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CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE MANAUS CEULM CREDENCIADO PELO DECRETO DE 26/03/2001 D.O.U. DE 27/03/2001 LEVY MATHEUS LIMA PASTOR NOGUEIRA ROSÁRIO “SÍNDROME DE INEFETIVIDADEDAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, E SEUS REMÉDIOS DE COMBATE À OMISSÃO INCONSTITUCIONAL. MANAUS 2017

CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE MANAUS CEULM · por isso incluiu no articulado dois remédios constitucionais que visam combater a omissão inconstitucional, entre eles, têm-se

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CENTRO UNIVERSITÁRIO LUTERANO DE MANAUS – CEULM

CREDENCIADO PELO DECRETO DE 26/03/2001 – D.O.U. DE 27/03/2001

LEVY MATHEUS LIMA PASTOR NOGUEIRA ROSÁRIO

“SÍNDROME DE INEFETIVIDADE” DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, E SEUS

REMÉDIOS DE COMBATE À OMISSÃO INCONSTITUCIONAL.

MANAUS

2017

LEVY MATHEUS LIMA PASTOR NOGUEIRA ROSÁRIO

“SÍNDROME DE INEFETIVIDADE” DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, E SEUS

REMÉDIOS DE COMBATE À OMISSÃO INCONSTITUCIONAL.

MANAUS

2017

Monografia apresentada à banca examinadora do Centro Universitário Luterano de Manaus – ULBRA, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora. Claudia Maria Nobre Lisboa.

LEVY MATHEUS LIMA PASTOR NOGUEIRA ROSÁRIO

“SÍNDROME DE INEFETIVIDADE” DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, E SEUS

REMÉDIOS DE COMBATE À OMISSÃO INCONSTITUCIONAL.

Aprovada em:

Banca Examinadora

Prof.ª Claudia Maria Nobre Lisboa

ULBRA (Orientadora)

Examinador Prof.

Examinador Prof.

MANAUS

2017

Monografia apresentada à banca examinadora do Centro Universitário Luterano de Manaus – ULBRA, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora. Claudia Maria Nobre Lisboa.

À Deus, meus pais, João e Patrícia, e minha família que

sempre me deram força para alcançar esse objetivo.

AGRADECIMENTOS

Gostaria agradecer primeiramente a Deus, que me deu força para terminar esta

obra. Muitas pessoas indiretamente foram responsáveis por esse trabalho, minha

orientadora professora Claudia Lisboa por dar o discernimento para construção

deste trabalho. À instituição de ensino Universidade Luterana de Manaus por

sempre ajudar os alunos. À Patrícia, minha querida mãe que ajudava com palavras

de incentivo e estando ali comigo nos momentos difíceis. Ao meu pai, João Rosário

que fazia o impossível pra dar o melhor aos filhos, tenho certeza que onde ele

estiver agora ele está feliz e nos protegendo, e minha obrigação é dar alegria a eles.

Ao José Pastor, meu avô que também não esta entre nós, sempre me ajudava e

tinha o sonho que ver seu neto formando em “advocacia”.

À todos o meu muito Obrigado!

Levy Rosário

Mas graças a Deus, que nos dá a vitória por meio de nosso

Senhor Jesus Cristo. 1 Coríntios 15-57.

RESUMO

Esta monografia tem por objetivo mostrar as denominadas omissões

legislativas inconstitucionais, também conhecidas como “síndrome de inefetividade”

das normas constitucionais de eficácia limitada, e seus remédios de combate, a

saber: o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

Neste trabalho, é feito um paralelo destes dois instrumentos de combate às

omissões legislativas inconstitucionais, diferenciando-os em relação a alguns de

seus aspectos, especialmente em relação ao efeito de suas decisões, sempre

levando em consideração os recentes julgados da Suprema Corte Federal. Como

estratégia, adotou-se uma pesquisa jurisprudencial para saber o entendimento que o

STF vinha adotando nas ações para sanar omissões inconstitucionais. Outro método

foi a pesquisa do posicionamento doutrinário sobre o tema, com diversas teorias

conforme recentes decisões do STF.

Palavras-chaves: Omissão inconstitucional. Ações de controle de

inconstitucionalidade.

ABSTRACT

This monograph aims to show the so-called unconstitutional legislative

omissions, also known as "ineffectiveness syndrome" of constitutional rules of limited

effectiveness, and its combat remedies, namely: the injunction and direct action of

unconstitutionality by omission. In this work, a parallel is made of these two

instruments to combat unconstitutional legislative omissions, differentiating them in

relation to some of their aspects, especially in relation to the effect of their decisions,

always taking into account the recent Supreme Court judgments. As a strategy, a

jurisprudential research was adopted to know the understanding that the Supreme

Court was adopting in the actions to remedy unconstitutional omissions. Another

method was the research of the doctrinal position on the subject, with several

theories according to recent decisions of the Supreme Court.

Keywords: Unconstitutional omission. Control actions of unconstitutionality.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9

2. EFICÁCIA E APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS ................... 13

3. CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA .................................................. 17

3.1. NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA PLENA ........................ 17

3.2. NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA CONTIDA ................... 18

3.3. NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA LIMITADA ................... 19

4. CLASSIFICAÇÃO DE MARIA HELENA DINIZ......................................................... 23

5. REMÉDIOS DE COMBATE À OMISSÃO INCONSTITUCIONAL ........................... 25

5.1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO ...... 25

5.1.1. ESPÉCIES DE OMISSÃO ............................................................ 26

5.1.2. OBJETO ....................................................................................... 27

5.1.3. COMPETÊNCIA ........................................................................... 28

5.1.4. AUTORES LEGITIMADOS .......................................................... 28

5.1.5. PROCEDIMENTO ....................................................................... 28

5.1.6. EFEITOS DA DECISÃO .............................................................. 29

5.2. MANDADO DE INJUNÇÃO................................................................... 34

5.2.1. OMISSÃO TOTAL OU PARCIAL.................................................. 35

5.2.2. LEGITIMADOS ............................................................................ 36

5.2.3. COMPETÊNCIA ......................................................................... 37

5.2.4. PROCEDIMENTO ....................................................................... 38

5.2.5. EFEITOS DA DECISÃO .............................................................. 39

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 43

7. REFERÊNCIAS ............................................................................................ 44

9

1. INTRODUÇÃO

A Constituição no sentido jurídico é a norma fundamental do Estado, que

abriga normas jurídicas centrais para validação de todo ordenamento jurídico, com a

finalidade de delinear a sua forma e estrutura, garantir direitos fundamentais,

estabelecer a forma de governo, a separação e a organização dos poderes, delimitar

o modo de se adquirir e de exercer o poder, distribuir competências e estabelecer

limites de sua atuação. Não obstante existam normas constitucionais sem conteúdo

constitucional, será considerada formalmente constitucional.

Às demais fontes normativas infraconstitucionais competem disciplinar

outros conteúdos não observados pela Constituição, bem como a regulamentação

dos dispositivos constitucionais, porém sempre em consonância com os princípios e

diretrizes estabelecidos na Lei Maior.

A constatação da existência de uma omissão inconstitucional por parte do

legislador e sua eventual supressão tem por finalidade a proteção da Magna Carta,

em observância ao principio da supremacia constitucional, bem como ao principio da

força normativa da Constituição.

Posto isso, o ilustre Ministro Celso de Mello no julgamento do Mandado de

Injunção nº 715, em 25.02.2005, dispôs: “Impende enfatizar, neste ponto, que as

omissões inconstitucionais do Poder Legislativo não podem ser toleradas, eis que o

desprestígio da Constituição - resultante da inércia de órgãos meramente

constituídos - representa um dos mais tormentosos aspectos do processo de

desvalorização funcional da Lei Fundamental da República, ao mesmo tempo em

que estimula, gravemente, a erosão da consciência constitucional, evidenciando,

desse modo, o inaceitável desprezo dos direitos básicos e das liberdades públicas

pelos Poderes do Estado.”

Desta forma, com o intuito de valorizar e proteger a Constituição, os

estudiosos do Direito passaram, cada vez mais, a se preocupar com o instituto da

omissão constitucional, bem como os instrumentos de supressão destas omissões.

O constituindo originário preocupou-se com sua eficácia e aplicabilidade e

por isso incluiu no articulado dois remédios constitucionais que visam combater a

omissão inconstitucional, entre eles, têm-se a ação direta de inconstitucionalidade

por omissão (art. 103, § 2º, CF), e o mandado de injunção (art. 5º, LXXI, CF).

10

Na teoria do ilustre professor José Afonso da Silva, em sua clássica obra

Aplicabilidade das normas constitucionais, propõe a classificação, das normas de

eficácia plena e contida como tendo aplicabilidade direta e imediata, e as de eficácia

limitada possuidoras de aplicabilidade mediata ou indireta. Ter aplicação imediata

significa que as normas constitucionais “são dotadas de todos os meios e elementos

necessários para aplicá-la imediatamente aos fatos, situações, condutas ou

comportamentos que elas regulam. A regra é que as normas definidoras de direitos

e garantias individuais sejam de aplicabilidade imediata. Mas aquelas definidoras de

direitos sociais, culturais e econômicos, nem sempre o são, porque não raro

dependem de providências ulteriores que lhes completem a eficácia e possibilitem

sua aplicação”. (Jose Afonso da Silva, Comentário contextual à Constituição,

Malheiros, 6º ed., p.408.).

Assim, “por regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais

democráticos e individuais são de aplicabilidade imediata, enquanto as que definem

os direitos sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas,

especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada e

aplicabilidade indireta” (Jose Afonso da Silva, Comentário contextual à Constituição,

Malheiros, 6º ed., p. 408).

