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CORANTES NATURAIS EM ALIMENTOS: ÊNFASE NO USO DO
URUCUM
Abel Rebouças São José1; Tiyoko Nair Hojo Rebouças1; Mônica de Moura Pires2; Marinês Pereira Bonfim3;1Ivan Vilas Bôas Souza4
O uso de pigmentos ou corantes para dar cor a objetos e alimentos é um aditivo
indispensável na vida do homem desde os tempos mais antigos, estando presente em uma
variedade de situações do dia-a-dia, como na pintura das paredes de uma casa e sala de
trabalho, dos equipamentos e utensílios domésticos, dos carros, das roupas, dos calçados, dos
cabelos, das maquiagens utilizadas (pó facial, batom, esmalte etc.), do papel (lenços,
guardanapos, higiênico, etc.), dos alimentos.
Na antiguidade, esses corantes naturais eram extraídos essencialmente de flores,
sementes, frutos, cascas e raízes de plantas ou de insetos e moluscos através de complexos
processos, envolvendo diversas operações como maceração, destilação, fermentação,
decantação, precipitação, filtração, etc. Os índios, por exemplo, extraíam corantes de plantas
com a finalidade de tingirem artefatos, vestimentas e os próprios corpos (como proteção
contra picada de insetos, raios solares ou para indicarem um estado de espírito como festejos,
guerras, etc.). No entanto, com o processo de industrialização e desenvolvimento da indústria
química, surgem, no século XVIII, os corantes sintetizados quimicamente, substituindo em
larga escala os denominados naturais.
Atualmente, é difícil encontrar no mercado um alimento processado que não contenha
algum tipo de aditivo químico sintético, isso porque a indústria de alimentos e a química estão
fortemente relacionadas. Nesse sentido, as pesquisas científicas vêm buscando desenvolver
novos princípios ativos que forneçam condições essenciais ao processamento e que torne os
alimentos mais estáveis e atraentes, prolongando, também sua vida na prateleira.
Comparativamente aos corantes sintéticos os naturais apresentam algumas desvantagens
quanto a sensibilidade à luz, ao calor, ao oxigênio ou a ação das bactérias, o que acaba por
interferir na sua estabilidade. Diferentemente, os sintéticos são mais estáveis, têm maior
durabilidade, cores mais intensa e muitas vezes apresentam menor custo de produção. Mesmo
1DS Produção Vegetal, Professor Titular da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Campus de
Vitória da Conquista, Bahia, E-mail: [email protected]. 2DS em Economia Rural, Professora Titular, Universidade Estadual de Santa Cruz, Departamento de
Ciências Econômicas, Ilhéus, Bahia. E-mail: [email protected]. 3Doutoranda em Fitopatologia na UFRPE, Recife, Pernambuco. E-mail: [email protected].
assim, o mercado vem assinalando para uma substituição cada vez maior dos sintéticos pelos
naturais, em função de problemas que os primeiros propiciam à saúde (SOUZA, 2000).
Países como a Austrália, por exemplo, proibiu a circulação de corantes sintéticos, os
Estados Unidos e o Japão prevêem a retirada total do mercado desse tipo de corante nos
próximos anos. No Brasil, em 7 de agosto de 1987 a Divisão Nacional de Vigilância Sanitária
de Alimentos (DINAL), pela Portaria número 17, proibiu a utilização de alguns corantes
sintéticos como Amarelo Ácido, Azul de Indatreno, Vermelho Sólido E , Escarlate GN e
Laranja GCN. Apenas os corantes Amarelo Crepúsculo, Azul Brilhante FCF, Bordeaux S ou
Amaranto, Eritrosina, Indigotina, Ponceau 4R, Tartrazina e Vermelho 40 tiveram a
autorização mantida (PEPPERTRADE, 2006). Nesse novo cenário, há uma mudança do
mercado, em que os corantes artificiais usados pela indústria de alimentos vêm sendo
substituídos por uma série de pigmentos naturais, que vão desde partes vegetais comestíveis e
sucos de vegetais, animais e insetos até substâncias extraídas e purificadas.
