18
1 Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao Desenvolvimento Sustentável Caso do Comitê Cívico pela Defesa da Terra (CCDT), Thomas A. Anderson e outros. A Federação de Gália Caso No. DR31031999 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos Universidad de los Andes Facultad de Derecho Bogotá, Colômbia Fundação Getulio Vargas FGV Direito Rio Centro de Direito e Meio Ambiente Rio de Janeiro, Brasil Tulane University Law School New Orleans, United States of America Fevereiro de 2016 New Orleans

Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

1    

Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao Desenvolvimento

Sustentável

Caso do Comitê Cívico pela Defesa da Terra (CCDT), Thomas A. Anderson e outros. A Federação de Gália

Caso No. DR31031999 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos

Universidad de los Andes Facultad de Derecho Bogotá, Colômbia

Fundação Getulio Vargas – FGV Direito Rio Centro de Direito e Meio Ambiente

Rio de Janeiro, Brasil

Tulane University Law School New Orleans, United States of America

Fevereiro de 2016 New Orleans

Page 2: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

2    

Os fatos do caso

Primeira seção: Sobre o Estado de Sião, os movimentos ambientalistas e o desenvolvimento econômico 1. A República de Sião é um país montanhoso com uma população de,

aproximadamente, 12.000.000 (doze milhões) de habitantes, de acordo com o último censo realizado em 2014. O país tem uma longa costa no Oceano Pacífico e é um dos 20 países mais biodiversos do mundo, segundo o Centro de Monitoramento da Conservação do Ambiente, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

2. Sião teve um conflito armado interno desde fins da década de 70. Em 1978 o

General Maurício Coutinho, junto com outros membros das forças públicas, pegou em armas para enfrentar o governo socialista escolhido democraticamente em Sião nas eleições de 1976. Este enfrentamento militar falhou em seu objetivo de derrocar o governo estabelecido, mas acabou criando um grupo guerrilheiro que tratava, segundo seus depoimentos públicos, de: “retornar à ordem e ao rumo do país que foram perdidos pelo governo sem destino que tinha tomado o poder no ano 1976, sob a farsa de uma democracia”.

3. O grupo armado criado nesse momento continuou de forma ilegal depois disso.

Por conseguinte, iniciou-se uma guerra sangrenta que foi transformando-se com o passar dos anos, pois, para este grupo armado, não existiam governos legítimos, dado que a democracia tinha sido distorcida e tinha perdido sua essência. Atualmente, o grupo insurgente se chama Patria e Seguridad (PS) e segue à margem da lei margem da lei, lutando contra as forças estatais.

4. De acordo com os dados de inteligência do Estado de Sião, estima-se que o PS

tenha aproximadamente 30.000 (trinta mil) combatentes presentes em quase todas as regiões do país, mas principalmente exercem um forte controle territorial na região sudoeste, na fronteira com a Clonália. Por sua vez, o exército oficial de Sião é o terceiro maior da América Latina e tem um exército permanente de aproximadamente 350.000 (trezentos e cinquenta mil) soldados e policiais.

5. Na região sudoeste do país os enfrentamentos são constantes e, às vezes, por dias

inteiros o PS toma pequenos povoados, pois o acesso a essas regiões é remoto e complicado para as forças estatais.

6. Estima-se que desde 2007 a fonte principal de financiamento para o grupo

insurgente PS deixou de ser a produção e exportação de droga e passou a ser a extração de recursos naturais, especialmente a mineração de ouro e o coltan. Estima-

Page 3: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

3    

se que o PS produza anualmente entre 2 e 5 milhões de dólares anuais, exportando ilegalmente esses recursos naturais que atravessam a fronteira e são comercializados em outros países vizinhos.

7. A região sudoeste é a área comprovada com as reservas mais altas de ouro e,

portanto, não é estranho que o conflito tenha sido particularmente intenso nessa área, pois esses recursos são estratégicos dentro do conflito interno que se vive no Sião.

8. Apesar das dificuldades geradas pela guerrilha, a República do Sião tem sido um

país com um crescimento econômico estável. Calcula-se que na primeira década do século XXI o Sião teve uma média de crescimento de 4.2 % em seu produto interno bruto (PIB) anual, e de 2011 a 2015 a média do crescimento foi de 3.8 %. Porém, estima-se que cerca de 13% de sua população vive em condições de pobreza extrema e outros 25% em condições de pobreza.

9. Os setores econômicos mais importantes têm sido a exportação de manufatura e

os produtos agrícolas, dentro dos quais a quinoa posicionou-se como o principal produto agrícola de exportação, representando 32% das exportações de todo o país.

10. Porém, com a Lei Nacional de Novas Energias e Desenvolvimento (Lei n° 4271

de 2012), o setor energético assumiu uma nova força dentro do desenvolvimento econômico do país.

11. Segundo a exposição de motivos da Lei Nacional de Novas Energias e

Desenvolvimento com esta lei tratava-se de: “criar novos mercados e atores para a renovação na produção, distribuição e uso de fontes de energia, a nível nacional, a fim de criar mecanismos de concorrência de produção energética que possam proporcionar melhores preços para os consumidores locais, mas que, por sua vez, tornem a República de Sião em um ator central do mercado de energia, a nível regional, pois o setor carece de investimento privado internacional que ele precisa”.

12. No terceiro parágrafo do artigo 345 da Lei Nacional de Novas Energias e

Desenvolvimento foram criadas as rondadas energéticas para encontrar fontes de energia não convencionais. Neste parágrafo foi definido que: “o país iria utilizar formas contratuais de concessão com atores privados, estruturadas através de rodadas de licitações públicas para promover a entrada de atores privados na exploração e extração de recursos naturais e de fontes de energia não convencionais”.

