Artigo pilares da educação

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    OS 4+1 PILARES DA EDUCAO ON-LINE ADISTNCIA: UMA ESTRATGIA MULTIDIMENSIONAL

    DE PLANEJAMENTO

    Maio 2008

    Gerson Pastre de Oliveira PUC/SP [email protected]

    Categoria C

    Setor Educacional 5

    Natureza C

    Classe 1

    RESUMO

    As iniciativas de ensino-aprendizagem realizadas atravs de cursos on-line adistncia tm, como cenrio predominante, a complexidade caracterstica doconhecimento da atualidade. Os percursos, as trajetrias das pessoas queexecutam seus projetos de educao continuada em ambientes mediados portecnologias de informao e comunicao (TICs) no so lineares ou simples,pedindo modelos de planejamento que consideram o carter multidimensionalda construo do conhecimento. Neste aspecto, este artigo prope a utilizao

    das reflexes oriundas da proposio denominada Os quatro pilares daeducao, contida no Relatrio da Comisso Internacional sobre Educaopara o sculo XXI (UNESCO) como elemento mediador para o planejamentoflexvel em processos de ensino-aprendizagem on-line a distncia. Atravs daanlise de uma experincia resultante desta prtica, este trabalho indica meiospara utilizar uma lgica baseada em avaliao multidimensional e nos quatropilares, com a adio de um quinto elemento, de modo a atender as demandascontemporneas por educao continuada, reconhecendo o papel mediadordas tecnologias e destacando as dimenses humanas relativas s dinmicasdo conhecer, fazer, conviver, ser e criar.

    Palavras chave: planejamento; avaliao; complexidade; cursos on-line

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    1 - Introduo: quando a complexidade o cenrio

    Pense em um assunto que possa ser tema de uma disciplina ou de uma outrainiciativa de ensino-aprendizagem semelhante, no mbito de um curso degraduao. Agora, pense em um planejamento que permita construir

    abordagens didtico-pedaggicas para que o curso possa ser oferecido atravsde ambientes virtuais de aprendizagem via EAD. Considere os textos, vdeos,animaes e quaisquer outras mdias que queira usar; pense nas atividades enos meios de interao entre os participantes; cogite a abordagem avaliativa, ofeedback aos membros da experincia, e todos os demais aspectoseducacionais envolvidos. Agora, responda: voc pensou em algo simples,linear, acabado, rgido, qualquer que tenha sido o tema eleito inicialmente? pouco provvel, pois estas no so caractersticas facilmente encontrveis noconhecimento da atualidade.

    O autor francs Edgar Morin afirma, refutando quaisquer conjecturas

    simplistas, que o carter predominante do conhecimento pertinente acomplexidade. Segundo Morin, esta complexidade significa uma tessituraconjunta, acrescentando:

    (...) h complexidade quando elementos diferentes so inseparveis constitutivosdo todo (...), e h um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre oobjeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, aspartes entre si. Por isso, a complexidade a unio entre a unidade e amultiplicidade. Os desenvolvimentos prprios a nossa era planetria nosconfrontam cada vez mais com os desafios da complexidade(Morin, 2002, p. 38-39).

    Morin acrescenta que a contextualizao da informao uma caractersticadeterminante do pensamento pertinente: podemos dizer at que oconhecimento progride no tanto por sofisticao, formalizao e abstrao,mas, principalmente, pela capacidade de contextualizar e englobar (2001, p.15). Tambm por isso, Bruno e Moraes (2006, p. 52) comentam que, comofator que constitui a vida e a realidade, a complexidade indica a existncia deuma tessitura comum, que leva inseparabilidade dos interagentes dosfenmenos, como sujeito e objeto, indivduo e contexto. Segundo as autoras,desta maneira, fatos, fenmenos e objetos permanecem inter-relacionados,multidimensionais e interativos (idem, ibidem), o que se estende aprendizagem, ela tambm, como o conhecimento, dotada das instabilidades,

    desordens e incertezas instauradas pelos cenrios complexos dacontemporaneidade.

