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Candomblé e os Tipos Psicológicos por Carminha Levy (EXU, o Mercúrio africano, o intermediário necessário entre o homem e o sobrenatural, o intérprete da linguagem dos mortais e dos ORIXÁS. É pois o encarregado de levar aos deuses da África o chamado de seus filhos estrangeiros. E nestas notas introdutórias, ele e chamado a levar aos filhos estrangeiros amostragem das infinitas possibilidades deste rico Panteão, que se mantém vivo na África, no Brasil e em outros países do Novo Mundo). 0 CANDOMBLÉ à uma estrutura de culto às forças da natureza, à um hino à vida como Eterno Movimento, que se manifesta nas danças, nas cores dos ORIXÁS, nos alimentos sacramentais. Ritual comunitário de cantos, danças e alimentos sagrados na sua forma pública, o Candomblé é sacramentado pelo Pai ou Mãe de Santo, pelos Filhos de Santo, pelos tocadores de atabaque (OGAN), que entoam os cantos sagrados possibilitando a vinda do ORIXÁ, com a participação da comunidade dos mais velhos às criancinhas. Todos cantam e saúdam os ORIXÁS, executam a dança sagrada, num hino à Alegria, Amor e Partilha. Os ORIXÁS - deuses IORUBÁS na África e no Novo Mundo - seriam ancestrais míticos encantados e metamorfoseados nas forças da natureza. Cada Indivíduo tem um ORIXÁ principal que é o "dono da cabeça", e outros três que exigem cultuacão e que também oferecem proteção. A tradição afirma que cada ser humano, no momento em que é criado, escolhe livremente sua cabeça (ORI) e seu destino (ODU). Cada pessoa tem uma origem divina, que a liga a uma divindade específica. Esta parte divina é situada dentro da cabeça. A substância de origem divina (IPORI) torna manifesta a filiação a um deus especifico - o ELEDÁ, por Isso chamado o dono da cabeça. Conhecer seu ELEDÁ possibilita ao homem ser artífice de seu próprio destino, cumprindo as obrigações ou Interdições que seu ORIXÁ determina. Saber manipular tais influências eqüivale ao conhecimento do horóscopo natal com as melhoras de vida, que se pode obter sabendo ouvir os astros. 0 "dono da cabeça" (ELEDÁ) determina o tipo psicológico de seu filho e responde, também, por suas características físicas e seu destino. Tradicionalmente, sabe-se qual o ORIXÁ da cabeça, pela leitura de búzios - forma divinatória na qual se lê o ODU. Para isso, usa-se búzio africano (CAURI ) previamente preparado para esse fim. Voltaremos, após uma visão geral da estrutura do CANDOMBLË, aos ORIXÄS e tipos psicológicos. O CANDOMBLÉ expressa-se nos terreiros ou roças, onde se cultuam os ORIXÁS e os ancestrais ilustres. 0 terreiro contém dois espaços, com características e funções diferentes: (a) um espaço urbano, construído, onde se dá a dança; (b) um espaço virgem (árvores e uma fonte, equivalentes à floresta africana), que é considerado sagrado. 0 chefe supremo do terreiro é o BABALORIXIÁ ou IYALORIXÁ (pai ou mãe que possuem o ORIXÁ). Eles são detentores de um poder sobrenatural - o AXÉ, a força propulsora de todo Universo. 0 AXÉ impulsiona a prática sagrada que, por sua vez, realimenta o AXÉ, pondo todo sistema em movimento. 0 AXÉ sendo principio e força é neutro. Transmite-se, aplica-se e combina-se aos elementos naturais, que contam e expressam o AXÉ do terreiro, que pode ser: (a) o AXÉ de cada ORIXÁ, realimentado através das oferendas e da ação ritual; (b) o AXÉ

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Candomblé e os Tipos Psicológicospor Carminha Levy

(EXU, o Mercúrio africano, o intermediário necessário entre o homem e o sobrenatural, o intérprete da linguagem dos mortais e dos ORIXÁS. É pois o encarregado de levar aos deuses da África o chamado de seus filhos estrangeiros. E nestas notas introdutórias, ele e chamado a levar aos filhos estrangeiros amostragem das infinitas possibilidades deste rico Panteão, que se mantém vivo na África, no Brasil e em outros países do Novo Mundo).

0 CANDOMBLÉ à uma estrutura de culto às forças da natureza, à um hino à vida como Eterno Movimento, que se manifesta nas danças, nas cores dos ORIXÁS, nos alimentos sacramentais. Ritual comunitário de cantos, danças e alimentos sagrados na sua forma pública, o Candomblé é sacramentado pelo Pai ou Mãe de Santo, pelos Filhos de Santo, pelos tocadores de atabaque (OGAN), que entoam os cantos sagrados possibilitando a vinda do ORIXÁ, com a participação da comunidade dos mais velhos às criancinhas. Todos cantam e saúdam os ORIXÁS, executam a dança sagrada, num hino à Alegria, Amor e Partilha.

Os ORIXÁS - deuses IORUBÁS na África e no Novo Mundo - seriam ancestrais míticos encantados e metamorfoseados nas forças da natureza. Cada Indivíduo tem um ORIXÁ principal que é o "dono da cabeça", e outros três que exigem cultuacão e que também oferecem proteção. A tradição afirma que cada ser humano, no momento em que é criado, escolhe livremente sua cabeça (ORI) e seu destino (ODU). Cada pessoa tem uma origem divina, que a liga a uma divindade específica. Esta parte divina é situada dentro da cabeça. A substância de origem divina (IPORI) torna manifesta a filiação a um deus especifico - o ELEDÁ, por Isso chamado o dono da cabeça. Conhecer seu ELEDÁ possibilita ao homem ser artífice de seu próprio destino, cumprindo as obrigações ou Interdições que seu ORIXÁ determina.

Saber manipular tais influências eqüivale ao conhecimento do horóscopo natal com as melhoras de vida, que se pode obter sabendo ouvir os astros. 0 "dono da cabeça" (ELEDÁ) determina o tipo psicológico de seu filho e responde, também, por suas características físicas e seu destino. Tradicionalmente, sabe-se qual o ORIXÁ da cabeça, pela leitura de búzios - forma divinatória na qual se lê o ODU. Para isso, usa-se búzio africano (CAURI ) previamente preparado para esse fim. Voltaremos, após uma visão geral da estrutura do CANDOMBLË, aos ORIXÄS e tipos psicológicos.

