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CINCO ANOS DO MEMORIAL DA INCLUSãO PELOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIêNCIA

CinCo Anos do MeMoriAl dA inClusão pelos direitos dA ... · Escolas: Um Guia para ... Guia para a reflexão e avaliação de experiências educacionais inclusivas ... do Memorial

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CinCo Anos do MeMoriAl dA inClusão pelos direitos dA pessoA CoM defiCiênCiA

A pedAGoGiA inClusiVA nA sAlA de AulAMAteriAl de referênCiA

orGAnizAdores

Crismere Gadelha

márCio Bustamante

marília Costa dias

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

FIChA téCnICA InstItuCIonAl

Governo do Estado de são PauloGeraldo Alckmin

Governador do Estado

secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania Márcio Fernando Elias Rosa

Secretário de Estado

secretaria dos Direitos da Pessoa com DeficiênciaLinamara Rizzo Battistella

Secretária de Estado

Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos (FID)Luiz Souto Madureira

Secretário Adjunto da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania e Presidente do Conselho Gestor do FID

Memorial da Inclusão: os caminhos da pessoa com deficiência

Elza AmbrósioCuradora do Memorial da Inclusão

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Sumário

Apresentação ............................................................................................................ 7

Introdução ................................................................................................................ 8

Entendendo a deficiência – Relatório Mundial sobre a deficiência (oMs) .................. 11

Principais Premissas ................................................................................................ 19

2.1. A Educação Inclusiva: um meio de construir escolas para todos no século XXI .....................20

2.2. O direito de ser diferente ...............................................................................................37

2.3. O direito à diferença nas escolas ...................................................................................46

2.4. Na escola, dar mais a quem tem menos: Entrevista com Philippe Perrenoud .......................48

2.5. O aluno com deficiência em uma perspectiva multidimensional ..........................................52

Indicadores de Qualidade em Educação Inclusiva .................................................... 61

3.1. Princípios-Chave para a Promoção da Qualidade na Educação Inclusiva Recomendações ....62

3.2. Educação Inclusiva e Educação Especial- Indicadores-Chave para o Desenvolvimento das Escolas: Um Guia para Directores..........................................................................................77

3.3. Guia para a reflexão e avaliação de experiências educacionais inclusivas .......................115

Currículo dos organizadores ................................................................................. 131

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

ApreSentAção

Sumário

Essa publicação é fruto de um convênio entre as Secretarias de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência e da Justiça e da Defesa da Cidadania. Está inserida no contexto do projeto “Cinco anos do Memorial da Inclusão pelos Direitos da Pessoa com Deficiência”, que comporta uma série de ações educativas, voltadas para púbicos diversos, sobre os direitos das pessoas com deficiência. A iniciativa é custeada pelo Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos (FID).

O projeto beneficiará 4 mil funcionários públicos, pouco mais de mil professores e 12 mil jovens da rede pública de todo o Estado de São Paulo e consiste em duas frentes: a primeira, são quatro edições do curso a distância “Direitos da Pessoa com Deficiência: Igualdade e Diversidade Humana”. Os cursos são voltados para funcionários públicos municipais e estaduais, em especial os que têm contato imediato com a população: como as áreas da saúde, educação, segurança, desenvolvimento social entre outras.

Na segunda frente, será realizada a adequação do conteúdo histórico da exposição permanente do Memorial da Inclusão para linguagem lúdica e adaptada ao público infanto-juvenil, com desen-volvimento de jogos e brincadeiras voltada aos jovens. Além disso, faz parte dessa frente, também, a realização de atividades de formação específica para professores da rede pública a partir de palestras, rodas de conversa e atividades que tocam nos temas ligados à história da deficiência e, de forma mais circunscrita, a aspectos alinhados à pedagogia, inclusão escolar e a realidade nas salas de aula. Todas as atividades são desempenhadas e acompanhadas por especialistas no assunto e serão desenvolvidas na capital e em algumas cidades do interior.

O projeto nasceu a partir de uma demanda crescente de preparação e sensibilização dos corpos docente e discente para lidar com a diversidade e todas as questões que ela implica. Tradicional-mente, as pessoas com deficiência tinham sua formação escolar apenas na linha da dita “educação especial”. Atualmente, a tendência hegemônica é a da educação inclusiva.

Inaugurado no dia 3 de dezembro de 2009, o Memorial da Inclusão: os Caminhos da Pessoa com Deficiência1, tem o propósito de reunir em um só espaço fotografias, documentos, manuscritos, áudios, vídeos e referências aos principais personagens, às lutas e às várias iniciativas que incentiva-ram as conquistas e melhores oportunidades às pessoas com deficiências. O Memorial da Inclusão, dessa forma, consiste num equipamento cultural que conta a história e faz o registro da memória da luta pelos direitos das pessoas com deficiência no Brasil – certo de que é indispensável, para a construção de uma sociedade democrática e inclusiva, a valorização e o reconhecimento, dessa trajetória, por parte das instituições e dos poderes públicos em geral.

1 http://www.memorialdainclusao.sp.gov.br/

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

introdução

Essa coletânea reúne materiais, que são referências importantes para a prática de uma educação inclusiva, os quais podem ser usados para estudo individual, para discussão de equipe nas escolas e também como consulta sobre aspectos específicos.

O texto de abertura contextualiza como a deficiência é compreendida na atualidade, no âmbito do movimento das pessoas com deficiência, da pesquisa científica, dos tratados internacionais e da legislação nacional. Essa concepção é fruto de muito debate, estudo e militância, mesmo assim, ainda encontramos, no dia a dia, muitas pessoas que ainda não se apropriaram dessa forma de compreender a deficiência.

Essa concepção sobre deficiência está presente também em outras referências internacionais, que evidenciam a educação inclusiva como um valor mundial, ou seja, como um movimento que transcende as fronteiras do Brasil, pois representa o pensamento das lideranças de muitos países. Uma dessas referências é a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, que representa um grande marco na afirmação de direitos para pessoas, e foi elaborada pela Organi-zação das Nações Unidas, em 2006, por meio de um consenso entre lideranças de vários países, muitos com deficiência. Essa convenção foi ratificada pelo Brasil em 2008 pelo Legislativo e em 2009 pelo poder Executivo, assumindo status de texto constitucional, e representa uma importante ferramenta para fazer valer direitos no campo da deficiência. Para ter acesso a esse documento entre no site da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, no endereço:

Outra referência importante diz respeito aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, estabelecidos também pela pela Organização das Nações Unidas, no início do século, em 2000, por meio de uma parceria global para reduzir a pobreza extrema, em uma série de oito objetivos – com um prazo para o seu alcance em 2015. Muitos avanços foram feitos, mas em 2015 avaliou-se que ainda havia muito o que avançar em vários países, portanto foram estabelecidos os 17 Objetivos de Desenvolvimento Susten-tável, conhecidos como Agenda 2030, com 169 metas relacionadas. Um desses objetivos se refere a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, com oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos. Para conhecer melhor esse objetivo, que é uma meta mundial, entre no site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil no endereço abaixo:

Link: http://www.pessoacomdeficiencia.sp.gov.br/convencao-da-onu

Link: http://www.undp.org/content/brazil/pt/home/post-2015.html

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Vale conhecer estes documentos para compreender a educação inclusiva como uma tendência contemporânea mundial.

No Brasil há muitos documentos normativos que definem diretrizes para a educação nacional, numa perspectiva inclusiva. No entanto, chamamos a atenção para a recente Lei Brasileira de Inclusão, promulgada em 2015, por apresentar uma visão abrangente, que vai além do campo educacional. Essa lei operacionaliza a Convenção Internacional dos Direitos da pessoa com Defici-ência e é um marco de assertividade em relação à perspectiva inclusiva. Para conhece-la, acesse o endereço: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm

Em relação à prática inclusiva nas escolas, na segunda parte desta coletânea, encontram-se textos que apresentam as principais premissas, que alicerçam a proposta de uma educação com qualidade para todos os alunos, em termos de histórico e de concepções relacionadas ao modo de conceber o ensino, a aprendizagem, a escola e o aluno.

Em seguida, na terceira parte da coletânea, há três documentos internacionais que apresentam indicadores de qualidade em Educação Inclusiva. A proposta de todos os documentos é oferecer parâmetros para que escolas e sistemas de ensino possam fazer uma autoavaliação de suas práti-cas, para identificar as necessidades de aprimoramentos em várias dimensões da prática educativa.

Para conhecer, pesquisar e se inspirar em experiências de professores, escolas e redes de ensino, acesse a plataforma Diversa – Educação Inclusiva na prática, do Instituto Rodrigo Mendes. Vale à pena conhecer esta plataforma no endereço www.diversa.org.br , pois há muitos materiais interessantes em textos e vídeos. Destacamos:

Desenho Universal para a aprendizagem - um guia para o sucesso escolar – Beth Holland (2014)http://diversa.org.br/uploads/arquivos/artigos/014013_artigo_beth_2014_07_22.pdf

O Plano Educacional Individualizado (PEI) e o sistema de avaliação classificatória http://diversa.org.br/artigos/o-plano-educacional-individualizado-pei-e-o-sistema-escolar-de-a-

valiacao-classificatoria/

O caso da Escola Aexandre Bacchi, Guaporé, RS http://diversa.org.br/estudos-de-caso/o-caso-escola-alexandre-bacchi-guapore-rio-grande-do-sul-brasil/

O caso da Escola Amorin Lima, São Paulo, SP http://diversa.org.br/estudos-de-caso/o-caso-da-escola-amorim-lima-sao-paulo-sao-paulo-brasil/

O caso da Escola Helena Zanfelicci, São Bernardo do Campo, SPhttp://diversa.org.br/estudos-de-caso/o-caso-da-escola-helena-zanfelici-sao-bernardo-do-cam-

po-sao-paulo-brasil/

Desejamos que esse material ajude na reflexão sobre a ação pedagógica e na construção de novas práticas numa perspectiva inclusiva!

Boa leitura!Equipe do Projeto

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

1Entendendo a deficiência – Relatório Mundial sobre a deficiência (OMS)

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

entendendo A deficiênciA1

A deficiência faz parte da condição humana. Quase todas as pessoas terão uma deficiência temporária ou permanente em algum momento de suas vidas, e aqueles que sobreviverem ao enve-lhecimento enfrentarão dificuldades cada vez maiores com a funcionalidade de seus corpos. A maio-ria das grandes famílias possui um familiar deficiente, e muitas pessoas não deficientes assumem a responsabilidade de prover suporte e cuidar de parentes e amigos com deficiências. Todos períodos históricos enfrentaram a questão moral e política de como melhor incluir e apoiar as pessoas com deficiência. Essa questão se tornará mais premente conforme a demografia das sociedades muda, e cada vez mais pessoas alcançam a idade avançada.

As respostas à deficiência têm mudado desde os anos 1970, estimuladas em grande parte pela organização das pessoas que possuem alguma deficiência, e pela crescente tendência de se encarar a deficiência como uma questão de direitos humanos. Historicamente, as pesso-as com deficiência têm em sua maioria sido atendidas através de soluções segregacionistas, tais como instituições de abrigo e escolas especiais. Agora, as políticas mudaram em prol das comunidades e da inclusão educacional, e as soluções focadas na medicina deram lugar a abordagens mais interativas que reconhecem que as pessoas se tornam incapacitadas devido a fatores ambientais e também por causa de seus corpos. Iniciativas nacionais e internacionais tais como as Regras Padrões sobre Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Defici-ência, das Nações Unidas, têm incorporado os direitos humanos das pessoas com de ciência, culminando em 2006 com a adoção da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD).

Esse relatório mundial sobre a deficiência fornece evidências para facilitar a implementação da CDPD. Documenta as circunstâncias das pessoas com deficiência no mundo todo e explora as medidas para promover sua participação social, abrangendo de saúde e reabilitação à educação e emprego. Este primeiro capítulo fornece uma orientação geral sobre a deficiência, introduzindo conceitos chave – tais como a abordagem de direitos humanos com relação à deficiência, o cru-zamento entre deficiência e desenvolvimento, e a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) – e explora as barreiras que afetam as pessoas com deficiência.

o QuE é DEFICIênCIA?

A deficiência é complexa, dinâmica, multidimensional, e questionada. Nas últimas décadas, o movimento das pessoas com deficiência, juntamente com inúmeros pesquisadores das ciências sociais e da saúde têm identificado o papel das barreiras físicas e sociais para a deficiência. A tran-sição de uma perspectiva individual e médica para uma perspectiva estrutural e social foi descrita

1 Relatório Mundial sobre a Deficiência / World Health Organization, The World Bank ; tradução Lexicus Serviços Linguísticos.

- São Paulo: SEDPcD, 2012. 334 p. Título original: World report on disability, p. 03 -10, 2011. Disponível em: <http://www.

pessoacomdeficiencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUNDIAL_COMPLETO.pdf> Acesso em: 31 out. 2016.

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como a mudança de um “modelo médico” para um “modelo social” no qual as pessoas são vistas como deficientes pela sociedade e não devido a seus corpos.

O modelo médico e o modelo social costumam ser apresentados como separados, mas a deficiên-cia não deve ser vista como algo puramente médico nem como algo puramente social: pessoas com deficiência frequentemente podem apresentar problemas decorrentes de seu estado físico. É necessário fazer uma abordagem mais equilibrada que dê o devido peso aos diferentes aspectos da deficiência.

A CIF, adotada como modelo conceitual para este relatório mundial sobre a deficiência, compre-ende funcionalidade e deficiência como uma interação dinâmica entre problemas de saúde e fatores contextuais, tanto pessoais quanto ambientais (Ver Quadro 1.1). Promovido como um “modelo bioló-gico- -psíquico-social”, o relatório representa um compromisso viável entre os modelos médico e social. A incapacidade é um termo abrangente para deficiências, limitações para realizar, e restrições para participar de certas atividades, que engloba os aspectos negativos da interação entre um indivíduo (com um problema de saúde) e os fatores contextuais daquele indivíduo (fatores ambientais e pessoais).

Quadro 1.1. nova ênfase em fatores ambientais

Continua

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) (17) fez avançar a compreensão e a mensuração da deficiência. Ela foi desenvolvida através de um longo processo envolvendo acadêmicos, médicos clínicos, e o mais importante, pessoas com deficiência (18). A CIF enfatiza os fatores ambientais para a criação de deficiências, o que é a principal diferença entre essa nova classificação e a Classificação Internacional de Deficiên-cias, Incapacidades e Desvantagens (ICIDH) anterior. Na CIF, os problemas de funcionalidade humana são categorizados em três áreas interconectadas:

• alterações das estruturas e funções corporais significa problemas de funções corporais ou alterações de estruturas do corpo, como por exemplo, paralisia ou cegueira;

• limitações são dificuldades para executar certas atividades, por exemplo, caminhar ou comer; • restrições à participação em certas atividades são problemas que envolvem qualquer

aspecto da vida, por exemplo, enfrentar discriminação no emprego ou nos transportes.

A deficiência refere-se às dificuldades encontradas em alguma ou todas as três áreas da funcionalidade. A CIF também pode ser usada para compreendermos e mensurarmos os as-pectos positivos da funcionalidade tais como funções corporais, atividades, participação e facilitação ambiental. A CIF adota uma linguagem neutra e não distingue entre o tipo e a causa da deficiência, por exemplo, entre saúde “física” e “mental”. Os “problemas de saúde” são as doenças, lesões, e complicações, enquanto que as “diminuições de capacidade” são diminuições específicas das funções e estruturas corporais, geralmente identificadas como sin-tomas ou sinais de problemas de saúde. A deficiência surge da interação entre problemas de saúde e fatores contextuais – fatores ambientais e pessoais conforme mostra a figura abaixo.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Continuação

A CIF contém uma classificação de fatores ambientais que descreve o mundo no qual pessoas com diferentes níveis de funcionalidade devem viver e agir. Esses fatores podem ser facilitadores ou grandes barreiras. Os fatores ambientais incluem: produtos e tecnologias, o ambiente natural e o construído, suporte e relacionamentos, atitudes, e serviços, sistemas, e políticas públicas. A CIF também reconhece fatores pessoais, tais como motivação e auto-es-tima, que podem influenciar o quanto uma pessoa participa da vida em sociedade. Porém, esses fatores ainda não foram conceitualizados ou classificados. Ela também distingue entre as capacidades de uma pessoa de desempenhar ações e o desempenho efetivo daquelas ações na vida real, uma diferença sutil que ajuda a esclarecer o efeito do meio ambiente e como o desempenho poderia ser melhorado com a modificação do ambiente. A CIF é universal porque cobre toda a funcionalidade humana e trata a deficiência como um contínuo ao invés de categorizar as pessoas com deficiência como um grupo separado: a deficiência é uma questão de mais ou menos, e não de sim ou não. Porém, a elaboração de políticas públicas e a entrega de serviços pode requerer que sejam estabelecidos limites para a gravidade da incapacidade, limitações para realizar ou restrição à participação em certas atividades. Ela é útil para uma ampla variedade de finalidades – pesquisa, fiscalização e informação – re-lacionadas à descrição e mensuração da saúde e da deficiência, incluindo: avaliar a funcio-nalidade individual, estabelecimento de metas, tratamento, e monitoração; mensuração dos resultados finais e avaliação de serviços; determinar a elegibilidade para receber benefícios da previdência social; e desenvolver pesquisas sobre saúde e deficiência.

Condição de Saúde(distúrbio ou doença)

Atividades

Fatores ambientais

Fatores pessoais

Funções e estruturas corporais

Participação

Representação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e saúde

O Preâmbulo da CDPD reconhece que a deficiência é “um conceito em evolução”, mas realça também que “a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e barreiras com-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

portamentais e ambientais que impedem sua participação plena e eficaz na sociedade de forma igualitária”. Definir a deficiência como uma interação significa que a “deficiência” não é um atributo da pessoa. O progresso na melhoria da participação social pode ser realizado lidando com as barreiras que afetam pessoas com deficiência na vida diária.

o AMbIEntE

O ambiente de uma pessoa tem um enorme impacto sobre a experiência e a extensão da defici-ência. Ambientes inacessíveis criam deficiência ao criarem barreiras à participação e inclusão. Os exemplos do possível impacto negativo do ambiente incluem:

• um indivíduo surdo sem intérprete de língua de sinais; • um usuário de cadeira de rodas num prédio sem banheiro ou elevador acessíveis; • uma pessoa cega que usa um computador sem software de leitura de tela.

A saúde também é afetada por fatores ambientais, tais como água potável e saneamento, nutri-ção, pobreza, condições de trabalho, clima, ou acesso a atendimento de saúde. Como a Comissão sobre Determinantes Sociais da Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS) tem alegado, a desigualdade é uma das principais causas dos problemas de saúde, e portanto da deficiência.

O ambiente pode ser mudado para melhorar a saúde, evitar incapacidades, e melhorar os resultados finais para as pessoas com deficiência. Tais mudanças podem ser implementadas pela legislação, por mudanças nas políticas públicas, pela construção da capacidade de agir, ou por desenvolvimentos tecnológicos que gerem:

• Acessibilidade do desenho do ambiente construído e do transporte; • Sinalização para bene ciar pessoas com deficiências sensoriais; • Acesso aos serviços de saúde, e reabilitação, educação, e suporte a vida independente; • Maiores oportunidades de trabalho e emprego para pessoas com deficiência.

Os fatores ambientais incluem um conjunto mais amplo de questões do que apenas o acesso físico e à informação. As políticas públicas e os sistemas de fornecimento de serviços, incluindo as regras subjacentes à provisão de serviços, também podem ser obstáculos. Uma análise do finan-ciamento dos serviços públicos de saúde na Austrália, por exemplo, revelou que o reembolso aos provedores de serviços médicos não levava em consideração o tempo adicional que costuma ser ne-cessário para prover serviços às pessoas com deficiência; assim, os hospitais que tratavam pacientes com deficiência ficavam em desvantagem num sistema de financiamento que lhes reembolsava uma quantia fixa por paciente.

A análise do acesso aos serviços de atendimento médico na Europa revelou barreiras organiza-cionais tais como listas de espera, falta de um sistema de reservas para agendamentos, e complexos sistemas de referências que são mais complicados para pessoas com deficiência, que podem ter dificuldade de chegar cedo, ou esperar o dia todo, ou que não conseguem navegar em sistemas complexos. Embora sem a intenção de discriminar, indiretamente o sistema exclui as pessoas com deficiência ao não levar em consideração suas necessidades.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

As instituições e organizações também precisam mudar – além dos indivíduos e dos ambientes – para evitar excluir as pessoas com deficiência. O Decreto Contra a Discriminação das Pessoas com Deficiência de 2005, aplicado no Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, orientou as organizações do setor público a promover a igualdade das pessoas com deficiência instituindo uma estratégia corporativa para promover a igualdade entre pessoas com deficiência, por exemplo, e avaliando o impacto potencial das políticas e atividades propostas nas pessoas com deficiência.

O conhecimento e as atitudes são importantes fatores ambientais que afetam todas as áreas de fornecimento de serviços e vida social. Elevar a conscientização e desafiar as atitudes negativas costumam ser os primeiros passos para a criação de ambientes mais acessíveis para as pessoas com deficiência. As imagens e linguagens negativas, os estereótipos, e o estigma – com profundas raízes históricas – persistem para as pessoas com deficiência no mundo todo. A deficiência é geralmente associada à incapacidade. Uma análise dos estigmas associados à saúde revelou que o impacto foi notavelmente similar nos diferentes países e para os diferentes problemas de saúde. Um estudo realiza-do em 10 países revelou que o público em geral não possui uma compreensão das habilidades das pessoas com deficiência intelectual. Os problemas mentais são particularmente estigmatizados, com problemas comuns em diferentes cenários. Pois pessoas com problemas mentais enfrentam discrimina-ção mesmo nos ambientes de atendimento de saúde.

As atitudes negativas para com a deficiência podem resultar no tratamento negativo de pessoas com deficiência, por exemplo:

• crianças maltratando outras crianças (bullying) com deficiência nas escolas; • motoristas de ônibus que desrespeitam as necessidades de acesso de passageiros com deficiência; • empregadores que discriminam pessoas com deficiência; • pessoas estranhas que zombam de pessoas com deficiência.

As atitudes e comportamentos negativos têm um efeito adverso sobre crianças e adultos com de-ficiência, gerando consequências negativas tais como baixa autoestima e menor participação. As pessoas que se sentem molestadas por causa da sua deficiência às vezes evitam ir a certos lugares, mudam suas rotinas, ou até mudam de casa.

O estigma e a discriminação podem ser combatidos, por exemplo, através do contato pessoal direto e através de marketing social. As campanhas da Associação Mundial de Psiquiatria contra a estigmatização da esquizofrenia realizadas há mais de 10 anos em 18 países têm demonstrado a importância das intervenções de longo prazo, do amplo envolvimento multi-setorial, e da inclusão daqueles que possuem tal condição. Evidências vindas da Noruega mostraram que os conhecimen-tos sobre psicose entre a população em geral melhoraram após um ano de campanhas informativas, e que a duração dos casos de psicose não tratada caiu de 114 semanas em 1997 para 20 sema-nas em 1999 devido ao maior reconhecimento e intervenção precoce junto aos pacientes.

Os programas de reabilitação baseados na comunidade (CBR) podem questionar as atitudes negativas em comunidades rurais, gerando maior visibilidade e participação das pessoas com de-ficiência. Um projeto de três anos em uma comunidade mais pobre perto de Allahabad, na índia, resultou em crianças com deficiência comparecendo à escola pela primeira vez, mais pessoas com deficiência participando de fóruns comunitários, e mais pessoas trazendo seus filhos deficientes para vacinação e reabilitação.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

A DIvERsIDADE DA DEFICIênCIA

A experiência de deficiências resultante da interação de problemas de saúde, fatores pessoais, e fatores ambientais varia muito. As pessoas com deficiência são diferentes e heterogêneas, enquanto que os pontos de vista estereotipados da deficiência enfatizam os usuários de cadeiras de rodas e alguns poucos outros grupos “clássicos” tais como os cegos e os surdos. A deficiência afeta seja a criança recém-nascida com uma condição congênita tal como paralisia cerebral, seja o jovem soldado que perde sua perna ao pisar numa mina terrestre, a mulher de meia idade que sofre de artrite severa, ou o idoso que sofre de demência, entre muitas outras pessoas. Os problemas de saúde podem ser visíveis ou invisíveis; temporários ou de longo prazo; estáticos, episódicos, ou em degeneração; dolorosos ou inconsequentes. Observem que muitas das pessoas com deficiência não consideram a si mesmas enfermas. Por exemplo, 40% das pessoas com alguma deficiência grave ou profunda e que responderam à Pesquisa Nacional de Saúde da Austrália 2007–2008 classificaram sua saúde como boa, muito boa, ou excelente.

As generalizações sobre as “incapacidades” ou sobre as “pessoas com deficiência” podem enga-nar. As pessoas com deficiência possuem diversos fatores pessoais com diferenças em termos de gêne-ro, idade, status socioeconômico, sexualidade, etnia, ou herança cultural. Cada uma delas tem suas preferências e respostas pessoais para lidar com a deficiência. Embora a deficiência seja associada a privações, nem todas as pessoas com de ciência são igualmente desprovidas. Mulheres com defi-ciências enfrentam, além da deficiência, as desvantagens associadas ao sexo, e podem ter menores chances de se casar do que mulheres não-deficientes. As pessoas que enfrentam problemas de saúde mental ou deficiências intelectuais parecem ser mais desprovidas em muitos cenários do que aquelas que enfrentam deficiências físicas ou sensoriais. As pessoas com deficiências mais graves costumam enfrentar desvantagens maiores, conforme demonstrado por evidências que cobrem das áreas rurais da Guatemala aos dados sobre emprego da Europa. Por outro lado, a riqueza e o status social podem ajudar a superar as limitações para realizar, e as restrições para participar de certas atividades.

(...)

DEFICIênCIA E DIREItos huMAnos

A deficiência é uma questão de direitos humanos porque: As pessoas com deficiência enfrentam desigualdades, por exemplo, quando elas tem negado o

acesso igualitário a serviços de saúde, emprego, educação, ou participação política devido à sua de-ficiência.

As pessoas com deficiência estão sujeitas a violações da sua dignidade, por exemplo, quando são sujeitas à violência, abuso, preconceito, ou desrespeito devido à sua deficiência.

Algumas pessoas com deficiência perdem sua autonomia, por exemplo, quando estão sujeitas a esterilização involuntária, ou quando são confinadas em instituições contra sua vontade, ou quando são vistas como legalmente incompetentes devido à sua deficiência.

Uma grande quantidade de documentos internacionais tem realçado que a deficiência é uma questão de direitos humanos, incluindo o Programa de Ação Mundial para as Pessoas Deficientes (1982), a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), e as Regras Padrões sobre Equalização de Oportunidades para Pessoas com Deficiências (1993). Mais de 40 nações adotaram legislação

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

contra a discriminação de deficientes durante os anos 1990. A CDPD – a mais recente, e o mais amplo reconhecimento dos direitos humanos das pessoas com deficiência – delineia os direitos civis, culturais, políticos, sociais, e econômicos das pessoas com deficiência. Seu objetivo é “promover, proteger, e garantir o usufruto pleno e igualitário de todos os direitos humanos e liberdades funda-mentais por parte das pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente”.

A CDPD aplica os direitos humanos à deficiência, tornando assim os direitos humanos em geral específicos para as pessoas com deficiência, e esclarecendo as leis internacionais já existentes relativas à deficiência. Mesmo que um Estado não ratifique a CDPD, ela ajuda a interpretar outras convenções sobre direitos humanos das quais aquele estado faz parte.

O artigo 3 da CDPD delineia os seguintes princípios gerais:

1. respeito à dignidade inerente, e autonomia individual incluindo a liberdade de fazer suas próprias escolhas, e pela independência das pessoas;

2. não-discriminação; 3. participação e inclusão plena e eficaz na sociedade; 4. respeito pelas diferenças e aceitação das pessoas com deficiência como parte da diversida-

de humana e da humanidade; 5. igualdade de oportunidades; 6. acessibilidade; 7. igualdade entre homens e mulheres; 8. respeito pelas capacidades em evolução de crianças com deficiência e respeito pelo direito

das crianças com deficiência de preservar suas identidades.

Os estados que ratificaram a CDPD devem adotar um certo número de obrigações gerais. Entre outras coisas, eles se comprometem a:

• adotar legislação e outras medidas administrativas apropriadas onde for necessário; • modificar ou revogar leis, costumes, ou práticas que direta ou indiretamente discriminem; • incluir a deficiência em todas as políticas públicas e programas relevantes; • abster-se de qualquer ato ou prática inconsistente com a CDPD; • tomar todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra pessoas com de-

ficiência por qualquer pessoa, organização, ou empresa privada.

Os estados devem consultar as pessoas com deficiência e suas organizações representativas ao desenvolver leis, políticas públicas, e programas para implementar a CDPD. A Convenção também requer que as entidades públicas e privadas realizem uma “adaptação razoável” com a situação das pessoas com deficiência. E ela é acompanhada de um Protocolo Opcional que, se ratificado, fornece um procedimento para fazer reclamações e um procedimento para indagações, que podem ser submetido ao comitê que monitora o tratado. A CDPD promove a reforma das leis sobre deficiên-cia, envolvendo diretamente pessoas com deficiência e usando um modelo de direitos humanos; sua mensagem chave é que as pessoas com deficiência não devem ser consideradas “objetos” a serem administrados, mas “sujeitos” que merecem igual respeito e usufruto dos direitos humanos.

(...)

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2Principais Premissas

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2.1. A educAção incLuSivA: um meio de conStruir eScoLAS pArA todoS no SécuLo XXi

dra. pilar Arnaiz Sánchez2

universidade de murcia - espanha e-mail: [email protected]

REsuMo

Este artigo analisa o conceito de diversidade no campo da educação inclusiva. Inicialmente, diversi-dade foi entendida como uma inovação na área de educação especial, mas, gradualmente, passou a ser compreendida como uma tentativa de oferecer educação de qualidade para todo(a)s. A fim de discutir a diversidade, este artigo primeiro coloca o foco sobre o nascimento da inclusão por meio da abordagem de seus fundamentos e, finalmente, discute o sentido da educação inclusiva.

suMARy

This paper analyses the concept of diversity in the field of inclusive education. Initially diversity was understood as an innovation in the area of special education, but it has gradually become understood as an attempt to provide a quality education for all. In order to discuss about diversity, the paper focuses first on the context of the birth of the inclusion by addressing its foundation and, finally, the paper focuses on the meaning of inclusive education.

IntRoDução

O presente trabalho analisa a nova perspectiva da diversidade no âmbito da educação inclusiva. Ela foi vista, num primeiro momento, como uma inovação da educação especial, mas, progressiva-mente, foi expandindo-se em todo o contexto educativo como tentativa de que uma educação de qualidade alcançasse a todos.

Suas características fundamentais, na opinião de Ballard (1997), são: a não discriminação das deficiências, da cultura e do gênero. Referindo-se a todos os alunos de uma comunidade escolar sem nenhum tipo de exceção. Para Ballard (1997), todos os alunos têm o mesmo direito a ter acesso a um currículo culturalmente valioso e em tempo completo, como membros de uma classe escolar e de

1SÁNCHEZ, Pilar Arnaiz. A EDUCAÇÃO INCLUSIVA: um meio de construir escolas para todos no século XXI. In: Revista

Inclusão, v. 1, n. 1, p. 07-18, 2005. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/revistainclusao1.

pdf>. Acesso em: 31 out. 20162 Professora titular da Faculdade de Educação / Departamento de Didática e Organização Escolar / Universidade

de Murcia / Espanha.

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acordo com sua idade. A educação inclusiva enfatiza a diversidade mais que a semelhança. Nessa mesma linha de argumentação, Skrtic (1991; 1996; 1999) considera que o movimento a favor da educação inclusiva pode oferecer a visão estrutural e cultural necessárias para começar a reconstruir a educação pública rumo às condições históricas do século XXI.

Assim, pois, analisar-se-á, nas linhas seguintes, baseando-se em trabalhos anteriores (Arnaiz, 1996; Arnaiz 2002; Arnaiz, 2003), o contexto do nascimento da inclusão, os pressupostos, nos quais se fundamenta, e o significado da educação inclusiva.

CoMo suRGE A InClusão E QuE CAusAs A PRoMovEM

Desde meados dos anos 80 e princípio dos 90, inicia-se no contexto internacional um movimento materializado por profissionais, pais e as pessoas com deficiência, que lutam contra a idéia de que a educação especial, embora colocada em prática junto com a integração escolar, estivera enclau-surada em um mundo à parte, dedicado à atenção de reduzida proporção de alunos qualificados como deficientes ou com necessidades educacionais especiais.

Cabe destacar a este respeito, como passo prévio à inclusão, o movimento que aparece nos EUA denominado “Regular Education Iniciative” (REI), cujo objetivo era a inclusão na escola comum das crianças com alguma deficiência. Os trabalhos de seus principais expoentes, Stainback & Stainba-ck, (1989) & Reynolds; Wang & Walberg, (1987), delineavam a necessidade de unificar a educa-ção especial e a regular num único sistema educativo, criticando a ineficácia da educação especial.

Aparecia assim, pela primeira vez, uma defesa muito importante à prevalência de um único sis-tema educativo para todos.

O REI luta pela reestruturação da educação especial, pelo desaparecimento da educação com-pensatória e pela recuperação em que tantos alunos estavam imersos (Garcia Pastor, 1996) simples-mente por pertencer a um grupo étnico minoritário:

“Um amplo excesso de representação das minorias na educação especial sugere um as-pecto racista da continuidade de programas separados” (Villa e Thousand 1995, p.33).

A proposta do REI é clara: todos os alunos, sem exceção, devem estar escolarizados na classe de ensino regular, e receber uma educação eficaz nessas classes. As separações por causa da língua, do gênero, ou do grupo étnico minoritário deveriam ser mínimas e requerer reflexões. O REI defende a necessidade de reformar a educação geral e especial para que se constitua como um recurso de maior alcance para todos os alunos.

Aparece no final dos anos 80 e princípios dos 90, como continuação desse movimento no con-texto americano, e do movimento de integração escolar em outras partes do mundo, o movimento da inclusão. Entre suas principais vozes encontram-se Fulcher (1989) e Slee (1991) na Austrália;

Barton (1988), Booth (1988) e Tom linson (1982) no Reino Unido; Ballard (1990) na Nova Zelândia; Carrier (1983) em Nova Guiné; e Biklen (1989), Heshusius (1989) e Sktirc (1991 a) na América do Norte. Na Espanha, ainda que um pouco mais tarde, cabe destacar os trabalhos de Arnaiz (1996, 1997), García Pastor (1993) & Ortiz (1996). Estes autores manifestam sua insatisfa-ção pela trajetória da integração. Eles questionam o tratamento dado aos alunos com necessidades educacionais especiais no sistema de ensino em muitos países. Os sistemas de ensino, imersos em

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um modelo médico de avaliação, seguiam considerando as dificuldades de aprendizagem como conseqüência do déficit do aluno, evitando questionamentos, tais como: por que fracassam as esco-las na hora de educar a determinados alunos?

Ante esta circunstância propõem um novo delineamento do conceito de necessidades educacionais es-peciais e a necessidade de uma mudança de paradigma. Assim, também, reconhecem que as dificuldades que experimentam alguns alunos no sistema de ensino são o resultado de determinadas formas de organi-zar as escolas e as formas de ensinar delineadas por elas (Ainscow, Hopkins e outros, 2001). O interesse nesses temas está provocando a revisão de numerosos sistemas educacionais, que, por conseqüência, implementaram ações condizentes, como fazer o possível para que a educação chegue a todos os alunos em contextos regulares e não segregados. Isto tem fomentado o surgimento e a defesa da chamada edu-cação inclusiva, que coloca em juízo de valor, por um lado, o pensamento existente sobre as necessidades educacionais especiais, e, por outro lado, estabelece uma forte crítica às práticas da educação em geral.