    Ao contrrio de um cenrio anterior, no campo da aprendizagem, calcado emcertezas mais ou menos slidas e definitivas, a proposio da complexidadevem indicar uma ruptura com as estruturas pseudo-solidificadas do saber-certeza. O sujeito que sabe, invariavelmente, e que edificou seu conhecimentode forma inatacvel e definitiva, abre espao para o indivduo que pergunta eque problematiza, isto mesmo a partir das incertezas, indeterminaes,imprecises, dvidas e desordens tpicas da complexidade (idem, p. 53).

    Ao consolidar a compreenso de que a simplificao no mais possvel nos

    cenrios contemporneos, Morin, entretanto, indica que isso no corresponde obteno de quaisquer respostas ou receitas: (...) a complexidade surge com

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    dificuldade, como incerteza e no como clareza e como resposta. O problema saber se h uma possibilidade de responder ao desafio da incerteza e dadificuldade (Morin, 2001b, p.177). Para Pombo (2004, p.11), perceber atransformao epistemolgica em curso perceber que l, onde espervamosencontrar o simples, est o complexo, o infinitamente complexo. Que quanto

    mais fina a anlise, maior a complexidade que se abre nossa frente. E,portanto, que o todo no a soma das partes.

    2 - Como lidar com a construo do conhecimento em cenrioscomplexos?

    No h uma resposta nica e infalvel para as questes levantadas at aqui,expressas sinteticamente no subttulo desta seo. No entanto, isto noimpede a proposio de abordagens pedaggicas que visem lidar comsemelhantes argies. Tais abordagens, por sua vez, precisam, para seremefetivas no trato com a complexidade, encontrar articulaes e propostas

    relacionadas a outra indagao: ao criar a estratgia de um mdulo, disciplinaou curso, que elementos devem estar presentes para que os participantestenham maiores oportunidades para a construo do conhecimento pertinente?Neste aspecto, alguns pressupostos precisam ser considerados:

    As TICs no so uma finalidade em si, quando o assunto educao.Tecnologias so mediadoras, podendo, portanto, atravs de diversasinterfaces, e sob a intencionalidade de uma estratgia pedaggicacoerente, ser utilizadas em iniciativas educacionais que tenham aspessoas como foco (Oliveira, 2006);

    A construo do conhecimento pertinente na contemporaneidade um

    processo contnuo, que pode ser potencializado atravs de interaesplanejadas nos diversos ambientes nos quais o processo de ensino-aprendizagem se d, inclusive nos de natureza virtual. Sob esteenfoque, a colaborao e a cooperao, conceitos distintos, masigualmente importantes, podem proporcionar oportunidades paraconstrues de carter coletivo, materializando, assim, a inteno deentender a figura docente como orientadora, e no transmissora, noprocesso. Tal enfoque no descarta outras abordagens, desde quecomponentes de uma estratgia pedaggica que considere as trajetriasindividuais, as experincias das pessoas e seus objetivos (Vigotski,1998; Kenski, 2003);

    A interdisciplinaridade (como abordagem e atitude) deve prevalecer sabordagens fragmentrias e lineares (Pombo, 2004; Fazenda, 2005).Muito mais do que uma simples relao entre as disciplinas, esteconceito abrange as atividades propostas ao longo da experinciaeducativa como um todo, e tambm as relaes sociais presentes nacomunidade aprendente, suas interfaces com o mundo e com os outrossaberes, prvios e construdos em paralelo. Toda esta trama vai sendotecida continuamente, com mltiplas interconexes, ao longo doprocesso. Abrange tambm o prprio carter colaborativo dasinteraes, que no encontram limites rgidos nos perodos

    estabelecidos para incio ou trmino de cada uma das disciplinas(Oliveira, 2007, p.134).

