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Crônicas

Crônicas

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Revista com crônicas de autores brasileiros

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Page 1: Crônicas

Crônicas

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Índice

pág. 3 - Solidão

pág. 4 - Desabafo de um bom marido

pág. 6 - Usuário arrependdido

pág. 8 - Assalto à Banco

pág. 10 - Páscoa

pág. 12 - Como pedir uma pizza em 2010

pág. 14 - Ressaca

pág. 16 - Mulheres com mais de trinta

pág. 19 - O Sermão

pág. 20 - Depilação pág. 23 - Crônica de amor pág. 25 - Quase pág. 27 - Amigos

Chico Buarque de Holanda

Luis Fernando Veríssimo

Autor desconhecido -

Luis Fernando Veríssimo

Autor desconhecido

Luis Fernando Veríssimo

Luis Fernando Veríssimo-

Arnaldo Jabor

Mário Quintana

Luis Fernando Veríssimo

Arnaldo Jabor

Sarah Westphal Batista da Silva

Vinicius de Morais pág. 29 - Metade pág. 31 - Amor e sexo

Oswaldo Montenegro

Arnaldo Jabor

pag.2

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Solidão

Solidão não é falta de gente para conversar, namorar, passear ou fazer sexo...

Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar...

Solidão não é o retiro solitário que a gente se impõe, as vezes, para realinhar os pensamentos...

Solidão é muito mais do que isto.

Isto é carência.

Isto é saudade.

Isto é equilíbrio.

Chico Buarque de Holanda

pag.3

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Desabafo de um bom marido

Nós também dormimosem camas separadas. A delaé em Fortaleza e a minha eSão Paulo. Eu levo minhaesposa a todos os lugares,mas ela sempre acha o caminhode volta. Perguntei a ela ondeela gostaria de ir ao nossoaniversário de casamento."Em algum lugar que eu nãotenha ido há muito tempo!"ela disse. Então eu sugeri acozinha. Nós sempre andamos de mãos dadas. Se eu soltar, ela vai às compras.Ela tem um liquidificador elétrico, uma torradeiraelétrica, e uma máquina de fazer pão elétrica. Então ela disse:"Nós temos muitos aparelhos, mas não temos lugar pra sentar".Daí, comprei pra ela uma cadeira elétrica. Lembrem-se, o casamento é a causa número um para o divórcio. Estatisticamente, 100 % dos divórcios começam como casamento. Eu me casei com a "Sra. Certa". Só não sabia queo primeiro nome dela era "Sempre". Já faz 18 meses que não falo com minha esposa. É que nãogosto de interrompê-la. Mas tenho que admitir, a nossa últimabriga foi culpa minha. Ela perguntou: O que tem na TV? E eudisse: Poeira. No começo Deus criou o mundo e descansou. Então, Ele criou o homem e descansou. Depois, criou a mulher. Desde então, nem Deus, nem o homem, nem Mundo tiveram mais descanso.

pág.4

Quando o nosso cortador de grama quebrou, minha mulherficava sempre me dando a entender que eu deveria consertá-lo. Mas eu sempre acabava tendo outra coisa para cuidar antes: o caminhão, o carro, a pesca, sempre alguma coisa mais importante para mim.

Minha Esposa e eu temos o segredo pra fazer um casamentodurar: duas vezes por semana, vamos a um ótimo restaurante, com uma comida gostosa, uma boa bebida, e um bom compa-nheirismo. Ela vai às terças-feiras, e eu às quintas.

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Finalmente ela pensou num jeito esperto de me convencer. Certo dia, ao chegar em casa, encontrei-a sentada na grama alta, ocupada em podá-la com uma tesourinha de costura. Eu olhei em silêncio por um tempo, me emocionei bastante e depois entreiem casa. Em alguns minutos eu voltei com uma escova de dentese lhe entreguei.- Quando você terminar de cortar a grama, eu disse,você pode também varrer a calçada.

Depois disso não me lembro de mais nada. Os médicos dizem que eu voltarei a andar, mas mancarei pelo resto da vida.O casamento é uma relação entre duas pessoas na qual uma estásempre certa e a outra é o marido...

Luis Fernando Veríssimo

pág.5

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Usuário arrependido

Prezado Técnico;

Há um ano e meio troqueio programa [Noiva 1.0] pelo [Esposa 1.0] e verifiquei que oprogramagerou um aplicativoinesperado chamado [Bebê.exe]que ocupa muito espaço no HD.Por outro lado, o [Esposa1.0] seauto-instala em todos os outros

Além disso, de tempos em tempos um executável oculto (vírus) chamado [sogra 1.0] aparece, encerrando abruptamente a execução de um comando. Não consigo desinstalar este programa.Também não consigo diminuir o espaço ocupado pelo [Esposa 1.0 ]quando estou rodando meus aplicativos preferidos. Sem falar também que o programa [Sexo 5.1] sumiu do HD. Eu gostaria de voltar ao programa que eu usava antes, o [Noiva 1..0], mas o comando [Uninstall.exe] não funciona adequadamente.

Poderia ajudar-me? Por favor!

Ass: Usuário Arrependido

programas e é carregado automaticamente assim que eu abro qualquer aplicativo. Aplicativos como [cerveja_com_a_turma0.3],[noite_de_farra 2.5] ou [domingo_de_futebol 2.8], não funcionammais, e o sistema trava assim que eu tento carregá-los novamente.