13. As ONGs e os especialistas, reunidos em uma rede nacional denominada Foro

Nacional do Ambiente (FNA), após a entrada em vigor da Lei Nacional de Novas Energias e Desenvolvimento, foram enfáticos em ressaltar em um comunicado público que: “esta nova lei de energias estava abrindo o caminho para formas não convencionais de produção de energia, que não tinham sido vastamente discutidas a nível nacional, e para as tecnologias que a institucionalidade do país não podia regular corretamente”. Porém a imprensa nacional e as autoridades nacionais consideraram

Page 4: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

4    

esses depoimentos como “alarmistas” e produto da “radicalidade e fanatismo dos movimentos ambientalistas que se opõem ao desenvolvimento do país”.

14. Devido à pressão exercida por diversos setores sociais, a República do Sião

decidiu desenvolver, em um decreto baixado pelo Ministério de Mineração, uma regulamentação específica da nova lei de energia em relação às fontes de energia não convencionais, concentrado particularmente no fraturamento hidráulico comumente conhecido como fracking.

15. O fraturamento hidráulico, ou fracking, consiste da injeção no subsolo de uma

mistura de água, areia e produtos químicos, em pressões tais que permitam a ruptura das rochas de xisto, em cujos poros estão o gás e o petróleo. Para isso, primeiro é preciso realizar uma perfuração vertical até alcançar a profundidade na qual estão formações geológicas (entre um e cinco quilômetros) e depois uma série de perfurações horizontais de 1 a 5 km de extensão.

16. A regulação particular do fracking conseguiu ser realizada a nível nacional pelo

Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos e procedimentos para a exploração e aproveitamento dos hidrocarbonetos em jazidas não convencionais do território nacional.

17. O decreto n° 675 de 2013 definia no primeiro artigo que: “para efeitos da

presente lei será compreendida como jazida não convencional aquela formação rochosa com pouca permeabilidade primária, que deva ser estimulada para melhorar as condições de mobilidade e recuperar os hidrocarbonetos”. No segundo artigo também se definiu que: “As jazidas não convencionais incluem gás e petróleo em areias e carbonatos embutidos, gás metano ligado às jazidas de carvão (CBM), gás e petróleo de xistos (shale), hidratos de metano e areias betuminosas.”

18. Por sua vez, o decreto n° 675 declarou a atividade de exploração e

aproveitamento de hidrocarbonetos em jazidas não convencionais, entre elas o fraturamento hidráulico, como uma atividade de interesse nacional e ordem pública. Devido à declaração de interesse público, os departamentos ou entidades territoriais a nível local não podem proibir ou impor exigências adicionais às definidas no decreto regulamentar baixado pelo Ministério de Mineração.

19. Adicionalmente ao decreto regulamentar n° 675 de 2013, foram emitidas as

resoluções n° 1493, no dia 4 de novembro de 2013, e a Resolução n° 8263, de janeiro de 2014, ambas destinadas a definir as especificações para o desenvolvimento do fracking a nível nacional.

20. No decreto n° 675 de 2013, em seu artigo n° 137, definiu-se que “as empresas

que solicitarem uma permissão de perfuração usando técnicas não convencionais, terão de tornar público os químicos e as substâncias adicionais à água que utilizarem no processo de fraturamento hidráulico, exceto em casos excepcionais nos quais esta

Page 5: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

5    

informação esteja protegida como segredo industrial, pois se trata de fórmulas com valor comercial”.

21. A proteção sob o pretexto do secreto industrial sobre os químicos e as

porcentagens destes fluídos utilizados na perfuração não convencional foi fortemente criticada pelo Foro Nacional do Ambiente (FNA). Segundo o relatório apresentado pelo FNA, analisando a regulação do fracking, o artigo n° 137 do decreto n° 675 de 2013 diz: “a norma acaba sendo um tigre de papel, pois o caráter excepcional da proteção do segredo industrial é ambíguo e muito genérico”.

22. Esta crítica do FNA começou a gerar uma grande preocupação a nível nacional

sobre a atividade do fracking. Inclusive a Ministra de Ambiente Isabel Vilaseca reconheceu publicamente em dezembro de 2013 que: “As atuais condições institucionais e a regulação do fracking são experimentos que podem colocar em risco os recursos naturais, e é preocupante a falta de informação sobre a tecnologia que a República do Sião tem neste momento”.

23. Porém, em uma conferência de imprensa, realizada também em dezembro de

2013, na qual participou o Ministro de Mineração e a Chanceler do Sião, declarou-se que “a proteção da informação comercial, definida no artigo n° 137 do decreto n° 675 de 2013, faz parte das obrigações do país dentro dos Acordos sobre os Obstáculos Técnicos ao Comércio (OTC) da Organização Mundial do Comércio (OMC), que estabelece que os membros da OMC devam notificar aos outros membros sobre as modificações de seus regulamentos e proteger qualquer informação, criação ou modificação de procedimentos que tenha valor comercial (…) Razão pela qual o Estado não podia agir de maneira diversa e estava, portanto, com as mãos atadas em relação a esse assunto em particular”.

24. Em janeiro de 2014, através de uma parceria entre a Agência Nacional de

Hidrocarbonetos (ANH), o Ministério de Mineração (MM), e o financiamento do Banco Regional de Desenvolvimento da Federação de Gália (BRDRG), a República do Sião identificou cinco regiões do país que foram declaradas “de importância estratégica para a produção de fontes de energia não convencionais no país”.

25. Particularmente na região sudoeste do país, perto da fronteira com a Clonália, foi

lançada a Rodada 1, pois segundo a pesquisa técnica da ANH e do MM foram encontrados: “os mais claros indícios de reservas economicamente viáveis de rochas de xisto que, segundo as pesquisas técnicas, provavelmente contêm reservatórios massivos de gás e petróleo que são removíveis através da tecnologia de fraturamento hidráulico”

26. De acordo com a Lei Nacional de Novas Energias e Desenvolvimento: “cada

região seria entregue em licitações públicas para empresas que serão encarregadas da exploração e aproveitamento dos recursos energéticos e com quem o Estado assinará contratos de concessão por 20 anos”.

