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Aspectos moleculares da transformação celular: conceitos e implicações
Patrícia C. B. Beltrão-Braga, Verônica Rodrigues Teixeira e Roger Chammas
Câncer é um conjunto de doenças caracterizado pelo progressivo
acúmulo de mutações no genoma de uma célula. Estas mutações levam a
alterações na expressão ou função de genes-chave para a manutenção da
homeostasia celular. Essas alterações genéticas podem converter uma célula
normal em uma célula transformada, que se caracteriza por não mais
responder aos sinais de controle de proliferação, morte e diferenciação que
governam a comunidade celular (Figura 1).
Estudos epidemiológicos mostram que a idade é um dos principais
fatores de risco para o desenvolvimento do câncer. Ou seja, o câncer é uma
doença relacionada com a idade, ocorrendo mais freqüentemente em pessoas
idosas. Assim, com o aumento progressivo da expectativa de vida média das
pessoas, a incidência de câncer tende a aumentar. Este fato é interpretado
como um aumento na probabilidade de mutações acumularem-se no material
genético de cada indivíduo devido à exposição acumulada a fatores
mutagênicos. Assim, numa situação limite, o aparecimento de uma célula
cancerosa seria praticamente inevitável.
Entretanto, o câncer é uma doença de múltiplos passos, ou seja, para
que o câncer ocorra é necessário acontecer mais de uma lesão diferente no
genoma celular para que se complete o processo de transformação. Por
exemplo, para células de roedores em cultura adquirirem competência
tumorigênica, são necessárias pelo menos duas alterações genéticas. Já para
2
células humanas nas mesmas condições, esse número sobe para quatro a sete
lesões diferentes. Em adultos, estima-se que o intervalo de tempo entre a
primeira lesão genética e o aparecimento do câncer seja em torno de dez a
vinte anos. Assim, pelo tempo necessário para seu desenvolvimento, alguns
tipos de cânceres seriam potencialmente preveníveis. A compreensão do
processo de carcinogênese tem permitido o desenho de estratégias de
intervenção que visam em última análise prevenir o aparecimento de tumores.
Neste capítulo serão discutidas as bases moleculares do processo de
transformação celular e algumas de suas implicações para a prevenção de
tumores.
Mutações e alterações epigenéticas
Os tipos de alterações físicas no genoma, ou mutações, mais
freqüentemente encontradas em câncer são:
1) mutações pontuais; quando um único par de nucleotídeos encontra-
se alterado. É o que ocorre com o gene ras, que codifica uma proteína
associada à sinalização de vias de proliferação celular. Mutações pontuais em
ras, especificamente nos códons 12, 13 e 61 levam à formação de uma forma
constitutivamente ativada do produto deste gene. Células com esta alteração,
freqüentes em adenocarcinomas de pâncreas por exemplo, proliferam de
maneira desordenada mesmo na ausência de estímulos externos. Mutações
pontuais podem também levar à geração de códons de terminação, que
levariam à produção de proteínas truncadas.
2) rearranjo gênico; quando genes ou fragmentos de genes são
movidos de lugar, por mecanismos como inversão ou translocação, ou
3
eventualmente perdidos (deleção). Rearranjos gênicos podem levar ao
truncamento de genes (por exemplo, por alterações da fase de leitura de
genes). Translocações podem levar à geração de genes quiméricos, como por
exemplo na translocação recíproca entre os cromossomos 9 e 22 (gerando
cromossomo Philadelphia), freqüente na leucemia mielóide crônica, que origina
o gene de fusão bcr-abl, com potencial transformante. Translocações também
podem mudar as relações entre genes e elementos reguladores da transcrição
destes genes. É o que acontece na translocação entre os cromossomos 8 e 14
associada a linfomas de Burkitt em algumas regiões da África. O gene myc,
que codifica uma proteína nuclear que está associada ao controle de
transcrição de genes-chave para o controle do ciclo celular, posiciona-se frente
ao promotor dos genes das imunoglobulinas, um promotor forte em linfócitos. A
transcrição desregulada de myc é um dos eventos necessários para a
transformação maligna destes linfócitos.
3) amplificação gênica, quando há aumento no número de cópias de
um alelo. Citogeneticamente, a amplificação gênica está associada à formação
de regiões homogeneamente coradas em cromossomos, ou ainda ao
aparecimento de mini-cromossomos extranumerários. Técnicas de localização
de alelos em cromossomos, baseadas em técnicas de hibridação in situ
atualmente utilizadas na clínica permitem a identificação deste fenômeno, que
ocorre, por exemplo, em adenocarcinomas de mama, onde o gene do receptor
associado a proliferação celular, erbB2, encontra-se amplificado.
