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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    NCLEO DE PS-GRADUAO

    EM

    DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL

    PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    CONSTRUINDO COM A NATUREZA

    BAMBU:

    UMA ALTERNATIVA DE ECODESENVOLVIMENTO

    Autor: Antnio Ricardo Sampaio Nunes

    Orientador: Dra. Maria Augusta Mundim Vargas

    Outubro de 2005

    So Cristvo Sergipe

    Brasil

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    NCLEO DE PS-GRADUAO

    EM

    DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL

    PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    CONSTRUINDO COM A NATUREZA

    BAMBU:

    UMA ALTERNATIVA DE ECODESENVOLVIMENTO

    Dissertao de Mestrado apresentada ao Ncleo de Ps-Graduao

    em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de

    Sergipe, como parte dos requisitos exigidos para a obteno dottulo de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.

    Autor: Antnio Ricardo Sampaio Nunes

    Orientador: Dr. Maria Augusta Mundim Vargas

    Outubro de 2005

    So Cristvo Sergipe

    Brasil

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    Nunes, Antonio Ricardo Sampaio

    N972c Construindo com a natureza bambu : uma alternativa de ecodesenvolvimento

    / Antonio Ricardo Sampaio Nunes. So Cristvo, 2005.131p. : il.

    Dissertao (Mestrado em Desenvolvimento e MeioAmbiente) Ncleo de Ps-Graduao em Desenvolvimentoe Meio Ambiente, Programa Regional de Desenvolvimento

    e Meio Ambiente, Pr-Reitoria de Ps-Graduao e Pesquisa,Universidade Federal de Sergipe.

    1. Ecodesenvolvimento. 2. Desenvolvimento sustentvel.3. Arquitetura. 4. Material de construo Bambu. I. Ttulo.

    CDU 504.062.4:72:691.12

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    NCLEO DE PS-GRADUAO

    EM

    DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL

    PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    CONSTRUINDO COM A NATUREZABAMBU:

    UMA ALTERNATIVA DE ECODESENVOLVIMENTO

    Dissertao de Mestrado defendida por Nome do(a) Aluno(a) e aprovada em dia de msde

    ano pela banca examinadora constituda pelos doutores:

    ________________________________________________

    Nome do(a) Orientador(a) Orientador(a)

    Instituio

    ________________________________________________

    Nome do(a) Examinador(a)

    Instituio

    ________________________________________________

    Nome do(a) Examinador(a)

    Instituio

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    Este exemplar corresponde verso final da Dissertao de Mestrado em Desenvolvimento

    e Meio Ambiente.

    ________________________________________________

    Dra. Maria Augusta Mundim Vargas Orientadora

    Universidade Federal de Sergipe

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    concedida aoNcleo responsvel pelo Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente

    da Universidade Federal de Sergipe permisso para disponibilizar, reproduzir cpias desta

    dissertao e emprestar ou vender tais cpias.

    ________________________________________________

    Antnio Ricardo Sampaio Nunes Autor

    Universidade Federal de Sergipe

    ________________________________________________

    Dr. Maria Augusta Mundim Vargas

    Orientadora

    Universidade Federal de Sergipe

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    vii

    DDeeddiiccooeesstteettrraabbaallhhooaaoossmmeeuussffiillhhooss,,

    TTaalleess,,TTaaiinneeSSaammiirraa,,

    ppoorrccrreerrqquueeeelleessssooeesseerroo

    aaccoonnttiinnuuiiddaaddee

    ddaammiinnhhaaeessppeerraannaa

    eemmuummmmuunnddoommeellhhoorr..

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    AGRADECIMENTOS

    Diversas pessoas, direta ou indiretamente, mas sempre de maneira especial e generosa,

    participaram da construo deste trabalho e a estas eu quero prestar aqui a minha

    reverncia e meu agradecimento, pois sem elas este mestrado e esta dissertao no teriam

    sido possveis.

    Aos autores, Enrique Leff, Oscar Idalgo, Jorge Morn, Ignacy Sachs e Carlos Walter

    Gonalves,que, pessoalmente ou atravs de suas obras, tanto me ajudaram a construir o

    meu pensamento e minha compreenso das questes ambientais do mundo, para que

    pudesse transcrev-lo neste trabalho.

    A minha orientadora, professora Dr. Maria Augusta Mundim Vargas - que, por sua

    simpatia e carisma, todos a conhecem por Guta - pela maestria e dedicao com que

    conduziu a orientao desta dissertao.

    A minha mulher, Susana Andery, que proporcionou com muito carinho o suporte

    emocional e material necessrios para o meu trabalho, pela compreenso da minha

    ausncia nos muitos dias e noites de trabalho, pela dedicao, acolhimento, generosidadee

    palavras de estmulo, sem as quais eu no teria construdo esta pesquisa.

    Ao professor Dr. Sandro Holanda, que no momento mais crtico deste mestrado, com

    poucas, mas decisivas palavras, me fez retomar o rumo da sua concluso.

    Ao ambientalista, bilogo e professor Antnio Carlos Barretoque me ajudou a dar os

    primeiros passos deste projeto quando ainda era uma idia, tantas sugestes preciosas fez

    para enriquec-la e faz-la se transformar neste trabalho concludo.

    A amiga Denise Rocha pela reviso cuidadosa e precisa, generosamente doada como

    colaborao preciosa a este texto.

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    Aos professores do NESA, em especial a Dr. Rosimeri de Melo e Souzae Dr. Roberto

    Rodrigues, pelo estmulo e ateno que sempre dispensaram para mim e para este projeto.

    A rapaziada da construo, em Carmpolis, Heleno, Anderson, Paulo Srgio, Jos

    Carlos, Nelson e Elenilson,os verdadeiros construtores da nossa obra. Atravs de suas

    inteligncias, dos seus conhecimentos, de suas mo habilidosas de carpinteiros, da

    dedicao, fidelidade e parceria irrestrita, possibilitaram os resultados obtidos por esta

    pesquisa.

    A Ismael Trindade Neto, ambientalista da Petrobrs, grande colaborar na idia de

    construirmos o CEAF usando o bambu, e que, com sua serenidade de esprito, muito

    ajudou a percorrer os labirnticos caminhos institucionais desta pesquisa junto a Petrobrs.

    A Celina Lerena,arquiteta e amiga que muito me ensinou sobre a arte de trabalhar com o

    bambu, os mistrios e segredos desta planta to generosa quanto ela.

    Aos colegas de turma do mestrado no NESA, pelo compartilhamento de idias, solues

    das nossas questes acadmicas, estmulos e amizade.

    Aos elementais que habitam os bambuzais e que tm me guiado por estas novas veredas

    me indicando o rumo, por vezes no muito claros, dos caminhos para a disseminao da

    cultura do bambu.

    A todos vocs, a minha mais profunda gratido.

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    RESUMO

    Este trabalho teve como objetivo investigar as possibilidades de aplicao do bambu como

    um material de construo em Sergipe, analisando-se os aspectos decorrentes do processo

    de uso, quais sejam: eficincia econmica, propriedades fsicas e mecnicas do material,

    desempenho da mo de obra local, nveis de aceitao do material pela populao usuria,

    desempenho esttico do bambu na arquitetura e suas possibilidades de

    ecodesenvolvimento. O mtodo empregado para esta investigao foi o da pesquisa-ao

    que utilizou uma ao coletiva planejada de carter tcnico, social e cultural, orientada em

    funo da resoluo de problemas conceituais e tcnicos operacionais, levantados nas

    questes de pesquisa. A ao escolhida para se proceder a investigao que levaria a

    responder tais questes foi a construo de uma edificao cujo material aplicado seria

    prioritariamente o bambu. O local escolhido para construo foi o Horto do Diogo, situado

    na fazenda Oiteirinhos de propriedade da Petrobrs, no municpio de Carmpolis, estado

    de Sergipe, Brasil. Foi sob a perspectiva do ecodesenvolvimento que propomos investigar

    o uso do bambu como uma alternativa para o desenvolvimento com sustentabilidade

    ambiental contextualizando-o num processo tecnolgico, social, econmico e cultural. O

    ecodesenvolvimento o fundamento para o entendimento da ecotcnica como uma

    estratgia para superar as barreiras impostas pela economia de mercado dominante. Para oseu sucesso toma-se fundamental o desenvolvimento de tecnologias apropriadas que

    absorvam o melhor da diversidade tanto humana como natural de cada ecossistema (local

    ou regional) de forma particular. O bambu se revela como uma planta e um material de

    grandes potencialidades, sendo comprovadas nesta pesquisa, as suas propriedades fsicas e

    mecnicas que o qualifica como um material de fcil uso por populaes rurais ou

    perifricas de pequenas cidades, se afirmando como uma alternativa de desenvolvimento

    comunitrio sustentvel e ecodesenvolvimento.

    Palavras-chave: Ecodesenvolvimento, Arquitetura com bambu, Desenvolvimento

    sustentvel.

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    ABSTRACT

    This work aims at investigating the application of the bamboo as a construction material in

    the State of Sergipe, Brazil, through the analysis of the aspects deriving from its use

    process, them being: economical efficiency, the materials physical and mechanical

    properties, local workforce output, acceptance level by the local population, a esthetical

    results of the bamboo in architectural applications and its possibilities of ecological

    development. The method employed in this scientific investigation was action-research,

    which made use of a coordinated collective action plan of technical, social and cultural

    character, oriented towards the solving of conceptual, technical and operational problems

    which arose from research matters raised throughout this project. The action selected so as

    to proceed in an investigation which could lead to solving such questions was the

    construction of a house in which the bamboo was a priority as a material employed. The

    designated sight for the construction was the Horto do Diogo, located on the Oiterinhos

    farm, a Petrobras property, in the city of Carmpolis, state of Sergipe, Brazil. Under the

    perspective of ecological development, it is the projects objective to investigate the use of

    the bamboo as an alternative in environmentally sustainable development contextualized in

    a technological, social, economic and cultural process. The ecological development is a

    strategy used in order to overcome the barriers imposed by a dominating market economy.

