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Navegações v. 4, n. 2, p. 232-238, jul./dez. 2011 ENSAIOS Amores marginais e hibridismo no conto de Mia Couto Marginal love affair and hybridism in Mia Couto’s short-stories JOSÉ LUÍS GIOVANONI FORNOS FURG Resumo: O presente ensaio examina contos extraídos do livro Cada homem é uma raça (1990), do escritor moçambicano Mia Couto, considerando os aspectos históricos que marcam tal produção. Ao mesmo tempo, procura caracterizar as estratégias empregadas pelo autor ao revisitar a situação colonial e pós-colonial do seu país. Enfatiza a tese do hibridismo cultural como demarcação crítica às identidades localizadas a partir do nacionalismo étnico-racial. Palavras-chave: Identidades híbridas; Literatura moçambicana; Mia Couto Abstract: In this study, short-stories from the book Cada homem é uma raça (1990), by the Mozambican writer Mia Couto, are analyzed based on the historical aspects underlying such work. The strategies used by the author to revisit the postcolonial and colonial situation of his country is sought to be characterized. Therefore, the theory of cultural hybridism is brought up as a critical reading of identities located on the grounds of ethnic-racial nationalism. Keywords: Hybrid identities; Mozambican literature; Mia Couto A temática das relações entre o eu e o outro assinala os contos de Mia couto. Tal assunto deve ser desdobrado obrigatoriamente com base no entendimento da História do colonialismo e pós-colonialismo europeu e português na África. Durante longo percurso, a resistência políti- ca e literária dos africanos esteve presente como estraté- gia na constituição de um Estado nacional livre e soberano que pusesse fim às leis e normas impostas pelos impérios. As literaturas africanas vêm refletindo múltiplos episódios da dominação colonial, demonstrando o forte compromisso dos intelectuais com a defesa de uma identidade cultural, étnica e racial que barrasse preconceitos e desigualdades sociais. Nas literaturas africanas de língua portuguesa, são inúmeros os escritores que, através da imprensa e da produção artística, desafiaram o regime colonial, sofrendo com exílios e prisões. A busca pela liberdade teve iniciativas importantes. Destas, destaca- se o Movimento da Négritude, criado a partir de 1930 por intelectuais caribenhos, inspirados no Renascimento Negro (Black Renaissance) norte-americano. 1 Também o socialismo irradiou entusiasmos ideológicos, forne- cendo estratégias e táticas para os movimentos de libertação. Em Angola e Moçambique 2 , a batalha pela in- dependência alcança maior projeção em meados da década de 1960, com o surgimento de organizações políticas que reivindicavam a libertação nacional através da “guerra de guerrilhas”, estimulados, entre outros fatores, pela Revolução Cubana em 1959 e a Argelina em 1961. Após treze anos de combate contra o exército português e as forças salazaristas de repressão, obtidos os objetivos com a assinatura de acordos em 1975, os países africanos de língua portuguesa enfrentariam, a seguir, o impacto de nova guerra, agora situada no seio da nação. 12 É sob as contingências de aproximadamente trinta anos de guerra – colonial e civil – que os escritores se debruçam. Num primeiro instante, desvendam as arbitrariedades praticadas pelo império, utilizando a literatura como ferramenta de combate e conscien- 1 Conforme José Luís Pires Laranjeira, tal movimento surge nos anos 20 e 30 do século passado, como agitação intelectual de negros “empenhados em participar na crescente valorização do homem negro e na luta pela igualdade de direitos com brancos, condição suficiente para ter inspirado a Négritude de língua francesa e também a Negritude africana de língua portuguesa. Na literatura, Claude Mckay, Countee Cullen, Langston Hughes e Sterling Brown, entre outros, assumem a especificidade de serem negros, no que toca à herança cultural africana e à condição social de segregados, elaborando textos em que a raça e o continente africano são recorrentes.” (PIRES, 1995, p. 26) 2 Para um aprofundamento das relações políticas e culturais em Moçambique ver o livro, resultado de uma tese de doutoramento, Moçambique: identidade, colonialismo e libertação (UNESP, 2009), José Luís Cabaço.

