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25 Anuário da Produção Acadêmica Docente Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008 Maria Estela Barbosa da Rocha Faculdade Atlântico Sul do Rio Grande [email protected] Julia Maria Barrios Nogueira Faculdade Atlântico Sul do Rio Grande [email protected] HOTELARIA HOSPITALAR E A HUMANIZAÇÃO: O OLHAR VAI ALÉM DO CORPO E SEUS AGRAVOS RESUMO O presente artigo tem por objetivo apresentar um trabalho reali- zado com os alunos da disciplina Gestão em Hotelaria do Curso de Tecnologia em Gestão Hospitalar da Faculdade Anhanguera Educacional - Rio Grande (RS). O trabalho foi desenvolvido por sete grupos que buscaram as narrativas de pacientes que interna- ram e utilizaram os serviços de hotelaria, buscando conhecer sua impressão sobre o sistema de atendimento. O “saber ouvir” era uma das propostas, e de uma forma geral os trabalhos ainda des- tacaram a preocupação central no corpo: este preponderou pontu- ando questões do tratamento e da doença ou o destino que este corpo tomou, a saída do hospital em recuperação ou a morte. Para entendermos estas questões se faz necessário um conhecimento de como foi historicamente constituído esse discurso centrado no corpo visível e sua anatomia, como esse “golpe de vista” foi dire- cionado e se apoderou dos corpos sem levar em conta os senti- mentos da pessoa doente, o bem estar no ambiente, o tratamento mais digno, a alteridade e a cidadania. Palavras-Chave: Hotelaria hospitalar, humanização, cidadania, pesquisa narrativa. ABSTRACT This article aims to present a work proceeded with students of the subject Management in Hotel Business of the Course of Technol- ogy in Hospital Management of the Faculdade Anhanguera Edu- cacional – Rio Grande (RS). The work was developed by seven groups which searched for statements of patients who were hospi- talized and used the services/facilities of hotel. It was sought to know their impression about the service system. “Knowing how to listen” was one of the proposals and, in a general sense, it was pointed out the main worry in the body: it prevailed stating issues in the treatment and in the illness or even the future that the body took, the leaving of the hospital either in recovery or because of death . In order to understand those issues it is necessary a kno- wledge of how this discourse was historically built, oriented on the visible body and its anatomy, how this glancing was leaded and took over of the bodies without taking into consideration the feelings of the sick person, the well-being in the environment, a more dignified treatment, the interaction and citizenship. Keywords: Hospital service system, humanization, citizenship, state- ment survey. Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 [email protected] Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Artigo Original Recebido em: 18/8/2008 Avaliado em: 24/11/2008 Publicação: 19 de dezembro de 2008

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Anuário da Produção Acadêmica Docente Vol. XII, Nº. 2, Ano 2008

Maria Estela Barbosa da Rocha Faculdade Atlântico Sul do Rio Grande [email protected]

Julia Maria Barrios Nogueira Faculdade Atlântico Sul do Rio Grande [email protected]

HOTELARIA HOSPITALAR E A HUMANIZAÇÃO: O OLHAR VAI ALÉM DO CORPO E SEUS AGRAVOS

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo apresentar um trabalho reali-zado com os alunos da disciplina Gestão em Hotelaria do Curso de Tecnologia em Gestão Hospitalar da Faculdade Anhanguera Educacional - Rio Grande (RS). O trabalho foi desenvolvido por sete grupos que buscaram as narrativas de pacientes que interna-ram e utilizaram os serviços de hotelaria, buscando conhecer sua impressão sobre o sistema de atendimento. O “saber ouvir” era uma das propostas, e de uma forma geral os trabalhos ainda des-tacaram a preocupação central no corpo: este preponderou pontu-ando questões do tratamento e da doença ou o destino que este corpo tomou, a saída do hospital em recuperação ou a morte. Para entendermos estas questões se faz necessário um conhecimento de como foi historicamente constituído esse discurso centrado no corpo visível e sua anatomia, como esse “golpe de vista” foi dire-cionado e se apoderou dos corpos sem levar em conta os senti-mentos da pessoa doente, o bem estar no ambiente, o tratamento mais digno, a alteridade e a cidadania.

Palavras-Chave: Hotelaria hospitalar, humanização, cidadania, pesquisa narrativa.

