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Armando E Hoet; MV, PhD, Dipl ACVPM Director, Veterinary Public

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  • 2

    O projeto "SAPUVETNET III: contribuindo para os Objetivos de

    Desenvolvimento do Milnio, atravs do conceito de "Uma Sade",

    apresenta o primeiro manual de sade pblica veterinria desenvolvido

    em cooperao com a Amrica Latina e a Europa.

    Este manual o resultado da unio de esforos de acadmicos de

    dezasseis universidades da Amrica Latina e da Europa e reflete os

    consensos alcanados sobre os contedos essenciais ao ensino da Sade

    Pblica Veterinria (SPV). Destina-se a fornecer material de base que

    facilite o acesso a uma viso global das principais aes passveis de serem

    praticados, na maioria dos pases, por veterinrios. Destinam-se a

    estudantes, professores e profissionais interessados no campo da sade

    pblica.

    Para a redao do Manual, houve um perodo de discusso e reflexo

    sobre o "currculo" a ser seguido em Instituies de ensino de sade

    pblica veterinria, de modo a capacitar os futuros veterinrios para

    enfrentar os desafios do milnio dentro do marco de "Uma Sade". Neste

    debate, alm de membros do grupo SAPUVETNET, tambm participaram

    colegas de outras instituies, j que os problemas e os planos de estudo

    que se apresentam, foram discutidos atravs da organizao de

    conferncias eletrnicas, conferncias internacionais, seminrios

    regionais e pela avaliao interpares.

    Esperamos que gostem e enviem comentrios e sugestes para que

    futuras edies espelhem essas contribuies e concorram para resolver

    as necessidades de educao para a sade pblica e para reforar a

    cooperao entre a Amrica Latina e a Unio Europeia.

    Realamos e agradecemos a valiosa colaborao e disponibilidade

    evidenciadas pela FAO e OPAS/OMS, durante a vigncia do projeto.

  • 3

    Lista Revisores externos

    Coordenador: Armando E Hoet; MV, PhD, Dipl ACVPM Director, Veterinary Public Health Program

    REVISOR Grau

    Acadmico INSTITUIO PAS

    Alberto Medina MV, PhD Faculdade de Cincias Veterinrias Universidade Complutense de Madrid

    Espanha

    Antonio Landaeta-

    Hernandez MV, MSc, PhD

    Departamento de Produccin e Industria Animal, Facultad de Ciencias Veterinarias, La Universidad del Zulia

    Venezuela

    Argenis Rodas-

    Gonzalez MV, MSc, PhD

    Lacombe Research Centre, Agriculture and Agrifood Canada (AAFC)

    Canada

    Armando E Hoet MV, PhD,

    Dipl ACVPM

    Director, Veterinary Public Health Program Department of Veterinary Preventive Medicine College of Veterinary Medicine The Ohio State University

    Estados

    Unidos

    Audrey Torres MV, PhD Departamento de Produccin Industrial y Animal, Facultad de Ciencias Veterinarias, Universidad Centro Occidental Lisandro Alvarado

    Venezuela

    Claudia Narvaez MV, MSc, PhD Lacombe Research Centre, Agriculture and Agrifood Canada (AAFC)

    Canada

    Dubraska V Diaz-

    Campos MV, PhD

    Veterinary Microbiology and Pathology Department, College of Veterinary Medicine, Washington State University / Washington Animal Disease Diagnostic Laboratory.

    Estados

    Unidos

    Jorge Crdenas Lara MVZ, MSP. Facultad de Medicina Veterinaria y Zootecnia de la Universidad Nacional Autnoma de Mxico

    Mxico

    Katinka DeBalogh MV, MSc, PhD Programa de Salud Publica Veterinaria, Servicio de Salud Animal, Organizacin de las Naciones Unidas para la Alimentacin y la Agricultura (FAO).

    Itlia

    Rafael Olea Prez MVZ. PhD. Facultad de Medicina Veterinaria y Zootecnia de la Universidad Nacional Autnoma de Mxico

    Mxico

    Ral E. Vargas Garca MVZ, MSP,

    MPVM.

    Departamento de Medicina Preventiva y Salud Pblica. Facultad de Medicina Veterinaria y Zootecnia Universidad Nacional Autnoma de Mxico

    Mxico

    Stella Maris Huertas MV, MSc. Facultad de Veterinaria Universidad de la Repblica del Uruguay

    Uruguay

  • 4

    NDICE GERAL

    Sade Pblica Veterinria: desde as suas origens at ao Sc. XXI pgina 7

    Principais ferramentas para estudar e intervir em fenmenos de Sade

    Pblica Veterinria

    pgina

    26

    Anlise de Risco pgina 44

    A influncia das alteraes climticas e ambientais no surgimento de

    doenas emergentes e reemergentes.

    pgina

    88

    Segurana alimentar, qualidade e higiene dos alimentos pgina 110

    Impacto ambiental dos resduos gerados nos sistemas de produo

    animal

    pgina

    132

    Biodiversidade: gesto da fauna e meio ambiente e sua relao com a

    sade pblica

    pgina

    158

    Zoonoses emergentes, reemergentes e negligenciadas pgina 174

    Resistncia bacteriana: estratgias para o seu controlo, boas prticas e

    uso prudente de antimicrobianos

    pgina 204

    Bem-estar animal e sade pblica pgina 229

    Papel das cincias veterinrias em situaes de desastre pgina 241

  • 5

    NDICE DE TABELAS/QUADROS

    Sade Pblica Veterinria: desde a sua origem at ao Sec XXI

    Quadro 1. Fatores com influncia na sade pblica veterinria no Sc. XXI

    pgina

    21

    Quadro 2. Competncias gerais e prticas do m.v. de sade pblica veterinria

    pgina 24

    Quadro 3. Disciplinas necessrias para alcanar as competncias especficas de sade pblica

    pgina 25

    Quadro 4. Proposta de currculo em S.P.V. pgina 26

    Anlise de Risco

    Tabela 1. Perigos que se podem encontrar ou detetar associados aos alimentos

    pgina 58

    Tabela 2. Lista de alguns agentes patognicos que podem afetar o comrcio internacional.

    pgina 62

    Tabela 3. Estimativa de risco pgina 75

    A Influncia das alteraes climticas no aparecimento de doenas re/emergentes

    Tabela 1. Alguns exemplos de fatores climticos e ambientais que influenciam a transmisso e a distribuio das doenas transmitidas por vetores

    pgina

    108

    Biodiversidade: gesto da fauna e meio ambiente e sua relao com a sade pblica

    Tabela 1: Posio dos pases pgina 170

    Papel das cincias veterinrias em situaes de desastre

    Tabela 1. Principais desastres no epidmicos com impacto em animais, na Amrica do Sul, durante as duas ltimas dcadas.

    pgina 254

    Tabela 2. Etapas ou componentes do ciclo de um desastre ou emergncia.

    pgina 258

    Tabela 3. Fatores que facilitam o surgimento de uma doena durante ou posterior a um desastre. Exemplos de doenas zoonticas e seus fatores predisponentes.

    pgina 261

    Tabela 4. Fases e atividades de ateno veterinria em desastres. pgina 263

  • 6

    NDICE DE FIGURAS

    Sade Pblica Veterinria: desde a sua origem at ao Sec XXI

    Figura 1. A domesticao como incio da relao interdependente

    entre os animais e a sobrevivncia do homem. pgina 8

    Figura 2. Interveno e contribuio da veterinria na sade

    pblica. pgina 14

    Figura 3. Relaes entre os setores de sade pblica veterinria pgina 20

    Anlise de Risco

    Figura 1. Esquema dos diferentes componentes duma anlise de

    risco pgina 52

    Papel das cincias veterinrias em situaes de desastre

    Figura 1. Trabalhos de contingncia aps a derrocada de um caminho rural, causado por chuvas intensas (Foto: Diego Soler-Tovar).

    pgina 253

    Figura 2. Animais de produo como os bovinos podem ficar atolados aps inundaes ou deslizamentos de terras (Foto: Diego Soler-Tovar)

    pgina 254

    Figura 3. Os incndios florestais podem ser causados acidentalmente ou intencionalmente pela atividade humana. (Foto: Diego Soler-Tovar).

    pgina 254

    Figura 4. Imagem relativamente frequente nos pases andinos, construes originadas por migraes de pessoas para zonas periurbanas, onde o parque habitacional deficiente, vulnervel a desastres naturais e ao aumento de contacto com ameaas de tipo biolgico (Foto: Diego Soler-Tovar).

    pgina 256

    Figura 5. As carcaas de animais mortos em situaes de desastre devem ser avaliados para decidir o seu destino/modo de eliminao. (Foto: Diego Soler-Tovar).

    pgina 265

  • 7

    S

    SADE PBLICA VETERINRIA: DESDE AS SUAS ORIGENS AT AO SCULO XXI

    COMPETNCIAS A ADQUIRIR PELOS ESTUDANTES:

    * Conhecer o contexto histrico e os antecedentes da relao homem-animal

    * Identificar as contribuies especficas da cincia veterinria para a sade pblica

    * Reconhece e dominar os desafios dos veterinrios na Sade Pblica Veterinria (SPV) no

    sculo XXI

    * Compreender o papel estratgico da academia para enfrentar os desafios do sculo XXI em

    SPV

    Pergunta orientadora:

    Sabe quais so as atividades em que os animais influenciem a sade humana e quando que

    comeou essa relao?

    A RELAO HOMEM-ANIMAL E AS ORIGENS DA SADE PBLICA VETERINRIA (SPV) NA

    HISTRIA DAS CINCIAS VETERINRIAS

    Desde as sociedades mais primitivas que uma das atividades mais importantes tem sido a

    procura de alimentos (coleta de razes, frutos e sementes, caa de pequenos animais e pesca).

    Adicionalmente, a conservao e proteo destes alimentos de forma a evitar perdas e doenas

    tem sido uma preocupao constante das diferentes culturas.

    Desde a sua origem, o aproveitamento do meio ambiente pelo homem, isto , o uso das outras

    espcies vivas e outros elementos da natureza e do seu habitat tem sido inquestionvel no

    progresso do homem atravs dos vrios estgios da sua evoluo.

    A domesticao animal representa um marco fundamental no desenvolvimento da sociedade,

    do esprito de sade comunitria, e aquilo que hoje reconhecido como sade pblica

    veterinria. Para o seu bem-estar e sobrevivncia, o homem utilizou os recursos existentes sua

    volta, atingindo diferentes graus de adaptao e desenvolvimento (1)

    Luis Carlos Villamil, MV, MSc; PhD

    Facultad de Ciencias Agropecuarias, U. de la Salle, Bogot,

    Colombia

  • 8

    Figura 1. A domesticao como o incio da relao de interdependncia entre animais e a

    sobrevivncia humana

    Devido relao estreita entre o homem e os animais ao longo da histria, a sade e a doena

    em ambas as populaes esto intrinsecamente relacionadas. A sade pblica veterinria deve

    a sua origem e o seu desenvolvimento a esta relao.

