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  1 CHEPTULIN, Alexander.  A dialética materialista: leis e categorias da dialética. São Paulo: Alfa-Ômega, 1982. Rodrigo Giraldi Cocco RESUMO O livro se dedica à análise das principais categorias e leis da dialética materialista. Esta estuda as formas gerias do ser, os aspectos e laços gerais da realidade e as leis do reflexo da realidade na consciência dos homens. Estes estudos são indispensáveis ao homem para sua orientação na resolução de tarefas diversas, além disso, compondo um sistema de idéias sobre o mundo, ajuda a compreender a essência  das formações materiais (por exemplo, a política de um Estado, etc.). As categorias dialéticas compõem: 1)as formas do reflexo da realidade (suas conexões etc.); 2) leis de funcionamento e desenvolvimento do conhecimento, alargando possibilidades criativas a partir do submetimento do pensamento e; 3) formas de interpretação filosófica. Vejamos agora, a natureza das categorias de modo amplo. Definir esta natureza remete ao problema entre o “particular” e o “geral” tanto na realidade objetiva quanto na consciência (a realidade objetiva reflete-se na consciência segundo o materialismo dialético!). Assim como se relaciona ao problema que “nasce com a Filosofia”: o da origem e existência das “essências ideais” e como elas se relacionam com as formações materiais, em outras palavras, trata-se do problema de quem vem primeiro: a matéria ou a consciência? A história da Filosofia centrou-se por muito tempo nesta questão gerando discussões entre as diversas escolas filosóficas (materialistas vs. idealistas, etc.). Já na Grécia antiga os pitagóricos tentaram solucionar este problema notando certa semelhança entre as coisas e os números, atribuindo ao número o atributo de “essência universal das coisas”. Isto equivale a dizer que eles evidenciaram uma das propriedades universais das coisas: suas relações quantitativas, numéricas, alçando esta categoria (a “quantidade”) como a essência autônoma e ideal que existiria independente das coisas. (seu idealismo reside nisto, nesta independência das coisas, uma origem a priori). É Platão quem desenvolverá a doutrina pitagórica, atestando que a idéia é eterna e que as coisas são transitórias, que tudo que existe advém da “idéia”. Aristóteles vai criticar este apriorismo das categorias, destacando que elas não passam de noções gerais e não existem antes das coisas singulares! As categorias são o resultado do conhecimento das coisas e refletem as propriedades das coisas. Para ele, é necessário antes, conhecer as coisas singulares para se chegar ao conhecimento do geral. Fixado este geral, conceitos mais gerais são apreendidos a partir de maiores relações entre maior numero de formações materiais, chegando, por fim, ao estabelecimento das categorias: os conceitos mais gerais de todos e que refletem as formas universais do ser. Assim, as categorias devem ser “lastreadas” pela matéria e pela forma, as quais,  juntas, compõem a realidade objetiva. A teoria de Aristóteles (embora esteja correta ao afirmar que as categorias refletem a realidade), contudo, equivoca-se ao afirmar que as “formas” têm origem ideal autônoma, ou seja, uma parte da realidade objetiva possuiria uma natureza ideal segundo o filósofo.

CHEPTULIN, Alexander. A dialética materialista_leis e categorias da dialética. resenha

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CHEPTULIN, Alexander. A dialtica materialista: leis e categorias da dialtica. So Paulo: Alfa-mega, 1982. Rodrigo Giraldi Cocco RESUMO O livro se dedica anlise das principais categorias e leis da dialtica materialista. Esta estuda as formas gerias do ser, os aspectos e laos gerais da realidade e as leis do reflexo da realidade na conscincia dos homens. Estes estudos so indispensveis ao homem para sua orientao na resoluo de tarefas diversas, alm disso, compondo um sistema de idias sobre o mundo, ajuda a compreender a essncia das formaes materiais (por exemplo, a poltica de um Estado, etc.). As categorias dialticas compem: 1)as formas do reflexo da realidade (suas conexes etc.); 2) leis de funcionamento e desenvolvimento do conhecimento, alargando possibilidades criativas a partir do submetimento do pensamento e; 3) formas de interpretao filosfica. Vejamos agora, a natureza das categorias de modo amplo. Definir esta natureza remete ao problema entre o particular e o geral tanto na realidade objetiva quanto na conscincia (a realidade objetiva reflete-se na conscincia segundo o materialismo dialtico!). Assim como se relaciona ao problema que nasce com a Filosofia: o da origem e existncia das essncias ideais e como elas se relacionam com as formaes materiais, em outras palavras, trata-se do problema de quem vem primeiro: a matria ou a conscincia? A histria da Filosofia centrou-se por muito tempo nesta questo gerando discusses entre as diversas escolas filosficas (materialistas vs. idealistas, etc.). J na Grcia antiga os pitagricos tentaram solucionar este problema notando certa semelhana entre as coisas e os nmeros, atribuindo ao nmero o atributo de essncia universal das coisas. Isto equivale a dizer que eles evidenciaram uma das propriedades universais das coisas: suas relaes quantitativas, numricas, alando esta categoria (a quantidade) como a essncia autnoma e ideal que existiria independente das coisas. (seu idealismo reside nisto, nesta independncia das coisas, uma origem a priori). Plato quem desenvolver a doutrina pitagrica, atestando que a idia eterna e que as coisas so transitrias, que tudo que existe advm da idia. Aristteles vai criticar este apriorismo das categorias, destacando que elas no passam de noes gerais e no existem antes das coisas singulares! As categorias so o resultado do conhecimento das coisas e refletem as propriedades das coisas. Para ele, necessrio antes, conhecer as coisas singulares para se chegar ao conhecimento do geral. Fixado este geral, conceitos mais gerais so apreendidos a partir de maiores relaes entre maior numero de formaes materiais, chegando, por fim, ao estabelecimento das categorias: os conceitos mais gerais de todos e que refletem as formas universais do ser. Assim, as categorias devem ser lastreadas pela matria e pela forma, as quais, juntas, compem a realidade objetiva. A teoria de Aristteles (embora esteja correta ao afirmar que as categorias refletem a realidade), contudo, equivoca-se ao afirmar que as formas tm origem ideal autnoma, ou seja, uma parte da realidade objetiva possuiria uma natureza ideal segundo o filsofo. 1

Na idade mdia, as categorias assumem um matiz teolgico, subordinadas teologia as novas escolas retomam alguns pensamentos clssicos para justific-la, como o caso dos realistas (retomando o platonismo) e os nominalistas (que repudiavam a existncia das categorias!). Por exemplo, Erigena (realista) dizia que as categorias eram criadas por Deus, o qual criara um mundo ideal a partir do qual as coisas se originam. A essncia das coisas. As categorias para ele so criadoras e no criadas a partir da realidade. Roscelin (nominalista) apregoa que as coisas particulares vm antes das categorias, mas afirma a inexistncia do geral (propriedades comuns s diversas formaes materiais). Toms de Aquino tenta conciliar a perspectiva de Roscelin de Erigena, dizendo haver duas razes, a humana e a divina. Assim, o geral tem uma existncia ideal, mora na razo divina, modelando as coisas singulares. A essncia (divina) se manifesta no geral e deste modo, categorias no so mais do que o reflexo das essncias ideais divinas. Posteriormente, os materialistas da modernidade (Bacon, Hobbes, Locke, etc.) negaram, a concepo realista das essncias ideais das categorias e para isso, retomaram Aristteles, reiterando que as categorias so o reflexo das propriedades gerais das coisas. Immanuel Kant, posteriormente, enceta um diverso ponto de vista (subjetivismo), dizendo que as categorias no so o reflexo da realidade objetiva, mas que representam a atividade do pensamento apenas. De fato, um indivduo (um homem) isoladamente, assimila categorias a priori advindas de uma sociedade anterior para poder pensar segundo sua poca. Todavia, o sujeito do conhecimento a sociedade como um todo e para esta, a categoria no pode existir a priori, ela engendrada ao longo da histria e do desenvolvimento social e da cincia como reflexo da realidade. Hegel ir, posteriormente, criticar o idealismo subjetivo de Kant, o qual dizia que as categorias provinham da conscincia humana, do reflexo da realidade na conscincia humana. Para Hegel (idealismo objetivo), as categorias provm do desenvolvimento da idia absoluta, a qual existe anterior e independentemente do mundo material. A idia absoluta se encarna nas formaes materiais e (sem ter conscincia de si) vai se desenvolvendo. As categorias em Hegel exprimem cada momento do desenvolvimento da idia absoluta encarnada, em desenvolvimento dialtico. Hegel supera Kant na medida em que desnuda o desenvolvimento das coisas e das categorias a partir da dialtica, da resoluo de contradies. No entanto, apregoa a dialtica do autodesenvolvimento das categorias, ou seja, uma dialtica das categorias, com suas subseqentes transformaes, mas que submete a dialtica das coisas. Lembremos que para Hegel a origem das coisas est na idia. Marx e Engels por sua vez, iro superar a concepo hegeliana da natureza das categorias. Ora, tanto fcil, escreveram Marx e Engels, partindo de frutos reais, engendrarem a representao abstrata do fruto (a palavra fruto), como difcil, partindo da idia abstrata de fruto, engendrar frutos reais (...). Pode-se ver por isso, concluem Marx e Engels, que enquanto a religio crist conhece apenas uma encarnao de Deus, a filosofia especulativa tem tantas encarnaes quantas so as coisas; assim que ela possui, neste caso, em cada fruto, uma encarnao da substncia do fruto absoluto (CHEPTULIN, P.12-13).

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Para Moore (filsofo burgus), existem objetivamente essncias ideais particulares ou simplesmente aquilo que ele chama de universais, fora da conscincia humana. Ns apenas tomamos conscincia deles. Moore tenta justificar seu ponto de vista a partir do exemplo de trs objetos diferentes que possuiriam todos eles uma mesma propriedade: estar mesma distncia de um quarto objeto. Esta propriedade (estar mesma distncia) seria um universal, uma idia geral independente da conscincia humana. Mas o fato de estarem mesma distncia no prova que sejam uma essncia ideal, apenas prova que esta propriedade pertence s trs coisas. uma propriedade das coisas, o que no sinnimo de essncia ideal independente delas. Se o geral (como dizem os realistas) existe de forma autnoma s coisas, ele s pode existir idealmente e enganosamente, porque entre as coisas materiais ningum viu nada que fosse geral existindo de modo independente das coisas. Para o nominalista Chase, s as coisas singulares existem na realidade objetiva, enquanto que conceitos gerais e categorias so palavras vazias uma vez que no h, no mundo objetivo, coisas s quais possam corresponder. De fato, Chase verossmil nesta assertiva, todavia, os conceitos so deveras teis ao homem e surgem associados a um ponto de referncia concreto com finalidades cientficas. Seria anti-cientfico dizer que o geral no existe, pois precisamente o movimento que o conhecimento faz at o geral e a sua essncia que descortina uma srie de fenmenos e formaes materiais, dissecandoas. Em resumo: Realistas: categorias existem independentemente da conscincia humana como essncias idias; Nominalistas: categorias so palavras vazias. Kantistas: categorias provm da atividade do pensamento (idealismo subjetivo) a priori; Pr-marxistas (Aristteles, Locke, materialistas franceses, etc.): categorias so imagens idias que se formam no decorrer do desenvolvimento da conscincia da realidade e refletem os aspectos das coisas; Hegel: categorias so o momento ou graus do desenvolvimento da idia (idealismo objetivo); Quanto ao problema da correlao das categorias da dialtica, dizemos que se refere existncia de interao e interdependncia entre as formaes materiais. Consecutivamente, tambm os conceitos no podem estar isolados, devem tambm passar um pelo outro se transformando em seu contrrio. Pois como disse Lnin (Ouevres, p23), os conceitos humanos no so inamovveis, mas, pelo contrrio, eles movem-se perpetuamente, mudam-se uns nos outros, escoam-se um no outro, porque, sem isso, eles no refletem a vida existente. Vejamos como isto se d nas diversas escolas filosficas. Em Aristteles, a organizao das categorias se d sob a lgica formal, com a diviso das mesmas em grupos a partir de seus traos comuns. Kant tambm as agrupa, submetendo-as a cada estgio do conhecimento (Ex: ao estgio da percepo sensvel estaria a categoria espao). Hegel far a correlao das categorias a partir do idealismo objetivo, ou seja, apresentando as categorias em seu desenvolvimento e a passagem dialtica de umas s outras durante o desenvolvimento da idia (idia esta independente da matria e do homem). O sistema hegeliano parte da categoria do ser puro (vacuidade pura, contedo impreciso) o qual muda de estado. Este ser puro age com o nada e torna-