Quanto ao emprego dos corantes naturais, a legislação brasileira atual não faz
nenhuma restrição no seu uso em alimentos e nem impõe qualquer limite quanto a sua
aplicação, devido às características de produto natural. O momento atual tem levado a um
retorno aos corantes naturais, no mais diverso uso, implicando na criação, por parte de alguns
países, de uma legislação específica para tratar sobre esse tema. A Food and Agriculture
Organization of the United Nations (FAO), por meio da Comissão do Codex Alimentarius
vem estabelecendo limites para certos alimentos, como óleos e gorduras comestíveis (SATO
et al., 1992), procurando assim criar regras e normas para um uso mais adequado dos corantes
denominados de naturais.
No Brasil, das 35 indústrias produtoras de corantes, mais da metade produz corantes
naturais e apenas 12,5% corantes sintéticos. Isso vem ocorrendo porque os produtos
industrializados, isentos de aditivos, têm maior aceitação por parte dos consumidores,
especialmente onde o nível de exigência na produção de alimentos é maior como na Europa e
no Japão (STRINGHETA, 2000). Os corantes são aditivos utilizados nos alimentos para
conferir, intensificar ou restaurar a sua cor, sendo empregados largamente nas indústrias de
laticínios, doce, massas, carnes, sorvetes, bebidas, óleos e gorduras, desidratados, cosméticos,
farmacêuticas, diagnósticas, têxteis, tintas, entre outras (MASCARENHAS et al., 1999; SÃO
JOSÉ, 1990).
4 MS Agronomia pela UESB. E-mail: [email protected]
Os aditivos têm uma variedade de funções, alguns atuam como conservantes e
estabilizantes, proporcionando maior durabilidade ao produto ou evitando o desenvolvimento
a microrganismos nocivos à saúde do homem. Outras, como os corantes, servem para tingir os
alimentos, conferindo-os melhor aparência, tornando-os mais atraentes ao consumo.
Conforme Portaria 540 de 27 de outubro de 1997 do Ministério da Saúde/Secretaria de
Vigilância Sanitária (ANVISA, 2007) aditivo alimentar é: qualquer ingrediente adicionado intencionalmente aos alimentos, sem propósito de nutrir, com o objetivo de modificar as características físicas, químicas, biológicas ou sensoriais, durante a fabricação, processamento, preparação, tratamento, embalagem, acondicionamento, armazenagem, transporte ou manipulação de um alimento.
A Resolução da Comissão Nacional de Normas e Padrões para Alimentos (CNNPA),
do Ministério da Saúde, no. 44/1977 (ANVISA, 2007) classifica os corantes como:
a) Orgânico natural - aquele obtido a partir de vegetal, ou eventualmente, de animal, cujo
princípio corante tenha sido isolado com o emprego de processo tecnológico adequado.
b) Orgânico sintético - aquele obtido por síntese orgânica mediante o emprego de processo
tecnológico adequado, podendo ser classificado em artificial (aquele não encontrado em
produtos naturais) ou orgânico sintético idêntico ao natural (cuja estrutura química é
semelhante à do princípio ativo isolado de corante orgânico natural).
c) Inorgânico - aquele obtido a partir de substâncias minerais e submetido a processos de
elaboração e purificação adequados a seu emprego em alimento.
d) Natural obtido pelo aquecimento de açúcares à temperatura superior ao ponto de fusão.
e) Caramelo (processo amônia) - é o corante orgânico sintético idêntico ao natural obtido pelo
processo amônia.
As principais fontes de corantes no mundo são de origem vegetal, animal e minerais.
No reino vegetal destacam-se o urucum (Bixa orellana L.), a cúrcuma ou o açafrão (Crocus
sativus), a páprica ou pimentão vermelho (Capsicum annuum L.), o cravo de defunto
(marygold), dentre outros. No reino animal a principal fonte é o corante carmin extraído a
partir de fêmeas dessecadas da cochonilha da espécie Dactylopius coccus, que é um inseto
parasita de plantas, especialmente de palmas forrageiras cultivadas em países andinos, com
destaque para o Peru. Os de natureza mineral correspondem os pigmentos presentes na pré-
história da pintura e correspondem geralmente às classes dos sulfuretos, dos óxidos, dos
carbonatos e dos silicatos (CRUZ, 2006). Comercialmente os corantes mais empregados pelas
indústrias alimentícias têm sido os extratos de urucum, carmim de cochonilha, curcumina,
antociaminas e as betalaínas.
