hora, a comissão salienta que considera
este item um indicador fraco, dada a grande variabilidade no número de horas semanais
declaradas por cada médico. De qualquer forma, a média foi de 5,41 no RRE e de 4,67
no grupo comparador, sendo o RRE superior ao grupo comparador em 15 casos. Note
-se que o indicador utilizado na auto-avaliação relativa a 2001 era o número de
consultas por dia (considerando 220 dias de consultas por ano). Nesta nova avaliação tal
indicador não foi descrito, mas seria 27,7 para o RRE e 22,7 para o grupo comparador.
O número de consultas por inscrito foi de 3,4 para o RRE e de 3,0 no grupo
comparador, sendo a média nacional de 2,8. O RRE foi novamente superior em 16 dos
18 casos. Note-se que, de acordo com o Plano Nacional de Saúde 2004/2010 da
Direcção Geral de Saúde (DGS), a meta a nível nacional para 2010 é de três consultas
anuais por utente.
No que respeita a encargos, o RRE apresentou menores despesas com
medicamentos por utilizador, sendo estas de €100,01 no RRE e de €108,45 no grupo
comparador (uma vantagem de 7%). Paralelamente, registou-se também uma menor
despesa em meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT), que foram de
€50,94 no RRE e de €60,87 no grupo comparador (uma diferença correspondente a
16,3%). No entanto, as remunerações por utilizador foram superiores no RRE: €54,49
em comparação com €45,71 no grupo comparador, representando um acréscimo de
19,2%.
Assim, o custo total por utilizador (medicamentos+MCDT+remunerações de
pessoal médico) foi €206,33 no RRE e €215,03 no grupo comparador, ou seja, o custo
por utilizador foi inferior em 4% no RRE. Este indicador de custos é superior nos RRE
em 7 dos 18 casos considerados.
Também o custo por consulta é superior no grupo comparador, sendo de €45,52
no RRE e de €52,35 no referido grupo, o que corresponde a uma diferença de 13%.
Neste caso, o indicador é superior no RRE em apenas 2 dos 18 casos.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A comissão calculou ainda os encargos globais em 2003 para o RRE e para o
grupo comparador, considerando para tal os encargos do SNS com medicamentos
prescritos no centro de saúde, os encargos com MCDT, e os encargos com
remunerações médicas sem incluir horas extraordinárias.
Para um número de inscritos no RRE de 228.888, foram gastos €35.734.687,
correspondentes a €17.476.581 com medicamentos, €8.821.656 com MCDT, e
€9.436.450 com remunerações médicas. Assim, o custo total por inscrito foi de €156,12.
No grupo comparador, com 214.698 inscritos, foram gastos €34.215.225, resultantes de
€17.256.205 gastos com medicamentos, €9.685.126 com MCDT, e €7.273.893 com
remunerações médicas. Tal resultou num custo total por inscrito de €159,36. Constata-
se que, apesar do RRE ter gerado um nível superior de encargos, tal se deve a um maior
número de inscritos e não a um maior custo por inscrito.
Segundo a comissão, se a população inscrita no grupo comparador fosse inscrita
no RRE, ter-se-iam poupado cerca de €695.000 durante o ano de 2003. A comissão
conclui então que o “aumento de encargos com remunerações encontra a sua
contrapartida numa melhor oferta de cuidados, no aumento da produção (mais 22%), na
garantia da qualidade e em maior eficiência”.
2.3 Diferenças entre a Avaliação do RRE pela DGS e a Presente Avaliação
Para além da avaliação feita neste relatório usar dados mais recentes, de 2005, há
outras diferenças, de natureza mais metodológica entre as duas avaliações. A avaliação
da DGS adoptou uma metodologia de case-control que permitiu uma investigação
muito detalhada das diferenças entre um conjunto de indicadores nas unidades em RRE
e unidades consideradas comparáveis a funcionar no modelo convencional. Isso
permitiu que além das variáveis de custo a que já fizemos referência, se tenha
investigado um conjunto vasto de indicadores sobre a produção e qualidade de serviço
na prestação dos cuidados de saúde.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A presente avaliação adopta uma metodologia estatística/econométrica,
concentra-se nos custos e mede a produção dos centros de saúde de forma
necessariamente simplificada: por utentes inscritos, por utilizadores e por consultas,
sendo que esta última variável agrega os vários tipos de consultas. Ou seja, esta
avaliação considera um conjunto menos rico de indicadores. Esta desvantagem é
compensada por algumas vantagens de outra natureza.
• Em primeiro lugar, a análise baseou-se em dados secundários, em particular nos
Tableaux de Bord das ARS, facto que permitiu concluir a análise no escassíssimo
tempo disponível.
• Em segundo lugar, ao considerar dados de todos os centros de saúde e ao tratar os
dados das unidades em RRE como fazendo parte do universo dos centros de saúde,
tornou-se possível a utilização da metodologia da inferência estatística, ou seja
avaliar a significância estatística das diferenças encontradas.
• Em terceiro lugar, o uso de metodologias de regressão múltipla permitiu encontrar
resultados controlando por um conjunto de factores que são necessariamente
negligenciados em comparações bilaterais. Por exemplo, pudemos encontrar
diferenças em custos entre unidades em RRE e unidades convencionais controlando
pela estrutura etária da população, pela proporção de utentes sem médico de família,
por um indicador da qualidade de serviço, e sobretudo pelos efeitos de escala e pelas
especificidades regionais. A muito significativa relevância destas últimas variáveis
faz-nos ter pouca confiança nas diferenças entre unidades em RRE e unidades
convencionais encontradas bilateralmente, já que não é seguro que tais diferenças
não possam ser atribuídas a esta variáveis omitidas, as quais agem como
confounding factors.
• Em quarto lugar, a avaliação de uma experiência como o RRE fica seriamente
comprometida se não se tiver em conta que a participação em tal experiência é
voluntária e logo sujeita a fortes enviesamentos provocados pela auto-selecção dos
participantes. Ao encontrarmos diferenças entre os resultados de uma unidade em
RRE e de uma convencional, será que as diferenças de performance reflectem as
diferenças entre as instituições e os incentivos, ou reflectem apenas que se trata de
tipos diferentes de médicos, e que tais diferenças nada têm a ver com as
instituições? Por exemplo, se juntarmos médicos no percentil 95 e acima de
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
produtividade numa unidade convencional, esta unidade será muito mais produtiva
que a média, mas nenhum aumento real de produtividade ocorreu na perspectiva
global do sistema de saúde. Só mudanças de comportamento podem representar
ganhos reais para o sistema de saúde como um todo. Nesta avaliação tentámos
enfrentar com tanto cuidado quanto possível esta questão, e os resultados que
apresentamos são, na medida do possível, expurgados dos efeitos de auto-selecção.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
3. Fontes dos Dados e Valores Agregados
Os dados de base usados na análise económica dos centros de saúde são
provenientes dos Tableaux de Bord de 2005 para as ARS do Norte, Centro, Lisboa e
Vale do Tejo e Alentejo. Trata-se de uma base de dados, em ficheiro Excel, contendo
informação sobre os recursos humanos, os custos e a actividade dos centros de saúde.13
Os dados são recolhidos nas várias Sub-Regiões de Saúde14 (SRS) que podem
não seguir rigorosamente os mesmos critérios contabilísticos. O método estatístico de
análise dos custos a utilizar mais adiante será adaptado por forma a gerar resultados que
sejam robustos face a esta fonte de variabilidade dos dados.
Outro problema com os dados sobre custos é o período a que dizem respeito as
despesas com Meios Complementares de Diagnóstico e Terapêutica (MCDT) e com
Medicamentos. Devido à demora no processo de conferência de facturas para ambos os
tipos de despesas, há várias sub-regiões cujos dados disponíveis para a elaboração do
Tableau de Bord no final de 2005 não incluem todo o ano de 2005. Nestes casos a
despesa anual foi estimada recorrendo aos meses homólogos de 2004. O Quadro 1
exibe alguma informação sobre esta situação.
Como a situação relativamente a estes desfasamentos é diversificada, eles
representam uma fonte espúria de variabilidade dos dados que terá de ser tida em conta
na análise estatística dos custos dos centros de saúde.
13 Os dados foram-nos enviados pelas ARS respectivas, via Missão para os Cuidados de Saúde Primários (MCSP). 14 Apesar de todas as SRS usarem o mesmo formato para o Tableau de Bord os critérios de contabilização dos custos não são rigorosamente idênticos em todas as regiões. As discrepâncias notam-se sobretudo nas classificações de custos residuais, como é o caso das classes “Custos Administrativos”, “Custos com Dirigentes” e “Outros Custos”. Nalgumas SRS os “Custos com Dirigentes” estão a zero. A importância relativa dos “Outros custos” é extremamente variável, pelo que presumimos que parte da razão para tal tem a ver com critérios contabilísticos. As várias parcelas de custos não somam rigorosamente o total, ou seja não são necessariamente exaustivas.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 1. Último Mês com Dados Reais
ARS SRS Medicamentos MCDT Braga n.d. n.d. Bragança Dez-05 Dez-05
Norte Porto Viana do Castelo
n.d. Nov-05
n.d. Out-05
Vila Real Set-05 Out-05 ULS Matosinhos Set-05 Set-05 Aveiro n.d. n.d. Castelo Branco Dez-05 Dez-05
Centro Coimbra Set-05 Dez-05 Guarda Nov-05 Nov-05 Leiria Abr-05 Abr-05 Viseu Dez-05 Nov-05 Lisboa Out-04 Nov-04
LVT Santarém Jul-05 Ago-05 Setúbal n.d. n.d. Évora Nov-05 Nov-05
Alentejo Beja Out-05 Nov-05 Portalegre Set-05 Set-05
Nota: n.d. – informação não disponível. Os meses indicados são os mais relevantes, há excepções em vários casos.
Os Tableaux de Bord não incluem informação sobre as “necessidades” de
cuidados de saúde da população ou, alternativamente, sobre características estruturais da
população determinantes da procura de cuidados de saúde. Um aspecto relevante e cuja
inclusão na análise foi viável é a estrutura etária da população. Retirámos informação
sobre a “percentagem da população com mais de 65 anos” e “percentagem da população
com 18 anos e menos” de uma útil publicação do IGIF, “Estatísticas do Movimento
Assistencial dos Centros de Saúde - 2004”. Esta publicação tinha gaps nos dados, em
particular sobre a SRS de Lisboa e sobre a Unidade Local de Saúde (ULS) de
Matosinhos, pelo que foram utilizados dados do Recenseamento de 2001 para
compensar a falta de informação ao nível do Concelho e, no caso da cidade de Lisboa,
ao nível da freguesia. Os dados foram acedidos quer no site do INE (ao nível dos
concelhos), quer no site www.guiadeportugal.pt (ao nível das freguesias).
Quanto à definição da unidade observada - o centro de saúde -, ela inclui
extensões, que são tratadas em conjunto com a respectiva sede. A excepção é o conjunto
das unidades em RRE na ARS do Norte, as quais, por serem centros de custo, dispõem
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
de informação separada. Para efeitos desta análise as RRE do Norte são tratadas como
centros de saúde.
Relativamente aos conceitos base, seguimos as definições operacionais nos
Tableaux de Bord. Para “Utentes” foi utilizado o total de utentes registados no centro de
saúde, não incluindo utentes esporádicos, no último dia do mês em questão. A definição
de “Utilizadores” corresponde ao total de primeiras consultas em cada ano. O total de
consultas corresponde às consultas em atendimentos ambulatório e de urgência (mais
atendimentos em SAP).
Quadro 2. Valores Agregados da Base de Dados
Variáveis
Utentes 10.329.338
% Utentes sem Médico de Família 10,86%
Habitantes 9.493.392
Utilizadores 6.630,215
Consultas 32.600.442
Custos €2236 Milhões
Totais
Para que os números globais anteriores possam ter algum enquadramento,
recordemos que, em 2004, de acordo com a publicação da DGS “Produção em saúde em
2004”, o número total de consultas e de atendimentos em SAP foi de 33,5 milhões para
todo o Continente, e de 32,3 milhões para as quatro ARS consideradas (o Algarve foi
retirado pois não dispúnhamos de um Tableau de Bord algarvio para 2005). Por outro
lado, a publicação do IGIF “Relatório de Contas do SNS para 2004” indica um total
nacional de 6,4 milhões de utilizadores num total de 10,5 milhões de utentes/inscritos,
havendo 9,6% de utentes sem médico de família.
Quanto às características médias de um centro de saúde na base de dados, o
Quadro 3 apresenta algumas estatísticas relevantes. Os dados são semelhantes aos
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
valores indicados para 2004 no Relatório de Contas do SNS15, os quais apresentavam
uma média de 30015 utentes, 20 médicos e 20 enfermeiros por centro de saúde.
Quadro 3. Estatísticas dos Centros de Saúde
Variáveis Média Desvio Padrão
Utentes 30834 28022
% Utentes sem Médico de Família* 10,8 9,33
Utilizadores 19792 17323
Médicos 20,88 17,74
Enfermeiros 20,55 14,11
Consultas 97315 74374
Utentes por Médico* 1478 308
Consultas por Médico* 4663 1377
Consultas por Utente* 3,16 0,92
Consultas por Utilizador* 4,92 1,04
Custos (€1000) 6674,69 4940,78
Estatísticas das variáveis com * correspondem à distribuição ponderada pelos utentes, pelos utilizadores ou pelo número de médicos conforme apropriado.
Note-se igualmente que os desvios padrão são elevados, o que indica uma
grande heterogeneidade nos centros de saúde, quer em termos de dimensão quer em
termos de rácios.
15 Note-se que como a unidade de observação é o centro de saúde, médias de rácios, como por exemplo “utentes por médico”, são calculadas dando o mesmo peso a centros de saúde grandes e pequenos, pelo que esta média de médias não coincide necessariamente com a média para o total do Continente.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
4. Caracterização Básica dos Custos
4.1 A Distribuição Estatística dos Custos Médios
Um dos passos intermédios essenciais da análise, conforme explicitado nos
termos de referência, é caracterizar os custos por utente e os custos por consulta.
Nesta secção, começamos pela apresentação das estatísticas essenciais
quantificando os custos por utente, quer em termos médios, quer em termos da sua
heterogeneidade ou dispersão.
