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Economia de Empresas DEFESA DA CONCORRÊNCIA NOS 'PORTOS Gesner Oliveira Professor Adjunto do Departamento de Economia da EAESP/FGV e Presidente do CADE, E-maU: [email protected] César Mattos Mestre em Economia pela PUC/RJ e Assessor do CADE. RESUMO: Este artigo procura avaliar o sistema portuário brasileiro à luz da questão concorrencial. A despeito de o governo ter obtido sucesso no estímulo à concorrência entre portos após 1990, o mesmo não ocorreu para os vários serviços de operação portuária. Como a concorrência entre portos no Brasil é imperfeita, dadas as grandes distâncias envolvidas, a falta de concorrência dos serviços nos portos tende a aumentar os preços cobrados acima dos níveis competitivos, incrementando o chamado "Custo Brasil". Há uma série de fatores que influenciam a falta de concorrência nos serviços portuários, sendo que o principal objetivo do artigo é avaliar as fontes possíveis de barreiras à entrada que podem bloquear a concorrência nos serviços portuários do país. ABSTRACT:This artiele studies the Brazilian port system in the light of eompetition issues. Sinee the eompetition between ports in Brazil is imperfeet, this laek of eompetition inside the ports raises the operation priees above eompetitive leveIs, inereasing the so-ealled "Brazil Cost". The main target of this artiele is to evaluate the sourees of entry barriers that eould bloek eompetition inside the ports in Brazil. KEY WOROS:competition, ports. Port Management Council (CAP), port labourcouneil (OGMO), private port terminaIs. PALAVRAS-CHAVE: concorrência, portos, Órgão Gestor da Mão-de-Obra (OGMO), Conselho de Autoridade Portuária (CAP), teminais privativos. 64 RAE - Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 38, n. 3, p. 64-76 Jul./Set. 1998

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Economia de Empresas

DEFESA DA CONCORRÊNCIA NOS'PORTOS

Gesner OliveiraProfessor Adjunto do Departamento de Economia

da EAESP/FGV e Presidente do CADE,E-maU: [email protected]

César MattosMestre em Economia pela PUC/RJ e

Assessor do CADE.

RESUMO: Este artigo procura avaliar o sistema portuário brasileiro à luz da questão concorrencial. A despeito de ogoverno ter obtido sucesso no estímulo à concorrência entre portos após 1990, o mesmo não ocorreu para osvários serviços de operação portuária. Como a concorrência entre portos no Brasil é imperfeita, dadas as grandesdistâncias envolvidas, a falta de concorrência dos serviços nos portos tende a aumentar os preços cobrados acimados níveis competitivos, incrementando o chamado "Custo Brasil". Há uma série de fatores que influenciam a faltade concorrência nos serviços portuários, sendo que o principal objetivo do artigo é avaliar as fontes possíveis debarreiras à entrada que podem bloquear a concorrência nos serviços portuários do país.

ABSTRACT:This artiele studies the Brazilian port system in the light of eompetition issues. Sinee the eompetitionbetween ports in Brazil is imperfeet, this laek of eompetition inside the ports raises the operation priees aboveeompetitive leveIs, inereasing the so-ealled "Brazil Cost". The main target of this artiele is to evaluate the sourees ofentry barriers that eould bloek eompetition inside the ports in Brazil.

KEYWOROS:competition, ports. Port Management Council (CAP), port labourcouneil (OGMO), private port terminaIs.

PALAVRAS-CHAVE: concorrência, portos, Órgão Gestor da Mão-de-Obra (OGMO), Conselho de AutoridadePortuária (CAP), teminais privativos.

64 RAE - Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 38, n. 3, p. 64-76 Jul./Set. 1998

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INTRODUÇÃO

DEFESADA CONCORRINC/A NOS PORTOS

o objetivo deste texto é avaliar a questãoportuária no Brasil na ótica da concorrência apartir do texto da Lei 8.630/93 e dos proble-mas atuais com a sua implementação. Alémda competição entre portos, a formação docusto final de transporte para o usuário donoda carga dependerá do grau efetivo de concor-rência nos mercados constituídos pelos dife-rentes agentes econômicos dentro do porto. As-sim, o problema do custo portuário é aborda-do inicialmente por meio da análise da con-corrência em cada segmento da operação por-tuária, desde o frete, passando pela operaçãode movimentação da carga, até a saída do por-to. No final, procurar-se-á estabelecer uma vi-são de conjunto das relações entre os agentese suas implicações para a estratégia de redu-ção do Custo Brasil no porto.

A seção 11aponta os aspectos mais geraisda questão portuária e os limites da óticaconcorrencial. A seção 111apresenta a questãoda concorrência interportos versus intraportono contexto da reforma do início da década de90 e o papel das CIAs Docas.

O Conselho de Autoridade Portuária (CAP)é tratado na seção IV, apresentando-se as pos-síveis implicações de sua constituição do pon-to de vista do usuário. A idéia do CAP comoórgão regulador permeia essa análise. A con-corrência no contexto da operação portuária éavaliada na seção V.A seção VI aborda a ques-tão correlata da concorrência na oferta de mão-de-obra. Dois pontos principais merecem des-taque nessa questão: o Órgão Gestor da Mão-de-Obra (OGMO) e o serviço de praticagem.

Nas seções VII e VIII, são discutidas asquestões dos terminais privativos e da concor-rência entre as empresas de navegação, respec-tivamente. A seção IX procura demonstrar asinterrelações entre os agentes econômicos queoperam no porto, suas implicações para a con-corrência e, por conseguinte, para a formaçãodo custo portuário.

Uma seção conclusiva contém um sumá-rio dos principais pontos e recomendações depolítica. Estas últimas, se implementadas, po-deriam contribuir para eventual aperfeiçoa-mento regulatório no setor. Nesse sentido, oCADE deveria analisar a oportunidade de emi-tir recomendação na direção apontada em seupapel de advogado da concorrência. Indepen-dentemente de alteração no atual marcoregulatório, a relevância da questão portuária

e a freqüência de imperfeição dos mercadosanalisados justificam redobrada atenção e ri-gor na aplicação da Lei 8.884/94 nesta área.

A formação do custofinal de transporte

para o usuário dono decarga dependerá do

grau efetivo deconcorrência nos

mercados constituídospelos diferentes

agentes econômicosdentro do porto.

MODERNIZAÇÃO PORTUÁRIA,CONCORRÊNCIA E O CADE:ASPECTOS GERAIS

A Lei 8.630/93 constituiu avanço, emboraainda apresente ambigüidades no que tange àquestão concorrencial. Se, por um lado, váriosde seus dispositivos estimulam a concorrênciadas operações portuárias, conferindo maiormargem de manobra aos usuários, a flexibili-dade existente pode gerar lacunas que, na prá-tica, possibilitam a manutenção de privilégiospor meio de barreiras à entrada nas operaçõesportuárias. Cumpre avaliar em que medida taislimitações podem gerar prejuízos à concorrên-cia sem quaisquer ganhos de eficiência na ope-ração portuária.