Tumores apresentam ainda uma série de alterações epigenéticas,
caracterizadas como alterações na expressão gênica, onde se observam
4
diferentes conseqüências fenotípicas, sem haver nenhuma mudança na
seqüência de DNA. Um mecanismo freqüentemente descrito para estas
alterações é a variação no grau de metilação do promotor de genes. De
maneira geral, porém não absoluta, a hipermetilação de regiões do promotor
associa-se ao silenciamento da transcrição de genes; enquanto a
hipometilação pode estar associada à transcrição desordenada destes genes.
Em tumores humanos, por exemplo, o silenciamento do gene regulador do ciclo
celular CDKN2a (Cyclin-Dependent Kinase iNhibitor) que codifica duas
proteínas com funções supressoras do aparecimento de tumores p14 e p19ARF
ocorre por hipermetilação de seu promotor.
Um dos mecanismos associados à flutuação da expressão de genes
devida a variações da metilação é a reorganização da cromatina. Esta
reorganização depende do grau de interação do DNA com proteínas da classe
das histonas. O estado de acetilação das histonas altera a estrutura da
cromatina: a acetilação de histonas afrouxa a interação entre o DNA e estas
proteínas, favorecendo a transcrição gênica; a desacetilação de histonas está
associada ao bloqueio da transcrição de alguns genes. Duas classes de
enzimas podem afetar a acetilação de histonas: histono-acetiltransferases
(HATs), que adicionam um grupo acetil, e histono-deacetilases (HDACs), que
removem um grupo acetil, e dessa forma provoca a repressão transcricional de
genes que estão envolvidos no controle do ciclo celular, diferenciação e/ou
apoptose.
Mutações são eventos mais freqüentes do que geralmente se imagina.
Claramente, uma pequena fração delas leva ao desenvolvimento de cânceres.
Postula-se que as mutações que ocorrem freqüentemente em todos os
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organismos garantem a variabilidade genética, tida como necessária para a
evolução das espécies. De maneira análoga ao que acontece com as espécies,
um processo micro-evolutivo também ocorre em nosso organismo, porém
durante o tempo de vida de um indivíduo.
Vários mecanismos moleculares atuam na manutenção da integridade
dos genomas celulares. Uma vez que uma célula é mutada, mecanismos
operantes ou reparam as lesões no DNA (Figura 2), ou então induzem a morte
da célula mutada. A eficiência deste processo não é, porém, absoluta. Na falha
ou no relaxamento destes mecanismos, as células mutadas não são excluídas
nem reparadas. Mutações que confiram uma vantagem seletiva à célula
mutada (por exemplo, crescimento autônomo ou evasão dos processos de
morte celular) são fixadas na população de células de um organismo. As
vantagens conferidas às células mutadas culminam com a expansão da
população destas células (expansão clonal), dando origem a um eventual
tumor. Assim, os tumores originam-se freqüentemente de uma única célula
(origem monoclonal). Contudo, à medida que as mutações progressivamente
se acumulam, é freqüente observar o aumento da heterogeneidade da massa
tumoral, devido ao aparecimento de subpopulações. Esta heterogeneidade
pode ter uma base genética, com alterações físicas do DNA das células
tumorais, ou ser devida a flutuações no nível de expressão de conjuntos de
genes (base epigenética). A interação entre células de diferentes
subpopulações tumorais pode modular o processo de carcinogênese. Esta
noção vem sendo conhecida como efeito de comunidade, e tem um grande
impacto nas fases mais tardias do processo de carcinogênese.
Agentes mutagênicos
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As mutações podem ser causadas por erros durante o processo de
replicação ou por mutagênicos endógenos, como as espécies reativas de
oxigênio, ou induzidas por agentes externos. De maneira didática, os agentes
externos são divididos em três classes:
1) Agentes físicos, como luz ultravioleta e radiações ionizantes;
2) Agentes biológicos, como alguns vírus, que se integram ao genoma
celular interrompendo seqüências gênicas ou promovendo rearranjos gênicos;
3) Agentes químicos, como os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos e
nitrosaminas. Alguns carcinógenos químicos são inativos e se tornam
potencialmente lesivos ao DNA após terem sido modificados para uma forma
mais reativa por processos metabólicos, como por exemplo por enzimas
intracelulares conhecidas como citocromo P-450 oxidases. Essas enzimas
normalmente atuam na conversão de toxinas ingeridas em compostos
inofensivos que são facilmente excretados. Entretanto, sua atividade sob certos
agentes químicos gera produtos que são altamente mutagênicos, como é
observado com uma toxina fúngica, a aflatoxina B1 (vide abaixo). As enzimas
detoxificantes como as citocromo P-450 oxidases apresentam um grande
número de variantes polimórficas nas populações humanas. Diferentes
variantes polimórficas podem ter maior ou menor atividade sobre os vários
agentes pró-carcinogênicos, sugerindo uma possível explicação para as
diferenças quanto à susceptibilidade a diferentes tipos de câncer em
populações humanas definidas.