Esta nova orientação assume um caráter internacional. Cabe destacar o importante trabalho que estão realizando os organismos como o UNICEF e a UNESCO em prol de que a educação chegue a todas as crianças em idade escolar. Isto pode ser comprovado na série de ações e reuniões in-ternacionais que têm sido convocadas para conseguir chamar a atenção do mundo a este respeito (Arnaiz e Ortiz, 1998).

Dentre essas reuniões, destaca- se a Convenção dos Direitos da Criança realizada em Nova York em 1989; a Conferência Mundial de Educação para Todos, que aconteceu em Jomtiem (Tailândia) em 1990; a Conferência Mundial sobre “Necessidades Educativas Especiais”, desenvolvida em Salamanca (Espanha), 1994; e, a mais recente no ano de 2000, acontecida em Dakar (Senegal), com o título de “Fórum Consultivo Internacional para a Educação para Todos”.

Talvez, entre todas essas conferências caiba destacar aqui a Conferência Mundial sobre Neces-sidades Educativas Especiais, de 1994, em Salamanca, por ser a que de maneira mais decisiva e explicitamente contribuiu para impulsionar a Educação Inclusiva em todo o mundo. Nessa conferên-cia participaram noventa e dois governos e vinte cinco organizações internacionais, que reconhece-ram a necessidade e urgência de que o ensino chegasse a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais no âmbito da escola regular.

Com este fim, os especialistas ali reunidos estabeleceram um plano de ação cujo princípio nor-teador mostrava que as escolas deveriam acolher a todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas e outras. A partir daí, as escolas se encontram frente ao desafio de desenvolver uma pedagogia capaz de educar com êxito a todas as crianças, inclusive àquelas que têm deficiências graves. Além disso, planeja-se que as escolas devem ser comunidades que atendam a todos, já que as diferenças humanas são naturais, diga-se existem, havendo porém a necessidade de adaptar a aprendizagem a cada criança (Tierney, 1993). Nessa perspectiva, esta Declaração proclama que:

• Todas as crianças têm direito à educação e deve-se dar a elas a oportunidade de alcançar e manter um nível aceitável de conhecimentos;

• cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias;

• os sistemas de ensino devem ser organizados e os programas aplicados de modo que tenham em conta todas as diferentes características e necessidades;

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• as pessoas com necessidades educacionais especiais devem ter acesso às escolas comuns; e• as escolas comuns devem representar um meio mais eficaz para combater as atitudes discri-

minatórias, criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade integradora e alcançar a educação para todos.

A Declaração estabelece um decálogo de recomendações que deveriam ser desenvolvidas por todos os países participantes, nos anos que se seguiram e que consistia-se em:

reQuerer aos países do Norte que desenvolvessem uma redistribuição dos recursos conforme o estabelecido na Convenção sobre os direitos da criança;

ApliCAr os direitos civis e políticos para dar uma melhor proteção aos coletivos, especial-mente vulneráveis na faixa etária infantil, e, também, aos grupos étnicos, assim como outras minorias culturais;

reConHeCer os direitos econômicos e sociais como verdadeiros direitos e não somente como aspiração;

reAlizAr maiores esforços para ascender ao que aparentemente hoje é inalcançável, e poder, assim, afrontar os novos desafios do futuro.

proteGer firmemente os direitos das meninas;AssuMir as diferenças culturais, porém não admiti-las como desculpa para não aplicar a Con-

venção em toda a sua extensão;dediCAr a máxima atenção à situação das crianças afetadas por conflitos bélicos;ACeitAr que a participação das crianças é o ponto decisivo para provocar, conforme a Conven-

ção, uma revolução positiva do comportamento humano;ConCluir o processo de ratificação da Convenção e promover a eliminação das reservas que

ela tem objetivado por parte dos países afetados; ereiterAr que a sobrevivência e o desenvolvimento da infância são imperativos à consecução

dos objetivos de desenvolvimento humano sustentável, adotados pela comunidade mundial e a rea-lização da visão de paz e progresso social contida na Carta das Nações Unidas.

De igual forma, a declaração por parte da Organização das Nações Unidas, ao longo de todos os anos tem mantido a posição em defesa dos mais desfavorecidos. Isto tem contribuído notavelmen-te para o reconhecimento dos direitos humanos e dos princípios de igualdade e eqüidade. Uma das posições mais notáveis nos últimos tempos foi eleger o ano de 1996 como Ano Internacional contra a Exclusão, decisão tomada na Conferência dos Direitos da Criança no século XXI, realizada neste mesmo ano em Salamanca.

O “Informe à UNESCO”, realizado pela Comissão Internacional, sobre a Educação para o sé-culo XXI, presidido por Delors (1996), segue essa mesma linha de argumentação. Estabelece que a educação deve chegar a todos, e com este fim determina dois objetivos: transmitir um volume cada vez maior de conhecimentos teóricos e técnicos, e definir orientações que podem ser desenvolvidas em projetos de desenvolvimento individual e coletivo.

Para dar cumprimento a estes objetivos, a citada Comissão fixa os quatro pilares básicos em que se deve centrar a educação ao longo da vida de uma pessoa:

aprender a conhecer, consiste em adquirir os instrumentos que se requer para a compreen-são do que nos cerca. Para isto, deve-se combinar o conhecimento de uma cultura suficiente-

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mente ampla, com algo mais objetivo, concreto referido a uma determinada matéria. Não se trata, portanto, de adquirir conhecimentos classificados e codificados, senão de ajudar a cada pessoa a aprender e compreender o mundo que a cerca, para viver com dignidade, desenvol-ver suas capacidades profissionais e comunicar-se com os demais. Isto supõe aprender a apren-der, exercitando a atenção, a memória e o pensamento, aproveitando as possibilidades que a educação oferece ao longo da vida, posto que o processo de aquisição do conhecimento está sempre aberto e pode nutrir-se de novas experiências. Aprender a fazer, está diretamente ligado a aprender a conhecer e se refere à possibilidade de influir sobre o próprio meio. Ocupa-se de como ensinar ao aluno a colocar em prática seus conhecimentos adaptando-os a um mercado de trabalho que, por diferentes circunstâncias, é bastante imprevisível. Portanto, é preciso formar as pessoas para trabalhar em equipe em uma variada gama de situações. Mas, não somente isto, é preciso também lhes ensinar “o fazer” nos diferentes marcos sociais em geral e do traba-lho. Em definitivo, este princípio pretende que o aluno tenha a possibilidade de desenvolver sua capacidade de comunicar-se e trabalhar com os demais, afrontando e solucionando os conflitos que possam ser apresentados a ele.

aprender a viver juntos, trata- se de uns dos principais objetivos da educação contemporânea, já que supõe participar e cooperar com os demais em todas as atividades humanas. Essa educação requer, sem dúvida, o desenvolvimento da compreensão ante o outro, e a percepção de formas de interdependência, respeitando os valores do pluralismo, a compreensão mútua e a paz. Assim, luta contra a exclusão por meio de traçados que favorecem o contato e a comunicação entre os mem-bros de grupos diferentes, em contextos de igualdade, por meio do descobrimento gradual do outro e do desenvolvimento de projetos de trabalho em comum.

aprender a ser, implica dotar a cada pessoa de meios e pontos de referência intelectuais permanentes, que lhe permita compreender o mundo que a cerca e a comportar- se como um elemento responsável e justo. Quer dizer, conferir, a cada ser humano, liberdade de pensa- mento, de juízo, de sentimentos e de imaginação para desenvolver-se em plenitude estética, artística, desportiva, científica, cultural e social, e a trabalhar com responsabilidade individual. “O desenvolvimento tem por objetivo o desapego completo do homem em toda sua riqueza e na complexidade de suas expressões e de seus compromissos como indivíduo, membro de uma família e de uma coletividade, cidadão e produto, inventor de técnicas e criador de sonhos” (UNESCO, 1987,16).

Dada a sociedade plural e desigual em que estamos imersos, cabe aos sistemas de ensino considerarem esses quatro princípios de maneira equilibrada, com a finalidade de que cada ser humano, tanto pessoa, como membro da sociedade, receba uma educação válida no plano cog-nitivo e prático. Isto supõe conceber a educação para além de uma visão puramente instrumental, utilizada para conseguir determinados resultados (experiência prática, aquisição de capacidades diversas ou para fins de caráter econômico), e buscar a sua função em toda sua plenitude. O que supõe a plena realização da pessoa, ou dito de outra forma, que toda pessoa aprenda a “ser” (Allan, 1999).

A partir do expressado nessas declarações e informes, podemos apontar que as causas funda-mentais que têm promovido o aparecimento da inclusão são de dois tipos: por um lado, o reconhe-cimento da educação como um direito, e, por outro, a consideração da diversidade como um valor educativo essencial para a transformação das escolas.

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QuAlIDADE E EFICáCIA PARA toDos os Alunos: A EDuCAção InClusIvA

Cada vez com maior clareza a Educação Geral considera a necessidade de que todos os

alunos recebam uma educação de qualidade centrada na atenção das suas necessidades indivi-duais (Booth y Ainscow,1998). Objetivo que coincide plenamente com a finalidade da educação inclusiva, posto que reconhece a diversidade existente entre os alunos de uma classe, determinando que eles recebam uma educação de acordo com suas características, uma vez que incrementa as possibilidades de aprendizagem para todos (Daniels y Garner, 1999, Stainback & Stainback y Mora- vec,1999).

A filosofia da inclusão defende uma educação eficaz para todos, sustentada em que as escolas, enquanto comunidades educativas, devem satisfazer as necessidades de todos os alunos, sejam quais forem as suas características pessoais, psicológicas ou sociais (com independência de ter ou não deficiência).

Trata-se de estabelecer os alicerces para que a escola possa educar com êxito a diversidade de seu alunado e colaborar com a erradicação da ampla desigualdade e injustiça social, Howe, 1996; Slee,1996; Kerzner Lipsky & Gartner, 1996. Dessa maneira, a educação inclusiva enfatiza a necessidade de avançar até outras formas de atuação, em contraposições às práticas que têm caracterizado a integração escolar. Os educadores que têm se arriscado a educar com êxito as crianças com deficiência no marco da educação geral, sabem e argumentam que esses alunos “são um presente para a reforma educativa” (Villa e Thousand, 1995, 31). São estudantes que forçam a romper o paradigma da escolarização tradicional e obrigam a tentar novas formas de ensinar.

Por conseguinte, a educação inclusiva deve ser entendida como uma tentativa a mais de atender as dificuldades de aprendizagem de qualquer aluno no sistema educacional e como um meio de assegurar que os alunos, que apresentam alguma deficiência, tenham os mesmos direitos que os outros, ou seja, os mesmos direitos dos seus colegas escolarizados em uma escola regular.

Dito de outra forma: que todos sejam cidadãos de direito nas escolas regulares, bem-vindos e aceitos; formem parte da vida daquela comunidade escolar; e sejam vistos como um desafio a ser avançado (Booth & Ainscow/ 1998; Jan Pije, Meijer e Hegarty, 1997; Udistsky, 1993).

É desse modo, que o conceito de inclusão trata de abordar as diferentes situações que levam à exclusão social e educativa de muitos alunos. E dessa forma, faz referência não somente aos alunos com necessidades educacionais especiais, que sem dúvida têm que seguir sendo atendidos, seguir dando as suas respostas educativas e recebendo o apoio correspondente. Mas, senão, a todos os alunos das escolas. Ainda que este conceito esteja evoluindo, nesse momento pode ser muito útil considerá-lo como um agente de mudança conceitual. Especialmente, quando defende que não bas-ta que os alunos com necessidades educacionais especiais estejam integrados às escolas comuns, eles devem participar plenamente da vida escolar e social dessa comunidade escolar. Isto significa que as escolas devem estar preparadas para acolher e educar a todos os alunos e não somente aos considerados como “educáveis”. Por isso, a inclusão assume que a convivência e a aprendizagem em grupo é a melhor forma de beneficiar a todos, não somente às crianças rotuladas como diferen-tes (Forest & Pearpoint, 1992).

A educação inclusiva é antes de tudo uma questão de direitos humanos, já que defende que não se pode segregar a nenhuma pessoa como conseqüência de sua deficiência, de sua dificuldade

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de aprendizagem, do seu gênero ou mesmo se esta pertencer a uma minoria étnica (seria algo que iria contra os direitos humanos). Em segundo lugar, é uma atitude, representa um sistema de valores e de crenças, não uma ação simplesmente, mas sim um conjunto de ações. Uma vez adotada esta perspectiva por uma escola ou por um sistema de ensino, deverá condicionar as decisões e ações de todos àqueles que a tenham adotado, posto que incluir significa ser parte de algo, formar parte do todo, enquanto que excluir significa manter fora, apartar, expulsar (Falvey & outros, 1995).

Na opinião de Booth (1998a), a noção de inclusão compreende dois conceitos básicos: o de comunidade e o de participação. Ambos caracterizam-se por sua conexão com os processos de in-clusão e o caráter de processo atribuído a ela. Portanto, a educação inclusiva se propõe a aumentar a participação de todos os alunos no currículo escolar e a redução da exclusão escolar e social, o que pode ser comprovado nas seguintes definições:

“[...] é o meio mais efetivo de combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando a educação para todos, além disso proporciona uma educação eficaz para a maioria das crianças, melhora a eficácia e, por fim, a relação custo-efetividade de todo o sistema educativo” (UNESCO, Declaração de Salamanca 1994, XI). “O acesso de estudantes aos mesmos colégios que os irmãos e os vizinhos, pertencer às classes de educação geral com companheiros de uma idade apropriada, a existência de alguns objetivos de aprendizagem individualizados e relevantes, e do apoio necessário para aprender” (York 1994, p.3).

[...] é uma forma de vida, uma maneira de viver juntos, baseado na crença de que cada indivíduo é valorizado e pertence ao grupo. Uma escola inclusiva será aquela em que todos os alunos sintam-se incluídos” (Patterson 1995, p. V).

“É uma atitude, um sistema de valores, de crenças, não uma ação nem um conjunto de ações. Centra-se, pois, em como apoiar as qualidades, e, as necessidades de cada aluno e de todos os alunos na comunidade escolar, para que se sintam bem-vindos e seguros e alcancem êxitos” (Arnaiz 1996, p. 27-28).

“Um sistema de educação que reconhece o direito a todas as crianças e jovens a compar-tilharem de um meio ambiente educativo comum em que todos sejam valorizados por igual, com independência das diferenças percebidas quanto à capacidade, sexo, classe social, etnia ou estilo de aprendizagem” (Armstrong 1999, p. 76).

“É uma forma melhor de viver. É o oposto da segregação e do “apartheid”. A inclusão deter- mina aonde vivemos, recebemos educação, trabalhamos e nos divertimos. Tem que ver com a mudança de nossos corações e valores” (Pearpoint & Forest 1999, p.15).

“Processo de incremento da participação dos alunos nas culturas, currículos e comunidades de suas escolas locais e da redução da sua exclusão dos mesmos, sem esquecer que a edu-

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cação abarca muitos processos que se desenvolvem fora das escolas [...] Processo sem fim, em vez de um simples contínuo dentro da educação geral” (Ainscow 2001, p. 293 – 294).

“É o modo de avançar” (Dyson 2001, p. 146).

Como se depreende dessas definições, a educação inclusiva centra-se em como apoiar as qua-lidades e as necessidades de cada um e de todos os alunos na comunidade escolar, para que se sintam bem-vindos e seguros e alcancem o êxito. Requer pensar na heterogeneidade do alunado como uma situação normal do grupo/classe e pôr em marcha um delineamento educativo que per-mita aos docentes utilizar os diferentes níveis instrumentais e atitudinais como recursos intrapessoais e interpessoais que beneficiem a todos os alunos (Mir, 1997). Defende a passagem da educação segregada para um sistema inclusivo caracterizado por uma aprendizagem significativa centrada na criança. Seria a transformação de uma sociedade e um mundo intolerante e temeroso para um mundo que acolha e encare a diversidade como algo natural.

Portanto, reivindica uma ação educativa que responda de maneira mais eficaz à diversidade de todos os alunos. Este ponto de vista tem dado lugar a uma série de modelos, tais como: a escola especial (Dessent, 1987), a escola efetiva para todos (Ainscow, 1991), a escola “adhocrática” (Skrtic, 1991b), a escola heterogênea (Villa e Thousand, 1992) ou a escola inclusiva (UNES- CO, 1994, Declaração de Salamanca). Todos esses modelos se apoiam na crença de que é possível identificar um conjunto de características organizativas que tendem a fazer as escolas mais ou menos inclusivas, como se aborda mais adiante.

Booth, em numerosos trabalhos (1996, 1998, 1999), diz que o termo inclusão não significa o mesmo em todos os países. Razão pela qual este autor considera que inclusão é um termo escorre-gadio, porque pode adquirir significados diferentes em contextos distintos. Por isso, ele afirma que: “mais do que lhe outorgar um significado unívoco, tem-se que analisá-lo dentro de uma ampla gama de discursos,” sendo, em sua opinião, adequado falar de inclusões.

Essa postura, também assumida por Dyson (2001), leva-o a realizar uma análise da situação existente no contexto internacional. A pesquisa propõe quatro variedades de conceber a inclusão, e determina que a política educativa deve precisar com clareza a variedade de inclusão que se quer promover e também conhecer seus pontos fortes e fracos.

A InClusão CoMo ColoCAção

Este modelo foi amplamente desenvolvido com o movimento da integração escolar na Europa. Seu principal objetivo é concretizar o lugar aonde serão escolarizados os alunos com necessidades educacionais especiais. Ainda que esta acepção, centrada em um determinado es- paço, tenha sido fortemente criticada naqueles contextos, nos quais a integração vem funcionando há muito tempo, em outros, onde a integração não existe, representa o reconhecimento dos direitos civis de nume-rosas pessoas com deficiências que não têm acesso à educação ou que seguem segregados nos centros de educação especial. Para que isto se converta em realidade, precisa-se de uma mudança nas atitudes e valores do professorado que se traduzam em mudanças práticas que respeitem esses direitos. Não obstante, a partir deste enfoque, centrado na questão de saber-se qual o melhor lugar para o aluno ser atendido, não se debate como seriam essas práticas.

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A InClusão CoMo EDuCAção PARA toDos

Provém essencialmente do trabalho desenvolvido pela UNESCO em prol de que a educação chegue a todas as crianças em idade escolar, como indicamos anteriormente. Seu reconhecimento decisivo acontece em 1994 com a Declaração de Salamanca, momento em que se adota interna-cionalmente o termo de educação inclusiva. Assim, se proclama que os sistemas educativos devem desenvolver programas que respondam a vasta variedade de características e necessidades da diversidade do alunado, fazendo um esforço especial no caso das crianças marginalizadas e desfa-vorecidas. Quer dizer, representa uma defesa explícita à igualdade de oportunidades enumeradas no contexto dos direitos humanos como conjunto e, de maneira particular, nos direitos humanos das crianças. Estabelece- se, assim, um debate social, educativo e de recursos tendendo ao desen-volvimento da educação nos países mais pobres, o que dará lugar a numerosas reuniões e ações internacionais, concebidas com a finalidade de melhorar a situação de deterioração dos serviços educacionais em numerosos países.

“O desenvolvimento de escolas inclusivas – escolas capazes de educar a todas as crianças – não é portanto unicamente uma forma de assegurar o respeito dos direitos das crianças com deficiência de forma que tenham acesso a um ou outro tipo de escola, senão que constitui uma estratégia es-sencial para garantir que uma ampla gama de grupos tenha acesso a qual- quer forma de escolari-dade” (Dyson 2001, 150).

A InClusão CoMo PARtICIPAção

Seu principal interesse centra- se em conhecer se as crianças são educáveis, como se leva a cabo essa situação e até que ponto elas participam dos processos educativos. Este enfoque quer remediar a antiga noção de integração, entendida como uma mera mudança de lugar da escola especial para a regular. Esta forma de entender a inclusão reivindica a noção de pertencer, uma vez que considera a escola como uma comunidade acolhedora em que participam todas as crianças. Assim, se ocupa do “locus”, no qual são educados os alunos e como estes participam dos processos que animam a vida das escolas, além de que cada aluno aprende na medida de suas possibilidades. De igual forma, cuida para que ninguém seja excluído por suas necessidades especiais, ou por per-tencer a grupos étnicos ou lingüísticos minoritários, por não ir freqüentemente a aula, e, finalmente, ocupa-se dos alunos em qualquer situação de risco. Dessa maneira, traça-se uma forma particular de conceber a sociedade, que entende o pluralismo não como uma forma de exercer o direito de ser diferente isolando-se, senão por meio de um sentimento de compartilhar e pertencer. Considerando-se que a igualdade leva à inclusão, e a desigualdade à exclusão.

A InClusão soCIAl

A educação inclusiva é um meio privilegiado para alcançar a inclusão social, algo que não deve ser alheio aos governos e estes devem dedicar os recursos econômicos necessários para es-tabelecê-la. Mais ainda, a inclusão não se refere somente ao terreno educativo, mas o verdadeiro significado de ser incluído. Está implícita na inclusão social, a participação no mercado de trabalho competitivo, sendo este o fim último da inclusão:

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“Os alunos não podem considerar-se incluídos até que não adquiram as atitudes necessárias para participar na sociedade e no emprego e/ou até que as diferenças entre suas atitudes e as de seus iguais seja considerável” (Dyson 2001, p.157).

Ainda que essas acepções da inclusão apresentem suas próprias peculiaridades, seus pontos em comuns se estabelecem no que se refere ao seu compromisso pela criação de uma sociedade mais justa, pelo desejo de criar um sistema educativo mais eqüitativo. Além disso, pela convicção de que a resposta das escolas regulares frente à diversidade estudantil, e especialmente frente aos grupos de estudantes marginalizados, constitui um meio de tornar real os seus compromissos.

IntEGRAção vERsus InClusão ou InClusão CoMo uMA ContInuIDADE DA IntEGRAção?

Desde o surgimento do movimento da inclusão, tem-se levantado um interessante debate acerca de se a inclusão supõe uma ruptura a respeito dos pressupostos da integração escolar, ou se entre ambos pode-se estabelecer um laço contínuo. Não resta dúvida de que a inclusão funde suas ra-ízes no movimento da integração escolar e no REI. Não obstante, ainda que exista um continuum entre eles, a educação inclusiva apresenta tendências alternativas que ampliam e fazem avançar a atenção à diversidade do alunado, dada as fortes críticas relacionadas com o processo integrador (Peralta, 2001).

Inicialmente, com o propósito de efetivar esses princípios norteadores, os esforços centraram-se em conseguir que as pessoas com deficiência fossem integradas nas salas comuns das escolas regu-lares ou na mais adequada para elas. A partir da evolução da experiência da integração escolar em diferentes países, viu-se que na maioria dos casos esta integração não ocorreu. Em conseqüên-cia, o objetivo principal da inclusão centra-se em desenvolver uma educação eficaz para todos os alunos (Sebba, 1997), posto que a segregação categórica de qualquer subgrupo de pessoas é simplesmente uma violação dos direitos civis e do princípio de igualdade da cidadania (Villa e Thousand, 1995).

O movimento da integração escolar supôs estabelecer as primeiras tentativas, por questionar e rechaçar a segregação e o isolamento em que se encontravam as pessoas com deficiência nos centros de educação especial. Em um primeiro momento, as classes especiais foram consolidadas dentro de um centro escolar, e, mais tarde, à assistência dos alunos com deficiência em tempo par-cial foi estabelecida na classe regular. Todavia, esta modalidade está bastante generalizada e vem apresentando enormes barreiras para ser erradicada. A inclusão dirige seu olhar a todos os alunos, já que todos podem experimentar dificuldades de aprendizagem em um dado momento (Ainscow, 1995). Dessa forma, as estratégias de trabalho que ela estabelece são direcionadas para favorecer a aprendizagem de todos os alunos na classe regular (Murphy, 1996; Thomas,1997; Potts, 1998).

Na integração, para que um aluno com necessidades educacionais especiais pudesse estar numa classe regular, era necessário que apresentasse dificuldades médias ou comuns. Na inclusão, todos os alunos são membros de direito da classe regular, sejam quais forem suas características pessoais.

“Os alunos com necessidades especiais não requerem integração. Requerem educação” (Heyarty & Pocklington 1981, p. 23).

Uma das críticas mais comuns feitas ao movimento da integração escolar é relativa às definições difundidas sobre seu próprio conceito. Essas definições, em muitas ocasiões, dizem muito pouco

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sobre a qualidade da educação oferecida aos alunos com necessidades educacionais especiais no sistema educacional. Ainda que se saiba que esses alunos estavam escolarizados nas classes regulares, conhece-se pouco do processo de ensino-aprendizagem que seguiam. Constatou-se que um aluno podia estar integrado e passar bastante tempo isolado na sala de apoio, ou estar na sala regular, porém sem interagir com seus companheiros. Em ambos os casos, o programa de trabalho seguido pelos alunos com necessidades educacionais especiais diferenciava-se bastante do desen-volvido pelo grupo da classe regular, e a comunicação entre o professor de classe comum e o de apoio era escassa, (Arnaiz e outros, 2001).

Outro aspecto questionado pela inclusão é a forma como os alunos foram considerados como “especiais” no contexto da integração, posto que obedecia a decisões, fundamentalmente, políticas e econômicas, em lugar de se proceder a uma revisão dos processos que podem dar lugar a ele. Pode-se dizer que são decisões guiadas por uma visão da educação especial que interpreta as di-ficuldades de aprendizagem exclusivamente a partir do déficit do aluno, o que promove a injustiça e detém os progressos neste campo. Com certeza, também, condiciona a colocação dos alunos nas escolas comuns ou especiais. Ante esta consideração, os defensores da inclusão manifestam a necessidade de reconstruir o conceito de necessidades educacionais especiais, ao defender que na inclusão não somente temos que considerar o déficit do aluno, senão, também as dificuldades que ele experimenta, considerando o contexto educativo, a organização da sala, e como se de-senvolvem os processos de ensino-aprendizagem nas escolas inclusivas (Slee, 1991; Ortiz, 1996). Essas considerações levam Skrtic (1991) a afirmar que: “os alunos com necessidades educacionais especiais são artefatos do currículo tradicional.”

E, ainda, recomenda às escolas a revisão de sua organização e suas formas de ensino, com a finalidade de responder positivamente à diversidade de seus alunos.

Assim como a “normalização” produz uma luta contra os pressupostos da educação especial mais tradicional, a inclusão estabelece uma forte crítica ao modelo deficitário implícito nas práticas de integração escolar. Com esta finalidade revisa-se as estratégias de trabalho das aulas para romper definitivamente com o subsistema de educação especial que tem caracterizado as práticas associadas à integração escolar. Nesse contexto, muitos alunos diagnosticados com necessidades educacionais especiais, os chamados alunos de integração, têm experimentado situações discrimi-natórias e segregadoras. Poder-se-ia dizer que para muitos alunos com deficiência a integração em escolas e classes regulares tem legitimado um subsistema de educação especial dentro da escola comum, que tem dando lugar a formas mais sutis de segregação. Por isso, a inclusão é vista por muitos como uma luta contra as concepções e práticas educativas que se associam ao modelo mé-dico-psicológico.

Na opinião de Cobertt (1999), com o conceito de integração tem-se fomentado práticas de exclusão, porque geralmente era a pessoa com deficiência que estava obrigada a integrar-se na comunidade escolar e de forma ativa. A responsabilidade é colocada sobre o que é diferente; a ên-fase recai sobre o aluno com deficiência, já que este deve integrar- se à cultura dominante. Portanto, existe uma grande exigência para quem não pode compartilhar os sistemas de valores dominantes. Na inclusão, pelo contrário, é a instituição que cria um clima de receptividade, flexibilidade e sen-sibilidade a qualquer aluno que seja escolariza-do nela.

Ainscow, Farrell e Tweddle (2000) consideram a integração como um movimento dos alunos dos programas especiais para a educação regular, enquanto que a inclusão faz referência ao grau de

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

participação desses alunos nas atividades e experiências da escola regular. Assim, podemos ver que enquanto a integração tem a ver com as pessoas, a inclusão refere-se aos valores da comunidade.

A perspectiva da educação inclusiva, imersa no marco da escola compreensiva e das escolas eficazes, traça um modelo curricular que inspira sobre como reformar as escolas, as práticas educati-vas e a formação dos professores, com o fim de proporcionar uma educação de qualidade ajustada às características de todos alunos. A educação inclusiva promove a reforma dos sistemas educati-vos, e coloca em juízo de valor as teorias e hipóteses inerentes à educação especial (Ballard,1997; Bayley,1998; Clarck e al., 1998; Rouse & Florian, 1969). Inicia-se, dessa forma, uma análise muito mais radical relativa a sua política e a sua prática, desde os pressupostos de disciplinas como a Sociologia, a Política e a Filosofia, além de outras.

Ainscow (1998), um dos principais defensores e promotores da inclusão em todo o mundo, afir-ma que: “a educação inclusiva vai muito além de atender ao alunado com necessidades educacio-nais especiais, uma vez que supõe a melhoria das práticas educativas para todos os alunos e para o conjunto da escola”.

“A inclusão não é somente para os alunos com deficiência, mas para todos os alunos, educado-res, pais e membros da comunidade” (Falvey e al. 1995, p.9).

De acordo com Ainscow (1995), as soluções construídas para atender às necessidades espe-ciais não devem dirigir-se exclusiva- mente aos alunos que experimentam dificuldades (do ponto de vista individual), ao invés disso, a resolução de problemas deve facilitar e apoiar a aprendizagem de todos os alunos (do ponto de vista curricular). Trata-se da necessidade de deixar de utilizar o ter-mo necessidades educacionais especiais, porque se na educação inclusiva entram todos os alunos não tem sentido falar de educação inclusiva para alunos com necessidades educacionais especiais, já que os mesmos formam parte de um plano de trabalho mais amplo de melhoria escolar que per-segue a igualdade e a excelência para todos os alunos. Portanto, enquanto a integração tem posto sua ênfase no aluno com necessidades educacionais especiais, a inclusão centra seu interesse em todos os alunos.

Isso implica que os professores revisem, junto a seus companheiros, o conceito que têm sobre dificuldades de aprendizagem e que ações eles devem colocar em prática. Dessa forma, e como in-dica Fulcher (1989) propõe-se que rompa sua visão individualizada e considere o contexto social e político. A perspectiva individualizada tem levado a que se estabeleçam tipos de alunos que reque-rem diferentes formas de ensinar e, portanto, diferentes tipos de professores, desviando a atenção de questões fundamentais como as formas de ensino que a es- cola estabelece para dar resposta à diversidade. A atenção às necessidades educacionais especiais tem sido considerada como uma tarefa técnica, que requer formas técnicas e recursos especiais, subestimando a interação social, exatamente como um meio de facilitar a aprendizagem (Ainscow e Tweddle,1988).

Esta mudança requer, sem dúvida, uma cultura de colaboração nas escolas que, respeitando a individualidade, apoie a resolução de problemas como uma estratégia de trabalho entre os profes-sores (Fullan, 1991; Thousand e Vi- lla,1991; Skrtic,1991). Além disso, reconhecer a reconstrução das necessidades especiais, em termos de melhoria da escola e do desenvolvimento do professor; fazer com que o professor estabeleça como ponto prioritário a resolução de problemas em grupo, visando a colaboração, posto que requer revisar e eliminar crenças e conceitos sobre a natureza das dificuldades de aprendizagem e a busca de novas alternativas.

Por causa disso, o termo inclusão está sendo adotado no contexto internacional (Estados Uni-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

dos, Canadá, Reino Unido) com a intenção de dar um passo adiante no que se chamou até agora de integração. As razões que justificam essa mudança, na opinião de Stainback, Stainback e Jackson (1999), são:

1. O conceito de inclusão comunica mais claramente e com maior exatidão, que todas as crian-ças necessitam estar incluídas na vida educativa e social das escolas comuns, e na sociedade em geral, não unicamente dentro da escola comum;

2. o termo integração está sendo abandonado, já que implica que a meta é integrar na vida escolar e comunitária alguém ou algum grupo que está sendo certamente excluído. O objetivo básico da inclusão é não deixar ninguém fora da escola comum. Incluir tanto do ponto de vista educativo, físico, como social;

3. a atenção nas escolas inclusivas centra-se em como construir um sistema que inclua e esteja estruturado para fazer frente às necessidades de cada um dos alunos. Não se assume que as escolas e salas tradicionais, que estão estruturadas para satisfazer as necessidades dos chamados normais ou da maioria, sejam apropriadas e que qualquer estudante deva encai-xar-se no que tenha sido desenhado para a maioria. Pelo contrário, a integração desses alunos deixa implícita que realmente estejam incluídos e participem na vida acadêmica. Nes-sa perspectiva, destaca-se a responsabilidade da equipe docente da escola, já que tem que se acomodar às necessidades de todos e a cada um de seus alunos; e

4. assim mesmo, existe uma mudança com respeito ao delineamento de ajudar somente a alunos com deficiência. O interesse centra-se agora no apoio à necessidade de cada membro da escola.

As sEGuIntEs CItAçõEs EvoCAM EssA MuDAnçA:

“[...] tem-se utilizado a palavra «integração» para descrever processos mediante os quais certas crianças recebem apoio com o propósito de que possam participar nos programas existentes em grande medida sem modificações dos colégios; pelo contrário, a “inclusão” sugere um desejo de reestruturação do programa do colégio para responder à diversidade dos alunos que recebem as aulas” ( Ainscow 1999, p.25).

“[...] o novo conceito de integração era, e ainda hoje é, muito problemático, sua análise reflete as tensões, contradições e ambigüidades que têm levado a algumas pessoas a definir a integra-ção como outro nome para designar a educação especial [...]. A educação inclusiva parece ser incompatível com um sistema que tem dado prioridade a mecanismos de evolução, similitude, co-mercialismo, elitismo, produtividade e noções de eficácia derivadas de sua perspectiva econômica e industrial [...]. examina o papel e as relações entre os profissionais e os deficientes, e explora as novas tendências educativas com respeito a sua relação e impacto sobre as políticas e práticas da educação” (Vlachou 1999, p.31- 57- 61).

Para Parrilla (2001), cabe reconhecer as diferenças entre a integração e a inclusão em um marco mais amplo, centradas nos direitos humanos, no fim dos rótulos e no modelo sociológico sob o qual interpretam a deficiência.

Em síntese, poder-se-ia dizer que o termo inclusão surge, a princípio, como uma alternativa à

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

integração; como uma tentativa de eliminar as situações de desintegração e exclusão em que se encontravam muitos alunos nas escolas, sob o enfoque da integração. Em segundo lugar, como uma tentativa de reconstruir o enfoque deficitário individualista e médico dominante, considerando seria-mente as vozes das pessoas com deficiência, e analisando as complexas relações de poder im-plicadas nesses controvertidos debates. E, em terceiro lugar, como uma reivindicação de que todos os alunos com ou sem necessidades educacionais especiais recebam uma educação de qualidade, nas classes comuns do sistema regular de ensino.

