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Biomatemática 22 (2012), 77–92 ISSN 1679-365X Uma Publicação do Grupo de Biomatemática IMECC – UNICAMP Análise qualitativa da solução fuzzy do modelo epidemiológico SIR Moiseis S. Cecconello 1 , DMAT, ICET – UFMT, 78.060-900, Cuiabá/MT. Chryslaine M. Pereira, Rodney C. Bassanezi 2 , CMCC – UFABC, 09.210-170, Santo André/SP. Resumo. Estudamos o comportamento assintótico do modelo SIR, con- siderando que a subjetividade da condição inicial é dada por um conjunto fuzzy. Mostramos que, assim como no caso determinístico, o fluxo fuzzy gera- do pelas equações do modelo admite pontos de equilíbrio fuzzy que dependem da condição inicial considerada. Palavras-chave:Modelo SIR; epidemiologia; soluções fuzzy. 1. Introdução Desde a atinguidade até os tempos atuais as doenças infecciosas têm cau- sado muitos danos para a humanidade, dizimando populações inteiras, extermi- nando raças, contabilizando mais mortes que as guerras. Epidemias ocorreram e continuam ocorrendo, muitas das quais ainda estão assolando populações de muitos países, continentes e, até mesmo, a população mundial. Como dois ex- emplos de doenças infecciosas dos dias atuais , podemos citar a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) ea Influenza AH1N 1, também conhecida como Gripe Suína. Quando uma doença infecciosa incide sobre um grande número de indi- víduos em um curto período de tempo temos caracterizado uma epidemia.A 1 [email protected] 2 [email protected]

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  • Biomatemtica 22 (2012), 7792 ISSN 1679-365X

    Uma Publicao do Grupo de Biomatemtica IMECC UNICAMP

    Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modeloepidemiolgico SIR

    Moiseis S. Cecconello1,DMAT, ICET UFMT, 78.060-900, Cuiab/MT.

    Chryslaine M. Pereira, Rodney C. Bassanezi2,CMCC UFABC, 09.210-170, Santo Andr/SP.

    Resumo. Estudamos o comportamento assinttico do modelo SIR, con-siderando que a subjetividade da condio inicial dada por um conjuntofuzzy. Mostramos que, assim como no caso determinstico, o fluxo fuzzy gera-do pelas equaes do modelo admite pontos de equilbrio fuzzy que dependemda condio inicial considerada.

    Palavras-chave:Modelo SIR; epidemiologia; solues fuzzy.

    1. Introduo

    Desde a atinguidade at os tempos atuais as doenas infecciosas tm cau-sado muitos danos para a humanidade, dizimando populaes inteiras, extermi-nando raas, contabilizando mais mortes que as guerras. Epidemias ocorrerame continuam ocorrendo, muitas das quais ainda esto assolando populaes demuitos pases, continentes e, at mesmo, a populao mundial. Como dois ex-emplos de doenas infecciosas dos dias atuais , podemos citar a Sndrome daImunodeficincia Adquirida (AIDS) e a Influenza A H1N1, tambm conhecidacomo Gripe Suna.

    Quando uma doena infecciosa incide sobre um grande nmero de indi-vduos em um curto perodo de tempo temos caracterizado uma epidemia. A

    [email protected]@ime.unicamp.br

  • 78 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    anlise do comportamento de uma doena em determinada populao levando-se em considerao diversas caractersticas ambientais objeto da epidemiolo-gia, cujo desenvolvimento est diretamente ligado ao avano do conhecimentomdico sobre as causas das doenas infecciosas.

    no mnimo sensato fazer uma distino entre os indivduos que abrigama doena e aqueles que esto ainda saudveis. Esta a base de todos os mo-delos epidemiolgicos. Em uma publicao de 1906, W. H. Hamer postulouque o aparecimento de uma epidemia depende da taxa de contato entre in-divduos suscetveis, que so os indivduos da populao que no apresentama doena, e os infecciosos, os indivduos que apresentam a doena e so ca-pazes de transmit-la para os suscetveis (Murray, 2002). Este postulado, hojeconhecido como o princpio de ao das massas, tornou-se o um importanteconceito na anlise de propagao de doenas infecciosas, abrindo caminho paraa incluso de ferramentas matemticas em epidemiologia. Matematicamente,o postulado de W. H. Hamer traduzido pela ideia de que a disseminao dadoena em uma populao proporcional ao produto da densidade de indiv-duos suscetveis pela densidade de indivduos infecciosos.