Do carmim de cochonilha extrai-se o ácido carmínico que nos tempos mais remotos
era usado para tingir tecidos. Em função da boa estabilidade ao calor e à luz, resistência à
oxidação, esse corante tem sido cada vez mais difundido no mundo, sendo largamente
utilizado na indústria de iogurtes, bebidas lácteas, recheios de biscoitos etc. A produção está
concentrada na região dos Andes, especialmente o Peru que é o maior produtor, seguido do
Chile, Bolívia e Ilhas Canárias. Pela dificuldade em extração e pela necessidade de um
volume grande de insetos para produzir um quilo do produto, cerca de 150 mil insetos, a sua
cotação no mercado é maior, comparativamente a outros tipos de corantes naturais.
A cúrcuma (Curcuma longa L.) ou açafrão possui uma substância corante denominada
de curcumina, que contém óleos essenciais utilizados no mercado para inúmeras finalidades
(perfumaria, medicinal, alimentício, condimentar, têxtil e outros). Internacionalmente
conhecida como turmeric, tem um mercado relativamente estruturado e consolidado. Em nível
internacional esse corante chega a responder por 1% das transações comerciais, tendo nos
Estados Unidos, Japão, Alemanha, Cingapura e Holanda os principais países importadores.
Nesse mercado, a Índia configura-se como o principal país produtor e exportador, chegando a
quase 50% da oferta desse produto em nível de mercado mundial. A produção brasileira é
modesta, cerca de 1% do que é produzido na Índia, algo em torno de 1.000 a 1.300 toneladas.
Os plantios encontram-se concentrados nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Goiás,
sendo Mara Rosa no estado de Goiás, o maior pólo regional de produção no Brasil
(MARIZZONI, 2002).
Quanto à páprica este é um pigmento de cor vermelha forte e brilhante extraída do
pimentão (Capsicum annuum L.) seco e moído (SANTOS et al., 2006), tendo vários sabores,
desde o doce ao picante. É considerada uma das três especiarias mais populares do mundo.
Dados da FAO (2007) indicam que Indonésia e Brasil constituem-se nos principais produtores
e exportadores dessa especiaria, tendo também importante participação da Índia e Malásia.
Nesse mercado, os Estados Unidos, Alemanha e Índia representam os principais países
compradores.
O urucum é um corante extraído do revestimento da semente de uma espécie de árvore
tropical urucuzeiro (Bixa orellana L.). No mercado possui alto potencial de uso na indústria
de alimentos, cosmética, farmacêutica e têxtil. O emprego como pigmento é feito há séculos
pelos povos indígenas, porém seu uso comercial é algo mais recente. Isso vem ocorrendo
porque o mercado é cada vez mais exigente quanto ao uso de aditivos nos produtos, além do
que a legislação atual proíbe o uso de determinados corantes artificiais em alimentos e, ou
cosméticos. Na indústria alimentícia estima-se que o uso de corantes (naturais e artificiais)
represente cerca de US$ 1 bilhão, sendo que o mercado de corantes naturais chega a
movimentar quase 70% desse total. A perspectiva é que esse mercado cresça cada vez mais,
enquanto o de corantes artificiais diminua dadas as restrições legais impostas ao mercado
(QUAN, 2002).
No Brasil, dentre os aditivos naturais, o urucum possui maior relevância econômico-
social, visto que de suas sementes podem ser extraídos corantes naturais de diversas
tonalidades, desde o amarelo pálido até o vermelho tijolo. Além disso, a dispersão dos
cultivos em quase todo o território nacional imprime à cultura uma boa perspectiva no
mercado de corantes naturais.
