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1
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
ADRIANA ALMEIDA DE MELO
TRANSAÇÃO PENAL: BREVES CONSIDERAÇÕES, À LUZ DA LEI
Nº9.099/95
João Pessoa 2009
2
Adriana Almeida de Melo
TRANSAÇÃO PENAL: BREVES CONSIDERAÇÕES, À LUZ DA LEI Nº 9.099/95
Monografia apresentada ao Curso de
Graduação em Direito, da FESP Faculdades,
como requisito parcial para obtenção do título
de Bacharel em Direito.
Orientador: Tiago Felipe Azevedo Isidro.
João Pessoa 2009
3
M528t Melo, Adriana Almeida de Transação penal: breves considerações à luz da Lei nº
9099/99. / Adriana Almeida de Melo – João Pessoa, 2009.
49f.
Orientador: Prof. Tiago Felipe Azevedo Isidro Monografia (Graduação em Direito) Faculdade de Ensino
Superior da Paraíba – FESP.
1. Transação Penal 2. Juizados Especiais Criminais 3. Infrações de Menor Potencial Ofensivo I. Título.
BC/FESP CDU: 343 (043)
4
Adriana Almeida de Melo
TRANSAÇÃO PENAL: BREVES CONSIDERAÇÕES, À LUZ DA LEI Nº9.099/95
Monografia apresentada ao Curso de
Graduação em Direito, da FESP Faculdades,
como requisito parcial para obtenção do título
de Bacharel em Direito.
Orientador: Tiago Felipe Azevedo Isidro
Data de Aprovação: _______/_______/_________.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________
Prof. Tiago Felipe Azevedo Isidro. (Orientador)
___________________________________________________
Professor (a)
___________________________________________________
Professor (a)
João Pessoa 2009
5
Com muito amor, a minha família, em especial
a Antônio Almeida de Melo, meu pai, pelo
esforço e dedicação, em todos os momentos
desta e de outras caminhadas. DEDICO
6
AGRADECIMENTOS
A DEUS, pela fé que me concedeu para obtenção de mais esta conquista,
depois de tantos obstáculos enfrentados.
Aos meus pais Antônio e Ana Maria, que tanto me incentivaram e não
mediram esforços para o meu aprendizado, com bastante dedicação para que eu
não desistisse na luta pela realização de mais um sonho.
Ao professor Tiago Felipe Azevedo Isidro, competente orientador, por toda
sua atenção, disponibilidade e pelas orientações importantes facilitando assim
elaboração desta monografia, para o término dessa longa jornada.
Á FESP FACULDADES, particularmente a todos os professores do curso de
Direito, que, com dedicação e competência, muito contribuíram para a minha
formação.
À professora Ana Luíza Celino Coutinho, da FESP FACULDADES, que
facilitou com seus ensinamentos para o trabalho de conclusão deste Curso.
A todos os meus colegas do Curso de Direito desta instituição, que
enriqueceram o nosso convívio, através dos debates e trocas de experiências.
A todas aquelas pessoas que, de uma forma ou de outra, contribuíram para
esta conquista.
7
RESUMO
A Transação Penal nos Juizados Especiais Criminais vem sendo considerada como
uma das mais importantes formas de despenalizar, procurando reparar os danos e
prejuízos sofridos pela vitima de maneira mais econômica, agilizando e simplificando
o processo e julgamento para as infrações penais de menor potencial ofensivo,
aquelas consideradas de menos gravidade, desafogando o Judiciário e evitando a
aplicação de penas privativas de liberdade, e buscando sempre que possível a
conciliação. A transação penal, de acordo com o art. 2° da Lei 9.099.95, busca evitar
o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público livrando o autor do fato de um
processo criminal. O cumprimento da pena acordada não gera reincidência, nem
será indicada em registros criminais e não gerará efeitos civis, sendo registrada
apenas para impedir nova transação nos próximos cinco anos. A transação penal é
um procedimento bastante diferente dos demais existentes à época da edição da
referida Lei, e que, portanto, trouxe consigo novos debates acerca do processo e
julgamento de infrações que produzem uma menor consequência no meio social.
Palavras-Chave: Transação Penal, Juizados Especiais Criminais, Infrações de
menor potencial ofensivo.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................
CAPÍTULO I - LINHAS GERAIS SOBRE A LEI Nº 9.099/95.................................
1.1 Requisitos da Transação Penal......................................................................
CAPÍTULO II - TRANSAÇÃO PENAL: BENEFÍCIO OU APLICAÇÃO DE PENA
SEM O DEVIDO PROCESSO LEGAL?..................................................................
2.1 Descumprimento da Transação Penal...........................................................
CAPÍTULO III - TRANSAÇÃO PENAL: É UM DIREITO SUBJETIVO OU UMA
DISCRICIONARIEDADE RESERVADO AO MINISTERIO PUBLICO? .................
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................
REFERÊNCIAS .....................................................................................................
8
12
17
23
27
34
42
47
9
INTRODUÇÃO
A presente monografia tem por objetivo analisar a Transação Penal nos
Juizados Especiais Criminais. A Lei dos Juizados Especiais Criminais veio a dar
efetividade ao artigo 98 da Constituição Federal, agilizar e simplificar o procedimento
e julgamento para as infrações penais de menor potencial ofensivo visando dá
celeridade aos feitos criminais, possibilitando a reparação dos danos causados às
vitimas, que, após as alterações trazidas pelo art. 2º, parágrafo único, da Lei n.
10.259/01, são todas as contravenções penais e os crimes que tenham pena máxima
não superior a dois anos.
Art.2º- Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os fatos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência. Parágrafo Único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrente da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.
Os Juizados Especiais Criminais, com esse efeito, deverá ser utilizado na
realização desse novo processo, dessa nova forma de pensar a Justiça e a
concretização dos direitos.
A Transação Penal, na forma da lei, utiliza-se do procedimento oral e
sumaríssimo, permitindo o julgamento dos recursos por turmas de Juízes de primeiro
grau. O objetivo da norma constitucional foi o de propiciar uma justiça criminal mais
ágil e mais adequada à conjuntura social em um Estado democrático, simplificando
procedimentos e impedindo a estigmatização do acusado pelo processo penal e
estabelecendo alternativas para as penas de detenção, e, por outro lado, a criação de
novos institutos dentro do direito de punir. A aceitação da transação penal não tem
efeitos penais. Com aceitação e cumprimento da pena alternativa proposta em sede
de transação penal, o autor da infração fica sem poder fazer jus a este benefício nos
próximos cinco anos.
Dispõe de forma clara o artigo 76 da Lei 9.099/95 as hipóteses de
cabimento, os requisitos para sua concessão, bem como o procedimento e os efeitos
da transação criminal:
10
Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. § 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado: I - ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; II - ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida. § 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz; § 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. § 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei. § 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.
