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1 CONCEITO DE ÁCIDOS E BASES 1 1. Conceito de Arrhenius A primeira definição de ácidos e bases foi dada pelo químico sueco Svante Arrhenius ao redor de 1884: “Substâncias ácidas são aquelas que em solução aquosa dissociam-se em íons hidrogênios” “Substâncias básicas são aquelas que em solução aquosa dissociam-se em íons hidroxilas” A teoria de Arrhenius de ácidos e bases foi formulada com base na sua teoria de ionização das substâncias em soluções aquosas. As substâncias que se dissociavam totalmente ou em parte como íons em solução aquosa eram considerados eletrólitos. Aquelas que se dissociavam totalmente eram eletrólitos fortes, as que não se dissociavam totalmente eram eletrólitos fracos. No caso dos ácidos fortes tais como H 2 SO 4 , HNO 3 , HCl, HClO 4 , os quais se ionizam completamente em solução aquosa e fornecem íons hidrogênio (H + ), a teoria de Arrhenius funcionava perfeitamente. De modo semelhante, as bases fortes como o NaOH e KOH também se ionizam completamente em solução aquosa e produzem íons hidroxilas (OH - ) No entanto, em certos casos, a teoria de Arrhenius não se aplicava bem onde a solução não era aquosa e até mesmo nestas condições onde certas substâncias com caráter ácido ou básico não forneciam íons H + ou OH - , respectivamente. Como por exemplo, a amônia (NH 3 ) não contém íons hidroxila, porém em solução aquosa ela pode produzir íons hidroxilas reagindo com a água: 1 Arquimedes Lavorenti. Professor Associado do Depto. de Ciências Exatas, ESALQ/USP, Caixa Postal 9, 13418-900 – Piracicaba – SP. E-mail: [email protected] – Publicação Destinada ao Ensino de Ciências - Química - 28/3/2002

Atividade04

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CONCEITO DE ÁCIDOS E BASES1

1. Conceito de Arrhenius

A primeira definição de ácidos e bases foi dada pelo químico sueco Svante Arrhenius

ao redor de 1884:

“Substâncias ácidas são aquelas que em solução aquosa dissociam-se em íons

hidrogênios”

“Substâncias básicas são aquelas que em solução aquosa dissociam-se em íons

hidroxilas”

A teoria de Arrhenius de ácidos e bases foi formulada com base na sua teoria de

ionização das substâncias em soluções aquosas. As substâncias que se dissociavam totalmente ou

em parte como íons em solução aquosa eram considerados eletrólitos. Aquelas que se dissociavam

totalmente eram eletrólitos fortes, as que não se dissociavam totalmente eram eletrólitos fracos.

No caso dos ácidos fortes tais como H2SO4, HNO3, HCl, HClO4, os quais se ionizam

completamente em solução aquosa e fornecem íons hidrogênio (H+), a teoria de Arrhenius

funcionava perfeitamente. De modo semelhante, as bases fortes como o NaOH e KOH também se

ionizam completamente em solução aquosa e produzem íons hidroxilas (OH-)

No entanto, em certos casos, a teoria de Arrhenius não se aplicava bem onde a

solução não era aquosa e até mesmo nestas condições onde certas substâncias com caráter ácido

ou básico não forneciam íons H+ ou OH-, respectivamente. Como por exemplo, a amônia (NH3)

não contém íons hidroxila, porém em solução aquosa ela pode produzir íons hidroxilas reagindo

com a água:

1 Arquimedes Lavorenti. Professor Associado do Depto. de Ciências Exatas, ESALQ/USP, Caixa Postal 9, 13418-900 – Piracicaba – SP. E-mail: [email protected] – Publicação Destinada ao Ensino de Ciências - Química - 28/3/2002

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NH3(aq) + H2O à NH3HOH à NH4OH à NH4+

(aq) + OH-(aq) (1)

De qualquer modo, como não há evidências de que o NH4OH existe, o conceito de

Arrhenius para ácidos e bases não tem sido mais considerado, nem mesmo em soluções aquosas.

Além disso, o conceito de Arrhenius promoveu a idéia errônea que dissociação iônica

era indispensável para manifestação da acidez e que, portanto, reações do tipo ácido-base não

poderiam ocorrer na maioria dos solventes não aquosos e na ausência de solvente.

