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 C O G N I T I V I S M O (Prof. Timoteo Madaleno Vieira) Aula 1: Revisão Breve de Aspectos Históricos do Cognitivismo Introdução: KASPAROV E O MONSTRO Garry Kasparov não era apenas mais um grande jogador de xadrez: ele era o mestre de todos os grão-mestres, o maior jogador da história. No auge do seu  prolongado reconhecimento, na primavera de 1997, com 34 anos, vinha mantendo o título mundial por 12 anos, sem jamais perder uma partida sequer nas competições de que participara. Em maio de 1997, o gênio estava em Nova York para enfrentar novamente um oponente que vencera há um ano. Estava tranqüilo, seguro de que não havia adversário páreo para ele. No entanto, quando a partida se iniciou, os especialistas de xadrez do mundo todo, a ssistindo a partida através da transmissão em cadeia mundial do evento (pela televisão e pela Internet), começaram a testemunhar algo inesperado. O grande Kasparov começou a apresentar sinais incomuns de  perturbação. Primeiro mostrou dúvida diante de algumas jogadas, depois terror, desespero e perda de controle. Por fim, mostrou-se à beira do colapso emocional. No passado, Kasparov demonstrara muita facilidade em explorar a fraqueza do oponente, aprendendo o padrão de pensamento adotado contra ele. Mas, dessa vez, não conseguiu utilizar essa estratégia. A partida terminou empatada, para o espanto geral. Em seguida veio outro empate, a primeira derrota, e quando chegaram ao confronto do sábado a série estava empatada. Era o impensável, na opinião de todos os especialistas do mundo. No início do confronto de sábado, Kasparov estava se dando muito bem, consciente de que estava vencendo, quando o seu oponente desfechou contra ele uma seqüência brutal de movimentos, abalando-o claramente. A  partida novamente terminou em empate. Di ante da seqüência empata da, f oi marcado mais um confronto, para a segunda-feira. Quando se sentou diante do seu oponente o ar confiante e a arrogância típica de Kasparov havia dado lugar a um jogador com movimentos nervosos, olheiras e ar sombrio. Antes de começar a jogar, ele já parecia derrotado. Ao longo da partida, o aspecto do gênio foi se deteriorando ainda mais, diante dos movimentos incontestavelmente superiores de seu oponente. Diante das câmeras e do mundo todo, Kasparov abaixou a cabeça, colocou o rosto nas mãos e depois se levantou e desistiu da partida, tendo feito apenas 19 movimentos. Na tumultuada entrevista coletiva, alguns minutos depois, quando perguntado sobre o motivo do que acontecera, Kasparov respondeu: “Sou um ser humano. Quando vejo algo além da minha ca pacidade de compreensão, sinto medo”. (Schultz & Schultz, 2005)

Aula 1 - Cognitivismo

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  • C O G N I T I V I S M O

    (Prof. Timoteo Madaleno Vieira)

    Aula 1: Reviso Breve de Aspectos Histricos do Cognitivismo

    Introduo: KASPAROV E O MONSTRO

    Garry Kasparov no era apenas mais um grande jogador de xadrez: ele era o mestre de todos os gro-mestres, o maior jogador da histria. No auge do seu prolongado reconhecimento, na primavera de 1997, com 34 anos, vinha mantendo o ttulo mundial por 12 anos, sem jamais perder uma partida sequer nas competies de que participara. Em maio de 1997, o gnio estava em Nova York para enfrentar novamente um oponente que vencera h um ano. Estava tranqilo, seguro de que no havia adversrio preo para ele. No entanto, quando a partida se iniciou, os especialistas de xadrez do mundo todo, assistindo a partida atravs da transmisso em cadeia mundial do evento (pela televiso e pela Internet), comearam a testemunhar algo inesperado. O grande Kasparov comeou a apresentar sinais incomuns de perturbao. Primeiro mostrou dvida diante de algumas jogadas, depois terror, desespero e perda de controle. Por fim, mostrou-se beira do colapso emocional.

    No passado, Kasparov demonstrara muita facilidade em explorar a fraqueza do oponente, aprendendo o padro de pensamento adotado contra ele. Mas, dessa vez, no conseguiu utilizar essa estratgia. A partida terminou empatada, para o espanto geral.

    Em seguida veio outro empate, a primeira derrota, e quando chegaram ao confronto do sbado a srie estava empatada. Era o impensvel, na opinio de todos os especialistas do mundo. No incio do confronto de sbado, Kasparov estava se dando muito bem, consciente de que estava vencendo, quando o seu oponente desfechou contra ele uma seqncia brutal de movimentos, abalando-o claramente. A partida novamente terminou em empate. Diante da seqncia empatada, foi marcado mais um confronto, para a segunda-feira.

