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As elites da Justiça: instituições, profissões e poder na política da justiça brasileira Frederico de Almeida RESUMO O presente trabalho busca sistematizar o referencial teórico utilizado em um estudo sobre as elites jurídicas e a política da justiça no Brasil. A partir de problemas metodológicos trazidos pela pesquisa empírica, o artigo busca apresentar as articulações feitas entre a sociologia das elites propriamente, os estudos de sociologia das profissões jurídicas e as análises institucionais da ciência política sobre o sistema de justiça para a identificação e a análise das elites jurídicas e de sua ação política ao nível da administração superior e da reforma do sistema de justiça no Brasil. A articulação desses referenciais teóricos foi possível a partir de uma confrontação entre as concepções de sistema de justiça e de campo jurídico. A partir da revisão da literatura dessas diferentes tradições teóricas e da ilustração dos problemas metodológicos por meio de conjunto de dados selecionados, conclui-se pela pertinência do uso da noção de campo jurídico como moldura teórica para se entender as distinções e hierarquizações de bases institucional, profissional e social que produzem elites da política da justiça no Brasil. PALAVRAS-CHAVE: elites jurídicas; política da justiça; sistema de justiça; campo jurídico; reformas judiciais. Recebido em 27 de Novembro de 2013. Aprovado em 26 de Agosto de 2014. I. Introdução 1 O presente trabalho busca sistematizar o referencial teórico utilizado por mim em um estudo sobre as elites jurídicas e a política da justiça no Brasil 2 . Partindo do objetivo inicial de identificar os atores políticos relevantes do processo de reforma do Judiciário no Brasil, aquela pesquisa logo se defrontou com algumas questões teóricas e empíricas que definiram o referencial teórico abaixo descrito. O primeiro conjunto de questões decorreu de um aspecto essencialmente institucional do sistema de justiça estatal brasileiro: sua fragmentação federa- tiva e multiprofissional, ou seja, uma estrutura constitucional que estabelece uma divisão do poder Judiciário entre justiça federal e justiças estaduais; a autonomia entre elas e de cada justiça estadual; uma organização estrutural- mente simétrica do Ministério Público; a combinação entre autonomia política da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e sua inserção no desenho consti- tucional do sistema de justiça. Esse aspecto institucional da organização da justiça estatal, que nos leva à imagem de vários sistemas de justiça (Falcão 2005), trouxe as seguintes questões para a pesquisa: como foi possível realizar a reforma do Judiciário de 2004 em um cenário de dificuldades institucionais de coordenação nacional de organizações e carreiras tão autonomizadas? Quais as lideranças e os processos políticos possíveis para uma ação de âmbito nacional no sentido da construção de uma agenda e de um processo político de aprovação e execução de uma reforma do Judiciário? O segundo conjunto de questões decorreu de outro tipo de autonomia construída historicamente no interior do sistema de justiça, e que se sobrepõe e se confunde com as diversas autonomias decorrentes da fragmentação institu- DOI 10.1590/1678-987314225206 Artigo Rev. Sociol. Polit., v. 22, n. 52, p. 77-95, dez. 2014 1 Este artigo é uma versão modificada do capítulo introdutório de minha tese de doutoramento (Almeida 2010a). Agradeço aos comentários de Flávio Heinz no colóquio Elites em diferentes escalas: teoria e metodologia no estudo de grupos dirigentes, onde uma primeira versão desse texto foi apresentada; e aos comentários dos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e Política à versão final. 2 Para uma síntese dos resultados dessa pesquisa, ver Almeida (2010b).

Bernard Stiegler, pensador do humano e da tecnologia

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Introdução ao pensamento de Bernard Stiegler.

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  • As elites da Justia: instituies,

    profisses e poder na poltica da justia

    brasileira

    Frederico de Almeida

    RESUMO

    O presente trabalho busca sistematizar o referencial terico utilizado em um estudo sobre as elites jurdicas e a poltica da justia no

    Brasil. A partir de problemas metodolgicos trazidos pela pesquisa emprica, o artigo busca apresentar as articulaes feitas entre a

    sociologia das elites propriamente, os estudos de sociologia das profisses jurdicas e as anlises institucionais da cincia poltica

    sobre o sistema de justia para a identificao e a anlise das elites jurdicas e de sua ao poltica ao nvel da administrao superior

    e da reforma do sistema de justia no Brasil. A articulao desses referenciais tericos foi possvel a partir de uma confrontao entre

    as concepes de sistema de justia e de campo jurdico. A partir da reviso da literatura dessas diferentes tradies tericas e da

    ilustrao dos problemas metodolgicos por meio de conjunto de dados selecionados, conclui-se pela pertinncia do uso da noo

    de campo jurdico como moldura terica para se entender as distines e hierarquizaes de bases institucional, profissional e social

    que produzem elites da poltica da justia no Brasil.

    PALAVRAS-CHAVE: elites jurdicas; poltica da justia; sistema de justia; campo jurdico; reformas judiciais.

    Recebido em 27 de Novembro de 2013. Aprovado em 26 de Agosto de 2014.

    I. Introduo1

    Opresente trabalho busca sistematizar o referencial terico utilizado pormim em um estudo sobre as elites jurdicas e a poltica da justia noBrasil2. Partindo do objetivo inicial de identificar os atores polticosrelevantes do processo de reforma do Judicirio no Brasil, aquela pesquisa logose defrontou com algumas questes tericas e empricas que definiram oreferencial terico abaixo descrito.

    O primeiro conjunto de questes decorreu de um aspecto essencialmenteinstitucional do sistema de justia estatal brasileiro: sua fragmentao federa-tiva e multiprofissional, ou seja, uma estrutura constitucional que estabeleceuma diviso do poder Judicirio entre justia federal e justias estaduais; aautonomia entre elas e de cada justia estadual; uma organizao estrutural-mente simtrica do Ministrio Pblico; a combinao entre autonomia polticada Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e sua insero no desenho consti-tucional do sistema de justia. Esse aspecto institucional da organizao dajustia estatal, que nos leva imagem de vrios sistemas de justia (Falco2005), trouxe as seguintes questes para a pesquisa: como foi possvel realizar areforma do Judicirio de 2004 em um cenrio de dificuldades institucionais decoordenao nacional de organizaes e carreiras to autonomizadas? Quais aslideranas e os processos polticos possveis para uma ao de mbito nacionalno sentido da construo de uma agenda e de um processo poltico de aprovaoe execuo de uma reforma do Judicirio?

    O segundo conjunto de questes decorreu de outro tipo de autonomiaconstruda historicamente no interior do sistema de justia, e que se sobrepe ese confunde com as diversas autonomias decorrentes da fragmentao institu-

    DOI 10.1590/1678-987314225206

    Artigo Rev. Sociol. Polit., v. 22, n. 52, p. 77-95, dez. 2014

    1 Este artigo uma versomodificada do captulointrodutrio de minha tese dedoutoramento (Almeida2010a). Agradeo aoscomentrios de Flvio Heinzno colquio Elites emdiferentes escalas: teoria e

    metodologia no estudo de

    grupos dirigentes, onde umaprimeira verso desse texto foiapresentada; e aos comentriosdos pareceristas annimos daRevista de Sociologia e

    Poltica verso final.2 Para uma sntese dosresultados dessa pesquisa, verAlmeida (2010b).