Page 6: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

6    

27. Por sua vez, a Lei Nacional de Energias em seu artigo n° 254 definiu que: “nos

projetos de desenvolvimento energético, para os quais sejam destinadas mais de 200.000 (duzentas mil) hectares, a empresa que execute o projeto juntamente com as entidades públicas desenvolverão uma área de reserva florestal de conservação em ecossistemas semelhantes e em extensões de terra de 1 hectare por cada mil entregues em concessão, a fim de compensar o ecossistema, devido à intervenção extrativa que seja feita. Essas áreas de reserva florestal deverão ser definidas para evitar a intervenção humana e permitir que o ecossistema seja consolidado”. Esta cláusula foi conhecida como o “braço verde da lei de energia” e foi concebida como uma nova ferramenta de conservação e balanço do desenvolvimento do país.

Segunda seção: Sobre o fraturamento hidráulico e o contrato de aproveitamento com a empresa Cypher 28. Em 20 de março de 2014 a Agência Nacional de Hidrocarbonetos assinou um

contrato de exploração com a empresa Cypher, em que entregou à empresa uma área de 1.1 milhão de hectares na região sudoeste do país, a fim de desenvolver atividades de exploração e aproveitamento dos depósitos de gás e petróleo preliminarmente descobertos. Esse contrato foi concedido através de uma licitação pública, na qual a empresa Cypher apresentou a oferta mais competitiva desde uma análise de custo-benefício.

29. O contrato de concessão tornou-se público quase que de maneira imediata, e

houve três cláusulas (cláusulas n° 74, 89 e 167) que chamaram especial atenção do país, devido ao seu escopo e às condições excepcionais.

30. A cláusula n° 74 definia que: “devido aos problemas de ordem pública, vividos na

República do Sião e particularmente na região sul oeste, onde está localizada a área concedida, a República do Sião reconhece que não pode garantir plenamente a segurança das atividades comerciais na área, e, portanto, autoriza à Empresa Cypher a contar com a presença e a proteção do exército da Federação da Gália, pois a empresa Cypher é uma filial da empresa Oracle, domiciliada na Federação da Gália (…) Por sua vez, devido às condições excepcionais de ordem púbica, a empresa também tem autorização para contar com forças armadas privadas, contratadas diretamente pela empresa, para cuidar do projeto e dos seus funcionários. Os soldados, quer do exército nacional de um país ou das forças armadas privadas, serão regidos sob as leis da Gália e têm imunidade perante as leis do Sião, enquanto estiverem exercendo funções dentro ou ao redor da área do projeto de extração Revolution”.

31. Por sua vez, a cláusula n° 89 define que: “devido aos riscos associados ao projeto

e às condições sociais da área do projeto, os trabalhadores locais ou estrangeiros que sejam contratados pela empresa Cypher, para trabalhar no desenvolvimento do projeto, serão regidos pela lei de trabalho da Gália e não pela de Sião, a fim de

Page 7: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

7    

garantir a estabilidade e a competitividade das operações, bem como a rápida solução de potenciais disputas trabalhistas (…) no mesmo sentido, caso haja divergência contratual, será um tribunal de arbitragem da Gália quem decidirá a disputa. Esta mesma cláusula é aplicada para as leis ambientais”.

32. Finalmente, a cláusula 167 do contrato de concessão determina que: “o projeto

de conservação que define a cláusula verde da lei de energia (artigo n° 254) será desenvolvido em um ecossistema semelhante ao do projeto Revolution, mas a decisão do lugar exato e a expansão caberá somente à empresa Cypher e será acatada pelas autoridades nacionais, desde que cumpra com os requisitos definidos pela norma”.

33. A empresa Cypher, segundo explicou em um comunicado público entregue

depois da concessão, procura “desenvolver o projeto Revolution, que é um esforço da empresa em parceria com o Banco Regional de Desenvolvimento da Federação da Gália, para introduzir o fraturamento hidráulico como tecnologia que revolucionará o mercado de energia no país e na região e assim colocar a República do Sião nas esferas mais avançadas de produção de energia do mundo”.

34. Estima-se que participarão do projeto 350 funcionários oriundos da área de

influência do projeto, e, aproximadamente, 570 funcionários que, devido ao conhecimento especializado requerido, serão provavelmente estrangeiros e contratantes que tenham trabalhado anteriormente com a Oracle, que é a casa matriz da Cypher.

35. Em maio de 2014 a empresa Cypher entregou seu relatório final de exploração,

no qual se estima que no projeto Revolution, localizado na região sudoeste, há uma reserva de gás de xisto, que, com produção de 2.000.000 (dois milhões) de barris diários, teria reserva suficiente para 35 anos. Devido ao tamanho da reserva, a empresa Cypher priorizou este projeto e apresentou em julho de 2014 um estudo de impacto ambiental, para iniciar em setembro a exploração formal dessas reservas, sob as condições definidas no contrato de concessão assinado com a República do Sião.

36. O estudo de impacto ambiental (EIA), entregue em julho 2014, foi aprovado

rapidamente pelo Ministério de Ambiente, em parte devido à pressão que o governo da Gália vinha exercendo para a execução do contrato, visto que tinham insistido continuamente em que, qualquer demora na aprovação de permissões ou por modificação de procedimentos, poderia alterar o equilíbrio financeiro do projeto.

37. No EIA a empresa Cypher foi habilitada iniciar as atividades de aproveitamento a

partir de setembro de 2014. A aprovação realizou-se rapidamente devido a um novo decreto regulamentar (Decreto n° 628 de 2014) que concede somente “dois meses às autoridades ambientais para analisar o EIA e propor as modificações necessárias, uma única vez, a fim de não atrasar ou demorar os projetos de desenvolvimento do país.”

