Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito do Patrimônio Cultural - v. 01, n. 05

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Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em trabalhar, academicamente, determinados assuntos. Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo dogmático. É possível, à luz da tradicional visão empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual não se incluem somente as instituições legais, as ordens legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das mencionadas instituições, ordens e decisões, materializando, comumente, uma “meta direito”. No Direito, a construção do conhecimento advém da interpretação de leis e as pessoas autorizadas a interpretar as leis são os juristas.Contudo, o alvorecer acadêmico que é presenciado pelos Operadores do Direito, que se debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando as experiências empíricas e o contorno regional como elementos indissociáveis para a compreensão do Direito. Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento jurídico como algo dogmático, buscando conferir molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e inquietações produzida durante a formação acadêmica do autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática de Direito do Patrimônio Cultural, o presente busca trazer para o debate uma série de assuntos contemporâneos e que reclamam maiores reflexões.

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  • TAU LIMA VERDAN

    RANGEL

    COMPNDIO DE ENSAIOS

    JURDICOS: TEMAS DE DIREITO

    DO PATRIMNIO CULTURAL

    V.

    01

    N.

    05

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURDICOS:

    TEMAS DE DIREITO DO PATRIMNIO

    CULTURAL

    (V. 01, N. 05)

    Capa: Cndido Portinari, Gado (1938).

    ISBN: 978-1517022389

    Editorao, padronizao e formatao de texto

    Tau Lima Verdan Rangel

    Projeto Grfico e capa

    Tau Lima Verdan Rangel

    Contedo, citaes e referncias bibliogrficas

    O autor

    de inteira responsabilidade do autor os conceitos aqui

    apresentados. Reproduo dos textos autorizada

    mediante citao da fonte.

  • A P R E S E N T A O

    Tradicionalmente, o Direito reproduzido por

    meio de doutrinas, que constituem o pensamento de

    pessoas reconhecidas pela comunidade jurdica em

    trabalhar, academicamente, determinados assuntos.

    Assim, o saber jurdico sempre foi concebido como algo

    dogmtico. possvel, luz da tradicional viso

    empregada, afirmar que o Direito um campo no qual

    no se incluem somente as instituies legais, as ordens

    legais, as decises legais; mas, ainda, so computados

    tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das

    mencionadas instituies, ordens e decises,

    materializando, comumente, uma meta direito. No

    Direito, a construo do conhecimento advm da

    interpretao de leis e as pessoas autorizadas a

    interpretar as leis so os juristas.

    Contudo, o alvorecer acadmico que

    presenciado pelos Operadores do Direito, que se

    debruam no desenvolvimento de pesquisas, passa a

    conceber o conhecimento de maneira prtica, utilizando

    as experincias empricas e o contorno regional como

    elementos indissociveis para a compreenso do Direito.

    Ultrapassa-se a tradicional viso do conhecimento

  • jurdico como algo dogmtico, buscando conferir

    molduras acadmicas, por meio do emprego de mtodos

    cientficos. Neste aspecto, o Compndio de Ensaios

    Jurdico objetiva disponibilizar para a comunidade

    interessada uma coletnea de trabalhos, reflexes e

    inquietaes produzida durante a formao acadmica do

    autor. Debruando-se especificamente sobre a temtica

    de Direito do Patrimnio Cultural, o presente busca

    trazer para o debate uma srie de assuntos

    contemporneos e que reclamam maiores reflexes.

    Boa leitura!

    Tau Lima Verdan Rangel

  • 5

    S U M R I O

    Tessituras ao Programa Nacional do Patrimnio

    Imaterial (PNPI): breves explicitaes ............................... 06

    O Sistema Nacional de Informaes e Indicadores

    Culturais (SNIIC) em exame: singelas ponderaes Lei

    n 12.343/2010 ...................................................................... 43

    O Plano Nacional de Cultura em anlise: primeiros

    comentrios Lei n 12.343/2010 ....................................... 73

    O Plano de Ao para as Cidades Histricas:

    apontamentos ao instrumento integrado para a gesto do

    patrimnio cultural com enfoque territorial ...................... 110

    Explicitaes ao Plano de Preservao de Stio Histrico

    Urbano (PPSH): apontamentos Portaria n 299/2004 do

    IPHAN ................................................................................. 141

  • 6

    TESSITURAS AO PROGRAMA NACIONAL DO

    PATRIMNIO IMATERIAL (PNPI): BREVES

    EXPLICITAES

    Resumo: O objetivo do presente discorrer acerca

    do Programa Nacional do Patrimnio Imaterial

    (PNPI). Em sede de comentrios introdutrios,

    cuida salientar que o meio ambiente cultural

    constitudo por bens culturais, cuja acepo

    compreende aqueles que possuem valor histrico,

    artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,

    fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as

    caractersticas de uma determinada sociedade. Ao

    lado disso, quadra anotar que a cultura identifica

    as sociedades humanas, sendo formada pela

    histria e maciamente influenciada pela natureza,

    como localizao geogrfica e clima. Com efeito, o

    meio ambiente cultural decorre de uma intensa

    interao entre homem e natureza, porquanto

    aquele constri o seu meio, e toda sua atividade e

  • 7

    percepo so conformadas pela sua cultural. Ao

    lado disso, a cultura brasileira o resultado daquilo

    que era prprio das populaes tradicionais

    indgenas e das transformaes trazidas pelos

    diversos grupos colonizadores e escravos africanos.

    O conceito de patrimnio histrico e artstico

    nacional abrange todos os bens moveis e imveis,

    existentes no Pas, cuja conservao seja de

    interesse pblico, por sua vinculao a fatos

    memorveis da Histria ptria ou por seu

    excepcional valor artstico, arqueolgico,

    etnogrfico, bibliogrfico e ambiental.

    Palavras-chaves: Patrimnio Cultural Imaterial.

    Programa Nacional. Salvaguarda.

    Sumrio: 1 Ponderaes Introdutrias: Breves

    notas construo terica do Direito Ambiental; 2

    Comentrios concepo de Meio Ambiente; 3 Meio

    Ambiente e Patrimnio Cultural: Aspectos

    Introdutrios; 4 Ponderaes Proeminncia do

    Instituto do Registro como mecanismo de

    preservao dos Bens Culturais Imateriais; 5

    Tessituras ao Programa Nacional do Patrimnio

    Imaterial (PNPI): Breves Explicitaes

  • 8

    1 PONDERAES INTRODUTRIAS: BREVES

    NOTAS CONSTRUO TERICA DO DIREITO

    AMBIENTAL

    Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

    do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

    Cincia Jurdica, enquanto um conjunto multifacetado de

    arcabouo doutrinrio e tcnico, assim como as robustas

    ramificaes que a integram, reclama uma interpretao

    alicerada nos plurais aspectos modificadores que

    passaram a influir em sua estruturao. Neste alamir,

    lanando tona os aspectos caractersticos de

    mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

    se imperioso salientar, com nfase, que no mais subsiste

    uma viso arrimada em preceitos estagnados e

    estanques, alheios s necessidades e s diversidades

    sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

    Jurdicos. Ora, infere-se que no mais prospera o

    arcabouo imutvel que outrora sedimentava a aplicao

    das leis, sendo, em decorrncia dos anseios da populao,

    suplantados em uma nova sistemtica.

    Com espeque em tais premissas, cuida

    hastear, com bastante pertinncia, como flmula de

    interpretao o prisma de avaliao o brocardo jurdico

  • 9

    'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde est a sociedade, est

    o Direito', tornando explcita e cristalina a relao de

    interdependncia que esse binmio mantm1. Destarte,

    com clareza solar, denota-se que h uma interao

    consolidada na mtua dependncia, j que o primeiro

    tem suas balizas fincadas no constante processo de

    evoluo da sociedade, com o fito de que seus Diplomas

    Legislativos e institutos no fiquem inquinados de

    inaptido e arcasmo, em total descompasso com a

    realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

    estrutural dependncia das regras consolidadas pelo

    Ordenamento Ptrio, cujo escopo primevo assegurar

    que no haja uma vingana privada, afastando, por

    extenso, qualquer rano que rememore priscas eras em

    que o homem valorizava a Lei de Talio (Olho por olho,

    dente por dente), bem como para evitar que se robustea

    um cenrio catico no seio da coletividade.

    Ademais, com a promulgao da Constituio

    da Repblica Federativa do Brasil de 1988,

    imprescindvel se fez adot-la como macio axioma de

    sustentao do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

    1 VERDAN, Tau Lima. Princpio da Legalidade: Corolrio do

    Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas, Bauru, 22 jun.

    2009. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.

    2015.