  • cional colocada pelo desenho constitucional: a autonomia profissional, enten-dida no sentido da sociologia das profisses, construda como ideologiaidentitria e prtica poltica de magistrados, membros do Ministrio Pblico eadvogados na demarcao de fronteiras entre si e entre eles e o Estado e omundo da poltica (Bonelli 2002). A dimenso profissional dos grupos dejuristas que administram a justia estatal trouxe as seguintes questes para apesquisa: como se deu a representao poltica dessas profisses no processopoltico da reforma do Judicirio? Como a demarcao de fronteiras entre essesgrupos e entre eles e o mundo da poltica afetou suas estratgias de ao polticaem relao reforma?

    Por fim, um terceiro conjunto de questes decorreu da constatao, ao longoda pesquisa emprica, do protagonismo poltico de grupos de juristas que,embora tivessem inseres nas instituies e nas organizaes profissionais dosistema de justia, qualificavam sua atuao no processo poltico da reforma dajustia como intelectuais, como especialistas em uma dimenso especfica dareforma do Judicirio que a legislao processual, que define os ritos deresoluo de conflitos por meio do qual agem instituies e profissionais dajustia. Essa dimenso da reforma da justia no Brasil trouxe as seguintesquestes: como entender o protagonismo de atores sem posio institucional su-perior, mas com grande influncia nos processos polticos de reforma doJudicirio gestados e desenvolvidos no interior do Estado brasileiro? Qual arelao estabelecida entre esses atores e os atores cuja caracterizao comoatores polticos decorre de sua posio na estrutura institucional do sistema dejustia?

    Esses conjuntos de questes levaram aquela pesquisa na direo de umestudo sobre elites: estava claro que o problema da liderana poltica da reformaem mbito nacional s poderia ser enfrentado caso se passasse a considerar osatores jurdicos do processo como grupos dirigentes de um sistema com ml-tiplas divises institucionais e profissionais. A fragmentao institucional dosistema de justia, a dimenso profissional das carreiras jurdicas e seu discursode autonomia, e o papel dos intelectuais com insero nas reformas, contudo,levaram-nos a problematizar o referencial terico das elites ou grupos diri-gentes em face dos achados empricos e das referncias tericas vindos deoutros campos de estudos.

    Este artigo busca, portanto, apresentar as articulaes feitas entre a socio-logia das elites propriamente dita, de um lado, e os estudos de sociologia dasprofisses jurdicas e as anlises institucionais da cincia poltica sobre osistema de justia, por outro. A moldura terica mais ampla encontrada para aarticulao desses diferentes elementos tericos foi o conceito de campo jur-dico, de Pierre Bourdieu (2007a). Como demonstrarei abaixo, a ideia de umespao social de agentes, posies e relaes, constitutivas de distines evises de mundo prprias do direito, pareceu bastante til para a integrao dosaspectos institucionais e profissionais da organizao da justia estatal brasilei-ra, bem como para compreender os processos de diferenciao e hierarquizaoque produzem grupos dominantes as elites da justia capazes de impordiscursos legtimos e prticas polticas para a administrao superior e a refor-ma do aparato da justia estatal.

    II. Campo jurdico e sistema de justia

    Com maior ou menor rigor, com maior ou menor definio conceitual, asnoes de campo jurdico e sistema de justia vm sendo utilizadas em diversosestudos de cincias sociais sobre o funcionamento da justia no Brasil, seusagentes e suas instituies. De uma maneira bastante esquemtica e, conse-quentemente, um tanto imprecisa possvel dizer que a noo de campo

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  • jurdico mais comum em estudos de vis sociolgico ou antropolgico, aopasso que a de sistema de justia caracterstica dos estudos poltico-institucionais. Isso no quer dizer que no se verifique, na realidade, o usocombinado das duas expresses, ora tidas como sinnimos, ora como noescomplementares tal qual se percebe, por exemplo, nos estudos de Bonelli(1999b; 2002) e Sinhoretto (2011). Ainda que sob risco de certo preciosismo,sero dedicadas consideraes a fim de esclarecer de que maneira buscou-sesituar as instituies do chamado sistema de justia no interior do campojurdico, e a partir desse posicionamento, identificou-se o espao de aopoltica de elites jurdicas especialmente dedicadas administrao superior e reforma da justia.

    Segundo Sadek, cientista poltica e uma das principais mobilizadoras, noBrasil, da noo corrente de sistema de justia3 nos trabalhos de orientaopoltico-institucional:

    A constituio e o desenvolvimento de uma rea temtica centrada nas insti-tuies que compem o sistema de justia correlacionam-se fortemente com oEstado de Direito, com a democracia formal e sua consolidao. [...] A agenda daCincia Poltica como das demais Cincias Sociais s passou a incorporarestudos sobre o Judicirio e sobre as outras instituies que compem o sistemade justia nos anos de 1990, quando o regime democrtico passou a ser consi-derado um valor em si mesmo e quando os efeitos da Constituio de 1988tornaram-se visveis (Sadek 2002, p. 236).

    Prossegue a autora:

    Entendemos por sistema de justia o conjunto de instituies estatais encarre-gadas de garantir os preceitos constitucionais, de aplicar a lei e de distribuirjustia. [...] [A]o se constituir como uma rea relativamente autnoma, teminvocado e chamado para si questes anteriormente tratadas por outras socio-logias especializadas e outras disciplinas, quer do Direito quer das CinciasSociais e da Histria. Mas, ao incorporar essas questes, transforma-as, exami-nado-as sob uma tica distinta. Isto , prope que as anlises sobre aqueles temastenham por eixo ou fio condutor as instituies judiciais (idem, p. 237).

    Em outra passagem do mesmo artigo, Sadek refora dois aspectos sugeridosnas passagens transcritas acima, centrais na formulao do conceito de sistemade justia: seu carter institucional-formal e sua vinculao organizaojurdico-constitucional do poder. Afirma a autora:

    A Constituio de 1988 e os papis atribudos ao Judicirio, ao MinistrioPblico, Defensoria Pblica, Procuradoria da Repblica, Advocacia Geralda Unio, s polcias, aos advogados, enfim aos operadores do Direito, repre-sentam uma mudana radical, no apenas no perfil destas instituies e de seusintegrantes, mas tambm em suas possibilidades de atuao na arena poltica ede envolvimento com questes pblicas. [...] Esse Judicirio, com baixssimarealidade poltica, ganhou vitalidade na ordem democrtica ou, ao menos,foram-lhe propiciadas condies de romper com o encapsulamento em quevinha vivendo desde suas origens. No que se refere s demais instituies dosistema de justia, a converso foi ainda maior: conquistaram recursos de poder eum espao que extrapola (em excesso, diriam alguns) os limites de funesexclusivamente judiciais (idem, pp. 253-254).

    De fato, uma anlise formal do modelo institucional-constitucional dosistema de justia seria, do ponto de vista de qualquer anlise poltica, um passoimportante, se no o primeiro, de uma investigao sobre a justia estatal dequalquer pas. O objetivo, como j dito, agregar anlise da organizao dajustia brasileira, a partir de seu desenho constitucional, consideraes relacio-nadas a outras formas de estruturao e organizao do poder que no somenteaquelas previstas nos desenhos institucionais e nas constituies polticas, e queser buscada justamente na teoria dos campos sociais, de Bourdieu.