Page 8: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

8    

38. Na resolução da aprovação do EIA e na entrega da licença ambiental, por parte do Ministério de Ambiente, esta entidade anotou que “O Ministério considerava que algumas medidas de mitigação, especialmente as relacionadas com o uso da água, podiam colocar em risco os recursos hídricos dos habitantes da região, e que a empresa Cypher deveria criar um fundo de compensação e mitigação dos impactos ambientais do projeto”. Esta observação foi vista por parte da empresa Cypher como uma inapropriada valoração da informação técnica e, por causa disso, enviou uma carta ao Presidente da República na qual dizia que: “a falta de rigor técnico do Ministério do Ambiente no processo de licenciamento, faz com que a empresa seja forçada a pensar que existem motivos alheios ao projeto, pois o Ministério não quer que ele seja desenvolvido, e, portanto, se não retirar essa anotação será iniciado um processo perante a OMC, por trato discriminatório e imposição ilegal de barreiras contra o comércio, visto que coloca em risco a operação total da empresa Cypher na República do Sião”.

39. A resolução não foi modificada, mas o Presidente da República emitiu um

comunicado no qual afirmava que “a soberania e o poder regulatório da República do Sião não são negociáveis, e as empresas que entrem no país teriam que se submeter às leis do país e em circunstância alguma este governo cederá às pressões de agentes privados”. Este depoimento foi celebrado por diversas organizações sociais que viram positivamente o fato de o Estado ser mais severo em seu discurso sobre as empresas extrativas estrangeiras. Porém, esse depoimento não conduziu a modificação alguma na aprovação do EIA apresentado pela empresa Cypher.

40. Dentro do EIA foi aprovado um plano de gestão de águas que envolve um

tratamento excepcional, visto que a área na qual o projeto Revolution é realizado tem fontes de água bem limitadas. Por essa razão, dentro do plano de gestão ambiental apresentado pela empresa Cypher e para evitar o contínuo fluxo de caminhões-cisterna e os riscos ligados a esse transporte, foi proposto o desvio do desfiladeiro Niobe. O desvio, segundo o plano de gestão ambiental, é a estratégia de mitigação menos ariscada, desde uma análise custo-benefício, segundo os cálculos econômicos feitos por os engenheiros contratados para a pesquisa.

41. O desfiladeiro Niobe será desviado para passar 501 metros do projeto

Revolution, com uma variação do leito que modifica seu percurso em um ângulo de 35.8 e 36.2 graus, aproximadamente. O desvio proposto é ajustado às normas nacionais sobre o fracking, visto que na regulamentação da Resolução n° 8263 de janeiro de 2014 é definida que: “a distância entre o estímulo hidráulico e um aquífero utilizável para o consumo humano não poderá ser inferior a cinco vezes o raio de estímulo, distância que deverá ser calculada com base no modelo geomecânico que será utilizado na perfuração.” Segundo o modelo geomecânico apresentado no EIA, o raio de estímulo é de 100 metros.

42. O desfiladeiro Niobe é o quinto maior afluente caudaloso do Rio Faustos que é o

terceiro rio mais importante da República do Sião. Este desfiladeiro é uma das fontes

Page 9: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

9    

de água doce das quais dependem 12 comunidades camponesas que historicamente habitaram em áreas adjacentes a massas de água.

43. Especialmente as comunidades camponesas dos municípios de Mayer, Román e

Robayo estariam diretamente afetadas, pois a alteração do fluxo significaria que a massa de água não passaria mais a 36 metros de suas áreas de agricultura, como tem sido tradicionalmente o caso, senão a 298 metros. Além disso, para os moradores dos mencionados municípios, o desfiladeiro também tem um valor cultural, pois na cultura dos povos camponeses da região, o desfiladeiro Niobe é a coluna vertebral por onde fluem o conhecimento e a vida da terra que os alimenta.

Terceira Seção: Sobre o projeto Revolution 44. O povoado mais próximo ao projeto Revolution é a sede municipal do município

de Mayer denominado Candelo, que está na zona norte do projeto a 2,5 quilômetros, aproximadamente. Estima-se que entre junho de 2014 e setembro do mesmo ano o povoado passou de 15.000 a 20.000 habitantes, todos eles habitantes que provinham de regiões vizinhas para trabalhar em atividades relacionadas com o projeto, e também devido a que a atividade econômica e social expandiu-se exponencialmente.

45. O incremento abrupto da população gerou ansiedade nos moradores tradicionais,

visto que o abastecimento de água foi interrompido continuamente, o valor dos produtos da cesta básica familiar aumentou quase 25%, e as atividades como o consumo de droga, a delinquencia e a prostituição foram declaradas pelas autoridades locais como “atividades fora de controle pela falta de funcionários para atender essas novas dinâmicas”.

46. Em agosto de 2014 uma tropa de elite de 3000 homens do exército da Gália

ingressou à zona, a fim de cobrir a chegada da maquinaria que estava sendo esperada para inícios desse mês, mas por problemas de ordem pública ela não conseguiu sair do porto. Esse exército estabeleceu postos de controle nas estradas de acesso a Candelo e também ficou dentro do povoado e na área adjacente ao projeto.

47. O exército da Gália é identificado por usar uniformes camuflados pretos e ser

fortemente armado. Porém a interação com a população local tem sido difícil, dado que os moradores não compreendem bem se esses militares são força pública autorizada para organizar todos esses postos de controle e controles de mobilização ou são mais semelhantes à segurança privada.

48. A presença de militares estrangeiros e a falta de informação sobre o

desenvolvimento do projeto Revolution gerou grande ansiedade na população local, que se organizou no Comitê Cívico pela Defesa da Terra (CCDT) em resposta a essas novas dinâmicas. Esse Comitê reuniu não só milhares de moradores de Candelo, senão também pessoas dos municípios de Román e Robayo, que estão respectivamente a 14 e 21 quilômetros do projeto.