    Um dos primeiros trabalhos que incorpora ferramentas matemticas emepidemiologia para descrever a propagao de uma doena infecciosa ao longodo tempo devido Kermack e McKendrick (1927). Considerado um dosprimeiros modelos matemticos para explicar a disseminao de doenas in-fecciosas em uma populao, o modelo proposto por Kermack e McKendrick(1927), denominado modelo SIR, assume que uma populao de tamanho cons-tante, N > 0, pode ser subdividida em trs distintas classes: Suscetveis, Infec-ciosos e Removidos. Os suscetveis so indivduos que esto sujeitos a contraira doena quando em contato com os infecciosos. Os infecciosos so aqueles indi-vduos portadores e com capacidade de transmitir a doena para os suscetveis.Os indivduos que aps contrarem a doena adquirem imunidade e perdem acapacidade de transmisso da doena formam a classe dos removidos. Nestemodelo, so analisados as quantidades ao longo do tempo dos indivduos nastrs categorias levando em considerao que alguns dos suscetveis adquirem adoena ao entrarem em contado com indivduos infecciosos da populao. Almdisso, com o passar do tempo os infecciosos adquirem imunidade deixando assimde contribuir para a propagao da doena.

    Desde o modelo proposto por Kermack e McKendrick, diversos outrosmodelos tem sido propostos para descrever a propagao de uma epidemia

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 79

    em uma populao levando em conta caractersticas de cada doena especfica(Bassanezi e Ferreira Jr, 1988). No modelo compartimental do tipo SI, apopulao dividida em suscetveis e infecciosos e este modelo adequadoquando so consideradas doenas transmissveis de carter crnico, para asquais os indivduos infecciosos no voltam a ser suscetveis nem se recuperamda infeco. Nos modelos do tipo SIS, os infecciosos se recuperam da infecotornando-se suscetveis doena novamente. J no modelos modelos do tipoSIRS os infecciosos adquirem imunidade temporria, tornando-se suscetveiscom a evoluo no tempo.

    Os modelos de epidemiologia mencionados no pargrafo anterior podemser descritos, de modo geral, por equaes diferenciais no lineares sendo difcilou at mesmo impossvel obter uma frmula que estabelea a soluo em funodo tempo. Estas equaes diferencias dependem de taxas de transmisso deum compartimento para outro e condies iniciais que podem estar sujeitas aincertezas.

    Nosso objetivo neste trabalho estudar o comportamento assintticodo modelo SIR considerando que a condio inicial fuzzy. Vamos mostrarque, assim como no caso determinstico, o fluxo fuzzy gerado pelas equaesdo modelo admite pontos de equilbrio fuzzy que dependem da condio inicialconsiderada.

    2. O modelo SIR

    Denotemos por S(t), I(t) e R(t) o nmero de indivduos suscetveis,infecciosos e removidos respectivamente. Levando em considerao que partedos suscetveis adquirem a doena ao entrarem em contado com indivduosinfecciosos da populao e que os infecciosos adquirem imunidade deixandoassim de contribuir para a propagao da doena, a dinmica da epidemiaregida pelo modelo SIR descrita pelo sistema de equaes diferenciais nolineares:

    dS

    dt= SI, S(0) = So 0,

    dI

    dt= SI I, I(0) = Io 0,

    dR

    dt= I, R(0) = Ro 0,

    (1)

  • 80 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    no qual > 0 o chamado taxa de infeco e > 0 a taxa de remoo dosinfecciosos. Aqui, (1/) o perodo de tempo no estgio infeccioso ou o perodode permanncia da doena no organismo do indivduo (Bassanezi e Ferreira Jr,1988; Edelstein-Keshet, 2005).