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    3 No se poder ignorar,tambm, a influncia daexpresso judicial system,utilizada em lngua inglesa, eespecialmente no EstadosUnidos, como equivalente apoder Judicirio, no spelos cientistas polticas,como tambm pelosoperadores do sistema.

  • Essas consideraes no so de todo ausentes nas anlises institucionais, jque, como afirma Sadek (idem), a delimitao do chamado sistema de justiatem por objetivo constituir-se em uma linha de anlise, um parmetro deorganizao de uma vasta produo de cincia social sobre o funcionamento dajustia estatal em torno de um objeto comum, qual seja, a qualidade de nossademocracia, afervel tambm por seu desempenho judicial ou, em outraspalavras, pelo desempenho de suas instituies de justia. Da, conforme Sadeksugere na transcrio acima, a ideia de sistema de justia como eixo, ou fiocondutor, de anlises desenvolvidas por diferentes disciplinas das cinciassociais, bem como da histria e do direito, em torno de um objeto que maisamplo do que o poder judicirio (Sadek 1999, p. 11).

    Buscou-se avanar, portanto, na construo de uma moldura terica maisabrangente, que possa ser aplicada a outros objetos de pesquisa sobre a adminis-trao da justia estatal brasileira e que permita a integrao de variveissociolgicas anlise institucional, possibilitando um dilogo metodologica-mente estruturado de diferentes vertentes da produo da cincia social brasi-leira sobre o funcionamento da justia estatal4. Nessa proposta metodolgica,portanto, variveis sociolgicas e institucionais articulam-se desde o primeiromomento do trabalho de pesquisa, ou seja, desde o momento inicial de formu-lao das primeiras hipteses de investigao, nas quais a origem, o exerccio ea distribuio do poder no interior do sistema de justia devem necessariamenteconsiderar processos e fenmenos de origem social e simblica (mais especifi-camente, aqueles relacionados s divises de classe, gnero e prestgio), bemcomo aqueles decorrentes das funes e divises poltico-institucionais (maisespecificamente, aqueles relacionados ao desenho constitucional formal e sfunes e denominaes oficiais das instituies e dos agentes do sistema). Paratanto, parte-se dos estudos de Sadek e seus colaboradores sobre o sistema dejustia (Sadek 1999; 2001; 2002; 2003; 2004a; 2004b; 2006; Sadek & Arantes2001; Sadek & Dantas 2001; Sadek & Cavalcante 2003), para, por meio de umdilogo com uma ampla literatura sobre o funcionamento das instituies dejustia no Brasil, construir um objeto (a poltica da justia, ou seja, o espao deagentes e aes polticas voltadas para a administrao superior e a reforma dajustia estatal) que permita compreender as origens, a organizao e a distri-buio do poder de direo e controle da administrao da justia estatal.

    Da mesma forma como a mera listagem de posies institucionais serviriapara a identificao das elites jurdicas, ela serviria tambm para a delimitaoformal do espao institucional do poder de administrao da justia estatal.Entretanto, como sugerido acima, acredita-se que o poder da administrao dajustia estatal no exercido e delimitado apenas por posies e arenas institu-cionais; em outras palavras, o espao de circulao e exerccio desse poder dedireo superior e reforma da justia estruturado a partir da concentrao dediversas formas de capitais no apenas institucionais, mas tambm sociais epolticos, como demonstrado a partir das anlises de trajetrias com foco emvariveis como experincias profissionais e polticas, gnero e faculdades deorigem e, principalmente, da articulao que essas estruturas de capitaiscompartilhados permitem entre diferentes posies institucionais, ocupadas pormembros com trajetrias e perfis semelhantes. Alm disso, como demonstradona anlise do poder dos intelectuais com atuao na reforma do Judicirio, esseespao de poder inclui, tambm, posies margem do organograma do sistemade justia embora as comisses de reforma processual, no mbito do Execu-tivo e do Legislativo, e de um conselho de pesquisas judicirias, no mbito doConselho Nacional de Justia, apontem para algum grau de institucionalizaoformal dessas posies de poder.

    A existncia desse espao de poder, no qual transitam agentes com estru-turas de capitais semelhantes, ajuda a entender como se d a unidade poltica

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    4 Para importantes revises daliteratura de cincias sociaissobre o funcionamento dajustia no Brasil, seusdesenvolvimentos e divisesdisciplinares, ver Junqueira(1996) e Sadek (2002). Porfim, importante mencionar oesforo de sistematizao daliteratura levado a cabo porSinhoretto (2011), que fazuma crtica das revises feitaspor Junqueira e Sadek.

  • nacional de um sistema de justia formalmente fragmentado, tendo em vista suaestrutura federativa e dual. Nesse aspecto, a criao dos Conselhos Nacionais deJustia (CNJ) e do Ministrio Pblico (CNMP), bem como os mecanismosprocessuais que aumentaram o poder jurisdicional do Supremo Tribunal Fed-eral (smulas vinculantes e repercusso geral dos recursos), apenas consoli-daram, pela via da institucionalizao no aparato estatal da administrao dajustia, um poder j concentrado em um plo nacional dominante, estruturadoem torno das posies institucionais do Supremo Tribunal Federal (STF), doSuperior Tribunal de Justia (STJ), da Procuradoria-Geral da Repblica (PGR)e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e de suas relaes com as cpulasdos sistemas estaduais e federal de justia, bem como de suas alianas comgrupos intelectuais to bem delimitados e concentrados como os especialistasem direito processual.

    Para Bourdieu (2007a), o processo de institucionalizao (ou simplesmenteinstituio) caracterizado como um acmulo lento de conquistas histricas,fruto da ao de agentes em disputa por princpios de diviso e organizao domundo social, capaz de restringir as possibilidades de ao e transformao domundo pela incorporao e reificao contnua da histria. Segundo o autor:

    O processo de instituio, de estabelecimento, quer dizer, a objetivao e aincorporao como acumulao nas coisas e nos corpos de um conjunto deconquistas histricas, que trazem a marca das suas condies de produo e quetendem a gerar as condies da sua prpria reproduo (quanto mais no peloefeito de demonstrao e imposio das necessidades que um bem exerceunicamente pela sua existncia), aniquila continuamente possveis laterais. medida que a histria avana, estes possveis tornam-se cada vez mais impro-vveis, mais difceis de realizar, porque a sua passagem existncia suporia adestruio, a neutralizao ou a reconverso de uma parte maior ou menor daherana histrica que tambm um capital , e mesmo mais difceis de pensar,porque os esquemas de pensamento e de percepo so, em cada momento,produto das opes anteriores transformadas em coisas (idem, p. 101).

    A compreenso conjunta de processos formais/estatais e informais/so-cietais de institucionalizao para a construo do campo e do objeto de estudo possvel a partir da ideia de que as estruturas do campo tm diferentes pesosrelativos (idem), tendo o Estado um papel especial na legitimao e oficiali-zao de divises e hierarquias social e politicamente construdas (Bourdieu1989); alm disso, segundo Bourdieu (2007a), essa compreenso conjunta deprocessos temporalmente distintos de institucionalizao deve constituir-se nofoco de anlise do cientista social, apesar de muitas vezes reproduzirem-se emtempos histricos diversos.