Page 10: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

10    

49. O CCDT tentou comunicar suas inquietudes para a empresa Cypher, que

considera que não é sua função responder as dúvidas dos moradores locais, senão dos funcionários públicos da República do Sião e, por conseguinte, decidiram não manter comunicação com os membros do CCDT.

50. A Presidente do CCDT, Mariela dos Santos, apareceu em todas as mídias

nacionais na última semana de setembro de 2014, propondo que as condições de contrato com a empresa Cypher sejam revistas. Segundo o CCDT: “o desvio do desfiladeiro Niobe nunca deveria ter sido autorizado e a socialização do projeto foi nula. Por sua vez, este projeto carece de permissão social que, embora não esteja na lei, é um princípio moral do desenvolvimento e, portanto, os trabalhos de exploração devem interromper-se, pois na área as casas dos moradores começaram a ser afetadas pela crescente atividade sísmica que a exploração gerou. Devido à incerteza dos agricultores da região, eles também estão perdendo compradores que têm medo de que as águas para a irrigação do cultivo estejam contaminadas.”

51. Os municípios de Mayer, Román e Candelo são os maiores produtores de quinoa

da região, mas, embora sempre pudessem desenvolver seus projetos agrícolas apesar do conflito na área, nesta ocasião as perdas dos últimos meses têm sido de tal magnitude que vários habitantes agrícolas locais tiveram que abandonar suas terras e viajar para as regiões urbanas de Meritea e Trinity, que são as cidades mais próximas. Essa região foi declarada como área de “poluição potencial” por parte dos agentes do setor, e, portanto, não é fácil comercializar produtos agrícolas desta região.

52. O clamor das organizações sociais fez eco nas mídias nacionais. Por sua vez, o

Ministro de Mineração e o Ministro de Ambiente pediram para a empresa Cypher organizar jornadas de socialização, para explicar o projeto à comunidade, bem como desenvolver projetos financeiros para ajudar os moradores da região a perderem os seus cultivos.

53. Porém a empresa Cypher comunicou publicamente que “o espaço de socialização

já tinha sido garantido durante o procedimento de permissão ambiental e que esse não era o momento para introduzir mudanças no projeto”, diante do ocorrido “a empresa quer ser direta e honesta com os moradores, dado que a socialização nesta fase se tornaria em um exercício inócuo sem importância e eles não irão enganar as pessoas, pois caso exista inconformismo com a atual situação, são as entidades locais que têm o direito de iniciar planos para solucionar as novas dinâmicas sociais e econômicas e não a empresa privada”.

54. No dia 1 de outubro de 2014 a empresa Cypher já tinha toda a maquinaria na

área do projeto e começou as obras para iniciar a fase de exploração e adequação de fontes hídricas aprovadas no EIA.

Page 11: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

11    

55. Adicionalmente, em outubro de 2014, em um comunicado público acompanhando o pedido formal perante o Ministério de Ambiente, a empresa Cypher comunicou que: “em cumprimento da cláusula n° 167 do contrato de concessão, a empresa constituirá a área de reserva florestal de conservação, pois essa obrigação está definida no artigo n° 254 da Lei Nacional de Novas Energias e Desenvolvimento (Lei n° 4271 do ano 2012), e, por conseguinte, será realizada em uma área de aproximadamente 90.000 hectares que abrange os municípios de Mayer, Román e Robayo e que os habitantes dessas zonas deveriam ser relocalizados em terras que já estavam sendo adquiridas pela empresa, graças ao financiamento do Banco Regional de Desenvolvimento da Federação da Gália (BRDFG) e que estão localizadas no norte do país, onde a agricultura poderia tornar-se um motor de desenvolvimento nessas áreas”.

56. A seleção para a área de reserva florestal de conservação dos municípios de

Mayer, Román e Robayo gerou uma grande revolta nacional e protestos violentos que se propagaram por vários dias em todas as sedes municipais. Diante desses acontecimentos, a empresa Cypher e a Federação da Gália decidiram introduzir outros 5000 (cinco mil) homens do exército dessa Federação para cuidar do projeto e da instalação de poços que já estavam em andamento.

57. O Presidente da República do Sião deu um discurso presidencial na segunda

semana de outubro de 2014 em meio à crise nacional e disse: “A decisão da empresa Cypher de desafiar os habitantes dos municípios de Mayer, Román e Mayer não é compatível com o tratamento benéfico que esta nação lhes concedeu. Sob essas condições o Projeto Revolution não pode continuar e pediremos a anulação imediata do contrato de concessão, e daqui em diante firmaremos os projetos em parceria com as empresas estrangeiras, mas sob a supervisão e cogestão da empresa nacional de hidrocarbonetos (ENH) para evitar arbitrariedades”. O discurso presidencial gerou um grande apoio nacional e foi visto positivamente pelas organizações sociais e pelos líderes locais da região de influência do projeto.

58. A Federação da Gália considerou que a declaração do Presidente do Sião era uma

decisão unilateral arbitrária que colocava em risco o comércio entre as duas nações, e também pediu uma reunião entre ambos os mandatários, para proteger as relações entre os países e honrar os compromissos de contrato adquiridos pela República do Sião, com as empresas cujo domicilio se encontravam nessa Federação e diante as quais tem uma obrigação de proteção.

59. A reunião entre ambos os mandatários foi realizada em novembro de 2014,

enquanto as operações da Cypher continuavam e era iniciado o desvio do desfiladeiro Niobe. Os habitantes da área viam a situação com grande incerteza e não compreendiam porque as operações continuavam e o Estado não fazia nada.

60. Após a reunião entre ambos os mandatários o Presidente do Sião fez uma

declaração oficial: “... descobrimos que esta situação escapa de nossas mãos.