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    Uma das possibilidades para equacionar a questo aqui levantada surge com aproposio dos quatro pilares da educao, fundamentados teoricamente aseguir, e cujo emprego no planejamento didtico-pedaggico de cursos on-linea distncia conduziu adio de outro elemento, tambm mais adianteespecificado1. O emprego da lgica proposta pelos autores do relatrio, lgica

    esta que deu origem a idia dos pilares, permite abarcar as diversasdimenses das pessoas que buscam realizar ou completar suas formaesatravs de iniciativas educacionais mediadas por TICs, em modalidadesparcialmente ou completamente a distncia.

    3 Os quatro pilares da educao

    Ao elaborar para a UNESCO o Relatrio da Comisso Internacional sobreEducao para o sculo XXI2, Jacques Delors e colaboradores incluram umcaptulo denominado Os quatro pilares da educao. Nele, argumentam osmembros da Comisso sobre a ampla disponibilidade de armazenamento e

    circulao de informaes no novo sculo, e sobre o papel da educao diantedeste contexto de abundncia potencialmente cognitiva. As novas propostaspara a educao neste cenrio notoriamente mediado pelas tecnologias deinformao e comunicao (TICs) no devem, de acordo com os autores,prover uma resposta de carter quantitativo, to-somente, aos problemas decarter educacional, ou seja: no suficiente o acmulo de conhecimentos nafase inicial da vida das pessoas, como se isto fosse capaz de providenciar umestoque para toda a existncia dos indivduos. A educao, desta forma, devepermitir a cada um estar a altura de aproveitar e explorar, do comeo ao fim davida, todas as ocasies de atualizar, aprofundar e enriquecer estes primeirosconhecimentos, e de se adaptar a um mundo em mudana (Delors et al, 1998,

    p. 89). Assim, de acordo com a Comisso, como papel da educao:

    (...) compete-lhe encontrar e assinalar as referncias que impeam as pessoasde ficar submergidas nas ondas de informaes, mais ou menos efmeras, queinvadem os espaos pblicos e privados e as levem a orientar-se para projetosde desenvolvimento individuais e coletivos. educao cabe fornecer, de algummodo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, aomesmo tempo, a bssola que permita navegar atravs dele(idem, ibidem).

    Para a consecuo de tais cometimentos, a educao deveria, segundo osautores, organizar-se em quatro pilares fundamentais: aprender a conhecer,aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. Com rarssimas

    excees, entretanto, o aspecto de maior foco ou de foco quase exclusivo da educao formal seria o primeiro, com alguma ateno para o segundo,ficando os demais relegados eventualidade. Para a Comisso, no entanto, osoutros dois aspectos esquecidos deveriam receber a mesma ateno dosanteriores, de modo a conferir ao indivduo no apenas os aspectos cognitivos,

    1 Tanto a discusso relativa aos quatro pilares da educao, quanto a experincia mencionada, surgiu das

    reflexes efetuadas entre os membros da equipe da SITE Educacional, sob direo da Profa. Dra. Vani

    Moreira Kenski, quando do planejamento pedaggico de disciplinas relativas ao curso de especializao

    em Design Instrucional para Educao On-line, em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora

    (UFJF).2 A primeira edio do Relatrio veio a pblico em 1996.

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    mas todos aqueles necessrios sua formao como pessoa e cidado. Destamaneira,

    Uma nova concepo ampliada da educao devia fazer com que todospudessem descobrir, reanimar e fortalecer o seu potencial criativo revelar otesouro escondido em cada um de ns. Isto supe que se ultrapasse a viso

    puramente instrumental da educao, considerada como a via obrigatria paraobter certos resultados (saber-fazer, aquisio de capacidades diversas, fins deordem econmica), e se passe a consider-la em toda a sua plenitude:realizao da pessoa que, na sua totalidade, aprende a ser(op.cit., p. 90).