Segundo Sergio Turra Sobrane, a transação penal pode ser definida como
o ato jurídico, através do qual, o Ministério Público e o autor do fato, atendidos os
requisitos legais, e na presença do magistrado, acordam em concessões recíprocas
para prevenir ou extinguir o conflito instaurado pelo fato típico, mediante o
cumprimento de uma pena consensualmente ajustada.1
Damásio de Jesus diz tratar-se de um negócio entre o Ministério Público e a
defesa, possibilitando-se ao juiz, de imediato, aplicar uma pena alternativa ao
autuado, justa para a acusação e defesa.2
Para Dotti, é medida alternativa que visa impedir a imposição de pena
privativa de liberdade, mas não deixa de constituir sanção penal. Como o próprio
dispositivo estabelece, claramente, a pena será aplicada de imediato, ou seja,
antecipa-se a punição. É pena no sentido de imposição estatal, consistente em perda
ou restrição de bens jurídicos do autor do fato, em retribuição à sua conduta e para
prevenir novos ilícitos.3
Neste trabalho, tentaremos tecer alguns comentários em torno da transação
penal e do procedimento nos Juizados Especiais Criminais, principalmente nos
1 SOBRANE, Sergio Turra. Transação Penal. São Paulo: Saraiva, 2001. P. 75
2 JESUS, Damásio Evangelista. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. São Paulo: Saraiva, 1995. P. 62.
3 DOTTI, René Ariel. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. P. 433.
11
pontos de maior dúvida na aplicação do rito processual previsto na Lei n. 9.099/95. A
transação penal proposta pelo ministério Público é a aplicação de pena alternativa à
prisão.
O art. 5º, LIV e LV da Constituição Federal, prevê o direito ao devido
processo legal ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal. Na transação penal, o Ministério Público abre
mão da persecução penal, e o autor do fato aceita a proposta evitando o processo
ao preferir sujeitar-se se sujeitar a uma medida penal que, em sendo cumprida,
permitirá a extinção da punibilidade. Não há ofensa ao devido processo legal nem ao
principio da presunção da inocência, pois na transação penal não se discute a
culpabilidade do autor do fato. Não há efeitos penais ou civis, reincidência, registro
ou antecedentes criminais.
A transação penal é inspirada no art. 2° da Lei 9.099.95, ou seja, o processo
se baseia na oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e
celeridade, buscando sempre que possível, a conciliação.
A proposta de transação apenas deverá ser veiculada se houver justa causa
suficiente para o exercício da ação penal, do contrario o termo circunstanciado
deverá ser arquivado. Só o autor do fato depois de preenchidos os requisitos
objetivos e subjetivos, poderá aceitar ou não a proposta de transação penal.
Com a finalidade de dispor de maneira didática o conteúdo deste trabalho o
subdividiremos em 03 (três) capítulos. Assim, no primeiro capitulo, faremos uma
breve análise da Lei nº 9.099/95 e dos requisitos da transação penal apresentando a
sua eficácia e evitando que o acusado seja processado, ou seja, ainda que a
aplicação do rito sumaríssimo deva ser breve, o legislador busca um meio mais
rápido de sancionar aquele que agiu em desconformidade com a lei.
No segundo capítulo, analisaremos se a transação penal é um beneficio ou
aplicação de pena sem o devido processo legal. Também discutiremos sobre o seu
descumprimento e as principais dificuldades existentes no pátrio ordenamento
jurídico, para se fazerem cumprir as medidas substitutivas impostas a título de
transação penal, procurando-se pautar as soluções nos princípios Constitucionais do
Direito Processual Penal. Para tanto, serão apresentadas as consequências do
descumprimento, as soluções apresentadas pela doutrina e jurisprudência, bem
como suas principais deficiências.
12
Por último, no terceiro capítulo, adentramos em um ponto polêmico da
transação penal: se é um direito subjetivo do autor do fato ou uma discricionariedade
reservado ao Ministério Publico. Analisaremos a natureza jurídica da decisão que
homologa a transação e até onde o juiz poderá controlar o exercício da transação
penal pelo Ministério Público.
O presente trabalho tem como tema TRANSAÇÃO PENAL: BREVES
CONSIDERAÇÕES, À LUZ DA LEI Nº 9.099/95, baseada em pesquisa bibliográfica,
com a finalidade de colocar em debate a liberdade do individuo, e suas escolhas, o
impacto das leis penais na sociedade e a ressocialização do infrator.
No trabalho ora exposto, determinamos que a técnica de pesquisa utilizada
foi a de documentação indireta, pois abrange a pesquisa documental e bibliográfica.
O método de abordagem a ser utilizado foi o indutivo, que permite analisar
nosso objeto para tiramos conclusões gerais e universais, ou seja, a partir da
observação de um ou alguns fenômenos particulares, uma proposição mais geral é
estabelecida para, por sua vez, ser aplicada a outros fenômenos. É um
procedimento generalizador, porém, os métodos de procedimentos utilizados foram
os funcionalistas que se referem ao estudo de um fato do ponto de vista da função.
A sociedade é entendida como um todo que se comporta como um mecanismo em
operação, ou seja, cada engrenagem, cada elemento da sociedade possui uma
função neste todo. E o outro método é o estruturalista: o centro das atenções, que
se situa no estudo dos fenômenos como componentes de um todo maior. Portanto,
este método não analisa a sociedade individualmente, nem estuda o comportamento
de um indivíduo, como se ele vivesse afastado de toda estrutura social. Importa
conhecer os elementos que compõem a sociedade como um todo para poder
explicar o comportamento de setores sociais mais específicos ou de indivíduos.
A metodologia utilizada classifica-se quanto aos meios de investigação:
pesquisa bibliográfica que “é aquela (...) desenvolvida a partir de um estudo
sistematizado desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas,
jornais, documentais, periódicos, artigos, dirigidos ao público em geral. Além disso,
no caso de ser uma pesquisa jurídica, é importante o estudo de documentos como
leis, repertórios de jurisprudências, anais legislativos, constituindo uma vertente
específica da pesquisa”.
13
1- CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A LEI Nº 9.099/95.
O Juizado Especial Criminal foi criado, pela Lei nº 9.099, de 26/09/1995, e
objetiva a conciliação, julgamento e execução das infrações penais de menor
potencial ofensivo, buscando sempre que possível a reparação dos danos sofridos
pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade.
A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 98, inciso I4, impôs aos entes
federativos a criação dos Juizados Especiais Criminais, e delegou ao legislador
infraconstitucional o dever de instituir, no âmbito dos Juizados Especiais Criminais, a
transação penal.
A transação penal é inspirada no art. 2° da Lei 9.099.95, ou seja, o
processo se baseia na oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual
e celeridade, buscando sempre que possível, a conciliação, julgando e executando
as infrações penais de menor potencial ofensivo, aquelas consideradas de menor
gravidade, reparando os danos sofridos pela vítima e aplicando penas restritivas de
direitos que, de acordo com o Art. 43 do Código Penal, são:
Art. 43- As Penas restritivas de direitos são: I - Prestação Pecuniária; II - Perdas de bens e valores; III ---------------------------------------------------------------------------------- IV - Prestação de serviços a comunidade ou entidades publicas; V - Interdição temporária de direitos; VI - Limitação de fim de semana.
A Lei 9.099/95, no art. 76, caput, instituiu a figura da transação penal,
nos seguintes termos:
Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.
4Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos por
juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis
de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e
sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de
juizes de primeiro grau.