RESPOSTA:

Prezado Usuário,

Sua queixa é muito comum entre os usuários, mas é devido, na maioria das vezes,a um erro básico de conceito: muitosusuários migram de qualquer versão [Noiva 1.0] para [Esposa 1.0] com a falsa idéia de que se trata de um aplicativode entretenimento e utilitário. Entretanto, o [Esposa 1.0] é muito mais do que isso: é um sistema operacional completo,criado para controlar todo o sistema!

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É quase impossível desinstalar [Esposa 1.0] e voltar para uma versão [Noiva 1.0], porque há aplicativos criados pelo [Esposa 1..0],como o [Filhos.dll], que não poderiam ser deletados, também ocupam muito espaço, e não rodam sem o [Esposa 1.0].

É impossível desinstalar, deletar ou esvaziar os arquivos dos programas depois de instalados. Você não pode voltar ao [Noiva 1.0]porque [Esposa 1.0] não foi programado para isso. Alguns usuáriostentaram formatar todo o sistema para em seguida instalar a [NoivaPlus] ou o [ Esposa 2.0], mas passaram a ter mais problemas do queantes (leia os capítulos 'Cuidados Gerais' referente a 'Pensões Ali-mentícias' e ' Guarda das crianças' do software [CASAMENTO].

Uma das melhores soluções é o comando [DESCULPAR.EXE /flores/all] assim que aparecer o menor problema ou se travar o micro. Evite o uso excessivo da tecla [ESC] (escapar). Para melhorar a rentabilidade do [Esposa 1.0 ], aconselho o uso de [Flores 5.1], [ Férias_No_Caribe 3.2] ou [Jóias 3.3]. Os resultados são bem interessantes! Mas nunca instale [Secretária_De_Minissaia 3.3], [Antiga_Namorada 2.6] ou [ Turma_Do_Chopp 4.6], pois não funcionam depois de ter sido instalado o [Esposa 1.0] e podem causar problemas irreparáveis no sistema. Com relação ao programa [Sexo 5.1 ] esquece! Esse roda quandoquer. Se você tivesse procurado o suporte técnico antes de instalar o [Esposa1.0 ] a orientação seria: NUNCA INSTALE O [ESPOSA 1.0]sem ter a certeza de que é capaz de usá-lo!

Autor desconhecido

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Agora.... Boa sorte!

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Assalto à Banco

Ligação telefônica para um banco:- Alô? Quem tá falando? - Aqui é o ladrão.

- Desculpe, a telefonista deve ter se enganado, eu não querofalar com o dono do banco. Tem algum funcionário aí?

- Não, os funcionários tá tudo refém. - Ah, eu entendo. Afinal, eles trabalham quatorze horas por dia, ganham um salário ridículo, vivem levando esporro, mas não pedem demissão porque não encontram outro emprego, né?Vida difícil... Mas será que eu não poderia dar uma palavrinha com um deles?

- Impossível Eles tá tudo amordaçado.

- Foi o que pensei. Gestão moderna, né? Se fizerem qualquercrítica, vão pro olho da rua. Não haverá, então, algum chefe por aí?

- Claro que não mermão. Quanta inguinorança! O chefe tá no presídio desegurança máxima, que é o lugar mais seguro pra se comandar assalto! - Bom... Sabe o que que é? Eu tenhouma conta.... - Tamo levando tudo, ô bacana. Osaldo da tua conta agora é zero, saco - Bem, isso eu já sabia. Eu sou professor! O que eu queria mesmo erauma informação sobre juros... - Companheiro, eu sou um ladrão pé-de-chinelo. Meu negócio é pequeno. Assalto a banco, vez ou outra um seqüestro.Pra saber de juros é melhor tu ligá pra Brasília. - Sei, sei O senhor tá na informalidade, né? Também, com o preço quetão cobrando por um voto hoje em dia.... Mas, será que não podia fazerum favor pra mim? É que eu atrasei o pagamento do cartão e queria saberquanto vou pagar de taxa de juros.

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- Tu tá pensando que eu tô brincando? Isso aqui é um assalto,ô mano! - Longe de mim pensar que o senhor está de brincadeira! Queé um assalto eu sei perfeitamente; ninguém no mundo cobra osjuros que se cobram no Brasil. Mas queria saber o número preciso:seis por cento, sete por cento?

- Eu acho que tu não tá entendendo, ô mané. Sou assaltante.Trabalho na base da intimidação e da chantagem, saca?

- Ah, já tava esperando. Você vai querer vender um seguro de vida ou um título de capitalização, né? - Não.... Já falei... Eu sou... Peraí, bacana... Hoje eu tô bonzinhoe vou quebrar o teu galho.

(um minuto depois)

- Alô? O sujeito aqui tá dizendo que é oito por cento ao mês.- Puxa, que incrível!- Incrive por que, ô meu? Tu achava que era menos?

- Não, achava que era mais ou menos isso mesmo. Tô impres-sionado é que, pela primeira vez na vida, eu consegui obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço pelo telefone em menos de meia hora e sem ouvir 'Pour Elise'. - Quer saber? Fui com a tua cara. Acabei de dar umas bordoadasno gerente e ele falou que vai te dar um desconto. Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado?

- Nadica de nada, já tá tudo acertado!- Muito obrigado, meu senhor. Nunca fui tratado dessa...(De repente, ouvem-se tiros, gritos, ruido de sirene...)- Ih, sujou! Puliça!- Polícia? Que polícia? Alô? Alô?(sinal de ocupado)

- Droga! Maldito Estado: quando o negócio começa a funcio-nar, entra o Governo e caga tudo!