ABSTRACT

This article aims to present a work proceeded with students of the subject Management in Hotel Business of the Course of Technol-ogy in Hospital Management of the Faculdade Anhanguera Edu-cacional – Rio Grande (RS). The work was developed by seven groups which searched for statements of patients who were hospi-talized and used the services/facilities of hotel. It was sought to know their impression about the service system. “Knowing how to listen” was one of the proposals and, in a general sense, it was pointed out the main worry in the body: it prevailed stating issues in the treatment and in the illness or even the future that the body took, the leaving of the hospital either in recovery or because of death . In order to understand those issues it is necessary a kno-wledge of how this discourse was historically built, oriented on the visible body and its anatomy, how this glancing was leaded and took over of the bodies without taking into consideration the feelings of the sick person, the well-being in the environment, a more dignified treatment, the interaction and citizenship.

Keywords: Hospital service system, humanization, citizenship, state-ment survey.

Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato

Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 [email protected]

Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE

Artigo Original Recebido em: 18/8/2008 Avaliado em: 24/11/2008

Publicação: 19 de dezembro de 2008

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Hotelaria hospitalar e a humanização: o olhar vai além do corpo e seus agravos

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1. INTRODUÇÃO

A cada ano a ciência médica tem despontado como salvadora da humanidade de gran-

des males que assolam os corpos. A doença sempre foi descrita na história de forma

trágica ceifando grandes levas de indivíduos ou pessoas importantes são afetadas por

algum mal orgânico que a levou à morte, seu afastamento das pessoas que ama e que o

amavam. A humanidade vive um duplo nó, hora entende que a ciência médica pode

salvar suas vidas para, em um determinado momento, verificar que a doença vence a

ciência de forma implacável – como podemos verificar as questões que envolvem o

HIV/Aids no Continente Africano – e, mais recentemente, a epidemia da dengue no

Brasil. Nos tempos atuais o olhar do homem varre as mais diversas regiões do mundo,

seja pela imagem da televisão ou através da Internet, e verifica por vezes espantado e

hora sem assombro nenhum que corpos se encontram espalhados nas situações mais

humilhantes possíveis, doentes e sem assistência, sejam eles homem, mulheres, idosos

ou crianças.

O olhar do espectador se depara com os corpos na tela onde é produzida uma

imagem da dor e do abandono, não muito diferente dos quadros do século XV, como o

do pintor belga Peter Bruegel com o seu quadro Triunfo da Morte (Figura 1) – que mos-

tra um mundo assolado pela peste que não poupava nem reis e rainhas.

Figura 1. Quadro "Triunfo da Morte".

Com tristeza verificamos que para muitos ainda se mantêm o total abandono

de seu bem estar, assistência à saúde e de um ambiente em que possa esse corpo, onde

ficam escritas todas as aventuras humanas marcadas pelas vivências, obter a cura ou

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morrer com dignidade; todas estas situações destroem quase que toda, se não grande

parte da capacidade de olhar-se a si própria como pessoa de direito e que pode receber

uma atenção mais respeitosa, mais humanizada.

Esse olhar o corpo, a visibilidade do corpo, foi construído historicamente atra-

vés do conhecimento desenvolvido pelo médico. No século XIV a medicina, por tantos

impedimentos como a proibição da dissecação de cadáveres em nome da “dignidade

humana”, era estabelecida pelo Papa Bonifácio I (Século XIV) fizeram da anatomia uma

aventura que poderia custar a vida de quem a realizasse.

Figura 2. Rembrandt - Aula de Anatomia do Dr. Deyman (1656).

No entanto, de forma furtiva os estudos transcorriam e ocorrem inclusive re-

gistros de casos de vivissecação de condenados à morte: era o poder do saber sobre o

corpo vivo. Esse conhecimento da anatomia humana era, na realidade, o olhar em bus-

ca das estruturas que compunham o corpo, bem como os “males” que o assolavam e

assim o indivíduo é dessecado em partes. O “doente” é olhado não no seu todo bio-

psico-social, o olhar que paira é sobre partes do corpo e assim se perpetua, na maioria

das vezes, até os tempos atuais. Foucault, no seu livro Nascimento da Clínica (2006, p. 2),

argumenta que o corpo no século XIX foi esquadrinhado e que a configuração da doen-

ça e o espaço da configuração do mal foi privilégio da anatomia patológica. Segundo

Foucault, este é o momento que marca a soberania do olhar, quando observa:

Época que marca a soberania do olhar, visto que no mesmo campo perceptivo, seguindo as mesmas continuidades ou as mesmas falhas, a experiência lê, de uma só vez, as lesões visíveis do organismo e a coerência das formas patológicas; o mal se articula exatamente com o corpo e sua distribuição lógica se faz, desde o começo, por massas anatômicas. O “golpe de vista” precisa apenas exercer sobre a verdade, que ele descobre no lugar onde ela se encontra, um poder que, de ple-no direito, ele detém. (2006, p. 2)

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Detentor do conhecimento legítimo, o médico exerce esse saber sobre as mais

diversas classes; no entanto, as pessoas mais humildes historicamente sem o reconhe-

cimento de seus direitos, ainda se mostram constrangidas de dizerem muito mais do

que as dores da própria doença. Para estes pacientes realizarem solicitações ou ponde-

rar sobre momentos vividos no ambiente hospitalar que o afetam e estão ligadas dire-

tamente à convivência e às rotinas do ambiente em que está sendo tratado, ou falar

seus sentimentos no que concerne ao momento em que se encontra, se torna muito di-

fícil – pois teme que algo possa dar “errado” porque o seu bem mais precioso está em

risco: a vida.

Para as classes populares, por vezes, tudo é muito estranho como afirma Bol-

tanski:

Estranho ao “universo da experiência” e regido por uma outra lógica cujas regras se ignoram, o mundo da doença e da medicina é para os membros das classes populares “um universo onde, por essência, tudo é possível”, e que em vão dese-jar-se-ia submeter a uma crítica exigente [...]. (2004, p. 29)

O paciente olha para a mazela de seu corpo e relembra o discurso realizado

pelo médico sobre o mesmo, mas sem entender muito bem o que significam tantas pa-

lavras sobre o que está afetando o seu bem estar e verificar que outros especialistas se

apoderam desse mal e o observam através de imagens e de papéis que descrevem o

que está acontecendo com o seu sangue; e no silêncio, o paciente observa os especialis-

tas e o especialista observa, por vezes, somente as imagens e os resultados dos exames.

Isso tudo afeta o paciente que pode não entender o que ocorre com seu corpo de forma

clara, mas entende o que é solidão, dúvidas, ansiedade, medo, receio, e outros tantos

sentimentos que afloram nesse momento que podem terminar em uma resistência ao

atendimento médico.

Para Boltanski,

Se os doentes das classes populares se sentem pouco inclinados a se confiar ao médico, é em primeiro lugar porque não possuem o equipamento lingüístico e, mais particularmente, o vocabulário da introspecção e a linguagem das emoções que lhe seria necessária para abrir-se ao médico sobre seus problemas e preocu-pações mais íntimos. (2004, p. 47)

O lidar com a doença e o corpo é uma construção sócio-histórica que precisa

ser analisada de forma holística, ou seja, no seu todo; isso requer um compromisso das

instituições de saúde organizando, entre outros segmentos de trabalho, a Hotelaria

Hospitalar que tem em um de seus objetivos a humanização e o atendimento de quali-

dade que objetiva – através de uma equipe multidisciplinar – o atendimento do pacien-

te preconizando o respeito à sua individualidade.

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Para que esse objetivo aconteça de forma crítica e comprometida se faz neces-

sário trabalhar estas questões dentro dos cursos capacitando os futuros gestores da Ho-

telaria Hospitalar a lançarem um olhar que não fique somente no corpo, mas que leve

em consideração outras questões que ajudarão o paciente a se sentir mais seguro e con-

fiante diante das situações que se apresentam. Na realidade, é um trabalho que envolve

a desconstrução do imaginário desses futuros profissionais no que se refere a “atendi-

mento de qualidade”, ou seja, centrado somente no que se refere a corpo/doença.

Nesse sentido, a proposta de trabalho realizado com os alunos visava essa a-

proximação com os pacientes que estiveram internados buscando as narrativas e reali-

zando uma análise crítica das situações vivenciadas. Nas aulas foram realizados estu-

dos de caso com análise crítica através dos textos e debates, ou seja, quando estes alu-

nos chegaram até ao paciente já se encontravam em condições de realizarem um olhar

não mais centrado somente na doença, mas já observado e analisado através das narra-

tivas desses indivíduos: o ambiente que foi oferecido buscando saber como era a higie-

ne, serviço de alimentos e bebidas, lazer, atendimento de outros profissionais que auxi-

liaram na sua recuperação.