Também conhecidas como normas constitucionais “não auto-exequíveis”,

temos exemplo de omissão total e omissão parcial, conforme dispõe o art. 37, VII, da

CF: “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei

específica”, face à postura desidiosa do órgão omisso, temos uma omissão total,

não sendo razoável quase trinta anos para a criação da lei regulamentadora para

que a norma tenha eficácia plena. Em outro giro, no art. 7, IV, da CF: “salário

mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas

necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação,

educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com

reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua

vinculação para qualquer fim”, temos uma omissão parcial, no que tange ao valor

estabelecido como salário mínimo, por não atender todas as necessidades da

pessoa, e de sua família.

Em relação aos remédios constitucionais para combater a “síndrome de

inefetividade” das normas de eficácia limitada, o STF tinha o entendimento de que a

ação direta de inconstitucionalidade por omissão seria apenas o instrumento para

11

notificar o legislador, constituindo-o em mora, enquanto o mandado de injunção,

seria o principal instrumento de concretização dos direitos fundamentais, como vem

sendo usado a posição concretista intermediária nos termos do art. 8, inciso I, da lei

13.300/2016.

Apesar de inicialmente o STF ter adotado a posição não concretista, este

entendimento, atualmente, está totalmente superado. Conforme julgado da ADO 25,

o novo entendimento é o mesmo do mandado de injunção, posição concretista

intermediária, que fixou o prazo de 12 meses para o congresso nacional editar lei

complementar regulamentando os recursos da União para os estados e o Distrito

Federal em decorrência da desoneração das exportações do ICMS.

A síndrome de inefetividade das normas constitucionais ocorre devido à

inércia desidiosa desproporcional do órgão omisso, não respeitando a vontade do

constituinte originário, visto que há tempo suficiente para editar normas de

aplicabilidade limitada. Posto isso, o principio da Separação dos Poderes não é

absoluto, tendo o STF legitimidade para dar eficácia a toda norma que não está

sendo aplicada por negligência do poder Legislativo, adotando a posição concretista

intermediária do direito, que da um prazo para o órgão sanar a omissão.

Conforme definiu em suas palavras, a ilustre Ministra Carmem Lucia:

“A fixação de um prazo para que o parlamento supra a omissão é um passo

adiante na natureza recomendatória que se tinha nos julgamentos das

ADOs” (ADO 25, voto da Min. Cármen Lúcia, julgado em 30.11.2016, seção

de acompanhamento processual do Supremo Tribunal Federal:

http://www.stf.jus.br).

Conforme visto, a Constituição Brasileira, a fim de assegurar a eficácia dos

seus dispositivos, previu mecanismos contra a inércia desidiosa legislativa,

especialmente o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade por

omissão.

Estes dois instrumentos, ambas as inovações do Constituinte de 1988, têm

por objeto a proteção contra as omissões do legislador, que deixou de regulamentar

dispositivos da Constituição (omissões legislativas inconstitucionais), mas diferem

um do outro em relação a alguns aspectos, tendo diferentes pressupostos,

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finalidades, legitimados, e não sendo necessariamente julgados pelo mesmo órgão

judicial.

13

2. EFICÁCIA E APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

A priori, em regra não há norma constitucional que não produza efeitos. O

pressuposto básico é o reconhecimento de que as normas contidas na Constituição

brasileira possuem um mínimo de eficácia, gerando conseqüentemente algum efeito.

Em regra, todas as normas contidas no articulado constitucional apresentam

eficácia, algumas jurídica e social e outras apenas jurídica.

Para Michel Temer a

“eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isto é, com

potencialidade para regular determinadas relações, ser efetivamente

aplicada a casos concretos. A eficácia jurídica, por sua vez, significa que a

norma está apta a produzir efeitos na ocorrência de relações concretas;

mas já produz efeitos jurídicos na medida em que a sua simples criação

resulta na revogação de todas as normas anteriores que com ela conflitam”.

Embora não aplicada a casos concretos, é aplicável juridicamente no

sentido negativo antes apontado. Isto é: retira a eficácia da normatividade anterior. É

eficácia, juridicamente, embora não tenha sido aplicada concretamente.

Algumas normas constitucionais que não tenham efeito social produzem

efeitos jurídicos, na medida em que revogam normas anteriores e impedem o

legislador infraconstitucional de editar normas contrárias ao comando constitucional.

Michel Temer observa que as normas contidas na Constituição brasileira são

dotadas de eficácia. Por essa razão todas as normas constitucionais são aplicáveis.

Vide:

“aplicabilidade tem origem, etimologicamente, no verbo applicare que, por

sua vez, resulta de ad-plicare. Plicare significa dobrar e o sufixo ad é uma

preposição de acusativo que acompanha as circunstâncias de lugar,

proximidade, tanto no sentido espacial (onde) quanto no sentido temporal

(quando). Daí o sentido original, envolvendo, em conseqüência, uma

finalidade. Na linguagem jurídica, por isso, aplicar a norma vai significar pô-

la em contato com um referente objetivo (fatos e atos). A aplicabilidade

exige assim interpretação. Além disso exige condições de possibilidade que

no direito estão referidas a aspectos técnicos inerentes à estrutura das

14

normas e da realidade normada. Na teoria jurídica, essas condições

reportam-se à noção de eficácia”.

As normas que tratam dos direitos e garantias fundamentais, nos termos do

art. 5.º, §1.º, da CF/88, têm aplicação imediata.

O termo “aplicação”, não se confunde com “aplicabilidade”, na teoria de José

Afonso da Silva, que classifica, as normas de eficácia plena e contida como

tendo aplicabilidade direta e imediata, e as de eficácia limitada possuidoras

de aplicabilidade mediata ou indireta.

Ensina José Afonso da Silva que ter aplicação imediata significa que as

normas constitucionais são “dotadas de todos os meios e elementos necessários à

sua pronta incidência aos fatos, situações, condutas ou comportamentos que elas

regulam. A regra é que as normas definidoras de direitos e garantias individuais

(direitos de 1.ª dimensão, acrescente-se) sejam de aplicabilidade imediata. Mas

aquelas definidoras de direitos sociais, culturais e econômicos (direitos de 2.ª

dimensão, acrescente-se) nem sempre o são, porque não raro dependem de

providências ulteriores que lhes completem a eficácia e possibilitem sua aplicação”.

Dessa maneira, “por regra, as normas que consubstanciam os direitos

fundamentais democráticos e individuais são de aplicabilidade imediata, enquanto as

que definem os direitos sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas

algumas, especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia

limitada e aplicabilidade indireta”.

Como exemplo de norma definidora de direito e garantia fundamental que

depende de lei, podemos citar o direito de greve dos servidores públicos, previsto no

art. 37, VII, ou o da aposentadoria especial, garantido nos termos do art. 40, § 4.º.

Então, qual seria o sentido dessa regra inscrita no art. 5.º, § 1.º?

José Afonso da Silva explica: “em primeiro lugar, significa que elas são

aplicáveis até onde possam, até onde as instituições ofereçam condições para seu

atendimento. Em segundo lugar, significa que o Poder Judiciário, sendo invocado a

propósito de uma situação concreta nelas garantida, não pode deixar de aplicá-las,

conferindo ao interessado o direito reclamado, segundo as instituições existentes”.

Assim, diante de omissão de medida para tornar efetiva norma

constitucional, a CF/88 trouxe duas importantes novidades: a ação direta de

inconstitucionalidade por omissão — ADO (agora regulamentada na Lei n. 12.063,

15

de 27.10.2009, e por nós comentada no item 6.7.4) e o mandado de injunção (MI,

art. 5.º, LXXI, CF).

Em relação a esses dois remédios para combater a “síndrome de

inefetividade” das normas constitucionais de eficácia limitada, o STF tende a

consolidar o entendimento de que, em se tratando de “Poder”, a ADO seria o

instrumento para fazer um apelo ao legislador, constituindo-o em mora, enquanto o

MI, por seu turno, seria o importante instrumento de concretização dos direitos

fundamentais, como vem sendo percebido na jurisprudência do STF e, assim, dando

um exato sentido ao art. 5.º, § 1.º, que fala em aplicação imediata. Vejamos:

“EMENTA: Mandado de injunção. Natureza. Conforme disposto no inciso

LXXI do artigo 5.º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de

injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades

constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e

à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de

omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa

da ordem a ser formalizada. Mandado de injunção. Decisão. Balizas.

Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a

relação jurídica nele revelada. Aposentadoria. Trabalho em condições

especiais. Prejuízo à saúde do servidor. Inexistência de lei complementar.

Artigo 40, § 4.º, da Constituição Federal. Inexistente a disciplina específica

da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via

pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral —

artigo 57, § 1.º, da Lei n. 8.213/91” (MI 758, Rel. Min. Marco Aurélio, j.

1.º.07.2008, Plenário, DJE de 26.09.2008).

Ainda, conforme bem definiu a Min. Cármen Lúcia, no julgamento de vários

Mandados de Injunção (MI 828/DF, MI 841/DF, MI 850/DF, MI 857/DF, MI 879/DF,

MI 905/DF, MI 927/DF, MI 938/DF, MI 962/DF, MI 998/DF), “o mandado de injunção

é ação constitucional de natureza mandamental, destinada a integrar a regra

constitucional ressentida, em sua eficácia, pela ausência de norma que assegure a

ela o vigor pleno”.

Qualquer outro entendimento geraria o mais nefasto sentimento de

frustração e desprestígio aos direitos fundamentais, reduzindo a importante

conquista do MI a um nada.

16

Assim, Maria Helena Diniz refere-se a um gradualismo eficacial das normas

constitucionais. “Há um escalonamento na intangibilidade e nos efeitos dos preceitos

constitucionais... Todas têm juridicidade, mas seria uma utopia considerar que têm a

mesma eficácia, pois o seu grau eficacial é variável. Logo, não há norma

constitucional destituída de eficácia. Todas as disposições constitucionais têm a

possibilidade de produzir, a sua maneira, concretamente, os efeitos jurídicos por

elas visados.”

