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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
PRATICANDO NO CAMPO O CONHECIMENTO SOBRE PERÍMETRO, ÁREA E VOLUME
Autor: Luiz Zani1
Orientador: Valdeni Soliani Franco2
Resumo
Este artigo tem como objetivo demonstrar a importância da Etnomatemática no ensino da Geometria, tendo o campo como espaço de construção do ensino e da aprendizagem acerca dos conteúdos: perímetro, área e volume. A proposta foi desenvolvida com 20 alunos da 7ª série e 25 da 8ª série no Colégio Estadual Lovat, distrito de Umuarama–Paraná, situada em uma região agrícola. Para o desenvolvimento da proposta optou-se pela pesquisa-ação como procedimento de trabalho. Esse tipo de pesquisa não se limita a descrever uma situação, mas busca gerar eventos que possibilitem o desencadeamento de mudanças significativas no seio da coletividade. As diferentes práticas sociais aprendidas de geração a geração constituem-se em procedimentos ricos de produção de conhecimentos que fazem parte da dinâmica vivenciada pelos indivíduos em diferentes culturas, mas que nem sempre são reconhecidos como conhecimentos autênticos nas práticas escolares. Pensando nisso, a Etnomatemática valoriza a Matemática dos diferentes grupos socioculturais, propondo a valorização dos conceitos matemáticos informais construídos pelos alunos através de suas experiências fora do contexto da escola. Ficou evidente pelo trabalho realizado que à escola cabe constituir-se em uma via de acesso para que cada discente seja valorizado em sua diferença, oferecendo-lhe oportunidades intelectuais e ampliando-as, considerando, sobretudo, que o aprendizado se faz também fora dela. É deste modo que os indivíduos podem valorizar o conhecimento popular próprio e compreenderem melhor o ambiente em que estão inseridos, ou seja, um etnoconhecimento.
Palavras-chave: Educação Matemática; Etnomatemática; perímetro; área; volume.
1Professor de Matemática da Educação Básica. Especialista em Matemática. [email protected]
2Professor Associado do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e
do Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência e a Matemática do Centro de Ciências Exatas da UEM.
1 Introdução
A educação pode ser entendida a partir da ação de seus diversos agentes e,
por consequência, pode exprimir a concepção que se tem a seu respeito. Dessa
forma, torna-se fundamental compreender como o docente que atua na disciplina de
Matemática pode construir suas práticas de ensino, isto é, como planejar ações
pedagógicas a partir de uma tendência contemporânea.
Ao reconhecer a especificidade do campo, com respeito à diversidade
sociocultural, cabe pensar um ensino de Matemática que acolha as diferenças sem
transformá-las em desigualdades. Isso implica que os sistemas de ensino façam
adaptações na sua forma de organização, funcionamento e atendimento para se
adequarem ao que é peculiar à realidade do campo, sem perder de vista as práticas
sociais.
Ao considerar o ensino e a aprendizagem da Matemática em termos de
práticas sociais, pressupõe-se que ensinar e aprender exige indivíduos participantes
e inseridos em um contexto sociocultural, compartilhando costumes, valores e
culturas distintas.
D’Ambrósio (2002) evidencia que a aprendizagem Matemática não pode
estar desvinculada do contexto cultural. Assim sendo, o autor aponta a necessidade
de trabalhar a Matemática institucional a partir da Etnomatemática elaborada pelos
sujeitos que a praticam. O cotidiano dos alunos está saturado de saberes e fazeres
próprios da sua cultura, e a etnomatemática possibilita que esse cotidiano seja
explorado, entendido e transformado.
Para a Etnomatemática, a análise das culturas populares se faz necessária
na perspectiva de uma (relativa) autonomia, associando-as às condições sociais dos
grupos estudados, sem esquecer que, quando confrontadas sociologicamente com
as culturas hegemônicas elas se mostram de diferentes formas (D’AMBRÓSIO,
2002). A relevância de práticas inovadoras no ensino e aprendizagem da Matemática
reforça a necessidade de se pensar um professor que, a partir de uma visão de
totalidade e de uma tentativa de reflexão cuidadosa, possa rever conceitos e tomar
decisões transformadoras que dirijam o seu trabalho.
Assim sendo, é necessário dar uma resposta satisfatória aos alunos, uma
vez que, atualmente, é muito difícil localizar áreas da atividade humana na qual a
matemática ou o seu raciocínio lógico-dedutivo não tenha em menor ou maior grau,
uma real participação. O que não se pode é educar através de um ensino mecânico,
que, muitas vezes, o aluno não tem o conhecimento relativo à importância da
Matemática num determinado contexto (PARANÁ, 2008).
Cabe afirmar que o trabalho docente constitui o exercício profissional do
professor e este é o seu primeiro compromisso com a sociedade, haja vista que sua
principal tarefa é preparar os alunos para se tornarem cidadãos ativos e participantes
na família, no trabalho, nas associações de classe, na vida cultural e política.
Logo, trabalhar com a metodologia proposta pela Etnomatemática é uma
atividade fundamentalmente social, porque contribui para a formação cultural e
científica do povo, tarefa esta indispensável para outras conquistas democráticas. O
desafio é educar as pessoas, proporcionando-lhes um desenvolvimento humano,
cultural, científico e tecnológico, de modo que adquiram condições para enfrentar as
exigências do mundo contemporâneo.
A presente proposta, portanto, justifica-se ao dar ênfase às possibilidades
pedagógicas de trabalho com o ensino da geometria, sobretudo, ao tratar dos
conteúdos relativos ao estudo do perímetro, área e volume, buscando revelar
elementos significativos da abordagem etnomatemática a partir da educação do
campo. Assim, espera-se que o presente trabalho de pesquisa possa servir de
relevante contribuição para os professores atuantes na área.
Portanto, o presente artigo tem como objetivo demonstrar a importância da
Etnomatemática no ensino da Geometria, tendo o campo como espaço de
construção do ensino e da aprendizagem acerca dos conteúdos perímetro, área e
volume.
1.1 A Importância da Etnomatemática no Ensino e Aprendizagem da
Matemática
O ensino da Matemática na sua forma tradicional tem sofrido modificações
na busca do que é o melhor para os discentes e docentes em educação. Conforme o
entendimento de Scandiuzzi (2009), a linha tradicional deixou de ser aceita por
muitos educadores como a melhor, mesmo sendo a mais cômoda e mais segura
para aquele que assume o papel de difusor dessa parte do conhecimento.