O CANDOMBLÉ expressa-se nos terreiros ou roças, onde se cultuam os ORIXÁS e os ancestrais ilustres. 0 terreiro contém dois espaços, com características e funções diferentes: (a) um espaço urbano, construído, onde se dá a dança; (b) um espaço virgem (árvores e uma fonte, equivalentes à floresta africana), que é considerado sagrado.

0 chefe supremo do terreiro é o BABALORIXIÁ ou IYALORIXÁ (pai ou mãe que possuem o ORIXÁ). Eles são detentores de um poder sobrenatural - o AXÉ, a força propulsora de todo Universo. 0 AXÉ impulsiona a prática sagrada que, por sua vez, realimenta o AXÉ, pondo todo sistema em movimento. 0 AXÉ sendo principio e força é neutro. Transmite-se, aplica-se e combina-se aos elementos naturais, que contam e expressam o AXÉ do terreiro, que pode ser: (a) o AXÉ de cada ORIXÁ, realimentado através das oferendas e da ação ritual; (b) o AXÉ

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de cada membro do terreiro, somado ao do seu ORIXÁ, recebido na iniciação, mais o AXÉ do seu destino individual (ODU) e o herdado dos próprios ancestrais; (c) o AXÉ dos antepassados ilustres.

0 AXÉ como força pode diminuir ou aumentar dependendo da prática litúrgica e rigorosa observância dos deveres e obrigações. A força do AXÉ é contida e transmitida através de elementos representativos do reino vegetal, animal e mineral (oferendas) e podem ser agrupados em três categorias: (a) sangue vermelho do reino animal (sangue), vegetal (azeite de dendê) e mineral (cobre); (b) sangue branco do reino animal (sêmen, a saliva), vegetal (seiva), mineral (giz); (c) sangue preto do reino animal (cinzas de animais), vegetal (sumo escuro de certos vegetais) e mineral (carvão, ferro). Estes três tipos de sangue, por onde veicula o AXÉ, com sua coloração, vai determinar a fundamental importância da cor no culto. Resumindo: o AXÉ é, portanto, um poder que se recebe, partilha-se e distribuí-se através da prática ritual, da experiência mística e iniciátIca, conceitos e elementos simbólicos servindo de veículo. É a força do AXÉ que permite que o ORIXÁ venha e realize-se.

A existência transcorre em dois planos: o AIYE (mundo, habitação do homem) e o ORUN (além, habitação dos ORIXÁS, mundo paralelo ao mundo real, que coexiste com todos os conteúdos deste). Cada indivíduo, árvore, animal, cidade etc., possui um duplo espiritual e abstrato no ORUN. Os mitos revelam que, em épocas remotas, o AIYÉ e o ORUN estavam ligados, e os homens podiam ir e vir livremente de um local a outro. Houve, porém, a violação de uma interdição e a conseqüente separação e o desdobramento da existência. Um mito da criação nos conta que nos primórdios, nada existia além do ar. Quando OLORUN começou a respirar, uma parte do ar transformou-se em massa de água, originando ORIXALÁ - o grande ORIXÄ FUNFUN do branco. 0 ar e as águas moveram-se conjuntamente e uma parte deles transformou-se em bolha ou montículo uma matéria dotada de forma - um rochedo avermelhado e lamacento. OLORUN soprou vida sobre ele e com seu hálito deu a vida a EXU, o primeiro nascido, o procriado, o primogênito do Universo.

OLORUN abrange todo espaço e detém três poderes que regulam e mantém ativos a existência e o Universo: IWÁ, que permite ao Universo genérico o ar, a respiração; AXÉ, que permite a existência advir dinâmica; ABÁ, que outorga propósito e dá direção. Ou como diz o poeta Moraes Moreira em "Pensamento Ioruba" : Para tudo ser tem que ter IWA. Para vir a ser tem que ter AXÉ. Para o sempre ser tem que ter ABÁ

Ao combinar esses três poderes de forma específica, OLORUN transmite-os aos IRUNMALÉ, entidades divinas que remontam aos primórdios de universo, encarregados de mantê-las nas diferentes esferas de seu domínio. Os IRUNMALÉ seriam em número de seiscentos, quatrocentos da direita (os ORIXÁS, detentores dos poderes masculinos) e duzentos da esquerda (os EBORAS, detentores dos poderes femininos. os ORIXÁS são massas de movimentos lentos, serenos, de idade imemorial. Estão dotados de um grande equilíbrio que controlam as relações do que nasce, do que morre, do que é dado, do que deve ser resolvido. São associados à Justiça e ao equilíbrio, principio regulador dos fenômenos cósmicos, sociais e individuais.

Vimos que quando OLORUN começou a respirar, gerou ORIXALÁ e EXU, o procriado. Na qualidade de procriado, EXU não pode ser isolado nem classificado em qualquer categoria. Minha homenagem ao meu BARA! Nestes escritos sobre os ORIXÁS, EXU com seu perfil psicológico e o tipo determinante dos seus filhos, abrirão os caminhos sendo o primeiro a ser evocado.

EXU - EXU é o preexistente à ordem do mundo. Como a própria vida, ele

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se transforma sem parar, mas não uniformemente, porque EXU muda o jogo a seu bel prazer - é um "tríckster". É astucioso, vaidoso, inteligente e ambíguo, a tal ponto que os primeiros missionários assustados compararam-no ao diabo, dele fazendo símbolo de tudo que é maldade. Mas EXU, por ser o próprio dinamismo, é quem faz, com seus paradoxos, as coisas manterem-se vivas. É ele que propicia estar o AXE sempre circulando e, ao ser tratado com consideração (oferendas) reage favoravelmente, mostrando-se serviçal e prestativo. EXU revela-se o mais humano dos ORIXÁS, nem completamente mau, nem completamente bom. Por estar relacionado com os ancestrais, ele é o guardião dos templos, das casas, das cidades e das pessoas. Cada pessoa tem o seu BARA - até cada ORIXÁ tem seu EXU. Ele está em tudo e com tudo, pois é o intermediário eterno entre os homens e os deuses. É por isso que em todas as cerimônias do CANDOMBLÉ sua oferenda é a primeira e chama-se PADÉ - que significa reunião. No PADÉ, EXU é chamado, saudado, cumprimentado e enviado ao além, com dupla intenção: convocar os outros ORIXÁS para a festa e ao mesmo tempo afasta-lo, para que não perturbe a boa ordem da cerimônia, com seus golpes de "tríckster". Como transportador das oferendas, ele é OXETUÁ, filho de OXUM com os dezesseis ODU do oráculo (Jogo de búzios) (CAURI) Este aspecto benfazejo de EXU outorga-lhe o poder de restituir a fecundidade ao mundo. Como senhor do poder da transformação, ele é EXU ELEGBARA, que foi cortado em pedaços e em seguida se regenerou e, ao fazê-lo, reuniu simbolicamente o Universo inteiro.

