9
Washington Novaes Heródoto Barbeiro : recicla o jornalismo novo colunista de rádi o COMERCIAL PÚBLIC A A TV Pública mostra que é boa de briga e sobe no ringue

COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

  • Upload
    others

  • View
    4

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Washington Novaes

Heródoto Barbeiro :recicla o jornalismo

novo colunista de rádi o

COMERCIAL PÚBLICAA TV Pública mostra que é boa de briga e sobe no ringue

Page 2: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Uma te(e não apenasconsumida)

Mariana Menezes

Nos Estados Unidos, a televisã opública está consolidada desd ea década de 60 . Na Europa, est a

mídia conseguiu manter-se pública des -de a sua origem até hoje, já que os ca-nais comerciais conquistaram espaç obem mais tarde .

Agora, às vésperas do século 21, fi-nalmente estamos assistindo, no Brasil, a onascimento de uma rede de emissoras d etelevisão verdadeiramente pública . Ouseja, nem estatal, nem comercial, mas d apopulação e para a população .

Uma das batalhas a ser vencida pelo sidealistas da TV Pública é a própria lei . Alegislação brasileira ainda não contem-pla o modelo de televisão pública . Ape-sar disso, em rede, elas chegam a 95 %do território nacional . E o que é mais im-portante : respondem por 3% da audiên-cia total .

Acontece que, durante o regime mili-tar, paralelamente às emissoras comerci-ais, foi criado o sistema de televisãoeducativa, com o objetivo de utilizar ovídeo como recurso pedagógico . Ess emodelo de televisão foi proibido de vei-cular publicidade, o que deixou os ca-nais educativos pobres e dependentes d oEstado .

"O modelo de televisão pública pre -cisa ser reconhecido pela nova legisla-ção . É preciso fazer a distinção entre astelevisões comercial, pública e estatal ,porque a emissora pública precisa ter re -

ceita para não falir", diz Mauro Garcia ,presidente da TVE, do Rio de Janeiro eatual presidente da Associação Brasileirade Tevês Públicas, Educativas e Culturai s(ABEPEC) .

Para tentar resolver este problema n oâmbito do Legislativo, em maio, foi criad aa Frente Parlamentar em Defesa da Tele -visão Pública . Seu presidente, o deputad ofederal Evilásio Farias (PSB - SP), reuni u250 assinaturas de deputados e senadore sde todos os partidos para a composiçã oda Frente . É a maior já registrada na histó-ria do Congresso Nacional .

"O que nos preocupa é que estamo sentrando na era digital e isso envolve in-vestimentos . As televisões públicas nãotêm uma garantia de recursos definida ,nem uma proteção amparada em leis ,dependem da boa vontade dos governos" ,esclarece Farias .

O deputado propõe a criação de u mfundo para a renovação tecnoló-gica e aprodução de programas . O dinheiro vi -ria, além do Estado, de porcentagens so -bre o lucro das televisões comerciais, o uainda sobre a venda e industrialização d eaparelhos de tevê .

Outra proposta é garantir que 5 %dos gastos com propaganda governa -mental sejam destinados à televisã opública . São apenas idéias, sem maio-res compromissos .

"A tevê comercial que quiser conti-nuar com sua programação de baixo ní -

A cara do telejornalism opúblico :Dafnes da Fonseca, Paul oHenrique Amorim, AlanSeveriano, Marco AntônioCoelho Filho, Paulo Markun ,Ederson Granetto, Vladi rLemos, Heródoto Barbeiro ,Valéria Grillo, Flávia Lippi ,Madeleine Alves, Lucian aCamargo e Laura Wie .

Revista IMPRENSA -18

Page 3: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Infelizmente, no Brasil . . .Como nem tudo é cor de rosa, a históri a

das tevês educativas também tem seu lado

negro. Um decreto de 10 de maio deste ano

assinado pelo presidente Fernando Henriqu e

Cardoso e pelo Ministro das Comunicaçõe sPimenta da Veiga, permitiu que a sretransmissoras de televisão educativa se tor -nassem geradoras . Até então, essas peque-nas emissoras podiam apenas, como diz opróprio nome, retransmitir a programaçã odas 25 geradoras estaduais . A partir destedecreto, elas podem também fazer sua pró-pria programação e, mais que isso, procuraros tais apoios culturais para patrocinare msuas produções .