  • 10

    quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genrico

    e abstrato, aos complexos anseios e mltiplas

    necessidades que influenciam a realidade

    contempornea. Ao lado disso, h que se citar o voto

    magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

    apreciar a Ao de Descumprimento de Preceito

    Fundamental N. 46/DF, o direito um organismo vivo,

    peculiar porm porque no envelhece, nem permanece

    jovem, pois contemporneo realidade. O direito um

    dinamismo. Essa, a sua fora, o seu fascnio, a sua

    beleza2. Como bem pontuado, o fascnio da Cincia

    Jurdica jaz, justamente, na constante e imprescindvel

    mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

    que reverbera na sociedade e orienta a aplicao dos

    2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo em Arguio de

    Descumprimento de Preceito Fundamental N. 46/DF. Empresa

    Pblica de Correios e Telgrafos. Privilgio de Entrega de

    Correspondncias. Servio Postal. Controvrsia referente Lei

    Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

    direitos e obrigaes concernentes ao Servio Postal. Previso de

    Sanes nas Hipteses de Violao do Privilgio Postal.

    Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegao de

    afronta ao disposto nos artigos 1, inciso IV; 5, inciso XIII, 170,

    caput, inciso IV e pargrafo nico, e 173 da Constituio do Brasil.

    Violao dos Princpios da Livre Concorrncia e Livre Iniciativa. No

    Caracterizao. Arguio Julgada Improcedente. Interpretao

    conforme Constituio conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

    estabelece sano, se configurada a violao do privilgio postal da

    Unio. Aplicao s atividades postais descritas no artigo 9, da lei.

    rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurlio.

    Julgado em 05 ag. 2009. Disponvel em: . Acesso em

    15 ago. 2015.

  • 11

    Diplomas Legais e os institutos jurdicos neles

    consagrados.

    Ainda neste substrato de exposio, pode-se

    evidenciar que a concepo ps-positivista que passou a

    permear o Direito, ofertou, por via de consequncia, uma

    rotunda independncia dos estudiosos e profissionais da

    Cincia Jurdica. Alis, h que se citar o entendimento

    de Verdan, esta doutrina o ponto culminante de uma

    progressiva evoluo acerca do valor atribudo aos

    princpios em face da legislao3. Destarte, a partir de

    uma anlise profunda dos mencionados sustentculos,

    infere-se que o ponto central da corrente ps-positivista

    cinge-se valorao da robusta tbua principiolgica que

    Direito e, por conseguinte, o arcabouo normativo

    passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

    vinculante, flmulas hasteadas a serem adotadas na

    aplicao e interpretao do contedo das leis, diante das

    situaes concretas.

    Nas ltimas dcadas, o aspecto de

    mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

    quando se analisa a construo de novos que derivam da

    Cincia Jurdica. Entre estes, cuida destacar a

    ramificao ambiental, considerando como um ponto de

    3 VERDAN, 2009, s.p.

  • 12

    congruncia da formao de novos iderios e cnones,

    motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

    novos valores adotados. Nesta trilha de argumentao,

    de boa tcnica se apresenta os ensinamentos de

    Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

    aduz: Com a intensificao, entretanto, do interesse dos

    estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar

    as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito

    mais ligadas s cincias biolgicas, at ento era

    marginalizadas4. Assim, em decorrncia da

    proeminncia que os temas ambientais vm, de maneira

    paulatina, alcanando, notadamente a partir das ltimas

    discusses internacionais envolvendo a necessidade de

    um desenvolvimento econmico pautado em

    sustentabilidade, no raro que prospere, mormente em

    razo de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

    mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

    ramificao ambiental do Direito, com o fito de permitir

    que ocorra a conservao e recuperao das reas

    degradadas, primacialmente as culturais.

    4 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificao do

    meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemtica sobre a

    existncia ou a inexistncia das classes do meio-ambiente do

    trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurdico, Uberaba,

    ano 5, n. 968. Disponvel em: .

    Acesso em 15 ago. 2015.

  • 13

    Ademais, h de ressaltar ainda que o direito

    ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

    dcadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

    farta e slida tbua de direitos fundamentais. Calha

    realar, com cores quentes, que mais contemporneos, os

    direitos que constituem a terceira dimenso recebem a

    alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

    solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

    patente preocupao com o destino da humanidade5.

    Ora, da se verifica a incluso de meio ambiente como um

    direito fundamental, logo, est umbilicalmente atrelado

    com humanismo e, por extenso, a um ideal de sociedade

    mais justa e solidria. Nesse sentido, ainda, plausvel

    citar o artigo 3., inciso I, da Carta de 1988 que abriga

    em sua redao tais pressupostos como os princpios

    fundamentais do Estado Democrtico de Direitos: Art.

    3 - Constituem objetivos fundamentais da Repblica

    Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

    justa e solidria6.

    Ainda nesta esteira, possvel verificar que a

    5 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional Teoria, Jurisprudncia e 1.000 Questes 15 ed., rev., ampl. e

    atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 6 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica

    Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel

    em: . Acesso em 15 ago. 2015.

  • 14

    construo dos direitos encampados sob a rubrica de

    terceira dimenso tende a identificar a existncia de

    valores concernentes a uma determinada categoria de

    pessoas, consideradas enquanto unidade, no mais

    prosperando a tpica fragmentao individual de seus

    componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

    momento pretrito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

    pertinente as ponderaes vertidas, insta trazer colao

    o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N. 1.856/RJ, em

    especial quando destaca:

    Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

    direitos de terceira gerao (ou de

    novssima dimenso), que materializam

    poderes de titularidade coletiva atribudos,

    genericamente, e de modo difuso, a todos os

    integrantes dos agrupamentos sociais,

    consagram o princpio da solidariedade e

    constituem, por isso mesmo, ao lado dos

    denominados direitos de quarta gerao

    (como o direito ao desenvolvimento e o

    direito paz), um momento importante no

    processo de expanso e reconhecimento dos

    direitos humanos, qualificados estes,

    enquanto valores fundamentais

    indisponveis, como prerrogativas

    impregnadas de uma natureza

    essencialmente inexaurvel7.

    7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em Ao

    Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De

    Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -

    Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies

  • 15

    Cuida reconhecer, dessa maneira, que os

    direitos encampados sob a rubrica da terceira dimenso

    guardam ntima relao com a promoo da

    solidariedade, dispensando ateno ao iderio de unidade

    de indivduos, considerados enquanto coletividade e no

    isoladamente. Tm primeiro por destinatrios o gnero

    humano mesmo, num momento expressivo de sua

    afirmao como valor supremo em termos de

    existencialidade concreta8. Com efeito, os direitos de

    terceira dimenso, dentre os quais se inclui ao meio

    ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

    Constituio Federal de 1988, emerge com um claro e

    tangvel aspecto de familiaridade, como pice da evoluo

    e concretizao dos direitos fundamentais.

    entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -

    Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

    crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,

    ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade

    (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de

    metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima

    dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo

    constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao

    da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da

    inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta

    procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de

    exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma

    que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

    Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015. 8 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

    atual. So Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

  • 16

    2 COMENTRIOS CONCEPO DE MEIO

    AMBIENTE

    Em uma primeira plana, ao lanar mo do

    sedimentado jurdico-doutrinrio apresentado pelo inciso

    I do artigo 3 da Lei N. 6.938, de 31 de agosto de 19819,

    que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente,

    seus fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d

    outras providncias, salienta que o meio ambiente

    consiste no conjunto e conjunto de condies, leis e

    influncias de ordem qumica, fsica e biolgica que

    permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

    Pois bem, com o escopo de promover uma facilitao do

    aspecto conceitual apresentado, possvel verificar que o

    meio ambiente se assenta em um complexo dilogo de

    fatores abiticos, provenientes de ordem qumica e fsica,

    e biticos, consistentes nas plurais e diversificadas

    formas de seres viventes. Consoante Silva, possvel

    considerar o meio ambiente como a interao do

    conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que

    propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em

    9 BRASIL. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispe sobre a

    Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

    formulao e aplicao, e d outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

  • 17

    todas as suas formas10.

    Nesta senda, ainda, Fiorillo11, ao tecer

    comentrios acerca da acepo conceitual de meio

    ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

    um iderio jurdico indeterminado, incumbindo, ao

    intrprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

    fluidez do tema, possvel colocar em evidncia que o

    meio ambiente encontra ntima e umbilical relao com

    os componentes que cercam o ser humano, os quais so

    de imprescindvel relevncia para a sua existncia. O

    Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ao Direta de

    Inconstitucionalidade N. 4.029/AM, salientou, com

    bastante pertinncia, que:

    [...] o meio ambiente um conceito hoje

    geminado com o de sade pblica, sade de

    cada indivduo, sadia qualidade de vida, diz

    a Constituio, por isso que estou falando

    de sade, e hoje todos ns sabemos que ele

    imbricado, conceitualmente geminado com

    o prprio desenvolvimento. Se antes ns

    dizamos que o meio ambiente compatvel

    com o desenvolvimento, hoje ns dizemos, a

    partir da Constituio, tecnicamente, que

    no pode haver desenvolvimento seno com

    o meio ambiente ecologicamente

    equilibrado. A geminao do conceito me

    10 SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. So

    Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.20. 11 FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de Direito

    Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. So Paulo:

    Editora Saraiva, 2012, p. 77.