Luis Fernando Veríssimo

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- Não acredito! E eu não vou ter que comprar nenhum produtodo banco?

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Páscoa

-Papai, o que é Páscoa? -Ora, Páscoa é... bem... é uma festa religiosa! -Igual ao Natal? -É parecido. Só que no Natal comemora-se o nascimento deJesus, e na Páscoa, se não me engano, comemora-se a sua ressur-reição. -Ressurreição? -É, ressurreição. Marta , vem cá ! -Sim? -Explica pra esse garoto o que é ressurreição pra eu poder ler o meu jornal. -Bom, meu filho, ressurreição é tornar a viver após ter mor-rido. Foi o que aconteceu com Jesus, três dias depois de ter sidocrucificado. Ele ressuscitou e subiu aos céus. Entendeu ?

-Mais ou menos... Mamãe, Jesus era um coelho? -O que é isso menino? Não me fale uma bobagem dessas! Coelho! Jesus Cristo é o Papai do Céu! Nem parece que esse me-nino foi batizado! Jorge, esse menino não pode crescer desse jeito, sem ir numa missa pelo menos aos domingos. Até parece que não lhe demos uma educação cristã ! Já pensou se ele solta uma besteira dessas na escola ? Deus me perdoe ! Amanhã mes-mo vou matricular esse moleque no catecismo!

-Mamãe, mas o Papai do Céu não é Deus ?

- É filho, Jesus e Deus são a mesma coisa. Você vai estudar isso no catecismo. É a Trindade. Deus é Pai, Filho e Espírito Santo.

-O Espírito Santo também é Deus? -É sim. -E Minas Gerais? -Sacrilégio!!! -É por isso que a ilha de Trindade fica perto do Espírito Santo?

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-Não é o Estado do Espírito Santo que compõe a Trindade, meu filho,é o Espírito Santo de Deus. É um negócio meio complicado, nem a ma-mãe entende direito. Mas se você perguntar no catecismo a professora explica tudinho!

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-Bom, se Jesus não é um coelho, quem é o coelho da Páscoa ?

- Papai, Jesus nasceu no dia 25 de dezembro, né ? - Que dia ele morreu ? - Isso eu sei: na Sexta-feira Santa. - Que dia e que mês? - (???). Sabe que eu nunca pensei nisso ? Eu só aprendi que ele morreuna Sexta-feira Santa e ressuscitou três dias depois, no Sábado de Aleluia.

-Eu sei lá ! É uma tradição. É igual a Papai Noel, só que ao invés de pre-sente ele traz ovinhos. -Coelho bota ovo ? -Chega ! Deixa eu ir fazer o almoço que eu ganho mais ! - Papai, não era melhor que fosse galinha da Páscoa ? -Era... era melhor, sim... ou então urubu.

Morreu na Sexta mesmo e ressuscitou no sábado, três dias depois !Como ? Pergunte à sua professora de catecismo!

-É que hoje é Sabado de Aleluia, e o pessoal vai fazer a malhaçãodo Judas. Judas foi o apóstolo que traiu Jesus. -O Judas traiu Jesus no Sábado ? -Claro que não ! Se Jesus morreu na Sexta !!! -Então por que eles não malham o Judas no dia certo ? -Ui... -Papai, qual era o sobrenome de Jesus? -Cristo. Jesus Cristo. -Só ? -Que eu saiba sim, por quê? -Não sei não, mas tenho um palpite de que o nome dele era Jesus Cristo Coelho. Só assim esse negócio de coelho da Páscoa faz sentido, não acha? -Ai coitada! -Coitada de quem? -Da sua professora de catecismo!

Autor desconhecido

-Um dia depois! - Não três dias depois. -Então morreu na Quarta-feira. -Não, morreu na Sexta-feira Santa... ou terá sido na Quarta-feira de Cin-zas ? Ah, garoto, vê se não me confunde !

-Papai, porque amarraram um monte de bonecos de pano lá na rua?

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Como pedir uma pizza em 2010* Telefonista: Pizza Hot, boa noite! * Cliente: Boa noite! Quero encomendar pi-zzas...* Telefonista: Pode me dar o seu NIDN?* Cliente: Sim, o meu número de identifica-ção nacional é 6102-1993-8456-54632107. * Telefonista: Obrigada, Sr.Lacerda. Seu en-dereço é Avenida Paes de Barros, 1988 ap.52B, e o número de seu telefone é 5494-2366,certo? O telefone do seu escritório da Lincoln Seguros é o 5745-2302 e o seu celular é 9266-2566. * Cliente: Como você conseguiu essas informações todas?* Telefonista: Nós estamos ligados em rede ao Grande Sistema Central. * Cliente: Ah, sim, é verdade! Eu queria encomendar duas pi-zzas, uma de quatro queijos e outra de calabresa...* Telefonista: Talvez não seja uma boa idéia...* Cliente: O quê?* Telefonista: Consta na sua ficha médica que o Senhor sofre de hipertensão e tem a taxa de colesterol muito alta. Além disso, oseu seguro de vida proíbe categoricamente escolhas perigosas para a sua saúde.* Cliente: É você tem razão! O que você sugere?* Telefonista: Por que o Senhor não experimenta a nossa pizza Superlight, com tofu e rabanetes? O Senhor vai adorar! * Cliente: Como é que você sabe que vou adorar? * Telefonista: O Senhor consultou o site 'Recettes Gourmandesau Soja' da Biblioteca Municipal, dia 15 de janeiro, às 4h27min, onde permaneceu conectado à rede durante 39 minutos. Daí a minha sugestão... * Cliente: OK está bem! Mande-me duas pizzas tamanho família!* Telefonista: É a escolha certa para o Senhor, sua esposa e seus 4filhos, pode ter certeza.