Do urucum podem ser obtidos corantes lipossolúveis - extraídos com óleo vegetal – ou
hidrossolúveis - extraídos com solução álcali-aquosa. Por meio dessas formas de extração
têm-se dois importantes corantes: a bixina, que é o principal componente colorido da extração
lipossolúvel e a norbixina, que é o principal componente colorido da extração hidrossolúvel.
Esses extratos podem ser apresentados sob a forma de pós, pastas, suspensões ou soluções, e a
eles não poderão ser atribuídas atividades vitamínica.
Na indústria brasileira de alimentos o urucum é a mais importante fonte de matéria-
prima, representando quase 90% do total do mercado de corantes naturais, enquanto no
mercado internacional esse percentual é de 70%. Esse corante é empregado na produção de
embutidos (salsichas, por exemplo), massas, queijos (tipo prato), sorvetes e confeitarias etc.
(CONTO et al., 1991). Em função da crescente demanda de alguns setores, especialmente o
de alimentos coloridos a partir de corantes naturais e das indústrias de cosméticos,
farmacêutica e têxtil, a produção de corantes naturais vem aumentando nos últimos 10 anos
para suprir essa procura. Estima-se que essa demanda cresce a uma taxa de 5% ao ano nos
últimos anos.
Os cultivos de urucum estão dispersos em quase todo o território nacional,
representando mais uma fonte de renda para pequenos agricultores. Uma das características
do urucueiro é sua rusticidade, fácil adaptabilidade edafoclimática e grande diversidade
genética dentre as variedades cultivadas. No entanto, para que se obtenha qualidade dos grãos
(teor de pigmento) e produtividade são necessários determinados manejos, que dependem das
condições de solo e clima da região. Na maioria dos cultivos os principais tratos culturais são
adubação de cobertura, controle de plantas daninhas, podas, controle de pragas e doenças e,
eventualmente, aplicação de irrigação.
Quanto aos grãos, esses são classificados de acordo com o teor de bixina. Para
comercialização junto às indústrias de corantes, o teor de bixina mínimo exigido é de 2,5%.
Porém, muitos produtores não conseguem atingir esse percentual, limitando assim a expansão
das exportações e comprometendo a competitividade brasileira no mercado internacional.
Para reverter esse quadro torna-se relevante o desenvolvimento de cultivares com
maior teor de bixina nos grãos e práticas agrícolas que permitam aumento da produtividade no
campo. No entanto, pouco tem sido feito quanto à obtenção de cultivares de urucum, à
exceção da seleção de tipos locais e avaliações tradicionais a partir de ensaios regional e
nacional. Portanto, existe um longo caminho a ser percorrido em busca de informações que
ampliem a base científica do melhorista para que se possa, assim, atender às demandas de
produtores e do setor industrial (FRANCO et al., 2002). Portanto, as pesquisas devem centrar-
se na busca por produtividade planta/teor de bixina, o que possibilitaria a sustentabilidade do
agronegócio do urucueiro. Nesse contexto, o melhoramento genético é de fundamental
importância para que a cultura do urucum possa se consolidar e que o Brasil consiga manter
sua posição de maior produtor e exportador mundial com material de qualidade, gerando
divisas e emprego para o país.
As cultivares de urucum mais presentes no Brasil são: Bico-de-pato, Peruana Paulista,
Piave Vermelha e a Peruana Pará. As exigências são basicamente as mesmas, pois, em geral,
os plantios necessitam de uma lâmina de água em torno de 1.200 a 2.000 mm, bem distribuída
ao longo do ano, solos profundos e com um bom sistema de drenagem natural e, de
preferência, de média a alta fertilidade. Normalmente, a produção comercial se inicia a partir
do segundo ano após o plantio, sendo que no quarto ano a planta atinge a idade adulta e o
máximo do seu potencial produtivo (SANTANA, 2006).