O momento atual da economia brasileira,no qual coexistem o grande esforço do gover-no federal de implementar a Lei 8.630/93 pormeio do GEMPO (Grupo Executivo para aModernização dos Portos), a consolidação dosprocessos de estabilização de preços e de aber-tura econômica e a emergência de novo apara-to regulatório, em que o CADE ocupa papelde destaque, parece especialmente oportunopara uma maior atuação do órgão na questãoportuária.

Nesse contexto, pode-se dizer que o vigorda concorrência nos portos afeta a concorrên-cia em praticamente todos os setores tradeables

© 1998, RAE - Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil. 65

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atingir aqueles objetivos. É lícito supor que,em vários casos, certos portos apresentam ca-racterísticas de monopólio natural, tomandoimplausível uma concorrência acirrada dentrode uma determinada área geográfica. Ou seja,o "mercado de portos" apresenta imperfeições,tomando desejável uma atenção especial aofomento da concorrência intraporto. Isso incluia concorrência entre terminais, operadores, tra-balhadores, entre outros aspectos.

Um passo importante que está sendo dadonesse sentido é o do programa de desestatizaçãodo governo federal no setor portuário. No en-tanto, não está claro o quanto esse processodeverá avançar no sentido da desestatização daprópria administração portuária. Apesar de aLei 8.630/93 ser perfeitamente consistente coma desestatização das CIAs Docas, também nãodetermina que tal processo seja obrigatoriamen-te seguido. Nesse sentido, o legislador prefe-riu uma opção de maior flexibilidade, deixan-do que a maturidade institucional de cada por-to defina qual o melhor modelo de administra-ção portuária a seguir.

De qualquer forma, em um regime de tran-sição, a Lei concebeu no Parágrafo 3º do Arti-go 9º que a administração do porto (hoje asCIAs Docas) seria considerada pré-qualifica-da' como operadora portuária.

Segundo Lima & Velasco," a nova Lei eli-minou a exclusividade das CIAs Docas nasoperações de capatazia (movimentação no caisatravés de funcionários próprios das CIAs Do-cas). No entanto, conforme acentua oGEMPO,5 "na maioria dos portos, o setor pú-blico continua exercendo a exclusividade naprestação dos serviços de capatazia", o que éfrontalmente contrário ao disposto na Lei, pre-judicando uma importante fonte de concorrên-cia intraporto consoante aos objetivos do pro-grama de desestatização. As conseqüênciasdesse atraso no repasse de várias funções dasCIAs Docas em Santos, por exemplo, estãoretratadas no estudo da FIPE,6 no qual todas as

1. Para uma discussão sobre o CustoBrasil ver OLIVEIRA, G. J., MAnOS, C. C.A. "Redução do Custo Brasil: uma agendapara 1996." Secretaria de PolíticaEconômica/Ministério da Fazenda, fev.1996 (mimeo).

2. Em 1995, cerca de 25,9% do valor FOBdas exportações e 29% do valor CIF dasimportações foram realizadas por Santos.

3. A importância da pré-qualificação nojogo concorrencial dentro do porto serámelhor avaliada no próximo item.

5. GEMPO (Grupo Executivo paraModernização dos Portos). ProgramaIntegrado de Modernização Portuária.Diário Dficial. n.220, 12/11/1996.

6. Ver relatório da FIPE, Custo Santos,análise do mercado e das cadeiaslogísticas, de julho de 1996.

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da economia. De fato, o grau de influência daabertura econômica sobre a contestabilidadedos mercados internos naqueles setores apre-senta forte conexão com os custos (e, por con-seguinte, com a concorrência) nos portos. Afi-nal, a grande massa de importações entra nopaís pelo porto, fazendo com que a não-conse-cução dos objetivos concorrenciais nesse setorpossa prejudicar parte dos ganhos de bem-es-tar almejados com a abertura econômica. Issosem falar nos impactos sobre a competitivida-de das exportações brasileiras. Não há, de fato,tema no qual convirjam de forma tão plena,objetivos de política pública de defender a con-corrência e reduzir o Custo Brasil.'

ADMINISTRAÇÃO DO PORTO,OPERAÇÃO PORTUÁRIA ECONCORRÊNCIA

O Quadro 1 resume a evolução do sistemade administração portuária no Brasil.

Antes de 1990, seria difícil conceber tantoa concorrência entre os portos como no interiordos próprios portos, considerando que haviaapenas um administrador, o próprio governo,pela Portobrás.

A idéia de descentralização permeia o sis-tema pós-1990, com a extinção da Portobrás, epromove a concorrência entre portos, apesarda responsabilidade única do Ministério dosTransportes, da continuidade da administraçãopelas CIAs Docas e de uma natural concentra-ção de cargas em Santos;' reflexo da própriaconcentração da atividade econômica no país.

Por outro lado, apesar da importância doestímulo da concorrência interportos, há quese reconhecer os seus limites para reduzir oscustos portuários e aumentar a eficiência dasoperações. Características estruturais, associa-das principalmente ao diferencial de custo detransporte terrestre entre um porto e outro, tor-nam a existência de concorrência interportoscondição necessária, mas não suficiente, para

Quadro 1 - Sistema portuário pré e pós-Portobrás

Mais de 30 portos públicos administradospelas CIAs Docas, diretamente pelaPortobrás, por empresas sob administraçãoprivada ou por concessionárias estaduais.

4. LIMA. E. T., VELASCO, L. M. O sistema!1 Iportuário brasileiro. Revista do BNDES Sistema pré-1990 Sistema pós-1990dez. 1996. L- + --'

Desativação da Portobrás, passando oMinistério dos Transportes a ser diretamenteresponsável pela política portuária por meiode oito CIAs Docas federais, cinco estaduaise uma privada.

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DEFESA DA CONCORRÊNCIA NOS PORTOS

empresas com terminais privativos própriosapresentam uma reclamação em comum: a bai-xa eficiência da CODESP.

A ECONOMIA POLíTICA DOCONSELHO DE AUTORIDADEPORTUÁRIA

A instância máxima de deliberação criadapela Lei 8.630/93, no âmbito de cada porto,foi o Conselho de Autoridade Portuária (CAP).O CAP é uma espécie de "órgão regulador" decada porto, constituído por quatro blocos, cadaum com um voto: poder público, operadoresportuários, trabalhadores e usuários.

O legislador estabeleceu explicitamentecomo função do CAP, no Inciso VI do Artigo30, "zelar pelo cumprimento das normas dedefesa da concorrência". É elucidativo nesteponto um exercício sobre a lógica de funcio-namento do CAPoEm cada um dos blocos aci-ma há pelos menos dois representantes de gru-pos diferentes, que devem entrar em consensopara definir um voto único dentro do bloco. Ovoto de decisão do CAP, no caso de empate(2'2), ficaria a cargo do bloco do poder públi-co. Este é constituído por um representante dogoverno federal, um do estado e outro do mu-nicípio-sede do porto.

Cabe avaliar o quanto os representantes domunicípio e mesmo do estado terão seus inte-resses mais identificados com os interesses dosoperadores portuários e trabalhadores (que ten-deriam a reduzir a concorrência nas operaçõesdentro do porto) 7 ou com os dos usuários (quetenderiam aumentar a concorrência). A depen-der disso, os usuários podem, no máximo,empatar. No entanto, nessa configuração de2 '2, o voto de qualidade é exercido pelo presi-dente do CAP, que será o representante do go-verno federal (Artigo 31, Inciso I, Alínea A),que, em tese, favoreceria os usuários.