  • 18

    parece de rigor tcnico, porque salta da

    prpria Constituio Federal12.

    denotvel, desta sorte, que a

    constitucionalizao do meio ambiente no Brasil

    viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

    concerne, especificamente, s normas de proteo

    ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

    corolrios e princpios norteadores foram alados ao

    patamar constitucional, assumindo colocao eminente,

    ao lado das liberdades pblicas e dos direitos

    fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

    Constituinte, ao entalhar a Carta Poltica Brasileira,

    ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

    dimenso, insculpir na redao do artigo 225, conceder

    amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

    integrante dos direitos fundamentais. Com o advento da

    12 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N 4.029/AM. Ao Direta de

    Inconstitucionalidade. Lei Federal N 11.516/07. Criao do Instituto

    Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade. Legitimidade da

    Associao Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

    de mbito Nacional. Violao do art. 62, caput e 9, da

    Constituio. No emisso de parecer pela Comisso Mista

    Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5, caput, e 6, caput

    e pargrafos 1 e 2, da Resoluo N 1 de 2002 do Congresso

    Nacional. Modulao dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

    Lei 9.868/99). Ao Direta Parcialmente Procedente. rgo

    Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

    mar. 2012. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.

    2015.

  • 19

    Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988,

    as normas de proteo ambiental so aladas categoria

    de normas constitucionais, com elaborao de captulo

    especialmente dedicado proteo do meio ambiente13.

    Nesta toada, ainda, observvel que o caput do artigo

    225 da Constituio Federal de 198814 est abalizado em

    quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em

    conjunto, do corpo a toda tbua ideolgica e terica que

    assegura o substrato de edificao da ramificao

    ambiental.

    Primeiramente, em decorrncia do tratamento

    dispensado pelo artfice da Constituio Federal, o meio

    ambiente foi iado condio de direito de todos,

    presentes e futuras geraes. encarado como algo

    pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

    no se admite o emprego de qualquer distino entre

    brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

    se, sim, a necessidade de preservao, conservao e no-

    13 THOM, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

    Novo Cdigo Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

    Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 14 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica

    Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel

    em: . Acesso em 15 ago. 2015: Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

    bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida,

    impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e

    preserv-lo para as presentes e futuras geraes.

  • 20

    poluio. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

    que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

    Brasileiro, no ficando centrado, apenas, na extenso

    nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

    sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ao

    Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ, destacou

    que:

    A preocupao com o meio ambiente - que

    hoje transcende o plano das presentes

    geraes, para tambm atuar em favor das

    geraes futuras [...] tem constitudo, por

    isso mesmo, objeto de regulaes

    normativas e de proclamaes jurdicas,

    que, ultrapassando a provncia meramente

    domstica do direito nacional de cada

    Estado soberano, projetam-se no plano das

    declaraes internacionais, que refletem, em

    sua expresso concreta, o compromisso das

    Naes com o indeclinvel respeito a esse

    direito fundamental que assiste a toda a

    Humanidade15.

    15 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De

    Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -

    Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies

    entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -

    Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

    crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,

    ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade

    (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de

    metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima

    dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo

    constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao

    da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da

    inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta

  • 21

    O termo todos, aludido na redao do caput

    do artigo 225 da Constituio Federal de 1988, faz

    meno aos j nascidos (presente gerao) e ainda

    aqueles que esto por nascer (futura gerao), cabendo

    queles zelar para que esses tenham sua disposio, no

    mnimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

    encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

    gnero humano o direito fundamental liberdade,

    igualdade e ao gozo de condies de vida adequada, em

    ambiente que permita desenvolver todas as suas

    potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

    Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

    seja, ultrapassa as geraes, logo, vivel afirmar que o

    meio-ambiente um direito pblico subjetivo. Desta

    feita, o iderio de que o meio ambiente substancializa

    patrimnio pblico a ser imperiosamente assegurado e

    protegido pelos organismos sociais e pelas instituies

    estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenuncivel

    que se impe, objetivando sempre o benefcio das

    presentes e das futuras geraes, incumbindo tanto ao

    procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de

    exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma

    que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

    Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

  • 22

    Poder Pblico quanto coletividade considerada em si

    mesma.

    Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

    erga omnes, sendo, portanto, oponvel contra a todos,

    incluindo pessoa fsica/natural ou jurdica, de direito

    pblico interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

    como tambm ente estatal, autarquia, fundao ou

    sociedade de economia mista. Impera, tambm,

    evidenciar que, como um direito difuso, no subiste a

    possibilidade de quantificar quantas so as pessoas

    atingidas, pois a poluio no afeta to s a populao

    local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade

    indeterminada. Nesta senda, o direito integridade do

    meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

    jurdica de titularidade coletiva, ressoando a expresso

    robusta de um poder deferido, no ao indivduo

    identificado em sua singularidade, mas num sentido

    mais amplo, atribudo prpria coletividade social. Com

    a nova sistemtica entabulada pela redao do artigo 225

    da Carta Maior, o meio-ambiente passou a ter

    autonomia, tal seja no est vinculada a leses

    perpetradas contra o ser humano para se agasalhar das

    reprimendas a serem utilizadas em relao ao ato

    perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de uso comum do

  • 23

    povo o segundo pilar que d corpo aos sustentculos do

    tema em tela. O axioma a ser esmiuado, est atrelado o

    meio-ambiente como vetor da sadia qualidade de vida, ou

    seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente, ao

    vincular a espcie humana est se tratando do bem-estar

    e condies mnimas de existncia. Igualmente, o

    sustentculo em anlise se corporifica tambm na

    higidez, ao cumprir os preceitos de ecologicamente

    equilibrado, salvaguardando a vida em todas as suas

    formas (diversidade de espcies).

    Por derradeiro, o quarto pilar a

    corresponsabilidade, que impe ao Poder Pblico o dever

    geral de se responsabilizar por todos os elementos que

    integram o meio ambiente, assim como a condio

    positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

    tem a obrigao de atuar no sentido de zelar, defender e

    preservar, asseverando que o meio-ambiente permanea

    intacto. Alis, este ltimo se diferencia de conservar que

    permite a ao antrpica, viabilizando melhorias no meio

    ambiente, trabalhando com as premissas de

    desenvolvimento sustentvel, aliando progresso e

    conservao. Por seu turno, o cidado tem o dever

    negativo, que se apresenta ao no poluir nem agredir o

    meio-ambiente com sua ao. Alm disso, em razo da

  • 24

    referida corresponsabilidade, so titulares do meio

    ambiente os cidados da presente e da futura gerao.

    3 MEIO AMBIENTE E PATRIMNIO CULTURAL:

    ASPECTOS INTRODUTRIOS

    Em sede de comentrios introdutrios, cuida

    salientar que o meio ambiente cultural constitudo por

    bens culturais, cuja acepo compreende aqueles que

    possuem valor histrico, artstico, paisagstico,

    arqueolgico, espeleolgico, fossilfero, turstico,

    cientfico, refletindo as caractersticas de uma

    determinada sociedade. Ao lado disso, quadra anotar que

    a cultura identifica as sociedades humanas, sendo

    formada pela histria e maciamente influenciada pela

    natureza, como localizao geogrfica e clima. Com

    efeito, o meio ambiente cultural decorre de uma intensa

    interao entre homem e natureza, porquanto aquele

    constri o seu meio, e toda sua atividade e percepo so

    conformadas pela sua cultural. A cultura brasileira o

    resultado daquilo que era prprio das populaes

    tradicionais indgenas e das transformaes trazidas

    pelos diversos grupos colonizadores e escravos

  • 25

    africanos16. Desta maneira, possvel ponderar que a

    proteo do patrimnio cultural se revela como

    instrumento robusto da sobrevivncia da prpria

    sociedade.

    Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente

    cultural, enquanto complexo macrossistema,

    perceptvel que algo incorpreo, abstrato, fludo,

    constitudo por bens culturais materiais e imateriais

    portadores de referncia memria, ao e

    identidade dos distintos grupos formadores da sociedade

    brasileira. Meirelles anota que o conceito de patrimnio

    histrico e artstico nacional abrange todos os bens

    moveis e imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja

    de interesse pblico, por sua vinculao a fatos

    memorveis da Histria ptria ou por seu excepcional

    valor artstico, arqueolgico, etnogrfico, bibliogrfico e

    ambiental17. Quadra anotar que os bens compreendidos

    pelo patrimnio cultural compreendem tanto realizaes

    16 BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do meio

    ambiente cultural: Proteo contra a exportao ilcita dos

    bens culturais. 106f. Dissertao (Mestrado em Direito) Pontifcia Universidade Catlica do Paran, Curitiba, 2006.

    Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015, p.

    15-16. 17 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro,

    38 ed. So Paulo: Editora Malheiros, 2012, p. 634.

  • 26

    antrpicas como obras da Natureza; preciosidades do

    passado e obras contemporneas.