    Na viso apresentada pelo Relatrio, aprender a conhecerquer significar, maisdo que a apreenso de uma srie de saberes codificados, a apropriao dosmecanismos do conhecimento, o que representaria, simultaneamente, meio efim da prpria existncia dos indivduos. Por isso, os estudos encetados pelaspessoas ao longo da vida no deveriam resumir-se queles de carterunicamente utilitrio, mas ampliar-se de modo a estimular a curiosidade

    intelectual, desenvolver o senso crtico e dimensionar a realidade, medidaque a capacidade de discernir ganha ampliao no mbito do desenvolvimentoda autonomia. Dado o carter mltiplo do conhecimento e das caractersticasquase infinitas de sua progresso na contemporaneidade, no possvelpretender um conhecimento de tudo, mas, ainda assim, as diversasespecializaes no prescindem de uma cultura geral, de modo a provocar,para os especialistas de quaisquer domnios, a possibilidade de interferir emum ambiente de sinergia entre os saberes e disciplinas, ou seja, interdisciplinar.

    Um aspecto importante do aprender a conhecer, e que lhe pr-requisito, oaprender a aprender, de modo a exercitar a ateno, a memria e opensamento (op.cit., p. 92).

    A ateno deve procurar trabalhar no mbito da velocidade com que sesucedem as informaes mediatizadas em nossa sociedade; a memria, longede ser prescindida em funo das incontveis possibilidades dearmazenamento e difuso de dados, deve funcionar como resposta instantaneidade destes mesmos dados, de forma seletiva/associativa, j que amemria humana supera os automatismos das memrias informticas; opensamento, por sua vez, desde cedo, deve possibilitar amplo trnsito entre oconcreto e o abstrato, alm de permitir a combinao de deduo e induonas diversas situaes de ensino e pesquisa. Em sntese: Aprender aconhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a

    possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno nmero de matrias.O que tambm significa: aprender a aprender, para beneficiar-se dasoportunidades oferecidas pela educao ao longo da vida (op.cit., p.101).

    O segundo aspecto, aprender a fazer, visto pela Comisso comoindissocivel em relao ao aprender a conhecer, ainda que esteja maisconectado aos aspectos da formao profissional dos indivduos. A natureza dotrabalho, entretanto, modificou-se com os avanos tcnicos, tornando-semenos circunscritas s atividades automticas, rotineiras e fsicas (largamentesubstitudas pelas mquinas), e mais pertinente a elementos imateriais ecognitivos. Outras qualificaes so exigidas neste contexto e incluem,

    segundo os autores, qualificao, em sentido estrito, adquirida pela formaotcnica e profissional, comportamento social, aptido para trabalho em

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    equipe, capacidade de iniciativa e gosto pelo risco (op. cit., p.94). Emoutras palavras, o trabalho estaria em processo de desmaterializao, comnfase para o setor de servios. Neste aspecto, aptides no mbito dasrelaes interpessoais mostram-se altamente desejveis, uma vez que, nestesetor, no se trabalha com um produto acabado, ou com a terra, mas com

    pessoas, projetos e informaes especficas. Segundo os autores, estas noso habilidades desenvolvidas em larga escala no ensino formal, o querepresentaria para esta um desafio a ser superado. A este desafio juntam-se asespecificidades locais dos pases em desenvolvimento, grande parte deles comconsidervel nmero de trabalhadores na informalidade, e um desafio comum atodas as naes: como aprender a comportar-se, eficazmente, numa situaode incerteza, como participar na criao do futuro? (op.cit., p.96).