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se um vir-a-ser, um vazio e depois ganha contedo. Torna-se um ser-aqui. o vir-aser que transformaria o nada em um ser concreto. visvel a incrvel artificialidade da correlao das categorias em Hegel, mas mesmo assim h certa racionalidade nelas, j que a passagem de uma categoria a outra se d pelo movimento e unidade dos contrrios o ser puro e o nada. O ser-aqui j manifesta qualidade (categoria alguma coisa). A categoria alguma coisa possui uma natureza contraditria, pois a unidade dos contrrios, isto , entre o ser real (ser aqui) e seu potencial de se transformar em outras coisas (ser para outro). Este alguma coisa vai se modificando progressivamente (o alguma coisa original no se perde!) at o infinito. Com este esquema Hegel vai mostrar o desenvolvimento da qualidade e posteriormente sua passagem quantidade, ainda que em esquemas superficiais. As relaes fazem com que uma coisa se distinga de outras, tendo uma qualidade, a esta coisa, a partir de sua qualidade especfica transforma-se em um, a soma de vrios uns semelhantes o geral. Fazendo a abstrao daquilo que a coisa est ligada, ela torna-se um e enquanto um, ela no se distingue das demais, de nada e inclui em si tudo! (como a gua de Thales ou o fogo de Herclito). Este um no permanece em repouso, ele se diferencia a partir de si mesmo (repulsa a si mesmo): surge o mltiplo (unidade da repulsa e da atrao). De fato, se tomarmos o exemplo do processo de conhecimento dos fenmenos e formaes, o sujeito afasta um do outro objeto, aproximando-se mais de um que de outro, ao mesmo tempo em que evidencia os aspectos mais gerais que os unificam. Aps a observao dos objetos faz-se a determinao qualitativa deles (parecendo que eles se afastam uns dos outros), quantificando objetos de qualidades semelhantes e posteriormente passando-se ao aspecto qualidade. Hegel atenta ainda para as essncias contraditrias dentro da quantidade e da qualidade: por exemplo, a repulsa e a atrao so prprias qualidade e diferenciam os objetos em quantidade. Esta quantidade, em Hegel, tambm tem um desenvolvimento prprio, ela se transforma de uma quantidade abstrata em uma quantidade material dada. O desenvolvimento da qualidade em quantidade conduz por sua vez categoria de essncia (essncia , em Hegel, o que permanece entre as passagens de uma a outra categoria). At aqui o desenvolvimento encontrava-se no plano do ser puro onde a qualidade e a quantidade eram momentos deste ser... O qual agora se torna um momento da essncia. O ser vive sob uma forma anulada dentro da essncia, mas ele uma das contradies encerradas na essncia, pois na realidade objetiva no h, no pode haver identidade abstrata e pura, deve haver contradio... Esta se manifesta primeiramente a partir da diferena exterior, mais superficial e no essencial, depois se torna essencial, depois vira seu contrrio e nisto Hegel est de acordo com Marx. Na histria do conhecimento as categorias identidade, diferena e essncia, aparecem muito antes: logo quando se evidencia alguma formao material, evidencia-se identidade e diferena. Os primeiros conceitos gerais provm da tomada de conscincia destas. Assim sendo, por mais que o pensamento de Hegel seja fundado no idealismo, ele em parte verossmil, quando diz que tudo o que existe encerra em si mesmo uma contradio e de que a contradio a origem do movimento, o impulso da vida, transformando uma formao material em outra. Esta contradio, no entanto, no eterna, pois uma vez resolvida torna-se o fundamento (os contrrios so destrudos enquanto existentes de forma autnoma e conservados como caractersticas do fundamento).

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Ainda para Hegel, a forma est ligada essncia e esta idntica forma, embora se expresse como informe. A forma ativa enquanto a matria passiva e quando se transforma em forma constitui o contedo, o qual possui certa forma e certa matria e idntico a ela. O fundamento adquire um contedo e uma forma (torna-se um fundamento determinado). Um aspecto de uma formao material torna-se fundamento quando ele passa a influir sobre outros aspectos da matria, a considerar uma nova qualidade, etc. Outro aspecto destacvel: o fundamento no pode originar este ou aquele ser sem que haja condies rigorosamente determinadas, Surge a categoria condio. A idia de Hegel a de que a condio, ainda que necessria para a realizao do fundamento, no a fora motora que obriga o fundamento a originar o fundamentado, que esta fora motora est contida no prprio fundamento e que este se desenvolve sob presso de contradies internas que lhe so prprias. Mas dizer que primeiro surge a coisa pensada e depois ela passa a existir no concreto, isso o idealismo de Hegel. A realidade em Hegel a unidade entre essncia e existncia, sendo que primeiro a realidade se manifesta como possibilidade (abstrata, no traz em si a razo de seu existir), enquanto a unidade entre possibilidade e realidade gera a necessidade que por sua vez se manifesta em relaes de substancialidade e acidentalidade. O proceder o seguinte: chega-se finalmente ao conceito, a verdade do ser e da essncia para Hegel, este atinge a objetividade e finalmente a idia, unidade do objetivo e do subjetivo, conceito e realidade. Manifesta-se a idia absoluta, finda o desenvolvimento. Finalmente, a idia absoluta, a partir da forma ideal, transforma-se no seu contrrio e manifesta-se como natureza, rejeita-a e retorna ao elemento espiritual. O passo adiante dado por Hegel no seria evoludo por outros filsofos posteriores como Windelband, Gunther, Hartmann, Wundt ou Cohen entre outros, pois estes ignoram a dialtica. O passo adiante s vira com o materialismo marxista. O marxismo determina que no estudo de todo o objeto se comece pelo aspecto ou relao dominante, isto fato. Mas e quando h mais de uma relao que possa ser destacada? Vejamos como proceder. Em toda filosofia h a questo fundamental da relao entre o pensamento e o ser, est a essncia da filosofia e por isso, a anlise deve comear pelas categorias matria, conscincia e prtica, como categorias de partida. Lnin j destacava como mais importantes as categorias que davam conta das relaes principais entre a unidade dos contrrios. Deve-se ter em conta que as categorias so tambm produtos da conscincia, enquanto atividade cognitiva dependente de fatores determinantes como a prtica social a partir da qual a inteligncia se desenvolve como determinao da transformao da natureza pela sociedade. Assim sendo, os possveis pontos de partida so: 1. Questo fundamental da filosofia: relao entre matria e conscincia; 2. Lei da unidade e luta dos contrrios; 3. A prtica social. As categorias refletindo as ligaes e os aspectos universais do mundo exterior so tambm graus de desenvolvimento do conhecimento. Momentos que fixam a passagem do conhecimento de um estgio inferior a um superior. O prprio Lnin j apregoava que o aparecimento de uma nova categoria depende do desenvolvimento do conhecimento, penetrando este mais profundamente nos fenmenos e descortinando novos e recnditos aspectos, fazendo necessrio o surgimento de novas categorias, as quais devem ser dispostas na ordem em que aparecem no processo do conhecimento. 5

Destaca-se, que a ordem na qual as categorias se formaram no se seguiu historicamente, muitas surgem ao mesmo tempo, no ato do conhecimento. Deste modo, como possvel classific-las para que exprimam o movimento do saber do inferior ao superior? Vejamos. A premissa bsica que as categorias, cada uma delas, devem corresponder aos graus do conhecimento, ordem em que aparece no desenvolver da prtica e do conhecimento. Deste modo, reproduzem-se em certa ordem as leis universais na conscincia, do inferior ao superior: leis de desenvolvimento de todo o concreto que h no mundo. Assim, as categorias de partida (para a anlise das categorias) devem ser as categorias correspondentes prtica e depois, devem ser analisadas sob a luz da relao entre matria e conscincia. Matria e Conscincia O conceito de matria diverso e perpassa as vrias escolas filosficas. Para Berkeley e outros (idealismo subjetivo), ela inexistente e o mundo reduz-se a um conjunto de sensaes. Para idealistas objetivos como Hegel, a matria existe fora da conscincia e das sensaes, mas est submetida idia absoluta que a engendra, assim como para Leibniz, a matria o recipiente das mnadas (tomos espirituais independentes da conscincia). Kant admite a sua existncia real e objetiva, mas nega a possibilidade de se conhec-la. Entre os materialistas so diversas as concepes de matria, mas todos eles concordam com a existncia objetiva da matria independente da conscincia e do esprito. Filsofos chineses, inds e babilnicos da antiguidade, assim como gregos, j pensavam sobre a matria como sendo o corpo concreto, o princpio primeiro de tudo, todavia, ficava a questo de como toda a diversidade do mundo surgiria de uma nica substncia e a que outros filsofos ampliaram as substncias primordiais (Empdocles quatro substncias, Demcrito o tomo, etc.). O tomo de Demcrito foi o paradigma da matria at incio do sculo XX, mas com a descoberta do eltron, da radiao etc. a cincia e suas concepes engessadas entram em crise, uma vez que anteriormente havia uma identificao consolidada entre a matria e sua substncia (o tomo primitivo). Com o eltron, essas afirmaes so questionadas na medida em que se pensou a inexistncia de massa no eltron, assim como se pensou seu atributo principal como sendo o movimento (logo, a matria seria movimento). Os idealistas vo utilizar estes fatos para justificar suas teses contra o materialismo, mas Lnin o defender com acurcia em seu Materialismo e empiriocriticismo, dizendo que em verdade, a matria no pode ser to somente identificada com a substncia, mas com a realidade objetiva independente da conscincia de modo mais amplo. Outras idias igualmente enganosas, consideram como matria, apenas certas propriedades deste mundo como o espao, o tempo e o movimento (Klotz, Gunther e Hopfner, etc.) e as propriedades da matria como sendo existentes objetivamente apenas se postas em relao com a conscincia. Pelo contrrio, a existncia objetiva, independente da conscincia humana suficiente para definir a matria, at porque a conscincia finita e a matria eterna! Um aspecto importante desta discusso que o que aplicado ao todo no pode, igualmente, ser aplicado aos seus aspectos e relaes, ou seja, aos aspectos e relaes relativos matria, aplicamos o adjetivo de material. 6