    Observemos que o nmero total de indivduos da populao a somados suscetveis com os infectados e com os recuperados, isto ,

    S(t) + I(t) +R(t) = N(t). (2)

    e assim a variao no nmero de indivduos da populao em relao ao tempo dada por

    dN

    dt=

    dS

    dt+dI

    dt+dR

    dt= 0,

    de modo que S(t) + I(t) +R(t) = So + Io +Ro para todo t R+.

    2.1 Existncia e unicidade de soluo

    No difcil ver que as funes que definem as equaes do modelo SIRpossuem derivadas parciais contnuas portanto so de classe C1 de modo quepodemos garantir a existncia de existncia e unicidade local de soluo paraos sistema (Arnold, 1985). Assim podemos concluir que existe um intervaloL R com 0 L e uma funo t : L R3, t = (S(t), I(t), R(t)), quetornam verdadeiras as equaes do sistema.

    A afirmao a seguir mostra que se as condies iniciais do sistema sono negativas, ento S(t) 0, I(t) 0 e R(t) 0 para todo t no intervalo dedefinio da soluo.

    Afirmao 1. Se t = (S(t), I(t), R(t)) a soluo do sistema (1) definidaem L R+, ento S(t) 0, I(t) 0 e R(t) 0 t L. Alm disso S0 > 0 eI0 > 0 ento S(t) > 0, I(t) > 0 e R(t) > 0 para todo t L {0}.

    Prova: Dado que as duas primeiras equaes de (1) no dependem de R(t)ento vamos considerar o sistema

    dS

    dt= SI, S0 0

    dI

    dt= SI I, I0 0

    (3)

    No difcil ver que se t = (S(t), I(t), R(t)) soluo do sistema (1)ento z(t) = (S(t), I(t)) soluo de (3).

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 81

    Dada uma condio inicial zo = (So, Io), a trajetria da soluo z(t) =(S(t), I(t)) do sistema (3) o conjunto

    (zo) ={z R2 : t R+, z(t) = (S(t), I(t)) e zo = (So, Io)

    }.

    Vamos mostrar que as trajetrias do sistema (1) esto contidas no conjunto

    B ={(x, y) R2/x 0 e y 0} .

    Para a condio inicial z0 = (0, N) a soluo do sistema z(t) = (0, Net)para todo t 0 e portanto, o conjunto

    (0, N) ={(x, y) R2 : x = 0 e y N} B

    uma trajetria do sistema. Por outro lado para condies iniciais da formaz0 = (S0, 0) a soluo z0 = (S0, 0). Assim todo o ponto do eixo horizontaldo plano SI uma trajetria do sistema (3). Por unicidade, a soluo z(t) =(S(t), I(t)) com condio inicial S0 > 0, I0 > 0 no podem interceptar os eixosS e I, de modo que a z(t) B para todo t L.

    Falta mostrar ento que R(t) no negativa. Do sistema (1) temos:

    dR

    dt= I R(t) = R(0) +

    t0

    I () d.

    Como I() 0 ento R(t) 0 e se I0 > 0, ento I(t) > 0 o que implicaR(t) > 0 t L. Por (2) temos ainda que t = |S(t)| + |I(t)| + |R(t)| = Npara todo no domnio de definio de t.

    Com o resultado anterior, podemos mostrar que a soluo do sistema (1)est definida para todo t R+.