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Luis Fernando Veríssimo

* Cliente: Quanto é? * Telefonista: São R$ 49,99.* Cliente: Você quer o número do meu cartão de crédito? * Telefonista: Lamento, mas o Senhor vai ter que pagar em di-nheiro. O limite do seu cartão de crédito já foi ultrapassado. * Cliente: Tudo bem, eu posso ir ao Multibanco sacar dinheiro antes que chegue a pizza.* Telefonista: Duvido que consiga! O Senhor está com o saldo negativo no banco. * Cliente: Meta-se com a sua vida! Mande-me as pizzas que euarranjo o dinheiro. Quando é que entregam? * Telefonista: Estamos um pouco atrasados, serão entregues em45 minutos. Se o Senhor estiver com muita pressa pode vir bus-cá-las, se bem que transportar duas pizzas na moto não é acon-selhável, além de ser perigoso....* Cliente: Mas que história é essa, como é que você sabe que eu vou de moto? * Telefonista: Peço desculpas, mas reparei aqui que o Sr. não pa-gou as últimas prestações do carro e ele foi penhorado. Mas a sua moto está paga, e então pensei que fosse utilizá-la.* Cliente: @#%/§@&?#>§/%#!!!!!!!!!!!!! * Telefonista: Gostaria de pedir ao Senhor para não me insultar... Não se esqueça de que o Senhor já foi condenado em julho de 2006 por desacato em público a um Agente Regional.* Cliente: (Silêncio)* Telefonista: Mais alguma coisa? * Cliente: Não, é só isso... Não, espere... Não se esqueça dos 2 li-tros de Coca-Cola que constam na promoção. * Telefonista: Senhor, o regulamento da nossa promoção, confor-me citado no artigo 3095423/12, nos proíbe de vender bebidas com açúcar a pessoas diabéticas... * Cliente: Aaaaaaaahhhhhhhh!!!!!!!!!!! Vou me atirar pela janela!!!!!* Telefonista: E machucar o joelho? O Senhor mora no andar térreo!

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A medida que envelheço e convivocom outras, valorizo mais ainda as mu-lheres que estão acima dos 30;

Mulheres com mais de trinta: mulheresde verdade.

- Se ela não quer assistir ao jogo de futebol na tv, não fica à suavolta resmungando, pirraçando... vai fazer alguma coisa que queirafazer... E geralmente é alguma coisa bem mais interessante;

Isto é para as mulheres de 30 anos pra cima… E para todas aquelas que estão en-trando nos 30, e para todas aquelas que estão com medo de entrar nos 30… E para homens que têm medo de meninas com mais de 30!!!

Estas são algumas razões do porquê: - Uma mulher de 30 nunca o acordará no meio da noite para perguntar: “O que você está pensando?” - Elas não se importam com o que você pensa, mas se dispõemde coração se você tiver a intenção de conversar;

- Uma mulher de 30 se conhece o suficiente para saber quem é,o que quer e quem quer. Poucas mulheres de 30 se incomodam com o que você pensa dela ou sobre o que ela esta fazendo. - Mulheres dos 30 são honradas. Elas raramente brigam aos gritos com você durante a ópera ou no meio de um restaurante caro. É claro, que se você merecer, elas não hesitarão em atirar em você, mas só se ainda sim elas acharem que poderão se safar impunes. - Uma mulher de 30 tem total confiança em si para apresentar-te para suas melhores amigas. Uma mulher mais nova com um ho-mem tende a ignorar mesmo sua melhor amiga porque ela não con-fia no cara com outra mulher. E falo por experiência própria. Não se fica com quem não confia, vivendo e aprendendo né???

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-Mulheres se tornam psicanalistas quando envelhecem.Você nunca precisa confessar seuspecados... elas sempre sabem...

-Você nunca precisa se preocupar onde se encaixa na vida dela.Basta agir como homem e o resto deixe que ela faça...

- Infelizmente isto não é recí-proco, pois para cada mulher com mais de 30 anos, estonteante,bonita, bem apanhada, sexy, e bem resolvida, existe um homemcom mais de 30, careca, pançudoem bermudões amarelos, bancan-do o bobo para uma garota de 19 anos... Senhoras, eu peço desculpas por eles : não sabem o que fazem!

Para todos os homens que dizem: "Porque comprar a vaca, sevocê pode beber o leite de graça?" Aqui está a novidade para vocês:hoje em dia 80% das mulheres são contra o casamento e sabem porquê? Porque " as mulheres perceberam que não vale a pena comprar um porco inteiro só para ter uma lingüiça!".

Nada mais justo!

Arnaldo Jabor

- Ficam lindas quando usam batom vermelho. O mesmo não acontece com mulheres mais jovens... Por que será, heim?? - Mulheres mais velhas são diretas e honestas. Elas te dirão nacara se você for um idiota, se você estiver agindo como um!

-Sim, nós admiramos as mulhe-res com mais de 30 anos!