No seguinte quadro, e a título de resumo, aparecem as principais diferenças entre ambos conceitos:

inteGrAção incLuSãoCompetição Cooperação/solidariedadeSeleção Respeito às diferençasIndividualidade ComunidadePreconceitos Valorização das diferençasVisão individualizada Melhora para todosModelo técnico-racional Pesquisa reflexiva

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Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2.2. o direito de Ser diferente

cidinei Bogo chatt

1 IntRoDução

Nenhum ser humano é igual ao seu semelhante. Cada pessoa tem sua própria singularidade que a distingue como ser humano individual, em face de gosto, antipatia, talento, sexo, cultura, língua, religião e nacionalidade. Entretanto, as diferenças sempre alimentaram discórdias entre as pessoas e grupos sociais.

Álias, sob tal perspectiva, urge ressaltar que a humanidade tem presenciado ao longo de sua história uma sequência de intolerância à diferença. Ser rotulado de “diferente” sempre foi visto como sinônimo de inferioridade, de indesejável, de separado do grupo. Basta à pessoa ser considerada diferente para os tidos padrões “normais” para que todos passem a desprezá-la, considerando-a como um ser de outro mundo.

Nesse sentido, um dos problemas que deve ser enfrentado por toda humanidade é a tendência existente de definir as pessoas diferentes em termos negativos, de ver essas pessoas e o grupo ao qual pertencem como inferiores e não merecedores de respeito.

Isto se deve a prática de classificar as pessoas em grupos distintos e homogêneos, com base em cri-térios de cor, língua, cultura, nacionalidade, preferência sexual e religião. Sob este aspecto, os grupos são classificados em desejáveis ou indesejáveis, advindo daí, o desrespeito ao direito de ser diferente.

Historicamente os diferentes sempre foram vítimas de perseguições injustificadas. Cite-se como exemplo a perseguição aos judeus durante toda história da humanidade e mais recentemente duran-te a 2ª Guerra Mundial, onde o ódio ao semelhante levou a atrocidades sem precedentes, fato que ficou mundialmente conhecido como Holocausto.

Se não bastasse, as mulheres têm menos direitos que os homens; as pessoas portadoras de defici-ência ainda enfrentam dificuldades em ver seus direitos efetivamente implantados e os homossexuais ainda sofrem discriminação em face das suas preferências sexuais.

1 CHATT, Cidinei Bogo. O DIREITO DE SER DIFERENTE - Cidinei Bogo Chatt. Clubjus, Brasília-DF: 06 set. 2010. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.32089> Acesso em: 12 de outubro de 2016.

Quando perdemos o direito de ser diferentes, perdemos o privilégio de ser livres.

Charles Evans Hughes

suMÁrio: 1 Introdução; 2 Proibição de Qualquer Forma de Discriminação; 3 Princípio da Igualda-de Formal e Material; 4 Direito de Ser Diferente; 5 Da Tolerância; 6 Tolerância Versus Respeito; 7 Considerações Finais; 8 Referências.

1

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Atrocidades cometidas atualmente no Sudão, Ruanda e Iugoslávia têm demonstrado até onde os seres humanos ainda estão prontos a ir para negar aos outros o direito de ser diferente. Nós torna-mos uma sociedade que não respeita o direito do ser humano ser diferente.

Diante de desse quadro, a empreitada aqui proposta consiste em expor e defender a ideia de que na sociedade moderna e nos estados democráticos de direito não existe mais espaço para a discriminação, para a intolerância e o desrespeito ao direito do próximo de ser diferente.

2 PRoIbIção DE QuAlQuER FoRMA DE DIsCRIMInAção

A Constituição Federal de 1988 rejeita qualquer forma de discriminação ao proclamar que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, sendo invioláveis o direito à vida, à li-berdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Dessa forma, dentre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil está à promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Com efeito, não é permitido adotar qualquer tipo de discriminação em razão do sexo, origem, idade, cor, raça, estado civil, crença religiosa, convicção filosófica ou política, situação familiar, condição e saúde física sensorial e mental ou orientação sexual (gay, lésbica, travesti e bissexual).

Conforme assevera Rodrigo da Cunha Pereira o grande grito da contemporaneidade é o da igualdade. Aduz que a igualdade de refere aos direitos entre homens e mulheres, das raças, dos estrangeiros, das classes sociais etc. Ainda sobre o tema, alega que desde a Carta da ONU de 1948 ficou declarada a igualdade de direitos entre todos os homens (as pessoas).i

Nesse sentido, cumpre trazer à baila os ensinamentos de Firmino Alves de Lima, para quem, a Constituição Federal de 1988 trouxe importantes princípios gerais que asseguram a possibilidade de se efetivar a proibição da discriminação no ordenamento jurídico pátrio. A saber: (i) combate à discriminação como um dos objetivos da República; (ii) proibição da discriminação de qualquer espécie e por qualquer motivo nas relações de trabalho; (iii) intensa preocupação na proibição de determinados grupos historicamente discriminados, em especial a mulher, a discriminação pela cor da pele e o deficiente; (iv) reconhecimento como lícitas as formas de discriminação positiva como as ações afirmativas para combate a situações discriminatórias reiteradas e já consolida-das, promovendo igualdade de tratamento e de oportunidades; e (v) uma importante possibilidade de abertura do texto para incorporação de normas advindas de tratados internacionais, como normas de nível constitucional.ii

Partindo dessa percepção, faz-se necessário o desenvolvimento de medidas que visem a coibir qualquer forma de discriminação. Comportamentos que não toleram a diferença não podem mais ser admitidos em um Estado Democrático de Direito. E, para tanto, o preconceito e a discriminação devem ser alvos de repressão, de esclarecimento e de educação em políticas públicas em níveis federal, estaduais e municipais.

A pretensão de eliminar por completo qualquer forma de discriminação certamente não é uma ta-refa fácil. Contudo, urge ressaltar que são atitudes positivas que levarão toda sociedade a respeitar o direito à diferença.

Em suma, impor atitudes de reconhecimento dos direitos das pessoas diferentes é promover justiça e equidade. Numa sociedade dita “democrática” há que prevalecer a diversidade e a diferença natural e cultural entre as pessoas.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3 PRInCíPIo DA IGuAlDADE FoRMAl E MAtERIAl

Segundo Gregório Assagra de Almeida, em sentido vulgar o vocábulo “princípio”iii tem o signifi-cado de origem, começo, nascedouro. Por outro lado, assevera que no campo do direito a palavra “princípio” tem significado de normas elementares ou preceitos primordiais instituídos como alicerce de alguma coisa. Aduz que nessa concepção, os princípios exprimem sentido mais importante que as regras jurídicas e significam pontos básicos que constituem o próprio alicerce do direito.iv

Sob tal enfoque, Celso Antônio Bandeira de Mello define princípio como sendo mandamento nuclear de um sistema, o alicerce, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência. Segun-do este, violar um princípio é mais grave que transgredir uma norma.v

Com efeito, a Constituição Federal de 1988 consagrou tanto o princípio da igualdade formal, quanto o princípio da igualdade material. Pode-se dizer que a igualdade material encontra-se as-sentada no art. 3º do texto Constitucional, o qual determina que são objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil erradicar a pobreza e a marginalização, bem como a redução das desigualdades sociais e regionais. De outra banda, o caput do art. 5º da Constituição Federal prevê a igualdade formal, ou seja, a igualdade de todos perante a lei.

Noutras palavras, a igualdade formal impede que pessoas que se encontrem na mesma situação fática tenham tratamento desigual. Lado outro, em face do princípio da igualdade material, impõe-se à adoção de medidas reparadoras objetivando a redução das desigualdades de fato, por meio de tratamento diferenciado as pessoas de se encontrem em situações de desigualdade.

O tema entabulado também é tratado por Luiz Alberto David Araújo, para quem o princípio da igualdade tem duas vertentes: I – igualdade formal ou igualdade perante a lei: não se ad-mite qualquer privilegio, tratando-se igualmente todas as pessoas; II – igualdade material ou igualdade na lei: o texto constitucional cuida de realçar certos valores, direitos de pessoas ou grupos, os quais necessitam de proteção especial. Ou seja, está-se diante de uma autorização para desigualar.vi

Trata-se de discriminações positivas que constituem, na verdade, preceitos compensatórios como solução para superar as diferenças existentes. Nesse sentido, manifesta-se Berenice Dias, aduzindo que se deve atentar não é à igualdade perante a lei, mas ao direito à igualdade mediante a elimi-nação das desigualdades, o que impõe que se estabeleçam diferenciações específicas como única forma de dar efetividade ao preceito isonômico consagrado na Constituição.vii

Nessa conjuntura, insta ressaltar que o objetivo da Constituição Federal é a aplicação do princí-pio isonômico, tratando-se desigualmente os desiguais, ao se estabelecer um tratamento especial às pessoas diferentes.

Portanto, o princípio da igualdade surge como ponto de equilíbrio entre os direitos das pessoas “ditas” normais e das pessoas diferentes. É razoável entender que a pessoa diferente tem, pela sua própria condição, direito à quebra da igualdade.

4 DIREIto DE sER DIFEREntE vIII

Conforme asseverou Charles Evans Hughesix, quando perdemos o direito de ser diferentes, per-demos o privilégio de ser livres.x Nesse sentido, o princípio da igualdade defendido pelos direitos

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humanos assegura o respeito às diferenças e determina que todos devam ser tratados iguais quando a desigualdade puder implicar em prejuízo de alguns.

Nesse viés, a igualdade assegura ao ser humano o direito de ser diferente, de não ser submetido a tratamento de modificação de personalidade, proibindo qualquer forma de discriminação e de tratamento desigual em razão de origem, sexo, idade, cor, raça, estado civil, deficiência, crença religiosa, convicção filosófica ou política, situação familiar, orientação sexual etc.

Sábias são as palavras de Boaventura de Sousa Santos, esclarecendo que: “Temos o direito a sermos iguais quando a diferença nos inferioriza. Temos o direito a sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza. As pessoas querem ser iguais, mas querem respeitadas suas diferen-ças. Ou seja, querem participar, mas querem também que suas diferenças sejam reconhecidas e respeitadas.”

De outra parte, registre-se que a educação para o respeito à diferença deve ser iniciada desde cedo, com as crianças. Conforme ensinamento de Sigmund Freud, a nossa personalidade está intei-ramente formada até os 7 (sete) anos de idade, sendo que, a partir daí, é imutável.

Nessa perspectiva, cabe transcrever a brilhante lição do mestre Humberto Eco, ao asseverar que: “De-ve-se ensinar às crianças que os seres humanos são muito diferentes entre si e explicar-lhes em que se di-ferenciam, para então mostrar que essas diferenças podem ser uma fonte de enriquecimento para todos.”

A sociedade deve ter em mente que a diversidade ou diferença não é um problema, mas sim, uma solução. Todo ser humano tem o direito de ser autêntico, de ser diferente. Ora, o que todos queremos é ser feliz, inclusive, as pessoas diferentes.

Enfim, toda sociedade deve ser capaz de aceitar e conviver com as diferenças. Deve-se criar a consciência de que ser diferente é bom. Quanto mais pessoas se unirem em torna dessa idéia, mais rapidamente caminharemos para uma sociedade justa, pacífica e igualitária.

5 DA tolERânCIAxI

Sob o aspecto histórico, desde Aristóteles até a modernidade, a tolerância tem sido defendida como medida indispensável a ser adotada para manter a convivência humana pacífica. Tanto liberais como comunitaristas defendem a idéia de que devemos aceitar as diferentes formas de existência social.

Nesse sentido, cabe lembrar que a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclama que: (i) toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; (ii) de opinião e de expressão; e (iii) que a educação deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étnicos ou religiosos.

Inobstante, atualmente tem se presenciado uma crescente onda de intolerância em todo mundo. Alarmada, a Organização das Nações Unidas para Educação resolveu aprovar uma declaração de princípios sobre a tolerância, prescrevendo que: “todos os indivíduos e grupos têm o direito de ser diferentes.”xii

Marcelo Gustavo Andrade de Souza e Leandro Konderxiii sustentam que tolerar não é pouco, mas ao contrário, trata-se de um valor-atitude basilar, tanto no campo das normas éticas quanto no campo educacional. E mais, asseveram que tolerância é um mínimo moralmente exigível, aquele pouco que nos revela o fundamental. E o que é fundamental, na verdade, não é pouco, é sim o im-prescindível, o valioso, o essencial, aquilo que em hipótese nenhuma pode faltar em nossas relações sociais e muito menos na prática educativa.

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O exercício da tolerância inclui, em primeiro lugar, o respeito à outra pessoa. Isso não significa concordar incondicionalmente com o que está sendo dito, anular sua opinião ou se submeter ao que nos violenta ou faz mal. A tolerância nos permite considerar que existem, sim, diversas formas de olhar para a vida, outras maneiras de ser ou vários tipos de ideal. E que opiniões diferentes das nossas não significam, necessariamente, uma afronta pessoal.

A educação é o meio mais eficaz de criar uma cultura de tolerância. Ela pode estimular as crianças a serem mais abertas, curiosas e receptivas às diferenças. O acesso à educação também desenvolve o senso crítico para recusar a intolerância e o preconceito que podem estar presentes nos meios de comunicação, na família ou no ambiente social.

A tolerância requer um exercício diário de cada pessoa, deve-se adotar as seguinte atitudes: (i) avaliar se a opinião pessoal sobre determinada pessoa ou grupo não está fundamentada em preconceito; (ii) investigar quais são as crenças pessoais; (iii) tomar o cuidado de não julgar precipi-tadamente as pessoas; (iv) respeitar os modos de viver diferentes, pois vivemos em uma sociedade livre; (v) não tentar mudar as pessoas, aceita-las como elas são; (vi) procurar ser tolerante consigo mesmo, pois erar é humano.

Em suma, somente seremos felizes quando concretizarmos o disposto na Declaração de Princípios da Tolerância aprovada pela Organização das Nações Unidas para a Educação. Isto é: “A práti-ca da tolerância significa que cada pessoa é livre para escolher suas convicções e aceita que seu semelhante possa usufruir da mesma liberdade”.

6 tolERânCIA Versus REsPEIto xIv

A palavra tolerância provém da palavra tolerare que significa etimologicamente sofrer ou supor-tar pacientemente. O conceito tolerância radica numa aceitação assimétrica de poder: a) tolera-se aquilo que se apresenta como distinto da maneira de agir, pensar e sentir de quem tolera; b) quem tolera está, em princípio numa posição de superioridade em relação aquele que é tolerado.

Nesse sentido, pode-se definir a tolerância como sendo a capacidade de uma pessoa ou grupo social de aceitar, noutra pessoa ou grupo social, uma atitude diferente das que são tidas como normal.

Ser tolerante implica em aceitar que os outros pensem diferentes de nós, sem que isso possa nos levar a odiá-los. Assim, podemos ser tolerantes dentro do mesmo grupo; ser tolerantes face aos que não per-tencem ao nosso grupo; e tolerante as convicções e crenças dos outros que sejam diferentes das nossas.

Por outro lado, respeito é o apreço por, ou o sentido do valor e excelência de, uma pessoa, quali-dade pessoal, talento, ou a manifestação de uma qualidade pessoal ou talento. Em certos aspectos, o respeito manifesta-se como um tipo de ética ou princípio.

Nesta perspectiva, pode-se definir respeito como sendo a atitude de tomar em consideração ou preocupar-se com alguém ou uma coisa. Em outras palavras, respeito é uma atitude que consiste em não prejudicar alguém ou uma coisa. Cite-se como exemplos, a atitude de respeitar o bem do próximo, a liberdade, as tradições e crenças.

Segundo Ramiro Marques, pode-se dizer que tolerar não é amar, nem tão pouco apreciar. To-lera-se aquilo que não se gosta, mas que se é obrigado a aceitar e, na melhor das hipóteses, a compreender, para evitar o conflito e a violência. Segundo ele, estamos perante um valor necessário e importante, mas muito insuficiente.

E completa dizendo que seria um valor suficiente, caso a nossa vida ética se limitasse ao cum-

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primento dos deveres, ao respeito pelos contratos e ao respeito pela regra de outro, ou seja, da máxima “não faças aos outros o que não queres que te façam a ti”.

Partindo dessa percepção, Ramiro Marques assevera que a tolerância é um valor estruturante do campo social da ética, ou seja, do processo de ordenação e de hierarquização dos valores que norteiam o nosso relacionamento com os outros, com os grupos e com a sociedade. Não é, no entanto, um valor estruturante do campo pessoal da ética, ou, seja, do processo de hierarquização dos valores que norteiam e ordenam as prioridades de nossas vidas.

Assim, se comparada com o respeito, à tolerância não passa de um valor de resistência, o qual não pode deixar de ocupar uma posição subordinada ao respeito.

Noutras palavras, a tolerância obriga a obedecer à regra de outro: “não faças aos outros o que não queres que te façam a ti”. Com efeito, estamos perante uma ética do dever, deontológica, por-tanto que se limita a evitar a fazer mal aos outros. Trata-se de uma polaridade meramente passiva.

O respeito, ao invés da tolerância, carrega uma polaridade ativa, marcada pela preocupação com os outros e na qual vem impressa a indelével marca do amor.

Neste caso, a máxima “abstém-se de fazer mal aos outros” não é suficiente, porque ela é gover-nada pela passividade. Ora, o respeito é governado pela atividade e é, por isso, que a máxima que melhor se lhe aplica é “ama o próximo como a ti mesmo”.

Por esta razão, o respeito constitui uma virtude estruturante de uma ética do amor e da benevo-lência. O respeito é, portanto, uma virtude intermediária na longa e difícil travessia em direção ao cume da vida ética: o amor.

Locke escreveu no século XVII a Carta sobre a Tolerância. Que bom seria se, neste século XXI, estivesse ultrapassada a necessidade de tolerância e fosse à hora de escrever uma Carta sobre o Respeito.

O respeito constitui uma virtude que nunca pode pecar por excesso, porque quanto mais respeito se tem mais se ama, a tolerância é o exemplo de uma virtude que se obriga ao meio termo porque, em excesso, resulta em indiferença, e, em falta, traz o sabor da intolerância.

Sem mais delongas, tolerar é bom, mas respeitar é melhor. Respeitar é bom, mas amar é divino.

7 ConsIDERAçõEs FInAIs

Face ao exposto, podemos concluir que não se admite mais a adoção de qualquer tipo de dis-criminação em razão de sexo, origem, idade, cor, raça, estado civil, crença religiosa, convicção filosófica ou política, situação familiar, deficiência, orientação sexual etc.

Ilustrativas são as palavras de Charles Evans Hughes ao asseverar que quando perdemos o di-reito de ser diferentes, perdemos o privilégio de ser livres. Na esteira desse raciocínio, o princípio da igualdade defendido pelos direitos humanos assegura o respeito às diferenças e determina que todos devam ser tratados iguais quando a desigualdade puder implicar em prejuízo de alguns.

Cumpre ressaltar que toda sociedade deve ser capaz de aceitar e conviver com as diferenças. Tolerar a diferença nos permite considerar que existem diversas formas de olhar para a vida. Nesse diapasão, quanto mais pessoas se unirem em torna dessa ideia, respeito à diferença, mais rapida-mente caminharemos para uma sociedade justa, pacífica e igualitária.

Tolerar é bom, mas respeitar é melhor. Respeitar é bom, mas amar é divino. Em essência, pode-se dizer que todo ser humano tem por objetivo alcançar a felicidade, inclusive as pessoas diferentes e ninguém tem o direito de negar isso a elas.

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8 REFERênCIAs

ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito material coletivo: superação da summa divisio direito público e direito privado por uma nova summa divisio constitucionalizada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.DIAS, Maria Berenice. A solução para a desigualdade. Jornal Zero Hora. Porto Alegre. Publicado

em 28 maio 1997.LIMA, Firmino Alves. O princípio da proibição de discriminação no Direito Brasileiro. Disponível em:

<http://aulavirtual.upo.es:8900/webct/urw/lc102116011.tp0/CobaltMainFrame.dowe-bct>. Acesso em: 20 de set. de 2009.

MARQUES, Ramiro. A tolerância e o respeito em Aristóteles. Disponível em: <http://www.eses.pt/usr/ramiro/docs/etica_pedagogia/TOLER%C3%82NCIA%20E%0O%20RESPEITO%20ARIST%-C3%93TELES.pdf>. Acesso em: 20 de set. 2009.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1990.PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A desigualdade dos gêneros, o declínio do patriarcalismo e as dis-

criminações positivas. Disponível em: <http://www.gontijofamilia.adv.br/tex151.htm>. Acesso em: 20 de set. de 2009.

SOUZA, Marcelo Gustavo Andrade de; KONER, Leandro. Tolerar é pouco? Por uma filosofia da educação a partir do conceito de tolerância. Rio de Janeiro, 2006. [Tese de Doutorado – Depar-tamento de Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro].

Organização das Nações Unidas para Educação – UNESCO. Declaração de princípios sobre a tolerância. Aprovada pela Conferência Geral em sua 28ª reunião em Paris, em 16/11/1995

i PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A desigualdade dos gêneros, o declínio do patriarcalismo e as dis-criminações positivas. Disponível em: <http://www.gontijofamilia.adv.br/tex151.htm>. Acesso em: 20 de set. de 2009.

ii LIMA, Firmino Alves. O princípio da proibição de discriminação no Direito Brasileiro. Disponí-vel em: <http://aulavirtual.upo.es:8900/webct/urw/lc102116011.tp0/cobaltMainFrame.dowebct>. Acesso em: 20 de set. de 2009.

iii “Princípio derivado do latim principium (origem, começo) em sentido vulgar quer exprimir o come-ço da vida ou o primeiro instante em que as pessoas ou as coisas começaram a existir. É, ampla-mente, indicativo do começo ou origem de qualquer coisa. No sentido jurídico, notadamente no plural, quer significar as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixaram para servir de norma a toda ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Desse modo, exprimem sentido. Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-se em axiomas”. (SILVA, De Plácido e. Voca-bulário Jurídico. V.III. Rio de Janeiro: Forense. 1989. p. 433.).

iv ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito material coletivo: superação da summa divisio direito público e direito privado por uma nova summa divisio constitucionalizada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 443.

v MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1990.

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vi ARAÚJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. 2. ed. Brasília: CORDE, 1996.

vii DIAS, Maria Berenice. A solução para a desigualdade. Jornal Zero Hora. Porto Alegre. Publicado em 28 maio 1997. p. 23.

viii Conforme Artur da Távola: “A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem mo-radas deslumbrantes que eles guardam para os pouco capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois.”

ix Charles Evans Hughes (11/04/1862 – 27/08/1948) foi advogado e político dos Estados Unidos da América. Foi governador de Nova Iorque entre 1907 e 1910, juiz associado da Suprema Corte dos Estados Unidos de 10/10/1910 a 10/06/1916, candidato à presidência pelo Partido Republicano na eleição presidencial de 1916 (onde foi derrotado por Woodrow Wilson), Secretário de Estado entre 1921 e 1925 e Chefe de Justiça dos Estados Unidos da América de 24/02/1930 a 30/06/1941.

x Discurso em Faneuil Hall, Boston, Massachusetts, sobre o 150º aniversário da Batalha de Bunker Hill (17 junho 1925).

xi O art. 1º da declaração sobre princípios da tolerância da UNESCO estabelece o significado da tolerância:

1.1 A tolerância é o respeito, a aceitação e a apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a aber-tura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz.

1.2 A tolerância não é concessão, condescendência, indulgência. A tolerância é, antes de tudo, uma atitude ativa fundada no reconhecimento dos direitos universais da pes-soa humana e das liberdades fundamentais do outro. Em nenhum caso a tolerância poderia ser invocada para justificar lesões a esses valores fundamentais. A tolerância deve ser praticada pelos indivíduos, pelos grupos e pelo Estado.

1.3 A tolerância é o sustentáculo dos direitos humanos, do pluralismo (inclusive o pluralis-mo cultural), da democracia e do Estado de Direito. Implica a rejeição do dogmatismo e do absolutismo e fortalece as normas enunciadas nos instrumentos internacionais relativos aos direitos humanos.

1.4 Em consonância ao respeito dos direitos humanos, praticar a tolerância não significa tolerar a injustiça social, nem renunciar às próprias convicções, nem fazer concessões a respeito. A prática da tolerância significa que toda pessoa tem a livre escolha de suas convicções e aceita que o outro desfrute da mesma liberdade. Significa aceitar o fato de que os seres humanos, que se caracterizam naturalmente pela diversidade de seu aspecto físico, de sua situação, de seu modo de expressar-se, de seus comportamentos e de seus valores, têm o direito de viver em paz e de ser tais como são. Significa também que ninguém deve impor suas opiniões a outrem.” Organização das Nações Unidas para Educação – UNESCO. Declaração de princípios sobre a tolerância. Aprovada pela Conferência Geral em sua 28ª reunião em Paris, em 16/11/1995.

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xii Organização das Nações Unidas para Educação – UNESCO. Declaração de princípios sobre a tolerância. Aprovada pela Conferência Geral em sua 28ª reunião em Paris, em 16/11/1995.

xiii SOUZA, Marcelo Gustavo Andrade de; KONER, Leandro. Tolerar é pouco? Por uma filosofia da educação a partir do conceito de tolerância. Rio de Janeiro, 2006. [Tese de Doutorado – Depar-tamento de Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro].

xiv Tem por base o artigo de Ramiro MARQUES. A tolerância e o respeito em Aristóteles.

Sumário

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2.3. o direito à diferençA nAS eScoLAS

maria tereza mantoan

Pautadas para atender a um aluno idealizado e ensinando a partir de um projeto escolar elitista, meritocrático e homogeneizador, as escolas produzem quadros de exclusão que têm, injustamente, prejudicado a trajetória educacional de muitos estudantes.

Por processos compensatórios e de normalização as escolas comuns e especializadas proclamam o seu poder e propõem sutilmente, com base em características devidamente selecionadas como positivas, a eleição arbitrária de uma identidade “normal” que regula as suas práticas educativas e a promoção de seus alunos. Contrariar a perspectiva de uma escola que se pauta por esses padrões conceptuais e organizacionais é fazer a diferença, reconhecê-la e valorizá-la.

Somos diferentes de fato e queremos ser, agora, diferentes de direito, na escola e fora dela. Pautamo-nos pelo direito de ser, sendo diferentes. (Pierucci, 1991). Vale, contudo, a ressalva de sermos iguais, quando a diferença nos inferioriza e de sermos diferentes, quando a igualdade nos descaracteriza. (Souza Santos, 1995)

Conviver, reconhecendo e valorizando as diferenças é uma experiência essencial à nossa existên-cia, e um caminho para que se ensine a paz, a solidariedade entre as pessoas. Mas, é essencial que definamos a natureza dessa convivência, distinguindo o estar com o outro do estar junto ao outro.

Estar junto ao outro tem a ver com o que o outro é - um ser que não é como eu sou, que não sou eu. Essa relação forja uma identidade, imposta e forjada e rotulada pelo outro.

Estar com o outro tem a ver com quem é esse outro, esse desconhecido, um enigma, que tenho de decifrar, e que vai sendo desvelado, na medida em que se constrói entre nós um vínculo, pelo qual nos confrontamos, nos identificamos e nos constituímos como seres singulares e mutantes. (Sil-va,2000)

No desejo de assegurar a homogeneidade das turmas escolares, destruíram-se muitas diferenças que consideramos valiosas e importantes, hoje, nas salas de aula e fora delas.

Mas a identidade fixa, estável, acabada, própria do sujeito cartesiano unificado e racional está em crise (Hall, 2000) e a ideia de uma identidade móvel, volátil é capaz de desconstruir o sistema de significação excludente, elitista da escola atual, com suas medidas e mecanismos arbitrários de produção da identidade e da diferença.

Se o mote é uma educação para a paz, temos, então, de assumir uma posição contrária à pers-pectiva da identidade “normal”, que justifica a falsa uniformidade das turmas escolares.

1 O direito à diferença nas escolas.Disponível em: <https://undime.org.br/noticia/o-direito-a-diferenca-nas-escolas>

Acesso em: XXXXXXX2 Maria Tereza Mantoan - Doutora em Educação; professora dos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade

de Educação da Unicamp/SP; coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade - LEPED/

FE/Unicamp; autora de livros e artigos sobre educação escolar.e-mail:[email protected]

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A diferença é, pois, o conceito que se impõe para que possamos defender a tese de uma escola para todos. De certo que as identidades naturalizadas dão estabilidade ao mundo social, mas a mistura, a hibridização, a mestiçagem as desestabilizam, constituindo uma estratégia provocadora, questionadora e transgressora de toda e qualquer fixação da identidade. (Silva 2000; Serres 1993)

A escola tem resistido a mudanças exigidas por uma abertura incondicional às diferenças, porque as situações que promovem esse desafio e mobilizam os educadores a rever e recriar suas práticas e a entender as novas possibilidades educativas trazidas pela inclusão estão sendo constantemente neutralizadas por políticas educacionais, diretrizes, currículos, programas compensatórios (reforço, aceleração entre outros). Esta saída tem permitido às escolas escaparem pela tangente e a se livra-rem do enfrentamento necessário com sua organização pedagógica excludente e ultrapassada.

(...)

REFERênCIAs bIblIoGRáFICAs:

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade; trad. Tomás T. da Silva e Guacira L. Louro. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.

MORIN, Edgard.A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

SANTOS, Boaventura de Souza. Entrevista com Prof. Boaventura de Souza Santos. (On line). Dispo-nível: http://www.dhi.uem.br/jurandir/jurandir-boaven1.htm, 1995.

SERRES, Michel. Filosofia Mestiça: le tiers - instruit. Trad. Maria Ignez D. Estrada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1993.

SILVA, Tomás Tadeu da. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis/RJ: Vozes, 2000.

PIERUCCI, Antonio. Flávio.As ciladas da diferença. São Paulo: Editora 34, 1999.

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2.4. nA eScoLA, dAr mAiS A quem tem menoS: entreviStA com phiLippe perrenoud

por: rodrigo ratier ([email protected]), de Brasília, df

Referência na Educação, suíço defende que gestores e professores mobilizem sua dedicação aos alunos com maior dificuldade

Se você passou pelas aulas de Sociologia da Educação ou leu alguma obra da área, é pro-vável que já tenha ouvido falar da clássica noção da escola reprodutora. Em linhas gerais, a ideia é a seguinte: em vez de atuar como uma instituição em que todo os jovens e as crianças têm acesso a um conjunto de conhecimentos para uma vida digna, a escola, na prática, exer-ce o papel inverso, aumentando as desigualdades da origem socioeconômica - reproduzindo, portanto, uma realidade social injusta. Aos alunos das classes privilegiadas, filhos de pais com elevada escolaridade e que têm em casa acesso a um amplo repertório cultural (livros, música, artes plásticas etc.), está reservado o avanço às etapas mais altas de ensino - e as vantagens decorrentes desse percurso estendido, como salários mais altos. Para os estudantes das classes populares, menos preparados para as exigências da vida acadêmica, o caminho é pontuado por notas baixas, repetência e, em muitos casos, o abandono do estudo. Como, aliás, ocorreu décadas antes com os pais deles.

É o caso de perguntar: quando um aluno fracassa, a culpa é dele próprio (que não estudou direito) ou da escola (que não ensinou bem)? Para Philippe Perrenoud, um dos mais respei-tados pensadores contemporâneos da Educação, não há dúvida de que grande parte do problema encontra-se, sim, na instituição. Mais precisamente, na forma em que ela organiza sua atuação, oferecendo a todos os alunos o mesmo ensino, com a mesma metodologia, exer-cícios semelhantes e avaliações idênticas. “Tratamos as crianças como se elas fossem iguais, porém a diversidade de culturas, modos de vida e relações com o conhecimento é enorme.” Na opinião do sociólogo suíço, professor da Universidade de Genebra, a tarefa de uma es-cola que não exclui ninguém é oferecer uma Pedagogia que ele batiza de diferenciada, que considere - e atenda - as necessidades de cada um, dedicando mais atenção e energia a quem precisa mais. É a chamada discriminação positiva. Durante o Congresso Internacional da Rede Católica de Ensino, em Brasília, ele recebeu a equipe de GESTÃO ESCOLAR para explicar como diretores e coordenadores podem trabalhar para que suas escolas não deixem ninguém para trás.

1 Revista Gestão Escolar. NA ESCOLA, DAR MAIS A QUEM TEM MENOS: ENTREVISTA COM PHILIPPE PERRENOUD.

Disponível em: <http://gestaoescolar.abril.com.br/aprendizagem/philippe-perrenoud-escola-dar-mais-quem-tem-me-

nos-739260.shtml?page=1>. Acesso em: 31 out. 2016.

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A constatação de que a escola amplia as desigualdades socioeconômicas entre os alunos foi feita há quase meio século. de lá para cá, a situação mudou de alguma maneira?

pHilippe perrenoud Não muito. A diferença é que antes havia uma separação entre as classes privilegiadas - que chegavam às etapas superiores de estudo - e todas as outras, que não conse-guiam. A partir dos anos 1960, as classes médias obtiveram acesso à universidade, mas as cama-das populares ainda não. As desigualdades se deslocaram de patamar, mas continuam existindo.

A escola básica tem responsabilidade por essa situação?

pHilippe perrenoud Sim, na medida em que não consegue reduzir as desigualdades. Ela é eficaz apenas para uma parte dos alunos, menos para outra parcela e muito pouco para cerca de 20%. Esses abandonam os estudos ou aprendem quase nada. E de onde vêm esses 20%? São as crianças de classes populares, justamente as que mais precisam aprender, pois não têm recursos em seu local de origem. A escola deveria se concentrar nesses casos, em que ela é insubstituível. Não é o que observamos.

por que os sistemas educacionais da maioria dos países não têm alcançado o objetivo de fazer com que todos aprendam?

pHilippe perrenoud Porque a maioria trata os alunos como se eles fossem todos iguais. Sa-bemos que isso não é verdade. Na prática, o que ocorre é que, mesmo com boas condições de ensino, ninguém aprende no mesmo ritmo nem da mesma maneira. Igualdade de oportunidades não garante igualdade na aprendizagem.

por que isso ocorre?

pHilippe perrenoud A aprendizagem depende não apenas de como o professor ensina mas também do que crianças e jovens trazem em termos de origem sociocultural e, claro, de seu interesse e sua dedica-ção. Podemos pensar no exemplo de dois adolescentes de 15 anos que estudaram a vida inteira juntos. Imaginemos que um saiba ler e o outro não. Um terá aprendido muito do que foi ensinado e o outro não terá tirado proveito das propostas. Muita gente pode dizer que o fracasso escolar é culpa do aluno que não se esforçou. Discordo. Precisamos dar assistência maior aos que não têm vontade de aprender.

o que é a pedagogia diferenciada?

pHilippe perrenoud É uma característica que deveria permear qualquer metodologia de ensino. Consiste em reconhecer que toda turma tem alunos diferentes e que é preciso orientar a ação peda-gógica levando isso em conta. Diferenciar é ensinar de modo que cada aluno esteja sempre diante de situações didáticas propícias para aprender. Isso exclui aquelas que não trazem desafio e as que propõem uma missão fora do alcance. O interessante é que a diferenciação é um conceito presente em muitas áreas. Costumo dar o exemplo da medicina. Um médico não pode dar o mesmo medica-mento a todos os doentes. É preciso fazer diagnósticos individuais e adaptar o tratamento a cada um.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Como realizar a diferenciação do ensino em escolas grandes?

pHilippe perrenoud A pedagogia diferenciada é uma escolha por um sistema de Educação. Requer uma mudança na formação dos professores, na gestão das escolas e no trabalho na sala de aula. Operacionalizar tudo isso em escolas com centenas de alunos é complicado. Muitas vezes, elas são organizadas como quartéis, com normas rígidas de horário, circulação e mobili-ário. Contudo, esse quadro não é um obstáculo. Uma instituição grande pode ser estruturada em subconjuntos. Em diferentes atividades e disciplinas, os estudantes são divididos em grupos, que terão desafios distintos em termos de complexidade, com natureza compatível com o nível e as necessidades de cada um.