2. Conceito de Brønsted-Lowry

O conceito de ácidos e bases mais aceito, e um dos que tem elucidado o papel do

solvente em reações ácido-base, é aquele proposto independentemente por J.N. Brønsted

(Dinamarca) e T.M. Lowry (Inglaterra) em 1923.

“Ácido é definido como um doador de próton e base como um receptor de próton”

Esta definição tem uma importante implicação: Uma substância não pode atuar como

ácido sem a presença de uma base para aceitar o próton, e vice-versa.

Não há dependência em solventes ou em dissociações iônicas para que as substâncias

sejam classificadas como ácidos ou bases.

Uma reação de um ácido com uma base é, portanto, uma reação de troca de prótons;

se um ácido é simbolizado por HA e a base por B, então podemos escrever uma equação

generalizada ácido-base:

HA + B ßà A- + BH+ (2)

Porém, o produto BH+ também é capaz de doar seu novo próton recém adquirido para

outro receptor, e é, portanto potencialmente um outro ácido:

Ácido1 + Base2 ßà Base1 + Ácido2 (3)

Nesta reação esquemática, a base1 é conjugada do ácido1, e ácido2 é conjugado da

base2. O termo conjugado significa “estar conectado com”, e implica que qualquer espécie química

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e sua espécie conjugada estão relacionadas com o ganho ou perda de prótons, formando um par

ácido-base conjugado.

Deve ser enfatizado que o símbolo H+ representa aqui o próton não solvatado e não o

íon hidrogênio, o qual é uma espécie solvatada cuja natureza normalmente varia com o meio.

Alguns exemplos de pares ácido-base conjugado são dados abaixo:

Substância Ácido Base Conjugada

Ácido Clorídrico HCl Cl-

Ácido acético CH3COOH CH3COO-

Ácido nítrico HNO3 NO3-

Ácido perclórico HClO4 ClO4-

Água H2O OH-

Íon hidroxônio H3O+ H2O

Íon bicarbonato HCO3- CO3

2-

Cloreto de amônio NH4Cl NH3

Um ácido de Brønsted-Lowry pode ser uma molécula não carregada, um íon positivo,

ou um íon negativo.

Uma vez que a manifestação ácido-base de uma espécie química em uma reação

ocorre com a transferência de próton, e a capacidade de doar ou receber prótons de um ácido ou

uma base, respectivamente, está ligada as suas forças intrínsecas, então é necessário saber que a

força de um ácido ou de uma base se refere à extensão com que elas se ionizam em solução, isto é,

se desprotona (perde próton) no caso de um ácido e protona (ganha próton) no caso de uma base.

A acidez intrínseca de um ácido HA, por exemplo, é expressa como a constante de

equilíbrio para a reação:

HA à H+ + A- (4)

[H+] [A-]

Ka = -------------- (5) [HA]

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A basicidade intrínseca da base A-, correspondendo ao inverso da reação (5), e será

expressa pelo recíproco daquela constante:

1 [HA] Kb = ------ = ---------------- (6) Ka [H

+] [A-]

Uma vez que prótons livres não existem em solução em concentrações detectáveis,

reação do tipo expressa pela equação (4) não pode ser realizada experimentalmente, então a

acidez e basicidade intrínseca de uma substância não podem ser medidas.

Este fato é de fundamental importância no entendimento de medidas ácido-base. A

única maneira na qual podemos determinar força de um ácido ou base é pela reação de um ácido

com uma base de referência e vice versa (pela reação de uma base com um ácido de referência):

[H+] [A-] HA çè H+ + A- Ka = -------------- (7) [HA] [BH+] B + H+ çè BH+ Kb = ------------ (8) [H+] [B]

[BH+] [A-] HA + B çè BH+ + A- K = ---------------- = KaKb (9) [HA] [B]

Assim, a medida da constante para uma reação ácido-base, K, é o produto da

constante de acidez intrínseca de um ácido HA e a constante de basicidade intrínseca da base B.

Podemos determinar a força de um ácido apenas pela extensão da reação ácido-base, ou reação de

neutralização, na qual um próton é transferido de um ácido HA para uma base B para formar o

novo par mais fraco ácido-base BH+ e A-.

Para que a reação ocorra da esquerda para a direita como escrita em (9), a base B

deve ser mais forte do que a base conjugada do ácido HA, isto é, ela deve ter maior afinidade para

prótons do que A-.

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Cada reação ácido-base pode ser visualisada como uma soma de duas semi-reações,

uma expressando a acidez intrínseca do ácido HA e a outra, a basicidade intrínseca da base B.