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Ressaca Hoje, existem pílulas milagrosas, mas eu ainda sou do tempo das grandes ressacas. As bebedeiras de antigamente eram mais dignas, porque você as tomava sabendo que no dia seguinte estaria no inferno.Além de saúde era preciso coragem. As novas gerações não conhecemressaca, o que talvez explique a falência dos velhos valores. A ressaca era a prova de que a retribuição divina existe e que nenhum prazer ficará sem castigo. Cada porre era um desafio ao céu e às suas eras. E elas vinham: Náusea, Azia, Dor de Cabeça, Dúvidas Existenciais - golfadas. Hoje,as bebedeiras não têm a mesma grandeza. São inconseqüentes, lite-ralmente. Não é que eu fosse um bêbado, mas me lembro de to-dos os sábados de minha adolescência como uma luta desigual entre a cuba-libre e o meu instinto de autopreservação. A cuba-libre ga-nhava sempre. Já dos domingos me lembro de muito pouco, salvo atontura e o desejo de morte

Jurava que nunca mais a beber, mas, antes dos trinta, "nunca mais"dura pouco. Ou então o próximo sábado custava tanto a chegar que parecia mesmo uma eternidade. Não sei o que a cuba-libre fez com meu organismo, mas até hoje quando vejo uma garrafa de rum os dedos do meu pé encolhem.

Tentava-se de tudo para evitar a ressaca. Eu preferia um Alka-Seltzer e duas aspirinas antes de dormir. Mas no estado em que chegava nem sempre conseguia completar a operação. Às vezes dissolvia as aspirinas num copo de água, engolia o Alka-Seltzer eia borbulhando para a cama, quando encontrava a cama. Mas os métodos variavam. Por exemplo:

Um cálice de azeite antes de começar a beber - O estomago se revoltava, você ficava doente e desistia de beber.

Tomar um copo de água entre cada copo de bebida - O difícil era manter a regularidade. A certa altura, você começava a misturar a água com a bebida, e em proporções cada vez menores. Depois, passava a pedir um copo de outra bebida entre cada copo de bebida.

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Ressaca de vinho. Pior era a sede. Você se arrastava até a cozinha,tentava alcançar a garrafa de água e puxava todo o conteúdo da geladeiraem cima de você. Era descoberto na manhã seguinte imobilizado por hor-tigranjeiros e laticínios e mastigando um chuchu para alcançar a umida-de. Era deserdado na hora.

pág.17

Canja - Acreditava-se que uma boa canja de galinha de madrugadaresolveria qualquer problema. Era preciso especificar que a canja era paratomar. No entanto, muitos mergulhavam o rosto no prato e tinham de ser socorridos às pressas antes do afogamento.

Minha experiência maior era com a cuba-libre, mas conheço outrostipos de ressaca, pelo menos de ouvir falar. Você sabia que o uísque es-cocês que tomara na noite anterior era paraguaio quando acordava sesentindo como uma harpa guarani. Quando a bebedeira com uísquefalsificado era muito grande, você acordava se sentindo como uma harpa guarani no depósito de instrumentos da boate Catito's em Assunção. A pior ressaca era de gim. Na manhã seguinte, você não conseguiaabrir os dois olhos ao mesmo tempo. Abria um e quando abria o outro,o primeiro se fechava. Ficava com o ouvido tão aguçado que ouvia atéos sinos da catedral de São Pedro, em Roma.

Ressaca de martini doce: você ia se levantar da cama e escorria parao chão como óleo. Pior é que você chamava a sua mãe, ela entrava cor-rendo no quarto, escorregava em você e deslocava a bacia.

Sumo de uma batata, sementes de girassol e folhas de gelatina verdedissolvidas em querosene - Misturava-se tudo num prato pirex forradocom velhos cartões do sabonete Eucalol. Embebia-se um algodão na testa e deitava-se com os pés voltados para a ilha de Páscoa. Ficava-se imóvel durante três dias, no fim dos quais o tempo já teria curado a res-saca de qualquer maneira. Uma cerveja bem gelada na hora de acordar - Por alguma razão ométodo mais popular.

Suco de tomate, limão, molho inglês, sal e pimenta - Para ser to-mado no dia seguinte, de jejum. Adicionando vodca ficava um bloody-mary, mas isto era para mais tarde um pouco.

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Estivemos no inferno e voltamos, inteiros.Um brinde.E um Engov.

Luis Fernando Veríssimo

Ressaca de cachaça. Você acordava sem saber como, de pé numcanto do quarto. Levava meia hora para chegar até a cama porquese esquecera como se caminhava: era pé ante pé ou mão ante mão?Quando conseguia se deitar, tinha a sensação que deixara as duasorelhas e uma clavícula no canto. Olhava para cima e via que aquelamancha com uma forma vagamente humana no teto finalmente sedefinira. Era o Peter Pan e estava piscando para você.

Ressaca de conhaque. Você acordava lúcido. Tinha, de repente,resposta para todos os enigmas do universo. A chave de tudo estavano seu cérebro. Devia ser por isso que aqueles homenzinhos estavamtentando arrombar a sua caixa craniana. Você sabia que era alucina-ção, mas por via das dúvidas, quando ouvia falar em dinamite, salta-va da cama ligeiro.

Ressaca de licor de ovos. Um dos poucos casos em que a lei brasi-leira permite a eutanásia.

De vez em quando alguns dos nossos se encontram e se saúdam em silêncio. Somos como veteranos de velhas guerras lembrando os companheiros caídos e o nosso heroísmo anônimo.