Que critérios utilizar na formação dos grupos para que todos aprendam?

pHilippe perrenoud Antes de tudo, não estamos falando em separação por nível - melhores com melhores, piores com piores. As pesquisas mostram que, quando se colocam alunos seme-lhantes juntos, os piores têm menos ambição para avançar. Os grupos também não devem ser estáveis. É preferível que eles sejam focados em dificuldades particulares imediatas e possam ser recompostos quando os objetivos de aprendizagem forem atingidos. Isso exige a atenção do pro-fessor ou do gestor para avaliar quantos alunos estão efetivamente aprendendo, quantos saíram do processo, quantos se entediaram.

Há exemplos concretos de sucesso da pedagogia diferenciada?

pHilippe perrenoud Há alguns. Há um caso emblemático em Luxemburgo. Lá, a diferenciação ocorre numa instituição de Ensino Médio, etapa em que muitos acham impossível fazer esse traba-lho. Nessa escola, são ensinadas as mesmas disciplinas, nos mesmos horários, em três turmas da mesma série. Os professores entram em acordo em relação aos objetivos e cada um trabalha sua turma durante quatro semanas. Depois desse período, eles fazem um balanço do que cada estudan-te aprendeu. Na quinta e na sexta semana, eles redistribuem os alunos das três turmas em grupos de desenvolvimento e de recuperação. Depois, eles voltam para outro ciclo de quatro semanas em turmas tradicionais, seguindo por mais uma ou duas semanas de nivelamento. Não é um esquema perfeito, mas ataca o problema da desigualdade de aprendizagem pela raiz.

em termos de organização do espaço, como deve ser uma escola que dê atenção a quem mais precisa?

pHilippe perrenoud Uma escola construída para uma pedagogia diferenciada não é um retân-gulo. Exige flexibilidade, com locais grandes, para reunir todos os alunos, e outros menores, para os trabalhos em grupo. É preciso pensar em modelos para a sala de aula com mesas para equipes ou com a possibilidade de juntar carteiras. No Brasil, conheci uma escola que tinha mesas hexagonais, em que os alunos ficam sempre reunidos de seis em seis. Quem não tem uma arquitetura conveniente vai precisar um pouco mais de energia e inventividade para a diferenciação, sempre respeitando os princípios do agrupamento e a posterior reunificação.

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para a diferenciação dar certo, os estudantes precisam ficar mais tempo na escola?

pHilippe perrenoud Se todo o resto já foi modificado - as ferramentas didáticas, a avaliação, o atendimento -, não é necessário aumentar o número de horas na sala de aula. Segurar os alunos com dificuldade além do período letivo costuma ser mal vivenciado por eles e quase nunca repõe as defasagens. O primordial é rever o tempo que o professor vai dedicar a cada aluno. Diferenciar pressupõe que o docente dê mais de seus recursos e habilidades aos que precisam mais e deixar aqueles que se viram bem trabalhar com os colegas.

Muitos professores sofrem com esse dilema. pensam que é injusto não dedicar o mesmo tempo a todos.

pHilippe perrenoud Ensinar um aluno que vai bem a ler, que tem vontade de aprender e valo-riza a leitura está ao alcance de qualquer professor. Há carência de profissionais qualificados para trabalhar com os alunos que vêm de um entorno em que não se lê nem se encoraja a leitura. É para isso que precisamos de bons docentes.

os professores estão preparados para trabalhar com a diferenciação?

pHilippe perrenoud Não. Nem na Europa. Não conheço nenhum país em que a formação inicial contemple esse domínio a ponto de ser bem praticado. É preciso recorrer à formação em serviço dentro da escola para resolver algumas lacunas.

Quais os primeiros passos da formação em serviço para dar mais a quem mais precisa?

pHilippe perrenoud O diretor ou o coordenador podem fazer um balanço das competências e ver os pontos fortes e fracos da equipe. Em seguida, é necessário começar um processo de orien-tação de cada docente. Essa não é apenas uma tarefa que consiste em indicar um ou outro curso e pronto. É um trabalho que deve tratar do sofrimento do professor, de eventual vontade de abandonar a carreira, dos alunos de que o professor não gosta e dos pais que ele detesta. Nem nos lugares em que há tédio, desespero e cansaço mental por parte de alguns docentes os formadores trabalham nessa dimensão psicossociológica.

não há o risco de que esse trabalho se esgote nas queixas, sem avançar em mudanças efetivas?

pHilippe perrenoud É possível. Entretanto, segundo minha experiência, as pessoas concordam em experimentar outras maneiras de trabalhar quando há espaço para a queixa sem haver ridicu-larização da situação. Os formadores precisam ouvir os professores, estabelecendo um espaço de diálogo e de confiança, em que o sentido das tarefas seja discutido. Levar a equipe a se questionar sobre o fracasso escolar é prioridade. Quando se consegue fazer isso, a gente coloca as pessoas em movimento.

Sumário

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2.5. o ALuno com deficiênciA em umA perSpectivA muLtidimenSionAL

marília costa dias1

REsuMo

O artigo discute as concepções de deficiência expressas em documentos de referência da atualidade e suas implicações para a escola a partir de uma reflexão sobre o processo de afirmação dos direi-tos das pessoas com deficiência. A perspectiva multidimensional coloca o foco nas relações entre os aspectos individuais e o ambiente no qual a pessoa com deficiência está inserida, resultando numa abordagem que dá ênfase às dificuldades funcionais, de modo a favorecer a oferta de serviços e apoios para atender às demandas específicas de cada pessoa. Essa perspectiva tem implicações na elaboração e na implementação de políticas públicas em diversas áreas, e também na educação. A análise das diretrizes para a educação nacional permite dizer que o direito à diferença é reconhecido como forma de equiparar oportunidades, mas a estrutura e o modus operandi desse trabalho ainda são frágeis e insuficientes para atender às diferentes necessidades de apoio desses alunos.

Palavras-chave: deficiência; educação inclusiva; perspectiva multidimensional; necessidades de apoio; políticas públicas.

Na perspectiva da educação inclusiva, a função da escola é compreendida também como um espaço de aprendizagem de valores essenciais à vida com dignidade, tais como a solidariedade, a compreensão mútua, o diálogo e o senso de justiça, entre outros aspectos do convívio social. Por isso, a prática da educação inclusiva diz respeito a uma decisão ética sobre a formação que queremos oferecer às novas gerações, tendo como horizonte a sociedade que queremos construir, nosso sonho de futuro.

Sentir-se parte da vida em sociedade, em todas as suas dimensões, é o que todo ser humano dese-ja. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a qualidade de vida está relacionada à “per-cepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (The WHOQOL Group, 1995 apud FLECK, 2000, p. 34). Mas, no caso das pessoas com deficiência, considerando que, ao longo da história da humanidade estiveram quase sempre privadas de ocupar determinadas posições

1 DIAS, M. C. O aluno com deficiência em uma perspectiva multidimensional. In: Conflitos, Direitos e Diversidade – I Simpó-

sio Internacional de Estudos sobre a Deficiência, 2013, São Paulo, SP. Anais do I Simpósio Internacional de Estudos sobre

a Deficiência, 2013. Disponível em: < http://www.memorialdainclusao.sp.gov.br/ebook/#> Acesso em: 25 out 2016 2Pedagoga pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestre em Educação pela Faculdade de Educação

da Universidade de São Paulo (FEUSP). Atualmente é professora no curso de Pedagogia do Instituto Superior de Educação

Vera Cruz e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação da FEUSP.

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de destaque na sociedade, de ter expectativas em relação ao futuro, como qualquer outra pessoa, porque foram excluídas e segregadas, esta percepção pode se tornar bastante alterada. Muitas dessas pessoas ainda desconhecem seus direitos, outras não sabem como exigi-los e há também aquelas que assimilaram uma concepção assistencialista e entendem o direito como favor ou privilégio.

Nas escolas, é muito comum que os pais aceitem passivamente algumas exigências para que seus filhos com deficiência frequentem a sala de aula comum, sem exigirem recursos e serviços de apoio para garantir a igualdade de oportunidade no processo de aprendizagem. Isso ocorre porque é bas-tante frequente que pais e profissionais de educação ignorem a legislação que protege os direitos dos alunos com deficiência, até porque, historicamente, esses direitos nem sempre foram reconhecidos.

O século XXI trouxe grandes avanços na afirmação dos direitos das pessoas com deficiência e cada vez ganha mais relevância a compreensão de que a deficiência é multidimensional, sendo necessário levar em consideração tanto os aspectos biológicos, quanto os sociais e psicológicos de cada indivíduo para oferecer melhores condições de vida para todos. Vivemos, portanto, um momento de mudança nas concepções sobre deficiência e nos modos de se relacionar, conviver e garantir condições de acesso e participação a essas pessoas.

No Brasil, as ações afirmativas, em geral, garantem o acesso às pessoas com deficiência na escola regular, no mercado de trabalho e nos espaços sociais. Mas as necessidades de apoio para garantir acesso com qualidade e participação real são desafios que precisam ser contemplados na elaboração e implementação de novas políticas públicas. Por isso, assume importância a discussão sobre os conceitos atuais de deficiência e seus impactos na construção de uma consciência coletiva sobre a necessidade de se enfrentar este problema.

Ao longo da história da humanidade, a deficiência foi compreendida de muitas formas diferentes, em função de uma multiplicidade de fatores, que abarcam desde o conhecimento científico disponível e socializado até os valores intrínsecos ao modo como cada sociedade se organiza e funciona. Du-rante séculos, as pessoas com deficiência foram compreendidas como anormais, e não havia distinção clara entre as limitações de ordem sensorial, física ou intelectual, pois todos eram categorizados como desvios da normalidade (JANUZZI, 1992; BUENO, 1993). Consequentemente, a identidade dessas pessoas era construída prioritariamente pelo viés da deficiência, o que significava ocupar o lugar social de anormal, retardado, aleijado, deficiente, entre outros adjetivos comumente atribuídos a elas. Esta noção de anormalidade sugere impossibilidade ou incapacidade para o convívio social, a apren-dizagem escolar e a vida profissional, como se a deficiência fosse um atributo unicamente pessoal.

Remonta ao século XX o reconhecimento da especificidade da deficiência mental, hoje também denomi-nada deficiência intelectual, embora a compreensão desses conceitos ainda seja bastante diversa. Segun-do Jannuzzi (1992), foi em 1939, no Congresso de Genebra, que a expressão deficiente mental surgiu como tentativa de padronizar a forma de se referir às pessoas nessa condição e substituir o termo anormal, que até então era usualmente utilizado para se referir a todas as pessoas com algum tipo de deficiência, como já mencionado. Em relação à expressão deficiência intelectual, de acordo com Sassaki (2005), seu uso foi legitimado em 2004 pela Declaração de Montreal sobre a Deficiência Intelectual. Esta mudança de nomenclatura foi proposta com a intenção de distinguir o funcionamento da mente, como um todo, do funcionamento do intelecto, pois é frequente a indistinção entre doença mental e deficiência mental.

Foi também a partir século XX, com os avanços da neurociência, que ficou patente a capacidade e a potencialidade das pessoas com deficiências. Ainda no final do século XIX surgiram os primeiros estu-dos sobre a capacidade de reorganização do cérebro, mas apenas em 1940 a reorganização neural

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seria chamada, pela primeira vez, de plasticidade cerebral (ROTTA, 2006). Segundo Oda, Santana e Carvalho (2002, p. 173), o conceito de plasticidade cerebral “se refere à adaptação que experimenta o sistema nervoso diante de mudanças em seu meio externo e interno, além disso, pode refletir a adap-tação funcional do cérebro para minimizar os efeitos das lesões estruturais e funcionais”. Esses autores, assim como Rotta (2006), Consenza e Guerra (2011), enfatizam que a plasticidade ocorre ao longo da vida, ou seja, que até mesmo o cérebro de adultos tem capacidade de se reorganizar para atender às demandas funcionais. Os mesmos autores também ressaltam que o ambiente tem relação direta com a plasticidade cerebral e, consequentemente, com a aprendizagem, pois as modificações do sistema nervoso central ocorrem a partir dos estímulos e/ou experiências de vida dos indivíduos.

Nesse contexto, atualmente ganha força a concepção social de deficiência, que coloca em foco a relação entre os aspectos individuais e o ambiente no qual a pessoa esteja inserida, considerando o desempenho como resultado de múltiplas variáveis e não apenas a expressão de uma condição pessoal. Esse entendimento da condição de deficiência está expresso em três documentos interna-cionais que foram elaborados no século atual.

O primeiro deles é a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), que foi elaborada em 2001 pela Organização Mundial da Saúde e contribuiu sobremaneira para a ressignificação do conceito de deficiência. Segundo Farias e Buchalla (2005, p. 190),

(…) os conceitos apresentados na classificação introduzem um novo paradigma para pen-sar e trabalhar a deficiência e a incapacidade: elas não são apenas uma consequência das condições de saúde/doença, mas são determinadas também pelo contexto do meio ambiente físico e social, pelas diferentes percepções culturais e atitudes em relação à defi-ciência, pela disponibilidade de serviços e de legislação.

De acordo com a CIF, “a funcionalidade de um indivíduo num domínio específico é uma interação ou relação complexa entre a condição de saúde e os fatores contextuais (fatores ambientais e pesso-ais)” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2004, p. 20, tradução nossa). Essa funcionalidade está representada na figura 1 a seguir:

Condição de Saúde(distúrbio ou doença)

Atividades

Fatores ambientais

Fatores pessoais

Funções e estruturas corporais

Participação

figura 1 – Interações entre os componentes da CIF

Fonte: OMS (2004, p. 20, tradução nossa).

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Nessa abordagem multidimensional, o que realmente importa é a descrição da funcionalidade e da incapacidade3 decorrentes de várias possibilidades de interação entre as diferentes dimensões. Por exemplo, uma pessoa pode:

• ter deficiência sem limitações de capacidade (ex: uma desfiguração resultante da Doença de Hansen pode não ter efeito sobre a capacidade da pessoa);

• ter problemas de desempenho e limitações de capacidade sem deficiências evidentes (ex: redução de desempenho nas atividades diárias associado a várias doenças);

• ter problemas de desempenho sem deficiências ou limitações de capacidade (ex: indivíduo HIV positivo ou ex-doente curado de doença mental que enfrenta estigmas ou discriminações nas relações interpessoais ou no trabalho);

• ter limitações de capacidade se não tiver assistência, e nenhum problema de desempenho no ambiente habitual (ex: um indivíduo com limitações de mobilidade pode se beneficiar de ajudas tecnológicas de assistência para se movimentar);

• experimentar um grau de influência em sentido contrário (ex: a inatividade dos membros pode levar à atrofia muscular; a institucionalização pode resultar numa perda da socialização). (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2004, p. 20, tradução nossa)

O segundo documento de relevância internacional é o texto da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CDPD), que é um tratado aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) em 2006 e ratificado por mais de 100 países, incluindo o Brasil, que em 2008 promulgou o Decreto Legislativo nº 186/08, aprovando a Convenção e seu protocolo facul-tativo. Em seu Art. 1o, a deficiência é definida como:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza fí-sica, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas. (BRASIL, 2008).

Também na CDPD (2006) a deficiência não é compreendida como um atributo da pessoa, e segundo Lopes (2007, p. 62):

A principal contribuição desse tratado internacional é a positivação da mudança do paradigma da visão da deficiência no mundo, que passa do modelo médico e assistencialista, no qual a deficiência é tratada como um problema de saúde, para o modelo social de direitos humanos, no qual a deficiência é resultado da equação de interação da limitação funcional com o meio. Essa transformação deve mudar o planejamento das políticas públicas do mundo inteiro.

3Na CIF (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2004), o termo incapacidade “inclui deficiências, limitação da

atividade ou restrição na participação” (p. 7) e é caracterizado “como o resultado de uma relação complexa entre a

condição de saúde do indivíduo e os fatores pessoais, com os fatores externos que representam as circunstâncias nas

quais o indivíduo vive (p. 19, tradução nossa).

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O mais recente documento de expressão internacional é o Relatório Mundial sobre a Deficiência (World Report on Disability), publicado pela OMS em 2011, o qual identifica a deficiência como “complexa, dinâmica, multidimensional e questionada” e reconhece que “o ambiente de uma pes-soa tem um enorme impacto sobre a experiência e a extensão da deficiência” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2011, p. 4). O mesmo relatório afirma que, “embora sem a intenção de discriminar, indiretamente o sistema exclui as pessoas com deficiência ao não levar em conta suas necessidades” (p. 6).

Essa compreensão da deficiência na perspectiva multidimensional tem implicações diretas para a elaboração e implementação de políticas públicas, pois até então a deficiência era entendida como uma condição de saúde imutável, que não tinha relação direta com os aspectos ambientais. Portanto, a condição da pessoa com deficiência não era vista como uma construção social. Já na abordagem proposta pela OMS, a sociedade e o Estado são responsabilizados pela provisão de serviços e recursos de apoio que permitam maior atividade e participação social.

Segundo Secchi (2010), as políticas públicas buscam soluções para problemas considerados relevantes para a coletividade em relação a situações consideradas inadequadas, uma vez que tais situações não atendem ao que é desejado e idealizado como possível. Este autor chama a atenção para o fato de que

a essência conceitual das políticas públicas é o problema público. Exatamente por isso, o que define se uma política é ou não pública é a sua intenção de responder a um problema público, e não se o tomador de decisão tem personalidade jurídica estatal ou não estatal. (SECCHI, 2010, p. 4, grifo do autor).

De acordo com essa abordagem, alguns aspectos da vida de pessoas com deficiência já são reconhecidos como problemas pela coletividade e, por isso, há uma série de decisões e ações, nos âmbitos legislativo e executivo, que buscam oferecer melhores condições de vida a elas. Um exem-plo é a Lei nº 8.213/91, também conhecida como Lei de Cotas, que instituiu a obrigatoriedade das empresas reservarem uma porcentagem de postos de trabalho às pessoas com deficiência (BRASIL, 1991). Esta lei é uma ação afirmativa em prol do direito ao trabalho e significa o reconhecimento de que a maioria das pessoas com deficiência pode ser produtiva. Assim como essa lei, na legislação brasileira há outros dispositivos normativos que garantem às pessoas com deficiência o direito de frequentar a classe comum da escola regular, ter atendimento educacional especializado comple-mentar ou suplementar, isenção tarifária em transportes públicos, entre outros.

No entanto, as discussões mais recentes sobre deficiência apontam como principal problema a ausência e/ou insuficiência de serviços de assistência e apoios específicos (suportes) para atender às necessidades das pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida de modo a garantir funcionalidade, visando autonomia, independência e qualidade de vida.

O Relatório Mundial sobre a Deficiência (OMS, 2011) aponta que “são escassas as evidências sobre a demanda e oferta de serviços de suporte e assistência, mesmo em países desenvolvidos” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2011, p. 145), mas enfatiza:

[...] muitas pessoas com deficiência precisam de assistência e suporte para alcançar uma boa qualidade de vida e serem capazes de participar da vida econômica e social em

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igualdade de condições com as demais pessoas. […] A maior parte da assistência e do suporte vem de membros da família ou de redes sociais. O fornecimento de serviços formais por parte do Estado é, de forma geral, insuficiente, as organizações sem fins lucrativos têm abrangência limitada, e organizações privadas raramente oferecem um suporte economica-mente viável às necessidades das pessoas com deficiência. (p. 143).

No Brasil, o atendimento às necessidades das pessoas com deficiência ainda é um desafio. O acesso a serviços específicos de apoio, por parte das pessoas com deficiências, para garantir a igual-dade de oportunidades nas diferentes dimensões na vida social, como educação, saúde, trabalho, lazer, esporte, cultura, turismo, transporte ou assistência social, ainda não é compreendido como um problema público, ou seja, como um problema reconhecido pela coletividade como relevante.

Portanto, na atualidade, mais importante do que uma “abordagem para a deficiência”, é utilizar-mos uma “abordagem para as dificuldades funcionais” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2011, p. 47), pois a construção desse entendimento favorecerá a implementação de ações no senti-do de ofertar serviços específicos para atender às demandas de apoio de pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida. Nesse contexto, cabe refletir sobre como as escolas estão atendendo às necessidades de apoio dos alunos com deficiência e oferecendo recursos, metodolo-gias, estratégias e serviços que ampliem as habilidades funcionais dos mesmos, criando condições mais favoráveis ao seu aprendizado e desenvolvimento.

Uma concepção de educação que contempla as diferenças concebe o ensino como resposta às necessidades e estilos de aprendizagem de todos os alunos, valorizando a interação entre eles, a participação ativa, a autonomia e a colaboração nas situações de ensino. É, nesse sentido, uma abordagem que busca equilíbrio entre as necessidades de igualar e diferenciar para garantir o di-reito a uma educação de qualidade para todo e qualquer aluno.

Muitas vezes é necessário garantir condições iguais a todos os alunos, tais como condições de acesso aos espaços da escola, de participação em eventos e saídas pedagógicas etc. Em outras situações, o mais importante é diferenciar para garantir que todos os alunos possam desfrutar de situações desafiadoras, que resultem em participação e aprendizagem. Para isso, é necessário iden-tificar qual é a barreira que está dificultando o aprendizado, ou a participação, e propor recursos, estratégias ou serviços que potencializem a capacidade de aprender em sala de aula. Trata-se de oferecer apoios, que muitas vezes são soluções simples, como por exemplo:

• para facilitar a leitura de um texto, alunos com baixa visão podem utilizar uma lupa, e alunos com deficiência física podem dispor de um cavalete para fixar as folhas verticalmente;

• e para a apoiar a produção textual de alunos com deficiência intelectual é possível construir um roteiro com a sequência de ideias a ser escrita.

Enfim, são muitas as formas de diferenciar para garantir o direito à educação a todos os alunos, e não há um manual que possa ser oferecido aos professores e às escolas que dê conta da complexi-dade e da diversidade do ser humano, e, portanto, do grupo de alunos e de cada um em particular.

De acordo com o Decreto nº 7.611/2011 (BRASIL, 2011), que estabelece diretrizes para a educação especial no país, um dos objetivos dessa modalidade escolar é a “adoção de medidas de apoio individualizadas e efetivas, em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico

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e social, de acordo com a meta de inclusão plena” (Art. 1º, Inciso VI). Portanto, as diretrizes oficiais para a educação orientam os sistemas de ensino a oferecer apoio aos alunos com deficiência, pois reconhecem o direito à diferença como direito à equiparação de oportunidades para alcançar boas condições de desenvolvimento para todos os alunos.

O Atendimento Educacional Especializado (AEE) previsto nos documentos oficiais do Ministério da Educação é uma forma de atender às diferentes necessidades de apoio dos alunos que são pú-blico-alvo da Educação Especial4 . Segundo a Resolução CNE/CEB nº 4/2009:

O AEE tem como função complementar ou suplementar a formação do aluno por meio da dis-ponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e desenvolvimento de sua aprendizagem. (Art. 2º).

No entanto, para que tais diretrizes se efetivem nas escolas, é preciso pensar a atuação da edu-cação especial em diferentes abordagens – em salas multifuncionais, no contraturno, na sala de aula comum em parceria com o professor da classe, em centros especializados e, enfim, em formatos variados –, de modo que se possa atender à diversidade de demandas desses alunos.

Numa perspectiva multidimensional, também é indispensável uma avaliação criteriosa das ne-cessidades de apoio dos alunos, o que permite planificar os serviços, as estratégias e os suportes necessários para cada criança ou jovem usufruir das situações de ensino da melhor forma possível. Mas esta avaliação vai muito além do diagnóstico clínico, pois requer uma avaliação descritiva das dificuldades funcionais que devem ser foco da equipe que trabalha com cada um dos alunos.

Um aspecto que merece destaque é que em nenhum dos documentos normativos da educação es-pecial há menção à exigência de avaliações diagnósticas clínicas para que alunos com deficiência recebam os apoios necessários. Ao contrário, em 2006, o documento intitulado Saberes e práticas da inclusão: avaliação para identificação das necessidades educacionais especiais apresenta crí-ticas a uma prática instituída em muitas escolas brasileiras, na qual o laudo (diagnóstico clínico) é uma exigência para a inserção em serviços especializados de educação:

Os próprios integrantes de equipes de diagnóstico, geralmente composta por psicólogos, pedagogos e fonoaudiólogos, declaram-se insatisfeitos com suas práticas, pois reconhecem que são pautadas numa visão estática do quadro em que se encontra o aluno avaliado. Sabem, ainda, que os laudos funcionam como “etiquetas” que rotulam, discriminam e se-gregam. E, o que é mais sério, pouco têm servido para orientar o trabalho pedagógico a ser desenvolvido pelos professores [...] (BRASIL, 2006, p. 86)

A perspectiva multidimensional requer uma equipe multidisciplinar que trabalhe de forma com-plementar, pois as necessidades de apoio podem se relacionar a diferentes áreas: pedagogia, psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, assistência social, entre outras. Se trabalharem de forma isolada, esses profissionais terão dificuldade para conseguir resultados efetivos. Também as áreas da medicina – neurologia, genética, psiquiatria, entre outras – podem ser contributivas

4Alunos com deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.

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para se estabelecer um plano de apoio adequado às necessidades dos alunos. Essa complemen-taridade é enriquecedora tanto do ponto de vista da avaliação das necessidades de apoio, como do planejamento do trabalho a ser feito com cada aluno, e também na implementação dos apoios e serviços especializados.

No Brasil, o trabalho pedagógico, de modo geral, não acontece em parceria com profissionais de diferentes áreas, o que se constitui em um desafio a ser superado. Embora o direito à diferença seja reconhecido como forma de equiparar oportunidades, a estrutura e a forma de trabalho ainda são frágeis e insuficientes para atender às diferentes necessidades de apoio dos alunos.

Vivemos hoje um momento em que é preciso reinventar, inovar e ousar para construir um modelo de educação e de sociedade que resguarde o que é individual e singular, e proteja o que é comum e compartilhado, possibilitando formas de convivência enriquecedoras e pacíficas.

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SECCHI, Leonardo. Políticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. São Paulo: Cengage Learning, 2010.

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3Indicadores de Qualidade em Educação Inclusiva

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3.1. princípioS-chAve pArA A promoção dA quALidAde nA educAção incLuSivA recomendAçõeS pArA deciSoreS poLíticoS

Agência europeia para o desenvolvimento da educação especial

PREFáCIo

O primeiro relatório sobre Princípios-Chave foi publicado pela Agência em 2003 com o título “Princípios-chave para a educação especial – Recomendações para responsáveis políticos”.

À semelhança da edição anterior, o presente documento foi elaborado por decisores políticos com a finalidade de fornecer aos decisores políticos da Europa uma síntese dos principais resul-tados do trabalho temático da Agência sobre o apoio à inclusão de alunos com diferentes tipos

Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial [AEDEE]. (2009). Princípios-chave para a promoção

da qualidade na educação inclusiva – Recomendações para decisores políticos. Odense, Denmark: European Agency

for Development in Special Needs Education, 2009. Disponível em: <https://www.european-agency.org/sites/default/

files/key-principles-for-promoting-quality-in-inclusive-education_key-principles-PT.pdf>. Acesso em: 31 out. 2016.

Este documento foi produzido com o apoio da DG de Educação e Cultura da Comissão Europeia:Link: http://ec.europa.eu/dgs/education_ culture/index_en.htm

este documento foi preparado por:Lucie Bauer, Membro do Conselho de Representantes

da Agência, ÁustriaZuzana Kaprova, Membro do Conselho de Representantes

da Agência, República ChecaMaria Michaelidou, Membro do Conselho de Representantes da Agência, Grécia Christine Pluhar, Membro do Conselho de

Representantes da Agência, Alemanhaeditado por: Amanda Watkins, Membro do Staff da AgênciaSão permitidos excertos deste documento desde que devidamente referenciada a fonte da seguinte forma: Agência Europeia para

o Desenvolvimento da Educação especial, 2009. Princípios-Chave para a Promoção da Qualidade na Educação Inclusiva – Recomendações para Decisores Políticos, Odense, Denmark: European Agency for Development in Special Needs EducationPara garantir o acesso à informação, o relatório está disponí-vel em formatos electrónicos e em 21 línguas. As versões elec-

trónicas deste relatório estão disponíveis no website da Agência: http://www.european-agency.org/publications/ ereports

Esta versão do relatório é uma tradução feita pelos países membros da Agência a partir da versão original da Agência em Inglês.

Capa: Daniela Demeterová, República ChecaISBN (Impresso): 978-87-92387-95-0

ISBN (Electrónico): 978-87-7110-018-1© Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação

Especial 2009Secretariat Østre Stationsvej 33

DK-5000 Odense C Denmark Tel: +45 64 41 00 [email protected]

Brussels Office3 Avenue Palmerston BE-1000 Brussels Belgium

Tel: +32 2 280 33 [email protected]

www.european-agency.org

1

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

de necessidades educativas especiais (NEE) nas escolas regulares. Utiliza-se, para o efeito, o trabalho da Agência de 2003 até a presente data, abrangendo as seguintes publicações:

• Educação Especial na Europa em 2003 (2003);• Educação Especial na Europa (2003): Publicação Temática (Volume 1, 2003 e Volume 2, 2006);• Educação Inclusiva e Práticas de Sala de Aula nos 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico (2005);• Perspectivas dos Jovens sobre Educação Especial (2005);• Intervenção Precoce na Infância (2005);• Planos Individuais de Transição (2006);• Processo de Avaliação em Contextos Inclusivos (2007 e 2009);• Vozes Jovens: Ao Encontro da Diversidade na Educação (2008);• Desenvolvimento de um conjunto de indicadores – para a Educação Inclusiva na Europa (2009);• Diversidade Multicultural e Necessidades Especiais de Educação (2009).Todas estas publicações estão disponíveis, em mais de 21 línguas, no website da Agência:

http://www.european-agency.org/publicationsEspera-se que estas recomendações da Agência sobre Princípios- Chave constituam um contributo

positivo para o trabalho dos decisores políticos europeus que, de formas diferentes, estão empe-nhados no desenvolvimento da educação inclusiva nos seus países.

Cor MeijerDirector da European Agency for Development in Special Needs Education

IntRoDução

Tal como na edição anterior sobre Princípios-Chave, o presente relatório tem por finalidade apre-sentar recomendações sobre os aspectos-chave da política educativa que parecem ser eficazes no apoio à inclusão de alunos com diferentes tipos de necessidades educativas especiais (NEE), nas escolas regulares. Essas recomendações afirmam os princípios da promoção da inclusão educativa e da escola para todos. Todos os países da Europa reconhecem que a educação inclusiva – ou Uma Escola para Todos, conforme referido na Carta do Luxemburgo (1996) – é um pilar importante para assegurar a igualdade de oportunidades a alunos com diferentes tipos de necessidades espe-ciais, na educação, na formação profissional, no emprego e na vida social. Na preparação deste documento foi utilizada a afirmação mais relevante da primeira edição sobre Princípios-Chave: “a educação inclusiva requer sistemas educativos flexíveis que respondam às diversas e, muitas vezes, complexas necessidades individuais dos alunos” (p. 4).

O público-alvo deste documento continua a ser o dos decisores das políticas educativas. Ainda mais do que na edição anterior, reconhece-se que, para maximizar o impacto da inclusão, os princípios-chave para a educação inclusiva devem conter recomendações tanto para os decisores das políticas educativas gerais como para os da educação especial. Reconhece-se, igualmente, a necessidade de um debate entre os principais decisores políticos dos diferentes níveis de ensino que facilite o desenvolvimento da educação inclusiva. As recomendações apresentadas neste relatório são sustentadas nas conclusões dos estudos da Agência, entre 2003 e 2009, sobre o que os decisores políticos devem fazer para apoiar a inclusão. (Para maiores detalhes sobre o trabalho da Agência, por favor consulte o ponto 4: Mais Informações).

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2 Em 2009, os países membros são: Alemanha, Áustria, Bélgica (comunidades flamenga e francófona), Chipre, Dinamar-

ca, Eslovénia, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Letónia, Lituâ-

nia, Luxemburgo, Malta, Noruega, Polónia, Portugal, Reino Unido (Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte, País de Gales),

República Checa, Suécia e Suíça.

Este trabalho foi realizado através de diferentes tipos de projectos temáticos envolvendo, geral-mente, todos os países membros da Agência2.

Os projectos da Agência são determinados pelos representantes ministeriais dos países membros e reflectem as prioridades nacionais. Nos projectos utilizam-se diferentes metodologias (análise da informação dos países recolhida através de inquéritos ou questionários, revisões da literatura, inter-câmbios de especialistas) e deles resultam vários documentos (documentos impressos, relatórios e recursos electrónicos).

Os projectos temáticos que serviram de base à elaboração do presente relatório incidem sobre os diversos aspectos da inclusão que favorecem o acesso dos alunos à educação, na sua comunidade local. Embora os resultados dos projectos da Agência utilizados no presente trabalho focalizem, fundamentalmente, o ensino obrigatório, os princípios enunciados apoiam a aprendizagem ao longo da vida tendo como meta a inclusão social das pessoas com NEE. Tal como na situação apresentada em 2003, importa salientar que existem diferentes contextos nacionais para a inclusão e que: “Todos os países estão em … diferentes estádios do percurso para a inclusão” (Watkins, 2007, p. 16).

Em 2003, a percentagem de alunos no ensino obrigatório identificada como tendo necessidades educativas especiais, varia entre menos de 1% e 19%, nos diferentes países. A percentagem de alu-nos com NEE em escolas e classes especiais também é bastante variável. Há países com menos de 1% do total de alunos em colocações segregadas e outros com mais de 5% (2009). A persistência destes dados reflecte as diferenças dos países nos procedimentos de avaliação, nas políticas de financiamento e de respostas educativas e não tanto nas diferenças das taxas de incidência real das necessidades educativas especiais.

Também como em 2003, os países continuam a usar abordagens muito diferentes na organiza-ção das respostas para os alunos com NEE. É possível identificar sistemas orientados para a plena inclusão em escolas regulares, sistemas que envolvem um “contínuo de respostas” a necessidades diversas e sistemas separados, claramente divididos entre sistema regular e sistema especial. É, no entanto, também possível observar que: “as concepções, políticas e práticas em educação inclusiva estão em constante mudança em todos os países” (ibidem).

Não obstante as diferenças notadas nos contextos nacionais é possível, mesmo assim, destacar os princípios-chave das políticas de inclusão que mereceram o acordo dos países membros da Agên-cia, emergentes dos projectos temáticos mais recentes, que se apresentam no ponto 3.

Estes princípios são sustentados por um entendimento da educação inclusiva orientada para o vasto grupo de alunos vulneráveis à exclusão, para além dos identificados com necessidades edu-cativas especiais. Esta perspectiva é consistente com o reconhecimento de que a educação de qua-lidade para alunos com necessidades educativas especiais nas escolas regulares significa educação de qualidade para todos os alunos.

Esta concepção de alargar a participação no ensino regular como meio de garantir uma educa-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3 Todos os documentos estão devidamente referenciados na secção “Mais Informação”

ção de qualidade para todos os alunos, está reflectida no título da presente edição: Princípios-chave para a Promoção da Qualidade em Educação Inclusiva.