    O terceiro pilar mencionado pelos autores do Relatrio aprender a viverjuntos, aprender a viver com os outros. Para os autores, esta proposiosupera o mero ensino de questes como a da no-violncia na escola, para

    atingir os diversos grupos humanos nos variados contextos sociais e instituirsituaes de aprendizado nas quais existam objetivos e projetos comuns, coma finalidade de superar questes ligadas ao preconceito e hostilidade, cujasrazes so, muitas vezes, histricas. Apesar do generalizado clima decompetio e concorrncia vigente na contemporaneidade, deve ser possvel educao levar as pessoas a tomar conscincia das semelhanas e dainterdependncia entre todos os seres humanos do planeta (op.cit., p.97). Acompreenso e a abertura alteridade impem educao a tarefa de propora descoberta de si mesmos por parte das pessoas, o que pressupe asuperao de dogmatismos sectrios existentes em alguns professores emtodos de ensino, na direo da resoluo de tenses e conflitos entre as

    pessoas, os grupos e os pases, de modo a fazer com que o dilogo e a trocade argumentos representem instrumentos indispensveis educao dosculo XXI (op.cit., p.98). Ainda sobre este aspecto, dizem os autores:

    A educao formal deve, pois, reservar tempo e ocasies suficientes em seusprogramas para iniciar jovens em projetos de cooperao, logo depois dainfncia, no campo das atividades desportivas e culturais, evidentemente, mastambm estimulando a sua participao em atividades sociais: renovao debairros, ajuda aos mais desfavorecidos, aes humanitrias, servios desolidariedade entre as geraes... (...) Por outro lado, na prtica letiva diria, aparticipao de professores e alunos em projetos comuns pode dar origem aprendizagem de mtodos de resoluo de conflitos e constituir uma refernciapara a vida futura dos alunos, enriquecendo a relao professor/aluno (Delors etal, p. 99).

    4 Uma estratgia multidimensional

    A idia defendida aqui se refere ao atendimento dos requisitos indicados pelaproposio terica dos quatro pilares. Para dar conta do carter complexo doconhecimento, de modo a atender as possibilidades abertas pelas proposiesimplcitas na idia supramencionada, uma estratgia didtico-pedaggicamultidimensional necessria. Em Morin (2002, p.38), o conceito domultidimensional explicitado em relao ao ser humano e sociedade. Para

    o autor, o ser humano tem um carter mltiplo, ao mesmo tempo biolgico,psquico, social, afetivo e racional, assim com a sociedade, com suas

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    dimenses histrica, econmica, sociolgica, religiosa, .... Ao transpor amultidimensionalidade para a questo do conhecimento, Morin afirma que oconhecimento pertinente deve reconhecer este carter multidimensional e neleinserir estes dados: no apenas no se poderia isolar uma parte do todo, masas partes umas das outras (idem, ibidem).

    A avaliao da aprendizagem um dos componentes da estratgia para o quala multidimensionalidade fundamental. Avaliao multidimensional3 aquelaque constitui um processo que procura dar conta do carter complexo doconhecimento pertinente (Morin, 2002; Oliveira, 2007). Ela se contrape avaliao meramente somativa, que olha apenas o alcance dos resultados eque no se preocupa em analisar as condies individuais, as vrias trajetriasde quem aprende, os vrios momentos, as mltiplas dimenses do saber e asinmeras articulaes entre os objetos de conhecimento, corre o risco deproduzir resultados muito estranhos. a avaliao de critrios arbitrrios eparticulares, e que usa a prova final como quase exclusiva forma de apurao.

    A multidimensionalidade na avaliao procura outro sentido, tomando asinteraes entre estudantes e professores havidas em tempos e espaosvariados, considerando significativos todos os momentos do processo epartindo deles para produzir uma avaliao ampla e participativa, em situaesde complexidade e de interdisciplinaridade.

    Assim como o processo de ensino-aprendizagem, visto como construosignificativa, a multidimensionalidade avaliativa uma construo conjunta, naqual tanto a colaborao entre grupos de alunos e professores, quanto o usode TICs, so altamente recomendveis (Oliveira, 2007, p. 26 e seguintes). Deoutra maneira:

    este carter multidimensional (...) deve ser entendido como de acompanhamentoem mltiplos sentidos e direes, que se faz ao longo do processo e de maneiraconstante, que se refere aos aspectos de correlao interna e externa dossaberes, bem como a suas interfaces, e que fornece elementos amplos sobre oprocesso de ensino-aprendizagem em cenrios complexos (...) (Oliveira, 2007,p.134).