EXU mantém o equilíbrio das trocas, provoca o conflito para promover a síntese. Tudo que se une, multiplica-se, separa-se, transforma-se - tudo é EXU, personificação do principio da transformação. Seu dia é segunda-feira. Ele está associado ao nascente e ao futuro e sua cor é o azul escuro arroxeado, cor do mistério da procriação. Seu animal e o cão; o cacto e o mandacaru são suas plantas. Rege o sexo e usa um chapéu que se assemelha ao falo: não há sexualidade sem EXU.

OKOTÓ é o caracol, símbolo de EXU, e representa a espiral da evolução. Quando se manifesta, é saudado por um de seus nomes (LAROYE). Veste-se de branco, azul e vermelho, leva na mão um tridente ou um ferro de sete pontas ou ainda uma lança.

0 tipo psicológico do filho de EXU tem as seguintes características: é robusto, ágil, dinâmico, incansável, transborda vitalidade. Ë grande amigo dos prazeres da vida, guloso, está sempre com fome e bebe bastante. E por isso que ninguém do CANDOMBLË deve beber nada sem antes jogar no chão da porta da rua, bebida para EXU. Alegre, brincalhão, gosta de pregar peças, esconder objetos, contar mentiras, ensinar o caminho errado. Adora chocar, dizer palavrões. E desordeiro e adora tumultuar festas e reuniões. Quando lhe convém, pode ser extremamente trabalhador, eficiente, incansável e obstinado - tendo em vista sempre o que com isso irá ganhar. Mas é totalmente imprevisível, podendo deixar o trabalho em que se empenha apenas por capricho. Não é, entretanto, Insensível. É prestativo e não recusa sua ajuda aos amigos. É chamado sempre para resolver problemas financeiros, brigas, encrencas amorosas, as quais com habilidade e bom humor consegue dar uma solução feliz. Mas a principal característica dos filhos de EXU e a exacerbação da sexualidade; suas vidas são regidas por intensa atividade sexual, e fidelidade sexual e algo impossível de obter-se dos filhos de EXU.

OXALÁ - Obedecendo a seqüência hierárquica, encontramos à frente dos ORIXÁS FUNFUN do branco, OXALÁ.

OXALÁ é o detentor do poder genitor masculino. Todas suas representações incluem o branco. E um elemento fundamental dos primórdios, massa de ar e massa de água, a protoforma e a formação de todo tipo de criaturas no AIYE e no ORUN. Ao incorporar-se, assume

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duas formas: OXAGUIÃ jovem guerreiro, e OXALUFÃ, velho apoiado num bastão de prata (APAXORÓ). OXALÁ é alheio a toda violência, disputas, brigas, gosta de ordem, da limpeza, da pureza. Sua cor é o branco e o seu dia é a sexta-feira. Seus filhos devem vestir branco neste dia. Pertencem a OXALÁ os metais e outras substâncias brancas.

0 tipo psicológico do filho de OXALÁ é benevolente e paternal, é sábio, calmo, paciente e tolerante. É lento, frio, fechado. Obstinado, age em silêncio. 0 tipo físico de OXALUFÃ é frágil, delicado, friorento, sujeito a resfriados. Compensa sua debilidade física com grande força moral, e seu alvo é realizar a condição humana no que tem de mais nobre. É fiel no amor e na amizade. 0 tipo OXAGUIÃ é um jovem guerreiro combativo. É habitualmente alto e robusto, mas não é agressivo nem brutal. Não despreza o sexo e cultiva o amor livre. É alegre, gosta profundamente da vida, é falador e brincalhão. Ao mesmo tempo é idealista, defendendo os injustiçados, os fracos e os oprimidos. Orgulhoso, sedento de feitos gloriosos é, às vezes, uma espécie de D. Quixote. Seus pensamentos originais geralmente antecipam o de sua época. Ele é o nascente e OXALUFÃ o poente.

ODUDUWA - ODUDUWA, também considerado entidade FUNFUN, recebeu de OLORUN o elemento terra, com o qual ela criou o AIYÉ. Sua cor é preta (azul escuro), por ser representante do AIYÉ. OXALÁ e ODUDUWA são cultuados no mesmo dia (sexta-feira) e em alguns terreiros, os dois conceitos são confundidos.

0 tipo psicológico do filho de ODUDUWA, do ponto de vista físico, é semelhante ao tipo OXALÁ. São magros, franzinos, nervosos e secos como a terra. Mas ao contrário do tipo OXALÁ, os filhos de ODUDUWA são violentos e agressivos, fechados, inseguros e angustiados, tornando-se às vezes susceptíveis, impacientes, intolerantes e desconfiados. Invejosos, vingativos, perseguem aqueles cuja felicidade ou êxito é para eles uma afronta. Sabem manipular os outros e toda sua força está em uma Inteligência curiosa, de senso critico e de ironia ferina. É dominador, autoritário e no trabalho é exigente, perfeccionista e minucioso.

NANÃ - NANÃ, divindade dos primórdios da criação, é associado a lama, água e à morte: recebe no seu seio os mortos, tornando possível o renascimento. 0 fato dela ser um continente, associado com processo e interioridade, conecta com o preto, que se expressa no azul escuro. Por ser força genitora, pertence ao branco. Suas cores são, portanto, a azul e a branca. Seu animal é a rã e o seu dia à a terça-feira.

ORIXÁ da Justiça, NANÃ não tolera traição, indiscrição, nem roubo. Por ser ORIXÁ muito discreto e gostar de se esconder, suas filhas podem ter um caráter completamente diferente do dela. Por exemplo, ninguém desconfiará que uma dengosa e vaidosa aparente filha de OXUM seria uma filha de NANÃ "escondida".

0 tipo psicológico dos filhos de NANÃ à introvertido e calmo. Seu temperamento é severo e austero. Rabugento, é mais temido do que amado. Pouco feminina, não tem maiores atrativos e é muito afastada da sexualidade. Por medo de amar e de ser abandonada e sofrer, ela dedica sua vida ao trabalho, à vocação, à ambição social.