Os trabalhos nos mostram, também, o grande desafio de fazer entender e

comprometer os futuros gestores da importância da humanização e do atendimento de

qualidade quando o contra ponto se mostra em nosso dia a dia de forma dura e até

mesmo cruel, como a falta de tratamento adequado e digno a todos que procuram o

sistema de saúde. Seria esta forma de trabalhar, a busca das narrativas dos pacientes,

um caminho para a conscientização da importância desse trabalho, a implantação da

Hotelaria Hospitalar e a Humanização no atendimento? Quais foram as conclusões

desses alunos?

1.1. Metodologia

Nessa caminhada utilizamos como estratégia metodológica a pesquisa qualitativa com

investigação narrativa por possibilitar a construção e a reconstituição da história por

meio de relatos individuais e coletivos. Esse tipo de pesquisa busca a descrição e a ex-

ploração de fenômenos sociais, psicológicos, culturais, estruturais, funcionais e econô-

micos relacionados às famílias, com o propósito de compreender um problema ou de-

terminada situação que envolve o viver de seus membros, de toda a família e a socie-

dade. (ALTHOFF; SHMICKLER; MIOTO; MANFRINI, 2004, p. 37)

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Na ramagem complexa das relações sociais o olhar vai além do nosso tão co-

nhecido paciente/corpo/doença lançando um olhar para outras necessidades que po-

dem contribuir para o restabelecimento do paciente e apoio para seus familiares.

Sendo assim, não nos referimos somente ao adoecimento, mas às vivências

que incorporam sentimentos conflituosos que, por vezes, o usuário e seus familiares

não conseguem expressar em palavras no momento de suas vivências na complexa es-

trutura hospitalar: são as experiências individuais e familiares no contexto hospitalar.

Assim, a pesquisa realizada procurou as narrativas com um olhar além do

corpo doente e buscou retratar a realidade do contexto hospitalar vivenciado através

dos depoimentos.

Os alunos, em sete grupos, desenvolveram a pesquisa e realizaram suas análi-

ses com base nos estudos efetuados em sala de aula através de materiais como artigos

publicados e capítulos de livros relacionados à administração hospitalar, hotelaria hos-

pitalar e humanização.

1.2. Objetivos

Ampliar a visão do aluno para que não fique resumido ao atendimento pacien-

te/corpo/doença, mas que ocorra um alargamento desse olhar levando em considera-

ção o usuário e seu atendimento de forma holística.

Proporcionar situações que permitam a análise das características essenciais

do conhecimento sobre hotelaria-hospitalar – oportunizando reflexões sobre o compor-

tamento das pessoas como força humana no trabalho para que se delineiem alternati-

vas de um proceder diferente que mobilizem os profissionais para um trabalho em e-

quipe mais produtivo e de qualidade.

2. O CORPO DOENTE E OS LOCAIS ESTABELECIDOS PARA FICAR: DO SÉCU-LO XV AO SÉCULO XXI

Nesse trabalho o “golpe de vista se amplia”: ele se abre para além do corpo, vai do am-

biente à pessoa e das relações do paciente com o seu entorno. Este se transforma ao o-

lhar do aluno não mais, e tão somente, um corpo doente, mas sim aquele homem, mu-

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lher, idoso, jovem ou criança que está em busca da recuperação de sua saúde – mas

mesmo sem saber explicar em palavras a sua cidadania1.

O aluno passa a tomar consciência da palavra alteridade. Para Silva (2006, p.

01) “A palavra alteridade, que possui o prefixo alter do latim possui o significado de se

colocar no lugar do outro na relação interpessoal, com consideração, valorização, iden-

tificação e dialogar com o outro.” Ele passa a olhar outras instâncias da instituição que

antes não lhe “incomodavam” – este olhar vai desde a falta de um profissional que

possa levar familiares em desespero até o paciente acidentado à falta do banco para es-

pera na porta de uma UTI. Estas foram partes de uma análise da aluna que vivenciou

este momento e realizou, no trabalho, a narrativa de sua própria vivência e de sua fa-

mília no acidente de seu irmão, que o deixou entre a vida e a morte na UTI. Ao partici-

par das aulas ela se reportava ao momento vivido e pensava que caso os serviços de

Hotelaria Hospitalar estivessem implantados no hospital, ela e sua família teriam um

outro suporte que não permitiria que se sentissem tão solitárias naquele momento difí-

cil. Ela sita, entre os serviços, o mensageiro e o orientador social.