    Nesta esteira, possvel subclassificar o meio

    ambiente cultural em duas espcies distintas, quais

    sejam: uma concreta e outra abstrata. Neste passo, o

    meio-ambiente cultural concreto, tambm denominado

    material, se revela materializado quando est

    transfigurado em um objeto classificado como elemento

    integrante do meio-ambiente humano. Assim, possvel

    citar os prdios, as construes, os monumentos

    arquitetnicos, as estaes, os museus e os parques, que

    albergam em si a qualidade de ponto turstico, artstico,

    paisagstico, arquitetnico ou histrico. Os exemplos

    citados alhures, em razo de todos os predicados que

    ostentam, so denominados de meio-ambiente cultural

    concreto. Acerca do tema em comento, possvel citar o

    robusto entendimento jurisprudencial firmado pelo

    Ministro Ruy Rosado de Aguiar, ao apreciar o Recurso

    Especial N 115.599/RS:

    Ementa: Meio Ambiente. Patrimnio

    cultural. Destruio de dunas em stios

    arqueolgicos. Responsabilidade civil.

    Indenizao. O autor da destruio de dunas

    que encobriam stios arqueolgicos deve

    indenizar pelos prejuzos causados ao meio

    ambiente, especificamente ao meio

  • 27

    ambiente natural (dunas) e ao meio

    ambiente cultural (jazidas arqueolgicas

    com cermica indgena da Fase Vieira).

    Recurso conhecido em parte e provido.

    (Superior Tribunal de Justia Quarta Turma/ REsp 115.599/RS/ Relator: Ministro

    Ruy Rosado de Aguiar/ Julgado em

    27.06.2002/ Publicado no Dirio da Justia

    em 02.09.2002, p. 192).

    Diz-se, de outro modo, o meio-ambiente

    cultural abstrato, chamado, ainda, de imaterial, quando

    este no se apresenta materializado no meio-ambiente

    humano, sendo, deste modo, considerado como a cultura

    de um povo ou mesmo de uma determinada comunidade.

    Da mesma maneira, so alcanados por tal acepo a

    lngua e suas variaes regionais, os costumes, os modos

    e como as pessoas relacionam-se, as produes

    acadmicas, literrias e cientficas, as manifestaes

    decorrentes de cada identidade nacional e/ou regional.

    Neste sentido, possvel colacionar o entendimento

    firmado pelo Tribunal Regional Federal da Segunda

    Regio, quando, ao apreciar a Apelao Cvel N

    2005251015239518, firmou entendimento que expresses

    tradicionais e termos de uso corrente, trivial e

    disseminado, reproduzidos em dicionrios, integram o

    patrimnio cultural de um povo18. Ora, cuida reconhecer

    18 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Segunda Regio.

  • 28

    que esses aspectos constituem, sem distino,

    abstratamente o meio-ambiente cultural. O patrimnio

    cultural imaterial transmite-se de gerao a gerao e

    constantemente recriado pelas comunidades e grupos em

    funo de seu ambiente19, decorrendo, com destaque, da

    interao com a natureza e dos acontecimentos histricos

    que permeiam a populao.

    Acrdo proferido em Apelao Cvel N 2005251015239518. Direito

    da propriedade industrial. Marca fraca e marca de alto renome.

    Anulao de marca. Uso compartilhado de signo mercadolgico

    (MEGA). I Expresses tradicionais e termos de uso corrente, trivial e disseminado, reproduzidos em dicionrios, integram o

    patrimnio cultural de um povo. Palavras dotadas dessas

    caractersticas podem inspirar o registro de marcas, pelas

    peculiaridades de suas expresses eufnicas ou pela sua inegvel

    repercusso associativa no imaginrio do consumidor. II fraca a marca que reproduz a ltima letra do alfabeto grego (Omega),

    utilizado pelo povo helnico desde o sculo VIII a.C., e inserida pelos

    povos eslavos no alfabeto cirlico, utilizado no Imprio Bizantino

    desde o sculo X d.C. O propsito de sua adoo , inegavelmente, o

    de fazer uso da familiaridade do consumidor com o vocbulo de uso

    corrente desde a Antiguidade. III Se uma marca fraca alcanou alto renome, a ela s se pode assegurar proteo limitada, despida do

    jus excludendi de terceiros, que tambm fazem uso do mesmo signo

    merceolgico de boa-f e em atividade distinta. Nessas

    circunstncias, no h a possibilidade de o consumidor incidir erro

    ou, ainda, de se configurar concorrncia desleal. IV Apelao parcialmente provida to-somente para ajustar o plo passivo da

    relao processual, fazendo constar o Instituto Nacional de

    Propriedade Industrial INPI como ru, mantida a improcedncia do pedido de invalidao do registro da marca mista OMEGA (n

    818.522.216), classe 20 (mveis e acessrios de cozinha), formulado

    por mega S.A. rgo Julgador: Segunda Turma Especializada.

    Relator: Desembargador Federal Andr Fontes. Julgado em

    25.08.2007. Disponvel em: . Acesso em 15 ago.

    2015. 19 BROLLO, 2006, p. 33.

  • 29

    O Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200020,

    que institui o registro de bens culturais de natureza

    imaterial que constituem patrimnio cultural brasileiro,

    cria o Programa Nacional do Patrimnio Imaterial e d

    outras providncias, consiste em instrumento efetivo

    para a preservao dos bens imateriais que integram o

    meio-ambiente cultural. Como bem aponta Brollo21, em

    seu magistrio, o aludido decreto no instituiu apenas o

    registro de bens culturais de natureza imaterial que

    integram o patrimnio cultural brasileiro, mas tambm

    estruturou uma poltica de inventariana,

    referenciamento e valorizao desse patrimnio. Ejeta-se,

    segundo o entendimento firmado por Fiorillo22, que os

    bens que constituem o denominado patrimnio cultural

    consistem na materializao da histria de um povo, de

    todo o caminho de sua formao e reafirmao de seus

    valores culturais, os quais tm o condo de

    substancializar a identidade e a cidadania dos indivduos

    insertos em uma determinada comunidade. Ao lado do

    exposto, necessrio se faz salientar que o meio-ambiente

    20 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o

    Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem

    patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do

    Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015. 21 BROLLO, 2006, p. 33. 22 FIORILLO, 2012, p. 80.

  • 30

    cultural, conquanto seja artificial, difere-se do meio-

    ambiente humano em razo do aspecto cultural que o

    caracteriza, sendo dotado de valor especial, notadamente

    em decorrncia de produzir um sentimento de identidade

    no grupo em que se encontra inserido, bem como

    propiciada a constante evoluo fomentada pela ateno

    diversidade e criatividade humana.

    4 PONDERAES PROEMINNCIA DO

    INSTITUTO DO REGISTRO COMO MECANISMO

    DE PRESERVAO DOS BENS CULTURAIS

    IMATERIAIS

    Cuida anotar que o registro do bem cultural de

    natureza imaterial, para ser considerado vlido e

    legtimo, reclama harmonia com o ordenamento jurdico

    vigente. Com efeito, o Texto Constitucional consagra em

    seu bojo a definio acercam de quais bens constituem o

    patrimnio cultural brasileiro, estabelecendo, por via de

    consequncia, as normas de proteo a esse patrimnio,

    consoante afixa a redao do artigo 21623. verificvel

    23 BRASIL. Constituio (1988). Constituio da) Repblica Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel em: . Acesso em 19 jul. 2013: Art. 216. Constituem patrimnio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em

  • 31

    que o dispositivo em comento faz expressa referncia aos

    bens portadores de identidade, ao e memria dos

    diferentes grupos da sociedade brasileira. Desta feita,

    possvel salientar, oportunamente, que a Carta de

    Outubro de 1988 no estrutura a sociedade brasileira

    como um todo homogneo, mas como uma sociedade

    multifacetada, constituda por diferentes grupos, cada

    um portador de identidades e de modos de criar, fazer e

    viver especficos.

    Com efeito, o posicionamento dotado de

    proeminncia na medida em que o Texto Constitucional,

    com clareza solar, sublinha que o seu interesse no est

    centrado apenas em proteger objetos materiais que

    gozem valor acadmico, mas tambm os bens de natureza

    material ou imaterial portadores de referncia

    identidade de cada grupo formador da sociedade

    brasileira. Ora, cada um dos diversos grupos, assim como

    seus modos de fazer, criar e viver, objetivo de proteo

    conferida pelo Ente Estatal. Ao lado disso, a Carta de

    1988 apresenta caracterstico forte os ideais republicanos

    conjunto, portadores de referncia identidade, ao, memria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expresso; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criaes cientficas, artsticas e tecnolgicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificaes e demais espaos destinados s manifestaes artstico-culturais; V - os conjuntos urbanos e stios de valor histrico, paisagstico, artstico, arqueolgico, paleontolgico, ecolgico e cientfico.

