Aspectos Teoricos y Filosoficos Del a

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Leondia Alfredo Guimares

ASPECTOS TERICOS E FILOSFICOS DO PSICODRAMA

SALVADOR BAHIA Ano de Organizao dos textos produzidos: 2000

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NDICE

Aspectos Tericos e Filosficos do Psicodrama Por Leondia Alfredo Guimares

Introduo Cap. 1 : Histria do Psicodrama Da Evoluo do Criador Evoluo da Criao...................................................03 Cap. 2: Bases Filosficas do Psicodrama Um ensaio psicodramtico.....................................................................09 Cap. 3: A Socionomia como Proposta Integrativa.......................................................................................................16 Cap. 4: Sobre a Teoria dos Papis ................................................. .......................................................................22 Cap.5 : A Criao de Cenas atravs da Forma e a Emergncia de Contedo.............................................................24 Cap. 6 : A Msica como Objeto Intermedirio.............................................................................................................26 Cap. 7 : As Tcnicas do Ingeridor...............................................................................................................................30 Cap. 8: Efeitos do Psicodrama algumas incompatibilidades entre contexto e instrumento...................................36

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Textos Anexos escritos por outros autores Anexo I - Aspectos da Unidade Funcional para complementao de personalidades............................................ 48 Por Alfredo e Cia, Roberto Glauss e Suzana Etcheverry Anexo II Coletnea sobre Filosofia Hermtica Yoga Kundalini .............................................................................54 Por Celina Estela Santos Anexo III Texto de Dinmica de Grupo Jardim Zoolgico ................................................................................... 58 Por Lauro de Oliveira Lima

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Captulo 1 Histria do Psicodrama: Da Evoluo do Criador Evoluo da Criao.

O Criador do Psicodrama Jacob Levy Moreno nasceu em Bucareste- Romnia, em 18 de maio de 1889, s 16:00 horas. Morreu em Beacon- Estados Unidos, quatro dias antes de completar os seus 85 anos, em 14 de maio de 1974, no Instituto Moreno de Nova York. Era descendente de famlia judia, oriunda da Pennsula Ibrica. Seu pai era judeu de origem espanhola e sua me eslava . Jacob Levy, o primognito entre seis irmos. A famlia emigrou sucessivamente para a Turquia, Mar Negro e para as margens do Rio Danbio, local onde Moreno viveu at os 5 anos de idade. Em 1895, a sua famlia radicou-se na ustria, em Viena, cidade onde Moreno cresceu, estudou Filosofia e Medicina e desenvolveu as suas primeiras experincias com o Teatro Espontneo, at o ano de 1924. Concepo do Psicodrama Moreno conta que aos 4 anos e meio organizou uma brincadeira com algumas crianas no poro da sua casa, empilhando cadeiras sobre uma mesa, at o teto, para brincar de ser Deus : seus amigos faziam o papel de anjos e incentivavam para que ele voasse at o cho, ao dramtica assumida pelo pequeno protagonista embalado pelos sonhos de ser Deus. O resultado imediato foi uma fratura no brao esquerdo. A longo prazo, essa experincia tomada como uma Cena precursora da criao do Psicodrama. Moreno ao mesmo tempo em que dirige a cena, transforma-se em autor e ator do drama. Seu pblico compartilha e estimula o protagonista ao. A experincia marca e a idia germina na adolescncia. Durante a adolescncia (1908-1911), Moreno apaixona-se pelo teatro, pela filosofia e por trabalhos comunitrios de recreao. L Rousseau, Pestallozi , Froebel e gosta do contato com pequenos grupos de crianas, nos jardins de Viena, onde prope e improvisa brincadeiras, distribuindo-lhes papis. A experincia oferece-lhe estmulos para que realize em 1911, no Kindergarden, um Teatro de Crianas, a sua primeira sesso de Teatro Espontneo, ainda como estudante. Em 1909, Moreno ingressa na Universidade de Viena, primeiro como estudante de Filosofia, depois de Medicina.. Faz aulas de psiquiatria e psicanlise com Freud, mas no identifica-se teoria freudiana : conta que, num rpido encontro com Freud, aps uma aula sobre a

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Interpretao dos Sonhos, foi questionado acerca das suas ocupaes e respondeu o seguinte: O Senhor v as pessoas no ambiente artificial do seu Gabinete. Eu vejo-as na rua, na casa delas, em seu ambiente natural. O Senhor analisa os sonhos das pessoas. Eu procuro darlhes mais coragem para que sonhem de novo. Ensino as pessoas a como brincarem de ser Deus. Ao que parece, a irreverncia de Moreno para com os modelos sociais estabelecidos vai lhe permitir a concepo da sua idia original; mas, em contrapartida, o veremos passar anos a fio aprimorando-se para assumir oficialmente o seu papel de psicoteraputa e ser finalmente aceito no meio cientfico. Enquanto no chega esse momento, Moreno vive, experimenta, confunde-se nos papis de criador criatura- cidado. Mas no desiste : Entre 1913 e 1914, realiza a sua premire como estudante de psiquiatria, participando de um trabalho com um grupo de meretrizes do Spittelberg, bairro de Viena, assistido por um mdico e um psiquiatra psicanalista. Em 1914, formula o seu Convite a um Encontro, onde j podemos ver alguns dos conceitos bsicos estabelecidos, posteriormente, para o Psicodrama : a psicoterapia frente a frente, centrada no aqui e agora, a postura de contato direto e caloroso com o paciente e a tcnica de inverso de papis: Divisa Mais importante do que a cincia, o seu resultado, Uma resposta provoca uma srie de perguntas. Mais importante do que a poesia, o seu resultado, Um poema invoca uma centena de atos hericos. Mais importante do que o reconhecimento, o seu resultado, O resultado dor e culpa. Mais importante do que a procriao a criana. Mais importante do que a evoluo da criao a evoluo do criador. Em lugar de passos imperativos, o imperador. Em lugar dos passos criativos, o criador. Um encontro de dois : olhos nos olhos, face a face. E quando estiveres perto, arrancarei teus olhos E os colocarei no lugar dos meus; E arrancarei os meus olhos Para coloc-los no lugar dos teus

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Ento ver-te-ei com os teus olhos E tu me vers com os meus. Assim, at a coisa comum serve ao silncio E o nosso encontro permanecer a meta sem cadeias: Um lugar indeterminado, num tempo indeterminado Uma palavra indeterminada para um homem indeterminado. (Psicodrama,2 edio,SP.,1978) De 1915 a 1917, Moreno realiza um outro trabalho de grupo, dessa vez no campo de Mittendorf, com soldados tirolesses refugiados em Viena. Aps este trabalho, concebe algumas idias a respeito das estruturas grupais e do efeito teraputico do grupo sobre o indivduo. Em 1917, aps formar-se em Medicina, Moreno publica a revista Daimon, tendo como colaboradores alguns membros do movimento expressionista vienense: Franz Kafka, Martin Buber, Max Scheller, Francis James, Jacob Wasserman, Arthur Schmitzler e Franz Werfel. Moreno mantm a publicao da revista Daimon at 1920 e nela publica as suas primeiras experincias e principais idias. Conta-nos Moreno que, no incio da sua carreira , no conseguia conter o seu desejo messinico de recriao do universo social e de construir um palco para expurgar as dores e sofrimentos dos pequenos grupos. Admirava Marx, pela sua preocupao social e humanstica em relao ao povo, mas, criticava-o por haver esquecido o cidado enquanto indivduo. Moreno era ento um socialista convicto e atuante, embora no adepto. Dirigia sua energia para questes sociais, certo , mas sem esquecer-se nunca da sua prpria existncia, que queria libertria, espontnea e criativa. Parece profundamente religioso, ao citar Cristo, Buda, Maom e Gandhi, mas critica os existencialistas profetas que, do seu ponto de vista, no conseguiram consolidar sua prpria existncia e que morreram prisioneiros dos seus ideais, a exemplo de Nietzche e Kierkegaard. Admira e reconhece como verdadeiros representantes do existencialismo, um grupo que estava inserido no seu contexto histrico e social, surgido no perodo de 1900 a 1920, em Viena, e que praticava a filosofia do Seinismo , segundo a qual, Ser e Saber so condies inseparveis, influindo-se mutuamente. Esta filosofia, tambm chamada de Hassidismo, originria da Cabala e do judasmo mstico. Rene numa s realidade a existncia e o pensamento, e defende alm da existncia de um Deus csmico, presente em cada pessoa enquanto centelhas divinas, a manuteno do fluxo natural e espontneo da existncia, a importncia de viver-se o momento presente, sem aterse ao passado ou ao futuro, a importncia da liberdade, espontaneidade e criatividade.

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A filosofia do Hassidismo aproxima-se em alguns aspectos das idias de Bergson ( lan vital) e da teoria do Eu e Tu de Martin Buber. Ao mesmo tempo, diferenciam-se : O Deus de Moreno no um Deus-Tu, um Deus-Ele um Deus igual a ele prprio, presente nele e por isso em relao direta, no hierrquica, inseparvel, transcendente, tipo : Eu sou Deus e, que lhe permite falar pelo outro. Moreno escreve na orelha do seu livro Psicodrama : Deus espontaneidade. Da o mandamento: S Espontneo. O Hassidismo portanto, a filosofia de base de Moreno e do Psicodrama , pois so desses conceitos que Moreno formula posteriormente a Doutrina da Espontaneidade Criatividade. Poderemos ver a influncia de outras correntes filosficas, como a fenomenologia de Husserl e o materialismo histrico de Marx, posteriormente, medida em que o psicodrama, a sociometria, a psicoterapia de grupo e a proposta da sociatria vo estabelecendo o contorno dos mtodos psicodramticos. Mas, a partir da sua fenomelogia existencial, j era possvel a Moreno, investir numa ao mais elaborada e abrir espaos onde pudesse explorar as suas idias. Em 1920, Moreno publicou o seu primeiro livro Das Testament des Vaters e depois, realizou o seu 1 Ato Pblico Psicodramtico, no dia 1 de abril de 1921, dia dos loucos, na ustria, dia da mentira, para ns. Neste evento, realizado no perodo de ps guerra e com o governo austraco em plena desordem, Moreno props como tema dramtico a escolha do Rei da ustria e conseguiu vrios voluntrios para encen-lo. Mas o pblico no elegeu nenhum dos Reis representados, o que deve ter sido bastante frustrante para Moreno, levando-se em conta inclusive que ali estavam sendo lanadas as bases para o enquadre do Sociodrama, trabalhado posteriormente. Moreno persegue as suas idias e projeta no ano seguinte ( 1922 ), com a ajuda do seu irmo William, um Teatro da Espontaneidade (Das Stegreiftheater), em Viena, onde passa a realizar improvisaes espontneas com um grupo de atores profissionais, at descobrir que a representao espontnea de situaes da vida cotidiana produzem efeitos teraputicos (1924) . A histria que Moreno nos conta que uma das atrizes que freqentava o teatro com o seu marido, e que elegia sempre papis dceis e carinhosos para representar; era segundo o marido, uma verdadeira megera na intimidade do lar. Intrigado com a incongruncia, Moreno passou a dar-lhe papis opostos aos que vinha representando. Soube posteriormente, atravs do marido desta atriz, que ela tornara-se mais calma e carinhosa com ele. Descobriu, dessa forma, os efeitos teraputicos do seu manejo tcnico e passou a designar o seu Teatro Espontneo como Teatro Teraputico. Moreno atribuiu a essa atriz o nome de Brbara e ao marido, o nome de George, para citar o seu primeiro Caso Clnico. So eles os seus primeiros pacientes- espontneos, ou seja, isentos de um contrato teraputico, j que a proposta de Moreno era apenas de representao dramtica, com atores profissionais.