Mas de onde provém essa falta de sensibilidade para coisas que parecem ób-

vias, mas na sua ausência beira ao descaso? Os indivíduos acometidos de alguma do-

ença e seus acompanhantes surgem na história da hotelaria com lugares e locais bem

determinados, ou seja, o seu destino tem sua história registrada através dos séculos; na

verdade os locais foram mudando e seu espaço físico conforme a doença e as determi-

nações governamentais de como deveria ser tratado.

Em seu livro clássico “História da Loucura”, Foucault nos elucida como era

realizada a exclusão do louco no século XV, ou seja, toda a espécie de insano que se en-

trega à desordem e à devassidão: delatores, bêbados, os que praticam adultério, ím-

pios, superbos, luxuriosos, lascivos, libertinos; enfim, todas essas condutas eram puni-

das com a exclusão, e para que ocorresse a contento esse ato de punição, esses indiví-

duos eram colocados no que chamavam na época a “Nau dos Loucos” – estranho barco

que deslizava ao longo dos calmos rios da Renâmia e dos canais flamengos. Quem en-

trasse não poderia, em tese, sair – a não ser morto. Eis o corpo tomado pela “loucura” a

ficar na “hotelaria” náutica.

No século XVI é criado o Hospital Geral de Paris, se estabelece a grande inter-

nação: os indivíduos insanos passaram a ter – a princípio – um lugar com assistência,

1 De acordo com esta perspectiva a cidadania não se refere apenas a um direito legal, mas, sobretudo a um direito a par-ticipar, direito este que se encontra relacionado com a natureza e a essência social do ser humano. (TOMÁS e SOARES, 2004)

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na realidade um amontoado de gente em condições subumanas. “O Hospital Geral tem

um estatuto ético. É desse encargo moral que se revestem seus diretores, e é-lhes atri-

buído todo o aparelho jurídico e material de repressão: e para que realizem sua tarefa,

põe-se-lhes à disposição ‘pelourinhos, e golilhas, prisões e celas-fortes’”. (Foucault,

2005, p. 74). Eis a “hotelaria” da reclusão. Houve outras tão lúgubres quanto esta?

Figura 3. Philippe Pinel e as Loucas. T.R.Fleury – 1837-1912.

A “hotelaria” nasce em meio ao sofrimento e exclusão desses corpos por vezes

reconhecidos como “algo próximo a uma natureza demoníaca” (2000, p. 71) como eram

designados os leprosos.

Segundo Tronca:

[...] o Havaí inaugurou a política sanitária contra os leprosos no século XIX, re-servando-lhes um inferno no paraíso. Cercada de penhascos profundos e águas coloridas de topázio azul, a ilha-leprosário de Molokai foi transformada num lu-gar de exílio sem retorno, onde os doentes ou suspeitos de contaminação eram abandonados à própria sorte. (2000, p. 67)

O corpo deformado não poderia ficar a aterrorizar a população, e sem um tra-

tamento apropriado essas pessoas ficavam isoladas sem jamais recuperarem sua vida

social anterior. Eis uma “hotelaria” em meio à natureza.

Podemos verificar por meio da história que o corpo através do visível, a doen-

ça a mostrar seus danos ou atitudes tidas como anormais, fica com seu destino traçado

no olhar do médico que verificava a periculosidade e definia o seu rumo, neste mo-

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mento não importava e não se leva em consideração o que o doente poderia querer pa-

ra sua vida e muito menos se ouvia seus acompanhantes e familiares.

Hoje ainda ouvimos nossos parentes ou pessoas idosas falarem de como eram

tratadas as pessoas doentes em um tempo “ido” e que se assemelha ao tratamento da-

do às pessoas doentes que acabamos de verificar na história da hotelaria, porque a tu-

berculose e seu tratamento que mantinham os indivíduos isolados – seja em um cômo-

do da casa ou em uma cidade serrana como Campos do Jordão – que ficou conhecida

como “tisiópolis”, cidade da tuberculose, eram lugares de isolamento do corpo doente

e para estes locais que os indivíduos com melhores condições de vida iam “tratar” a

doença.