Aspectos da matria. Matria e formao material Uma formao material uma parte da matria e todas juntas constituem a matria, so os elos de uma mesma matria. Diferentes formaes materiais entram no contedo do conceito de matria, existem fora da conscincia, tem caractersticas espaciais, temporais, movem-se, tem aspectos, ligaes necessrias, contingentes, singulares, gerais, possveis e reais. Incluem causalidade, contradies. Tm um contedo prprio, uma forma, uma essncia, etc. (p.74). A formao material no eterna, e sempre se transforma em outra, da a impossibilidade de se aplicar o conceito de matria diretamente s coisas particulares (ainda que este ponto de vista equivocado seja amplamente difundido). EM SUMA, O CONCEITO DE TODO NO PODE SER IDNTICO AO CONCEITO DE PARTE DESSE TODO. Ademais, no se pode reduzir a matria a dois aspectos (substncia e campo, prprios das caractersticas dos tomos), esta uma definio muito rudimentar... Da substancialidade da matria Opor matria e conscincia relativo (Lnin), j que a conscincia uma propriedade de uma formao material: o crebro. A suposta substncia da matria possui algo de imutvel e absoluto, mas o materialismo dialtico no reconhece nada assim, pois a substncia deve modificar-se continuamente, de certos estados qualitativos a outros. Em muitos casos, uma propriedade no se manifestar em uma formao material, mas o far em outra. Assim, no materialismo dialtico, a nica substancialidade possvel a impossibilidade de a matria perder suas propriedades, prova disso que a matria no pode existir fora de suas propriedades e relaes. O reflexo Para o materialismo dialtico a conscincia no uma propriedade universal da matria, ela s existe em formas altamente organizadas em certo estgio do desenvolvimento, a forma superior de reflexo. A conscincia uma das formas de reflexo prpria a toda matria (a sensao e outros fenmenos psquicos tm sua base no mundo material, elas refletem uma forma superior da natureza). Outro fato importante que a formao material no passiva, mas ativa. Ela prpria age sobre as formaes materiais a ela ligadas modificando-as. Desta forma, o reflexo est ligado no apenas ao de uma formao material sobre outra, mas tambm sua interao, em decorrncia da qual cada formao material particular , ao mesmo tempo, refletora e refletida. Ela reproduz sob uma forma especfica as particularidades correspondentes destes objetos e desses fenmenos. (p. 79). Todas as transformaes surgidas em uma formao material, sob a ao de outras formaes materiais, so resultado de uma ao bilateral, isto , de uma interao. As particularidades dos corpos refletidos (os que agem) e dos refletores so (ambas) representadas nestas transformaes. por isso que no todo o contedo das transformaes (surgidas na formao material em decorrncia da ao de outras formaes materiais sobre ela) que representam o reflexo destas ltimas, mas somente o que isomorfo (semelhante) a esse ou quele aspecto dos objetos que agem. 7

No todo o contedo das transformaes que representam o reflexo da ao de certas formaes materiais, mas s o que semelhante a este ou quele aspecto das formaes que agem. Por isso, trata-se de uma interao (relao bilateral), uma vez que na realidade objetiva no h aes puras, orientadas unilateralmente, cada ao est ligada a uma reao. assim que as formaes materiais vo combinando semelhanas e diferenas. Lnin foi mal interpretado ao dizer que o refletido existe independetemente do reflexo. Na verdade, na interao, ambas as formaes materiais so refletoras e refletidas (por reflexo, entender a parte que, no refletor, representa o refletido), assim, o reflexo no idntico interao, um resultado da interao, enquanto que esta produz influncias recprocas entre formaes materiais que efetuam algumas mudanas em cada uma delas. O reflexo ento, apenas a propriedade de cada formao material de reproduzir certas particularidades de outras formaes materiais que agem sobre elas. O reflexo tambm uma representao mpar das particularidades dos fatores agentes (p. 82). J a modificao do objeto devido a interaes (exteriores e interiores) no representa o reflexo, mas o movimento. Vale ressaltar que as propriedades do objeto refletor no so idnticas ao reflexo que ele efetiva de outros objetos, mas igual sua prpria essncia. O reflexo representa as mudanas que reproduzem particularidades dos objetos agentes. Modificaes das formas de reflexo so observadas na passagem da matria de um grau qualitativo de desenvolvimento a outro. Nos organismos vivos, por exemplo, dentre outras formaes materiais, alguns tecidos e rgos se especializaram em refletir (percepo, fixao da ao exterior, etc.): trata-se do sistema nervoso, mediador entre o organismo e o mundo exterior. O reflexo do mundo exterior vital para os organismos e mediado pelo sistema nervoso, o qual se complica no decorrer da evoluo. A forma do reflexo varia conforme o desenvolvimento do sistema nervoso. Em organismos superiores, por exemplo, a correlao com o meio torna-se mais evoluda do que a simples reao aos excitantes exteriores, ocorrem reflexos condicionados que vo se elaborando no processo da vida do indivduo, em sua experincia pessoal. Todavia, lembremos que todo o psquico est ligado ao fisiolgico, s existe sob esta base, em outras palavras, como propriedade da matria altamente organizada, a conscincia , ao mesmo tempo, o produto do trabalho humano, o resultado do desenvolvimento social. Para que a conscincia surja, devem existir necessidades materiais e foi precisamente isto que se sucedeu: a necessidade de trabalho conjunto, de comunicao entre os homens a propiciou. Assim sendo, podemos deduzir que algumas formaes materiais, em decorrncia de interaes, produzem outras mais complexas, o que contraria Deus, ou a alma. Ademais, as imagens que constituem a conscincia no carregam consigo as propriedades da realidade (peso, espacialidade...), elas apenas refletem a realidade sob as bases da conscincia e do crebro humano. H deste modo, duas realidades: a realidade objetiva que existe fora e independente da conscincia e a realidade subjetiva, engendrada pela primeira, da qual reflexo. A primeira realidade material e a segunda, ideal. Assim, nem tudo o que existe matria. Vale destacar que a conscincia no a nica fonte de reflexo: a matria, igualmente, possui uma propriedade que corresponderia sensao, a propriedade mesma do reflexo, mas que diferente, uma vez que na conscincia o reflexo consciente. As categorias como graus do desenvolvimento do conhecimento social e da prtica

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O conhecimento funciona a partir da prtica e desenvolve-se da intuio viva ao pensamento abstrato e deste prtica. Os aspectos e ligaes universais conhecidas nas categorias so tambm graus da passagem do conhecimento inferior ao superior. Mas em que ordem surgem as categorias no mbito do desenvolvimento do conhecimento? No momento em que o homem toma conscincia do particular (objeto, processo, etc.) como sendo singular, passa a julg-lo a partir de sua qualidade. Neste estgio de desenvolvimento do conhecimento as caractersticas quantitativas eram indiferenciadas. S que depois, quando o homem passa de um objeto a vrios, ele vai tomando conscincia da quantidade. Posteriormente passa a consider-las como interdependentes e transmutveis uma outra e depois, v que a transformao de um aspecto condicionada por outro (causa-efeito e necessidade). Feito este processo, vo se reunindo todas as relaes em um todo nico e a reproduo desse todo na conscincia representa o conhecimento da essncia do objeto. Mas para definir a essncia deve-se definir o aspecto determinante das relaes (o fundamento) e seu desenvolvimento. Devem-se evidenciar as tendncias contraditrias que condicionam a passagem do estado qualitativo a outro (forma-se as categorias: contradio, unidade e luta dos contrrios), evidenciando-se a contradio prpria ao fundamento. Ordem de aparecimento das categorias no desenvolvimento cientfico A lei do movimento de uma categoria a outra deve aparecer em qualquer domnio do saber, vejamos alguns exemplos. O mbar era uma pedra ornamental e com sua frico, descobriu-se (na Antiguidade) a ligao existente entre a faculdade do mbar de atrair corpos e a frico. Em seguida isso foi se generalizando para outros corpos e em seguida, estabelece-se que a faculdade de uma substncia de atrair por frico outros corpos pertencia a todos os corpos maus condutores. No comeo do sc. XVIII Gray descobriu essa propriedade em corpos bons condutores. Para elucidar mais apuradamente seus aspectos qualitativos, compararam-se os fenmenos eltricos com os fenmenos eletromagnticos e deste modo, aps consecutivas descobertas foram-se definindo as propriedades qualitativas da eletricidade (Gray, Gilbert, Guerick) at que a ateno dos pesquisadores se volta aos aspectos quantitativos (Coulomb, Ohn, Joule, Ampre etc.). Depois se tentaram correlacionar os aspectos qualitativos com os quantitativos, estabelecendo laos de causa e efeito e observando o que os condicionam. Os mais importantes desses laos necessrios (imperiosos) tornaram-se leis Ex: o fato de a resistncia do condutor depender da sua substncia e comprimento (Ohm) foi tido por lei e posteriormente a isso, tencionou estabelecer uma interdependncia ainda mais abrangente entre leis: uma teoria, reproduzindo na conscincia a essncia da eletricidade que culmina com o eltron! J na Antiguidade, Thales, Anaxmenes e Anaximandro davam importncia s categorias ligao e movimento, as quais tornaram necessrio o estudo dos conceitos de espao e tempo (para a existncia e movimento das coisas preciso um lugar). Aristteles foi o primeiro a us-lo como categoria: o espao como o lugar ocupado pelas coisas, se relacionando ao limite entre um objeto e outro, enquanto o tempo era caracterstica do movimento. ... medimos no somente o movimento pelo tempo, mas tambm o tempo pelo movimento, porque eles determinam-se reciprocamente; j que o tempo determina o movimento, do qual ele o nmero, e o movimento, o tempo (p. 134). Neste perodo a escola de Mileto elabora concepes a partir do particular, do singular (gua, ar, etc.) que tornavam a forma do fenmeno concreta, ao contrrio de Plato. 9