CONCORRÊNCIA INTRAPORTO: OOPERADOR PORTUÁRIO

Pré-qualificação do operadorportuário

O Artigo 92 define que "a pré-qualifica-ção do operador portuário será efetuada jun-to à administração do Porto, na forma de nor-ma publicada pelo CAP com exigências cla-ras e objetivas". Além disso, o Inciso IH doParágrafo 12 do Artigo 33 atribui à adminis-

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tração do porto a pré-qualificação dos opera-dores portuários. Ou seja, o CAP normatiza ea administração do porto aplica a norma na pré-qualificação.

Para avaliar como se dá a concorrência en-tre operadores portuários é fundamental sabercomo são as regras de entrada nesse mercado.A existência de barreiras institucionais depen-de das normas exaradas pelo CAP e da aplica-ção das mesmas pela administração dos por-tos. Tais normas serão mais ou menos restriti-vas em relação à entrada de operadores portuá-rios a depender dos resultados das votaçõesdentro do CAP e da boa vontade de implemen-tação das mesmas pelas CIAs Docas. SegundoLima & Velasco," "uma reforma portuária,com incentivo à concorrência entre operado-res portuários, é um excelente programa deincentivo às exportações".

É útil uma digressão para avaliar a lógicade funcionamento do órgão responsável pelasregras de pré-qualificação: o CAPo É naturalque o bloco dos operadores portuários, por tercomo representantes agentes já qualificados,tenda a buscar regras mais restritivas,maximizando as barreiras à entrada para os queainda não estão qualificados. Observe-se que,em tese, os representantes dos trabalhadorespodem entrar em acordo com os representan-tes dos operadores em troca de melhores con-dições de remuneração. Lembre-se de que noArtigo 29 define-se que "a remuneração, adefinição das funções, a composição dos ter-nos e as demais condições do trabalho portuá-rio avulso serão objeto de negociação entreas entidades representativas dos trabalhado-res portuários avulsos e dos operadores por-tuários". Ou seja, se os operadores portuáriospuderem repassar para os usuários custos maio-res derivados de uma negociação frouxa daremuneração, fixação dos temos etc., pode setomar vantajoso para aqueles dois blocos en-trarem em acordo em detrimento do bloco dosusuários. Observe-se que 50% do bloco dostrabalhadores é constituído por avulsos (cate-goria mais ativa politicamente) e 50% pelosdemais trabalhadores.

Do ponto de vista das ClAs Docas, deve-se analisar a disposição de cada uma em pré-qualificar operadores portuários que, em últi-ma análise, a estarão substituindo na transiçãopara um regime de operações portuárias maisprivatizado."

Em suma, o regime concorrencial da ope-ração portuária depende tanto das normas que

7. Na seção sobre pré-qualltlcação dooperador portuário, discute-se maisdetalhadamente a lógica do possivelconluio trabalhador·operador.

8. LIMA, E. 1, VELASCO, L. M. Op. cil.

9. Lembrar Que as elAs Docas já foramconsideradas na Lei como pré·Qualificadasno Parágrafo 3ll do Artigo 9<'.

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pria tripulação das embarcações" (Inciso I doParágrafo 12).

Trata-se de um dispositivo importante porpermitir ao usuário fazer uma movimentaçãoportuária mais barata que a ofertada pelos ope-radores locais. Isso inibiria a ação concertadados operadores portuários locais no sentido deaumentar o custo da operação. O Parágrafo 22

do Artigo 82 apresenta maior alcance ainda aopermitir que o interessado, entendendo comonecessária a utilização de mão-de-obra com-plementar, a requisite ao Órgão Gestor da Mão-de-Obra (OGMO). Há três problemas potenciaisa serem avaliados na prática:1. Não está claro quem define se uma deter-

minada operação se enquadra nas caracte-rísticas definidas no Inciso I do Parágrafo1º, os próprios usuários, os armadores, a ad-ministração do porto ou o CAPo A flexibi-lidade conferida pela Lei depende de tal de-finição.

2. Não está assegurado o grau de liberdade dointeressado em utilizar a mão-de-obra com-plementar.

3. Há uma natural assimetria de informaçãoda grande parte dos usuários em relação àoperação portuária vis-à-vis o operadorportuário. Nesse aspecto, é importante re-alçar o papel do operador portuário na re-dução do custo de transação para o usuá-rio, o qual evita inecessidade de lidar comas várias fases do complexo processo deembarque e desembarque no porto, que in-

• clui aduana, armazenamento, contrataçãode mão-de-obra na estiva, capatazia, con-ferência etc. É difícil, em vários casos, vis-lumbrar a possibilidade da dispensa do ope-rador. De qualquer forma, é importante ava-liar com que freqüência os usuários têm seutilizado desse dispositivo e a que custo.

10. LIMA, E. 1, VELASCO, L. M. Op. cil.

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têm sido expedidas pelos CAPs para a pré-qua-lificação como da implementação das mesmaspelas administrações portuárias.

O processo concorrencial dos operadoresportuários pode ser limitado, ademais, por ra-zões estruturais. Isso porque é necessário ummínimo de capital fixo (portrainers, guindas-tes etc.) do operador portuário para que estepossa estar apto a operar adequadamente. Averificação de elevados custos fixos tende agerar economias de escala no curto prazo, li-mitando, naturalmente, o número de entrantes.

Além disso, uma infinidade de operadorescompromete a capacidade de administração doporto e amplia o problema de assimetria de in-formação do usuário em face da qualidade dosserviços dos operadores. Assim, o dispositivoda pré-qualificação, apesar de constituir umapossível barreira à entrada burocrática, podeapresentar também uma justificativa do pontode vista da eficiência que deve ser ponderada.

Além disso, é fundamental que as normasexaradas pelo CAP (o que deve estar no regu-lamento do porto, segundo o Artigo 10 da Lei)privilegiem, ao máximo, a liberdade de esco-lha do operador portuário pelo usuário e as re-gras específicas para os terminais privativos.Assim, juntamente com a questão das eventu-ais barreiras burocráticas à entrada para a pré-qualificação de operadores, é importante ava-liar qual a liberdade de escolha dos usuáriosem relação aos operadores que estejam pré-qualificados em cada porto.

Um ponto fundamental a observar é que aLei 8.630/93 não impede que seja concedidaexclusividade de exploração de um porto in-teiro ou mesmo de terminais, áreas ou servi-ços. A Lei foi sábia em não introduzir restri-ções, tendo em vista a heterogeneidade de ta-manho dos portos brasileiros. No entanto, tor-na-se importante atenção especial das autori-dades de defesa da concorrência para que ex-clusividades para operadores portuáriosinjustificadas não sejam efetuadas.