Page 12: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

12    

Tentamos mudar as condições para oferecer um projeto que todos pudéssemos aprovar, mas isso não foi possível, pois as obrigações de contrato que nos exigem já não podem mais ser modificadas. É por essa razão que consideramos que a melhor opção é continuar com o projeto Revolution, sob as condições atuais e temos certeza de que é um projeto que contribuirá para o desenvolvimento do país”.

61. Os protestos a nível local se iniciaram de imediato e foram dias de intensas

confrontações entre os moradores locais e a força pública do Sião que juntamente com os soldados do exército da Gália controlavam os protestos.

62. O projeto Revolution continuou em andamento e se habilitaram as regiões no

norte do país em novembro de 2014, a fim de realocar os habitantes dos municípios vizinhos do projeto, onde a área de reserva florestal de conservação estava sendo desenvolvida. Porém, os povoadores resistiram ao reassentamento e consideram ilegítima a definição da área de reserva florestal, por atentar contra suas vidas e contra o direito ao território.

Quarta seção: Estratégias legais, moradores e o projeto Revolution 63. O projeto Revolution instalou os poços de perfuração, estabeleceu as piscinas de

sedimentação, fechou o perímetro do projeto e construiu em pouco tempo o complexo de moradias e lazer para os trabalhadores. Além disso, em janeiro de 2015, a Cypher contratou 120 habitantes locais da região que moravam dentro do projeto e que faziam parte da força de trabalho, que era um total de 347 funcionários.

64. As condições de trabalho do grupo de trabalhadores locais eram mais restringidas

e duras que as dos trabalhadores estrangeiros. Nos contratos assinados pelos trabalhadores locais, a maioria deles operando em máquinas pesadas e fazendo trabalho físico, foi estipulado na cláusula n° 34 que “devido às condições excepcionais de segurança na região do projeto, os trabalhadores nascidos na República do Sião e que façam parte do projeto Revolution e cujo empregador seja a Cypher serão regidos pela lei da Gália. Por razões de ordem pública, nesta lei é proibida, por sua singularidade e necessidade de projetos no exterior, a associação de trabalhadores em sindicatos ou qualquer outro tipo de organização, que possa questionar as obrigações de serviço dos trabalhadores ou colocar em risco o funcionamento e a operação dos projetos”.

65. Por sua vez, os contratos também estipulam na cláusula n° 56 que: “sem

importar o tipo de contrato, o empregador poderá finalizar o contrato, de forma unilateral, sem nenhuma compensação, se considerar que o trabalho ou as atividades sociais do funcionário colocam em risco a segurança de outros trabalhadores ou a estabilidade do projeto”.

Page 13: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

13    

66. Thomas A. Anderson foi um líder local na região e agora trabalha no projeto Revolution como motorista de caminhões-cisterna com águas residuais. Thomas sempre se caracterizou por ser ter voz ativa em defesa dos direitos dos funcionários.

67. Thomas considera que a operação dos carros-cisterna com as águas residuais que

saem do projeto é perigosa e eles não têm muito treinamento e proteção para realizar essa atividade, e como motoristas desses caminhões há 43 trabalhadores que são habitantes residentes da região.

68. Thomas conversou várias vezes com seu supervisor, mas não houve nenhuma

mudança, portanto, Thomas decidiu reunir os seus colegas motoristas para apresentar uma carta formal, por parte de todos, para melhorar as condições de segurança de seus trabalhos.

69. A carta foi assinada por 32 dos 43 motoristas e apresentada no dia 23 de janeiro

de 2015. Por sua vez, uma cópia da carta foi enviada ao Ministério de Trabalho do Sião para que conheça estes fatos.

70. O Ministério de Trabalho decidiu multar a empresa Cypher pelas condições

arriscadas de trabalho que estão suportando os motoristas e por não seguir os protocolos de segurança para os trabalhadores que lidam com resíduos perigosos. A multa é de aproximadamente 500.000 dólares.

71. A empresa Cypher considerou que, de acordo com a cláusula n° 56 e a lei de

trabalho da Gália, “notificar ao Ministério de Trabalho e articular uma operação de desestabilização das atividades comerciais do Cypher, colocou em risco os cotrabalhadores, e, portanto, finalizamos o contrato, de forma unilateral e sem direito a compensação, dos 32 trabalhadores que assinaram a carta”. “A empresa considera que esses não são os canais para solucionar as diferenças de contrato ou gerenciar as diferenças na empresa, e que o risco é uma condição natural das atividades extrativas que esses trabalhadores não estão em condições de afrontar”.

72. O Ministério de Trabalho do Sião, através de uma resolução que inicia uma

investigação formal sobre os contratos de trabalho da empresa Cypher, definiu que: “as mencionadas rescisões de contrato parecem ser indícios de uma represália arbitrária contra o direito dos trabalhadores, visto que isso constituiria uma violação à lei de trabalho do Sião”.

73. Diante desse depoimento, a empresa Cypher respondeu em um comunicado

público em relação ao inicio da investigação que “talvez essas rescisões unilaterais de contrato, pelos motivos já expostos, sejam ilegais na lei de trabalho da República de Sião, mas os contratos de trabalho dos funcionários do projeto Revolution são regidos sob as leis da Gália, e isso ficou estabelecido e autorizado pelo contrato de concessão que a empresa assinou com esse país.”

Page 14: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

14    

74. Por sua vez, o Embaixador da Gália no Sião também se pronunciou e disse que: “Estamos muito preocupados com a atitude desafiante contra as normas internacionais da República do Sião, visto que o Ministério de Trabalho do Sião não tem jurisdição para resolver este assunto, nem pode multar a empresa Cypher pela gestão de suas relações trabalhistas, tal como ficou estabelecido no contrato de concessão assinado (…) em todo caso compreendemos que se alguma entidade pública do Sião interromper as operações ou acabar com o contrato de concessão, o país da Gália, protegendo sua iniciativa privada e devido às conversas mantidas com a empresa Cypher, entenderá que o equilíbrio financeiro das operações da empresa está sendo alterado por intervenção unilateral do Sião, e compreenderá que isso é uma violação ao direito internacional do comércio, e, portanto, recorrerá à Organização Mundial do Comércio”.

