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Disciplina: Direitos Humanos Professor: Eduardo Cabral Moraes Monteiro Aula 04: Os Direitos Fundamentais e sua evolução – As liberdades públicas PLANO DE AULA 1) As liberdade públicas - As liberdades públicas ou direitos individuais constituem o núcleo dos direitos fundamentais; - A elas se agregaram os direitos econômicos e sociais e, depois, os direitos de solidariedade, mas estes outros direitos não renegam essas liberdades, visam antes a completá-las. 2) Natureza jurídica - Em termos técnico-jurídicos essas liberdades são direitos subjetivos; - São poderes de agir reconhecidos e protegidos pela ordem jurídica a todos os seres humanos e, eventualmente, a entes a eles assimilados; - São direitos subjetivos oponíveis ao Estado, o que era desconhecido antes de 1789 no Direito Positivo. 3) O titular do direito - O seu sujeito ativo ou titular do poder de agir é todo e cada um dos seres humanos. No século XVIII, isso era devido à igual natureza de todos os seres humanos. Hoje, com a

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Disciplina: Direitos Humanos

Professor: Eduardo Cabral Moraes Monteiro

Aula 04: Os Direitos Fundamentais e sua evolução – As liberdades públicas

PLANO DE AULA

1) As liberdade públicas

- As liberdades públicas ou direitos individuais constituem o núcleo dos direitos

fundamentais;

- A elas se agregaram os direitos econômicos e sociais e, depois, os direitos de

solidariedade, mas estes outros direitos não renegam essas liberdades, visam antes a

completá-las.

2) Natureza jurídica

- Em termos técnico-jurídicos essas liberdades são direitos subjetivos;

- São poderes de agir reconhecidos e protegidos pela ordem jurídica a todos os seres

humanos e, eventualmente, a entes a eles assimilados;

- São direitos subjetivos oponíveis ao Estado, o que era desconhecido antes de 1789

no Direito Positivo.

3) O titular do direito

- O seu sujeito ativo ou titular do poder de agir é todo e cada um dos seres humanos. No

século XVIII, isso era devido à igual natureza de todos os seres humanos. Hoje, com a

desvinculação jusnaturalista, enfatiza-se a igual dignidade dos seres humanos;

- Inadequação do art. 5º, caput, da CF/88 ao ponto. Aliás, isso é defeito que remonta a

todas as Constituições brasileiras;

- Os direitos do Homem são reconhecidos a todos, brasileiros ou estrangeiros, residentes

ou não no país. Os direitos do cidadão é que podem se restringir aos nacionais e/ou aos

estrangeiros residentes no país (ex: ação popular);

- Podem ser titulares desses direitos entes de toda espécie, desde que compatíveis em sua

natureza com essa situação (ex: direito de propriedade e liberdade de expressão às pessoas

jurídicas).

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4) Sujeito passivo

- O sujeito passivo desses direitos são todos os indivíduos que não o seu titular, a que se

acrescentam todos os entes públicos ou privados, inclusive e especialmente o Estado;

- Em contrapartida desses direitos, o sujeito passivo deve uma abstenção, um não fazer;

- Mas o Estado, de um lado, deve abster-se de perturbar o exercício desses direitos

e, de outro, tem a tarefa de, preventivamente, evitar sejam eles desrespeitados e, também, a

de, repressivamente, restaurá-los se violados, inclusive punindo os responsáveis por esta

violação.

5) O objeto

- É uma conduta: agir ou não agir; fazer ou não fazer; usar ou não usar; ir, vir ou ficar.

6) A origem desses direitos

- São direitos reconhecidos pela ordem jurídica (concepção do jusnaturalismo);

- Não é necessário que estejam expressamente incluídos na declaração formalizada,

para que devam ser respeitados. Sua enumeração não é taxativa, mas sim exemplificativa;

- Art. 5º, § 2º, da CF de 1988: o reconhecimento de direitos implícitos;

- Para os autores não vinculados ao jusnaturalismo (ex: Jellinek), os referidos direitos são

direitos subjetivos públicos, conferidos pelas normas de Direito Público.

7) O fundamento dos direitos humanos

- Para os adeptos do Direito Natural, o fundamento de tais direitos é a natureza humana;

- Para os contrários ao jusnaturalismo, a questão se apresenta como um problema

importante a ser resolvido. Posicionamentos:

- Para uns, esses direitos baseiam-se numa experiência comum às sociedades

contemporâneas. O que é equivocado, porque, por um lado, nem todas elas creem em

direitos fundamentais e, por outro, a prática é antes a negação do que a afirmação desses

direitos;

- Para outros, como os redatores da Declaração Universal de 1948, eles constituem

“um ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações”. O que vem refletir uma

visão otimista do progresso e da história como marcha em sentido determinado;

- E há aqueles que invocam a civilização, ou os povos cultos, como modelo.