Com o fracasso da Matemática Moderna na década de 70 surgiram, entre os
mestres matemáticos, várias abordagens educacionais concernentes a esta
disciplina apontando um componente comum relativo a uma reação contrária à
existência de um currículo comum, assim como a forma autoritária de apresentar a
matemática partindo de uma só visão, como um conhecimento universal e marcado
por anunciar verdades absolutas.
Deste modo, foi constatado que não havia espaço na Matemática Moderna
para a valorização do conhecimento que o aluno trazia para a sala de aula
procedente do seu social. Nesse sentido, os educadores matemáticos passaram a
compreender a necessidade de viabilizar um outro tipo de conhecimento que
considerasse as práticas sócias vivenciadas pelos educandos (SCANDIUZZI, 2009).
Na tentativa de propor que os programas educacionais enfatizassem as
matemáticas produzidas pelas diferentes culturas, em meados da década de 1970
surgiu a etnomatemática com o papel de reconhecer e registrar questões de
relevância social que produzem o conhecimento matemático. Essa tendência
considera que não existe um único, mas vários e distintos conhecimentos e nenhum
é menos importante que outro. As manifestações matemáticas são percebidas por
meio de diferentes teorias e práticas, das mais diversas áreas que emergem dos
ambientes culturais (PARANÁ, 2008).
Etnomatemática é a matemática praticada por grupos culturais, tais como comunidades urbanas e rurais, grupos de trabalhadores, classes profissionais, crianças de uma certa faixa etária, sociedades indígenas, e tantos outros grupos que se identificam por objetivos e tradições comuns aos grupos. Além desse caráter antropológico, a etnomatemática tem um indiscutível foco político. A etnomatemática é embebida de ética, focalizada na recuperação da dignidade cultural do ser humano (D’AMBROSIO, 2002, p. 9).
A etnomatemática busca uma organização da sociedade que permite o
exercício da crítica e a análise da realidade. É uma importante fonte de investigação
da Educação Matemática, que prioriza um ensino que valoriza a história dos
estudantes pelo reconhecimento e respeito e suas raízes culturais. D’Ambrósio
(2001, p. 42) afirma que “reconhecer e respeitar as raízes de um indivíduo não
significa ignorar e rejeitar as raízes do outro, mas, num processo de síntese, reforçar
suas próprias raízes”. Para este autor, o enfoque da Etnomatemática ilustra
relacionar uma questão maior, como o ambiente do indivíduo e as relações de
produção e trabalho, assim como a vinculação das manifestações culturais como
arte e religião.
Cabe afirmar que o trabalho docente constitui o exercício profissional do
professor e este é o seu primeiro compromisso com a sociedade, haja vista que sua
principal tarefa é preparar os alunos para se tornarem cidadãos ativos e participantes
na família, no trabalho, nas associações de classe, na vida cultural e política.
Logo, trabalhar com a metodologia proposta pela Etnomatemática é uma
atividade fundamentalmente social, porque contribui para a formação cultural e
científica do povo, tarefa esta indispensável para outras conquistas democráticas. O
desafio é educar as pessoas, proporcionando-lhes um desenvolvimento humano,
cultural, científico e tecnológico, de modo que adquiram condições para enfrentar as
exigências do mundo contemporâneo.
Na Educação Matemática há uma preocupação muito positiva em busca de
caminhos que respondam às expectativas dos envolvidos no processo educacional.
“Sabemos que não existe o melhor caminho, mas, ao ampliarmos as possibilidades
de escolha, o ensino/educação será melhor conduzido” (SCANDIUZZI, 2009, p. 06).
Assim sendo, o autor lembra que os conflitos que abarcam as abordagens
metodológicas existentes tendem a desaparecer, à medida que os educadores se
propõem a conhecer e investigar cada uma e a utilizá-las no momento adequado.
Freire (1982, p. 104) lembra que, na medida em que a sociedade vai
fazendo girar a sua produção de tal maneira que as relações sócias de produção, ou
em torno dessa produção, se deem em termos de solidariedade e não de
competição, espera-se também que, “[...] dentro das escolas, a produção do
conhecimento e o exercício de conhecer o conhecimento que já existe se de em não
em termos de competitivo, mas sim de solidariedade”.
É por isso que a abordagem da Etnomatemática faz pensar que o ensino da
Matemática trata “[...] da construção do conhecimento matemático sob uma visão
histórica, de modo que os conceitos são apresentados, discutidos, construídos e
reconstruídos e também influenciam na formação do pensamento humano e na
produção de sua existência por meio das idéias e das tecnologias” (PARANÁ, 2006,
p. 24).
O educador democrático não pode se negar ao dever de, na sua própria
prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, suas
tarefas primordiais e trabalhar junto os conhecimentos que os alunos trazem para a
escola (FREIRE, 1997). É por isso que embasada numa perspectiva democrática de
educação, a Etnomatemática é reconhecida como uma metodologia que:
[...] não se esgota no entender o conhecimento [saber e fazer] matemático das culturas periféricas e marginalizadas. Também o conhecimento das culturas dominantes deve ser entendido de forma muito mais geral que a simples descrição e assimilação de teorias e práticas consagradas pelo ambiente acadêmico. Deve-se entender o conhecimento, seja das culturas periféricas e marginalizadas, seja das dominantes, na complexidade do ciclo da sua geração, organização intelectual, organização social e difusão. Deve-se também levar em forte consideração a dinâmica cultural dos encontros [de indivíduos e de grupos] e a dinâmica de adaptação e reformulação que acompanha o ciclo da geração, organização intelectual, organização social e difusão do conhecimento. O Programa Etnomatemática tem, portanto, ligações com a Etnografia e a Antropologia, com a Cognição e a Lingüística, com a História e a Sociologia, com a Filosofia e a Religião, e com a Educação e a Política. Mas vê todas essas ligações com a visão da transdisciplinaridade. O fato não se subordina às classificações disciplinares (D’AMBROSIO, 2009, p. 01).