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  • Navegaes v. 4, n. 2, p. 232-238, jul./dez. 2011

    Ensaios

    Amores marginais e hibridismo no conto de Mia Couto

    Marginal love affair and hybridism in Mia Coutos short-stories

    Jos Lus Giovanoni FornosFURG

    Resumo: O presente ensaio examina contos extrados do livro Cada homem uma raa (1990), do escritor moambicano Mia Couto, considerando os aspectos histricos que marcam tal produo. Ao mesmo tempo, procura caracterizar as estratgias empregadas pelo autor ao revisitar a situao colonial e ps-colonial do seu pas. Enfatiza a tese do hibridismo cultural como demarcao crtica s identidades localizadas a partir do nacionalismo tnico-racial. Palavras-chave: Identidades hbridas; Literatura moambicana; Mia Couto

    Abstract: In this study, short-stories from the book Cada homem uma raa (1990), by the Mozambican writer Mia Couto, are analyzed based on the historical aspects underlying such work. The strategies used by the author to revisit the postcolonial and colonial situation of his country is sought to be characterized. Therefore, the theory of cultural hybridism is brought up as a critical reading of identities located on the grounds of ethnic-racial nationalism.Keywords: Hybrid identities; Mozambican literature; Mia Couto

    A temtica das relaes entre o eu e o outro assinala os contos de Mia couto. Tal assunto deve ser desdobrado obrigatoriamente com base no entendimento da Histria do colonialismo e ps-colonialismo europeu e portugus na frica. Durante longo percurso, a resistncia polti- ca e literria dos africanos esteve presente como estrat- gia na constituio de um Estado nacional livre e soberano que pusesse fim s leis e normas impostas pelos imprios.

    As literaturas africanas vm refletindo mltiplos episdios da dominao colonial, demonstrando o forte compromisso dos intelectuais com a defesa de uma identidade cultural, tnica e racial que barrasse preconceitos e desigualdades sociais. Nas literaturas africanas de lngua portuguesa, so inmeros os escritores que, atravs da imprensa e da produo artstica, desafiaram o regime colonial, sofrendo com exlios e prises. A busca pela liberdade teve iniciativas importantes. Destas, destaca-se o Movimento da Ngritude, criado a partir de 1930 por intelectuais caribenhos, inspirados no Renascimento Negro (Black Renaissance) norte-americano.1 Tambm o socialismo irradiou entusiasmos ideolgicos, forne- cendo estratgias e tticas para os movimentos de libertao.

    Em Angola e Moambique2, a batalha pela in- dependncia alcana maior projeo em meados da

    dcada de 1960, com o surgimento de organizaes polticas que reivindicavam a libertao nacional atravs da guerra de guerrilhas, estimulados, entre outros fatores, pela Revoluo Cubana em 1959 e a Argelina em 1961. Aps treze anos de combate contra o exrcito portugus e as foras salazaristas de represso, obtidos os objetivos com a assinatura de acordos em 1975, os pases africanos de lngua portuguesa enfrentariam, a seguir, o impacto de nova guerra, agora situada no seio da nao.12

    sob as contingncias de aproximadamente trinta anos de guerra colonial e civil que os escritores se debruam. Num primeiro instante, desvendam as arbitrariedades praticadas pelo imprio, utilizando a literatura como ferramenta de combate e conscien-

    1 Conforme Jos Lus Pires Laranjeira, tal movimento surge nos anos 20 e 30 do sculo passado, como agitao intelectual de negros empenhados em participar na crescente valorizao do homem negro e na luta pela igualdade de direitos com brancos, condio suficiente para ter inspirado a Ngritude de lngua francesa e tambm a Negritude africana de lngua portuguesa. Na literatura, Claude Mckay, Countee Cullen, Langston Hughes e Sterling Brown, entre outros, assumem a especificidade de serem negros, no que toca herana cultural africana e condio social de segregados, elaborando textos em que a raa e o continente africano so recorrentes. (PIRES, 1995, p. 26)

    2 Para um aprofundamento das relaes polticas e culturais em Moambique ver o livro, resultado de uma tese de doutoramento, Moambique: identidade, colonialismo e libertao (UNESP, 2009), Jos Lus Cabao.

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    tizao.3 Em outro momento, abordam os conflitos deflagrados ps-independncia, perodo que se mostrou to atroz e violento quanto o anterior. Em comum, a ateno do escritor com a Histria, configurada ainda pela ancestralidade mtica e religiosa, pelas prticas populares, extradas do passado, como autnticos signos a serem celebrados pela nacionalidade instituda. Como aponta Rita Chaves:

    Profundamente marcada pela Histria, a literatura dos pases africanos de lngua portuguesa traz a dimenso do passado como uma de suas matrizes de significado. Depreende-se o intuito de valorizao de elementos da prtica popular como um patrimnio identificado com a resistncia que era preciso alimentar. A dana como elemento de integrao e o alimento como explicao de uma distinta energia ganham estatuto de signos de uma identidade a ser preservada. (CHAVES, 2005, p. 45-48)

