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UFPB – Universidade Federal da Paraíba PPGCR – Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões Disciplina: História das Religiões Seminário – Religiões Afro-brasileiras 1. A voz da África e suas expressões religiosas Como as religiões afro-brasileiras desenvolveram-se em praticamente todos os Estados em que houve a presença dos escravos, e por isso fatores como influência de etnias, repressão e condições urbanas levaram o culto a apresentar características regionais em seus ritos: Tambor-de-mina; Cabula; Macumba; Candomblé de caboclo; Catimbó, pajelança e cura; 2. As religiões Africanas no Brasil: 2.1 Sincretismo religioso no Brasil: Contexto histórico É correto afirmar que foram trazidos diversos grupos culturais da África, capturados pelos próprios europeus ou por atravessadores africanos que em disputas de tribos, escravizavam seus rivais . De acordo com Ribeiro são três os grupos trazidos ao Brasil: Yorubá – chamados nagô; Dahomey – designados geralmente como gegê ; Fanti-Ashanti – conhecidos como minas, além de muitos representantes de grupos menores da Gâmbia, Serra Leoa, Costa da Malagueta e Costa do Marfim (Gonçalves, 1994). Chegando ao Brasil, tais grupos eram caracterizados não pelas etnias e sim pelos portos nos quais foram embarcados na África. Tais denominações não correspondiam necessariamente à suas origens (PARÉS, 2007, p. 25). Na nova terra, fundiram-se as culturas europeia, indígena e africana, num amalgamado de conceitos e significados distintos. Com a força dominante irrevogável da Igreja Católica e da caça às bruxas e rituais considerados mágicos ou luxuriosos, professar a fé se fez cada

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Apostila de acompanhamento do seminário: Religiões Afro.

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UFPB Universidade Federal da ParabaPPGCR Programa de Ps-Graduao em Cincias das ReligiesDisciplina: Histria das ReligiesSeminrio Religies Afro-brasileiras

1. A voz da frica e suas expresses religiosasComo as religies afro-brasileiras desenvolveram-se em praticamente todos os Estados em que houve a presena dos escravos, e por isso fatores como influncia de etnias, represso e condies urbanas levaram o culto a apresentar caractersticas regionais em seus ritos: Tambor-de-mina; Cabula; Macumba; Candombl de caboclo; Catimb, pajelana e cura;2. As religies Africanas no Brasil: 2.1 Sincretismo religioso no Brasil: Contexto histrico correto afirmar que foram trazidos diversos grupos culturais da frica, capturados pelos prprios europeus ou por atravessadores africanos que em disputas de tribos, escravizavam seus rivais . De acordo com Ribeiro so trs os grupos trazidos ao Brasil: Yorub chamados nag; Dahomey designados geralmente como geg ; Fanti-Ashanti conhecidos como minas, alm de muitos representantes de grupos menores da Gmbia, Serra Leoa, Costa da Malagueta e Costa do Marfim (Gonalves, 1994). Chegando ao Brasil, tais grupos eram caracterizados no pelas etnias e sim pelos portos nos quais foram embarcados na frica. Tais denominaes no correspondiam necessariamente suas origens (PARS, 2007, p. 25). Na nova terra, fundiram-se as culturas europeia, indgena e africana, num amalgamado de conceitos e significados distintos. Com a fora dominante irrevogvel da Igreja Catlica e da caa s bruxas e rituais considerados mgicos ou luxuriosos, professar a f se fez cada vez mais difcil. Nesta interseo de valores e conceitos, os orixs so denominados como santos catlicos e a ritualizao, permitida pelos senhores e escondeu-se com isso, do Tribunal do Santo Ofcio. Acrescenta Sodr, afirmando que a cultura negro-brasileira emergia tanto de formas originarias quanto dos vazios suscitados pelos limites da ordem ideolgica vigente (SODR, 2005). notrio que a ligao entre os santos catlicos e os orixs que os representam no culto sincrtico fruto da interseo de informaes que geram essa associao, pois ela no aleatria, na qual se observa simbologias semelhantes, seja em personalidade, milagres ou na histria ou mitologia que envolve cada santo e o orix a ele relacionado. 2.2 Deuses africanos e o sincretismo