As etapas da carcinogênese
O processo de carcinogênese é classicamente dividido em quatro fases:
(i) iniciação; (ii) promoção; (iii) manutenção e (iv) progressão tumoral.
7
No início do processo de carcinogênese ocorre uma alteração no DNA.
Para gerar-se a doença, é necessário que esta mutação seja herdável, isto é
seja transmitida para as células filhas. Essa alteração inicial recebe o nome de
iniciação. Como já mencionamos anteriormente, somente uma alteração no
DNA não é suficiente para causar o câncer. São necessárias várias mutações
em seqüência, que não sejam letais para a célula. Mutações ocorrem em
qualquer parte do genoma, porém o efeito deletério que provocam só
contribuirá para o desenvolvimento do câncer se ocorrerem em classes de
genes específicas. As mutações responsáveis pelo desenvolvimento do câncer
ocorrem preferencialmente em duas classes de genes: nos genes supressores
de tumores e nos protoncogenes. Mais recentemente alterações em genes
associados ao reparo de DNA têm sido relatadas em diferentes tipos de
câncer, sendo freqüentemente associados às síndromes hereditárias que
cursam com o desenvolvimento de tumores. Alguns exemplos de
protoncogenes e genes supressores de tumor estão listados nas tabelas I e II.
Genes supressores de tumores codificam proteínas com funções
específicas que atuam, por exemplo, impedindo o acumulo de mutações no
genoma da célula, e portando garantindo a integridade do genoma, como o
produto do gene TP53, ou controlando a progressão da célula ao longo das
fases do ciclo celular, como os produtos dos genes Rb e os inibidores de
quinases dependentes de ciclinas, como os produtos dos genes WAFp21 e
CDKN2a (p14). Os produtos destes genes atuam em diferentes níveis de
regulação, como no processo de transcrição e transdução de sinal. Estudos
moleculares permitiram a identificação de vários genes supressores de tumor
(Tabela I).
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O gene supressor de tumor mais bem estudado em tumores humanos é
o TP53. Este gene codifica uma fosfoproteína nuclear (p53) que tem papel
ativo na parada do ciclo celular e indução da expressão de genes de reparo de
DNA lesado. Quando há uma lesão no DNA o nível de p53 na célula aumenta,
e após o reparo o nível diminui. Dependendo da intensidade do agravo, p53
pode induzir a morte das células geneticamente alteradas (via indução do gene
pró-apoptótico bax (Figura 1 e 2).
Protoncogenes são genes celulares normais que participam do controle
das funções celulares vitais como proliferação, diferenciação, migração e morte
celular (apoptose). De maneira geral, os protoncogenes podem ser divididos
em quatro classes de genes que codificam as seguintes proteínas: fatores de
crescimento, receptores para fatores de crescimento, transdutores de sinal e
fatores de transcrição (Tabela II). Quando esse genes se encontram mutados
ou sua expressão descontrolada por alguns dos mecanismos de rearranjo
gênico mencionados acima, diz-se que estão ativados, e passam a receber o
nome de oncogenes.
As mutações em genes supressores mais freqüentes são do tipo
deleção e mutação de ponto. Elas atuam de maneira recessiva, ou seja, ambos
os alelos desses genes devem ser perdidos ou inativados para que sua função
celular seja afetada. Genes supressores de tumores como TP53 e Rb são
alvos da ação de oncoproteínas virais, como os produtos dos genes E6 e E7 de
HPVs de alto risco, respectivamente. A hipermetilação de promotores dos
genes supressores de tumor representa um mecanismo freqüente de
inativação transcricional.
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Nos protoncogenes as mutações mais freqüentes são por substituição
(mutação pontual) ou amplificação, e essas mutações atuam de maneira
dominante, onde apenas um alelo precisa estar mutado para a ativação do
gene. Em relação ao promotor, postula-se que a hipometilação do promotor
está associada à transcrição descontrolada de oncogenes.
A etapa seguinte do processo de carcinogênese é a promoção, onde as
células geneticamente alteradas, ou seja, iniciadas, sofrem o efeito de agentes
que não são mutagênicos, porem que promovem a expansão da população
celular que carrega uma mutação inicial. Lesões causadas por infecções com
alguns parasitas, bactérias e vírus podem atuar como promotores de câncer.