    A representao da Histria pode ser avaliada sob os efeitos da condio tnica e racial. Conquanto examinadas distintamente, tais aspectos atravessam tematicamente a produo literria nas ex-colnias portuguesas. Em vista disso, sintomtico o ttulo escolhido por Mia Couto para um de seus livros: Cada homem uma raa, coletnea de contos, publicada em 1990, cuja finalidade est em problematizar o vnculo entre nacionalidade, etnia e raa, figuras norteadoras das relaes sociais no espao africano. Nos contos, evidenciam-se tal preocupao, uma vez que as personagens caracterizam-se pelo elemento fentipo e pela comunidade tnica. Numa passagem, o escritor moambicano pe em xeque as armadilhas provocadas pelas disputas raciais:

    Inquirido sobre a sua raa, respondeu: A minha raa sou eu, Joo PassarinheiroConvidado a explicar-se, acrescentou: Minha raa sou eu mesmo. A pessoa uma huma- nidade individual. Cada homem uma raa, senhor polcia. (COUTO, 1998, p. 8)

    Desta forma, Mia Couto procura discutir em seus textos o que significa africanidade, questionando a busca de uma raiz africana empreendida por alguns intelectuais, caadores da virgindade tnica e racial que, de acordo com o escritor, so responsveis por uma viso restrita 3 Embora se refira ao processo de formao da literatura angolana moderna,

    o trecho a seguir retirado dos documentos da Unio dos Escritores Angolanos (UEA) representa adequadamente o papel desempenhado pelos escritores africanos: A histria de nossa literatura testemunho de gerao de escritores que souberam, na sua poca, dinamizar o processo de nossa libertao exprimindo os anseios profundos de nosso povo, particularmente o das camadas mais exploradas. A literatura angolana surge assim no como simples necessidade esttica, mas como arma de combate pela afirmao do homem angolano. (CHAVES, 2005, p. 70)

    e restritiva do que genuno e uma das causas para explicar a desconfiana com que olhada a literatura produzida em frica. (COUTO, 2005, p. 60)

    Neste sentido, a nfase ao hibridismo como interrogao crtica aos absolutismos tnicos e raciais torna-se destaque. Se num perodo os apelos raa e ancestralidade serviram de baliza para a distino de valores genunos da nao, num contexto, marcado pelo ps-colonialismo e pela globalizao, em que as relaes diaspricas despontam cotidianamente, a hibridao reaparece como categoria inovadora, ensejando polticas pblicas pelos rgos governamentais. No entender de Mia Couto, difcil ao intelectual africano eliminar os conflitos de sua identidade hbrida:

    A Europa estava dentro do poeta africano e no podia ser esquecida por imposio. Entre o convite ao esquecimento da Europa e o sonho de ser americano a sada s podia ser vista como um passo a frente. Os intelectuais africanos no tm que se envergonhar de sua apetncia para a mestiagem. Eles no necessitam de corresponder imagem que os mitos europeus fizeram deles. No carecem de artifcios nem de fetiches para serem africanos. Eles so africanos assim como so, urbanos de alma mista e mesclada, porque frica tem direito pleno modernidade, tem direito a assumir as mestiagens que ela prpria iniciou e que tornam mais diversa e, por isso, mais rica. (COUTO, 2005, p. 61)

    O depoimento acima nos remete ao pensamento de Stuart Hall que v no hibridismo uma lgica conceitual e cultural capaz compreender os processos contemporneos de globalizao. Para Hall:

    Essa lgica se torna cada vez mais evidente nas disporas multiculturais e em outras comunidades minoritrias e mistas do mundo ps-colonial. Antigas e recentes disporas governadas por essa posio ambivalente, do tipo dentro/fora, podem ser encontradas em toda a parte. Ela define a lgica cultural composta e irregular pela qual a chamada modernidade ocidental tem afetado o resto do mundo desde o incio do projeto globalizante da Europa. (HALL, 2003, p. 574)

    Para o socilogo portugus Boaventura de Sousa Santos, o cosmopolitismo multicultural deve ser per- seguido, uma vez que corrigiria as distores econmicas e culturais planetrias. Entendido como utopia possvel, tal ideia pode ser sintetizada no seguinte princpio: temos o direito a ser iguais quando a diferena nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza (SANTOS, 2003, p. 458).

    Contudo, o socilogo portugus adverte para os riscos de se celebrar a condio hbrida diasprica como

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    situao que permite uma infinita criatividade, j que a mesma tem sido utilizada para ocultar as realidades imediatas, econmicas, sociais, polticas e culturais dos imigrantes ou das comunidades diaspricas. Segundo o autor, a aura ps-colonial, a celebrao da dispora e o enaltecimento da esttica da hibridez tendem a ocultar os conflitos sociais reais em que os grupos imigrantes ou diaspricos esto envolvidos (SANTOS, 2006, p. 240).

    A advertncia seguida por Mia Couto quando no minimiza as tenses e confrontos de personagens originrias das sociedades metropolitanas europeias e moambicanas. De uma maneira geral, todas de diferentes formas so atingidas pelos contatos, afetando seus modos de pensar, falar, escrever e agir.