Exu Santo Antonio; Ogum Santo Antnio e So Jorge no Rio de Janeiro;Oxssi So Sebastio e So Jorge;Obaluai ou Omulu ou Xapan So Lzaro;Ossaim So Benedito, So Roque e So Jorge;Xang So Jernimo, So Joo e So Pedro;Oxum Nossa Senhora da Conceio;Iemanj Nossa Senhora;Ians ou Oy Santa Brbara;Ibeji Santos Cosme e Damio;Nan Santa Ana;Ob Santa Joana DArc, Santa Catarina, Santa Marta;Logun- Ed So Miguel Arcanjo e Santo Expedito;Ew Nossa Senhora das Neves;Oxumar So Bartolomeu;Oxal Jesus Cristo;

3. A frica no Brasil: CandomblAt o Sculo XVIII, o nome mais frequentemente utilizado no Brasil para denominar as religies de origem africana, de acordo com alguns historiadores, foi o calundu, que antecederam as casas de candombl e os terreiros de candombl.Aps a abolio dos escravos e a proclamao da Repblica, veio tambm uma melhor organizao do culto. Contudo, a realidade social modificou-se consideravelmente, com a insero do negro como mo de obra assalariada, exercendo e sofrendo influncia em distintos setores da sociedade (Gonalves, 1994). Sobre este fato afirma-se que trabalhando no eito, no engenho, na mina ou na cidade, os homens e mulheres [africanas (os)] foram deixando sua marca no comportamento, no fazer, no falar e no ser brasileiro. Marca to profunda que hoje nem se sabe da sua origem africana, pois vista e sentida como parte do que somos (SANTANNA, 2003, p.2).3.1 A Organizao social dos terreirosLaos religiosos regem a estrutura social dos terreiros, atravs da famlia-de-santo. Afirma-se que os primeiros terreiros foram fundados por africanos de mesma etnia, e com o crescimento do nmero de iniciados, com o ingresso dos mestios, negros de outras etnias e brancos, a ligao passou a ser pelos laos sagrados.A religio passa a ser uma reproduo da estrutura familiar, com me-de-santo, irmos/irms-de-santo, tios/tias-de-santo e avs/avs-de-santo, numa hierarquia na qual se deve exercer os mesmos valores de uma famlia consangunea, mantendo assim a identidade do grupo. Sobre a disposio espacial dos terreiros, estes reproduzem em escala menor, os moldes africanos, com Exu guardando a entrada e os orixs possuem quartos individuais, sintetizando a diviso do culto por famlia (Gonalves, 1994). Percebe-se que h uma inspirao para reproduzir a estrutura africana original, trazida pela tradio oral, que fundamenta as questes inerentes prtica religiosa . 3.2 As naes do CandomblAssim como nos reinos africanos, onde havia forte identidade cultural e de etnia, o candombl costuma distinguir as formas de culto de acordo com ritos que foram denominados nao, e devido predominncia dos sudaneses no sculo XIX, quando a perseguio ao culto diminuiu, a organizao religiosa dos povos de lngua ioruba, junto com as influncias das demais etnias, suscitou a organizao do candombl. So praticados atualmente os ritos jeje-nag e o angola (Gonalves, 1994). O rito jeje-nag destaca o legado das religies sudanesas e considerado o mais puro ou superior aos demais porque, segundo seus praticantes, as origens foram preservadas. O rito angola diz respeito ao cerimonial congo e cabinda, de acordo com as religies bantos, a mais popular e praticada pelo povo-de-santo, contudo vista pelos membros de outras naes como deturpada devido ao seu vasto panteo (Gonalves, 1994). Faz-se importante observar que na atualidade no h