Assim, a Etnomatemática visualiza uma prática pedagógica corporificada
nos sujeitos que a fazem, professores e alunos ensinando e aprendendo, nos
processos de ensinar e aprender, situando-se nos conhecimentos plurais de seu
campo em suas especificidades e nos diálogos que fazem com outras ciências,
numa perspectiva interdisciplinar e dialógica. Há um entendimento similar entre
autores como (FREIRE, 1997; GARCIA, 2005; PRETTO, 2005; GASPARIN, 2009),
entre outros, de que o ato de aprender a aprender é uma das principais funções do
ato de ensinar, ou melhor, do ato de educar.
Os educadores Matemáticos precisam estar em sintonia com a grande
missão de educador. O educador matemático que não percebe que há muito mais
na sua missão de educador do que ensinar a fazer continhas ou a resolver equações
e problemas absolutamente artificiais, mesmo que, muitas vezes, tenha a aparência
de estar se referindo a fatos reais está equivocado (D’ AMBRÓSIO, 2002).
A proposta pedagógica da etnomatemática, segundo a visão de D’Ambrosio
(2002) consiste em fazer da matemática algo vivo, lidando com situações reais no
tempo [agora] e no espaço [aqui]. E, através da crítica, questionar o aqui e agora. Ao
fazer isso, é possível trabalhar nas raízes culturais e praticar a dinâmica cultural,
reconhecendo na educação a importância das várias culturas e tradições na
formação de uma nova civilização, transcultural e transdisciplinar.
Assim, acredita-se ser possível abandonar a exclusividade atribuída à
técnica, e os professores podem se mostrar favoráveis a uma prática acolhedora,
confiante, dialógica, questionadora e provocadora. Em relação à disciplina
Matemática, pode surgir uma proposta mais global, relacionada a conteúdos,
sentimentos, cooperação, participação e/ou incertezas.
Nessa perspectiva, segundo Freire (1982), o domínio das habilidades
didáticas opõe-se ao espontaneismo e ao amadorismo, havendo, assim, a
necessidade do resgate da técnica, enquanto recurso de organização e condução da
atividade fundada na ciência. O domínio das relações situacionais implica a
compreensão, por parte dos sujeitos de si mesmo, dos outros, de suas relações
recíprocas, da sua pertinência ao grupo social e à humanidade como um todo.
Na realidade, o docente professor precisa estar atento ao fato de que o
sistema social faz exigências ao sistema educacional, que acaba por determinar os
fins da educação. A partir daí, cabe-lhe a importante missão de refletir sobre tais
exigências, identificando aquelas que devem ser satisfeitas e aquelas que devem
sofrer influências transformadoras por parte do seu trabalho. Posteriormente, deve-
se pensar na formulação de objetivos, seleção e planejamento de conteúdos e
metodologias adequadas para o desenvolvimento do processo de ensino-
aprendizagem (AFONSO, 2005).
Na visão de Freire (1982), os docentes precisam ser inovador e criativo,
devendo tratar os conteúdos de forma coerente com os seus objetivos, rompendo
com a fragmentação na sua ação didática. Tais reflexões fazem perceber como é
importante o professor de Matemática determinar, de início, o que o aluno será
capaz de fazer ao final do aprendizado.
Segundo D’Ambrósio (1998), o entendimento e respeito à prática da
etnomatemática abre um grande potencial para o senso de questionamento,
reconhecimento de parâmetros específicos e sentimento de equilíbrio global da
natureza. Todavia, na visão do autor, as práticas etnomatemáticas ainda encontram-
se muito desvalorizadas no sistema escolar, em todos os níveis de escolaridade e
até mesmo na vida profissional, sendo muitas vezes descartadas para o
conhecimento matemático. A etnomatemática tem relevantes implicações
pedagógicas, pois:
[...] educação é, em geral, um exercício de criatividade. Muito mais que transmitir ao aprendente teorias e conceitos feitos, para que ele as memorize e repita quando solicitado em exames e testes, a educação deve fornecer ao aprendente os instrumentos comunicativos, analíticos e tecnológicos necessários para sua sobrevivência e transcendência. Esses instrumentos só farão sentido se referidos à cultura do aprendente ou explicitados como tendo sido adquiridos de outra cultura e inseridos num discurso crítico. O Programa Etnomatemática destaca a dinâmica e a crítica dessa aquisição (D’AMBROSIO, 2009, p. 01).
O autor supracitado descreve a Etnomatemática como uma metodologia de
retraçar e avaliar os processos de geração, comunicação, propagação e
institucionalização do conhecimento. É também um esforço para entender como os
diferentes processos identificados ao longo da história das civilizações têm
determinado diferentes procedimentos de comportamento individual, diferentes
processos cognitivos, diferentes modos de interação e, portanto, de comportamento
coletivo ou social em diferentes culturas.
D’Ambrosio (2002, p. 36) lembra que a Geometria, por exemplo, na sua
origem e no próprio nome, está relacionada com as medições do terreno.
[...] como nos conta Heródoto, a geometria foi apreendida dos egípcios, onde era mais que uma simples medição de terreno, tendo tudo a ver com o sistema de taxação de áreas produtivas. Por trás desse desenvolvimento, vemos todo um sistema de produção e uma estrutura econômica, social e política, exigindo medições de terra e, ao mesmo tempo, aritmética para lidar com as economias e com a contagem dos tempos. Enquanto esse sistema de conhecimento se desenvolvia, há mais de 2.500 anos, nas civilizações em torno do Mediterrâneo, os indígenas aqui da Amazônia estavam também tentando conhecer e lidar com o seu ambiente, desenvolvendo sistemas de produção e sistemas sociais, que igualmente necessitavam medições de espaço e de tempo. Igualmente os esquimós, as civilizações andinas, e aquelas da China, da Índia, da áfrica sub-Sahara, enfim em todo o planeta. Todas estavam desenvolvendo suas maneiras de conhecer (D’AMBROSIO, 2002, p. 36).
É preciso pensar, portanto, que a cultura constitui-se um conjunto de
comportamentos compatibilizados e de conhecimentos compartilhados, abarcando
valores. Assim, é possível dizer que numa mesma cultura, os indivíduos dão as
mesmas explicações e utilizam os mesmos instrumentos materiais e intelectuais no
seu cotidiano.