    A estreita ligao de convivncia entre o homem e os animais, desde a sua origem at hoje,

    permitiu a subsistncia, promoveu o conhecimento, impulsionou a indstria, desenvolveu a

    agricultura, a comunicao, o transporte, a cincia e a tecnologia. Diferentes culturas do mundo

    antigo referem-se participao social proeminente dos veterinrios e sua importncia para

    a sade e o bem-estar da comunidade.

    Desde a antiguidade, algumas das doenas, entre elas a raiva, foram identificadas como de

    interesse para a comunidade; na Babilnia, o cdigo Eshunna (2300 a.C.), destaca os cuidados

    que se devem ter para evitar que um co doente morda os vizinhos e que se morder algum e

    a pessoa morrer, o proprietrio dever pagar uma alta indemnizao ou multa. Na Mesopotmia

    (1700 a.C.), o Cdigo de Hamurabi, indica vrios aspetos da prtica mdica, honorrios e

    punies dos mdicos, detalhados nos artigos 224 e 225 com os procedimentos para o

    tratamento de doenas de animais, os honorrios que eles devem receber pelo seu trabalho, e

    a respetiva punio quando falhem (Reyes et al, 2006).

    O papiro Kahun, o mais antigo documento escrito encontrado em 1890 sobre a prtica

    veterinria e que faz parte da cultura egpcia (1800 a.c.) descreve os factos relacionados com a

    arte da cura dos animais, indicando os procedimentos de diagnstico, prognstico, sintomas e

    tratamento de doenas em bovinos, candeos, peixes e aves. Durante este perodo, o

    embalsamento permitiu o desenvolvimento de conhecimentos em anatomia comparada

    (Schwabe, 1984).

    Benefcios da domesticao.

    O incio da Sade Pblica

    Veterinria.

    Aumentar a fora de trabalho, para a caa e a guerra. Utilizar animais, tais como o cavalo, burro e lama para o transporte.

    Para alimentao e nutrio.

    Fornecer calor, peles, couro e l

    Desporto e lazer

    Para companhia

  • 9

    As prticas relacionadas com a proteo dos alimentos e a preveno de zoonoses tambm vm

    de longe. As sagradas escrituras constituem uma referncia a tais prticas. Os animais que

    podem servir para a alimentao so os que tm o casco fendido e que ruminam. Quer isto dizer

    que os seguintes animais no devem ser ingeridos: o camelo que rumina mas no tem o casco

    fendido; o coelho (ou o texugo) que rumina mas no tem casco fendido; a lebre que tambm

    rumina mas no tem casco fendido; o porco que ainda que tenha o casco fendido no rumina.

    No devero comer a sua carne nem sequer tocar nos seus cadveres. alimento que vos

    proibido... No que se refere s aves, so as seguintes as que no devem comer: a guia, o

    abutre... Mas tudo o mais que voe e que tenha quatro patas proibido. ... Nenhum inseto que

    voe, que tenha quatro patas, devero comer; com exceo de todos os que saltam... (Levtico).

    Nestes textos, atribui-se carne de certos animais ligaes com doenas humanas, de modo

    que os rituais estabelecidos para o abate desses animais, favoreciam a conservao da carne e

    a inspeo meticulosa do estado sanitrio das vsceras e da carne, para aprovar o seu consumo

    sem afetar o consumidor. Indiscutivelmente, esta foi uma das primeiras prticas veterinrias em

    sade pblica.

    Veterinrio um termo que nasceu no primeiro sculo da nossa era, na obra: Res Rustica (Os

    trabalhos do campo) de Lucius Junius Moderatus Columela. A cincia veterinria desde as suas

    origens e ao longo do seu desenvolvimento apresenta vrios aspetos histricos, onde

    convergem os interesses comuns sob o ponto de vista do conhecimento mdico, a sade das

    populaes animais e o seu impacto sobre as comunidades humanas e o meio ambiente.

    Desde o seu incio, o conhecimento mdico e veterinrio estiveram intimamente relacionados

    com a figura mitolgica do centauro Quron, metade homem e metade animal, ser justo e

    hospitaleiro, educador de heris, mdicos e cirurgies. Quiron representa o lendrio fundador

    de veterinria. Ele foi o mentor e o pai adotivo de Esculpio, deus da arte de curar, o pai de

    Hygeia, a deusa da sade a partir da qual deriva o termo higiene. Em Quron reflete-se o

    conhecimento mdico, o conhecimento veterinrio, a sade comunitria, mas tambm a

    vocao docente. Representar a origem mtica da profisso com Quron como lendrio

    fundador, assinala dois elementos importantes: o ensino da arte de curar e a transferncia de

    conhecimento com uma projeo na sade comunitria. No por coincidncia, que tambm

    desde a lenda, o veterinrio identificado com as contribuies para a clnica individual e a

  • 10

    sade coletiva; o caduceu ou basto de Esculpio o smbolo mundial da profisso mdica e

    veterinria.

    No seu incio, a educao veterinria foi muito influenciada pelo pensamento Iluminista do

    sculo XVIII e atravs da j referida razes cientficas, baseadas fundamentalmente a experincia

    acumulada dos sculos anteriores, que foram dedicados ao cuidado dos animais. O primeiro

    centro francs recuperou o termo "veterinria", usado pela primeira vez por Columela (Lucius

    Julius Moderatus), na sua obra Res Rustica, durante o primeiro sculo (d.c.), que tinha cado em

    desuso durante a Idade Mdia.

    As doenas do gado bovino apresentaram-se com excecional intensidade nos sculos XVII e

    XVIII. Em 1609 a peste bovina espalhou-se para todos os pases da Europa Central.

    A primeira escola veterinria foi fundada em Lyon, em fevereiro de 1761, durante o reinado de

    Lus XV. A segunda foi a de Alfort, fundada em outubro de 1766. Claude Bourgelat, fundador da

    escola de Lyon, participou assiduamente em atividades cientficas que se realizavam em Frana

    na segunda metade do sculo XVIII.

    As publicaes "Nouveau Trait de Cavalerie" e "lments d'hippiatrique" fizeram dele um dos

    principais autores do seu tempo, destacando-se pela metodologia cientfica, adquirida atravs

    do seu trabalho e cooperao com os cirurgies de Lyon, com quem estudou a anatomia equina.

    Em 1761 em Frana, Lus XV promoveu a preveno das doenas do gado, proteo de pastagens

    e formao de agricultores. Realizar esta reforma agrria implicou, entre outras coisas, criar uma

    outra escola veterinria em Lyon e nomear Bourgelat como o diretor da mesma. Dois anos

    depois, um decreto real nomeava Bourgelat como "Diretor e Inspetor Geral da Escola Veterinria

    de Lyon e de todas as escolas veterinrias criadas no reino" e mais tarde como "Comissrio Geral

    das cavalarias do Reino".

    Os fundadores das escolas veterinrias da Europa foram formados em Lyon e em Alfort nos finais

    do sculo XVIII. Alguns eram franceses que deixaram o pas depois da sua formao e outros

    eram estrangeiros que foram enviados para Frana pelos governos dos seus pases para

    aprender os princpios fundamentais da nova arte da medicina veterinria.

  • 11

    Duas frases extradas do livro "Regulamentos para as Escolas Veterinrias Reais" (publicado em

    1777, dois anos antes de sua morte), o seu "testamento filosfico", assinala a sua contribuio:

    As portas das nossas escolas esto abertas a todos aqueles cuja misso garantir a preservao

    da humanidade e que adquiriram, atravs do renome que alcanaram, o direito de frequenta-

    los para estudar a natureza, procurar analogias e verificar ideias cuja confirmao pode ser til

    para a espcie humana.

    Os problemas comuns aos seres humanos e animais e a preocupao com a segurana alimentar

    eram evidentes j no sculo XVII, quando foi aceite que a sade dos animais influencia a sade

    humana e o meio ambiente; na Alemanha, Ludwig von Seckendorf formulou um programa

    sanitrio estatal, em que se estabelecia a inspeo de alimentos e outras medidas para proteger

    a populao de doenas infeciosas.

    Entre 1779 e 1817, o alemo Johan Peter Frank, publicou uma srie de trabalhos sobre sade

    pblica que abordavam temas como doenas de animais e consumo de carne. Em 1848, foram

    estabelecidos em cada municpio os Conselhos de Sade e foram contratados os primeiros

    veterinrios por um perodo de quatro anos.

    COMO SE DEFINE SADE PBLICA VETERINRIA

    Entende-se por sade pblica como a atividade que visa melhorar a sade das populaes.

    Segundo a definio da OMS (1978), a mesma consiste em "todas as atividades relacionadas

    com a sade e doena de uma populao, o estado sanitrio e ecolgico do meio ambiente, a

    organizao e o funcionamento dos servios de sade e da doena, a planificao e gesto dos

    mesmos e a educao para a sade. As suas atividades devem traduzir-se no aumento de

    esperana de vida do homem atravs da promoo da sade, da preveno e do controlo de

    doenas, a melhoria na produo e sanidade de alimentos e a proteo do meio ambiente (OMS,

    1981, 2002).

    Do ponto de vista das cincias veterinrias, a SPV refere-se s "reas de Sade Pblica, nas quais

    a medicina veterinria tem um interesse especial (Schwabe, 1984)" e, portanto, o veterinrio

    trabalha em atividades em que o seu conhecimento pode contribuir diretamente para a soluo

    de problemas de sade e doenas da espcie humana (OMS / WHO, 2002).

  • 12

    A Reunio Interamericana a Nvel Ministerial, em Sade e Agricultura, RIMSA, de 2001 props

    que "a SPV um componente das atividades de sade pblica, dedicada aplicao de

    conhecimentos, habilidades e competncias ou aptides de medicina veterinria para a

    promoo e proteo da sade humana". Neste sentido, uma disciplina com um amplo campo

    de ao, que visa alcanar estes objetivos atravs de intervenes em sade e produo animal

    (OPAS, 2001).

    B- CAMPOS DE AO DA SADE PBLICA VETERINRIA (SPV)

    O objetivo final da medicina veterinria no reside nas espcies animais, que o que o

    veterinrio geralmente faz. A sua principal finalidade reside definitivamente no homem, e

    em toda a humanidade". Martinez Baez citando Schwabe, 1986

    Aps vrios anos de estudo da SPV, no projeto Alfa da Unio Europeia SAPUVETNET II, Ortega

    et al, (2005), apresentaram as seguintes consideraes relacionadas com as suas atividades e

    intervenes:

    A SPV tem um amplo campo de ao com diferentes objetivos:

    b. Deteo e compreenso de um processo adverso que surja (vigilncia

    epidemiolgica) e que necessrio controlar ou eliminar.

    c. Identificao de situaes de risco potencial (anlise de risco) e a sua gesto de

    modo a evitar a sua ocorrncia ou para minimizar os seus efeitos, tanto do ponto de

    vista sanitrio como econmico.