Tal concepção de educação inclusiva está, claramente, plasmada em vários relatórios e declara-ções internacionais, que se resumem seguidamente, como introdução aos princípios-chave emergen-tes do trabalho da Agência.

uMA PERsPECtIvA EuRoPEIA E IntERnACIonAl DA EDuCAção InClusIvA

A nível internacional e da União Europeia várias convenções, declarações e resoluções sobre a incapacidade, a inclusão e a educação especial sustentam as políticas nacionais dos países e fornecem um quadro de referência para o seu trabalho3. Estes documentos são também utilizados pela Agência como princípios orientadores. Para enquadrar e elaborar este documento foram utilizados os estudos da Agência num contexto mais vasto, apresentam-se seguidamente os textos-chave internacionais e europeus.

Princípios orientadores a nível europeu

A nível europeu, vários documentos definem os objectivos dos estados membros quanto ao apoio a alunos com necessidades especiais, o que implica o compromisso por parte dos países da UE na implementação das prioridades acordadas. Muitos desses documentos são declarações com as prioridades do Conselho sobre a educação em geral, por exemplo, o Relatório do Conselho de Educação para o Conselho Europeu Os futuros objectivos dos sistemas de educação e de formação (2001) e a Comunicação da Comissão Um enquadramento coerente de indicadores e metas para monitorizar o progresso dos objectivos de Lisboa em matéria de educação e formação (2007).

Há também uma série de documentos importantes orientados, especificamente, para alunos com necessidades educativas especiais e a sua inclusão no ensino regular. Um primeiro, de 1990, é a Resolução do Conselho de Ministros da Educação sobre a Integração das crianças e jovens com defi-ciência no sistema regular de ensino. Seguidamente, os Estados Membros da UE ratificaram as Regras das Nações Unidas sobre a Igualdade de Oportunidades para Pessoas com Deficiência (1993).

Mais tarde, em 1996, o Conselho publicou a Resolução sobre os direitos humanos das pessoas com deficiência e a Comissão publicou uma Comunicação (pedindo a acção do Conselho) sobre a Igualda-de de oportunidades para pessoas com deficiência. Em 2001 foi publicada a Resolução do Parlamento Europeu Rumo a uma Europa sem barreiras para pessoas com deficiência. Em 2003, a Resolução do Parlamento Europeu Rumo a um instrumento juridicamente vinculativo das Nações Unidas destinado a promover e proteger os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência, foi seguida pela Resolução do Conselho de 2003 sobre a Promoção do emprego e da integração social das pessoas com deficiên-cia, bem como pela Resolução do Conselho de 2003 sobre Igualdade de oportunidades para os alunos e estudantes com deficiência na educação e formação. Estas são duas das principais declarações a nível da UE que orientam as políticas dos estados-membros para a educação especial.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

As opiniões dos alunos com necessidades educativas especiais constam da Declaração de Lis-boa: Vozes dos Jovens sobre Educação Inclusiva (2007), que contem as propostas aprovadas pelos jovens com necessidades educativas especiais de 29 países, dos ensinos secundário, profissional e superior. Na Declaração os jovens afirmam: “Nós vemos uma série de benefícios na educação inclusiva ... precisamos de ter amigos, com e sem necessidades especiais, e de interagir com eles ... a educação inclusiva é benéfica para nós e para todos.”

Em 2007, o Conselho Europeu de Ministros da Educação identificou as necessidades educati-vas especiais como um dos 16 objectivos prioritários a considerar nos Objectivos de Lisboa 2010 (Comissão Europeia, 2007). Nas propostas de objectivos da Comunidade Europeia para 2020 os alunos com necessidades educativas especiais são novamente considerados prioridade (2009).

Princípios orientadores a nível internacional

A nível internacional, os principais enquadramentos legais com impacto na educação inclusi-va estão definidos nas Orientações Políticas sobre Inclusão na Educação (2009), da UNESCO: Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), Convenção contra a Discriminação na Edu-cação (1960), Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), Convenção sobre a Protecção e Promoção da Diversidade nas Expressões Culturais (2005). Recentemente, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), mais especificamente o Artigo 24, é considerado de importância crucial uma vez que advoga a educação inclusiva. Pode afirmar-se que estes e outros documentos internacionais: “... apontam os principais elementos a seguir para assegurar o direito ao acesso à educação, o direito a uma educação de quali- dade e o direito ao respeito no contexto de aprendizagem” (p.10).

A maior parte dos países europeus assinou a convenção e a maioria destes assinou o protocolo opcional e está em processo de ratificação da convenção e do protocolo4.

Todos os países europeus assinaram a Declaração de Salamanca e Enquadramento da Acção na Área das Necessidades Educativas Especiais (1994), da UNESCO. Esta declaração colectiva é o ponto focal para o trabalho na área das necessidades educativas especiais na Europa sendo, ain-da, um elemento-chave para o enquadramento conceptual das políticas de muitos países. Todos os países europeus concordam que os princípios contidos na Declaração de Salamanca devem nortear todas as políticas de educação e não apenas aquelas que tratam especificamente das necessidades educativas especiais. Esses princípios dizem respeito à igualdade de oportunidades, em termos de um verdadeiro acesso à aprendizagem, ao respeito pelas diferenças individuais e a uma educação de qualidade para todos, mais centrada nas áreas fortes do que nas debilidades.

As Conclusões e Recomendações da 48ª sessão da Conferência Internacional de Educação (2008) designada Educação Inclusiva: O Caminho do Futuro, identificaram uma série de recomen-dações- chave:

• Os responsáveis políticos devem reconhecer que: “a educação inclusiva é um processo contí-nuo que visa oferecer educação de qualidade para todos”;

4 Ver: http://www.un.org/disabilities/countries.asp?navid=17&pid=16 para informação actualizada.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• A política de educação e de recursos deverá ter por objectivo: “Promover culturas e ambientes escolares amigos da criança, conducentes a uma aprendizagem eficaz e inclusiva de todas as crianças” (UNESCO, 2008).

O documento Orientações Políticas da UNESCO (2009), sugere que: “A educação inclusiva é um processo de fortalecimento da capacidade do sistema de ensino para chegar a todos os alunos ... Um sistema de educação “inclusiva” só pode ser criado se as escolas regulares se tor-narem mais inclusivas, isto é, se se tornarem melhores na educação de todas as crianças, nas suas comunidades” (p. 8).

Este documento vai mais longe ao dizer que: “A inclusão é entendida como um processo para responder à diversidade das necessidades de todas as crianças, jovens e adultos, aumentando a participação nas aprendizagens, nas culturas e nas comunidades, reduzindo e eliminando a exclu-são da educação ou dentro desta ... Promover a inclusão significa estimular a discussão, incentivar atitudes positivas e melhorar os enquadramentos sociais e educacionais para lidar com novas exi-gências nas estruturas de educação e de governação. Trata-se de melhorar os processos e ambientes para facilitar a aprendizagem, tanto ao nível do aluno no seu contexto de aprendizagem, como ao nível do sistema para apoiar a aprendizagem” (UNESCO, 2009, p. 7–9).

As Orientações Políticas sobre a educação inclusiva realçam o seguinte:

• Inclusão e qualidade são recíprocas;• Acesso e qualidade interligam-se e reforçam-se mutuamente;• Qualidade e equidade são fundamentais para garantir a educação inclusiva.

Estas afirmações são fundamentais para os princípios-chave evidenciados no trabalho temático da Agência que se apresentam no ponto seguinte.

PRInCíPIos-ChAvE PARA A PRoMoção DA QuAlIDADE nA EDuCAção InClusIvA

Os princípios-chave aqui apresentados centram-se nos aspectos dos sistemas educativos que, com base no trabalho da Agência, parecem ser cruciais para promover a qualidade na educação inclusiva e apoiar a inclusão de alunos com diferentes tipos de necessidades educativas especiais (NEE), nas escolas regulares. Estes aspectos, que vão desde a legislação nacional ao trabalho a nível de escola, devem ser considerados no âmbito dos enquadramentos políticos para a promoção da qualidade na educação inclusiva.

Embora os documentos da Agência usados para identificar estes princípios-chave se focalizem no ensino obrigatório, entende-se que os mesmos são aplicáveis a todos os sectores e a todas as fases da aprendizagem ao longo da vida.

Examinando o trabalho da Agência, de 2003 até à presente data, encontram-se sete áreas, interligadas de acordo com os princípios- chave que se apresentam de seguida juntamente com as recomendações específicas necessárias para sua efectiva implementação.

O objectivo último destes princípios é promover a participação na educação inclusiva, garantin-do uma oferta educativa de qualidade. Neste sentido, o princípio-chave do alargamento da parti-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

cipação é apresentado em primeiro lugar e todos os outros princípios-chave devem ser entendidos como um contributo para esse objectivo.

Alargar a participação para aumentar oportunidades educativas para todos os alunos

A meta da educação inclusiva é alargar o acesso à educação, promover a plena participação e dar oportunidade aos alunos, vulneráveis à exclusão, de realizarem o seu potencial.

Considerando a promoção da qualidade na educação inclusiva, é necessário realçar um conjun-to de factores-chave relacionados com este objectivo:

• Inclusão diz respeito a um grupo mais vasto de alunos e não apenas aos identificados com necessidades educativas especiais.

• Diz respeito a quaisquer alunos em risco de exclusão resultante de insucesso escolar;• O acesso à educação regular, por si só, não é suficiente. Participação significa que todos os

alunos estão envolvidos em actividades significativas de aprendizagem.• A promoção de atitudes positivas na educação é fundamental para aumentar a participação.

As atitudes dos pais e dos professores face à educação de alunos com diferentes tipos de ne-cessidades parecem ser largamente determinadas pelas suas experiências pessoais. Reconhe-cendo este facto, devem ser introduzidas/implementadas estratégias dirigidas aos factores atitudinais. As estratégias eficazes para promover atitudes positivas incluem:

• Garantir que todos os professores são treinados e que se sentem capazes de assumir a res-ponsabilidade por todos os alunos, independentemente das suas necessidades individuais;

• Apoiar a participação dos alunos e dos pais na tomada de decisões educacionais, o que inclui envolver os alunos nas decisões sobre sua própria aprendizagem e apoiar os pais a fazer escolhas para o seu educando.

Ao nível do percurso educativo individual do aluno parecem contribuir significativamente para atingir o objectivo de ampliar a participação os seguintes aspectos:

• Uma visão da aprendizagem como um processo – não baseada em conteúdos – tendo como objectivo principal, para todos os alunos, o desenvolvimento das competências de aprender a aprender e não apenas o conhecimento;

• Utilizar abordagens personalizadas de aprendizagem para todos os alunos, nas quais estes registem e revejam as suas próprias metas de aprendizagem, em colaboração com os pro-fessores e famílias, e sejam ajudados a desenvolver uma forma estruturada de aprendizagem autónoma, a fim de assumirem o controlo da sua própria aprendizagem;

• A implementação de um Programa Educativo Individual (PEI) para os alunos (possivelmente com necessidades mais complexas de aprendizagem) que possam exigir, para a sua aprendizagem, uma abordagem mais focalizada. Os PEI devem maximizar a independência dos alunos e o seu envolvimento na definição de objectivos e também a colaboração com os pais e famílias.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Educação e formação sobre educação inclusiva para todos os professoresPara trabalhar eficazmente em contextos inclusivos, os professores precisam de ter valores e

atitudes apropriadas, competências, conhecimentos e compreensão.

Uma abordagem de aprendizagem que vise responder às diversas necessidades de todos os alunos, sem rotulagem/categorização é coerente com os princípios de inclusão e requer a imple-mentação de estratégias educativas que irão beneficiar todos os alunos:

• Ensino cooperativo em que os professores utilizam uma abordagem de trabalho em equipa envolvendo os próprios alunos, pais, colegas, e outro pessoal de apoio bem como os mem-bros da equipa multidisciplinar, conforme o caso;

• Aprendizagem cooperativa em que alunos se ajudam uns aos outros de formas diferentes – incluindo tutoria a pares – em grupos flexíveis;

• Resolução cooperativa de problemas envolvendo abordagens sistemáticas para a gestão positiva da sala de aula;

• Grupos heterogéneos de alunos e diferenciação pedagógica para responder à diversidade das necessidades dos alunos na sala de aula. Esta abordagem implica definição clara de ob-jectivos, registo e revisão, percursos alternativos de aprendizagem, ensino flexível e diferentes formas de organização de grupos;

• Ensino eficaz baseado em metas específicas, percursos alternativos de aprendizagem, ensino flexível e feedback aos alunos;

• Avaliação que apoie a aprendizagem e não rotule ou conduza a consequências negativas para os alunos. A avaliação deve ter uma visão holística/ecológica que considere os aspec-tos académico, comportamental, social e emocional do aluno e dê informações claras sobre o processo de aprendizagem.

As estratégias para aumentar a participação na sala de aula regular não podem ser implementadas isoladamente sem ter em consideração o contexto da escola e a situação em casa. Para aumentar as oportunidades educacionais para todos os alunos, é necessário implementar um conjunto de factores inter-relacionados de apoio ao trabalho individual dos professores, que se descrevem seguidamente.

Durante a formação inicial todos os professores devem ser preparados para trabalhar na educação inclusiva. Posteriormente, devem ter acesso à formação em serviço, a fim de desenvolverem conheci-mentos e competências para melhorar a prática, em contextos inclusivos.

A formação para a inclusão envolve a aquisição de conhecimentos e de competências sobre:

• Diferenciação e resposta às diferentes necessidades, que permita a um professor prestar apoio individual na sala de aula;

• Trabalho colaborativo com pais e famílias;• Colaboração e trabalho em equipa que facilite o trabalho efectivo em equipa com outros profes-

sores, bem como com os serviços educacionais e profissionais dentro e fora da escola.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

A par da formação de todos os professores para a inclusão, os serviços responsáveis pela forma-ção de professores devem assegurar:

• Formação de professores especializados, a fim de manter e garantir recursos especializados para apoiar todos os professores, em contextos inclusivos;

• Momentos formativos de partilha entre professores de diferentes serviços e sectores, a fim de facilitar um trabalho de colaboração eficaz;

• Formação de directores de escola sobre desenvolvimento de competências de liderança e de visão consentâneas com a promoção de valores e práticas inclusivas;

• Curso de formação para formadores em educação inclusiva, de modo a que estes possam assegurar programas de formação inicial e em serviço que promovam a qualidade na edu-cação inclusiva.

Cultura organizacional e filosofia que promova a inclusãoAo nível da escola, ou de outra organização educacional, é crucial a existência duma cultura e duma filosofia aceite por todos, baseadas em atitudes positivas, que acolham a diversidade de alunos nas salas de aula e respondam às diversas necessidades em matéria de educação.

Estruturas de apoio organizadas de forma a promover a inclusãoAs estruturas de apoio com impacto na educação inclusiva são diversas e envolvem, muitas ve-zes, profissionais, abordagens e métodos de trabalho diferentes. As estruturas de apoio podem

funcionar como um apoio ou como uma barreira à inclusão.

Essa cultura aceite por todos:

• Inclui todos os intervenientes: alunos, famílias, professores e comunidade local;• É dirigida por uma liderança escolar com uma visão para inclusão que contempla o desenvol-

vimento da escola, a prestação de contas e a responsabilidade pela resposta à diversidade das necessidades.

As culturas organizacionais que apoiam a inclusão têm como resultado:

• Práticas que evitem todas as formas de segregação e promovam uma escola para todos, pro-porcionando igualdade de oportunidades educacionais para todos os alunos;

• Cultura de trabalho em equipa e de parceria com os pais, bem como trabalho interdisciplinar;• Prática educativa que responde a todos os tipos de necessidades, assente no desenvolvimento

duma educação de qualidade para todos os alunos em geral, não focalizada apenas em grupos específicos.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

sistemas flexíveis de afectação de recursos que promovam a inclusãoAs políticas de financiamento e as estruturas são um dos factores mais importantes na inclusão. A ausência ou o acesso limitado a recursos e respostas pode obstaculizar a inclusão e a igual

dade de oportunidades dos alunos com NEE.

Políticas que promovem a inclusãoA promoção da qualidade na educação inclusiva requer uma política claramente definida. O objectivo da escola para todos deve ser fomentado através de políticas educacionais e apoia-

do por uma filosofia e liderança de escola e por práticas dos professores.

As estruturas de apoio que promovem a educação inclusiva são:

• Constituídas por uma gama de diferentes serviços especializados, organizações e centros de recursos e por profissionais que reflectem as necessidades a nível local. As estruturas de apoio deverão ser capazes de responder, de forma flexível, às diferentes necessidades das organizações, dos profissionais e das famílias;

• Coordenadas intersectorialmente (educação, saúde, serviços sociais, etc.);• Coordenadas de forma a apoiar, da melhor maneira possível, as transições de todos os

alunos entre as diferentes fases da aprendizagem ao longo da vida (pré-escolar, ensino obri-gatório e pós-obrigatório e emprego).

Tais estruturas de apoio utilizam uma abordagem interdisciplinar que:

• Integra o conhecimento e as perspectivas das diferentes áreas de especialização, a fim de responder de forma holística às necessidades dos alunos;

• Utiliza uma abordagem participativa que requer uma mudança no “locus” do controlo do apoio e do contributo dos especialistas. As decisões sobre o apoio são, cada vez mais, conduzidas pelos professores da turma, alunos e suas famílias, trabalhando em parceria com profissionais, de forma interdisciplinar. Isto exige uma mudança nas atitudes e práticas dos especialistas.

Os mecanismos de financiamento e o sistema de alocação de recursos educativos que promovem – ao invés de dificultarem – a inclusão, são orientados por políticas de financiamento que:

• Asseguram respostas flexíveis, eficazes e eficientes às necessidades dos alunos;• Promovem a colaboração intersectorial entre serviços relevantes;• Asseguram a coordenação entre as estruturas de financiamento regionais e nacionais.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

As políticas que visam a promoção da qualidade na educação inclusiva:

• Têm em conta as políticas e iniciativas internacionais;• São suficientemente flexíveis, de modo a reflectirem as necessidades locais;• Maximizam os factores que contribuem para a inclusão – como referido acima – do aluno e dos

pais, a nível organizativo e a nível do professor.

Para implementar a educação inclusiva, os objectivos subjacentes às políticas adoptadas de-vem ser comunicados, de forma eficaz, a todos os membros da comunidade educativa. Os líderes educacionais – a nível nacional, regional e local – têm um papel essencial na concretização e na implementação da política que promova a qualidade na educação inclusiva. As políticas que pro-movem a qualidade na educação inclusiva devem dirigir-se a alunos com diversas necessidades e propor medidas para lhes responder. Tais políticas:

• Definem a organização educacional da escola e também as responsabilidades dos serviços/estruturas de apoio;

• Definem o apoio e a formação a disponibilizar a todos os intervenientes, de forma a que pos-sam assumir as responsabilidades.

• As políticas para promover a inclusão e para responder às necessidades individuais dos alunos estão “integradas” nos vários sectores e serviços. Tais políticas devem ser trans-sectoriais e pro-mover, activamente, a cooperação intersectorial, garantindo que:

• A nível nacional e local, os decisores políticos dos sectores da educação, da saúde e da segu-rança social, trabalhem cooperativamente para criar políticas e planos que facilitem e apoiem, activamente, a interdisciplinaridade em todas as fases da aprendizagem ao longo da vida;

• As respostas flexíveis que apoiam a prática inclusiva sejam aplicadas em todos os níveis de educação e de ensino. À inclusão de alunos com diversas necessidades no ensino secundário, na transição da escola para o emprego, no ensino superior e na educação de adultos deve ser prestada a mesma atenção que é dada à educação pré-escolar e ao ensino básico;

• As políticas tenham como objectivo facilitar a partilha de boas práticas e apoiar a investigação e o desenvolvimento de novas abordagens educacionais, métodos e instrumentos.

Embora a curto prazo deva existir um plano de acção estratégico para a educação inclusiva, a longo prazo a inclusão na educação deverá ser “um dado” em todas as políticas e estratégias educativas gerais.

Na fase de planeamento das políticas devem ser definidas modalidades de acompanhamento da respectiva execução, o que envolve:

• Identificar indicadores adequados para monitorizar os desenvolvimento das políticas e das práticas;• Promover parcerias entre escolas, responsáveis políticos locais e pais, a fim de assegurar uma

maior responsabilização dos serviços prestados;• Estabelecer procedimentos para a avaliação da qualidade das respostas prestadas a todos os

alunos no sistema educativo;• Avaliar o efeito das políticas no que respeita ao seu impacto sobre a igualdade de oportuni-

dades para todos os alunos.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

legislação que promove a inclusãoPara que possa ter impacto sobre a educação inclusiva, a legislação deve estabelecer

claramente a inclusão como uma meta. Neste sentido, a legislação de todos os sectores públicos deve conduzir à prestação de serviços e à melhoria dos processos que

favoreçam a inclusão educativa.

Em particular, a legislação deverá:

• Ser transversal aos sectores, de forma a existir uma coerência entre a educação inclusiva e outras iniciativas políticas;

• Constituir um quadro legal que contemple a educação inclusiva em todos os níveis de ensino.• Uma legislação abrangente e coordenada sobre a educação inclusiva, que contemple a

flexibilidade, a diversidade e a equidade em todas as instituições educacionais, para todos os alunos, garantindo que a política e a prestação do apoio sejam consistentes em todas as áreas geográficas do país/região. Essa legislação tem por base:

• Uma “abordagem centrada nos direitos”, em que os alunos (e seus familiares ou cuidadores) possam aceder ao ensino regular e aos serviços de apoio necessários, em todos os níveis;

• O alinhamento da legislação nacional com os acordos e declarações internacionais sobre a inclusão.

Comentários conclusivos

Considerando as principais mensagens evidenciadas ao longo do trabalho da Agência, pode perceber-se que o compromisso dos países para promover a inclusão será demonstrado por uma diminuição no número de alunos em contextos segregados, em toda a Europa.

Pode afirmar-se, que as necessárias mudanças sistémicas na política e nas respostas que visem a promoção da qualidade na educação inclusiva podem ser orientadas pelos princípios-chave, que se inter-relacionam e se apoiam mutuamente, apresentados nos pontos anteriores.

MAIs InFoRMAção

Toda a informação referenciada neste documento pode ser encontrada no website da Agência, na área Princípios-Chave: http://www.european-agency.org/agency-projects/key-principles

A informação inclui:

• Uma “matriz” de evidências dos estudos da Agência que sustentam cada um dos princípios-chave definidos na secção 3;

• Links ou ficheiros para download de todos os documentos e outros materiais da Agência refe-ridos neste documento.

As referências específicas a todos os materiais usados neste documento são apresentadas abaixo.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Fontes da agência

Kyriazopoulou, M. and Weber, H. (eds.) 2009. Development of a set of indicators – for inclusive edu-cation in Europe, Odense, Denmark: European Agency for Development in Special Needs Education

Meijer, C. J. W. (ed.) 2003. Special education across Europe in 2003: Trends in provision in 18 European countries, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Meijer, C. J. W., Soriano, V. and Watkins, A. (eds.) 2003. Special Needs Education in Europe: Thematic Publication, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Meijer, C. J. W. (ed.) 2005. Inclusive education and classroom practice in Secondary Education, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Meijer, C. J. W., Soriano, V. and Watkins, A. (eds.) 2006. Special Needs Education in Europe: Provision in Post-Primary Education, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Soriano, V. (ed.) 2005. Early Childhood Intervention: Analysis of Situations in Europe – Key Aspects and Recommendations, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Soriano, V. (ed.) 2005. Young Views on Special Needs Education: Results of the Hearing in the European Parliament – 3 November, 2003, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Soriano, V. (ed.) 2006. Individual Transition Plans – Supporting the Move from School to Employ-ment, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Soriano, V., Kyriazopoulou, M., Weber, H. and Grünberger, A. (eds.) 2008. Young Voices: Meeting Diversity in Education, Odense: European Agency for Development in Special Needs Education

Soriano, V., Grünberger, A. and Kyriazopoulou, M. (eds.) 2009. Multicultural Diversity and Special Needs Education, Odense: European Agency for Development in Special Needs Education

Watkins, A. (ed.) 2007. Assessment in Inclusive Settings: Key issues for policy and practice, Odense: European Agency for Development in Special Needs Education

Watkins, A. and D’Alessio, S. (eds.) 2009. Assessment in Inclusive Settings: Putting Inclusive Assess-ment into Practice, Odense: European Agency for Development in Special Needs Education

Todas estas publicações estão disponíveis em 21 línguas e podem ser descarregadas a partir da secção publicações no website da Agência: http://www.european-agency.org/publications

outras fontes

European Agency for Development in Special Needs Education 2007. Lisbon Declaration: Young People’s Views on Inclusive Education, available online: http://www.european-agency.org/ publications/flyers/lisbon-declaration-young-people2019s-views-on- inclusive-education

European Commission (DGXXII) 1996. The Charter of Luxembourg, Brussels, BelgiumEuropean Commission 2007. Communication from the Commission “A coherent framework of indi-

cators and benchmarks for monitoring progress towards the Lisbon objectives in education and training” (February 2007)

European Commission 2007. Progress towards the Lisbon objectives in Education and Training. Indicators and Benchmarks, Brussels, Commission Staff Working Document, SEC (2007) 1284

European Council 2001. Report from the Education Council to the European Council “The concrete future objectives of education and training systems” (February 2001)

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

European Council 2009. Council conclusions on a strategic framework for European co-operation in education and training (“ET 2020”), Brussels (May 2009)

European Union 1990. Resolution of the Council and the Ministers of Education meeting with the Council of 31 May 1990 concerning Integration of children and young people with disabilities into ordinary systems of education, Official Journal C 162, 03/07/1990, p. 2–3

European Union 1996. Resolution on the human rights of disabled people, Official Journal C 17, 22/10/1996

European Union 1996. Communication of the Commission on equality of opportunity for people with disabilities, COM (96)406 final of 30 July 1996

European Union 2001. European Parliament Resolution on the Communication from the Commission to the Council, the European Parliament, the Economic and Social Committee and the Committee of the Regions – Towards a barrier-free Europe for people with disabilities, adopted on 4 March 2001, (COM (20000 284 – C5-0632/ 2000-2000/2296 (COS))

European Union 2003. Council Resolution of 5 May 2003 on Equal opportunities for pupils and students with disabilities in education and training, 2003/C 134/04, Official Journal C 134, 07/06/2003

European Union 2003. Council Resolution of 15 July 2003 on promoting the employment and social integration of people with disabilities, (2003/C 175/01)

European Union 2003. European Parliament Resolution on the Communication from the Commission to the Council and the European Parliament – Towards a United Nations legally binding instru-ment to promote and protect the rights and dignity of persons with disabilities, (COM(2003) 16 – 2003/2100 (INI))

UNESCO 1994. The Salamanca Statement and Framework for Action on Special Needs Education, Paris: UNESCO

UNESCO 2008. “Inclusive Education: The Way of the Future”, International Conference on Educa-tion, 48th session, Final Report, Geneva: UNESCO

UNESCO 2009. Policy Guidelines on Inclusion in Education, Paris: UNESCOUnited Nations 1948. Universal Declaration of Human Rights, available online: http://www.un.org/

en/documents/udhr/United Nations 1960. Convention against Discrimination in Education, available online: http://

www2.ohchr.org/english/law/ education.htmUnited Nations 1989. Convention on the Rights of the Child, available online: http://www.unicef.

org/crc/United Nations 1993. Standard Rules on the Equalisation of Opportunities for Persons with Disabili-

ties, available online: http://www.un.org/esa/socdev/enable/dissre00.htmUnited Nations 2005. Convention on the Protection and Promotion of Diversity in Cultural Expression,

available online: http://portal.unesco. org/en/ev.php-URL_ID=31038&URL_DO=DO_TOPI-C&URL_ SECTION=201.html

United Nations 2006. Convention on Rights of People with Disabilities, available online: http://www.un.org/disabilities/convention/conventionfull.shtml

Watkins, A. (ed.) 2003. Key Principles for Special Needs Education – Recommendations for Policy Makers, Middelfart: European Agency for Development in Special Needs Education

Watkins, A. (ed.) 2009. Special Needs Education – Country Data 2008, Odense: European Agen-cy for Development in Special Needs Education

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Pt

O primeiro relatório sobre Princípios-Chave foi publicado pela Agência em 2003, baseado no trabalho da Agência até então publicado. A presente edição tem por base o trabalho da Agência a partir de 2003.

À semelhança da edição anterior, o presente documento foi elaborado por decisores políticos com a finalidade de fornecer aos decisores políticos da Europa uma síntese dos principais resultados do trabalho temático da Agência.

O presente relatório tem por finalidade apresentar recomendações sobre os aspectos-chave da política educativa que parecem ser eficazes no apoio à inclusão de alunos com diferentes tipos de necessidades educativas especiais (NEE) nas escolas regulares.

Estas recomendações afirmam os princípios da promoção da inclusão educativa e da escola para todos os alunos.

European Agency for Development in Special Needs Education

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3.2. educAção incLuSivA e educAção eSpeciAL- indicAdoreS-chAve pArA o deSenvoLvimento dAS eScoLAS: um GuiA pArA directoreS

sIGlAs utIlIzADAs:

• Cif- CJ Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - versão crian-ças e jovens

• Cno Centro Novas Oportunidades• Cri Centro de Recursos TIC para a Educação Especial• onu Organização das Nações Unidas PEI Programa Educativo Individual PIT Plano Indivi-

dual de Transição• tiC Tecnologias da Informação e Comunicação• unesCo Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

FInAlIDADE Do GuIA

A educação inclusiva tem vindo progressivamente a afirmar-se como uma questão central no plano dos direitos humanos, consignada em inúmeras declarações e convenções interna-cionais. O direito de todos à educação, inscrito na Declaração Universal dos Direitos Huma-nos (ONU, 1948) e na Declaração dos Direitos da Criança (ONU, 1959), foi posterior-mente reafirmado e renovado, designadamente na Declaração de Jomtien (ONU, 1990), na Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), na Declaração de Dakar (ONU, 2000) e mais recentemente na Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2006), através da consagração do direito a uma plena integração na educação e a uma educação de qualidade para todos.

Em Portugal, à semelhança de muitos outros países, as políticas educativas têm procu-rado responder aos desafios presentes nas orientações internacionais, incorporando as

1PEREIRA, Filomena et al. Educação Inclusiva e Educação Especial Indicadores Chave para o Desenvolvimento das Escolas:

Um Guia para Diretores. Lisboa: DGIDC, 2011. Disponível em: <https://www.dge.mec.pt/sites/default/files/EEspe-

cial/guia_diretor_16_9_net.pdf>. Acesso em: 31 out. 2016.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

dimensões política, ética e social em que se funda a educação inclusiva. A ratificação por Portugal da Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, designadamente do artigo 24°, através da Resolução da Assembleia da República n.o 56/2009, de 30 de Julho, confirma a determinação do Estado Português em manter a educação inclusiva no centro da Agenda Política.

O Decreto-Lei n.03/2008, de 7 de Janeiro, diploma que define os apoios especializados a prestar aos alunos com necessidades educativas especiais, situa-se numa perspectiva claramente inclusiva, reconhecendo e legitimando práticas educativas inclusivas e impulsionando uma mais célere mudança cultural e organizativa das escolas que mais timidamente iniciaram os seus percursos de desenvolvimento.

De acordo com as conclusões da avaliação externa à implementação do Decreto-Lei n.o3/2008 (Ferreira, M. e Simeonsson, R. et ai., 2010), este diploma legal veio permitir uma melhor qualidade das respostas educativas e do ensino, nomeadamente, uma escola mais inclusiva e um ensino de maior qualidade. Das recomendações delineadas, com base nos resultados do estudo e numa pers-pectiva de optimização da aplicação do Decreto-lei n.03/2008, salienta-se o desenvolvimento de indicadores de qualidade para a educação especial.

EDuCAção InClusIvA E EDuCAção EsPECIAl

Historicamente, o conceito de educação inclusiva surgiu as-sociado à educação dos alunos com necessidades educativas especiais, grupo tradicionalmente vulnerável à exclusão e ao in-sucesso. Actualmente o conceito é bem mais abrangente, sendo a tónica colocada na qualidade da educação e nas mudanças a introduzir nos contextos educativos para responder às necessida-des de todos os alunos.

A inclusão é um processo que visa responder à diversidade de necessidades de todos os alunos,através do incremento da sua participação na aprendizagem,na cultura e na comu-nidade e da redução da exclusão à educação e na educa-ção. Envolve modificações nos conteúdos,nas abordagens,-nas estruturas e nas estratégias e a convicção de que é responsabilidade do sistema educativo garantir a educação de todos os alunos. UNESCO,2005

De acordo com o conceito da UNESCO, há quatro ideias-chave sobre a educação inclusiva:

• A inclusão é um processo;• A inclusão diz respeito à participação de TODOS os alunos na

aprendizagem,na vida escolar e na comunidade;

O que é a educação inclusiva?

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• A inclusão implica a identificação e a remoção de barreiras à participação e à aprendizagem (ao nível das atitudes, da comunicação, do espaço físico, do meio sócio-económico, entre outras);

• A inclusão baseia-se no princípio de que as escolas são res-ponsáveis por garantir a educação de TODOS os alunos.

A escola inclusiva tem como princípio fundamental que todos os alunos devem aprender juntos, independentemente das suas dificuldades ou diferenças. As escolas devem responder às diver-sas necessidades dos seus alunos, assegurando uma educação de qualidade a todos, através de um currículo apropriado e de modifi-cações organizacionais.

Para os alunos com necessidades educativas especiais pode ser necessária a activação de apoios adicionais. A educação especial, nos termos do actual quadro legislativo, é operacionalizada através (i) de adequações curriculares (na organização da sala de aula, nos materiais didácticos, nas actividades, nas estratégias de ensino aprendizagem, nos instrumentos de avaliação, nos conteúdos curriculares);(ii) da introdução de TIC para aumentar a eficiência no desempenho das tarefas académicas e para desenvolver capacida-des;(iii) de apoio pedagógico personalizado e, em algumas situa-ções,(iv) de apoios terapêuticos.

A partir da análise de práticas educativas de sucesso foi possível identificar seis factores essenciais para o desenvolvimento de escolas numa perspectiva de inclusão:

• Liderança eficaz;• Reflexão sobre as práticas;• Envolvimento de todos os profissionais da escola, alunos e co-

munidade;• Planificação conjunta entre os profissionais da escola;• Implementação de estratégias de coordenação;• Valorização profissional de toda a equipa educativa. Os contextos e as práticas de cada escola são diferentes, pelo

que não existe uma fórmula única que possa ser aplicada por to-das. É necessário que cada escola seja capaz de analisar e de repensar as suas práticas. A utilização de indicadores permite uma análise aprofundada dos contextos e a definição de prioridades de desenvolvimento.

Qual o lugar da Educação especial

numa escola inclusiva?

Quais os factores que apoiamo

processo de desenvolvimento das

escolas?

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

QuADRo 1 - AlGuns InDICADoREs PARA MonItoRIzAR o PRoCEsso DE InClusão

· o conceito de educação inclusiva é conhecido e aceite por todos?

· o currículo fomenta os princípios da não discriminação, do valor da diversidade e da tolerância?

· o currículo fomenta os princípios da não discriminação, do valor da diversidade e da tolerância?

Os pais têm um papel activo na educação.Existem programas de sensibilização para apoiara educação inclusiva.A comunidade local e o sector privado são encorajados a apoiar a educação inclusiva.A educação inclusiva é vista como um importante factor para o desenvolvimento económico e social. As competências das escolas de educação especial são usadas para apoiar a inclusão.

Os direitos humanos e os direitos da criança fazem parte do currículo. O currículo contempla a coexistência de direitos e responsabilidades. O currículo é inclusivo para todos os alunos.O conteúdo do currículo é relevante para as necessidades e para o futuro dos alunos.Os programas, os materiais didácticos e os métodos de ensino são bem adaptados e relevan-tes para a vida dos alunos.O currículo permite uma variedade de métodos de ensino.O currículo é sensível ao género,identidade cultural e língua do país de origem.