14
Como se vê, embora não conste da lei o vocábulo “transação”, o ato
praticado segundo o dispositivo legal supra transcrito efetivamente configura um
acordo entre as partes, uma verdadeira transação, como é conhecida. Esta medida
despenalizadora pode ser assim conceituada:
A transação penal é uma das figuras presentes no procedimento sumaríssimo característico dos Juizados Especiais e formalizado no Brasil pela Lei nº 9.099/95. Ao fazer a proposta, o representante ministerial não emite juízo definitivo de culpabilidade, posto que não foram produzidas todas as provas de que depende tal conclusão. O suposto autor do fato, naquele momento, nem é culpado, nem é inocente. Ele é passível tão-somente, de um juízo de probabilidade de culpabilidade, em que se aplica antecipadamente uma pena não-privativa de liberdade, de acordo com os elementos apresentados no termo circunstanciado de ocorrência.
5
Do conceito ora transcrito, podemos verificar algumas características da
transação, quais sejam: o consenso, o não reconhecimento da culpabilidade, e a
aplicação de pena não privativa de liberdade, sem a necessidade de se instaurar a
ação penal.
É bom frisar que, para que se possa oferecer proposta de transação penal,
é imprescindível que o Ministério Público tenha firmado a sua opinio delicti,
entendendo pela viabilidade da ação penal. Caso contrário, havendo nos autos
elementos que levem à conclusão da atipicidade do fato, ou da ocorrência de
alguma exclusão de ilicitude, deve-se promover o arquivamento dos autos. Em
outras palavras, se não há elementos mínimos quanto à ocorrência do delito, não se
pode falar em aplicação imediata de pena.
Antonio Fernandes Scarance comenta sobre a revolução no sistema
brasileiro com a lei 9.099/95:
A Lei 9.0999/95 representou verdadeira revolução no sistema brasileiro, liberando a justiça para o consenso em matéria penal, sendo, em virtude disso, aplaudida pela grande maioria dos estudiosos e dos operadores do direito. Insere o Brasil entre os países que adotam o modelo consensual de justiça criminal, no mesmo sentido do que vinha sendo estimulado pela doutrina (Processo Penal Constitucional, pág. 215).
6
5CARVALHO, Liana Espínola Pereira de. Maus antecedentes e sua repercussão na proposta de transação penal
pelo Ministério Público. Revista Jurídica do Ministério Público, João Pessoa, ano 1, n. 1, p. 365-387, jan./jun.
2007. 6 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 4º ed. Rev. atual. e ampliada. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2005.
15
As contravenções e crimes mais julgados nos Juizados Especiais Criminais
são: Omissão de cautela na guarda ou condução de animais; Perturbação do
trabalho ou do sossego alheios; Importunação ofensiva ao pudor; Perturbação da
tranqüilidade. Crimes de Ameaça; Lesão corporal; Desobediência; Dano; Ato
obsceno; Comunicação falsa de crime ou contravenção; Exercício arbitrário das
próprias razões; Dirigir sem habilitação causando perigo de dano.
Possui natureza de negócio jurídico civil, firmado entre o Ministério Público e o autor do fato, e que as „penas‟ de multa e restritivas de direitos, estabelecidas por força desse negócio jurídico nada mais são do que as prestações assumidas pelo autor do fato. Quanto à sentença estabelecida pelo parágrafo 4
o do artigo 76 da Lei n
o 9.099/95, não é condenatória, não
impõe pena, mas somente homologa o acordo firmado entre as partes e forma o título executivo judicial da obrigação assumida pelo autor do fato, tendo por conseqüência a exclusão do processo-crime e a declaração da extinção da punibilidade, pela decadência do direito de propor a ação penal.
7
Dois aspectos da transação penal são de extrema importância para o
entendimento do instituto. O primeiro deles se refere à proibição de aplicação de
pena privativa de liberdade. A proposta jamais poderá versar sobre pena de prisão.
É essa vedação legal que afasta a nossa transação penal do direito norte
americano, onde o acusador tem maior liberdade para “barganhar” com o acusado.
Um segundo ponto de grande relevância é o não reconhecimento da
culpabilidade. Por expressa previsão legal (art. 76, § 4º), a aceitação da proposta
pelo autor do fato não implica em reincidência, e deverá ser registrada apenas para
obstar que a mesma pessoa seja novamente beneficiada com a transação no prazo
de cinco anos.
E não poderia ser diferente. Se o autor do fato está abdicando de um
processo judicial, no qual poderia ser inclusive absolvido, para que seja
imediatamente aplicada a sanção penal, não se poderia conceber que a aceitação
da proposta induzisse reincidência e gerasse antecedentes criminais. Estar-se-ia
diante de flagrante ofensa aos princípios do devido processo legal e presunção da
inocência, consagrados pela Constituição Federal.
7 PAIVA, Mario Antonio Lobato de. A Lei dos Juizados Especiais Criminais. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.
49.
16
Um ponto polêmico acerca da transação penal é o seu cabimento na ação
privada. O art. 76 da Lei dos Juizados contemplou a transação apenas para os
casos de ação pública, condicionada ou não, sendo legitimado a ofertar a proposta
apenas o Ministério Público. Diante da falta de previsão legal, o titular da queixa
crime não poderia propor a aplicação imediata de penal.
O eminente doutor Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, ensina,
às paginas 251/252:
Pela redação do artigo 76, teria sido excluída a possibilidade de transação nos crimes de iniciativa privada. Consistiria isso simples omissão do legislador ou uma vedação consciente? Quando a lei confere ao particular a legitimidade para o exercício da ação penal, o faz na condição de substituto processual do Estado, que é o titular da pretensão punitiva. Como se sabe, na legitimação extraordinária o substituto não tem poderes para transacionar com os direitos do substituído. Portanto, o querelante só poderia oferecer transação penal quando houvesse autorização legal. A Lei nº 9099/95 não lhe dá tal autorização. Ocorre que é princípio geral de interpretação que quem pode o mais, pode o menos. Ou seja, quem pode deduzir em juízo uma pretensão condenatória pode também transacionar a pretensão, reduzindo o seu alcance, ainda mais consensualmente. Além disso, e mais importante, o querelante pode até perdoar e ocasionar a extinção da punibilidade, conforme autorizam os artigos 51 do Código de Processo Penal e 105 do Código Penal. Desse modo, a autorização para que o querelante transacione a pretensão punitiva está assentada nos sistemas processual penal e penal que devem ser aplicados à Lei nº 9099/95, à falta de dispositivo específico.
8
No entanto, a evolução do direito abriu novos horizontes nesse sentido.
Senão vejamos:
A vítima, que viu frustrado o acordo civil do art. 74, quase certamente oferecerá a queixa, se nenhuma outra alternativa lhe for oferecida. Mas, se pode o mais, por que não poderia o menos? Talvez sua satisfação, no âmbito penal se reduza à imposição imediata de uma pena restrita de direitos ou multa, e não se vêem razões válidas para obstar-se-lhe a via da transação que, se aceita pelo autuado, será mais benéfica também para este.
9 Em sendo assim, fica claro que a transação penal é cabível em caso de
ação penal de privada. Preenchidos os requisitos da transação, não há motivos para
8 CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de et al. Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais
Comentada e Anotada. 2ª ed., rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 434 p. 9 GRINOVER, Ada Pellegrini et alii, Juizados especiais Criminais. 4º Ed. São Paulo, RT, 2002. p. 150.