Dispensa de operador portuário

O Parágrafo 1º do Artigo 8º torna dispen-sável a intervenção de operadores portuáriosnas operações portuárias em certas circunstân-cias, especialmente quando a operação, "porseus métodos de manipulação, suas caracte-rísticas de automação ou mecanização, nãorequeiram a utilização de mão-de-obra ou pos-sam ser executadas exclusivamente pela pró-

CONCORRÊNCIA INTRAPORTO: AMÃO-DE-OBRA PORTUÁRIA

Implantação do OGMO e concorrência

Anteriormente (e ainda hoje) a contrataçãoda mão-de-obra nos portos era feita diretamenteno sindicato. Além disso, conforme Lima &Velasco," "as condições de remuneração, a de-finição das funções e as demais condições detrabalho eram objeto de determinação fede-ral, suprimindo qualquer tipo de concorrên-cia entre trabalhadores ou grupo de trabalha-dores pelos serviços nos portos". O sindicato

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DEFESA DA CONCORRÊNCIA NOS PORTOS

também costumava privilegiar grupos especí-ficos de trabalhadores em detrimento de ou-tros na atribuição dos serviços.

A Lei 8.630/93 transferiu essa prerrogati-va para os OGMOs. O OGMO deve ser cons-tituído pelos operadores portuários (caput Ar-tigo 18), constituído de um Conselho de Su-pervisão (CS) e uma diretoria executiva. O CSdeve ser composto por representantes dos ope-radores portuários, dos usuários e dos traba-lhadores. A diretoria executiva é dos operado-res portuários. Nesse caso, as condições de tra-balho (remuneração, definição das funçõesetc.) passam a ser negociadas coletivamentecom os operadores portuários, estimulando aconcorrência entre portos, 11mas não intraporto.Os operadores portuários também possuem aliberdade de requisitar ao OGMO os trabalha-dores que desejarem, fomentando, em tese, aconcorrência entre estes pela maior eficiência.No entanto, nada impede que os critérios deeficiência sejam menos privilegiados, dada apossibilidade de colusão entre operadores e tra-balhadores em detrimento dos usuários, difi-cultando a concorrência intraporto."

É importante ressaltar que os Incisos IV eV do Artigo 18 determinam que compete aoOGMO "selecionar e registrar o trabalha-dor portuário avulso" cuja oferta será restri-ta pelo "número de vagas, aforma e a perio-dicidade para acesso ao registro do traba-lhador portuário". Ou seja, substituiu-se osindicato pelo OGMO no gerenciamento damão-de-obra portuária, transferindo-se omonopólio da mão-de-obra de uma entidade(o sindicato) para outra (o OGMO). Alémdisso, o OGMO é dominado pelo operadorportuário, que, como vimos acima, não obri-gatoriamente, terá interesses convergentescom os usuários no que tange a custos de mo-vimentação. De qualquer forma, o sistemaainda é superior para o usuário em relação aoanterior, em que este não tinha qualquer re-presentação e o sindicato monopolizava o ge-renciamento da mão-de-obra.

Segundo o GEMPO,13 "os OGMOs já es-tão criados em todos os portos organizados"(o que foi uma conquista que contou com fun-damental impulso do GEMPO após três anosde total inércia na implementação dos mes-mos), além de "quase todos já terem assumi-do o processamento do pagamento dos traba-lhadores". No entanto, a administração do for-necimento de mão-de-obra avulsa ainda estáem fase de implantação, reconhecendo o

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GEMPO ser ainda incipiente o estágio de or-ganização da maioria dos OGMOs criados.

Um reflexo claro disso ainda se observa nasregras atuais de alocação de mão-de-obra emSantos. Conforme a PIPE,13 "na descarga deum navio de containers com dois guindastesoperando, são alocadas, em terra, duas equi-pes de trabalhadores, dois ternos por guindastemais dois feitores, mais dois anotadores e maisdois mestres, além de um contra-mestre gerar'.Além disso, são alocados quatro trabalhado-res na peação ou desapeação, atingindo-se 17trabalhadores. De acordo com algumas estima-tivas, seria necessário somente 40% da mão-de-obra atualmente utilizada no trabalho de em-barque e desembarque.

Pode-se dizer que ovigor da concorrência

nos portos afeta aconcorrência em

praticamente todos ossetores tradeables da

economia.

O problema é que operador e usuário nãotêm liberdade de definir, caso a caso, dequantos trabalhadores necessita. Este númeroé fixado por tabela, o que elimina importantefonte de racionalização do custo do trabalha-dor portuário, minando, na prática, os ganhosobtidos mesmo nos portos em que o OGMO jáestá mais atuante.

Esse problema é resultado do número ex-cessivo de trabalhadores que se encontra noporto. Isso justificou o fato de a Lei 8.630/93conter um dispositivo aparentemente contrá-rio à concorrência: reduzir a oferta de mão-de-obra nos portos, estimulando o cancelamentodos registros pelos portuários avulsos por meiode pagamento de indenizações (o PDV por-tuário) conforme Artigo 59.14,15

Sendo os portuários avulsos - em últimaanálise, mão-de-obra terceirizada para traba-lho sem uma base regular -, caberia indagarpor que a concorrência da mão-de-obra nãopoderia se dar individualmente ou por coope-rativas. Nesse espírito, não faria sentido regis-

11. Observe-se que já houve forte demandados trabalhadores para unificar asnegociações em nível nacional, o queeliminaria a concorrência interportos nessequesito.

12. Apesar de haver alguma margem deflexibilidade para a concorrência intraporto,como acentuado por Lima & Velasco e queserá discutido adiante.

13. GEMPO (Grupo Executivo paraModernização dos Portos). Op. cít.

14. O GEMPO informa que já foram pagascerca de 6.000 indenizações em todo oBrasil.

15. As virtudes da concorrência em termosde preços menores da mão-de-ooraseriam, de fato, invariantes, no curto emédio prazos da implementação da Lei dosportos, à oferta global de trabalhadoresportuários.

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Serviço de praticagemtro de mão-de-obra a não ser aquele feito parafins de prover informação ao usuário sobre aqualificação e o treinamento do portuário in-dividual e sem qualquer tipo de restrição à en-trada.

No entanto, dadas as peculiaridades da for-ça dos sindicatos portuários, o modelo basea-do no OGMO parece ser a configuração maisrazoável, pelo menos até o momento. Seria ilu-sório conceber um ambiente plenamente com-petitivo na oferta de mão-de-obra no porto, apartir de várias cooperativas ou mesmo indivi-dualmente, oferecendo serviços com menorespreços e melhor qualidade. A não-consolida-ção do OGMO possivelmente implicaria amanutenção da força do sindicato, que conti-nuaria atuando como uma "cooperativa única",havendo uma tendência natural a essa configu-ração monopolista. Ou seja, no presente momen-to, o fortalecimento do OGMO parece ser, nomomento, o caminho mais adequado para me-lhorar a eficiência da mão-de-obra no porto adespeito de constituir uma agência única.

No futuro, as possibilidades de ampliar alógica concorrencial no fornecimento da mão-de-obra serão condicionadas pelos seguintesaspectos:• o movimento de aposentadoria dos atuais

avulsos;• o crescimento das próprias exceções de

contratação pelo OGMO, que incluem oincremento do número de terminais priva-tivos e algumas possibilidades da Lei (ex-ploradas abaixo) no item VI-b;a importância relativa de eventual conver-gência de interesses entre operadores por-tuários e sindicatos, o que caracterizariauma simples substituição dos últimos pe-los primeiros no monopólio da contratação;

• o papel do OGMO como redutor do custode transação na contratação de mão-de-obra. Afinal, um organismo coordenadorque centralize a contratação de mão-de-obra pode reduzir o custo de procura tantopara usuários como para os operadoresportuários;

• a progressiva introdução da multifuncio-nalidade no trabalho portuário, buscandoreduzir a segmentação das atividades por-tuárias (Ação e Projeto 4 do PIMOP), quedeve proceder mudanças qualitativas im-portantes na forma de contratação de mão-de-obra no porto, reduzindo o número deagentes envolvidos e, portanto, o custo,além de tomar a operação mais eficiente.