O conjunto desses instrumentos se manifesta nas maneiras, nos modos, nas habilidades, nas artes, nas técnicas, nas ticas de lidar com o ambiente, de entender e explicar fatos e fenômenos, de ensinar e compartilhar tudo isso, que é o matema próprio ao grupo, à comunidade, ao etno. Isto é, na sua etnomatemática (D’ AMBROSIO, 2002, p.35).
Para o autor supracitado, a proposta da etnomatemática não significa a
rejeição da matemática acadêmica, mas consiste em aprimorar os conhecimentos
acadêmicos, incorporando aos mesmos, valores de humanidade, sintetizados numa
ética de respeito, solidariedade e cooperação.
A Etnomatemática viabiliza uma relação/educação dialógica em que os
conteúdos tradicionais têm uma importância secundária, ou seja, estarão a serviço
no sentido e do desvelar da realidade para o desenvolvimento dos discentes (D’
AMBRÓSIO, 2002). É por isso que terão significância os conteúdos que, de certo
modo, ofereçam subsídios à intenção de desvelar a realidade, isto é, que sejam
conteúdos críticos e façam parte da matemática acadêmica ou da etnomatemática
da comunidade, devendo, pois:
[...] excluir toda auto-suficiência, dialogar com igualdade, aceitar a diferença e a alteridade, deixar que seja o outro que se defina aceitando a autoleitura a partir da própria identidade. Esta postura reconhece a capacidade social de decisão e o direito de participação na programação dos processos de formação de todos os povos minoritários e/ou majoritário que não tenha voz e vez na sociedade nacional. Reconhecemos e aceitamos a pluralidade cultural e o direito de manejar, de maneira autônoma, os recursos de sua cultura. São esses povos que devem decidir seu futuro, segundo projetos que partam de seus interesses e aspirações. Sob esta concepção temos muito que caminhar no processo de formação de educadores matemáticos e o programa da etnomatemática pode contribuir neste momento histórico (SCANDIUZZI, 2009, p. 09).
Com este entendimento, a etnomatemática privilegia o raciocínio qualitativo,
uma vez que o enfoque da proposta sempre está ligado a uma questão maior, de
natureza ambiental ou de produção, e a etnomatemática raramente se apresenta
desvinculada de outras manifestações culturais. A etnomatemática se harmoniza
com uma concepção multicultural e holística de educação em matemática.
2 Etnomatemática Aplicada ao Ensino da Geometria: O campo como espaço de
construção do ensino e aprendizagem
A prática pedagógica de intervenções matemáticas tem sido recomendada
por diversos estudiosos como forma de concluir para uma melhor compreensão da
matemática. Na intervenção matemática, o aluno é chamado a agir como um
matemático, não apenas porque é solicitado a propor questões, mas, principalmente,
porque formula conjecturas a respeito do que está investigando.
Ao indicar uma determinada experiência de aprendizagem escolar, um aluno
pode até saber os conceitos da mesma, conceitos adquiridos espontaneamente, em
geral mais carregado de valores por resultarem de experiências pessoais, onde
ocorre através da interação com os outros, de influência dos meios onde vivem.
É preciso tratar as noções relativas ao perímetro, área e volume por meio de
atividades significativas. Pressupõe-se que problematizadas a partir da realidade do
aluno, as atividades relativas ao conteúdo de Geometria tem-se no campo, o espaço
de referência, de modo que seja possível situá-lo, analisá-lo e perceber seus objetos
para, assim, representá-los.
Com esse propósito, apresenta-se a seguir os resultados da prática
desenvolvida com os alunos das 7ª e 8ª séries no Colégio Estadual Lovat, distrito de
Umuarama – Paraná, situada em uma região agrícola.
Para o desenvolvimento da proposta optou-se pela pesquisa-ação como
procedimento de trabalho. Esse tipo de pesquisa não se limita a descrever uma
situação, mas busca gerar eventos que possibilitem o desencadeamento de
mudanças significativas no seio da coletividade. A opção por essa linha de
investigação considerou que os problemas fazem parte do contexto interativo entre
indivíduo e comunidade, estando fundamentada no entendimento de que os
indivíduos vivem em uma sociedade, e sua conduta é marcada por outros indivíduos
que interagem constantemente.
A pesquisa ação possibilitou a compreensão e intervenção na situação, com
vistas a modificá-la, e o conhecimento pretendido articula-se a uma finalidade
intencional de alteração da situação pesquisada. Deste modo, “[...] ao mesmo tempo
que realiza um diagnóstico e a análise de uma determinada situação, a pesquisa-
ação propõe ao conjunto de sujeitos envolvidos mudanças que levem a um
aprimoramento das práticas analisadas” (SEVERINO, 2007, p. 120).
Ao admitir que os sujeitos constituem parte da realidade e, portanto, atuam
como agentes modificadores da história, permitindo a contextualização sociocultural
dos conteúdos acadêmicos, os eventos trabalhados com embasamentos na
metodologia da Etnomatemática constituíram-se em um conjunto de procedimentos,
ideias, vivências e práticas que permitiram ao docente e discentes problematizarem
a sua realidade e apreender os conteúdos trabalhados.
Para tal, buscou-se compreender as práticas sociais a partir de situações do
cotidiano dos alunos: observação do perímetro e áreas das hortas, canteiros e
estufas, volume dos reservatórios de água, observar objetos que têm formas
retangulares, por exemplo, para o conhecimento elaborado cientificamente possa ter
significado para o aluno.
2.1 Medidas de Comprimento
As atividades buscaram elaborar as visões, experiências e expectativas em
relação à aprendizagem de perímetro, visando desenvolver em cada aluno as
capacidades de trabalhar de tomar decisões, formular e resolver problemas
relacionados à geometria usada na construção de hortas e canteiros.
Assim, por meio das atividades sugeridas, o professor levou os alunos a
refletirem acerca do que foi pesquisado no campo, propiciando condições para que
os mesmos pudessem construir esquemas mais elaborados, organizando os
pensamentos e ações, para aprenderem com maior qualidade e profundidade o que
já fazem no seu cotidiano.