Por exemplo, infecção do estômago com a bactéria Helicobacter pylori,
associada à gastrite , parece ser a principal causa do câncer de estômago. Já o
câncer de bexiga parece estar associado com a infecção com um platelminto, o
Schistosoma haematobium . A hepatite causada pelo vírus da hepatite B (VHB),
tem sido bastante associada ao desenvolvimento de câncer hepático quando
se manifesta a forma crônica da doença. De maneira semelhante, a
persistência da infecção pelo vírus da hepatite C é um importante fator de risco
para o desenvolvimento de câncer hepático. A persistência da infecção levaria
a uma exposição descontrolada a fatores que regulam a transcrição de genes
associados à proliferação celular, como é o caso do fator de transcrição Stat 3,
cujo acúmulo na forma fosforilada está associado ao desenvolvimento de
hepatocarcinomas.
O câncer só ocorrerá se as células forem expostas primeiramente a um
iniciador e seqüencialmente a um agente promotor. Essa ordem deve ser
respeitada, caso contrário não há a desenvolvimento de câncer. Se a
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exposição ao promotor não ocorrer imediatamente após a exposição ao
iniciador, ainda assim pode haver o desenvolvimento do câncer. Alguns
agentes mutagênicos podem eventualmente também desencadear a promoção
tumoral; estes agentes são chamados de carcinógenos completos.
É importante notar que nem todo agente carcinogênico é
necessariamente um agente mutagênico, isto é, causa um dano no mater ial
genético (genotóxico). Estes agentes atuam por diversos mecanismos, dentre
os quais dois são os principais: (1) promovem a proliferação celular
desregulada, quer diretamente por causar um dano tecidual persistente,
associado à criação de microambiente pró-inflamatório que estimule a
proliferação celular; (2) induzem o estresse oxidativo, que leva ao acúmulo de
espécies reativas de oxigênio com potencial genotóxico.
Após a iniciação e a promoção, há a fase de manutenção, onde as
células geneticamente alteradas são mantidas na população. Isto só ocorrerá:
1) se as mutações não forem excessivas. Mutações excessivas são deletérias;
de fato, células com grande instabilidade genética são selecionadas
negativamente; 2) se as alterações genéticas estiverem associadas a maior
capacidade de proliferar em relação às células normais; 3) se as mutações
levarem ao escape do processo de morte celular induzida.
Como mencionado acima, nossas células têm um mecanismo de reparo
do DNA. Só não desenvolvemos câncer rapidamente porque nossos
mecanismos de reparo são em geral eficientes. Dessa forma, podemos dizer
que a manutenção da célula alterada significa que a mesma escapou dos
mecanismos homeostáticos intracelulares, que as levariam a apoptose. Esses
mecanismos ainda não estão completamente conhecidos, porém garantem a
11
integridade do genoma celular. Se os mecanismos homeostáticos
intracelulares não foram capazes de eliminar a célula tumoral, essas mutações
serão fixadas na população celular e sua freqüência irá aumentar à medida que
as células se duplicam. Se os mecanismos de integridade do genoma
estiverem comprometidos (por exemplo, houver mutações em TP53 ou em
genes de reparo), aumentará a probabilidade de mutações se acumularem. A
progressão do tumor se manifestará em função do acúmulo destas mutações.
Uma característica essencial da célula transformada é sua capacidade
de replicação sustentada, muitas vezes chamada de capacidade de replicação
infinita, um conceito ligado a características de linhagens estabelecidas em
cultura. Células normais tendem a dividir um número finito de vezes. A cada
divisão, há um progressivo encurtamento das extremidades dos cromossomos
(os telômeros). O tamanho destes telômeros funcionaria assim como um
relógio biológico, este encurtamento se dá até um tamanho limite. Quando
atingido este limite de encurtamento a célula sofre apoptose. Células
embrionárias, células progenitoras dos diferentes tecidos (stem cells ) e células
tumorais apresentam mecanismos de reposição destas extremidades
cromossômicas, mantendo sua capacidade de replicação indefinidamente. A
manutenção de características de replicação são geralmente associadas de
maneira inversa com o grau de diferenciação celular. Por exemplo, em um
epitélio, as células que apresentam as características mais diferenciadas não
proliferam; de fato, muitas vezes o processo de diferenciação celular em alguns
tecidos culmina em morte celular. Os modelos de carcinogênese mais aceitos
no momento propõem que a célula transformada mantém algumas das
características de células progenitoras, abortando os processos de
12
diferenciação celular normal. Não ocorre, assim, uma "desdiferenciação"
celular. Alguns dos traços de diferenciação podem ainda ser observados em
células ao longo da progressão tumoral; contudo, o processo de diferenciação
em tumores é incompleto e disfuncional. Esta noção tem importância clínica em
alguns modelos, onde a base da transformação está associada a resposta
incompleta a agentes diferenciadores. A identificação dos mecanismos desta
resposta incompleta e o uso de drogas que compensem estas vias defectivas
são áreas promissoras de estudo, apresentando alguns resultados positivos,
embora incompletos, no controle da progressão tumoral.