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Nessa poca, o trabalho de Moreno consistia em dirigir peas espontneas a partir de temas escolhidos pelo grupo. Costumava usar tambm, a leitura de jornais do dia, para escolha e dramatizao de matrias com as quais o grupo se identificava. Esse tcnica ficou depois conhecida com o nome de Jornal Vivo. Ao perceber o valor teraputico do trabalho que vinha fazendo, Moreno usou novamente o seu manejo tcnico com outro casal , Robert e Diora. Mas desta vez no conseguiu o sucesso que esperava : Diora separou-se de Robert e, no dia seguinte ele suicidou-se. Ren Marineau cita, na bibliografia que fez de Moreno, que este episdio abalou profundamente as convices de Moreno, e provou uma parada para reflexo. Incomoda a Moreno, o fato de no haver previsto a possibilidade de suicdio ele resolve, no ano seguinte, mudar-se da ustria. Ao sair da ustria, Moreno j dispunha de vrios recursos tcnicos para desenvolver o Psicodrama : o setting da sesso e algumas tcnicas, como a inverso de papis e o duplo, j haviam sido bastante exploradas e testadas, e j haviam indicado o seu valor teraputico. O ano de 1924 fez, ento, duas revelaes a Moreno: uma relativa ao valor teraputico da dramatizao espontnea e da inverso de papis; e outra de alerta, quanto ao uso desses mtodos sem enquadre clnico. Mas, podemos considerar concebida a teoria bsica do Psicodrama. Neste mesmo ano, editado o O Teatro da Espontaneidade. Neste livro, Moreno definiu quatro enquadres psicodramticos : o Axiodrama, onde o pblico assume o papel de instigador sistemtico para desvendar a Cena a partir da pessoa privada do ator, derrubando as suas mscaras e conservas culturais; o Teatro de Improviso, onde o drama encenado da forma como surge, com atores e protagonistas espontneos; o Teatro Teraputico, onde existe um conflito a ser trabalhado e as pessoas representam a prpria vida; e o Teatro do Criador, mais prximo ao que mais tarde ficou conhecido pelo nome de Psicodrama Individual. Moreno projeta tambm nesse livro, o seu palco psicodramtico e refere os caminhos da sociometria, da psicoterapia de grupo e do psicodrama teraputico. Tomemos, ento, o ano de 1924 como o ano de nascimento do Psicodrama, na mesma Viena de Freud e em plena efervescncia da Psicanlise. Com certeza, no era este o contexto histrico e cultural propcio Moreno e ao desenvolvimento do Psicodrama. Conta-se at, que em 1921, Moreno tivera um sonho antecipatrio, da sua sada da ustria. Moreno decide, finalmente, deixar Viena. Evoluo do Criador e sua Criao Em 1925 Moreno muda-se para os Estados Unidos e instala-se em Beacon- Nova York. Em 1927, casa-se com Beatrice Beecher e passa a assumir, sucessivamente, os papis sociais para os quais fora preparado : abre uma Clnica Psiquitrica, anexa sua residncia e realiza

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no ano seguinte, a sua primeira demonstrao pblica do Psicodrama, no Carnegie Hall, onde passa a dirigir sesses de Psicodrama Pblico, trs vezes por semana, at 1931. Neste ano, publica a Revista Improviso , abordando sobre os seus mtodos de psicoterapia de grupo e paulatinamente vai encontrando apoio s suas idias, participando de Conferncias e fazendo demonstraes do seu trabalho em Escolas, Igrejas e Universidades. Em 1932, apresenta em Filadlfia, no I Congresso de Psiquiatria da Sociedade Americana, o trabalho que realizara com os prisioneiros de Sing Sing, denominando- o de Psicoterapia de Grupo. Compra briga com Slavson, lder americano da psicoterapia de grupo, e vai adiante, dedicando-se a uma pesquisa sobre as relaes interpessoais na Comunidade de Hudson, com jovens delinqentes. Encontra a colaborao de Helen Jennings, que na poca era orientada no seu Curso de ps-graduao- Universidade de Colmbia, por Gardner Murphy , abrindo-se dessa forma uma grande rede sociomtrica para Moreno, no campo da Psicologia Social e da Sociologia. Publica, em 1934, Quem Sobreviver? reeditado posteriormente com o nome de Fundamentos da Sociometria.

Consolidao do Psicodrama e da Sociometria Os Fundamentos da Sociometria so bem acolhidos pela comunidade cientfica americana, praticados e desenvolvidos. Moreno convidado a ensinar na Universidade. A partir de 1934, torna-se cidado americano e, em 1936, abre um Hospital Psiquitrico em Beacon, realizando trabalho com psicticos, em comunidade teraputica. Anexo ao Hospital, passa a funcionar tambm, a partir de 1941, o Instituto de Psicodrama de Nova York , freqentado por psicoterapeutas do mundo inteiro, em busca de formao. Moreno dedica-se transmisso dos conhecimentos que adquiriu durante todo o desenvolvimento da sua teoria e prtica, e autoriza seus formandos a proceder a formao de outros Psicodramatistas nos seus pases de origem, conferindo-lhes o ttulo de Diretor de Psicodrama. Funda tambm, a Associao Americana de Sociometria e torna-se membro da Associao Psiquitrica Americana. Vrios Congressos de Psicodrama so organizados em diversos pases, e em 1968, Moreno recebe o ttulo de Doutor Honores Causa, pela Universidade de Barcelona. Disseminao do Psicodrama A partir de 1946, o Psicodrama de Crianas comea a expandir-se na Frana, atravs do Centro Claude Bernard, a cargo de Jean Delay, Fouquet e Mireile Monod, que tem como colaboradores Andr Berge, Henri Buchene, Franoise Dolto e Serge Lebovinci. Em 1950, ainda na Frana, o Psicodrama se bifurca, dando origem ao Psicodrama Tridico e ao Psicodrama Analtico. Segundo Didier Anzieu, formam-se quatro principais correntes :

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A de Serge Lebovinci, que confronta os mtodos morenianos psicanlise individual, e que fracassa; A de Gravel e Bourreau que adotam as reformas de Mireile Monod, segundo as concepes de Slavson; A de Anne-Marie Spenh, que conserva a noo de papel e representao dramtica; e A de Anne-Ancelin Schutzenberg e Didier Anzieu, representantes, em Paris, do Psicodrama Tridico e do Psicodrama Analtico, respectivamente. Ambos se baseiam nas noes tericas de Jacques Lacan, considerando a representao dramtica como uma estrutura, fazendo-a intervir no campo do Imaginrio. No adotam o modelo terico proposto por Jacob Levy Moreno, apenas o seu setting teraputico. Em 1954, Moreno realiza a sua primeira demonstrao pblica do Psicodrama na Frana, por ocasio do I Congresso Internacional de Psicoterapia de Grupo. E em 1960, faz o mesmo na Rssia, ano em que publica tambm, o seu livro Psicoterapia de Grupo e Psicodrama . Em 1962, o Psicodrama chega ao Brasil, atravs de Pierre Weil, que formou-se em Psicodrama na Frana, com Anne-Ancelin Schutzemberg, formada no Instituto de Nova York. Pierre Weil radicou-se em Belo Horizonte e adotou a linha do Psicodrama Tridico, abrindo um Ncleo de formao em Psicodrama. Em 1963, o Psicodrama comea a difundir-se na Argentina, atravs de Jaime RojasBermdez, que aps receber o ttulo de Diretor de Psicodrama, no Instituto de Nova York, passou a realizar formaes em Psicodrama Teraputico e Aplicado, fundando a Associao Argentina de Psicodrama e Psicoterapia de Grupo- AAPGP. Outros Diretores de Psicodrama, fazem o mesmo e o Psicodrama chega : Na Venezuela, atravs de Robert Fontaine e Fernando Risques. No Peru, atravs de Dalida de Platero. E chega ao Uruguai, em 1970, atravs de Raymondo Dinello. Entre 1969 e 1970 o Psicodrama desenvolveu-se rapidamente, tanto na Argentina, sob a liderana de Jaime Rojas-Bermdez ( AAPGP )quanto no Brasil, inicialmente atravs de Alfredo Correia Soeiro, formado por Rojas-Bermdez, e que mantinha o Grupo de Estudos de Psicodrama de So Paulo- GEPSP. Nesse perodo, aps o IV Congresso Internacional de Psicodrama, realizado em Buenos Aires, surgiram as divergncias tericas nos dois grupos liderados por Rojas-Bermdez, criador da Teoria do Ncleo do Eu, e as duas associaes cindiram-se : Na Argentina, foram criados vrios Institutos de Psicodrama, permanecendo AAPGP. No Brasil, o antigo grupo do GEPSP foi extinto : alguns membros criaram a Associao Brasileira de Psicodrama e Sociodrama ABPS, que permaneceu vinculada Rojas-Bermdez; e outros membros,

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criaram a Sociedade de Psicodrama de So Paulo SOPSP, que passaram a vincular-se aos Institutos de Psicodrama criados na Argentina. Em Salvador, Bahia, o Psicodrama foi introduzido por Waldeck e Graciela DAlmeida , casal formado por Rojas-Bermdez , na Argentina, aps a realizao da 1 Semana de Psicodrama da Bahia, em julho de 1973. Em abril de 1974, Waldeck DAlmeida fundou e assumiu a presidncia da Associao Bahiana de Psicodrama e Psicoterapia de Grupo ASBAP, que segue a orientao terica de Rojas-Bermdez. Do 1 grupo de formao da ASBAP, surgiu um outro grupo dissidente de Rojas-Bermdez, que concluiu sua formao atravs da SOPSP, e que fundou posteriormente, a SOPBA Sociedade de Psicodrama da Bahia, que liderada por Paulo Amado e Romlia Santos. Recentemente, em 1994, foi criado um outro centro de Psicodrama em Salvador, o CEPS Centro de Psicodrama e Sociodrama, fundado por Thereza Valladares, formada pela ASBAP e que segue a mesma linha de Rojas-Bermdez. Aps o surgimento de vrios centros de formao em Psicodrama no Brasil, surgiu a proposta de criao da FEBRAP- Federao Brasileira de Psicodrama, fundada em 1976, com a funo de integrar esses diversos centros enquanto entidades federadas e de regulamentar currculos de formao para obteno do ttulo de Psicodramatista. A FEBRAP congrega atualmente, um total de 40 entidades federadas : 17 em So Paulo; 04 no Paran, e 01 em Santa Catarina (Regio Sul); 03 no Rio de Janeiro; 01 em Vitria do Esprito Santo e 01 em Juiz de Fora (Regio Sudeste); 03 na Bahia e 03 em Fortaleza (Regio Norte/Nordeste); 03 em Braslia, 01 em Minas Gerais, 01 no Mato Grosso do Sul e 01 em Goinia ( Regio Centro Oeste). Referncias Bibliogrficas ANZIEU, D.- Psicodrama Analtico, Campus, RJ,1981 BERMDEZ, R.J.- Introduo ao Psicodrama, Mestre Jou, SP,1970 FONSECA FILHO, S.J.- Psicodrama da Loucura-Correlaes entre Buber e Moreno, gora, SP, 1980 MARINEAU, F.R.- Jacob Levy Moreno- 1889-1974 : Pai do psicodrama, da sociometria e da psicoterapia de grupo, gora,SP,1992 MORENO, J.L. Fundamentos do Psicodrama, 1 ed. 1959,Summus,Vol.20, SP, 1983 ..............................Psicodrama, Cultrix, 2 Ed. em Portugus, SP., 1974 Observao: Dados sobre Federadas : retirados do site da FEBRAP