    Bourdieu um dos autores da teoria social contempornea dedicados aoesforo terico de conciliao entre ao e estrutura na explicao dos fenme-nos sociais (Cohen 1999; Vandenbergue 2006). Seu conceito de habitus umaviso de mundo compartilhada por indivduos com caractersticas sociaiscomuns, produzida pela ao de mecanismos como a educao formal e famil-iar, ritos de passagem e prticas de sociabilidade que incutem nos indivduos asestruturas objetivas de poder no campo e na sociedade e que definem suasprprias posies (e posturas, prticas, gestual etc.) nesse campo (Bourdieu2007a; 2007b) , associado ao conceito de campo um espao social deestruturas e agentes com caractersticas comuns e que disputam um tipo de capi-tal prprio desse espao, como o capital poltico ou o capital jurdico (Bourdieu2007a; 2007b) , fornece uma importante teoria da ao e, ao mesmo tempo,uma interessante soluo para o aparente dilema ao vs. estrutura na teoriasocial5, em geral, e para a anlise institucional, especificamente. O aprofun-damento da anlise do habitus confere dinmica e substncia ao campo comoobjeto de pesquisa ao identificar na ao dos agentes tanto a histria incor-

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    5 Sobre esse e outros dilemas(ou encruzilhadas)fundamentais da cincia

  • porada em suas trajetrias individuais como a histria reificada nas institui-es, ou seja, ao revelar a presena de elementos subjetivos e objetivos quedeterminam as estratgias, concebidas como o senso prtico dessa ao,empiricamente verificado no caso concreto em estudo (Lamaison & Bourdieu1986). Segundo Bourdieu (2007b, p. 164):

    A teoria da ao que proponho (com a noo de habitus) implica dizer que amaior parte das aes humanas tem por base algo diferente da inteno, isto ,disposies adquiridas que fazem com que a ao possa e deva ser interpretadacomo orientada em direo a tal ou qual fim, sem que se possa, entretanto, dizerque ela tenha por princpio a busca consciente desse objetivo [...]. O melhorexemplo de disposio , sem dvida, o sentido do jogo: o jogador, tendointeriorizado profundamente as regularidades de um jogo, faz o que faz nomomento em que preciso faz-lo, sem ter a necessidade de colocar explici-tamente como finalidade o que deve fazer. Ele no tem necessidade de saberconscientemente o que faz para faz-lo, e menos ainda de se perguntar explici-tamente (a no ser em algumas situaes crticas) o que os outros podem fazerem resposta, como faz crer a viso do jogo de xadrez ou de bridge que algunseconomistas (especialmente quando aderem teoria dos jogos) atribuem aosagentes.

    O campo, porm, no uma estrutura politicamente neutra; ao contrrio, nele que so produzidas formas de dominao especficas, bem como sereproduzem formas de dominao prprias de outros campos sociais, que setraduzem na lgica especfica de cada um desses espaos sociais. O problema dadominao est na base dos estudos de Weber sobre a burocracia (Tragtenberg1974; Giddens 1998) e tambm da anlise marxista de classes (Miliband 1999);o trabalho de Bourdieu, no que se refere dominao, pode ser consideradouma forma de conciliao entre essas duas tradies, sntese possvel por meiode sua teoria dos campos do poder e pela anlise do poder a partir das estruturase dos volumes de diversos capitais, que resultam em diferentes posies depoder (incluindo a de classe), e na produo cultural como meio de violncia edominao simblica.

    Para Bourdieu, ao menos em uma etapa inicial do projeto cientfico, aconstruo de um campo como objeto de pesquisa deve se dar como construoprvia do esquema de relaes dos agentes e instituies objeto do estudo, ouseja, entre as posies do campo. Essa etapa define a problemtica do campo apartir de um modelo, no no sentido de regularidades pr-definidas como leisou formalizadas matematicamente, mas sim no sentido de proposies a seremtestadas, que antecedem a experimentao, um sistema coerente de relaes,que deve ser posto prova como tal (Bourdieu 2007a, p. 32). Aps a reconstru-o da lgica do campo, por meio de uma interpretao das causas estruturaisque escapam conscincia dos agentes (Thiry-Cherques 2006, p. 45), obede-cendo a um trabalho de deduo e induo que corrige permanentemente oesquema inicial de anlise, conferindo-lhe substncia com a incorporao dosresultados de pesquisa emprica, e do habitus do campo, ou seja, a congrunciade elementos subjetivos e objetivos que determinam as estratgias dessa ao, amatriz relacional inicial de anlise deve ser corrigida, buscando-se o queThiry-Cherques (idem, p. 50) denomina sntese da problemtica geral do cam-po.

    Essa etapa final encaminha o trabalho de pesquisa para suas concluses emtermos de recolocar os problemas iniciais, buscando respostas s questes porele colocadas, teorias que o expliquem e novos desdobramentos e hipteses depesquisa futura a partir desse novo estado de conhecimento do campo. Oconhecimento da problemtica do campo orienta o analista para a identificaodo senso do jogo que estrutura as prticas naquele campo e do prpriotrabalho de codificao e normatizao social que produz as regras e as regula-ridades imediatamente apreensveis pelo cientista social.

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    social, ver Tilly (2004).Buscou-se enfrentar cada umdesses dilemas, de uma formamais detalhada, no captulointrodutrio de minha tese dedoutoramento (Almeida2010a).

  • A teoria dos campos tem, portanto, carter essencialmente metodolgico e,nas palavras de Bourdieu (2007a, p. 31), o limite de um campo o limite deseus efeitos, ou, em outro sentido, um agente ou uma instituio faz parte de umcampo na medida em que nele sofre efeitos ou nele os produz o que, deacordo com o programa de pesquisa escolhido, s se define ao final da pesquisa.

    Nesse sentido, a opo por mesclar a anlise de processos histricos delongo prazo relacionados com a institucionalizao do campo acadmico emdireito e das estruturas burocrticas e profissionais da justia estatal com areconstruo de processos histricos conjunturais , mais especificamente oprimeiro ciclo da reforma do Judicirio de 2003 a 2004 e os conflitos conjun-turais entre profisses e posies hierrquicas do campo jurdico em torno defronteiras entre grupos e de nomeaes para tribunais superiores6 , teve porobjetivo justamente compreender a interao entre indivduos, e entre eles e aestrutura social em dois contextos diversos, nos quais os horizontes das estrat-gias e tomadas de deciso diferem no tempo e no grau de conscincia da ao.Assim, no se acredita descabido afirmar que estratgias, no sentido dado porBourdieu ou seja, de aes semiconscientes ou inconscientes, adotadasconforme o senso do jogo ou o habitus da posio social do agente , sejammelhor apreensveis, na anlise social, na reconstruo das trajetrias de longoprazo que definem as posies dos agentes no campo jurdico e dos padres deconflito e interao entre os diversos grupos profissionais de juristas, princi-palmente quando se analisam os deslocamentos intergeracionais de um mesmogrupo de elite. Por outro lado, tambm no parece equivocado afirmar que, naanlise da ao dos grupos de elites jurdicas no processo poltico conjuntural dareforma do Judicirio e dos conflitos interprofissionais e hierrquicos, anali-dados em Almeida (2010a), estejam presentes outras estratgias, no sentidodado pelos adeptos da escolha racional, ou seja, de clculos conscientes eracionais. Sobre esse ponto, em especial, tecer-se- mais algumas conside-raes adiante, ao discorrer-se sobre o papel das elites em processos conjun-turais.