    Assim, so condies desejveis prtica desta modalidade avaliativa:

    Mediao do processo por TICs, em todo ou em parte;

    Colaborao e/ou cooperao;

    Retornos individuais de questes, desempenho, dvidas, discusses; Ambiente de ensino-aprendizagem altamente interativo.

    A prtica avaliativa multidimensional aqui destacada em funo do cartercontnuo, processual, flexvel, adaptativo, colaborativo e interdisciplinarnecessrio sua implementao em cursos on-line. Ao pratic-la, torna-sepossvel atender maior parte dos elementos destacados por Delors (1998) emseu relatrio. Uma breve descrio de uma experincia neste sentido podetornar esta afirmao mais clara.

    3 Para esclarecimentos mais amplos sobre a avaliao multidimensional, ver OLIVEIRA, Gerson P.

    Avaliao em cursos on-line colaborativos: uma abordagem multidimensional. Tese de doutorado:educao. Universidade de So Paulo, 2007.

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    5 Avaliao multidimensional em um curso on-line

    A disciplina Avaliao a nona, de uma srie de dez, oferecidas namodalidade on-line a distncia no curso de Especializao em DesignInstrucional (DI) para Educao On-line, realizado pela Universidade Federal

    de Juiz de Fora (UFJF) em parceria com a SITE Educacional. H, tambm,uma disciplina presencial, com encontros peridicos ao longo de toda ainiciativa. As disciplinas tm um formato semanal, perfazendo quatro unidadescada uma.

    Em relao disciplina Avaliao, na primeira semana, atividadesrelacionadas aproximao do objeto de estudo foram efetuadas, ematendimento estratgia multidimensional adotada. Como se pretendia abordaros conceitos ligados prtica avaliativa efetiva, parte dos participantes foiconvidada a julgar um desenho, produzidos com limitaes (por exemplo, umaflor usando somente tringulos), enquanto os demais, desconhecendo as

    limitaes, foram convidados a avaliar as produes grficas. Em meio atividade, um texto especialmente elaborado para o curso era discutido nofrum. Terminadas as tarefas de desenho e avaliao, foram reveladas aslimitaes, e as discusses prosseguiram, em outro patamar terico,culminando com uma terceira atividade, colaborativa, relativa construo deum quadro sobre conceitos de avaliao e sua aplicabilidade, o que permitiuaos participantes trazer exemplos prticos/refletir sobre a prtica profissionalem construo.

    (...) intitulado (...) Flor, caso no tivesse uma

    definio do objeto em destaque, teria muita

    dificuldade de chegar mesma concluso. O

    trabalho ficaria mais rico se no estivesse definidoo nome, pois liberaria a forma como as pessoas

    poderiam sentir o objeto (...). Est entre o

    figurativo e o no figurativo, entre o que existe e o

    que no existe. Entre o real e o abstrato.(...)

    Quanto s cores utilizadas no trabalho, fica

    pairando em momentos quentes e vibrantes. Coisa

    do tipo de restaurantes mexicanos (...). Nota-se

    que a criadora buscou ou estava em um momento

    agitado, mas interno, pois o desenho no

    demonstra movimento em relao ao espao.

    Quadro 1 Desenho realizado na primeira semana, com a respectiva avaliao, antes que fosse

    revelada a limitao (desenhar uma flor somente com tringulos)

    Na segunda semana, os participantes receberam outro texto (Avaliao ePlanejamento), tambm elaborado para o curso, e tinham como atividadeinicial complet-lo com suas reflexes e idias, com base na trajetriapercorrida na primeira semana e no aprendizado das outras disciplinas. Almdisso, receberam, como trabalho coletivo, reelaborar o planejamento de umcurso on-line, proposto na forma de case. Em meio s atividades, asdiscusses foram muito importantes, e as interaes intra e intergrupaislevaram produo de um material de extrema qualidade.