No Brasil, os plantios comerciais de urucum vêm se expandindo (Figura 1) e,
atualmente o país conta com aproximadamente 12 mil hectares de área plantada (IBGE,
2007). Em 1975 a produção era pouco mais que 90 toneladas, em 1987 eram 1.270 e em 2005
de 13.736 toneladas, segundo dados do IBGE (2007). Na década de oitenta a produção
brasileira concentrava-se na Paraíba, Minas Gerais, Ceará e Rio de Janeiro. Atualmente, três
regiões, Norte, Nordeste e Sudeste (Figura 2), se destacam em especial os estados do Pará,
Bahia e São Paulo, respectivamente, que nos anos de 1980 praticamente não tinham cultivos
comerciais.
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Áre
a (h
a)
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Figura 1 – Área plantada com urucum, em hectares, por região do Brasil, período 1990 a 2005.
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal (www.ibge.gov.br, 2007).
Em 1990 a produção brasileira de grãos de urucum situava-se, em torno 6.500 T/ano, e
a quase totalidade destinava-se à fabricação de colorau (ou colorífico), condimento bastante
utilizado na culinária da região Nordeste do país. Uma pequena parte destinava-se à produção
de corantes e o excedente era exportado. Em 1991, o consumo de colorífico chegou a
aproximadamente 1000 toneladas, em que cerca de 70% eram consumidos na região Nordeste
e pouco mais de 20% (em torno de 214 toneladas), na região Sudeste. Em 2001, o consumo
estimado atingia, aproximadamente, 1.600 toneladas, um crescimento, nesse período de 10
anos, de cerca de 60%, no Brasil.
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Prod
ução
(T)
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Figura 2 – Quantidade produzida de urucum, em toneladas, por região do Brasil, período 1990 a 2005.
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal (www.ibge.gov.br, 2007).
Nos anos de 1995 e 2000, o Nordeste chegou a produzir mais de 50% de toda a
produção nacional, especificamente o estado da Bahia. Esse quadro, porém se altera a partir
de 2001 e, os dados mais recentes apontam a região Sudeste como a principal produtora,
5.614 toneladas em 2005, o que representa mais de 40% da quantidade total produzida, tendo
o estado de São Paulo participação cada vez mais relevante nesse novo cenário. Essa
migração dos cultivos imprimiu à cultura uma nova configuração produtiva, impulsionada
pelo aumento da demanda da indústria, pela necessidade de fornecimento contínuo, qualidade
dos grãos (teor de bixina) e em função da logística, especialmente dos custos de transporte.
Esses fatores provocaram uma nova dinâmica no mercado, pois regiões tradicionalmente
produtoras, especialmente Norte do país, tiveram que se adaptar a essas novas condições de
mercado, saindo de cultivos tradicionais para plantios mais tecnificados visando aumentar a
produtividade e qualidade de grãos.
Em termos de rendimento, não houve relevantes transformações (Figura 3), o que
demonstra certa estagnação no emprego de novas tecnologias nos cultivos de urucum. Os
maiores níveis de produtividade em 2005 foram observados no Distrito Federal e em São
Paulo, 2.250 kg/ha e 1.862 kg/ha, respectivamente. Regiões tradicionais como Pará e Bahia,
nesse mesmo ano, alcançaram produtividades inferiores, 832 kg/ha e 1.290 kg/ha,
respectivamente (IBGE, 2007). Em certa medida, esse é um cenário desfavorável para o
produtor, pois fortalece a relação de dependência com a indústria de processamento.
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Prod
utiv
idad
e (k
g/ha
)
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Figura 3 – Produtividade do urucum, em kg/ha, por região do Brasil, período 1990 a 2005.
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal (www.ibge.gov.br, 2007).
Nos últimos anos, os estados do Paraná e de Rondônia têm se configurado em novos
pólos produtores, por outro lado, o estado da Paraíba que era um importante produtor vem
reduzindo sua participação no mercado doméstico.
Na Bahia, as microrregiões que mais se destacam na produção de urucum são Vitória
da Conquista e Porto Seguro, segundo dados do IBGE (2007). No entanto, enquanto a
quantidade produzida na microrregião de Vitória da Conquista vem reduzindo drasticamente
ao longo dos últimos 12 anos, em 1992 foram produzidas 4800 toneladas passando para 81
toneladas em 2005, o que representa menos de 2% da produção do início da década de 1990.