    Em suma, o importante de se apreender dessa escolha metodolgica inicial a concepo do poder como resultado de processos histricos e relacionais, nosquais agentes disputam posies tendo por recurso suas prprias quantidades depoder simblico (seus capitais), em um contexto estruturado (o campo) eestruturante da ao poltica (por meio do habitus), ele prprio capaz deproduzir novas formas e posies de poder. Assim, se verdade que o Estado uma organizao caracterizada pelo monoplio do uso legtimo da violncia,nos termos weberianos, tambm verdade que esse monoplio se apresentacomo uma reivindicao (Weber 1972, p. 56), um processo no qual a tendnciade concentrao do poder pelo Estado se d em disputa e relao com ospoderes privados ou seja, um Estado constitudo como campo de foras ecampo de lutas orientados para o monoplio da manipulao legtima dos benspblicos (Bourdieu 2005, p. 41). No caso de minha pesquisa sobre as elitesjurdicas brasileiras, esse referencial me permitiu situar a poltica da adminis-trao superior e da reforma da justia brasileira para alm das instituiesformais do sistema de justia, bem como identificar suas elites para alm dosdetentores oficiais de cargos pblicos naquelas instituies.

    III. Os juristas como profissionais

    Outra perspectiva terica que orientou estudos prvios sobre as elites jurdi-cas e a administrao da justia estatal (Almeida 2010a; 2010b; 2012) foi a dasociologia das profisses, especialmente da maneira como est nos estudos deFreidson (1996; 1998) e de Rueschemeyer (1964; 1977; 1986). Embora no seignore a multiplicidade de abordagens sociolgicas sobre as profisses e o

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 83

    6 Ver o captulo 4 de minhatese de doutoramento(Almeida, 2010a).

  • profissionalismo (Diniz 1996; Coelho 1999; Bonelli 1999a), creio que osautores escolhidos, em especial Freidson, enfrentam temas que so comuns aodebate mais amplo da sociologia das profisses, ao mesmo tempo em queincluem, em suas anlises, elementos relativamente consensuais na caracteri-zao sociolgica das profisses: (i) sua constituio como grupo social epoltico a partir de um projeto poltico de autogoverno; (ii) a exigncia de di-ploma de nvel superior, o credencialismo e o controle sobre o exerccioprofissional monopolizado pelo grupo; (iii) o papel da liderana profissional naconduo daquele projeto poltico e na interao com o Estado, o mercado e asociedade na conquista e manuteno de seu monoplio profissional; (iv) adiferenciao em relao a outras formas de organizao do trabalho, como aburocracia e a livre concorrncia do mercado.

    Entendida, portanto, em perspectiva dinmica, a profissionalizao podeser definida ento como o processo pelo qual uma ocupao empreende umprojeto poltico de conquista de um abrigo estvel no mercado de trabalho,

    caracterizado por negociaes e conflitos com consumidores, ocupaes cor-

    relatas e principalmente o Estado na legitimao social e poltica de sua exper-tise, na definio de competncias e ttulos distintivos de seu conhecimentoespecializado e de sua jurisdio e na construo de artifcios institucionais de

    autogoverno e credencialismo dos pares (Rueschemeyer 1986; Freidson 1996;1998).

    Todas essas caractersticas esto presentes, em maior ou menor grau, naorganizao dos juristas brasileiros analisados em Almeida (2010a) mesmo demagistrados e membros do Ministrio Pblico que, ao contrrio da advocacia(mais prxima do tipo-ideal de profisso liberal), organizam-se comocarreiras de Estado. Alis, acredita-se que a partir da dinmica dos conflitosentre sua organizao burocrtica (ligada ao Estado e sujeita a algum grau decontrole hierrquico administrativo) e suas caractersticas propriamenteprofissionais (a autonomia de suas funes e o grau de controle prprio sobre orecrutamento e o exerccio profissional) que se pode compreender a constitui-o da magistratura e do Ministrio Pblico, bem como de suas associaesrepresentativas, como atores polticos relevantes na poltica da administrao ereforma da justia. Da mesma forma, mesmo a advocacia e a Ordem dosAdvogados do Brasil, mais prximas do modelo de organizao profissionalpura (ou seja, organizada fora do Estado), no podem ter seu poder e suaatuao poltica explicadas sem recurso sua relao com o Estado, seja por suaorigem corporativa, seja pelos trnsitos de suas elites pelo campo poltico e pelocampo jurdico7.

    Embora nem sempre na chave terica de autores consagrados e propria-mente identificados sociologia das profisses (como Freidson, Terence Hal-liday e Magali Larson), mas especialmente no que se refere sociologia dasprofisses jurdicas, merecem destaque alm dos trabalhos j citados deFreidson e Rueschemeyer, que tm nos advogados (ou lawyers) objetos prefe-renciais de estudo o trabalho comparativo de Abel (1982); o estudo deEllmann (1992) sobre os advogados de interesse pblico e a mobilizao decausas coletivas nos Estados Unidos; a pesquisa de Heinz, Nelson e Laumann(2001) sobre a diversificao das prticas jurdicas de advogados e escritriosde Chicago; a coletnea de artigos organizada por Cummings (2011) sobre oparadoxo das profisses jurdicas, entre sua funo pblica de realizao dajustia e os aspectos mercantis de sua lgica de funcionamento como prestaode servio. Estabelecendo uma articulao entre a sociologia do campo jurdicode Bourdieu e uma sociologia das profisses jurdicas (ou dos juristas), possvel citar, ainda, os trabalhos de Yves Dezalay (Dezalay 1991; Dezalay &Trubek 1996; Dezalay & Garth 2000; 2002), que enfocam o papel do conhe-

    84 Frederico de Almeida

    7 Sobre a profissionalizaodo trabalho jurdico e suasrelaes com o Estadobrasileiro, ver captulo 6 deminha tese de doutoramento(Almeida 2010a).

  • cimento especializado dos juristas nas transformaes do Estado e do poder naEuropa e na Amrica Latina.

    No que se refere sociologia das profisses jurdicas no Brasil, a principalreferncia foram os estudos coordenados ou com participao de Maria daGlria Bonelli (Bonelli 1999b; 2002; 2003; 2008; Bonelli, Oliveira & Martins2006; Cunha et al., 2007; Bonelli et al. 2008). Esses estudos buscaram recons-truir o percurso por meio do qual magistrados, membros do Ministrio Pblico,advogados e delegados de polcia construram seus projetos polticos de auto-nomia profissional e suas prprias ideologias do profissionalismo, em conflitose negociaes com o Estado, o mercado e os demais grupos profissionais;identificou, ainda, as clivagens internas que, em muitos casos, marcam astrajetrias de institucionalizao e construo dos projetos profissionais dessesgrupos.