    Uma discusso mais profunda sobre o intervalo mximo de definio deuma funo pode ser encontrada em Hartman (1964). De modo geral a soluode uma equao diferencial

    dx

    dt= f(t, x)

    com f : (a, b) Rn Rn, pode ser estendida para um intervalo mximo dedefinio [0, T ), deste que tal soluo exista. Se T < + possvel mostrarque para todo compacto K Rn existe > 0 tal que para todo t (T , T )temos (t, t) / [0, T )K. Isto significa que a soluo ilimitada. Dessa forma,

  • 82 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    sempre que a trajetria da soluo estiver contida em um conjunto compacto,ento tal soluo est definida para todo t R+.

    Afirmao 2. A soluo do sistema SIR est definida para todo t no nega-tivo.

    Prova: Suponha que o intervalo mximo de definio da soluo seja [0, T )com T < +. Consideremos o conjunto K = [0, T ) x [0, N3] R4, peloprimeira afirmao a soluo positiva e W (t) = |S(t)|+ |I(t)|+ |R(t)| = N .Logo (t,W (t)) K para todo t [0, T ], que uma contradio pois deveramoster (t,W (t)) / K para algum t prximo de T . Logo, a soluo do modelo estdefinida para todo t R+.

    2.2 Analise qualitativa da soluo

    Como mostramos, o modelo SIR tem soluo t(So, Io, Ro) definidapara todo t R+. Vamos ento analisar o comportamento assinttico det(So, Io, Ro) quando t.

    Pelo sistema (3), a relao entre S e I dada por:

    dI

    dS=

    SI ISI = 1 +

    S(4)

    cuja soluo, obtida pelo mtodo de separao de variveis, :

    I(S) = S + ln(S) +K

    Se S(0) = So > 0, I(0) = Io > 0 e R(0) = Ro = 0 da ltima expressotemos

    K = N lnS0,

    de modo que

    I(S) = N S + ln

    S

    S0. (5)

    Da equao (4), observa-se que:

    a)dI

    dS> 0 se S

    .

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 83

    Temos tambm que:

    dI

    dS= 0 1 +

    S= 0

    S= 1 S =

    .

    Substituindo em (5) obtemos

    I = N +

    ln

    S0,

    que valor mximo de infecciosos na populao.Do sistema (1) temos que S(t) decrescente com relao ao tempo. Alm

    disso quando S 0+ temos que I . Mas como I0 > 0, existe S, com0 < S < S0 tal que I(S) = 0, isto ,

    N S + ln(S

    S0

    )= 0.

    Desde que I(S) crescente se S > / ento S (0, /).A seguir, faremos a anlise de estabilidade dos pontos de equilbrio do

    modelo SIR.

    2.3 Pontos de equilbrio

    Considerando o sistema (1) os pontos de equilbrio do modelo SIR ocor-rem quando a variao em cada uma das equaes diferenciais do sistema nula,isto , os pontos de equilbrio so as solues constantes do sistema. Assim,temos:

    dR

    dt= 0 I = 0 I = 0.

    Portanto, se I = 0 ento R = NS e P = (S, 0, NS) so pontos de equilbriode (1). Como o sistema depende apenas de S e I, podemos considerar

    dS

    dt= SI

    dI

    dt= SI I

    (6)

    e, neste caso, os pontos de equilbrio so da forma P = (S, 0) com S [0, N ].A matriz jacobiana do sistema (6) em P = (S, 0) :

    J(S,0) =

    (0 S0 S

    )que por anlise dos autovalores podemos concluir que:

  • 84 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    a) Se S > / os pontos (S, 0) so instveis;

    b) Se S / tem-se um autovalor nulo e outro negativo.

    Para os pontos do segundo item no possvel obter uma conclusosobre a estabilidade dos pontos de equilbrio. Na prxima seo estudaremos aestabilidade dos pontos, segundo o princpio da invarincia de LaSalle.

    2.3.1 Princpio de invarincia de LaSalle

    Antes de fazermos uma anlise assinttica do sistema SIR, interessanteenunciarmos o teorema de LaSalle sobre estabilidade assinttica de conjun-tos invariantes. Apresentaremos aqui uma verso generalizada deste teoremanecessria para aplicao na anlise do modelo SIR.