  • 32

    e democrticos, refletindo em toda s as matrias nela

    versadas esses corolrios, at mesmo porque estrutura -

    se como escopo fundamental entalhado na Constituio o

    de edificar uma sociedade livre, justa e solidria. Desta

    feita, a concepo em testilha informa a maneira por

    meio da qual o Estado deve proteger e promover a

    cultura. Ademais, ao tratar da poltica cultural e da

    democracia cultural, Jos Afonso da Silva assinala:

    A questo da poltica cultural est

    exatamente no equilbrio que se h de

    perseguir entre um Estado que imponha

    um a cultura oficial e a democracia

    cultural. A concepo de um Estado

    Cultural no sentido de um Estado que

    sustente uma cultura oficial no atende,

    certamente, a uma concepo de

    democracia cultural. A Constituio, como

    j deixamos expresso antes, no deixa

    dvidas sobre o tema, visto que garante a

    liberdade de criao, de expresso e de

    acesso s fontes da cultura nacional. Isso

    significa que no pode haver cultura

    imposta, que o papel do Poder Pblico

    deve ser o de favorecer a livre procura das

    manifestaes culturais, criar condies de

    acesso popular cultura, prover meios

    para que a difuso cultural se funda nos

    critrios de igualdade. A democracia

    cultural pode-se apresentar sob trs

    aspectos: por um lado, no tolher a

    liberdade de criao, expresso e de

    acesso cultura, por qualquer forma de

    constrangimento ou de restrio oficial;

    antes, criar, condies para a efetivao

    dessa liberdade num clima de igualdade;

  • 33

    por outro lado, favorecer o acesso

    cultura e o gozo dos bens culturais

    massa da populao excluda24.

    Nesta linha, ainda, cuida mencionar que a ao

    cultural pblica se apresenta como absolutamente

    imprescindvel democratizao da cultura, sendo

    considerada como o procedimento que propiciai a

    convergncia e o alargamento do pblico, tal como a

    extenso do fenmeno de comunicao artstico,

    consoante o iderio de que a poltica cultural ,

    juntamente com a poltica social, um dos modos

    utilizados pelo Estado contemporneo para assegurar sua

    legitimao, ou seja, para oferecer como um Estado que

    vela por todos e que vale para todos. Ao lado disso, em

    razo da proteo cultural se fazer conjuntamente com o

    Estado e a sociedade, pode-se destacar que o Texto

    Constitucional afixou que o Poder Pblico, com a

    colaborao da comunidade, promover e proteger o

    patrimnio cultural brasileiro, lanando mo, para

    tanto, de inventrios, registros e tombamentos, alm

    de outras formas de acautelamento e preservao.

    Infere-se que, dentre os instrumentos

    previstos para se proteger os bens culturais brasileiros,

    24 SILVA, Jos Afonso da. Ordenao Constitucional da Cultura. So Paulo: Malheiros Editores, 1998, p. 209-210.

  • 34

    encontra -se o instituto do registro, cuja regulamentao se

    d pelo Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200025,

    que institui o Registro de Bens Culturais de Natureza

    Imaterial que constituem o patrimnio cultural

    brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimnio

    Imaterial e d outras providncias. Imperioso se faz

    assinalar que a criao do instituto do registro est

    vinculada a di versos movimentos em defesa de uma

    compreenso mais ampla no que se refere ao

    patrimnio cultural brasileiro. No Brasil, a publicao

    do Decreto 3.551/2000, insere-se numa trajetria a que

    se vinculam as figuras emblemticas de Mrio de

    Andrade e de Alosio Magalhes, mas em que se incluem

    tambm as sociedades de folcloristas, os movimentos

    negros e de defesa dos direitos indgenas26, como bem

    observa Maria Ceclia Londres Fonseca. Igualmente,

    o instituto em comento reflete as rei vindicaes dos

    grupos de descendentes de imigrantes das mais

    diversas procedncias, alcanando, desta maneira, os

    25 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o

    Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem

    patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do

    Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015. 26 FONSECA, Maria Ceclia Londres. Para alm da pedra e cal: por uma concepo ampla do patrimnio cultural in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.). Memria e patrimnio: ensaios contemporneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 62.

  • 35

    excludos do cenrio do patrimnio cultural brasileiro,

    estruturada a partir de 1937.

    Nesta esteira, evidencia-se que o registro tem

    por finalidade reconhecer e valorizar bens da natureza

    imaterial em seu processo dinmico de evoluo,

    viabilizando uma apreenso do contexto pretrito e

    presente dessas manifestaes em suas distintas

    verses. Mrcia SantA nna, ao discorrer acerca do

    instituto em comento, coloca em realce que no um

    instrumento de tutela e acautelamento anlogo ao

    tombamento, mas um recurso de reconhecimento e

    valorizao do patrimnio imaterial, que pode tambm

    ser complementar a este27. Ora, neste cenrio, o registro

    corresponde identificao e produo do

    conhecimento acerca do bem cultural de natureza

    imaterial, equivalendo a documentar, pelos meios

    tcnicos mais adequados, o passado e o presente dessas

    manifestaes, em suas plurais facetas, possibilitando,

    a partir de uma fluidez das relaes, o amplo acesso ao

    pblico. Nesta perspectiva, o escopo manter o registro

    da memria dos bens culturais e de sua trajetria no

    27 SANTANNA, Mrcia. A face imaterial do patrimnio cultural: os novos instrumentos de reconhecimento e valorizao in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.). Memria e patrimnio: ensaios contemporneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 52.

  • 36

    tempo, eis que este o mecanismo apto a assegurar a

    sua preservao.

    Em razo da dinamicidade dos processos

    culturais dinmicos, as mencionadas manifestaes

    desbordam em uma concepo de preservao di versa

    daquela da prtica ocidental, no podendo ser alicerada

    em seus conceitos de permanncia e autenticidade. Os

    bens culturais de natureza imaterial, a partir do

    esposado, so emoldurados por uma dinmica de

    desenvolvimento e transformao que no pode ser

    engessado nesses conceitos, sendo mais importante,

    nas situaes concretas, o registro e a documentao do

    que interveno, restaurao e conservao. Acrescente-

    se, ainda, que os bens escolhidos para registro sero

    inscritos em livros denominados: (i) Livro de registros

    dos saberes, no qual sero registrados os conhecimentos

    e modo de fazer; (ii) Livro das formas de expresso, o

    qual conter as manifestaes literrias, musicais,

    plsticas, cnicas e ldicas; (iii) Livro dos lugares, no

    qual se inscrever as manifestaes de espaos em que

    se concentram ou mesmo reproduzem prticas

    culturais coletivas; e, (iv) Livro das celebraes, no

    qual sero lavradas as festas, rituais e folguedos,

    consoante afixa o Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto

  • 37

    de 200028.

    5 TESSITURAS AO PROGRAMA NACIONAL DO

    PATRIMNIO IMATERIAL (PNPI): BREVES

    EXPLICITAES

    Em sede de apresentao, O Programa

    Nacional do Patrimnio Imaterial (PNPI), institudo

    pelo Decreto N. 3.551, de 04 de Agosto de 200029, que

    institui o Registro de Bens Culturais de Natureza

    Imaterial que constituem o patrimnio cultural

    brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimnio

    Imaterial e d outras providncias, viabiliza projetos de

    identificao, reconhecimento, salvaguarda e promoo

    da dimenso imaterial do patrimnio cultural, com

    respeito e proteo dos direitos difusos ou coletivos

    relativos preservao e ao uso desse patrimnio. um

    programa de apoio e fomento que busca estabelecer

    parcerias com instituies dos governos federal,

    estaduais e municipais, universidades, organizaes no

    28 BRASIL. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de 2000. Institui o

    Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem

    patrimnio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do

    Patrimnio Imaterial e d outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015. 29 Ibid.

  • 38

    governamentais, agncias de desenvolvimento e

    organizaes privadas ligadas cultura e pesquisa.

    Entre as atribuies do PNPI, est a

    elaborao de indicadores para acompanhamento e

    avaliao de aes de valorizao e salvaguarda do

    patrimnio cultural imaterial. Ao lado disso, cuida

    apontar que o Programa foi criado para implementar a

    poltica de inventrio, registro e salvaguarda de bens

    culturais de natureza imaterial, e contribuir com a

    preservao da diversidade tnica e cultural do pas e

    disseminao de informaes sobre o Patrimnio

    Cultural Brasileiro a todos os segmentos da sociedade.

    Outros objetivos so a captao de recursos e promoo

    da formao de uma rede de parceiros para preservao,

    valorizao e ampliao dos bens que compem o

    patrimnio cultural brasileiro, alm do incentivo e apoio

    s iniciativas e prticas de preservao desenvolvidas

    pela sociedade.

    Nas diretrizes da poltica de apoio e fomento

    do PNPI esto previstas a promoo da incluso social e

    a melhoria das condies de vida de produtores e

    detentores do patrimnio cultural imaterial, e medidas

    que ampliem a participao dos grupos que produzem,

    transmitem e atualizam manifestaes culturais de

  • 39

    natureza imaterial nos projetos de preservao e

    valorizao desse patrimnio. Nesta esteira de exposio,

    a promoo da salvaguarda de bens culturais imateriais

    deve ocorrer por meio do apoio s condies materiais

    que propiciam a existncia desses bens e pela ampliao

    do acesso aos benefcios gerados por essa preservao, e

    com a criao de mecanismos de proteo efetiva dos

    bens culturais imateriais em situao de risco.