17

3. CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA

José Afonso da Silva, em sua clássica obra Aplicabilidade das normas

constitucionais, propõe a seguinte classificação:

3.1. Normas constitucionais de eficácia plena

Normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata e

integral são aquelas normas da constituição que, no momento que esta entra em

vigor, são aptas a produzir todos os seus efeitos, independentemente de norma

regulamentadora infraconstitucional. Em regra criam órgãos ou atribuem aos entes

federativos competências. Não têm a necessidade de ser integradas. Aproximam-se

do que a doutrina clássica norte-americana chamou de normas autoaplicáveis.

José Afonso da Silva destaca que as normas constitucionais de eficácia

plena “... são as que receberam do constituinte normatividade suficiente à sua

incidência imediata. Situam-se predominantemente entre os elementos orgânicos da

Constituição. Não necessitam de providência normativa ulterior para sua aplicação.

Criam situações subjetivas de vantagem ou de vínculo, desde logo exigíveis”.3

Como exemplo, lembramos os arts. 2.º; 5.º, III; 14, § 2.º; 16; 17, § 4.º; 19; 20; 21; 22;

24; 28, caput; 30; 37, III; 44, parágrafo único; 45, caput; 46, § 1.º; 51; 52; 60, § 3.º;

69; 70; 76; 145, § 2.º; 155; 156; 201, §§ 5.º e 6.º (cf. AI 396.695-AgR, DJ de

06.02.2004); 226, § 1.º; 230, § 2.º (gratuidade de transporte coletivo urbano para os

maiores de 65 anos — cf. ADI 3.768, DJ de 26.10.2007), todos da CF/88. Abaixo,

pedimos vênia para destacar o importante reconhecimento, pelo STF, da autonomia

da Defensoria Pública Estadual, nos termos da Reforma do Poder Judiciário: “Ação

direta de inconstitucionalidade: art. 2.º, inciso IV, ‘c’, da Lei n. 12.755, de 22 de

março de 2005, do Estado de Pernambuco, que estabelece a vinculação da

Defensoria Pública estadual à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos: violação do

art. 134, § 2.º, da Constituição Federal, com a redação da EC 45/04:

inconstitucionalidade declarada. A EC 45/04 outorgou expressamente autonomia

funcional e administrativa às defensorias públicas estaduais, além da iniciativa para

a propositura de seus orçamentos (art. 134, § 2.º): donde, ser inconstitucional a

norma local que estabelece a vinculação da Defensoria Pública a Secretaria de

Estado. A norma de autonomia inscrita no art. 134, § 2.º, da Constituição Federal

18

pela EC 45/04 é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, dado ser a Defensoria

Pública um instrumento de efetivação dos direitos humanos. Defensoria Pública:

vinculação à Secretaria de Justiça, por força da LC est. (PE) 20/98: revogação, dada

a incompatibilidade com o novo texto constitucional. É da jurisprudência do Supremo

Tribunal — malgrado o dissenso do Relator — que a antinomia entre norma

ordinária anterior e a Constituição superveniente se resolve em mera revogação da

primeira, a cuja declaração não se presta a ação direta. O mesmo raciocínio é

aplicado quando, por força de emenda à Constituição, a lei ordinária ou

complementar anterior se torna incompatível com o texto constitucional modificado:

precedentes” (ADI3.569, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 02.04.2007, DJ de

11.05.2007).

3.2. Normas constitucionais de eficácia contida

Esse grupo de normas constitucionais é diferente das de eficácia plena e

das de eficácia limitada. A priori, são semelhantes com as de eficácia plena no

tocante à aplicabilidade, pois possuem aplicabilidade imediata, mas delas se

distanciam porque há a possibilidade de contenção de sua eficácia, por meio de

legislação infraconstitucional futura ou outros meios. Em um segundo momento,

assemelham-se às de eficácia limitada por ser possível regulamentação legislativa

infraconstitucional, mas desta se afastam sob o aspecto da aplicabilidade e também

porque o surgimento da legislação posterior tem sentido contrário: restringe a sua

eficácia e aplicabilidade, enquanto as de eficácia limitada é ampliada.

Como exemplo citamos o art. 5.º, XIII, da CF/88, que assegura ser livre o

exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações

profissionais que a lei estabelecer. Ou seja, garante-se o direito do livre exercício

profissional, mas uma lei, por exemplo, o Estatuto da OAB, pode exigir que para nos

tornarmos advogados sejamos aprovados em um exame de ordem. Sem essa

aprovação, infelizmente, não poderemos exercer a profissão de advogado, sendo

apenas bacharéis em direito. O que a lei infraconstitucional fez foi reduzir a

amplitude do direito constitucionalmente assegurado.

A questão foi posta, e o STF entendeu que “o exame de suficiência discutido

seria compatível com o juízo de proporcionalidade e não alcançaria o núcleo

essencial da liberdade de ofício. No concernente à adequação do exame à finalidade

19

prevista na Constituição — assegurar que as atividades de risco sejam

desempenhadas por pessoas com conhecimento técnico suficiente, de modo a evitar

danos à coletividade — aduziu-se que a aprovação do candidato seria elemento a

qualificá-lo para o exercício profissional” (RE 603.583, Rel. Min. Marco Aurélio,

j.26.10.2011, Plenário, Inf. 646/STF).

Cabe alertar, contudo, conforme estabeleceu a Corte ao analisar referido

dispositivo constitucional (art. 5.º, XIII), que “nem todos os ofícios ou profissões

podem ser condicionados ao cumprimento de condições legais para o seu exercício.

A regra é a liberdade. Apenas quando houver potencial lesivo na atividade é que

pode ser exigida inscrição em conselho de fiscalização profissional. A atividade de

músico prescinde de controle. Constitui, ademais, manifestação artística protegida

pela garantia da liberdade de expressão” (RE 414.426, Rel. Min. Ellen Gracie,

j.1.º.08.2011, Plenário, DJE de 10.10.2011. No mesmo sentido: RE 795.467-RG,

Rel. Min. Teori Zavascki, j. 05.06.2014; RE 635.023- ED, Rel. Min. Celso de Mello,

j.13.12.2011, 2.ª T.; RE 509.409, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática,

j.31.08.2011 etc.).

Outros exemplos, ainda, podem ser constatados nos incisos VII, 4 VIII, XV,

XXIV, XXV,5 XXVII e XXXIII do art. 5.º; arts. 15, IV; 37, I; 170, parágrafo único etc.

Importante notar que, como veremos, em algumas provas de concursos, o

examinador utilizou a nomenclatura sugerida por Michel Temer para as normas

constitucionais de eficácia contida, qual seja, normas constitucionais de eficácia

redutível ou restringível, apesar de sua aplicabilidade plena. Segundo Temer,

referidas normas “são aquelas que têm aplicabilidade imediata, integral, plena, mas

que podem ter reduzido seu alcance pela atividade do legislador infraconstitucional”.

3.3. Normas constitucionais de eficácia limitada

Essas normas que, de imediato, no momento em que a constituição é

promulgada, ou entra em vigor, não tem o condão de produzir todos os seus efeitos,

precisando de uma lei integrativa infraconstitucional, ou até mesmo de integração

por meio de emenda constitucional, como se observou nos termos do art. 4º da EC

n.47/2005. São portanto, de aplicabilidade direta, mediata e reduzida, ou, segundo

alguns autores, aplicabilidade diferida.

20

Em geral, essas normas, não receberam do constituinte normatividade

suficiente para sua aplicação, o qual deixou ao legislador infraconstitucional a tarefa

de completar a regulamentação da matéria nelas traçada em princípio ou esquema.

São aquelas que sempre dependerão de outras providências para que possam

produzir os efeitos desejados pelo legislador constituinte.

O mestre do Largo São Francisco divide-as em dois grandes grupos: normas

de princípio institutivo (ou organizativo) e normas de princípio programático.

As normas de eficácia limitada, declaratórias de princípios institutivos ou

organizativos (ou orgânicos) contêm esquemas gerais (iniciais) de estruturação de

instituições, órgãos ou entidades. Podemos exemplificar com os arts. 18, § 2.º; 22,

parágrafo único; 25, § 3.º; 33; 37, VII; 37, XI; 88; 90, § 2.º; 91, § 2.º; 102, § 1.º; 107,

§ 1.º; 109, VI; 109, § 3.º; 113; 121; 125, § 3.º; 128, § 5.º; 131; 146; 161, I; 224...

Já as normas de eficácia limitada, declaratórias de princípios programáticos,

veiculam programas a serem implementados pelo Estado, visando à realização de

fins sociais (arts. 6.º — direito à alimentação; 196 — direito à saúde; 205 — direito à

educação; 215 — cultura; 218, caput — ciência, tecnologia e inovação (EC n.

85/2015); 227 — proteção da criança...).

Alguns outros exemplos podem ser “colhidos” do vasto estudo desenvolvido

por José Afonso da Silva. Vinculadas ao princípio da legalidade, o autor menciona

algumas normas programáticas: a) art. 7.º, XI (participação nos lucros, ou

resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na

gestão da empresa, conforme definido em lei, observando que já existe ato

normativo concretizando o direito); b) art. 7.º, XX (proteção do mercado de trabalho

da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei); c) art. 7.º, XXVII

(proteção em face da automação, na forma da lei); d) art. 173, § 4.º (a lei reprimirá o

abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da

concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros — vide CADE); e) art. 216, § 3.º; f)

art. 218, § 4.º etc.

Outros dois exemplos, de interesse prático, podem ser encontrados na

jurisprudência do STF, já declarados como normas de eficácia limitada: a) juros

legais de 12% ao ano; b) teto do funcionalismo público.