    Tensionadas pela violncia ou pelo descompasso cultural e lingustico, os encontros produzem seres dialgicos que repensam os valores da conscincia, da cultura e da linguagem. Os valores possuem uma dinmica varivel, mltipla e flutuante cujas origens histricas so os acidentes, as frices, os erros e a disperso. Como enfatiza Jos Manuel Oliveira Mendes, o o indivduo forma sua identidade no na reproduo pelo idntico, mas sim do rudo, dos conflitos entre os agentes e lugares de socializao (MENDES, 2002, p. 505). Tal conformao encontra-se presente na obra de Mia Couto em que as frices do contato, expressos entre europeus e africanos, encenam as diferenas social, econmica, tnica, racial, religiosa, de gnero. As diferenas ampliam-se quando o corpo marginalizado torna-se o local da subverso e do preconceito. o que ocorre no conto Rosalinda, a nenhuma cuja metamorfose da personagem serve de pretexto para se discutir a condio marginal dos sujeitos:

    Rosalinda era mulher retaguardada, fornecida de assento. Senhora de muita polpa, carnes aqum e alm roupa. Sofria de tanto volume que se sentava no prprio peso, superlativa. J fora esbelta, dessas mulheres que explicam o amor. (COUTO, 1998, p. 51)

    Outro aspecto detonador da marginalidade social o amor. Este demarca, com profundidade, as modificaes da alma e da carne. Nos contos A princesa russa e A Rosa Caramela, as consequncias da experincia amorosa so a alucinao, originria do mal-estar poltico e cultural. Uma descaracterizao brutal atinge a identidade das personagens envolvidas, colocando-as margem da sociedade.

    Tais contos apontam para um quadro em que gestos e prticas discursivas oficiais desconsideram as peculiaridades identitrias, tramadas na mistura tnica e racial. Neste caso, a hibridez soa sempre como desvio que rasura os preceitos raciais estabelecidos pela comunidade nacional imaginada.

    Os nacionalismos homogeneizantes asfixiam encontros amorosos multiculturais, trazendo desoladores efeitos s personagens. A intolerncia ideolgica e racial est na base dos conflitos. Os trgicos resultados derivam de preconceitos que convertem as promessas amorosas em solido e morte. A felicidade conjugal recalcada por uma ideologia que se infiltra nas escolhas individuais, fazendo prevalecer a uniformidade racial da nao. Na epgrafe que serve de abertura ao conto A rosa caramela, l-se:

    Acendemos paixes no rastilho do prprio corao. O que amamos sempre chuva, entre o vo da nuvem e a priso do charco. Afinal somos caadores que a si mesmo se azagaiam. No arremesso certeiro vai sempre um pouco de quem dispara. (COUTO, 1998, p. 13)

    Numa observao inicial, a lana azagaia arre- messada refere-se personagem Juca que se contamina pelo prprio gesto. Ao ferir o outro, acaba por ferir-se, corroendo parte de sua existncia. Sua lassido, vivida na cadeira instalada na varanda, fruto do remorso. A doena preconizada igualmente resultado do pesar imposto ao outro. A ruptura do noivado conduz Juca paralisia, ao mesmo tempo, enlouquecendo a noiva Rosa. A loucura da moa ecoa continuamente sobre a mente do noivo que, embora tendo construdo uma famlia, no apaga o passado, enlaando-se outra vez nas amarras da paixo ao seguir os passos da louca.

    Desde o abandono da moa no altar da igreja, Juca no esquece o ato ferino que o imobiliza e o aflige. O leitor, como o narrador, compartilha da mesma pergunta: o que motivara a personagem a tal comportamento. O corpo defeituoso de Rosa uma das respostas plausveis, porm simplificada.

    A perda do noivo gera em Rosa uma depresso profunda, conduzindo-a loucura. Famlia e nao igual- mente a rejeitam, categorias singulares na constituio do indivduo. Sem o aconchego do lar e da ptria, Rosa perambula noite pelas ruas e praas da cidade, dedican- do carinho pleno s esttuas. Esse circular solitrio alegoriza a dolorosa e violenta histria do ps-colonial em Moambique. As consequncias das guerras e das diferenas ideolgicas so a loucura, a imobilidade e a solido. O amor em tempos de clera tnica e racial torna-se invivel, impossibilitando as mestiagens. Acuado pela Histria oficial, Juca recusa Rosa, figura hbrida que se marginaliza diante do autoritarismo nacionalista.