Ao tratar das medidas de comprimento, o professor trabalhou no próprio
campo com uma visita a uma horta próxima ao Colégio. O professor explicou que os
agricultores delimitam o tamanho da horta “perímetro e área”, geralmente, utilizando
o metro ou a trena, em alguns casos, medem com passos, contando um metro a
cada passo. Para cercar uma horta de forma retangular, com o auxílio de uma trena,
o agricultor mede as laterais, à frente e o fundo, obtendo o perímetro: laterais +
frente + fundo (soma dos lados) é igual ao perímetro.
Ao tratar das medidas de comprimento, o professor trabalhou as figuras
representadas a seguir no próprio campo, ou seja, na horta. O professor explicou
que o perímetro de um polígono é a soma das medidas dos seus lados. Com relação
ao perímetro do retângulo, os alunos foram levados a compreender os aspectos
relacionados à figura abaixo identificando que:
Figura 1: Exemplos de perímetro de um retângulo (fórmula).
Fonte: O autor
dois lados de medida b. dois lados com medida h. Perímetro = 2b + 2h = 2(b + h)
Posteriormente, o professor trabalhou os polígonos regulares evidenciando
os aspectos retratados nas figuras relativas ao triângulo equilátero, quadrado,
pentágono e hexágono, conforme ilustrados a seguir:
Figura 2: exemplos de perímetro de um
Triângulo equilátero (fórmula).
P = L + L + L
P = 3 x L L- medida do lado do polígono regular
P - perímetro do polígono regular
Figura 3: exemplos de perímetro de um quadrado (fórmula).
P = L + L + L+ L P = 4 x L
L- medida do lado do polígono regular P - perímetro do polígono regular
Figura 4: exemplos de perímetro de um Pentágono regular(formula).
Figura 5: exemplos de perímetro de um Pentágono Hexágono regular(formula).
P = L + L + L + L + L P = 5 x L
P = L + L + L + L + L + L P = 6 x L
L- medida do lado do polígono regular L- medida do lado do polígono regular P - perímetro do polígono regular P - perímetro do polígono regular
Fonte: O autor Fonte: O autor
A seguir, o professor auxiliou os alunos a perceberem que para um polígono
de N lados têm perímetro P = N x L.
Os alunos foram levados a uma horta da própria escola para estudar cálculo
de perímetro e área utilizando a teoria proposta no projeto. Utilizando uma trena
foram medidas a largura (h) e o comprimento (b) do canteiro de alface.
Posteriormente, com os dados obtidos foi calculado o perímetro e a área utilizando a
seguinte fórmula: h+h+b+b = perímetro e b x h = área.
A circunferência do pé de alface também foi calculada partindo do ponto
inicial p, envolvendo o pé de alface com a trena, até chegar no ponto inicial p.
Assim, encontramos o perímetro, obtendo o raio do pé de alface, considerando o
centro da circunferência, o tronco do pé de alface; e os pontos da circunferência no
final das folhas.
A circunferência do reservatório de água foi medida envolvendo a caixa de
água com a trena. Continuando com a atividade no campo foi verificado o diâmetro.
Para tal, foi comparado com o resultado obtido por meio da formula C = 2 π r e, em
seguida, a área do círculo A = π r2 foi calculada. Foram contados quantos pés de
alface havia no canteiro, de posse destes dados os alunos compreenderam que a
maneira de trabalho dos agricultores difere apenas em parte das teorias científicas,
pois os agricultores utilizam técnicas que não estão respaldadas em fórmulas
matemáticas convencionais, mas criam mecanismos práticos que correspondem
satisfatoriamente para a solução dos problemas diários no campo, aproximando-se
da perspectiva que é defendida pela etnomatemática.
Os alunos demonstraram muito interesse nas atividades propostas. O
professor foi o mediador da prática no sentido de favorecer a compreensão dos
mesmos.
Professor como é interessante a técnica utilizada pelos agricultores. È bem mais fácil do jeito deles. A gente percebe que a matemática faz parte da vida igual o senhor falou (Aluno 7ª série). Eu também gostei muito é melhor que na sala de aula, a gente aprende divertindo. Na escola a gente aprende usando um monte de fórmulas e não sabe prá que serve na prática a gente percebe que a matemática ajuda na vida da gente. (Aluno 7ª série).
Nessa perspectiva, os conceitos cotidianos e os científicos tiveram no
educador o unificador do trabalho pedagógico. Em conformidade com Gasparin
(2009):
Os conceitos científicos não passam diretamente aos alunos, nem os conceitos cotidianos são subsumidos, automaticamente, pelos científicos. É na caminhada dialógico-pedagógica que se dá o encontro das duas ordens de conceitos: os conceitos cotidianos são incorporados e superados pelos científicos. Realizam-se, por intermédio do trabalho coletivo e individual, a interaprendizagem e a intra-aprendizagem. Os conceitos cotidianos ou espontâneos são expressos pelo senso comum e pelos conhecimentos empíricos que os alunos adquiriram no seu dia a dia, nas vivências fora da escola. São representados por aqueles conhecimentos científicos que foram adquiridos pela via escolar e que já se incorporaram à vida de cada um deles e que, portanto, também fazem parte do cotidiano. Os conceitos cotidianos, de certa forma, indicam tudo o que o educando é capaz de realizar sozinho. É o seu nível de desenvolvimento atual. Neste nível ele não necessita da escola. Ele sabe (GASPARIN, 2009, p. 115).
A Etnomatemática favorece o confronto dos conhecimentos científicos
apresentados pelo professor com os conhecimentos do cotidiano, partindo de uma
postura diferenciada por parte dos educadores que:
2.2 Utilizando a Estufa e a Trena de Carpinteiro
Essa atividade foi realizada em uma horta utilizando como instrumento
pedagógico a estufa e a trena de carpinteiro. Para a compreensão dos alunos a
trena foi esticada sobre a lateral da estufa, obtendo o resultado de 45m.
Em seguida, os alunos esticaram a trena na frente da estufa, obtendo o
resultado de 6 metros, ou seja, o perímetro é igual a 45 + 45 + 6 + 6 ou 2 X 45 + 2 X
6. Concluímos, então, que o perímetro foi igual à soma dos lados da estufa, ou seja,
igual a 102 metros.
Posteriormente, os alunos construíram um canteiro retangular com um
perímetro de 36 metros. Os alunos usaram a trema medindo várias vezes o canteiro
a ser construído (a planta do canteiro). Após as medidas os mesmos chegaram à
conclusão de que o canteiro teria que possuir as seguintes medidas: 15m de
comprimento e 3 m de largura, para que o perímetro seja igual a 36 metros.