    A interveno veterinria na proteo da sade da comunidade concentra-se em trs situaes:

    d. Processos "epidmicos", tanto de "zoonoses", doenas ou infees que se

    transmitem de forma natural de animais para seres humanos ou vice-versa (Toma

    et al, 1991, Thrusfield, 1997; Acha e Szifres, 2001), como de "no zoonoses" doenas

    de animais que, apesar de no serem transmitidas ao homem, tm um impacto

    negativo sobre a economia por provocarem perdas significativas de produo e a

    reduo da disponibilidade alimentar das populaes humanas, ou alterar o

    ecossistema.

  • 13

    e. Processos "no-epidmicos", em que apesar da inexistncia de uma doena animal,

    provocam a morte ou o desaparecimento da populao animal numa rea,

    causando problemas para a subsistncia humana ou para o meio ambiente. Tratam-

    se de "catstrofes" de origem "natural", como o caso de terremotos, erupes

    vulcnicas, inundaes e secas, ou de catstrofes "induzidas pelo homem", como

    o caso de guerras, fugas de produtos qumicos e radioativos, derrames txicos ou

    algumas formas de bioterrorismo.

    f. "Consequncia da produo animal". Atividades relacionadas com a gesto e o

    tratamento de animais que podem afetar os consumidores. A resistncia aos

    antibiticos, causada pela utilizao inadequada de antibiticos na produo animal

    (usado em muitos casos como promotores de crescimento), e por outro lado, o

    "bem-estar animal" de que depende em grande medida a qualidade da produo

    destinada ao consumo humano so situaes relevantes na sociedade atual.

    CONTRIBUIES CONCRETAS DAS CINCIAS VETERINRIAS PARA A SADE PBLICA

    A sade pblica veterinria encontra-se numa posio nica em relao ao bem-estar coletivo,

    e o seu ensino deve preparar o veterinrio para que possa contribuir para a luta contra as duas

    maiores catstrofes da humanidade: a fome e a doena. Isso, sem ignorar os esforos realizados

    pelos veterinrios para a construo das bases da economia moderna de alguns pases

    nitidamente rurais.

  • 14

    Com base no exposto, a Figura 2 mostra as contribuies da cincia veterinria para o bem-estar

    social.

    Figura 2. Interveno e contribuio da cincia veterinria para a sade pblica

    A promoo de servios de sade animal

    Esta uma atividade tradicional, que tem merecido a ateno de governos e veterinrios em

    todo o mundo. Numa populao, a sade animal alcanada atravs da adoo e adaptao de

    avanos tecnolgicos disponveis, relacionados com a preveno e o controlo das doenas dos

    animais com importncia econmica e zoontica, com o melhoramento gentico, a

    disponibilidade de forragem e a gesto ambiental.

    A Segurana alimentar

    A segurana alimentar definida pela FAO como "a disponibilidade local de alimentos e sua

    distribuio, e o acesso das pessoas aos alimentos para uma vida saudvel." Este conceito

    abrange no apenas a produo de alimentos saudveis dentro de um pas, mas tambm os

    fatores que interagem desde o momento da produo at ao consumo final dos alimentos: a

  • 15

    comercializao, a transformao industrial e os fatores desestabilizadores ou adversos, tanto

    para a produo agropecuria como para a indstria alimentar.

    A segurana alimentar constitui uma responsabilidade importante dos governos, que devem

    estabelecer um sistema de abastecimento de alimentos, procurando melhorar a qualidade e

    segurana dos produtos destinados ao consumo, ajudando a garantir o direito de todos os seres

    humanos a "um padro de vida adequado que lhes assegure a sade e o bem-estar" (OMS, 1981,

    2002).

    A segurana alimentar enquanto um plano de ao representa um elemento central da poltica

    social de qualquer pas e nela a sade pblica veterinria desempenha um papel fundamental,

    na medida que aborda a problemtica de sade no s de ponto de vista mdico, mas tambm

    do ponto de vista de sade animal e da produo de alimentos seguros, devido sua relao

    com o setor agrcola. Embora aparentemente se trate de um problema econmico, na verdade

    tambm um problema de Sade Pblica Veterinria.

    A proteo de alimentos destinados ao consumo humano

    As Doenas de Origem Alimentar (DOA), so consideradas um dos problemas mais graves de

    sade pblica. O seu efeito no se limita ao setor de sade, mas tambm afeta outros domnios:

    econmicos, de mercado, de sade animal, e de saneamento ambiental.

    J se identificaram mais de 250 DOAs, a maioria causadas por bactrias, vrus e parasitas. Muitas

    zoonoses so transmitidas por alimentos, outras so causadas por toxinas ou substncias

    qumicas usadas na agricultura, tais como pesticidas, aditivos e resduos de medicamentos

    veterinrios.

    Os programas de proteo de alimentos desempenham um papel importante no contexto da

    segurana alimentar, pois garantem a segurana e a qualidade dos alimentos e evitam doenas

    humanas transmitidas por alimentos de origem animal. A educao e promoo da sade em

    funo dos hbitos alimentares locais, o controle ante e post mortem nas unidades de

    processamento e refrigerao, a inspeo sanitria de produtos de origem animal para consumo

    nacional e para exportao, o controlo e a assessoria integral cadeia produtiva, so aes que

    devem ser coordenadas entre os diferentes setores: sade, agricultura, meio ambiente e

  • 16

    comrcio externo. A SPV constitui o elemento facilitador e a "interface" que agiliza o fluxo de

    comunicao entre essas instituies.

    A Vigilncia, preveno e controlo de zoonoses e outras doenas transmissveis comuns ao

    homem e aos animais

    Os servios veterinrios pblicos e privados, responsveis pela preveno, controlo e eventual

    erradicao das doenas animais atravs de informao para sistemas de vigilncia

    epidemiolgica, estabelecem prioridades na classificao das doenas de acordo com os seus

    efeitos: as que causam prejuzos produo e afetam a rentabilidade e disponibilidade dos

    alimentos e portanto tm impacto nos programas de segurana alimentar; as zoonoses, que

    fazem parte das atividades tpicas da SPV; e as doenas que implicam restries ao comrcio

    internacional de animais, dos seus produtos e subprodutos, e que esto sujeitas a acordos

    comerciais e sanitrios a nvel global.

    Algumas das doenas zoonticas tornaram-se um campo de ao para a sade pblica, e

    continuam a ser prioritrias. Com as mudanas nos padres de alimentao e estilos de vida, as

    doenas zoonticas adquiriram ainda maior relevncia. O seu controlo requer estratgias

    inovadoras, com elevado contedo tcnico prprio do mundo ps-moderno, mas tambm

    estreitamente relacionadas com as atuais circunstncias sociais e econmicas.

    O estudo da perceo pblica de zoonoses e os programas de preveno e controlo em pases

    como a Colmbia, devem ser inseridos no contexto da medicina tropical, considerado

    simultaneamente com as DOAs, doenas infeciosas e parasitrias, como tema de estudo e como

    rea de nfase em programas de ps-graduao.

    Meio ambiente

    A proteo e o cuidado com o meio ambiente, esto relacionados com os potenciais riscos para

    a sade pblica resultantes da produo, transformao, comercializao e consumo de

    produtos de origem animal e da criao de animais, da presena de pragas e animais

    "sinantrpicos". Deve-se ter em conta os processos de transformao de insumos, eliminao

    de dejetos e o uso de agroqumicos, dadas as potenciais consequncias negativas que estes

    processos podem ter sobre os utilizadores dos alimentos produzidos.

  • 17

    O efeito dos inseticidas, pesticidas, fertilizantes, anti-parasitantes, etc, sobre o teor de resduos

    em ovos, carne e leite; o uso de hormonas, antibiticos e outros promotores de crescimento e

    o destino dos efluentes de produo primria e da indstria, e o seu potencial impacto na

    deteriorao da ecologia devem ser objeto de especial ateno e vigilncia.

    O desenvolvimento de bio modelos

    Os bio modelos (animais produzidos cientificamente, para serem usados em investigaes

    biolgicas) de qualidade, devem ser produzidos atravs da partilha de recursos e centralizao

    de produo e distribuio, garantindo desta maneira a qualidade e a consistncia. Da mesma

    forma, estes bio modelos so fundamentais para a existncia de avanos tecnolgicos

    adequados nas cincias, consistentes com os princpios da biotica que esto a liderar a

    investigao e prestao de servios de sade pblica.

    Para a substituio gradual de algumas espcies animais em certas atividades e estudos

    necessrios no ensino, na investigao, no diagnstico e no controlo de qualidade na indstria,

    na produo biolgica e nas reas farmacuticas mdicas e veterinrias existe a tendncia de

    desenvolver tecnologias in vitro, para as quais necessria uma elevada participao da

    profisso veterinria e dos servios de SPV.

    A preveno e cuidados em situaes de catstrofes

    Neste tpico, animais e servios de sade especialmente os de SPV, encarregam-se de proteger

    os alimentos submetidos a riscos de contaminao, bem como da eliminao de cadveres de

    animais; do controlo de reservatrios e vetores; da preveno e controlo de zoonoses; do

    armazenamento, gesto e distribuio de vacinas e outros produtos biolgicos e medicamentos;

    da limpeza e desinfeo das instalaes afetadas; do controlo de alimentos doados e da

    classificao dos reagentes e medicamentos; bem como da inspeo de cozinhas comunitrias,

    entre outros.

    Adicionalmente, os servios de sade animal devem desempenhar um papel importante na

    preservao da fauna, na planificao produtiva e no controlo de epidemias de origem animal,

    em situaes de seca extrema, incndios, inundaes, terremotos ou outros desastres naturais

    ou catstrofes de origem humana que afetam o movimento e concentrao de gado. Os

    desastres biolgicos relacionados com a introduo de doenas exticas ou o uso de armas

  • 18

    biolgicas, devem encontrar nesses servios a primeira barreira organizada de conteno. Isto

    constitui outro caso de cooperao intersectorial programada dos elementos ligados sade e

    agricultura (Villamil e Romero, 2003).

    A sade mental e os valores humanos

    A relao entre o co e o homem tem uma histria de mais de 14.000 anos, e sem dvida a

    mais ampla e generalizada relao simbitica entre duas espcies diferentes. Algumas das

    relaes entre o homem e os animais (peixes, canrios, cavalos e outras espcies exticas) esto

    enraizadas numa profunda razo cultural, religiosa ou costumes antigos. No entanto, h outras

    que so claramente o resultado de intercmbio ou tendncias existentes de isolamento dos

    indivduos e de sociedades e ambientes mais impessoais.