Aristteles evidenciara a dialtica do singular e do geral. Para Empdocles, a qualidade de algo determinada pela proporo (quantidade) em que se agrupam os quatro elementos (gua, ar, terra, f ou), tendo j um vislumbre da relao entre qualidade e quantidade. Isso foi aperfeioado por Aristteles, encerrando uma etapa do movimento do conhecimento (correlao quantidade/qualidade). Posteriormente, Bacon iria desenvolver as categorias causalidade, efeito, forma e necessidade, ao apregoar que a causa das coisas est nos elementos, na prpria matria. A forma inseparvel da coisa (diferentemente de Aristteles, que separava a matria da forma pura, Deus). Spinoza salientaria o carter geral da ligao da causa e do efeito como sendo ligao necessria e disse que a substncia (imutvel) o fundamento. Essa premissa limitou seu entendimento com relao diversidade do mundo, enquanto Hegel mostrou como a substncia (o fundamento) desenvolve seu contedo e engendra a diversidade das formas do ser. Na qualidade de substncia de fundamento e de causa primeira de tudo Hegel prope a idia absoluta que, graas a sua natureza contraditria, cria e fundamenta sua essncia. Mas s Marx o faz com uma base materialista. Categorias como graus do desenvolvimento da prtica social O conhecimento das formas universais do ser d-se no decorrer da atividade prtica, no processo da transformao orientada em direo a uma meta e realidade. Na formao de uma categoria exprime-se no apenas o estgio do desenvolvimento do conhecimento, mas tambm o estgio do desenvolvimento histrico da sociedade. Observando o mundo exterior, a natureza em interao e as transformaes acarretadas por esta, o homem torna-se convicto de que suas ferramentas podem tambm interagir e transformar as coisas. As primeiras formas de obter fogo advieram da interao entre dois objetos. A influncia da prtica social sobre a formao de categorias vista j em Herclito quando ele compara o fogo ao ouro, dizendo que tal como o ouro (prtica social) tudo pode ser trocado pelo fogo na natureza. As categorias ento, no so apenas graus do desenvolvimento da conscincia, mas tambm da pratica social, das relaes entre eles e com a natureza. O desenvolvimento das formas do pensamento no processo do movimento do conhecimento de uma categoria a outra As formas de pensamento em desenvolvimento s sero estudadas a partir de Hegel. O conceito o resultado do desenvolvimento e correlao das formas de pensamento e provm do raciocnio e do juzo. Para Hegel, o juzo o isolamento e a confrontao de momentos do conceito. Segundo Hegel, o juzo deve representar a verdade, j que ele exprime a correspondncia do conceito e da realidade, a qual s atingida no pice do desenvolvimento do juzo, que inicialmente engloba apenas o imediato, o superficial dos objetos. O esquema de Hegel sobre os juzos baseia-se na correlao do singular e do geral. Aqui, o juzo entra na esfera do conceito e continua a desenvolver-se. No processo desse desenvolvimento, o singular, por outro lado, eleva-se at o universal por meio do particular e o universal a partir do particular desce at o singular. Para Hegel, em suas formas inferiores, o raciocnio engloba apenas correlaes superficiais do singular, do particular e do universal; em suas formas superiores ele engloba as correlaes internas ESSENCIAIS E NECESSRIAS. Nesse movimento, passa-se dos momentos abstratos do singular, do 10

particular e do universal para os momentos concretos, essenciais. Do superficial vai-se ao essencial, necessrio. O erro de Hegel neste ponto reside no seguinte fato: para ele o raciocnio vai do geral ao particular e deste ao singular. Mas este geral deve, antes, ser concebido, elaborado, indo-se do singular ao particular e deste ao universal! Destaca-se que todos estes tipos de juzo s fixam o mais superficial, mas o conhecimento no para por a, ao se esforar para penetrar no interior das coisas construmos hipteses, supondo causas (juzo de possibilidade) que originam as propriedades: uma vez comprovada a causa relacionada ao efeito, a relao torna-se de necessidade (x necessariamente "H"). Assim, passamos do conhecimento superficial causa. Conclui-se, que os diferentes tipos de raciocnio tambm no so fixos, eles esto em movimento, em desenvolvimento. Assim, da intuio (aonde se formam conceitos concretos sensveis, superficiais) passa-se a raciocnios de suposio, com vistas a se chegar essncia das coisas. O particular, o movimento, a relao Repouso relativo um dos momentos do movimento da matria. O movimento condiciona a modificao permanente da matria, j o repouso, constitui na verdade, o movimento em estado de equilbrio, a manuteno, ainda que momentnea da matria transformada em um determinado estado. Assim, a corrente contnua do movimento parece descontnua, como um conjunto de diferentes sistemas de movimento. A formao material (uma coisa particular ou um estado particular) provm desses sistemas de movimento. Sendo eterno como a matria, o movimento absoluto, assim como o repouso relativo, condicionam a existncia eterna da matria mediante as formaes materiais particulares encerradas no espao e no tempo. O particular , portanto, uma forma universal da existncia da matria. O conceito de movimento Entre os primeiros filsofos gregos, o movimento desempenhou o papel de princpio inicial, a partir do qual se explicavam todos os fenmenos observados na realidade. A partir da, depreenderam que todas as formas do ser, observadas no mundo, apareceram em decorrncia de transformaes do princpio primeiro. Na antiguidade grega, diversos filsofos j concebiam o movimento como categoria universal da matria. Para Anaximandro, do apeiron desdobraram-se tudo o mais, j para Anaxmenes, o fizeram a partir do ar em seu movimento de transformao. Caberia a Herclito conceber a universalidade do movimento, quando afirmara residir na morte do fogo o nascimento do ar, na morte do ar o nascimento da gua, etc. Os pensadores de Mileto tambm concebiam assim o movimento. Destaca-se, que nos termos do desenvolvimento do conhecimento, o homem descobre o movimento j em seus estgios iniciais. Isto factvel, na medida em que manifesta j entre os primeiros filsofos. Engels j destacava que quando submetemos ao exame do pensamento natureza ou histria humana, ou ainda nossa prpria atividade mental, o que temos como primeiro resultado o quadro de um entrelaamento infinito de relaes e de aes recprocas (interaes), no qual nada permanece como era, no lugar onde estava anteriormente e como 11

estava, mas em que tudo muda, modifica-se, vem a ser e perece... Essa maneira primitiva e ingnua, porm fundamentalmente correta, de encarar o mundo, foi a maneira adotada pelos filsofos gregos da Antiguidade, e o primeiro a formul-la de modo claro foi Herclito... (Engels, Anti-Duhring). Para os primeiros filsofos gregos, o movimento (processo de destruio de um e surgimento sob mesma base de outro), o conceito de movimento era guindado ao primeiro plano. S mais tarde, os eleatas, ao contrrio dos jnios, interessar-se-iam pela estabilidade, negando em absoluto o movimento. Para eles, tudo o que existe provinha de um todo imutvel e homogneo. Empdocles retoma o conceito de movimento, mas conserva a estabilidade. Para ele, terra, gua, fogo e ar so imutveis e o movimento no seria o surgimento de uma coisa e o desaparecimento de outra, mas o simples rearranjo dos elementos que compem as coisas, elemento que associam-se e desassociam-se. Esse conceito aparece tambm em Demcrito, com seus tomos. Destaca-se, que o movimento nestes casos o simples deslocamento, a unio e a desagregao. Aristteles, posteriormente, desenvolveu a teoria do movimento e da correlao, retomando as idias dos jnios e de Herclito (movimento como o aparecimento de algo e a destruio de outro). Em verdade, Aristteles se esfora para aprimorar estas concepes, tomando o movimento no apenas como destruio e aparecimento, mas tambm como crescimento, diminuio e deslocamento dos corpos no espao. Em Aristteles havia 6 formas de movimento: gerao, corrupo, crescimento, diminuio, alterao e modificao local, formando a categoria do movimento como unificadora a seus conceitos. Posteriormente emerge como dominante no materialismo, a forma mecanicista do movimento da matria (sc. XVII e XVIII), com o movimento representando o mero deslocamento de corpos no espao (Descartes, Holbach), no incluindo as transformaes da matria. Transformaes no ncleo atmico, no organismo vivo, na sociedade, etc., no so simples deslocamentos (embora nestes processos tambm haja deslocamento de matria). No materialismo dialtico, o movimento aplicado matria a modificao geral. Ele inclui todas as mudanas e processos que se produzem no universo, da simples mudana de lugar at o pensamento. O movimento um atributo da matria e est indissoluvelmente ligado a ela. A prpria lei de correspondncia da massa e da energia testemunha do lao matria-movimento. Contrariando essas concepes, certos filsofos e fsicos burgueses reduzem a matria ao movimento (ao qual a energia determinante). A matria constituindo assim, uma das formas da energia como j foi discutido. Contudo, a transformao de eltrons e de psitrons em ftons luz no a transformao da matria em energia (movimento puro), mas a transformao de uma forma de matria em outra. O movimento e o repouso Para o materialismo dialtico, o repouso no a ausncia de movimento. Muitos autores, inclusive, baseiam sua idia de repouso no prprio Engels, distorcendo sua viso. Dizem estes que Engels (Anti-Duhring) refora a existncia do repouso absoluto, ao trazer exemplos de corpos celestes em repouso em relao a outros corpos. Todavia, omitem passagens esclarecedoras, nas quais o autor adverte se tratar de exemplos do repouso inerente ESPECIFICAMENTE ao movimento mecnico.

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Em verdade, o repouso o movimento em equilbrio, em estabilidade, e no a ausncia de movimento. O sistema solar, por exemplo, um sistema em repouso, no porque est parado, mas porque mantm certa estabilidade. Mas o sistema de movimento estvel no esgota todo o movimento da coisa. Paralelamente ao movimento em equilbrio de uma formao material, h transformaes contnuas, seja no quadro desse sistema, como nas relaes com outros sistemas de movimento estveis. Em interao, dois ou mais tomos (enquanto sistemas estveis que so), perdem ou ganham eltrons, formando um sistema de movimento estvel novo e mais complexo. Estas transformaes, ao atingirem certo nvel, arrunam o sistema estvel, perturbando-o, fazendo surgir novos, embora no incio, as transformaes (provenientes da interao) no afetem sua estabilidade. O movimento e o desenvolvimento Diante desses processos, a questo que se coloca : qual a tendncia de todas essas transformaes, qual o sentido do movimento e o que aparece no lugar das formaes materiais destrudas que desapareceram? Para a teoria do movimento circular, todas as transformaes observadas no mundo transpem os mesmos estgios, voltando posio de partida (descrevem um crculo). A idia de movimento circular foi expressa pelos pitagricos que consideravam que todos os 760.000 anos, tudo no mundo, volta ao seu estado inicial, repetindo os j transpostos. Em outra teoria, as transformaes no se do de forma circular, mas tendem destruio, morte, a ir ao encontro do menos perfeito. O materialismo dialtico reconhece tanto o movimento em crculo como o movimento regressivo, mas entende o movimento progressivo como sendo o dominante, conduzindo passagem do inferior ao superior, do simples ao complexo, ou seja, ao desenvolvimento. Exemplo disso a prpria histria humana, relatando a passagem de uma sociedade mais primitiva ao regime escravagista, deste ao feudal e do capitalista ao socialista, passando a formas mais perfeitas de vida social. Ademais, pode ocorrer que, para que haja desenvolvimento (movimento do inferior ao superior) sejam necessrios movimentos circulares e regressivos no quadro do sistema de desenvolvimento. Mas no se trata de momentos sumamente necessrios para o desenvolvimento. Engels define a dialtica como a cincia das leis gerais do movimento e do desenvolvimento da matria, da sociedade e do pensamento, diferenciando o conceito de movimento do de desenvolvimento. De fato, o desenvolvimento remete ao movimento do inferior para o superior, mas h o movimento circular e o regressivo. preciso dizer que nem todos os movimentos circulares e mudanas regressivas compem o processo geral de desenvolvimento, pois podem ser elos de um processo geral de degradao. Assim, um movimento circular ou mudana regressiva, pode ser uma parte (elos no processo mais amplo de desenvolvimento), mas como todo, o movimento circular e regressivo no so desenvolvimento. O movimento circular, sendo uma parte de um todo mais geral, manifesta-se ele prprio como sendo possuidor de suas prprias partes. Deste modo, enquanto os metafsicos reduzem toda mudana, inclusive o desenvolvimento, a uma nica forma de movimento: o simples deslocamento dos corpos no espao, autores como Kalsine, Fourman e Molodsov, dizem ser, toda mudana, inclusive o simples deslocamento dos corpos, um desenvolvimento.