Até aqui descrevemos o processo de carcinogênese centrado na célula
tumoral. Atualmente, muitas evidências indicam que as diferentes etapas da
carcinogênese são moduladas pela interação entre as células geneticamente
alteradas (células tumorais propriamente ditas) e elementos do microambiente
tecidual destas células. De fato, a aquisição da capacidade de invasão tecidual,
a indução de formação de vasos sanguíneos ou linfáticos e a capacidade de
metastatização, todas estas características associadas ao comportamento das
células cancerosas, são claramente dependentes de células não tumorais
presentes ou recrutadas para o microambiente tumoral. Estas características
da transformação celular que caracterizam as fases finais da progressão
tumoral serão discutidas em outros capítulos deste livro.
Quimioprevenção
Por se tratar de uma doença na maioria das vezes de difícil tratamento,
a idéia de prevenir o aparecimento do câncer atrai diversos pesquisadores para
a área da quimioprevenção. Quimioprevenção pode ser definida como o uso de
13
compostos sintéticos e naturais (encontrados em alimentos) para intervir
precocemente em estágios pré-cancerosos da carcinogênese, inibindo,
retardando ou revertendo a carcinogênese, assim, um agente quimiopreventivo
deve atuar em alvos moleculares e celulares específicos, como nos processos
de inflamação, vias de transdução de sinal e nos processos de metilação e
acetilação de histonas.
Diversos protocolos têm sido avaliados na tentativa de se reduzir os
riscos de desenvolvimento do câncer, usando-se agentes quimiopreventivos.
Esses estudos são baseados em experiências anteriores com animais em
laboratório, que resultaram na determinação do efeito protetor de diversas
substâncias no desenvolvimento de câncer experimental.
Agentes quimiopreventivos devem ser não tóxicos e relativamente livres
de efeitos colaterais, pois eles têm de ser administrados em pessoas saudáveis
por longos períodos. Desta forma devem ser preferencialmente administrados
oralmente, como pílulas, alimentos ou bebidas modificadas. Os alimentos são
uma fonte das mais promissoras contendo componentes que podem ser
usados na quimioprevenção. Vegetais e frutas podem diminuir o risco de
desenvolvimento do câncer. Entretanto, a identificação e isolamento das
substâncias ativas como agentes quimiopreventivos não é necessariamente
simples.
Uma grande variedade de agentes quimiopreventivos vem sendo
estudada desde 1990. Aproximadamente 2000 compostos naturais e sintéticos
têm demonstrado, em modelos experimentais, atividade quimiopreventiva.
Entre estes compostos encontram-se inibidores hormonais (anti-estrogênios),
anti-inflamatórios, antioxidantes e outros componentes derivados da dieta. A
14
seguir comentaremos sobre alguns agentes quimiopreventivos que já possuem
resultados em ensaios clínicos com humanos e seu modo de ação. A maior
parte dos estudos visa a prevenção secundária, isto é, acaba recaindo sobre
pacientes que já tem o diagnóstico de câncer. Aí analise-se o impacto destes
agentes na sobrevida livre de doença na vigência dos tratamentos
convencionalmente preconizados. Em menor proporção, há também os
estudos de prevenção primária, que avalia populações sadias com risco
aumentado de desenvolvimento de tumores de maneira comparativa a grupos
controle.
Iniciação como alvo para quimioprevenção: o caso da aflatoxina
Aflatoxinas são substâncias produzidas por fungos que são
freqüentemente encontradas como contaminantes de alimentos como o milho,
amendoim, molhos de soja e grãos de soja fermentados. A aflatoxina B1
(AFB1) por exemplo, após sofrer modificação por ação do citocromo P450 é
ativada, formando adutos com o DNA (aflatoxina N7-guanina). A formação
destes adutos está associada a mutações do tipo transversão, onde há a
substituição de G (guanina) para T(timina) no DNA. A presença de aflatoxina
N7-guanina na urina é um indicador de exposição a aflatoxina e está associada
a um risco relativo de 2 a 3 vezes maior para o desenvolvimento do carcinoma
hepatocelular (HCC).
Diversas análises mutacionais no gene supressor de tumor TP53 em
indivíduos com HCC em populações da China e África que foram expostas a
aflatoxina mostraram altas freqüências de transversões de G para T,
especialmente no códon 249. Esta mutação ocorre no domínio de ligação de
15
TP53 ao DNA, interferindo com a função normal deste gene supressor de
tumor.