    Por fim, na mesma linha dos trabalhos de Yves Dezalay, j citados, teve-sepor referncia tambm os estudos de Engelmann (2006a; 2006b) sobre ainstitucionalizao e a diversificao das carreiras jurdicas e as lutas entregrupos profissionais no campo jurdico brasileiro.

    Como dito acima, esse referencial terico especfico mostrou-se til namedida em que pode se caracterizar os juristas e suas elites como membros degrupos profissionais, no sentido em que so definidas as profisses por suasociologia especfica e no sentido em que assim so caracterizadas as profissesjurdicas brasileiras pela ampla produo nacional baseada nesse referencialterico. O recurso sociologia das profisses ajudou a entender-se a evoluohistrica da relao entre direito e poltica na constituio desses gruposprofissionais, mais especificamente, no sentido de uma progressiva masnunca total diferenciao de atividades estritamente profissionais das ativi-dades tipicamente polticas. O Grfico 1 mostra como a passagem por cargospolticos legislativos e executivos diminui, mas no desaparece totalmente nacomposio social de um importante grupo das elites jurdicas brasileiras, queso os ministros do STF.

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 85

    Fonte: Almeida (2010a), a partir de Supremo Tribunal Federal.

    Grfico 1 - Porcentagens de ministros do Supremo Tribunal Federal com passagens porcargos polticos legislativos e executivos (Brasil, 1827 a 2008)

  • A perspectiva da sociologia das profisses ajudou, tambm, na identificaodos conflitos interprofissionais do campo jurdico brasileiro, como definidoresde clivagens e hierarquizaes entre profisses ao nvel das elites jurdicas, e naidentificao da importncia do associativismo profissional para a formao decapital poltico prprio desse campo. O Grfico 2 ilustrativo do primeiroaspecto, ao demonstrar como certas experincias profissionais so mais impor-tantes do que outras na construo de trajetrias de juristas que chegam ao STF;o Grfico 3, por sua vez, demonstra a importncia da experincia como lide-rana associativa no acmulo de capital poltico prprio da dinmica de repre-sentao dos grupos de juristas em disputa no campo jurdico brasileiro.

    IV. Os juristas como elite e a elite dos juristas

    A terceira perspectiva que orientou o estudo sobre as elites jurdicas e apoltica da administrao e da reforma da justia estatal (Almeida 2010a) foi,

    86 Frederico de Almeida

    Fonte: Almeida (2010a), a partir de Supremo Tribunal Federal.

    Grfico 2 - Porcentagens de ministros do Supremo Tribunal Federal de acordo astrajetrias profissionais (Brasil, 1827 a 2008)

    Fonte: Almeida (2010a), a partir de Supremo Tribunal Federal.

    Grfico 3 - Porcentagens de ministros do Supremo Tribunal Federal com passagens porcargos de liderana corporativa (Brasil, 1827 a 2008)

  • obviamente, a da sociologia das elites. Ao estabelecer interlocuo com asociologia das elites, buscou-se situar aquele estudo no esforo de retomadadesse tema pelas cincias sociais brasileiras (Perissinotto & Codato 2008) eidentificar bases para a comparao das elites jurdicas com outras elites sociais,econmicas, intelectuais, polticas e administrativas no Brasil.

    A opo pela abordagem das elites justifica-se, segundo Jos Murilo deCarvalho (2007, p. 25), porque uma das vantagens das abordagens clssicas dofenmeno das elites polticas a vinculao que fazem entre elite e dinmica so-cial. O autor identifica dois mtodos de anlise das elites desenvolvidos pelaliteratura: o primeiro, de posio, identifica a elite nas posies formais depoder, o que incluiria os cargos eletivos e burocrticos do Estado e das organi-zaes econmicas e profissionais; o segundo, de deciso, identifica a elite nosgrupos e nas pessoas que exercem poder real, mais do que institucional-formal,na estrutura social, podendo a fonte desse poder ser de natureza diversa daestatal, ou seja, pode ser de natureza social, econmica e cultural. Nesseaspecto, a opo adotada em minha pesquisa pode se localizar entre aquelesestudos que, segundo Carvalho, buscam articular os dois mtodos na definiodas elites, j que, de acordo com Bourdieu (2007b), as posies de elite sodeterminadas pela combinao cumulativa de capitais econmicos, culturais, edos capitais prprios de cada campo (como o jurdico, por exemplo), que deveser analisada em trs dimenses: (I) a distribuio dos agentes no campo deacordo com o volume global do capital possudo, de qualquer modalidade; (II) opeso relativo de um ou outro capital na estrutura do capital global (com destaquepara as relaes entre capitais econmicos e culturais); e (III) a evoluo, notempo, do volume e da estrutura desses capitais, perceptvel na reconstruo dastrajetrias dos agentes no campo.

    Para alm da contribuio especfica de Bourdieu, contudo, a leitura detrabalhos diversos sobre diferentes aspectos ou grupos de elite expe elementoscomuns dessa tradio de estudos, que ajudaram na orientao de minhapesquisa. O primeiro deles, como j sugerido acima, a articulao necessriaque se deve buscar, na anlise dos grupos de elites, entre esses indivduos egrupos e a prpria estrutura social, a partir da verificao das divises sociaisque permitem o destacamento e a identificao de um ou mais grupos comoelites. Essa orientao serve para advertir o analista das elites sobre os riscos domal uso do mtodo prosopogrfico8 e para for-lo a considerar, na identifi-cao dos atributos comuns de grupos sociais de elites, a partir das trajetriasindividuais, a incidncia de elementos estruturais e da relao entre agentes eestruturas na constituio das relaes de poder e dominao, e de legitimaodessas relaes num dado contexto (campo) social (Montagner 2007; Perissi-notto & Codato 2008).

    Em outras palavras, o risco do mal uso do mtodo estritamente prosopo-grfico, que a metodologia do campo previne, o da nfase excessiva que sepossa dar aos atributos individuais como sendo efetivamente pessoais, essen-cialmente ligados aos sujeitos, sejam esses atributos naturais ou adquiridos. Oque a anlise sociolgica da trajetria dos indivduos deve revelar, ao contrrio, a incorporao das estruturas objetivas nos indivduos e nos esquemassubjetivos de percepo e representao, de construo de identidades e de

    ao social (Bourdieu 2007a). Segundo F.M. Heinz (2006, p. 8), trata-se decompreender, atravs da anlise mais fina dos atores situados no topo dahierarquia social, a complexidade de suas relaes e de seus laos objetivos como conjunto ou com setores da sociedade.

    Nesse sentido, para ser completado, esse tipo de anlise deve tambmrelacionar a compreenso dessa histria incorporada nos sujeitos compre-enso da histria reificada nas estruturas, ou seja, da objetividade das estru-

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 87

    8 Miceli (2001, p. 347) dizque: Essa metodologia requera construo da biografiacoletiva de um determinadosetor de classe dirigente, combase numa estratgia deexposio e anlise que se valedo exame detido de casosexemplares, alados condio de tipos ideais, e,com base nesse corpus deevidncias, de infernciasqualificadas acerca do grupoou do setor de classe na mirado pesquisador.