OMULU - OMULU, o Rei da Terra, é filho de NANÃ, mas foi criado por IEMANJÁ que o acolheu quando a mãe rejeitou-o por ser manco, feio e coberto de feridas. É uma divindade da terra dura, seda e quente. É às vezes chamado "o velho", com todo o prestígio e poder que a idade representa no CANDOMBLÉ. Está ligado ao Sol, propicia colheitas e ambivalentemente detém a doença e a cura. Com seu SASSARÁ, cetro ritual de palha da Costa, ele expulsa a peste e o mal. Mas a doença

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pode ser também a marca dos eleitos, pelos quais OMULU quer ser servido. Quem teve varíola é freqüentemente consagrado a OMULU, que é chamado "médico dos pobres". Suas cores são o vermelho e o preto e ele usa urna "filha" de palha da Costa (África) que o cobre da cabeça a cintura. Suas relações com os ORIXÁS são marcadas pelas brigas com XANGÔ e OGUN e pelo abandono que os ORIXÁS femininos legaram-lhe. Rejeitado primeiramente pela mãe, segue sendo abandonado por OXUM, por quem se apaixonou, que, juntamente com IANSÃ, troca-o por XANGÔ. Finalmente OBÁ, com quem se casou, foi roubada por XANGÔ. É um ORIXÃ solitário, das ruas, como EXU. Seu dia e segunda-feira, quando se lhe oferece pipocas. Seu animal é o caranguejo.

0 tipo psicológico dos filhos de OMULU é atarracado, fechado, desajeitado, rústico, desprovido de elegância ou de charme. Pode ser um doente marcado pela varíola ou por alguma doença de pele e é freqüentemente hipocondríaco. Tem considerável força de resistência e é capaz de prolongados esforços. Geralmente é um pessimista, com tendências autodestrutivas que o prejudicam na vida. Amargo, melancólico, torna-se solitário. Mas quando tem seus objetivos determinados, é combativo e obstinado em alcançar suas metas. Quando desiludido, reprime suas ambições, adotando uma vida de humildade, de pobreza voluntária, de mortificação. É lento, porém perseverante. Firme como uma rocha. Falta-lhe espontaneidade e capacidade de adaptação, e por isso não aceita mudanças. É vingativo, cruel e impiedoso quando ofendido ou humilhado.

Essencialmente viril, por ser ORIXÁ fundamentalmente masculino, falta-lhe um toque de sedução e sobra apenas um brutal solteirão. Fenômeno semelhante parece ocorrer no caso de NANÃ: quanto mais poderosa e mais acentuada é a feminilidade, mais perigosa ela se torna e, paradoxalmente, perde a sedução.

OXUMARÉ - OXUMARÉ, filho mais novo e preferido de NANÃ, irmão de OMULU. É uma entidade branca muito antiga, participou da criação do Mundo enrolando-se ao redor da terra, reunindo a matéria e dando forma ao Mundo. sustenta o Universo, controla e põe os astros e o oceano em movimento. Rastejando pelo Mundo, desenhou seus vales e rios. É a grande cobra que morde a cauda, representando a continuidade do movimento e do ciclo vital. A cobra é dele e é por isso que no CANDOMBLÉ não se lha mata. Sua essência é o movimento, a fertilidade, a continuidade da vida. A comunicação entre o céu e a terra é garantida por OXUMARÉ. Leva a água dos mares, para o céu, para que a chuva possa formar-se - é o arco-íris, a grande cobra colorida. Assegura comunicação entre o mundo sobrenatural, os antepassados e os homens e por isso à associa do ao cordão umbilical. Sua cor é o verde alface e todas as combinações do arco-íris.

Seu dia é terça-feira e a oferenda predileta é tatu, galo e frutas frescas. É bissexual e com aspecto feminino, dança com o ADÉ (coroa das rainhas). É homem durante seis meses, mulher outros seis meses. É dono das riquezas escondidas na floresta, nas entranhas da terra e no fundo do mar, onde reside debaixo do oceano: pedras preciosas, ouro, coral pertence-lhe.

0 tipo psicológico dos filhos de OXUMARÉ é aristocrático. Fisicamente é esbelto, seus traços são finos. É dinâmico, inteligente, dotado de espírito curioso e destaca-se pela ironia. Gosta de fofoca e por ser intrigante, atrai, seduz e diverte. É freqüentemente esnobe e gosta de exibir-se, chegando a ser excêntrico e extravagante. Quando rico, é protetor dos jovens de talento. É homossexual ou bissexual. Não à bruto nem grosseiro, é refinado e civilizado, mas pode ser perigoso pela maledicência. Possui uma grande intuição e pode ser adivinho esperto.

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YEMANJÁ - YEMANJÁ é considerada mãe de todos os demais ORIXÁS OGUM, XANGÔ, OBÁ, OXOSSI e OXUM que nasceram de caso ilícito que teve com IFÁ. NANÃ Como vimos, é mãe de OMULU e OXUMARÉ. YEMANJÁ, por sua vez, filha de OLODKUN, ORIXÁ masculino em BENIN, ou feminino em IFÉ, sempre do mar. No Brasil, é muito venerada, e seu culto tornou-se quase independente do CANDOMBLÉ. É representada como uma sereia de longos cabelos pretos. Rege a maternidade, e a mãe dos peixes que representam fecundidade. Seu dia à sábado. Nas grandes "obrigações", são oferecidos cabra branca, pata ou galinha branca. Gosta muito de flores e é costume oferecer-lhe sete rosas brancas abertas, que são jogadas ao mar para agradecimento. Sua cor à a branca com azul. Usa um ADÉ com franjas de miçangas que esconde o rosto. Leva na mão o BÉBÊ -- leque ritual de metal prateado de forma circular, com uma sereia recortada no centro.

0 tipo psicológico dos filhos de YEMANJÁ é imponente, majestoso e belo, calmo, sensual, fecundo e cheio de dignidade e dotado de irresistível fascínio (o canto da sereia). As filhas de YEMANJÁ são boas donas de casa, educadoras pródigas e generosas, criando até os filhos de outros (OMULU). Não perdoam facilmente, quando ofendidas. São possessivas e muito ciumentas. YEMANJÁ, por presidir a formação da individualidade, que como sabemos está na cabeça, está presente em todos os rituais, especialmente o BORI.