Como a contaminação de aflatoxina na comida é um problema difícil de
ser completamente eliminado, programas de prevenção secundária
(quimioprevenção) são altamente desejáveis. Ditioltionas, encontrados em
vegetais crucíferos com brócoles, couve-flor e repolho, são potentes inibidores
do citocromo P-450. Assim, seu uso bloquearia a ativação da aflatoxina,
bloqueando a etapa de iniciação (Figura 3). Um derivado sintético de ditioltiona
(Oltipraz) inibe o desenvolvimento de tumores em animais e atualmente está
sendo estudado em humanos. Entretanto, enquanto a avaliação da eficácia de
Oltipraz está em andamento, outros agentes quimiopreventivos também têm
sido alvo de estudos, como é o caso da clorofilina.
A clorofilina, encontrado em vegetais de coloração verde, é uma mistura
de sais de sódio e cobre da clorofila, utilizada como corante de alimentos. Ela
atua diminuindo a biodisponibilidade de AFB1 e seus metabólitos, por diminuir
sua absorção e aumentando sua excreção, assim como inibindo a formação
de adutos derivados de AFB1. Recentemente, foi feito um ensaio clínico em
uma população na China, exposta a aflatoxinas em sua dieta e com alto risco
de desenvolvimento subseqüente de HCC. Nesse estudo, esses indivíduos
ingeriram clorofilina e foi constatada uma redução de 55% de aflatoxina N7-
guanina na urina, sugerindo que a clorofilina poderia ser usada contra os
efeitos da AFB1.
Promoção como alvo para prevenção
Muitos alimentos possuem grandes quantidades de flavonóides, como a
genisteína por exemplo. Estas substâncias têm sido estudadas como potentes
16
inibidores de tirosino-quinases, enzimas associadas a resposta proliferativa.
Alterações na função destas enzimas são frequentes na fase de promoção.
Além de modular a resposta proliferativa, há evidências de que genisteína
também induza o processo de morte celular (apoptose), por interferir com o
grau de fosforilação de proteínas que atuam no controle da mitose (Figura 4).
Ainda,genisteína inibe a ativação do fator de transcrição nuclear, NF-kB e a via
de sinalização Akt, ambos envolvidos na manutenção de um balanceamento
entre a sobrevivência celular e a morte celular programada (Figura 1). O fator
de transcrição nuclear NFkB desempenha um papel importante no processo
inflamatório. Produtos naturais (como curcumin e resveratrol), possuem
atividade antiinflamatória e anticarcinogênica, pois bloqueiam a atividade
transcricional de NF-kB.
Vitaminas e anti-oxidantes como agentes quimiopreventivos
Câncer de próstata é o tumor mais comumente diagnosticado e o
segundo relacionado com tumores que levam ao óbito de homens em paises
desenvolvidos. Dados epidemiológicos mostram que variações étnicas e
geográficas na incidência e mortalidade do câncer de próstata podem estar
relacionadas ao consumo de substâncias na dieta, em especial anti-oxidantes.
Essas substâncias incluem vitamina D e E, soja, licopene e selênio. Entretanto,
a ingestão de grandes quantidades de vitamina D é prejudicial a saúde,
causando hipercalcemia. Já análogos sintéticos de vitaminas D (deltanóides)
que têm ação antiproliferativa e baixo risco de provocar hipercalcemia são
eficientes na diminuição do risco de desenvolvimento de câncer coloretal em
humanos.
17
Estudos clínicos para determinar o valor preventivo de vitaminas A e E
para câncer de pulmão em jovens fumantes foram um dos primeiros ensaios
clínicos de quimioprevenção. Nesse estudo utilizaram-se altas doses de
vitamina E (alfa-tocoferol) associado com beta-caroteno ou vitamina A (retinol).
Embora o estudo tenha falhado em indicar qualquer grau de proteção contra o
câncer de pulmão; o grupo de indivíduos que recebeu vitamina E (sozinha ou
associada com beta-caroteno) apresentou uma diminuição de 34% no risco
para desenvolvimento de câncer de próstata, e de 16% para câncer de
intestino (coloretal).
Outro alvo potencial para quimioprevenção são os receptores de
hormônios esteróides, como o receptor de estrógeno. Desenvolvido
originalmente como um anti-estrogênico, o tamoxifeno vem sendo utilizado em
protocolos de quimioprevenção com resultados bastante promissores. Esta
droga é um modulador seletivo do receptor de estrogênio (SERM) que tem
atividade antiestrogênio em um órgão, como mama, e pró-estrogênio em outro,
como osso e útero. A atividade antiestrogênio em mama é desejável, pois o
estrogênio aumenta o crescimento de quase todas as células de câncer de
mama durante os estágios iniciais da carcinogênese. Por outro lado, a
exposição do epitélio uterino a tamoxifeno pode levar ao desenvolvimento de
carcinoma endometrial. Novas drogas como o raloxifeno apresentam menos
efeitos adversos sobre o útero e sua utilização é alvo de estudos clínicos.