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A idia equivocada, pois dialtico no o que v o desenvolvimento onde ele no existe, mas sim o que representa a realidade em toda sua diversidade, sem confundir progresso e regresso, aquele que v na massa das mudanas o que intervm no desenvolvimento o movimento progressivo, apesar dos aparentes retornos para traz termina por aparecer (p.171). A especificidade do desenvolvimento constituda no pela integridade, o carter lgico ou a espontaneidade das mudanas das formaes materiais, mas pelo carter progressivo das mudanas, pela passagem do inferior ao superior, do menos perfeito ao mais perfeito. Esse o carter que os clssicos do marxismo tomaram como desenvolvimento. Mas, afirmando que toda mudana no desenvolvimento e que, ao lado do desenvolvimento observamos movimentos circulares e mudanas regressivas, no estaremos pondo em dvida a universalidade do desenvolvimento? No. O desenvolvimento uma propriedade universal da matria, trata-se, contudo, de uma capacidade que s aparece em condies adequadas. (p.174). Onde essas condies renem-se h NECESSARIAMENTE, mudana do inferior ao superior. Vale ressaltar ainda, que formaes materiais que participam do movimento circular ou sofrem mudanas regressivas no perdem a capacidade de passar do inferior ao superior. A RELAO As diferentes formaes materiais, sendo sistemas de movimento estveis, no coexistem de modo justaposto, mas agem umas sobre as outras, provocando mudanas mtuas e encontrando-se, assim, em correlao e interdependncia determinadas. Nesse sentido, o conceito de relao mais abrangente que o de ligao. A relao no engloba apenas a simples ligao entre fenmenos, mas tambm seu isolamento, sua separao e relativa autonomia que pode assumir. A ligao uma relao entre dois fenmenos quando a modificao de um supe certa transformao do outro. Exemplo: o movimento do corpo est organicamente ligado sua massa, pois que a modificao do primeiro acarreta necessariamente modificao na segunda. O isolamento (separao) uma relao entre os fenmenos da realidade feita de tal forma que as mudanas de um deles no afetam os outros fenmenos, no acarretam mudanas nesses ltimos. Fenmenos como a natureza biolgica do homem e a luta de classes, as jazidas de carvo e de ferro, etc., no esto ligados entre si, portanto, a modificao de um no modifica o outro. Contudo, necessrio dizer que nem tudo est totalmente correlacionado, mas tambm no est totalmente isolado. O fato que em certos casos, a correlao est em primeiro plano, enquanto em outros o isolamento que est. No mundo, todos os fenmenos esto ao mesmo tempo, ligados e isolados, ou seja, esto ligados sob certas relaes e isolados sob outras. O ncleo atmico, por exemplo, est organicamente ligado camada eletrnica, embora esteja, ao mesmo tempo, separado dela (isolado). Nesse ncleo produzem-se modificaes que acarretam modificaes na camada eletrnica e outras que no afetam a camada. A formao material est indissoluvelmente ligada ao meio, mas ao mesmo tempo separada (um organismo, por exemplo). Eis a unidade da ligao e da separao. As idias de separao, isolamento e correlao dos fenmenos remontam ao nascimento da filosofia. Nas teorias dos primeiros filsofos gregos, a correlao era compreendida como a passagem dos fenmenos uns nos outros. Mas logo depois, 14

Empdocles e Anaxgoras vislumbraram a correlao como sendo junes e disjunes mecnicas de elementos invariveis. Somente Aristteles, posteriormente, superaria esse ponto de vista limitado, dizendo que a correlao a interdependncia das coisas. Ele foi o primeiro filosofo a guindar ao patamar de categoria o conceito de relao, dando a ele um carter geral e necessrio. Kant voltaria a utilizar a categoria relao desenvolvendo-a, destacando que a ligao e a separao so dois aspectos que esto em qualquer relao. Ex: O lobo um animal, est, portanto, de certa forma ligado aos animais, posto que um animal, mas tambm um lobo. Est ligado ao geral animais, mas tambm separado de todos os outros animais, ao ligar-se ao particular lobo. Vale lembrar que em Kant, todas as categorias, sem exceo, advm do subjetivo. Do mesmo modo, Hegel afirmava que tudo estava em relao, mas sob suas premissas idealistas. Os metafsicos (sc. XV e XVI) postulavam por seu turno, a idia de isolamento absoluto e negavam a correlao. Nesse momento da histria, deixou-se de lado o estudo do mundo em seu conjunto para o estudo das partes, dos objetos particulares e suas propriedades. Distinguiam-se os objetos uns dos outros e dissecavam-nos em partes sem conceber seus laos (Bacon, Locke, etc.). Espao e tempo A matria, que possui um movimento absoluto e um repouso relativo, existe no s sob a forma de massa totalmente homognea, mas divide-se em um conjunto de formaes materiais particulares. Cada formao material particular, enquanto parte do mundo material, possui certa extenso e est em correlao, de uma maneira ou de outra, com outros objetos e formaes materiais particulares que a rodeiam. A extenso das formaes materiais particulares e a relao entre cada uma delas com as outras formaes materiais que a rodeiam constitui o espao. A durao da existncia das formaes materiais e a relao de cada uma delas com as formaes anteriores e posteriores o tempo. Os idealistas negam a existncia do tempo e do espao, alguns deles apregoam inclusive, a inexistncia do espao e do tempo fora de nossas sensaes. O tempo para Berkeley, por exemplo, nada fora da sucesso de idias no esprito. Para Kant, o espao no uma propriedade das coisas e nem existe em si mesmo. subjetivo. J para o materialismo dialtico, o espao e o tempo so propriedades fundamentais da matria. O universo escreve Lnin, apenas matria em movimento e essa matria em movimento s pode mover-se no espao e no tempo. Assim, o espao e o tempo so propriedades fundamentais da matria, esto, portanto, organicamente e necessariamente ligados matria. Muitos filsofos acreditavam que embora existissem objetivamente, espao e tempo poderiam existir independentemente da matria, tal como um recipiente. Tais opinies so expostas por Archytas de Tarente, Demcrito, Aristteles e modernamente Newton, com sua teoria do espao absoluto, um dos pilares da mecnica newtoniana. Trata-se de um espao imvel, eterno e imutvel, com as coisas particulares movendo-se NO espao. Pensadores como Giordano Bruno, Spinoza, Locke e alguns materialistas pr-marxistas, tentaram ligar organicamente o espao matria, mas somente o materialismo dialtico superaria as concepes metafsicas.

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Para o materialismo, o espao, no est s organicamente ligado matria, mas tambm depende igualmente da matria e no o mesmo para todos os corpos, o espao tambm muda de uma forma de existncia a outra. (pg. 184). Exemplo disso so os gases com atrao molecular menor e os lquidos, com atrao maior, conformando relaes espaciais diferentes. A teoria da relatividade contribuiu para a ancoragem do espao s formaes materiais, atestando que as caractersticas espaciais dependem da diviso e do movimento das massas em atrao, dependem, portanto, da densidade da matria e de suas foras de atrao (campos de gravidade). O tempo, assim como o espao, est organicamente ligado matria, depende dessa ou daquela forma de sua existncia. Ex: pela teoria da relatividade, o decorrer do tempo, seu ritmo, depende da densidade da substncia desse ou daquele sistema e das foras de atrao que agem entre os corpos dados: quanto mais a densidade da substncia elevada, tanto mais lentamente corre o tempo. Destaca-se, que a dependncia do espao e do tempo com relao matria... A determinao do espao e do tempo pelas formas concretas de existncia da matria decorre do fato de que o espao e o tempo esto ligados ao movimento. Mesmo ao movimento mecnico. Exemplo disso que a distncia percorrida por um corpo em movimento uniforme determinada pelo produto do tempo, pela velocidade. A distncia a medida do espao; a velocidade, a medida do movimento. Assim, o espao , aqui, determinado pelo movimento e pelo tempo. Se o espao e o tempo esto ligados ao movimento, e se o movimento um atributo da matria, o tempo e o espao esto, no entanto, organicamente ligados matria, dependem das formas de seu movimento. A caracterstica do espao a de ser tridimensional. A representao das trs dimenses do espao dada por trs linhas perpendiculares uma a outra, passando por um nico e mesmo ponto no espao. Uma delas vai da esquerda para a direita, a outra de cima para baixo e a terceira da frente para trs. Esses trs eixos so totalmente suficientes para que possamos, deslocando-nos paralelamente a eles, atingir qualquer que seja o corpo e localiz-lo no espao. Filsofos idealistas como Zelner, propalaro a idia de 4 dimenses, justificando tal fato pela idia de que tal como (supostos) seres de 2 dimenses no podem conceber uma terceira, tambm estes no podem adentrar a 4. A quarta dimenso justifica a idia de Deus, tal como eventos sobrenaturais... A discusso de quarta dimenso da fsica nada tema ver com isso... O SINGULAR, O PARTICULAR E O GERAL Em primeiro lugar, devemos destacar que so as propriedades e ligaes que so prprias apenas a uma formao material dada e que no existem em outras formaes materiais que constituem o singular. Trata-se de uma forma particular do movimento da matria. Assim, em cada formao material, ao lado do singular (do que no se repete), h o que se repete (o geral). Assim, o singular e o geral no existem de maneira independente, mas somente por meio de formaes materiais particulares (do particular), por isso que cada formao material representa a unidade do singular e do geral. A correlao do singular e do geral no particular (na formao material) manifestase como correlao de aspectos nicos em seu gnero (singular) e aspectos que se repetem 16

nesse ou naquele grupo de outras formaes materiais (gerais). Vale destacar, que o que singular pode se tornar geral, e este, singular. Contudo, quando se pensa na correlao do particular e do geral, isto , do todo (do particular enquanto todo) e da parte (do aspecto geral enquanto parte que compe a formao material), temos que todo o particular (formao material) entra de modo incompleto no geral, j que possui tambm aspectos singulares, nicos. Isto equivale a dizer que nenhuma formao material pode diluir-se plenamente no geral. Mas, em condies adequadas, determinada formao material pode se transformar em outra. Assim, cada particular (cada formao material) possui, em potencial, propriedades de outras formaes materiais (nas quais pode se transformar). Esse potencial um dos aspectos gerais. Que nos permite ver o geral no particular. O geral e o particular Se analisarmos o singular e o geral de um objeto, o que evidenciaremos so as propriedades e ligaes nicas a esse objeto e as que se repetem em outros (geral). Mas se o que se quer evidenciar a semelhana e a diferena entre objetos, devemos confrontar o geral ao particular e no o geral ao singular que est num objeto dado. O singular apresenta-se sempre como particular, pois, sendo prprio apenas a uma formao material dada, ele a distingue de qualquer outra formao material. Assim, um fenmeno nico, tal como a instaurao do poder dos Sovietes, pela primeira vez na URSS, representar sempre o particular para a URSS e marcar a diferena entre ela e qualquer outro pas. O singular pode desempenhar seu papel de caracterizar o singular de uma formao material. Mas quando ele encarna o geral, isto , quando os aspectos singulares, em verdade, alinham em semelhana os objetos, as formaes materiais, ele as une. O singular pode ento representar aspectos gerais (o geral), mas, quando as distingue das outras, desempenha o papel de particular. O fato, por exemplo, de que a ditadura do proletariado na Bulgria existe sob a forma de democracia popular constitui o geral se compararmos esse pas com a Polnia, com a RDA ou mesmo com a Hungria; e, ao mesmo tempo, se compararmos a Bulgria com a URSS, esse mesmo fato tornar-se- o particular, o regime da democracia popular distinguindo ento a Bulgria da URSS, onde a ditadura do proletariado afirma-se sob a forma de Repblica dos Sovietes (p. 197). Para desempenhar a funo de particular, o geral deve poder distinguir as formaes materiais umas das outras, mas no todo geral que capaz de faz-lo, pois h propriedades e ligaes comuns (causa, contedo, forma, etc.) a todas as formaes materiais que no podem distingu-las umas das outras. Abarcando todas as formaes materiais, o geral no pode assumir o papel de particularizador, no pode distingu-las. por isso que cada formao material representa a unidade do geral e do particular, isto , a unidade do que a identifica a outras formaes materiais, assim como a unidade do que a distingue.