70

Os práticos configuram categoria à parte,não se sujeitando ao OGMO. Sua função con-siste na manobra dos navios, conduzindo-os daentrada dos portos até os berços de atracação evice-versa. Isso requer conhecimentoaprofundado das características de navegaçãonas imediações do porto de forma a evitar aci-dentes.

Esse quesito de elevado conhecimento dolocal para garantir a segurança dos navios con-figura uma natural barreira à entrada de novospráticos e justifica a regulamentação deste ser-viço. Assim, o ingresso na profissão demandarigoroso exame aplicado pela Marinha do Bra-sil e estágio de qualificação.

Segundo o CONAPRA (Conselho Nacio-nal de Praticagem), como "os serviços depraticagem são, normalmente, pagos pelosarmadores, [... ] os custos dos serviços depraticagem não interferem na formação doscustos da logística de transbordo e de proces-samento de cargas", ou seja, "os custos dosserviços de praticagem interferem apenas naformação do frete marítimo e não na composi-ção dos custos portuários".

No entanto, tal como em análises de inci-dência de imposto, um aumento do custo dapraticagem deslocaria a curva de oferta dosarmadores para cima. A incidência desse au-mento seria distribuída pelos donos da carga earmadores. O ônus relativo de cada um depen-derá das elasticidades de demanda e oferta porserviços de frete marítimo. Supondo o casoextremo de uma demanda de mercado total-mente inelástica, todo o custo elevado dapraticagem seria repassado pelo armador parao dono da carga. Assim, alguma parcela doônus será transferida para o dono da carga, one-rando o custo dos produtos. No limite (curvade demanda vertical), o ônus integral será ar-cado pelo dono da carga.

Argumenta-se freqüentemente que o pro-blema maior dos altos custos do serviço depraticagem reside na regulação que estabeleceum número máximo de práticos por porto pelaMarinha. No entanto, uma medida que apenaselimine essa restrição e gere aumento da ofertade práticos não é condição suficiente para am-pliar a concorrência na oferta do serviço. Issoporque, se os práticos em cada porto se manti-verem sob o guarda-chuva de apenas uma as-sociação, pode ocorrer que apenas o ganho porprático se reduza (pois mais práticos estariam

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DEFESADA CONCORRtNClA NOS PORTOS

ganhando o mesmo valor global), mas sem re-dução do custo para o armador e, por conse-guinte, para o usuário. Pareceria recomendá-vel, portanto, maior descentralização do ser-viço de praticagem em cada porto juntamentecom o aumento da oferta de práticos. As duasmedidas seriam complementares e deveriamser empreendidas em conjunto.

o processoconcorrencial dos

operadores portuáriospode ser limitado,

ademais, por razõesestruturais.

Uma medida complementar interessanteseria permitir que as empresas de navegação econcessionárias de terminais privativos, dentreoutros, tivessem seus próprios práticos, o queexigiria uma flexibilização maior do processode seleção a cargo da Marinha, no sentido deampliar o número de práticos. A Lei 9.537/97,recentemente aprovada, que dispõe sobre a se-gurança do transporte aquaviário, aprovada naCâmara dos Deputados e já encaminhada aoSenado, procura oferecer uma solução. Desta-quem-se alguns pontos importantes da Lei:• o Parágrafo 31!do Artigo 13 assegura a todo

prático habilitado o livre exercício do ser-viço de praticagem, individualmente, or-ganizado em associação ou contratado porempresa;

• o Parágrafo 4ll do mesmo Artigo permiteque a autoridade marítima habilite coman-dantes de navios de bandeira brasileira aconduzir a embarcação sob seu comandono interior de zona de praticagem específi-ca ou em parte dela, os quais seriam consi-derados práticos nesta situação exclusiva.Essas novas disposições legais são, em ge-

ral, positivas, pois permitem a ampliação daconcorrência no serviço de praticagem. Noentanto, há o risco de as mesmas tomarem-seinócuas do ponto de vista da concorrência, jáque podem continuar sendo fixados o númerode práticos necessário para cada zona depraticagem (Artigo 14, Parágrafo Único, IncisoI) e o preço do serviço (Inciso 11).

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Quanto ao primeiro aspecto, não pareceapropriada uma regulação do número de práti-cos. Seria mais adequado tomar mais aberto oprocesso de habilitação, deixando ao mercadoa determinação desse quantitativo, como ocorrecom outras profissões que requerem qualifica-ção.

Além disso, a regulação de preços deve seruma exceção, aplicada apenas quando se cons-tatar que não é possível haver concorrência noserviço de praticagem de um determinado por-to. Ademais, os preços deveriam constituir te-tos e não valores absolutos, sendo válidos ape-nas para os navios e empresas que não dispu-serem de prático próprio (possibilidade quepode ser aberta por essa Lei). Assim, mesmoque as pré-condições de concorrência se esta-beleçam no serviço de praticagem nos portos,a fixação de preços pela autoridade marítimapode simplesmente solapar as vantagens domesmo. De qualquer maneira, para assegurara devida aplicação das normas concorrenciais,caberia uma maior cooperação entre o CADEe a autoridade responsável no exercício dessaregulação.

Outras críticas devem ser efetuadas à novaLei:• é fundamental que os exames de qualifica-

ção sejam freqüentes e tenham apenas ca-ráter eliminatório, ou seja, não deveria ha-ver número determinado de vagas, pois esseé um serviço em que o mercado, e não umente regulador, deve estabelecer a quanti-dade ofertada;

• não faz sentido, no Parágrafo 4ll do Artigo13, a limitação da possibilidade de habili-tação a prático apenas para comandantesde navios de bandeira brasileira. Cerca de98% das embarcações que entram nos por-tos brasileiros não possuem bandeira bra-sileira;

• o Inciso XV do Artigo 21!define o práti-co como não-tripulante. Isso pode invia-bilizar a habilitação do comandante donavio como prático, de acordo com oParágrafo 41!do Artigo 13, por ser o co-mandante também um tripulante. Assim,a expressão "não-tripulante" pode limi-tar o escopo do aumento da concorrênciano serviço;

• os dois últimos dispositivos (obrigação debandeira brasileira e não-tripulante) podemreduzir muito, na prática, os ganhos alme-jados com o Parágrafo 4º do Artigo 13.É razoável postular, entretanto, que parte

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ser grandes, apesar de ser justamente nessascargas que o seu terminal deve ser mais espe-cializado. Ou seja, não é claro se a aberturados terminais privativos será uma medida detão largo alcance, apesar de meritória. Cabetambém avaliar até que ponto a carga geral,normalmente transportada pelos portos públi-cos, terá ganhos de custo ao efetuar movimen-tações pelos terminais privativos, normalmen-te mais especializados.