Outro grupo de agentes quimiopreventivos que parece promissor são os
rexinóides. Estas moléculas se ligam seletivamente a receptores retinóides X,
apresentando grande capacidade de modular a ação de muitos fatores de
18
transcrição. Em modelos animais esta droga tem demonstrado ação preventiva
contra câncer de mama.
Modificadores da estrutura da cromatina
Diferentemente das alterações genéticas, as mudanças epigenéticas
(metilação e desacetilação) são potencialmente reversíveis. Dessa forma, há a
possibilidade de reativar genes que estão silenciados epigeneticamente. A
estrutura da cromatina pode ser modificada com o uso de drogas que
aumentem a acetilação de histonas (inibidores de histono-deacetilases) ou
promovam a desmetilação de resíduos de citidina no DNA. Alguns genes
silenciados por metilação podem ser re-expressos usando agentes
desmetilantes como 5-azacitidina e 5-aza-2-deoxiacitidina. Estes compostos e
seus derivados têm sido usados como agentes quimiopreventivos em ensaios
clínicos e vêm mostrando alguns resultados terapêuticos, principalmente em
tumores hematopoiéticos. No entanto, as doses dessas drogas usadas
atualmente são bastante tóxicas. Essas dosagens podem ser reduzidas se
forem administradas em conjunto com agentes inibidores de histono-
deacetilases como o fenilbutirato.
Vários inibidores de histono-deacetilases têm demonstrado capacidade
de inibir o crescimento do tumor in vitro e in vivo a quantidades que são pouco
ou não tóxicas. Algumas dessas drogas já estão sendo testadas em protocolos
clínicos. Estes compostos atuam de maneira seletiva alterando a transcrição de
cerca de 2% dos genes expressos. Os inibidores de histono-deacetilases
incluem aminoácidos de cadeia curta como o 4-fenilbutirato e o acido valpróico;
ácidos hidroxâmicos como SAHA e tricostatina-A (TSA), entre outros;
tetrapeptideos cíclicos como trapoxin, apidicin e FK-228; e benzamidas como
19
MS-275. Ácidos hidroxâmicos apresentam a capacidade de interagir com o sítio
catalílico de histono-deacetilases. Inibidores de histono-deacetilases causam
parada de ciclo celular em G1 e/ou G2, apoptose e/ou diferenciação de células
transformadas em cultura. Os efeitos de inibição de crescimento têm sido
documentados em quase todos tipos de células transformadas, incluindo
linhagens de células que surgem de tumores hematológicos (leucemias,
linfomas e mielomas) e epitelial (câncer de mama, bexiga, ovário, próstata e
pulmão).
Os inibidores de HDACs butirato, TSA, oxamflatin, MS-275 e SAHA
induzem a expressão do gene CDKN1A, que codifica um inibidor da quinase
dependente de ciclina, WAF1 (p21, Figura 2). WAF1 inibe a progressão do ciclo
celular, bloqueando a atividade da quinase dependente de ciclina e,
conseqüentemente provocando a parada do ciclo em G1.
Genes que são induzidos por inibidores de HDACs em células
transformadas são os seguintes: CDKN2A, que codifica INK4A também
conhecido como p16, e os genes para ciclina E, todos reguladores do ciclo
celular. Uma grande variedade de inibidores de HDACs demonstraram
capacidade de inibir o crescimento de tumor em modelos animais. O análogo
do butirato, fenilbutirato tem demonstrado capacidade de inibir o crescimento
de tumor in vivo. Muitos estudos com derivados do butirato mostraram que são
necessárias doses muito altas desses compostos. Inibidores de HDACs como
TSA, CHAP1, CHAP31, SAHA, piroxiamida e oxamflatin administrados
intravenosamente e intraperitonialmente, inibiram o crescimento de tumores de
mama, próstata, pulmão e estômago em modelos animais. Além disso, esses
compostos também foram capazes de inibir a progressão de neuroblastomas e
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leucemias com pouca toxicidade. SAHA e MS-275 administrados oralmente
foram eficientes na supressão do crescimento de tumores em ratos ou
camundongos. Inibidores de HDACs provocam uma acumulação de histonas
acetiladas no tumor e tecidos normais. O aumento de histonas acetiladas
funciona como um marcador biológico da atividade de HDACs, e tem sido
usado em estudos clínicos em pacientes com câncer.