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8) A proteção dos direitos

- Esses direitos-liberdades, graças ao reconhecimento, ganham proteção. São garantidos

pela ordem jurídica, pelo Estado. Assim, gozam de coercibilidade estatal;

- O próprio Estado contemporâneo nasce de uma filosofia política que o justifica

exatamente pela necessidade de dar proteção aos direitos fundamentais (art. 2º da

Declaração de 1789);

- Mais ainda, o constitucionalismo exige que o Estado se organize em função dessa

finalidade (noção de Constituição do art. 16 da Declaração de 1789). É exigida da

Constituição a garantia dos direitos fundamentais.

9) Os vários sentidos de “garantia”

- Acepção amplíssima: garantia-sistema; acepção ampla: garantia institucional; acepção

restrita: garantia-defesa; e acepção restritíssima: garantia instrumental;

- Num sentido amplíssimo, seguindo Rui Barbosa, pode-se dizer que garantias

constitucionais são “as providências que, na Constituição, se destinam a manter os poderes

no jogo harmônico das funções, no exercício contrabalançado das suas prerrogativas, ou

seja, no mesmo sentido em que os ingleses falam em freios e contrapesos da Constituição”.

São, pois, a garantia que decorre do próprio sistema constitucional: garantia-sistema;

- Num sentido amplo, garantias são a estrutura organizada que se volta para a defesa de

direitos. É o caso, no Brasil, do mecanismo judicial (art. 5º, XXXV, da CF), na França, do

contencioso administrativo e etc. Essa garantia é confiada a instituições determinadas:

garantia institucional;

- Em sentido restrito, são garantias as defesas especiais relativamente a determinados

direitos, e constituem proibições que visam a prevenir a violação a direito (exs: proibição

da censura, para proteger a liberdade de expressão do pensamento e da comunicação; da

proibição da prisão, salvo flagrante delito ou ordem de autoridade, para proteger a

liberdade pessoal e de locomoção; da proibição do confisco, para salvaguardar a

propriedade e etc.). São garantias-defesa ou garantias-limite, porque são limites à ação do

poder;

- Em sentido restritíssimo, garantias são os instrumentos (daí garantias instrumentais) ou

meios para defender direitos específicos, provocando a atuação das instituições previstas

para sua proteção (a estrutura de garantia institucional);

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- Servem, assim, para invocar a garantia institucional, em prol das garantias-limite,

constituindo instrumento para a proteção dos direitos fundamentais;

- No Brasil, em face da garantia institucional judiciária, elas são os chamados

remédios, ações especiais constitucionalmente previstas (remédios constitucionais), (exs:

habeas corpus, mandado de segurança, habeas data). Delas se aproximam a ação popular e

as ações pelas quais se efetiva o controle de constitucionalidade.

10) Garantias como direitos fundamentais

- As garantias, sobretudo, em sentido restrito e em sentido restritíssimo, são elas próprias

direitos fundamentais, pois, com efeito, incluem-se no direito à segurança (caput do art. 5º

da CF). Assim, a proteção aos direitos fundamentais compreende-se no direito fundamental

à segurança;

- Logo, direito fundamental às garantias;

- Tal direito às garantias não é um “direito natural”. Pois, presume vida social e

organização política (Estado). Para Hobbes e Locke, a obtenção dessa proteção é a própria

razão de ser da sociedade e principalmente do Estado, para a preservação dos direitos

fundamentais.

11) A disciplina das liberdades

- É reservada à lei a disciplina das liberdades. E, sobretudo, deve ser reservada à lei a

definição das sanções que hão de punir os abusos no exercício dos direitos;

- Lei formal, editada pelo Poder Legislativo;

- É da história que o Estado, especificamente o Executivo, seja o “inimigo das liberdades”.

Logo, absurdo seria dar a ele o poder de instituir delitos e o de disciplinar direitos

reconhecidos, por assim dizer, contra ele, por intermédio de regulamento;

- A difusão contemporânea da “legiferação pelo Executivo”, com a proliferação de

atos do Executivo com força de lei (decretos-lei, medidas provisórias, leis delegadas etc.),

coloca em grave contestação esse princípio da reserva de lei. Porque, tendo tais atos

vigência imediata, seus efeitos se sentem muito antes da aprovação ou desaprovação pelo

Legislativo;

- Por isso, deve-se entender que, no tocante às liberdades públicas, somente

cabe a lei formal, jamais o ato com força de lei. A esse respeito, consta proibição expressa

da CF de 1988, para as leis delegadas (art. 68, § 1º, II).