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Captulo 2 Bases Filosficas do Psicodrama : Um ensaio psicodramtico Cada um dos nossos pensamentos no mais do que um instante de nossa vida Ns utilizamos cada dia, para alcaar um pouco de verdade Romain Rolland Jean Christophe Sabe-se que, tanto a teoria quanto a prtica psicodramtica, traduzem uma postura filosfica basicamente existencial , textualmente explcita e particularizada pelo seu criador, Jacob Levy Moreno. Mas cabe sobre este tema, algumas reflexes, mesmo que sejam postas a nvel de um ensaio psicodramtico terico. Comecemos, ento, examinando a panormica traada por Moreno (Fundamentos do Psicodrama, 1983) a respeito do movimento existencialista moderno, iniciado por Hegel e Kierkegaard e prosseguido por Sartre e Heidegger. Vimos que, historicamente, Moreno divide o movimento existencialista moderno em trs fases, comeando pelo Existencialismo Cristo de Kierkegaard, em meados do sculo XIX, passando pelo Existencialismo Herico encarnado pelo Seinismo e surgido antes da Segunda grande guerra mundial ( 1900-1920), cujos principais expoentes filosficos foram John Kellmer, Leon Tolstoi e Charles Pguy , incluindo na terceira fase do movimento, o Existencialismo comtemporneo de Heidegger e Sartre. KIERKEGAARD Kierkegaard comtrapunha-se compreenso do indivduo enquanto manifestao do Esprito Absoluto, a ser incorporado no sistema, como sugeria Hegel, insistindo na necessidade de apropriao subjetiva da verdade e ligando o pensar racional a algo que estivesse vinculado raiz mais profunda da existncia. Em nome do cristianismo pelo indivduo, Kierkegaard defendeu a subjetividade e a singularidade deste, assumindo como bandeira a defesa pela liberdade e responsabilidade individuais. Sublinha dessa forma, as diferenas que so caractersticas da subjetividade, de forma contrria a Hegel, que defende a liberdade como razo de ser essencial de todo progresso, em detrimento do indivduo livre. As idias de Kierkegaard , com quem Moreno conviveu por longo tempo, so tomadas como uma das bases filosficas do Psicodrama, embora Moreno realce em sua anlise de Kierkegaard que o mesmo no conseguiu consolidar a sua prpria existncia enquanto um fenmeno geral, prejudicando a sua vida particular favor da Igreja Crist. Pensamos que, com essa anlise crtica, Moreno reala a sua prpria proposta ao criar os pilares filosficos

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do Psicodrama, ou seja, em vez de realizar uma anlise da existncia, Moreno prope-se com o seu mtodo a realizar uma anlise existencial. Prosseguindo a sua anlise acerca do movimento existencialista moderno, Moreno situa o perodo de 1900 a 1920 como equivalente existncia proftica de Kierkegaard, desta vez in actu e in situ , marcado pela transformao da existncia e do pensamento, mesclados uma s realidade. Esta fase, chamada de Existencialismo Herico, foi iniciada por John Kellmer, Leon Tolsti e Charles Pguy, considerados grandes pensadores existencialistas. Moreno contudo, critica-os veementemente, atribuindo aos mesmos uma neurose de criatividade, uma vez que, tal como os seus antecessores profetas, no conseguiram realizar a sua prpria existncia e tambm, aos seus sucessores do prximo perodo que, segundo Moreno, no conseguiram dar sua existncia uma nova expresso de pensamento, isolando-se do contexto histrico. Moreno escolhe como verdadeiros representantes do Existencialismo Herico o grupo do Seinismo : representantes adeptos a uma cincia do ser , que expressava de forma plena a filosofia existencial e fenomenolgica, onde a idia do Ser foi adotada e vivida, sem o reconhecimento de limites e incluindo cada instante da existncia. Surgido antes da 2a Guerra, tambm em Viana, o Seinismo defendia o pensamento segundo o qual SER e SABER so inseparveis; sendo que o Ser uma pre-condio do Saber, pois a partir do Saber nunca se poderia alcanar o Ser. Os princpios bsicos deste grupo consistiam em manter o fluxo natural e espontneo da existncia sem ater-se ao passado ou ao futuro, vivendo sempre a situao do momento presente, o instante, a espontaneidade e a criatividade. dispensvel registrar que desta idia filosfica bsica que decorrem os principais conceitos tericos do Psicodrama, delineados por Moreno na Teoria da Espontaneidade. Chegamos ento, terceira fase do movimento existencialista moderno, denominado por Moreno como Existencialismo Intelectual Contemporneo, onde figuram como destaque Heidegger e Sartre no campo da filosofia, e Jaspers, no campo da psiquiatria . Esta fase ficou caracterizada por uma preocupao radical com o conhecimento dos problemas da existncia, adotando uma corrente de pensamento essencialmente racional . Moreno no demonstra simpatias por esta corrente de pensamento, embora atribua-se o conceito moreniano de subjetividade ao conceito de subjetividade de Sartre, o qual teria sido ampliado para incluir o fenmeno como histrico. Sartre acentua a questo da subjetividade como uma verdade inter-subjetiva, que nesse sentido a-histrica. Moreno, ao contrrio, toma a subjetividade como um fenmeno histrico, tal como Marx e Husserl, onde a verdade inter-subjetiva encarada do ponto de vista da realidade e do aqui e agora , ou seja, a partir do conhecimento vivencial do indivduo, o que inclui seu pensamento, sentimento e ao. Nesse sentido, no vimos como chegar a uma correspondncia de pensamento entre Moreno e Sartre no que se refere ao conceito de subjetividade.

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Contudo, outras influncias filosficas ficam patentes no delineamento dado ao mtodo psicodramtico, principalmente no que diz respeito Sociometria, Psicoterapia de Grupo e ao Sociodrama, incluindo-se aqui tambm a dinmica de construo do Eu, traada por Moreno na Teoria dos Papis. Nos seus primeiros escritos Moreno refere-se continuamente Freud e a Marx, opondo-se s suas teorias. Posteriormente, j em 1969, durante a realizao do IV Congresso Internacional de Psicodrama, na Argentina, Moreno sintetiza as suas crticas Marx com o seguinte discurso : Nunca se procurou trabalhar de baixo para cima. Karl Marx foi um grande pensador, mas quis trabalhar com as grandes massas, esquecendo-se dos pequenos grupos, das pessoas, e esses pequenos grupos no tinham pais, no tinham mes, no tinham seu prprio eu e permaneceram passivos, esperando Hitler, esperando Mussolini ... Que aconteceu? Nada. Muito rudo, demasiado rudo...Seguramente, vocs diro que j tm ouvido palavras; certo, tem existido muitos homens sbios; Buda, Cristo, o foram. So palavras sbias, mas a sabedoria no suficiente, falta ao ( Moreno, em Introduo ao Psicodrama, J.G.RojasBermdez, 1970). Vejamos ento um pouco do pensamento de Karl Marx e em que medida poderamos encontra-los na teoria psicodramtica. A DIALTICA MARXISTA De acordo com a dialtica marxista mtodo dialtico proposto pelo materialismo histrico, a realidade ou o indivduo no podem ser dicotomizados. O concreto a sntese de mltiplas inter-relaes. Por isto no existe linearidade, ou seja, causa e efeito absolutos. Dessa forma, cada fato ou fenmeno teriam mltiplas causas, formando uma rede de relaes intrnsecas de realidades subjetivas, que num dado momento existem e que por isso so histricas. Marx combateu o materialismo mecnico e abstrato da cincia natural, que exclua a histria e seus processos, defendendo o naturalismo ou humanismo, fortemente presente em suas idias. No seu entender, os cientistas naturais partiam do idealismo, filosofia segundo a qual no o mundo dos sentidos, em constante mutao, que constitui a realidade e sim essncias incorpreas ou idias. O materialismo histrico de Marx, em contraste ao existencialismo de Hegel, ensina que o processo vital da realidade humana deve partir de homens reais e atuantes, baseandose na realidade objetiva, a qual, traz os seus ecos ideolgicos. Vimos nesse ponto, uma correspondncia importante entre os pensamentos de Moreno e os de Marx, que estuda a existncia e a sua histria a partir do homem real e das condies econmicas e sociais em que vive, e no a partir das suas prprias idias. Consideremos, tambm, que a crtica que Marx faz a Hegel no que se refere conscincia transcendental esotrica, decorre do prprio conceito de transcendncia de

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Hegel, que parte da lgica formal para alcanar a lgica transcendental. Em Husserl, encontramos um outro conceito de transcendncia, que parte de uma perspectiva naturalista, defendida por Marx, e que proveniente do mundo dos sentidos; 2) No que se refere ao conceito de Deus, encontramos uma citao do prprio Moreno, criticando tambm os lderes profetas, ao tempo em que personaliza o seu conceito de Deus : Na atualidade, quando o Deus-Eu esta universalizado, como em meu livro, todo o conceito de Deus se converte em humildade, debilidade e inferioridade : micromania mais que megalomania. Deus jamais foi to humildemente descrito e to universal quanto em sua dependncia como em meu livro. Foi uma transformao importante a do Deus csmico dos hebreus, o Deus-Ele, em Deus vivo de Cristo, o Deus-Tu. Mas foi ainda muito mais desafiante a transformao do Deus-Tu em Deus-Eu, que pe toda a responsabilidade em mim e em ns, no Eu e no Grupo... Os lderes, profetas e terapeutas de todos os tempos, sempre tentaram jogar o Deus e tentaram impor o seu magnfico poder e superioridade sobre a pobre gente, ao homem pequeno. No mundo psicodramtico, a moeda deu a volta. O que encarna o Deus j no mais o amo, o grande sacerdote ou o grande terapeuta . ( Psicodrama da Loucura, Fonseca F., 1980). Voltando Marx, vimos que ele distingue claramente o seu materialismo histrico do materialismo contemporneo dos existencialistas ideolgicos, criticados por J.L. Moreno, onde o objeto e a realidade no so apreendidos pelos prprios sentidos e a realidade tomada como objeto de contemplao ( Anschawing) e no como uma prtica da atividade sensorial. Chegamos aqui a um outro ponto polmico : at que ponto podemos considerar que Moreno sofreu influncias marcantes de Martim Buber , filsofo seguidor do hassidismo e criador da Teoria do Eu-Tu, tambm judeu radicado em Viena e que trabalhou na revista Daimon entre 1918 e 1920 ? O HASSIDISMO Segundo o que se sabe, o hassidismo uma seita religiosa judia , originria da Cabala e que provem do judasmo mstico, o qual prega a existncia de um Deus csmico, presente em cada pessoa enquanto centelhas divinas. Embora este tipo de pensamento parea ter influenciado bastante a Moreno, no incio dos seus trabalhos, vimos, a partir da citao anteriormente colocada, que Moreno evoluiu posteriormente o seu conceito csmico-mstico. Podemos verificar isso mais claramente ao estudar a Teoria Geral dos Papis , a qual parte de um conceito dialtico ativo, mais condizente Dialtica Marxista, onde os papis emergem das formas reais e tangveis que o eu adota, formando uma rede de relaes subjetivas e inter-subjetivas, lastreadas pela Tele e o Encontro. Em Buber, pelo que pudemos ver, existe uma relao dialgica entre o EU-TU, sugerindo uma relao unilateral contemplativa, passiva e idealizada, e que hierarquiza os pares. A perspectiva do Encontro moreniano pois, diferente da perspectiva do Encontro de Buber : Moreno defende a relao