Hoje não existe mais isto. As pessoas bebem, bebem e não acon-tece nada. No dia seguinte estão saudáveis, bem-dispostas e fazematé piadas a respeito.

pág.18

Page 19: Crônicas

O Sermão

'Promete ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença,amando-lhe e respeitando-lhe até que a morte os separe?' Achosimplista e um pouco fora da realidade. Dou aqui novas sugestões de sermões: 'Promete não deixar a paixão fazer de você uma pessoa contro-ladora, e sim respeitar individualidade do seu amado, lembrando sem-pre que ele não pertence a você e que está ao seu lado por livre eespontânea vontade? Promete saber ser amiga(o) e ser amante, sabendo exatamentequando devem entrar em cena uma e outra, sem que isso lhe trans-forme numa pessoa de dupla identidade ou numa pessoa menos romântica? Promete fazer da passagem dos anos uma via de amadure-cimento e não uma via de cobranças por sonhos idealizados quenão chegaram a se concretizar? Promete sentir prazer de estar com a pessoa que você escolheu e ser feliz ao lado dela pelo simples fato de ela ser a pessoa que melhorconhece você e portanto a mais bem preparada para lhe ajudar, assimcomo você a ela?

Promete se deixar conhecer?

Promete que seguirá sendo uma pessoa gentil, carinhosa e edu-cada, que não usará a rotina como desculpa para sua falta de humor?

Promete que fará sexo sem pudores, que fará filhos por amor por vontade, e não porque é o que esperam de você, e que os educa-rá para serem independentes e bem informados sobre a realidade queos aguarda? Promete que não falará mal da pessoa com quem casou sópara arrancar risadas dos outros? Promete que a palavra liberdade seguirá tendo a mesma impor-tância que sempre teve na sua vida, que você saberá responsabilizar-se por si mesmo sem ficar escravizado pelo outro e que saberá lidar com sua própria solidão, que casamento algum elimina?

Promete que será tão você mesmo quanto era minutos antes de entrar na igreja? Sendo assim, declaro-os muito mais que marido e mulher, declaro-os maduros.

Mário Quintana

pág.19

Page 20: Crônicas

Depilação Estava eu assistindo TV numatarde de domingo, naquele horárioem que não se podeinventar nadao que fazer, pois no outro dia é segunda-feira, quando minha mu-lher deitou-sedo meu lado e ficoubrincando com minhas 'partes'.

Aquela frase foi igual um sino na minha cabeça. Por alguns segundos fiquei imaginando o que seriam 'outras coisas'. Respondique não, que doeria coisa e tal, mas ela veio com argumentos sobreas novas técnicas de depilação e eu, imaginando as 'outras coisas',não tive mais como negar. Concordei. Ela me pediu que ficasse pelado enquanto buscaria os equi-pamentos necessários para tal feito. Fiquei olhando para TV, po-rém minha mente estava vagando pelas novas sensações que sódespertei quando ouvi o beep do microondas. Ela voltou ao quar-to com um pote de cêra, uma espátula e alguns pedaços de plásti-co. Achei meio estranho aqueles equipamentos, mas ela estava com um ar de 'dona da situação' que deixaria qualquer médico urologista sentindo-se como residente. Fiquei tranqüilo e autorizei o restante do processo. Pediu paraque eu ficasse numa posição de quase-frango-assado e liberasse oacesso à zona do agrião. Pegou meus ovinhos como quem pega duasbolinhas de porcelana e começou a passar cêra morna. Achei aquelasensação maravilhosa! O Sr. Pinto já estava todo 'pimpão' como quem diz: 'sou o próximo da fila'! Pelo início, fiquei imaginando quais seriam as 'outras coisas' que viriam. Após estarem completa-mente besuntados de cêra, ela embrulhou ambos no plástico comtanto cuidado que eu achei que iria levá-los para viagem. Fiquei imaginando onde ela teria aprendido essa técnica de prazer: naThailândia, na China ou pela Internet mesmo?

Após alguns minutos ela veio com a 'brilhante' idéia: Por quenão depilamos seus ovinhos, assim eu poderia fazer 'outras coisas'com eles.

pág.20

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Saí do banheiro e voltei para o quarto. Ela estava argumen-tado que os pentelhos tinham saído pelas raízes, que demorariamvoltar a nascer. 'Pela espessura da pele do meu saco, aqui não nas-ce nem penugem, meus ovos vão ficar que nem os das 'codornas',respondi. Ela pediu para olhar como estavam. Eu falei para olhara meio metro de distância e sem tocar em nada e se ficar rindo vaientrar na PORRADA!! Vesti a camiseta e fui dormir (somente de camiseta). Naquele momento sexo para mim, nem para perpetuar a espécie humana.

Porém, alguns segundos depois ela esticou o saquinho paraum lado e deu um puxão repentino. Todas as novas sensações fo-ram trocadas por um sonoro PUUTA QUEE ME PARIUUUUquase falado letra por letra. Olhei para o plástico para ver se o couro do meu saco não tinha ficado grudado. Ela disse que ainda restavam alguns pelinhos, e que precisava passar de novo. Res-pondi prontamente: Se depender de mim eles vão ficar aí para a eternidade! Segurei o Dr. Esquerdo e o Dr. Direito com as duas mãos, como quem segura os últimos ovos da mais bela ave amazônicaem extinção, e fui para o banheiro. Sentia o coração bater nos ovos. Abri o chuveiro e foi a primeira vez que eu molhei o saco antes de molhar a cabeça. Passei alguns minutos só deixando a água gelada escorrer pelo meu corpo.