O mais perigoso é que, diferente dasemissoras comerciais, as educativas não pas-

sam por licitação . Ou seja . basta encaminharum pedido de concessão ao Ministério da sComunicações, que vai analisar e decidi rsobre a solicitação . É aí que começa aquelavelha tradição entre os políticos brasileiro sde transformar concessão em instrumento de

barganha .Uma reportagem do jornalista Bo b

Fernandes para a revista Carta Capital d ejunho deste ano ilustrou bem como estãosendo distribuídas essas concessões .

Muitas foram parar nas mãos de algu mpolítico ou empresário local, boa parte dele spessoas que são, digamos, pouco compro -metidas com a formação de cidadãos . Bo bFernandes apurou que até o ex-deputad oSérgio Naya recebeu pelo menos quatro con-

cessões de emissoras educativas . Todas ,

como exige a lei, formadas em nome de fun -

dações sem fins lucrativos .O próprio ouvidor da Anatel, o deputa -

do Saulo Coelho, colocou uma educativapara seu filho cuidar em sua cidade natal ,Ubá (Minas Gerais) . Segundo a reportagem,na TV Ubá vende-se anúncios como em qual-quer emissora comercial (segundo um fun-cionário entrevistado por Fernandes pode -se anunciar "banana, cachaça, xampu, remé-

dio, cigarro . . .") . E mais : em sua programa -"educativa" consta um programa que é

"uma mistura de Celso Russomano com o

Ratinho e o Alborguetti, aquele da toalha" .

Realmente muito educativo . . .

Apesar de tudo, o projeto das televisõe s

educativas, desde que evitadas a farra da s

concessões, pode ser um passo decisivo para

mudar o perfil da TV no Brasil .

Revista IMPRENSA -19

Page 4: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Novo estúdio e ilha de edição da TV Cultura, em São Paul o

vel, continue . O que nós queremos é qu eo cidadão se defenda por meio do con -trole remoto . Para isso, ele precisa de um aalternativa e eu acho que a melhor op-ção é a televisão pública", argument aFarias .

O exemplo da CulturaA TV Cultura de São Paulo, desde a

década de 80, vem assumindo um pape lde emissora pública, não apenas no esta -tuto, mas também pela programação in -dependente e diferenciada .

A diferença é que agora, a Cultura li -dera, ao lado da carioca TVE, a união de

Claudio Bojunga : conquista do cidadã o

25 emissoras educativas (uma de cad aEstado, com exceção do Amapá) na Red ePública de Televisão (RPTV) . Juntas des -de 1998, elas pretendem finalmente con -solidar no Brasil este modelo de televi-são, tão comum em países do primeir omundo .

"Formamos uma rede diferente da stradicionais porque cada emissora te mabsoluta liberdade para fazer sua progra -mação, o que nos ajuda a levantar a re-ceita sem abrir mão da regionalidade" ,explica Mauro Garcia .

A fórmula possibilitou que as emisso-ras transmitissem seis horas de programa-

cão conjunta, que até agora é gerada prin -cipalmente a partir da paulista Cultura eda TVE do Rio de Janeiro. "Mas a qual -quer momento a rede pode ter seu eixogerador transferido para outras emissora sdo país, como a TV Cultura do Pará, a TVMinas e a TVE da Bahia", acrescenta opresidente da ABEPEC .

Mas, afinal, por que o Brasil demo-rou tanto para consolidar sua rede de te-levisões públicas ?

Uma explicação dada por Garcia éque finalmente as emissoras aprendera ma utilizar as regras do mercado a seu fa-vor, sem sacrifício da programação : " aformação de uma rede facilita a atuaçã odas agências, dos clientes e traz uma nov afrente de receita" .

Marco Antônio Coelho Filho, diretorde jornalismo da TV Cultura, credita ademora à proteção especial que o mode-lo privado sempre recebeu do poder pú-blico . "A televisão brasileira nasceu e per-maneceu exclusivamente na esfera da ini -ciativa privada, mas os desacertos come -tidos nos últimos anos pela televisão co-mercial deram fôlego novo à tevê públicae ensejaram a criação da rede", afirma .