Os métodos de ensino são adaptados às idades dos diferentes grupos. Os professores são en-corajados a trabalhar em equipa.Existe trabalho de projecto.Os materiais respondem às necessidades de todos os alunos.Os professores são encorajados a cooperar com pais e com a sociedade civil.

UNESC0,2009

Para apoiar as escolas existem diversos materiais, muitos deles resultantes de estudos de investigação-acção, que constituem um su-porte à recolha e análise de informação sobre a realidade de cada escola, bem como à implementação e monitorização dos processos de desenvolvimento.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

QuADRo 2 - MAtERIAIs DE suPoRtE Ao DEsEnvolvIMEnto DE EsColAs InClusIvAs

· Quadro 2 - materiais de suporte ao desenvolvimento de escolas inclusivas

Booth,tony;Ainscow,Mel. {2002).index para a inclusão{versão em português traduzida por Ana Maria Bénard da Costa e José Vaz pinto dis-ponível em http://redeinclusao.web.ua.pt/files/fl_17.pdf)

O Índex apresenta vários instrumentos de auto-análise, baseados na percepção dos profissionais, dos alunos, dos pais e de outros elementos da comunidade, abrangendo as três dimensões da escola: cultura,políticas e práticas.Caldeira, eisa;paes, isabel;Micaelo, Manuela;Vitorino, teresa. {2004). Aprender com a di-versidade:um guia para o desenvolvimento da escola. ACiMe/Me

É apresentado um referencial de desenvolvimento das escolas constituído por três áreas centrais: analisar contextos, ultrapassar barreiras e aprender a colaborar. Para cada uma destas áreas foram equacionadas questões estratégicas destinadas a fomentar a reflexão, o debate e a tomada de decisões em cada comunidade educativa.

Competent educators ofthe 21st Century:principies ofQuality pedagogy. {2010).issA

A International Step by Step Association desenvolveu um conjunto de princípios e de indicadores, visando a criação de comunidades de aprendizagem,que constituem um suporte para a refle-xão e discussão entre os profissionais,bem como para a monitorização e melhoria das práticas.Hollenweger, ludith; Haskell, simon. {2002). Quality indicators in special needs education. edition szH/spC

Hollenweger and Haskell definiram um conjunto de indicadores de qualidade que abrangem aspectos relativos (i) a políticas e recursos educativos, (ii) a processos educativos e (iii) a resultados educativos do sistema e dos indivíduos.

Os directores, dos agrupamentos ou de escolas, ocupam uma posi-ção privilegiada na comunidade escolar não só pelo facto de exercerem uma liderança formalmente legitimada, mas também por deterem uma visão sistémica do agrupamento, pelo que o seu papel poderá ser determinante, influenciando e apoiando o desencadear de processos de mudança orien-tados por princípios inclusivos. Esta mudança deve ser enquadrada num processo de desenvolvimento profissional que promova as competências necessárias à implementação de práticas inclusivas, designadamente ao nível da resolução colaborativa de problemas, ensino cooperativo, trabalho de equipa, comunicação com os pais e organização e gestão da sala de aula. Cabe aos profissionais, de cada agrupamento ou escola, identificar necessidades e definir os seus percursos de formação.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

PlAnEAMEnto E oRGAnIzAção DA EDuCAção EsPECIAl

Os agrupamentos ou escolas devem incluir nos seus documentos es-truturantes as adequações necessárias, ao nível da organização e do funcionamento, relativas à educação especial.

O director, do agrupamento ou escola, deve assumir um papel orga-nizador e de regulação, assegurando os mecanismos inerentes à implemen-tação de respostas de educação especial.

• Os documentos estruturantes contemplam finalidades, objectivos e estratégias que o agrupamento ou escola se propõem realizar com vista a apoiar os alunos com necessidades educativas especiais?

• Os documentos estruturantes identificam as respostas específicas, diferenciadas, a disponibilizar a alunos surdos, cegos ou com bai-xa visão, com perturbações do espectro do autismo ou com multi-deficiência?

• O Regulamento Interno estabelece a organização e o funciona-mento da educação especial e das respostas educativas?

• Existem critérios explícitos de distribuição de serviço dos di-versos intervenientes na educação especial?

• A escola desencadeou mecanismos de monitorização e auto • regulação da educação especial?• O director tem organizado, acompanhado e orientado o desen-

volvimento das modalidades específicas de educação?• O director tem acompanhado e assegurado o desenvolvimento dos

currículos específicos individuais?• O coordenador de departamento em que se integram os

docentes de educação especial tem orientado e assegurado o desenvolvimento dos currículos específicos individuais?

• O responsável pelo grupo de educação especial tem orientado e assegurado o desenvolvimento dos currículos específicos individuais?

• O agrupamento ou escola procede ao registo da assiduidade dos técnicos dos Centros de Recursos para a Inclusão?

• O director desencadeou os procedimentos necessanos à ava-liação dos alunos por referência à Classificação Internacional da Funcionalidade,Incapacidade e Saúde- versão crianças e jovens?

O processo de referenciação e avaliação assumiu carácter priori-tário em detrimento de outro serviço não lectivo?

De modo a garantir as adequações de carácter organizativo necessárias

QuADRo 3 - QuEstõEs DE APoIo à oRGAnIzAção E GEstão DA EDuCAção EsPECIAl

Quais os aspectos a ter em consideração na

organização e gestão da Educação

Especial?

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

PRoCEsso DE ElEGIbIlIDADE PARA A EDuCAção EsPECIAl

Uma escola inclusiva é uma escola que consegue responder às necessidades de todos os alunos. O actual quadro legislativo distin-gue as necessidades educativas que resultam de desvantagens de ordem social,cultural e económica, passíveis de ser ultrapassadas através de um ensino de qualidade no quadro da gestão da diversidade, daquelas

QuADRo 4 - APoIo Ao FunCIonAMEnto DE unIDADEs DE APoIo EsPECIAlIzADo- lIstA DE vERIFICAção

para responder às necessidades dos alunos com perturbações do espectro do autismo e com multideficiência ou surdocegueira congénita, o Decreto-Lei n. 0 3/2008 prevê a criação de unidades de apoio especializado.

· unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com Perturbações do espectro do autismo

· unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência ou surdocegueira Congénita

É implementado um modelo de ensino estruturado, assente em informação visual, orga-nização do espaço,do tempo,dos materiais e das actividades.Foram efectuadas as adequações curriculares necessárias.Foram adaptadas medidas educativas flexíveis e de carácter individual e dinâmico. São promovidas metodologias de intervenção transdisciplinares.Os alunos participam em actividades curriculares e de enriquecimento curricular junto dos pares da turma a que pertencem.São desenvolvidas actividades para a integração social dos alunos, em parceria com instituições da comunidade.

Os alunos participam em actividades curriculares e de enriquecimento curricular junto dos pa-res da turma a que pertencem.Os alunos dispõem dos apoios específicos necessários (por exemplo terapias). Foram efectua-das as adequações curriculares necessárias.Foram adaptadas medidas educativas flexíveis e de carácter individual e dinâmico.São desenvolvidas actividades para a integração social dos alunos, em parceria com instituições da comunidade.São desenvolvidas actividades para a integração social dos alunos, em parceria com instituições da comunidade.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

que efectivamente requerem apoios e recursos adicionais altamente diferenciados e especializados.

Compete à equipa de avaliação, que integra obrigatoriamente os en-carregados de educação, e com base na análise de toda a informação recolhida no processo de referenciação e de avaliação, identificar as necessidades educativas especiais dos alunos e os apoios especializados necessários.

Para efeitos de elegibilidade há que ter presente o grupo-alvo da educação especial.

Alunos com limitações significativas ao nível da actividade e da participação num ou vários domínios de vida, decorrentes de alte-rações funcionais e estruturais, de carácter permanente, resultan-do em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social. (Decreto-Lei n.03/2008)

Face ao grupo-alvo definido deve a equipa responsável pela avaliação considerar as seguintes questões:

• O aluno evidencia problemas nas funções ou estruturas do corpo?• O aluno tem dificuldades na execução das tarefas ou acções?• O aluno tem dificuldade em envolver-se nas actividades da vida

diária esperadas para o seu níveletário?• Existem factores ambientais que limitam/restringem ou facilitam

a funcionalidade do aluno?

Quais os factores que determinam a

elegibilidade para a educação especial?

Em que consiste o processo de

referenciação e de avaliação?

DA REFEREnCIAção à AvAlIAção

De acordo com o previsto no Decreto-Lei n.0 3/2008 qualquer pessoa ou entidade, sempre que presume que um aluno necessita de apoios especiali-zados, deve expressar e fundamentar essa necessidade junto da escola.

Este é o primeiro passo para que a escola inicie, com autorização dos encarregados de educação, o processo de avaliação que conduzirá à tomada de decisões quanto à elegibilidade para a educação especial, bem como à identificação dos apoios especializados adequadas para responder às necessidades educativas especiais.

O processo de avaliação culmina com a elaboração do relatório técnico-pedagógico que deve conter os resultados da avaliação e a descrição do perfil de funcionalidade do aluno, por referência à Classi-ficação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - versão crianças e jovens (CIF-CJ). Este relatório constitui a base para a elabora-ção do Programa Educativo Individual (PEI).

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Como operacionalizar

o processo de avaliação

especializada?

Em que consiste o processo de

referenciação e de avaliação?

QuADRo 5- IDEIAs-ChAvE sobRE o PRoCEsso DE AvAlIAção EsPECIAlIzADADA

Sempre que a referenciação é feita pelo professor de turma ou disciplina, o formulário de referenciação, aprovado pela direcção do agrupamento ou da escola, deve ser acompanhado das seguintes infor-mações pedagógicas:

• Preocupações do professor relativas ao desempenho escolar do alu-no que justificam a eventual necessidade de educação especial;

• Evidências que sustentam a referenciação (trabalhos dos alunos, registos de avaliação,etc);

• Acções já implementadas pelo professor para melhorar o processo de ensino e de aprendizagem (adequação de metodologias, de estratégias, organização da sala de aula, utilização de TIC, apoio individualizado ao aluno, recurso a tutorias, trabalho a pares,etc.).

A referenciação não é um mero acto administrativo de encaminha-mento para apoios especializados devendo assumir, antes de mais, um carácter pedagógico. A referenciação só deve ser realizada quando o professor verifica que através de estratégias de diferenciação pedagógi-ca não consegue responder às necessidades educativas do aluno. Antes de proceder à referenciação o professor deve analisar as suas práticas (atitudes, estratégias, actividades, materiais utilizados,...) no sentido de identificar aspectos que possam ser melhorados ao nível do processo de ensino e de aprendizagem.

No acto de tomada de decisão quanto ao envio do processo de refe-renciação para a equipa de avaliação,o director deve assegurar -se que:

• As razões da referenciação estão claramente expressas;• A informação disponibilizada indicia tratar-se de um aluno que ne-

cessita de apoios especializados;• Do processo constam produtos de aprendizagem do aluno;• A informação disponibilizada comprova que o professor esgotou todas

as possibilidades de responder às necessidades educativas do aluno.

•Temcomoobjectivoanalisarainformaçãodisponibilizadanoâmbitodareferenciação e, se necessário, recolher informação adicional que permita a tomada de decisões quanto: (i) à elegibilidade do aluno para a educa-ção especial e (ii) à definição das respostas educativas mais adequadas;•Cabeàdirecção,doagrupamentooudaescola,activarosme-canismos necessários para a constituição da equipa de avaliação;•Asequipasdeavaliação,degeometriavariável,integramprofissionais

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

da escola (professor de turma ou disciplina, diretor de turma, professor de educação especial, psicólogo, entre outros) e encarregados de educação;•Podeserútilaparticipaçãodeoutrosserviçosdeapoioàsescolas,designadamente, Centros de Recursos para a Inclusão (CRI), Centros de Recursos TIC para a Educação Especial e Saúde Escolar, entre outros;•Osresultadosdaavaliaçãosãoconsubstanciadosnorelatório téc-nico-pedagógico elaborado pela equipa de avaliação, o qual deve conter os resultados da avaliação por referência à CIF-CJ e orientações para elaboração do PEI.

A avaliação especializada pressupõe um trabalho colaborativo entre os diferentes intervenientes.

A homologação do relatório técnico-pedagógico traduz o compro-misso da direcção do agrupamento em criar as condições necessárias à implementação dos apoios especializados propostos, designadamente no que se refere à organização, gestão e afectação de recursos.

· Quadro 6 - apoio à homologação do relatório técnico-pedagógico - lista de verificação

O encarregado de educação participou activamente na avaliação especializada. O relatório apresenta os resultados da avaliação obtidos por referência à CIF-CJ.O relatório identifica as necessidades educativas do aluno.O relatório descreve o perfil de funcionalidade do aluno.O relatório fundamenta a decisão da elegibilidade para a educação especial. O relatório identifica os apoios especializados a constar do PEI.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

figura 1 –Processo de referenciação e de avaliação

Verifica a conformidade do processo de referenciação

(ver caixa 6)

referenCiAÇãoOrganizada numa perspectiva pedagógica e formalmente

entregue à direcção do agrupamento ou da escola

AVAliAÇãoA equipa analisa a informação contida no processo de

referenciação e decide sobre a necessidade de uma avaliação especializada por referência à CIF-CJ

Assegura-se de que oencarregado de educação

autorizou a avaliação

Envia para a equipa de avaliação

É necessária uma avaliação

especializada por referência à CIF -CJ

Confirma-se a necessidade de

educação especial

É elaborado o relatório técnico-pedagógico

HoMoloGAÇãoO relatório é enviado para homologação

Não é necessária uma avaliação

especializada por referência à CIF-CJ

Não se confirma a necessidade de

educação especial

O director não homologa

Emite despacho justificativo da

decisão

O director homologa

elABorAÇão do peiO relatório técnico-pedagógico serve

de base à elaboração do PEI

Elabora um relatório onde constam as razões

que fundamentam a decisão e identifica os

apoios à aprendizagemconsiderados adequados

Procede à avaliaçãoespecializada, podendo

solicitar aparticipação de outros

profissionais ou serviços

O director analisa a documentação

Solicitainformaçãoadicional

EtA

PA3ª

EtA

PA2ª

EtA

PA

Envia o processo dereferenciação para a equipa

de avaliação

Verifica a conformidade dorelatório técnicopedagógico(ver quadro 6) e procede à

sua homologação

Constitui a equipa de avaliação

EtAPAs ACção Do DIRECtoR

88

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

PRoGRAMA EDuCAtIvo InDIvIDuAl

QuADRo 7- IDEIAs-ChAvE sobRE o PEI

O Programa Educativo Individual (PEI) é o único documento legal que estabelece as respostas educativas consideradas adequadas a cada alu-no e fundamenta a afectação dos recursos necessários.

• Sempre que, decorrente da avaliação especializada por referência à CIF-CJ, o aluno foi considerado elegível para a educação especial.

• A elaboração do PEIdeve ser feita conjunta e obrigatoriamente pe-los docentes de grupo/ turma ou director de turma, pelo docente de educação especial, pelo encarregado de educação e sempre que necessário por outros profissionais intervenientes no processo educativo do aluno, designadamente os técnicos dos CRI.

• A coordenação do PEI compete ao educador de infância, profes-sor do 1° ciclo ou ao director de turma do aluno, conforme o nível de educação ou de ensino.

• O coordenador do PEIé o responsável pelo processo educativo do aluno, o que implica um acompanhamento contínuo à implementa-ção e avaliação do PEI .

• A responsabilidade pela implementação dos apoios definidos no PEI é de todos os docentes e técnicos intervenientes.

• Deve ser elaborado e aprovado no prazo máximo de 60 dias após a referenciação.

• É necessária a autorização expressa do encarregado de educa-ção, a aprovação pelo conselho pedagógico e a homologação pelo diretor do agrupamento ou da escola.

• A avaliação e a revisão do PEI são da responsabilidade de todos os intervenientes na sua elaboração e implementação.

• O PEI é obrigatoriamente avaliado em cada um dos momentos da avaliação sumativa da escola.

• O PEI pode ser revisto a qualquer momento e, obrigatoriamente, no final de cada nível de educação e de ensino e no fim da cada ciclo do ensino básico.

• A avaliação dos resultados obtidos pelo aluno com a aplicação das medidas estabelecidas no PEI deve ser expressa num relatório circunstanciado a elaborar no final do ano lectivo.

No acto de tomada de decisão quanto à homologação do PEI compete ao director, do agrupamento ou escola, verificar se:

Quando deve ser elaborado o PEI?

Quem participa na elaboração do PEI?

Quem são os responsáveis pela

coordenação e implementação do PEI?

Qual o prazo para a sua

elaboração e aprovação?

O que é necessário para

implementar o PEI?

A quem compete a avaliação e a revisão do PEI?

Quando é feita a avaliação e a revisão do PEI?

· Programa educativo individual

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• O PE fIoi aprovado pelo conselho pedagógico;• No PEcI onstam todos os elementos definidos no Decreto-Lei n.o

3/2008 (ver quadro 8);• No PEIconsta a autorização expressa do encarregado de educação;• Os recursos necessários à implementação do PEI estão garantidos;• Foram assegurados os direitos fundamentais do aluno (não discri-

minação,igualdade de oportunidades,privacidade...).

• Na organização e disposição da sala de aula;• Nos materiais didácticos;• Nas actividades;• Nas estratégias de ensino-aprendizagem;

QuADRo 8- APoIo à hoMoloGAção Do PRoGRAMA EDuCAtIvo InDIvIDuAl - lIstA DE vERIFICAção

· 1. Fundamentação dos apoios especializados

· 2. definição dos apoios especializados

Apresenta uma síntese descritiva da história escolar e pessoal do aluno. Identifica as áreas fortes e os interesses do aluno.Identifica as necessidades actuais do aluno de forma clara e não discriminatória.Identifica os pontos de vista do aluno (sempre que possível) sobre as suas dificuldades na aprendizagem.Reflecte os pontos de vista dos pais e o seu potencial para ajudar. Descreve o perfil de funcionalidade do aluno.Identifica os factores ambientais que funcionam como facilitadores/barreiras à participa-ção e à aprendizagem.

Define os recursos necessários (profissionais, produtos de apoio, equipamentos, etc.). Define as responsabilidades de cada um dos intervenientes na implementação do PEI.Define os espaços, a frequência, a distribuição horária das actividades e os apoios especializados.Define as formas de comunicação entre o docente de grupo/turma ou disciplina,e o pro-fessor de educação especial.Define as formas de comunicação com os pais.Define os procedimentos de avaliação e de revisão do PEI.Caso seja proposta a medida "Adequações Curriculares Individuais" estão discrimina-das as adequações previstas, designadamente:

90

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• Nos instrumentos de avaliação;• Nos conteúdos curriculares.

Caso seja proposta a medida "Currículo Específico Individual":

• Está claramente fundamentada a necessidade desta medida;• Foi considerada a interacção com os colegas da turma no máxi-

mo de situações e de actividades possíveis;• As actividades propostas valorizam a autonomia do aluno, são

adequadas à sua faixa etária e são úteis para a sua vida futura.

O PEI pode integrar um Plano Individual de Transição (PIT). O PIT é um instrumento de planeamento que consubstancia o processo de transição do aluno para a vida pós-escolar, elaborado de acordo com a situação,-motivação,desejos e capacidades do aluno.

Embora documentos estreitamente relacionados, PEI e PIT, foca-lizam aspectos diferentes do percurso de vida do aluno. O PEI identifica e descreve todos os elementos e procedimentos necessários à adequa-ção do processo de ensino e de aprendizagem do aluno. O PIT, enquanto complemento do PEI, alarga consideravelmente o espaço educativo do aluno ao direccionar-se para um conjunto de actividades de carácter social, pré-profissional e profissional ou ocupacional.

QuADRo 9- IDEIAs-ChAvE sobRE o PIt

• O PIT destina-se aos alunos com currículo específico individual.• A elaboração e implementação do PIT devem ocorrer três anos

antes da idade limite da escolaridade obrigatória.• O PIT tem como finalidade apoiar a transição do aluno para a vida

pós-escolar.• O PIT promove a aquisição de competências necessárias à inser-

ção familiar,comunitária e profissional.• O PIT é elaborado e implementado pela equipa responsável pelo

PEI, pelo encarregado de educação, pelo jovem e outros profissio-nais de serviços da comunidade, nomeadamente, dos CRI.

• O PIT deve ser datado e assinado por todos os profissionais que participam na sua elaboração, bem como pelo encarregado de educação e pelo aluno.

• Uma vez que o PIT complementa o PEI, deve ser avaliado sempre que

A quem se destina e quando deve ser

elaborado o PIT?

Qual a finalidade do PIT?

Quem elabora e implementa o PIT?

· Plano individual de transição

91

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

O processo de desenvolvimento das escolas para a inclusão exige a activação de mecanismos de gestão que permitam, por um lado, ade-quar os recursos existentes na escola e, por outro, encontrar os recursos adicionais necessários. Neste sentido, é da maior importância o mapeamento dos recursos da comunidade a mobilizar através do desen-volvimento de parcerias.

O Decreto-Lei n.0 3/2008 prevê que os agrupamentos ou escolas possam estabelecer parcerias com diversos serviços da comunidade, de-signadamente com os CRI. Os CRI constituem parceiros privilegia-dos, uma vez que integram recursos especializados, com conhecimentos e competências que lhes conferem um estatuto diferenciado para a prestação de serviços complementares à escola.

Os CRI, em parceria com os agrupamentos ou escolas da respectiva área de abrangência, desenvolvem a sua actividade sustentada num Plano de Acção.

Quando é feita e a quem compete

a avaliação e a revisão do PIT?

se proceder à avaliação deste e ser revisto sempre que necessário.• A avaliação e revisão do PIT são da responsabilidade de todos os

intervenientes na sua elaboração e implementação.

A equipa responsável pela elaboração do PIT deve ter presente um conjunto de aspectos fundamentais que asseguram, durante o processo de im-plementação do PIT, os valores, direitos e interesses dos alunos e das famílias.

• Identificar os interesses, desejos, motivações, competências, atitu-des e capacidades do aluno;

• Terem conta os valores culturais e expectativas da família;• Utilizar uma terminologia clara e acessível a todos os

intervenientes, em especial pais e aluno;• Garantir ao aluno o apoio e o aconselhamento de que necessita

antes, durante e depois do período de transição.

QuADRo 10- RECoMEnDAçõEs PARA A ElAboRAção Do PIt

PARCERIAs CoM sERvIços DA CoMunIDADE

· o Pit deve:

92

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

QuADRo 11- IDEIAs-ChAvE sobRE o PlAno DE ACção

O Plano de Acção é um instrumento que define e fundamenta os apoios especializados a prestar pelos CRI, previstos nos PEI, sempre que estes apoios não possam ser prestados através dos recursos existentes nos agrupamentos ou escolas.

Do Plano de Acção deve constar:

1. Identificação dos parceiros;2. Identificação dos apoios especializados a prestar, com base no per-

fil de funcionalidade dos alunos e nas medidas definidas nos PEI;3. Identificação e caracterização dos alunos que necessitam de apoios

especializados, de acordo com o definido no respectivo PEI;4. Definição dos objectivos tendo em vista elevar os níveis de de-

sempenho e de participação dos alunos nas actividades curricu-lares, e outras, desenvolvidas no âmbito da turma, da escola e em outros contextos;

5. Identificação dos recursos a mobilizar (psicólogo, terapeuta da fala,terapeuta ocupacional e fisioterapeuta);

6. Identificação das actividades a desenvolver, por referência às áre-as-chave definidas no artigo 30° do Decreto-Lei n.03/2008;

7. Identificação de outros serviços/entidades da comunidade (ex: centros de emprego, empresas, CNO, escolas profissionais, etc.) e explicitação do seu papel e responsabilidades na implementação do Plano de Acção;

8. Avaliação do Plano de Acção com base em indicadores que per-mitam medir os resultados através de evidências e tendo como referência os objectivos definidos;

9. Orçamento.

Compete ao director:

• Elaborar o Plano deAcção em conjunto com a entidade gestora do CRI;• Apresentar o Plano de Acção à Direcção Regional de Educação

para análise e aprovação;• Avaliar o Plano de Acção em conjunto com a entidade gestora do CRI.

O desenvolvimento do Plano de Acção exige um trabalho colabora-tivo entre os intervenientes ao longo de todo o processo, desde a identi-ficação de necessidades até à implementação das acções definidas.

É fundamental que a reflexão incida não só nos resultados obtidos mas também na qualidade das interacções estabelecidas entre os parceiros.

Quais os elementos que

devem constar no Plano de Acção?

O que implica o desenvolvimento do

Plano de Acção?

93

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

QuADRo 12- QuEstõEs DE APoIo à AnálIsE Do PRoCEsso ColAboRAtIvo

EnvolvIMEnto Dos PAIs

• Quais os aspectos que no desenvolvimento do plano de acção estão a ser abordados de forma colaborativa?

• Quais as evidências que sugerem existir colaboração entre os parceiros?• Quais os aspectos que no desenvolvimento do plano de acção não

estão a ser abordados de forma colaborativa?• Quais as evidências que sugerem não existir colaboração entre

os parceiros?• Quais as mudanças a introduzir para melhorar o processo colaborativo?

• Cabe ao director encorajar uma cultura de colaboração e apoiar a equipa de profissionais da escola, criando condi-ções facilitadoras do desenvolvimento de parcerias com servi-ços da comunidade.

Os pais têm o direito e o dever de participar nas decisões relativas à educação dos seus filhos. O Decreto-Lei n. 03/2008 expressa os direitos dos pais ao estabelecer que qualquer decisão relativa ao per-curso escolar dos alunos com necessidades educativas especiais só pode ser tomada com o seu consentimento.

A escola deve ter em atenção que os pais têm o direito de:

• Ser ouvidos;• Ser informados sobre qualquer assunto relativo ao seu filho;• Ser esclarecidos sobre as normas e regras que orientam o funciona-

mento do agrupamento ou da escola;• Dialogar com os intervenientes no processo educativo do seu filho;• Ter assegurada a confidencialidade das informações;• Utilizar a sua língua materna, ainda que seja necessário recorrer

a um intérprete;• Ter assegurado o respeito pelas diferenças culturais;• Ser esclarecidos sobre os procedimentos do Decreto-Lei• n.o3/2008;• Participar na avaliação;• Participar na elaboração do PEI;• Reclamar junto da administração sempre que não concordem com

o definido no PEI;

Quais são os direitos dos pais?

94

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• Solicitar a revisão do PEI;• Consultar o processo do seu filho;• Ter um exemplar do PEI.

Compete aos directores, dos agrupamentos e de escolas, criar as condições necessárias para que sejam assegurados os direitos dos pais.

A maioria dos pais destes alunos confronta-se com um conjunto de preocupações determinantes para a organização da sua vida diária.

QuADRo 13 - QuEstõEs MAIs FREQuEntEMEntE ColoCADAs PElos PAIs

QuADRo 14 - suGEstõEs PARA APoIAR o EnvolvIMEnto Dos PAIs nA EsColA

• Qual a escola mais adequada para o meu filho?• Estará a escola preparada para responder às necessidades do

meu filho?• Como posso participar no processo educativo do meu filho?• Poderá a escola assegurar actividades extracurriculares ao meu filho?• Poderá a escola disponibilizar os apoios terapêuticos de que o

meu filho precisa?• Será possível conciliar os horários das actividades escolares com os

apoios terapêuticos e outros prestados fora da escola?

É necessário que a escola seja um elemento facilitador, definindo acções concretas que possibilitem aos pais exercer o direito de intervir no processo educativo dos seus filhos.

• As reuniões devem ser planeadas respeitando a disponibilidade horária dos pais;

• Os pais devem ser avisados com antecedência das reuniões;• As reuniões devem ter objectivos claramente definidos;• Os pais devem ser encorajados a participar activamente na vida

da escola.

O director, do agrupamento ou escola, pode ter um papel determinante no desenvolvimento de uma cultura de escola que privilegie uma relação próxima com a comunidade e com os pais.

95

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Ainscow, Mel. (1995). Education For Ali: Making it Happen - Comunicação apresentada no Congresso Internacional de Educação Especial em Birmingham

Booth, Tony; Ainscow, Mel. (2002). Index para a Inclusão (acedido em Rede Inclusão, http://re-deinclusao.web.ua.pt/files/fl_17.pdf)

Caldeira, Eisa; Paes, Isabel; Micaelo, Manuela; Vitorino, Teresa. (2004). Aprender com a diversidade: Um guia para o desenvolvimento da escola. ACIME/ME

Decreto-Lei n.o3/2008 de 7 de Janeiro. Diário da República n.o4- 1.a Série. Ministério da Educa-ção. Lisboa

Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular. (2008). Educação Especial, Manual de Apoio à Pratica. Lisboa: Editorial do ME.

Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular. (2008). Educação de Alunos com Mul-tideficiência e com Surdocegueira Congénita: Organização da Resposta Educativa. Lisboa: Editorial do ME.

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http://www.dgidc.min-edu.pt/educacaoespecial/index.php?s=directorio&pid=6) UNESCO. (2005). Orientações para a inclusão: garantindo o acesso a todos.

QuADRo 15 - AnálIsE DA RElAção EntRE os PRoFIssIonAIs E os PAIs- lIstA DE vERIFICAção

bIblIoGRAFIA

Os profissionais estabelecem uma relação positiva com os pais.Os profissionais promovem a participação activa dos pais no processo de avaliação e de implementação do PEI.Os profissionais evitam a utilização de expressões técnicas quando comunicam com os pais. Os profissionais respeitam a opinião dos pais.Os profissionais escutam as preocupações dos pais. Os profissionais partilham informações com os pais.Só uma estreita colaboração entre profissionais e famílias permite compreender global-mente o aluno e planificar a intervenção nos diferentes contextos.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

UNESCO. (2009). Policy Guidelines on Inclusion in Education.World Health Organization. (2007). International Classification of Functio-

ning,Disability and Health- Children & Youth Version. Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Protocolo Opcional

(ONU,2006) Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU,1948)Declaração dos Direitos da Criança (ONU,1959) Declaração de Jomtien

(ONU,1990)Declaração de Salamanca (UNESCO,1994) Declaração de Dakar

(ONU,2000)

decreto-lei n.0 3/2008(publicado em diário da república, 1 a. série - n°. 4 - 7 de .Janeiro de 2008)

Constitui desígnio do XVII Governo Constitucional promover a igualdade de oportunidades, valorizar a educação e promover a melhoria da qualidade do ensino. Um aspecto determinante dessa qualidade é a promoção de uma escola democrática e inclusiva, orientada para o sucesso educativo de todas as crianças e jovens. Nessa medida importa planear um sistema de educação flexível, pautado por uma política global integrada, que permita responder à diversidade de características e necessidades de todos os alunos que implicam a inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas especiais no quadro de uma política de qualidade orientada para o sucesso educativo de todos os alunos.

Nos últimos anos, principalmente após a Declaração de Salamanca {1994), tem vindo a afirmar se a noção de escola inclusiva, capaz de acolher e reter, no seu seio, grupos de crianças e jovens

tradicionalmente excluídos. Esta noção, dada a sua dimensão eminentemente social, tem merecido o apoio generalizado de profissionais, da comunidade científica e de pais.

A educação inclusiva visa a equidade educativa, sendo que por esta se entende a garantia de igualdade, quer no acesso quer nos resultados.

No quadro da equidade educativa, o sistema e as práticas educativas devem assegurar a ges-tão da diversidade da qual decorrem diferentes tipos de estratégias que permitam responder às necessidades educativas dos alunos.

Deste modo, a escola inclusiva pressupõe individualização e personalização das estratégias educativas, enquanto método de prossecução do objectivo de promover competências universais que permitam a autonomia e o acesso à condução plena da cidadania por parte de todos.

Todos os alunos têm necessidades educativas, trabalhadas no quadro da gestão da diversidade acima referida. Existem casos, porém, em que as necessidades se revestem de contornos muito es-pecíficos, exigindo a activação de apoios especializados.

Os apoios especializados visam responder às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da actividade e da participação, num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de carácter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social e dando lugar à mobilização

AnExo

97

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

de serviços especializados para promover o potencial de funcionamento biopsicosocial.Os apoios especializados podem implicar a adaptação de estratégias, recursos, conteúdos, pro-

cessos, procedimentos e instrumentos, bem como a utilização de tecnologias de apoio. Portanto, não se trata só de medidas para os alunos, mas também de medidas de mudança no contexto escolar.

Entre os alunos com deficiências e incapacidades alguns necessitam de acções positivas que exigem diferentes graus de intensidade e de especialização. À medida que aumenta a necessidade de uma maior especialização do apoio personalizado, decresce o número de crianças e jovens que dele necessitam, do que decorre que apenas uma reduzida percentagem necessita de apoios personalizados altamente especializados.

Assim:No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.0 46/86, de 14 de Outubro, e

nos termos da alínea c) do n.0 1do artigo 198.0 da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Capítulo iobjectivos, enquadramento e princípios orientadores

Artigo 1.oobjecto e âmbito

1- O presente decreto-lei define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos sectores público, particular e cooperativo, visando a criação de condições para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da actividade e da participação num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de carácter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social.

2 - A educação especial tem por objectivos a inclusão educativa e social, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a estabilidade emocional, bem como a promoção da igualdade de oportunidades, a preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada preparação para a vida profissional e para uma transição da escola para o emprego das crianças e dos jovens nas necessidades educativas especiais nas condições acima descritas.

Artigo 2.oprincípios orientadores

1 - A educação especial prossegue, em permanência, os princípios da justiça e da solidarieda-de social, da não discriminação e do combate à exclusão social, da igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo, da participação dos pais e da confidencialidade da informação.

2 - Nos termos do disposto no número anterior, as escolas ou os agrupamentos de escolas, os es-tabelecimentos de ensino particular com paralelismo pedagógico, as escolas profissionais, directa ou indirectamente financiados pelo Ministério da Educação (ME), não podem rejeitar a matrícula ou a inscrição de qualquer criança ou jovem com base na incapacidade ou nas necessidades educativas especiais que manifestem.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3 -As crianças e jovens com necessidades educativas especiais de carácter permanente gozam de prioridade na matrícula, tendo o direito, nos termos do presente decreto-lei, a frequentar o jar-dim-de-infância ou a escola nos mesmos termos das restantes crianças.

4 - As crianças e os jovens com necessidades educativas especiais de carácter permanente têm direito ao reconhecimento da sua singularidade e à oferta de respostas educativas adequadas.

5 - Toda a informação resultante da intervenção técnica e educativa está sujeita aos limites cons-titucionais e legais, em especial os relativos à reserva da intimidade da vida privada e familiar e ao tratamento automatizado, conexão, transmissão, utilização e protecção de dados pessoais, sendo garantida a sua confidencialidade.

Artigo 3.oparticipação dos pais e encarregados de educação

1 - Os pais ou encarregados de educação têm o direito e o dever de participar activamente, exercendo o poder paternal nos termos da lei, em tudo o que se relacione com a educação especial a prestar ao seu filho, acedendo, para tal, a toda a informação constante do processo educativo.

2 - Quando, comprovadamente, os pais ou encarregados de educação não exerçam o seu di-reito de participação, cabe à escola desencadear as respostas educativas adequadas em função das necessidades educativas especiais diagnosticadas.

3 - Quando os pais ou encarregados de educação não concordem com as medidas educativas propostas pela escola, podem recorrer, mediante documento escrito, no qual fundamentam a sua posição, aos serviços competentes do ME.