    For it to be fully successful, the development of proper technologies which can make the

    most of both bio and human diversity of each ecosystem particularly (whether local or

    regional) is essential. The bamboo has proven to be a plant and a material of enormous

    potentialities, presenting physical and mechanical properties (proved herewith) which

    qualify it as a widely accessible and easily usable material by either rural or peripheral

    urban populations of small cities, thereby being regarded as an alternative in sustainable

    community development as well as ecological development.

    Key-words: Ecodevelopment, Arquitetcture with bamboo, Sustainable development.

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    SUMRIO

    LISTA DE FOTOGRAFIAS...............................................................................................xvi

    LISTA DE FIGURAS.......................................................................................................xviii

    LISTA DE QUADROS............ ...........................................................................................xix

    CAPTULO 1INTRODUO........................................................................................1

    PRIMEIRA PARTE - FUNDAMENTAO TERICA 4

    CAPTULO 2 DESENVOLVIMENTO, CULTURA E MEIO AMBIENTE NA

    RELAO SOCIEDADENATUREZA.............. .......... .................................................5

    2.1 - A Crise Civilizatria e a Questo Ambiental...........................................................6

    2.2 - Desenvolvimento e a Relao Homem Natureza...................................................14

    2.3 - Saber Tecno lgico, Etnoconhecimento e Ecodesenvolvimento ............20

    CAPTULO 3 - O BAMBU........................................................................25 3.1 USOS E POSSIBILIDADES....................................... ................26

    3.1.1.O bambu em diversas culturas........................................................26

    3.1.2. Polticas habitacionais e o uso do bambu.............................................................32

    3.2. A PLANTA.........................................................................................38

    3.2.1.Rizoma.........................................................................................43

    3.2.3. Cultivo..................................................................................................................45

    3.3 OS COLMOS.....................................................................................48

    3.3.1.Caractersticas fsicas e mecnicas dos colmos.....................................................503.3.2.Colheita dos colmos...............................................................................................52

    3.4 - TRATAMENTOS NATURAIS................ ...................................................................54

    3.5 - TRATAMENTOS QUMICOS...................................................................................56

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    SEGUNDA PARTE - METODOLOGIA 60

    CAPTULO 4 - MTODOS E PROCESSOS............ ........... ...........................................61

    4.1. Mtodo aplicado......................................................................................................63

    4.2. Objeto da pesquisa...................................................................................................65

    4.3. Definio das tecnologias, das espciese dos materiais utilizados.........................68

    4.4. Cenrio da pesquisa......................... ........................................................................69

    4.5. Atores sociais...........................................................................................................70

    4.6. Instrumentos............................................................................................................73

    TERCEIRA PARTERESULTADOS E CONCLUSES 76

    CAPTULO 5DESENVOLVIMENTO E RESULTADOS.............. ........... ................77

    5.1. Aquisio do bambu................................................................................................78

    5.2. Confeco das esteiras.............................................................................................80

    5.3. Construo das fundaes........................................................................................81

    5.4. Tratamento dos colmos............................................................................................82

    5.5. Construo da estrutura...........................................................................................85

    5.6. Construo da cobertura..........................................................................................90

    5.7. Fixao dos pilares..................................................................................................935.8. Construodas paredes............................................................................................95

    CAPTULO 6 CONCLUSES E SUGESTES 113

    6.1. CONCLUSES...........................................................................................................114

    6.2. SUGESTES..............................................................................................................116

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS............ .......... .....................................................117

    Bibliografia.........................................................................................................................121

    ANEXOS...........................................................................................................................123

    Anexo 1. Documento do Programa Nacional de Florestas..........................................124

    Anexo 2. MemorialDescritivo para construo do CEAF............................................125

    Anexo 3. Relatrio Dirio de Obra...............................................................................130

    Anexo 4. Boletim do CUB (SINDUSCON 07/2004)...................................................131

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    LISTA DE FOTOGRAFIAS

    Foto 3.1. Tratamento por injeo................................................ .........................................58

    Foto 5.1. Bambuzal em Atibaia............................................................................................79

    Foto 5.2. Bambuzal em Embu-Guau..................................................................................79

    Foto 5.3. Colheita de taquara................................................................................................81

    Foto 5.4. Abertura dos colmos.............................................................................................81

    Foto 5.5. Preparo das esteiras...............................................................................................81

    Foto 5.6. Linha de sapatas.......... ..........................................................................................82

    Foto 5.7. Sapata com pilar....................................................................................................82

    Foto 5.8. Queimador de bambu............................................................................................83

    Foto 5.9. Queimador em uso............................. ...................................................................83

    Foto 5.10.Furo para injeo......................... .........................................................................85

    Foto 5.11. Injetando soluo................................................................. ...............................85

    Foto 5.12. Tcnica de corte..................................................................................................86

    Foto 5.13. Serra copo............................ ...............................................................................86

    Foto 5.14. Corte ortogonal...................................................................................................86

    Foto 5.15. Corte em 45............................................................ ..........................................86

    Foto 5.16. Resultado do 1 ensaio........................................................................................87

    Foto 5.17. Gabarito do prtico................................................... ..........................................88

    Foto 5.18. Fixao do 1 prtico..........................................................................................88

    Foto 5.19. Seqncia de prticos paralelos..........................................................................89

    Foto 5.20. Protegendo o bambu da chuva............................................................................90

    Foto 5.21. Execuo da cobertura........................................................................................91

    Foto 5.22. Pavilho coberto..................................................................................................91

    Foto 5.23. Vista area...........................................................................................................92

    Foto 5.24. Abrindo os diafragmas do bambu.......................................................................93

    Foto 5.25. Fixao dos pilares..............................................................................................93

    Foto 5.26. Cimentando o pilar.... ..........................................................................................94

    Foto 5.27. Acabamento do furo de cimentao....................................................................94

    Foto 5.28. Pilar pronto.........................................................................................................94

    Foto 5.29. Construo do painel de parede..........................................................................96

    Foto 5.30. Fixao das esteiras ao painel.............................................................................97

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    xvi

    Foto 5.31. Imunizando o painel...... ......................................................................................97

    Foto 5.32. Alvenaria de bambu em execuo......................................................................98

    Foto 5.33. Painis prontos....................................................................................................98

    Foto 5.34. Cinta de impermeabilizao...................................... ..........................................99

    Foto 5.35. Regularizando o painel........................................................................................99

    Foto 5.36. Paredes com reboco..........................................................................................100

    Foto 5.37. Paredes prontas.......... .......................................................................................101

    Foto 5.38. Espessura do painel sem reboco........................................................................101

    Foto 5.39. Espessura do painel regularizado......................................................................101

    Foto 5.40. Espessura da parede pronta...............................................................................102

    Foto 5.41. Andaime de bambu...........................................................................................105

    Foto 5.42. Pesquisa aps trs meses..................................................................................106Foto 5.43. Edificao pronta vista lateral........................................................................107

    Foto 5.44. Beiral em acabamento......................... ..............................................................107

    Foto 5.45. Beiral pronto.....................................................................................................107

    Foto 5.46. Vista do salo em construo............................................................................108

    Foto 5.47. Vista do salo pronto.........................................................................................108

    Foto 5.48. Fachada posterior em obra........... .....................................................................108

    Foto 5.49. Fachada posterior pronta...................................................................................108

    Foto 5.50. Fachada principal em obra................................................................................109

    Foto 5.51. Fachada principal pronta...................................................................................109

    Foto 5.52. Detalhe do corrimo.................................................. ........................................110

    Foto 5.53. Detalhe da fachada............................................................................................110

    Foto 5.54. Soldas fachadas............................................................................................110

    Foto 5.55. Alisares e arremates.........................................................................................110

    Foto 5.56. Articulao entre viga e pilar............................................................................111

    Foto 5.57. Interior pronto...................................................................................................111

    Foto 5.58. Grupo participante direto ............................ .....................................................112

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 3.1. Paises signatrios do INBAR.............................................................................35

    Figura 3.2. Disposio do bambu no mundo........................................................................38

    Figura 3.3. Rizoma leptomorfo.................. ..........................................................................44

    Figura 3.4. Rizoma paquimorfo.............. .............................................................................45

    Figura 3.5. Usos do bambu de acordo com sua idade........................ ..................................48

    Figura 3.6. Anatomia de um colmo de bambu........... ..........................................................49

    Figura 3.7.Dinoderus minutus.............................................................................................54

    Figura 3.8. Cura na mata......................................................................................................55

    Figura 3.9. Tratamento pelo fogo.........................................................................................56

    Figura 3.10. Mtodo Boucherie............................................................................................59

    Figura 4.1. Planta baixa do CEAF........................................................................................67

    Figura 4.2. Prtico principal da estrutura.............................................................................67

    Figura 4.3. Localizao da pesquisa.....................................................................................70

    Figura 6.1. Queimador de bambu.........................................................................................84

    Figura 6.2. Parafusos de ligao............................................. ..............................................87

    Figura 6.3. Modelo de ligamento de peas...........................................................................87

    Figura 6.4. Mau corte, bom corte do bambu........................................................................87

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    LISTA DE QUADROS

    Quadro 3.1. Espcies prioritrias.........................................................................................41

    Quadro 3.2. Elementos anatmicos de espcies de bambu..................................................50

    Quadro 3.3. Resistncia mecnica de algumas espcies de bambu......................................51

    Quadro 3.4. Caractersticas fsicas e mecnicas de espcies de bambu...............................52

    Quadro 3.5. Ensaio de resistncia mecnica........................................................................52

    Quadro 3.6. Carboidratos totais por fases da lua..................................................................53

    Quadro 3.7. Soluo imunizante..........................................................................................57

    Quadro 6.1. Soluo imunizante..........................................................................................84

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    CAPTULO 1

    INTRODUO

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    Captulo 1Introduo 2

    INTRODUO

    A humanidade, ao longo da sua histria, tem adotado um comportamento predatrio em

    relao natureza, utilizando os seus recursos basicamente interessada em sua prpria

    sobrevivncia, legando-nos o mundo em que vivemos hoje: catico, desarmnico,

    desequilibrado, e ambientalmente doente. Vivemos em meio a uma crise ambiental gerada

    por um modelo de desenvolvimento adotado pelas sociedades dominantes que, na prtica,

    tem se mostrado predatrio, penoso e injusto.