Há um longo caminho a se percorrer até a consolidação de estratégias
quimiopreventivas para o câncer. Como as bases biológicas da carcinogênese
continuam sendo elucidadas, diferentes estratégias para quimioprevenção
certamente surgirão. O relativo sucesso dos protocolos clínicos iniciais,
destinados a prevenir câncer em indivíduos com alto risco desta doença sugere
que quimioprevenção seja uma estratégia possível e sensata. Investimentos
serão necessários para a formação de recursos humanos na área de pesquisa
clínica, nutricional e em educação para prevenção, para assim explorar as
perspectivas abertas pela melhor compreensão das etapas da carcinogênese.
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Legendas das Figuras Figura 1. A manutenção do número de células em qualquer tecido normal depende do equilíbrio entre proliferação e morte celular. Diversos mecanismos homeostáticos determinam este equilíbrio. Fatores de crescimento e fatores de sobrevivência favorecem o aumento do número de células em um tecido; enquanto fatores pró-apoptóticos, isto é que promovem a morte celular, e fatores anti-proliferativos favorecem a diminuição deste número de células. No equilíbrio, o número de células em uma população tende a ser mantido: fatores de crescimento se contrapõe a fatores anti-proliferativos, assim como fatores pró-apoptóticos se contrapõe a fatores de sobrevivência. Genes-chave da homeostasia celular, como por exemplo o gene supressor de tumores TP53 atuam interferindo de maneira controlada sobre este balanço. Em tumores, o aumento do número de células é o resultado líquido do desbalanço entre proliferação e morte (proliferação >> morte), que poderia ser obtido pela resposta descontrolada a fatores de proliferação; diminuição da sensibilidade (ou evasão) aos mecanismos pró-apoptóticos; diminuição da sensibilidade a fatores anti-proliferativos e até mesmo resposta descontrolada a fatores de sobrevivênc ia. Figura 2. Respostas celulares a agentes mutagênicos. A exposição das células a agentes mutagênicos endógenos e exógenos é bastante freqüente. As lesões causadas no DNA por estes agentes, no entanto, geralmente não se propagam. Diversos mecanismos de reparo de DNA atuam em células que sofreram agravos genotóxicos revertendo a célula mutada ao seu estado normal. Dependendo da intensidade do agravo, as células alteradas são excluídas da população de células do organismo. O gene supressor de tumor TP53 atua no controle do processo de reparo. Quando a função de TP53 está preservada, em resposta ao agravo genotóxico, há indução de expressão de genes como p21WAF, um inibidor universal de quinases dependentes de ciclinas, que leva às células a uma parada no cic lo celular; genes de reparo são também induzidos. Em consequência disto, as células mutadas são reparadas e revertem ao estado normal. Alternativamente, p53 pode também induzir a transcrição de bax, por exemplo, que atua induzindo o processo de morte celular (apoptose). Quando o gene TP53 está mutado, estes mecanismos não estão operantes, favorecendo a manutenção da célula mutada na população. Se houver condições, a célula mutada sofre expansão clonal gerando um tumor. Figura 3. Iniciação como alvo para quimioprevenção. A aflatoxina B1 (AFB1), presente em alimentos contaminados com o fungo Aspergillus fumigatus é um pró-carcinógeno, que após metabolizada por isoformas de citocromo P450 pode dar origem a um agente mutagênico, associado à iniciação de hepatócitos no desenvolvimento do carcinoma hepatocelular. Infeccão persistente pelo vírus da Hepatite B, associado ao desenvolvimento da hepatite crônica ativa, atua como fator promotor para o desenvolvimento do tumor. Inibidores de citocromo P450, como ditioltionas (Oltipraz) inibem a ativação do carcinógeno. Substâncias como clorofilina ligam-se a aflatoxinas e
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derivados, diminuindo a biodisponibilidade do pró-carcinógeno e competindo com a ligação do carcinógeno ao DNA. Figura 4. A fase de promoção como alvo para quimioprevenção. Flavonóides como a genisteína atuam de diversas maneiras favorecendo a morte celular de células em proliferação. Genisteína atua como um inibidor de tirosino-quinases, enzimas envolvidas na transdução de sinais proliferativos, como, por exemplo, aqueles associados à ativação de receptores da família de EGF (epidermal growth factor), como erbB2, frequentemente ativado em tumores de mama e próstata. Ensaios pré-clínicos são promissores. Indutores de diferenciação celular também podem ser usados nesta fase. A tentativa seria a de reprogramar a célula iniciada a executar um programa de diferenciação, que culminaria com o processo de morte celular.