Artigo 4.oorganização

1 - As escolas devem incluir nos seus projectos educativos as adequações relativas ao processo de ensino e de aprendizagem, de carácter organizativo e de funcionamento, necessárias para responder adequadamente às necessidades educativas especiais de carácter permanente das crianças e jovens, com vista a assegurar a sua maior participação nas actividades de cada grupo ou turma e da comunidade escolar em geral.

2 - Para garantir as adequações de carácter organizativo e de funcionamento referidas no número anterior, são criadas por despacho ministerial:

a) Escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos;b) Escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão.

3 - Para apoiar a adequação do processo de ensino e de aprendizagem podem as escolas ou agrupamentos de escolas desenvolver respostas específicas diferenciadas para alunos com per-turbações do espectro do autismo e com multideficiência, designadamente através da criação de:

a) Unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espectro do autismo;b) Unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

4- As respostas referidas nas alíneas a) e b) do número anterior são propostas por deliberação do conselho executivo, ouvido o conselho pedagógico, quando numa escola ou grupos de escolas limítrofes, o número de alunos o justificar e quando a natureza das respostas, dos equipamentos específicos e das especializações profissionais, justifiquem a sua concentração.

5 -As unidades referidas no n.0 3 são criadas por despacho do director regional de edu-cação competente.

Capítulo ii

procedimentos de referenciação e avaliação

Artigo 5.oprocesso de referenciação

1 - A educação especial pressupõe a referenciação das crianças e jovens que eventualmente dela necessitem, a qual deve ocorrer o mais precocemente possível, detectando os factores de risco associados às limitações ou incapacidades.

2 - A referenciação efectua-se por iniciativa dos pais ou encarregados de educação, dos servi-ços de intervenção precoce, dos docentes ou de outros técnicos ou serviços que intervêm com a criança ou jovem ou que tenham conhecimento da eventual existência de necessidades educativas especiais.

3 - A referenciação é feita aos órgãos de administração e gestão das escolas ou agrupamentos de escolas da área da residência, mediante o preenchimento de um documento onde se explicitam as razões que levaram a referenciar a situação e se anexa toda a documentação considerada relevante para o processo de avaliação.

Artigo 6.oprocesso de avaliação

1 - Referenciada a criança ou jovem, nos termos do artigo anterior, compete ao conselho executivo desencadear os procedimentos seguintes:

a) Solicitar ao departamento de educação especial e ao serviço de psicologia um relatório técnico-pedagógico conjunto, com os contributos dos restantes intervenientes no processo, onde sejam identificadas, nos casos em que tal se justifique, as razões que determinam as necessidades educativas especiais do aluno e a sua tipologia, designadamente as condições de saúde, doença ou incapacidade;b) Solicitar ao departamento de educação especial a determinação dos apoios especializados, das adequações do processo de ensino e de aprendizagem de que o aluno deva beneficiar e das tecnologias de apoio;c) Assegurar a participação activa dos pais ou encarregados de educação, assim como a sua anuência;d) Homologar o relatório técnico-pedagógico e determinar as suas implicações;e) Nos casos em que se considere não se estar perante uma situação de necessidades educati-vas que justifiquem a intervenção dos serviços da educação especial, solicitar ao departamento

100

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

de educação especial e aos serviços de psicologia o encaminhamento dos alunos para os apoios disponibilizados pela escola que melhor se adeqúem à sua situação específica.

2- Para a elaboração do relatório a que se refere a alínea a) do número anterior pode o conselho executivo, quando tal se justifique, recorrer aos centros de saúde, a centros de recursos espe-cializados, às escolas ou unidades referidas nos n.os 2 e 3 do artigo 4.o

3 - Do relatório técnico-pedagógico constam os resultados decorrentes da avaliação, obtidos por referência à Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, da Organiza-ção Mundial de Saúde, servindo de base à elaboração do programa educativo individual.

4- O relatório técnico-pedagógico a que se referem os números anteriores é parte integrante do processo individual do aluno.

5 - A avaliação deve ficar concluída 60 dias após a referenciação com a aprovação do progra-ma educativo individual pelo presidente do conselho executivo.

6 - Quando o presidente do conselho executivo decida pela não aprovação, deve exarar despa-cho justificativo da decisão, devendo reenviá-lo à entidade que o tenha elaborado, com o fim de obter uma melhor justificação ou enquadramento.

Artigo 7.oserviço docente nos processos de referenciação e de avaliação

1- O serviço docente no âmbito dos processos de referenciação e de avaliação assume carácter prioritário, devendo concluir-se no mais curto período de tempo, dando preferência à sua execução sobre toda a actividade docente e não docente, à excepção da lectiva.

2 - O serviço de referenciação e de avaliação é de aceitação obrigatória e quando re-alizado por um docente é sempre integrado na componente não lectiva do seu horário de trabalho.

Capítulo iiiprograma educativo individual e plano individual de transição

Artigo 8.oprograma educativo individual

1- O programa educativo individual é o documento que fixa e fundamenta as respostas educativas e respectivas formas de avaliação.

2 - O programa educativo individual documenta as necessidades educativas especiais da criança ou jovem, baseadas na observação e avaliação de sala de aula e nas informações complementares disponibilizadas pelos participantes no processo.

3 - O programa educativo individual integra o processo individual do aluno.

Artigo 9.oModelo do programa educativo individual

1 - O modelo do programa educativo individual é aprovado por deliberação do con-

101

Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

selho pedagógico e inclui os dados do processo individual do aluno, nomeadamente identifica-ção, história escolar e pessoal relevante, conclusões do relatório de avaliação e as adequações no processo de ensino e de aprendizagem a realizar, com indicação das metas, das estratégias, recursos humanos e materiais e formas de avaliação.

2 - O modelo do programa educativo individual integra os indicadores de funcionalidade, bem como os factores ambientais que funcionam como facilitadores ou como barreiras à actividade e participação do aluno na vida escolar, obtidos por referência à Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, em termos que permitam identificar o perfil concreto de funcionalidade.

3 - Do modelo de programa educativo individual devem constar, de entre outros, obrigatoriamente:a) A identificação do aluno;b) O resumo da história escolar e outros antecedentes relevantes;c) A caracterização dos indicadores de funcionalidade e do nível de aquisições e dificuldades do aluno;d) Os factores ambientais que funcionam como facilitadores ou como barreiras à participação e à aprendizagem;e) Definição das medidas educativas a implementar;f) Discriminação dos conteúdos, dos objectivos gerais e específicos a atingir e das estra-tégias e recursos humanos e materiais a utilizar;g) Nível de participação do aluno nas actividades educativas da escola;h) Distribuição horária das diferentes actividades previstas;i) Identificação dos técnicos responsáveis;j) Definição do processo de avaliação da implementação do programa educativo individual;I) A data e assinatura dos participantes na sua elaboração e dos responsáveis pelas res-postas educativas a aplicar.

Artigo 10.oelaboração do programa educativo individual

1 - Na educação pré-escolar e no 1.0 ciclo do ensino básico, o programa educativo individual é elaborado, conjunta e obrigatoriamente, pelo docente do grupo ou turma, pelo docente de educação especial, pelos encarregados de educação e sempre que se considere necessário, pelos serviços referidos na alínea a) do n.0 1e no n.0 2 do artigo 6.0, sendo submetido à aprovação do conselho pedagógico e homologado pelo conselho executivo.

2- Nos 2.0 e 3.0 ciclos do ensino básico e no ensino secundário e em todas as moda-lidades não sujeitas a monodocência, o programa educativo individual é elaborado pelo director de turma, pelo docente de educação especial, pelos encarregados de educação e sempre que se considere necessário pelos serviços referidos na alínea a) do n.0 1e no n.0 2 do artigo 6.0, sendo submetido à aprovação do conselho pedagógico e homologado pelo conselho executivo.

3 - No caso dos alunos surdos com ensino bilingue deve também participar na elaboração do programa educativo individual um docente surdo de LGP.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Artigo 11.oCoordenação do programa educativo individual

1- O coordenador do programa educativo individual é o educador de infância, o professor do 1.0 ciclo ou o diretor de turma, a quem esteja atribuído o grupo ou a turma que o aluno integra.

2 - A aplicação do programa educativo individual carece de autorização expressa do encarre-gado de educação, excepto nas situações previstas no n.o 2 do artigo 3.o

Artigo 12.oprazos de aplicação do programa educativo individual

1 - A elaboração do programa educativo individual deve decorrer no prazo máximo de 60 dias após a referenciação dos alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente.

2 - O programa educativo individual constituiu o único documento válido para efeitos de distribuição de serviço docente e não docente e constituição de turmas, não sendo permitida a aplicação de qualquer adequação no processo de ensino e de aprendizagem sem a sua existência.

Artigo 13.oAcompanhamento do programa educativo individual

1 - O programa educativo individual deve ser revisto a qualquer momento e, obrigatoriamente, no final de cada nível de educação e ensino e no fim de cada ciclo do ensino básico.

2 - A avaliação da implementação das medidas educativas deve assumir carácter de continui-dade, sendo obrigatória pelo menos em cada um dos momentos de avaliação sumativa interna da escola.

3 - Dos resultados obtidos por cada aluno com a aplicação das medidas estabelecidas no programa educativo individual, deve ser elaborado um relatório circunstanciado no final do ano lectivo.

4 - O relatório referido no número anterior é elaborado, conjuntamente pelo educador de infância, professor do 1. 0 ciclo ou director de turma, pelo docente de educação especial, pelo psicólogo e pelos docentes e técnicos que acompanham o desenvolvimento do processo educativo do aluno e aprovado pelo conselho pedagógico e pelo encarregado de educação.

5 - O relatório explicita a existência da necessidade de o aluno continuar a beneficiar de adequações no processo de ensino e de aprendizagem, propõe as alterações necessárias ao programa educativo individual e constitui parte integrante do processo individual do aluno.

6 - O relatório referido nos números anteriores, ao qual é anexo o programa educativo individual,é obrigatoriamente comunicado ao estabelecimento que receba o aluno, para prosseguimento de

estudos ou em resultado de processo de transferência.

Artigo 14.oplano individual de transição

1 - Sempre que o aluno apresente necessidades educativas especiais de carácter permanente que o impeçam de adquirir as aprendizagens e competências definidas no currículo deve a escola complementar o programa educativo individual com um plano individual de transição destinado a pro-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

mover a transição para a vida pós-escolar e, sempre que possível, para o exercício de uma activida-de profissional com adequada inserção social, familiar ou numa instituição de carácter ocupacional.

2 - A concretização do número anterior, designadamente a implementação do plano individual de transição, inicia-se três anos antes da idade limite de escolaridade obrigatória, sem prejuízo do disposto no artigo anterior.

3 - No sentido de preparar a transição do jovem para a vida pós-escolar, o plano individual de transição deve promover a capacitação e a aquisição de competências sociais necessárias à inserção familiar e comunitária.

4 - O plano individual de transição deve ser datado e assinado por todos os profissionais que participam na sua elaboração, bem como pelos pais ou encarregados de educação e, sempre que possível, pelo próprio aluno.

Artigo 15.0Certificação

1 - Os instrumentos de certificação da escolaridade devem adequar-se às necessidades especiais dos alunos que seguem o seu percurso escolar com programa educativo individual.

2 - Para efeitos do número anterior, os instrumentos normalizados de certificação devem identi-ficar as adequações do processo de ensino e de aprendizagem que tenham sido aplicadas.

3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, as normas de emissão e os formulários a utilizar são as mesmas que estejam legalmente fixadas para o sistema de ensino.

Capítulo iV Medidas educativasArtigo 16.o

Adequação do processo de ensino e de aprendizagem

1- A adequação do processo de ensino e de aprendizagem integra medidas educativas que vi-sam promover a aprendizagem e a participação dos alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente.

2- Constituem medidas educativas referidas no número anterior:a) Apoio pedagógico personalizado;b) Adequações curriculares individuais; c) Adequações no processo de matrícula; d) Adequações no processo de avaliação; e) Currículo específico individual;f) Tecnologias de apoio.

3 - As medidas referidas no número anterior podem ser aplicadas cumulativamente, com excepção das alíneas b) e e), não cumuláveis entre si.

4 - As medidas educativas referidas no n.0 2 pressupõem o planeamento de estratégias e de actividades que visam o apoio personalizado aos alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente que integram obrigatoriamente o plano de actividades da escola de acordo com o projecto educativo de escola.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

5 - O projecto educativo da escola deve conter:a) As metas e estratégias que a escola se propõe realizar com vista a apoiar os alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente;b) A identificação das respostas específicas diferenciadas a disponibilizar para alunos surdos, cegos, com baixa visão, com perturbações do espectro do autismo e com multideficiência.

Artigo 17.oApoio pedagógico personalizado

1- Para efeitos do presente decreto-lei entende-se por apoio pedagógico personalizado:a) O reforço das estratégias utilizadas no grupo ou turma aos níveis da organização, do espaço e das actividades;b) O estímulo e reforço das competências e aptidões envolvidas na aprendizagem;c) A antecipação e reforço da aprendizagem de conteúdos leccionados no seio do grupo ou da turma;d) O reforço e desenvolvimento de competências específicas.

2 - O apoio definido nas alíneas a), b) e c) do número anterior é prestado pelo educador de infân-cia, pelo professor de turma ou de disciplina, conforme o nível de educação ou de ensino do aluno.

3 - O apoio definido na alínea d) do n.01 é prestado, consoante a gravidade da situação dos alunos e a especificidade das competências a desenvolver, pelo educador de infância, professor da turma ou da disciplina, ou pelo docente de educação especial.

Artigo 18.0Adequações curriculares individuais

1 - Entende-se por adequações curriculares individuais aquelas que, mediante o parecer do conselho de docentes ou conselho de turma, conforme o nível de educação e ensino, se considere que têm como padrão o currículo comum, no caso da educação pré-escolar as que respeitem as orientações curriculares, no ensino básico as que não põem em causa a aquisição das competências terminais de ciclo e, no ensino secundário, as que não põem em causa as competências essenciais das disciplinas.

2 - As adequações curriculares podem consistir na introdução de áreas curriculares específicas que não façam parte da estrutura curricular comum, nomeadamente leitura e escrita em braille, orientação e mobilidade, treino de visão e a actividade motora adaptada, entre outras.

3 - A adequação do currículo dos alunos surdos com ensino bilingue consiste na introdução de áreas curriculares específicas para a primeira língua (L1), segunda língua (L2) e terceira língua (L3):

a) A língua gestual portuguesa (L1), do pré-escolar ao ensino secundário;b) O português segunda língua (L2) do pré-escolar ao ensino secundário;c) A introdução de uma língua estrangeira escrita (L3) do 3.0 ciclo do ensino básico ao ensino secundário.

4 - As adequações curriculares podem consistir igualmente na introdução de objectivos e conteúdos intermédios em função das competências terminais do ciclo ou de curso, das características de aprendizagem e dificuldades específicas dos alunos.

5 - As adequações curriculares individuais podem traduzir-se na dispensa das atividades que se

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

revelem de difícil execução em função da incapacidade do aluno, só sendo aplicáveis quando se verifique que o recurso a tecnologias de apoio não é suficiente para colmatar as necessidades educativas resultantes da incapacidade.

Artigo 19.oAdequações no processo de matrícula

1 - As crianças e jovens com necessidades educativas especiais de carácter permanente gozam de condições especiais de matrícula, podendo nos termos do presente decreto-lei, frequentar o jar-dim-de-infância ou a escola, independentemente da sua área de residência.

2 - As crianças com necessidades educativas especiais de carácter permanente podem, em situações excepcionais devidamente fundamentadas, beneficiar do adiamento da matrícula no1.0 ano de escolaridade obrigatória, por um ano, não renovável.

3 - A matrícula por disciplinas pode efectuar-se nos 2.0 e 3.0 ciclos do ensino básico e no en-sino secundário, desde que assegurada a sequencialidade do regime educativo comum.

4 - As crianças e jovens surdos têm direito ao ensino bilingue, devendo ser dada prioridade à sua matrícula nas escolas de referência a que se refere a alínea a) do n.0 2 do artigo 4.0 inde-pendentemente da sua área de residência.

5 - As crianças e jovens cegos ou com baixa visão podem matricular-se e frequentar escolas da rede de escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão a que se refere a alínea b) do n.0 2 do artigo 4.0, independentemente da sua área de residência.

6 - As crianças e jovens com perturbações do espectro do autismo podem matricular-se e frequentar escolas com unidades de ensino estruturado a que se refere alínea a) do n.0 3 do artigo 4.0 independentemente da sua área de residência.

7 - As crianças e jovens com multideficiência e com surdocegueira podem matricular-se e frequentar escolas com unidades especializadas a que se refere a alínea b) do n.0 3 do artigo 4.0, independentemente da sua área de residência.

Artigo 20.0Adequações no processo de avaliação

1- As adequações quanto aos termos a seguir para a avaliação dos progressos das aprendiza-gens podem consistir, nomeadamente, na alteração do tipo de provas, dos instrumentos de avalia-ção e certificação, bem como das condições de avaliação, no que respeita, entre outros aspectos, às formas e meios de comunicação e à periodicidade, duração e local da mesma.

2 - Os alunos com currículos específicos individuais não estão sujeitos ao regime de transição de ano escolar nem ao processo de avaliação característico do regime educativo comum, ficando sujei-tos aos critérios específicos de avaliação definidos no respectivo programa educativo individual.

Artigo 21.oCurrículo específico individual

1 - Entende-se por currículo específico individual, no âmbito da educação especial, aquele

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

que, mediante o parecer do conselho de docentes ou conselho de turma, substitui as competências definidas para cada nível de educação e ensino.

2 - O currículo específico individual pressupõe alterações significativas no currículo comum, podendo as mesmas traduzir-se na introdução, substituição e ou eliminação de objectivos e con-teúdos, em função do nível de funcionalidade da criança ou do jovem.

3 - O currículo específico individual inclui conteúdos conducentes à autonomia pessoal e social do aluno e dá prioridade ao desenvolvimento de actividades de cariz funcional centradas nos con-textos de vida, à comunicação e à organização do processo de transição para a vida pós escolar.

4 - Compete ao conselho executivo e ao respectivo departamento de educação especial orientar e assegurar o desenvolvimento dos referidos currículos.

Artigo 22.otecnologias de apoio

Entende-se por tecnologias de apoio os dispositivos facilitadores que se destinam a melhorar a funcionalidade e a reduzir a incapacidade do aluno, tendo como impacte permitir o desempenho de actividades e a participação nos domínios da aprendizagem e da vida profissional e social.

Capítulo V

Modalidades específicas de educação

Artigo 23.oeducação bilingue de alunos surdos

1 - A educação das crianças e jovens surdos deve ser feita em ambientes bilingues que possibilitem o domínio da LGP, o domínio do português escrito e, eventualmente, falado, competindo à escola contribuir para o crescimento linguístico dos alunos surdos, para a adequação do processo de acesso ao currículo e para a inclusão escolar e social.

2 - A concentração dos alunos surdos, inseridos numa comunidade linguística de referência e num grupo de socialização constituído por adultos, crianças e jovens de diversas idades que utilizam a LGP, promove condições adequadas ao desenvolvimento desta língua e possibilita o desenvolvimento do ensino e da aprendizagem em grupos ou turmas de alunos surdos, iniciando se este processo nas primeiras idades e concluindo-se no ensino secundário.

3 - As escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos a que se refere a alínea a) do n.0 2 do artigo 4.0 constituem uma resposta educativa especializada desenvolvida, em agrupamentos de escolas ou escolas secundárias que concentram estes alunos numa escola, em grupos ou turmas de alunos surdos.

4 - As escolas de referência para a educação de ensino bilingue de alunos surdos têm como objectivo principal aplicar metodologias e estratégias de intervenção interdisciplinares, adequadas a alunos surdos.

5- As escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos integram:a) Docentes com formação especializada em educação especial, na área da surdez, com-petentes em LGP (docentes surdos e ouvintes dos vários níveis de educação e ensino),com

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

formação e experiência no ensino bilingue de alunos surdos;b) Docente surdo de LGP;c) Intérpretes de LGP;d) Terapeutas da fala.

6- Para os alunos surdos, o processo de avaliação, referido no artigo 6. 0, deve ser desenvolvido por equipas a constituir no agrupamento de escolas ou nas escolas secundárias para a educação bilingue destes alunos.

7- As equipas referidas no número anterior devem ser constituídas pelos seguintes elementos:a) Docente que lecciona grupo ou turma de alunos surdos do nível de educação e ensino da criança ou jovem;b) Docente de educação especial especializado na área da surdez;c) Docentes surdos de LGP;d) Terapeutas da fala;e) Outros profissionais ou serviços da escola ou da comunidade.

8 - Deve ser dada prioridade à matrícula de alunos surdos, nas escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos.

9 - A organização da resposta educativa deve ser determinada pelo nível de educação e ensino, ano de escolaridade, idade dos alunos e nível de proficiência linguística.

10 - As respostas educativas devem ser flexíveis, assumindo carácter individual e dinâmico, e pressupõem uma avaliação sistemática do processo de ensino e de aprendizagem do aluno surdo, bem como o envolvimento e a participação da família.

11 - Os agrupamentos de escolas que integram os jardins-de-infância de referência para a educação bilingue de crianças surdas devem articular as respostas educativas com os serviços de intervenção precoce no apoio e informação das escolhas e opções das suas famílias e na disponibilização de recursos técnicos especializados, nomeadamente de docentes surdos de LGP, bem como na frequência precoce de jardim-de-infância no grupo de crianças surdas.

12 - As crianças surdas, entre os 3 e os 6 anos de idade, devem frequentar a educação pré escolar, sempre em grupos de crianças surdas, de forma a desenvolverem a LGP como primeira língua, sem prejuízo da participação do seu grupo com grupos de crianças ouvintes em actividades desenvolvidas na comunidade escolar.

13 - Os alunos dos ensino básico e secundário realizam o seu percurso escolar em turmas de alunos surdos, de forma a desenvolverem a LGP como primeira língua e aceder ao currículo nesta língua, sem prejuízo da sua participação com as turmas de alunos ouvintes em actividades desen-volvidas na comunidade escolar.

14 - A docência dos grupos ou turmas de alunos surdos é assegurada por docentes surdos ou ouvintes com habilitação profissional para leccionar aqueles níveis de educação e ensino, competentes em LGP e com formação e experiência no ensino bilingue de alunos surdos.

15 - Na educação pré-escolar e no 1.0 ciclo do ensino básico deve ser desenvolvido um tra-balho de co-responsabilização e parceria entre docentes surdos e ouvintes de forma a garantir aos alunos surdos a aprendizagem e o desenvolvimento da LGP como primeira língua, e da língua portuguesa, como segunda língua.

16 - Sempre que se verifique a inexistência de docente surdo competente em LGP, com habilitação profissional para o exercício da docência no pré-escolar ou no 1.0 ciclo do ensino

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básico, deve ser garantida a colocação de docente surdo responsável pela área curricular de LGP, a tempo inteiro, no grupo ou turma dos alunos surdos.

17 - Não se verificando a existência de docentes competentes em LGP nos 2.0 e 3.0 ciclos do ensino básico e no ensino secundário, as aulas leccionadas por docentes ouvintes são traduzidas por um intérprete de LGP.

18 - Ao intérprete de LGP compete fazer a tradução da língua portuguesa oral para a língua ges-tual portuguesa e da língua gestual portuguesa para a língua oral das actividades que na escola envolvam a comunicação entre surdos e ouvintes, bem como a tradução das aulas leccionadas por docentes, reuniões, acções e projectos resultantes da dinâmica da comunidade educativa.

19 - Os docentes surdos de LGP asseguram o desenvolvimento da língua gestual portuguesa como primeira língua dos alunos surdos.

20 - Os docentes ouvintes asseguram o desenvolvimento da língua portuguesa como segunda língua dos alunos surdos.

21- Aos docentes de educação especial com formação na área da surdez, colocados nas esco-las de referência para a educação bilingue de alunos surdos, compete:

a) Leccionar turmas de alunos surdos, atendendo à sua habilitação profissional para a do-cência e à sua competência em LGP;b) Apoiar os alunos surdos na antecipação e reforço das aprendizagens, no domínio da leitura/escrita;c) Elaborar e adaptar materiais para os alunos que deles necessitem;d) Participar na elaboração do programa educativo individual dos alunos surdos.

22 - Aos docentes surdos com habilitação profissional para o ensino da área curricular ou da disciplina de LGP compete:

a) Leccionar os programas LGP como primeira língua dos alunos surdos;b) Desenvolver,acompanhar e avaliar o processo de ensino e de aprendizagem da LGPc) Definir, preparar e elaborar meios e suportes didácticos de apoio ao ensino/aprendi-zagem da LGP;d) Participar na elaboração do programa educativo individual dos alunos surdos;e) Desenvolver actividades, no âmbito da comunidade educativa em que se insere, visando a interacção de surdos e ouvintes e promovendo a divulgação da LGP junto da comunidade ouvinte;f) Ensinar a LGP como segunda língua a alunos ou outros elementos da comunidade educativa em que está inserido, difundir os valores e a cultura da comunidade surda con-tribuindo para a integração social da pessoa surda.

23 - As escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos devem estar apetrechadas com equipamentos essenciais às necessidades específicas da população surda.

24- Consideram-se equipamentos essenciais ao nível da escola e da sala de aula os seguin-tes: computadores com câmaras, programas para tratamento de imagem e filmes, impressora e scanner; televisor e vídeo, câmara e máquinas fotográficas digitais, retroprojector, projector multimédia, quadro interactivo, sinalizadores luminosos de todos os sinais sonoros, telefone com serviço de mensagens curtas (sms), sistema de vídeo-conferência, software educativo, dicionários e livros de apoio ao ensino do português escrito, materiais multimídia de apoio ao ensino e aprendizagem em LGP, ao desenvolvimento da LGP e sobre a cultura da comunidade

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

surda, disponibilizados em diferentes formatos; material e equipamentos específicos para a intervenção em terapêutica da fala.

25- Constituem objectivos dos agrupamentos de escolas e escolas secundárias:a) Assegurar o desenvolvimento da LGP como primeira língua dos alunos surdos;b) Assegurar o desenvolvimento da língua portuguesa escrita como segunda língua dos alunos surdos;c) Assegurar às crianças e jovens surdos, os apoios ao nível da terapia da fala do apoio pedagógico e do reforço das aprendizagens, dos equipamentos e materiais específicos bem como de outros apoios que devam beneficiar;d) Organizar e apoiar os processos de transição entre os diferentes níveis de educação e de ensino;e) Organizar e apoiar os processos de transição entre os diferentes níveis de educação e de ensino;f) Criar espaços de reflexão e partilha de conhecimentos e experiências numa perspectiva transdisciplinar de desenvolvimento de trabalho cooperativo entre profissionais com diferen-tes formações que desempenham as suas funções com os alunos surdos;g) Programar e desenvolver acções de formação em LGP para a comunidade escolar e para os familiares dos alunos surdos;h) Colaborar e desenvolver com as associações de pais e com as associações de surdos acções de diferentes âmbitos, visando a interacção entre a comunidade surda e a co-munidade ouvinte.

26- Compete ao conselho executivo do agrupamento de escolas ou da escola secundária garan-tir, organizar, acompanhar e orientar o funcionamento e o desenvolvimento da resposta educativa adequada à inclusão dos alunos surdos.

Artigo 24.oeducação de alunos cegos e com baixa visão

1 - As escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão concentram as crianças e jovens de um ou mais concelhos, em função da sua localização e rede de transportes existentes.

2 - As escolas de referência a que se refere a alínea b) do n.o 2 do artigo 4.o constitui uma res-posta educativa especializada desenvolvida em agrupamentos de escolas ou escolas secundárias que concentrem alunos cegos e com baixa visão.

3 - Constituem objectivos das escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão:

a) Assegurar a observação e avaliação visual e funcional;b) Assegurar o ensino e a aprendizagem da leitura e escrita do braille bem como das suas diversas grafias e domínios de aplicação;c) Assegurar a utilização de meios informáticos específicos, entre outros, leitores de ecrã, software de ampliação de caracteres, linhas braille e impressora braille;d) Assegurar o ensino e a aprendizagem da orientação e mobilidade;e) Assegurar o treino visual específico;

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

f) Orientar os alunos nas disciplinas em que as limitações visuais ocasionem dificuldades par-ticulares, designadamente a educação visual, educação física, técnicas laboratoriais, matemática, química, línguas estrangeiras e tecnologias de comunicação e informação;g) Assegurar o acompanhamento psicológico e a orientação vocacional;h) Assegurar o treino de actividades de vida diária e a promoção de competências sociais;i) Assegurar a formação e aconselhamento aos professores, pais, encarregados de edu-cação e outros membros da comunidade educativa.

4 - As escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão integram docentes com formação especializada em educação especial no domínio da visão e outros profissionais com competências para o ensino de braille e de orientação e mobilidade.

5 - As escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão devem estar apetrechadas com equipamentos informáticos e didácticos adequados às necessidades da popu-lação a que se destinam.

6 - Consideram-se materiais didácticos adequados os seguintes: material em caracteres amplia-dos, em braille; em formato digital, em áudio e materiais em relevo.

7 - Consideram-se equipamentos informáticos adequados, os seguintes: computadores equipa-dos com leitor de ecrã com voz em português e linha braille, impressora braille, impressora laser para preparação de documentos e concepção de relevos; scanner; máquina para produção de relevos, máquinas braille; cubarítmos; calculadoras electrónicas; lupas de mão; lupa TV; software de ampliação de caracteres; software de transcrição de texto em braille; gravadores adequados aos formatos áudio actuais e suportes digitais de acesso à Internet.

8 - Compete ao conselho executivo do agrupamento de escolas e escolas secundárias organizar, acompanhar e orientar o funcionamento e o desenvolvimento da resposta educativa adequada à inclusão dos alunos cegos e com baixa visão.

Artigo 25.o

unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espectro do autismo

1- As unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espectro do autismo constituem uma resposta educativa especializada desenvolvida em escolas ou agrupa-mentos de escolas que concentrem grupos de alunos que manifestem perturbações enquadráveis nesta problemática.

2 - A organização da resposta educativa para alunos com perturbações do espectro do autis-mo deve ser determinada pelo grau de severidade, nível de desenvolvimento cognitivo, linguístico e social, nível de ensino e pela idade dos alunos.

3- Constituem objectivos das unidades de ensino estruturado:a) Promover a participação dos alunos com perturbações do espectro do autismo nas actividades curriculares e de enriquecimento curricular junto dos pares da turma a que pertencem;b) Implementar e desenvolver um modelo de ensino estruturado o qual consiste na apli-cação de um conjunto de princípios e estratégias que, com base em informação visual, promovam a organização do espaço, do tempo, dos materiais e das actividades;

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

c) Aplicar e desenvolver metodologias de intervenção interdisciplinares que, com base no modelo de ensino estruturado, facilitem os processos de aprendizagem, de autonomia e de adaptação ao contexto escolar;d) Proceder às adequações curriculares necessárias;e) Organizar o processo de transição para a vida pós-escolar;f) Adoptar opções educativas flexíveis, de carácter individual e dinâmico, pressupondo uma avaliação constante do processo de ensino e de aprendizagem do aluno e o regu-lar envolvimento e participação da família.

4 - As escolas ou agrupamentos de escolas com unidades de ensino estruturado concentram alunos de um ou mais concelhos, em função da sua localização e rede de transportes existentes.

5 - As escolas ou agrupamentos de escolas com unidades de ensino estruturado integram docentes com formação especializada em educação especial.

6 - Às escolas ou agrupamentos de escolas com unidades de ensino estruturado compete:a) Acompanhar o desenvolvimento do modelo de ensino estruturado;b) Organizar formação específica sobre as perturbações do espectro do autismo e o modelo de ensino estruturado;c) Adequar os recursos às necessidades das crianças e jovens;d) Assegurar os apoios necessários ao nível de terapia da fala, ou outros que se venham a considerar essenciais;e) Criar espaços de reflexão e de formação sobre estratégias de diferenciação pedagógica numa perspectiva de desenvolvimento de trabalho transdisciplinar e coopera-tivo entre vários profissionais;f) Organizar e apoiar os processos de transição entre os diversos níveis de educação e de ensino;g) Promover e apoiar o processo de transição dos jovens para a vida pós-escolar;h) Colaborar com as associações de pais e com as associações vocacionadas para a educação e apoio a crianças e jovens com perturbações do espectro do autismo;i) Planear e participar, em colaboração com as associações relevantes da comunidade, em actividades recreativas e de lazer dirigidas a jovens com perturbações do espectro do autismo, visando a inclusão social dos seus alunos.

7 - As escolas ou agrupamentos de escolas onde funcionem unidades de ensino estruturado devem ser apetrechadas com mobiliário e equipamento essenciais às necessidades específicas da população com perturbações do espectro do autismo e introduzir as modificações nos espaços e nos materiais que se considerem necessárias face ao modelo de ensino a implementar.

8 - Compete ao conselho executivo da escola ou agrupamento de escolas organizar, acompa-nhar e orientar o funcionamento da unidade de ensino estruturado.

Artigo 26.0unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência

e surdocegueira congénita

1 - As unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita constituem uma resposta educativa especializada desenvolvida em escolas ou agrupamentos de escolas que concentrem grupos de alunos que manifestem essas problemáticas.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2 - A organização da resposta educativa deve ser determinada pelo tipo de dificuldade manifestada, pelo nível de desenvolvimento cognitivo, linguístico e social e pela idade dos alunos.

3 - Constituem objectivos das unidades de apoio especializado:a) Promover a participação dos alunos com multideficiência e surdocegueira nas actividades curriculares e de enriquecimento curricular junto dos pares da turma a que pertencem;b) Aplicar metodologias e estratégias de intervenção interdisciplinares visando o desenvolvimento e a integração social e escolar dos alunos;c) Assegurar a criação de ambientes estruturados, securizantes e significativos para os alunos;d) Proceder às adequações curriculares necessárias;e) Adoptar opções educativas flexíveis, de carácter individual e dinâmico, pressupondo uma avaliação constante do processo de ensino e de aprendizagem do aluno e o regular envolvimento e participação da família;f) Assegurar os apoios específicos ao nível das terapias, da psicologia e da orientação e mobilidade aos alunos que deles possam necessitar;g) Organizar o processo de transição para a vida pós-escolar.

4 - As escolas ou agrupamentos de escolas com unidades especializadas concentram alunos de um ou mais concelhos, em função da sua localização e rede de transportes existentes.

5 - As escolas ou agrupamentos de escolas com unidades especializadas integram docentes com formação especializada em educação especial.

6 - Às escolas ou agrupamentos de escolas com unidades especializadas compete:a) Acompanhar o desenvolvimento das metodologias de apoio;b) Adequar os recursos às necessidades dos alunos;c) Promover a participação social dos alunos com multideficiência e surdocegueira congénita;d) Criar espaços de reflexão e de formação sobre estratégias de diferenciação pedagógica numa perspectiva de desenvolvimento de trabalho transdisciplinar e cooperativo entre os vários profissionais;e) Organizar e apoiar os processos de transição entre os diversos níveis de educação e de ensino;f) Promover e apoiar o processo de transição dos jovens para a vida pós-escolar;g) Planear e participar, em colaboração com as associações da comunidade, em actividades recreativas e de lazer dirigidas a crianças e jovens com multideficiência e sur-docegueira congénita, visando a integração social dos seus alunos.

7 - As escolas ou agrupamentos de escolas onde funcionem unidades de apoio especializado devem ser apetrechadas com os equipamentos essenciais às necessidades específicas dos alunos com multideficiência ou surdocegueira e introduzir as modificações nos espaços e mobiliário que se mostrem necessárias face às metodologias e técnicas a implementar.