O sentimento de solidão e confinamento se segue no final do século XIX e iní-

cio do século XX; estas questões foram pontuadas por Gonçalves quando detalha as

questões que envolvem a doença e o doente. O autor observa: “O fato da doença colo-

car em questão o confronto com a tristeza, a solidão, o confinamento, a percepção dos

limites corporais, pela visão do definhamento, chegando à morte [...]” (2002, p. 23-24).

É preciso lembrar que este tempo não está tão distante de nós: ele aconteceu

no século passado e a Hotelaria Hospitalar, que leva em consideração o atendimento

do paciente e seus acompanhantes de forma holística, que tanto queremos implantar

no maior número de hospitais possível para benefício dos pacientes e seus acompa-

nhantes, não tem mais de doze anos.

Outro ponto crucial é que os profissionais que podem realizar a diferença no

ambiente hospitalar então sendo formados há pouco tempo, e que ainda em pontos

chave da administração hospitalar se encontram funcionários que não acreditam nesse

diferencial como algo importante – tanto na recuperação do paciente como também na

busca do respeito aos seus direitos fundamentais, como afirma Mezomo: “[...] dentre os

quais se destaca a dignidade e o valor da pessoa humana”. (1995, p. 275)

3. UMA REFLEXÃO SOBRE OS TRABALHOS NARRATIVOS E AS CONCLUSÕES DOS ALUNOS

O trabalho que busca as narrativas dos pacientes internados surpreende quando os

próprios alunos contam suas vivências no ambiente hospitalar, como o caso já descrito

pela aluna que teve seu irmão acidentado. Mas também o narrar de uma aluna que es-

tava grávida e teve sua filha no decorrer do curso, e com seu grupo realizou a análise

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de algumas situações que ocorreram enquanto estava internada, contando como foi es-

sa “aventura” de entrar em um mundo que lhe era (des)conhecido2 e, como os dizeres

dos médicos, seus auxiliares e o “bip” dos equipamentos a assustavam sentindo-se

vulnerável à situação. A jovem narra que em meio à angustia de palavras

(des)conhecidas tentava entender o que isso poderia oferecer de risco para si e sua fi-

lha.

Segue a narrativa: “Eu me deitei e no momento em que eles começaram a cor-

tar, o monitor que estava ao meu lado apitou, então eu virei o olho e vi que minha

pressão havia caído para 8/5, e então começou a adormecer o meu corpo: adormeceu a

parte de cima, eu senti falta de ar, eu respirava, fazia força e não sentia o ar entrar, até

que ouvi a anestesista dizer. – Deu queda, deu queda de pressão! Contornada a situa-

ção nesse primeiro momento o monitor ainda apitou mais duas vezes durante a cirur-

gia. Após o nascimento da filha, quando já estava se acalmando, a médica se aproxi-

mou antes de sair da sala de cirurgia e disse: - “Espero que tu pense duas vezes antes

de engravidar novamente, porque eu não sei se tu visse tu quase morresse”. A jovem

disse que esta foi a última vez que viu a médica, durante os dois dias que se seguiram

até a alta.

O grupo, após a apresentação, realiza sua análise que enfatiza a falta de uma

comunicação com mais, como eles mesmos expressaram, “tato” – e que aquele não era

o momento de tecer comentários sobre o risco de vida que a jovem passou. O atendi-

mento da jovem e da criança, parte física, havia terminado: mas o lado psicológico ain-

da estava frágil devido a toda situação vivenciada.

Segundo Godoi:

Como não é possível separar o lado psicológico do fisiológico quando se trata do ser humano, a recuperação do paciente pode depender muito mais do lado emo-cional do que apenas de fatores bioquímicos. Como o lado emocional estará sob tensão, a sua recuperação dependerá como ele se sentirá durante essa estada; isso significa que o sentimento de rejeição ou aceitação afetarão o seu quadro clínico final. (2004, p.78)

No entanto, a jovem relata que esta situação foi pontual, outros serviços que

lhe foram oferecidos mostram que a humanização nesse ambiente hospitalar era uma

realidade como a presença atenciosa das enfermeiras, atendimento psicológico, assis-

tente social, nutricionista e profissionais do Banco de Leite, que auxiliaram na primeira

amamentação do bebê.

2 Coloco o termo (des)conhecido porque as pessoas, de um modo geral, são amplamente invadidas por discursos médi-cos, imagens de situações hospitalares e procedimentos, o que não quer dizer que tenham um conhecimento real do que poderá acontecer caso necessite do mesmo atendimento visto anteriormente.