Como já foi referido na secção anterior (ver nota 15), as médias de indicadores
para distribuições onde a unidade de observação é o centro de saúde não são
representativas, ou seja, não coincidem necessariamente com os valores agregados. Por
essa razão, apresentamos as estatísticas ponderadas pelo número de utentes (ou de
consultas, quando apropriado), por forma a apresentar indicadores representativos de
todo o sistema de cuidados primários. A menos que haja menção específica em
contrário, sempre que nos referirmos a médias de rácios ou indicadores estamos a usar
médias ponderadas.
Quadro 4. Custos Médios por Utente nos Centros de Saúde
Dados Brutos Desvio Correlação c/
N=335 Centros de Saúde Média Padrão Min Max Utentes (1) (2) (3) (4) (4) (5)
Custo 259,46 84,96 142,38 796,79 -0,559
Vencimentos Médicos 42,03 16,25 14,29 141,42 -0,494
Vencimentos de Enfermeiros 19,84 11,25 6,47 72,74 -0,578
Custos Administrativos e de Direcção 25,06 13,83 3,22 83,31 -0,526
Custos com MCDT 40,26 10,14 14,24 89,02 0,073*
Custos com Medicamentos 101,33 35,49 33,38 346,11 -0,529
Outros Custos 30,95 31,17 0,00 337,6 -0,247
Correlações com número de utentes significativas (p<0,001) excepto *(p=0,185)
32/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 5. Custos Médios por Utente nos Centros de Saúde,
Ponderado pelo Número de Utentes N=335 Centros de Saúde Média Desvio Padrão CV Correlação c/ Utentes
(1) (2) (3) (3)/(2)=(4) (5) Custo 216,47 58,84 27,2% -0,533
Vencimentos Médicos 34,76 11,33 32,6% -0,463
Vencimentos de Enfermeiros 13,95 7,13 51,1% -0,528
Custos Administrativos e de Direcção 18,56 9,25 49,8% -0,454
Custos com MCDT 40,92 8,58 21,0% 0,042*
Custos com Medicamentos 84,32 26,73 31,7% -0,480
Outros Custos 23,96 20,89 87,2% -0,271
Correlações com número de utentes significativas (p<0,001) excepto *(p= 0,4447)
Os resultados nos Quadro 4 e Quadro 5 podem ser visualizados através das
estimativas das densidades dos custos médios, apresentadas na Figura 1. Além de um
custo médio anual por utente de €216, a distribuição tem uma grande dispersão,
existindo algumas observações extremas (outliers) que influenciam os resultados.
Figura 1. Distribuições dos Custos por Utente
0
.002
.004
.006
Densid
ade
200 400 600 800 Custo por Utente
Distribuição do Custo por Utente
0
.005
.0
1
Densid
ade
200 400 600 800 Custo por Utente
Distribuição Ponderada do Custo por Utente
Custos por Utente
A distribuição ponderada apresenta uma média menor que a dos dados
brutos (indiciando que os custos médios são mais baixos nos centros de saúde maiores),
mas sobretudo apresenta uma dispersão bem menor, como aliás a comparação dos
33/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
painéis na Figura 1 evidencia. Isso significa que a dispersão e a existência de
observações extremas são mais intensas em centros de saúde pequenos.
Quanto à composição dos custos, o Quadro 5 mostra que a maior componente
dos custos se deve aos custos com medicamentos (cerca de 40%) e com MCDT (19%),
e só depois aos vencimentos dos médicos (16%). As despesas administrativas e de
direcção, juntamente com outros custos (como custos com limpeza, segurança,
electricidade, água, comunicações e consumíveis) absorvem aproximadamente 20% dos
custos.
Os Quadro 6 e Quadro 7 apresentam as principais estatísticas sobe os custos
médios quando a unidade usada é a consulta.
Quadro 6. Custos Médios por Consulta nos Centros de Saúde
Dados Brutos Correlação c/
Custos por Consulta, N=335 Média Desvio Padrão Min Max Consultas (1) (2) (3) (4) (4) (5)
Custo Total 70,88 16,30 40,69 170,85 -0,184
Vencimentos Médicos 11,46 3,36 5,54 24,38 -0,175
Custos com MCDT 11,66 4,38 ,01 27,54 0,389
Custos com Medicamentos 27,49 6,48 8,51 57,53 -0,157
Correlações com número de consultas significativas (p<0,005)
Quadro 7. Custos Médios por Consulta nos Centros de Saúde,
Ponderado pelo Número de Consultas Custos por Consulta, N=335 Média Desvio Padrão CV Correlação c/ Consultas
(1) (2) (3) (3)/(2)=(4) (5) Custo Total 68,59 13,99 20,4% -0,202
Vencimentos Médicos 11,01 2,82 25,6% -0,1691
Vencimentos Enfermeiros 4,42 1,52 34,3% -0,425
Custos com MCDT 12,96 4,04 31,2% 0,318
Custos com Medicamentos 26,72 5,75 21,5% -0,132
Correlações com número de consultas significativas (p<0,02)
O que anteriormente foi dito sobre estatísticas ponderadas mantém-se válido,
ou seja as médias dos valores brutos não coincidem com os valores agregados pelo que
é conveniente ponderar os dados, sendo apenas que neste caso o ponderador natural é o
34/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
número de consultas. Também neste caso a distribuição ponderada tem uma menor
média e dispersão, como se pode ver na Figura 2. Com excepção dos MCDT há uma
correlação negativa entre volume de consultas e custos médios.
Figura 2. Distribuições dos Custos por Consulta
0 .
005
.01
.015
.02
.025
D
ensid
ade
0 50 100 150 200 Custo por Utente
Distribuição do Custo por Consulta
0
.01
.0
2
.03
D
ensid
ade
0 50 100 150 200 Custo por Utente
Distribuição Ponderada do Custo por Consulta
Custos por Consulta
4. 2 Relação entre Custos Médios e Número de Utentes
O factor explicativo mais importante para o custo total de um centro de saúde é o seu
nível de actividade. Este pode ser medido em várias dimensões, em particular pelo
número de utentes, pelo número de utilizadores ou pelo número de consultas. A Figura
3 ilustra, a relação entre custos totais e número de utentes e de consultas.16
16 Os pontos centrais a vermelho correspondem à média condicional da variável custos, ou seja a média para cada valor do número de utentes ou de consultas. A função média condicional foi estimada por regressão não paramétrica.
35/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 3. Custos Totais 0
1000
0000
20
0000
00
3000
0000
C
usto
s
0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos
Custos Totais vs. Utentes
0 10
0000
00
2000
0000
30
0000
00
Cus
tos
0 200000 400000 600000 Consultas
Custos Totais vs. Consultas
Custos Totais e Nível de Actividade
Outro facto a salientar é que, mesmo ao nível dos custos médios, o volume de
actividade é igualmente uma variável explicativa importante. Tal significa que não
temos uma situação de rendimentos constantes à escala em que os custos por utente ou
por consulta sejam independentes do volume de actividade. Essa situação é ilustrada na
Figura 4.
A existência de economias de escala sugere que poderia haver ganhos de
eficiência em aumentar as dimensões dos centros de saúde mais pequenos, isto é em
concentrar a sua actividade num menor número de unidades. Naturalmente que uma tal
alteração traria custos em termos dos níveis de acesso aos cuidados primários em alguns
meios populacionais, embora uma concentração de certos serviços comuns (logística,
etc.) possa ser realizada mantendo um conjunto de extensões e sub-unidades que
minimize o impacto nos níveis de acesso17. No entanto, uma conclusão que se pode
17 Centros de saúde maiores podem igualmente permitir uma gestão melhor dos recursos humanos, em particular porque é legalmente possível ter mobilidade de recursos dentro das unidades de um mesmo
36/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
retirar da análise visual é que há ganhos substanciais em aumentar a escala de operações
até cerca de 50000 utentes. Para dimensões superiores, esses ganhos parecem ser
bastante mais reduzidos.
Figura 4. Custos por Utente
0 20
0 40
0 60
0 80
0 C
usto
s
0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos
Custos Médios por Utente
A Figura 5, bem como as Figuras 6 e 7 mostram a decomposição dos custos
médios por utente pelos vários tipos de custo. Surpreendentemente, em todas as
rubricas, excepto os MCDT, é visível que os custos médios decrescem com o número de
utentes. É imprescindível reter a ideia de que a escala é uma variável importante para
explicar os custos médios de um centro de saúde. Qualquer análise económica dos
centros de saúde que não use medidas de escala poderá estar a errar por omitir um dos
factores mais significativos na determinação dos custos médios.
centro de saúde. Estamos gratos à Professora Suzete Gonçalves pela ajuda na compreensão destas questões.
37/91
150
Vencimentos de Enfermeiros por Utente
0 50000 100000 150000 200000 0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos Utentes/Inscritos
38/91
Cus
tos
0 50
10
0 15
0 C
usto
s 0
100
200
300
400
Cus
tos
0 10
0 20
0 30
0 40
0
0 50000 100000 150000 200000 0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos Utentes/Inscritos
Figura 6. Custos por Utente: Componentes II
Componentes do Custo Médio por Utente II
Custos com Medicamentos por Utente Custos com MCDT por Utente
0 50
C
usto
s 10
0
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 5. Custos por Utente: Componentes I
Componentes do Custo Médio por Utente I
Vencimentos Médicos por Utente
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 7. Custos por Utente: Componentes III
0 50
10
0 15
0 C
usto
s
0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos
Custos Administrativos por Utente
0 50
10
0 15
0 C
usto
s
0 50000 100000 150000 200000 Utentes/Inscritos
Outros Custos por Utente
Componentes do Custo Médio por Utente III
Apesar de a situação dos MCDT ser claramente diferente dos outros custos é
difícil encontrar a explicação para estes facto. Uma possibilidade é a de tal situação se
dever a um menor acesso a MCDT em meios com centros de saúde mais pequenos.
4. 3 Relação entre Custos Médios e Número de Utilizadores
A utilização dos utentes como unidade de volume faz mais sentido se a relação
entre utentes e utilizadores for relativamente estável. De facto, como se pode ver na
Figura 8, a relação entre utentes e utilizadores é linear. Em média, 64,2% dos utentes
são utilizadores, sendo o coeficiente de correlação entre utentes e utilizadores é 0,979.
Uma análise de regressão simples mostra que, por cada utente adicional, um centro de
saúde tende a ter mais 0,625 utilizadores, de forma que as propensões média e marginal
para um utente se tornar um utilizador são praticamente iguais, não dependendo da
escala do centro de saúde.
39/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 8. Relação entre Utilizadores e Utentes
0 50
000
1000
00
1500
00
Util
izad
ores
0 50000 100000 150000 200000 Utentes
Utilizadores vs. Utentes
Dado que existe uma relação simples e estável entre utilizadores e utentes, a
análise dos custos médios por utilizador mostra que o comportamento destes custos é
muito semelhante ao dos custos por utentes.
Figura 9. Custos por Utilizador
0 20
0 40
0 60
0 80
0 C
usto
s
0 20000 40000 60000 80000 100000 120000 Utilizador
Custos Médios por Utilizador
40/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A Figura 9 mostra a relação entre custo médio por utilizador e volume de
actividade medido pelo número de utilizadores. Este gráfico é qualitativamente
sobreponível ao gráfico correspondente para utentes, apresentado na Figura 4.
O Quadro 8 evidencia alguns dos componentes mais relevantes do custo médio
por utilizador, em simetria com a decomposição anteriormente apresentada no Quadro
5.
Quadro 8. Custos Médios por Utilizador nos Centros de Saúde,
Ponderado pelo Número de Utilizadores
Correlação c/ Custos por Utilizador, N=335 Média Desvio Padrão CV Utilizadores
(1) (2) (3) (3)/(2)=(4) (5)
Custo Total 337,25 81,83 24,3% -0,476
Vencimentos Médicos 54,15 16,26 30,0% -0,419
Custos com MCDT 63,74 14,77 23,2% 0,128
Custos com Medicamentos 131,36 33,43 25,4% -0,417
Correlações com número de consultas são estatisticamente significativas (p<0,02)
Uma conclusão que retiramos desta análise é que não é qualitativamente
diferente estudar a economia dos centros de saúde usando os “utentes” ou os
“utilizadores” como unidade de medida da produção. Dado que a unidade “utentes” está
mais ligada ao processo de planeamento em saúde e, em particular, dado que as listas de
utentes são uma componente importante das candidaturas às USF, a análise irá
claramente privilegiar este conceito. Esta opção assenta no facto de se assumir que tal
não implica nenhuma perda ou distorção importante da informação disponível.
4. 4 Relação entre Custos Médios e Número de Consultas
A Figura 10 mostra a relação entre custos totais de um centro de saúde e o
número de consultas. Tal como nos casos anteriores, a relação é positiva e
estatisticamente forte, com um coeficiente de correlação de 0,957 (p<0,001).
41/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 10. Custos e Consultas Totais 0
1000
0000
20
0000
00
3000
0000
C
usto
s
0 100000 200000 300000 400000 500000 600000 Consultas
Custos Totais vs. Consultas
O Quadro 9 destina-se a servir de referência para utilização futura e relaciona as
medidas de produção “Utentes” e “Utilizadores” com o número de consultas.
Quadro 9. Consultas por Utente e por Utilizador
Dados Ponderados
N=335 Média Desvio Padrão CV Correlação c/ Utilizadores (1) (2) (3) (3)/(2)=(4) (5)
Consultas por Utente 3,16 0,92 29,1% -0,482 Consultas por Utilizador 4,92 1,04 21,1% -0,450
Correlações com número de utentes ou utilizadores significativas (p<0,001)
A Figura 11 adiciona alguma informação ao quadro anterior e mostra a relação
entre as consultas médias por utente e por utilizador com o número de utentes ou de
utilizadores dos centros de saúde: centros de saúde de pequena dimensão tendem a ter
um maior número de consultas por utentes ou por utilizador. O coeficiente de correlação
é 0,69 e estatisticamente significativo (p<0,001).
42/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 11. Utentes, Utilizadores e Consultas
Consultas per capita
Consultas por Utente Consultas por Utilizador
Co
nsu
ltas
05
10
Co
nsu
ltas
0 5
10
0 50000 100000 150000 200000 0 50000 100000 150000 200000 Utente Utilizador
Por sua vez, a Figura 12 comprova que centros de saúde com maior número de
consultas por utente tendem a ter custos anuais por utente mais elevados.