OGUM - OUGUM à o primeiro filho de YEMANJÁ, a quem sempre acompanhava, sendo também muito afeiçoado a EXU e seu irmão OXOSSI, ORIXÁ da caça - a quem ele deu suas armas. Foi casado com IANSÃ que o abandonou para seguir XANGÔ. Casou-se também com OXUM, mas vive só, batalhando pelas estradas é o abre-caminhos. Ele é o ORIXÁ do ferro; foi o primeiro ferreiro. É o ORIXÁ da civilização e da técnica. Introduziu a agricultura e, como oferenda, recebe inhame e feijão, os frutos da terra. É o ORIXÁ dos maquinistas, motoristas, ferroviários, operários e de todos aqueles que trabalham com máquinas e ferramentas. É o ORIXÁ da virilidade; remove obstáculos, civiliza o mundo, prove alimentos.

Seu dia é a terça-feira. E nas grandes "obrigações", pode pedir um boi ou um bode. Sua cor é o vermelho, mas gosta também de azul e verde forte. Seu animal o cachorro. É agressivo e brutal e à tido como responsável pelos acidentes de carro, avião e mecânicos em geral, com os quais castiga quem o desrespeitou. Seus filhos devem abster-se de beber cachaça e de andar armado com faca e facão. Por ser sua possessão muito violenta, pode deixar quem o recebe completamente inconsciente e sem controle de seus atos.

Os filhos de OGUM são briguentos, violentos, impulsivos e não perdoam e nãoperdoam as ofensas que foram vítimas. Perseguem energicamente seus objetivos e em momentos difíceis, triunfam onde qualquer outro teria abandonado o combate e perdido toda esperança. Possui humor mutável, indo dos furiosos acessos de raiva a um tranqüilo comportamento. São impetuosos e arrogantes, não se incomodando de melindrar os outros, mas por terem franquezas em suas intenções, e serem sinceros, dificilmente são odiados.

XANGÔ - XANGÔ à um ORIXÁ de fogo, filho de OXALÁ com YEMANJÁ. Diz a lenda que ele foi rei de OYÓ. Rei poderoso e orgulhoso, teve que enfrentar rivalidades e até brigar com seus irmãos para manter-se no poder. Vencido por seus inimigos, refugiu-se na floresta, sempre acompanhado da fiel OYA (IANSÃ), e enforcou-se e ela também. Seu corpo desapareceu debaixo da terra num profundo buraco, do qual saiu uma corrente de ferro - a cadela das gerações humanas. E ele se transformou num ORIXÁ, mas ao mesmo tempo passa a ser um EGUM (espírito dos antepassados). Verdadeiro paradigma, no CANDOMBLÉ, os

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EGUNS não são cultuados junto aos ORIXÁS. 0 EGUM é para os homens um pai e o ORIXÁ à para OXALÁ um filho: XANGÔ é, ao mesmo tempo, um filho de OXALÁ e um antepassado mítico, ligado à realeza, um herói divinizado, fundador da dinastia NAGÔ. Por sua origem real, XANGÔ é o Santo da Justiça, castigando com o raio.

Ele à também conquistador; possui a três esposas: OBA a mais velha e menos amada; OXUM, que era casado com OXOSSI e por quem XANGÔ se apaixona e faz com que ela abandone OXOSSI; e IANSÃ, que vivia com OGUM e que XANGÔ raptou. Esta é a mais nova e a preferida, pois à esposa dedicada e forte guerreira, que precede o marido nas batalhas e, por ser dona do raio, deu o fogo a seu amado XANGÔ comandando as forças da natureza que se caracterizam pela violência: o trovão, o raio (o fogo sobrenatural do céu), atira pedras do céu. Ele é o dinamismo dos elementos da natureza de cujo encontro nascem estes fenômenos meteorológicos. Poder, fogo, movimento, vida e fecundidade - ele recebe da mulher IANSÃ.

Seu animal e o carneiro, cujos ataques são comparáveis à violência do raio e tem seus chifres em espiral como o fogo. É um ORIXÁ libertino, turbulento, vermelho e quente e destaca--se pela intensa atividade sexual. XANGÔ tem pavor da morte ë dos EGUNS. E estes são os opostos que tem que unir: mortal e imortal, pai (dos homens) e filho (de OXALÁ), o que fará com a mediação da mulher (IANSÃ), que vem trazer o fogo, a fecundidade, a continuidade das gerações o poder da vida transmitido de pai para filho por intermédio da gestação na mulher.

Sua cor é vermelha e branca e seu dia é quarta-feira. Gosta do sacrifício do cágado, que multas vezes é chamado seu cavalo, de galo e de pato. Sua possessão uma explosão, de alegria, sua dança é vigorosa e bela e seus filhos saúdam-no com palmas, fogos, gritos e com a expressão "desejamos longa vida a Vossa Majestade" - antes de tudo um Rei. Os objetos sagrados de XANGÔ são o LABÁ e o OXÉ, a dupla machadinha que representa o raio e que pode ser em madeira ou bronze metal - pela cor avermelhada, é consagrado a ele. 0 LABÁ é um capanga de couro pintada, feita só na África, e cujos desenhos são sagrados. Ela à dividida em quatro partes e suas figuras, que lembram o raio, são assimétricas e evocam os três segmentos do raio e do triângulo. 0 número três é o par mais um, sugerindo movimento e continuação - ou seja, a própria vida.

0 tipo psicológico dos filhos de XANGÔ é fisicamente robusto, o queixo forte e voluntarioso, pescoço curto, boca carnuda e sensual. Violentos, orgulhosos, porém sua agressividade não e gratuita: ela se volta contra os maus, pois comoXANGÔ, seus filhos são paladinos da Justiça.

IANSÃ - IANSÃ é a filha de YEMANJÁ com OXALÁ e a esposa preferida de XANGÔ. É guerreira e aventureira como ele, mulher de muitos homens (OXÓSSI,OGUM E XANGÔ. ReIaciona-se com todos os elementos da natureza. A água, sob formal de chuva, de tempestade. 0 ar, sob a forma do vento da tempestade, que arranca árvores, derruba casas. No seu aspecto benéfico, foi o ar de IANSÃ que espalhou as plantas medicinais, anteriormente guardadas por OSSAIN numa cabaça. Ligada a floresta, ela se transforma em um búfalo, cervo ou elefante. Propicia a caça abundante. Mas sua essência é o movimento e o fogo, é o ORIXÁ do raio. Esta relação com o movimento e o fogo faz de IANSÃ uma divindade do sexo e do amor. Ela é rainha por ser a predileta de XANGÔ. E por ser mãe e rainha dos EGUNS, à o único ORIXÁ que não tem medo dos mortos. Seu número é o nove, produto de 3 X 3 - o par Inicial mais um, indicando continuação - puro movimento. 0 seu dia ë quarta-feira e sua cor e a vermelho. Seus objetos são uma espada de cobre e um "espanta moscas", com o qual mantém os EGUNS afastados.