    Esse modelo de desenvolvimento imposto e assimilado por quase todos os povos, mostra a

    predominncia da razo tecnolgica e da racionalidade econmica, fundamentada no lucro

    e norteada pelo utilitarismo, a competio, a produo e o consumo. Esse processocivilizatrio, pautado por modelos de sociedade incompatveis com a sustentabilidade

    biolgica, social, cultural e econmica, desencadeou tudo isto a que chamamos de crise

    ambiental.

    Acreditando-se que o ecodesenvolvimeto, no s um referencial terico intelectual, mas

    tambm uma estratgia norteadora para impulsionar aes locais, rumo construo da

    sustentabilidade scio-ambiental, econmica e cultural, estruturaram-se sobre este marco

    terico os objetivos prticos que nortearam as aes de pesquisa deste trabalho dentro do

    contexto social em que se deu. Foi sob a perspectiva do ecodesenvolvimeto que se props

    investigar o uso do bambu como uma alternativa para o desenvolvimento com

    sustentabilidade ambiental contextualizando-o num processo tecnolgico, social,

    econmico e cultural.

    Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo investigar as possibilidades de aplicao do

    bambu como um material de construo em Sergipe, analisando-se todos os aspectos

    decorrentes do processo de uso, quais sejam: eficincia econmica, propriedades fsicas e

    mecnicas do material, desempenho da mo de obra local, nveis de aceitao do material

    pela populao usuria e desempenho esttico do bambu na arquitetura, buscando-se ao

    final da pesquisa responder as questes formuladas.

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    Captulo 1Introduo 3

    O mtodo empregado foi o da pesquisa-ao que utilizou uma ao coletiva planejada de

    carter tcnico, social e cultural, orientada em funo da resoluo de problemas

    conceituais e tcnicos operacionais, levantados nas questes de investigaodeste trabalho.

    O desenvolvimento da pesquisa se deu com a construo do Centro de Educao

    Agroflorestal, no municpio de Carmpolis, em Sergipe, onde se utilizou o bambu como

    material de construo predominante. Neste trabalho, o objetivo da pesquisa-ao foi

    principalmente voltado para a produo de conhecimento que no ser til apenas para o

    grupo considerado na investigao local. Trata-se de um conhecimento a ser confrontado

    com outros estudos e suscetvel de parciais generalizaes quanto soluo de questes

    tcnicas, culturais e econmicas.

    Composto por trs partes, busca-se na primeira realizar uma breve contextualizao dascondies histrico-culturais em que se construiu o conceito de desenvolvimento no

    mundo ocidental, conhecendo as razes que nos permitem compreender melhor a

    progressiva devastao das nossas condies de vida e analisando o modo como a nossa

    sociedade construiu o seu conceito de natureza.

    Na Segunda Parte se apresentam os caminhos percorridos para delimitao das questes de

    pesquisa, os mtodos, tcnicas, procedimentos e materiais utilizados na ao proposta,

    definio do cenrio e atores, at a coleta de dados e como foi feita a anlise dos mesmos.

    A Terceira Parte apresenta o desenvolvimento e resultados obtidos, atravs dos quais

    procura-se responder as questes investigadas, chegando-se s concluses que

    demonstram a existncia de uma alternativa de ecodesenvolvimento centrado no uso e na

    disseminao da cultura do bambu, que podem representar uma ao transformadora para

    comunidades rurais e perifricas de pequenas cidades em Sergipe.

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    PRIMEIRA PARTE

    FUNDAMENTAO TERICA

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    CAPTULO 2

    DESENVOLVIMENTO, CULTURA E MEIO

    AMBIENTE NA RELAO SOCIEDADE-NATUREZA

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 6

    2. DESENVOLVIMENTO, CULTURA E MEIO AMBIENTE NARELAO SOCIEDADE- NATUREZA

    2.1. CRISE CIVILIZATRIA E A QUESTO AMBIENTAL

    Neste captulo busca-se realizar uma breve contextualizao das condies histrico-

    culturais em que se construiu o conceito de desenvolvimento no mundo ocidental,

    conhecendo as razes que nos permitem compreender melhor a progressiva devastao das

    nossas condies de vida e analisando o modo como a nossa sociedade construiu o seu

    conceito de natureza, caracterizado por uma espcie de deslocamento do homem, no

    processo de desenvolvimento e declnio do pensamento ocidental, em que nos deparamos

    com uma sociedade industrial ignorante das implicaes metafsicas de seus prpriosfundamentos.

    A humanidade, durante a sua trajetria histrica, estabeleceu a ocupao e o uso espacial

    da terra, utilizando os recursos naturais renovveis e no-renovveis, basicamente

    interessada na sua prpria sobrevivncia. Ao longo dos tempos, passou a adotar um

    comportamento predatrio em relao natureza, legando-nos o mundo em que vivemos

    hoje: catico, desarmnico, desequilibrado e ambientalmente doente. Estamos vivendo em

    meio a uma srie crescente de problemas ambientais, gerados por um modelo hegemnicode desenvolvimento.

    Na histria humana, o comportamento predatrio no novo. O que novo a dimenso e

    extenso dos mecanismos de depredao onde se inclui, desde o surgimento das grandes

    cidades e das imensas lavouras de monoculturas, at as armas nucleares.

    Segundo Andrade (2000), osproblemas ambientais s comearam a ser identificados como

    sendo impactantes a partir de dois fatos bsicos: primeiro, a revoluo industrial, ocorrida

    a partir da metade do sculo XVIII, mais precisamente a partir do ano de 1750, produzida

    pela passagem do artesanato e da manufatura fbrica, pela criao das mquinas de fiar

    (tear mecnico), ocasionando uma grande mudana no processo de produo. Segundo: a

    organizao urbana, representada pela construo das grandes cidades originadas com a

    revoluo industrial,a maioria delas feita sem nenhum planejamento e ordenamento.

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 7

    A forma como as sociedades predominantes promoveram o desenvolvimento,

    fizeram cincia e desenvolveram tecnologias, gerou o mau desenvolvimento que, na

    prtica, tem se mostrado predatrio, penoso e injusto. O progresso, entendido

    apenas como avano tcnico, material e crescimento econmico, est sendo obtido

    dentro de um padro de produo, de consumo, de acumulao e de vidainsustentvel. (LEFF, 1996, p. 41)

    Com efeito, o domnio sobre a natureza estampa relaes insustentveis traduzidas nas

    externalidades do avano tecnolgico, do crescimento econmico e da maximixao de

    lucros. Nosso modelo de desenvolvimento mostra a predominncia da razo tecnolgica e

    da racionalidade econmica, fundamentada no clculo econmico. o que demonstra Leff

    (2001) ao expor nosso modelo norteador utilitarista, competitivo e produtivo, base de

    sustentao de uma sociedade deformada, desintegrada e desintegradora do meio ambiente.

    Sobretudo construmos o nosso conhecimento por meio de uma percepo estreita da

    realidade, baseado no pensamento racional, que se caracteriza pela linearidade e pela

    oposio do sujeito ao objeto. Segundo Vieira & Weber (1996), fragmentamos o saber e,

    conseqentemente, tratamos os saberes e os problemas ambientais de forma isolada, no

    relacional. Em ltima anlise, optamos por uma utopia-desenvolvimentista

    antropocntrica caracterizada pelo individualismo, pela falta de solidariedade entre os

    homens e destes para com a natureza. Neste sentido, os autores afirmam a existncia depreocupao em estabelecer uma co-viabilidade de longo prazo dos ecossistemas e dos

    estilos de vida que eles suportam.(VIEIRA & WEBER, 1996, p. 19).

    Esse processo civilizatrio, pautado por modelos de sociedade incompatveis com a

    sustentabilidade biolgica, social, cultural e econmica, desencadeou tudo isto a que

    chamamos de crise ambiental. Na verdade, esta crise, manifestada atravs da degradao

    ambiental, , em sua essncia, um sintoma de uma crisecivilizatria. Essa, por sua vez,

    est ligada a uma crise existencial, fundamentada na perda de valores. Hoje, a criseambiental serissima e grave. Est vinculada, inclusive, s questes de segurana planetria,

    diretamente relacionada nossa sobrevivncia, das futuras geraes, e a do planeta que nos abriga.

    A separao homem-natureza uma caracterstica marcante do pensamento que tem

    dominado o mundo ocidental, cuja matriz filosfica se encontra na Grcia e Roma

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 8

    clssicas. preciso questionar as razes dessa crise, razes profundas e antigas. Segundo

    Saffiati (2002), a civilizao ocidental, da qual fazemos parte, tem, j nas suas origens

    mais remotas, duas posturas intelectuais bsicas, que oscilam de acordo com as fases da

    sua histria: uma o antropocentrismo, que coloca o homem como centro absoluto do

    universo; outra o teocentrismo, que faz tudo girar em torno da idia de Deus. Elas so

    encontradas nas duas vertentes formadoras da civilizao ocidental, ou seja, o judasmo e o

    helenismo.