    REFERNCIA:

    BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito

    Constitucional. 21 ed. atual. So Paulo: Editora

    Malheiros Ltda., 2007.

    BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da)

    Repblica Federativa do Brasil. Braslia: Senado

    Federal, 1988. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

    ___________. Decreto N 3.551, de 04 de Agosto de

    2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza

    Imaterial que constituem patrimnio cultural brasileiro,

    cria o Programa Nacional do Patrimnio Imaterial e d

    outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

    ___________. Instituto do Patrimnio Histrico e

    Artstico Nacional. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

  • 40

    ___________. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.

    Dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus

    fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d outras

    providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

    ___________. Superior Tribunal de Justia.

    Disponvel em: . Acesso em 15 ago.

    2015.

    ___________. Supremo Tribunal Federal. Disponvel

    em: . Acesso em 15 ago. 2015.

    ___________. Tribunal Regional Federal da Segunda

    Regio. Disponvel em: . Acesso em 15

    ago. 2015.

    BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna

    classificao do meio-ambiente, o seu remodelamento e a

    problemtica sobre a existncia ou a inexistncia das

    classes do meio-ambiente do trabalho e do meio-ambiente

    misto. Boletim Jurdico, Uberaba, ano 5, n. 968.

    Disponvel em: .

    Acesso em 15 ago. 2015.

    BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do

    meio ambiente cultural: Proteo contra a

    exportao ilcita dos bens culturais. 106f.

    Dissertao (Mestrado em Direito) Pontifcia Universidade Catlica do Paran, Curitiba, 2006.

    Disponvel em:

    . Acesso

    em 15 ago. 2015

    FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de Direito

  • 41

    Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. So

    Paulo: Editora Saraiva, 2012.

    FONSECA, Maria Ceclia Londres. Para alm da pedra

    e cal: por uma concepo ampla do patrimnio cultural

    in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.). Memria

    e patrimnio: ensaios contemporneos. Rio de

    Janeiro: DP&A, 2003.

    MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo

    Brasileiro. 38 ed. So Paulo: Editora Malheiros, 2012.

    MINAS GERAIS (ESTADO). Tribunal de Justia do

    Estado de Minas Gerais. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

    MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito

    Constitucional Teoria, Jurisprudncia e 1.000 Questes 15 ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro:

    Editora Impetus, 2004.

    RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Tribunal de

    Justia do Estado do Rio Grande do Sul. Disponvel

    em: . Acesso em 15 ago. 2015.

    SANTANNA, Mrcia. A face imaterial do patrimnio cultural: os novos instrumentos de reconhecimento e

    valorizao in: ABREU, Regina; CHAGAS, Mrio (orgs.).

    Memria e patrimnio: ensaios contemporneos.

    Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

    SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental

    Constitucional. So Paulo: Malheiros Editores, 2009.

    ___________. Ordenao Constitucional da Cultura.

    So Paulo: Malheiros Editores, 1998.

  • 42

    THOM, Romeu. Manual de Direito Ambiental:

    Conforme o Novo Cdigo Florestal e a Lei

    Complementar 140/2011. 2 ed. Salvador: Editora

    JusPodivm, 2012.

    VERDAN, Tau Lima. Princpio da Legalidade: Corolrio

    do Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas,

    Bauru, 22 jun. 2009. Disponvel em:

    . Acesso em 15 ago. 2015.

  • 43

    O SISTEMA NACIONAL DE INFORMAES E

    INDICADORES CULTURAIS (SNIIC) EM EXAME:

    SINGELAS PONDERAES LEI N 12.343/2010

    Resumo: O objetivo do presente est assentado na

    anlise do Sistema Nacional de Informaes e

    Indicadores Culturais (SNIIC), institudo pela Lei

    n 12.343, de 02 de dezembro de 2010. Cuida

    salientar que o meio ambiente cultural

    constitudo por bens culturais, cuja acepo

    compreende aqueles que possuem valor histrico,

    artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,

    fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as

    caractersticas de uma determinada sociedade. Ao

    lado disso, quadra anotar que a cultura identifica

    as sociedades humanas, sendo formada pela

    histria e maciamente influenciada pela natureza,

    como localizao geogrfica e clima. Com efeito, o

    meio ambiente cultural decorre de uma intensa

    interao entre homem e natureza, porquanto

    aquele constri o seu meio, e toda sua atividade e

    percepo so conformadas pela sua cultural. A

    cultura brasileira o resultado daquilo que era

    prprio das populaes tradicionais indgenas e das

    transformaes trazidas pelos diversos grupos

  • 44

    colonizadores e escravos africanos. Nesta toada, ao

    se analisar o meio ambiente cultural, enquanto

    complexo macrossistema, perceptvel que algo

    incorpreo, abstrato, fludo, constitudo por bens

    culturais materiais e imateriais portadores de

    referncia memria, ao e identidade dos

    distintos grupos formadores da sociedade

    brasileira. O conceito de patrimnio histrico e

    artstico nacional abrange todos os bens moveis e

    imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja

    de interesse pblico, por sua vinculao a fatos

    memorveis da Histria ptria ou por seu

    excepcional valor artstico, arqueolgico,

    etnogrfico, bibliogrfico e ambiental.

    Palavras-chaves: Patrimnio Cultural. Sistema

    Nacional de Informaes e Indicadores Culturais.

    Tutela Jurdica.

    Sumrio: 1 Ponderaes Introdutrias: Breves

    notas construo terica da Ramificao

    Ambiental do Direito; 2 Comentrios concepo

    de Meio Ambiente; 3 Meio Ambiente e Patrimnio

    Cultural: Aspectos Introdutrios; 4 O Sistema

    Nacional de Informaes e Indicadores Culturais

    (SNIIC) em exame: Singelas Ponderaes Lei n

    12.343/2010

  • 45

    1 PONDERAES INTRODUTRIAS: BREVES

    NOTAS CONSTRUO TERICA DA

    RAMIFICAO AMBIENTAL DO DIREITO

    Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

    do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

    Cincia Jurdica, enquanto um conjunto multifacetado de

    arcabouo doutrinrio e tcnico, assim como as robustas

    ramificaes que a integram, reclama uma interpretao

    alicerada nos plurais aspectos modificadores que

    passaram a influir em sua estruturao. Neste alamir,

    lanando tona os aspectos caractersticos de

    mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

    se imperioso salientar, com nfase, que no mais subsiste

    uma viso arrimada em preceitos estagnados e

    estanques, alheios s necessidades e s diversidades

    sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

    Jurdicos. Ora, infere-se que no mais prospera o

    arcabouo imutvel que outrora sedimentava a aplicao

    das leis, sendo, em decorrncia dos anseios da populao,

    suplantados em uma nova sistemtica.

    Com espeque em tais premissas, cuida

    hastear, com bastante pertinncia, como flmula de

    interpretao o prisma de avaliao o brocardo jurdico

  • 46

    'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde est a sociedade, est

    o Direito', tornando explcita e cristalina a relao de

    interdependncia que esse binmio mantm30. Destarte,

    com clareza solar, denota-se que h uma interao

    consolidada na mtua dependncia, j que o primeiro

    tem suas balizas fincadas no constante processo de

    evoluo da sociedade, com o fito de que seus Diplomas

    Legislativos e institutos no fiquem inquinados de

    inaptido e arcasmo, em total descompasso com a

    realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

    estrutural dependncia das regras consolidadas pelo

    Ordenamento Ptrio, cujo escopo primevo assegurar

    que no haja uma vingana privada, afastando, por

    extenso, qualquer rano que rememore priscas eras em

    que o homem valorizava a Lei de Talio (Olho por olho,

    dente por dente), bem como para evitar que se robustea

    um cenrio catico no seio da coletividade.

    Ademais, com a promulgao da Constituio

    da Repblica Federativa do Brasil de 1988,

    imprescindvel se fez adot-la como macio axioma de

    sustentao do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

    30 VERDAN, Tau Lima. Princpio da Legalidade: Corolrio do

    Direito Penal. Jurid Publicaes Eletrnicas, Bauru, 22 jun.

    2009. Disponvel em: . Acesso em 13

    mar. 2015, s.p.

  • 47

    quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genrico

    e abstrato, aos complexos anseios e mltiplas

    necessidades que influenciam a realidade

    contempornea. Ao lado disso, h que se citar o voto

    magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

    apreciar a Ao de Descumprimento de Preceito

    Fundamental N. 46/DF, o direito um organismo vivo,

    peculiar porm porque no envelhece, nem permanece

    jovem, pois contemporneo realidade. O direito um

    dinamismo. Essa, a sua fora, o seu fascnio, a sua

    beleza31. Como bem pontuado, o fascnio da Cincia

    Jurdica jaz, justamente, na constante e imprescindvel

    mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

    que reverbera na sociedade e orienta a aplicao dos

    31 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo em Arguio de

    Descumprimento de Preceito Fundamental N. 46/DF. Empresa

    Pblica de Correios e Telgrafos. Privilgio de Entrega de

    Correspondncias. Servio Postal. Controvrsia referente Lei

    Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

    direitos e obrigaes concernentes ao Servio Postal. Previso de

    Sanes nas Hipteses de Violao do Privilgio Postal.

    Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegao de

    afronta ao disposto nos artigos 1, inciso IV; 5, inciso XIII, 170,

    caput, inciso IV e pargrafo nico, e 173 da Constituio do Brasil.

    Violao dos Princpios da Livre Concorrncia e Livre Iniciativa. No

    Caracterizao. Arguio Julgada Improcedente. Interpretao

    conforme Constituio conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

    estabelece sano, se configurada a violao do privilgio postal da

    Unio. Aplicao s atividades postais descritas no artigo 9, da lei.

    rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurlio.

    Julgado em 05 ag. 2009. Disponvel em: . Acesso em

    13 mar. 2015.

  • 48

    Diplomas Legais e os institutos jurdicos neles

    consagrados.

    Ainda neste substrato de exposio, pode-se

    evidenciar que a concepo ps-positivista que passou a

    permear o Direito, ofertou, por via de consequncia, uma

    rotunda independncia dos estudiosos e profissionais da

    Cincia Jurdica. Alis, h que se citar o entendimento

    de Verdan, esta doutrina o ponto culminante de uma

    progressiva evoluo acerca do valor atribudo aos

    princpios em face da legislao32. Destarte, a partir de

    uma anlise profunda dos mencionados sustentculos,

    infere-se que o ponto central da corrente ps-positivista

    cinge-se valorao da robusta tbua principiolgica que

    Direito e, por conseguinte, o arcabouo normativo

    passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

    vinculante, flmulas hasteadas a serem adotadas na

    aplicao e interpretao do contedo das leis, diante das

    situaes concretas.

    Nas ltimas dcadas, o aspecto de

    mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

    quando se analisa a construo de novos que derivam da

    Cincia Jurdica. Entre estes, cuida destacar a

    ramificao ambiental, considerando como um ponto de

    32 VERDAN, 2009, s.p.

  • 49

    congruncia da formao de novos iderios e cnones,

    motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

    novos valores adotados. Nesta trilha de argumentao,

    de boa tcnica se apresenta os ensinamentos de

    Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

    aduz: Com a intensificao, entretanto, do interesse dos

    estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar

    as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito

    mais ligadas s cincias biolgicas, at ento era

    marginalizadas33. Assim, em decorrncia da

    proeminncia que os temas ambientais vm, de maneira

    paulatina, alcanando, notadamente a partir das ltimas

    discusses internacionais envolvendo a necessidade de

    um desenvolvimento econmico pautado em

    sustentabilidade, no raro que prospere, mormente em

    razo de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

    mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

    ramificao ambiental do Direito, com o fito de permitir

    que ocorra a conservao e recuperao das reas

    degradadas, primacialmente as culturais.

    33 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificao do

    meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemtica sobre a

    existncia ou a inexistncia das classes do meio-ambiente do

    trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurdico, Uberaba,

    ano 5, n. 968. Disponvel em: .

    Acesso em 13 mar. 2015.

  • 50

    Ademais, h de ressaltar ainda que o direito

    ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

    dcadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

    farta e slida tbua de direitos fundamentais. Calha

    realar que mais contemporneos, os direitos que

    constituem a terceira dimenso recebem a alcunha de

    direitos de fraternidade ou, ainda, de solidariedade,

    contemplando, em sua estrutura, uma patente

    preocupao com o destino da humanidade34. Ora, da se

    verifica a incluso de meio ambiente como um direito

    fundamental, logo, est umbilicalmente atrelado com

    humanismo e, por extenso, a um ideal de sociedade

    mais justa e solidria. Nesse sentido, ainda, plausvel

    citar o artigo 3., inciso I, da Carta Poltica de 1988 que

    abriga em sua redao tais pressupostos como os

    princpios fundamentais do Estado Democrtico de

    Direitos: Art. 3 - Constituem objetivos fundamentais da

    Repblica Federativa do Brasil: I - construir uma

    sociedade livre, justa e solidria35.

    Ainda nesta esteira, possvel verificar que a

    34 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional Teoria, Jurisprudncia e 1.000 Questes 15 ed., rev., ampl. e

    atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 35 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica

    Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel

    em: . Acesso em 13 mar. 2015.

  • 51

    construo dos direitos encampados sob a rubrica de

    terceira dimenso tende a identificar a existncia de

    valores concernentes a uma determinada categoria de

    pessoas, consideradas enquanto unidade, no mais

    prosperando a tpica fragmentao individual de seus

    componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

    momento pretrito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

    pertinente as ponderaes vertidas, insta trazer colao

    o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N. 1.856/RJ, em

    especial quando destaca:

    Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

    direitos de terceira gerao (ou de

    novssima dimenso), que materializam

    poderes de titularidade coletiva atribudos,

    genericamente, e de modo difuso, a todos os

    integrantes dos agrupamentos sociais,

    consagram o princpio da solidariedade e

    constituem, por isso mesmo, ao lado dos

    denominados direitos de quarta gerao

    (como o direito ao desenvolvimento e o

    direito paz), um momento importante no

    processo de expanso e reconhecimento dos

    direitos humanos, qualificados estes,

    enquanto valores fundamentais

    indisponveis, como prerrogativas

    impregnadas de uma natureza

    essencialmente inexaurvel36.

    36 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De

    Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -

    Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies

  • 52

    Quadra anotar que os direitos alocados sob a

    rubrica de direito de terceira dimenso encontram como

    assento primordial a viso da espcie humana na

    condio de coletividade, superando, via de consequncia,

    a tradicional viso que est pautada no ser humano em

    sua individualidade. Assim, a preocupao identificada

    est alicerada em direitos que so coletivos, cujas

    influncias afetam a todos, de maneira indiscriminada.

    Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

    que tais direitos tm primeiro por destinatrios o gnero

    humano mesmo, num momento expressivo de sua

    afirmao como valor supremo em termos de

    existencialidade concreta37. Com efeito, os direitos de

    terceira dimenso, dentre os quais se inclui ao meio

    entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -

    Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

    crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,

    ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade

    (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de

    metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima

    dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo

    constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao

    da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da

    inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta

    procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de

    exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma

    que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

    Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:

    . Acesso em 13 mar. 2015. 37 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

    atual. So Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

  • 53

    ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

    Constituio de 1988, emerge com um claro e tangvel

    aspecto de familiaridade, como pice da evoluo e

    concretizao dos direitos fundamentais.

    2 COMENTRIOS CONCEPO DE MEIO

    AMBIENTE

    Em uma primeira plana, ao lanar mo do

    sedimentado jurdico-doutrinrio apresentado pelo inciso

    I do artigo 3 da Lei N. 6.938, de 31 de agosto de 198138,

    que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente,

    seus fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d

    outras providncias, salienta que o meio ambiente

    consiste no conjunto e conjunto de condies, leis e

    influncias de ordem qumica, fsica e biolgica que

    permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

    Pois bem, com o escopo de promover uma facilitao do

    aspecto conceitual apresentado, possvel verificar que o

    meio ambiente se assenta em um complexo dilogo de

    fatores abiticos, provenientes de ordem qumica e fsica,

    38 BRASIL. Lei N. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispe sobre a

    Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

    formulao e aplicao, e d outras providncias. Disponvel em:

    . Acesso em 13 mar. 2015.

  • 54

    e biticos, consistentes nas plurais e diversificadas

    formas de seres viventes. Consoante os ensinamentos

    apresentados por Jos Afonso da Silva, considera-se

    meio-ambiente como a interao do conjunto de

    elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o

    desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

    formas39.

    Nesta senda, ainda, Fiorillo40, ao tecer

    comentrios acerca da acepo conceitual de meio

    ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

    um iderio jurdico indeterminado, incumbindo, ao

    intrprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

    fluidez do tema, possvel colocar em evidncia que o

    meio ambiente encontra ntima e umbilical relao com

    os componentes que cercam o ser humano, os quais so

    de imprescindvel relevncia para a sua existncia. O

    Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ao Direta de

    Inconstitucionalidade N. 4.029/AM, salientou, com

    bastante pertinncia, que:

    (...) o meio ambiente um conceito hoje

    geminado com o de sade pblica, sade de

    39 SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. So

    Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.20. 40 FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de Direito

    Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. So Paulo:

    Editora Saraiva, 2012, p. 77.