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0 tipo psicológico das filhas de IANSÃ e turbulento, inquieto, cheio de iniciativa. Faz-se notar, provocante e domina os homens, porém à esposa dedicada. Os homossexuais têm como modelo IANSÃ. São mulheres fecundas, mãe de muitos filhos, mas que são criados por uma avó, babá, tia. 0 tipo IANSÃ apenas orienta a educação. Não gosta de trabalho doméstico e nem de trabalho executivo. Prefere ser atriz, fazendeira ou qualquer outra profissão, na qual seja necessário um pouco de aventura, garra e impetuosidade.

OBA - OBA é ORIXÁ ligado a água, guerreira e pouco feminina. Suas roupas são vermelhas e brancas, leva um escudo, uma espada, uma coroa de cobre. Usa um pano na cabeça para esconder a orelha cortada. Conta e lenda que OBA, repudiada por XANGÔ. vivia sempre rondando o palácio para voltar. OXUM, com suas artimanhas, diz a OBA que XANGÔ adora orelha e que ela faça uma sopa com sua orelha, o que será um remédio infalível para conquista-lo. Assim OBA fez e quando' XANGÔ- tomou a sopa e sentiu-a esquisita, quis saber quem a fez e OBA apresenta-se feliz, pensando que havia reconquistando-o. XANGÔ fica horrorizado com a mutilação e expulsa-a para sempre.

0 tipo psicológico dos filhos de OBA, constitui o estereotipo da mulher de forte temperamento, terrivelmente possessiva e carente. Ao contrário de IANSÃ, é mulher de um homem só, fiel e sofrida. São combativas, impetuosas e vingativas. OBA e um ORIXÁ que raramente se manifesta e há pouco estudo sobre ela.Talvez porque nos dias de hoje, mesmo na África ou Brasil, não há espaço para essas características do feminino, que cada vez mais recupera seu poder de IANSÃ.

OXUM - OXUM à ORIXÁ feminino por excelência - o Eterno Feminino. Filha predileta de OXALÁ e YEMANJÁ. Nos mitos, ela foi casada com OXOSSI, a quem engana, com XANGÔ, com OGUM, de quem sofria maus tratos e XANGÔ a salva.

Seduz OMULU, que fica perdidamente apaixonado, obtendo dele, assim, que afaste a peste do reino de XANGÔ. Mas OXUM é considerado unanimemente como uma das esposas de XANGÔ e rival de IANSÃ e OBA. É um ORIXÁ das águas doces, fontes e regatos, e dona do RIO OXUM e de todas as águas que nascem na terra. Diz uma tradição esotérica que OXUM é a própria Mãe Terra, um ser vivo que se auto-regula, sendo os rios suas veias.

OXUM e essencialmente o ORIXÁ das mulheres, preside a menstruação, a gravidez e o parto. Desempenha importante função nos ritos de iniciação, que são a gestação e o nascimento. ORIXÁ da maternidade, ama as crianças, protege a vida e tem funções de cura. OXUM à fecundidade e fartura que se manifesta no fruto das águas (peixe) e no fruto da terra (inhame) que estão sempre presentes nos seus cultos. Fecundidade e fertilidade são por extensão, abundância e fartura.

OXUM é o ORIXÁ da riqueza - dona do ouro, fruto das entranhas da Terra. É alegre, risonha, cheia de dengues, Inteligente, mulher-menina que brinca de boneca, e mulher-sábia, generosa e compassiva, nunca se enfurecendo. Elegante, cheia de jóias, é a rainha que nada recusa, tudo dá. Tem o título de IYALODÊ entre os povos IORUBÁ: aquela que comanda as mulheres na cidade, arbitra litígios e é responsável pela boa ordem na feira. Também comanda as feiticeiras, o que só aparece como predileção pelo pássaro - um pombo de olhos vermelhos. Desempenha importante papel no jogo de búzios, pois à ela quem formula as perguntas que EXU responde.

Seu dia à sábado, dia das águas sua cor é o amarelo dourado e o ovo é a ela consagrado por representar a gestação Adora o mel, doce como

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ela. Quando OXUM dança traz na mão uma espada e um espelho, revelando-se em sua condição de guerreira da sedução. Ela se banha no rio, penteia seus cabelos, põe suas jóias e pulseiras, tudo isso num movimento lânguido e provocante. ORIXÁ do ouro, da bonança, da riqueza, é essencialmente a Mãe - generosa, pródiga e complacente e por isso, como OXUM EWUJI e saudado no PADÉ, começo de todo ritual do CANDOMBLÉ.

0 tipo psicológico dos filhos de OXUM possuidor de muita beleza física. São bem proporcionados de corpo, geralmente claros e louros. Representa sempre o tipo que atrai e que é, sempre perseguido pelo sexo oposto (não quem conquista como IANSÃ. Aprecia o luxo e o conforto, é vaidoso, elegante, sensual e gosta de mudanças, podendo ser infiel. Mas é calmo, tranqüilo, emotivo, chora facilmente. É astuto, conseguindo tudo que quer com imaginação e intriga. A pesar de ser complacente e pródigo pode vir a ser Interesseiro, preguiçoso e indeciso. É muito desconfiado e possui dor de grande intuição que muitas vezes é posta à serviço da astúcia.

OXOSSI - OXOSSI é o Rei do Keto, filho de OXALÁ e YEMANJÁ ou, nos mitos, filho de APAOKA (jaqueira). É o ORIXÁ da caça; foi um caçador de elefantes, animal associado à realeza e aos antepassados. Diz um mito que OXOSSI encontrou IANSÃ na floresta, sob a forma de um grande elefante, que se transformou em mulher. Casa com ela, tem muitos filhos que são abandonados e criados por OXUM. OXOSSI vive na floresta, onde moram os espíritos e está relacionado com as árvores e os antepassados. As abelhas pertencem-lhe e representam os espíritos dos antepassados femininos. relacionasse com os animais, cujos gritos imita a perfeição, e caçador valente e ágil, generoso, propicia a caça e protege contra o ataque das feras. um solitário solteirão, depois que foi abandonado por IANSÃ e também porque na qualidade de caçador, tem que se afastar das mulheres, pois são nefastas à caça.