    Gonalves (1998) afirma que, com Plato e Aristteles que se comea a assistir um certo

    desprezo pelas pedras e pelas plantase um privilegiamento do homem e das idias. Na

    civilizao helnica, entendendo com essa expresso Grcia e Roma, a postura

    predominante antropocntrica: os deuses so concebidos imagem e semelhana doshomens. Considerando-se centro, o homem distancia-se dos demais seres e, de certa

    maneira, se posta diante deles em atitude de superioridade absoluta, abertamente

    antagnica.Surgem assim as relaes equivocadas e s vezes perversas de dominador x

    dominado, de esprito x matria, de homem x natureza. Esta postura do homem como

    centro absoluto do universo, tendo assim, a natureza ao seu dispor, vem sendo utilizada

    ideologicamente para justificar a explorao do meio ambiente h sculos.

    A tradio judaico-crist fortemente marcada por um cunho teocntrico. Nela o homem concebido semelhana e imagem de Deus e foi sob essa influncia que a oposio

    homem-natureza e esprito-matria adquiriu maior dimenso. Segundo Gonalves (1998),

    os cristos vo afirmar decididamente que Deus criou o homem a sua imagem e

    semelhana. Criado imagem e semelhana de Deus, o homem assim, dotado de um

    privilgio. Se Plato falava que s a idia era perfeita, em oposio realidade mundana, o

    cristianismo operar a sua prpria leitura, opondo a perfeio de Deus imperfeio do

    mundo material. Com o cristianismo, os deuses j no habitam mais este mundo, como na

    concepo dos pr-socrticos.Deus sobe aos cus e, de fora, passa a agir sobre o mundoimperfeito do dia-a-dia dos mortais. Localizado num lugar privilegiado, estratgico, do

    alto, Deus a tudo v e controla. A assimilao aristotlico-platnica que o cristianismo far

    em toda a Idade Mdia levar a cristalizao da separao entre esprito-matria, homem-

    natureza.

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 9

    No perodo renascentista, as profundas alteraes da vida correspondentes ao

    desmantelamento do Feudalismo, tiveram amplas repercusses no campo das idias, a

    exemplo da revalorizao do empirismo e do racionalismo e da contestao religiosa

    responsvel pela ecloso do Protestantismo a partir das idias de Lutero. A partir da o

    poder da Igreja Catlica de Roma deixa de ser incontestvel, sobretudo em domnios

    filosficos,segundo Melo e Souza (2003).

    No entanto, com Rene Descartes(1596-1650) e seu racionalismo cartesiano, no sculo

    XVII, que a oposio esprito-matria, sujeito-objeto, homem-natureza se tornar mais

    completa, se constituindo no centro do pensamento moderno e contemporneo, pois

    conforme Kesselring (1992) a natureza torna-se objeto da cincia.

    Bolf (2004) afirma na sua leitura sobre Descartes, que sintomtica pela ciso entre homem

    e natureza a diviso cartesiana do mundo em duas partes: a res extensa (mundo dos

    corpos materiais) e a res cogitans (mundo do pensamento). Neste esquema a natureza

    restringe-se a res extensa e o pensamento, por outro lado, no pertence natureza.

    Ainda, dois aspectos marcam a modernidade, conforme Gonalves (1998): primeiro, o

    carter pragmtico do conhecimento, que v a natureza como um recurso, um meio para se

    atingir um fim. E, segundo o antropocentrismo, assimilado e expandido no Renascimento,

    em que o homem, um sujeito em oposio ao objeto que a natureza, instrumentalizado

    pelo mtodo cientfico, pode penetrar nos mistrios desta e assim se tornar senhor e

    possuidor do mundo. imagem e semelhana de Deus tudo pode, todo poderoso.

    Assim, a natureza perde o carter de finalidade e espontaneidade com o qual os antigos a

    haviam impregnado, e passa a ser interpretada como mquina, podendo ser esmiuada de

    maneira que tudo seja conhecido, que nada cause espanto ou admirao, pois, segundo

    Donatelli (2003), no h mais sentido estudar fenmenos com o objetivo de descobrir as

    intenes da natureza, visto que, segundo a teoria mecanicista, o homem deve ser um

    manipulador dela. Dessa forma, a natureza foi dessacralizada, explica Acot (1990), e um

    terrvel conceito utilitrio tomou conta de ns; s nos interessamos pelo que serve, pelo

    que tem um rendimento, de preferncia imediato. Amplia-se assim, o carter de finalidade

    e aprofundando-se a concepo de matria a ser explorada e dominada pela tcnica.

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 10

    Conforme Filho (2003), este homem de pensamento cartesiano em contraposio ao

    pensamento medieval afirma que o ser humano deve ser conhecedor da natureza para que

    nela encontre e dela extraia os recursos, o que inclui, alm da satisfao do esprito, o bem-

    estar do corpo.

    A diviso cartesiana entre matria e esprito, aliada concepo mecanicista, gerou toda a

    base filosfica da dessacralizao completa da natureza, provocando a sada do homem,

    como se ele no fizesse mais parte dela. Segundo Capra (1996), a rejeio de qualidades

    espirituais no cosmo, o repdio a qualquer significado intrnseco na natureza e o

    desaparecimento do divino da viso cientfica do mundo gerou um vazio espiritual que se

    tornou caracterstico da nossa cultura ocidental.

    No sculo XIX, em meio s transformaes ocorridas com a revoluo industrial,emergiu

    a filosofia ps-kantiana, baseada no positivismo, que tem em Augusto Comte (1798-1857)

    o seu principal representante, segundo Cotrim (2000).

    O positivismo, como afirma Cotrim (2000), refere-se a toda uma diretriz filosfica

    marcada pela exaltao da cincia e do mtodo cientfico. Criou-se o mito do

    cientificismo, segundo o qual o nico conhecimento possvel e perfeito o proveniente da

    cincia. Reflete, no plano filosfico, a euforia surgida pelo desenvolvimento da sociedadecapitalista industrial, acreditando nos benefcios que esta sociedade poderia gerar e no

    progresso capitalista, orientado pela tcnica e pela cincia.Afirma ainda o autor que as

    penosas conseqncias sociais advindas da industrializao eram justificadas ou

    menosprezadas pelo positivismo e que, Comte defendeu a legitimidade da explorao

    industrial, concordando com a existncia dos empreendedores capitalistas e dos operadores

    diretos, o proletariado.

    Cotrim (2000) ainda assegura que, segundo Comte, somente so reais os conhecimentos

    que repousam sobre fatos observados. Assim, o conhecimento cientfico positivista se

    torna um instrumento humano de transformao da realidade, onde o homem capaz de

    prever os fenmenos naturais e de dominar a natureza.

    Comte atribua o progresso ao desenvolvimento das cincias positivas. Essas

    cincias permitiriam aos seres humanos saber para prever, prever para

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 11

    prover, de modo que o desenvolvimento social se faria por aumento do

    conhecimento cientfico e do controle cientfico da sociedade. de Conte a

    idia de Ordem e Progresso, que viria a fazer parte da bandeira do Brasil

    republicano. (CHAU, 1998,p. 49)

    Gonalves (1998) assegura que o sculo XIX ser o do triunfo desse mundo pragmtico,

    com a cincia e a tcnica adquirindo, como nunca, um significado central na vida dos

    homens. A natureza, cada vez mais um objeto a ser possudo e dominado, agora

    subdividida em fsica, qumica, biologia. O homem em economia, sociologia, antropologia,

    psicologia, etc. Qualquer tentativa de pensar o homem e a natureza de uma forma orgnica

    torna-se cada vez mais difcil, at porque a diviso no se d somente enquanto

    pensamento. A realidade objetiva construda pelos homens est toda dividida: a indstria

    txtil est separada da agricultura, a diviso social e tcnica do trabalho fazem parte do

    mundo concreto dos homens e no pensar de modo fragmentado, dividido, dicotomizado,

    passa a ser cada vez mais caracterstico daqueles que parecem ter perdido o senso de

    realidade.

    Segundo Gaspar (1995), o pensamento no linear e integrador, fruto de uma relao

    sistmica do homem com a natureza, visto como uma cultura de lentido em seguir o

    ritmo do progresso tecnolgico. A grande caracterstica do tempo nas culturas integradas

    natureza o fato de ser um tempo cclico, circular, que se repete anualmente conforme os

    eventos marcantes das vrias estaes que se sucedem em cada regio da terra. Imersos

    nesse sistema, os povos sentiam que suas aes ajudavam o ciclo a se realizar: havia um

    sentimento de participao e responsabilidade. Por ser uma cultura que respeitava a Terra e

    os seres vivos, a explorao da natureza tendia a ser feita com muita parcimnia e apenas

    na medida em que era indispensvel para a sobrevivncia do grupo.