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horizontal, ativa e direta, baseada no inter-relacionamento dinmico. E vem dessa perspectiva filosfica, o desenvolvimento da Sociometria e da Psicoterapia de Grupo, ao que nos parece. Resta-nos agora examinar sobre uma outra corrente filosfica, que do nosso ponto de vista encontra-se estreitamente relacionada teoria e prtica psicodramtica. Trata-se da Fenomenologia de Husserl, assunto que trataremos agora. NOO GERAL DE FENOMENOLOGIA A palavra fenmeno ( aquilo que aparece) foi usada na filosofia desde Plato e Aristteles, adquirindo no decorrer do tempo um sentido cada vez mais subjetivo. Em Husserl, desliga-se completamente da relao a qualquer objeto exterior conscincia, referindo-se ao puro objeto imanente enquanto aparece na conscincia. A palavra fenomenologia foi usada inicialmente por Lambert, em 1764, assumindo o significado de doutrina da aparncia . Posteriormente foi usada por Kant e sobretudo por Hegel, mas sempre num sentido diferente daquele que lhe deu Husserl. Em sentido corrente, a palavra fenomenologia, derivada de logos ( razo, descrio), usada para descrever ou dar uma razo ntima ao fenmeno. Mas, recebe a partir de Husserl um significado particular : a fenomenologia tambm e principalmente um mtodo filosfico e uma atitude especificamente filosfica . Baseando-se nesta noo de fenomenologia Husserl elabora um mtodo de depurao rigorosa ( Epoch), de tudo o que no oferece garantia suficiente de uma Evidncia Apodctica ( intuio pura, sensvel, intelectiva e universal) . Toma como objeto o fenmeno puro ( conscincia inter-subjetiva) acerca do qual no poder haver nenhuma dvida. Seu mtodo de evidenciao um mtodo descritivo, que explora a intuio pura na presena do objeto, e rigorosamente analtico, buscando averiguar tudo o que se pode incluir como experincia transcendental. O mtodo fenomenolgico de Husserl, como j foi dito, consiste em fazer redues das partes questionveis ou sujeitas a dedues e contradies. Desenvolve-se gradualmente, submetendo-se a vrias epochs : 1) reduo do objeto conscincia; 2) reduo psicolgica do objeto; e 3) reduo transcendental do objeto. Durante a reduo psicolgica ainda no se pe entre parnteses a existncia natural ou mundana do eu, nem os seus atos ou vivncias ( Erlebnis), os quais conservam um carter psicolgico. Atravs da reduo do objeto, Husserl pretende atingir a conscincia transcendental, chamada de conscincia pura, pondo entre parntesesa existncia psicolgica. Assim, a fenomenologia de Husserl pe fora de circuito a realidade da natureza, at mesmo a realidade do cu e da terra, dos homens e dos animais, do prprio eu e do eu alheio. Mas retm o sentido de tudo isso. este o eu puro que pode apreender, sem perigo de erro, tudo o que se lhe apresentar como fenmeno da conscincia. Foi dessa forma que Husserl disse haver chegado a um idealismo transcendental fenomenolgico. Esse idealismo

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mantm-se contudo, apenas na atitude transcendental. Na atitude natural a realidade concebida como existente em si mesmo, independente da conscincia. O mundo no uma iluso subjetiva, mas uma realidade natural, aspecto que coincide com o objeto intencional da fenomenologia . Finalizando, vamos analisar agora, as cinco principais caractersticas fenomenologia husserliana: 1) O APRIORI ( EPOCH) Temos de proceder com plena ausncia de pressupostos e com inteira liberdade , reduzindo ( epoch) todas as influncias de opinies cientficas ou filosficas, para podermos nos orientar exclusivamente pelas coisas em si, aprioristicamente, admitindo-se que No das filosofias que deve partir o impulso da investigao, mas sim das coisas e dos problemas( Husserl) . 2) A EVIDNCIA O fundamento radical tem de ser evidente por si mesmo, os fatos devem excluir as dvidas de modo absoluto e imediato ( evidncia apodctica), tal como um reflexo, uma autoreflexo, plenamente esclarecedora do sentido da coisa ( Sinn). Esta noo de evidncia esta relacionada ao conceito de intuio . A intuio enquanto uma evidncia apodctica : uma intuio sensvel ( evidncia de sentimento) - uma intuio intelectiva ( Imagem), aquilo que pode afirmar o contedo - uma intuio eidtica ( Perceptiva), evidncia de conceitos universais, essncias e eidos que podem ser apreendidos de imediato atravs da presena do objeto e na sua corporiedade, ou de modo indireto, atravs de uma recordao ou Imagem. No caso da Imagem, temos uma intuio originria, tambm chamada de percepo, no sentido estrito (wahrnehmung). 3- A INTENCIONALIDADE A intencionalidade parte do eu e invade temporariamente os dados materiais, unificando-os em ordem constituio e designao do objeto enquanto consciente e significado. Informando os dados materiais, d origem compreenso subjetiva, que o elemento real da vivncia, chamado de Nesis . A nesis projetada ao objeto, originando a vivncia objetivamente orientada, que Husserl chama de Noema . O noema o elemento irracional ou intencional da vivncia ( aquilo que foi colocado entre parntesis ) . Esse elemento irreal encontra o sentido do objeto intencional ou o sentido objetivo e, por isso, transcende a vivncia para um plo oposto ao eu puro. Porm, essa transcendncia efetua-se na imanncia. O objeto intencional difere pois do objeto real, existente em si mesmo, exterior conscincia. Foi dessa forma que Husserl chegou a um idealismo transcendental fenomenolgico, admitido por poucos, onde por exemplo, o sentimento existe enquanto qualidade ( amor, por exemplo), independentemente da vivncia e de que realmente haja um objeto intencional ( algum, um outro ).

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Vimos ento que o conceito de intencionalidade de Husserl, no trata a intencionalidade como uma qualidade subjetiva dependente de um objeto externo ( ex.: quem ama, ama a algum) . Isto contrape-se a Sartre, que considera sempre o fenmeno como histrico e enquanto uma evidncia da relao sujeito-objeto. 4- A LGICA DA CONTRADIO Husserl chama a ateno para o ato e a contedo do ato. Enquanto a Psicologia Experimental diz que no pode haver um contedo do ato , sem o ato, ele argumenta que isso no implica que as leis reguladoras do ato e do contedo sejam as mesmas; se assim fosse, teramos que reger os contedos pelas leis que regulam os atos. Neste caso, a verdade que se refere ao contedo ficaria dependente do processo psicolgico que se refere ao ato, levando-nos a um puro subjetivismo e relativismo da verdade. Considerando que a verdade objetiva e absoluta, Husserl v a um contradio lgica. Afirma ento que o que se d justamente o contrrio : o ato que depende das leis do contedo, para estar em conformidade com a matemtica. nesse ponto que Husserl rompe com a lgica formal e parte para o estudo do fenmeno puro, formulando a lgica da contradio ou a lgica da verdade, mais profunda e radical, no domnio da qual se manifesta o impulso reflexo de evidenciao. 5- A INTERSUBJETIVIDADE Quando a objetividade se fundamenta pela relao a um objeto exterior, basta provar esta imposio como necessria, para garantir sua validez. Mas se o objeto considerado como meramente significado, o nico modo absolutamente vlido de garantir o seu carter de existncia esclarecer que o conhecimento dele no meramente subjetivo ( em nica direo ), mas intersubjetivo ( em direo dupla ). Dessa forma fica afastada a idia de anomalia individual. Segundo Husserl, graas a uma espcie de intropatia ( Einfuhlung) que se constitui a conscincia transcendental, e outros eus como sujeitos cognoscentes, idnticos a mim mesmo. O objeto intencional constitudo de intersubjetividade ( em dupla direo) para Husserl o fenmeno no seu pleno grau de evidncia..

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CONCLUSO Ao trmino do nosso estudo, e de acordo com tudo o que foi aqui colocado a respeito das principais correntes filosficas, que direta ou indiretamente, poderiam ter influenciado o pensamento de Moreno, ao criar o mtodo psicodramtico, chegamos tambm concluso de que, vrias correlaes metodolgicas podem ser feitas entre o Psicodrama e a fenomenologia de Husserl, como por exemplo : 1) O conceito de Intersubjetividade e os conceitos de Tele e Encontro; 2) A lgica da Contradio e a proposta do faz de conta da dramatizao, em busca da verdade; 3) O conceito de Intencionalidade e o valor dado vivncia e representao de personagens ausentes sesso de Psicodrama; 4) O conceito de Evidncia Apodctica e a iseno interpretao teraputica; a busca de uma compreenso vivencial psicodramtica, a estimulao intuio sensvel do paciente; e o respeito sua verdade. Lembrando-se aqui tambm, o mtodo de Construo de Imagens, introduzido por Rojas-Bermdez. 5) O a priori e a entrada em cena com textos espontneos, improvisados no placo pelo paciente, a apelao criatividade tambm do terapeuta, que deve isentar-se de qualquer juzo anterior para ir em busca da Cena esclarecedora, aceitando e fazendo atuar a fantasia do paciente. No obstante as semelhanas, no podemos deixar de perceber que Moreno, ao criar e desenvolver o Psicodrama, partiu sempre de uma perspectiva prpria, singular e especfica a cada momento de produo cientfica, utilizando-se plenamente da sua liberdade, espontaneidade e criatividade, dando a todos os seus conceitos e mtodos um sentido particular ( Sinn) representante do seu prprio estilo pessoal de pensamento. Entendido dessa forma, acreditamos que qualquer tentativa de enquadrar a concepo do pensamento moreniano numa nica corrente filosfica, ser sempre uma questo controvertida. Num certo sentido, impossvel. Melhor seria ento, se dar conta de que, dentro de uma proposta to ampla e flexvel da concepo do ser humano, no cabe limites. Manter a mente aberta e captar o significado de cada proposta socionmica, parece-nos ser a atitude mais lcida, podendo-se dessa forma integrar filosofia do Psicodrama, diferentes modelos filosficos, que podem ir do existencialismo cristo de Kierkegaard ao materialismo histrico humanista de Marx, cuidando-se apenas de no ferir ou desvirtuar os supostos existenciais bsicos da sua teoria.

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Lembremos ento : Moreno percebia o indivduo como parte integrante do Universo, propondo-lhe uma anlise existencial e fenomenolgica da sua existncia, sem estabelecer limites entre a vida e a morte, entre o eu e os papis ou entre a fantasia e a realidade. Com isso, criou um novo conceito de papel, que provm da catarse total oriunda do ato de nascer e libertar-se, vendo o indivduo como sntese de uma integrao sinttica de todos os elementos presentes na natureza e nos espaos preenchidos pelo indivduo, em suas relaes com o mundo, com as pessoas e com os seus papis. Sua viso do ser humano to ampla quanto o sua proposta psicoteraputica, atravs da Socionomia, indo do teatro teraputico espontneo sociatria e, quem sabe, possibilidade de suspenso real do personagem analista- terapeuta atravs da Vdeo Terapia, proposta no desenvolvida at o momento , mas guardada talvez para o futuro?