    Para isso consideremos a equao diferencial autnoma

    dx

    dt= f(x) (7)

    Teorema 3. (Hale e Koak, 1991) Sejam V (x) : Rn R e

    C = {x Rn : V (x) < C}

    onde C um nmero real. Suponha que V seja contnua em C e de classeC1 com V (x) = V (x) f(x) 0 no interior de C . Considere o subconjuntoS = {x C : V (x) = 0} C e seja B o maior conjunto invariante contidoem E. Ento, toda soluo de (7) iniciando em C converge para B quandot.

    Vamos aplicar o teorema acima na anlise da soluo do modelo SIRe para isso consideremos o sistema (6). Seja U = R+ R+ e seja tambmV : U U definida por

    V (z) = (S )H(S ) + I

    com z = (S, I) U no qual H a funo Heaviside

    H(x) =

    1 se x > 0,

    0 se x 0.

    e = /.

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 85

    Consideremos ainda o conjunto

    N = {(S, I) : V (S, I) < N}.

    A funo V contnua em N e alm disso a funo V possui derivadas parciaiscontnuas em N , dadas por

    V

    S=

    V

    I= 1

    e, portanto, V de classe C1. Seja z(t) a soluo do sistema. Como mostramosz(t) N para todo t R+, e alm disso

    V (z(t)) =V

    S

    dS

    dt+V

    I

    dI

    dt=

    dS

    dt+dI

    dt= I,

    e assim temos V (z) 0 para todo z N . Os pontos nos quais V (z) = 0formam o conjunto

    E = {(S, I) N : S [0, ] e I = 0}.

    Observemos que este conjunto invariante pelo sistema (3). Tomando B = Eno teorema acima, podemos concluir que limt dist((z(t), B) = 0. Portantoa soluo do sistema (6) converge para algum ponto [0, ] {0}.

    Pelos resultados da seo anterior temos que, se a condio inicial (S0, I0) tal que S0 + I0 N e S0 > ento, z(t) N para todo t > 0. Portanto,podemos concluir que nesse caso a soluo tambm converge para o conjunto[0, ] {0}. Enfatizemos esse resultado na seguinte afirmao:

    Afirmao 4. A soluo z(t) = (S(t), I(t)) do sistema (6) converge para umponto do conjunto [0, ] {0}.

    Da expresso (5), considerando S = S e I = 0, podemos obter o pontoS (0, ] para o qual a soluo converge, resolvendo a equao:

    N S = ln SoS

    (8)

    Resumidamente, as funes S(t), I(t) e R(t) apresentam o seguinte com-portamento:

    a) I(t) decresce para zero, t, se S0 ;

  • 86 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    b) I(t) cresce atingindo o valor mximo

    N (1 + ln

    (

    S0

    ))e depois decresce para 0, se S0 > /;

    c) S(t) decrescente e converge para S, soluo de (8).

    d) R(t) crescente e converge para N S.

    3. Soluo fuzzy de equaes diferenciais

    Consideremos o conjunto U Rn. Denotaremos por F(U) o conjuntoformado pelos subconjuntos fuzzy de U cujos suportes so subconjuntos com-pactos de U. Algumas propriedades mtricas de F(U) podem ser encontradasem Cecconello (2010) ou Diamond e Kloeden (1994). Se A um subconjuntode U , usaremos a notao A para indicar o conjunto fuzzy onde a funo depertinncia a funo caracterstica de A.

    Consideremos a equao autnoma definida por

    dx

    dt= f(x) (9)

    onde f : U Rn Rn uma funo suficientemente suave. Para cada xo U,denotaremos por t(xo) a soluo determinstica da Eq. (9) cuja condio inicial xo. Aqui estamos assumindo que a soluo est definida para todo t R+.