Saí do banho, mas nesses momentos de dor qualquer homemvira um bebezinho novo: fazmerda atrás de merda. Peguei meugel pós-barba com camomila 'que acalma a pele', enchi as mãos epassei nos ovos. Foi como se estivesse passado molho de pimenta.Sentei no bidê na posição de 'lava xereca' e deixei o chuveirinhoacalmar os doutores. Peguei a toalha de rosto e fiquei abanando os ovos como quem abana um boxeador no 10° round. Olhei parameu pinto. Ele, coitado, tão alegrinho minutos atrás, estava tão pequeno que mais parecia irmão gêmeo de meu umbigo. Nesse momento minha mulher bate à porta do banheiro e pergunta se estava passando bem. Aquela voz antes tão aveludada e sedutora ficou igual uma gralha.

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No outro dia pela manhã fui me arrumar para ir trabalhar. Osovos estavam mais calmos, porém mais vermelhos que tomatesmaduros. Foi estranho sentir o vento bater em lugares nunca an-tes visitados. Tentei colocar a cueca, mas nada feito. Procurei al-guma cueca de veludo e nada. Vesti a calça mais folgada que acheino armário e fui trabalhar sem cueca mesmo.

Entrei na minha seçãoandando igualum cowboycagado. Falei bom dia paratodos, mas sem olhar nosolhos. E passei o dia inteirotrabalhando em pé com receio de encostar os to-mates maduros em qual-quer superfície. Resultado,

Ainda dói...

Luis Fernando Veríssimo

certas coisas devem ser feitas somente pelas mulheres. Não adianta tentar misturar os universos masculino e feminino

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Crônica de amor

Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem,caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam umafila de pretendentes batendo a porta. O amor não é chegado a fazercontas, não obedece à razão. O verdadeiro amor acontece por em-patia, por magnetismo, por conjunção estelar. Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referenciais. Ama-sepelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, oupelo tormento que provoca. Ama-se pelo tom de voz, pela ma-neira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quan-do menos se espera. Você ama aquela petulante. Você escre-veu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu floresque ela deixou a seco. Você gosta de rock e ela de chorinho,você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina o Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no ódio vocês combinam.Então? Então, que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobi-lizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora bri-gar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.

Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário. Ele não emplaca umasemana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele nãotem a menor vocação para príncipe encantado e ainda assim vocênão consegue despachá-lo. Quando a mão dele toca na suanuca, você derrete feito manteiga. Ele toca gaita na boca, ado-ra animais e escreve poemas. Por que você ama este cara?Não pergunte pra mim, você é inteligente. Lê livros, revistas,jornais. Gosta dos filmes dos irmãos Coen e do Robert Altman,mas sabe que uma boa comédia romântica também tem seuvalor. É bonita. Seu cabelo nasceu para ser sacudido num co-mercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar.Independente, emprego fixo, bom saldo no banco. Gosta de viajar, de música, tem loucura por computador e seu fettucineao pesto é imbatível. Você tem bom humor, não pega no pé deninguém e adora sexo. Com um currículo desse, criatura, por que está sem um amor?

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Ah, o amor, essa raposa. Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática: você linda + eu inteligente = dois apaixonados. Não funciona assim. Amarnão requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC. Ama-se justamente pelo que o Amor tem de indefinível, honesto existem os milhares, generosos têm às pencas, bons motoris-tas e bons pais de família, ta assim, ó! Mas ninguém consegueser do jeito que o amor da sua vida é! Pense nisso.

Arnaldo Jabor

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Quase

Ainda pior que a convicção do não é a incerteza do talvez, é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda,que me entristece, que me matatrazendo tudo que poderia ter sidoe não foi. Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou aindaestuda, quem quase morreu estávivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportuni-dades que escaparam pelos de-dos, nas chances que se perdempor medo, nas idéias que nunca airão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frie-za dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados.

Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvezesses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor,sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar nãoteria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons decinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma,apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si. Não é que a fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadasresta-nos somente paciência. Porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.

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Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horasrealizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo,quem quase vive já morreu.

Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amoresimpossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazioou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou in-dolor não é romance.

Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar.

Sarah Westphal Batista da Silva

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Amigos

Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos. Não percebem o amor que lhesdevoto e a absoluta necessidade que tenho deles. A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor, eis quepermite que o objeto dela se dividaem outros afetos, enquanto o amortem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade. E eu poderia suportar, emboranão sem dor, que tivessem morrido

todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todosos meus amigos! Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências... A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida. Mas, porque não os procuro com assiduidade, não posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar. Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, emboranão declare e não os procure. E às vezes, quando os procuro,noto que eles não tem noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu,tremulamente, construí e se tornaram alicerces do meu encantopela vida. Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado. Se todos eles morrerem, eu desabo! Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles. E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese,dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo. Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.

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Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer... Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus amigos, e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos! A gente não faz amigos, reconhece-os.

Vinicius de Moraes

Chico, Tom e Vinicius

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Metade

Que a força do medo que tenhonão me impeça de ver o que anseioque a morte de tudo em que acreditonão me tape os ouvidos e a bocapois metade de mim é o que eu gritoa outra metade é silêncioQue a música que ouço ao longeseja linda ainda que tristezaque a mulher que amo seja pra sempre amadamesmo que distantepois metade de mim é partidaa outra metade é saudadeQue as palavras que falonão sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervorapenas respeitadas como a única coisaque resta a um homem inundado de sentimentospois metade de mim é o que ouçoa outra metade é o que caloQue a minha vontade de ir emborase transforme na calma e paz que mereçoque a tensão que me corrói por dentroseja um dia recompensadaporque metade de mim é o que pensoa outra metade um vulcãoQue o medo da solidão se afastee o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportávelque o espelho reflita meu rosto num doce sorrisoque me lembro ter dado na infânciapois metade de mim é a lembrança do que fuia outra metade não sei.Que não seja preciso mais do que uma simples alegriapra me fazer aquietar o espíritoe que o seu silêncio me fale cada vez maispois metade de mim é abrigoa outra metade é cansaço

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Que a arte me aponte uma respostamesmo que ela mesma não saibae que ninguém a tente complicarpois é preciso simplicidade pra fazê-la florescerpois metade de mim é platéiaa outra metade é cançãoQue a minha loucura seja perdoadapois metade de mim é amore a outra metade também.