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Nesse caso descrito pela jovem aluna podemos verificar que a médica preocu-

pou-se totalmente com o corpo, sua visão está entre o monitor e o corpo: naquele mo-

mento, os esforços estavam canalizados para o sucesso do trabalho levando em consi-

deração o estado físico da paciente e da criança que estava para nascer. Ao término de

uma situação estressante, a médica deveria observar questões referentes a uma possí-

vel gravidez futura da jovem em um outro momento, onde ela – profissional – e a jo-

vem paciente estivessem em condições de tranqüilidade para que ambas elaborassem

uma comunicação menos angustiante, porque o lado emocional, devido à tensão, esta-

va totalmente fragilizado.

Para Mezomo:

É preciso lembrar que para o paciente o hospital é um lugar estranho e misterioso e, por vezes trágico, que não o deixa à vontade. Daí a necessidade de sua ambien-tação através da informação bem dada, da solidariedade, do apoio e da atenção dos que o recebem. (1995, p. 279-281).

No trabalho desenvolvido pelos grupos se verificam as vozes ausentes dos pa-

cientes e seus familiares; por vezes, não ocorre a oportunidade de expressar suas an-

gústias e medos no ambiente hospitalar, mas quando esta possibilidade ocorre, eles se

mostram temerosos de expor situações que os levaram a um constrangimento, enfati-

zando sempre que o seu tratamento (corpo) foi ótimo e que saiu com vida.

Esta foi a vivência de um dos grupos com uma senhora3 de 69 anos, com a

narrativa gravada em vídeo. A senhora dá início à sua história com a situação que a le-

vou ao hospital, com febre e colocando muito sangue pela boca, sendo assim imedia-

tamente atendida. A idosa repete sempre que foi bem atendida por todos e que se está

viva deve a este atendimento imediato. Quando perguntada sobre outras situações que

tenha vivenciado e que a preocuparam, a idosa olha para a câmera um tanto insegura e

retorna a dizer que tudo foi muito bem.

Com o término da entrevista e após desligar a câmera de vídeo, a idosa então

fala de um momento que vivenciou com seus familiares e que a deixaram com muita

angústia. Ela narra que estando em recuperação internou no mesmo quarto uma jovem

– o que causou muita angústia porque, segundo a idosa, ela temia ter uma outra he-

morragia e a sua acompanhante de quarto então presenciasse toda aquela situação; ou-

tra questão que pontuou foi a febre que persistia, o que ocasionava um suor intenso fi-

cando com os lençóis molhados por um longo tempo. No caso da jovem ela solicitou

que fosse retirada explicando sua angústia, mas a jovem paciente ainda ficou por dois

3 Todos os colaboradores assinaram o termo de consentimento. A senhora recebeu os esclarecimentos sobre o trabalho que estava sendo feito e assinou o consentimento para estudo de suas informações, bem como sua imagem.

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Hotelaria hospitalar e a humanização: o olhar vai além do corpo e seus agravos

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dias no mesmo quarto. Quanto aos lençóis era solicitada a retirada, mas a troca dos

mesmos nem sempre ocorria ficando a idosa por longo tempo com os lençóis molhados

de suor.

O grupo, em sua análise, salienta a falta da Governanta para resolver proble-

mas como estes que foram expostos, sendo uma de suas funções “avaliar regularmente

o desempenho de todos os empregados e desenvolver ao máximo o potencial de cada

um, orientando e determinando os pontos a serem corrigidos [...]” (TARABOULSI,

2006, p. 132).

No que se refere à jovem no quarto o grupo salienta a falta de sensibilidade

dos profissionais com o momento, e que por dois dias a senhora ficou angustiada com

toda a situação que não foi levada em consideração, podendo prejudicar sua recupera-

ção. Embora a senhora enfatizasse o “corpo” que foi tratado, não deixou de verificar a

situação que lhe causou estranheza, mas a observação ficou no que a jovem poderia

presenciar, ela conscientemente não se deu conta, segundo o grupo, que estava tam-

bém sendo prejudicada.