    Quando se sentou diante do seu oponente o ar confiante e a arrogncia tpica de Kasparov havia dado lugar a um jogador com movimentos nervosos, olheiras e ar sombrio. Antes de comear a jogar, ele j parecia derrotado. Ao longo da partida, o aspecto do gnio foi se deteriorando ainda mais, diante dos movimentos incontestavelmente superiores de seu oponente. Diante das cmeras e do mundo todo, Kasparov abaixou a cabea, colocou o rosto nas mos e depois se levantou e desistiu da partida, tendo feito apenas 19 movimentos.

    Na tumultuada entrevista coletiva, alguns minutos depois, quando perguntado sobre o motivo do que acontecera, Kasparov respondeu: Sou um ser humano. Quando vejo algo alm da minha capacidade de compreenso, sinto medo.

    (Schultz & Schultz, 2005)

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    O oponente enfrentado por Garry Kasparov era um computador fabricado pela IBM, chamado Deep Blue. Pesava cerca de 2 toneladas, e cada uma das suas duas torres media mais de 1,80 m de altura. Tinha uma capacidade de processamento de 200 milhes de posies por segundo; em trs minutos conseguia processar 50 bilhes de movimentos.

    CONTUDO, PODE-SE DIZER QUE O DEEP BLUE, AO JOGAR COM KASPAROV, ESTAVA PENSANDO? Do que estamos falando quando nos referimos ao COGNITIVISMO?

    De um esforo contemporneo, com fundamentao emprica, para responder questes epistemolgicas de longa data principalmente aquelas relativas natureza do conhecimento, seus componentes, suas origens, seu desenvolvimento e seu emprego (Gardner, 2003).

    A afirmao de Gardner (2003) mostra o interesse das Cincias Cognitivas em estudar como se d a apreenso do mundo e as transformaes perceptivas que ocorrem no universo subjetivo do sujeito. Processos como memria, pensamento, inteligncia, resoluo de problemas e conscincia, so alguns dos objetos de estudo dos cientistas cognitivos.

    O COGNITIVISMO NO SE LIMITA A PRODUZIR CONHECIMENTO NO CAMPO DA PSICOLOGIA, MAS RENE ESFOROS CIENTFICOS DE VRIAS REAS DISTINTAS, TAIS COMO: ANTROPOLOGIA, SOCIOLOGIA, PSICOLOGIA, INTELIGNCIA ARTIFICIAL, INFORMTICA, MATEMTICA, NEUROCINCIAS, ETC.

    Essa uma das questes presentes nos estudos dos cognitivistas: possvel construir mquinas que pensam?

    O cognitivismo marcado pelo reconhecimento da subjetividade e pela recuperao da conscincia como

    objeto de estudo.

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    OS CIENTISTAS DESSAS REAS TM COMO INTERESSE COMUM O ESTUDO DA MENTE, TANTO EM SEUS ASPECTOS ESTRUTURAIS COMO EM SUA FUNO.

    RAZES HISTRICAS E FILOSFICAS DO COGNITIVISMO:

    Para se compreender o momento atual da psicologia e de tudo que

    nela ocorre, importante levar em considerao a evoluo histrica que a precedeu. Apesar de que comumente se considera o nascimento da psicologia como cincia no final do sculo XIX sabe-se que muitos dos problemas que hoje se procura responder j estavam presentes desde muito antes de que esta fosse considerada uma disciplina cientfica formal. Falando-se especificamente das Cincias Cognitivas, objetos de interesse dos cientistas cognitivos j eram abordados por filsofos como Plato e Aristteles, que mencionavam os processos de pensamento e procuravam produzir explicaes acerca dos mesmos.

    Os associacionistas e os empiristas britnicos tambm se interessaram pelo tema e produziram estudos a respeito. Contudo, o cientista considerado fundador da psicologia, Wundt, considerado por muitos como o precursor da psicologia cognitiva (Scultz & Schultz, 2003). Wundt concentrou o seu trabalho no estudo da conscincia, dando nfase atividade criativa da mente.

    Depois de Wundt, as escolas de pensamento estruturalista e funcionalista abordavam a conscincia, estudando os seus elementos e suas funes

    A INFLUNCIA DE DESCARTES O cognitivismo apresenta dois traos de forte conexo com a psicologia

    cartesiana: o postulado de um locus interno de controle e a descorporificao do pensamento.

    A proposta de simulao de processos cognitivos em programas

    de computador ilustra muito bem uma forma de descorporificao do pensamento na cincia cognitiva.