  • 55

    cada indivduo, sadia qualidade de vida, diz

    a Constituio, por isso que estou falando

    de sade, e hoje todos ns sabemos que ele

    imbricado, conceitualmente geminado com

    o prprio desenvolvimento. Se antes ns

    dizamos que o meio ambiente compatvel

    com o desenvolvimento, hoje ns dizemos, a

    partir da Constituio, tecnicamente, que

    no pode haver desenvolvimento seno com

    o meio ambiente ecologicamente

    equilibrado. A geminao do conceito me

    parece de rigor tcnico, porque salta da

    prpria Constituio Federal41.

    denotvel, desta sorte, que a

    constitucionalizao do meio ambiente no Brasil

    viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

    concerne, especificamente, s normas de proteo

    ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

    corolrios e princpios norteadores foram alados ao

    patamar constitucional, assumindo colocao eminente,

    ao lado das liberdades pblicas e dos direitos

    41 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N 4.029/AM. Ao Direta de

    Inconstitucionalidade. Lei Federal N 11.516/07. Criao do Instituto

    Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade. Legitimidade da

    Associao Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

    de mbito Nacional. Violao do art. 62, caput e 9, da

    Constituio. No emisso de parecer pela Comisso Mista

    Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5, caput, e 6, caput

    e pargrafos 1 e 2, da Resoluo N 1 de 2002 do Congresso

    Nacional. Modulao dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

    Lei 9.868/99). Ao Direta Parcialmente Procedente. rgo

    Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

    mar. 2012. Disponvel em: . Acesso em 13 mar.

    2015.

  • 56

    fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

    Constituinte, ao entalhar a Carta Poltica Brasileira,

    ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

    dimenso, insculpir na redao do artigo 225, conceder

    amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

    integrante dos direitos fundamentais. Com o advento da

    Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988,

    as normas de proteo ambiental so aladas categoria

    de normas constitucionais, com elaborao de captulo

    especialmente dedicado proteo do meio ambiente42.

    Nesta toada, ainda, observvel que o caput do artigo

    225 da Constituio Federal de 198843 est abalizado em

    quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em

    conjunto, do corpo a toda tbua ideolgica e terica que

    assegura o substrato de edificao da ramificao

    ambiental.

    Primeiramente, em decorrncia do tratamento

    dispensado pelo artfice da Constituio Federal, o meio

    42 THOM, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

    Novo Cdigo Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

    Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 43 BRASIL. Constituio (1988). Constituio (da) Repblica

    Federativa do Brasil. Braslia: Senado Federal, 1988. Disponvel

    em: . Acesso em 13 mar. 2015: Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

    bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida,

    impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e

    preserv-lo para as presentes e futuras geraes.

  • 57

    ambiente foi iado condio de direito de todos,

    presentes e futuras geraes. encarado como algo

    pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

    no se admite o emprego de qualquer distino entre

    brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

    se, sim, a necessidade de preservao, conservao e no-

    poluio. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

    que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

    Brasileiro, no ficando centrado, apenas, na extenso

    nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

    sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ao

    Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ, destacou

    que:

    A preocupao com o meio ambiente - que

    hoje transcende o plano das presentes

    geraes, para tambm atuar em favor das

    geraes futuras (...) tem constitudo, por

    isso mesmo, objeto de regulaes

    normativas e de proclamaes jurdicas,

    que, ultrapassando a provncia meramente

    domstica do direito nacional de cada

    Estado soberano, projetam-se no plano das

    declaraes internacionais, que refletem, em

    sua expresso concreta, o compromisso das

    Naes com o indeclinvel respeito a esse

    direito fundamental que assiste a toda a

    Humanidade44.

    44 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acrdo proferido em

    Ao Direta de Inconstitucionalidade N 1.856/RJ. Ao Direta De

    Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense N 2.895/98) -

  • 58

    O termo todos, aludido na redao do caput

    do artigo 225 da Constituio Federal de 1988, faz

    meno aos j nascidos (presente gerao) e ainda

    aqueles que esto por nascer (futura gerao), cabendo

    queles zelar para que esses tenham sua disposio, no

    mnimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

    encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

    gnero humano o direito fundamental liberdade,

    igualdade e ao gozo de condies de vida adequada, em

    ambiente que permita desenvolver todas as suas

    potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

    Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

    seja, ultrapassa as geraes, logo, vivel afirmar que o

    meio-ambiente um direito pblico subjetivo. Desta

    Legislao Estadual que, pertinente a exposies e a competies

    entre aves das raas combatentes, favorece essa prtica criminosa -

    Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

    crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei N 9.605/98,

    ART. 32) - Meio Ambiente - Direito preservao de sua integridade

    (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu carter de

    metaindividualidade - Direito de terceira gerao (ou de novssima

    dimenso) que consagra o postulado da solidariedade - Proteo

    constitucional da fauna (CF, Art. 225, 1, VII) - Descaracterizao

    da briga de galo como manifestao cultural - Reconhecimento da

    inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ao Direta

    procedente. Legislao Estadual que autoriza a realizao de

    exposies e competies entre aves das raas combatentes - Norma

    que institucionaliza a prtica de crueldade contra a fauna Inconstitucionalidade. . rgo Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

    Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponvel em:

    . Acesso em 13 mar. 2015.

  • 59

    feita, o iderio de que o meio ambiente substancializa

    patrimnio pblico a ser imperiosamente assegurado e

    protegido pelos organismos sociais e pelas instituies

    estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenuncivel

    que se impe, objetivando sempre o benefcio das

    presentes e das futuras geraes, incumbindo tanto ao

    Poder Pblico quanto coletividade considerada em si

    mesma.

    Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

    erga omnes, sendo, portanto, oponvel contra a todos,

    incluindo pessoa fsica/natural ou jurdica, de direito

    pblico interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

    como tambm ente estatal, autarquia, fundao ou

    sociedade de economia mista. Impera, tambm,

    evidenciar que, como um direito difuso, no subiste a

    possibilidade de quantificar quantas so as pessoas

    atingidas, pois a poluio no afeta to s a populao

    local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade

    indeterminada. Nesta senda, o direito integridade do

    meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

    jurdica de titularidade coletiva, ressoando a expresso

    robusta de um poder deferido, no ao indivduo

    identificado em sua singularidade, mas num sentido

    mais amplo, atribudo prpria coletividade social.

  • 60

    Com a nova sistemtica entabulada pela

    redao do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

    passou a ter autonomia, tal seja no est vinculada a

    leses perpetradas contra o ser humano para se

    agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

    relao ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

    uso comum do povo o segundo pilar que d corpo aos

    sustentculos do tema em tela. O axioma a ser

    esmiuado, est atrelado o meio-ambiente como vetor da

    sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

    salubridade, precipuamente, ao vincular a espcie

    humana est se tratando do bem-estar e condies

    mnimas de existncia. Igualmente, o sustentculo em

    anlise se corporifica tambm na higidez, ao cumprir os

    preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

    a vida em todas as suas formas (diversidade de espcies).

    Por derradeiro, o quarto pilar a

    corresponsabilidade, que impe ao Poder Pblico o dever

    geral de se responsabilizar por todos os elementos que

    integram o meio ambiente, assim como a condio

    positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

    tem a obrigao de atuar no sentido de zelar, defender e

    preservar, asseverando que o meio-ambiente permanea

    intacto. Alis, este ltimo se diferencia de conservar que

  • 61

    permite a ao antrpica, viabilizando melhorias no meio

    ambiente, trabalhando com as premissas de

    desenvolvimento sustentvel, aliando progresso e

    conservao. Por seu turno, o cidado tem o dever

    negativo, que se apresenta ao no poluir nem agredir o

    meio-ambiente com sua ao. Alm disso, em razo da

    referida corresponsabilidade, so titulares do meio

    ambiente os cidados da presente e da futura gerao.

    3 MEIO AMBIENTE E PATRIMNIO CULTURAL:

    ASPECTOS INTRODUTRIOS

    Quadra salientar que o meio ambiente cultural

    constitudo por bens culturais, cuja acepo

    compreende aqueles que possuem valor histrico,

    artstico, paisagstico, arqueolgico, espeleolgico,

    fossilfero, turstico, cientfico, refletindo as

    caractersticas de uma determinada sociedade. Ao lado

    disso, quadra anotar que a cultura identifica as

    sociedades humanas, sendo formada pela histria e

    maciamente influenciada pela natureza, como

    localizao geogrfica e clima. Com efeito, o meio

    ambiente cultural decorre de uma intensa interao

    entre homem e natureza, porquanto aquele constri o seu

  • 62

    meio, e toda sua atividade e percepo so conformadas

    pela sua cultural. A cultura brasileira o resultado

    daquilo que era prprio das populaes tradicionais

    indgenas e das transformaes trazidas pelos diversos

    grupos colonizadores e escravos africanos45. Desta

    maneira, a proteo do patrimnio cultural se revela

    como instrumento robusto da sobrevivncia da prpria

    sociedade.

    Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente

    cultural, enquanto complexo macrossistema,

    perceptvel que algo incorpreo, abstrato, fludo,

    constitudo por bens culturais materiais e imateriais

    portadores de referncia memria, ao e

    identidade dos distintos grupos formadores da sociedade

    brasileira. Meirelles anota que o conceito de patrimnio

    histrico e artstico nacional abrange todos os bens

    moveis e imveis, existentes no Pas, cuja conservao seja

    de interesse pblico, por sua vinculao a fatos

    memorveis da Histria ptria ou por seu excepcional

    45 BROLLO, Slvia Regina Salau. Tutela Jurdica do meio

    ambiente cultural: Proteo contra a exportao ilcita dos

    bens culturais. 106f. Dissertao (M