    As intervenes dos veterinrios nesta rea podem contemplar uma diversidade de

    possibilidades com impacto social. Na verdade, o alvio do sofrimento dos animais deve

    sensibilizar a nossa preocupao pelo alvio do sofrimento humano. O veterinrio o mais

    qualificado para entender e arbitrar tais implicaes e questes sociais, como o caso da

    produo intensiva de animais, os procedimentos de vivisseco e as tendncias dos

    consumidores face a dietas vegetarianas quando defendem a proteo e defesa da vida animal.

    Por outro lado, o mdico veterinrio um elemento chave para colaborar com os profissionais

    de sade, nos processos de recuperao de estados de incapacidade fsica e mental de pacientes

    humanos, com doenas de origem gentica e casos de doenas crnicas ou terminais, onde o

    contacto com os animais e o apoio obtido tm mostrado resultados prticos.

    Turismo

    Atualmente, o turismo uma das maiores indstrias o mundiais, com crescimento constante em

    termos de volume, extenso geogrfica e qualidade. Milhes de pessoas movimentam-se nos

    seus pases ou entre diferentes continentes com fins comerciais, desportivos ou lazer, graas

    aos avanos dos meios de transporte coletivos e facilidades de financiamento.

  • 19

    O turismo um fenmeno econmico, social e cultural, com implicaes significativas para a

    sade e bem-estar dos visitantes e residentes. Devido s mudanas ambientais e alimentares,

    existem muitas pessoas vulnerveis que apresentam problemas de sade relacionados com as

    suas viagens. Um nmero significativo de viajantes desenvolve doenas transmitidas por

    alimentos que se manifestam de forma aguda nos locais visitados, ou aps o regresso para o seu

    local de origem. Outra possvel situao quando o viajante portador de uma doena infeciosa

    e torna-se um transmissor da mesma.

    Neste contexto, a SPV desempenha um papel com algum protagonismo. Os cuidados com o

    meio ambiente e a proteo dos alimentos em zonas tursticas constituem uma prioridade, no

    s em termos da preveno de doenas transmitidas por alimentos, DOAs, mas tambm para a

    diminuio dos efeitos negativos sobre a economia das zonas tursticas e a indstria alimentar,

    atravs de programas de vigilncia e controlo de DOAs e programas de defesa do consumidor,

    atravs da participao comunitria.

    A SPV e os Objetivos do Milnio

    A reduo da pobreza e da fome uma rea na qual a sade animal e a SPV so consideradas

    como crticas. Desde h muitos anos que se considera que a produo animal essencial para a

    reduo da pobreza e da fome. Questes relacionadas com a sade animal constituem muitas

    vezes um fator limitante para que a produo animal possa cumprir o seu papel na eliminao

    da pobreza e, portanto, na alimentao dos seres humanos (Delgado et al 1999). Por isso, alm

    dos efeitos diretos sobre a produo, se evidencia a problemtica de sade pblica; no seu

    conjunto estamos a referir segurana alimentar, o que envolve aspetos relacionados com a

    oferta (quantidade e qualidade) e procura (acesso).

    O acesso da populao infantil a alimentos saudveis contribui para o seu bom desenvolvimento

    e garante que possam frequentar e funcionar de forma adequada na escola primria e

    secundria.

    No que se refere promoo da igualdade de gnero e "autonomia" das mulheres, atravs da

    sua participao na criao de animais, especialmente espcies de menor porte sobre os quais

    elas tm controlo direto at fase de comercializao, que conseguem ter uma fonte de

    rendimento, proporcionando-lhes alguma independncia financeira. Esta atividade ainda mais

  • 20

    relevante em situaes de pobreza de mulheres chefes de famlia. Existem experincias em

    pases latino-americanos para a emancipao da mulher, tais como clube de mes, programas

    de mes chefes de famlia, programas municipais com mulheres empresrias, etc.. As doenas

    de animais com alta mortalidade so as principais ameaas para estas atividades de

    autonomizao das mulheres.

    Neste contexto, o melhoramento da sade materna e a reduo da mortalidade infantil esto

    intimamente relacionados com a SPV, no s em termos de produo animal, enquanto uma

    fonte de rendimento e de protena animal (leite, queijo, carne) que so essenciais para as mes

    bem como para as crianas; mas tambm em termos de controlo de doenas de animais, entre

    as quais zoonoses que tm um efeito negativo sobre a populao infantil, como o caso da

    mortalidade por raiva, parasitas e doenas diarreicas, etc.

    DESAFIOS PARA A SADE PBLICA EM VETERINRIA NO SCULO XXI

    A sade no o nico cenrio com a qual a SPV tem de negociar, tambm essencial estabelecer

    a reciprocidade e o dilogo com a economia, a educao, a cincia ambiental, a poltica e a

    cultura. Isto a fim de melhorar as condies de vida humana, a sanidade animal e a proteo do

    meio ambiente.

    Na Figura 3, os dois setores que caminham juntos e so os mais reconhecidos como recetores e

    transmissores de aes na sade pblica veterinria so o sector da sade e o setor agrcola,

    razo pela qual considera-se que a SPV intersectorial e pela qual SPV enfrenta grandes

    desafios.

    Dilogo

    permanente

    SADE

    ANIMAL

    SADE

    HUMANA Sade

    Pblica

    Setor de

    sade

    Setor

    Agrcola

  • 21

    Figura 1 . Relaes entre setores na sade pblica veterinria

    No novo milnio, inmeros fatores sociais, econmicos, culturais e polticos induziram

    mudanas nas atividades veterinrias de sade pblica. Em 2002, um grupo de estudo da OMS

    reuniu-se para destacar e analisar os aspetos mais relevantes que mudaram as atividades de

    sade pblica (Quadro 1).

    Quadro 1. Fatores que influenciam a sade pblica veterinria no sculo XXI (12):

    Mtodos de produo

    Maior intensidade produtiva Produo orgnica Engenharia gentica Uso de aditivos e antibiticos Promotores de crescimento Ruralizao de reas urbanas Eliminao de resduos

    Cadeias alimentares e de produo

    Mudana da abordagem individual para a comunitria Maior responsabilidade de todos os intervenientes na cadeia Desenvolvimento e implementao de novas tecnologias para produo, preservao e

    comercializao Novas exigncias dos consumidores

    Comrcio e viagens

    Comrcio internacional de animais Mudanas nos hbitos alimentares durante as viagens Globalizao Turismo

    Interao entre humanos e animais

    Novos riscos associados ao turismo em reas selvagens O papel dos animais de estimao Aumento do nmero de animais em reas urbanas e suburbanas Aplicaes biomdicas

    Frequncia de Desastres

    Emergncias no epidmicas como: furaces, terremotos, inundaes, acidentes nucleares e industriais.

    Diminuio de recursos

    Reduo de fundos governamentais Tendncia para a privatizao dos servios Desenvolvimento de novos mecanismos para prestao de servios de SPV Fraca perceo pblica da SPV no sistema de sade e da comunidade

  • 22

    A ACADEMIA COMO UMA ESTRATGIA PARA ENFRENTAR OS DESAFIOS

    No contexto veterinrio, deve-se criar uma "Cultura de Sade Pblica Veterinria", que divulgue

    o papel do veterinrio perante situaes muito diversas de promoo da sade e preveno de

    doenas, que engloba desde desastres tais como terremotos, inundaes ou guerras, mais

    frequentes em pases em desenvolvimento, at as atividades rotineiras de vigilncia do bem-

    estar animal a segurana alimentar nos pases desenvolvidos. Por isso, hoje o veterinrio

    fundamental, e portanto deve ser formado, em atividades to diversas como (14):

    a. A cooperao internacional para o maneio dos animais em situaes de desastres naturais

    ou induzidas pelo homem (conhecer profundamente os aspetos da poltica internacional e as

    aes de organizaes como a ONU).

    b. Ajuda humanitria em situaes da guerra ou ps-guerra (interveno e gesto de ONGs)

    para manter as populaes de animais enquanto recurso para a sobrevivncia e evitar

    epidemias.

    c. Gesto da movimentao de animais, dos seus resduos e a cadeia alimentar (sade animal e

    inspeo de alimentos).

    d. Promover o bem-estar animal, incentivando o maneio e cuidado tico e humano dos animais

    de criao, do laboratrio e de investigao bem como dos animais selvagens e animais de

    estimao.

    e. Eficcia e segurana das medidas de luta contra doenas (aplicao correta de medicina

    preventiva para evitar resistncias a biocidas ou outros efeitos secundrios).

    f. Melhoramento dos canais de comercializao dos produtos de origem animal e inspeo dos

    mesmos, a fim de melhorar a qualidade sanitria, que por sua vez promove a exportao, que

    resulta numa maior riqueza econmica, especialmente nos pases em desenvolvimento.

    g. Avaliao de impacto ambiental e gesto dos recursos naturais para evitar os seus efeitos

    sobre as populaes animais e humanas (desenvolvimento sustentvel e ecolgico).

    h. Estabelecimento de leis e regulamentos regionais, nacionais e internacionais que possam ter

    impacto sobre a sade animal e humana, ou a relao entre elas (implicaes polticas de sade

    recomendadas ou exigidas por organismos como a OPAS / OMS, FAO, OIE, etc.)

  • 23

    Para isso, necessrio ter em conta que as universidades desempenham um papel essencial e

    insubstituvel, dada a sua influncia no estabelecimento e reestruturao de programas de

    formao profissional e na perceo que as novas geraes de profissionais adquirem do seu

    papel nas diversas reas, desde a produo animal, o bem-estar animal, a segurana alimentar

    e a proteo ambiental at luta contra as doenas.

    O papel das universidades no se limita ao ensino e investigao, mas tambm inclui o

    acompanhamento na formulao e implementao de polticas, o que implica uma ao

    intersectorial da sade e agricultura. Isto pressupe uma formao integral nas reas de

    desenvolvimento humano que transcende a aprendizagem tcnica e explora o potencial desses

    profissionais enquanto lderes sociais (14, 15).

    O projeto SAPUVETNET III "contribui para os Objetivos do Milnio, atravs do conceito One

    Health", tendo como objetivo procurar solues locais para problemas globais de sade pblica

    utilizando uma linguagem comum, e tentar aproximar a Amrica Latina e a Europa, propondo

    regras comuns de acreditao e um currculo semelhante para o ensino de sade pblica entre

    os participantes das escolas veterinrias.

    Analisaram-se os documentos pertinentes e aplicou-se o mtodo de concordncia e diferena,

    e posteriormente elaborou-se um documento de trabalho entre todos os participantes de

    SAPUVETNET III. Para a elaborao da proposta, utilizou-se o documento da Associao Europeia

    de Estabelecimentos de Ensino Veterinrio (EAEVE) como base para a determinao das

    "competncias mnimas" que o veterinrio deve ter na rea de SPV. A proposta foi discutida

    entre os participantes de SAPUVETNET e o representante da FAO-AGA, Diretor Chefe de

    Veterinria, unidade HPV.