    A idia fundamental na simulao de que o programa de computador usado na simulao manipula smbolos, como o caso da pessoa que est solucionando problemas. As capacidades do programa so suficientemente gerais para ler smbolos ou padres apresentados por imputs apropriados, estocar smbolos na memria, copiar smbolos de uma localizao na memria para outra, apagar smbolos, comparar smbolos por identidade, detectar diferenas especficas entre padres, e comportar-se de uma maneira condicional aos resultados dos processos (Newell & Simon, 1961). A teoria do processamento de informao admite que tais processos esto presentes na

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    atividade de uma pessoa que soluciona um problema. nesse nvel, da organizao da manipulao de smbolos, que se encontra a comparao feita pela teoria do processamento de informao entre os processos cognitivos humanos e os programas de simulao.Postula-se que o programa de computador um sistema de manipulao e produo de smbolos, assim como os processos que se passam dentro da cabea de uma pessoa submetida a um problema de recodificao. H uma conexo tambm entre a idia cartesiana de que no pensamento que se deve atuar para produzir o ajustamento do sujeito ao mundo, e a Terapia Cognitiva de Aaron T. Beck. Descartes fala da identificao de hbitos, comportamentos, reaes que so disfuncionais, e, em seguida apresenta um mtodo para modificar os processos cognitivos e os comportamentos disfuncionais da pessoa. Para Descartes, como para a terapia cognitiva de Aaron T. Beck, no a programao de contingncias e a exposio s mesmas o mtodo fundamental para modificao do hbito disfuncional, mas sim a avaliao e modificao do sistema de representaes do sujeito. Assim, Descartes e a Terapia Cognitiva compartilham a idia de que a sade e a doena dependem da forma como interpretamos a vida (sistema de crenas).

    A INFLUNCIA DE WUNDT

    A aceitao das experincias conscientes fez os psiclogos cognitivos reconsiderarem a primeira abordagem de pesquisa da psicologia cientfica, o mtodo introspectivo introduzido por Wundt h mais de um sculo. Foram realizadas tentativas de quantificao que permitissem anlises estatsticas mais objetivas e manipulveis. Contudo, logo se comeou a questionar se o indivduo seria realmente capaz de acessar os prprios processos mentais, principalmente os que envolvem tomadas de deciso e julgamentos. Em seguida alguns dados mostraram que isso no possvel, convencendo vrios cientistas a esse respeito. Contudo, essa uma questo que carece de uma soluo, o que crucial para o futuro das cincias cognitivas, em especial no mbito da psicologia cognitiva.

    A INFLUNCIA DE PIAGET

    O suo Jean Piaget foi um importante precursor do cognitivismo. Participou com Alfred Binet e Thodore Simon nos estudos envolvendo aplicao de testes para medio de habilidade mental em crianas. Posteriormente se tornaria importante por seu trabalho sobre o desenvolvimento infantil no com base nos estgios psicossexuais, conforme propunha Freud, mas em funo dos estgios cognitivos. O enfoque do seu trabalho na criana ajudou a ampliar o campo de aplicao da psicologia cognitiva.

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    A COGNIO INCONSCIENTE Os cognitivistas tambm se interessaram pelas atividades cognitivas inconscientes. Contudo, essa no mente inconsciente de que falava Freud, transbordando as lembranas e os desejos reprimidos trazidos ao consciente somente por meio na psicanlise. Esse novo inconsciente mais racional que emocional e est envolvido no primeiro estgio da cognio de resposta a um estmulo. No se trata nem do inconsciente da psicanlise nem dos estados fsicos de inconscincia (como a sonolncia, por exemplo). Os cognitivistas afirmam que o indivduo pode ser influenciado por estmulos que no v ou no ouve (conscientemente). Para isso so feitos estudos que investigam a percepo subliminar (ou ativao subliminar), na qual estmulos so apresentados abaixo do nvel de conscincia do indivduo. Apesar da incapacidade do indivduo de perceb-los, a estimulao ativa o processo consciente e comportamento da pessoa.

    DIFERENAS EM RELAO AO BEHAVIORISMO

    Os cognitivistas dedicam-se a estudar o processo de aquisio do conhecimento e no apenas a mera resposta ao estmulo ou a forma como as conseqncias modelam ou mantm um comportamento. Os principais fatores so os fatos e os processos mentais e no as contingncias.

    Apesar de que os cognitivistas tambm se interessam pelo comportamento, mas esse no o nico enfoque de pesquisa.

    Os cognitivistas esto interessados em saber como a mente estrutura ou organiza as experincias - influncia da Gestalt, que ressaltavam, assim como Piaget, uma tendncia inata da mente de organizar a experincia consciente (as sensaes e as percepes) em unidades e padres de significado. A mente d forma e coerncia experincia mental.

    A NFASE DADA MENTE E NO AO COMPORTAMENTO

    O QUE FOI COMBATIDO PELO BEHAVIORISMO SKINNERIANO

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    Os cognitivistas acreditam na atuao ativa e criativa do indivduo em organizar estmulos recebidos do ambiente. Assim, o indivduo participa da aquisio e aplicao do conhecimento, participando intencionalmente de alguns fatos e optando por associ-los memria. Isto , a aquisio do conhecimento no depende apenas das contingncias, mas tambm da atuao do organismo que est exposto a elas.

    A MAIOR PARTE DOS BEHAVIORISTAS POSICIONAM-SE CONTRRIOS AO MOVIMENTO COGNITIVO.