    Teoricamente, trata-se de questionar ritos ideolgicos, assinalados pelo relativismo ou por verdades absolutos que acabam por contrariar o motor das negociaes, entendendo que no h comunidade ou massa de pessoas cuja historicidade inerente, radical, emita os sinais corretos (BHABHA, 1998, p. 53). Em termos

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    de identidade comunitria, a recusa de uma lgica essencialista e um referente mimtico representao poltica um argumento forte contra o separatismo poltico de qualquer colorao, eliminando o moralismo que acompanha tais reivindicaes (BHABHA, 1998, p. 53). A opo de Bhabha reflete a crise do sujeito histrico e do movimento socialista internacional, ao mesmo tempo, ataca os fundamentalismos que se apossam do estado, instaurando prticas culturais baseadas na tradio religiosa, tnico-racial.

    No conto A princesa russa, tambm a impossibilidade amorosa resulta em loucura, solido e remorso. Duarte Fortin, um negro cristo, ama a patroa, uma emigrada russa. Acossado pela culpa, Fortin busca na confisso ao padre da comunidade a absolvio do pecado cometido. O defeito fsico da personagem parece comandar os atos do mesmo que, em vista de sua condio, maltrata e pune colegas de trabalho, agindo de forma autoritria. O uso da delao faz com que o negro Fortin seja renegado pelos companheiros de raa e classe. Na tentativa de compreender as atitudes empregadas no passado quando exercia a funo de encarregado geral da casa da princesa, a personagem faz a seguinte confisso:

    Os criados me odiavam, senhor padre. Eu sentia aquela raiva deles quando lhes roubava os feriados. No me importava at que gostava de no ser gostado. Aquela raiva deles me engordava, eu me sentia quase-quase patro. Me disseram que este gosto de mandar um pecado. Mas eu acho essa minha perna que me aconselha maldades. Tenho duas pernas; uma de santo, outra de diabo. Como posso seguir um s caminho? (COUTO, 1998, p.78)

    Se em A Rosa Caramela a corcova nas costas que limita a beleza da personagem, refletida na zombaria enfrentada nas ruas, em A princesa russa a perna esqulida de Fortin que lhe serve de justificativa para reagir com crueldade, segundo a prpria personagem. Fortin um homem dividido entre dois mundos que se cruzam e se confrontam. Pelo amor patroa, procura assimilar-se, seguindo as diretrizes impostas pela casa grande, sem, todavia, alcanar xito. Por amor adere ao branco estrangeiro. Igualmente contaminada pelo humanismo da patroa Ndia que, na ausncia do marido, visita as precrias moradias dos empregados.

    Por sua vez, a amizade de Ndia a Fortin gera inveja nos demais empregados. A confiabilidade que Ndia confere a Fortin produz no empregado sentimentos dbios que, aos poucos, vai se transformando em amor pela emigrada russa. Todavia, diante da impossibilidade de ver seu amor concretizado por uma mulher branca e de classe social superior, o negro trai a patroa, no enviando, a pedido dela, cartas Rssia a um amante ao qual ainda

    se encontra enamorada. Ao perceber que a patroa est a enlouquecer, uma vez que no recebe respostas, Fortin elabora uma carta, simulando respostas do distante amado.

    A estratgia no resulta em sucesso, culminando na morte da russa e na descoberta da carta pelo marido que expulsa o empregado de suas terras. O exlio na prpria terra, somado morte da patroa e a rejeio dos colegas de trabalho, desencadeia em Fortin uma desestabilizao identitria cruel, levando-o a alucinaes. No entanto, as confisses amenizam o sofrimento, impedindo-o de mergulhar num delrio irrecupervel. Numa passagem significativa, o negro mergulha mos e braos na terra, numa aluso simblica de retorno ao lugar de origem. Embora manifeste em suas confisses que tenha sido a escavao do solo a sua salvao, o gesto no apazigua seus conflitos. Ao utilizar-se dos ritos catlicos, dispe-se a compreender as marcas da maldade, concluindo que ser sempre um homem dividido. No entanto, tem voltado regio com freqncia para visitar o tmulo da amada e mina abandonado, chegando nica concluso:

    A nica alegria que me aquece, sabe qual ? quando saio do cemitrio e vou passear nas poeiras e cinzas de antiga mina dos russos. Aquela mina j fechou, faleceu junto com a senhora. Eu caminho-me l sozinho. Depois sento num tronco e olho para trs, para esses caminhos onde pisei. E sabe o que vejo, ento? Vejo duas pegadas, diferentes, mas ambas sadas do meu corpo. Umas de p grande, p masculino. Outras so marcas de p pequeno, de mulher. Esse o p da princesa, dessas que caminha ao meu lado. So pegadas dela, padre. No h certeza maior que eu tenho. Nem Deus me pode corrigir desta certeza. Deus pode no me perdoar nenhum pecado e eu arriscar o destino dos infernos; Mas eu nem me importo: l, nas cinzas desse inferno, eu hei-de ver a marca desses passos dela, caminhando sempre a meu lado esquerdo. (COUTO, 1998, p. 92)

    As observaes sobre as violncias provocadas pelo colonialismo portugus e os desdobramentos polticos ps-independncia em Moambique cercam todos os contos de Cada homem uma raa. Mia Couto pe sob juzo crtico o imprio portugus e o aparato ideolgico aps a descolonizao, apresentando personagens que desafiam as prticas culturais na sociedade colonial e ps-colonial.