hegemonia de culto entre Brasil e frica, e a religio faz parte do cotidiano da sociedade no mbito cultural, no s religioso. A prtica hoje independe da ancestralidade do ritualista, e sim de sua crena e devoo.4. A Umbanda e suas origensSobre o surgimento da Umbanda, uma religio que podemos dizer nascida no Brasil, afirma o antroplogo Vagner Gonalves:A umbanda, como culto organizado segundo os padres atualmente predominantes, teve sua origem por volta das dcadas de 1920 e 1930, quando kadercistas de classe mdia, no Rio de Janeiro, So Paulo e Rio Grande do Sul, passaram a mesclar com suas prticas elementos das tradies religiosas afro-brasileiras, e a professar e defender publicamente essa mistura, com o objetivo de torn-la legitimamente aceita, com o status de nova religio. (Gonalves, 1994: 106)Aps esse perodo, com o crescimento das referncias cultura afro-brasileira nas diversas camadas da sociedade, seja pelas artes ou produo bibliogrfica, a classe mdia branca se uniu classe pobre, que frequentava a religio. O termo umbanda pode ser derivado do embanda, nome associado ao chefe do culto na cabula, que inclusive forneceu cargos e elementos litrgicos umbanda. Na macumba o termo umbanda designava tambm o chefe do culto. Contudo, pode ser possvel cultivar a ideia de que a umbanda seria uma linha da macumba, que alcanou autonomia e popularidade, passando a ser um culto parte (Gonalves, 1994). 4.1 O KadercismoO kardecismo, sendo praticado por um estrato social mais elevado da populao, autodenominando-se uma religio crist, legitimando a possesso dos espritos e apresentando um discurso racional frente os fenmenos mgicos, serviu como mediador para a constituio da umbanda, que, sob sua influncia, se desenvolveu como religio organizada (Gonalves, 1994).4.2 Codificao umbandistaAlguns kardecistas, insatisfeitos com sua prtica religiosa, aproximaram-se dos ritos da macumba e decidiram cultuar e preferiram os espritos dessa religio, as divindades africanas e indgenas, que eram consideradas como atrasadas. Houve uma depurao do culto para que essas entidades, a princpio caboclos e pretos-velhos, pudessem baixar. Tornaram-se ento centrais na nova religio que se formou, e com isso irmanava todas as raas e classes sociais que formavam o povo brasileiro e apresentou-se como uma forma religiosa intermediria, preservando os conceitos kardecistas de carma, evoluo espiritual e comunicao com os espritos, mostrando-se todavia, aberta ao culto africano (Gonalves, 1994). 4.3 Organizao Burocrtica e legitimao socialDe acordo com o antroplogo Vagner Gonalves, no final da dcada de 1930, j foi possvel observar um movimento umbandista que continha uma ideologia a qual os terreiros se indentificavam. Mesmo com o Estado Novo sendo contra o desenvolvimento dos cultos afro-brasilerios, a nova religio valeu-se do enaltecimento da cultura popular e da valorizao propiciada pelas elites intelectuais e artsticas no pas. provvel, segundo os antroplogos e pesquisadores, que a umbanda no tenha se formado a partir de um nico terreiro, pois havia existncia paralela de culto em diferentes localidades, sem relaes ou influncias diretas entre os praticantes.Foram criadas federaes e em 1941 aconteceu o Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda, realizado no Rio de Janeiro. O segundo congresso aconteceu em 1961. Sendo cada vez mais atuante nos meios de comunicao, empresariais e poltica, a religio atraiu muitos adeptos e como resultado do processo de legitimao social, a umbanda adquiriu permisso legal e apoio institucional do Governo para realizar festas em espaos pblicos. Foi proclamado em 1967 o dia 31 de Dezembro, no Rio de Janeiro, como o Dia dos Umbandistas (Gonalves, 1994).4.4 As entidades brasileiras da