    Na terceira semana, em meio leitura e discusso de outro texto (Avaliao e

    acompanhamento da aprendizagem), foi proposto um chat-relmpago empequenos grupos, formados livremente entre os participantes, em paralelo com

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    as discusses. O tema era DI e avaliao e o chat devia, com base nasleituras j realizadas, nas experincias pessoais, nas construes coletivasprvias, produzir a base para um texto de autoria coletiva. A tarefa prescreviaapenas uma limitao: havia uma ordem, ou seja, cada participante deveria semanifestar na sua vez, sendo que, no caso, era permitido apenas construir uma

    frase por interveno. A idia central era a de que, em no mximo quarentaminutos, todos os participantes fizessem suas intervenes, colaborando paraa construo coletiva do conhecimento. A participao, neste caso, seriadividida de forma semelhante entre todos. Claro que, como os perfis erammuito diversos, as intervenes individuais resultaram muito diferentes, quanto forma e relevncia. Em funo disto, utilizaram-se postagens no frum etrocas realizadas via e-mail como formas de completar os textos e melhororganiz-los. A estrutura dos mesmos, no entanto, permaneceu sendo aqueladada pelas trocas ocorridas nos chats.

    Na semana final do curso, os alunos deveriam produzir um texto contendo a

    sntese de suas reflexes durante a experincia vivenciada na disciplina. Havia,tambm, um texto, como nas semanas anteriores, baseado em aes deavaliao, suas limitaes e possibilidades, e indicaes de formas de usar osresultados recolhidos em futuras aes de reconstruo de um curso on-line.Sobre este texto, um debate foi aberto no frum de discusses. Alm dediscutir a leitura proposta, este acabou sendo, tambm, um frum defechamento da disciplina, de concluses, as quais acabaram por colaborar naconstruo do texto final de cada um. As concluses foram muito interessantes,revelando que os participantes conseguiram agregar elementos importantessobre a avaliao em cursos on-line(e sobre a avaliao da aprendizagem emgeral) s experincias anteriores.

    Durante todo o curso, o movimento avaliativo foi constante, considerando todasas intervenes dos participantes, suas atividades, discusses, perguntas,produes e dificuldades. Ao professor, alm da intensa participao nasinteraes, tambm cabia o trabalho de fornecer retornos individuais, atravsdas diversas interfaces do ambiente virtual, incentivando as correlaesinterdisciplinares, orientando em relao ao percurso de cada um, destacandoas intervenes dos alunos e colaborando, assim como toda a comunidade, naconstruo do conhecimento. A idia no era produzir um conceito ou nota,mas de construir uma viso ampla sobre a atuao de cada um, ao mesmotempo em que se dava a aprendizagem. Uma sntese destas intervenes,relativa primeira semana da disciplina, pode ser vista no prximo quadro.

    Atividade AvaliaoTarefa 1: Desenhar e julgar Acompanhamento dos desenhos;

    Esclarecimento da tarefa e das dvidas por e-mail ou chat; Acompanhamento dos julgamentos; Acompanhamento e interveno nas discusses; Sntese coletiva,feedbackdas intervenes individuais.

    Tarefa 2: Leitura e

    discusso do texto da

    semana

    Acompanhamento e discusso relacionados ao texto no frum; Resposta s dvidas individuais enviadas por e-mail; Sntese coletiva,feedbackdas intervenes individuais.

    Tarefa 3: Elaborao de

    quadro-sntese sobre

    avaliao

    Acompanhamento e intervenes (quando solicitadas) nos chats grupais; Anlise dos critrios utilizados na elaborao dos quadros durante a tarefa, com

    intervenes relacionadas aos conceitos e retorno s dvidas levantadas;

    Anlise do quadro final, com comentrios e discusses inter-grupais; Orientao em eventuais reelaboraes.