Por outro lado, a produção de Porto Seguro vem aumentando, nesse mesmo período, passando
de 4 toneladas para 807 toneladas.
No caso da região Norte, os cultivos estão localizados nas microrregiões de Santarém,
Bragantina e Paragominas no Pará, e Ariquemes e Colorado do Oeste no estado de Rondônia.
Em São Paulo, os plantios se concentram nas microrregiões de São José do Rio Preto e
Dracena (IBGE, 2007).
Essas transformações observadas na oferta é resultado, também, dos preços pagos aos
produtores. Nos anos de 1990, 1991 e 1992, os produtores recebiam entre US$ 0,70 a 1,00/kg
de grãos, na entressafra de novembro de 1993 a maio de 1994 o preço chegou a níveis
superiores a US$ 3,00/kg, preço este não mais verificado. Nas safras de 1995, os grãos de
urucum foram comercializados a preços que variaram entre US$ 1,00 a 1,80/kg de grãos.
Porém nos três anos subseqüentes (1996 a 1998), os preços caíram vertiginosamente,
chegando, em algumas zonas produtoras, a estarem abaixo do custo de produção. Essas
oscilações provocaram um desestímulo à produção, o que afetou positivamente o preço no
ano de 1999 (FRANCO, 2006). No entanto, esse quadro já instalado levou muitos produtores
a abandonarem suas áreas ou reduzirem os tratos culturais, afetando assim a qualidade dos
grãos e a produtividade dos cultivos.
Porém, o aumento da demanda da indústria de corantes e da agroindústria de colorau e
colorífico levaram os preços a aumentarem e situarem-se entre US$ 0,80 a 1,00/kg de grãos
nas safras de 1999, 2000 e 2001 (FRANCO, 2006). Em 2005 os preços pagos oscilaram entre
US$ 0,70 a 1,00/kg de grãos. Essas oscilações de preços implicam em riscos para o produtor,
tendo efeito direto sobre expansão das áreas e incorporação de novos plantios, pois à medida
que os preços se elevam, os produtores ampliam suas áreas, dispensam novos tratos culturais
e novas áreas são incorporadas. Por outro lado, queda de preços implica em um cenário
bastante perverso para o agricultor. Isso mostra uma grande sensibilidade-preço da oferta.
Quanto à estrutura de concorrência na comercialização primária do urucum no Brasil,
segundo dados do Censo Agropecuário do IBGE de 1996, é atomizada, principalmente entre
os pequenos, com área cultivada de no máximo 10 hectares, o que indica um cenário de
oferta, em nível de produtor, relativamente próximo da competição perfeita, haja vista que
não há uma diferenciação marcante de tecnologia entre produtores, escala de produção e
diferenciação do produto, tornando o produtor um tomador de preço. Dessa forma, a
necessidade de procedimentos mais racionais de produção, otimização no uso dos insumos e
busca por níveis mais elevados de produtividade constituem-se em vantagens e fatores de
diferenciação entre produtores.
De acordo com a Figura 4, observa-se que a maior parte das lavouras de urucum das
regiões Sul, Nordeste e Norte está distribuída entre pequenas e médias propriedades,
inferiores a 50 hectares, diferentemente das regiões Sudeste e Centro-Oeste em que o tamanho
das propriedades são superiores a 50 hectares. Esses dados mostram que a estrutura fundiária
é diferenciada por região produtora, predominando a pequena propriedade.
0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%
Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Menos de 1 a menos 10 ha 10 a menos 50 ha acima de 50 ha
Figura 4 – Classes de tamanho de propriedades predominantes no sistema de cultivo de urucum em lavouras permanentes no Brasil.
Fonte: Calculado com base em dados do Censo Agropecuário do IBGE, 1996.
Em nível da indústria o mercado é concorrencial. No país existem, atualmente, 35
indústrias produtoras de corantes, segundo Franco (2006), sendo que mais de 50% é produtora
de corantes naturais, tendo o urucum como a principal matéria-prima. A maioria das empresas
está localizada no Sudeste do país.