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A Correlao do Geral e do Particular no Momento do Movimento da Matria do Inferior para o Superior (p. 199). A forma superior do movimento da matria encerra em si a forma inferior, ainda que anulada. H, portanto, traos gerais a ambos os movimentos. Contudo, so traos comuns diferentes daqueles que existem em formaes materiais que esto na mesma etapa de desenvolvimento, pois so traos refletidos nas categorias atravs da especificidade das novas caractersticas adquiridas pelas novas formas superiores de movimento. A molcula contm tomos, portanto, essas duas formaes possuem traos comuns. Ambos possuem partculas elementares, as mesmas decerto (eltrons, nions, etc.). O fato que no tomo as interaes ocorrem no prprio tomo, enquanto que na molcula ela ocorre indiretamente, refletida mediante a interao entre os tomos. Do inferior ao superior guardam-se caractersticas, mas estas so reflexos. Manifestam-se diferentemente a posteriori. (No caso do caminho percorrido de um tomo at um organismo, ou seja, mais complexo do que a molcula) a manifestao refletida deste trao ser mais modificada ainda. por isso que difcil, a partir desses traos gerais apenas, exprimir a essncia das formaes materiais, porque esses traos se modificam e s se mantm modificadamente, de forma anulada, nas formaes materiais superiores. Exprimem, portanto, apenas a existncia da continuidade de uma formao material a outra. Esses traos deixam de lado o que foi ganho pela formao material na sua evoluo, o diferencial adquirido em seu desenvolvimento. J a correlao entre o geral e o particular nas formaes materiais que pertencem a um nico e mesmo estgio do desenvolvimento apresenta um aspecto algo diferente, com o geral constituindo a essncia, isto , o que foi adquirido no desenvolvimento. Deste modo, o geral (os traos gerais que aqui discutimos) que existe em formaes materiais em estgios de desenvolvimento diferentes, no demonstra a essncia dessas formaes, a comparao entre elas no deve se dar mediante esse geral, mas atravs de suas particularidades (Ex: no se compara o Estado capitalista com o Estado socialista por seus aspectos gerais, mas sim pelos aspectos particulares adquiridos ao longo do desenvolvimento). A QUALIDADE E A QUANTIDADE Conceitos de Qualidade e Quantidade. O que distingue uma coisa de outra ou mostra sua semelhana uma propriedade. H diversas propriedades que podem representar aspectos qualitativos ou quantitativos.

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Tanto a categoria qualidade como quantidade, reflete a semelhana (geral) e a diferena (particular e singular). Embora defendida por muitos autores, a definio de qualidade como determinismo interno da coisa no coloca em evidncia o contedo da categoria considerada, no a distingue devidamente. O determinismo interno de uma coisa deve compreender suas qualidades, assim como seus aspectos quantitativos, isto , suas caractersticas de modo abrangente. Contudo, a idia de determinismo interno no capaz de distinguir a categoria de qualidade da de essncia e de contedo, uma vez que estas duas ltimas tambm refletem o determinismo interno da coisa. Igualmente, no consegue definir a qualidade, pois a qualidade no apenas aquilo que distingue uma coisa de outra, mas algo que assemelha uma coisa com outra, ou seja, representa tanto o singular (que no se repete) como o geral (o que se repete). Assim, tanto qualidade quanto quantidade refletem tanto a semelhana quanto a diferena nas formaes materiais. Cabe categoria de particular e de singular, refletir a diferena nas coisas e no a de quantidade, do mesmo modo que o reflexo da semelhana contedo da categoria do geral e no da quantidade. Tambm no exato definir qualidade como propriedade fundamental, propriedades essenciais, pois nem a qualidade, nem a quantidade podem ser unicamente atreladas essncia ou ao fenmeno, respectivamente. Mais exato definir a qualidade como o conjunto das propriedades que indicam o que uma coisa dada representa e a quantidade como o conjunto das propriedades que exprimem suas dimenses, sua grandeza. Da que a qualidade e a quantidade sejam prprias, mais detidamente, s coisas. Apesar disso, mesmo algumas propriedades de uma coisa (processos pelos quais a coisa passa), podem ter qualidade e quantidade, vide o caso da gua: uma de suas propriedades dissolver o sal. A dissoluo e o que ela representa, representam uma qualidade. A quantidade de sal que a gua pode dissolver representa sua quantidade. Uma pergunta recorrente entre os pensadores soviticos indaga se uma coisa possui uma ou vrias qualidades. Decerto, se a qualidade de uma coisa um conjunto de propriedades, a resposta seria: uma s qualidade. Contudo, a coisa no pode, em todas as condies, manifestar todas as suas propriedades, pelo contrrio, em certas condies e relaes que estabelece, a coisa representa isso ou aquilo. O fato que, devido s diferentes relaes que a coisa estabelece, ela manifestar apenas algumas de suas propriedades, e mais, essas propriedades podem no ter nada a ver com sua qualidade particular e fundamental. Isso, todavia, no impede que esta coisa seja considerada a partir da qualidade dessas propriedades no-essenciais. As mudanas qualitativas aparecem apenas no momento em que as mudanas quantitativas saem dos limites de uma medida dada. Ao sair do limite da medida, no se comportam caoticamente, ao contrrio, mostram-se ligadas, em interdependncia processual, deflagrando em uma nova medida. o caso do gelo quando atinge 0 grau: inicia a passagem para a gua. A passagem de um estado qualitativo a outro, que tambm a passagem de uma medida a outra foi categorizada por Hegel como o n de uma linha nodal de transformao. Portanto, a matria se desenvolve pelo desatamento ininterrupto de ns e criao de outros, pelo resultado de certas mudanas quantitativas que levam a mudanas qualitativas. A qualidade nova, decorrente das mudanas quantitativas, no passiva com relao a esses aspectos quantitativos que a determinaram... Trata-se de uma via de mo dupla, na qual essa qualidade nova influencia tambm os aspectos quantitativos que a 19

determinaram. Ex: uma interao peculiar das molculas que caracterizam o estado gasoso da gua (a nova qualidade gasosa da gua) condiciona o volume da gua (aspecto quantitativo). A afirmao de que a qualidade precede logicamente a quantidade correta. No conhecimento, o homem foi historicamente do conhecimento da qualidade colocao em evidncia, tomada de conscincia da quantidade. Mas isso no quer dizer que as mudanas qualitativas no so conseqncia de mudanas quantitativas. No conhecimento, somos, s vezes, obrigados a ir em sentido contrrio ao da realidade. Aristteles j havia revelado esse fenmeno indicando que o primeiro, na realidade, o ltimo no conhecimento e vice-versa, o primeiro no conhecimento o ltimo na realidade. (pg. 215). Na realidade objetiva o processo se d das mudanas quantitativas s mudanas qualitativas (da causa ao efeito), enquanto no conhecimento, vamos da anlise da qualidade quantidade das formaes materiais (do efeito causa), esta inverso no quer dizer que haja uma disjuno entre o conhecimento e a realidade objetiva, mas justifica a existncia de leis que so prprias apenas ao conhecimento, para a apreenso e investigao da realidade. No obstante, o desenvolvimento do conhecimento segue as mesmas leis do desenvolvimento do mundo objetivo. Salto. Tipos de saltos Mudanas qualitativas so, habitualmente, lentas e progressivas, dissimuladas e contnuas; as mudanas qualitativas, ao contrrio, so bruscas, evidentes, constituindo uma ruptura, sendo denominadas de saltos. O salto o processo de passagem de uma coisa de um estado qualitativo a outro mediante uma ruptura de continuidade. H dois tipos de saltos: o de ruptura e do de acumulao gradual de elementos da nova qualidade e enfraquecimento da antiga. O salto-ruptura se d brutalmente e afeta toda a qualidade em seu conjunto, seus aspectos e ligaes (Ex: revoluo armada, etc.). O salto mediante acumulao gradual mais lento, com a transformao da qualidade se dando aos poucos. A mudana da qualidade fundamental e no-fundamental da coisa produz-se sob a forma de saltos, mas o salto que faz mudar a qualidade fundamental transtorna a essncia da formao material (forma revolucionria de salto), gerando uma nova essncia, j o salto no-fundamental determina mudanas apenas no quadro de sua essncia, isto , sem transform-la (forma evolucionista de salto). A passagem direta de uma formao scio-econmica a outra um exemplo de revoluo, a passagem do capitalismo pr-monopolista ao capitalismo monopolista exemplifica a evoluo. Revoluo e evoluo distinguem-se no pela forma como se d a mudana, mas pela profundidade da transformao, pela destruio radical da essncia que a revoluo proporciona. Embora os conceitos de evoluo e revoluo sejam universais, adquirem especificidade em cada domnio da realidade objetiva: na natureza a revoluo um salto que destri o antigo fundamento qualitativo (essncia), na sociedade, a revoluo ser a passagem que engendra formaes (formaes econmicas e sociais) mais perfeitas 20

(complexas). Neste sentido, a contra-revoluo representa a passagem de uma formao mais perfeita a uma menos perfeita. A evoluo, aplicada sociedade, representa a mudana qualitativa no quadro da essncia da formao social, trata-se do reformismo. Com relao a isso, nos diz Lnin que: A cincia histrica nos diz que o que distingue uma mudana reformista de uma mudana no-reformista em um regime poltico dado , em geral, que, no primeiro caso, o poder permanece nas mos da antiga classe dominante, e que, no segundo caso, o poder passa das mos desta classe para uma nova (...). Seria absolutamente falso pensar que, para lutar diretamente em favor da revoluo socialista, possamos ou devamos abandonar a luta pelas reformas. No isso absolutamente. Ns no podemos saber em quanto tempo alcanaremos o sucesso e em que momento condies objetivas permitiro o acontecimento dessa revoluo. preciso que sustentemos qualquer melhoria, toda melhoria real da situao econmica e poltica das massas. (Lnin apud Cheptulin p. 221) O cientista e o planejador que intervm sobre a matria, devem escolher a melhor forma de salto, correspondente s condies concretas dadas na realidade objetiva, devendo ter em conta que estas condies concretas mudam independentemente da vontade humana, podendo ser contingentes do ponto de vista da capacidade humana de apreender a realidade. O prprio Lnin viu-se obrigado a mudar suas consideraes devido a foras conjunturais. Inicialmente, Lnin apregoava em suas teses, a impossibilidade de passagem ao socialismo por via pacfica, mas aps fevereiro de 1917 na Rssia, a dualidade de poder , na qual vira-se frgil a burguesia russa, ele passa a aceitar a idia de passagem pacfica do proletariado ao poder (tambm havia se modificado a composio dos sovietes, excluindo os mencheviques e os S. R.s de direita). Mas com o passar do tempo, os mencheviques tornaram-se meros valetes da burguesia, a dualidade de poder termina e todo o poder vai para a burguesia. Nestas condies, s a revoluo armada resolveria. Posteriormente, as teses sobre a revoluo armada passariam por revises durante os Congressos do PCUS, j que as condies socioeconmicas sob o capitalismo mudaram.