Figura 12 Custos e Consultas por Utente
Custos Médios e Consultas por Utente
Cus
tos
0 20
0 40
0 60
0 80
0
1 2 3 4 5 6 7 Consultas
43/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
O facto de os centros de saúde maiores terem, por um lado, custos por utente
mais baixos mas, por outro, terem igualmente um menor número de consultas por utente
poderia levar-nos a crer à primeira vista que, na realidade, não existem economias de
escala, resultando os menores custos unitários dos centros de saúde maiores apenas do
facto de prestarem menos cuidados per capita. No entanto, uma vez que as consultas
por utente explicam apenas metade da variabilidade dos custos por utente, será de
esperar que outras variáveis tenham um papel explicativo relevante. Como se pode ver
na Figura 13, a qual exibe uma relação negativa entre custos médios por consulta e
número de consultas18, o factor escala é relevante para o custo por consulta, pelo que se
pode concluír que há uma relação entre escala e custo que passa por causas para além da
redução dos cuidados per capita referida anteriormente.
Figura 13 Custos por Consulta
0 50
10
0 15
0 C
usto
s
0 100000 200000 300000 400000 500000 600000 Consultas
Custo por Consulta vs Consultas
18 O coeficiente de correlação é -0,184 (com p<0,001).
44/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES A análise multivariada, que apresentaremos mais adiante, provará a importância
do factor escala, já que apesar de introduzirmos como variável de controlo o número de
consultas per capita, a variável escala continua a ser relevante na explicação dos custos
por utente.
Figura 14. Custos por Consulta: Componentes
Componentes do Custo por Consulta
Custos Médicos por Consulta
Cus
tos
Cus
tos
Cus
tos
0 10
20
30
0
20
40
60
5 10
1520
25
0 200000 400000 600000 Consultas
Medicamentos por Consulta
0 200000 400000 600000 Consultas
MCDTs por Consulta
0 200000 400000 600000 Consultas
45/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Em paralelo com as Figura 5 e 6, apresentamos na Figura 14 os gráficos com os
componentes do custo por consulta e a sua relação com o número de consultas.
À semelhança do que obtivemos para o caso dos custos por utente as imagens
sugerem economias de escala nos custos com medicamentos e com vencimentos
médicos, mas uma ausência de economias de escala (talvez até mesmo a presença de
deseconomias de escala) nos custos com MCDT.
46/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
5. Funções Custo por Utente e o RRE
5.1. Análise exploratória
A análise econométrica que se segue tem como objectivo identificar o efeito do
Regime Remuneratório Experimental (RRE) em medidas de custo e de produção dos
centros de saúde. Nesta secção iremos centrar-nos no custo médio por utente.
A análise descritiva vista anteriormente salientou a importância do volume de
actividade na determinação dos custos médios, e por essa razão uma das variáveis de
controlo na análise será sempre uma medida de escala ou, neste caso, uma medida
inversa da escala. O resultado da estimação19 de um modelo exploratório muito simples
pode ser visto no Quadro 10. A variável explicada é o custo médio anual por utente. Os
coeficientes são directamente interpretáveis em euros.
Quadro 10. Modelo Exploratório - Custos dos Centros de Saúde e RRE
Custos por Utente Coeficiente Erro Padrão
P>t
10000· ( Utentes) -½
Indicador de Unidades em RRE Indicador de CS incluindo RRE Constante
1,797 -92,80 -3,69 124,5
0,097 11,54 7,39 5,15
0,000 0,000 0,618 0,000
N = 335 ; R2 = 0,5094 ; Prob > F = 0,0000
O principal resultado provisório obtido nesta exploração indica que uma unidade
em RRE tem um custo por utente €92,8 mais baixo que um centro de saúde
convencional semelhante. Os dados em que este resultado se baseia dizem respeito à
ARS Norte, onde as unidades em RRE foram tratadas como centro de custos e por
conseguinte originaram informação contabilística e estatística autónoma. Um outro
resultado respeitante às ARS de Lisboa e Vale do Tejo (LVT) e do Alentejo, é que um
centro de saúde em que uma sub-unidade ou uma extensão estejam a funcionar em RRE
19 Todas as equações nesta secção foram estimada por mínimos quadrados utilizando como ponderador o número de utentes em cada centro de saúde. Dada a presença de heteroescedasticidade os resultados são sempre apresentados com erros padrão robustos.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
(mas para a qual não temos contabilidade autónoma), apresentava indícios de ter um
custo por utente mais baixo sendo que, no entanto, esta diferença não era
estatisticamente significativa. Como as sub-unidades em RRE são pequenas e podem
estar inseridas em centros de saúde de dimensões muito superiores, a ausência de efeito
estimado não é surpreendente dado que, mesmo que tal efeito exista, ele estará
atenuado.20
A Figura 15 ilustra os resultados – a linha superior representa a estimativa dos
custos médios por utente para várias dimensões dos centros de saúde, e a linha inferior
apresenta as estimativas para esses custos nas unidades em RRE. Apesar das RRE
serem pequenas e por conseguinte não beneficiarem de economias de escala, os custos
médios são inferiores quer aos dos centros de saúde de dimensão semelhante, quer aos
dos centros de saúde de dimensão superior.
Figura 15. Função Custos Médios por Utente
0 20
0 40
0 60
0 80
0 C
usto
s
0 50000 100000 150000 200000 Utentes
Custos Médios por Utente
20 Alternativamente, poderíamos supor os RRE têm efeitos só no Norte. Esta interpretação ad hoc não parece razoável pelo que prosseguiremos a análise assumindo que os efeitos medidos com base nos dados da ARS Norte são representativos de todo o Continente.
48/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
5.2 Estimativa da Função Custos Médios por Utente
A análise anterior pode ser considerada exploratória, uma vez que não incluía
variáveis de controlo por vários factores que afectam os custos de um centro de saúde.
Para além da escala, sabemos que as características da população abrangida, o nível de
acesso aos cuidados e a sua qualidade afectam potencialmente os custos, pelo que é
necessário considerar os seguintes aspectos21:
• o perfil demográfico da população, já que isso permite indirectamente ter em
conta as necessidades de cuidados de saúde. Tal é capturado, na medida do
possível, pelas variáveis “percentagem da população com menos de 18 anos” e
“percentagem da população com 65 anos ou mais”.
• as características do acesso aos cuidados primários. Esta dimensão é
representada por duas variáveis: a primeira é a “percentagem de utilizadores”,
ou seja, a percentagem de inscritos num centro de saúde que teve pelo menos
uma consulta num dado ano; a segunda, uma dimensão negativa, é a
“percentagem dos inscritos sem médico de família”.
• a intensidade no consumo de cuidados, medida pelo número de “consultas por
utilizador”.
• a qualidade organizacional na prestação dos cuidados de saúde, representada
negativamente pela “proporção de consultas marcadas mas não realizadas”.22
As estatísticas descritivas destas variáveis de controlo são apresentadas no Quadro
11.
21 As variáveis usadas baseiam-se na informação disponível nos Tableaux de Bord, com excepção das demográficas, que foram coligidas a partir de outras fontes. 22 As consultas podem ter sido canceladas pelo próprio centro de saúde – e nesse caso é uma situação negativa, ou pelo utente – nesse caso, pode dever-se a características populacionais ou à incapacidade do centro de saúde de adequar os horários das consultas às necessidades dos doentes – e neste último caso, é também uma situação negativa.
49/91
Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 11. Estatísticas Descritivas das Variáveis Explicativas
Variáveis
Indicador de Unidades em RRE 335 0,027 0,162 0 1 Indicador de CS incluindo RRE 335 0,027 0,162 0 1 10000· ( Utentes) -½ 335 77,14 36,49 23,20 234,79 Percentagem de Utilizadores 335 68,02 10,06 42,08 99,98 Consultas por Utilizador 335 5,46 1,26 3,23 9,34 % Utentes sem Médico de Família 333 7,30 9,14 0 47,76 % Consultas marcadas não realizadas 334 11,74 6,19 0,00 47,42 % Utentes com 18 anos ou menos 335 19,15 3,39 0,15 28,00 % Utentes com 65 anos ou mais 335 21,24 6,94 0,28 42,7
Desvio N Média Min Max Padrão
Além desta variáveis de controlo, é necessário ter em conta os aspectos regionais
de enquadramento dos centros de saúde. As razões para isso são várias, podendo ser
invocada uma literatura vasta sobre variações regionais na prática clínica23. No entanto,
a razão mais importante é pragmática: a análise dos dados de base tornou evidente que
as diferentes Sub-Regiões de Saúde podem seguir critérios contabilísticos diferentes na
alocação de custos e reportam dados sobre despesas com medicamentos e MCDT com
calendarizações heterogéneas, pelo que é mais prudente que a análise econométrica
tenha a flexibilidade para acomodar tais especificidades sem que isso contamine as
estimativas dos principais parâmetros de interesse.24
Os resultados da estimação econométrica são apresentados no Quadro 12. A
variação explicada é globalmente significativa e apresenta ganhos face ao modelo
exploratório. O principal resultado, dados os nosso objectivos, é a estimativa de um
custo por utente inferior em €104 nas unidades em RRE face a centros de saúde
equivalentes em todos os demais aspectos considerados. Ou seja, uma análise mais
cuidada e usando mais informação ampliou ligeiramente a estimativa da vantagem, em
termos de custos, do Regime Remuneratório Experimental. No entanto, a estimativa é
muito pouco precisa, já que o intervalo com 95% de confiança é muito amplo, entre €
9.60 e €-197.92. Nos centros de saúde nas ARS de LVT e do Alentejo incluindo sub
23 Para uma breve recensão de tais questões veja-se por exemplo o manual de Folland, Goodman e Stano, “The Economics of Health and Health Care” (2004), pp.215-222. 24 Para além de uma variável indicador por Sub-Região de Saúde, as regressões utilizaram métodos de inferência robustos com clusters definidos ao nível das sub-regiões.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
unidades em RRE, há indícios ténues de uma pequena vantagem nos custos, mas nestes
casos o efeito não é estatisticamente significativo.
Quadro 12. Estimativa da Função Custo por Utente dos Centros de Saúde
Custos por Utente Coeficiente Erro
Padrão (Robusto)
P>t
Indicador de Unidades em RRE Indicador de CS que incluem RRE 10000· ( Utentes) -½
Percentagem de Utilizadores Consultas por Utilizador % Utentes sem Médico de Família % Consultas marcadas não realizadas % Utentes com 18 anos ou menos % Utentes com 65 anos ou mais
-103,76 -4,87
0,6397 1,85
25,17 -0,32 -0,15 -2,31 1,82
44,629 5,684 0,125 0,361 3,673 0,213 0,245 0,754 0,709
0,033 0,404 0,000 0,000 0,000 0,150 0,550 0,007 0,020
00 ULS Matosinhos 01 SRS Braga 02 SRS Bragança 03 SRS Porto 04 SRS Viana do Castelo 05 SRS Vila Real 06 SRS Aveiro 07 SRS Castelo Branco 08 SRS Coimbra 09 SRS Guarda 10 SRS Leiria 11 SRS Viseu 12 SRS Lisboa 13 SRS Santarém 14 SRS Setúbal 15 SRS Beja 16 SRS Évora Constante
149,0545,07 33,60 50,93 55,68 35,35 17,79 71,10 11,86 79,22 69,21 10,25 55,37 13,14 57,01 36,20 26,73
-82,32191
13,966 11,989 4,599
10,503 6,931 4,273
10,873 9,237 6,071 3,637 8,756 5,932 7,790 5,725 6,828 2,168 2,655
30,5904
0,000 0,002 0,000 0,000 0,000 0,000 0,120 0,000 0,067 0,000 0,000 0,102 0,000 0,035 0,000 0,000 0,000 0,015
N = 332 ; R2 = 0,8025
Os resultados indicam também que um aumento da percentagem dos utentes que
é utilizadora ou um aumento da proporção da população idosa aumentam os custos em
montantes pequenos, mas ainda assim estatisticamente significativos. Por cada ponto
percentual de aumento da quota da população idosa o custo por utente aumenta €1,8. Já
em termos da intensidade de consumos a variável consultas por utilizador tem um
impacto maior, positivo e estatisticamente significativo nos custos: cada consulta
adicional leva a um aumento médio dos custos anuais por utente de €25.
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Os resultados são consistentes com a ideia generalizada de que um centro de
saúde com uma população coberta mais jovem tem custos menores, uma vez que cada
ponto de aumento na percentagem dos jovens reduz em €2,3 os custos por utente25. Os
resultados indiciam também que um centro de saúde com pior acesso (medido pela
percentagem de utentes sem médico de família) e qualidade organizacional (medida
pela percentagem de consultas marcadas não realizadas) terá eventualmente custos mais
baixos, mas os montantes estimados para tais efeitos são económica e estatisticamente
sem significado.26
As estimativas confirmam o impacto das economias de escala identificado na
análise anterior.
Por último, os coeficientes das Sub-Regiões de Saúde permitem quantificar uma
substancial heterogeneidade regional nos custos27. Aqui, todos os coeficientes devem
ser vistos como o acréscimo de custo médios por utente face à SRS de base - Portalegre
- escolhida para tal por apresentar os custos por utente mais baixos. O caso da ULS de
Matosinhos faz-se notar pelo elevado valor do coeficiente do acréscimo de custo por
utente, pelo que lhe dedicamos uma “caixa” neste relatório.
Em conclusão, os RRE têm um custo anual por utente inferior em €93 quando
os indicadores de qualidade e acesso não são tidos em conta, e em €104 quando os
indicadores de qualidade são considerados. Assume-se implicitamente que o seu valor é
pelo menos igual aos custos imputados pela regressão.
25 É interessante contrastar este resultado com o facto de o RRE atribuir um peso de 1.5 a utentes de idade até aos 4 anos. Infelizmente, não foi possível ter dados separando os jovens em dois grupos etários, até aos 4 e mais de 4, pelo que não pudemos estimar separadamente os efeitos de cada grupo nos custos. 26 Uma ideia sugerida em contactos com a Dra. Lúcia Barbosa, da ARS Norte, é que uma maior percentagem de utentes sem médico de família pode gerar dois efeitos contraditórios. Por um lado, o pior acesso pode traduzir-se num menor consumo de serviços e logo em menores custos. Por outro lado, quando a população a descoberto é atendida no chamado atendimento complementar, em que os médicos desconhecem os doentes, há necessariamente uma prática médica menos programada e mais defensiva, o que pode contribuir para aumentar os custos. Os dois efeitos cancelam-se e isso pode explicar a falta de significância estatística da variável na regressão. Note-se que os efeitos de spill over de utentes sem médico de família em princípio fazem-se sentir mais a jusante, nos cuidados hospitalares, o que não se reflecte nos nossos dados já que os cuidados de base hospitalar estão fora do âmbito da nossa análise. 27 Em todas as regressões com coeficientes regionais, um teste de F mostra que o conjunto dos coeficientes é estatisticamente significativo, sempre com p<0,001.