17
não admitir a sua incidência na ação penal privada, como forma de, mais uma vez,
atender ao princípio da razoável duração do processo.
Segundo decisão do STJ: A Lei 9099/95 aplica-se aos crimes sujeitos a
procedimentos especiais, desde que obedecidos os requisitos autorizadores,
permitindo a transação e a suspensão condicional do processo inclusive nas ações
penais de iniciativa exclusivamente privada. 10
"É possível a transação penal privada, se o autor do fato satisfaz os
requisitos legais. A transação penal é instituto inovador e que deve ser prestigiado
pelo Judiciário independentemente da legitimidade ativa para a ação ou a sua
titularidade ou da vontade do querelante ou do Ministério Público." 11
É importante frisar, todavia, que a homologação do acordo implica em
renúncia ao direito de representação ou queixa e, por conseguinte, em extinção da
punibilidade. Dito isso, não se pode deixar de abordar um dos mais controvertidos
aspectos atinentes à transação penal: a natureza jurídica da sentença que homologa
o acordo.
Correntes várias há em diversos sentidos. Há quem sustente que a sentença
tem caráter absolutório; existe também quem diga que é sentença condenatória, ou
mesmo “condenatória imprópria”. Mas, a mais acertada corrente é aquela, segundo
a qual, a sentença tem caráter meramente homologatório. É a posição adotada,
inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal.12
A respeito da sentença homologatória da proposta de transação penal,
pode-se dizer:
[...] a sentença em estudo possui natureza meramente homologatória, pelo fato de que o papel do magistrado no momento da prolação da decisão é, tão-somente, dar força jurídica ao consenso realizado entre as partes. Não há, portanto, na realidade, qualquer condenação, tampouco uma modificação na situação do autor do fato. [...] entendemos que a sentença meramente homologatória da transação penal não faz coisa julgada material, ficando, apenas, no âmbito da coisa julgada formal. Ela não entra no mérito da questão, não discute a autoria, a materialidade ou quaisquer outros aspectos do crime.
13
10
(S.T.J. , Confl. Comp. 30164/MG, Rel. Min. Gilson Dipp, em 13.12.01) 11
(Turma Recursal de Belo Horizonte, Rec. 10078, Rel. Juiz Eli Lucas de Mendonça, em 30.9.98). 12
STF, 1ª. T.,HC 79.572/GO, rel. Min. Marco Aurélio, j. 20-2-00, DJ 22 fev. 02, p. 34. 13
GALDINO, Gardênia Cirne de Almeida. Descumprimento da transação penal. Revista Jurídica do Ministério
Público, João Pessoa, ano 1, n. 1, p. 113-150, jan./jun. 2007.
18
Nesses termos, descumprido o acordo, o processo retomará seu curso, com
o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público e a instrução, culminando com a
prolação de sentença.
1.1- Requisitos da Transação Penal Há requisitos a serem observados na transação penal e preenchidos.
Requisito prévio é a existência das condições da ação, não se admitindo a
apresentação de proposta se o caso determina o arquivamento do procedimento
investigatório. A partir da criação da transação penal, entendemos não se admitir
sua apresentação quando houver dúvidas quanto à autoria, materialidade, existência
do fato típico e ilícito. Ao contrário da análise que se faz no momento do
oferecimento da denúncia, informada pelo princípio in dubio pro societate, a
transação penal deve ser informada pelo princípio in dubio pro reo, ou seja, na
dúvida a favor do réu, não se pode admitir a aplicação imediata de sanção penal,
sob pena de se afrontarem os princípios constitucionais anteriormente indicados.
Aqui, sim, justifica-se o temor da flagrante desigualdade das partes.14
O primeiro requisito indispensável da transação penal é que o crime não
possua pena privativa de liberdade superior a 02 (dois) anos, ou seja, contravenção
penal, ex vi do artigo 2º, § único, da Lei nº 10.259/01.15 Além desse requisito, conta
também com três causas impeditivas, que estão elencadas no § 2º do art. 76. São
elas: a condenação anterior do autor do fato à pena privativa de liberdade, pela
prática de crime (inc. I); o gozo do benefício da transação penal, no prazo de 5
(cinco) anos (inc. II); e a inadequação da medida, diante dos antecedentes, conduta
social e personalidade do agente bem como os motivos e circunstâncias do fato (inc.
III).
As hipóteses previstas nos dois primeiros incisos são claramente objetivas e,
portanto, estando comprovadas nos autos, impedem diretamente a proposta de
transação, não havendo lugar para questionamentos.
14
GOMES, Luiz Flávio. Tendências político-criminais quanto à criminalidade de bagatela. São Paulo:
RBCCrim, 1992, p.88-109. 15
“Art. 2º- Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça
Federal relativos as infrações de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência.
Parágrafo Único- Na reunião de processos, perante o juízo comum ou tribunal do júri, decorrente das regras de
conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civil.”
19
Cabe salientar, no entanto, que, no caso do inciso I, a condenação que pesa
sobre o autuado deve, necessariamente, ser pela prática de crime, não sendo
suficiente a condenação por contravenção. É necessário que o acusado seja
primário e de bons antecedentes, não tenha sentença condenatória definitiva com
trânsito em julgado porque milita ao seu favor a presunção da inocência. Outrossim,
a pena imposta deve ter sido privativa de liberdade. Como bem assinala Márcio
Franklin Nogueira, “eventual condenação anterior cuja pena tenha sido substituída
por restritiva de direitos ou por multa não impede o benefício”.16
A segunda causa impeditiva, a seu turno, se destina a coibir a impunidade,
posto que, se possível fosse que determinado indivíduo praticasse inúmeros crimes
de baixa lesividade e para todos eles pudesse ser beneficiado com a transação
penal, a criminalidade certamente seria incentivada. Da data da infração, o acusado
não pode ter sido beneficiado pela transação penal menos de cinco anos.
Já a terceira causa, prevista no inciso III, é a única de caráter subjetivo. E é
justamente ela que baseia o nosso posicionamento contra da aplicação da transação
nos casos de crime de menor potencial ofensivo conexo a crime comum.
O Ministério Público, quando preenchidos todos os requisitos objetivos e
subjetivos para a oferta da transação penal, deverá executá-la, ainda que nas ações
penais privadas. Neste caso, o que é particular é a iniciativa, pois de fato, todas as
ações são de caráter público.
Vejamos o seguinte exemplo: “A” mata “B”, a fim de subtrair seu carro e, no
mesmo instante, ao ser flagrado pela polícia, resiste à ordem de prisão, efetuando
disparos de arma de fogo contra a guarnição. Praticou, portanto, os crimes de
latrocínio e resistência, em concurso material (art. 157, § 3º e 329 c/c 69, todos do
Código Penal).
O crime de resistência, cuja pena máxima é de dois anos, é, claramente, de
menor potencial ofensivo e, em tese, seria passível de transação penal. Contudo, se
for considerada a regra anterior, em que as penas cominadas a ambos os crimes
seriam somadas, a transação estaria claramente impedida.
16
NOGUEIRA, Márcio Franklin. Transação penal. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 177.