Na sequencia, foi realizada a delimitação da planta baixa de um reservatório
de água de forma quadrada com perímetro de 8 metros. Nesta atividade, os alunos
foram mais rápidos. Raciocinaram da seguinte maneira: se o reservatório é
quadrado, basta dividir 8 por 4 para obter a medida de um lado que é igual a 2
metros. Assim sendo, desenvolveram as atividades a partir do seguinte raciocínio.
Traçaram uma linha a partindo de um ponto X onde foi cravado um marco de
madeira. A linha foi esticada até o ponto Y onde foi cravado outro marco de madeira.
A medida da distância entre o ponto X até Y foi de 3 metros.
Foi construída outra linha c, paralela à linha a. Foi medida uma distância
entre elas obtendo-se 2 metros, partindo do ponto W onde foi cravado um marco de
madeira. Após a linha c foi esticada até o ponto Z onde foi cravado outro marco de
madeira. A distância do marco W até o Z foi é de 3 metros.
A partir de uma linha b, perpendicular à linha a e c, partindo do ponto K foi
cravado um marco de madeira. P. A linha b foi esticada até o ponto H onde foi
cravado outro marco de madeira. A distância do marco K até o H foi de 3 metros.
Também, construiu-se uma linha d perpendicular à linha a e c e paralela com
a linha b com uma distância entre elas de 2 metros, partindo do ponto U onde foi
cravado um marco de madeira. Após foi esticada uma linha d até o ponto V onde foi
cravado outro marco de madeira. A distância do marco U até o V foi é de 3 metros.
De posse desses conhecimentos os alunos foram levados a resolver a
seguinte questão: Dispondo de 64 m de tela para cercar a horta, existirão várias
possibilidades de retângulos (medidos em metros). Para tal, o professor apresentou
aos alunos as possibilidades, considerando que:
A figura A mede = 20 x 12
A figura B mede17 x 15
A figura C mede 25 x 7
Figura 6: Exemplos de retângulos.
Fonte: O autor
Os alunos constataram que os 64 m de tela foram distribuídos de formas
diferentes, e que a área apresentou variações de acordo com as medidas dos lados.
Contudo, chegou-se à conclusão de que havia uma maneira de cercar a horta que
faz com que a área para o plantio das hortaliças seja máxima. Para a atividade o
professor lançou o desafio referente às seguintes questões:
Com o auxilio da trena de pedreiro, os alunos construíram vários retângulos
verificando as respectivas áreas. Com a utilização da fórmula matemática A = B X H
e chegaram à conclusão que o retângulo que possui maior área é o representado na
figura B.
As atividades propostas se constituíram em desafios para os alunos que se
mostraram envolvidos com as mesmas, propiciando o diálogo construtivo com os
alunos que estiveram sempre atentos. Nessa perspectiva, os educadores precisam
ter “[...] sensibilidade social, histórica e política e uma boa formação pedagógica para
ser capaz de compreender bem a sua própria prática, refletir sobre a sua prática
diária” (FREIRE, 1982, p. 23).
Zaccur (2005) lembra que:
[...] diálogos acontecem em qualquer tempo e lugar. Diálogos implicam diferentes dimensões do tempo e re-significações que se dá em diferentes espaços. Cotidianos que são inerentes que são as interações pontuais, eles também se disseminam incontidos, e sobre eles, igualmente, incidem ressonâncias de diálogos travados em outros espaços-tempos. É que as palavras, uma vez proferidas, o vento as leva, e a exemplo do pólen, os pensamentos são fertilizados com fragmentos de idéias de outros. É que diálogos espalham palavras-semente que germinam em poucos ou muitos instantes, mas também, séculos e milênios depois. E diálogos necessariamente se reconfiguram, seja por que o momento único em que são produzidos é irrepetível, seja por que a nossa escuta deles é sempre outra recriação (ZACCUR, 2005, p. 07).
Nesse entendimento, as atribuições da Educação Matemática exigem uma
ação docente na qual o professor precisa atuar como profissional reflexivo, crítico,
responsável e competente no âmbito de sua disciplina, diferentemente do que
ocorria no passado. Além disso, ele precisa ter capacidade para exercer a docência
a realizar atividades de investigação.
A aprendizagem deve estar voltada para o aluno utilizando métodos que
contribuam para o entendimento do que está sendo ensinado, cabendo ao professor
ter consciência do seu papel no contexto educacional, para que possa ser um
agente transformador da sociedade, defensor do ensino para todos (PARANÁ,
2008).
2.3 Construção de uma Estufa
Os alunos se deslocaram para uma chácara próxima à escola que trabalha
com o cultivo de hortaliças na estufa. Os alunos observaram a construção da estufa,
a espessura dos ferros que é dada em polegada. Na oportunidade, o professor
comentou sobre a origem e a unidade de medida polegada.
A unidade de medida denominada polegada foi criada pelo rei Eduardo I, da
Inglaterra, durante o século XVI. Sua origem está ligada à medição utilizando o
próprio polegar, consistindo na largura entre a base da unha e a ponta do dedo. A
média do polegar de um humano adulto corresponde a aproximadamente 2,54
centímetros.
Atualmente, a medida polegada é muito utilizada em situações cotidianas,
como referencial para a grossura dos canos, o tamanho da tela de televisores e
monitores de computador. Quando nos deparamos com uma promoção informando
que a televisão possui 29 polegadas de tela, estamos diante de um aparelho que
possui a medida da diagonal da tela de aproximadamente 73,66 centímetros. Para
realizar essa conversão foi explicado aos alunos que basta utilizar uma simples
regra de três, conforme modelo abaixo.
Polegadas Centímetros
1 2,54
29 x
Tabela 1 – Exemplos de conversão de polegadas
para centímetros utilizando a regra de três
1 . x = 29 . 2,54 x = 73,66 cm Fonte: O autor
A medida da tela fornecida em polegadas faz referência à medida da
diagonal da tela em centímetros. Para facilitar a explicação foram ilustradas algumas
relações entre as medidas em polegadas e em centímetros, conforme a Tabela
abaixo:
Polegadas Centímetros
14
20
35,55
50,8
21 53,35
32 81,28
42 106,68
52
62
132,08
157,48
Tabela 2: Exemplo de conversão de polegadas para centímetros
Fonte: O autor
Foram propostas algumas atividades aos alunos. Primeiramente foi proposto
aos alunos que resolvessem a seguinte questão: Na construção dos arcos de uma
estufa são utilizados canos de ferro galvanizados com a espessura de 3/4 de
polegadas. Qual é a espessura deste cano em cm?