UmbandaNa umbanda os orixs so considerados espritos muito evoludos e s descem Terra ocasionalmente, em forma de vibrao. Enquanto no candombl as entidades foram agrupadas procurando preservar as referencias dos grupos tnicos africanos, na umbanda as linhas classificam e organizam a variedade de entidades (Gonalves, 1994).Existem sete linhas dirigidas por orixs principais. Cada linha composta por sete falanges ou legies. O nmero sete devido ao seu valor cabalstico. Algumas dessas linhas so: Linha de Oxal, Linha de Iemanj, Linha de Xang, Linha de Ogum, Linha de Oxssi, Linha das Crianas e Linha dos Pretos Velhos. No existe, entretanto, um consenso entre os vrios terreiros e codificadores da umbanda a respeito da composio dessas linhas e falanges (Gonalves, 1994).Abaixo dos orixs esto os caboclos e os pretos velhos. As entidades Exu e Pombagira so apresentadas como espritos das trevas, que pelo ideal de caridade so incorporados a fim de serem doutrinados e trabalharem a fim de evolurem espiritualmente. H tambm as entidades como z-pilintra, marinheiros, baianos, ciganas, etc., que representam no plano mtico, as diferentes categorias sociais do povo brasileiro (Gonalves, 1994). A umbanda e todo o sincretismo associado s representaes sociais e divinatrias representam a sociedade brasileira e sua histria de formao tnica e a genealogia das associaes culturais e espirituais, numa sntese das crenas e crendices populares, o mito do povo ligado diretamente sua f. 5. Brasil de todos os SantosO Brasil o pas que apresenta um sincretismo que totaliza as camadas da populao e a formao tnica de seu povo.Na msica e demais expresses artsticas, a religio se faz fonte de conceitos e significados dos mais diversos, bem como recebe suas homenagens e referncias. Militncia e defesa da livre prtica do culto fazem parte e caminham de mos dadas com a democratizao e liberdade do povo brasileiro, desde a mais tenra idade desse pas continente. As diversas formas de expresso religiosa afro-brasileira no Brasil podem sugerir a unio das mais distintas formas de cultuar as foras sobrenaturais, e com sua ajuda construir um iderio justo e harmnico em cuja tradio esteja presente a valorizao da miscigenao. Sobre a contribuio cultural, Gonalves acrescenta:Dos xangs do Recife saram os maracatus (...). Dos candombls de Salvador saram os afoxs (...). O samba, tornado smbolo da msica popular brasileira e diretamente relacionado com a festa mais conhecida e divulgada nacionalmente (...), teve sua origem no Rio de Janeiro, a partir dos centros aglutinadores das religies afro-brasileiras. Afirma-se que se o candombl procurou reconstituir nos terreiros a frica no Brasil, a umbanda procurou refazer o Brasil passando pela frica. Destacando o valor de todas as camadas da sociedade, as religies afro-brasileiras trazem tona o valor da fora e da crena popular.

Referncias Bibliogrficas:RIBEIRO, Ronilda Iyakemi. Alma Africana no Brasil: os iorubas. So Paulo: Oduduwa, 1996.SODR, Muniz. A Verdade Seduzida: Por um Conceito de Cultura no Brasil. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.SILVA, Vagner Gonalves da. Candombl e Umbanda: caminhos da devoo brasileira. So Paulo: Selo Negro, 2005.CASCUDO, Lus da Cmara. 1988. Dicionrio do folclore brasileiro. So Paulo, Itatiaia/Edusp.SANTANA, Mrcia. Escravido no Brasil: Os Terreiros de Candombl e a Resistncia Cultural dos Povos Negros: IPHA. Disponvel em: .Internet:http://cidade-do-axe.blogspot.com.br/2012/09/ewa-orixa-da-videncia.html Acessado em 28/11/2012http://ogumdaestrelaguia.blogspot.com.br/2012/04/os-orixas-e-os-santos-catolicos.html Acessado em 28/11/2012http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos/a-questao-do-segredo-no-candomble Acessado em 28/11/2012