    A racionalidade tecnolgica das sociedades ocidentais modernas desfaz o crculo do tempo

    e o transforma em uma linha reta. Agora o tempo como uma longa estrada pela qual

    corremos sem parar, para um lugar distante das crenas e das supersties: o territrio

    seguro do progresso. Esses dois conceitos de tempo circular e linear determinam duas

    atitudes antagnicas em relao ao mundo. O tempo circular determina uma atitude de

    respeito e cooperao. O indivduo se sente co-responsvel pelo retorno desse ciclo; alm

    de cuidar da natureza, dos animais e vegetais, estabelece um profundo sentimento de

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 12

    gratido e reverncia com todos os seres. Do cuidado que receberem agora, depende a

    possibilidade de renascerem na prxima estao.(GASPAR, 1995, p. 8)

    Segundo Gonalves (1998), quando o homem passa a manipular a natureza a partir do

    mtodo cientfico, controlando a freqncia das safras agrcolas, forjando minrios e

    transformando-os em mquinas, a meta prioritria se tornou criar as condies necessrias

    para aumentar a produtividade em curto prazo da terra, das mquinas e dos homens. A

    tecnologia cresceu direcionada para a manipulao da gua e da fertilidade do solo, para a

    acelerao dos processos de plantio, colheita e conservao de alimentos, para a produo

    de excedentes que significariam estoque garantido, possibilidade de manipular preos,

    lucro crescente para os donos dos produtos e comerciantes, expulso dos fantasmas da

    fome e do frio para todo o povo, libertando-o assim do jugo dos ciclos da natureza.

    A possibilidade concreta de se libertar dos ciclos naturais atravs da tecnologia

    se reflete na transformao do conceito de tempo, que deixa de seguir o ciclo

    das estaes climticas e passa a refletir a seqncia linear de projetos e

    experincias individuais. A projeo de todas as expectativas da coletividade

    num mundo de desenvolvimento e progresso e a percepo linear do tempo,

    criou uma atitude individual de irresponsabilidade e inconscincia em relao

    natureza que foi se espalhando por toda a sociedade ocidental e destruindo a

    sua ligao com a Terra.(GASPAR, 1995, p. 19)

    A noo de tempo que est por traz da lgica capitalista, segundo Gonalves (1998), o

    tempo do prprio capital e no a temporalidade dos ecossistemas ou dos trabalhadores. o

    tempo da concorrncia, traduzido no interior das unidades de produo, nas fbricas e

    fazendas, pela preocupao com o rendimento do trabalho, com a produtividade:

    Para que a fbrica funcione necessrio que todos estejam a postos,

    mesma hora, no mesmo lugar; a fbrica exige que as matrias-primascheguem no tempo certo; os comerciantes devem estar a postos para

    comprar e vender na hora certa; as demais fbricas devem fornecer em

    tempo hbil os insumos; enfim, tudo deve ser sincronizado atravs de

    uma rede de transportes e comunicaes com o mximo de preciso

    horria possvel. (GONALVES, 1998, p. 109)

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 13

    O universo newtoniano um relgio, mecanicista, sincronizado e no diacronizado. A

    idia mecanicista do funcionamento csmico formulado por Isaac Newton(1642-1727),

    deixou os cus e desceu a terra para atravs das mquinas se constituir na imagem de

    progresso palpvel e tangvel para a humanidade.

    Quando se considera o tempo no como uma sucesso de experincias, mas

    sim como uma coleo de horas, minutos e segundos, aparecem os hbitos de

    acrescentar ou de economizar tempo. O tempo cobra um carter de espao

    fechado: pode dividir-se, pode preencher-se, pode, inclusive, dilatar-se

    mediante o invento de instrumentos que economizem tempo. O tempo abstrato

    converteu-se no novo mbito da existncia. As mesmas funes so reguladas

    por ele: come-se no porque se tem fome, mas porque est na hora; dorme-se

    no porque se est cansado, mas porque est na hora. Uma concepo

    mecanicista generalizada do tempo acompanhou o emprego mais extenso dos

    relgios dissociando a conscincia temporal das seqncias orgnicas e dos

    ritmos da natureza. (MUMFORD apud GONALVES, 1998, p. 107)

    Rompida, ento, a relao homem-natureza, encontrando-se estes, em sua maior parte,

    separados do espao e das condies naturais de transformao dos seus bens de

    subsistncia, vem-se obrigados a comprar no mercado aquilo que poderiam produzir, caso

    as condies fossem outras. Separar o homem da natureza , portanto, uma forma de

    subordin-lo ao capital.(GONALVES, 1998, p. 116)

    Sem pr em dvida a difuso do conforto material trazido pela civilizao industrial,

    temos, no entanto, o direito de nos perguntar se o avano espetacular dessa civilizao no

    significa desperdcio demasiado de recursos e homens; quais os seus limites e o seu sentido

    profundo; sobretudo, a que tipo de relaes de trabalho e de sociedade nos leva. Toda uma

    corrente de pensamento acha que o industrialismo e a diviso de trabalho por ele

    subentendido provocam inelutavelmente a alienao e a negao de qualquer espcie de

    autonomia para os trabalhadores e os indivduos.

    2.2. DESENVOLVIMENTO E A RELAO HOMEM-NATUREZA

    Forjadas no poderoso arcabouo de idias do Positivismo e munidas de um mtodo

    cientfico que consideravam inquestionvel, as geraes ocidentais a partir do

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 14

    Renascimento dedicaram-se sistematicamente a explorar o universo que as cercavam.

    Observar os cus, criar condies materiais de navegar os oceanos descobrindo e

    assimilando a sabedoria de outros povos, classificar e organizar a matria em padres

    lgicos, dissecar as foras secretas da natureza e formular leis gerais para domin-las,

    passou a ser o foco central da modernidade ocidental.

    Uma vez encontradas as chaves para abrir as portas de acesso s grandes descobertas pela

    utilizao do mtodo cientfico, poderiam estas ser utilizadas para construir cidades, curar

    doenas, para reduzir custos de produo,ou seja, para melhorar a vida da humanidade

    retirando-a do obscurantismo medieval.

    Assim, o significado de desenvolvimento foi acrescido de uma dimenso de

    valor. No se tratava apenas de uma questo de revelar como as coisas

    funcionavam ou se desenrolavam, era tambm uma questo de fazer com que

    funcionassem melhor, ou se desenrolassem bem e no de forma indesejvel. O

    objetivo era o progresso, o domnio das foras secretas a fsica de Newton, a

    dialtica de Hegel, a mo oculta do mercado, de Smith para o benefcio da

    humanidade. (CAIDEN & CARAVANTES, 1988, p. 20)

    A natureza perde qualquer conceito de sacralidade e mistrio e passa condio de objeto

    sob permanente investigao, para que, uma vez desvendados os seus segredos, pudesse

    servir a humanidade, melhorando a sua condio. Em relao a ela, o sentido do

    desenvolvimento se havia modificado, passando de uma posio passiva ou neutra para

    uma posio ativae assim, o homem agora irius-la, remodelando-a para servi-lo.

    Essa ideologia do desenvolvimento baseado no progresso cientfico e no avano

    tecnolgico passou a dominar o pensamento ocidental e expandiu-se alm do Ocidente, por

    meio da colonizao e da educao ocidentais. Desenvolver significava empregar a cincia

    e a tecnologia para melhorar a condio humana. Sendo assim, para assegurar o

    desenvolvimento exigiam-se esquemas ocidentais de pensamento, instituies, cincia e

    tecnologia e costumes ocidentais. Ser contrrio ao desenvolvimento era ser reacionrio.

    Quem quer que se colocasse no caminho do progresso deveria ser afastado ou esmagado.

    Historicamente nenhuma sociedade humana teve com a tcnica a relao que a sociedade

    europia estabeleceu para si e depois expandiu a outros povos e culturas dentro do

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 15

    processo de colonizao a partir do sculo XIX, pois, oaparato tecnolgico da sociedade

    industrial foi glorificado a ponto de ele ser visto como a condio indispensvel ao

    desenvolvimento dos povos. A razo tcnicaadquire uma dimenso inimaginvel, da a

    exaltao da cincia e da tcnica em oposio filosofia, aos saberes locais, s tecnologias

    intuitivas culturais, aos saberes indgenas etc. Arazo tcnicaest preocupada com a

    eficcia, com fins imediatos, com o lucro rpido. Como vivemos numa sociedade

    marcada pelo produtivismo, a razo tcnicatornou-se a nica razo.(GONALVES,

    1998, p. 118)

    Com o seu af de conquistar territrios e unificar culturas, o ocidente alegava que a

    ocidentalizao beneficiava todos os povos oferecendo-lhes uma opo modernizadora e

    verdadeira. Retirava os povos do obscurantismo medieval, livrava-os da barbrie,

    familiarizava-os com um comportamento mais civilizado e permitia-lhes partilhar de

    descobertas da cincia. Essa ideologia deu origem ao patrocnio das potncias mundiais -

    seu protecionismo, seu paternalismo e sua tecnologia. (CAIDEN & CARAVANTES,

    1988, p. 22)

    As sociedades tecnolgicas ocidentais abraam a cincia como uma nova religio e para

    disseminar a ideologia do progresso como fruto do desenvolvimento tecnolgico, no s

    reestruturam as suas instituies sociais, mas tambm ...se empenham no

    recondicionamento das atitudes das pessoas para aceitar os imperativos tecnolgicos,

    obrigando-as a abandonarem o manto sufocante da tradio que as acorrentavam ao

    passado reacionrio. (Buarque,1993, p. 119). Se outras sociedades permaneciam

    atrasadas, isso acontecia, sobretudo, por culpa delas prprias, porque no procuravam

    imitar as sociedades progressistas, ou porque permitiam que a tradio sufocasse seus

    esforos de modernizao.

    O objetivo de acumular riqueza levou a burguesia mercantil europia a uma impiedosadominao de outros povos. Sob o argumento ideolgico de introduzir o desenvolvimento

    e o progresso,...vrios povos foram arrasados culturalmente por essa lgica

    homogeneizadora, de unificao, que nega fundamentalmente a diferena.

    (GONALVES, 1998, p. 128)

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 16

    So profundas, portanto, as implicaes decorrentes do desrespeito s diferenas entre os

    modos de vida que caracterizam cada povo-cultura, assim como so profundas as

    implicaes recprocas entre ecologia e economia institudas pela ordem capitalista.