Polegadas Centímetros
1 2,54
3/4 X
Tabela 3: Resolução de situações problemas (regra de três).
Fonte: O autor
Ou ainda:
Para fixar os arcos são utilizados pedaços de canos de meia polegada. Qual
é a espessura deste cano em cm?
Polegadas Centímetros
1 2,54
1/2 X
Tabela 4: Resolução de situações problemas (regra de três).
Fonte: O autor
As atividades foram importantes para auxiliar os alunos na compreensão do
uso de medidas, levando-os a perceberem que conforme a situação e o tamanho do
objeto a unidade de medida utilizada é diferente. Foi possível constatar o
envolvimento dos alunos e a compreensão do assunto abordado, aproximando-se
do entendimento proposto pela etnomatemática que evidencia o entendimento da
matemática em uso.
Nessa perspectiva, o docente ficou atento aos aspectos acima enunciados, a
fim de conduzir a ação educativa em Matemática capaz de levar os alunos a
discernir valores e concepções de vida, de homem e de sociedade. Daí a
necessidade de o docente considerar fundamentalmente a educação Matemática
como um processo de ação da sociedade sobre o aluno, visando integrá-lo,
seguindo seus padrões sociais, econômicos, políticos e seus interesses.
Ao tratar do estudo da Geometria é fato que esta abarca as propriedades
espaciais do mundo material, entendendo-se “espaciais” as propriedades que são
determinadas pela forma, grandeza e objetos. A necessidade, pois, de conhecer
estas propriedades, está ligada às atividades práticas das pessoas: é preciso medir
comprimentos, áreas e volumes para construir máquinas, edifícios, abrir caminhos,
plantar, colher etc.
Para tal, faz-se necessário que o ensino de Matemática seja realizado com
base em práticas contextualizadas, ou seja, que parta de situações do cotidiano para
o conhecimento elaborado cientificamente, validando e articulando os
conhecimentos e saberes presentes nas práticas cotidianas dos discentes com os
conhecimentos presentes no âmbito escolar.
Daí a preocupação em implantar as ideias relacionadas à Etnomatemática
no contexto escolar na Educação do Campo. As relações entre a Matemática
cotidiana e a Matemática escolar pressupõem a valorização do conhecimento
matemático cotidiano com a pretensão de auxiliar no aprendizado da disciplina.
Figura 7 - Estufa Fonte: Disponível em: http://www2.ufla.br/~wrmaluf/bth055/Image14.gif
2.4 Área e Volume
Os alunos foram conduzidos até a horta para estudar cálculo de área e
volume utilizando a teoria do projeto. As atividades foram relevantes para a
compreensão de área e volume.
Com o auxílio de uma trena de pedreiro medimos a largura (h) e o
comprimento (b) do canteiro de alface e calculamos b x h = área. Medimos a
circunferência do pé de alface partindo do ponto inicial p, envolvendo o pé de alface
com a trena ate chegar no ponto inicial p encontramos o diâmetro, o raio do pé de
alface (o cento da circunferência é o tronco do pé de alface, a extremidade da
circunferência é o no final das folhas), (A = π r2), medimos reservatório de água de
forma de um cubo e de forma de um circulo, professor explicou aos alunos que para
medir a área (quadrada e retangular), os agricultores utilizam uma trena ou uma
corda, medindo a frente e a lateral. Após, multiplicam um resultado pelo outro.
A área diz respeito à superfície de uma figura geométrica. Cada figura
possui uma fórmula para obter a sua área. Em um retângulo, a área é dada pela
multiplicação entre a medida de seus dois lados desiguais. Por exemplo, se um
retângulo possui um lado medindo 2 cm e o outro medindo 4cm, a sua área será de
8 cm2. A unidade de medida da área é sempre acompanhada pelo expoente 2, que
significa ao quadrado.
Figura 8: Área do quadrado de lado L Fórmula: Aq = L x L
Fonte: O autor
Figura 9: Área do retângulo cujas medidas dos lados são a e b
Fórmula: Ar = a x b Fonte: O autor
Foi explicado que, para medir volume, os agricultores utilizam a trena ou
uma corda, multiplicando a área da superfície pela a altura do cilindro. Por exemplo,
para medir o volume de um reservatório de água, eles calculam a área da superfície,
em seguida multiplicam pela altura do reservatório, encontrando o volume em
metros cúbicos. Os agricultores têm o conhecimento que em cada metro cúbico,
cabem mil litros de água. Assim, os agricultores multiplicam o resultado encontrado
por mil.
Calcular volume é determinar sua capacidade e o espaço ocupado por ele.
Foi explicado que para calcular volume de um reservatório de água retangular ou
cúbico, basta tomar a área da base multiplicar pela medida da altura, assim:
V = Ab x h ou simplesmente V = a x b x h
Tomamos como experiência um reservatório de água cúbico onde
a = 1metro, b = 1 metro e c = 1 metro. Então,
V = a x b x c
V = 1 x 1 x 1
V = 1 m3
C = 1 x 1000 litros
C = 1000 litros de água
Esta experiência foi muito significativa. Os alunos tiveram a oportunidade de
aprender que o montante de água que corresponde 1 m3. Muitos deles admiraram
que 1 m3, corresponde a um volume de água tão grande: Um deles relatou que
“agora eu sei quantas água nos gastamos, o volume de água para 10 m3”.
Os alunos foram levados a calcular o volume dos reservatórios a seguir:
Figura 10: Volume de um paralelepípedo
Fórmula: V = a x b x c
V = 50 x 20 x 30
V = 30.000 m3
Fonte: O autor
Figura 11: Cálculo do volume do paralelepípedo
V = 60 x 30 x 25
V = 45.000 m3
Fonte: O autor
Características do cilindro:
O cilindro é um não poliedro, pois tem uma superfície curva.
Sua altura é a distância entre as duas bases.
As suas bases são círculos.