  • turas sociais, em perspectiva histrica (Bourdieu 2007a). No caso de Almeida(2010a), buscou-se compreender no s como os juristas se inserem e soproduzidos a partir da estrutura social brasileira, mas tambm como umaminoria de juristas domina os demais, no interior do campo jurdico, no espaopoltico da administrao superior e da reforma da justia estatal. Esse esforoobrigou-nos a considerar, portanto, os desenvolvimentos da estrutura social edas instituies polticas brasileiras e a incidncia de fatores relacionados aclasses sociais, raas, gnero, burocratizao etc. nas trajetrias desses agentese na estruturao daquele espao de dominncia e controle poltico da justiaestatal. Veja-se, a ttulo ilustrativo, como o processo de feminizao das carrei-ras jurdicas brasileiras, apontado por Werneck Vianna et al. (1997) comoindicativo das mudanas mais amplas da estrutura social brasileira, tm seusefeitos contidos ao nvel das elites da justia estatal (Grfico 4).

    Uma segunda orientao que decorre da leitura de diversos trabalhos sobreelites, e que est associada anterior, diz respeito s divises e hierarquiaspresentes no interior da prpria elite (Bottomore 1965), para alm da clssicadistino entre elites e no-elites formulada por Vilfredo Pareto (1966). EmAlmeida (2010a), buscou-se identificar conflitos entre subgrupos de elitesjurdicas na composio das instncias superiores de liderana da administraoda justia estatal, sejam esses conflitos estabelecidos entre bases e cpulas deorganizaes profissionais, sejam eles deflagrados entre diferentes grupos pro-fissionais que vivenciam situaes de dominao entre ocupaes correlatas(Freidson 1998). A anlise da institucionalizao do CNJ como um espao delutas entre grupos de elites e entre elites e no-elites parece emblemtica dessaafirmao: o Grfico 5 demonstra como profissionais de baixo escalo,associaes de bases corporativas e ocupaes subalternas do sistema de justiaforam os principais demandantes do CNJ nas sesses analisadas; o Grfico 6demonstra como os principais demandados, nos procedimentos administrativosanalisados nessas mesmas sesses, foram as cpulas de tribunais do poderJudicirio.

    Essas consideraes sobre diviso entre elite e no elite e sobre as hierar-quias e divises no interior das elites nos levam terceira contribuio dosestudos de elite para meu prprio trabalho, qual seja a questo da circulao epermeabilidade das elites (Bottomore 1965; Ferreira 2001). Nesse sentido,buscou-se identificar como determinados espaos e estruturas institucionaispermitem certo grau de circulao de grupos de juristas entre posies de elite, e

    88 Frederico de Almeida

    Fonte: Sadek (2006).

    Grfico 4 - Porcentagens de homens e mulheres entre magistrados, por grau dejurisdio (Brasil, 2005)

  • como os conflitos intraprofissionais e interprofissionais em torno da adminis-trao e da reforma da justia brasileira podem ser em grande parte entendidos apartir da diversificao social das bases profissionais das carreiras jurdicas, emoposio menor variao na composio do plo dominante do campojurdico, ainda bastante associado s estruturas tradicionais e aos processos delongo prazo que definiram as relaes de poder entre instituies e profissesjurdicas alm dos dados sobre gnero, j expostos (Grfico 4, acima), dadossobre as faculdades de origem dos membros das elites jurdicas (Grfico 7,abaixo) tambm ilustram essa impermeabilidade relativa do crculo de elitesjurdicas em relao aos processos de diversificao social das bases profis-sionais do campo.

    Entre as divises no interior das elites jurdicas, uma em especial foi de fun-damental importncia para a anlise contida em Almeida 2010a e refere-se auma quarta orientao dada pela reviso de estudos de elite, concernente relao entre intelectuais e grupos dirigentes e prpria caracterizao dosintelectuais como grupos de poder (Gramsci s.d.; Mannheim 1957; 1986;Bottomore 1965; Miceli 1979; 1999). Quanto a esse aspecto, busquei identificare analisar o papel dos intelectuais-juristas e de outros especialistas diretamenterelacionados administrao da justia estatal e sua contribuio para a defi-

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 89

    Fonte: Almeida (2010a), a partir de Conselho Nacional de Justia.

    Grfico 5 - Porcentagens de procedimentos de controle administrativos e de pedidos de providncias, somados, na pauta da 46,da 68 e da 88 sesses ordinrias do Conselho Nacional de Justia, por tipo de requerente (Brasil, 2007, 2008 e 2009)

  • nio de um discurso e de uma ideologia legtimos para as formas oficiais deoferta de justia, alm de uma agenda para sua reforma9. O caso dos espe-cialistas em direito processual associados ao Instituto Brasileiro de DireitoProcessual e chamada Escola Processual Paulista, e com participaorecorrente nas principais reformas processuais desde a dcada de 1970

    90 Frederico de Almeida

    Fonte: Almeida (2010a), a partir de Conselho Nacional de Justia.

    Grfico 6 - Porcentagens de procedimentos de controle administrativos e de pedidos deprovidncias, somados, na pauta da 46, da 68 e da 88 sesses ordinrias do Conselho

    Fontes: Almeida (2010a), a partir de Consultor Jurdico (2008) e Supremo Tribunal Federal.

    Grfico 7 - Nmero de ministros do Supremo Tribunal Federal, por instituio de ensino de origem (Brasil, 1889 a 2008)

    9 Sobre o poder dosespecialistas na poltica dajustia, ver o captulo 5 deminha tese de doutoramento(Almeida 2010a).

  • ilustrativo desse tipo de insero poltica de um grupo intelectual na poltica dajustia.

    Uma quinta orientao que vem da tradio dos estudos de elite diz respeito sua escolarizao e ao papel das instituies de ensino no recrutamento, nasocializao e na reproduo dos grupos de elite (Gramsci s.d.; Bourdieu 1996;2007b; Almeida & Nogueira 2002; Brando & Lellis 2003; Bourdieu & Pas-seron 2008; Almeida 2009). Considerando-se os diferentes volumes e estrutu-ras de capitais que definem as posies de elite, originalmente derivados daposio social inicial dos agentes do campo (que dessa forma ingressam e seposicionam nos campos, a princpio, apenas pela fora de suas heranas fami-liares, entendidas em sentido amplo), estas podem, contudo, ser alteradas emsua composio interna pelo efeito da entrada de novos grupos no interior docampo, mediada pelo sistema escolar, que passam a disputar com as posiesdominantes os recursos prprios de cada campo de poder. De acordo com essaperspectiva, portanto, a diversificao social e poltica dos campos de poderseria resultado da mediao exercida pelo sistema escolar sobre processos dediferenciao de classe produzidos no mbito do modo de produo e dosprocessos de estratificao social decorrentes (Bourdieu 1996; Bourdieu &Passeron 2008).