Em relação ao primeiro, o STF entendia, apesar da nossa crítica e de

diversos outros autores, bem como de alguns tribunais (vide Julgados do TARGS,

81/314), que o revogado art. 192, § 3.º, que fixava as taxas dos juros reais não

21

superiores a 12% a.a., era norma constitucional de eficácia limitada, dependente de

lei complementar para sua aplicação prática.14 Convém lembrar a novidade trazida

pela EC n. 40, de 29.05.2003 (PEC n. 53/99 da CD e n. 21/97 do SF), que, ao tratar

do Sistema Financeiro Nacional, alterou a redação do inciso V do art. 163 e do caput

do art. 52 do ADCT, revogando todos os incisos e parágrafos do art. 192, permitindo

a sua regulamentação por mais de uma lei complementar. Em razão dessa nova

sistemática, a já desprestigiada taxa de juros reais de 12% a.a. desconstitucionaliza-

se, infelizmente, assim como as importantes regras que constavam do referido art.

192. No parecer do relator à PEC n. 53, a reforma buscou “... superar as dificuldades

de regulamentação do art. 192 da Constituição Federal e viabilizar a aprovação de

uma nova lei estruturadora do sistema financeiro nacional”, uma vez que o STF já

havia resolvido que, na vigência da antiga regra, antes da EC n. 40/2003, portanto, o

sistema financeiro deveria ser regulamentado por uma única lei complementar

(cf.Súmula Vinculante 7/2008).

O segundo exemplo diz respeito ao teto do funcionalismo público. Como se

sabe, a Reforma Administrativa (EC n. 19/98) fixou o teto correspondente ao

subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do STF, nos termos dos arts. 37, XI; 39,

§ 4.º, e 48, XV. Tratava-se, como definiu o STF, de norma não autoaplicável,

dependente de lei formal de iniciativa conjunta dos Presidentes da República, da

Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal,

observadas as regras dos arts. 39, § 4.º, 150, II, 153, III e 153, § 2.º, I.15 Essas

regras, contudo, não persistem, tendo em vista a promulgação da EC n. 41/2003.

A Reforma da Previdência (EC n. 41, de 19.12.2003) também estabeleceu

como teto do funcionalismo público o subsídio pago ao Ministro do STF, a ser fixado

por lei. Inovando, acaba com a denominada “iniciativa conjunta”, já que a fixação do

teto dar-se-á por lei de iniciativa exclusiva do Presidente do STF (arts. 48, XV, e 96,

II, “b” — sendo a CD a Casa iniciadora e o SF, a revisora — art. 64, caput) e não

mais em conjunto pelos Presidentes dos “Poderes”.

Verificaremos que foram criados subtetos, nos termos do art. 37, XI, e §§ 11

e 12 (parágrafos introduzidos pela EC n. 47/2005), tema a ser estudado quando

tratarmos da exclusão da regra da iniciativa conjunta.

A perspectiva de que referida regra (art. 37, XI) continue sendo classificada

pelo STF como de eficácia limitada decorre não só do antigo posicionamento da

Suprema Corte como, principalmente, da regra contida no art. 8.º da EC n. 41/2003,

22

que tem a seguinte redação: “Até que seja fixado o valor do subsídio de que trata o

art. 37, XI, da Constituição Federal, será considerado, para os fins do limite fixado

naquele inciso, o valor da maior remuneração atribuída por lei na data de publicação

desta Emenda a Ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, de

representação mensal e da parcela recebida em razão de tempo de serviço,

aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no

Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o

subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o

subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e

vinte e cinco centésimos por cento da maior remuneração mensal de Ministro do

Supremo Tribunal Federal a que se refere este artigo, no âmbito do Poder Judiciário,

aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos

Defensores Públicos”.

Alexandre de Moraes considera o texto do inciso XI do art. 37

autoaplicável.16 Em nossa interpretação, concordamos que o texto seja

autoaplicável. Essa autoaplicabilidade, contudo, não decorre da eficácia plena da

norma (que, em nosso entender, é de eficácia limitada, já que prescreve a sua

regulamentação por lei de iniciativa do Presidente do STF), mas do comando fixado

no art. 8.º da EC n. 41/2003.

Tanto é verdade que o teto inicial, que era provisório, foi redefinido pela Lei

n. 11.143/2005, tendo sido reajustado nos termos da Lei n. 12.041/2009, estando

atualmente regulamentado pelas Leis ns. 12.771/2012 e 13.091/2015 que

estabeleceram o subsídio mensal de Ministro do STF, referido no inciso XV do art.

48 da CF/88, como sendo de: a) R$ 28.059,29, a partir de 1.º.01.2013; b) R$

29.462,25, a partir de 1.º.01.2014; e c) R$ 33.763,00, a partir de 1.º.01.2015 (as

regras sobre o teto do funcionalismo foram modificadas pela EC n. 47/2005.

Então, uma coisa é a regra contida na Constituição, que depende de lei para

sua regulamentação (eficácia limitada). Outra é o seu valor provisório (teto de

retribuição) estabelecido no citado art. 8.º, da EC n. 41/2003. Esse dispositivo foi

declarado pelo STF como de “eficácia imediata”, já que definiu um específico valor a

ser observado até o formal estabelecimento do teto do funcionalismo por lei

específica (RE 609.381/GO, Rel. Min. Teori Zavascki, j. em 02.10.2014, DJE de

11.12.2014).

23

4. CLASSIFICAÇÃO DE MARIA HELENA DINIZ

Maria Helena Diniz baseia-se nas várias classificações apresentadas pela

doutrina para propor, tendo por critério a questão da intangibilidade e da produção

dos efeitos concretos, a distinção das normas constitucionais em: normas com

eficácia absoluta; normas com eficácia plena; normas com eficácia relativa

restringível e normas com eficácia relativa completável ou dependentes de

complementação:

Normas supereficazes ou com eficácia absoluta: são intangíveis, não

podendo ser emendadas. Contêm uma força paralisante total de qualquer legislação

que, explícita ou implicitamente, vier a contrariá-las. Exemplos: textos constitucionais

que amparam: a) a federação (arts. 1.º; 18; 34, VII, “c”; 46, § 1.º); b) o voto direto,

secreto, universal e periódico (art. 14); c) a separação de Poderes (art. 2.º); d) os

direitos e garantias individuais (art. 5.º, I a LXXVIII), enfim, as normas intangíveis por

força dos arts. 60, § 4.º (as chamadas cláusulas pétreas), e 34, VII, “a” e “b”.

Normas com eficácia plena: contêm “... todos os elementos imprescindíveis

para que haja a possibilidade da produção imediata dos efeitos previstos, já que,

apesar de suscetíveis de emenda, não requerem normação subconstitucional

subsequente. Podem ser imediatamente aplicadas. Consistem, por exemplo, nos

preceitos que contenham proibições, confiram isenções, prerrogativas e que não

indiquem órgãos ou processos especiais para sua execução”. Exemplos: arts. 1.º,

parágrafo único; 14, § 2.º; 17, § 4.º; 21; 22; 37, III; 44, parágrafo único; 69; 153; 155;

156 etc.

Normas com eficácia relativa restringível: correspondem às normas de

eficácia contida na classificação exposta de José Afonso da Silva, com preferência

para a nomenclatura proposta por Michel Temer (eficácia redutível ou restringível),

sendo de aplicabilidade imediata ou plena. Enquanto não sobrevier a restrição, o

direito nelas contemplado será pleno. Exemplos: arts. 5.º, VIII, XI, XII, XIII, XIV, XVI,

XXIV, LX, LXI; 84, XXVI; 139; 170, parágrafo único; 184 etc.

Normas com eficácia relativa complementável ou dependente de

complementação legislativa: dependem de lei complementar ou ordinária para o

exercício do direito ou benefício consagrado. “Sua possibilidade de produzir efeitos é

mediata, pois, enquanto não for promulgada aquela lei complementar ou ordinária,

não produzirão efeitos positivos, mas terão eficácia paralisante de efeitos de normas

24

precedentes incompatíveis e impeditivas de qualquer conduta contrária ao que

estabelecerem.” Podem ser de princípio institutivo (“dependentes de lei para dar

corpo a instituições, pessoas, órgãos, nelas previstos” — exemplos: arts. 17, IV; 25,

§ 3.º; 43, § 1.º etc.), ou normas programáticas (programas a serem desenvolvidos

mediante lei infraconstitucional — exemplos: arts. 205; 211; 215; 218; 226, § 2.º

etc.).

25

5. REMÉDIOS DE COMBATE A OMISSÃO INCONSTITUCIONAL

O constituinte originário preocupou-se com a eficácia e aplicabilidade das

normas constitucionais e por isso preordenou alguns instrumentos que visam a esse

desiderato, entre eles, têm-se a ação direta de inconstitucionalidade por omissão

(CF, art. 103, § 2º) e o mandado de injunção (CF, art. 5º, LXXI).

5.1. Ação direta de inconstitucionalidade por omissão

Trata-se de inovação da CF/88, inspirada no art. 283 da Constituição

portuguesa. O que se busca com a ADO é combater uma “doença”, chamada pela

doutrina de “síndrome de inefetividade das normas constitucionais”.

O art. 103, § 2.º, da CF/88 determina que, declarada a inconstitucionalidade

por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência

ao poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando

de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. O que se busca é tornar efetiva

norma constitucional destituída de efetividade, ou seja, somente as normas

constitucionais de eficácia limitada!

Nesse sentido, devendo o poder público ou órgão administrativo

regulamentar norma constitucional de eficácia limitada e não o fazendo, surge a

“doença”, a omissão, que poderá ser “combatida” por um “remédio” chamado ADO,

de forma concentrada no STF.

A ADO aplica-se no caso de silêncio legislativo ou omissão legislativa

inconstitucional explicado por J. J. Gomes Canotilho, vide:

“O conceito de omissão legislativa não é um conceito naturalístico,

reconduzível a um simples ‘não fazer’, a um simples ‘conceito de negação’.