O professor explicou que, para calcular o volume de um reservatório
cilíndrico, basta tomar a área da base e multiplicar pela medida da altura, assim:
V = Ab x h ou simplesmente V = π . R2 x h
Figura 11: Volume do cilindro
Fórmula: V = R2 X h
Fonte: O autor
Assim, utilizando um pé de alface adulto, um canteiro e uma trena, os alunos
mediram com a trena comprimento e a largura do canteiro, medindo o diâmetro de
um pé de alface adulto. De posse dessas medidas, os alunos calcularam o perímetro
a área ocupada por um pé de alface adulto, a distância entre os pés de alface a
serem plantados, a área do canteiro e quantos pés de alface cabem no respectivo
canteiro.
Outra atividade solicitada foi a seguinte: utilizando um reservatório de água
cilíndrico e uma trena o professor levou os alunos a medir, com a trena, o diâmetro
do reservatório de água. De posse dessas medidas, os alunos calcularam o
perímetro do reservatório, área da superfície do reservatório e o volume do
reservatório.
Os alunos realizaram as atividades propostas demonstrando que
entenderam a aplicação dos conceitos matemáticos para resolver problemas do
cotidiano. O discurso de um aluno é revelador do interesse da maioria.
Professor como é bom estudar no campo. A gente consegue resolver as atividades com todo mundo pensado junto, nem parece matemática. Essa é a primeira vez que eu estudo assim, todos os professores deveriam trabalhar coisas da vida da gente. Meu pai me falou que ele aprendeu isso que eu estudo na sétima no primário, e eu estou vendo isso na sétima série (Aluno 7ª série).
Isso leva a pensar na educação que vem sendo oferecida na atualidade, os
pais criticam a forma como a escola tem trabalhado, pois antigamente, na fala dos
pais, a escola ensinava muito mais que hoje, inclusive, coisas que eles utilizam no
seu cotidiano e que os filhos não estão aprendendo.
A etnomatemática contribui para resgatar o trabalho com uma matemática
que faça sentindo para o aluno, abordando a teoria com ênfase na prática,
contextualizando o ensino e a aprendizagem. As instituições de ensino da forma
como estão estruturadas, além de não estimular, até dificultam as práticas
inovadoras. São raros os espaços cedidos aos alunos para que eles possam
compartilhar conhecimentos e refletir com os seus pares.
Em consonância com as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná –
DCEs (2008), o ensino da disciplina deve oferecer aos alunos a possibilidade de
gostar de estudar Matemática, evidenciando a importância de que o professor esteja
bem preparado, que faça uso de recursos diferenciados de ensino, abandonando a
ênfase relativa ao domínio de regras e fórmulas.
Na educação Matemática há uma preocupação muito positiva em busca de
caminhos que respondam às expectativas dos envolvidos no processo educacional.
“Sabemos que não existe o melhor caminho, mas, ao ampliarmos as possibilidades
de escolha, o ensino/educação será melhor conduzido” (SCANDIUZZI, 2009, p. 06).
Assim sendo, o autor lembra que os conflitos que abarcam as abordagens
metodológicas existentes tendem a desaparecer, à medida que os educadores se
propõem a conhecer e investigar cada uma e a utilizá-las no momento adequado.
A abordagem da Etnomatemática propõe que todos os grupos culturais no
fazer cotidiano se completam, criando técnicas para sobreviverem e facilitarem sua
vivência cotidiana. Assim sendo, os procedimentos utilizados pela comunidade rural,
por exemplo, são de suma importância entre eles e fazem parte de seus sistemas de
explicações.
Com base nisso, tais conhecimentos podem e precisam ser utilizados pelos
docentes na sua prática diária de ensino e aprendizagem, pois ao obterem um
conhecimento a partir do conhecido é possível atingir um novo saber e contextualizá-
lo em outras situações.
3 Conclusão
As diferentes práticas sociais aprendidas de geração a geração constituem-
se em procedimentos ricos de produção de conhecimentos que fazem parte da
dinâmica vivenciada pelos indivíduos em diferentes culturas, mas que nem sempre
são reconhecidos como conhecimentos autênticos nas práticas escolares. Pensando
nisso, a Etnomatemática valoriza a Matemática dos diferentes grupos socioculturais,
propondo a valorização dos conceitos matemáticos informais construídos pelos
alunos através de suas experiências fora do contexto da escola.
Ficou evidente pelo trabalho realizado que à escola cabe constituir-se em
uma via de acesso para que cada discente seja valorizado em sua diferença,
oferecendo-lhe oportunidades intelectuais e ampliando-as, considerando, sobretudo,
que o aprendizado se faz também fora dela. É deste modo que os indivíduos podem
valorizar o conhecimento popular próprio e compreenderem melhor o ambiente em
que estão inseridos, ou seja, um etnoconhecimento.
Para tal, faz-se necessário que o ensino de Matemática seja realizado com
base em práticas contextualizadas, ou seja, que parta de situações do cotidiano para
o conhecimento elaborado cientificamente. Portanto, faz-se necessário validar e
articular os conhecimentos e saberes presentes nas práticas cotidianas dos
discentes e articulá-los com os conhecimentos presentes no âmbito escolar. Daí a
preocupação em implantar as ideias relacionadas à Etnomatemática no contexto
escolar na Educação do Campo.
As relações entre a Matemática cotidiana e a Matemática escolar
pressupõem a valorização do conhecimento matemático cotidiano com a pretensão
de auxiliar no aprendizado da disciplina.
É preciso tratar as noções relativas ao perímetro, área e volume por meio de
atividades significativas. Pressupõe-se que problematizadas a partir da realidade do
aluno, as atividades relativas ao conteúdo de Geometria tem-se no campo, o espaço
de referência, de modo que seja possível situá-lo, analisá-lo e perceber seus objetos
para, assim, representá-los.
Referências
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SCANDIUZZI, P. P. A etnomatemática e a formação de educadores Matemáticos. Disponível em: <http://www.ethnomath.org/resources/brazil/a-etnomatematica.pdf> Acesso em: 31 de dez. de 2009.
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ZACCUR, E. Apresentação. In: GARCIA, R.L.; ZACCUR, E.; GIAMBIAGI, I. Cotidiano: diálogos sobre diálogos. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2005.