16. A FIPE (1996) contém um dadocurioso. No caso da Petrobrás, apesar dea empresa realizar toda a operação deembarque e desembarque em seuterminal marmmo com pessoal próprio,a CODESP cobra não apenas pelotransporte por dutos, como também pelacapatazia. O mesmo problema foiobservado para produtos quimicos emgeral.

17. Em Santos, por exemplo, há cincoterminais privativos: Cosipa, Ultrafértil,Cutrale, Dow Ouímica e Cargill.

18. Por exemplo, seria o caso de algumaspoucas empresas de navegação severticalizarem na operação dos terminaise bloquearem, colusivamente, o acessodas concorrentes, especialmente as delinhas não-conferenciadas. Estas últimas,como será visto na seção VIII, cumpremum papel de destaque na concorrência danavegação.

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desses problemas possa ser sanada através danecessária regulamentação dessa legislação queainda está por vir.

Flexibilidade da contratação detrabalhadores em terminais privativos

O Artigo 56 da Lei 8.630/93 faculta aosconcessionários de terminais privativos a con-tratação de trabalhadores por prazoindeterminado, observado o disposto no con-trato, convenção ou acordo coletivo de traba-lho nas respectivas categorias econômicas pre-ponderantes, devendo estas manter a atual pro-porção entre trabalhadores com vínculoempregatício e trabalhadores avulsos.

No caso de líquidos a granel, por exemplo,há independência dos terminais privativos nãosó em relação à mão-de-obra, mas também atoda a estrutura de funcionamento do portoorganizado, incluindo armazenagem e todo oserviço de movimentação de cargas. 16 A depen-dência dos granéis sólidos e, principalmente,da carga geral em relação ao cais público émaior.

Observe-se que, mesmo para os terminaisprivativos, há restrições para a contratação demão-de-obra, tendo em vista a obrigatoriedadeda proporção trabalhadores com vínculoempregatício/avulsos. Apesar disso, aindaconstitui um regime de contratação mais flexí-vel do que para o resto do porto."

TERMINAIS PRIVATIVOS

Terminais privativos e cargas deterceiros

O Inciso 11do Parágrafo 22 do Artigo 42 daLei 8.630/93 permitiu que as instalações por-tuárias de uso privativo pudessem realizar amovimentação de cargas de terceiros. Essa foiuma desregulamentação importante por redu-zir barreiras à entrada de importações que es-tavam compulsoriamente atreladas à eficiên-cia (precária) dos portos públicos. Taldesregulamentação, de qualquer forma, podeser tomada como um corolário da tendência dedesestatização dos portos.

De qualquer forma, não é claro o tipo decarga mais afetada na prática. Isso porque osterminais privativos apresentam elevado graude especialização em granéis sólidos, mineraise líquidos. Os interesses de um concessionáriomovimentar carga de concorrente não devem

CONCESSÃO DE TERMINAISPRIVATIVOS E CONCORRÊNCIA

A concessão de terminais pode ter implica-ções relativas a concorrência. Isso é verdadei-ro especialmente para terminais privativos, emque há elevado grau de especialização por tipode carga.

Imagine-se, por exemplo, que o ganhadorda concessão de um terminal especializado emSantos seja um grupo que atue verticalizadotanto nos mercados de insumo upstream comonos de produto downstream. Imagine-se que,apesar de esse grupo ser responsável por todaa produção nacional desse insumo, esse mer-cado upstream é altamente contestável via im-portações. No entanto, suponha-se que a úni-ca porta de entrada de importações de insumosseja aquele terminal especializado, cujo con-cessionário passa a ser aquele grupo. Nessecontexto, a privatização poderia gerar proble-mas de acesso das empresas no mercadodownstream aos insumos importados, dadoque a porta de entrada é controlada por con-corrente.

Mesmo a concessão de terminais de cargageral pode suscitar problemas caso se verifi-que um reduzido número de concessionáriosque viabilize práticas colusivas. Tais compor-tamentos podem gerar inclusive o bloqueio aoacesso de eventuais concorrentes dos conces-sionários nos mercados de produto ou mesmode transporte."

Nesse sentido, é importante avaliar como éabordada a questão concorrencial nos contra-tos de concessão de terminais. Em um contra-to de concessão firmado para o arrendamentode área de 100 mil m2 no porto de Santos, asprincipais cláusulas relacionadas à questãoconcorrencial foram as seguintes:1. Cláusula 52.1: Define que só pode haver

um vencedor para a licitação de cada umdos seguintes três terminais no Porto deSantos: PROAPS 13,19 e 23. Esse é um dis-

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DEFESA DA CONCORRtNC/A NOS PORTOS

positivo importante para a concorrência,pois evita concentração de propriedade determinais. Por outro lado, não há como in-ferir essa restrição em relação a outros ter-minais e nem se as áreas arrendadas sãograndes o suficiente para justificar mais deum terminal, o que se configura em infor-mações muito específicas. É importantedestacar, de qualquer forma, que há certaeconomia de escala no tamanho das áreasde cada terminal, que dependerá da espe-cialização específica de cada um (fertili-zantes, aço, automóveis, suco de laranjaetc.). Assim, seria muito difícil avaliar otamanho ideal de cada terminal a ser con-cedido, dado o trade-off entre amaximização do processo concorrencial,considerando uma escala mínima eficienterelacionada ao tamanho da área concedidapara cada tipo de terminal. Além disso, nãose aprofunda o que se entende por "vence-dor". Não esclarece se é qualquer empresade um consórcio vencedor ou empresa quedetenha mais que determinada participaçãono consórcio vencedor.

2. Cláusula 6.6: Determina que o controlesocietário da concessionária só poderá sermodificado após prévia anuência daCODESP. Pode ser um instrumento paraevitar concentração da propriedade de ter-minais, para o que a cooperação com oCADE é importante.

3. Cláusula 6.7: Veda participação isolada nalicitação de empresa estrangeira. Tal vetopareceria inadequado ao restringir a possi-bilidade de empresas estrangeiras aumen-tarem sua capacidade de importar e expor-tar.

4. Cláusula 100.2: Determina a apresentaçãopela licitante de Proposta de Metodologiade Execução, com planos de investimento,perspectivas mercadológicas e ainda aná-lise de mercado sobre concorrênciaintraporto e entre os portos. Constitui umaidéia interessante, mas caberia concretizaros instrumentos de tal análise.

EMPRESAS DE NAVEGAÇÃO ECONCORRÊNCIA

Conforme Lima & Velasco," as empresasde navegação atuam cartelizadamente no pla-no internacional, impondo fretes segundo suasestratégias empresariais, especialmente empaíses não-desenvolvidos."

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Segundo a FIPE,21 exportadores e impor-tadores contam com os serviços de linhas ma-rítimas regulares e não-regulares (eventual-tramp). Em relação às primeiras, que apresen-tam trajetos fixos, o importante é a diferencia-ção entre as linhas conferenciadas e as não-conferenciadas (outsiders). As conferências delinhas são acordos tarifários estabelecidos en-tre os armadores que operam uma mesma rota.Conforme o estudo, "as conferências de linhasão tentativas de se eliminar a concorrênciana navegação marítima, ou seja, as empresasprocuram, através de acordos, determinar pre-ços independentemente do estado da deman-da".

o dispositivo da pré-qualificação, apesar deconstituir uma possível

barreira à entradaburocrática, pode

apresentar tambémuma justificativa do

ponto de vista daeficiência que deve ser

ponderada.