Nenhuma das semi-reações podem ser avaliadas separadamente, apenas sua soma.

Nenhuma constante Ka, nem Kb pode ser avaliada separadamente, apenas seu produto.

Assim, todas as reações ácido-base envolvem a transferência de prótons entre dois pares

conjugados ácido-base como representado pela equação (9).

3. Conceito de Lewis. Conceito de ácidos e bases duras e moles

Os fundamentos da teoria eletrônica de acidez foi originalmente estabelecida pelo

americano G. N. Lewis em 1916, porém somente a partir de 1923 que a sua teoria foi aceita, o

qual estendeu a definição de ácidos e bases além daqueles conceitos de Brønsted-Lowry, tanto do

ponto de vista teórico como experimental.

De acordo com a teoria de Lewis:

“Base é definida como um doador de par de elétrons e ácido como um receptor de

par de elétrons”

Considere a seguinte reação geral:

A + :B à A:B (10)

A = Ácido de Lewis

:B = Base de Lewis

A:B = Complexo ácido-base

O exemplo mais simples de um ácido de Lewis é um proton, H+, o qual aceita um par

de elétrons quando ele se liga à molécula de amônia para formar um íon amônio:

H

N H

H

H+ :+ H N H

H

H

+

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A molécula de amônia forneceu um par de elétrons e, portanto de acordo com a

definição de Lewis é uma base, de modo semelhante à teoria de Brönsted.

A vantagem da definição de Lewis sobre a de Brönsted é que podemos identificar

substâncias como ácidos ou bases mesmo quando não há transferência de prótons (o papel do

próton é essencial na definição de Brönsted, porque a definição de um ácido ou uma base depende

do envolvimento de prótons).

O resultado da combinação de uma base de Lewis e um ácido de Lewis é chamado um

complexo (como no exemplo da formação do amônio). A ligação entre o ácido de Lewis e a base

de Lewis foi através de uma ligação covalente onde um par de elétrons fornecido pela base ao

ácido está agora sendo compartilhado por ambas as espécies químicas que lhe deu origem (trata-se

de uma ligação covalente dativa).

De acordo com as características em receber ou doar elétrons, certas espécies

químicas também tem outra classificação, segundo Pearson (1963):

Ácidos duros: o átomo receptor de elétrons possui número de oxidação elevada

(carga positiva), elevada eletronegatividade (capacidade da espécie química atrair elétrons),

tamanho pequeno, e não possuem elétrons externos facilmente excitados. Ácidos duros não são

polarizáveis (capacidade dos orbitais eletrônicos se deformarem na presença de um campo elétrico

e fazerem com que o centro de carga positivo e negativo não coincidam, gerando certa polaridade

temporária) e se associam com bases duras através de ligações iônicas.

Ácidos moles: o átomo receptor de elétrons possui baixo estado de oxidação,

tamanho relativamente grande, baixa eletronegatividade, e possuem vários elétrons externos

facilmente excitados. Ácidos moles são polarizáveis e se associam com bases moles através de

ligações covalentes.

Bases duras: o átomo doador é de baixa polarizabilidade e de elevada

eletronegatividade, é difícil de se oxidar, e não possuem orbitais eletrônicos vazios de baixa

energia.

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Bases moles: o átomo doador é de elevada polarizabilidade e de baixa

eletronegatividade, é facilmente oxidado, e está associado com orbitais eletrônicos vazios e de

baixo posicionamento.

Bases duras preferem complexar ácidos duros e bases moles preferem complexar

ácidos moles, sob condições semelhantes de força ácido-base.

Classificação de ácidos e bases de Lewis:

Ácidos de Lewis Bases de Lewis

Ácidos Duros: metais do grupo I Bases Duras

H+, Li+, Na+, K+, Be2+, Mg2+, H2O, OH-, F-, PO43-, SO4

2-,

Ca2+, Sr2+, Fe3+, Al3+, Sc3+ Cl-, CO32-, ClO4

-, NO3-

Ácidos de transição: metais do grupo II Bases de transição

Cr2+, Mn2+, Fe2+, Co2+, Ni2+, Cu2+ Br-, NO2-, N2

Ácidos Moles: metais do grupo III Bases Moles

Ag+, Au+, Tl+, Cu+, Zn2+, Cd2+, I-, CN-, CO

Hg2+, Pb2+, Sn2+