Para Mezomo:

Só se pode entender a administração do hospital partindo de sua dimensão psico-lógica, porque seu nível de humanidade e de empatia são um componente essen-cial na recuperação do paciente. Tudo isso tem uma importância muito grande para quem está confinado num leito. O sofrimento físico, muitas vezes, é agrava-do pela ansiedade, e esta também precisa ser tratada. (1995, p. 280)

Os outros trabalhos também mostram a visão ampliada dos grupos e o enten-

dimento de que o paciente é muito mais que o “corpo” a ser tratado: ele precisa de ou-

tros profissionais que realizem um atendimento que vai além desse “corpo” e sua cons-

tituição “anatômica" que está acometida de um determinado mal. A humanização só

poderá ser implantada se a administração do hospital entender que a Hotelaria Hospi-

talar é mais que um luxo – é uma equipe multiprofissional capacitada e direcionada

para o atendimento de qualidade que os pacientes devem e merecem obter em todos os

hospitais. “É sempre preciso lembrar ainda e sempre que a humanização diz respeito à

defesa dos valores do paciente e ao atendimento de suas expectativas e necessidades! E

como conhecê-las se ao paciente não forem garantidas vez e voz? (MEZOMO, 1995, p.

281).

Verificamos também que a cultura do atendimento ao corpo e sua anatomia

ainda prevalecem no ambiente hospitalar, o “golpe de vista” ainda persiste no corpo

doente e seus males; no entanto, podemos observar que algo fundamental está ocor-

rendo – que é a profissionalização dos gestores que estão se constituindo como profis-

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sionais da área advindos não somente de jovens estudantes, mas também de outras á-

reas do saber que fazem parte das equipes na área da saúde, como técnicos de enfer-

magem e médicos. Podemos vislumbrar um futuro promissor no trabalho de humani-

zação nos hospitais e na implantação da Hotelaria Hospitalar, pois sabemos que as di-

ferenças devem ser respeitadas, mas que é fundamental que todas as áreas que consti-

tuem os mais variados segmentos da saúde estejam coesas e conscientes da importân-

cia de uma mudança de pensamento no atendimento ao paciente e seus acompanhan-

tes. Uma mudança de visão, mais ampliada, pois os futuros gestores estão construindo

o seu saber e a importância da Hotelaria Hospitalar, desconstruindo e reformulando

sua forma de pensar através do diálogo, do respeito e do saber ouvir.

É nesse sentido que concordo com Demo, quando diz:

[...] o questionamento reconstrutivo, um dos princípios da pesquisa, é a capaci-dade de investigar o conhecimento existente, desfazendo verdades imutáveis, desconstruindo o já construído para, por meio dele ser capaz de reconstruir, pos-sibilitando assim, o avanço do conhecimento. (1995, p. 98)

Os futuros gestores demonstram em seus trabalhos que é possível uma mu-

dança na forma de olhar aqueles que, ao procurar o hospital, colocam a nossa frente o

seu bem maior: a vida. A conscientização da importância da Hotelaria Hospitalar per-

passa por esta vivência junto aos pacientes, é na construção de seu conhecimento que o

aluno se torna participativo e comprometido com as decisões a serem tomadas no am-

biente profissional e no processo de decisão no que se refere ao atendimento ao pacien-

te.

Este é o grande desafio: tornar a visão fragmentada do aluno no que concerne

ao paciente e seus acompanhantes em uma visão ampliada, e esta mudança poderá o-

correr com o trabalho em equipe com grupos de estudos e pesquisa atuando e anali-

sando as situações como as descritas. Ao objetivarmos mudança devemos proporcionar

que a gestão participativa para a qualidade e a humanização deva partir da identifica-

ção da cultura social e institucional, mas também permitir que se expressem as vozes

que a ainda são tímidas, em sua grande maioria, e que devem ser ouvidas: é desta for-

ma que se começa um grande trabalho de transformação social e local.

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BOLTANSKI, L. As classes sociais e o corpo. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

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______. História da loucura. 8.ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.

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MEZOMO, J. Gestão da qualidade na saúde – Princípios Básicos. São Paulo: Terra, 1995.

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Maria Estela Barbosa da Rocha

Pedagoga (FURG); Administradora Hospitalar (Universidade Católica – RS); Mestre em Edu-cação Ambiental (FURG); Docente – Gestão em Hotelaria (Faculdade Atlântico Sul – Anhan-guera Educacional – Rio Grande – RS).

Julia Maria Barrios Nogueira

Coordenadora – Curso Tecnologia em Gestão Hospitalar da Faculdade Atlântico Sul – A-nhanguera Educacional – Rio Grande – RS.