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Note-se que a interpretação dos resultados levanta uma questão de custo-
benefício já que não sabemos qual o benefício correspondente a um determinado
impacto no custo de uma variável de qualidade, acesso ou necessidade, podendo o
primeiro ser inferior, igual ou superior ao segundo. Esta questão é importante porque,
como vimos, ao adicionarmos tais variáveis à regressão explicativa dos custos médios
por utente, a estimativa do efeito RRE aumenta de €93 para €104. Ora, se a título de
exemplo um decisor considerar que uma consulta adicional vale – em termos de
benefícios - menos de €25 por utente, ou que o aumento em 1% da proporção de idosos
requer serviços cujos benefícios são inferiores a €1,8 por utente, então, posto perante
estes dados, tal decisor deve atribuir um benefício diferencial às RRE inferior à
poupança de €104 por utente. No entanto, na prática é de presumir que esta questão seja
irrelevante.
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CAIXA 1 O Caso da ULS de Matosinhos
A Unidade Local de Saúde (ULS) de Matosinhos, criada em 9 de Junho de 1999, é uma entidade pública empresarial, sendo dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial. Integra o Hospital Pedro Hispano, o Centro de Diagnóstico Pneumológico, a Unidade de Saúde Pública e os Centros de Saúde de Matosinhos, Senhora da Hora, São Mamede de Infesta e Leça da Palmeira
O entendimento, à época, era que o centro de saúde devia servir de porta de entrada no sistema, sendo o médico de família o responsável pela gestão global dos cuidados, e havendo referenciação para o hospital apenas em casos em que o centro de saúde não fosse capaz de responder às necessidades do doente. Isto era tanto mais importante quanto é sabido que os custos envolvidos em tratar - com a mesma qualidade - um mesmo doente num centro de saúde são, regra geral, significativamente mais baixos do que fazê-lo num hospital, devido essencialmente ao peso da estrutura física e humana em que este assenta. Por outro lado, a integração dos dois níveis de cuidados permitiria ainda uma mais eficiente circulação de informação, evitando perdas de tempo e repetições de exames, e aumentando a rapidez no tratamento.
Actualmente, o Centro de Saúde de Matosinhos é composto por três Unidades de Saúde Familiar (USF): Atlântida, Horizonte e Oceanos, tendo também os Centros de Saúde da Senhora da Hora e de São Mamede de Infesta passado a ser constituídos por um conjunto de USF. No entanto, no período em análise e até à recente aprovação das primeiras candidaturas à criação de USF, o Centro de Saúde de Matosinhos era composto por uma sede e duas unidades em Regime Remuneratório Experimental, enquanto os restantes três centros de saúde funcionavam no modelo tradicional, ainda que também integrados na ULS de Matosinhos.
Nesta curta análise, tentaremos contrapor dados da ULS com os da ARS Norte, e do Centro de Saúde de Matosinhos – pelo facto de integrar unidades em RRE – com os do conjunto de centros de saúde da ULS e da ARS.
Em termos de percentagem de utilizadores, o Centro de Saúde de Matosinhos tem, para 2005, 11% e 5% mais utentes “activos” do que a média dos centros de saúde da ARS Norte, e a média dos centros de saúde integrados na ULS, respectivamente, sendo que os centros de saúde a funcionar em RRE apresentam as mais elevadas taxas de utilização. Como um todo, os centros de saúde da ULS apresentam um valor superior em 5% face à média da ARS.
Quanto ao número de consultas por utente e por utilizador, o Centro de Saúde de Matosinhos apresenta valores superiores, respectivamente, em 25% e 19% face à média da ULS, e em 32% e 19% face à média da ARS. Os valores da ULS e da ARS são idênticos.
Relativamente ao custo total por utente, o Centro de Saúde de Matosinhos gasta 16% mais do que a média da ULS, e 69% mais do que a média da ARS. Repetindo a análise por utilizador, o Centro de Saúde tem um custo superior em 10% face à média da ULS, e em 53% face à média da ARS Norte. Convém aqui frisar que o conjunto dos
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centros de saúde integrados na ULS de Matosinhos gasta, por utente e por utilizador, respectivamente, mais 46% e 39% do que a média da ARS.
Decompondo os custos, obtém-se que os custos com MCDT, por utente e por utilizador, são mais baixos em 30% no Centro de Saúde de Matosinhos do que na média da ARS. No entanto, os centros de saúde tradicionais da ULS apresentam valores substancialmente superiores pelo que os centros de saúde da ULS, como um todo, gastam mais 20% e 14% com MCDT, por utente e por utilizador, do que a média da ARS.
Quanto aos custos com medicamentos, por utente e por utilizador, as unidades em RRE gastam menos de metade do que a média da ARS. Já os restantes centros de saúde da ULS e, em particular, a sede do Centro de Saúde de Matosinhos, apresentam valores superiores à média regional, pelo que os centros de saúde da ULS como um todo gastam mais 23% e 17% com medicamentos, por utente e por utilizador, do que a média da ARS.
Em termos de custo total por consulta, o Centro de Saúde de Matosinhos apresenta um valor superior em 29% face à média da ARS Norte. Os centros de saúde da ULS de Matosinhos gastam mais 39% por consulta do que a média da ARS. Decompondo mais uma vez este custo, temos que o Centro de Saúde gasta, em medicamentos por consulta um valor idêntico ao da ARS, mas gasta apenas metade em MCDT do que a média regional.
Parece inequívoco que os centros de saúde integrados na ULS de Matosinhos apresentam uma taxa de utilização e um número de consultas (por utente, e por utilizador) substancialmente superiores aos dos restantes centros de saúde da ARS Norte. No entanto, tal é conseguido à custa de uma significativa diferença nos custos, pelo que convém perceber se tal diferença pode ser justificada.
À partida, dado que um dos objectivos por detrás da criação da ULS era precisamente evitar que casos que pudessem ser tratados nos centros de saúde fossem enviados para o Hospital Pedro Hispano, seria razoável esperar estes resultados. Resta saber se este nível de custos dos cuidados primários tem algum reflexo directo numa descida dos custos com cuidados hospitalares, pelo que seria interessante analisar esta questão no futuro. Por outro lado, haveria que aferir se estes custos são compensados por significativos ganhos em saúde ou por melhorias dos níveis de qualidade dos serviços prestados nos centros de saúde. À falta desta análise adicional, fora do âmbito do Estudo, torna-se difícil avaliar a experiência que tem sido a Unidade Local de Saúde de Matosinhos. No entanto, os dados são claros ao mostrar uma vantagem substancial dos custos médios das unidades em RRE face à Sede, à ULS como um todo, e à ARS Norte.
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5.3 Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos
Os termos de referência especificam que o Estudo deve referir o “custo/ano por
utente”, considerando o consumo de Meios Complementares de Diagnóstico e
Terapêutica e de Medicamentos. Nesta secção, refaz-se a análise econométrica dos
custos, decompondo-os em custos com médicos, enfermeiros, administrativos e
dirigentes, meios complementares de diagnóstico, medicamentos e outros custos.
Um problema que se coloca é que, enquanto as RRE são extensões ou sub
unidades dos centros de saúde, estes últimos assumem algumas funções “centrais”, os
chamados serviços comuns, suportando os respectivos custos, pelo que uma
comparação directa de custos por utente pode não ser totalmente legítima. Uma forma
de ultrapassar o problema é decompor os custos por vários tipos, aos quais estão
associados funções equivalentes, quer nos centros de saúde quer nas unidades em RRE.
O Quadro 13 resume os resultados. Para cada tipo de custo foi estimada uma
regressão semelhante à do Quadro 12. De cada uma dessas regressões, retirou-se o
coeficiente estimado para o efeito do RRE no custo por utente, e a sua significância
estatística. Por ser uma questão de interesse na análise económica, retirou-se igualmente
informação sobre economias de escala, sinalizadas pela significância estatística da
variável relevante.
A análise das regressões para os vários custos parciais revela que, com excepção
dos custos com médicos, os centros de saúde em RRE têm custos mais baixos em todas
as áreas. Adoptando um nível de confiança de 90%, o que é razoável face ao número
reduzido de RRE, todas as diferenças são estatisticamente significativas, com excepção
dos custos com MCDT.
Por forma a ultrapassar o problema dos custos das funções “centrais” dos centros
de saúde que não estão garantidas pelas unidades em RRE, é razoável usar uma medida
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
de custos por utente restrita, que não inclui os “Custos administrativos e com
dirigentes” e os “Outros custos” 28.
Quadro 13. Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos
Tipo de Custos Por Utente
(1)
Vantagem RRE Estimada
(2)
Em % do total
(3) P>t (4)
Economias de Escala
(5) Médicos 5,63 -5,43% 0,017
Enfermeiros -9,46 9,12% 0,000
Administrativos/Dirigentes -13,57 13,08% 0,000
MCDT -15,61 15,04% 0,153
Medicamentos -38,39 37,00% 0,090
Outros -31,45 30,31% 0,078
Totais -103,76 100,00% 0,033
Não Sim Sim Não Não Sim Sim
Nota: Vantagem corresponde à diferença de custos 29, 30 por utente imputável ao estatuto de RRE. Um número negativo corresponde a uma redução de custos. Existem “economias de escala” se a variável de escala for estatisticamente significativa na regressão para cada tipo de custos.
Naturalmente, dado o seu nível de agregação, alguns dos custos assim excluídos
não o deveriam ser, podendo no entanto os resultados assim obtidos ser interpretados
como um limite inferior à diferença de custos por utente que as RRE conseguem obter.
28 A linha separadora entre os serviços comuns e funções “centrais” e as funções desempenhadas nas subunidades como aquelas em que o RRE funciona é relativamente complexa. As RRE dispõem de pessoal administrativo, que tem como funções primordiais o contacto com os utentes e outras directamente ligadas à actividade de prestação de cuidados. Nos centros de saúde, para além destas funções, os administrativos fazem a gestão dos fundos de maneio, a colecta de dados para estatísticas, lidam com casos particulares do ponto de vista administrativo (ex: imigrantes), etc. Além destes, a rubrica “custos administrativos” inclui os vencimentos de profissionais que só operam ao nível do centros de saúde, como é o caso de psicólogos, assistentes sociais, nutricionistas, etc. Por último, só os centros de saúde têm auxiliares (telefonistas, motoristas, auxiliares de limpeza, etc). Em resumo, apesar do grosso dos encargos administrativos e de “outros custos” serem só dos centros de saúde, as unidades em RRE também têm custos administrativos a considerar. Atribuir a totalidade da diferença em custos administrativos ao custo dos serviços centrais é sobrestimar o custos destes serviços, alguma da diferença poderá ser uma vantagem genuína das unidades em RRE. Por outro lado, há alguns custos com vencimentos médicos que são apenas dos centros de saúde (saúde pública, especialistas, etc.). Agradecemos à Dra. Lúcia Barbosa ajuda na análise destas questões. Ao incluir todos os vencimentos médicos como custos das RRE, subestimamos os custos com os serviços centrais. A divisão usada na análise será imperfeita, mas é de esperar que alguns dos erros por excesso estimando os custos com serviços centrais cancelem erros por defeito. 29 Fez-se uma regressão para cada classe de custos e reporta-se o coeficiente do indicador RRE.
Há uma questão técnica que se revela aqui de alguma importância. Recorde-se que a metodologia estatística utilizada visou explicitamente adaptar-se à heterogeneidade da informação disponível nas diferentes SRS, através do uso de clusters. Como já foi referido, as despesas em medicamentos e MCDT são das áreas de análise mais problemáticas devido aos atrasos na facturação e à assimetria nas várias SRS. Por essa razão, podendo a informação sobre estas despesas ser muito “ruidosa”, é de esperar que encontremos níveis de significância estatística muito pequenos, mesmo quando no mundo real gerador dos dados haja um efeito quantitativamente importante.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Nesta perspectiva conservadora, os RRE apresentam, ainda assim, custos por utente
inferiores com um coeficiente de vantagem estimado de €59. Com os standards
assumidos, esta diferença é estatisticamente significativa (p=0,079).
Convém recordar que estes standards em termos de significância estatística, caso
mais informação sobre as unidades em RRE estivesse disponível, deveriam ser mais
exigentes. O Anexo contém estimativas produzidas por uma metodologia diferente. Tais
estimativas são quantitativamente menores, mas estatisticamente significativas.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
6. Utilização, Custos e RRE
A diferença entre os custos das unidades em RRE e as restantes pode ser
explicada por vários factores. Para além de questões organizacionais e de produtividade,
poderia dar-se o caso das unidades em RRE pouparem custos através de uma redução da
oferta de cuidados. No entanto, como demonstraremos, não parece ser esse o caso.
Uma primeira indicação está no facto da regressão explicativa dos custos por
utente (Quadro 12) controlar pelo número de consultas por utilizador, pelo que
diferenças nesta variável não podem ser a fonte do efeito estimado do RRE. Por outro
lado, é revelador analisar as diferenças entre as estratégias de prestação de cuidados das
unidades em RRE e as convencionais. O Anexo contém a análise estatística que
demonstra os seguintes factos:
• Não há diferenças – controlando pelos factores adicionais - nas consultas
por utente entre os centros de saúde convencionais e as unidades
semelhantes em RRE.
• A percentagem de utilizadores dos centros de saúde em RRE é 5,8%
superior à dos centros de saúde convencionais equivalentes. Esta diferença
é estatisticamente significativa. Recorde-se que a média ponderada da taxa
de utilização é 64%.
• As consultas anuais por utilizador são inferiores em 0,4 nas unidades em
RRE, face aos centros de saúde convencionais equivalentes. A média
ponderada é de aproximadamente 4,9 por ano.