BIBLIOGRAFIA 1. FONSECA FILHO,S.J.-PSICODRAMA DA LOUCURA,ED.GORA,S.P.,1980 2-FROOM,ERICK CONCEITO MARXISTA DO HOMEM,ZAHAR ED. R.J.-1979 3-FRAGATA, J. S. PROBLEMAS DA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL, BRAGA LIVRARIA CRUZ, 1962 4-LUIJPEN. W. INTRODUO FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL, EPU. UNIVERSITRIA LTDA, S.P.,1973 5-MORENO,J.L. FUNDAMENTOS DO PSICODRAMA,EDITORIAL SUMMUS,S.P.,1983 .................................. PSICOTERAPIA DE GRUPO E PSICODRAMA, ED. MESTRE JOU,S.P.,1974 ................................. PSICODRAMA, ED. CULTRIX, S. P. , 1974 .................................. O TEATRO DA ESPONTANEIDADE, ED. SUMMUS,S.P. , 1984 6-RANSON GILES,T. HISTRIA DO EXISTENCIALISMO E DA FENOMENOLOGIA, EPU, S.P., 1973 7-ROJAS-BERMDEZ,J. G. INTRODUO AO PSICODRAMA ED. MESTRE JOU, S.P. , 1970

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Captulo 3 A Socionomia como proposta integrativa

Jacob Levy Moreno, ao conceber a idia do Psicodrama, talvez por ultrapassar, em muito, as idias cientficas da sua poca, mostrava-se uma pessoa inquieta, inconformada s exigncias sociais e aos conceitos e valores vigentes no meio cientfico, inclusive a nvel filosfico. A sua compresso do ser humano, vai alm das noes do existencialismo de Kierkergaard (1), embora delas se aproximem e, da mesma forma, das idias do lan vital e do conceito de momento, de Bergson. Sua noo de Encontro olho no olho, face a face, simtrico e em dupla via, difere, tambm, do conceito de Encontro de Martin Buber - onde se prioriza uma relao mais comtemplativa, tipo sujeito-objeto. Dirigem-se para o Hassidismo (2), mais ainda no isso, ou s isso que lhe basta. Ele deseja um ser humano socialmente atuante, tal como Marx, mas, preocupa-se com a preservao da liberdade individual e coletiva, com a criatividade e espontaneidade que aprisionada pelo sistema. Prope, ento, uma anlise existencial da existncia o Dasain ou Dasainlise, onde o indivduo convidado a concretizar a sua prpria existncia, vivendo, existindo e fazendo-se existir em atos, no apenas em palavras, e onde ser estimulado a exercitar a sua espontaneidade e criatividade. Pautado nessas idias filosficas, por muitos chamada de Religio do Encontro, Moreno trilha caminhos que o levam concepo do Teatro Espontneo e descobre o valor teraputico da representao espontnea e inverso de papis, atravs do Caso Brbara (1924). Em seguida, prope-se a fazer um trabalho teraputico , dentro do mesmo enquadre, e assume o Caso Robert Diora. Seu Teatro Teraputico, falha - Moreno no obtm o sucesso esperado, neste 2 Caso. Ao que parece, seus primeiros pacientes espontneos , fazem-no entrar num novo ciclo evolutivo, a partir da sua prpria experincia e da vivncia do seu papel profissional, despertando-lhe para novos aspectos referentes sua descoberta : uma 1 via- valor teraputico da dramatizao de papis, lhe indica o caminho inicial do psicodrama: o Teatro Teraputico; e uma 2 via limitaes do Teatro Espontneo, atinge a conscincia do seu papel de psicoterapeuta, a necessidade de reflexo, de mtodo, de ao social especfica e especializada. Moreno, ento, dirige-se para Nova Iorque (1925), em busca de um novo espao, e inaugura uma nova fase de aprimoramento cientfico da sua proposta de trabalho. dentro desse contexto de evoluo pessoal que as suas idias realmente frutificam e surge, de fato, o psicodrama, a sociometria, a psicoterapia de grupo e a sociodinmica ( 1934). A sua proposta de fazer emergir e praticar uma anlise existencial fenomenolgica Dasainlise, repensada e, ao ser ampliada para incluir de forma dialtica o Contexto Social

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e a adequao de papis, vislumbra tantas possibilidades de trabalhar-se com o Psicodrama, que tornou se necessrio delinear os seus vrios segmentos, especificar diferentes enquadres e definir o corpo terico do Psicodrama, numa espcie de coluna dorsal : a Socionomia. Dentro dessa perspectiva, a Socionomia seria uma cincia - aquilo que ao mesmo tempo o nada e o tudo que contm, ou seja, uma proposta de estudar cientificamente, as leis que regem o comportamento social e de grupo, levada a cabo por Moreno, desde a sua adolescncia. A fim de melhor compreender todas as propostas de Moreno, vamos fazer a retrospectiva de alguns conceitos filosficos que podero nos guiar ao praticar o Psicodrama, em suas diversas formas.

Princpios Bsicos Alm dos princpios filosficos bsicos, definidos por J.L. Moreno, que podem ser melhor detalhados atravs da seita praticada pelo Seinismo ou Hassidismo Filosofia Existencial Fenomenolgica, parece-nos essencial, a nvel metodolgico, que observemos as cinco principais noes da fenomenologia de Husserl, adaptando-as nossa prtica psicodramtica, as quais, podem, em muito, enriquec-la . Essas noes so as que se seguem:1)

O APRIORI (POCH) : Segundo Husserl, no das filosofias que devem partir o impulso da investigao, mas sim das coisas em si e dos problemas que temos frente fenmeno puro. E para realizarmos essa investigao, necessrio uma total ausncia de pressupostos vivncia, que se considere o fenmeno puro, em seu estado original, e se chegue uma compreenso do mesmo atravs da vivncia de um Evidncia Apodctica conscincia intersubjetiva, da qual no se tem nenhuma dvida.

No Psicodrama, dessa forma que fazemos a entrada em Cena, com textos espontneos, improvisados no palco pelo Protagonista, fazendo atuar realidade e a fantasia, em busca da Cena esclarecedora.

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2)A EVIDNCIA : Na Evidncia Apodctica, os fatos devem excluir a dvida, via a vivncia e atravs, Da intuio sensvel evidncia de sentimentos Da intuio Intelectiva atravs de uma Imagem Da intuio Perceptiva -Recordaes que partem de Conceitos Universais : essncias e eidos apreendidos, de forma direta, na presena do objeto na sua corporiedade, ou apreendidos de forma indireta, atravs de uma Imagem. No Psicodrama, adotando-se este tipo de postura, o terapeuta pode isentar-se a fazer Interpretaes do fenmeno, utilizando-se das tcnicas especiais- duplo, espelho, inverso de papis, construo de Imagens, etc., durante a etapa de Dramatizao. 3)A INTENCIONALIDADE : Segundo este conceito, a Intencionalidade parte do Eu e invade temporariamente os dados materiais, unificando-os, e designando o objeto, enquanto meramente consciente ou significado, ou seja, na sua imanncia ( ausncia exterior do objeto) . O que acontece durante a vivncia uma : Compreenso subjetiva dos fatos Uma vivncia do objeto significado na sua imanncia ( ausncia exterior do objeto significado) O faz de conta do Psicodrama em busca da verdade , via o interjogo de papis reais e fictcios. Este elemento irreal da vivncia colocado entre parnteses; e Preserva-se o Sentido da vivncia (Sinn) para transcend-lo fenomenologicamente Exemplo em Husserl : O sentimento existe enquanto qualidade ( AMOR), independente de que haja um objeto intencional (Algum, um Outro). No Psicodrama, o Ego-auxiliar tem como funo representar papis dos personagens internos do paciente, ausentes sesso, para presentific-los na sua corporiedade, conferindo maior realidade fantasia. Este elemento irreal da vivncia, colocado entre parnteses, conservando-se apenas o seu sentido original, para transcender a experincia. 4) A LGICA DA CONTRADIO : Segundo a Lgica Formal , existiria sempre um relativismo da verdade , pois teramos de reger o Contedo com as mesmas leis que regulam os Atos , ou seja, os atos e seus contedos seriam regidos pelas mesmas leis. Husserl faz uma distino entre o Ato e o Contedo do Ato , e rompe com a lgica formal, separando o Ato do Contedo do Ato. Prope a Lgica da Verdade ou Lgica da Contradio, onde o Ato que rege o Contedo, ou seja, o Ato independe das leis do Contedo e dessa maneira, aquilo que se v no pode ser de outra maneira, o fenmeno puro .

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No Psicodrama, esta noo de Lgica da Verdade, tambm existe, pois, parte-se sempre da Ao e da vivncia psicodramtica, para o estudo do fenmeno. Atravs da vivncia da dramatizao ou da Construo de Imagens, pode-se chegar ao Contedo do Ato sem precisar inferi-lo, atravs de uma Interpretao.

5) A INTERSUBJETIVIDADE : Husserl, tambm diz, que o conhecimento no meramente subjetivo - em nica direo, ele intersubjetivo - em direo dupla, de ambos os lados. Vem da o valor dado vivncia. No Psicodrama, prioriza-se a ao, a vivncia e a experincia do outro, da relao interpessoal . Temos, tambm, o Conceito de Tele - emisso, recepo e percepo de mensagens e sentimentos, em dupla direo . Observemos agora, o fator dinmico da teoria moreniana, presente na sua concepo do ser humano e que aproximam-se das idias de Marx , para tentar verificar o Encontro das idias de Marx com as idias de Moreno : A DIALTICA MARXISTA MARX diz que: A realidade e o indivduo no podem ser dicotomizados e por isso no existe linearidade ( causa e efeito absolutos); Cada fato ou fenmeno possui mltiplas causas e formam uma cadeia de relaes intrnsecas e de realidades subjetivas, que num dado momento existe e que por isso Histrica; Marx defende o naturalismo e humanismo, dizendo que do mundo dos sentidos, em constante mutao, que devemos ver a Realidade, e no a partir das idias ou ideais, de essncias incorpreas. Seu entendimento do processo vital da realidade humana construdo a partir de homens REAIS e ATUANTES; e Considera que existe uma Dialtica entre a Realidade Objetiva e a Realidade Subjetiva, onde a realidade subjetiva tomada como uma prtica da atividade sensorial, que apreendida pelos prprios sentidos e no atravs de uma atividade contemplativa do pensamento das idias.

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Vejamos, agora, o pensamento de Moreno, a respeito da personalidade e do Universo Social, bem como a sua proposta psicoteraputica. MORENO Diz que a Organizao da Personalidade decorre da interao dinmica de trs fatores: foras hereditrias ( fatores biolgicos) foras sociais ( Tele = relaes interpessoais x relaes de fantasia = tomo Social) foras ambientais ( papis sociais = realidade externa x realidade interna) Moreno decompe o Universo Social em trs Dimenses: Sociedade Externa = famlia, estado, igreja, etc Matriz Social ou tomo Social = mundo socioafetivo Realidade Social = que o reflexo da oposio dialtica entre a Realidade Social vigente ( Realidade Externa) e a realidade interna dos grupos ( Relaes Tele = redes sociomtricas). Consideramos que, vem desse pensamento de Moreno, o desenvolvimento de Tcnicas Especiais, como: a Psicoterapia de Grupo, a Sociometria e o Psicodrama Grupal, o Sociodrama. O QUE A SOCIONOMIA ? Moreno define a Socionomia como a cincia que estuda as leis que regem o comportamento social e grupal, a partir de 3 pontos de referncia : SOCIUS ( companheiro) : Insero do Indivduo em Pequenos Grupos; METRUM ( a medida ) : Estudo das Relaes Interpessoais; DRAMA ( ao ) : mtodo psicoteraputico RAMOS DA SOCIONOMIA (SUB-DIVISES) 1) SOCIODINMICA : Estudo da organizao e evoluo dos grupos Principais Ferramentas Sociodinmicas: ROLE PLAYING : treinamento e adequao de papis.

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TEATRO ESPONTNEO : 1 Enquadre Psicodramtico- representao espontnea de papis. JORNAL VIVO : tcnica de aquecimento para a ao e dramatizao. PSICODRAMA EDUCACIONAL: aplicao do Psicodrama ao contexto educacional de ensino-aprendizagem. PSICODRAMA PBLICO Vivncia do Psicodrama numa nica sesso, aberta ao pblico. PSICODRAMA INSTITUCIONAL aplicao do Psicodrama s organizaes. Ex: Reunies Setoriais, Reunies de reas ou de diretorias, Seleo de Pessoal, Entrevistas de admisso, Resoluo de Conflitos Organizacionais.