    As personagens Rosa e Fortin simbolizam a con- tnua dissoluo das identidades. Aleijadas na razo aps sofreram os ferimentos provocados pelo amor no concretizado, tais figuras buscam recursos distintos para salvaguardar a desordem emocional.

    Rosa, internada para tratamento, enamora-se das paredes e pedras do hospital. Ao receber alta, cultiva o

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    hbito de cuidar das esttuas da cidade, travando, em sua loucura, dilogos com as mesmas. O jovem narrador filho de Juca informa que a esttua preferida era um monumen- to de portugus dos tempos coloniais. O desfecho da demonstrao afetiva a priso da personagem. Diante da venerao a um explorador colonialista portugus, o governo moambicano acusa a moa de saudosismo ao passado colonial. Para o comandante militar, a loucura de Rosa escondia razes polticas, seno, por que se opor, com violncia, a destruio da esttua pelas tropas da independncia? Em respeito ptria encarceram Rosa e derrubam o monumento.

    O episdio ironiza o autoritarismo ideolgico nacionalista, sublinhando um dos componentes assinalado por Pires Laranjeira (1995) como fundamentais da escrita de Mia Couto: o humor que acaba por desdramatizar episdios trgicos da nao. Contudo, no significa que a crtica no seja efetuada, mas quase sempre vem suavizada pelo tom humorado, na viso do estudioso. No entanto, preciso examinar com preciso se tal caracterstica se estende de fato ao conjunto da obra. No conto examinado, ainda que o humor seja uma nota a ser constatada, tristeza e desconsolo se sobrepem ao final. Outro aspecto que vem em auxlio caracterstica anterior a criatividade e inventividade lingstica. Para tanto, a oralidade assume importncia capital ao ser reelaborada no contexto narrativo, alcanando equaes poticas singulares, instaurando um projeto de definio de estatuto nacional. Segundo Fonseca e Cury, essa estratgia de valorizao da oralidade, construda no espao da escrita:

    Faz com que o romance africano se insira de modo original no cnone, ao mesmo tempo em que, por essa mesma originalidade, ponha em xeque o cnone na sua feio tradicional e a viso da oralidade como um no-saber ou como um saber menor. Pode-se dizer, at, que esse colocar em xeque se configura como uma estratgia de afirmao da produo literria nacional. (FONSECA e CURY, 2008, p. 13)

    A crtica aos governantes ps-independncia ali- cerados na ideologia do marxismo-leninismo, imposta arbitrariamente, no respeitando o indivduo, uma tnica recorrente. Tomados pela cegueira do estado e do partido nicos, empregam a fora como forma de controle social. Tal posio parece apenas inverter os plos da representao poltica, j que os mtodos escalados pelo regime aps a independncia se assemelham aos praticados pelo colonialismo portugus autoritrio.

    No conto Sidney Poitier na barbearia de Firipe Beruberu, predomina o destronamento pardico da re-presso salazarista nas colnias, contrariando a propagan- da oficial do estado portugus. a face pattica, repugnan- te e, ao mesmo tempo, cmica, do autoritarismo.

    Em sua atividade de barbeiro, o negro Firipe, para atrair fregueses, mente aos seus clientes, contando que o ator norte-americano, igualmente negro, Sidney Poitier esteve em seu estabelecimento que se reduz ao abrigo de uma frondosa rvore, onde mantm os instrumentos necessrios ao exerccio de sua atividade. Embora seja uma mentira que no aleija ningum, no dizer do prprio barbeiro, a inveno criada num determinado contexto de represso poltica traz conseqncias funestas ao autor da mentira. Ao ser interrogado pelos agentes da PIDE, o barbeiro Firipe no consegue se desvencilhar das armadilhas impostas pela prpria inveno. Quanto mais se esfora para se desfazer do mal-entendido, mais cai em contradies, resultado da ignorncia e perversidade policial. Na tentativa de solucionar a situao, mostra aos agentes a foto do ator, recebendo em contrapartida os seguintes argumentos:

    Mas esse nunca este aqui, juro. F-de-Cristo, senhor agente. Essa foto do artista do cinema. Nunca viu nos filmes, desses dos americanos?- Americanos, ento? Est visto. Deve ser companheiro do outro, o tal Mondlane4 que veio da Amrica. Ento, este tambm veio de l?- Mas esse no veio de nenhuma parte. Isso tudo mentira, propaganda.- Propaganda? Ento deve ser tu o responsvel da propaganda da organizao. (COUTO, 1998, p.160-161)

    A personagem Gaspar Vivito, ajudante do barbeiro, sofre com a represso em virtude da deficincia fsica. A voz do rapaz, falada numa lngua que, segundo o narrador, era somente dele, traz igualmente novos mal entendidos. Ao ser inquirido, Vivito visto como um subversivo estrangeiro ou expressando-se numa lngua africana esconde no uso convices e confisses importantes. Resultam dos episdios indignao, impotncia e tristeza em vista da truculncia do regime repressivo colonial.