Oswaldo Montenegro

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Amor e sexo

Uma delas (solteira elírica) me diz: "Sexo e amorsão a mesma coisa..." A outra (casada e prática) retruca: "Não são a mes-ma coisa não..." "Sim, não, sim, não" - nasceu a doce polêmica ali à bei-ra-mar. Continuei meu cooper e deixei as duas lindas discutindo e beben-do água-de-coco. E resolvi escrever sobre essa antiga dualidade: sexo e amor. Comecei perguntando a amigos e amigas sua opi-nião. Ninguém sabe direito. As duas categorias se trepam, tendendo ou para a hipocrisia ou para o cinis-mo; ninguém sabe onde a galinha e onde o ovo. Per-cebo que os mais "sutis" defendem o amor, como algo "superior". Para os mais práticos, sexo é a única coisa concreta. Assim sendo, meto aqui minhas próprias colheres nesta so-pa. O amor tem jardim, cerca, projeto. O sexo invade tudo. Se-xo é contra a lei, no fundo de tudo. O amor depende de nosso desejo, é uma construção que criamos. Sexo não depende de nosso desejo; nosso desejo é que é tomado por ele. Ninguém se masturba por amor. Ninguém sofre sem tesão. O sexo é umdesejo de apaziguar o amor. O amor é uma espécie de gratidãoà posteriori pelos prazeres do sexo.

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O amor vem depois. O sexo vem antes. No amor, perdemosa cabeça, deliberadamente. No sexo, a cabeça nos perde. O amor precisa do pensamento. No sexo, o pensamento atrapalha; só as fantasias ajudam. O amor sonha com uma grande redenção. O sexo só pensa emproibições; não há fantasias permitidas. O amor é um desejo deatingir a plenitude. Sexo é o desejo de se satisfazer com a fini-tude. O amor vive da impossibilidade sempre deslizante para a frente. O sexo é um desejo de acabar com a impossibilidade. O amor pode atrapalhar o sexo. Já o contrário não acontece. Existe amor com sexo, claro, mas nunca gozam juntos. Amor é propriedade. Sexo é posse. Amor é a lei; sexo é in-vasão de domicílio. Amor é o sonho por um romântico latifúndio; já o sexo é o MST. O amor é mais narcisista, mesmo quando fala em "doa-ção". Sexo é mais democrático, mesmo vivendo no egoísmo. Amor e sexo são como a palavra farmakon em grego: remédioou veneno. Amor pode ser veneno ou remédio. Sexo também - tudo dependendo das posições adotadas. Amor é um texto. Sexo é um esporte. Amor não exige a pre-sença do "outro"; o sexo, no mínimo, precisa de uma "mãozi-nha". Certos amores nem precisam de parceiro; florescem atémais sozinhos, na solidão e na loucura. Sexo, não - é mais rea-lista. Nesse sentido, amor é uma busca de ilusão. Sexo é uma bruta vontade de verdade. Amor muitas vezes é uma masturba-ção. Sexo, não. O amor vem de dentro, o sexo vem de fora, o amor vem de nós. O sexo vem dos outros. Não somos vítimas do amor; só do sexo. "O sexo é uma selva de epilépticos" (Nelson Rodrigues) ou "o amor, se não foreterno, não era amor" (NR). O amor inventou a alma, a eterni-dade, a linguagem, a moral. O sexo inventou a moral também do lado de fora de sua jau la , onde e le ruge. O amor tem algo de ridículo, de patético, principalmente nasgrandes paixões. O sexo é mais quieto, como um caubói - quan-do acaba a valentia, ele vem e come. Eles dizem: "Faça amor, não faça a guerra." Sexo quer guerra. O ódio mata o amor, maso ódio pode acender o sexo. Amor é egoísta; sexo é altruísta.

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O amor quer superar a morte. No sexo, a morte está ali, nas bocas... O amor fala muito. O sexo grita, geme, ruge, mas não se explica. O sexo sempre existiu - das cavernas do paraíso até as sau-nas relax for men. Por outro lado, o amor foi inventado pelos poetas provençaisdo século 12 e, depois, revitalizado pelo cinema americano dadireita cristã. Amor é literatura. Sexo é cinema. Amor é prosa;sexo é poesia. Amor é mulher; sexo é homem - o casamentoperfeito é do travesti consigo mesmo. O amor domado protegea produção, sexo selvagem é uma ameaça ao bom funciona-mento do mercado. Por isso, a única maneira de controlá-lo éprogramá-lo, como faz a indústria das sacanagens. O mercado programa nossas fantasias. Não há "saunas relax" para o amor,onde o sujeito entre e se apaixone. No entanto, em todo bordel,finge-se um "amorzinho" para iniciar. O amor está virando um hors-d"oeuvre para o sexo. O problema do amor é que dura muito, já o sexo dura pouco.Amor busca uma certa "grandeza". O sexo sonha com as partesbaixas. O perigo do sexo é que você pode se apaixonar. O peri-go do amor é virar amizade. Com camisinha, há "sexo seguro",mas não há camisinha para o amor.

Arnaldo Jabor