    Nesse contexto determinista e unidimensional, as cincias sociais do ocidente

    desenvolveram teorias de suporte, na economia, na poltica e na sociologia, para tornar

    possvel uma classificao das naes segundo uma escala do mais desenvolvido ao menos

    desenvolvido, do mais atrasado ao mais avanado, de acordo com os padres ocidentais.

    Na economia os estgios definidos de crescimento, atravs dos quais uma

    economia tradicional se modernizava, vieram a ser formulados por Rostow. Em

    cincia poltica, Huntington, Riggs e outros formularam elaborados sistemas

    classificatrios distinguindo entre formas de governo tradicionais e modernas.

    Em sociologia, descreveram-se diferenciaes institucionais cada vez maiores

    entre as atividades industriais e agrrias. Mesmo na psicologia fez-se o

    contraste entre as personalidades conservadoras (autoritrias) e as

    personalidades modernas (orientadas para o desempenho). E, assim, foi

    possvel sobre pases desenvolvidos (ocidentais) e subdesenvolvidos (no-

    ocidentais) distinguir entre os mais desenvolvidos e os menos desenvolvidos,

    isto , entre os adiantados e os atrasados; podendo-se classificar as naes

    segundo um continuum, do mais atrasado ao mais avanado, de acordo com o

    que determinassem as caractersticas ocidentais.(CAIDEN & CARAVANTES,1988, p. 22)

    Segundo Huberman (1986), o modelo para o desenvolvimento era o de uma sociedade

    industrial urbana e o nvel de urbanizao e industrializao determinavam o grau de

    modernidade atingido por essa sociedadade. Desenvolvimento era, sobretudo,

    desenvolvimento econmico, que por sua vez era, acima de tudo, renda per capita

    expressa em termos monetrios, baseado mais nos ndices de capitalizaoe lucro, do que

    na agricultura de subsistncia. O planejamento econonmico se sobrepunha ao

    planejamento do desenvolvimento, pouca preocupao havendo com eqidade, justia ou

    bem estar.

    Huberman (1986) afirma ainda que o processo de industrializao levou ao rpido

    esvaziamento do campo e urbanizao. em torno das fbricas que se assentam os

    grandes aglomerados urbanos uma vez que, foi na indstria que o capital mais plenamente

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 17

    se apoderou do processo produtivo aps o advento do capitalismo. A organizao do

    espao socialmente instituda e as relaes sociais comeam tambm a ser

    mercantilizadas. A maior parte das populaes urbanas, formada por camponeses que

    foram expropriados dos seus meios de produo, se vm obrigadas venda de sua

    capacidade de trabalho por um preo, por um salrio.

    A sociedade capitalista comea realmente a se afirmar quando o capital se desloca da

    esfera do comrcio para a da produo. A manufatura a primeira expresso disto, ao

    reunir no mesmo espao da fbrica vrios trabalhadores, combinando suas parcelas de

    trabalho sob o comando do capitalista. Todavia, a manufatura apresentava limites para a

    acumulao do capital, tendo em vista as limitaes psquicas e biolgicas dos operrios

    que tiravam dos seus prprios corpos a energia para a produo, afirma Gonalves (1998).

    A partir dessas limitaes, o advento da mquina torna-se uma necessidade para a

    expanso do capital. Inovaes tecnolgicas se afirmam como sinnimos de progresso e a

    histria recente da tecnologia torna-se uma sucesso permanente de tcnicas que

    substituem umas s outras. (GONALVES, 1998, p. 119)A nossa sociedade ocidental

    contempornea estabelece com a tcnica uma relao que a considera superior

    manufatura. Superior por ser mais produtiva, por representar o progresso e a modernidade.

    Privados dos domnios territoriais e meios de produo, e assentados em aglomerados

    urbanos alheios aos seus saberes rurais, o trabalhador sofre uma segunda expropriao.

    Com o advento da mquina e da industrializao o conhecimento tradicional que pertencia

    ao trabalhador e transferido das oficinas para os departamentos de planejamento, da

    manufatura (manu, mo.; facere, fazer) para a automao mecnica. Elimina-se os

    processos subjetivos de pensar e fazer em ntima relao com os seus objetos de trabalho.

    Assim se consagra a separao entre trabalho intelectual e trabalho braal.

    Cristaliza-se o processo de separao homem-natureza ao ser negada, grande

    maioria da populao, aquilo que prprio da natureza humana, ou seja, a

    faculdade de criar, imaginar, inventar, que as classes planejadoras exaltam

    como indicadores da sua superioridade. (GONALVES, 1998, p.121)

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 18

    Com relao participao humana no processo de produo, deve-se destacar que na

    manufatura o saber fazer estava encarnado no prprio corpo do trabalhador, j na indstria

    tecnolgica a mquina quem faz, reduzindo o trabalhador a uma mera pea desta,

    alimentando-a.

    A criatividade inerente espcie humana. Se, na maior parte dos seres humanos, essa

    qualidade no desenvolvida plenamente, no por incapacidade, mas por vivermos numa

    sociedade e num tempo onde o pensamento criativo foi subjugado pela ao produtiva e

    assim, se desperdia o maior patrimnio criativo que a natureza produz: o prprio ser

    humano.

    Na opinio de Lasch apud Sachs (1986), o operrio que desaprendeu a construir a sua

    habitao, e a mulher dele que no sabe mais cozinhar, na realidade perderam quase todo o

    controle sobre si mesmos.

    Deveremos da deduzir, como parece sugerir esse autor, que a civilizao

    industrial, longe de constituir o ponto alto da nossa histria, tosomente uma

    aberrao, um passo na direo errada, cujo custo proibitivo no pode mais ser

    suportado pela humanidade? (SACHS, 1986, p.98)

    O fato de que, em diversos pases industrializados, novos e enormes movimentos que

    buscam despertar a conscincia coletiva para a questo ecolgica e comunitria, tenham

    entrado em cena no decorrer das ltimas dcadasconstitui indcio do mal-estar provocado

    pela sociedade industrial.

    O desenvolvimento industrial preocupou-se mais com o crescimento do que com a

    distribuio, entendendo que quanto mais bens materiais houvesse, mais haveria para ser

    distribudo. Segundo Sachs (1986), a associao do desenvolvimento ao crescimentoconstitui um reducionismo econmico, pois toma a parte pelo todo, e ignora a diferena

    que existe entre condio necessria e condio suficiente. Desta forma, a teoria

    econmica, assumindo a aparncia de rigor de cincia exata que lhe era conferida pela

    formalizao mecanicista, tornou-se argumento de peso no apoio ideologia do

    crescimento.

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 19

    Na sua essncia, a ideologia do crescimento prega a idia do "quanto mais, melhor" e de

    que todos os problemas estruturais acabaro por se resolver atravs de uma fuga

    quantitativa para diante. Na afirmao de Sachs (1986), no leva em conta a oposio entre

    a economia do ser e a do ter e, ao invs de redefinir as finalidades do desenvolvimento,

    concentra-se nas instrumentaes do aumento da oferta de bens e servios. No toma

    conhecimento das diferenas qualitativas essenciais entre desenvolvimento e mal-

    desenvolvimento, nas quais pesam, de um lado, o grau de satisfao das necessidades

    sociais reais da populao e, de outro, os custos sociais e ecolgicos do crescimento.

    O crescimento acelerado e a modernizao, Segundo Sachs (1986), mudam

    completamente as estruturas de consumo e os modos de vida das elites e das classes

    mdias nas cidades, sem criar as estruturas de produo capazes de assegurarem, ao

    mesmo tempo, uma existncia digna ao conjunto de toda populao.

    A experincia dos trs ltimos decnios mostrou que uma modernizao muito rpida

    pode, em certos casos, ser realizada na periferia do mundo capitalista, mas s custas do

    aumento das desigualdades entre a minoria privilegiada e a maioria dos pobres, em

    detrimento das populaes rurais e perifricas urbanas, a favor das intra-urbanas, com

    custos sociais e ecolgicos na maioria vezes exorbitantes.

    A contabilidade nacional, segundo Leff (2001) hoje utilizada para medir o crescimento,

    baseia-se na noo de valor de troca que abrange indistintamente valores de uso

    socialmente reconhecidos como tais; pseudo-valores de uso que no trazem qualquer

    satisfao ao consumidor, salvo talvez uma diferena de status em relao aos demais

    consumidores, e os "no-valores", que constituem, na realidade, um custo de

    funcionamento do sistema e, no, um resultado.

    Outros custos ecolgicos de produo - como a destruio do acervo gentico ou a

    degradao da fertilidade dos solos provocada por prticas agrcolas erradas - sosimplesmente ignorados; e a prpria poluio ainda um custo, ao mesmo tempo,

    ecolgico e social que mal se comea a levar em conta, mesmo assim parcialmente e

    apenas como conseqncia do custo da despoluio.

    Portanto, a degradao ambiental se manifesta como sintoma de uma crise de civilizao,

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 20

    marcada pelo modelo de modernidade regido pelo predomnio do desenvolvimento da

    razo tecnolgica sobre a organizao da natureza. A questo scio-ambiental

    problematiza as prprias bases da produo; aponta para a desconstruo do paradigma

    econmico da modernidade e para a construo de futuros possveis, fundados nos limites

    das leis da natureza, nos potenciais ecolgicos, na produo de sentidos sociais e na

    criatividade humana, segundo Leff (2001)

    2.3. SABER TECNOLGICO, ETNOCONHECIMENTO

    E ECODESENVOLVIMENTO

    A questoambiental surge nas ltimas dcadas do sculo XX como sinal mais eloqente

    da crise da racionalidade econmica que conduziu o processo de modernizao. Leff

    (2001) afirma que a racionalidade econmica cartesiana que se converteu no princpio

    constitutivo que predominou no paradigma que organizou a vida no ocidente, legitimou

    uma falsa idia de progresso, e v a degradao ambiental como um sintoma concreto da

    crise da civilizao. O saber ambiental passa a ocupar, ento, um lugar no vazio da

    racionalidade cientfica. o sintoma da falta de conhecimento da humanidade.