75. Devido às múltiplas diferenças que as entidades públicas do Sião tiveram com a

empresa Cypher e a relação distante com a Federação da Gália, decidiu-se convocar uma reunião de alto nível com a chanceler do Sião, os ministros de trabalho, ambiente, mineração e fazenda para analisar as condições atuais do projeto Revolution e as soluções jurídicas.

76. Na reunião de alto nível o Presidente da República do Sião decidiu que: “a

Federação da Gália em sua contínua defesa da empresa Cypher e por proteger os interesses dessa empresa adotou condutas que podem ser consideradas como uma violação dos direitos humanos, e, portanto, levando em conta que o artigo n° 45 da Convenção Americana de Direitos Humanos, assinada tanto pela República do Sião quanto pela Federação da Gália autoriza os Estados a apresentarem comunicações em que um Estado alegue que o outro Estado incorreu em violações dos direitos humanos, assim procederá a nação e o Sião para defender os seus cidadãos perante os abusos da Federação da Gália”.

77. Os trabalhadores demitidos da Cypher junto com o Comitê Cívico pela Defesa

da Terra (CCDT) e outros habitantes do setor, que perderam suas colheitas e foram deslocados pela falta de oportunidades econômicas que gerou o desvio do desfiladeiro Niobe e o projeto Revolution, criaram o Movimento Ambiental Unido (MAU), que junto com a ONG internacional People for the Defense of Water (PDW) decidiram em março de 2015 demandar perante a jurisdição administrativa o contrato de concessão entregue à Cypher.

78. Em junho de 2015 o juiz de primeira instância decidiu a favor da Cypher,

considerando que “o contrato de concessão tem condições de contrato de trabalho e ambientais que dependem das normas da Gália e do direito internacional, e que essas normas não são o corpo normativo aplicável pela jurisdição administrativa, portanto, um juiz na República do Sião não pode tomar nenhuma decisão”. O recurso da apelação foi negado pelas mesmas razões.

Page 15: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

15    

79. Imediatamente em julho de 2015 o MAU apresentou uma demanda de nulidade do contrato de concessão assinado pela Cypher e pelo Sião perante os juízes administrativos da Gália. A demanda foi rejeitada por não cumprir com os requisitos de fundo, dado que “o contrato sob disputa na demanda não é executado em solo da Federação da Gália e o Estado da Gália não faz parte dessa disputa, razão pela qual esse país não tem jurisdição para resolver essa disputa”.

80. Essa é a terceira vez que ONGs ou os movimentos sociais apresentam recursos

legais perante os juízes da Federação da Gália, por violação de direitos humanos das empresas domiciliadas nesse país, e em todas as ocasiões foram negadas por falta de jurisdição, e nenhum caso foi estudado minuciosamente. Casos semelhantes foram investigados pela Transparência Extrativa Internacional (TEI) que determinou que: “As leis da Federação da Gália têm sido pouco firmes na análise do comportamento de sujeitos privados sob sua jurisdição, que têm atividades no exterior, e, além disso, a estrutura legal é fraca ao investigar minuciosamente essas operações internacionais”.

Quinta seção: Cypher, Sião, Gália e o Sistema Interamericano de Direitos Humanos 81. O Movimento Ambiental Unido (MAU) encontrou, ao pesquisar as alternativas

legais, que a República do Sião tem sido somente: “um meio sem poder real de ação, pelo qual a Federação da Gália tomou decisões em detrimento dos direitos humanos dos habitantes do Sião”, e que a contínua proteção da Gália à Cypher e sua operação no Sião representa uma violação dos direitos humanos. Diante desses acontecimentos, recorrerão ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos, para exigir a imposição de obrigações extraterritoriais à Federação da Gália como um estado de origem das atividades de empresas extrativas no exterior.

82. O Movimento Ambiental Unido (MAU) considerou houve esgotamento dos

recursos internos administrativos e judiciais, visto que a lei do Sião não é aplicável ao caso e os juízes da Gália rejeitaram a demanda por falta de requisitos formais. Diante dos acontecimentos anteriores, o MAU decidiu recorrer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante CIDH ou Comissão) em nome do Comitê Cívico pela Defesa da Terra (CCDT), de Thomas A. Anderson e de outros trabalhadores e habitantes da região de influência do projeto, que assinam o poder geral que foi entregue aos representantes da MAU, acima, a fim de proteger os direitos humanos.

83. No dia 10 de setembro de 2015, na Petição Inicial elaborada pelo MAU,

argumenta-se que a Federação da Gália violou suas obrigações extraterritoriais pelo exercício de agentes privados sob sua jurisdição, derivados dos artigos n° 1 e 2 da Convenção Americana de Direitos humanos.

84. Por sua vez, essas violações geraram um dano severo aos direitos humanos para

ter garantias judiciais, liberdade de pensamento e de expressão, direito à propriedade privada, direito de circulação e de residência, direito à proteção judicial e ao

Page 16: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

16    

Desenvolvimento Progressivo dos membros habitantes de Román, Mayer e Robayo, reunidos no Comitê Cívico pela Defesa da Terra (CCDT), e direitos à reunião e à liberdade de associação de Thomas A. Anderson e de outros trabalhadores demitidos pela empresa Cypher. Diante do exposto acima, dado que o projeto Revolution, executado pela empresa Cypher, que é uma filial da empresa Oracle domiciliada na Federação da Gália, foi implementado sob o controle territorial de agentes públicos da Federação da Gália, tal como os soldados em terra do exército da Gália e os recursos econômicos entregues pelo Banco Regional de Desenvolvimento da Federação da Gália (BRDRG), que é uma entidade pública desta federação.