Omissão, em sentido jurídico-constitucional, significa não fazer aquilo a que

se estava constitucionalmente obrigado. A omissão legislativa, para ganhar

significado autônomo e relevante, deve conexionar-se com uma exigência

constitucional de acção, não bastando o simples dever geral de legislar para

dar fundamento a uma omissão inconstitucional”.

O objetivo da ação direta de inconstitucionalidade por omissão é combater à

chamada síndrome de inefetividade das normas constitucionais. Assim, a

26

inconstitucionalidade por omissão se da “quando o poder público deixa de praticar

atos legislativos ou executivos necessários e indispensáveis para tornar aplicáveis

as normas constitucionais”.

Michel Temer observa, que a finalidade desse tipo de controle concentrado é

a de realizar, em sua, em sua plenitude, a vontade de constituinte originário, ou seja,

nenhum comando constitucional deixará de atingir eficácia plena, verbis:

“Os preceitos que demandarem regulamentação legislativa ou aqueles

simplesmente programáticos não deixaram de ser invocáveis e exeqüíveis em razão

da inércia do legislador. O que se quer é que a inação (omissão) do legislador não

venha a impedir o auferimento de direitos por aqueles a quem a norma

constitucional se destina. Quer-se – tal forma de controle – passar da abstração para

concreção; da inação par ação; do descritivo para o realizado. O legislador

constituinte de 1988 baseou-se nas experiências constitucionais anteriores, quando

muitas normas não foram regulamentadas por legislação integrativa e, por isso,

tornaram-se ineficazes. Ou seja: o legislador ordinário, omitindo-se, inviabilizou a

vontade do legislador constituinte”.

5.1.1. Espécies de omissão

A omissão poderá ser total ou parcial: total, quando não houver o

cumprimento constitucional do dever de legislar; parcial, quando houver lei

integrativa infraconstitucional, porém de forma insuficiente.

Como exemplo de inconstitucionalidade por omissão total ou absoluta,

destacamos o art. 37, VII, que prevê o direito de greve para os servidores públicos,

ainda não regulamentado por lei.225 Outro exemplo é o revogado art. 192, § 3.º, que

dependia de lei (limitação da taxa de juros a 12% ao ano — cf. S. 648/STF e SV

7/2008).

A inconstitucionalidade por omissão parcial, por seu turno, poderá ser parcial

propriamente dita ou parcial relativa.

Por omissão parcial propriamente dita, a lei existe mas regula de forma

deficiente o texto. Como exemplo, temos o art. 7.º, IV, que dispõe sobre o direito ao

salário mínimo. A lei fixando o seu valor existe, mas o regulamenta de forma

deficiente, pois o valor fixado é muito inferior ao razoável para cumprir toda a

garantia da referida norma.

27

Por fim, a omissão parcial relativa surge quando a lei existe e outorga

determinado benefício a certa categoria mas deixa de concedê-lo a outra, que

deveria ter sido contemplada. Nesse caso, tem prevalecido a Súmula 339/STF,

potencializada com a sua conversão na SV n. 37/2014: “não cabe ao Poder

Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores

públicos sob o fundamento de isonomia”.

5.1.2. Objeto

A ação direta de inconstitucionalidade por omissão está ligada diretamente à

aplicabilidade das normas constitucionais. É cabível seu ajuizamento nas normas

constitucionais de eficácia limitada, desde que o legislador infraconstitucional não

elabore a norma jurídica para tornar efetivo o comando nas normas constitucionais

de princípio institutivo e de principio programático vinculados à legalidade.

Barroso observa que a omissão é de cunho normativo, que é mais ampla do

que a omissão de cunho legislativo. Assim, engloba “... atos gerais, abstratos e

obrigatórios de outros Poderes e não apenas daquele ao qual cabe, precipuamente,

a criação do direito positivo”.

O STF já decidiu que, pendente julgamento de ADO, se a norma que não

tinha sido regulamentada é revogada, a ação deverá ser extinta por perda de objeto.

A mesma decisão, qual seja, pela perda de objeto, tomou o STF para a

hipótese de encaminhamento de projeto de lei sobre a matéria ao Congresso

Nacional (cf. ADI 130-2/DF), ou, ainda, pelo não cabimento da ação se, no momento

de sua propositura, o processo legislativo já havia sido desencadeado (ADI 2.495,

Rel. Ilmar Galvão, j. 02.05.2002, DJ de 02.08.2002).

Este último posicionamento, contudo, foi repensado no julgamento da ADO

3.682, entendendo o STF não se justificar a demora na apreciação de projetos já

propostos (inertia deliberandi das Casas Legislativas), passível de se caracterizar

uma desautorizada “conduta manifestamente negligente ou desidiosa das Casas

Legislativas”, colocando em risco a própria ordem constitucional.

Por derradeiro, adotando posicionamento bastante formalista, sobre o qual

deixamos a nossa crítica, o STF entendeu inexistente a fungibilidade da ADO com o

mandado de injunção, tendo em vista a diversidade de pedidos: “Impossibilidade

jurídica do pedido de conversão do mandado de injunção em ação direta de

28

inconstitucionalidade por omissão” (MI 395-QO, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de

11.09.1992).

5.1.3. Competência

O órgão competente para apreciar a ação direta de inconstitucionalidade por

omissão é o STF, de forma originária (art. 103, § 2.º, c/c, analogicamente, o art. 102,

I, “a”).

5.1.4. Autores legitimados

Os legitimados para propositura da ação direta de inconstitucionalidade por

omissão são os mesmos da ação direta de inconstitucionalidade genérica e da ação

declaratória de constitucionalidade, ou seja: o Presidente da república; a Mesa do

Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; a Mesa da Assembléia

Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado ou

do Distrito Federal; o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da OAB;

partido político com representação no Congresso Nacional; confederação sindical ou

entidade de classe de âmbito nacional, nos termos do art. 12-A da Lei nº 9.868/99).

5.1.5. Procedimento

O procedimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO)

é praticamente o mesmo da ADI genérica, com algumas peculiaridades.

Nos termos do art. 12-B da Lei n. 9.868/99, a petição inicial, acompanhada

de instrumento de procuração, se for o caso, será apresentada em duas vias,

devendo conter cópias dos documentos necessários para comprovar a alegação de

omissão e indicará: a omissão inconstitucional total ou parcial quanto ao

cumprimento de dever constitucional de legislar ou quanto à adoção de providência

de índole administrativa; o pedido, com suas especificações.

A petição inicial inepta, não fundamentada, e a manifestamente

improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator, cabendo agravo da

referida decisão.

29

Lembramos que, de acordo com o CPC/2015, com vacatio legis de um ano a

contar da data de sua publicação oficial (art. 1.045), previsto nos arts. 994, III, e

1.021, contra a decisão monocrática do Relator caberá o recurso de agravo interno

para o Pleno do STF. A novidade é que, por força da regra explícita do art. 1.070 e

da previsão geral fixada no art. 1.003, § 5.º, o prazo para a interposição desse

recurso, bem como para responder-lhe (art. 1.021, § 2.º), passa a ser de 15 dias (e

não mais de 5), devendo a contagem, pela regra geral do art. 219 do Novo

CPC/2015, dar-se em dias úteis.

Proposta a ação, não se admitirá desistência, devendo ser, no que couber,

aplicadas as disposições constantes da Seção I do Capítulo II da Lei n. 9.868/99.

Os legitimados constantes do art. 103 da CF/88 poderão manifestar-se, por

escrito, sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis

para o exame da matéria, no prazo das informações, bem como apresentar

memoriais.

Modificando o entendimento do STF, 228 a lei passou a estabelecer que o

relator poderá solicitar a manifestação do AGU, cujo encaminhamento deverá ser

feito no prazo de 15 dias.

O Procurador-Geral da República, nas ações em que não for autor, terá vista

do processo, por 15 dias, após o decurso do prazo para informações.

Finalmente, segundo Clèmerson Merlin Clève, “não há prazo para a

propositura da ação. É evidente, entretanto, que sem o transcurso de um prazo

razoável, aferível caso a caso, não haverá omissão inconstitucional censurável, mas

sim mera lacuna técnica (omissão constitucional e omissão constitucional em

trânsito para a inconstitucionalidade)”.

5.1.6. Efeitos da decisão

Tratando-se de órgão do Poder, vale dizer, das funções Legislativa,

Executiva ou Judiciária, será dada ciência para adoção das providências

necessárias, sem prazo preestabelecido para suprir a omissão. O Supremo Tribunal

Federal não poderá obrigar qualquer um deles a legislar sobre a matéria objeto da

ação direta de inconstitucionalidade por omissão, sob pena de ferir o princípio

contido no art. 2º da CF, que trata da independência e harmonia entre as funções do

30

Estado. Também não poderá o pretório excelso expedir normas para suprir a

inatividade do órgão legislativo inadimplente, verbis:

“A procedência da ação direta de inconstitucionalidade por omissão,

importando em reconhecimento judicial do estado de inércia do poder público,

confere ao STF unicamente o poder de cientificar o legislador inadimplente, para que

adote as medidas necessárias à concretização do texto constitucional. Não assiste

ao STF, contudo, em face do próprios limites fixados pela Carta Política em tem de

inconstitucionalidade por omissão (CF, art. 103, § 2º), a prerrogativa de expedir

provimentos normativos com o objetivo de suprir a inatividade do órgão legislativo

inadimplente”.