Esse poder de ação cartelizada das empre-sas de navegação foi reduzido, de acordo como estudo, tendo em vista o aumento da ofertade embarcações, a maior capacidade das re-cém-construídas e o fluxo de novos armado-res estrangeiros em portos brasileiros. Esse fatoaumentou a concorrência, permitindo a que-bra de várias regulamentações existentes e aredução do poder de regulação do valor do fretemarítimo das conferências. Segundo o estudo,"os serviços regulares de linha não conferen-ciados - outsiders - são serviços oferecidospor armadores independentes que cobram ta-rifas mais baixas para poder concorrer comos armadores conferenciados". Nesse contex-to, o chamado special contract tem assumidoimportância crescente em relação às conferên-cias marítimas.

Para ilustrar esse aumento dacontestabilidade do mercado de transporte

19. LIMA, E.1,VELASCO,L. M. Op. cit.

20. Oe acordo com estudo da UNCTAD,citado por Lima & Velasco, os fretes foramaté 100% superiores aos praticados nospalsesdesenvolvidos. Sendo um cartal queage coordenadamente em nlvelinternacional, constituindo um mercadogeográfico mundial relevante, fica, noentanto, sem explicaçãoessadiferenciaçãode preços entre norte e sul, a não ser quese presuma a diferenciação daselasticidades de demanda entre as duasregiões.

21. FIPE. Op. cit.

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exemplo, uma série de custos são repassadosde um agente para o outro até, finalmente, che-gar ao usuário. Essa teia de relações apresentaimplicações do ponto de vista da estratégia parase tratar a questão concorrencial intraporto,ilustrada na Figura 1.

De acordo com a Figura 1, se não houverconcorrência entre os operadores portuários,todo o esforço de modernização das relaçõescapital-trabalho via OGMO pode ficar preju-dicado no sentido de reduzir o custo da opera-ção. Afinal, o usuário paga diretamente ao ope-rador que negocia com o trabalhador. O opera-dor repassará tanto mais para o usuário a redu-ção do custo da mão-de-obra, quanto mais omesmo operar em um ambiente concorrencial.Pode-se imaginar uma situação-limite na qualum operador com elevado poder de mercadono porto, pela falta de concorrência, venha aabsorver todo o ganho da racionalização dacontratação da mão-de-obra portuária semrepassá-lo para o usuário.

Também no caso da praticagem, é evidenteque todo o esforço de racionalização da ofertadesse tipo de serviços demanda a existência deefetiva concorrência entre as empresas de nave-gação. No limite, a ampliação da concorrênciano serviço de praticagem poderia ter efeitos pe-quenos na redução do custo para o usuário se aredução de custo gerada for absorvida apenaspelas empresas de navegação. O mesmo valepara a racionalização dos serviços prestadospelas ClAs Docas. Observe-se que, mesmo au-mentando a eficiência na administração portuá-ria, o repasse dos benefícios ao usuário finalpode ser limitado apenas à taxa de armazena-gem (item 2 do diagrama), pois as taxas de infra-estrutura, serviços gerais e aluguel de equipa-mentos (itens 4, 5 e 6) passam pelo operadorportuário, que, se estiver fora de um ambienteconcorrencial, pode absorver todo o benefício.

Cabe, no entanto, destacar que esse diagra-ma é bastante simplificado e não cobre todasas possíveis modalidades de relações entre osagentes do porto. Conforme a FIPE (1996), oscontratos realizados para transporte de cargasmarítimas obedecem a padrões definidos noINCOTERMS (International CommercialTerms), elaborado pela Câmara de ComércioInternacional. Há vários tipos de contratos con-sistentes com o INCOTERMS usualmenteadotados na navegação marítima e negociadosentre exportadores e importadores.

Para demonstrar como o diagrama acimapode ser modificado e suas implicações para a

22. Idem, ibidem.

23. Não é claro se o poder de barganhados armadores em carga geral é maiorpor causa do linerterm(um contrato quetalvez seja aceito pelo usuário por critériosde eficiência) ou se essa modalidade éimposta justamente por causa do elevadopoder de barganha da armação nessesegmento. Possivelmente um fortalece ooutro.

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marítimo, vale citar o evento descrito pelaPIPE, no qual, no segundo semestre de 1994,os armadores no mercado liner terms procura-ram estabelecer uma sobretaxa sobre o fretemarítimo para os portos do Rio de Janeiro e deSantos devido aos problemas de congestiona-mento destes últimos. A medida obteve o apoiode três conferências marítimas - Mediterrâneo,Europa e Interamericana. Conforme o estudo,"as dificuldades de sustentar esta medida emface da grande concorrência por fretes termi-naram por derrubar a sobretaxa". Essaconstatação seria especialmente verdadeira parao caso de granéis sólidos e líquidos, em que,ainda segundo a PIPE,22 "predomina uma con-corrência desenfreada na navegação", e noqual o armador não paga as despesas de em-barque e desembarque."

A autarquia deve terum papel de grande

relevância naimplementação da lei

dos portos em seusaspectos

concorrenciais.

Por outro lado, mesmo com essa concor-rência crescente, ainda remanesce um poder demercado das empresas conferenciadas que aca-bam por servir de parâmetro efetivo para astarifas praticadas. Há duas razões para isso.Primeiro, mesmo tendo aumentado a oferta deserviços de transporte marítimo, aumentoumuito a demanda pelos mesmos com o incre-mento do fluxo de comércio recente. Segun-do, a segurança do serviço prestado pelas li-nhas conferenciadas é, em média, maior.

CUSTO PORTUÁRIO ECONCORRÊNCIA

O incremento da concorrência intraportodepende, naturalmente, do conjunto das fasesda operação portuária. Assim, enquanto nositens anteriores foram discutidas individual-mente várias relações de concorrência no âm-bito do porto, nesta seção procurar-se-á anali-sar o conjunto destas relações. Em Santos, por

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DEFESADA CONCORRINClA NOS PORTOS

Figura 1 - Sistema de pagamentos no porto de Santos

Usuários no segmento

y de carga geral

Companhias de

~

2navegação

S/~ Trabalhadores daServiços de Operadores 4,5,6 Administração do ui capatazia e da

praticagem portuários e7 porto: CIASadministração doDOCAS

porto9

OGMO ou sindicato

12Trabalhadores da estiva e

outras

1. Frete.

2. Taxa de armazenagem: inclui recebimento, abertura para conferência aduaneira, arrumaçãoe serviços correlatos, recondicionamento e pesagem. Em alguns casos, a armazenagem éfeita em terminais retroportuárlos que não são de propriedade das CIAs Docas.24

3. Taxa de utilização da Infra-estrutura portuária: remuneram as obrigações consignadas àadministração do porto, a utilização das infra-estruturas de acesso aquaviário, deacostagem e da faixa do cals por ela mantidas.