De forma algo simplista, podemos dizer que estes factos mostram que os RRE
adoptam uma estratégia de alargamento da extensão dos cuidados compensada por uma
diminuição da sua intensidade. Uma forma de ver o resultado líquido de tal desempenho
é estimar novamente a função custos, tomando desta vez o utilizador, e não o utente
como até aqui, como unidade de observação.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Os resultados, apresentados no Quadro 14, são qualitativamente muito
semelhantes aos obtidos na regressão para os custos por utente, pelo que não repetimos
aqui a sua interpretação.
Quadro 14. Estimativa da Função Custo por Utilizador dos Centros de Saúde
Custos por Utilizador Coeficiente Erro
Padrão (Robusto)
P>t
Indicador de Unidade em RRE Indicador de CS incluindo RRE 10000· ( Utilizadores) -½
Consultas por Utilizador % Utentes sem Médico de Família % Consultas marcadas não realizadas % Utentes com 18 anos ou menos % Utentes com 65 anos ou mais
-148,08 -11,51 0,668 36,68 -0,13 0,36
-5,14 2,25
64,85 8,04 0,16 5,54 0,38 0,46 1,44 0,89
0,036 0,171 0,001 0,000 0,748 0,444 0,002
0,02 00 ULS Matosinhos 01 SRS Braga 02 SRS Bragança 03 SRS Porto 04 SRS Viana do Castelo 05 SRS Vila Real 06 SRS Aveiro 07 SRS Castelo Branco 08 SRS Coimbra 09 SRS Guarda 10 SRS Leiria 11 SRS Viseu 12 SRS Lisboa 13 SRS Santarém 14 SRS Setúbal 15 SRS Beja 16 SRS Évora Constante
221,8872,45 60,82 83,30 79,01 65,72 29,32
115,0617,36
124,01104,1119,64
110,0021,36
113,3967,29 60,55 99,78
19,66 15,46
7,38 14,96
8,95 6,73
13,58 14,50
7,79 5,27
12,53 7,56
13,03 8,28
11,08 2,72 3,48
48,40
0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,045 0,000 0,040 0,000 0,000 0,019 0,000 0,019 0,000 0,000 0,000 0,055
N = 332 ; R2 = 0,7318
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
7. Custos, Consultas e RRE
7.1 Estimativa da Função Custos Médios por Consulta
Até aqui, a unidade de produção adoptada foi o número de utentes ou de
utilizadores. Vamos agora adoptar como unidade a consulta – ou, mais rigorosamente, a
agregação das consultas de ambulatório e das consultas de urgência ou em SAP. A
opção por esta medida justifica-se por ser talvez a mais relevante, e a única com
informação nos Tableaux de Bord31 . Por outro lado, é provável que o total de consultas
seja um bom índice agregado do vector das produções dos centros de saúde.
Quadro 15. Modelo Exploratório – Custo Médio das Consultas
Custos por Consulta Coeficiente Erro Padrão
P>t
Indicador-Unidade RRE (Norte) Indicador -CS incluindo RRE LVT, Ale 10000· ( Consultas) -½
Constante
-23,11 1,49
0,2894
60,14
3,51 3,65
0,0588
2,07
0,000 0,683 0,000 0,000
N = 335 R2 = 0,0759
Os resultados de uma análise exploratória podem ser vistos no Quadro 15, onde se
mostra que uma consulta numa unidade em RRE tem um custo médio inferior em €23
face a uma consulta num centro de saúde convencional. Os resultados estão ilustrados
na Figura 16, onde a linha inferior corresponde aos custos por consulta inferiores
gerados nas unidades em RRE.
31 Análises futuras poderão adoptar uma perspectiva de fronteira de produção ou de custos para acomodar os diferentes “ouputs”, à semelhança das metodologias econométricas utilizadas para analisar custos em hospitais. Neste caso, poderão considerar-se separadamente consultas em ambulatório e de urgência, bem como domicílios, internamento nos centros de saúde, consultas de especialidade, inoculações, etc.. Um tema adicional a considerar nestas análises futuras é a influência que a difusão do SAM poderá ter exercido no comportamento de prescrição dos médicos e, por essa via, nos custos.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Figura 16. Função Custos Médios por Consulta
0 50
10
0 15
0 C
usto
s
0 100000 200000 300000 400000 500000 600000 Consultas
Custos Médios por Consulta
Os resultados exploratórios indiciam que há uma vantagem das unidades em RRE,
mas mostram igualmente que existem algumas economias de escala na produção de
consultas. Tal como para os custos por utente, é necessário usar variáveis de controlo
por outros factores, a fim de se extrair dos dados o efeito real do RRE. Isso é feito numa
regressão cujos resultados são apresentados no Quadro 16
Quando se controla para factores adicionais, a redução dos custos dos RRE é
ligeiramente superior à estimativa encontrada com o modelo exploratório, sendo essa
redução de €28 por consulta32, para um custo médio ponderado de cerca de €69 nos
centros de saúde convencionais.
32 Vale a pena usar este caso para ilustrar a vantagem da análise multivariada. A diferença bruta entre o custo médio ponderado por consulta em RRE e em centros de saúde convencionais é de €18, mas este valor subestima o impacto do RRE porque as médias são feitas para centros de saúde com características diferentes em termos de qualidade, necessidade, acesso, etc. A regressão múltipla “corrige” estas diferenças, levando a uma estimativa final do efeito RRE de maior dimensão.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 16. Estimativa da Função Custo por Consulta
Custos por Consulta Coeficiente Erro
Padrão (Robusto)
P>t
Indicador de Unidades em RRE Indicador de CS incluindo RRE 10000· ( Consultas) -½
Percentagem de Utilizadores % Utentes sem Médico de Família % Consultas marcadas não realizadas % Utentes com 18 anos ou menos % Utentes com 65 anos ou mais
-28,02 -2,00 0,253 -0,48 -0,11 0,01
-1,11 0,24
12,89 2,06 0,08 0,09 0,07 0,08 0,31 0,24
0,044 0,344 0,004 0,000 0,157 0,947 0,002 0,326
00 ULS Matosinhos 01 SRS Braga 02 SRS Bragança 03 SRS Porto 04 SRS Viana do Castelo 05 SRS Vila Real 06 SRS Aveiro 07 SRS Castelo Branco 08 SRS Coimbra 09 SRS Guarda 10 SRS Leiria 11 SRS Viseu 12 SRS Lisboa 13 SRS Santarém 14 SRS Setúbal 15 SRS Beja 16 SRS Évora Constante
47,27 14,48 11,73 17,57 16,63 11,08
7,12 24,65 -0,52 21,85 24,44
5,24 20,67
5,09 15,84
6,12 3,98
98,17
3,38 2,34 0,85 2,56 1,58 1,19 2,65 1,06 1,65 0,63 1,77 1,03 2,37 1,64 2,78 0,79 0,79
12,67
0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,016 0,000 0,756 0,000 0,000 0,000 0,000 0,007 0,000 0,000 0,000 0,000
N = 332 ; R2 = 0,6655
Em geral, a natureza dos resultados é semelhante aos encontrados para o custo
por utente. No entanto, a relação entre custos e consultas é mais “ruidosa” do que a
existente entre custos e utentes, pelo que os níveis de significância estatística são mais
baixos. A título de exemplo, a percentagem dos utentes com mais de 65 anos aparenta
não ter um impacto significativo nos custos, ao passo que a percentagem de jovens
continua a ter um efeito negativo significativo no custo por consulta. Um resultado com
algum interesse é o coeficiente negativo da percentagem de utilizadores ou taxa de
utilização. Uma forma de interpretar este resultado é admitir que um dado número de
consultas espalhado por mais utentes gera menos custos do que esse mesmo número de
consultas concentrado em menos utentes.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
No que à heterogeneidade regional diz respeito, observamos que, no caso das
consultas, a Sub-Região de Saúde com os custos unitários mais baixos é Coimbra, pelo
que o respectivo coeficiente indica uma redução relativamente a Portalegre, a SRS de
base33.
7.2 Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos das Consultas
À semelhança da decomposição por tipo de custo apresentada para o efeito RRE
nos custos por utente, apresentamos no Quadro 17 a contribuição do efeito RRE por tipo
de custo nas consultas. Aqui, é razoável assumir que apenas é relevante a contribuição
dos custos com recursos directamente variáveis nas consultas como sejam os
medicamentos, os MCDT e os vencimentos de médicos e enfermeiros.
Quadro 17. Decomposição do Efeito RRE por Tipo de Custos nas Consultas
Tipo de Custos Por Consulta
(1)
Vantagem RRE Estimada
(2)
Em % do total (3)
P>t (4)
Economias de Escala
(5) Médicos Enfermeiros MCDT Medicamentos Totais
1,60 -2,39 -5,05 -9,98 -28,02
-5,7 8,5
18,0 35,6 100
0,021 0,00
0,083 0,105 0,044
Não Sim Não Não Sim
Nota: Ver Quadro 13.
Como seria de esperar, os vencimentos médicos são um factor de aumento do
custo por consulta nas unidades em RRE, havendo uma redução dos custos com os
vencimentos dos enfermeiros, com medicamentos e com MCDT. Um resultado
relevante é que a diferença atribuível aos medicamentos não é estatisticamente
significativa, apesar da sua dimensão. Tal deve-se inteiramente aos factores explicados
nas notas ao Quadro 13. Agregando os custos menos ligados a funções de serviços
33 Para facilitar a leitura e comparação com resultados anteriores, mantivemos Portalegre como a SRS de base, apesar de não ter o custo mais baixo nesta dimensão.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
comuns (custos com médicos, enfermeiros, MCDT e medicamentos) obtemos uma
estimativa da vantagem em termos de custo por consulta para o RRE de €15.81,
com (p= 0,075). No Anexo, estes efeitos do RRE são estimados por uma metodologia
econométrica diferente, sendo os montantes estimados inferiores, mas estatisticamente
significativos.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
8. A Auto-Selecção de Médicos e as Vantagens do RRE
8.1 A Relevância da Auto-Selecção na Avaliação dos RRE
Um problema importante na análise do impacto das RRE é conseguir distinguir
entre efeitos de modificação do desempenho e efeitos de auto-selecção.
Os efeitos de modificação do comportamento dos profissionais são, teoricamente
pelo menos, gerados pelo novo enquadramento e respectivos incentivos individuais e de
grupo. Graças à constituição de um grupo de profissionais com afinidades profissionais
e de partilha de um projecto, e a um esquema remuneratório com incentivos (individuais
e de grupo), será de esperar que os profissionais - em particular os médicos de família -
respondam com maior esforço e empenho, aumentando a sua produtividade e a
qualidade do seu trabalho. A questão empírica é saber a dimensão desta resposta, ou
seja aferir se os ganhos gerados compensam os eventuais custos adicionais dos
incentivos34.
Naturalmente, os efeitos de uma modificação de comportamento referidos
anteriormente podem ocorrer mesmo quando os profissionais de saúde formam um
grupo perfeitamente homogéneo nas suas características profissionais. No entanto,
como qualquer grupo humano, os profissionais de saúde constituem uma população
dentro da qual existe uma heterogeneidade considerável, nomeadamente em termos de
produtividade, e de propensão para gastar na prescrição de medicamentos e MCDT.
Se tivéssemos a certeza dos médicos participantes em experiências de RRE
serem uma amostra representativa da população dos médicos, poderíamos imputar todas
as vantagens estimadas para os RRE à mudança de comportamento gerada pelos
incentivos. No entanto, dada a heterogeneidade existente, há uma outra hipótese teórica,
34 Utilizamos o termo incentivos num sentido lato, incluindo todas as formas de remuneração, desde a pecuniária à satisfação obtida pela integração num grupo profissional com o qual se sente afinidade e onde se tem maior autonomia.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
diametralmente oposta: a ser verdade, o que se detecta não é uma alteração de
comportamento, havendo antes uma concentração de profissionais relativamente mais
produtivos ou com menor propensão para prescrever e gastar em MCDT e
medicamentos nos RRE, enquanto os restantes continuam nos centros de saúde
convencionais. A confirmar-se esta hipótese, os resultados observados na análise
estatística dos dados seriam os mesmos que no caso da mudança de comportamento
custos mais baixos e produtividade mais elevada nos RRE. No entanto, isto seria
conseguido à custa de uma diminuição da produtividade média e de um aumento dos
gastos médios nos restantes centros de saúde não havendo, portanto, ganhos para o
sistema de saúde como um todo.
Resumindo, enquanto os efeitos dos incentivos dizem respeito à modificação do
comportamento dos médicos, os efeitos de auto-selecção dizem respeito a diferenças
nos profissionais que se encontram nos centros de saúde convencionais e nas unidades
em RRE. Só os efeitos atribuíveis à modificação de comportamento podem representar
ganhos reais para o sistema de saúde, mas o tipo de análise estatística que pudemos
realizar não consegue distinguir uns efeitos dos outros. Idealmente, seriam necessários
dados longitudinais, com informação sobre cada médico antes e depois da formação das
RRE, por forma a extrair das eventuais variações de comportamento individual os
efeitos relevantes.
Ainda que não tenha sido possível obter tal informação, foi realizado um
trabalho de aproximação ao que tais dados poderiam revelar. Para tentar obter alguma
informação sobre esta questão, socorremo-nos de dados históricos sobre os médicos nos
centros de saúde da ARS de Lisboa e Vale do Tejo (LVT)35. Foi construída uma base
de dados individuais36 com o número de consultas, a despesa em medicamentos, a
despesa em MCDT e o estatuto remuneratório (35 Horas, 35 Horas com exclusividade
35 A base de dados, cuja construção foi complexa e trabalhosa, deve-se ao esforço eficaz dos Drs. Manuel Schiappa e Carlos Pires da ARS de LVT a quem expressamos os nosso agradecimento.
A base de dados recebida pelos autores deste relatório respeita o anonimato dos médicos, já que a identificação individual é feita através de um código que permite apenas ligar observações de anos diferentes para um mesmo médico. Como referido, a única informação pessoal adicional que dispomos é se o médico integrou uma candidatura a uma USF.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
(CE), 42 horas)37, para os anos de 2002 a 2005. A base indica-nos também se o médico
integrou uma candidatura a uma USF. Não foi possível incluir informação sobre os
vencimentos dos médicos. O Quadro 18 contém alguma informação sobre os dados no
painel.