    Estabeleceram-se as competncias gerais e profissionais dos mdicos veterinrios na rea de

    SPV, bem como as competncias prticas na rea de sade pblica do mdico veterinrio com

    ps-graduao (ver Quadro 2)

  • 24

    QUADRO 2. COMPETNCIAS GERAIS E PRTICAS DO MV NA SADE PBLICA VETERINRIA

    Competncias gerais Competncias prticas

    Comunicar de forma eficaz com: clientes, o

    pblico, profissionais da rea e

    autoridades; ouvir efetivamente e

    responder de forma eficaz utilizando uma

    linguagem adequada ao pblico e ao

    contexto.

    Preparar relatrios claros e manter registos

    que sejam satisfatrios para os colegas e

    compreensveis para o pblico.

    Trabalhar de forma efetiva como membro

    da equipa multidisciplinar.

    Estar ciente das responsabilidades ticas

    do mdico veterinrio relativamente aos

    cuidados animais, seus clientes e, de uma

    forma geral, com o possvel impacto sobre

    o meio ambiente e a sociedade como um

    todo.

    Ter conhecimento do contexto econmico

    e emocional e responder adequadamente

    influncia de tais presses.

    Estar disposto a utilizar as suas capacidades

    profissionais para contribuir tanto quanto

    possvel para o avano do conhecimento e

    em benefcio da prtica veterinria,

    melhorando a qualidade dos cuidados

    prestados, o bem-estar animal e a sade

    pblica veterinria (medicina baseada em

    evidncias).

    Obter a histria clnica precisa e relevante

    do animal ou rebanho, bem como do

    ambiente que os rodeia.

    Seguir os procedimentos corretos aps o

    diagnstico de uma doena de notificao

    obrigatria ou zoontica.

    Conduzir os processos de certificao

    corretamente e com responsabilidade.

    Prescrever e / ou distribuir substncias e

    medicamentos corretamente e de forma

    responsvel, com base no conhecimento

    adequado das condies socioeconmicas e

    da legislao nacional e garantir que os

    medicamentos e os resduos so

    armazenados ou eliminados de forma

    segura.

    Propor e desenvolver programas profilticos

    e preventivos adequados a cada espcie

    (gesto de sade do rebanho), de acordo

    com os padres aceites para a sade e bem-

    estar animal e da sade pblica, procurando

    o aconselhamento e assistncia

    multiprofissional, sempre que necessrio.

    No Quadro No 3 apresentam-se as Unidades Curriculares consideradas necessrias para obter

    competncias especficas em sade pblica.

  • 25

    QUADRO 3. UNIDADES CURRICULARES CONSIDERADAS NECESSRIAS PARA OBTENO DE

    COMPETNCIAS ESPECIFICAS EM SADE PBLICA VETERINRIA

    Cincias Bsicas Cincias clnicas Produo Animal

    Farmacologia Veterinria

    Toxicologia

    Microbiologia

    Imunologia

    Epidemiologia

    Economia da Sade

    Deontologia

    Doenas parasitrias e

    infeciosas

    Medicina preventiva

    Legislao em

    Sade Pblica

    Legislao

    veterinria

    nacional e tratados

    de comrcio

    internacional

    Nutrio animal

    Higiene veterinria

    Etologia e proteo (organizao

    de comportamento social em

    populaes animais, medidas de

    proteo, bem-estar, alteraes

    comportamentais e suas

    solues).

    O Quadro 4 contempla a proposta de SAPUVETNET III para o currculo dos estudos em sade

    pblica veterinria.

  • 26

    QUADRO 4. PROPOSTA DE CURRCULO EM SPV

    TEMA SUB TEMA

    Sade Pblica - Conceitos e definies

    - O papel do veterinrio

    - Formao para investigao

    - Formao para a sociedade em SPV

    Co

    mp

    ort

    amen

    to d

    o V

    eter

    inr

    io P

    rofi

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    Edu

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    erm

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    Soci

    ais

    e C

    ult

    ura

    is

    1-Segurana Alimentar - Princpios e definies

    - Papel do Mdico Veterinrio

    - Legislao alimentar (nacional e internacional)

    2 Comercializao Nacional e Internacional

    - Polticas de segurana, independncia e soberania alimentar.

    3 Sistemas de Segurana alimentar e garantia de qualidade

    - Doenas Transmitidas por Alimentos

    - BP (agrcola, processamento, sade e produo)

    - HACCP

    - Controlo de Processo

    - Anlise de Risco

    - Biossegurana

    4-Sistemas informais de produo e comercializao de alimentos

    - Caracterizao de sistemas informais.

    - Garantir a segurana alimentar em sistemas informais.

    5-Processamento de alimentos e a cadeia alimentar

    - Tecnologia (controlo e inspeo),

    - Armazenamento (conservao),

    - Transporte e distribuio

    6-Gesto Ambiental e Medicina da Conservao

    - Legislao ambiental

    - Conceitos ambientais

    - Impacto sobre o meio ambiente

    - Saneamento

    - Controlo de pragas

    - Gesto de animais selvagens envolvidos na transmisso de

    doenas

    7-Responsabilidade para os animais de estimao

    - Introduo de animais exticos.

    - Agressividade (etologia)

    - Maneio de animais de estimao

    - Animais dispersos e selvagens

    8 Situaes de catstrofe e emergncia

    - Conceitos

    - Sistemas de aviso de deteo e conteno

    - Os planos de contingncia e participao dos veterinrios em

    situaes de emergncia

    - Preparao para emergncias

    - Resposta Rpida

    - Investigao de surtos,

    - Medidas a tomar,

    -Comunicao de risco

    - Implementao de medidas de controlo a nvel nacional

    9-Epidemiologia das zoonoses - Deteo, preveno controlo e erradicao de doenas

    emergentes, reemergentes e endmicas

    - Fatores ambientais

    - Fatores inerentes aos agentes patognicos

    - Gesto de programas de sade: anlises de risco, avaliao de

    programas.

  • 27

    REFERNCIAS

    1. Reyes M, Villamil LC, Ariza N, Cediel N. Pasado presente y futuro de la salud pblica

    veterinaria en Colombia. OPS-OMS. 1 Ed. 2004; ISBN 958-97053-9-1.Colombia,120

    pp.

    2. RUIZ A, ESTUPIN J. Organizacin de los servicios de salud pblica veterinaria en

    Amrica Latina y el Caribe. Revue Scientifique et technique, OIE Vol 11 No. 1 pp. 117-

    144. Pars 1992.

    3. Romero JR, Villamil LC. Servicios de Salud Pblica Veterinaria en pases en desarrollo:

    Lineamientos para la reestructuracin. Revista de Salud Pblica 1999;1: 29-42.

    4. Villamil, L., Reyes, M., Ariza, N., Cediel, N., La salud pblica desde la perspectiva de

    las ciencias veterinarias, Monogr. Electron. Patol. Vet. 2006; 3(1):1-21,

    5. FAO/OMS. El aporte de la veterinaria a la salud pblica. Informe del comit mixto

    FAO/OMS de expertos en veterinaria de salud pblica. Serie de informes tcnicos 573.

    1975; Ginebra, 85 pp.

    6. Reunion Interamericana a Nivel Ministerial en Salud y Agricultura, Rimsa. Informe del

    programa de Salud Pblica Veterinaria de la OPS sobre el cumplimiento de las

    orientaciones estratgicas y programticas (OEP) 1999-2000. OPS-OMS. 2001; Sao

    Paulo, Brasil. Memorias.

    7. Casas R, Rosemberg FJ, Astudillo VM. La produccin y la salud animal y sus

    interrelaciones con la salud pblica en Amrica Latina y el Caribe. Rev Sci Tech Off Int

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    Missouri 1996; 696 p.

  • 28

    10. Villamil L, Romero J. Retos y perspectivas de la salud Pblica veterinaria. Revista de Salud

    Pblica, 2003; 5: 109-122, Bogot

    11. Ruiz A. El turismo y la proteccin de alimentos. Desarrollo de programas de salud,

    Programa de salud pblica veterinaria. 1990; OPS Washington.

    12. World Health Organization, Future trends in veterinary Public heatlh, WHO technical

    Support Series 907, Geneva, 2002

    13. Romero JR, Villamil LC. Servicios de Salud Pblica Veterinaria en pases en desarrollo:

    Lineamientos para la reestructuracin. Revista de Salud Pblica 1999;1: 29-42.

    14. Ortega C, Villamil LC, Cediel N, Rosenfeld C, De Meneghi D, De Rosa M, Estol L, Lleguia

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    spvet: modelo de integracin en salud pblica veterinaria entre Europa e Iberoamrica.

    Revista Panamericana de Salud Pblica. OPS-OMS, 2005; 57(1): 60-65.

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    Salud Pblica. El papel de la educacin en el nuevo siglo. Revista de la Facultad de

    Medicina Veterinaria y de Zootecnia v. 52, n.2, p 163-169. ISSN 0120-2952l.2005

  • 29

    PRINCIPAIS FERRAMENTAS PARA ESTUDAR E INTERVIR EM FENMENOS DE

    SADE PBLICA VETERINRIA

    Pergunta orientadora:

    Que ferramentas devem ser utilizadas pelo veterinrio que enfrenta um problema relacionado

    com a sade pblica?

    Questes de avaliao:

    1- Quais so os fatores principais que explicam as caractersticas, a distribuio e a

    evoluo de uma doena numa populao?

    2- Que instrumento de pesquisa epidemiolgica fundamental para obter informaes

    que permitam definir o estado duma doena numa populao e os fatores de risco

    associados mesma?

    3- Quais so os parmetros de avaliao da doena que so necessrios conhecer para

    apoiar a tomada de decises na luta contra a doena?

    Competncias a adquirir:

    1- Compreender a utilidade e os mecanismos para o desenvolvimento de programas de

    vigilncia epidemiolgica.

    2- Compreender a importncia da informao sobre sade e os mecanismos para obt-la.

    3- Compreender as caractersticas que definem a fiabilidade dos testes de diagnstico e os

    critrios necessrios para a escolha do teste mais adequado em cada situao.

    4- Conhecer os principais parmetros utilizados para avaliar a importncia de uma doena

    na populao e as ferramentas utilizadas para avaliar a sua evoluo temporal e espacial.

    Carmelo Ortega, MV, DipECVPH, PhD, Facultad de Veterinaria. Universidad de Zaragoza, ZARAGOZA - ESPAA

  • 30

    Determinantes epidemiolgicos em sade pblica

    Em 1973, a Organizao Mundial da Sade (OMS) definiu a sade pblica como: todas as

    atividades relacionadas com a sade e a doena numa populao, o estado sanitrio e ecolgico

    do ambiente, a organizao e o funcionamento dos servios de sade, a planificao e a gesto

    dos mesmos e a educao para a sade (Frias-Osuna, 2000).