2- SOCIOMETRIA : Estudo das foras de atrao e repulso, organizao grupal e redes sociomtricas, da comunicao e afetividade grupal. Instrumento da Sociometria : Teste Sociomtrico Permite conhecer a posio dos indivduos no grupo : as redes sociomtricas do grupo, seu lder popular, lder socioafetivo, membros isolados, rechaados, status sociomtrico ( cotas de amor e simpatia), tomo Social ( relacionamentos socioafetivos); Tele ( emisso , recepo e percepo de sentimentos); funes e papis assumidos por cada componente do grupo. 3- SOCIATRIA : Parte da Socionomia que se dedica ao tratamento do Indivduo e do Grupo, atravs do Psicodrama e do Sociodrama. Diferentes enquadres e objetivos teraputicos so definidos: Psicoterapia de Grupo e Psicodrama Grupal Psicodrama Individual Psicodrama Bi-Pessoal Psicodrama de Casal Psicodrama Infantil Sociodrama Pblico Sociodrama Institucional Sociodrama Educacional Sociodrama Familiar

Psicodrama de Famlia Objetivo do Psicodrama : Prope-se ao aprofundamento psicoteraputico do indivduo, ou do indivduo inserido no grupo. Protagonista : o Indivduo Objetivo do Sociodrama : Prope-se ao tratamento sociodinmico das relaes interpessoais, em grupos operativosgrupos de estudo, trabalho, igrejas, comunidades. Protagonista : o Grupo NOTAS(1)

(2)

Para Kierkergaard, Hegel havia suprimido a distino entre Deus, o mundo e o indivduo, mergulhando tudo num nico sistema, representado pelo Esprito Absoluto , onde o racional o real e onde o indivduo e o seu extremo coincidem concretamente no Universal. Dentro de um sistema assim fechado, que leva tudo abstrao, ele considera que o prprio homem absorvido no absoluto das idias, restando-lhes apenas delimitar um lugar dentro do Sistema. com este aspecto da filosofia de Kierkergaard que Moreno parece se identificar, uma vez que, tal como Kierkergaard, defende uma doutrina onde o indivduo, sua subjetividade, liberdade e singularidade, so princpios bsicos. O Hassidismo uma seita religiosa proveniente da Cabala-Judasmo Mstico, que defende a filosofia do Seinismo , segundo a qual, Ser e Saber so inseparveis. Rene numa s realidade a existncia e o pensamento. Defende o naturalismo, a manuteno do fluxo natural e espontneo da existncia, o valor do momento presente e o estmulo espontaneidade e criatividade.

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Captulo 4 Sobre a Teoria dos Papis

O primeiro ato do indivduo , o nascer, traz baila questes referentes sua identidade. J.L.Moreno transcende a existncia imediata e relaciona ao indivduo uma primeira identidade csmica, na qual existe em estado puro uma possibilidade espontnea e criativa, natural sua essncia mais profunda, e da qual os papis somam as suas ramificaes expressivas, funcionais e culturais. Ou seja, os papis expressam as formas reais, imaginrias e simblicas que o eu adota ao interrelacionar-se com o outro, mas traz consigo uma Identidade que, mesmo catica e indiferenciada, existe. Define Moreno ( 1928) que toda configurao de papel envolve duas partes, exigindo uma vinculao, mesmo que fictcia, com um outro. Da decorre a principal caracterstica do papel : sua funo complementar . dentro dessa complementariedade que o Eu vai constituir-se. O desempenho de papis antecede, pois, o surgimento do Eu : atravs do interjogo de papis, atribudos criana, pela me, enquanto ego auxiliar, e no suprimento das suas necessidades bsicas de sobrevivncia, carinho e ateno, que os papis vo se desenvolvendo e desenhando os embries do Eu em eus - parciais. Diz ainda Moreno, que esses eus-parciais esforam-se de tempos em tempos por reunir-se e unificar-se e que o papel pode ser tomado como cada uma das unidades de conduta. Poderamos ento dizer que o Eu, ao emergir dos primeiros papis que desempenha, ou seja, dos papis psicossomticos, confere, aos mesmos, uma funo estruturante. Aos poucos, esse Eu vai-se organizando, adquirindo contedo e expresso emocional, ampliando o seu campo de atuao e comea a jogar papis mais complexos, que envolvem as suas funes simblica e imaginativa. Passa ento, a jogar papis psicodramticos, at

poder trilhar caminhos, desde o mundo social, para o desempenho de papis mais estruturados, com significados, experincias e funes sociais definidas. sobre este processo de nascimento, aquisio, auto conhecimento e interao social que se debrua a Teoria dos Papis de Jacob Levy Moreno. A Teoria dos Papis abrange em seu conjunto, trs tipos de papis: os papis psicossomticos, os papis psicodramticos e os papis sociais. Os papis psicossomticos so papis emergentes e espontneos, que existem desde o nascimento e que se apoiam nas funes fisiolgicas. Ao mesmo tempo em que representam funes orgnicas inatas, exigem a presena de um outro, de um papel complementar, para expressar-se e constituir-se num primeiro vnculo : o vnculo maternal. Nesse primeiro Universo, a merc da existncia insubstituvel de um vnculo que prov idealmente todas as necessidades bsicas de sobrevivncia, a criana vivencia os seus papis em suplementariedade, ou seja, sem que esteja consciente do seu papel e do papel do outro. Isto quer dizer, alm de outras coisas, que se o outro falha em seu papel, registra-se tambm uma falha no Eu. Muitos desenvolvimentos tericos, tanto em psicanlise quanto em psicodrama, fazem referncias especiais a esse primeiro mundo da criana, a exemplo da teoria do Ncleo do Eu de Rojas-Bermdez, dos estudos de Melanie Klein, Margareth Ribble, Ren Spitz e muitos outros. Mas, na Teoria dos Papis de J.L. Moreno esse um momento que, alm de passagem, representa a fantasia, possibilita a ao espontnea e o desenvolvimento da atividade criadora. Os papis continuam a emergir e surgem os papis psicodramticos, herdeiros paradoxais da brecha entre a realidade e a fantasia. Esses papis surgem como fruto do despertar do Eu em relao ao outro, da noo do vnculo em sua complementariedade. Apoiam-se nas funes da psique ( percepo e imagens mentais) e no jogo de inverso de papis. Conferem realidade fantasia e vice-versa. Segundo Moreno, ao ocorrer a brecha entre a realidade e a fantasia , a criana entra no seu segundo Universo , onde ocorrer uma diviso do eu :

PAPIS PSICODRAMTICOS E FANTASIA MUNDO PSICOSSOMTICO IMAGINRIO

PAPIS SOCIAIS REALIDADE MUNDO SOCIAL REAL

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PAPIS PSICOSSOMTICOS

A Matriz de Identidade, originalmente csmica e espontnea, cede espao Matriz Social, dando incio a um processo de inverso de identidade, que tem incio aps a configurao dos papis psicossomticos e se completa aps o surgimento dos papis psicodramticos que, embora ainda conservando realidade e fantasia, vem instalar a criana num contexto histrico e social, fazendo-a perder gradualmente a espontaneidade e criatividade, caractersticas de personalidade, at aqui, mais marcantes. Por conseguinte a sua capacidade de vincular-se a essa Matriz Espontnea vai sendo suprimida pelo treinamento, condicionamento e socializao crescentes, fazendo-a absorver do referido contexto as suas conservas culturais e novos modelos de conduta nele baseados. Se por um aspecto isto lhe favorvel, dado s inesgotveis experincias e construes humanas que possibilita, por outro, limitante a nvel de ao libertria criativa, aprisionando ou dificultando a expresso plena dos papis que traz em germe, ao nascer : o meio social, cultural , poltico, tnico, religioso ou familiar, podero ou no bloquear, em diversos nveis, as suas possibilidades de desenvolvimento e crescimento emocional e social. Moreno ento nos fala de papis ausentes, mortos, futuros, mal desempenhados, ansiosos, cristalizados, rgidos, inadequados e patolgicos, colocando-os enquanto partes no - resolvidas do Eu postulado , espontneo. Sugere o Psicodrama como palco de liberdade e libertao onde o indivduo vai ser estimulado a procurar a sua verdade e (re) encontrar-se. Referncia Bibliogrfica : Moreno,J.L. Psicodrama, Ed. Cultrix, 1978. Maio de 1998.

Captulo 5 A Criao de Cenas atravs da Forma e a Emergncia de Contedos

Para melhor compreender o mtodo psicodramtico de Rojas-Bermdez, psicodramatista argentino que desenvolveu a teoria do Ncleo do Eu, importante, acredito, absorver as principais diferenas entre o seu enquadre tcnico-formal e o mtodo moreniano, basicamente centrado na tcnica de dramatizao de papis. Bermdez, ao longo do seu trabalho clnico, desenvolveu uma metodologia de trabalho prpria, acrescentando algumas transformaes de estilo e tcnica ao enquadre original, definido por J.L.Moreno. Bermdez sugere enquanto procedimento sistemtico a Tcnica de Construo de Imagens, no contexto dramtico, como tcnica de aquecimento ou desaquecimento, pesquisa e trabalho teraputico. Ao comear a minha prtica como Psicodramatista estagiria, na ASBAP (1993), sentia dificuldades em adaptar-me ao mtodo psicodramtico proposto por Rojas-Bermdez, em sua ntegra. A dificuldade provinha, creio eu, de uma tendncia mais arraigada no trabalho verbal e do hbito, anteriormente incorporado, de ouvir e investigar verbalmente o material trazido para a sesso. O processo de conceber alguma hiptese de direcionamento para a produo de Cenas , atravs da escuta muito lento e este aspecto me serviu de motivo para a experimentao do modelo proposto. Familiarizando-me aos poucos com esta metodologia , pude perceber que, de fato, aquecer o Protagonista para a produo de uma Imagem, era realmente mais favorvel obteno de contedos e, da mesma forma, para um melhor desenvolvimento da sesso psicodramtica. Na maioria das vezes, criava-se a partir da uma cena a ser trabalhada, independentemente da dramatizao propriamente dita, favorecendo tambm, a construo de hipteses teraputicas, o envolvimento do grupo e o aquecimento do protagonista. Esse relaxamento de campo pareceu-me essencial, compensando, de alguma forma, o trabalho despendido junto ao paciente para a produo de uma Imagem, uma vez que esse tipo de linguagem falar atravs de uma forma ou alegoria, no muito comum na nossa cultura. A utilizao sistemtica desse mtodo de trabalho, me permitiu visualizar as cenas expostas, ao invs de ouvi-las e repeti-las no Cenrio, o que acredito que tenha sido bom tambm para os pacientes, fazendo-os voltar o seu olhar para si mesmos, ao tempo em que constrem o seu drama e o vivenciam. Pude perceber, tambm, que o mtodo permite a evoluo ou no das formas criadas no Cenrio, para uma dramatizao, desenvolvendo-se