O diretor de jornalismo da TVE, Cláu -dio Bojunga, insere o fortalecimento daseducativas no fortalecimento da socieda-de civil brasileira . "A conquista não énossa, é do cidadão . No Brasil, cada ve zmais nos tornamos mais fortes que o Es-tado e nos damos conta que a esfera pú-blica não coincide com a estatal", diz .

Evilásio : defesa por controle remoto

Revista IMPRENSA - 20

Page 5: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

"A TV Pública estáinteressada na audiência ,mas para nós audiênci aé um dos instrumento spara aferirmos nossa

prestação de serviços . Émeio, não é fim como na s

emissoras comerciais ."Mauro Garci a

Embate lega lHoje, a receita da TV Cultura é 75 %

estatal e 25% de captações em empresa sprivadas . A intenção é aumentar a parti-cipação da sociedade, subindo a capta-ção para 50% e deixando o restante par aa União .

As emissoras públicas não podem dis -pensar totalmente a verba estatal, já qu eé essa garantia financeira que permite aelas serem independentes do mercado eda disputa pela audiência .

"Por outro lado, precisamos modifi-car nossa relação com o Estado, que épaternalista e está habituado a fazer co mque você pese cada vez menos no bolso ,mas continue sendo tutelado", afirm aCláudio Bojunga .

Antes da Associação de Comunicação

Educativa Roquete Pinto (ACERP) ser trans -formada em Organização Social, em 1998 ,a TVE do Rio de Janeiro - que faz parte d ainstituição - era constituída como um aempresa pública ligada ao governo fede-ral . Como Organização Social, a associa -ção passou para o terceiro setor, ou seja ,uma empresa de caráter público com prá -ticas de empresa privada .

Até agora, apenas a ACERP adoto ueste modelo de gerenciamento, idealiza -do dentro da Reforma do Estado . As emis -soras educativas dos outros Estados ain -da funcionam como repartições públicas .

Diferente das demais, a Fundaçã oPadre Anchieta, da TV Cultura, foi con-cebida como entidade pública de direit oprivado . Por isso, além de ter conquista -do há mais tempo a independência d ogoverno, foi pioneira na utilização das lei sde incentivo à cultura - como a Rouanet,de 1998 - para a captação de patrocíni-os na forma de apoio cultural .

"Aqui o governo tem que dar o di -nheiro, mas não manda, porque não es-colhe o presidente . Ele é escolhido po rum conselho de 45 membros em que ogoverno tem apenas quatro votos . A Cul -tura nasceu assim e o conselho foi me-lhorando, cada vez menos atrelado aoEstado", explica Marco Antônio Coelho .

A TV Cultura começou sua passage mde televisão educativa para televisão pú -blica em 1986, durante a gestão do ex -presidente da Fundação Padre Anchieta ,

Roberto Muylaert . Des-de então, a emissor aconseguiu desenvolve rprogramas diferencia-dos para os público sinfantil e juvenil, além

de investir em séries de docu-mentário se programas jornalísticos com abordagen sdiferentes das oferecidas pelas emissora scomerciais .

"Depois da criação da Rede Pública ,as emissoras que ainda são tuteladas pel oEstado querem cada vez mais ser públi-cas", comemora Coelho .

Bojunga espera que os governos es-taduais agilizem a transformação das te-levisões em Organização Social para qu etodas possam seguir o caminho da TVE .Recentemente, o canal lançou uma cam-panha publicitária, que busca divulgar aqualidade da programação e estimular apropaganda institucional .

"Uma repartição pública está muitosujeita ao nepotismo, à tutela e à censu-ra . O Estado, nos deixando em uma figu-ra de entidade pública de direito priva -do, permite combinar o dinamismo domercado com a missão pública . Mas iss oencontra resistências porque, há sempreos nostálgicos da repartição", acrescentao diretor . (Vale lembrar aqui, a censuraque a TVE sofreu quando foi impedid ade exibir a entrevista que o program aRoda Viva fez com o líder do MST, Joã oPedro Stédile, em maio . )

Agora, o fortalecimento definitivo va idepender do reconhecimento legal dasemissoras como organizações sociais e dacapacidade de cada uma para conquis-tar anunciantes e, é claro, telespectadores .

TV pública, jornalismo públic oUm apresentador sem gravata cami-

nha pela redação enquanto introduz apróxima matéria do telejornal . Da ilha d eedição, ele dá uma prévia do que serámostrado no último bloco .