    Dentro deste conceito, a possvel implicao da sade animal em populaes humanas atravs

    de doenas zoonticas um facto estabelecido, e consequentemente desejvel a atuao do

    veterinrio em Sade Pblica.

    A partir desta definio, um dos aspetos que condicionam uma boa atuao em sade pblica,

    a disponibilidade de informaes epidemiolgicas sobre a doena, que permitam a tomada de

    decises adequadas (medidas de preveno ou controlo); mas que informao importante

    saber, do ponto de vista do veterinrio, para apoiar uma deciso correta? Para responder a essa

    pergunta, necessrio compreender que a sade e a doena dependem de uma srie de fatores

    determinantes.

    Determinantes de sade e de doena

    Quatro elementos so considerados como determinantes de sade / doena. Os primeiros trs

    fazem parte da cadeia epidemiolgica da doena: o hospedeiro vivo, o agente responsvel pela

    doena e o meio ambiente onde habita o ser vivo e onde a doena se manifesta (Friis y Sellers,

    1996). O quarto elemento o envolvimento dos profissionais da sade e do sistema sanitrio,

    que tm influncia nos trs primeiros elementos ou introduzem novos elementos que mudam

    a relao entre o agente, o hospedeiro e o ambiente, podendo inclinar a balana a favor da

    sade contra a doena.

    O facto de tanto a sade como a doena serem influenciadas por estes determinantes torna a

    doena um conceito dinmico no tempo, cujo resultado final depende da interveno de cada

    um destes determinantes e das suas modificaes em funo da interveno dos sistemas da

    sade.

    Devido importncia dos determinantes no desenvolvimento e na evoluo da sade e da

    doena, necessrio desenvolver estratgias para conhecer e avaliar a sua interveno. Para

  • 31

    esse efeito, uma das melhores ferramentas que a Sade Pblica dispe, a vigilncia

    epidemiolgica (VE).

    Vigilncia epidemiolgica

    O que a Vigilncia Epidemiolgica

    A Organizao Mundial da Sade Animal (OIE) define vigilncia epidemiolgica como "todas as

    operaes sistemticas e contnuas de recolha, comparao e anlise de dados relacionados

    com a sade animal e a disseminao de informao em tempo til a todos que necessitam de

    tomar medidas adequadas" (Cdigo terrestre de Sade Animal, OIE;

    http://www.oie.int/es/normas-internacionales/codigo-terrestre/)

    Do ponto de vista operacional, consiste na observao permanente do estado da sade ou de

    doena (a presena ou a ausncia dos mesmos, a morbilidade ou a mortalidade) numa dada

    populao, assim como os fatores de risco associados aos mesmos, o seu surgimento e evoluo

    no tempo e no espao, que permitam tomar medidas adequadas para os combater (Toma et al.,

    1991)

    Para isso, a vigilncia epidemiolgica apoia-se em dois aspetos importantes: o diagnstico do

    processo e a identificao dos fatores de risco que influenciem a sua ocorrncia, intensidade e

    evoluo. Isto significa que a Vigilncia Epidemiolgica em Sade Pblica Veterinria tem dois

    apoios metodolgicos: o diagnstico e a anlise de riscos.

    Outro ponto importante nesta definio que a informao obtida e analisada deve chegar com

    a maior rapidez possvel aos responsveis por atuarem contra a doena.

  • 32

    Que informaes so disponibilizadas num programa de vigilncia epidemiolgica?

    Os programas de vigilncia epidemiolgica devem responder s seguintes perguntas:

    O que que est a

    acontecer? Importncia da doena ETIOLOGA

    Onde est a acontecer? rea geogrfica afetada DISTRIBUIO GEOGRFICA

    Quando que est a

    acontecer? Perodo de apresentao DISTRIBUIO TEMPORAL

    Quais so os grupos de risco? Populao afetada DISTRIBUIO

    POPULACIONAL

    Porqu que est a

    acontecer? Fatores associados MEIO AMBIENTE

    Tipos de programas de Vigilncia Epidemiolgica

    Os programas de Vigilncia Epidemiolgica podem ser classificados de vrias formas:

    a- De acordo com a metodologia de recolha de informao:

    Passiva - descrevem os processos principalmente a partir das informaes obtidas

    pelo proprietrio dos animais doentes ou a partir da reviso bibliogrfica. Utiliza-se

    em doenas com interesse limitado.

    Neste tipo de vigilncia os servios veterinrios no tm nenhuma iniciativa no

    processo de recolha de informao; somente esperam que o agricultor os informe

    dos casos. Portanto uma "declarao incompleta" (porque nunca se declaram

    todos os casos).

    Ativa descrevem os processos a partir dos dados obtidos em campo atravs da

    recolha ativa da informao, mas tambm intervm na tomada de deciso. Aplica-

    se a doenas com grande impacto na populao animal ou em doenas com risco

    para a sade pblica. Neste caso as autoridades de sade tomam a iniciativa da

    recolha da informao.

  • 33

    b- De acordo com a durao:

    Programas Pontuais realizam-se num momento do tempo.

    Programas Contnuos realizam-se de forma contnua.

    Programas Peridicos realizam-se em determinadas pocas, e podem ter um

    carater cclico.

    c- De acordo com a geografia

    Nacionais.

    Regionais.

    Locais.

    d- De acordo com o momento em que so postos em prtica:

    Vigilncia em situaes de emergncia aplica-se imediatamente aps o incio de

    um surto de uma doena de alto risco, numa populao de animais ou quando a sua

    probabilidade de ocorrncia iminente.

    Vigilncia adicional - estabelecida aps o controlo do problema ou surto.

    Vigilncia de rotina - estabelecida de forma permanente e independentemente

    do estado da doena existente em cada momento (se existe ou no a doena)

    e- Tambm importante considerar o objetivo do programa de vigilncia.

    De acordo com o objetivo, consideram-se dois tipos diferentes de programas:

    Externos - baseiam-se em medidas para prevenir a entrada de uma doena

    transmissvel numa zona isenta. A sua base de atuao ser o controlo das fronteiras e

    as quarentenas. Utiliza a anlise de riscos como uma ferramenta.

    Internos baseiam-se em medidas aplicadas para evitar a propagao de uma

    doena que j existe numa zona. A sua ferramenta base o diagnstico.

    Organizao, Dificuldades e Ferramentas de Trabalho

    O que que importante organizar num programa de Vigilncia Epidemiolgica?

    Quando se decide implementar um programa de vigilncia para uma determinada doena,

    para a qual realmente importante recolher informao e divulg-la, o trabalho tem que ter

    uma organizao clara a trs nveis diferentes:

    Recolha de informao - necessrio um sistema permanente de recolha de dados,

    que seja uma motivao adicional para o agricultor e o veterinrio.

  • 34

    Validao a suspeita clnica exige uma rpida confirmao laboratorial e uma

    perfeita coordenao entre as unidades de diagnstico de campo, de recolha das amostras

    e de diagnstico laboratorial.

    Disseminao - os resultados devem chegar aos rgos de tomada de deciso para

    que a atuao contra a doena seja rpida e adequada. A disseminao interna da

    informao crucial para agir contra a doena e responder s necessidades. No entanto, a

    divulgao externa (a nvel internacional ou organismos de sade) tambm importante,

    para que se possa acompanhar a evoluo do processo e determinar a eficcia das medidas

    implementadas para assegurar a sade animal e a sade pblica internacional no caso de

    zoonoses.

    Quais so as ferramentas bsicas que se devem utilizar num programa de Vigilncia

    Epidemiolgica?

    A implementao de um programa de Vigilncia Epidemiolgica implica a necessidade

    inicial de se definirem as doenas a incluir no programa e a partir da se obterem dois tipos de

    informao chave:

    A- Informao referente presena e ao impacto da doena na populao; factos

    apoiados no diagnstico realizado no campo e no laboratrio.

    B- Identificao dos fatores que esto envolvidos na apresentao da doena,

    para a qual se recorre anlise de riscos ou a estudos epidemiolgicos.

    Apesar da Vigilncia Epidemiolgica ser uma ferramenta de uso global, a situao especfica de

    uma populao faz com que a sua implementao possa variar, tornando-se portanto

    importante considerar o desenho do programa de Vigilncia atendendo a duas situaes

    diferentes:

    1. A doena est presente. Neste caso, o programa de VE tenta estudar como

    apareceu, como se desenvolveu e quais so os seus determinantes.

    2. A doena no est presente, mas existe o risco de surgir. Neste caso

    concentram-se os esforos em conhecer quais so os riscos e como que se

    pode intervir para reduzi-los.

  • 35

    O desenho de um programa de Vigilncia Epidemiolgica deve ter presente o seguinte

    protocolo:

    Problema

    a. Presena da doena

    b. Risco da doena

    Campo de observao

    c. Doena(s) a estudar.

    d. Populao (homens, animais, meio ambiente) a estudar em funo da doena.

    e. rea geogrfica (de aplicao).

    Mtodo de trabalho

    f. Sequncia temporal do estudo (momentneo, peridico, contnuo).

    g. Sequncia espacial do estudo (toda a populao, uma amostra, estratos especficos).

    Vias de ao

    h. Diagnstico (como e que critrios).

    i. Informao epidemiolgica (inquritos).

    j. Bases de dados.

    k. Anlise de informao.

    l. Avaliao/anlise de riscos.

    Equipamento

    Recursos Humanos

    m. Tcnicos de campo: amostragem, inquritos.

    n. Laboratrios: diagnstico.

    o. Centro de dados: organizao e anlise de dados.

    p. Grupo de deciso: Aplicao de medidas, gesto de medidas, comunicao dos resultados.

  • 36

    De partida, a Vigilncia Epidemiolgica ser diferente, de acordo com a presena ou a ausncia

    de doena. Portanto, de acordo com a situao, dar-se- uma maior ou menor importncia a

    determinados aspetos da informao obtida. Por exemplo:

    1- Presena de doena: necessrio um programa que valorize:

    o Presena e quantificao da doena / infeo.

    o Gravidade da doena.

    o Sobrevivncia doena.

    o Evoluo ao longo do tempo (Curvas Epidemiolgicas).

    o Evoluo/distribuio geogrfica (Mapas).

    2- Possibilidade de introduo de doena no futuro: deve valorizar:

    o Pontos crticos e a magnitude dos mesmos (Anlise de Riscos).

    o Alteraes temporrias no risco (Curvas de Riscos).

    o Alteraes geogrficas no risco (Mapas).

    Um ltimo aspeto que se deve realar em relao Vigilncia Epidemiolgica, que quando se

    trata de um processo contnuo no tempo, tambm se podem avaliar a eficcia das medidas j

    implementadas e a sua correo.

    Informaes sobre a sade: a importncia da pesquisa

    Para a tomada de decises sobre o estado sanitrio de uma populao, necessrio ter um

    sistema de dados organizados que fornea a informao necessria tomada de decises, base

    dos sistemas de informao sanitria (Martinez Navarro et al, 1999).