85. Na Petição Inicial o MAU pede à Comissão Interamericana de Direitos

Humanos (CIDH) que: “levando em conta que, embora o território que está sob disputa esteja localizado na República do Sião, o controle real tanto em termos legais quanto físicos foram exercidos pela Federação da Gália e pelos agentes privados, domiciliados neste país, e que, nessa medida, as omissões e ações que ocorreram nessa região e que estão ligadas ao projeto extrativo Revolution são responsabilidade da Federação da Gália, país que demonstrou ausência de disposição para tomar medidas legais ou territoriais que diminuam ou alterem o impacto nos direitos humanos dos habitantes do Sião na área adjacente ao projeto”

86. A CIDH decidiu declarar o caso admissível para efeitos do exame minucioso

sobre a suposta violação dos artigos n° 8, 13, 15, 16, 21, 22, 25 e 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como dos artigos n° 6, 7, 8 e 11 do Protocolo de San Salvador.

87. Além disso, a Comissão pede à Corte que dentro de sua decisão: “exija à

Federação da Gália modificar suas leis nacionais sobre a operação dos agentes privados domiciliados em seu país em relação às suas operações no exterior, e também estabeleça uma política de compensação para os habitantes de diversos países nos quais as empresas nacionais desse país desenvolveram atividades extrativas regidas pela lei da Gália”. Além do mais, a Comissão aceitou o depoimento de uma das supostas vítimas dentro do corpo de evidência. A testemunha é o Senhor Thomas A. Anderson.

88. Na Contestação à Demanda a Federação da Gália argumenta que: “dentro do

Sistema Interamericano de Direitos Humanos não existem obrigações extraterritoriais e sob nenhuma circunstância podem ser exigidas sob o sistema individual de petições de proteção de direitos humanos, razão pela qual a Federação da Gália afirma que pelo estipulado no Art. n° 38 do Regulamento da Corte IDH, a Corte carece de qualquer competência para resolver este caso e por essa razão opõe uma exceção preliminar ao caso apresentado pelo MAU. Na Exceção Preliminar a Federação argumenta a incompetência da Corte para conhecer o presente caso em razão da matéria (ratione materiae)”.

Page 17: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

17    

89. Além do mais, na Contestação à Demanda, a Federação da Gália afirma que: “o caso construído pela Comissão apoia-se em um erro processual, pois o corpo de evidência é baseado, valorizando-o como prova, no depoimento de Thomas A. Anderson. Porém, segundo a jurisprudência do Tribunal, tem sido observado que o depoimento de uma suposta vítima, ao ter um possível interesse no caso, deve ser valorizado como um indício dentro do conjunto de provas e não como eixo probatório para ser utilizado para levar o caso a instâncias internacionais”. Diante desse acontecimento, a Federação da Gália objetou a admissão do depoimento da testemunha da suposta vítima e pede que o caso seja arquivado.

90. No dia 15 de novembro de 2015, em seu Relatório de Fundo n° 435/15, a

CIDH rejeitou a exceção preliminar apresentada pela Federação da Gália, e impôs uma série de recomendações ao Estado sobre a operação das atividades de empresas extrativas e seu impacto na proteção de direitos humanos e, além disso, pediu que sejam feitas algumas modificações na legislação interna do país para alterar os riscos que essa legislação implica para os direitos humanos de outros países.

91. No dia 17 de dezembro de 2015, a CIDH decidiu remeter o Caso do Comitê

Cívico pela Defesa da Terra (CCDT), Thomas A. Anderson e outros. vs. A Federação da Gália para a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante Corte IDH ou Corte) pela necessidade de obter justiça para as vítimas, ante a falta de resposta da Federação diante das recomendações dadas pela CIDH. A Corte definiu que será realizada uma audiência pública em fevereiro de 2016, para analisar as posições e os argumentos que o tribunal levará em conta para sua decisão.

92. A Federação da Gália ratificou a Convenção Americana sobre os Direitos

Humanos no dia 1 de agosto de 1978 e aceitou a competência contenciosa da Corte no dia 28 de junho de 1982. Além do mais, a República do Sião ratificou a Convenção no dia 7 de maio de 1984, e aceitou a competência contenciosa da Corte no dia 14 de setembro de 1985.

93. A Federação da Gália bem como a República do Sião também assinaram e

ratificaram os seguintes instrumentos internacionais: A Declaração Universal de Direitos Humanos (1976), a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) (1981), a Convenção n° 169 Sobre os Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes (1991), a Convenção sobre a Biodiversidade Biológica (1994), o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. O Protocolo de San Salvador (1996), a Declaração de Rio sobre o Ambiente e o Desenvolvimento (1998), a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos dos Trabalhadores Migratórios (1994), o Estatuto de Roma da Corte Penal Internacional (2002), e os Princípios de Maastricht sobre as Obrigações

Page 18: Caso do VI Concurso Interamericano de Direito ao … · 2015. 10. 8. · Ministério de Mineração, através do Decreto n° 675 de 2013 no qual foram definidos os requerimentos técnicos

18    

Extraterritoriais dos Estados na Área dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (2012) Síntese de direitos violados segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Convenção Americana

Protocolo de San Salvador

Artigo n° 8. Garantias judiciais Artigo n° 13. Liberdade de Pensamento e de Expressão Artigo n° 15. Direito de Reunião Artigo n° 16. Liberdade de Associação Artigo n° 21. Direito à Propriedade Privada Artigo n° 22. Direito de Circulação e de Residência Artigo n° 25. Proteção Judicial Artigo n° 26. Desenvolvimento Progressivo

Artigo n° 6. Direito ao Trabalho Artigo n° 7. Condições Justas, Igualitárias e Satisfatórias de Trabalho Artigo n° 8. Direitos Sindicais Artigo n° 11. Direito a um Ambiente Saudável Artigo