Ele não se prende ao teleprompte rnem se martiriza se errar a pronúncia d eSlobodan Milosevic . Enquanto isso, a re-dação continua seu trabalho como se nã ofizesse parte do cenário do programa . Éassim, de um jeito simples e sério, qu eaparece na telinha a nova proposta d etelejornalismo da TV Cultura .

Se esta emissora é uma empresa dife-rente, que não visa lucro, mas a educa-ção e a formação complementar do ho-

Coelho e Jorgeda Cunha Lima :reuniões durant edois anos paradefinir aprogramação e oconceit o

Revista IMPRENSA - 21

Page 6: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Matéria de Cap a

Na França, uma TVsem anúnci o

As emissoras públicas francesas, a ocontrário das brasileiras, não têm do qu ereclamar. Ao contrário, tem o que come -morar.

A TV5, um dos vários canais públicosda França, conseguiu levar sua progra-mação francófona para quase a metad edo planeta (46%), e elevar a audiênci amundial para quase 39% . Atualmente, aemissora fica atrás apenas das norte-ame-ricanas CNN e MTV.

O feito é atribuído ao diretor geral d aTV5, Jean Stock, que esteve no Brasil comsua equipe em outubro para comanda r24 horas de programação gerada direta -mente do Rio de Janeiro .

Segundo Stock, uma televisão comer-cial não conseguiria levar sua programa-ção para o mundo todo como fez a TV5 ."Hoje, fazer isso não é rentável . Porém ,existe uma demanda por nossa progra-mação e nós temos a responsabilidade d eatender essa necessidade . A única manei -ra de fazer isso é com o dinheiro de im-postos", explica .

Stock : audiência internacional elevada

O financiamento da TV5 vem 95 %de taxas pagas pela população e 5% d epublicidade . Os anúncios - pasmem -não são colocados para aumentarem areceita, mas para darem ritmo à progra-mação e levarem a criação audiovisua lfrancesa para outros países.

"Se com isso a gente conseguir umpouco mais de dinheiro para custea ruma operação como esta no Rio, me-lhor", garante Stock .

Outra grande diferença é que ocontrole da programação não é feitopor homens do governo, mas pela pró-pria população .

A diretora de comunicação da TV5 ,Souné Wade - uma grande admirado-ra das novelas brasileiras - conta quehá pouco tempo houve um debate emtoda a França para discutir se seria jus-to que a sociedade continuasse man-tendo as televisões públicas, já qu egrande parte da população paga parater acesso aos canais fechados .

O governo manteve o imposto paranão dar às emissoras públicas o argu-mento de que elas precisariam agi rcomo as comerciais, que apelam paraconquistar audiência e anunciantes .

"Já não queriam mais colocar, po rexemplo, programas literários e cultu -rais no horário nobre, porque não dãopúblico", relata Wade .

A sociedade civil reclamou e conse-guiu regulamentar a programação po rfaixas de idade e até mesmo controlar aexibição de cenas de violência gratuit anos telejornais . "Você pode mostrar a vi-olência, mas nunca sem uma explicação ,sem um contexto", explica a diretora .

Hoje, ela vê uma nova tendênci ana televisão francesa : "O público ama-dureceu e podemos dizer que até o sgrandes canais privados se deram con -ta que, se chocarem o público, vãoperder audiência" .

mem, por que deve ter um jornalism oigual ao das empresas comerciais ?

Foi a partir dessa pergunta, inspirad apelo atual presidente da Fundação PadreAnchieta, o jornalista Jorge da Cunh aLima, que Marco Antônio Coelho Filhoidealizou e concretizou o novo jornalis-mo público da emissora .

"Em 98, quando cheguei aqui, já ha -via um jornalismo diferente que era feit onos programas de reflexão, como o RodaViva, e nos documentários . Mas esseaprofundamento não existia no stelejornais, que tinham credibilidade, in -dependência, mas que não eram diferen-tes . O Jorge queria que a gente desse u msalto para a TV pública de fato", cont aMarco Antônio Coelho .

Logo no início ele percebeu que nã oadiantaria impor um novo modelo d etelejornalismo . Seria preciso envolve rtoda a equipe e fazer com que todos trou-xessem propostas e participassem ativa -mente das mudanças .