Se a omissão partir de órgão administrativo, este deverá adotar as

providências necessárias em 30 dias, ou em prazo razoável a ser estipulado

excepcionalmente pelo Supremo Tribunal Federal, tendo em vista as circunstâncias

específicas do caso e o interesse público envolvido (art. 12-H, § 1º, da Lei nº

9.868/99). Destaque-se que a ação direta de inconstitucionalidade por omissão não

pode ser proposta com a finalidade de que seja praticado determinado ato

administrativo em caso concreto, mas sim visa a que seja expedido ato normativo

necessário para o cumprimento do comando constitucional que, sem ele, não

poderia ter aplicabilidade.

Não há dúvidas de que a decisão de inconstitucionalidade por omissão terá

efeitos erga omnes. No entanto, essa decisão poderá retroagir ou não conforme o

caso. É o que explica a doutrina:

“Quando a Constituição fixar prazos para a atuação dos poderes

constituídos visando à sua plena aplicação, a declaração de

inconstitucionalidade por omissão deverá alcançar o prazo determinado

pela própria Lei Fundamental, retroagirá até a data.

Nos casos em que não há estabelecimento de prazo para atuação, os

efeitos da declaração de inconstitucionalidade omissiva se fazem a partir do

pronunciamento do STF nesse sentido”.

O Supremo Tribunal Federal passou a adotar posicionamento diferente

a tradicional em algumas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão. Tome-

se como precedente a ADIn 3.682 do STF (Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 9-5-2007),

31

onde se discutiu a demora legislativa em não editar a lei complementar federal,

exigida pelo art. 18, § 4º, com a redação conferida pelo EC nº 15/1996.

Do voto do Ministro relator, Gilmar Mendes, vide:

“Não obstante, ressalto que os dados fáticos da inexistência do ato

normativo em referência e do extenso lapso temporal podem não ser

suficientes para a configuração da omissão legislativa inconstitucional.

Desde a promulgação da EC nº 15/96, não se pode falar exatamente em

uma total inércia legislativa, visto que vários projetos de lei complementar

foram apresentados e discutidos no âmbito das casas legislativas. O

primeiro deles, o projeto de Lei complementar nº 130, foi apresentado em 21

de novembro de 1996, portanto, apenas dois meses após a publicação da

EC nº 15/96, em 13 de setembro de 1996. Posteriormente, foram

apresentados os seguintes projetos de lei complementar visando à

regulamentação do art. 18, § 4º, da Constituição: PLP 138/1996, PLP

151/1997, PLP 39/1999, PLP 87/1999, PLP 170/2000, PLP 227/2001, PLP

273/2001, PLP 6/2003, PLP 78/2003, PLP 286/2005.

O Projeto de Lei Complementar nº 41, de 2003, do Senado Federal, chegou

a ser aprovado, porém foi posteriormente vetado pelo Presidente da

República, por meio da mensagem nº 289, de 30 de junho de 2003.

Desde então, o Congresso Nacional não votou a apreciar o tema. Em

setembro de 2006, completaram-se dez anos de vigência da EC nº 15/96,

sem que a lei complementar federal nela referida tenha sido editada.

Assim, questão que ainda está a merecer melhor exame diz respeito à

inertia deliberandi (discussão e votação) no âmbito das Casas Legislativas.

Enquanto a sanção e o veto estão disciplinados, de forma relativamente

precisa, no texto constitucional, inclusive no que concerne a prazos (art. 66),

a deliberação não mereceu do constituinte, no tocante a esse aspecto, uma

disciplina mais minuciosa. Ressalvada a hipótese de utilização do

procedimento abreviado previsto no art. 64, §§ 1º e 2º, da Constituição, não

se estabeleceram prazos para a apreciação dos projetos de lei. Observe-se

que, mesmo nos casos desse procedimento abreviado, não há garantia

quanto à aprovação dentro de determinado prazo, uma vez que o modelo

de processo legislativo estabelecido pela Constituição não contempla a

aprovação por decurso de prazo.”

A questão colocada pelo relator é saber se haveria uma omissão passível de

vir a ser controlada por meio da ação direta de inconstitucionalidade por omissão se

os órgãos legislativos não deliberarem dentro de um prazo razoável sobre o projeto

32

de lei em tramitação. O relator reconheceu que o “o Supremo Tribunal Federal tem

considerado que, desencadeado o processo legislativo, não há que se cogitar de

omissão inconstitucional do legislador”. No entanto, entendeu o Ministro relator de

que essa orientação deve ser adotada com temperamento. Pondera que “a

complexidade de algumas obras legislativas não permite que elas sejam concluídas

em prazo exíguo”, mas não justifica uma conduta manifestamente negligente ou

desidiosa das Casas Legislativas, conduta esta que pode colocar em risco a própria

ordem constitucional. Assim, conclui que também a inertia deliberandi das Casas

Legislativas pode ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade por omissão e

pode o Supremo Tribunal Federal reconhecer a mora do legislador em deliberar

sobre a questão, declarando a inconstitucionalidade da omissão.

O relator votou

“no sentido de declarar o estado de mora em que se encontra o Congresso

Nacional, a fim de que, em prazo razoável de 18 (dezoito) meses, adote ele

todas as providências legislativas necessárias ao cumprimento do dever

constitucional imposto pelo art. 18, § 4º, da Constituição, devendo ser

contempladas as situações imperfeitas decorrentes do estado de

inconstitucionalidade gerado pela omissão”.

Esclareceu ainda que

“não se trata de impor um prazo para a atuação legislativa do Congresso

Nacional, mas apenas de fixação de um parâmetro temporal razoável, tendo

em vista o prazo de 24 meses determinado pelo Tribunal nas ADI nºs 2.240,

3.316, 3.489 e 3.689 para que as leis estaduais que criam municípios ou

alteram seus limites territoriais continuem vigendo, até que a lei

complementar federal seja promulgada contemplando as realidades desses

municípios”.

Ao que parece, tal decisão do Supremo Tribunal Federal tem caráter

mandamental, pois declarou o estado de mora do Congresso Nacional e fixou prazo

que entendeu razoável de 18 (dezoito) meses para ele adotar todas as providências

legislativas necessárias ao cumprimento do dever constitucional previsto no art. 18,

§ 4º, da CF. Apesar do esclarecimento do relator de que não se trata de impor um

prazo para a atuação legislativa do Parlamento, entendemos que a decisão tem

33

cunho mandamental. O que o acórdão do Supremo Tribunal Federal não esclareceu

é: Qual seria a conseqüência processual na omissão do Congresso Nacional,

decorrido aquele prazo de 18 (dezoito) meses?

Para evitar impasse entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal

Federal aquele promulgou a EC nº 57, de 18-12-2008, acrescentando o art. 96 ao

ADCT, com a seguinte redação: “Ficam convalidados os atos de criação, fusão,

incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31

de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do

respectivo Estado à época de sua criação”, ou seja, essa emenda convalidou o vício

formal de todas as leis estaduais que criaram Municípios sem a observância das

regras do art. 18, § 4º, da CF, em total descompasso com a decisão do Supremo

Tribunal Federal.

Finalmente, destacamos importante decisão tomada pelo Min. Dias Toffoli,

no julgamento monocrático do pedido de medida cautelar na ADO 24 (j. 1.º.07.2013

— pendente de julgamento).

O art. 27 da EC n. 19/98 estabelece o prazo de 120 dias para que o

Congresso Nacional elabore a lei de defesa do usuário de serviços públicos; aliás,

um tema extremamente importante quando se pensa nos serviços de saúde,

educação, transporte, assistência social etc.

Passados mais de 15 anos, a lei (que deveria ter sido editada em 120 dias!)

ainda não foi elaborada, apesar da existência de projetos de lei tramitando (PLC n.

6.953/2002, substitutivo do PL n. 674/99).

Trata-se de mais um exemplo de inatividade legislativa e, no caso, por

existirem os projetos de lei, de inertia deliberandi (discussão e votação).

Em sua decisão, de maneira acertada, o Ministro entendeu que a inércia na

apreciação dos projetos de lei se mostrava inaceitável, já que manifesta a omissão a

caracterizar afronta à Constituição (e, por que não dizer, nas palavras do Min. Gilmar

Mendes, no julgamento da ADO 3.682, omissão negligente e desidiosa a colocar em

risco a própria ordem constitucional).

Dessa forma, acolhendo o pedido formulado pela OAB, fixou o prazo de 120

dias para que o Congresso Nacional elabore a lei.

Novamente, como sugestão, parece razoável que a técnica que vem sendo

utilizada no MI também possa ser aqui aplicada, especialmente em casos, como

esse, de inércia desrespeitosa. Assim, plausível o pedido feito pela OAB de

34

aplicação subsidiária do CDC enquanto não editada a lei, como forma de se

“resguardar minimamente o cidadão contribuinte em suas relações com o Poder

Público”.

5.2. MANDADO DE INJUNÇÃO

A Constituição dispõe que se concederá mandado de injunção sempre que a

falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades

constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à

cidadania.

Trata-se, assim como o mandado de segurança coletivo e o habeas data, de

remédio constitucional introduzido pelo constituinte originário de 1988.

Os dois requisitos constitucionais para o mandado de injunção são: A norma

constitucional de eficácia limitada, prescrevendo direitos, liberdades constitucionais

e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania; e a falta de

norma regulamentadora, tornando inviável o exercício dos direitos, liberdades e

prerrogativas acima mencionados (omissão do Poder Público).

Dessa forma, tal como a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, o

mandado de injunção surge para “curar” uma “doença” denominada síndrome de

inefetividade das normas constitucionais, vale dizer, normas constitucionais que, de

imediato, no momento em que a Constituição entra em vigor (ou diante da

introdução de novos preceitos por emendas à Constituição, ou na hipótese do art.

5.º, § 3.º), não têm o condão de produzir todos os seus efeitos, precisando de ato

normativo integrativo e infraconstitucional.