Está estreitamente ligado a OGUM, de quem recebeu suas armas de caçador. OSSAIN apaixonou-se pela beleza de OXOSSI e prendeu-o na floresta. OGUMconsegue penetrar na floresta, com suas armas de ferreiro e libertá-lo. Ele estaassociado, ao frio, à noite, à lua; suas plantas são refrescantes. Seu dia é quinta-feira.

Veste-se de azul turqueza ou de azul e vermelho. Leva um elegante chapéu deabas largas enfeitado de penas de avestruz nas cores azul e branco. Leva doischifres de touro na cintura, um arco, uma flecha de metal dourado e um IRUKERÉ - chicote de rabo de touro para afastar os antepassados. Sua dança sumula o gesto de atirar flechas para a direita e para a esquerda, o ritmo é "corrido" na qual ele imita o cavaleiro que persegue a caça, deslizando devagar, às vezes pula e gira sobre si mesmo. É uma das danças mais bonitas do CANDOMBLÉ.

0 tipo psicológico, do filho de OXOSSI é refinado e de notável beleza. É o ORIXÁ dos artistas intelectuais. É dotado de um espírito curioso, observador degrande penetração. São cheios de manias, volúveis em suas reações amorosas, multo susceptíveis e tidos como "complicados". É solitário, misterioso, discreto, introvertido. Não se adapta facilmente à vida urbana e é geralmente um desbravador, um pioneiro. Muitas vezes exerce um fascínio sobre os rapazes e pode ser homossexual. Possui extrema sensibilidade, qualidades artísticas, criatividade e gosto depurado. Sua estrutura psíquica é muito emotiva e romântica.

LOGUM EDÉ - LOGUM EDÉ à filho de OXOSSI e de OXUM. É mulher durante

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seis meses, vivendo na água, e nos outros seis meses à homem, vivendo no mato, Propicia a caça e a pesca. Veste-se como um AYABÁ, com saia cor-de-rosa, usa uma coroa de metal dourado (não o ADÉ das rainhas), um arco e uma flecha. Usa sempre cores claras. Com seu aspecto masculino usa capacete de metal dourado, capangas, arco e flecha ou espada. Sempre acompanha na dança OXUM e OXOSSI.

0 tipo psicológico dos filhos de LOGUM EDÉ é muito orgulhoso de seu corpo - a atual política de cultivo do corpo poderia ser regida por LOGUM EDÉ. É sedutor, vaidoso, preguiçoso e ciumento. São tipos ambivalentes, podendo ser bem educados, bem humorados, refrescantes como a folha de ODUNDUN e a água, mas também serem sombrios como os antepassados. 0 ORIXÁ LOGUM EDÉ à responsável por tonturas e desmaios o que pode ser confundido com provocações dos EGUNS Seu culto na África está quase que extinto, porém na Bahia mantém-se vivo. Seus filhos não podem usar vermelho.

OSSAIN - OSSAIN, filho de OXALÁ e YEMANJÁ, irmão de OGUM, OXOSSI, XANGÔ. Vive na floresta - é também um ORIXÁ do ar livre, onde encontrou e prendeu OXUM. É inimigo de XANGÔ de quem dizem que tentou roubar OBA e teve que enfrentar a ira de XANGÔ, perdendo neste combate uma perna. Outras lendas contam que ele roubou de XANGÔ o fogo e deu aos homens, sendo este o motivo da inimizade.

OSSAIN é o ORIXÁ das folhas e da medicina. Embora como vimos, graças a IANSÃ todos os ORIXÁS tenham suas folhas, em princípio OSSAIN continua sendo o dono delas. Há folhas para tudo: para cada tipo de doença, de desgraça ou de bem, para conseguir a felicidade, dinheiro, longevidade. As folhas são sempre portadoras de AXÉ e no CANDOMBLÉ sem elas e sem OSSAIN nada se faz - portanto, OSSAIN é o dono do AXÉ!

Sua cor é verde e seu dia segunda-feira. Na sua qualidade de senhor da vegetação, ele está ligado com a terra. É um ORIXÁ tônico, como OMULU ele manca ou não tem uma perna. Seu metal é o ferro. Está profundamente relacionado com a cabaça - que representa a matriz cósmica, onde guarda suas folhas e seu poder. Está associado aos pássaros. usa uma coroa com um pássaro em cima. Convém lembrar que o simbolo das feiticeiras é uma cabaça na qual está encerrado um pássaro que simboliza seu poder e executa os trabalhos que elas determinam. OSSAIN representa, pois, o poder mágico da cabaça - gestação. É o ORIXÁ da medicina, aquele que com suas folhas fabrica remédios, encantos, talismãs e cura doentes. 0 conhecimento das folhas é a parte mais secreta do CANDOMBLÉ.

OSSAIN usa na cabeça uma coroa de metal prateado ornada com um pássaro, leva na cintura cabacinhas onde guarda seus remédios, e leva numa mão uma grande cabaça prateada e noutra uma ferramenta de sete pontas e um pássaro na ponta central. É o ORIXÁ dos médícos e cientistas.

0 tipo psicológico dos filhos de OSSAIN tem um temperamento secreto e imprevisível, ele se esconde, "põe outro na frente porque não gosta de aparecer". Do ponto de vista morfológico, à delicado e frágil; às vezes quando velhos, torna-se manco ou aleijado. É discreto, calado, nada conta de sua vida e faz questão de preservar sua liberdade. Desligado dos aspectos triviais da vida cotidiana, quando persegue a solução de algum problema científico ou filosófico esquece de alimentar-se. É sensivell, generoso, compassívo, ama os animais sobretudo os pássaros. Seu caráter equilibrado não deixa simpatias ou antipatias interferirem em suas decisões. Seus julgamentos sobre os homens e as coisas não--são fundamentados sobre a noção de bem e de mal, mas sobre a eficlência delas.

Estas notas Introdutórias ao estudo do CANDOMBLÉ - a Religião dos

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ORIXÁS começou com saudação a EXU (veiculador do AXÉ entre os homens e os deuses), e tem sua conclusão com nosso encontro com OSSAIN (veiculador do AXÉ entre os homens).