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de maneira fluda e enriquecendo o desempenho de papis, alm de pontuar as intervenes necessrias de uma forma conjunta. Segundo Bermdez, a Imagem traz o aspecto bsico conflitante, registrado e identificado na Imagem, o qual espontaneamente assumido pelo protagonista. Este fato possibilita-nos o prosseguimento do trabalho teraputico, muitas vezes sem passar pela produo de cenas onde so desenvolvidos papis mtodo moreniano, uma vez que a prpria Imagem pode ser capaz de possibilitar o insights e a catarse de integrao objetivada. Quando isso acontece, a Imagem fala por si mesma, a compreenso imediata e fortemente sentida pelo paciente como a sua verdade. Facilita-se tal compreenso fazendo-se uma leitura das formas em cena, com o envolvimento do protagonista ou, como orienta Bermdez, passa-se a investigar as relaes existentes entre os seus elementos expressivos e a verificar as inter-relaes existentes entre cada parte e contra-parte da Imagem. Atravs dessa metodologia, normalmente o protagonista chega auto-compreenso e auto-avaliao. Dentro da minha experincia com a tcnica, houve ocasies onde tornou-se desnecessrio, inclusive, passar o protagonista para a Imagem e pedir-lhe o Solilquio. Ao faz-lo tomar distncia da Imagem e visualiz-la, obtinha-se insights da situao, tornando-se desnecessrio o desdobramento tcnico-metodolgico do procedimento. Nessas ocasies, a qualidade da Imagem era muito boa. Notamos que certos pacientes conseguem mais facilmente uma auto-compreenso significativa logo aps o processo de produo da Imagem ou, no momento seguinte, ao assumir o lugar de cada parte e contra-parte da Imagem para realizar o Solilquio, etapa do procedimento considerada por alguns como um assumir e inverter papis embora particularmente acredite ser mais adequado utilizar essa terminologia para unidades de conduta(desempenho de papis) e no para unidades de gestos e posturas corporais, que compem representao plstica de uma situao, como estados de nimo, a percepo simblica de um conflito ou papel, etc. ou seja, a Imagem reflete, estrutura, decompe elementos, mas esttica. Ela pode levar ao jogo de papis, mas se isto acontece, tecnicamente estaremos passando fase clssica de dramatizao ( jogo de papis). A utilizao desse mtodo nem sempre uma tarefa fcil. Requer muito tempo de prtica, determinao e pacincia por parte do terapeuta. Principalmente quando estamos lidando com pacientes muito bloqueados nos seus afetos, com poucos recursos expressivos e muitas dificuldades de simbolizao. Percebi, no entanto, que mesmo para essas pessoas, o exerccio continuado de produzir Imagens, pode servir-lhes de estmulo ao desenvolvimento dos seus canais cenestsico e visual, permitindo-lhes de alguma forma ampliar o seu contato com o seu mundo interno de sensaes, sentimentos e fantasias, ajudando-os a

melhorar tambm a qualidade dramtica das suas Imagens e a liberar o seu potencial criativo para o desempenho de papis. Escrito Psicodramtico apresentado no II Encontro Regional Norte/Nordeste Realizado em Salvador-Bahia, 1994 e Publicado no Jornal EM CENA da FEBRAP-Ano15-No.1/ 1998

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Captulo 6 A MSICA COMO OBJETO INTERMEDIRIO

Focar a ateno do paciente, diminuir o controle do eu, facilitar o acesso ao material inibido e restabelecer a comunicao perturbada, so alguns dos aspectos mais corriqueiros para quem lida com a psicoterapia psicodramtica. A iseno ao mtodo de explorao do inconsciente atravs dos smbolos verbais e das tcnicas de interpretao, impem permanentemente ao psicodramatista a busca de novos recursos interacionais. No nos basta ouvir, preciso operar, entrar em setting, e aquecer o paciente para a produo psicodramtica. A utilizao da msica como Objeto Intermedirio e psicoteraputico tal como a utilizao dos tteres e das mscaras, surge no Psicodrama, como mais um recurso tcnico operacional, estudado e difundido no meio psicodramtico por Jaime Rojas-Bermdez. Incorporando-se s tcnicas de aquecimento grupal ou individual e s tcnicas auxiliares, a utilizao da msica no contexto teraputico cumpre o objetivo de fazer emergir material teraputico em estado subliminar. Como no plano pessoal sempre tive interesse pela msica, desde muito pequena, no tive resistncias em utiliz-la como recurso tcnico no meu trabalho clnico. Mas, reconheo ser s vezes delicado o manejo teraputico da msica, em sesses de psicoterapia. Precisamos dispor de um grande repertrio musical, que nem sempre faz parte das nossas preferncias e que, claro, possa estar presente a cada sesso. Alm disso, ter desenvolvido alguma, se no muita, sensibilidade musical em relao ao grupo, ou ao protagonista, e us-la com adequao, observando-se os objetivos teraputicos em cena. Alguns aspectos terico-prticos so ento importantes para trabalhar-se teraputicamente com a msica, at mesmo quando se trata de um simples processo de aquecimento preparatrio, pois preciso captar corretamente o clima do grupo e as necessidades do protagonista. este o motivo pelo qual me interessei em pesquisar sobre este tema, h algum tempo atrs (1993) , ao comear a fazer atendimentos de Psicodrama Grupal. Vejamos ento o que diz Bermdez a esse respeito. Segundo Rojas-Bermdez, a msica enquanto instrumento tcnico-teraputico, pode ser considerada como se fosse um Objeto Intermedirio , embora no possua todas as suas

caractersticas, teoricamente definidas como tendo existncia real e concreta e como tendo as seguintes qualidades : 1) no desencadear reaes de alarme ; 2) ser amplamente malevel; 3) permitir, por seu intermdio, a comunicao com o paciente, substituindo o vnculo e mantendo a distncia; 4) ser adaptvel s necessidades do indivduo; 5) ser assimilvel a ponto de permitir que o indivduo possa identific-lo consigo mesmo; 6) que possa ser instrumentado como prolongamento do indivduo; 7) que possa ser reconhecido e identificado imediatamente, com o indivduo. Usamos a msica como objeto intermedirio no processo comunicacional com o paciente, Em virtude das possibilidades que d ao terapeuta de estabelecer contato com certos papis do paciente sem desencadear reaes de alarme. Este contato o que permite, ulteriormente, a interao dos papis e a criao de vnculos( Introduo ao Psicodrama Rojas-Bermdez). Ela pode ser dirigida para o grupo ou para o indivduo. Quando dirigida para o indivduo, levamos em considerao as suas dificuldades para criar vnculos entre o Papel e o seu Complementar. Nesse caso, pode-se dirigir a msica tanto para o Papel do protagonista quanto para o Papel Complementar. Decorre da a categorizao da msica enquanto Complementar, Suplementar ou Indutora . A MSICA COMPLEMENTAR Tem como finalidade oferecer ao protagonista um papel complementar adequado, possibilitando-lhe a vivncia do vnculo requerido para a situao. Ao tratar-se, por exemplo, de um conflito relacional encoberto entre os papis de me - filho, o estmulo musical dever se adequar inicialmente ao material explcito trazido pelo paciente, at que se possa introduzir pouco a pouco algum contedo materno simblico ( papel complementar ). Essa forma de acesso teraputico, da periferia para o centro, permite ir focando gradualmente o estmulo especfico que se quer oferecer, at que o protagonista ( paciente) , possa vivenciar o seu papel de filho mediante o estmulo musical. O Ego-Auxiliar ( assistente teraputico encarregado de desenvolver papis no contexto psicodramtico), poder ou no ser introduzido na Dramatizao, assumindo os contedos da msica complementar. Porm, o mais freqente limitar a ao do Ego, sobretudo se existir dificuldades no protagonista para a criao de vnculo. A MSICA SUPLEMENTAR usada quando o objetivo teraputico suprir uma parte carente do papel do protagonista. Ou seja, quando ocorrem discrepncia ou desintegrao de contedos, fazendo com que o protagonista pense, sinta e atue de forma descoordenada, gerando dificuldades para o

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estabelecimento de vnculos. Sabemos que, quando existe uma certa clareza entre os contedos ( o que se pensa e o que se sente), integra-se melhor o agir no mundo. isso o que Bermdez chama de papel bem desenvolvido, do qual surgir determinado vnculo, estabelecendo-se uma interao espontnea entre o papel e seu complementar, a partir da qual pode-se adequar teraputicamente a situao em cena e objetivar o vnculo no aqui e agora . Ao contrrio, se no existir essa integrao entre o pensar-sentir-agir, a interao espontnea para o processamento do vnculo v-se dificultada, criando psicopatologias no papel desenvolvido. Dessa forma, a pessoa pode aparentemente desenvolver bem o seu papel, a partir de esteretipos culturais, mas no integr-los a nvel de contedos. Ex.: Um filho que atua como filho, pensa como filho, mas no se sente como filho, evidencia uma carncia no seu sentir-se filho (psicopatologia na rea corpo) e necessita de um papel suplementar para suprir a carncia de registros. Nesse caso, comearamos com uma dramatizao j que o paciente pensa e age bem como filho, introduzindo em certo momento a msica suplementar como Objeto Intermedirio estmulo que supre a ausncia de sentimento na relao. Esse estmulo pode ser intensificado at que o protagonista passe a jogar o papel com espontaneidade de sentimento. A MSICA INDUTORA usada com o objetivo de estimular o aparecimento de determinados papis e utilizada quando o protagonista encontra-se em situao conflitiva, devendo assumir um papel requerido pela situao, e joga outro papel ( dificuldade de estabelecer o contra-papel ). tambm usada quando o clima emocional apresenta-se difuso, com possibilidades de uma atuao irracional, por falta de uma canalizao adequada do papel requerido ( ausncia de contra-papel). Pode ser usada para aquecer ou desaquecer a dramatizao. Um estado agressivo, por exemplo, pode ser induzido com a focalizao do papel de heri, estimulado com msicas desse teor, um estado amoroso, com msicas romnticas, e assim sucessivamente. Quando dirigida para o grupo, a msica, ainda como objeto intermedirio na comunicao teraputica, recebe uma outra classificao tcnica , uma vez que o objetivo agora seria o de facilitar a integrao do grupo. Temos ento : A MSICA HOMOGENEIZANTE Utilizada quando durante a fase de Aquecimento , o grupo demonstra sinais de disperso grupal temtica ou afetiva, dificultando a emergncia de um protagonista. Tem como objetivo homogeneizar o clima do grupo e facilitar a emergncia de um protagonista , centralizando o foco de ateno grupal, numa mesma temtica, criando-se um fundo comum para os

integrantes do grupo e possibilitando-lhes passar fase de Comentrios de forma mais produtiva. A MSICA FACILITADORA usada no sentido de acelerar o aparecimento do emergente ou da catarse e normalmente manejada quando o clima do grupo sugere um estado afetivo muito forte, mas encoberto, que no aparece explicitamente, mas que se faz sentir no clima grupal, ou em algum membro especfico do grupo. Oferece uma oportunidade para o alvio de tenses e autoesclarecimento. No caso da msica facilitadora da catarse, fala-se em descarga afetiva quando o protagonista chega ao pranto, por exemplo, ou clera. No caso da catarse de integrao, fala-se em msicas que facilitam a integrao de contedos pessoais ou grupais e que desbloqueiam o emergente, provocando uma mudana significativa. A MSICA INIBIDORA Usada para desaquecer estados afetivos muito agitados, que podem chegar a desencadear atos irracionais , manacos ou violentos. A introduo de uma msica sacra, por exemplo, pode facilitar novas formas de expresso dramtica da violncia ou da produo manaca, inibindo a atuao irracional. So essas as formas de utilizao teraputica da msica como objeto intermedirio, em Psicodrama. Rojas-Bermdez sugere a sua utilizao espordica: 1) em sesses individuais de Psicodrama Clssico, quando o paciente apresenta transtornos de comunicao muito intensos, no nvel verbal, ou se apresenta em estado de alarme; 2) Em sesses de Psicodrama Grupal, quando existem transtornos de integrao entre os membros do grupo, ou ento como aquecimento especfico para a emergncia do protagonista. Em todos os casos, observa-se a necessidade de obteno de material encoberto ou explcito, a partir do qual se possa escolher corretamente o estmulo musical requerido, a partir de uma hiptese dramtica ou teraputica. Passando a fazer uso das possibilidades de instrumentao clnica da Msica como tcnica auxiliar ou de aquecimento grupal, pude ir percebendo aos poucos que, tal como as tcnicas verbais auxiliares, elas podem funcionar, de acordo com o alvo e a clientela , como um duplo do paciente, como um espelho, ou ser usada para fazer uma interpolao de resistncias, facilitando sobremaneira o desenvolvimento do processo teraputico Alguns psicodramatistas podem continuar preferindo utilizar apenas as tcnicas clssicas. Mas ser esta uma simples questo de escolha? Acho que talvez seja uma simples questo de escolha ou de preferncia de estilo , quando estamos trabalhando com pessoas que

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dispem de recursos comunicacionais saudveis, com psicopatologias menos graves. Levando em conta que Bermdez desenvolveu suas tcnicas no-verbais a partir do trabalho clnico com psicticos crnicos, muda-se o contexto. preciso pensar no paciente, em formas de acesso ao bem-estar e, principalmente, em despojar-se de preconceitos. A fora com que vem crescendo a Musicoterapia, no nosso tempo, pontua a existncia de novos encontros entre a capacidade de libertao humana atravs das artes em geral.