Quadro 18. Estatísticas Descritivas do Painel de Médicos de LVT
Ano N Média Desvio Padrão
Consultas
2002
2003 2004
2005
1755
1811 1868
1920
4026
3897 3832
3810
1778
1658 1616
1645
Medicamentos ( € )
2002
2003 2004
2005
1897
1946 1991
2049
109892
115651 125667
103838
60504
64642 70507
71413
MCDT ( € )
2002
2003
2004 2005
1892
1941
1992 2038
57296
58712
64855 64875
30332
31403
35114 35110
Os dados foram utilizados de duas formas distintas mas complementares. Na
primeira parte apresentamos as estimativas de um modelo que permite compreender
como as características de cada médico determinam a probabilidade de ele se candidatar
a uma USF.38 Na segunda, medimos as diferenças entre as consultas, despesas em
medicamentos e despesas em MCDT dos médicos que se candidataram e a de outros
médicos com características semelhantes.
37 Para cada centro de saúde e por ano há uma categoria residual de médicos noutros estatutos. Esses dados não foram incluídos na análise apresentada. Note-se também que a base de dados constitui um painel não equilibrado, uma vez que nem todos os médicos têm dados para todos os anos e para todas as variáveis.
Na estimação do “logit” desta secção em cada observação foi considerado o último estatuto remuneratório disponível e a média das consultas, e despesas com medicamentos e MCDT, nos anos com dados disponíveis entre 2002 e 2005.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
8.2 Determinantes da Candidatura a uma USF
A análise desta secção baseia-se numa regressão logística onde se estima para
cada médico a probabilidade de ele se ter candidatado a uma USF com base nos seus
níveis de actividade (consultas, e prescrição de MCDT e medicamentos), na sub-região
onde trabalha, e no seu estatuto remuneratório39, bem como em interacções entre estas
variáveis. Dado que não sabemos se cada médico individualmente está ou não numa
unidade em RRE, incluímos uma variável indicador que nos diz se no seu centro de
saúde existe uma unidade em RRE.
Quadro 19. Determinantes da Probabilidade de Candidatura a uma USF
Variável Efeito Incremental na Probabilidade
P>z
CS com Unidade em RRE* 0,125 0,000
∆Santarém* ∆Setúbal*
0,057 0,114
0,055 0,000
35 H com Exc*
42 H*
-0,079
-0,079
0,000
0,046
Consultas de 35 ∆Consultas de 35 h com Exc ∆Consultas de 42 h
0,045 -0,361 -0,011
0,000 0,255 0,450
Medicamentos de 35 h ∆Medicamentos de 35 h CE
∆Medicamentos de 42 h
-0,002 0,006
0,002
0,000 0,150
0,000
MCDT de 35 ∆MCDT de 35 h CE ∆MCDT de 42 h
0,001 0,010 -0,001
0,147 0,206 0,040
N= 1956; 11,66% Positivos; Pseudo R2 = 0,1477
Nota: A base corresponde a um médico de Lisboa, no regime das 35 horas de tempo completo que não está no RRE. O símbolo ∆ refere-se a um acréscimo por comparação com a situação de base. Consultas, medicamentos e MCDT estão em unidades de milhares e milhares de euros, respectivamente.
39 Na ARS de LVT, cerca de 40% dos médicos dos centros de saúde estão no regime das 35 horas de tempo completo, 2% nas 35 horas com dedicação exclusiva e os restantes 58% no regime das 42 horas.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Dos 1956 médicos para os quais havia dados, 11,66% (228) candidataram-se a
integrar uma RRE. Para estudar a variação em torno desta média estimou-se um
modelo de regressão logística, a partir do qual se chegou aos resultados no Quadro 19.40
Tomando como base um médico de Lisboa no regime de 35 horas de tempo
completo, e que trabalha num centro de saúde sem RRE, as seguintes alterações nas
suas características têm o seguinte impacto parcial (mantendo tudo o mais constante) na
probabilidade de candidatura:
• O principal determinante positivo é o médico pertencer a um centro de saúde
onde funciona uma unidade em RRE, sendo o seu efeito de 12,5%. Como os
médicos já envolvidos num RRE não se candidatam a esta fase das USF, esta
estimativa pode resultar de um possível efeito de “contágio” de outros
médicos no mesmo centro de saúde 41.
• Médicos das Sub-Região de Saúde de Santarém, e sobretudo de Setúbal, são
mais propensos a candidatar-se.
• Médicos em regime de 35 horas com exclusividade e de 42 horas são menos
propensos a candidatar-se.
• Para médicos em 35 horas de tempo completo e 42 horas, mais consultas
aumentam a probabilidade de candidatura. Cada 1000 consultas anuais
adicionais aumentam essa probabilidade em cerca de 4%.
• Para médicos em 35 horas de tempo completo, maiores gastos em
medicamentos estão associados a menor propensão a candidatar-se a uma
USF. Para os outros médicos, variações na despesa em medicamentos não
parecem ter efeitos estatística ou economicamente significativos na
probabilidade de candidatura.
• Não existe uma relação significativa entre gastos anuais em MCDT e a
propensão de um médico para se candidatar a uma USF.
A conclusão que se pode retirar é que, para uma maior propensão de um médico
para se candidatar a um USF contribuem a) o facto de pertencer a um centro de saúde
40 Dado que se trata de um modelo não linear, não é legítimo adicionar os efeitos parciais que se referemde seguida. 41 Em números brutos estes centros de saúde têm 10% dos médicos de LVT. No entanto 30% dos seusefectivos candidataram-se, fornecendo 28% de todos os candidatos a USF na ARS de LVT.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
onde já há um RRE, b) não trabalhar na SRS de Lisboa, c) estar no regime das 35 horas
de tempo completo e d) fazer mais consultas do que a média. As despesas em MCDT
não se apresentam como características relevantes no sentido de influenciarem a
referida propensão, e as despesas em medicamentos apenas são relevantes,
negativamente, para médicos no regime das 35 horas de tempo completo.
Estes resultados confirmam a existência de uma auto-selecção, em particular no
que diz respeito ao número de consultas, já que são os médicos que fazem mais
consultas do que os colegas em circunstâncias iguais que tendem a candidatar-se.
8.3 Caracterização Quantitativa dos Candidatos a uma USF
Nesta secção, tentamos estimar as diferenças médias entre os indicadores dos
médicos que se candidataram às USF e os dos médicos que continuarão nos centros de
saúde convencionais. Apesar da separação entre as duas categorias de médicos se basear
numa candidatura e não numa escolha real, é razoável assumir que os resultados nos
darão informação relevante sobre a eventual auto-selecção.
As estatísticas descritivas básicas dos dados usados são apresentadas no Quadro
18. Os dados sofreram alguma evolução ao longo do tempo, pelo que se tornou
necessário introduzir na análise estatística índices para cada ano.
Os dados foram objecto de uma análise de variância42, onde se pretendeu
identificar o efeito dos vários factores. Como a análise preliminar dos dados revelou
existirem diferenças substanciais entre as SRS, na estimação o modelo foi detalhado
para permitir evoluções ao longo do tempo diferentes em cada sub-região. Em cada
caso, o objectivo é quantificar até que ponto os candidatos a USF são diferentes à
42 Implementada na forma de regressão de painel com efeitos aleatórios (“random effects”), usando como regressores variáveis indicadores (“dummies”).
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
partida, relativamente aos outros médicos. O Quadro 20 mostra os resultados da
estimação para o número de consultas.43
Cada coeficiente neste quadro deve ser interpretado como um acréscimo à média
da situação de base. Por exemplo, um médico num centro de saúde onde haja uma
unidade em RRE, tudo o resto igual, faz em média mais 389 consultas por ano do que
um médico num centro de saúde convencional.
Quadro 20. Modelo Explicativo do Número de Consultas
Consultas Coeficiente Erro Padrão
P>t
Base 3138,6 62,4 0,000
∆CS com Unidade em RRE* 389,32 106,3 0,000
∆ Santarém 1802,1 110,4 0,000 ∆ Setúbal 664,8 86,4 0,000
∆ Lisboa 2003 29,4 30,1 0,328 ∆ Lisboa 2004 84,1 29,9 0,005 ∆ Lisboa 2005 73,1 29,9 0,014 ∆ Santarém 2003 -284,1 71,9 0,000 ∆ Santarém 2004 -396,8 72,0 0,000 ∆ Santarém 2005 -331,6 71,9 0,000 ∆ Setúbal 2003 -355,8 57,8 0,000 ∆ Setúbal 2004 -572,3 57,9 0,000 ∆ Setúbal 2005 -461,4 58,1 0,000
∆ 35 H Com Exclusividade -1097,7 249,4 0,000 ∆ 42 H 415,6 70,4 0,000
∆ USF 35 H -193,9 185,2 0,295 ∆ USF 35 H Com Exclusividade 1635,6 1051,1 0,120 ∆ USF 42 H 887,9 222,1 0,000 Observações; 7354; Médicos 1964; R2 = 0,1715
Nota: A base corresponde a um médico de Lisboa, em 2002, no regime das 35 horas de tempo completo e que não se candidatou a uma USF.
43 Mais precisamente o número de consultas no centro de saúde do médico. A base regista igualmente consultas de cada médico noutros centros de saúde.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Um médico em Santarém, tudo o mais igual, faz em média mais 1802 consultas
do que um colega em Lisboa. Por outro lado, verificamos que os números médios de
consultas subiram em Lisboa de 2002 até 2004, ao passo que decresceram em Santarém
e em Setúbal, no mesmo período. Vemos igualmente que um médico com 35 horas em
exclusividade faz em média menos 1098 consultas por ano do que um médico em 35
horas de tempo completo, mas que um médico no regime de 42 horas faz em média
mais 416 consultas do que um colega em 35 horas de tempo completo, tudo o resto
igual.
Os resultados mais importantes para o objectivo desta análise provêm dos
coeficientes do indicador de candidatura a uma USF. Os médicos em 35 horas de tempo
completo que se candidatam a uma USF fazem, em média, menos 194 consultas por ano
do que os que não se candidatam (-5,4%), mas a variabilidade nos dados é tão elevada
que esta diferença não é estatisticamente diferente de zero44. Por outro lado, um médico
no regime das 42 horas (regime que abrange cerca de 68% dos médicos nas
candidaturas) que se tenha candidatado a uma USF, faz em média mais 694 consultas
(887.9 – 193.9) do que outro colega em circunstâncias iguais, mas que não se tenha
candidatado, sendo esta diferença estatisticamente significativa (p<0,001). A média de
consultas anuais para médicos em regime de 42 horas é de 4118, pelo que a diferença
estimada é de +16.7%. Ponderando os dois grupos de médicos, temos a priori uma
diferença média de cerca de mais 410 consultas, mais 10% que a média das consultas
numa população de médicos com a mesma composição, ou seja as mesmas
percentagens de médicos em 35 horas e em 42 horas.
A despesa facturada em medicamentos prescritos é a segunda variável de
interesse que podemos estimar para caracterizar quantitativamente o médico que se
candidata às USF. A regressão empregada é inspirada no caso anterior, mas a
especificação é dirigida no sentido de se estimar, com a maior precisão possível, o
impacto de ser candidato a uma USF no custo dos medicamentos por consulta. A
regressão é apresentada no Quadro 21.
44 A estimativa para médicos em 35 horas com exclusividade que se candidatam a uma USF é irrelevante porque é uma situação sem expressão.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Os resultados mostram a existência de diferentes padrões regionais, já que um
médico em Setúbal tende a gerar menos €7.500 de gastos em medicamentos do que um
seu colega em Lisboa com características semelhantes, ao passo que um médico em
Santarém ultrapassa o seu colega de Lisboa em €18.300, Por outro lado as despesas
anuais subiram ao longo dos anos em Santarém e Setúbal, ao passo que em 2005 houve
uma quebra em Lisboa.
Quadro 21. Modelo Explicativo das Despesas em Medicamentos
Coeficiente Erro Padrão
P>t
Base 15607,9 2046,6 0,000
∆ Santarém 18338,5 2617,8 0,000 ∆ Setúbal -7529,8 2022,9 0,000
∆ Lisboa 2003 5943,0 676,0 0,000 ∆ Lisboa 2004 14610,8 673,7 0,000 ∆ Lisboa 2005 -22360,0 672,8 0,000 ∆ Santarém 2003 9886,6 1618,4 0,000 ∆ Santarém 2004 21361,2 1621,7 0,000 ∆ Santarém 2005 66311,0 1619,8 0,000 ∆ Setúbal 2003 8195,8 1308,1 0,000 ∆ Setúbal 2004 15680,1 1313,8 0,000 ∆ Setúbal 2005 58186,8 1318,7 0,000
∆ 35 H Com Exclusividade -8901,1 7815,1 0,255 ∆ 42 H 13631,2 2555,8 0,000
Consultas em 35 H 25,437 0,454 0,000 ∆ Consultas em 35 H Com Exclu 2,062 2,113 0,329 ∆ Consultas em 42 H. -3,568 0,556 0,000 ∆ Consultas em CS com RRE -2,180 0,460 0,000 ∆ Consultas de candidatos a USF -2,259 0,463 0,000
Observações – 7338; Médicos 1961; R2 = 0,6644 Nota: A base corresponde a um médico de Lisboa, em 2002,no regime das 35 horas de tempo completo e num centro de saúde convencional que não se candidatou a uma USF.
Quanto à influência do regime remuneratório, vemos que um médico no regime
das 35 horas com exclusividade poderá gastar menos que outro no regime das 35 horas
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
em tempo completo, mas esse diferença não é significativa. Já um médico no regime
das 42 horas tende a gastar mais €13.600 do que um outro, no regime das 35 horas.
Os resultados mais interessantes da regressão relacionam-se com o custo
incremental em medicamentos associado a cada consulta.45 Em termos incrementais, a
estimativa é que uma consulta gera despesas de €25,4 em medicamentos para um
médico no regime das 35 horas, e de menos €3,6 para um médico no regime das 42
horas. O resultado mais importante das estimativas apresentadas no Quadro 21 diz-nos
que os médicos que se candidataram às USF têm tendência para gastar menos
€2,26 por consulta em medicamentos, ou seja, menos 7.3%, do que outros médicos
com características observáveis semelhantes.
O Quadro 22 apresenta a estimativa dos custos com MCDT. Há diferenças
regionais, de sentido inverso às encontradas nos medicamentos, com um médico de
Santarém a gerar menos e um médico de Setúbal mais custos do que um colega
semelhante em Lisboa.