4. Taxa de infra-estrutura operacional.5. Aluguel de equipamento da administração do porto.6. Taxa de serviços gerais: inclui água, energia elétrica e transporte executado pela

administração do porto.7. Pagamento do serviço de capatazia: em longo prazo, esse pagamento deve entrar na

relação usuário-operador em 10.25

8. Taxa do serviço de praticagem (práticos não abrangidos pelo OGMO e nem pelo sindicatode portuários, apresentando organização própria).

9. Remuneração definida em negociação coletiva entre operadores e sindicatos do serviço deestiva (em longo prazo, o espírito da Lei é incluir também a capatazla fora das CIAs Docas).

10. Pagamento do serviço de operação portuária.11. Pagamento aos trabalhadores da capatazla e administração portuária.12. Pagamento da estiva e outras categorias.

Fontes: FIPE e GEMPO. Elaboração dos autores.

concorrência, considerem-se os contratos linerterms. Neles, os custos associados às opera-ções de embarque no porto de origem, estiva,transporte marítimo, desestiva e desembarqueestão incluídos no valor do frete. Ou seja, par-te da (ou toda a) relação dos usuários com osoperadores portuários (item 10) está na rela-ção dos usuários com os armadores= (item 1).Desta forma, são as elAs de navegação quecontratam com os operadores portuários (ou

até diretamente com os sindicatos) várias dasoperações, e não os usuários diretamente. Osprincipais usuários desse tipo de contrato sãoas cargas gerais em conteiners, preponderan-temente produtos industrializados e semi-in-dustrializados. Observe-se que os problemasde concorrência supracitados sãomagnificados. Nesse tipo de contrato, podemexistir dois intermediários (armadores e ope-radores) que irão absorver as eventuais redu-

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24. Neste último caso, estudo da FIPE(p.97) revela que o custo desses armazénsestá entre os mais pesados em Santos,havendo um número insuficiente, sendosua concessão determinada por fatorespolíticos, criando barreiras a entradasindesejáveis.

25. Em longo prazo, pretende-se unificarcapatazia e estiva em um só processo,racionalizando a movimentação de cargas.O PIMOP contempla esse projetoimplantando a multifuncionalidade notrabalho portuário.

26. Há certa preocupação com aproliferação excessiva de operadoresportuários, tendo em vista que háexigências de capital mini mo para umaoperação eficiente, muitas vezes nãopreenchidas. Se houvesse concorrênciaadequada nesse setor, obviamente osmenos eficientes seriam eliminados. Noentanto, a questão da baixa eficiência nãoparece estar sendo resolvida naturalmentepelo mercado (nesse caso, nem seexigiriam regras de pré-qualificação).Segundo algumas opiniões não-confirmadas, isso pode estar ocorrendopor dois tatores conjugados que se tornam,conjuntamente, condições suficientes paraviabilizar a ineficiência: (a) váriosoperadores portuários são testas-de-ferrodos armadores e (b) não há concorrênciano setor de navegação. Ou seja, nãohavendo concorrência no transportemaritimo e sendo o operador portuáriouma mera extensão do armador, esseúltimo pode se dar ao luxo de ser ineficientena operação.

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ter seus próprios práticos, também respei-tadas as normas supracitadas.

10. Eliminar restrição de existência de apenasuma associação na praticagem.

11. Facultar o exercício da profissão de práti-co independentemente de filiação a qual-quer associação.

12. Avaliar a existência de conduta concertadados armadores e a influência das linhas não-conferenciadas nos preços dos fretes maríti-mos.

13. Promover a utilização de cláusulasconcorrenciais nos editais de licitação determinais. Exemplos destas últimas são asque impedem o controle de mais de um ter-minal no modelo estudado de Santos e asque determinam o não-bloqueio da movi-mentação de cargas de concorrentes em ter-minais especializados (suco de laranja, fer-tilizantes ).

14. Evitar o uso de restrições a empresas es-trangeiras nas licitações de terminais pri-vativos.

15. Avaliar se as CIAs Docas utilizam, efeti-vamente, uma ótica concorrencial para con-trolar mudanças no controle acionário doslicitantes e para ponderar os dados sobreconcorrência intraporto e entre portos for-necidos pelas licitantes.

16. Punir as eventuais infrações à ordem eco-nômica verificadas no porto pelos disposi-tivos da Lei 8.884/94, sinalizando, de for-ma clara e inequívoca, aos agentes econô-micos do porto que o CADE não toleraráabusos que estejam na órbita de sua compe-tência.Vale destacar especialmente esta última re-

comendação, que está diretamente relaciona-da ao trabalho do CADE. A autarquia deve terum papel de grande relevância na implemen-tação da Lei dos portos em seus aspectosconcorrenciais, dos quais não pode se furtar.Nesse sentido, cumpre ressaltar que o CADEdeve utilizar todos os instrumentos disponíveisna Lei 8.884/94, inclusive os de caráterrepressor, para restaurar, ou mesmo promover,o ambiente concorrencial no porto quando evi-denciada infração. Ou seja, no âmbito da le-gislação existente (tanto a Lei 8.630/93 comoa 8.884/94), cabe complementar a ação doGEMPO e dos Ministérios diretamente relacio-nados com a matéria, de forma a articular adefesa da concorrência com o propósito maiorde modernização do sistema portuário e redu-ção do Custo Brasil. [J

ções de custo com a resolução dos problemasde mão-de-obra com o OGMO.

Em outra modalidade, como o free in andout (FIO), o frete inclui apenas o transportemarítimo, o que é mais fiel ao diagrama aci-ma, incluindo cereais, minério, trigo e granéislíquidos embarcados através de dutos.

A configuração de mercado de outros agen-tes intervenientes entre o usuário-produtor e asoperações portuárias também podem ser im-portantes, como as tradings, que adquiremcommodities agrícolas no local de produção ese encarregam de toda a logística de exporta-ção, e os brokers (empresas especializadas emlogística, normalmente utilizadas no comércioexterior de pequenas empresas).

CONCLUSÕESA discussão anterior sugere pontos para

incrementar o ambiente concorrencial no setor,tendo como base as Leis 8.630/93 e 8.884/94:1. Avaliar se as normas exaradas pelos CAPs

em cada porto e sua implementação pelasCIAs Docas têm restringido ou não a pré-qualificação de operadores portuários.

2. Avaliar se os operadores portuários estãosendo muito flexíveis nas negociações como sindicato, dada sua capacidade de repas-sar custos mais altos de mão-de-obra parao usuário.

3. Eliminar a compulsoriedade de toda e qual-quer tabela de turnos de trabalho tanto paraos operadores como para os usuários.

4. Acelerar a implantação da multifunciona-lidade do processo de trabalho portuário.

5. Avaliar a possibilidade de transferência daregulação do serviço de praticagem da au-toridade marítima para a administração doporto.

6. Eliminar dessa regulação qualquer item re-ferente a preços dos serviços quando emum determinado porto houver satisfatóriaconcorrência na praticagem.

7. Eliminar restrições do número de práticospor porto, limitando-se a barreira à entradaao processo de qualificação e certificação,que deve ser conduzido por entidade liga-da ou à administração do porto ou ao CAPo

8. Eliminar restrições para que comandantesde navios possam ser práticos, respeitadasas normais atuais de número mínimo de ma-nobras por período de tempo.

9. Eliminar restrições para que empresas con-cessionárias de terminais privativos possam

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