ILUSTRAO CLNICA DO USO DA MSICA COMO OBJETO INTERMEDIRIO 7 sesso : A fase de aquecimento se prolonga, sem a emergncia de um protagonista.Uma paciente pergunta-me o que que eu vou fazer com todo o material que o grupo vem trazendo para a sesso. Aps breve discusso grupal , solicito cada elemento do grupo a construo de Imagens de como eles vm a relao terapeuta - paciente. As Imagens assinalam a ausncia de vinculao e distores do papel do terapeuta, responsabilizando-o pela guarda de contedos. Durante a fase de comentrios, a paciente protagnica revela que vem sentindo muito medo em ralao a tudo, sem uma razo especfica, h cerca de uma semana. A tentativa de trabalhar a situao atravs de Imagens, estanca no momento do Solilquio a paciente demonstra sinais de alarme e no consegue produzir mais, embora permanea no Cenrio, saindo e entrando da Cena. Peo-lhe que tente permanecer na mesma posio e observar os seus sentimentos. Intervenho ento com a utilizao de msica instrumental suave, com o objetivo de relaxar o campo. Ao observar sinais de distenso, introduzo msicas que trazem os contedos expressos ( solido e tristeza). A paciente chora. Aps essa descarga afetiva, passa ao relato de farto material infantil relacionados a sexo e violncia, restabelecendo o vnculo teraputico. 13 sesso : Uma paciente chega sesso deprimida e revoltada com a ausncia da me ao seu aniversrio. tomada como protagonista , mas recusa-se a passar ao Cenrio. Como todo o interesse do grupo se dirige para ela, fao uso da tcnica de Construo de Imagens , como espelho, tentando com isso uma interpolao de resistncias. O grupo vai mostrando paciente como percebe a sua relao com a me. No final, peo-lhe que escolha uma Imagem e aps algumas discusses sobre a escolha, a paciente aceita passar ao Cenrio e assumir o seu lugar na mesma. A partir da passo a usar msicas com contedo materno e a paciente reage extravasando os seus sentimentos atravs do choro. Aps o alvio dessas tenses, a paciente pde passar dramatizao do tema trazido, desenvolvendo bem tanto o seu papel, quanto o da me.

Essas foram as duas primeiras oportunidades que tivemos de fazer uso da msica enquanto objeto intermedirio . A partir da passamos a compreend-la como um recurso de ampliao do fenmeno tratado, como se estivssemos a oferecer ao paciente uma lupa, para a auto-compreenso dos seus sentimentos. Referncias Bibliogrficas Rojas-Bermdez, G. Jaime. - Que s el Sicodrama Editorial Celcius 1984 - Introduo ao Psicodrama Ed. Mestre Jou 1977 - Tteres e Sicodrama Editorial Celcius 1985 - Avances en Sicodrama Editorial Celcius-1988

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Captulo 7 AS TCNICAS DO INGERIDOR Artigo decorrente de monografia de concluso de Curso Salvador - Bahia, 1998 Sinopse Neste estudo abordo questes referentes a utilizao das Tcnicas do Ingeridor em Psicodrama Grupal, pesquisando conceitos tericos que ofeream subsdios para a sua prtica. Indo alm disso, busco alcanar a fundamentao terica dessas tcnicas, seus objetivos e efeitos teraputicos, trilhando as suas origens e o contexto clnico referencial no qual foram inseridas. Unitermos Tcnicas Auxiliares / Psicodrama Grupal / Tcnicas de Aquecimento / Realidade Suplementar / Comunicao Natural / Estrutura Social / Matriz de Identidade Total / Papis Psicossomticos / Ncleo do Eu. / Papel de Defecador / Tcnicas do Ingeridor. Historicamente, as Tcnicas do Ingeridor, tal como a grande maioria das tcnicas psicodramticas clssicas, provm do teatro. Representam simbolicamente as situaes de nascimento e morte e, em Psicodrama, caracterizam-se como tcnicas auxiliares, manejadas com o objetivo de vivenciar contedos simblicos pertinentes estruturao do Papel de Ingeridor. Foram adaptadas Teoria do Ncleo do Eu e introduzidas no meio psicodramtico por Jaime Rojas - Bermdez, durante os seus Seminrios. Vale ressaltar contudo, que no encontramos registros das referidas Tcnicas na bibliografia do autor que desenvolveu o seu uso em psicoterapia e psicodrama grupal. O procedimento dessas tcnicas, bastante conhecidas tanto em teatro quanto em Psicodrama, consistem em : 1) Pr o protagonista deitado , no Cenrio, olhando para um grupo de pessoas postas de p , ao seu redor, realizando movimentos de aproximao e afastamento e olhando fixamente para o sujeito . Como normalmente o protagonista sorri, o grupo tambm lhe retribui o sorriso; 2) O grupo carrega o protagonista, embalando-o nos braos e depois o suspende at o alto, realizando um pequeno passeio no Cenrio, com ele nessa posio.

Levando adiante a tarefa de buscar subsdios tericos para a aplicao clnica das Tcnicas do Ingeridor, e objetivando encontrar alguns referenciais relativos ao seu tipo de produo cnica, consideramos ser possvel situ-las a partir de alguns conceitos morenianos que se destacam como regras fundamentais bsicas dentro do Psicodrama. Vimos a princpio que, durante a aplicao dessas tcnicas, prioriza-se a comunicao noverbal com o paciente, intensificando-se dessa forma as suas sensaes cenestsicas. O procedimento tcnico das mesmas, encontra-se ento associado a um tipo de produo que parte do Diretor para o protagonista, com o objetivo explcito de aquec-lo para a ao . Durante esse processo de aquecimento, as Tcnicas do Ingeridor oferecem a oportunidade de criar uma realidade suplementar para o paciente, aquecendo-o para participar mais ativamente da produo e, vo criando possibilidades de vivenciar contedos latentes que aos poucos, vo emergindo no cenrio. Define Moreno que atravs desse tipo de procedimento que o Diretor de Psicodrama cumpre a sua funo de produtor de cena, com a finalidade de envolver o paciente na sua prpria experincia e tornar mais tangveis as suas alucinaes , criando uma ponte, atravs de uma realidade suplementar, onde o mesmo possa sentir-se em situao e atuar a partir dos seus prprios fantasmas, compondo espaos entre o real e o imaginrio da sua existncia. Penso que uma das caractersticas mais marcante das Tcnicas do Ingeridor seja exatamente a de produzir uma realidade a nvel simblico, proporcionando ao protagonista tornar real o que fictcio e passar para fora o que esta dentro, em busca da Catarse de Integrao, sem perder os parmetros de vivncia da realidade imediata. Moreno esclarece ainda que o Psicodrama abrange todas as formas de expresso, as quais podem ser estimuladas a emergir na sesso atravs de estmulos de vrias espcies, sejam eles visuais, corporais, musicais, cromticos, olfativos, rtmicos ou psicoqumicos. O objetivo que estes estmulos sejam usados como impulsores, que sirvam ao processo de aquecimento e que levem Catarse de Integrao . Voltaremos a essa questo posteriormente. Uma outra caracterstica das Tcnicas do Ingeridor, observada a partir deste estudo, referese ao desencadeamento de esquemas produtores . Essas Tcnicas fazem emergir uma srie de comportamentos espontneos, a exemplo da resposta - sorriso e das imagens mentais e cenestsicas que produzem. Vimos, por exemplo que a Tcnica 1, ao focar a ateno no olhar e no que acontece ao redor, instrumentando as noes de distnciaproximidade, evoca a GestaltSinal ( resposta - sorriso), como produto da

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complementariedade e do encontro, facilitando o estabelecimento de vnculos e o relaxamento de campo necessrio elaborao de contedos. A Tcnica 2 (onde o protagonista levantado pelo grupo), ao focar a ateno nas noes de deslocamento no espao e peso, parece produzir uma vivncia ocenica, mesclando a sensao de solido e abandono a uma sensao de tranquilidade e sossego. Provoca um desligamento total do ambiente, sem que o indivduo perca a noo de onde provm os estmulos . Por exemplo, o protagonista sente como se estivesse morto, mas sabe que no est morto. similar ao que diz Bernis a respeito das imagens mentais : Sabe-se de onde provm as sensaes experimentadas e que estas fazem parte das suas prprias aspiraes imaginrias, as quais so dotadas de existncia durante a vivncia (p.92,93). Referendada nos conceitos tericos vistos at aqui, supomos que a primeira parte do procedimento das Tcnicas do Ingeridor, incidem espontaneamente os iniciadores fsicos, mentais e ambientais necessrios produo de uma realidade suplementar , fazendo o indivduo entrar em contato com as suas fantasias e com partes dissociadas de si mesmo; e que num segundo momento , cria-se uma fuso imaginria entre realidade e fantasia, caracterstica do Primeiro Universo da Matriz de Identidade Total, onde todos os papis so vivenciados em suplementariedade. No que se refere aos esquemas produtores, conceito que provm da Etologia, sabe-se que eles produzem certas disposies anmicas a partir da combinao estmulo externo estmulo interno, e que desencadeiam comportamentos inatos e estados de nimo especficos relacionados a um mesmo contexto, e que so reconhecidos e experimentados por indivduos da mesma espcie de forma conjunta e universal. Discutimos at aqui sobre alguns aspectos de produo psicodramtica das Tcnicas do Ingeridor, que facilitam ao protagonista durante a sua vivncia concretizar e exteriorizar os seus fantasmas, e ser acompanhado e compreendido pelo prprio grupo, tambm envolvido na ao dramtica enquanto egos-auxiliares. Mas, tendo em vista que Rojas-Bermdez desenvolveu as Tcnicas do Ingeridor adaptandoas do teatro Teoria do Ncleo do Eu, consideramos ainda necessrio voltar o nosso olhar para esse arcabouo terico, em busca das indicaes do manejo clnico dessas tcnicas. Sabemos preliminarmente que a construo terica da Teoria do Ncleo do Eu repousa na noo de Primeiro Universo da criana ( mundo psicossomtico), onde no h distino

entre realidade e fantasia. O que Bermdez (1978) oferece por assim dizer, uma leitura psquica e neurofisiolgica da estruturao dos papis psicossomticos de Ingeridor, Defecador e Urinador. Orienta-se para tanto, no amadurecimento do Sistema Nervoso e em algumas disciplinas afins, a exemplo da Etologia e da teoria psicanaltica de Pichn Rivire . Destacamos como ponto central da Teoria do Ncleo do Eu, a noo de focalizao dos estmulos em cada processo estruturante, por que a partir do foco de estmulo que o Ncleo do Eu vai se estruturando, primeiro a partir do papel de Ingeridor, depois a partir do papel de Defecador e posteriormente, a partir do papel de Urinador, fazendo a diferenciao entre as reas CorpoAmbiente (Papel de Ingeridor), Mente - Ambiente ( Papel de Defecador) e as reas Corpo - Mente (Papel de Urinador). Com o amadurecimento do Sistema Nervoso, as noes de proximidade - distncia e deslocamento no espao e peso, delimitam os espaos interiores , o prprio corpo, do espao externo interiorizado , rea Ambiente. J vimos de que forma tais elementos marcam a sua presena nas tcnicas em estudo ( pg. 3 e 4 ). Define Bermdez que a partir da complementariedade entre as estruturas genticas e sociais que se produz a Marca Mnmica - registro de ocorrncias, sem a qual no ocorrer o registro da experincia, resultando numa porosidade a nvel de papel psicossomtico, em estruturao. esta circunstncia de vazio de complementariedade que d margem patologia de papel, circunstancia