    Faz-se necessrio considerar a aplicao t : U U, que para cadaxo U possui imagem t(xo), chamada de fluxo determinstico. A extensode Zadeh de t a aplicao t : F(U) F(U) que leva o conjunto fuzzyxo F(U) no conjunto fuzzy t(xo). Chamaremos tal aplicao de fluxo fuzzy.Dado xo F(U), dizemos que t(xo) a soluo fuzzy da Eq. (9) cuja condioinicial o conjunto fuzzy xo.

    As condies para existncia de pontos de equilbrio fuzzy bem como anatureza da estabilidade de tais pontos foram primeiramente apresentados emMizukoshi et al. (2009). Os conceitos de estabilidade e estabilidade assintticapara pontos de equilbrio fuzzy so anlogos aos de pontos de equilbrio desolues determinsticas e as condies de estabilidade para pontos de equilbriofuzzy podem ser encontradas em Mizukoshi et al. (2009); Cecconello (2010).

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 87

    No teorema seguinte, por convergncia uniforme queremos dizer que: ofluxo determinstico t : U U converge uniformemente, em K A, paraxe : A U quando, para todo > 0, existe T > 0 tal que

    t(xo) xe(xo) < ,

    para todo t > T e xo K.Teorema 5. (Cecconello, 2010) Sejam xe : A U contnua, A U , xo F(U) com [xo]0 A e xe = xe(xo). Sob essas condies temos:

    a) Se t(xe(x)) = xe(x) para todo x A, ento t(xe) = xe para todot 0;

    b) Se t : U U converge uniformemente, em [xo]0 A, para xe : A Uquando t, ento t(xo) converge para xe e t(xe) = xe para todot R+.O teorema anterior fornece uma maneira relativamente simples de de-

    terminar o ponto de equilbrio para o qual a soluo fuzzy converge quandot . Em outras palavras, o Teorema 5 afirma que se a soluo determins-tica converge para uma funo, que para cada condio inicial associa um pontode equilbrio, ento a soluo fuzzy converge para a extenso de Zadeh destafuno. Este teorema ser fundamental para estudarmos a existncia de pontosde equilbrio para a soluo fuzzy do modelo SIR.

    Para uma visualizao geomtrica da do modelo SIR, vamos definirprojees em subespaos de F(U). Para isso, consideremos a aplicao Pn :Rn+m Rn que para cada (x, y) Rn+m associa o ponto Pn(x, y) = x.

    Desde que podemos caracterizar Rn como um subconjunto de Rn+m

    atravs da identificao com o subconjunto Rn {0}, ento a aplicao Pnpode ser vista como a projeo de Rn+m sobre o conjunto Rn. Por esse motivo,dizemos que x a projeo, em Rn, do ponto (x, y) Rn+m.

    Seja um ponto z F (Rn+m) com funo de pertinncia z : Rn+m [0, 1], isto , z(x, y) [0, 1] para todo (x, y) Rn+m. A imagem Pn(z), obtidapela extenso de Zadeh da projeo Pn, tem como funo de pertinncia

    x(x) = supvRm

    z(x, v).

    Definida dessa forma, a aplicao Pn : F (Rn+m) F (Rn), obtida pelaextenso de Zadeh de Pn, que para cada z F (Rn+m) associa o ponto Pn(z)

  • 88 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    F (Rn) pode ser vista como uma projeo de F (Rn+m) em F (Rn). Igualmente projeo Pn, no difcil ver que a aplicao Pn tambm satisfaz:

    Pn(Pn(z)) = Pn(z).

    Mais propriedades da aplicao Pn esto detalhadas em Cecconello (2010).

    3.1 Soluo fuzzy do modelo SIR

    Pelas anlises apresentadas anteriormente, podemos concluir que a solu-o determinstica do modelo SIR converge para o ponto de equilbrio

    xe(So, Io, Ro) = (S, 0, N S) =(S, 0, ln

    SoS

    ),

    no qual N = So + Io + Ro, para todo (So, Io, Ro) A = {(x, y, z) R3 : x >0 , y > 0, z 0}. Isto nos mostra que a convergncia para um ponto de equi-lbrio vai depender, continuamente, da escolha que fizermos para as condiesiniciais. Se as condies inicias so consideradas fuzzy, ento intuitivo imagi-nar que a soluo vai convergir para um ponto de equilbrio fuzzy (Cecconello,2010; Soares, 2010).