    Quadro 2 Avaliao multidimensional na primeira semana da disciplina Avaliao

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    6 Concluses e recomendaes

    Como j foi mencionado, a multidimensionalidade uma forma de trabalharcom a complexidade, entendendo que a construo do conhecimento atual sed em cenrios e atravs de trajetrias no-lineares. Atravs dela, torna-se

    possvel utilizar os quatro pilares da educao como elementos cujasproposies devem ser consideradas, para professores e alunos, em cursoson-line a distncia. Atravs de um planejamento flexvel, adaptvel strajetrias da comunidade e dos participantes em si, prope-se que cada umdos pilares receba as seguintes consideraes no mbito dos processos deensino-aprendizagem mediados por TICs e em EAD, em especial:

    Aprender a conhecer: trabalhar multidimensionalmente com osparticipantes, alunos e professores, de forma que seja possvel construiro conhecimento a partir de uma perspectiva ampla o que diferenteda mera aquisio de dados e da simples composio de informaes.

    Dito de outra forma, consiste na possibilidade de construir em conjunto,em um ambiente no qual todos ensinam e aprendem, de forma aincentivar que cada um desenvolva sua capacidade de elaborar ereelaborar conceitos, prticas, questionamentos, entre outrasintervenes;

    Aprender a fazer: proporcionar aos participantes de um curso aoportunidade de contato com situaes reais encontradas em seucenrio profissional particular, e, por extenso, no processo de ensino-aprendizagem via EAD, atravs de proposies tericas e atividadesprticas;

    Aprender a conviver: incentivar a abordagem colaborativa ecooperativa nos processos de ensino-aprendizagem, com a valorizaodos saberes e objetivos individuais. Discutir as possibilidades deedificao de uma comunidade virtual de aprendizagem com a finalidadede expandir os processos de construo do conhecimento para umalgica de continuidade, que pode estender os processos de construodo conhecimento para alm do perodo estipulado por um curso;

    Aprender a ser: fornecer elementos para que o participante vivencie umcomprometimento efetivo com a multidimensionalidade em todas asiniciativas de ensino-aprendizagem que venha a participar, bem comoem suas intervenes profissionais, incentivando, assim, a coernciaentre as teorias relacionadas e sua prtica cotidiana. Isto resulta emuma proposta de engajamento efetivo do profissional que realiza suaformao continuada em uma lgica que supera a mera transmisso eque se expande, por conseqncia, em direo do aprendizado de todoscom todos, no qual o professor orienta, aprende e ensina, assim como oaluno.

    s quatro proposies iniciais de Delors e sua equipe, percebe-se a imerso deuma quinta idia, um quinto pilar, conectado aos demais, permeando as aes

    e reflexes inseridas na lgica dos outros quatro: aprender a criar, de modo afavorecer o entendimento de que preciso inovar, sem descartar as

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    experincias anteriores dos participantes e do prprio professor. Ou seja:incentivar a utilizao de metodologias que despertem o potencial colaborativodo grupo e que auxiliem no resgate dos saberes em permanente construo(para modificar, refazer, acrescentar). Semelhante lgica permite apresentar apossibilidade de criar novas abordagens para a construo do conhecimento

    pertinente, as quais, por sua vez, devem pretender explorar possibilidadesamplas dos alunos, que vo da elaborao pessoal espontnea ao trabalhocoletivo, engajado, interativo, atravs das mais variadas formas de expresso.

    Ao propor o aprender a criar como elemento adicional, pretende-se, ento,ressaltar o carter mediador das TICs, e o valor do trabalho para e feito porpessoas. Pois conhecer, fazer, conviver, ser e criar so dimenses humanas,que demandam pensamento e emoo. Tais aspectos so fundamentais para otrato com a complexidade, de modo a permitir que os processos de ensino-aprendizagem da contemporaneidade no se percam na desorganizao ou nocaos.

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