20
De acordo com a regra introduzida pela Lei 11.313/2006, a resistência deve
ser considerada individualmente e, portanto, é cabível a transação penal para este
caso específico.
Esta nova possibilidade, a nosso ver, é absolutamente equivocada. Ora, na
hipótese proposta, o agente, além de ofender dois bens jurídicos da vítima, a vida e
o patrimônio, ainda resistiu à ordem que lhe fora dada por agente público legitimado,
demonstrando total distanciamento dos parâmetros normais de comportamento.
O contexto em que foi praticada a resistência, em concurso com crime cuja
pena mínima é de 20 (vinte) anos de reclusão, indica a personalidade voltada à
prática criminosa do agente e, consequentemente, a insuficiência da transação.
E esse impedimento à transação, é bom dizer, não fere o princípio da
presunção de inocência, posto que o agente seja ainda submetido a processo
judicial e, ao final, poderá ser até mesmo absolvido da imputação.
Trazemos à baila, ainda, o teor do Enunciado 723 da Súmula do Supremo
Tribunal Federal, que trata da suspensão condicional do processo:
Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado,
se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um
sexto for superior a um ano.
Na mesma esteira se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, ao editar o
Enunciado 243, ora transcrito: O benefício da suspensão do processo não é
aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso
formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo
somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.
Como se vê, os Tribunais Superiores, tratando de matéria semelhante, já
firmaram entendimento no sentido da inaplicabilidade dos institutos
despenalizadores no caso de a soma das penas ultrapassar o limite legal.
“Ocorre que, no caso de concurso de crimes, a pena considerada para fins
de fixação de competência será o resultado da soma, no caso de concurso material,
ou a exasperação, na hipótese de concurso formal ou crime continuado, das penas
máximas cominadas aos delitos. Precedentes. (...) Dessa forma, sendo o total das
penas, em abstrato, do caso vertente, superior a 2 (dois) anos, resta afastada, de
plano, a competência dos Juizados Especiais, não fazendo jus o paciente ao
benefício da transação penal”. (STJ - HC 41891/RJ; HABEAS CORPUS
2005/0024746-4. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA. DJ 22.08.2005 p. 319).
21
Diante de tudo o que foi exposto, a conclusão a que se chega é a de que a
Lei 11.313/2006 padeceu de grave equívoco, permitir a transação penal quando as
infrações penais de menor potencial ofensivo praticadas com laço de conexidade
com crimes comuns, e ainda permitir a aplicação da transação penal e da
composição dos danos civis no âmbito do juízo comum e do tribunal do júri. Quando
houver concurso de crimes para o mesmo autor do delito, que a apena ultrapasse 02
(dois) anos, haverá processamento e julgamento na vara comum, não sendo
possível a aplicação da transação penal.
A transação penal, de acordo com o art. 2° da Lei 9.099.95, busca evitar o
oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. A proposta de transação apenas
deverá ser veiculada se houver justa causa suficiente para o exercício da ação
penal, do contrario o termo circunstanciado deverá ser arquivado. O processo se
baseia na oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade,
buscando sempre a conciliação.
Feita a proposta, ela é submetida à aceitação bilateral pelo autor do fato e
pela defesa técnica. A transação deve ocorrer em audiência, com a presença do
Promotor de Justiça, que formaliza a proposta, pelo Juiz, que fiscaliza o acusado e
seu advogado, que podem transigir. Tudo deverá ficar formalizado, como garantia do
cidadão. Assim, não há transação penal extraprocessual, devendo sempre ser
formalizada nos autos. Se assim não se fizesse, aí sim, ficariam vulneradas as
garantias constitucionais. Se aceita por ambos, o juiz verificará se estão presentes
os seus requisitos objetivos e subjetivos e aplicará a pena não privativa de liberdade
discriminada na proposta. A aceitação da transação penal não é obrigatória. Nesse
caso, o Promotor de Justiça oferecerá uma denúncia (pedido ao Juiz para iniciar a
ação penal) e o suposto autor do fato será processado criminalmente, oportunidade
em que será citado (chamado a se defender em Juízo) para participar de uma
audiência de instrução e julgamento, onde deverá estar obrigatoriamente
acompanhado de advogado, podendo apresentar testemunhas.
A aceitação da sanção penal não importa em reconhecimento da
culpabilidade penal.17 Significa submissão consentida à sanção penal. Isso porque o
legislador brasileiro não fez depender a transação penal do prévio reconhecimento
da culpabilidade: o acordo sobre a aplicação imediata da pena é anterior à
17
GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antônio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antônio Scarance;
GOMES, Luíz Flávio; Comentários à Lei 9099/95; Revista dos Tribunais; p. 98
22
acusação, e na técnica da Lei não há discussão, nem reconhecimento de culpa. Em
situação alguma poderá ser transacionada pena privativa de liberdade. A aceitação
é benéfica para o autor do fato, pois não haverá anotação para efeito de
reincidência. O registro da transação impede apenas nova transação em até cinco
anos. Além disso, a aceitação não permite a execução civil da sentença para efeito
de reparação de dano. À vítima permanece aberta a via da ação civil ex delicto do
CPP.18
A proposta da transação penal só pode ser aceita pelo autor do fato. Este
tem que analisar bem o caso em concreto com seu advogado, as vantagens e
desvantagens para transacionar. Por exemplo, Vantagens: 1º- a resposta penal é
imediata; 2º- evita um processo moroso; 3º- desvencilha rapidamente o delinquente
das malhas do processo; 4º- reduz o custo do delito. Desvantagens: 1º- ausência de
exercício dos princípios da verdade real, do contraditório, do recurso, da ampla
defesa, do estado de inocência, etc.; 2º- coação psicológica do autuado; 3º-
desigualdade entre as partes.
Damásio E. de Jesus, ao comentar o art. 76 da Lei 9.099/95, afirma que:
O instituto da transação inclui-se no “espaço de consenso”, em que o Estado, respeitando a autonomia de vontade entre as partes, limita voluntariamente o acolhimento e o uso de determinados direitos. De modo que esses princípios não devem ser considerados absolutos e sim relativos, abrindo espaço para a adoção de medidas que, em determinado momento, são de capital importância para o legislador na solução de problemas, como da criminalidade, economia processual, custo do delito, superpopulação carcerária, etc.
19
Quando aceita, a transação põe termo ao procedimento, não mais
podendo ser discutida a autoria do fato ou a sua culpabilidade, sendo vedada,
assim, a retomada da persecução criminal, mesmo quando tal obrigação não for
cumprida. A aceitação da transação por cidadão desacompanhado de advogado é
nula. Os Juizados Especiais Criminais possuem defensores públicos de plantão
aptos a ajudarem as partes. Todavia, recomenda-se que o cidadão vá acompanhado
por seu advogado de confiança, para orientá-lo na defesa de seus direitos. Tem sido
comum o Ministério Público formular aos autores dos fatos propostas de transação
penal consistentes em pagamento de prestação pecuniária, prestação de serviços à
18
ARAS, Vladimir. Transação penal nos Juizados Especiais Criminais . Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60,
nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3361>. Acesso em: 13 maio 2009. 19
Damásio E. de Jesus. Lei dos Juizados Esopeciais Anotada. 3 ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 76.