A CAUSA E O EFEITO (p.224) A evoluo dos conceitos de causalidade na filosofia pr-marxista. Para os pr-marxistas, a idia de causa ainda no se distinguia do apeiron e consecutivamente, assume a forma de gua (Thales), ar (Anaxmenes) e de fogo (Herclito), etc. Em Plato, a causa seria o fator de gnese das coisas particulares, com cada coisa particular aparecendo devido interao do no-ser (matria) com o limite (categoria platnica que expressa a limitao matemtica). Aristteles por seu turno, agrupa esses fatores em 4 tipos de causa: 1. a material; 2. a formal; 3. a produtiva ; e 4. a finalista. O exemplo dado por Aristteles o da construo de uma casa, na qual o material de construo a causa, o plano o elemento formal, o 21

elemento produtivo o trabalho do arquiteto e a causa finalista o objetivo alcanado. Utilizando a teoria do Estagirita, a filosofia da Idade mdia encontrou sustentabilidade para a criao divina do mundo. A concepo metafsica de que cada fenmeno que desempenha o papel de causa e efeito tem, por sua vez, sua causa em outros fenmenos foi recusada por Hegel, o qual props uma soluo dialtica, na qual causa e efeito esto em interao. Uma interao dialtica, neste caso. Na concepo hegeliana, a causa, sendo uma substncia ativa, age sobre a substncia passiva e acarreta nessa certas mudanas que produzem nela um efeito. A substncia passiva exerce uma ao de retorno e anula, dessa maneira, a ao da substncia ativa e, assim, de substncia passiva ela transforma-se em substncia ativa e comea a interferir em relao primeira substncia ativa como alguma coisa de inicial, isto , como causa (p. 228). mediante a interao que a causa e o efeito assim passam um pelo outro e mudam de lugar. Assim, para se conhecer um fenmeno, o conhecimento de sua interao basilar, posto que ao desvend-la, desvendamos a causa, o efeito e a natureza dos dois fenmenos e elementos que interagem. A concepo marxista da causalidade A definio pr-marxista da causalidade, ao conceb-la como fenmeno (causa como fenmeno) que condiciona outro (efeito) insuficiente, pois reduz a causa do fenmeno unicamente a acontecimentos externos (o fenmeno expressa o externo, superfcie da formao material). O materialismo dialtico no nega a ao exterior (de corpos sobre outros corpos) e sua capacidade transformadora (de transformar fenmenos submetidos ao), mas aprofunda tais idias, destacando a capacidade de cada fenmeno em conter em seu imo a causalidade. Assim, reduzir os laos de causa e efeito s ligaes exteriores reluzi-los s ligaes dos aspectos e propriedades exteriores. Em verdade, o lao de causa e efeito no se reduz ao domnio dos fenmenos, mas igualmente, aos aspectos internos e necessrios, essncia, bem como correlao do interno com o externo, da essncia com o fenmeno. Assim: Parece-nos mais correto definir a causa como a interao de dois ou mais corpos, ou ainda, como a interao de elementos ou aspectos de um mesmo corpo acarretando certas mudanas nos corpos, elementos ou aspectos, agindo uns sobre os outros e o efeito como as mudanas surgidas nos corpos, elementos e aspectos agindo uns sobre os outros, em decorrncia de sua interao. Foi precisamente assim que os fundadores do materialismo dialtico e, em particular, Engels, definiram a causa: '(...) A ao recproca a verdadeira causa finalis das coisas. ' p. 231.

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A interao conduz assim transformao dos corpos ou aspectos em interao, assim como ao aparecimento de novos fenmenos e passagem de um estado qualitativo a outro. Por exemplo, a interao das classes antagnicas condiciona o aparecimento do Estado, a mudana do sistema social e de estado e a passagem da sociedade de uma formao scio-econmica a uma outra. Do mesmo modo, a causa da incandescncia do filamento de uma lmpada no a corrente eltrica em si, mas a interao da corrente eltrica com a substncia da qual feito o filamento. Mesmo os partidrios do materialismo mecanicista, que apresentam a idia de causa como ao mecnica de um corpo sobre outro, foram obrigados, quando da elaborao de sua teoria da causalidade, a levar em conta a retroao do segundo corpo sobre o primeiro. O efeito nada mais do que a mudana surgida a partir da interao.

Causalidade e Necessidade Mesmo os fenmenos contingentes tm causas que os produzem, mas a ligao desses fenmenos (efeitos) com as causas que os engendraram no so contingentes. H uma interao necessria entre causa e efeito, seja em fenmenos contingentes (que podem ou no vir a existir), ou em fenmenos necessrios (cuja existncia imperiosa). A destruio das sementes pelo granizo reconhecida como contingente porque o granizo em determinada poca do ano o resultado do acaso. Mas uma vez ocorrido, a interao do gelo com os organismos vegetais (causa) condiciona NECESSARIAMENTE a destruio destes organismos. Isto quer dizer que os fenmenos podem ou no entrar em interao (contingente), mas ao entrarem, a interao ganha carter necessrio. No entanto, fsicos como Mrio Bunge persistiram na idia de que o lao de causa e efeito contingente, baseando-se na experincia da difrao de eltrons atravs da dupla fenda*, a qual demonstra que o lao de causa (eltrons idnticos em movimento) e o efeito (impacto no cran) no necessrio, pois as mesma causa e as mesmas condies, neste caso especial, acarretam efeitos diversos (os eltrons impactam o cran em pontos diferentes, no seguem, portanto uma trajetria balstica...). Contudo, para o materialismo dialtico, Bunge est incorreto em sua deduo. O fato de os eltrons terminarem em pontos diversos do cran no exclui o carter necessrio do lao de causa e efeito: embora os eltrons estejam em interao com um mesmo objeto (o diafragma com as fendas), essas interaes no so idnticas, o que d a entender que ocorrem mudanas na trajetria, uma vez que cada eltron no est em interao nem com o mesmo objeto, nem com o mesmo meio na escala atmica. Da as causas e os efeitos no corresponderem a princpio. Mas o lao de causa (interao do eltron com o ambiente) e efeito (queda em um ponto do cran) necessrio. O materialismo dialtico no entende por causa o objeto, a coisa, mas a interao dos objetos, das coisas ou dos elementos e dos aspectos que formam o objeto, a coisa; e, por efeito, as mudanas surgidas nos corpos, nos elementos e nos aspectos em interaes. Uma mesma interao, em condies apropriadas, no acarreta mudanas diferentes, mas apenas idnticas. 23

Assim, h em cada objeto, a potencialidade para uma gama de efeitos diversos, mas isso no significa que todos esses efeitos adviro de uma mesma causa. H vrias causas, que deflagram em grande quantidade de efeitos. Isso no exclui o carter necessrio do lao interacional de causa e efeito. Mas, se todo fenmeno est ligado a uma causa genitora, no estamos colocando em dvida o contingente? com base nesse argumento que o materialismo metafsico (positivismo, etc.) nega a existncia do acaso. Contudo, os fenmenos, os corpos, no so a prpria causa, no podem ser. O corpo no a interao. Ademais, o reconhecimento da interao entre causa e efeito como necessria (necessariamente engendra um efeito, uma mudana), no conduz negao da contingncia, pois os elementos, as coisas, podem ou no entrar em interao. Eis seu carter contingente.

O NECESSRIO E O CONTINGENTE Os conceitos de Necessidade e de Contingncia Na filosofia antiga, h vrias definies diferentes das categorias de necessrio e de contingente, mas a idia segundo a qual a necessidade existe apenas como possibilidade falsa, pois os aspectos e as ligaes necessrias existem no somente na possibilidade, mas igualmente na realidade. A presena de oito prtons no ncleo atmico do oxignio e de um prton no tomo de hidrognio inevitvel, necessria no s para os tomos que surgiro, mas para aqueles que existem. Alguns filsofos confundem a categoria de contingncia com a de possibilidade. Quanto contingncia, j dissemos ser algo que pode vir a ser ou no, que passa a existir ou no. A possibilidade, em verdade, expressa aquilo que acontecer uma vez satisfeitas as pr-condies de sua existncia. O que liga a possibilidade realidade so estas pr-condies, as quais, reunidas, necessariamente daro realidade ao que era apenas possibilidade. mediante estes princpios da dialtica materialista que o homem, ao longo de sua histria pde organizar a produo, congregando certos fatores com um objetivo futuro, isto , planejar. Alguns autores identificam as categorias de necessidade e de contingente s categorias de geral e de singular. O geral, determinado por leis internas (essncia) necessrio, mas no todo geral que necessrio (Ex: o sal em vrias gotas dgua como geral), ele pode ser contingente (pode existir em determinadas gotas, mas no noutras). Do mesmo modo que o geral no idntico ao necessrio, o contingente tambm no idntico ao singular. O singular nico, o contingente pode se repetir e condicionado por circunstncias exteriores. Enquanto isso, o singular pode ser o efeito da interao de aspectos internos da formao material, com mudana qualitativa nica (tornando assim algo singular, nico), ao menos durante certo tempo. A causa do aparecimento do necessrio est nele mesmo, a do contingente est em eventos exteriores. Assim, necessrio e contingente esto ligados causalidade e expressam o grau seguinte do aprofundamento humano do conhecimento da realidade. A crtica das concepes idealistas e metafsicas da correlao da necessidade e da contingncia. (p.246) 24