São, portanto, de aplicabilidade mediata e reduzida, dividindo-se em dois

grupos: a) normas de eficácia limitada, declaratórias de princípios institutivos ou

organizativos: normalmente criam órgãos (arts. 91, 125, § 3.º, 131...); b) normas

declaratórias de princípios programáticos: veiculam programas a serem

implementados pelo Estado (ex.: arts. 196, 215, 218, caput...).

Dentre as várias distinções, Dirley da Cunha Júnior, em importante

monografia sobre o tema das omissões do Poder Público, observa que “o mandado

de injunção foi concebido como instrumento de controle concreto ou incidental de

constitucionalidade da omissão, voltado à tutela de direitos subjetivos. Já a ação

direta de inconstitucionalidade por omissão foi ideada como instrumento de controle

35

abstrato ou principal de constitucionalidade da omissão, empenhado na defesa

objetiva da Constituição. Isso significa que o mandado de injunção é uma ação

constitucional de garantia individual, enquanto a ação direta de inconstitucionalidade

por omissão é uma ação constitucional de garantia da Constituição”.

Depois de mais de 27 anos de vigência da CF/88, finalmente, a Lei n.

13.300, de 23.06.2016 (LMI), disciplinou o processo e o julgamento dos mandados

de injunção individual e coletivo, nos termos do inciso LXXI do art. 5.º da

Constituição Federal.

Muito embora não previsto expressamente na Constituição, o STF já admitia

o MI coletivo, à semelhança do MS coletivo, havendo, agora, previsão explícita na

lei. Nessa linha, o art. 14 da LMI determina a aplicação subsidiária das normas do

mandado de segurança (individual e coletivo — Lei n. 12.016/2009) e do CPC.

Ao tratar dos efeitos da decisão, o legislador manteve a concepção inicial

apontada por Dirley da Cunha Júnior, ao afirmar que a decisão terá eficácia

subjetiva limitada às partes, mas inovou, ampliando, prescrevendo, também, a

possibilidade de eficácia ultra partes ou erga omnes, como se verá a seguir.

5.2.1. Omissão total ou parcial

Partindo do texto constitucional, o art. 2.º da Lei n. 13.300/2016 estabelece

que será concedido mandado de injunção sempre que a falta total ou parcial de

norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades

constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à

cidadania.

A omissão é total quando a inércia é absoluta, ou seja, o preceito

constitucional de eficácia limitada não foi disciplinado. Por sua vez, considera-se

parcial a regulamentação quando forem insuficientes as normas editadas pelo órgão

legislador competente.

Como exemplo de omissão total, podemos citar o art. 37, VII, da CF/88, que

assegura o direito de greve ao servidor público, a ser exercido nos termos e nos

limites definidos em lei específica. Até hoje essa lei não foi editada!

Por sua vez, como exemplo de omissão parcial destacamos a

regulamentação do art. 7.º, IV, que assegura o direito ao salário mínimo.

Certamente, o valor estabelecido não é suficiente para atender todas as

36

necessidades previstas na Constituição. Isso quer dizer que o legislador

infraconstitucional regulamentou de modo insuficiente.

5.2.2. Legitimados

São legitimados ativos para o mandado de injunção individual, como

impetrantes, as pessoas naturais ou jurídicas que se afirmam titulares dos direitos e

liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania

e à cidadania.

E pessoa jurídica de direito público, pode impetrar o MI?

Trata-se de situação distinta daquela do MI coletivo. Nesta hipótese, a

pessoa jurídica de direito público impetraria o MI em seu próprio nome e tendo por

fundamento a falta de norma da Constituição que inviabilize, para a entidade de

direito público, o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Embora exista decisão não admitindo a legitimação ativa da pessoa jurídica

de direito público para a impetração do MI (MI 537/SC, DJ de 11.09.2001), o STF

parece ter superado esse entendimento anterior, nos termos do MI 725.

No caso concreto, entendeu o STF, nos termos do voto do relator, Min.

Gilmar Mendes, tendo por fundamento o “recurso de amparo” do direito ibero-

americano, que “não se deve negar aos municípios, peremptoriamente, a titularidade

de direitos fundamentais (...) e a eventual possibilidade das ações constitucionais

cabíveis para a sua proteção”. Assim, destacando que as pessoas jurídicas de

direito público podem ser titulares de direitos fundamentais, “parece bastante

razoável a hipótese em que o município, diante de omissão legislativa

inconstitucional impeditiva do exercício desse direito, se veja compelido a impetrar

mandado de injunção” (cf. Inf. 466/STF — j. 10.05.2007, DJ de 28.05.2007).

A previsão ampla de pessoas jurídicas como impetrantes no art. 3.º da LMI

parece fortalecer esse entendimento do STF.

Por sua vez, são legitimados ativos para a impetração do mandando de

injunção coletivo, como impetrantes: Ministério Público: quando a tutela requerida for

especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou

dos interesses sociais ou individuais indisponíveis; partido político com

representação no Congresso Nacional: para assegurar o exercício de direitos,

37

liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados com a finalidade

partidária; organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente

constituída e em funcionamento há pelo menos 1 ano: para assegurar o exercício de

direitos, liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus

membros ou associados, na forma de seus estatutos e desde que pertinentes a suas

finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial; Defensoria Pública:

quando a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos direitos

humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma

do inciso LXXIV do art. 5.º da Constituição Federal.

A LMI amplia a previsão dos legitimados ativos para a impetração do

mandado de injunção coletivo (art. 21 da Lei n. 12.016/2009), tanto para o MP como

para a Defensoria Pública.

O mandado de injunção individual ou coletivo deverá ser impetrado contra o

Poder, o órgão ou a autoridade com atribuição para editar a norma regulamentadora.

A petição inicial deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei

processual e indicará, além do órgão impetrado, a pessoa jurídica que ele integra ou

aquela a que está vinculado (art. 4.º da LMI).

No caso de normas de iniciativa reservada, como, por exemplo, aquelas

previstas no art. 61, § 1.º, em relação ao Presidente da República, o mandado de

injunção deverá ser impetrado também em face do titular da referida iniciativa

reservada, pois é ele que deve deflagrar (dar início) o processo legislativo, não

podendo o Congresso Nacional atuar sem a sua provocação formal.

5.2.3. Competência

A competência vem prevista na própria Constituição nos arts.: 102, I, “q”,

102, II, “a”, 105, I, “h”, 121, § 4.º, V, e 125, § 1.º:

• 102, I, “q”: compete ao STF, precipuamente, a guarda da

Constituição, cabendo-lhe processar e julgar, originariamente, o mandado

de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição

do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos

Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas

38

Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais

Superiores ou do próprio STF;

• 102, II, “a”: compete ao STF processar e julgar em recurso ordinário o

mandado de injunção decidido em única instância pelos Tribunais

Superiores, se denegatória a decisão;

• 105, I, “h”: compete ao STJ processar e julgar, originariamente, o

mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for

atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta

ou indireta, excetuados os casos de competência do STF e dos órgãos da

Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça

Federal;

• 121, § 4.º, V: competência atribuída ao TSE para julgar em grau de

recurso mandado de injunção denegado pelo TRE;

• 125, § 1.º: estabelece que os Estados organizarão sua Justiça,

observados os princípios estabelecidos na CF, sendo a competência dos

tribunais definida na Constituição do Estado. Para se ter um exemplo, no

Estado de São Paulo, o julgamento de mandado de injunção contra atos

omissivos de autoridades estaduais e municipais é da competência

originária do TJ (art. 74, V, da CE/SP — vide RJTJSP 176/92).

5.2.4. Procedimento

A petição inicial deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei

processual e indicará, conforme vimos, além do órgão impetrado, a pessoa jurídica

que ele integra ou aquela a que está vinculado.

Quando não for transmitida por meio eletrônico, a petição inicial e os

documentos que a instruem serão acompanhados de tantas vias quantos forem os

impetrados. Quando a ação for proposta por peticionamento eletrônico, não faz

sentido falar em contrafé, pois, naturalmente, o impetrado terá acesso a todo o

conteúdo da impetração.

Quando o documento necessário à prova do alegado encontrar-se em

repartição ou estabelecimento público, em poder de autoridade ou de terceiro,

havendo recusa em fornecê-lo por certidão, no original ou em cópia autêntica, será

ordenada, a pedido do impetrante, a exibição do documento no prazo de 10 dias,

devendo, nesse caso, ser juntada cópia à segunda via da petição.

39

Se a recusa em fornecer o documento for do impetrado, a ordem será feita

no próprio instrumento da notificação.

Recebida a petição inicial, será ordenada:

• a notificação do impetrado sobre o conteúdo da petição inicial,

devendo-lhe ser enviada a segunda via apresentada com as cópias dos

documentos, a fim de que, no prazo de 10 dias, preste informações;

• a ciência do ajuizamento da ação ao órgão de representação judicial

da pessoa jurídica interessada, devendo ser-lhe enviada cópia da petição

inicial, para que, querendo, ingresse no feito.

A petição inicial será desde logo indeferida quando a impetração for

manifestamente incabível o manifestamente improcedente.

Da decisão de relator que indeferir a petição inicial, prescreve a lei, caberá

agravo, em 5 dias, para o órgão colegiado competente para o julgamento da

impetração.

Muito embora a lei do mandado de injunção seja posterior ao CPC/2015 e,

ainda, legislação especial sobre o tema, dúvida surgirá se o prazo deve ser mesmo

de 5 dias (úteis) ou se deverá ser aplicada a regra do art. 1.070, c/c o art. 1.021, do

Código de Processo Civil, que estabelece o prazo de 15 dias úteis. Isso porque o art.

1.070 do CPC/2015 estabelece ser de 15 dias o prazo para a interposição de

qualquer agravo, previsto em lei ou em regimento interno de tribunal, contra decisão

de relator ou outra decisão unipessoal proferida em tribunal.