    Para o compromisso com uma teoria e linguagem crticas eficientes, o equvoco est em recusar a funo da ideologia na configurao das estruturas sociais e dos sujeitos que as compem. O engano igualmente pode ocorrer quando do menosprezo da heterogeneidade cultural promovida pelo hibridismo em tal teoria. O hibridismo como dinmica poltica e social est associado aos fenmenos globais das identidades em trnsito que se refugiam nas margens e centros do poder metropolitanos. 4 Um dos principais dirigentes e lder da FRELIMO (Frente de Libertao

    de Moambique) que havia sido encorajado pelo Padre Henry Junod a fazer estudos numa escola secundria sua, na frica do Sul. Assassinado em Dar-es-Salam, em 3 de fevereiro de 1969, segundo um plano elaborado pela PIDE, Eduardo Mondlane aparece, em vrios textos literrios escritos como um smbolo do destino coletivo do povo moambicano. (AFONSO, 2004, p.26)

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    Navegaes, Porto Alegre, v. 4, n. 2, p. 232-238, jul./dez. 2011

    O hibridismo, como defende Bhabha, postula mltiplas formas de ao e intervenes analticas, sem a perda da sistematizao ideolgica nos confrontos das polticas globais e nacionais. No caso especfico de frica, a violao colonial resultou em anos de contatos em que uma complexa relao de poder e subverso se desenvolveram, criando largas potencialidades culturais em torno da multiculturalidade. Dessa feita, significativa a descrio do narrador em torno da personagem Rosa Caramela:

    Dela se sabia quase pouco. Se conhecia assim, corcunda-marreca, desde menina. Lhe chamvamos Rosa Caramela. Era dessas que se pe outro nome. Aquele que tinha, de seu natural, no servia. Re- batizada, parecia mais a jeito de ser do mundo. Dela nem queramos aceitar parecenas. A corcunda era a mistura das raas todas, seu corpo cruzava os muitos continentes. (COUTO, 1998, p. 15)

    Na descrio, Rosa agrega ao nome original outra nomeao. Ao ser rebatizado, passa a adequar-se melhor ao mundo. Ainda que reconstituda no nome, no h vontade de assemelhar-se a ela, pois Rosa a mistura de todas as raas, sendo seu corpo o cruzamento de vrios continentes. As razes do abandono, assinalado em outro momento do texto, aparecem com nitidez quando da constituio identitria da personagem. Figura hbrida, resultado de mltiplas conexes, desautoriza o carter nacional dos sujeitos assinalados pela homogeneidade tnica e racial.

    Se os contos de Mia Couto podem ser lidos sob a categoria do hibridismo, retoma-se outra vez a voz de Homi Bhabha a fim de situar o conceito do estudioso. Assim, na emergncia dos entre-lugares, ocorrem experincias intersubjetivas e coletivas de nao que, combinadas com o valor da comunidade, precisam ser analisadas.

    a partir da transnacionalidade e da emergncia do conceito de traduo cultural,5 provocado pelo deslocamento, que se deve compreender tal projeto histrico e literrio. Em consequncia, Bhabha prope uma teoria em que despontam sujeitos assinalados pela coabitao assimtrica de culturas num contexto inter- nacional, exigindo uma mudana paradigmtica acerca das categorias de nacionalidade, de raa e de classe.

    Com efeito, sabe-se que a retrica do universalismo liberal no suficiente para a construo de cidadanias plenas. No concerto internacional das naes, a busca de

    5 Para Bhabha, a ideia de traduo no a de transportar fatias suculentas de sentido de um lado da barreira de uma lngua para a outra. A cultura como estratgia de sobrevivncia tanto transnacional como tradutria. A cultura tradutria porque as histrias espaciais de deslocamento tornam a questo de como a cultura significa, ou o que significado por cultura. (BHABHA, 1998, p. 248.)

    democracia econmica, poltica e cultural um dos eixos centrais para a emancipao dos povos, sendo as reformas nas estruturas do atual modo de produo necessrias.