Por isso, depois de uma reunião ini-cial, a redação foi divida em 12 grupo sde dez pessoas para discutirem e prepa-rarem relatórios com suas idéias . No to -tal, foram dois anos de reuniões ,workshops e laboratórios até chegarem àproposta atual .

A conclusão foi que o jornalismo pú-blico deve ser voltado para a construçã oda cidadania e ser pautado mais pela shistórias de construção que de destruição .Sua principal diferença é enxergar no te-lespectador um cidadão, e não um sim-ples consumidor.

"Essa premissa redefine tudo - d oconteúdo ao formato . Em lugar das man-chetes chamativas e das coberturas su-perficiais, prevalece a informação apro-fundada e contextualizada . As pautas sã odefinidas menos pelo impacto que cau-sam nos números do IBOPE, que pela re-levância para a sociedade . Daí, por exem-plo, a preocupação constante com o es-clarecimento e o debate das política spúblicas - tema, no geral, rotulado d eárido e pouco televisivo", diz Coelho .

Segundo o diretor, uma mudança im-portante foi a valorização da equipe d e

Revista INIPRENSA - 22

Page 7: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Vanessa Kalil e Alan Severiano discutem a pauta antes do programa Matéria Pública .

e,>

pauta, já que é da primeira concepçãode uma matéria que deve sair a dosage mcerta de informação factual e reflexão .

"Se eu preciso de matérias com u mconteúdo maior e melhor que o das ma-térias de mercado, eu devo ter na pontainicial, ou seja, na pauta, uma pessoa co mmais experiência, cultura e a maior ca-pacidade de escrever um roteiro", expli-ca . No processo de produção tradicional ,o pauteiro geralmente é o profissional qu eacabou de sair da faculdade e o mais ma lremunerado .

No dia-a-di aZélia Arruda, uma das quatro edito-

ras do jornal Matéria Pública, exemplific acomo esses conceitos aparecem na práti -ca : "Recentemente nós pautamos um re-pórter para cobrir uma invasão d o

" O que mata ojornalismo é a falta de

curiosidade com relaçã oao conhecimento . Eu vou

ter que forma rprofissionais aqui dentro

porque o jornalism opúblico é um conceitoque eu não vi em lugar

nenhum."Marco Antônio Coelho Filho

Greenpeace a supermercados de São Pau-lo . Na verdade, a intenção era discutir aquestão dos produtos transgênicos a par -tir desta notícia . A matéria foi derrubada ,porque o que chegou da rua foi uma merainvasão de supermercado" .

A diretora do programa, Vanessa Kalil ,conta que, no início, sua maior dificul-dade foi perceber que qualquer assunt opoderia ser tratado dentro dos princípiosdo jornalismo público . "Na verdade, s ómuda o tipo de abordagem . Ao invés deapenas noticiar uma chacina, por exem-plo, a gente deve contextualizar, discuti ros motivos daquilo, e não ficar só na ex -ploração da miséria humana", diz .

Zélia Arruda concorda, mas lembr aque ainda é difícil colocar os conceito sem prática em todas as matérias . Alémda dificuldade de encontrar o tratament omais correto para cada assunto, ela di zque uma preocupação da equipe está e mpassar a informação de uma maneir aagradável e atraente, para que otelespectador se sinta cativado e associ ea notícia à sua própria realidade .

"Nós não queremos impor formas d eagir, mas apontar caminhos e reflexõe spara a pessoa se posicionar . Falando, agente consegue saber exatamente o qu eé isso, mas no dia-a-dia é bem mais difí-cil", admite Zélia .

Novas linguagensPara apresentar esse conceito d e

telejornalismo foi preciso encontrar u mformato diferente de apresentação, afina -do com os propósitos teóricos . Se não

Zélia : no dia-a-dia é bem mais difíci l

houvesse muita criatividade dos profissi-onais, um risco seria cair no didatismo ,que geralmente não atrai o público .

O cenário dos telejornais, por exem-plo, deixou de ser uma mesa atrás da qua lo apresentador senta e sobriamente ditaverdades aparentemente imparciais . Um amesa redonda foi levada para o centr oda redação para que o telespectador pre-sencie o processo de produção d otelejornal .