    Nos sistemas de informao sanitria, a obteno de informao um dos pilares mais

    importantes e, portanto, recorre-se frequentemente pesquisa como uma ferramenta para a

    obteno de tal informao.

    A pesquisa epidemiolgica inclui no s uma recolha sistemtica e organizada de informao

    sobre um problema de sade, como a sua anlise posterior. Para a sua implementao, deve

    comear-se pela realizao de um questionrio para recolha da informao para interpretao

    posterior.

  • 37

    A implementao do inqurito comea com a definio do objetivo geral que se procura e que

    por sua vez inclui o propsito da pesquisa, identificando as reas de atuao (ver o seguinte

    exemplo:).

    Objetivo - Determinar o risco de infeo pelo agente responsvel pela febre

    do vale do Rift, numa populao.

    Finalidade - Identificar fatores predisponentes e de risco sobre os quais

    necessrio atuar e implementar medidas corretivas.

    Aps ter definido os pontos anteriores, necessrio estabelecer uma hiptese para desenvolver

    o questionrio. Para esse efeito necessrio apoiar-se no conhecimento cientfico existente

    sobre o problema e os dados dos estudos prvios ou observaes de campo (ver o seguinte

    exemplo para a febre do Vale do Rift)

    Hiptese de causalidade - a doena no existia anteriormente na regio, por

    isso deve ter como origem algum movimento de vetores.

    Hiptese sobre fatores de risco a doena est associada a vetores, e estes

    por sua vez so condicionados pelo clima e pela vegetao.

    As hipteses condicionaro as variveis do estudo que so os elementos que realmente sero

    analisados e sobre as quais se tiraro concluses. Cada varivel pode ser dividida em

    indicadores, que so os fatores que influenciam essas variveis (ver o seguinte exemplo para a

    febre do Vale do Rift:).

    Variveis a estudar Mudanas climticas e caractersticas da vegetao.

    Indicadores - temperatura, humidade, intervalos de variaes climticas, tipo

    de cobertura vegetal.

    Finalmente, os indicadores selecionados so transformados em questes que iro integrar o

    questionrio.

    Na elaborao das perguntas devem-se considerar todas as respostas possveis (perguntas

    fechadas), que constitui a melhor forma de recolher informao, atendendo tambm ao facto

    de que as pessoas que procedero aplicao dos questionrios poderem no ser as mesmas

  • 38

    que elaboraram as perguntas. Consequentemente existe a possibilidade das perguntas serem

    interpretadas de forma diferente tanto por parte dos respondentes, como dos inquiridores.

    Para evitar esta situao, as perguntas devem ser elaboradas num texto claro, relativamente

    extenso, acompanhados pelos esclarecimentos que se entenderem necessrios.

    As perguntas abertas deixam em aberto a possibilidade de muitas respostas diferentes sem

    critrios pr-definidos, o que pode fornecer muita informao. No entanto, estas respostas so

    mais complexas de analisar, razo pela qual, muitas vezes, em investigao em sade, acaba-se

    por transformar estas perguntas em perguntas fechadas, para a anlise final.

    As perguntas fechadas permitem a opo de responder a aspetos muito especficos,

    estabelecidos previamente durante a elaborao do questionrio. Estas so mais fceis de

    analisar, embora a sua utilizao possa implicar alguma perda de informao de interesse

    (Rebagliato et al., 1996).

    O investigador tem sempre a opo de transformar as perguntas abertas em perguntas

    fechadas, a partir das respostas obtidas; razo pela qual consideramos que nem sempre se pode

    recomendar uma ou outra forma, e que a escolha de usar um tipo ou outro depende de cada

    caso / indicador especfico.

    Esta primeira etapa conduz ao desenvolvimento do questionrio, a ferramenta utilizada "para

    obter informaes". O questionrio deve cumprir uma condio bsica, a de permitir uma

    recolha sistemtica de informao. Com este conceito, pretende-se indicar que um protocolo

    para obter informaes idnticas e sempre com os mesmos critrios para cada unidade de

    trabalho na pesquisa, individual ou coletiva; recolhe sempre as mesmas informaes e utiliza os

    mesmos mecanismos.

    As duas etapas seguintes do questionrio, que finalizam a pesquisa, so as bases de dados e a

    anlise dos mesmos. A primeira a ferramenta utilizada para armazenar a informao obtida e

    prepar-la para anlise posterior. A base de dados deve permitir a organizao das informaes

    de forma adequada, que permita a anlise posterior mais adequada.

    Por fim, a terceira etapa a anlise, que consiste em avaliar a informao existente na base de

    dados e dela retirar concluses. A anlise pode ser realizada a partir de uma perspetiva

  • 39

    puramente observacional ou com uma abordagem mais estatstica de acordo com os objetivos,

    o propsito, e a informao disponvel.

    O diagnstico da doena

    Outro aspeto chave na VE a identificao da doena, para a qual muitas vezes se recorre a

    alguns critrios de diagnstico. O problema que os testes de diagnstico nunca so 100%

    perfeitos, uma vez que podem ser identificados como doentes alguns animais saudveis ou

    saudveis alguns animais doentes. Isto , em quase todas as tcnicas de diagnstico h falsos

    positivos e falsos negativos. A capacidade de uma tcnica de diagnstico em reduzir, tanto

    quanto possvel, os falsos positivos e / ou os falsos negativos o que define a qualidade dos

    resultados obtidos.

    A fiabilidade de um teste diagnstico assim avaliada atravs dos parmetros "Sensibilidade"

    (Se) e "Especificidade" (Es), cujo clculo facilmente realizado usando uma tabela de 2x2

    (Thrusfield, 1997):

    Tabla 2x2:

    DOENA (Tcnica de referencia)

    Teste de Diagnstico

    SIM NO Total

    POSITIVO A B A+B

    NEGATIVO C D C+D

    TOTAL A+C B+D N (A+B+C+D)

    A = Indivduos doentes positivos ao teste

    B = falsos positivos

    C = falsos negativos

    D = Indivduos sos negativos ao teste

    N- total da populao diagnosticada

  • 40

    Sensibilidade: a probabilidade de um animal doente ser identificado como tal pela

    tcnica utilizada. igual ao nmero de animais doentes identificados como tal atravs do

    teste (A), dividido por nmero total de animais doentes (A + C).

    Especificidade: a probabilidade de um animal saudvel ser identificado como tal pela

    tcnica utilizada. igual ao nmero de animais saudveis identificados como tal, atravs do

    teste (D), dividido por nmero de total de animais saudveis (B + D).

    Quando existem valores de sensibilidade e especificidade inferiores a 100%, necessrio

    diferenciar entre a Prevalncia aparente e a Prevalncia real.

    Prevalncia aparente: a prevalncia detetada pelo ensaio utilizado.

    Prevalncia real: a prevalncia que existe realmente determinada pela tcnica de

    referncia.

    Sensibilidade = A/(A+C)

    Especificidade = D/(B+D)

    Prevalncia real = (A+C)/N

    Prevalncia aparente = (A+B)/N

    Como geralmente se obtm a prevalncia aparente num diagnstico, existe uma relao direta

    entre estes parmetros, de modo que a prevalncia aparente depende da prevalncia real e da

    sensibilidade e especificidade do teste. Assim, atravs desta relao, podemos determinar a

    verdadeira prevalncia da doena a partir dos resultados dos ensaios:

    (Prev. aparente + Especificidade - 1)

    Prev. real = _____________________________

    (Sensibilidade + Especificidade - 1)

  • 41

    Com esta premissa, o objetivo deve ser optar por testes com a mxima fiabilidade. O problema

    est em que frequentemente a Sensibilidade e a Especificidade so antagonistas, isto , se a

    credibilidade de uma aumenta, a da outra diminui; o que significa que comummente no se

    pode ter a mesma confiana em ambas as caractersticas. Isto significa que se deve decidir o que

    mais importante, se a Sensibilidade ou a Especificidade, em funo do objetivo procurado

    (que no haja falsos negativos ou no haja falsos positivos).

    Com o objetivo de minimizar os falsos positivos ou os falsos negativos surgem alternativas para

    melhorar a fiabilidade: Nesses casos, o mais comum utilizar os chamados testes mltiplos, isto

    , o uso de mais do que um teste de diagnstico para emitir um diagnstico final.

    Existem duas maneiras de planear e interpretar os resultados de ensaios mltiplos:

    *Interpretao dos testes em paralelo -

    Utilizam-se quando dois ou mais testes de diagnstico so aplicados mesma amostra em

    simultneo. Nestes casos so considerados negativos os indivduos que tm um resultado

    negativo em todos os testes de diagnstico. Em contraste, um indivduo considerado

    positivo quando tem um resultado positivo pelo menos num dos testes. Quando se

    interpreta os resultados dos testes realizados em paralelo possvel reduzir os falsos

    negativos e, portanto, aumenta-se a sensibilidade. Estes testes em paralelo aplicam-se

    quando se trata de assegurar que o indivduo identificado como negativo ou so est

    realmente saudvel.

    *Interpretao dos testes em srie -

    Utiliza-se quando dois ou mais testes so aplicados sequencialmente mesma amostra. No

    incio, realiza-se o primeiro teste de diagnstico e queles que tm um resultado positivo

    aplica-se o teste seguinte de diagnstico. Neste caso, para que um animal seja considerado

    positivo este deve ter um resultado positivo em cada uma das tcnicas utilizadas. Do mesmo

    modo, um animal ser considerado negativo se tem um resultado negativo em qualquer um

    dos testes utilizados. Atravs destes testes, realizados em srie, reduz-se o nmero dos

    falsos positivos e, assim, aumenta-se a especificidade. Realizam-se estes testes em srie

    quando importante assegurar que o animal realmente positivo.

  • 42

    Como nos casos anteriores, a escolha de testes em paralelo ou em srie, depender de se o

    objetivo minimizar os possveis falsos positivos ou os falsos negativos.

    Aspetos demogrficos da doena

    A caracterizao de um problema de sade numa populao supe, por um lado, realizar uma

    avaliao do estado de sade ou de doena, em que esta se encontra e, por outro lado, avaliar

    a sua evoluo temporal e espacial (distribuio geogrfica) (Thrusfield, 1997).

    A avaliao da doena deve ser realizada em termos relativos, isto quer dizer, deve-se express-

    la como uma relao entre os indivduos que sofrem da doena (o numerador) e todos os

    indivduos suscetveis ou expostos doena (o denominador), que so geralmente considerados

    como populao em risco (no coincide necessariamente com a populao total).

    Os parmetros geralmente usados para avaliar o estado da sade de uma populao so (Friis

    and Sellers, 1996; Noordhuizen et al, 1997):

    Morbilidade A probabilidade dos indivduos de uma populao adquirirem a doena num

    momento ou perodo do tempo. calculada como a relao entre o nmero de animais com a

    doena durante o perodo ou momento no tempo definido e o nmero de animais em risco de

    contrair a doena durante o mesmo perodo de tempo.