    Na percepo desta crise ecolgica foi sendo configurado um conceito de

    ambiente como uma nova viso do desenvolvimento humano que reintegra os

    valores e potenciais da natureza, as externalidades sociais, os saberes

    subjugados e a complexidade do mundo negados pela racionalidade

    mecanicista, simplificadora, unidimensional e fragmentadora que conduziu o

    processo de modernizao. O ambiente emerge como um saber reintegrador da

    diversidade, de novos valores ticos e estticos e dos potenciais sinergticos

    gerados pela articulao de processos ecolgicos, tecnolgicos e culturais. O

    saber ambientaI ocupa seu lugar no vazio deixado pelo progresso da

    racionalidade cientfica, como sintoma de sua falta de conhecimento e como

    sinal de um processo interminvel de produo terica e de aes prticasorientadas por uma utopia: a construo de um mundo sustentvel,

    democrtico, igualitrio e diverso. (LEFF,2001, p. 17).

    A reapropriao da natureza coloca um princpio de eqidade na diversidade que implica

    na autodeterminao das necessidades, a autogesto do potencial ecolgico de cada regio

    em estilos alternativos de desenvolvimento e, a autonomia cultural de cada povo e cada

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 21

    comunidade, processos que definem as condies de produo e as formas de vida de

    diversos grupos da populao em relao ao manejo sustentvel de seu ambiente.

    A eqidade no pode ser definida em termos de um padro hegemnico de bem estar, da

    repartio de estoques de recursos disponveis e da distribuio dos custos de

    contaminao do ambiente global. A equidade na diversidade tratada por Leff (2001),

    implica eliminar as condies de dominao sobre a autonomia dos povos, dando

    condies para a apropriao dos potenciais ecolgicos de cada regio, mediados pelos

    valores culturais e pelos interesses sociais de cada comunidade.

    A racionalidade ambiental tratada por Leff (2001) passa pela valorizao da diversidade

    tnica e cultural da espcie humana, pela fomentao da valorizao de diferentes formas

    de manejo produtivo da biodiversidade. Assim, o desenvolvimento sustentvel deve ser um

    projeto social e poltico que aponta para o ordenamento ecolgico e a descentralizao

    territorial da produo. Uma valorizao da diversificao dos tipos de desenvolvimento e

    dos modos de vida de todas as populaes que habitam o planeta. Afirma, ainda, que

    preciso que os pesquisadores e cientistas no tomem os povos que estudam como simples

    objetos, mas que deixem que eles falempara compreenderem seusvalores como valores

    prprios de uma outra cultura que no podem ser reduzidos.

    A tradio racionalista do iluminismo ainda est presente entre ns com grande fora:

    mesmo entre os ecologistas existem aqueles que acreditam que os tcnicos e cientistas

    devem orientar as prticas da relao homem-natureza. A cincia e a tcnica so condies

    necessrias, mas no suficientes para garantir um uso racional dos recursos naturais.

    O papel das universidades nesse sentido passa a ser tambm o de retomar os saberes locais

    e populares, captando os problemas a partir das bases e desenvolvendo o saber elaborado

    para sua aplicao em programas e projetos de gesto ambiental. Deve-se promover uma

    miscigenao de prticas tradicionais com conhecimentos cientficos, assim como a

    transmisso do saber ambiental e sua assimilao por parte das comunidades,

    potencializando, com isso, formas produtivas e capacidades de autogesto de processos de

    desenvolvimento.

    A pedagogia ambiental, proposta por Leff (2001), se orienta no pensamento da

    complexidade que crtico, participativo e propositivo. O saber interdisciplinar implica,

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 22

    no s na fuso e integrao dos conhecimentos provenientes de diferentes cincias, mas

    na reformulao de seus paradigmas de conhecimento a partir dos problemas scio-

    ambientais concretos que se apresentam competncia dos novos profissionais.

    Novos paradigmas passam a revisar os fundamentos tericos das etnocincias. A busca

    por aes prticas que finquem a cultura em suas razes naturais.

    Esta busca de fundamentao do saber coloca, por sua vez, a possibilidade de

    se construir novos projetos de civilizao e estratgias de

    etnoecodesenvolvimento, a partir dos valores e saberes das comunidades rurais

    e de sua mestiagem com as cincias e tecnologias modernas, num processo de

    inovao de prticas de aproveitamento sustentvel dos recursos naturais.

    (LEFF, 2003, p. 263)

    Para isso necessrio rever a relao de dominao, sujeio e desconhecimento dos

    saberes tradicionais pela monocultura modernizadora e libertar os saberes subjugados que

    no foram formalizados em cdigoscientficos..

    preciso um outro modo de pensar e de agir que incorpore uma outra relao homem-

    natureza. Trata-se de um outro projeto de sociedade, de um outro sentido para o viver, de

    uma outra cultura que subordine as tcnicas aos seus fins e no fique subordinada a elas,

    de um reprojetamento de nossa tecnologia, de novos valores e de uma nova poltica.

    A tica ambiental vincula a conservao da diversidade biolgica do planeta ao respeito

    heterogeneidade tnica e cultural da espcie humana. Ambos os princpios se conjugam no

    objetivo de preservar os recursos naturais e envolver as comunidades na gesto de seu

    ambiente. Segundo Leff (2001), entrelaam-se aqui o direito humano a preservar a sua

    prpria cultura e tradies, o direito de forjar o seu destino a partir de seus prprios valores

    e significao do mundo, com os princpios da gesto participativa para o manejo de seus

    recursos, de onde as comunidades retiram suas formas culturais de bem-estar e a satisfaode suas necessidades.

    Vale ressaltar que o termo ecodesenvolvimento foi adotado pela primeira vez em 1973 por

    Maurice Strong, Secretrio Geral da Conferncia de Estocolmo sobre Meio Ambiente. A

    concepo dessa conferncia foi essencialmente antitecnocrtica e recomendou uma gesto

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 23

    mais racional dos ecossistemas, a qual deveria incluir a valorizao do conhecimento

    emprico e da criatividade existente no interior das comunidades. Dessa maneira, nessa

    conferncia foi defendido que o crescimento econmico e a preservao, bem como o uso

    sustentado dos recursos naturais, representavam dimenses necessariamente passiveis de

    integrao, segundo Vieira (2001).

    O conceito de ecodesenvolvimento preconizava uma gesto mais racional dos

    ecossistemas locais inicialmente relacionadas s regies rurais da frica, sia e Amrica

    Latina, ganhando dimenses de critica s relaes globais entre pases subdesenvolvidos e

    superdesenvolvidos, bem como de crtica modernizao industrial como mtodo de

    desenvolvimento das regies perifricas. Tal conceito vinha propor para estas regies um

    desenvolvimento autnomo, independente daquele dos pases desenvolvidos epreocupados com os aspectos scio-poltico e ambiental do desenvolvimento, segundo

    Sachs (1986).

    Segundo Sachs (1999), o conceito de ecodesenvolvimento incorporou o argumento

    ecolgico em sua concepo de desenvolvimento, pois considera que a natureza entra na

    composiodo capital e no apenas nos meios de produo e de trabalho. Nesse sentido, o

    ecodesenvolvimento pode ser definido como uma estratgia para se promover a autonomia

    das populaes, estimular a reflexo e a experimentao participativa de formas decrescimento econmico que priorizem o potencial dos recursos naturais e sociais de cada

    lcus, mesmo que este se faa de modo mais lento.

    Segundo Almeida (1999), para se alcanar o objetivo do ecodesenvolvimento necessrio

    fundamentar o planejamento nas seguintes dimenses: social, econmica, ecolgica,

    espacial e cultural. Destarte, preciso introduzir processos que levem elaborao de

    alternativas ao modelo de desenvolvimento vigente, sendo a organizao das comunidades,

    dos grupos sociais e a reflexo a respeito das aes, algumas das alternativas possveis deserem realizadas em curto prazo.

    Sachs (1986), aponta o ecodesenvolvimento como estratgia para superar as barreiras

    ____________________

    A fundamentao e a disseminao do ecodesenvolvimento como um conceito, em vrios pases, dentre eles no Brasil, fruto do trabalho do autor Ignacy Sachs desde a dcada de 70, conforme Vieira, (2001), o qual ganhou umainterpretao mais ampla na Declarao de Cocoyoc, no Mxico em 1974.

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    Captulo 2 Desenvolvimento, cultura e meio ambiente na relao sociedade-natureza 24

    impostas pela economia de mercado dominante. E defende que, para o seu sucesso, torna-

    se fundamental o desenvolvimento de tecnologias apropriadas a absorverem o melhor da

    especificidade e da variabilidade tanto humana como naturais de cada ecossistema (local

    ou regional), de forma particular.

    sob a perspectiva do ecodesenvolvimento que propomos investigar o uso do bambu

    como uma alternativa para o desenvolvimento com sustentabilidade ambiental

    contextualizando-o num processo tecnolgico, social, econmico e cultural. Portanto, este

    marco terico tem por objetivo prtico nortear as aes de pesquisa deste trabalho dentro

    da dinmica social em que se dar.