    Nesse sentido, os contos chamam a ateno para o quanto se est distante de tais mudanas, ainda que muito se tenha refletido e escrito sobre desigualdades e diferenas. Os textos informam acerca do desequilbrio global que continua a causar guerras, martirizando comunidades em diferentes lugares do mundo. Neste caso, os contos de Mia Couto enfatizam, em especial, para a condio dos marginalizados absolutos que vtimas das polticas internacionais e nacionais se encontram em situaes permanentes de risco. So os refugiados da guerra e da fome cujas frmulas ideolgicas oficiais promovidas pelo Estado e pelo capital global esto longe de alcan-los em suas necessidades mais urgentes.

    A pergunta qual o compromisso com esse con- tingente humano que, entregue a toda espcie de misria, se dispersa, buscando a redeno da terra. As personagens de Mia Couto problematizam a natureza e a funo do intelectual hoje, evidenciando uma lacuna entre projetos tericos revolucionrios com os humilhados pela opresso econmica e cultural globais. Atento crise de representao do sujeito da revoluo, Homi Bhabha interroga-se:

    Podero esses sujeitos divididos e esses movimentos sociais diferenciados, que se mostram formas ambivalentes e divididas de identificao, serem representados em uma vontade coletiva em que ecoa claramente a herana iluminista de Gramsci e seu racionalismo? De que forma a linguagem de vontade coletiva concilia as vicissitudes de sua representao, sua construo atravs da maioridade simblica onde os despossudos se identificam a partir da posio das pessoas de posses? Como construir uma poltica baseada nesse deslocamento do afeto ou na elaborao estratgia em que o posicionamento poltico , de modo ambivalente, fundado em uma encenao das fantasias que requerem passagens repetidas pelas fronteiras diferenciais entre o bloco simblico e um outro e as posies disponveis para cada um? (BHABHA, 1998, p.57)

    De outro modo, os contos analisam o trabalho da cultura como paradigma importante para a compreenso das comunidades e dos indivduos. Se os universalismos liberalismo, marxismos trouxeram dificuldades, igualmente o chamado multiculturalismo pode obliterar as potencialidades do indivduo e da nao. Para alguns, o desenvolvimento do individualismo no somente fator positivo, mas condio para a realizao da democracia. Nesta perspectiva, tende-se a considerar as manifestaes das comunidades multiculturais como algo problemtico.

  • 238 Fornos, J. L. G.

    Navegaes, Porto Alegre, v. 4, n. 2, p. 232-238, jul./dez. 2011

    Em Cada homem uma raa, Mia Couto ironiza os poderes institucionalizados que pem limites ao hetero- gneo. Nesse sentido, o hibridismo forjado no trnsito internacional das diferentes raas e etnias compe-se de um capital simblico expressivo. Uma sociedade mundial livre das injustias econmicas e culturais a utopia pregada pelo socilogo Boaventura de Sousa Santos.

    Nessa direo que se entende a proposta em torno do terceiro espao de que fala Homi Bhabha. Ainda que seja irrepresentvel em si, o terceiro espao garante que o significado e os smbolos da cultura no sejam tomados como unidade ou fixidez primordial, liberando uma produtiva instabilidade revolucionria, no na viso do multiculturalismo extico veiculado pelas grandes redes miditicas de comunicao, mas na articulao e defesa da diferena cultural, assinalada pelo hibridismo. sob tal condio que a escrita potica de Mia Couto se detm e se dispersa, ampliando as possibilidades de conhecimento para alm do contexto moambicano e africano.

    Referncias

    AFONSO, Maria Fernanda. O conto moambicano: escritas ps-coloniais Lisboa: Caminho, 2004.BHABHA, Homi. K. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998.

    COUTO, Mia. Cada homem uma raa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.

    COUTO, Mia. Pensatempos. Lisboa: Caminho, 2005.CHAVES, Rita. Angola e Moambique: experincia colonial e territrios literrios. So Paulo: Ateli, 2005.

    FONSECA, Maria Nazar Soares; CURY, Maria Zilda Ferreira. Mia Couto: espaos ficcionais. So Paulo: Autntica, 2008.

    HALL, Stuart. Da dispora: identidades e mediaes culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

    LARANJEIRA, Jos Lus Pires. A negritude africana de lngua portuguesa. Porto: Afrontamento, 1995.LARANJEIRA, Jos Lus Pires. Literaturas africanas de expresso portuguesa. Lisboa: Universidade Aberta, 1995.SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramtica do tempo: So Paulo: Cortez, 2006.

    SANTOS, Boaventura de Sousa. (Org.) A globalizao e as cincias sociais. So Paulo: Cortez, 2002.SANTOS, Boaventura de Sousa. (Org.) Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2003.

    Recebido: 02 de junho de 2011Aprovado: 30 de junho de 2011

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