OSSAIN ao roubar o fogo para os homens, abriu-lhes o caminho da consciência e, por ser dono do AXÉ das plantass detém a energia da prática do CANDOMBLÉ - no CANDOMBLÉ, nada se faz sem a energia das plantas - e a energia da cura, através da energia curativa das mesmas. OSSAIN que manco e frágil, que com a força da limitação e da fragilidade mantém uma extraordinária reserva de energia criadora, curativa e de resistência passiva em direção aos objetivos que fixou como meta à o nosso CURADOR FERIDO. São Paulo, inverno de 1990.

GLOSSÁRIO - Grafamos em maíusculo no texto, o resultante do aportuguesamento das palavras e expressões NAGÔS. Certos estuediosos, como Juana Elbeín dos Santos e Pierre Fatumbi Verger, utilizam as expressões iourubás, sendo que conservamo-las nas citações ao longo do presente Glossario.

ABÁ - princípio que induz, permitindo às coisas terem orientação, direção, objetivo em sentido preciso; um dos três princípios ou forças que compoem o Universo. (Vide: AXÉ e IWÁ.).ABÊBÊ - Leque de YEMANJÁ, prateado, de forma circular, com uma sereia recortada no centro.ADÉ - Coroa de rainha, utilizada por OXUMARÉ, LOGUM EDÉ e YEMANJÁ. AIYÉ - 0 inundo. "0 àíyé compreende o universo físico concreto e a vida de todos os seres naturais que o habitam, particularmente os ará-àiyé, habitantes do mundo, humanidade." (Juana Elbein dos Santos, 1984, p. 53.) (Vide: ORUN).APAOKA Jaqueira, de quem OXÓSSI é considerado filho.APERERÉ 0 suporte da cabeça. (Vide: ORI).APAXORÓ Bastão em que se apõia OXALUFÃ, É feito de prata, mede cento e vínte centímetros, tem um pássaro na extremidade superior, com nove discos metálicos, Inseridos horizontalmente, em diferentes alturas, dos quais pendem pequenos objetos, sininhos redondos ou em forma de funil. 0 APAXORÓ pode atravessar os nove espaços do ORUN, sendo por isso muito poderoso e sagrado. ARÁ-AIYÉ - Ou ARAYÉ: os habitantes do AIYÉ, do mundo. (Vide: AYIÉ). AXÉ - Força propulsora do Universo, que está contida em todas as coisas ido reino animal, vegetal e mineral, quer sejam da água (doce ou salgada), da floresta, do mato, ou do espaço urgano. "É através do àsér propulsionado por Exu, que se estabelece a relação do àié - a humanidade e tudo que é vida -com o órun - os espaços sobrenaturais e os habitantes do além. (.:.) Receber àxé significa incorporar os elementos simbólicos que representam os princípios vitais e essenciais de tudo o que existe, numa particular combinação que Individualiza e permite uma significação determinada. Trata-se de Incorporar tudo o que constitui o àiyé e o òrun o mundo e oalém." (Juana Elbeín dos Santos, 1984, p. 37/43).AYABÁ - ou IYABÁ. Nome genérico dos ORIXÁS femininos. BABALORIXÁ - Homem chefe do terreiro ou roça, nos rituais e cerimônias do CANDOMBLÉ, também chamado BABALAÔ ou pai-de-santo. Além dessas funções, incumbe-lhe cuidar da iniciação dos filhos ou filhas-de-santo na religião dos IORUBÁS. BARA - EXU BARA, EXU Individual. Cada ORIXÁ possui seu EXU, com o qual constitui uma unidade - é o elemento EXU que executa suas funções. Assim, no terreiro, cada ORIXÁ faz-se acompanhar de seu EXU particular (BARA), e seu nome à Invocado, sendo-lhe felto oferendas, antes do próprio ORIXÁ. Por ocasião da iniciação, o filho ou a filha-de-santo recebe e duas vazilhas: uma que representa o ELEDÁ e outra o EXU pessoal, o BARA. Assim como os ORIXÁS, cada pessoa tem seu próprIo EXU, que está ligado tanto a seu destino Individual, como ao seu desenvolvimento.

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BENIN - Região africana de onde vieram ao Brasil, nos Séculos XVIII e XIX, como escravos, os NAGÔS-IORUBÁS.BORI - bo + ori = adorar a cabeça; cerimônía através da qual a pessoa passa a ser consagrada aos ORIXÁS. CANDOMBLÉ - A relígíão dos ORIXÁS, originária da região dos IORUBÁS (África), tendo a cidade de São Salvador na Bahia de Todos os Santos, também chamada Roma Negra, o centro à partir do qual se difundiu pelo Brasil. As práticas religiosas' do CANDOMBLÉ dão-se no terreiro ou roça, que se subdivide em um espaço sagrado, privado, o "mato", que cobre cerca de dois terços do terreiro, e o espaço profano, público, havendo intercâmbio entre, esses dois espaços. No terreiro, há diversos templos (ILÉ-ORIXÁ), onde são cultuados os diferentes ORIXÁS, reunindo os grupos de fiéis, praticantes e iniciados. Em cada templo, há o "assento" do ORIXÁ e os elementos que compõem e expressam seus diferentes aspectos. 0 conjunto de atividades do terreiro está sujeito à coordenação da YALORIXÁ ou BABALORIXÁ. 0 Terreiro aglutina, portanto, o culto de todos os ORIXÁS, sendo essa característica religiosa própria do Brasil; na África, os ORIXÁS são cultuados Individualmente, em cada região ou cidade. CAURI - Búzio africano, utilizado com fins divinatórios no CANDOMBLÉ. Diversos ORIXÁS utilizam os CAURIS em seus ornamentos e seus símbolos: está no SASSARÁ de OBALUAIÊ, seu patrono, no IRUKERÉ de OXÓSSI,nos ornamentos de NANÃ. Os CAURIS pertencem ao branco, sendo pedaços do branco, interação de dois poderes genitores; símbolos por excelência dos dobles espirituais e dos ancestrais. EBORA - IRUNMALÉ detentor dos poderes femininos, encabeçados por ODUDWUA. A água e a terra veiculam o AXÉ genítor femínino no - água dos mares, rios, lagos, mananciais, água "sangue branco" da terra - nesse sentido, o branco continua sígniflcando o poder genitor feminimo e ODUDWUA sendo considerado entidade FUNFUN no Brasil, o termo EBORA caiu quase em desuso, sendo todas as entidades chamadas genericamente de ORIXAS, distinguindo aquelas que s&ati