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    Captulo 3O bambu 26

    3.1. USOS E POTENCIALIDADES

    No se colecionam bambus apenas pelo prazer de admir-los. Naqueles

    que observam, estudam e amam esse vegetal, gera-se uma viso menos

    pessimista do futuro do planeta. Muitos problemas ecolgicos poderiam

    ser resolvidos, pelo menos em parte, com o bambu.

    (Yves Crouet )

    3.1.1. O bambu em diversas culturas

    O bambu, essa planta singular de mltiplas utilidades para o homem, um material ao

    mesmo tempo novo e antigo. Novo por conta do crescente interesse que sua utilizao e

    pesquisa tem despertado no mundo ocidental e antigo porque trata-se de uma planta que

    surgiu em nosso planeta h milhes de anos, e que tem participado da histria do ser

    humano desde o seu princpio, fornecendo alimento, abrigo, utenslios domsticos,

    ferramentas agrcolas, papel, tecido, cordas, jangadas e uma infinidade de outros objetos do

    seu cotidiano, segundo Pereira (2001).

    Na contemporaneidade bastante utilizado, especialmente na sia, onde contribui

    economicamente para suprir as necessidades de sobrevivncia de mais de um bilho de

    pessoas, como afirma Sastry apud Pereira (2001). De acordo com Feng & Chao apud

    Pereira (2001), a China o pas que mais produz bambu, possuindo uma rea plantada em

    1997 de 3,4 milhes de hectares, com uma produo de um bilho de colmos anualmente.

    Entre as centenas de usos j registrados para o bambu, incluem-se vrias aplicaes

    industriais: broto comestvel, celulose e papel, matria prima para engenharia, construo,

    qumica, mobilirio, produtos base de bambu processado e laminado colado para diversos

    usos como pisos, forros e divisarias.

    Culturalmente reconhecido como a planta dos mil usos e o amigo da natureza no

    Oriente, no ocidente o bambu muito pouco explorado, todavia, na Amrica Latina, pases

    como Colmbia, Equador, Peru e Chile tm o bambu como elemento tradicional na sua

    cultura e outros pases tm praticado a introduo e explorao do bambu, como a Costa

    Rica, atravs do Proyecto Nacional de Bamb. No Brasil, apesar de ser um vegetal

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    Captulo 3O bambu 27

    relativamente comum na flora de todas as regies, pouco utilizado, seja pelo

    desconhecimento de suas centenas de espcies, caractersticas e aplicaes, seja devido

    falta de pesquisas e informaes acessveis populaes que poderiam se beneficiar com

    os seus usos. O uso que aqui fazemos, excetuando-se a produo industrial de papel, est

    restrito a algumas aplicaes tradicionais como artesanato, vara de pescar, mveis, e o

    broto comestvel, afirma Pereira (2001).

    Os bambus apresentam caractersticas fsicas peculiares, o que os distinguem de outras

    plantas lenhosas. Uma das grandes diferenas a forma de crescimento. Enquanto as

    rvores crescem em sentido radial em sua seo, desenvolvendo a estrutura de caule,

    galhos e folhas simultaneamente, os bambus brotam com o seu dimetro definitivo e

    crescem verticalmente sem nenhuma ramificao horizontal. Apenas o colmo sedesenvolve com taxas de crescimento muito surpreendentes. Segundo Hidalgo, no seu livro

    Bamboo, The Gift of the Gods, (2003,p.11) o bilogo japons Koichiro Uedacoletou e

    observou nmeros admirveis de crescimento num perodo de 24 horas:

    a) 91,3 cm para o Bambusa arundinacea, observado no Kew Gardens na Inglaterra em1855;

    b) 88 cm para oPhyllostachys edulis(Ph. pubescens) por K. Shibata observado no JardimBotnico Koishikawa, em Tquio, em 1898;

    c) 119 cm para oPhyllostachys edulis, (dimetro de 16 cm), observado em 24 de maio de1956 por Koichiro Ueda, no jardim da prefeitura de Kyoto, no Japo,em 1955;

    d) 121cm para oPhyllostachys reticulata, conhecido vulgarmente como bambu Madake(12

    cm de dimetro) medido por K. Ueda em 23 de Junho de 1955, nos arredores de Kyoto, noJapo.

    Na Colmbia, o mximo de crescimento registrado para o Gudua angustifliafoi de 30

    cm em 24 horas, segundo Hidalgo (1978). Nesta pesquisa, observamos e medimos

    crescimento da ordem de 42 cm em 24 horas para bambus da espcie Bambusa vulgaris,

    em junho de 2004, plantados em 2001 em Aracaju.

    ________________________

    O livro Bamboo, The Gift of the Godsdo professor colombiano Oscar Hidalgo Lpez, publicado em 2003 (553 p.)que inclui todas a sua produo cientfica anterior, considerada a mais abrangente e completa publicao sobre o bambue fonte de consulta e referncia principal para todos os pesquisadores do tema.

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    Captulo 3O bambu 28

    Liese (1985) assegura que por esta caracterstica peculiar de crescimento acelerado, o

    bambu se distingue como um rpido seqestrador de carbono da atmosfera. Sendo o

    recurso natural e florestal que menos tempo leva para ser renovado, um material

    ecolgico, com excelentes caractersticas fsicas, qumicas e mecnicas, que lhe

    possibilitam milhares de aplicaes ao natural ou processado. Ainda, por ser uma cultura

    tropical perene e por produzir colmos assexuadamente ano aps ano sem necessidade de

    replantio, Pereira (2001) afirma que possui grande potencial agrcola, podendo ser

    utilizado em reflorestamentos e como regenerador/protetor ambiental.

    O bambu ajusta-se idia de sustentabilidade ambiental e de ecodesenvolvimento como

    podemos perceber ao ler a afirmao de Farrely (1984,p. 76): nunca haver em nosso

    planeta suficiente flautas de prata para dar a todos, mas facilmente haver bambu osuficiente para que cada um faa sua prpria flauta e toque.

    Lpez (2003) descreve que o bambu conhecidocomo "a madeira dos pobres" na ndia,

    "o amigo das pessoas" na China e "o irmo" no Vietn, e uma planta ancestral de crescente

    importncia para a humanidade:

    Tem-se revivido hoje em dia, muitos dos antigos usos que se faziam com o bambu,

    com aplicaes em medicina, farmcia, qumica e outros campos industriais, como

    um extratode slicachamado tabashir, empregado contra asma e como afrodisaco.

    Da camada externa do colmo se produz uma bebida antitrmica, das folhas verdes

    uma loo para os olhos e ainda, produtos como enzimas, hormnios, substncias

    para cosmticos, xampus, cultivo de bactrias, carvo, energia, leo comestvel,

    lcool, tecidos, aquedutos, cordas, pontes, papel, artesanato, construo civil e

    rural, material para engenharia e alimento. (LPEZ,2003, p. 533)

    Devido a disposio das fibras que compem os colmos se dar apenas no sentido

    longitudinal destes, os bambus podem ser facilmente seccionados axialmente, produzindo-

    se tiras ou ripas que podem ser aplicadas em diversos usos artesanais ou na construo

    _______________________

    O Professor Oscar H-Lpez no seu livro Bamboo, The Gift of the Gods, (2003, p.522) no captulo Usos do bambuno campo da medicina, cita 32 produtos farmacolgicos derivados do bambu de largo uso teraputico no Oriente, aindadesconhecidos comercialmente no Brasil.

  • 7/26/2019 Bambu Construo de Galpo.pdf

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    Captulo 3O bambu 29

    civil. As ferramentas para o desenvolvimento dessas tarefas so, geralmente, simples e

    manuais, o que torna esse desdobramento barato e acessvel a comunidades de baixa

    renda.

    Ainda que se reconhea a falta de informaes cientficas sobre o comportamento de

    muitas espcies, Schaur (1985), o credencia como a madeira do futuro, inclusive para a

    indstria da construo civil.

    Um dos exemplos mais significativos de confiana depositada em suas

    propriedades fsicas e mecnicas, segundo Barros (1986), foi a construo da

    aeronave Demoiselle, de Santos Dumont, com fuselagem constituda por dois

    conjuntos de trs hastes de bambu com 6,7 m de comprimento e que alcanava aenvergadura de 6,6 m. Este foi o modelo de maior comercializao nos anos de

    1909 e 1910, com mais de quarenta unidades vendidas. No se encontrou registro

    sobre a espcie de bambu escolhida por Santos Dumont que as indstrias de L.

    Dutheil, R. Chalmers et Cie. E Clment-Bayard tiveram que adotar, para fabricar o

    Demoisellecom tanto sucesso na poca.(PIMENTEL, 1997, p. 5)

    Ainda, como parte da histria, afirma Lpez (2003), sabe-se que o primeiro filamento

    utilizado em uma lmpada por Tomas Edson foi de bambu e que o imponente TajMahal, construdo em 1634, tinha, at 1998 quando de uma restaurao promovida pelo

    governo indiano, a sua cpula principal, com cerca de 20 metros de dimetro, estruturada

    com colmos de bambu, sob uma espessa camada de argila.

    Os variados potenciais de uso comunitrio e industrial tornam o bambu um produto

    dinmico, que pode ser alocado para mltiplos usos, adequados a muitas situaes. Nesse

    sentido, a Rede Internacional para o Bambu e o Rat,- INBAR (International Network

    for Bamboo and Rattan) (2005), afirma que atualmente o bambu um insumo de grande

    importncia na economia de pases asiticos como Vietn, Indonsia e Malsia,

    movimentando valores da ordem de sete bilhes de dlares americanos por ano. Cerca de

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    O rat uma palmcea trepadeira (Calamus rotang), nativa de regies tropicais,especialmente da ndia e da Malsia,cujo est