8- Compete ao conselho executivo da escola ou agrupamento de escolas organizar, acompanhar e orientar o desenvolvimento da unidade especializada.

Artigo 27.ointervenção precoce na infância

1 - No âmbito da intervenção precoce na infância são criados agrupamentos de escolas de referência para a colocação de docentes.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

2- Constituem objectivos dos agrupamentos de escolas de referência:a) Assegurar a articulação com os serviços de saúde e da segurança social;b) Reforçar as equipas técnicas, que prestam serviços no âmbito da intervenção precoce na infância, financiadas pela segurança social;c) Assegurar, no âmbito do ME, a prestação de serviços de intervenção precoce na infância.

Capítulo Vi disposições finais

Artigo 28.0serviço docente

1- Sem prejuízo do disposto no número seguinte, as áreas curriculares específicas definidas no n.o 2 do artigo 18.o, os conteúdos mencionados no n.o 3 do mesmo artigo e os conteúdos curriculares referidos no n.o 3 do artigo 21.0 são leccionadas por docentes de educação especial.

2 - Os quadros dos agrupamentos de escolas devem, nos termos aplicáveis ao restante pessoal docente, ser dotados dos necessários lugares.

3 - A docência da área curricular ou da disciplina de LGP pode ser exercida, num período de transição até à formação de docentes surdos com habilitação própria para a docência de LGP, por profissionais com habilitação suficiente: formadores surdos de LGP com curso profissional de formação de formadores de LGP ministrado pela Associação Portuguesa de Surdos ou pela Associação de Surdos do Porto.

4 - A competência em LGP dos docentes surdos e ouvintes deve ser certificada pelas entidades reconhecidas pela comunidade linguística surda com competência para o exercício da certificação e da formação em LGP que são, à data da publicação deste decreto-lei, a Associação Portuguesa de Surdos e a Associação de Surdos do Porto.

5 - O apoio à utilização de materiais didácticos adaptados e tecnologias de apoio é da res-ponsabilidade do docente de educação especial.

Artigo 29.o

serviço não docente

1 - As actividades de serviço não docente, no âmbito da educação especial, nomeadamente de terapia da fala, terapia ocupacional, avaliação e acompanhamento psicológico, treino da visão e intérpretes de LGP são desempenhadas por técnicos com formação profissional adequada.

2 - Quando o agrupamento não disponha nos seus quadros dos recursos humanos necessários à execução de tarefas incluídas no disposto no número anterior pode o mesmo recorrer à aquisição desses serviços, nos termos legal e regulamentarmente fixados.

Artigo 3o.oCooperação e parceria

As escolas, os agrupamentos de escolas devem, isolada ou conjuntamente, desenvolver par-

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

cerias com instituições particulares de solidariedade social, designadamente centros de recursos especializados, ou outras, visando os seguintes fins:

a) A referenciação e avaliação das crianças e jovens com necessidades educativas espe-ciais de carácter permanente;b) A execução de actividades de enriquecimento curricular, designadamente a realização de programas específicos de actividades físicas e a prática de desporto adaptado;c) A execução de respostas educativas de educação especial, entre outras, ensino do braille, do treino visual, da orientação e mobilidade e terapias;d) O desenvolvimento de estratégias de educação que se considerem adequadas para satisfazer necessidades educativas dos alunos;e) O desenvolvimento de acções de apoio à família;f) A transição para a vida pós-escolar, nomeadamente o apoio à transição da escola para o emprego;g) A integração em programas de formação profissional;h) Preparação para integração em centros de emprego apoiado;i) Preparação para integração em centros de actividades ocupacionais;j) Outras acções que se mostrem necessárias para desenvolvimento da educação especial, designadamente as previstas no n. 0 1do artigo 29.0

Artigo 31.onão cumprimento do princípio da não discriminação

O incumprimento do disposto no n.o 3 do artigo 2.o implica:a) Nos estabelecimentos de educação da rede pública, o início de procedimento disciplinar;b) Nas escolas de ensino particular e cooperativo, a retirada do paralelismo pedagógico e a

cessação do co-financiamento, qualquer que seja a sua natureza, por parte da administração edu-cativa central e regional e seus organismos e serviços dependentes.

Artigo 32.0norma revogatória

São revogados:a) O Decreto-Lei n. 0 319/91,de 23 de Agosto;b) O artigo 10.0 do Decreto-Lei n.0 6/2001,de 18 de Janeiro;c) A Portaria n.0 611/93,de 29 de Junho;d) O artigo 6.0 da Portaria n.0 1102/97,de 3 de Novembro;e) O artigo 6.0 da Portaria n.0 1103/97,de 3 de Novembro;f) Os n.os 51 e 52 do Despacho Normativo n. 0 30/2001, de 22 de Junho, publicado noDiário da República,1.a série-B,n. 0 166,de 19 de Julho de 2001;g) O despacho n.0 173/99,de 23 de Outubro;h) O despacho n.0 7520/98,de 6 de Maio.

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3.3. GuiA pArA A refLeXão e AvALiAção de eXperiênciAS educAcionAiS incLuSivAS

De acordo com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), ratifica-da pelo governo brasileiro por meio do Decreto Legislativo 186/2008 e do Decreto Executivo 6949/2009, se reconhece o direito das pessoas com deficiência a uma educação de quali-dade. Visando a efetivação deste direito, sem discriminação e sobre a base da igualdade de oportunidades, será assegurado um sistema de educação inclusivo a todos os níveis, assim como o ensino ao longo da vida.

Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial passa a integrar a proposta peda-gógica da escola regular, promovendo o atendimento às necessidades educacionais específicas de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.

Em uma escola inclusiva, todos os alunos aprendem juntos, independentemente das suas condi-ções pessoais, sociais ou culturais. Trata-se de construir uma escola na qual não existam “requisi-tos de entrada”, nem mecanismos de seleção ou discriminação de nenhum tipo, uma escola que modifique substancialmente sua estrutura, seu funcionamento e sua proposta pedagógica para responder às necessidades educacionais de todos e de cada um dos alunos. A partir desta pers-pectiva, cabe à escola adaptar-se aos alunos e não estes a ela.

CoMo IDEntIFICAR uMA ExPERIênCIA EDuCACIonAl InClusIvA

Uma experiência educacional inclusiva deve ser entendida como uma atuação “situada”, que ganha sentido e é viável a partir de uma realidade concreta, dos condicionantes estruturais que a tornam única. Não há boas experiências ideais. Elas são dependentes invariavelmente do contex-to onde se desenvolvem. O que se considera como boa experiência na zona rural da Guatemala ou do Paraguai pode ser diferente na avaliação das experiências na periferia da grande São Pau-lo ou em uma comunidade dos bairros abastados de Santiago. Não se trata tanto de comparar ou imitar o que os outros fazem. Trata-se de refletir sobre a situação atual de cada escola, elaborar perguntas para identificar os passos a seguir para que nos aproximemos dos indicadores que se desprendem da definição e que, na medida do possível, tentamos abarcar nos princípios contem-plados neste guia. Identificar as experiências educacionais inclusivas são oportunidades de co-nhecer o processo de construção dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos.

De todas as maneiras, a singularidade da “boa experiência” não pode servir como desculpa ou álibi para reafirmar que a nossa realidade é tão diversa que não vale a pena tentar algu-ma mudança. Se nos propusermos avançar na reflexão sobre os passos a serem seguidos na

1 OEI - Organizações dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura. Guia para a Reflexão e

Avaliação de Experiências Educacionais inclusivas. Disponível em: <http://peei.mec.gov.br/arquivos/guia_de_apresen-

tacao.pdf>. Acesso em: 31 out. 2016.

1

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

identificação das barreiras impostas pela escola, as quais impedem ou limitam a participação e aprendizagem dos alunos, perceberemos que a distância não é tão grande.

Podemos concluir que constitui uma “boa experiência” toda atuação que se oriente a partir do compromisso dos professores, dos alunos e das famílias, em promover o acesso, a participação e a aprendizagem de todos os alunos.

APREsEntAção E EstRutuRA Do GuIA

O Guia que apresentamos busca oferecer às escolas um momento de auto-avaliação de suas experiências educacionais e estimulá-las a relatar suas próprias experiências de mudança e de progresso para fazer da escola um espaço onde todos encontrem mais e melhores oportunidades para aprender e ser feliz.

Consequentemente, o Guia oferece pautas que promovem a reflexão, para que as equipes educacionais possam avaliar a sua realidade em relação a alguns dos indicadores que se desprendem do que entendemos por educação inclusiva e que possam servir para estabelecer alguns objetivos de mudança e inovação na direção adequada. Trata-se de um instrumento simples, criado para que as próprias equipes educacionais possam ter em mente, de forma re-sumida, aqueles aspectos cruciais que contribuem para oferecer uma educação mais atenta às especificidades de todos os alunos; e para que os incorporem e os adaptem de acordo com a realidade e as características da sua escola.

o GuIA sE DIvIDE EM DuAs sEçõEs:

•item A: Situação de partida.•item B: Princípios para a auto-avaliação da escola e para a avaliação da experiência.Em primeiro lugar, as escolas devem analisar as suas condições de partida. Neste sentido o item

A do Guia pretende ajudar os professores a considerar os elementos cruciais do contexto social e educacional de cada escola e que podem condicionar - facilitando ou dificultando - o avanço rumo à inclusão. Existe, ainda, a possibilidade de complementar esta avaliação com os comentários que se considerem oportunos.

A seguir, no item B, pede-se à comunidade escolar, principalmente aos professores, que através da reflexão compartilhada possam levar a cabo uma auto-avaliação, a partir das circunstâncias da sua escola. Estes itens estão estruturados nos seguintes módulos:

1. Concepção de escola.Neste módulo faz-se uma reflexão de como a escola entende a inclusão, as necessidades educacionais

do corpo discente e o valor da presença de alunos com deficiência na escola. Explora-se também o nível de compromisso com a identificação e a eliminação das barreiras na participação e na aprendizagem.

2. As atuações e as experiências da escola.Neste módulo promove-se uma reflexão, por um lado, sobre o papel do compromisso e da

liderança da equipe diretora no processo rumo à inclusão; por outro lado, sobre determinadas ex-periências educacionais, como a existência de atuações de boas-vindas, o papel dos professores

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

especializados, o planejamento de atendimento educacional especializado para os alunos com deficiência e o conceito de valorização das diferenças que impulsiona as experiências.

3. A inclusão como processo de inovação e melhoria na escola.Neste módulo promove-se uma reflexão sobre as características das experiências educacionais

inclusivas (devem ter objetivos bem delimitados, basear-se nos conhecimentos prévios e ser planeja-das de forma coletiva); contemplando as atuações em sala de aula (devem partir das capacidades, reconhecer as diferenças e utilizar diferentes tipos de apoio como, por exemplo, a aprendizagem colaborativa entre alunos) e na sala de recursos multifuncionais.

4. os apoios ao processo de inclusão.Este módulo refere-se à coordenação entre os distintos profissionais que oferecem apoio na in-

clusão dos alunos com deficiência. A partir de uma percepção ampla de apoio, contempla-se a participação das famílias e dos membros da comunidade.

5. As perspectivas das experiências inclusivas.

Finalmente, este módulo dedica-se às novas propostas de melhoria que deverão ser realizadas a partir da avaliação do processo de inclusão, bem como da sua sustentabilidade no futuro, com o objetivo de incorporá-las às atuações habituais das escolas e, também, ao fato de compartilhar suas experiências com outras escolas, como mecanismos de compromisso e de aprendizagem.

Em cada um deles, inclui-se uma série de princípios, seguido de um quadro de avaliação com definição e indicadores próprios que conduzem a uma educação inclusiva. Esses indicadores preten-dem explicitar os elementos cruciais que permitem que nos aproximemos de uma educação inclusiva.

uso Do GuIA

O guia foi elaborado com a finalidade de ser uma ferramenta fácil e simples.No item A serão analisados cada um dos quatro itens sob os quais está estruturado: sala de aula,

escola, comunidade escolar e gestão escolar. O formato da resposta varia em função dos itens a serem respondidos. Assim podem ser encontradas:

•Respostasquantitativas:aquelasquedeverãoserrespondidasdeformanumérica,porexemplo,o número de alunos.

•Respostasqualitativas:aquelasnasquaisserãoapresentadasduasoutrêsopçõeseumadelasdeverá ser assinalada. Por exemplo, no item formação de professores, deverá ser assinalada sufi-ciente ou insuficiente, em função da reflexão realizada.

No item dos comentários, poderão ser acrescentados outros fatores considerados de interesse, acompanhando a reflexão ou a avaliação com os comentários considerados oportunos.

Com respeito ao item B, o formato apresentado é um questionário no qual consta (como descrito no item anterior) uma série de enunciados com seus correspondentes indicadores.

Antes de preenchê-lo, cada uma das descrições fornecidas deve ser lida minuciosamente. A se-guir, deve-se considerar com exatidão como cada princípio descreve a experiência e as atuações desenvolvidas na sua escola, descrevendo conjuntamente a experiência desenvolvida na escola.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

As opções de resposta são:

Marquem com um X a opção que considerar mais adequada e que mais se ajusta à experiência realizada. Por exemplo, se no item 1.1 “A escola entende a inclusão como um processo de mudan-ça, inacabado e em constante revisão, para aumentar o acesso, a permanência, a participação e o sucesso na aprendizagem” a opção marcada for “raramente”, isto indicará que dita afirmação e os indicadores apresentados não se ajustam à experiência desenvolvida na sua escola.

É importante avaliar o mais honestamente possível, ajustando-se à realidade apresentada.O mais importante é a análise e a reflexão sobre o quão presente está um determinado indicador

no cotidiano da escola (valores, normativa e experiência) da escola ou na consideração de uma experiência determinada. Em conseqüência, nqualquer resposta pode ser positiva na medida em que nos indica os objetivos e a direção na qual a mudança deve ser orientada; o caminho rumo à inclusão não é uma questão de “tudo ou nada”, mas é um processo de construção contínua.

Pode ocorrer que nem todos os indicadores possam ser levados em consideração em uma escola ou em uma determinada experiência; alguns deles podem não se ajustar às características da expe-riência que se avalia e, portanto, não seja pertinente o seu preenchimento.

ItEM A:situação de partida

As experiências inclusivas somente podem ser avaliadas no contexto em que se situam, sendo ne-cessário conhecer o ponto de partida desde o qual se propõe avançar. A seguir sugerem-se alguns fatores do contexto social e educativo que permitem estabelecer a situação de partida.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

sala de Aula QuantidadeNúmero de alunos total matriculados na escola

Destes, quantos possuem alguma deficiência?Número de professores

Número de professores atuando em classes comunsNº de professores atuando no AEE

Destes, quantos possuem alguma formação em Educação Especial?Formação dos Professores

Quantos são somente graduados?Quantos possuem especialização?Quantos possuem mestrado?Quantos possuem doutorado?

Quais recursos de acessibilidade são utilizados na experiência escolar?

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

sugestões para a escola

Uma vez obtida informação realize uma análise das condições iniciais da sua escola refletindo sobre:

• Interatividadeexistenteentreosalunosdaescola• Relaçãoprofessor‐aluno.• RelaçãoprofessordeAEEealunoscomdeficiência.

A relação entre os recursos de acessibilidade existentes e não utilizados na escola e a necessi-dade de se buscar novos recursos para garantir a acessibilidade de todos os alunos.

Comentários

sugestões para a escola

As dimensões da escola serão avaliadas em função do número de alunos e profissionais. Tambémpoderãoseravaliadasaquantidadeeaqualidadedainfra‐estruturadaescola:

Comentários

escola AvaliaçãoÓtimo| Bom| regular| insuficiente| inexistente

Dimensões da escolaAcessibilidade física.

Rampas, elevadores, plataformas de acessoPortas e passagens alargadasEspaços e circulação acessíveisBanheiros e sanitários acessíveisSinalização sonoraSinalização tátilSinalização visual

Acessibilidade à informaçãoAcessibilidade ao currículoEstabilidade docenteExperiência de trabalho colaborativoExperiência de trabalho de formaçãoLiderança da direção

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

sugestões para a escola

A relação da família com a escola e a comunidade poderá ser avaliada em função de:• Convocatória de reuniões com as famílias e sua participação;• Participação da família em eventos escolares como, por exemplo, festas de fim de curso;• Envolvimento das famílias no progresso escolar de seus filhos e de suas filhas;• Trabalho conjunto das famílias para a execução de iniciativas a favor da escola.

Comentários

sugestões para a escola

As medidas e os recursos de apoio à inclusão fomentados pela administração escolar podem ser avaliados em função da:• Dotação econômica fornecida;• Dotação de pessoal fornecida;• Dotação de material.

Comentários

Comunidade escolar AvaliaçãoÓtimo| Bom| regular| insuficiente|inexistente

Relaçãoescola‐famílias

Relaçãoescola‐comunidade

Sentido de comunidade escolar

Administração escolar AvaliaçãoÓtimo| Bom| regular| insuficiente|inexistente

Políticas implementadas na escola que favorecem a educação inclusivaAções para aquisição e adequação de recursos de acessibilidadeAções para organização e oferta de recursos de acessibilidade

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

ItEM b:Princípios para a auto-avaliação da escola e avaliação da experiência educacional inclusiva, em especial de alunos com deficiência

1. ConCEPção DE EsColA.

O progresso rumo à inclusão está intimamente relacionado com o “pensamento” e os valores da comunidade educativa.

Existem suficientes evidências de que as maiores dificuldades para a mudança geralmente se localizam nestes âmbitos. Como conseqüência convém que nos perguntemos sobre o que significa a inclusão tanto para os professores quanto para as famílias e para os alunos.

1.1. a escola entende a inclusão como um processo de mudança, inacabado e em constante construção, para garantir o acesso, a permanência, a participação e a aprendizagem

descrição: A inclusão é um caminho que procura encontrar a maneira de fomentar o desenvolvimen-to e o progresso de todos os alunos. A escola avança a medida que oportuniza condições de acesso e participação. Ainda assim, sabemos que sempre surgirão novos desafios que requererão melhorias por parte das escolas com o fim de oferecer as oportunidades de participação e aprendizagem.

indicadores:• A escola entende a inclusão como um processo de mudança e de melhoria da qualidade da

educação para todos.• O Projeto Político Pedagógico reflete o processo de transformação da prática pedagógica inclusiva.• Existência por parte da escola de planos de trabalho que impliquem a reflexão dos direitos

dos docentes com a finalidade de propiciar a transformação de experiências não inclusivas.

1.2. a escola compreende que as necessidades específicas dos alunos com deficiência não são oriundas unicamente das suas características pessoais, senão que o contexto também interfere, facilitando ou dificultando as futuras aprendizagens

descrição: O ensino comum na perspectiva da educação inclusiva busca eliminar as barreiras que impedem ou dificultam o aprendizado e a participação dos alunos, entendendo que estas barreiras podem aparecer em função de práticas pedagógicas não inclusivas ou da falta de recursos de acessibilidade necessários.

indicadores:• O Atendimento Educacional Especializado não realiza intervenção clínica ou de reabilitação.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• A prática educacional está centrada na aprendizagem na sala de aula comum, junto aos outros alunos, ainda que possam ser oferecidos, em ocasiões específicas, atendimento educacional especializado voltado para as suas especificidade de forma complementar ou suplementar.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

1.3. a escola considera que a matrícula de alunos com deficiência contribui para o fomento dos valores inclusivos como, por exemplo, valorizar a diversidade ou contribuir para uma sociedade justa e democrática, supondo o reconhecimento efetivo dos seus direitos

descrição: O ensino comum na perspectiva da educação inclusiva valoriza a diferença no pro-cesso de ensino e aprendizagem. Desta forma, a escola contribui para a construção de uma socie-dade de todos.

indicadores:• A escola considera uma atitude positiva para o reconhecimento das diferenças como valor de

incremento às possibilidades educacionais de todos.

1.4. a escola, valorizando a diferença, vê como positiva a presença de alunos com deficiência

descrição: A presença de alunos com deficiência é um indicador do desenvolvimento inclusivo da escola.

indicadores:•Considera-se positiva a presença de alunos com deficiência na escola.•Reconhecem-seosbenefícios,quepodempropiciartantoparaosprofessorescomoparaosalunos, a presença dos alunos com deficiência.•Aescolaofereceoapoioeaatençãonecessáriosàsnecessidadesespecíficasdosalunoscomdeficiência e dos demais alunos.•Atendeasnecessidadeseducacionaisespecíficasdosalunos

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

1.5. a escola está comprometida ativamente na identificação e eliminação das barreiras que impedem a participação e a aprendizagem

descrição: O processo de avanço rumo à inclusão requer identificar as barreiras que impedem a plena participação e a aprendizagem dos alunos.

indicadores:• A escola possui instalações fisicamente acessíveis a todos.• A escola possui sinalização visual, tátil e sonora que torna os ambientes acessíveis aos alunos

com deficiências sensoriais. Realizam-se as experiências pedagógicas inclusivas que promo-vem o acesso ao currículo para todos os estudantes.

• Atende as necessidades educacionais específicas dos alunos

1.6. a escola, em seu projeto político pedagógico, demonstra a concepção inclusiva adotada pela escola

descrição: A escola concorda em estabelecer, no seu projeto político pedagógico, a orientação inclusiva da escola, com o intuito de valorizar as diferenças.

indicadores:• Existência de um Projeto Político Pedagógico que inclua as linhas ideológicas da educação inclusiva.

2. As AtuAçõEs E As ExPERIênCIAs DA EsColA.

O que realmente é decisivo para o sucesso da inclusão são as experiências (as oportunidades, os apoios, a relação...) que a escola oferece a todos os alunos, inclusive àqueles com deficiência. É por esta razão que convém explorar a existência e a qualidade de determinadas condições para promover a participação e a aprendizagem dos alunos.

2.1. a escola fomenta mecanismos para que todos se sintam acolhidos

descrição: Com a finalidade de criar uma comunidade inclusiva, são promovidas atuações orien-tadas a dar as boas-vindas às pessoas que se agregam a comunidade escolar.

indicadores:• Existência de atuações destinadas a facilitar a adaptação do novo professorado.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

• Existência de atuações destinadas a facilitar a adaptação dos grupos de alunos novatos.• Existência de atuações destinadas a facilitar a adaptação dos grupos de alunos que se incor-

poram ao longo do ano escolar.• Existência de atuações destinadas a facilitar a adaptação das famílias.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

2.2. a equipe dirigente está comprometida e apóia o avanço realizado pela escola rumo à educação inclusiva, assegurando o direito de todos os alunos a uma educação de qualidade

descrição: O percurso da escola rumo à inclusão necessita uma liderança capaz de incentivar e acompanhar os processos de mudança. O compromisso da equipe dirigente com esta meta deve estar refletido no apoio e no acompanhamento da mudança, necessários para conseguir a participa-ção e o aprendizado de todos os alunos, devendo ainda fornecer os elementos estruturais essenciais para a sua realização.

indicadores:• A meta da inclusão está explicitada no Projeto Político Pedagógico da Escola.• A meta da inclusão está explicitada no planejamento de ações da equipe dirigente.• Existem ações da direção para fomentar a formação continuada dos professores na área da

educação inclusiva.• A equipe dirigente apóia os processos de mudança e melhoria.

2.3. a equipe dirigente proporciona momentos e espaços para a reflexão coletiva da experiência pedagógica docente, criando um ambiente de colaboração

descrição: Os professores, como também os alunos e as famílias, dispõem de espaços físicos e temporais para refletir e tomar decisões sobre projetos de melhoria da escola. Estes espaços são mais efetivos quando os projetos de melhoria são planejados, realizados e avaliados de forma co-ordenada por toda a comunidade escolar.

indicadores:• Existência de espaços e períodos destinados ao trabalho em equipe dos professores, com o

objetivo de fomentar a reflexão sobre a experiência.• Encontros periódicos entre os distintos membros da comunidade escolar para debater as ini-

ciativas de melhoria.

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nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

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2.4. existência na escola de professores que atuam no aee

descrição: O Professor que atua no Atendimento Educacional Especializado oferta, aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, um con-junto de atividades pedagógicas complementares ou suplementares que se diferenciam daquelas realizadas na escolarização comum.

indicadores:• O professor do AEE atua na Sala de recursos multifuncionais, na oferta do AEE aos alunos

com deficiência, TGD ou altas habilidades/superdotação• O professor do AEE articula-se com o professor da sala comum, orientando sobre o uso de equi-

pamentos e materiais de acessibilidade e coletando informações sobre a aprendizagem do aluno• O professor do AEE realiza observações dentro da sala de aula comum da interação do

aluno com deficiência com os demais alunos e para detectar a necessidade e avaliar o uso de recursos de acessibilidade

2.5. a escola entende que todas as atividades devem promover a participação de todos

descrição: Os recursos de acessibilidade se incorporam às atividades da escola.

indicadores:• Utilização de recursos de Tecnologia Assistiva para atender às especificidades dos alunos

com deficiência nas diversas atividades desenvolvidas pela escola.• Existência de ajudas individuais, em grupos para a atenção à diversidade do corpo discente.

3. A InClusão CoMo PRoCEsso DE InovAção E DE MElhoRIA nA EsColA

As experiências com educação inclusiva mostram de forma clara que a melhor maneira de progredir rumo à inclusão é pensar, planejar e implementar as mudanças necessárias de forma compartilhada.

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3.1. as experiências inclusivas realizadas na escola devem estar baseadas em experiências prévias ou pesquisas anteriores

descrição: As experiências que colaboram com o processo de avanço rumo ao ensino inclusivo devem ter uma base sólida, aproveitando as contribuições de outros profissionais da educação e as reflexões prévias da própria equipe docente.

indicadores:• No planejamento da experiência, a equipe responsável realiza uma análise da situação atra-

vés de trabalhos ou estudos anteriores.• Justificativa da experiência a partir de trabalhos científicos publicados.• O documento que relata a experiência inclui as referências bibliográficas das experiências

próprias ou de pesquisas publicadas.

3.2. as experiências inclusivas realizadas na escola devem ser planejadas por meio de uma reflexão conjunta toda a comunidade escolar

descrição: A escolha do elemento a ser melhorado e o planejamento de como levar a cabo tal melhoria deve partir de uma reflexão sobre a realidade da escola feita em conjunto pelo maior número de pessoas envolvidas na comunidade escolar. Envolver os alunos e os representantes das famílias neste processo pode garantir a sua eficácia.

indicadores:• Na origem ou no desenvolvimento da experiência inclusiva participaram um grande número

de membros da comunidade educativa.• A opinião dos alunos com deficiência e seus familiares, é levada em consideração no plane-

jamento da experiência.

3.3. as experiências educacionais inclusivas devem planejar claramente quais são seus objetivos e como serão avaliados

descrição: No processo de avanço rumo à inclusão, as experiências pedagógicas permi-tirão uma continuidade no futuro se os objetivos forem claramente planejados, assim como a avaliação dessa experiência, que permitirá avaliar sua eficácia e indicar os próximos passos da melhoria.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

3.4. a intervenção pedagógica deve ser estabelecida a partir do conhecimento prévio do aluno

descrição: As atividades de ensino e de aprendizagem que ocorrem nas salas de aula promovem a participação de todos os alunos, reconhecendo que partindo de níveis de conhecimentos distintos, chegarão logicamente a níveis de aquisição também distintos. A diversidade de conhecimento não é um problema se cada aluno tem oportunidades de chegar o mais longe possível. As atuações em sala de aula devem promover resultados de aprendizagem para todos.

indicadores:• Realiza-se uma avaliação prévia dos alunos para determinar seu conhecimento inicial, e des-

ta forma poder conhecer os recursos de acessibilidade para se alcançar os objetivos.• Existência de atividades que permitem a participação de todos os alunos, oferecendo suportes

variados na apresentação da informação.• Valorização do esforço de participação de cada aluno.• As programações propiciam diferentes atividades ou conteúdos para a consecução do mes-

mo objetivo, propondo distintos caminhos para a mesma atividade.• As estratégias de avaliação objetivam verificar os avanços dos alunos.

3.5. na sala de aula trabalha-se a concepção das diferenças com todos os alunos

descrição: As atividades em sala de aula incorporam o aprendizado sobre as diferenças existentes entre os alunos da classe (como os antecedentes históricos, culturais, religiosos ou lingüísticos, diferenças físicas, posturais, sociais etc). Através do trabalho com os alunos, transmite-se o conhecimento sobre as diferenças e as possibilidades de pontos de vista distintos, e promove-se um olhar de valorização da diversidade.

indicadores:• As características próprias de cada aluno são objetos de aprendizado em sala de aula.• São incluídas atividades que permitem a reflexão sobre as contribuições da diversidade.• Utilização do conflito como elemento para o aprendizado.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

indicadores:• Os objetivos das atividades pedagógicas estão claramente formulados.• Existem indicações sobre as formas de avaliação dos objetivos, dos critérios e do nível de

consecução dos objetivos.

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3.6. as atividades desenvolvidas na sala de aula utilizam de forma sistemática o aprendizado colaborativo e cooperativo

descrição: O aprendizado colaborativo e cooperativo, é empregado regularmente nas aulas de forma que as diferenças entre os alunos se convertam em uma fonte de aprendizagem.

indicadores:• Uso regular de grupos heterogêneos (com distintos níveis de habilidades).• Utilização das diferenças dentro dos grupos como fonte de aprendizagem (distribuição de

papéis ou de informações distintas igualmente necessárias para o alcance do objetivo).• Habitual uso em sala de aula de métodos de aprendizado colaborativo e cooperativo.• Promove-se a colaboração entre os alunos em sala da aula, evitando as situações de de-

pendência.• Existem atividades de reflexão sobre as aprendizagens adquiridas quando se ensina aos outros.

4. os APoIos à InClusão.

Os próprios alunos, as famílias e os professores constituem verdadeiras fontes de apoio à inclu-são, sendo conveniente explorar sua funcionalidade atual. Do mesmo modo, deve-se prestar aten-ção ao potencial aproveitamento dos recursos presentes na comunidade.

4.1. os professores assumem como seus todos os alunos.

descrição: os professores, em geral, entendem o seu papel fundamental na responsabilidade do aprendizado de todos os alunos.

indicadores:•Todos os alunos que frequentam a escolas estão matriculados nas classes comuns do ensino regular.•Osprofessoresassumemaresponsabilidadedepromoveroaprendizadodetodososseusalunos.•Osprofessoresconhecemosrecursosdeacessibilidadeutilizadospelosalunoscomdeficiência

na classe comum, necessários para atender as suas especificidades .

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nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

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4.2. existe uma articulação entre os professores da classe comum e os professores da sala de recursos multifuncionais

descrição: Os distintos apoios oferecidos pelos professores da classe comum e pelos professores do AEE são articulados de modo a garantir a aprendizagem de todos os alunos.

indicadores:• Existem articulação, planejamento conjunto e discussão de casos entre os professores da

classe comum e os professores de AEE para promover experiências pedagógicas inclusivas a todos os alunos.

4.3. os apoios incluem a participação das famílias e dos membros da comunidade

descrição: As experiências inclusivas fomentam a participação regular das famílias e das pesso-as da comunidade nas atividades de ensino e aprendizagem, atuando como apoios à inclusão em atividades desenvolvidas tanto dentro das salas de aula quanto fora delas.

indicadores:• Na escola são realizadas atividades que incluem a participação das famílias e/ou da comunidade.

5. As PERsPECtIvAs DAs ExPERIênCIAs InClusIvAs

Todo processo de inovação e melhoria deve incluir previsões relacionadas com a sua sustenta-bilidade. Freqüentemente grandes iniciativas correm o risco de não funcionar se não for garantida a sua revisão, atualização e viabilidade através da análise de determinados aspectos relacionados com o seu desenvolvimento.

5.1. realiza-se uma avaliação periódica dos recursos necessários à realização das experiências inclusivas

descrição: Enquanto processo, as experiências inclusivas concluídas e avaliadas vão sugerir pon-tos de melhorias ou novos elementos sobre os quais é necessário propor correções, ampliações ou gerar novos planejamentos que comportem experiências educacionais inclusivas.

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

indicadores:• No trabalho cooperativo da comunidade escolar, são realizadas propostas de melhoria nas

experiências inclusivas e sua sustentabilidade.

5.2. no desenvolvimento da experiência inclusiva, pode surgir a necessidade de recursos adicionais que devem ser levados em consideração para garantir sua continuidade

descrição: Para assegurar a continuidade da experiência no futuro é preciso planejar os recursos que serão necessários e como serão viabilizados.. Se não for assim, a experiência pode ser inicia-da, porém não perdurará ao longo do tempo.

indicadores:• Tem-se consciência do custo adicional que a implementação da experiência requer.• Analisa-se quais custos iniciais serão mantidos no futuro.• Analisa-se as distintas possibilidades para viabilizar os recursos necessários com a finalidade

de dar continuidade à experiência.

nunca raramente Às vezes frequentemente sempre

Sumário

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Cinco Anos do Memorial da Inclusão Pelos Direitos das Pessoas com Deficiência

Crismere Gadelha

É graduada em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), especialista em Educação Ambiental pela Uni-versidade Federal de Goiás (UFG) e mestre em Antropologia Social pela Universidade de Campinas (UNICAMP). Atuou em pesquisas temáticas sobre movimentos sociais e ambientais, junto à Fundação Carlos Chagas, USP, UNICAMP e Instituto SocioAmbiental (ISA). Membro do Centro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência Rui Bian-chi – CEDIPOD. Assistente de curadoria do Memorial da Inclusão: os Caminhos da Pessoa com Deficiência, da Secre-taria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, onde atua desde seu lançamento nas áreas de documentação, história oral, educação museal, pesquisa, e eventos relacionados aos Estudos sobre a Deficiência (Disability Studies).

márCio Bustamante

É graduado em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e mestre em História e Culturas Políticas pela mesma instituição. Atuou como professor universitário pelo Centro Superior de Ensino e Pesquisa de Machado e pela Universidade Presidente Antônio Carlos. Atualmente trabalha como historiador no Memorial da Inclusão: os caminhos da pessoa com deficiência, sediado na Secretaria do Estado de São Paulo dos Direitos da Pessoas com Deficiência. Tem expe-riência nas áreas de história oral, história do Brasil república, história moderna e contemporânea - e em campos temáticos como história das guerras, movimentos sociais contemporâneos, direitos humanos e estudos sobre a deficiência (Disability Studies). Em 2013 organizou, em parceria com o Diversitas (FFLCH/USP) o evento “Conflitos, Direitos e Diversidade: I Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência. Desde então vem realizando uma série de debates e seminários em diversas áreas ligadas ao tema da deficiência.

marília Costa dias

Pedagoga pela UFRGS, mestre e doutoranda em Educação pela FEUSP. Atualmente é coordenadora pedagógica em Programas de Formação de Professores na Comunidade Educativa CEDAC e professora no curso de Pedagogia do Instituto Vera Cruz. No ensino superior foi Coordenadora dos Programas de Pós-graduação e Educação Continuada no Instituto Singularidades e Coordenadora e professora do curso de especialização em Educação Inclusiva (Pós Gradua-ção lato sensu) no Instituto Vera Cruz. No terceiro setor assumiu cargos de gestão na APAE de São Paulo e na Fundação Projeto Travessia. Realizou consultoria para o MEC, Secretarias de Educação municipal, escolas particulares, ONGs e editoras. Na Educação Básica foi professora e coordenadora pedagógica e trabalhou na formação de professores da rede pública e particular. Tem como foco educação inclusiva, formação de professores e gestores, políticas públicas e deficiência intelectual.

currícuLo doS orGAnizAdoreS