Findo o prazo para apresentação das informações, será ouvido o Ministério

Público, que opinará em 10 dias, após o quê, com ou sem parecer, os autos serão

conclusos para decisão.

5.2.5. Efeitos da decisão

No que respeita aos efeitos da decisão, várias posições já foram

sustentadas pela doutrina e pela jurisprudência e, ainda, inovando, agora, nos

termos da lei regulamentadora (Lei n. 13.300/2016), destacando-se os seguintes

posicionamentos:

40

• posição concretista direta: a concessão da ordem no MI “concretiza” o

direito diretamente, independentemente de atuação do órgão omisso, até

que a norma constitucional venha a ser regulamentada. A decisão vale ou

para todos (geral) e, nesse caso, terá efeitos erga omnes, ou para um

grupo, classe ou categoria de pessoas (coletivo), ou apenas para o

impetrante, pessoa natural ou jurídica (individual);

• posição concretista intermediária: julgando procedente o mandado de

injunção, o Judiciário fixa ao órgão omisso prazo para elaborar a norma

regulamentadora. Findo o prazo e permanecendo a inércia, o direito passa a

ser assegurado para todos (geral), para grupo, classe ou categoria de

pessoas (coletivo) ou apenas para o impetrante, pessoa natural ou jurídica

(individual);

• posição não concretista: a decisão apenas decreta a mora do Poder,

órgão ou autoridade com atribuição para editar a norma regulamentadora,

reconhecendo-se formalmente a sua inércia.

A posição não concretista por muito tempo foi a dominante no STF (vide MI

107-DF).

Esse posicionamento sofreu as nossas críticas, na medida em que se

tornaria inviável o exercício de direitos fundamentais, na persistência da inércia

normativa. A providência jurisdicional, nesses termos, mostrava-se inócua.

Avançando, o STF adotou em alguns casos a posição concretista individual

intermediária, que correspondia à do Ministro Néri da Silveira, qual seja, fixar um

prazo e comunicar ao órgão omisso para que elaborasse a norma naquele período.

Decorrido in albis o prazo fixado, o autor passaria a ter o direito pleiteado (efeitos

inter partes). (Vide MI 232-1-RJ, RDA 188/155.)

Posteriormente, em 30.08.2007, por unanimidade, o Pleno do STF

acompanhou o voto do Ministro relator, Marco Aurélio, para deferir ao impetrante o

direito à aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei n. 8.213/91, que

dispõe sobre planos de benefícios da Previdência Social. Passava o STF a adotar a

posição concretista direta individual.

No julgamento do MI 695/MA, que questionava a mora do Legislativo em

regulamentar o art. 7.º, XXI, da CF/88 (aviso prévio proporcional), o STF reconheceu

que, “... não fosse o pedido da inicial, limitado a requerer a comunicação ao órgão

competente para a imediata regulamentação da norma, seria talvez a oportunidade

de reexaminar a posição do Supremo em relação à natureza e à eficácia do

41

mandado de injunção, nos termos do que vem sendo decidido no MI 670/ES” (v. Inf.

430/STF e MI 695/MA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 1.º.03.2007, Inf. 457/STF).

Por fim, destacamos o julgamento dos MIs 670, 708 e 712, ajuizados,

respectivamente, pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito

Santo (Sindpol), pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de

João Pessoa (Sintem) e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do

Estado do Pará (Sinjep), buscando assegurar o direito de greve para seus filiados,

tendo em vista a inexistência de lei regulamentando o art. 37, VII, da CF/88.

O STF, em importante decisão, por unanimidade, declarou a omissão

legislativa e, por maioria, determinou a aplicação, no que couber, da lei de greve

vigente no setor privado, Lei n. 7.783/89.

A aplicação da lei não se restringiu aos impetrantes, mas a todo o

funcionalismo público (sobre o exercício do direito de greve pelos policiais civis, não

reconhecido pelo STF, cf). Assim, pode-se afirmar que o STF consagrou, em referido

julgamento e de modo excepcional, a posição concretista geral.158 Conforme

anotou Gilmar Mendes, “o Tribunal adotou, portanto, uma moderada sentença de

perfil aditivo, introduzindo modificação substancial na técnica de decisão da ação

direta de inconstitucionalidade por omissão”.

E qual foi a posição escolhida pelo legislador?

O art. 8.º, da LMI estabelece que, reconhecido o estado de mora legislativa,

será deferida a injunção para: a) determinar prazo razoável para que o impetrado

promova a edição da norma regulamentadora; b) estabelecer as condições em que

se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou,

se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação própria

visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo

determinado. Esse prazo será dispensado quando comprovado que o impetrado

deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo estabelecido para a

edição da norma.

O legislador, portanto, optou pela posição concretista intermediária, sendo,

então, mais conservador do que vinham sendo as decisões do STF. Essa posição,

contudo, nos parece extremamente equilibrada, pois dará ao impetrado a

possibilidade de suprir a omissão e, só então, mantida a mora, a decisão judicial

concretizando o direito fundamental.

42

A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc em

relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado, salvo se a aplicação da

norma editada lhes for mais favorável.

Ainda, por regra, a regulamentação adotou a posição concretista

intermediária individual ou coletiva. De acordo com o art. 9.º, caput, a decisão terá

eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma

regulamentadora.

Contudo, de maneira inovadora, afirma o legislador que poderá ser conferida

eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for inerente ou

indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da

impetração. Trata-se, sem dúvida, da posição concretista intermediária geral.

A lei prevê ainda a chamada coisa julgada secundum eventum probationis,

pois o indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a renovação

da impetração fundada em outros elementos probatórios.

Finalmente, inovando, a lei prescreveu a chamada ação de revisão. Sem

prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a pedido de

qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das

circunstâncias de fato ou de direito, devendo essa ação de revisão observar, no que

couber, o procedimento estabelecido na referida lei. Não se trata de ação rescisória,

mas de revisão da decisão proferida. Talvez, aqui, aproximando da ação de

alimentos, podemos falar que a decisão na ação de MI transita em julgado, mas é

dada com a cláusula rebus sic stantibus.

43

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme visto, a Constituição Brasileira, a fim de assegurar a eficácia dos

seus dispositivos, previu mecanismos contra a inércia legislativa, especialmente i) o

mandado de injunção e ii) a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADIn

por omissão).

Estes dois instrumentos, ambos inovações do Constituinte de 1988, têm por

objeto a proteção contra as omissões do legislador, que deixou de regulamentar

dispositivos da Constituição (omissões legislativas inconstitucionais), mas diferem

um do outro em relação a alguns aspectos, tendo diferentes pressupostos,

finalidades, legitimados, e não sendo necessariamente julgados pelo mesmo órgão

judicial.

Vale lembrar que o entendimento anterior do Supremo Tribunal Federal era

no sentido de que o mandado de injunção e a ADIn por omissão teriam efeitos

idênticos, recaindo a diferença entre esses institutos no fato do mandado de

injunção se prestar a salvaguardar direitos, liberdades e prerrogativas subjetivas ao

passo que a ADIn por omissão visa salvaguardar a Lei Fundamental como um todo,

indepedentemente de interesse específico.

Conforme interpretação atual do Supremo Tribunal Federal, no entanto, as

decisões proferidas em sede de mandado de injunção e ADIn por omissão

possuiriam diferentes efeitos. O mandado de injunção teria efeitos concretos

(individual ou geral – a depender da consolidação do posicionamento do STF nas

próximas decisões em sede de mandado de injunção), ao passo que a ADIn por

omissão permaneceria com efeitos não-concretos.

Com isso, foram ressaltadas as diferenças entre os dois instrumentos de

combate à inefetividade das normas constitucionais, o que, aparentemente, está em

consonância com a intenção do legislador constituinte de 1988, que preveu

instrumentos distintos, com diferentes finalidades.

44

7. REFERÊNCIAS

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADO 25, voto da Min. Cármen Lúcia, julgado em 30.11.2016. Acesso de acompanhamento processual: <http://www.stf.jus.br> Acesso em: 05.05.2017; LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17ª ed. São Paulo, 2013; NISHIYAMA, Adolfo Mamoru. Manual de Teoria Geral do Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2012; SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005; SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 3ª ed. São Pauo: Malheiros, 1998; TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993; CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 6. ed. rev. Coimbra: Almedina, 1993 (7. ed., 2003); RE 609.381/GO, Rel. Min. Teori Zavascki, j. em 02.10.2014, DJE de 11.12.2014; RE 414.426, Rel. Min. Ellen Gracie, j.1.º.08.2011, Plenário, DJE de 10.10.2011; RE 795.467-RG, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 05.06.2014; RE 635.023- ED, Rel. Min. Celso de Mello, j.13.12.2011, 2.ª T.; RE 509.409, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, j.31.08.2011; RE 603.583, Rel. Min. Marco Aurélio, j.26.10.2011, Plenário, Inf. 646/STF; ADI3.569, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 02.04.2007, DJ de 11.05.2007;

45

MI 758, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 1.º.07.2008, Plenário, DJE de 26.09.2008.

46

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

R171s Rosário, Levy Matheus Lima Pastor Nogueira. Síndrome de inefetividade das normas constitucionais e seus remédios de combate à omissão inconstitucional./ Levy Matheus Lima Pastor Nogueira Rosário. – 2017.

45 f.

Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Direito) – Centro Universitário Luterano de Manaus CEULM/ULBRA, Manaus, 2017.

Orientador Prof. Claudia Maria Nobre Lisboa.

1. Omissão inconstitucional. 2. Ações de controle de inconstitucionalidade. 3. Direito. I. Lisboa, Claudia Maria Nobre. II. Centro Universitário Luterano de Manaus - CEULM/ULBRA. III. Título.

CDU 342.4

Biblioteca Martinho Lutero / Setor de Processamento Técnico / Manaus – AM Bibliotecária Kamile Nascimento CRB11 - 672