O problema da necessidade e da contingncia foi objeto de estudos ao longo de toda a histria da Filosofia, ao longo da qual, diversas solues foram apresentadas. Idealistas subjetivos como Santayana, negaram a existncia da necessidade, como sendo apenas um compl de contingncias. Tambm para Wittgenstein, apenas as contingncias existem e para Walter Theimer, as contingncias agem na histria e excluem o determinismo, assim como a necessidade. Para Theimer, tudo depende das vontades subjetivas das pessoas. Outros autores negam a existncia da categoria necessidade na natureza, outros criaram concepes idealistas da necessidade, com a necessidade sendo apenas um postulado, um ponto de partida, mas que na verdade nada teria a ver com a realidade. Por tais concepes, o homem no poderia explicar nenhum fenmeno real... Contrariamente aos idealistas, os materialistas reconhecem a existncia objetiva da necessidade e consideram-na como uma das propriedades fundamentais da natureza, mas divergem entre si com relao existncia objetiva da contingncia. Materialistas prmarxistas como Demcrito, Spinoza e Holbach, negavam totalmente a existncia objetiva da contingncia. Spinoza dizia que os homens chamavam de contingente aquilo que no dominavam. Para negar a contingncia, recorria-se ao princpio da causalidade (causa e efeito), atribuindo a tudo uma causa necessariamente ligada a um efeito, assim no haveria fenmenos contingentes, pois todo fenmeno estaria ligado a sua causa. Esta ligao necessria (entre causa e efeito) factvel, mas isso no quer dizer que as causas sejam necessrias. As causas, igualmente, podem ser contingentes. A interao das formaes materiais ou de seus elementos, de seus aspectos, pode tanto ser contingente, isto , devido a um concurso de circunstncias, quanto necessria, em razo de sua natureza especfica. Por exemplo, na sociedade capitalista, o fato de que o operrio venda ao empregador sua fora de trabalho e de que este seja explorado pelo ltimo no nem contingente, nem devido a um concurso de circunstncias exteriores, necessrio: isso necessariamente condicionado pelo modo de produo dominante na sociedade capitalista e pela situao econmica do proletariado e da burguesia, que determinada por esse modo de produo, isto , pela prpria natureza dos aspectos em interao; e o fato de que o operrio trabalhe justamente para esse capitalista e justamente com esses operrios, e no com outros, um fenmeno contingente. A necessidade e a contingncia no existem de forma separada, mas pertencem ao mesmo fenmeno, podendo ter aspectos e ligaes internas que determinam sua natureza (necessrio) e outras que so externas e que ligam a formao material ao mundo exterior contingentemente. Mas o necessrio e o contingente esto ligados e tem relao. A necessidade cria seu caminho por meio de uma massa de desvios contingentes que, exprimindo-a como uma tendncia, introduzem no processo o fenmeno concreto, e uma grande quantidade de novos elementos que no decorrem da necessidade, mas que so condicionados por circunstncias exteriores. bem verdade, contudo, que devemos nos orientar pelas propriedades e ligaes necessrias, mas como o necessrio se manifesta mediante muitos desvios contingentes, preciso estudar o contingente e por meio dele 25

apreender as tendncias necessrias. A contingncia uma forma de manifestao da necessidade, mas tambm um complemento a ela, pois entra em interao com outras formaes materiais, provm de outras formaes. No desenvolvimento da formao material, o contingente torna-se necessrio e o necessrio contingente, sendo tal fato visvel na prpria sociedade: no comunismo primitivo, tudo o que era produzido era consumido na comunidade, sendo a troca um fenmeno eventual e contingente. Mas com o desenvolvimento das foras produtivas e a gerao do excedente, a permuta de produtos acentuou-se e as trocas tornaram-se necessrias. A LEI A lei representa uma ligao necessria geral, uma ligao prpria a vrios fenmenos, sendo aquilo que se manifesta necessariamente, nas condies apropriadas, muito embora nem todas as ligaes necessrias sejam leis. A lei existir at que tenha se dissipado o movimento da matria ou do pensamento do qual faz parte. As leis, em geral, manifestam-se como ligaes, relaes, mas a forma de manifestao varia, pois h leis que atuam somente em cada formao material (leis dinmicas) podendo prever o surgimento de fenmenos e seus estados futuros, j outras atuam na massa dos fenmenos (leis estatsticas), como por exemplo, as leis da mecnica quntica, da qual no podemos definir o movimento de cada partcula, nem prever o desfecho de seu movimento, a no ser mediante probabilidades. Vale destacar que uma mesma lei pode ser geral ou particular, dependendo das condies, tal como as prprias categorias de geral e de particular o so, mas, para alm destas, h tambm as chamadas leis universais, isto , aquelas que sob quaisquer relaes ou circunstncias so gerais, prprias a quaisquer domnios da realidade, em relao elas, todas as outras so particulares. As leis universais so estudadas pela filosofia, enquanto as particulares o so pelas cincias particulares. Leis gerais podem se manifestar pelas particulares quando ambas so concernentes s mesmas relaes, mas h leis gerais e particulares que concernem a ligaes diferentes, agindo ento uma ao lado da outra e no mediante a outra. Pelo fato de que, quando da passagem da matria de um estgio de desenvolvimento a outro, relaes e ligaes novas aparecem nas novas formaes materiais, ao lado das antigas leis que agiam nas formaes materiais dos estgios inferiores de desenvolvimento, leis especficas novas tambm entram em jogo, com o nascimento de novas ligaes e relaes especficas. As novas leis so especficas em relao s antigas leis, que passaram para as novas formaes materiais graas sobrevivncia de antigas relaes e ligaes, agindo apenas nas novas formaes materiais (grau superior do desenvolvimento), enquanto que as antigas leis, que so mais gerais, agem tambm nas formaes materiais de todos os estgios inferiores de desenvolvimento. As novas leis no podem ser uma forma de manifestao das antigas... Estas so as premissas da relao entre as leis gerais e especificas nas cincias particulares, mas e quanto correlao entre as leis da dialtica e as leis das cincias particulares? As leis da dialtica so universais e s se manifestam por meio de outras leis que so particulares em relao a elas, exemplo disso a lei dialtica da passagem da qualidade para a quantidade, que s pode agir por meio de fenmenos concretos. Contudo, 26

o conhecimento desta ou daquela lei da dialtica insuficiente para orientar esse ou aquele processo concreto, sendo necessrio conhecer as leis especficas, particulares que regem o dado processo. No obstante, as leis da dialtica s se manifestem mediante leis especficas no concreto, elas possuem um contedo concreto: tudo aquilo que se repete, exatamente nas leis e processos particulares de que tratamos, o contedo das leis da dialtica.

O CONTEDO E A FORMA Para definir o contedo, devemos transcender a idia de que se trata de simples conjunto de elementos e aspectos desprovidos de vitalidade que constituem uma coisa, sendo que trata-se de algo processual, com aspectos e elementos em interao constante. Esse movimento permanente, instvel, o contedo, representando sempre o individual, incluindo em si o geral e o singular, representando assim, a unidade do necessrio e do contingente, enquanto que a essncia o que permanece na coisa, o que estvel, representando o geral na coisa. A essncia o necessrio na coisa. No objeto, tanto o fundamental quanto o no-fundamental possuem um contedo e uma forma, sendo que nos objetos no h nada que no se relacione ao contedo e a sua forma, do mesmo modo que tanto no interior como no exterior da coisa h contedo e forma. O interior o necessrio na coisa e se manifesta por desvios contingentes, refletindo-se na categoria de essncia, enquanto estes prprios desvios contingentes, isto , o contingente, reflete-se na categoria de fenmeno. A especificidade da categoria de contedo a de refletir o conjunto de processos da coisa. No contedo de uma formao material, entram assim, processos que se do no seu interior, mas tambm aqueles que este estabelece com o exterior, j que nada est em perfeito isolamento no mundo. Especfico da categoria forma refletir o lao entre os elementos, trata-se da estrutura do contedo e, portanto, remete tanto essncia quanto ao fenmeno. Toda forma est organicamente ligada ao contedo, dependem, portanto, um do outro, sendo o papel determinante dado pelo contedo, ou seja, o contedo determina a forma e mudanas no contedo, acarretam mudanas nas formas, mas a forma no passiva, ela reage sobre o contedo, intensificando seu desenvolvimento ou refreando-o. A forma tambm um sistema relativamente estvel de ligaes de elementos do contedo, ligando-se, portanto, ao repouso relativo, o que significa que ela permanece estvel por um tempo relativamente maior. De incio, as mudanas do contedo (mais constantes e contnuas) no ameaam a forma, antes, do-se no quadro da mesma, mas posteriormente, h um ponto em que a forma comea a entravar o desenvolvimento do contedo. o momento no qual a forma deixa de corresponder ao contedo e o contedo novo destri a antiga forma, gerando uma nova. Passa-se a outro nvel qualitativo pela destruio da antiga forma, que corresponde transformao qualitativa radical do contedo. Trata-se, assim, de uma nova forma e um novo contedo que se manifesta na formao material. PARTE E TODO, ELEMENTO E ESTRUTURA

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As leis da correlao das partes isoladas com o todo refletem-se nas categorias de parte e de todo, j as leis da correlao das partes entre elas mesmas, refletem-se nas categorias de elemento e estrutura. A parte o objeto (processo, fenmeno, relao) que entra na composio de um outro objeto (processo, fenmeno, relao) e que se manifesta na qualidade de momento de seu contedo. O todo representa o objeto (processo, fenmeno), possuindo propriedades que no se reduzem s propriedades das partes que o constituem. Cada formao material representa um todo constitudo de partes bem definidas, sendo o desmembramento da formao material em partes uma condio necessria de sua existncia enquanto todo, possuindo uma natureza e uma essncia prprias, enquanto que a correlao de suas partes com o todo uma condio necessria de sua existncia enquanto partes, tendo uma essncia especifica. Teve-se ter em conta que sem estrutura no h todo, uma vez que esta designa a forma da unio e da correlao dos elementos do todo. O conceito de elemento designa os componentes do todo que se encontram entre eles em uma certa correlao e interdependncia. A correlao desses ou daqueles objetos, que forma o todo e torna-se sua estrutura, transforma simultaneamente em partes do todo e em elementos da estrutura correspondente. Entretanto, os conceitos de elemento e de parte no so idnticos. Um objeto torna-se elemento somente depois de sua entrada em uma ligao correspondente que forma um todo. O mesmo se d com a parte. Mas onde est a diferena entre o elemento e a parte? Os elementos manifestam seu contedo especfico na relao com a estrutura, sistemas de ligaes que entre eles se estabelecem, mas os elementos distinguem-se, no se confundem com essas ligaes. J o contedo das partes manifesta-se no nas relaes que elas estabelecem entre si, mas na relao delas com o todo. O conceito de parte , portanto, mais extenso do que o conceito de elemento. As partes do todo no so somente os elementos que se encontram em uma certa correlao, mas as prprias correlaes entre os elementos, isto , a estrutura. A estrutura a concretizao da categoria de forma, mas no exprime apenas a correlao, as leis da correlao do contedo e da forma, mas tambm as leis da correlao dos elementos do contedo entre eles. A ESSNCIA E O FENMENO A essncia est no interior da coisa, mas o aspecto interior da coisa no s a essncia, tambm a causa, a necessidade e a lei, fatos que tornam necessria uma melhor qualificao da essncia, para diferenci-la destas outras categorias. A essncia contm no apenas os aspectos fundamentais (categoria de fundamento), mas tambm os nofundamentais, enquanto que o fenmeno definido como o aspecto exterior, mutvel, do objeto, no mximo exprimindo sua essncia, (mas no coincidindo com ela) e podendo, inclusive deform-la. A essncia se manifesta mediante as interaes do objeto em questo com outros objetos. Estes outros, por sua vez, influenciaro o primeiro com modificaes em seu contedo. J o fenmeno, nunca pode ser como a essncia, pois os fenmenos nunca nos fornecem o conhecimento verdadeiro da essncia, ademais, o fenmeno representa aspectos exteriores e que mudam constantemente, enquanto que a essncia representa aquilo que estvel. Estvel sim, imutvel no. Mas a essncia tambm faz parte do contedo do 28

fenmeno, ao lado dos aspectos exteriores e cambiantes. Exemplo de certa modificao da essncia a passagem do capitalismo pr-monopolista para o imperialismo. O FUNDAMENTO E O FUNDAMENTADO Por fundamento1 deve ser entendida a relao determinante, o interior do todo estudado, o momento mais profundo de sua essncia. Em termos formais, o fundamento igual ao fundamentado, o que determinante no interior da essncia,