    De acordo com o Teorema 5, para cada condio inicial xo F (R3+) com-nveis contidos no conjunto A, o fluxo fuzzy t : F (R3+) F (R3+) convergepara o ponto de equilbrio xe F (R3+) que a imagem de xo pela aplicaoxe : F (R3+) (R3+) obtida pela extenso de Zadeh de xe : R3+ R3+, isto ,quando t temos que t(xo) converge para xe = xe(xo).

    Usando a definio do princpio da extenso de Zadeh, o ponto de equi-lbrio xe = xe(xo) neste caso possui funo de pertinncia

    xe (x, y, z) =

    supRo

    xo(x ez/, z + x(1 ez/), Ro), se y = 0

    0 se y 6= 0.(10)

    Exemplo 1. Para ilustrar os resultados apresentados, seja = 0.01 e = 0.2.consideremos Ro = 0 com o nmero de suscetveis e infecciosos seja dado pelafuno de pertinncia

    xo(So, Io) = max{1 0.01(So 80)2 0.25(Io 5)2, 0}.

    A condio inicial fuzzy para o sistema (1) o produto cartesiano xo =(xo, {0}). Para a condio inicial (80, 5, 0), a soluo determinstica converge

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 89

    para (1.2, 0, 83.8) e a soluo fuzzy converge para xe cuja funo de pertinncia, para y = 0:

    xe (x, y, z) = max{1 0.01 (xr 80)2 0.25 (z + x(1 r) 5)2 , 0

    }(11)

    no qual r = ez/20 . Quando y 6= 0 temos xe (x, y, z) = 0.

    0 4 8 12 16 20

    10

    30

    50

    70

    90

    t

    )(xo)

    Figura 1: Projeo da soluo fuzzy t(xo) sobre o eixo S.

    A figura 1 mostra a evoluo da projeo da soluo fuzzy t(xo) sobreo eixo S. A projeo da soluo fuzzy t(xo) sobre o eixo S converge para x1com funo de pertinncia

    x1(x) = supzR+

    xe (x, 0, z).

  • 90 Cecconello, Pereira & Bassanezi

    0 4 8 12 16 200

    20

    40

    60

    t

    )(xo)

    Figura 2: Projeo da soluo fuzzy t(xo) sobre o eixo I.

    0 4 8 12 16 20

    10

    30

    50

    70

    90

    t

    )(xo)

    Figura 3: Projeo da soluo fuzzy t(xo) sobre o eixo R.

    Na figura 2 temos a representao grfica da da projeo da soluo fuzzyt(xo) sobre o eixo I. A projeo da soluo fuzzy sobre o eixo I converge parax2 = {0}.

    J figura 3 temos a representao grfica da na projeo da soluo fuzzy

  • Anlise qualitativa da soluo fuzzy do modelo SIR 91

    sobre o eixo R. Esta projeo converge para

    x3(z) = supxR+

    xe (x, 0, z).

    Nas representaes grficas anteriores, o grau de pertinncia de um valor representado por tonalidades da cor cinza. Quanto maior o grau de pertinn-cia de um valor x R+ no respectivo conjunto fuzzy mais escura a tonalidadede cinza.

    4. Concluso

    Neste trabalho mostramos tanto a soluo determinstica quanto a solu-o fuzzy do modelo epidemiolgico SIR convergem para pontos de equilbrioque dependem da escolha feita para a condio inicial do modelo. Por meiode anlise da soluo determinstica e de resultados de anlise qualitativa desoluo fuzzy desenvolvidos em Cecconello (2010) caracterizamos as funesde pertinncia dos pontos de equilbrio fuzzy. Alm disso, apresentamos simu-laes numricas para melhor ilustrar a tcnica empregada.

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