    Mortalidade - A probabilidade dos indivduos de uma populao morrerem durante um perodo

    de tempo. calculada como a relao entre o nmero de mortes totais durante o perodo de

    tempo em estudo e da populao em risco de morrer, no mesmo perodo de tempo.

    Letalidade A probabilidade de morte entre os indivduos que apresentam uma determinada

    doena num determinado perodo do tempo. calculada como a relao entre o nmero de

    mortes devido doena num perodo do tempo e o nmero de animais que apresentaram a

    doena no mesmo perodo de tempo.

    Prevalncia A probabilidade de um indivduo selecionado aleatoriamente da populao sofra

    da doena, e portanto a proporo de casos da doena existentes numa populao durante

    um perodo de tempo ou num ponto no tempo; no primeiro caso, fala-se de prevalncia de

    perodo (conceito mais dinmico) e no segundo caso, da prevalncia pontual (conceito mais

    esttico).

  • 43

    O seu clculo equivalente ao coeficiente do nmero de indivduos doentes (novos no momento

    ou perodo do tempo mais os que j existiam antes e esto doentes no perodo do estudo) e o

    nmero total de animais em risco de apresentarem a doena, incluindo os que j estavam

    doentes, durante esse perodo ou ponto no tempo.

    Incidncia Acumulada A avaliao de novos casos da doena que se apresentam numa

    populao durante um determinado perodo do tempo (, portanto, um conceito

    completamente dinmico). Corresponde proporo de indivduos saudveis no incio do

    perodo do estudo, que adoecem durante este perodo. calculada como a relao entre o

    nmero de indivduos que contraem a doena durante um perodo de tempo e o nmero de

    animais saudveis em risco de contrair a doena, no incio do perodo do estudo. Embora

    existam vrios tipos de estimativas de incidncia a partir da informao disponvel e da

    interveno do conceito do tempo, apresenta-se aqui apenas a ideia geral.

    Taxa de sobrevivncia (Ts) - A probabilidade dos indivduos com uma determinada doena

    sobreviverem durante um perodo de tempo determinado

    Ts= (N-D) / N

    Em que:

    N- o nmero de novos casos da doena durante esse perodo do tempo.

    D -o nmero de indivduos mortos pela doena num determinado perodo do tempo

    (Letalidade).

    A soma da letalidade e da sobrevivncia deve ser igual a 1 (100%).

    A partir da avaliao da doena, realiza-se o seguimento em tempo e em espao da doena. Esta

    atividade responsvel pela epidemiologia espacial, definida como a descrio e a compreenso

    das variaes espaciais da doena e o seu risco (Elliot et al., 2000). A principal ferramenta nesta

    etapa do estudo a cartografia.

    A utilizao de mapas oferece uma viso geral e eficaz da informao que ajuda na elaborao

    de hipteses sobre as possveis causas e fatores associados, na identificao de reas de alto

    risco ou na tomada de decises sobre medidas de interveno.

  • 44

    Existem vrios tipos de mapas que disponibilizam diferentes modos para analisar e apresentar

    os resultados obtidos no estudo de uma doena:

    Mapas geogrficos base - Localizam a varivel a estudar e as diferentes reas do mesmo.

    Mapas Pontuais - Indicam a localizao da varivel atravs de pontos ou outros smbolos. Trata-

    se de representao de informao qualitativa.

    Mapas de distribuio - Delimitam reas em que se localizam as variveis a estudar. Apresentam

    igualmente informao qualitativa.

    Mapas Coroplticos - Delimitam reas em que se localiza a varivel a estudar mas com

    informao quantitativa (cada rea delimitada representa-se atravs de smbolos que

    indicam uma determinada quantidade da varivel).

    Mapas Isoplticos - Delimitam reas geogrficas com informao quantitativa mas neste caso a

    altura de cada rea corresponde a uma determinada quantidade da varivel.

    Mapas demogrficos - Relacionam a varivel em estudo e as suas taxas com o tamanho da

    populao.

    Atualmente, a representao de dados de uma doena a partir de uma perspetiva geogrfica

    depende da utilizao de Sistemas de Informao Geogrfica (SIG), o que permite que essa

    representao de informao seja dinmica, uma vez que pode ser modificada ao longo do

    tempo, de acordo com as variaes nos dados relativos s variveis envolvidas no processo.

  • 45

    Referncias bibliogrficas:

    * Elliott, P, Wakefield, J.C, Best, N.G, Briggs, D.J. Spatial epidemiology. Methods and applications.

    Oxford-New York. Oxford University Press. 2000

    * Frias Osuna A. Salud Pblica y educacin para la salud. Barcelona. Masson. 2000.

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    Madrid. McGraw-Hill. Interamericana. 1999.

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    quantitative methods in veterinary epidemiology. Wageningen. Wageningen press. 1997.

    * Rebagliato, M, Ruiz, I, Arranz, M. Metodologa de investigacin epidemiolgica. Ed. Daz de

    Santos Madrid. 1996.

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    animale. Maissons-Alfort. Point Vtrinaire. 1991

    * Thrusfield, M. Veterinary epidemiology. Oxford. Blackwell Science. 2 edition. 1997.

  • 46

    ANLISE DE RISCO

    Pergunta orientadora

    Se uma agncia governamental, empresa importadora, associao de produtores ou associao

    de consumidores solicitar assessoria a um veterinrio numa das seguintes situaes:

    * Introduo de animais ou de produtos de origem animal originrios de uma rea geogrfica

    com uma situao sanitria inferior, e que pode conduzir introduo de um perigo com

    consequncias importantes para a sade ou economia da rea geogrfica recetora (com um

    estado sanitrio superior), ou

    * Autorizao para o consumo de um alimento que pode conter algum componente, aditivo ou

    contaminante que representa um perigo com consequncias para a sade dos consumidores,

    Qual deve ser o procedimento a adotar pelo veterinrio para proporcionar recomendaes

    apropriadas, com base no conhecimento cientfico existente, para serem aplicadas pelos

    responsveis competentes?

    Competncias a adquirir pelo aluno (a)

    Conhecer os conceitos bsicos e as aplicaes da Anlise do Risco.

    Identificar e aplicar os componentes da Anlise do Risco.

    Saber elaborar o relatrio final da Anlise do Risco.

    Atualizar Anlises do Risco prvias.

    Elaborar uma anlise do risco qualitativa para uma situao problemtica.

    Andres Gil, MV, PhD, Facultad de Veterinaria, U.de la Republica. Uruguay Javier Guitian, MV, DipECVPH, PhD, Royal Veterinary College, United Kingdom Clara Lpez, MV, MSc, U. Buenos Aires, Argentina Armando Hoet, DMV, PhD, , Dipl ACVPM, College of

    Veterinary Medicine, The Ohio State University.

    The Ohio State University

  • 47

    Perguntas de avaliao

    17. Porque que se realize uma AR (Anlise do Risco)? Quando pensaria implement-

    la?

    18. Dada a necessidade de realizar uma AR para a entrada de smen bovino num

    determinado pas, qual seria o primeiro passo a dar?

    19. Quais so os elementos a ter em conta para saber se o risco associado a um

    produto alto, mdio ou baixo?

    20. A avaliao do risco um processo cientfico. Quais so os passos que compem

    este processo?

    21. A gesto do risco a etapa seguinte avaliao, a partir do qual se devem tomar

    decises. O que deve ser considerado nesta etapa?

    22. A comunicao do risco ajuda a fornecer informaes oportunas, pertinentes e

    precisas aos membros da equipa da anlise do risco e aos demais interessados.

    Quais so os aspetos da AR que devem ser comunicados?

    23. A partir dos animais com interesse zootcnico so gerados dezenas de produtos

    finais. A procura destes produtos est em expanso, aumentando

    constantemente o seu comrcio internacional. Nesta ampla gama de sistemas de

    produo e processamento, recorre-se cada vez mais a importaes para

    abastecer o mercado crescente de carne e produtos lcteos. Voc, enquanto

    veterinrio, deve aconselhar o seu pas sobre os potenciais fornecedores de carne

    fresca e congelada. O Departamento de Comrcio Internacional informa que h

    trs possveis pases fornecedores chamados A, B e C. Os custos por tonelada de

    carne proveniente desses pases e colocados no seu pas so: 10.000, B. 5000 e

    C. 2000 cada. Com esses elementos, estaria em condies de fazer uma

    recomendao? Por favor, fundamente a sua resposta.

  • 48

    CONCEITOS BSICOS DE ANLISE DO RISCO

    Introduo

    A Anlise do Risco (AR) uma ferramenta que facilita a tomada de decises, fornecendo

    informaes sobre o risco da introduo de agentes prejudiciais a sade, atravs de comrcio de

    animais, produtos e subprodutos de origem animal. Embora no seja uma metodologia nova

    (tem sido utilizada em diversas reas, tais como engenharia e economia), a sua aplicao no

    campo da sade animal relativamente recente.

    A origem da sua utilizao em veterinria est associada a implementao do Acordo sobre as

    Medidas Sanitrias e Fitossanitrias (MSF) Ligao 1 da Organizao Mundial de Comrcio

    (OMC).

    Ligao 1 Este acordo estabelece as bases para a regulamentao da inocuidade alimentar, sade

    animal e preservao das plantas, autorizando os pases a estabelecerem as suas prprias

    medidas para proteger a sade das suas populaes.

    As medidas sanitrias e fitossanitrias no devem ser um meio para a discriminao arbitrria

    ou injustificvel ou ter como objetivo principal a limitao do comrcio internacional. A

    crescente globalizao do intercmbio comercial de animais e dos seus produtos derivados

    aumenta a probabilidade de propagao de doenas. Perante esta situao, necessrio

    estabelecer mecanismos que permitam o comrcio, protegendo a sade pblica e o ambiente

    nos pases envolvidos. Uma parte importante do processo da Anlise do Risco a transparncia,

    e por isso, fundamental usar uma nomenclatura e metodologia normalizada para permitir a

    todos os atores envolvidos compreender a anlise realizada, as suas consequncias e as

    recomendaes que devem ser seguidas.

  • 49

    Definio do risco

    O risco Ligao 2 tem dois componentes: a probabilidade da ocorrncia do evento e a gravidade

    das suas consequncias. Esses componentes podem ser expressas qualitativamente atravs de

    categorias (por exemplo, baixa, mdia e alta) ou quantitativamente atravs de funes de

    probabilidade de exposio e ocorrncia de um evento num perodo especfico. possvel medir

    quantitativamente a sua magnitude atravs de morbilidade e mortalidade, indicadores de

    impacto ambiental, perda de mercados internacionais ou perdas de produo.

    Ligao 2 Risco a probabilidade de ocorrncia de um evento adverso e a estimativa da

    magnitude dos seus e