23
comunidade ou perdimento de objetos materiais e instrumentos de crime, cujos
beneficiários são entidades beneficentes, sem fins lucrativos, cadastradas juízo.
Em muitos casos, é mais conveniente não aceitar a transação, pois poderá
ocorrer o instituto da prescrição até a sentença penal. Poderá ainda, antes do
oferecimento da denúncia por parte do órgão ministerial, ser oferecida a suspensão
condicional do processo, ou por fim, o autor do fato poderá exercer o contraditório e
a ampla defesa e demonstrar que não cometeu nenhum delito, caso queira
comprovar sua inocência. Nesta circunstância, a denúncia será oferecida pelo
Ministério Público oralmente, reduzida a termo e designados data e hora para
audiência de instrução e julgamento, saindo o réu citado.
24
2- TRANSAÇÃO PENAL: BENEFÍCIO OU APLICAÇÃO DE PENA
SEM O DEVIDO PROCESSO LEGAL?
A Constituição Federal no art. 5º. LIV e LV, no devido processo legal
estabelece que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal e ao garantir a qualquer acusado em processo judicial o contraditório
e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. No art. 76 da Lei
9.099/1995, fala de aplicação imediata de pena. Na verdade se trata de uma
“medida penal”, pois, só é possível a aplicação de pena no Brasil se for instaurado o
devido processo legal.
A transação é um acordo e não necessariamente uma pena – pois se assim
fosse não se ouviria o acusado. Podemos considerar a possibilidade da transação
penal como um benefício ao autor do fato. Não sendo aceita, revoga-se o benefício
e aí então dá-se início ao processo penal propriamente dito, onde irá se analisar a
culpabilidade do até então autor do fato. É importante ressaltar que sua proposta
ocorre em fase pré-processual, uma vez que não há denúncia ou queixa ofertada.
Logo, inexiste processo criminal.20
O procedimento ocorre da seguinte forma: a autoridade policial, ao tomar
ciência da ocorrência, lavrará o termo circunstanciado de infração penal (TCIP) e,
em seguida, remete-o imediatamente ao judiciário; na sequência, em audiência
preliminar (art. 72 da Lei nº 9.099/95)21, é feita a proposta de acordo (transação
penal).
Não há ofensa ao devido processo legal nem ao principio da presunção da
inocência, pois na transação penal não se discute culpabilidade do autor do fato, ou
seja, ele não se declara em nenhum momento culpado, não havendo tampouco,
efeitos penais e civis, reincidência, registros ou antecedentes criminais.
A transação penal é proposta na fase administrativa ou pré-processual, com
finalidade de impedir o ajuizamento de uma ação penal, evitando, assim, a
deflagração de um processo criminal em face do autuado. Ainda que a aplicação do
rito sumaríssimo deva ser breve, o legislador busca um meio mais rápido de
20
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, 3ª ed. São Paulo: RT, 2008. 21
Lei 9099/95, art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e
a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a
possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa
de liberdade.
25
sancionar aquele que agiu em desconformidade com a lei. No entanto, não se julga
se o acusado agiu ou não em desacordo com as normas: não foram ouvidas
testemunhas, a defesa não se pronunciou, há ausência do devido processo legal. A
pena aplicada na transação penal não tem caráter de punição, mas, sim, de uma
medida penal aceita voluntariamente pelo autor do fato para evitar o processo, sem
admissão de culpa ou de responsabilidade civil. Se no sentido de punição se
tratasse, só poderia ser aplicada depois do devido processo legal. Tanto é assim
que a própria lei n. 9.099/95 estabelece que a aceitação, pelo autor da infração da
proposta do Ministério Público de imediata aplicação de uma medida restritiva de
direitos ou multa não importará em reincidência.
Nesse sentido, esclarece Rogério Schietti: "Intui-se, portanto, que ambos os
protagonistas dessa transação penal buscam, com o acerto de vontades, evitar o
processo. O Ministério Público abdica da persecução penal, obviando a formulação
de denúncia e toda a atividade processual que decorreria do exercício do ius
acusationis; o autuado também evita o processo... preferindo sujeitar-se a uma pena
que, em sendo cumprida, permitirá a extinção da punibilidade"22
O direito ao devido processo legal vem consagrado pela Constituição
Federal no art. 5º, CF, LIV e LV, fundamentando que ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal e garante a qualquer
acusado em processo judicial o contraditório e a ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes. Na transação penal, não existe acusação, o que existe é
uma notícia na delegacia (termo circunstanciado) que muitas vezes é levada a efeito
por manifestação da própria suposta vítima. Importante lembrar que isso acontece
numa fase pré-processual. Trata-se de um beneficio, chamado transação penal, que
o promotor oferece ao cidadão. Tal transação consiste em um acordo, entre parte e
promotor de justiça: o primeiro se compromete a fazer uma prestação, em dinheiro
ou em serviços, a uma entidade carente; o segundo, por sua vez, se compromete a
mandar arquivar o procedimento. Não há defesa, porque nesta fase não se discute
culpa, mas, o suposto autor do fato não pode se defender de algo de que nem foi
acusado. Não há condenação/absolvição, pois, não havendo denúncia, não havendo
defesa, não poderíamos falar em condenação ou absolvição. Nem em execução,
22
(Revista do TRF - 1ª Região, vol. 8, nº 2, p.30)
26
pois não existe sentença condenatória. O que há é uma decisão meramente
homologatória da transação entre autor do fato e Promotor de Justiça.
O acusado não reconhece sua culpa ao aceitar a proposta do Ministério
Público, o que ocorre é que o autor do fato conforma-se com uma medida penal,
para não vir a ser acusado e processado criminalmente. Importante ressaltar que
sendo cumprida a medida penal, obtém o acusado a extinção da punibilidade. A
proposta de transação penal há de ser apreciada com muito critério, pois, uma vez
outorgada, apenas poderá ser novamente concedida após 05 (cinco) anos, ex vi do
art. 76, § 2º, da Lei. 9.099/95.
Na lição de Júlio Fabbrini Mirabete: “Não se viola o princípio do devido
processo legal porque a própria constituição prevê o instituto, não obrigando a um
processo formal, mas a um procedimento oral e sumaríssimo (art. 98, I, CF/88) para
o Juizado Especial Criminal e, nos termos da lei, estão presentes as garantias
constitucionais de assistência do advogado, de ampla defesa, consistente na
obrigatoriedade do consenso e na possibilidade de não aceitação da transação.
Trata-se da possibilidade de uma técnica de defesa concedida ao apontado como
autor do fato”.23
A transação penal revela-se um instrumento mitigador do princípio da
obrigatoriedade da ação penal pública, pois, em se tratando de menor potencial
ofensivo, ainda que presentes as condições para regular o exercício da ação penal,
o que tornaria obrigatório o oferecimento da denuncia, esta poderá não ser proposta,
em prol de uma solução consensual entre o Ministério Público e o autuado.
Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance
Fernandes e Luiz Flávio Gomes estudam a ação penal pública á luz do princípio da
legalidade. Dizem que a transação penal não representou a introdução do principio
da oportunidade da ação penal pública em nosso ordenamento processual penal,
pois a concessão da transação não ocorrerá ao bel-prazer do promotor, conforme
um critério puramente de conveniência, como ocorre nos Estados Unidos
(prossecutorial discretion), mas sim em observância do procedimento e dos
requisitos estabelecidos na lei – discricionariedade regulada ou regrada. Destarte, a
transação penal não excepciona o principio da legalidade. Reconhecem, no entanto,
23
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência e legislação. 3ª ed.
São Paulo: Atlas, 1998.
27
que a regra geral da obrigatoriedade da ação penal publica, que até então era a
adotada pela lei, foi, sim mitigada.24
Partindo, então, da premissa de que a transação penal se dá numa fase pré-
processual, cabe uma indagação: Como é possível a aplicação imediata de uma
“pena”, ainda que não privativa de liberdade, nos moldes do art. 76, caput, da Lei nº
9.099/95, sem a existência prévia de um processo? Tal entendimento não seria
inconstitucional, afrontando não apenas os princípios do devido processo legal e da
ampla defesa, mas também o princípio geral nulla poema sine judictio, vulnerando,
assim, a presunção constitucional de não-culpabilidade do autuado – nulla culpa
sine judictio?
Tais questionamentos foram trazidos à colação por alguns doutrinadores,
como, por exemplo, Miguel Reale Junior.25
A doutrina e sua maioria entendem que não. Alda Pellegrini Grinover,
Antonio Magalhães Gomes filho, Antonio Scarance Fernandes de Luiz Flávio Gomes
entendem que a transação penal teria matiz constitucional (art. 98, I) tal qual o
princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV), ambos decorrentes do Poder
Constituinte Originário. Logo seria uma exceção constitucionalmente prevista ao
princípio, segundo o qual, ninguém pode ser condenado sem o devido processo
legal.
Ademais, não haveria riscos de “pena” de multa ser convertida em privativa
de liberdade, mesmo se tivesse sido imposta ao autuado uma “sanção” restritiva de
direitos, não haveria possibilidade de conversão de prisão, visto que, além de o art.
85 da Lei nº 9.099/9526 não ser auto-aplicável, tal procedimento atentaria contra o
art. 6227 do referido diploma legal, claríssimo em eleger como uma das metas dos
Juizados Especiais Criminais a não imposição de uma pena privativa de liberdade.
Finalmente, não haveria ofensa ao principio nulla culpa sine judictio, pois a
24
Ob. Cit., p. 44-45 e 97. Essa também é a posição do professor Maurício Antonio Ribeiro Lopes, “Comentários
à Lei dos Juizados Especiais Civis e Criminais”, ob. Cit., p. 467 e 556. 25
In “Pena sem Processo”. In Juizados Especiais Criminais – Interpretação e Critica, São Paulo, Malheiros,
1997, p. 26-28. 26
Art. 85. Não efetuado o pagamento de multa, será feita a conversão em pena privativa da liberdade, ou
restritiva de direitos, nos termos previstos em lei. 27
Art. 62. O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da oralidade, informalidade,
economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima
e a aplicação de pena não privativa de liberdade.
28
transação penal não importa em admissão de culpa, ex vi, do art. 76, §§ 4º e 6º, da
Lei nº 9.099/95.28
2.1 Descumprimento da Transação Penal Na atualidade a transação penal vem sendo apontada como uma das mais
importantes formas de despenalizar. Procurando reparar os danos e prejuizos
sofridos pela vitima de maneira mais economica, desafogando o judiciario e evitando
os efeitos criminogenos da prisão. Mas, um dos problemas não solucionados da Lei
nº 9.099/95 é o descumprimento da transação penal proposta pelo Ministério
Público. Causando grande divergencia no ambito do juizado especial criminal,
atingindo, inclusive, os Tribunais Superiores.
A corte Suprema29 diz que as penas alternativas não podem ser convertidas
em pena prisão já que não há previsão legal para autorização da conversão.
CRIMINAL. CONDENAÇÃO Á PENA RESTRITIVA DE DIREITO COMO RESULTADO DA TRANSAÇÃO PREVISTA NO ART. 76 DA LEI N. 9.099/95. CONVERSÃO EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. DESCABIMENTO. A conversão da pena restritiva de direito (art. 43 do Código Penal) em privativa de liberdade, sem o devido processo legal e sem defesa, caracteriza situação não permitida em nosso ordenamento constitucional, que assegura a qualquer cidadão a defesa em juizo, ou de não ser privado da vida, liberdade ou propriedade, sem a garantia da tramitação de um processo, segundo a forma estabelecida em lei. Recurso não conhecido” (STF, RE 268319-1 – PR, rel. Min. Ilmar Galvão).
A Constituição Federal no seu art. 98, inc.I, admite a transação penal e
simplificação do processo, diferentemente da conversão em prisão de pena
transacionada violando o princípio do devido processo legal, da ampla defesa e do
contraditório, pois não estar se tratando de pena e, sim, de um acordo. Num
pretenso Estado social e democrático de Direito é absurdo pretender a aplicação de
pena sem a demonstração de culpa, sem processo e sem contraditório. Seria o
28
Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso
de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou
multas, a ser especificada na proposta.
§ 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de
direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo
benefício no prazo de cinco anos.
§ 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais,
salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação
cabível no juízo cível. 29
RE 268.320, rel. Octávio Gallotti; HC 79.572, rel. Marco Aurélio; HC 80.802-6, rel. Ellen Gracie; RE
268.319-1, rel. Ilmar Galvão; HC 80.802-6, rel. Celso de Mello, entre outros.
29
equivalente a admitir a revelia em Direito penal, pior, admitir que a confissão do réu,
sequer expressa, mas implícita, pudesse ancorar condenação. Mais ainda, seria a
presunção de culpa, sem sequer a demonstração de responsabilidade, nem mesmo
de responsabilidade objetiva, quanto mais, subjetiva. Seria a total falência do
princípio de culpabilidade e do devido processo legal.
Diante do exposto, o Supremo Tribunal Federal deixa claro o seu
entendimento como essa decisão que se segue:
TRANSAÇÃO PENAL – NÃO CUMPRIMENTO – CONVERSÃO EM PRISÃO – CONSTRANGIMENTO IELGAL – CONFIGURAÇÃO – OFENSA AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. Habeas Corpus. Paciente acusado dos crimes dos arts. 129 e 147 do Código Penal. Constrangimento ilegal que consistiria na conversão em prisão, da pena de doar certa quantidade de alimento à „Casa da Criança‟, resultante de transação que não foi cumprida. Alegada ofensa ao princípio do devido processo legal. Conversão que, se mantida, valeria pela possibilidade de privar-se da liberdade de locomoção quem não foi condenado, em processo regular, sob as garantias do contraditório e da ampla defesa, como exigido nos incs. LIV, LV e LVII do art. 5 o da Constituição Federal. Habeas Corpus deferido”. (1 a Turma – HC nº 80.164-1 MS – Rel. Min. Ilmar Galvão – DJU I, 07.12.2000).