    Nesse sentido, escolas prestigiadas, voltadas para a instruo de membrosdas elites sociais, polticas e econmicas, teriam seus diplomas muito valori-zados no mercado de especialistas, ao passo que a expanso do mercado de di-plomas nas sociedades capitalistas pode ser capaz de reduzir o valor relativodesses diplomas e criar tenses na composio do campo e nas formas dereproduo das estruturas e dos agentes de dominao ao permitir o acesso aesse mercado de grupos socialmente inferiores nas hierarquias e divises declasses. Da mesma forma, o diploma de uma escola de prestgio pode ser, paraum agente socialmente marginal no campo, um importante capital que permitasua ascenso num campo, independente da rede de relaes familiares e de seuscapitais herdados. Essa seria a chave de anlise para se entender as mudanas nointerior das elites sociais e polticas (basicamente, as mudanas associadas suapermeabilidade e sua composio interna) e, dessa forma, para se compre-ender a conservao e a mudana na ordem social moderna (Bourdieu 2007b).

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 91

    Fonte: Supremo Tribunal Federal.

    Grfico 8 - Porcentagens de ministros do Supremo Tribunal Federal com ttulos deps-graduao e dedicao docncia (Brasil, 1889-2008)

  • Almeida (2010a) confirmou essa hiptese ao demonstrar que a posse de di-plomas superiores de certas faculdades de direito constitui o capital simblicomais homogeneamente distribudo entre todos os indivduos e grupos de eliteanalisados. A anlise de currculos e biografias de membros de diferentesgrupos das elites jurdicas permitiu identificar um conjunto de faculdades dedireito de elite, cujo diploma confere aos seus egressos um acesso privilegiado administrao superior e ao espao poltico da reforma da justia: as faculdadesde direito fundadas no Imprio, as primeiras escolas livres fundadas por eliteslocais nos primeiros anos da Repblica (todas ligadas a universidades pblicas,atualmente), e as confessionais catlicas (privadas), fundadas nas dcadas de1940 e 1950, seguidas de outros poucos cursos privados laicos criados antes damassificao do ensino na dcada de 1990 (Grfico 7). Essa anlise tambmpermitiu identificar como a posse de ttulos acadmicos de ps-graduaotorna-se um capital diferenciado nas lutas do campo jurdico, mais poderosoquanto maior for a titulao (Grfico 8)10.

    Por fim, ainda no que se refere sociologia das elites, a opo pelo foco emum processo poltico conjuntural bastante delimitado no tempo e no espao aReforma do Judicirio, especialmente seu ciclo poltico de 2003 a 2004 justifica-se a partir da diferenciao entre perodos histricos cruciais, carac-terizados por mudanas polticas abruptas (guerras, revolues, transies deregime etc.), e perodos histricos rotineiros, nos quais as decises das lideran-as polticas ocorrem de acordo com regras ou rotinas estabelecidas, em umcontexto de alta previsibilidade (Perissinotto & Codato 2008). De acordo comessa diferenciao, bastante til para se dimensionar o papel das elites emprocessos polticos, a natureza da elite poltica tanto mais importante quantomais crucial for o perodo histrico analisado: em momentos de mudana socialh mais decises a tomar, mais opes a fazer, mais alternativas a legitimar(Perissinotto & Codato 2008, p. 10).

    Meu argumento que a obteno de consensos mnimos para a aprovao daReforma do Judicirio, no perodo entre 2003 e 2004, aps 13 anos de trami-tao da Proposta de Emenda Constitucional n. 96/1992 no Congresso Nacio-nal, deveu-se articulao, pela liderana executiva da Reforma, de grupos deelites jurdicas associados a trajetrias e posies bastante consolidadas no cam-po jurdico, em torno de uma agenda reformista que acabou por fortalecer asposies do plo dominante do campo da administrao da justia estatal; nessesentido, a prevalncia da agenda racionalizadora (central no resultado final daReforma e voltada para a centralizao do sistema e o aumento de sua eficinciadecisria) sobre a agenda democratizante (associada ampliao do acesso justia e presente em medidas marginais aprovadas no conjunto das mudanasintroduzidas) pode ser explicada pelo protagonismo desses grupos de juristas,cujas trajetrias se associam a processos polticos de longo prazo na estrutu-rao do campo jurdico.

    Em suma, acredita-se que a caracterizao de um grupo de elite e sua anlisesociolgica deve levar em conta necessariamente esses cinco fatores suarelao com a estrutura social, suas divises e hierarquias internas, sua aberturapara a circulao e a permeabilidade, sua escolarizao e sua ao poltica emdiferentes tempos histricos; do contrrio, o estudo das elites corre o risco datautologia (explicar a elite por sua j conhecida posio social superior, quandoo que se deve explicar justamente essa posio superior) ou da apologia(simplesmente retratar as elites sem um esforo de anlise crtica que desnudeas formas de dominao das quais elas so produto, reforando essa dominaoao expressar acriticamente sua superioridade).

    92 Frederico de Almeida

    10 Nesse sentido, ver ocaptulo 2 de minha tese dedoutoramento (Almeida2010a); especificamente sobreo valor simblico dos ttulosde ps-graduao, ver tambmAlmeida (2012).

  • V. Concluses

    O presente trabalho teve por objetivo compartilhar os referenciais tericosutilizados em minha pesquisa sobre as elites jurdicas e a poltica da adminis-trao da justia estatal (Almeida 2010a), e a forma pela qual se buscouarticul-los em um esquema analtico mais amplo, por meio da noo de campojurdico. a partir dessa moldura terica que possvel compreender a incidn-cia diferencial e simultnea de elementos explicativos tradicionalmente (e noraro, isoladamente) mobilizados pela sociologia das profisses, pela anlisepoltica institucional, pela sociologia das elites em especial, e pela sociologiapoltica em geral. Embora cada uma dessas sociologias especficas tenha seusprprios instrumentais e tradies tericos, acredito que a articulao de suascontribuies metodolgicas no conceito de campo no s possvel, como til,na medida em que nos permite compreender as elites estatais a partir deelementos que considero essenciais: a origem e a circulao do poder em tornodo (mas no necessariamente no) Estado, as formas de diviso social dotrabalho e sua institucionalizao, os processos de produo e reproduo deelites, e as lgicas especficas dos campos de poder nos quais essas elites atuampreferencialmente.

    Frederico de Almeida ([email protected]) Doutor em Cincia Poltica pela Universidade de So Paulo (USP) e Profes-sor do Departamento de Cincia Poltica do Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da Universidade Estadual de Campinas(Unicamp).

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    ABSTRACT

    This work aims at systematizing the theoretical references used in a study on legal elites and the politics of justice in Brazil. Facing

    methodological problems brought by empirical research, the article aims at presenting the relations between the sociology of elites,

    the sociology of legal professions and the political sciences institutional analysis on the judicial system, in a way of identifying and

    analyzing legal elites and their political action in the high administration and in the reform of the Brazilian judicial system. It was pos-

    sible to establish relations between those theoretical references by facing the conceptions of judicial system and legal field. After re-

    viewing those different theoretical traditions literature and illustrating the methodological problems by selected sets of data, we can

    conclude that the notion of legal field is useful as a theoretical framework to understand the institutional, professional and social dis-

    tinctions and hierarchies which produce elites of judicial politics in Brazil.

    KEYWORDS: legal elites; judicial politics; judicial system; legal field; judicial reforms.

    As elites da Justia: instituies, profisses e poder na poltica da justia brasileira 95