Com excepção de Setúbal, em 2005, as despesas anuais em MCDT tendem a
crescer nas três Sub-Regiões de Saúde. À partida, os médicos no regime de 35 horas em
exclusividade tendem a gastar menos €12.950, ao passo que os médicos com 42 horas
gastam mais €5.160 do que os da categoria base. Adicionalmente, um médico com 35
horas em exclusividade gasta mais €3,4 por consulta em MCDT do que os €14 de um
médico com 35 horas em tempo completo, ao passo que um médico com 42 horas gasta
menos €2,2. As estimativas no Quadro 22 dizem-nos que os médicos que se
candidataram às USF têm tendência para gastar menos €1,26 por consulta em
MCDT46, ou seja, aproximadamente menos 7,5%, do que médicos em que tudo o mais
observado é semelhante.
Em média, cada consulta gerou custos com medicamentos de €31,07. Trata-se de um montante ligeiramente diferente do valor apresentado nas estatísticas descritivas iniciais dos centros de saúde. Recorde-se que este valor é apenas para a ARS de LVT e para as consultas feitas pelos médicos no seu centro de saúde (sendo que há consultas feitos por um médico em centros de saúde que não o seu). 46 De acordo com os dados brutos, cada consulta gerou, em média, uma despesa de € 16,75 em MCDT.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 22. Modelo Explicativo das Despesas com MCDT
Desvio Coeficiente P>t Padrão)
Base 11137,12 1195,37 0,000
∆ Santarém -21095,4 1581,3 0,000 ∆ Setúbal 685,3 1217,9 0,574
∆ Lisboa 2003 2175,0 370,5 0,000 ∆ Lisboa 2004 8465,7 369,0 0,000 ∆ Lisboa 2005 8996,2 368,9 0,000 ∆ Santarém 2003 5278,1 885,9 0,000 ∆ Santarém 2004 5368,8 888,8 0,000 ∆ Santarém 2005 4730,0 888,1 0,000 ∆ Setúbal 2003 105,7 716,0 0,883 ∆ Setúbal 2004 3796,9 720,6 0,000 ∆ Setúbal 2005 3079,6 723,3 0,000
∆ 35 H Com Exclusividade -12954,2 4623,6 0,005 ∆ 42 H 5164,5 1488,9 0,001
Consultas em 35 H 13,989 0,256 0,000 ∆ Consultas em 35 H Com Exclu 3,419 1,196 0,004 ∆ Consultas em 42 H. -2,178 0,314 0,000 ∆ Consultas em CS com RRE -2,344 0,273 0,000 ∆ Consultas de candidatos a USF -1,264 0,275 0,000
Observações - 7344; Médicos 1962; R2 = 0,484 Nota: A base corresponde a um médico de Lisboa, em 2002,no regime das 35 horas de tempo completo, num centro de saúde convencional e que não se candidatou a uma USF
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
9. Resultados Globais
Conjugando os resultados da análise na Secção 6, onde se estudou o custo médio
por consulta com os resultados obtidos na secção 7, onde se quantificou o efeito da
auto-selecção, podemos obter uma estimativa das vantagens líquidas apresentadas por
unidades em RRE, ou seja das reduções/aumentos de custos por consulta expurgadas do
efeito de os candidatos já terem, à partida, custos diferentes dos colegas. Os resultados,
em termos de custos por consulta, podem ser vistos no Quadro 23.
Quadro 23. Consultas: Vantagens Líquidas do RRE no modelo de base
Tipos de
Custos
Médicos
Enfermeiros
MCDT
Medicamentos
Global
Custo Efeito RRE Efeito Vantagem Vantagem
Médio Estimado Auto-selecção Líquida Líquida
(% Custo Médio)
11,01 1,60 ? 1,6 14,5%
4,42 -2,39 ? 0 0
12,96 -5,05 -1,26 (25%) -3,79 -29,2%
26,72 -9,98 -2,26 (22,6%) -7,72 -28,9%
68,59 -28,02 ? -9,91 -14,4%
Nota: Valores negativos (positivos) correspondem a reduções (aumentos) de custos médios
O Quadro 23 mostra que o efeito de auto-selecção reduz a estimativa da
vantagem líquida do RRE relativamente aos custos com medicamentos e comm MCDT,
em 22,6% e 25%, respectivamente. Adoptando a hipótese mais conservadora possível,
podemos assumir, no que diz respeito aos custo com enfermeiros, que a vantagem
líquida é nula (não dispomos aqui de evidência em contrário pelo que esta hipótese
assume que todo o ganho estimado anteriormente se deve à auto-selecção). Também à
falta de mais evidência, podemos assumir que o efeito de auto-selecção é nulo, no que
diz respeito ao custo dos vencimentos médicos por consulta. Neste cenário, estimamos
uma vantagem líquida de 29% nos custos médios por consulta em medicamentos e em
MCDT. A vantagem líquida global do RRE é de €9,9, ou seja cerca de 14,4% do custo
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
médio de uma consulta47. Como não há estimativas da auto-selecção tomando como
unidade de produção os utentes, assumiremos ser razoável usar no caso dos utentes as
mesmas percentagens estimadas no caso das consultas.
47 O Anexo contém uma estimativa de 8,1% usando uma metodologia econométrica alternativa.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
10. Estimativa do Impacto Orçamental
Nesta secção apresentamos as estimativas do impacto orçamental das USF.
Entendemos como impacto orçamental a diferença entre as despesas totais ocorridas em
2005 e as despesas que teriam ocorrido em 2005 num cenário contrafactual, simulado,
em que as USF estariam já em funcionamento.
A geração do cenário contrafactual usa as estimativas e informação produzidas e
apresentadas nas secções anteriores. Em termos técnicos, a estimativa do impacto
orçamental corresponde a utilizar as funções custos médio estimadas
econometricamente para gerar um cenário de status quo e um cenário com USF. A
unidade de observação em que a análise se baseia é o utente (e não as consultas, ou o
utilizador) uma vez que é em termos de utentes que as candidaturas a USF se
processam.
Âmbito
Em ambos os cenários, consideramos os custos correspondentes a uma mesma
população de utentes. As candidaturas a USF foram feitas para dois regimes: o Tipo I
mantém as regras convencionais de remuneração, enquanto o Tipo III corresponde às
regras do RRE.
O âmbito do impacto orçamental é definido pelos centros de saúde onde irá
haver novas USF a funcionar em RRE. Assumimos, de forma conservadora, que as USF
a funcionar em Tipo I não têm um comportamento diferenciado das unidades de saúde
existentes, pelo que não têm um impacto orçamental. Por essa razão, sempre que
mencionarmos USF nesta secção estamos a referir-nos às USF em RRE (Tipo III).
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quanto às unidades que já estavam a funcionar em RRE, assumimos que não haverá
qualquer modificação na sua situação, pelo que não foram incluídas nesta análise.48
Utilizando a informação mais recente disponível sobre as candidaturas e
evolução dos respectivos processos na altura da elaboração deste relatório, incluímos 32
centros de saúde na análise. Estes foram subdivididos em 69 unidades, estando aqui
incluídos quer as novas USF quer um centro de saúde convencional49. A população de
utentes em cada um dos centros de saúde originais foi distribuída pelas USF de acordo
com os dados constantes na proposta respectiva. Os utentes remanescentes, não
incluídos nas listas das USF, foram mantidos no centro de saúde original. A população
total de utentes, estimada para os centros de saúde envolvidos, é de 2.056.819.50
Hipóteses feitas sobre Comportamento
As regressões econométricas permitem prever os custos médios de um centro de
saúde ou de uma USF (entendida como uma unidade semelhantes aos RRE existentes
em 2005), com base num conjunto de variáveis, sendo uma das mais importantes o
número de utentes. O cálculo do número de utentes foi já detalhado na sub-secção
anterior, pelo que nesta explicamos apenas como foram construídas as restantes
variáveis usadas na regressão.
Percentagem de utentes sem médicos de família. Por definição, esta variável assume
o valor "0" para as candidaturas a USF. Para as unidades representantes dos
centros de saúde convencionais, o valor foi recalculado. Retirou-se ao número
de utentes sem médico de família no centro de saúde original o número de
48 Eventualmente estas unidades terão de se recandidatar em 2007, pelo que nessa altura este pressuposto poderá deixar de ser válido. 49 Na construção da base de dados para o estudo do impacto orçamental das USF, foram consideradas as candidaturas a USF que, de acordo com o ficheiro recebido da Missão para os Cuidados de Saúde Primários, não tinham desistido, ou sido recusadas, ou suspensas. O Anexo inclui a lista dos centros de saúde e USF incluídos na análise de impacto orçamental. 50 Um ponto técnico importante é compreender que, para efeitos de estimar o impacto orçamental, não é correcto estimar apenas os custos com os utentes das novas USF. A criação das USF vai afectar os custos médios dos centros de saúde convencionais remanescentes através dos efeitos de escala e da variação da proporção de utentes sem médico de família. Por essa razão é imprescindível considerar na análise toda a população de utentes nas áreas dos centros de saúde onde são criadas as USF.
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utentes adicional que as USF vêm cobrir51, e dividiu-se o novo total pelo número
de utentes que se mantém no centro de saúde convencional após a criação das
USF.
Percentagem de consultas marcadas não realizadas. Assumimos os mesmos valores
para as USF e para as unidades representantes de centros de saúde
convencionais, iguais às do centro de saúde original.
Percentagem dos Utentes com 18 anos ou menos e Percentagem dos Utentes com 65
anos ou mais. Assumimos os mesmos valores para as USF e as unidades CS
convencionais, iguais às do centro de saúde original.
Percentagem de Utilizadores. Para as unidades representantes de centros de saúde
convencionais, assumimos os mesmos valores que no centro de saúde original.
Para as unidades candidatas a USF, a variável vem adicionada de 5,82, a
diferença estimada nos dados dos Tableaux de Bord entre unidades de RRE e as 52restantes .
Consultas por Utilizador. Para as unidades representantes de centros de saúde
convencionais, mantemos os mesmos valores que no centro de saúde original.
Para as unidades candidatas a USF, a variável vem reduzida de 0,4.
Aspectos Adicionais da Metodologia Seguida
O primeiro passo da simulação correspondeu à utilização da estimativa da
função custo médio por utente apresentada no Quadro 12 para prever os custos médios
dos centros de saúde, tais como se encontravam em 2005, por um lado, e como se
encontrariam no cenário simulado com USF, por outro. Esta parte da simulação
51 Cada proposta de USF contém informação sobre a lista inicial dos utentes dos médicos que a constituem e a lista dos utentes que se propõem cobrir. Assumimos na análise que a diferença leva a uma redução do número total de utentes sem médico de família. 52 Estas estimativas da percentagem de utilização e a seguinte, das consultas por utilizador, foram já referidas na secção 6 e encontram-se na segunda parte do Anexo.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
quantifica vários efeitos. Para além do efeito RRE, há igualmente os efeitos de escala e
das modificações assumidas nas variáveis, descritas anteriormente.
O passo seguinte consistiu em seguir a mesma metodologia para os vários tipos
de custo. A principal etapa metodológica adicional foi ajustar as estimativas das
despesas com medicamentos e MCDT por um factor de correcção originado pelo efeito
de auto-selecção. Os efeitos auto-selecção foram estimados para os custos por consulta,
correspondendo a 25% do efeito RRE para os MCDT e a 22,6% para os medicamentos,
como já vimos anteriormente. Assumimos nesta parte da simulação que as mesmas
percentagens podem ser aplicadas para deflacionar o efeito RRE por utente. Os
resultados obtidos são apresentados no Quadro 24.
Quadro 24. Estimativas dos Efeitos Orçamentais, Contrafactual em 2005
Efeito Anual Simulado Diferença por Diferença Total N= 2056819 Utente (€) (Milhões €)
Médicos 2,44 5,025 Enfermeiros -0,11 -0,223
Administrativos/Dirigentes -0,71 -1,464 MCDT -1,86 -3,836
Medicamentos -4,92 -10,110 Outros -4,25 -8,749
Totais -12,30 -25,305
Nem todos estes efeitos deverão ser contabilizados, quer porque não sabemos até
que ponto as diferenças de custos estimadas nas regressões correspondem aos encargos
com serviços comuns dos centros de saúde, quer porque não foi possível filtrar os
resultados subtraindo os efeitos de auto-selecção em todos os tipos de custo.
Admitimos, como já fizemos anteriormente, que os efeitos ao nível de custos
administrativos e com dirigentes não são de incluir. Por outro lado, admitimos que os
efeitos sobre os custos com enfermeiros são nulos, já que por um lado não temos
informação sobre a auto-selecção no caso dos enfermeiros, e, por outro, é improvável
que uma diminuição significativa dos encargos com enfermeiros possa ocorrer num
horizonte temporal em que não poderá haver reafectação de recursos humanos
eventualmente excedentários.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Restam os efeitos estimados para os custos com medicamentos, MCDT e
vencimentos de médicos, sendo que não foi possível corrigir estes últimos para a auto
selecção. Os valores agregados estão reportados no Quadro 25.
Quadro 25. Estimativas dos Efeitos Orçamentais Relevantes para 2005
Efeito Anual Simulado Diferença por Diferença Total N=2056819 Utente (€) (Milhões €)
Custos com médicos, MCDT e medicamentos – efeito anual
-4,34 -8,920
Estimativa para Outubro-Dezembro -1,14 -2,344
Os montantes estimados para o trimestre Outubro– Dezembro, na segunda linha
do Quadro 25, correspondem a um factor de 26,28%. Este factor não é 25% já que a
sazonalidade no consumo de medicamentos e cuidados de saúde é relevante e não pode
ser ignorada. De acordo com os dados nas publicações “Estatísticas do Medicamento”
de 2002 a 2004 do INFARMED, bem como os dados disponíveis na publicação
“Análise do Mercado de Medicamentos no Âmbito do Serviço Nacional de Saúde, em
Ambulatório” referente a Dezembro de 2005, a média das proporções médias das
despesas anuais realizadas nos meses de Outubro a Dezembro é de 26,28%. De forma
conservadora, foi aplicado esse factor a todas os efeitos orçamentais estimados ou seja
para além dos medicamentos, foi igualmente aplicado aos MCDT e aos vencimentos.