"A gente não quer ficar duro em fren-te a um teleprompter . O telejor-nalism opúblico deve ser mais próximo das pes-soas, deve mostrar como fazemos nossotrabalho, que a gente também erra . Aapresentação é mais descontraída e nãotem a preocupação de fazer uma locu -

Revista IMPRENSA - 23

Page 8: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

Matéria Pública no ar : nada de voz empostad a

ção empostada", explica Alan Severiano ,apresentador do Matéria Pública .

Já as reportagens não precisam obe-decer à fórmula clássica off-sonora-pas-sagem, repetida incansavelmente no stelejornais brasileiros, inspirados no con -sagrado modelo norte-americano .

Uma opção diferente e muito usad aneste telejornalismo é a vídeo reporta -gem, que minimiza a presença da televi-são durante as captações . "Uma pessoasozinha interfere menos na veracidad edos fatos . Quando chega uma equipeimensa todo mundo modifica o compor-

Tetê Muniz : furo no seqüestro do ônibu s174 no Rio de Janeiro .

tamento", justifica Kalil .A câmera também muda . A captaçã o

das imagens acompanha o olhar d ocinegrafista, os planos são abertos e o scortes diminuem, já que a intenção édeixar a câmera caminhar com o repór-ter. A edição das matérias recebe a mes-ma orientação .

Na opinião de Coelho, a Cultura de uapenas o primeiro passo . Ele faz questãode lembrar que as mudanças vão aconte -cer aos poucos, porque "tanto o jornalis -ta está viciado em fazer jornalismo de u mdeterminado jeito quanto o telespectado restá viciado em ver desse mesmo jeito" ."Nós só estamos começando a quebra risso", ressalta .

O conteúdo em questãoPara o diretor da TVE, Cláudi o

Bojunga, fazer jornalismo público nãoimplica necessariamente na mudança d aestrutura formal de matérias ou da ma-neira de apresentar.

"Seja na BBC de Londres ou na CB Samericana, que têm propostas completa -mente diferentes, as técnicas são sempreas mesmas", justifica .

As hard news também não perde mespaço. Sua idéia é oferecer conteúdo sque normalmente não encontram espa-ço nas emissoras comerciais .

"Não me importo tanto em coloca rno ar uma redação bonita, mas garantir asustentabilidade de programas que con -sidero indispensáveis e que nunca seri-am levados ao ar por uma emissora co-mercial", diz Bojunga .

Um exemplo é o jornal RevistaMercosul, que procura mostrar a impor-tância desse processo político e econô-mico para o país . Outro programa quedificilmente entraria na grade de um ca-nal privado é o Direito em Debate, qu ediscute a legislação brasileira e orient aos telespectadores sobre seus direitos .

Porém, Bojunga lembra que o princí-pio que está por trás da programação d aTVE é o mesmo de todas as televisões pú -blicas : "a idéia é instrumentalizar o cida-dão para que ele seja mais que um con-sumidor" .

A proposta de procurar enfoques di-ferentes para as notícias diárias també mpermanece e está tão gravada no traba-lho dos jornalistas que recentemente doi sprofissionais da emissora furaram os ou-tros canais no episódio do seqüestro d eum ônibus da linha 174, no Rio de Janei-ro, em junho deste ano .

"Nosso cinegrafista e nosso repórte restavam tão preocupados com o que po-deria acontecer com o seqüestrador quan -do ele fosse preso, que assim que o seqües -tro terminou toda a imprensa correu par aum lado, enquanto os dois correram para ooposto", conta a gerente de jornalismo, TetêMuniz . Por isso, a TVE foi a única emissor aque conseguiu as imagens que provara mque bandido entrou vivo no carro da polí -cia, de onde ele saiu morto minutos depois .

Esse diferencial tem chamado a aten -ção do público de outras emissoras .Bojunga conta que uma pesquisa revelo uo aumento do número de telespectadore sda classe C . Para ele, a TVE está atraind ouma parte da população que não tem aces -so aos canais pagos e já está cansada d aapelação dos canais abertos .

Agora, Bojunga diz que a meta é con -vencer os publicitários a pensarem a te-levisão pública como uma mídia de ca-racterísticas e públicos especiais e aumen -tar os índices de audiência sem perde rde vista a missão educativa .