No mercado internacional, estima-se que a produção mundial seja de 10 mil toneladas
e que o comércio internacional represente 70% de toda a produção. Em nível mundial o Peru é
o maior produtor (35%) seguidamente do Quênia, Brasil e Índia (QUAN, 2002). Nesse
mercado Peru e Quênia são os maiores exportadores, enquanto Estados Unidos, Europa e
Japão são os maiores consumidores do produto.
No que se referem à economicidade dos cultivos, as características de maior
importância e que se constituem em parâmetros para trabalhos de melhoramento, são o
número de cachos/planta, número de sementes/cacho, número de cápsulas/cacho,
uniformidade de maturação, deiscência das cápsulas, tolerância a pragas e doenças, densidade
das sementes, intensidade de coloração das sementes e porcentagem de bixina. Todas essas
características têm herança quantitativa e, portanto, são determinadas por alguns genes que
podem sofrer influência do ambiente.
Dessa forma, um programa de melhoramento genético do urucueiro, torna-se
fundamental à sustentabilidade do agronegócio do urucum, devendo para tanto considerar as
especificidades da cultura, como por exemplo, as plantas alógamas ou de polinização cruzada,
onde os cruzamentos são realizados livremente entre todos os indivíduos da população. Deve-
se estimular o aumento da variabilidade genética e do vigor, o que contribuirá para o
aparecimento de indivíduos heterogêneos e heterozigotos, havendo, portanto, maior
flexibilidade da estrutura genética. Pois, a endogamia forçada provoca perda de vigor e
deterioração. Assim, no melhoramento dessas plantas deve-se manter a heterozigose ou
restabelecê-la ao final do programa (FRANCO et al., 2002).
Posto isto, a sustentabilidade do agronegócio do urucum passa, naturalmente, pelo uso
de material genético de qualidade, que possibilite elevar o teor de bixina nas sementes e os
níveis de produtividade. Esses dois elementos permitem ao produtor maior rentabilidade do
seu negócio e melhor enfrentamento das crises, especialmente aquelas associadas às
oscilações de preço. Nesse sentido, a expansão dos cultivos deve ser feita com cautela e de
forma criteriosa para que a atividade possa se estabelecer mais solidamente.
Em certa medida, pode-se verificar que nos últimos anos, as exigências do mercado
tem imposto aos novos plantios um maior profissionalismo na condução do negócio, pois o
material genético empregado nessas plantações é superior ao utilizado no passado. Com isso
aumenta-se a competitividade interna e externa do produto no mercado, garantindo maior
longevidade dos cultivos e de todos os agentes envolvidos na cadeia produtiva.
Em termos agrícolas, a cultura do urucum é uma atividade que possui riscos e
incertezas. Os movimentos abruptos de queda de preço implicam em perda de lucratividade
para o produtor, sobrevivendo aqueles que atingem determinados níveis de produtividade e
qualidade dos grãos. Nesse contexto, os produtores “ocasionais”, geralmente abandonarão os
cultivos. Como qualquer atividade econômica, flutuações acentuadas de preço afetam o
desempenho do negócio, dessa forma o preço pago aos produtores devem conseguir
remunerar seu investimento e serem compensadores para a indústria de processamento. Pois,
preços muito elevados, apesar de no curto prazo ter efeito positivo sobre a lucratividade, no
médio e longo prazo tendem a aumentar a oferta e, consequentemente, reduzir o preço, o que
pode, sob determinadas condições, inviabilizar o empreendimento, comprometendo a sua
sustentabilidade.
REFERÊNCIAS
ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria no. 540/1997. SVS/MS. Disponível em: <http://e-legis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=88&word>. Acesso em: 28 mar. 2007.
CONTO, W. L. do; OLIVEIRA, V. P.; CARVALHO, P. R. N.; GERMER, S. P. M. Estudos econômicos de alimentos processados. Campinas: ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos, 1991. 65p.
CRUZ, A. J. Os pigmentos naturais utilizados em pintura. Disponível em: <http://www.giepcn.uevora.pt/PROGRAMA%20WORKSHOP%20PIGMENTOS%20E%20CORANTES%20NATURAIS.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2007.
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