Em resumo, a nossa análise leva-nos a crer que a implementação das USF teria
tido um impacto orçamental de redução das despesas, em 2005, num montante que
deveria estar na ordem dos 8,9 milhões de euros para um ano inteiro e de 2,2 milhões
para o trimestre Outubro-Dezembro.53
Usando uma metodologia estatística alternativa, no Anexo, a estimativa do impacto global é uma redução dos custos de 0,49 milhões de Euros.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
11. Conclusões
Neste Estudo fez-se uma análise quantitativa caracterizando os custos e a relação
entre estes e a produção dos centros de saúde portugueses, através da estimação
econométrica de funções custos médios para utentes, utilizadores e consultas. Este
trabalho permitiu identificar os efeitos diferenciais nos custos gerados pela adopção do
Regime Remuneratório Experimental em algumas unidades, havendo evidência de tais
unidades apresentarem custos unitários mais baixos. Controlando por um conjunto de
factores, a estimativa de custo por utente é inferior em €104 nas unidades em RRE. No
entanto, se considerarmos apenas as diferenças relacionadas com custos por
vencimentos de médicos e de enfermeiros, com MCDT e com medicamentos, a
poupança associada aos RRE é de €59. Nos centros de saúde nas ARS de Lisboa e Vale
do Tejo, e Alentejo que incluem sub-unidades em RRE (sem informação económica
separada) também há indícios, embora ténues, de vantagem nos custos. Tomando como
unidade de base o “utilizador” ou a “consulta”, os resultados são qualitativamente
idênticos.
O facto das unidades em RRE apresentarem menores custos não é suficiente para se
provar a vantagem do modelo, já que poderia dar-se o caso de tais resultados se
deverem mais à auto-selecção dos médicos nas unidades em RRE do que à existência de
mudanças de comportamento. Por essa razão, a etapa seguinte do trabalho consistiu em
usar as candidaturas a USF na ARS de LVT para quantificar as diferenças entre os
médicos participantes nas USF e os restantes. A análise confirmou a existência de auto
selecção: os médicos que tendem a integrar uma USF fazem, em média, mais 410
consultas, e gastam menos €2,3 por consulta em medicamentos e menos €1,3 por
consulta em MCDT, quando comparados com médicos em que tudo o mais é
semelhante. Usando estes resultados, podemos expurgar as estimativas das vantagens do
RRE dos efeitos da auto-selecção; mas, ainda assim, a vantagem líquida do RRE é de
29% dos custos médios em medicamentos e em MCDT.
O cálculo do impacto orçamental foi realizado considerando toda a população de
utentes dos centros de saúde onde irá haver novas USF a funcionar em RRE (Tipo III).
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A avaliação inclui os custos das USF, mas também o impacto nos custos de
funcionamento dos centros de saúde convencionais remanescentes. O impacto
orçamental traduz-se numa poupança anual de €4,3 por utente, que resulta de um
aumento em €2,4 de vencimentos de médicos, compensado por poupanças de €1,9 em
MCDT e de €4,9 em medicamentos. Considerando um universo de 32 centros de saúde,
com pouco mais de dois milhões de utentes, onde serão criadas 37 USF tipo III, o total
da poupança que teria existido em 2005 teria sido de 8,9 milhões de euros. Para os
meses de Outubro a Dezembro, a poupança estimada teria sido de €1,1 por utente, ou de
2,3 milhões de euros no total.
Globalmente, os resultados sustentam uma avaliação positiva do RRE e constituem
um argumento para continuar a política de implementação das USF.
No entanto, como sempre acontece, este trabalho sofre de algumas limitações,
algumas das quais poderão eventualmente vir a ser ultrapassadas na segunda fase do
trabalho, ou em trabalhos futuros. Nomeadamente, faltam, por enquanto, os dados
necessários para estimar o efeito de auto-selecção nos custos com vencimentos médicos
por consulta. Estamos em contacto com as entidades competentes para tentar resolver
alguns problemas de incompatibilidades nos sistemas de identificação de bases de dados
diferentes que é necessário consolidar, a fim de se poder ultrapassar esta lacuna. Uma
outra limitação é o facto de não haver um Tableau de Bord actual para o Algarve. Seria
igualmente desejável se os Tableaux de Bord futuros fossem produzidos em condições
de maior uniformidade contabilística, particularmente no que diz respeito aos
medicamentos e MCDT, e registassem com mais detalhe a produção dos centros de
saúde (incluindo, por exemplo, domicílios, vacinações, etc.). Por último, a limitação
mais importante do ponto de vista metodológico é que dispusemos de apenas nove
observações de unidades a funcionar em RRE e que eram centros de custo. Este número
é pequeno, limitando a análise e decrescendo consideravelmente o seu poder estatístico.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
ANEXO
A1: ROBUSTEZ ECONOMÉTRICA DOS RESULTADOS
Um problema da análise é a presença de heteroescedasticidade nos dados, o que na
ausência do uso de estatísticas robustas invalida as estimativas dos erros padrão dos
coeficientes e torna as suas estimativas ineficientes. Por outro lado, a inspecção visual
dos resultados das regressões mostra a presença de resíduos extremos. Por essa razão,
reportamos de seguida os resultados de uma metodologia que muitas vezes se revela
adequada para lidar com o problema da heteroescedasticidade e de outliers e que
consiste na regressão de minimização dos desvios absolutos (modelo DAM), ou
regressão para a mediana.
Como muitos dos dados provêm de distribuições muito enviesadas para a direita,
esta metodologia poderá não ser a melhor para obter resultados representativos do
agregado ou da média, que são necessariamente as variáveis de interesse em análises de
custos e de impacto orçamental. No entanto, um modelo explicativo da mediana dos
custos por utente tem a vantagem da sua robustez estatística54, pelo que será de algum
interesse reportar estes resultados para que haja um termo de comparação.
Quadro 26. Anexo. Regressão da Mediana dos Custos por Utente
Custos por Utente Coeficiente Erro Padrão
P>t
Indicador de Unidades em RRE Indicador de CS que incluem RRE 10000· ( Utentes) -½
Percentagem de Utilizadores Consultas por Utilizador % Utentes sem Médico de Família % Consultas marcadas não realizadas % Utentes com 18 anos ou menos % Utentes com 65 anos ou mais
-65,78
-8,49 ,44
1,96 20,29
-,28
-,30 -2,04 2,40
5,91
5,27 ,05 ,16
1,13 ,16
,18 ,48 ,28
0,000
0,108 0,000 0,000 0,000 0,075
0,093 0,000 0,000
.................................... ................ .................. ............. N = 332 ; pseudo R2 = 0,6423
Nota: Observações ponderadas pelo número de utentes.
54 Embora neste caso os clusters de dados não sejam tidos em conta.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Para os custos por utente, os resultados são qualitativamente idênticos aos
apresentados no relatório, mas em geral de dimensão menor. A vantagem estimado do
RRE reduz-se de um efeito médio de €103 para um efeito mediano de €66.
Quadro 27. Anexo. Regressão da Mediana dos Custos por Consulta
Custos por Utilizador Coeficiente Erro Padrão
P>t
Indicador de Unidades em RRE Indicador de CS que incluem RRE 10000· ( Utentes) -½
Percentagem de Utilizadores % Utentes sem Médico de Família % Consultas marcadas não realizadas % Utentes com 18 anos ou menos % Utentes com 65 anos ou mais
-21,434 -1,177 0,237
-0,408 -0,059 -0,008 -1,654 -0,013
1,996 1,707 0,032 0,044 0,055 0,055 0,165 0,093
0,000 0,491 0,000 0,000 0,285 0,887 0,000 0,893
.................................... ................ .................. ............. N = 332 ; pseudo R2 = 0,4808
Nota: Observações ponderadas pelo número de consultas.
Para as consultas, temos que, mais uma vez, os resultados são qualitativamente
idênticos aos estimados anteriormente, ainda que de menor dimensão. A vantagem
estimada do RRE reduz-se de um efeito médio de €28 para um efeito mediano de €21.
Aplicando esta metodologia econométrica aos tipos de custos, os equivalentes
aos Quadro 13 e Quadro 17 ficam, respectivamente:
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 28. Anexo – Decomposição do Efeito RRE nos Custos por Utente
Tipo de Custos Por Utente
(1)
Vantagem RRE Estimada
(2)
Em % do total
(3) p-value
(4)
Economias de Escala
(5) Médicos Enfermeiros Administrativos/Dirigentes MCDT Medicamentos Outros Totais55
7,50 -6,70
-13,42 -10,92 -22,52 -15,12 -65,78
-12,30% 11,00% 22,00% 17,90% 36,90% 24,60% 100%
0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000
Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim
Quadro 29. Anexo – Decomposição do Efeito RRE nos Custos por Consulta
Tipo de Custos Por Consulta
(1)
Vantagem RRE Estimada
(2)
Em % do total (3)
pvalue (4)
Economias de Escala
(5) Médicos
Enfermeiros MCDT
Medicamentos Totais
1,59 -1,98 -3,62 -6,63
-21,434
-7,4% 9,2%
16,9% 30,9% 100%
0,015
0,000
0,000
0,000
0,000
Não Sim Não Não Sim
De acordo com a análise já feita, se agregarmos apenas os custos com funções
mais distantes de serviços comuns (custos com médicos, enfermeiros, MCDT e
medicamentos), temos uma vantagem para os RRE de €35,17 por utente e de €10,64 por
consulta, ao passo que as estimativas no relatório são respectivamente de €59 e de
€13,88.
O Quadro 30 é equivalente ao Quadro 23, mas agora com base nas estimativas
das regressões para a mediana:
55 No caso da mediana a soma dos efeitos não iguala necessariamente o efeito total.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
Quadro 30. Anexo - Consultas: Vantagens Líquidas do RRE no modelo DAM
Tipos de Custos Custo Médio Vantagem
RRE
Estimada
Efeito
Auto
selecção
Vantagem
Líquida
Vantagem
Líquida
(% Custo Médio)
Médicos 11,01 1,59 ? 1,59 14,4% Enfermeiros 4,42 -1,98 ? 0 0
MCDT 12,96 -3,62 -0,75 -2,87 -22,2% Medicamentos 26,72 -6,63 -2,37 -4,26 -15,9%
Global 68,59 -21,43 ? -5,54 -8,1%
O efeito de auto-selecção é, neste caso de 20,7% do estimado inicialmente para os
MCDT, e 35,7% para os medicamentos.
Os impactos nos diferentes tipo de despesa estimados são:
Quadro 31. Estimativas DAM dos Efeitos Orçamentais, Contrafactual em 2005
Efeito Anual Simulado N=2056819
Médicos 2,00 4,121 Enfermeiros 0,31 0,630
Administrativos/Dirigentes -0,84 -1,736 MCDT -0,86 -1,769
Medicamentos -2,04 -4,203 Outros -1,42 -2,927
Totais -6,03 -12,406
Diferença Diferença Total por Utente (Milhões €)
(€)
Os resultados relevantes, são então:
Quadro 32. Estimativas DAM dos Efeitos Orçamentais Relevantes para 2005
Efeito Anual Simulado Diferença por Diferença Total N=2056819 Utente (€) (Milhões €)
Custos com médicos, MCDT e medicamentos – efeito anual
-0,90 -1,851
Estimativa para Outubro-Dezembro -0,24 -0,486
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A2: UTILIZAÇÃO, CONSULTAS POR UTENTE E POR UTILIZADOR
Apresentamos nesta secção estimativas e testes para as diferenças entre as unidades em
RRE e os centros de saúde convencionais para as três variáveis listadas:
• Percentagem de utilizadores. Na regressão explicando esta variável, o
coeficiente do RRE foi estimado em 5,82, com um erros padrão da estimativa
0,97 e p= 0,000. Logo a percentagem de utilizadores é significativamente maior
nas unidades em RRE.
• Consultas por utente. Na regressão explicando esta variável, o coeficiente do
RRE foi estimado em -0,031, com um erro padrão da estimativa 0,101 e p=
0,767. Logo não há diferenças nas consultas por utente.
• Consultas por utilizador. Na regressão explicando esta variável, o coeficiente do
RRE foi estimado em –0,396, com um erros padrão da estimativa 0,16 e
p=0,024. Logo as consultas por utilizador são significativamente menores nas
unidades em RRE.
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Análise dos Custos dos Centros de Saúde e do RRE APES
A3: CENTROS DE SAÚDE E USF NA ANÁLISE DE IMPACTO ORÇAMENTAL
ARS SRS CS USF Alentejo Beja BEJA ALFABEJA LVT Lisboa ALGUEIRAO OURESSA LVT Lisboa BENFICA RODRIGUES MIGUEIS LVT Lisboa CARNAXIDE DAFUNDO LVT Lisboa CASCAIS MARGINAL LVT Lisboa OEIRAS DELTA LVT Lisboa SETE RIOS TILIAS LVT Lisboa TORRES VEDRAS GAMA LVT Santarém BENAVENTE SAMORA CORREIA LVT Santarém CORUCHE RAIA
SOR LVT Santarém SALVATERRA SALVATERRA DE MAGOS
MARINHAIS LVT Santarém SANTARÉM S. DOMINGOS LVT Santarém TOMAR SANTA MARIA LVT Setúbal ALMADA SOBREDA LVT Setúbal CORROIOS SERVIR SAÚDE LVT Setúbal COSTA CAPARICA MONTE DE CAPARICA LVT Setúbal QUINTA DA LOMBA QUINTA DA LOMBA LVT Setúbal COVA DA PIEDADE FEIJÓ/SANTO ANTÓNIO
COVA DA PIEDADE Norte Braga FAFE NOVO CUIDAR Norte Braga FAMALICÃO FAMALICÃO 1
DELÃES Norte Braga TAIPAS RONFE Norte PONTE Norte Porto ARCOZELO NOVA VIA Norte Porto CARVALHOS ALÉM D´OURO Norte Porto CASTELO DA MAIA PEDRAS RUBRAS Norte Porto GONDOMAR RENASCER Norte Porto MARCO DE CANAVEZES ALPENDORADA Norte Porto OLIVEIRA DO DOURO NOVA SALUS Norte Porto PARANHOS FARIA GUIMARÃES Norte Porto PAREDES BALTAR Norte Porto PENAFIEL S. MARTINHO Norte Porto RIO TINTO NASCENTE Norte Porto VALONGO VALONGO
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