"Precisamos ser aquele professor quetodos os alunos adoram . O ideal seria qu eas pessoas aprendessem a gostar de se rcidadãs com as emissoras públicas . Agente está longe disso, eu sei ."i

Revista IMPRENSA - 24

Page 9: COMERCIAL PÚBLICA - Notícias, Jornalismo, Comunicaçãoportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/2000_02_Nov_2000.pdf · nem uma proteção amparada em leis, dependem da boa vontade dos

TV Públicaa e

TV privada també m

cujos donos são 141 operadoras de emis-soras locais espalhadas por todos os Es-tados Unidos .

Em seu quartel general e mAlexandria, no estado da Virgínia, seu sexecutivos supervisionam a aquisição d eprogramas, distribuição e promoções ,serviços educativos, financiamento, en-genharia e tecno-logia .

Embora a PBS não realize produçõe spróprias, programas criados pelas esta-ções afiliadas juntam-se a outros adqui-ridos internacionalmente (inclusive bri-tânicos) em pacotes de programaçã o

(National Program Service) fornecidospara 348 emissoras afiliadas, atingind o99% dos lares com televisão no país .

Das 171 operadoras, 87 (51%) sãoorganizações comunitárias, 55 (32%) sãouniversidades . 21 (12%) são autoridade sestatais e 8 (5%) são instituições educa -

é públicaLuiz Guilherme Duarte,

de Miami .

Embora com nome e conceito de T Vpública, a rede PBS americana é umaempresa privada altamente bem sucedi -

da; um exemplo de que televisão com

qualidade não precisa ser estatal . Neminglesa .

Políticos e acadêmicos brasileiros j áchegaram a sugerir a abolição de um adas mais antigas indústrias privadas detelevisão da história, a do Brasil, e mfavor de um modelo britânico estatal ,considerado o melhor do mundo .

Eles apontaram para uma tendênci aao popularesco na TV brasileira comojustificativa para a revogação das licen-ças concedidas à redes como a Glob o(aquela que produziu a "Escrava Isaura "e "Sertões" entre outros), a Manchete (d e"Dona Beija") e outras mais . Em seu lu -gar, propunham a implementação de re -

des como a britânica BBC, sustentad apelo governo e impostos, mas com pro-gramação mais erudita e educacional ,portanto, capaz de proporcionar maio r"valor" ao povo brasileiro .

Entretanto, antes de se pular o Atlân-tico e buscar mais trabalho para um go-verno já bastante ocupado e pouco efici -ente, talvez seja interessante se explorarum outro modelo mais próximo da reali-dade brasileira . Nesse continente mesmoe sem grandes suportes estatais, a redeamericana PB parece estar muito mai spróxima das ambições de emissoras com o

a TV Cultura de São Paulo, por exemplo .A Public Broadcasting System (PBS)

foi fundada em 1969 como um acorporação privada sem fins lucrativos,

cionais municipais .A PBS é o recurso de televisão nú-

mero um nas escolas americanas e amaior fonte de telecursos para educaçãode adultos, com mais de 5 milhões d ediplomados, desde 1981 . Quando não

está educando, a PBS está entretendo .Sempre em alto nível .

Um estudo da Universidade d aPensilvânia, em 1999 ,reportou que a red etem a melhor progra-mação infantil (Arthur,Barney, Teletubbies ,Vila Sésamo, etc .) .Nada de violência oulinguagem de baixo ní-vel, e a maior varieda-

de de gênero e etnia .Em 1999, a PBS

recebeu mais indica-ções ao Emmy (o Os -car da televisão ameri-cana) no gênero docu-mentário do que qual -quer outra empresa d etelevisão.

Incentivados por gordos descontosem seus impostos, centenas d ecorporações e milhares de indivíduo sfazem doações regulares para a PBS .

Assim, suas rendas operacionai s

cresceram 56% desde 1995, chegando aUS$ 284 milhões, em 1999 .

Até 70% das rendas da PBS vem d eindivíduos, cidadãos comuns, enquantoo Ministério da Educação americanogarante recursos para a manutenção demuitos dos projetos educacionais dessaorganização, sobre a qual não exerc econtrole real .

Como diz um release da empresa, aPBS é uma das poucas garantias de T V

de acesso universal, oferecendo o queas outras redes não tem inclinação par a

fazê-lo : "Afinal, depois de 30 anos, po r

que ninguém se dispôs a criar outra Vil aSésamo?"j(

Revista I\1PRI~\S,a - 25