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12) O regime repressivo

- É o regime “normal” das liberdades públicas (exs: liberdade de locomoção, de expressão

do pensamento etc.);

- Caracteriza-se por deixar ao titular o direito livre e incondicionado para exercê-lo, dentro

dos limites da Constituição ou da lei. Sujeita-se a sanções, todavia, pelas violações a esses

limites, e mesmo pelos abusos que cometer;

- Regime favorável ao titular do direito, que pode exercitá-lo sem delongas, sem

adstrição a formalidades, bem como tem a certeza de que (ou deveria ter essa certeza),

respeitados os limites previstos, não corre risco na sua segurança;

- As sanções em que pode incidir somente podem estar previstas na lei, adotada pelo

Legislativo, definindo infrações, crimes e delitos de modo não retroativo (Declaração de

1789, art. 8º; CF de 1988, art. 5º, XXXIX e XL). O que acresce à segurança;

- A aplicação de tais sanções é feita pelo Judiciário, pelo Juiz Natural, por um

processo contencioso, assegurados o contraditório e a ampla defesa, e etc. Ou seja,

mediante o due process of law (CF de 1988, art. 5º, LIV, LV e outros incisos). De novo um

fator de segurança.

13) O regime preventivo

- Não é o mais adequado às liberdades públicas, embora seja, às vezes, o único que possa

evitar graves problemas ou colisões. De qualquer modo, ele é o melhor meio de conciliar o

exercício de um mesmo direito por diferentes pessoas ou grupos;

- Consiste em condicionar o exercício de um direito a uma manifestação da autoridade, ou,

pelo menos, a uma comunicação à autoridade (forma atenuada) (exs: liberdade de exercício

de certas profissões e, de modo atenuado, a liberdade de reunião; CF de 1988, art. 5º, XIII

e XVI);

- O sistema preventivo enseja a possibilidade de proibição do exercício do direito, ou a sua

procrastinação. Contra isso, num Estado de Direito, há o recurso ao contencioso

administrativo, ou judiciário. Contudo, o provimento desse recurso nem sempre repara

adequadamente o adiamento no exercício do direito;

- A proibição do exercício do direito não pode ser arbitrária, pois, ela há de resultar

da ausência de condições legais, ou infração a outras normas constitucionais que no caso

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prevaleçam (ex: manutenção da ordem pública e duas passeatas de partidos hostis pelas

mesmas rua e hora).

14) O regime especial das liberdades

- As liberdades públicas, todavia, podem ficar sujeitas a um regime excepcional, em

situações de grave crise, ou ameaça, como guerra ou desordens internas;

- Nessas situações de “emergência” ficam elas sujeitas a regime extraordinário. Este

varia de Estado para Estado, preferindo uns o sistema rígido de estado de sítio, outros, o

flexível, como a lei marcial, não faltando formulações mistas;

- O sistema de estado de sítio importa na suspensão de garantias

constitucionais. Assim, durante a situação excepcional, não subsistem as garantias

constitucionais em sentido estrito, salvo a institucional. Não prevalecem garantias-limite

(ex: proibição de censura) nem garantias-instrumento (ex: habeas corpus), o que restringe

e eventualmente anula na prática o recurso ao contencioso, portanto, a proteção ao direito;

- Sua decretação institui não o arbítrio, mas uma legalidade

excepcional, e transitória, sob a qual a autoridade tem amplos poderes para proibir o

exercício de liberdades, ou ao menos restringi-lo quanto lhe parecer adequado;

- Os sistemas flexíveis não preordenam a conduta da autoridade, assim não

instituem uma legalidade excepcional (ex: lei marcial que adota a Grã-Bretanha). Esta lei

marcial permite que a autoridade, para prevenir a situação anormal, ou para restabelecer a

normalidade, faça o que lhe parecer correto;

- Seus atos, porém, a menos que haja um bill of indemnity ou uma lei

de anistia, votada pelo Parlamento, estão sujeitos a exame pelo Judiciário. Este poderá

aceitar sua necessidade, o que exclui a criminalidade do ato eventualmente praticado, ou,

ao invés, aplicar a sanção ao responsável.