Há entendimentos de que o Ministério Público não poderá denunciar o autor
do fato, porque a proposta do Juizado Especial Criminal é justamente a da justiça
consensual e, sendo assim, o acusado já teve a sua pena imposta. Pois fere alguns
princípios constitucionais. Além disso, há de se dizer que a homologação da
proposta de transação ocasiona o efeito de coisa julgada o que impediria, por razões
óbvias, o prosseguimento do feito.
Nesta direção é o entendimento do STJ:
A sentença homologatória da transação penal, por sua natureza
condenatória, produz a eficácia de coisa julgada formal e material, o que impede,
nos casos de inadimplemento do acordo pelo autor do fato, a instauração da ação
penal. (STJ, Resp. nº 172.951, DJU de 31.05.99, p. 169).
Assim, o Ministério Público não poderia oferecer a denúncia, pois a
transação penal já foi feita e homologada. Se o objetivo do Juizado Especial Criminal
é a justiça consensual, cabe ao Juiz tentar um novo acordo entre as partes para que
possa ser cumprida a pena que foi imposta. Haverá que se fazer uma nova
audiência para que se propicie um novo consenso entre as partes. Não pode ser
30
desprestigiado o grande motivo da criação do Juizado Especial Criminal, que é o da
economia processual e da agilidade dos processos da justiça brasileira.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça já admitiu a possibilidade de,
descumprida a transação penal, abrir-se vista ao Ministério Público para denunciar
ou requerer a instauração de inquérito policial. Veja a seguinte ementa: “1.
Revogada a conversibilidade da pena de multa em prisão, nem por isso deve-se
negar vigência á Lei 9.099/95 de modo a fazer improponível, na transação penal, a
multa. 2. em se rebelando o apenado a satisfação pecuniária, impõe-se a edição da
resposta penal substitutiva, como é da Lei dos Juizados especiais, instaurando-se o
necessário processo penal. 3. Ordem denegada” (STJ, HC 10.219-SP, rel. Min.
Hamilton Carvalhido, DJU, 23 out. 2000, p. 189).
O entendimento do Ministério Público, exteriorizado em suas súmulas, é
justamente no sentido de que, diante do descumprimento das obrigações impostas
ao autor do fato, deve o Promotor de Justiça oferecer a denúncia, simplesmente
desconsiderando a homologação do acordo.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – 13/06/2006 SEGUNDA TURMA – HEBEAS CORPUS 88.785-6 SÃO PAULO – RELATOR: MIN. EROS GRAU – EMENTA: HABEAS CORPUS. LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS. TRANSAÇÃO PENAL. DESCUMPRIMENTO: DENUNCIA. SUSPENÇÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REVOGAÇÃO. AUTORIZAÇÃO LEGAL. 1. Descumprida a transação penal, há de se retornar ao status quo ante a fim de possibilitar ao Ministério Público a persecução penal (precedentes). 2. A revogação da suspensão condicional decorre de autorização legal, sendo ela passível até mesmo após o prazo final para o cumprimento das condições fixadas, desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo temporal delimitado pelo juiz para a suspensão condicional do processo (precedentes). Ordem denegada.” VOTO: “ A jurisprudência pacifica de ambas as Turmas desta Corte é no sentido de que, descumprida a transação penal, há de se retomar ao status quo ante, possibilitada ao Ministério Público a persecução penal ( HHCC 79.572, Marco Aurelio, 1ª Turma, DJ de 22.02.2002; 80.802, Ellen Graice, 1ª Turma, DJ de 18.5.2001; 268.320, Octavio Gallotti, 10.11.2000). 2. No que tange à revogação da suspensão condicional do processo, há autorização legal para tanto (cf. art. 89, § 1º, IV, da Lei n. 9.099/95), sendo ela possível até mesmo após o prazo final para o cumprimento das condições fixadas , desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo temporal delimitado pelo juiz para a suspensão do processo (cf. os HHCC 80.747, Sepúlveda Pertence, DJ de 31.12.2004; 84.746, Carlos Britto, DJ de 25.11.2005 e 84.746, Marco Aurelio, DJ de 31.3.2206). 3. É perfeita a observação, do Subprocurador-Geral da republica, de que “[n] ão é demais lembrar que o paciente , por varias vezes beneficiado com os favores legais, quedou-se inerte ao seu cumprimento, sendo esclarecedora a afirmação constante do acórdão impugnado no sentido de que “ Aliás, o que pretende o combativo defensor é um passaporte para impunidade. O paciente fez acordo de transação penal e não honrou. Novamente beneficiado com a suspensão condicional do processo não o cumpriu”. Denego a ordem.
31
Esse entendimento tem conotação unicamente finalista, uma vez que busca
garantir a aplicação de sanção ao autor do fato, e também evitar o sentimento de
descrença na Justiça Consensual. Entretanto, ao preço de uma busca obcecada
pela aplicação da lei, acaba por afrontar garantias processuais importantes do
sistema penal pátrio. Decisões que desconstituem uma decisão homologatória de
forma absolutamente estranha ao nosso ordenamento.
Efetivamente, o instituto da coisa julgada tem por finalidade a segurança
processual e jurídica do sistema, e não pode ser minimizado a ponto de ser
totalmente desconsiderado, justamente pela instituição responsável pela fiscalização
da correta aplicação da lei penal.
Luiz Flávio Gomes entende como a mais adequada solução é a retomada do
processo, embora admita que a lei não permita tal solução.
Segundo o renomado Nucci, que preconiza, „in verbis’:
A transação homologada pelo juiz fez cessar, por acordo, o trâmite do procedimento, ainda na fase preliminar. A decisão é terminativa e meramente declaratória. Transitando em julgado, não há como ser revista, para qualquer outra alternativa, como, por exemplo, permitir o oferecimento da denúncia ou queixa e prosseguimento do processo. Pior, ainda, seria encaminhar-se a solução para a conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade, pois esta seria uma punição severa aplicada sem o devido processo legal.
30
O emérito Dr. Antônio Roberto Sylla, em dissertação de mestrado,
posicionou-se pela retomada do processo, para que o Parquet ofereça a denúncia:
(...) Da homologação da transação penal, que a sentença que homologa a transação
penal possui natureza homologatória, produzindo apenas os efeitos de coisa julgada
formal, tendo, como corolário do descumprimento da pena transacionada pelo autor
do fato, a retomada do processo, cabendo por consequência, ao Ministério Público
promover a ação penal.31
Marco Aurélio, da 2a Turma do STF no HC 79.572, no qual admite que a
sentença que aplica pena no caso do art. 76 da Lei dos Juizados Especiais
Criminais não é nem condenatória e nem absolutória. É homologatória da transação
penal e que ela tem eficácia de título executivo judicial, como ocorre na esfera civil.
30
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, 3ª ed. São Paulo: RT, 2008.
P.763. 31
SYLLA, Antônio Roberto. A Natureza Jurídica e Pressupostos da Transação Penal. 2001. 285f. Dissertação
(Mestrado em Direito) – Unoeste, Presidente Prudente, 2001.
32
Cezar Roberto Bittencourt, afirma que:
...títulos judiciais somente podem ser desconstituídos observadas as ações e os procedimentos próprios. A coisa julgada tem uma função político-institucional: assegurar a imutabilidade das decisões judiciais definitivas e garantir a não-eternização das contendas levadas ao judiciário. (...) Afinal, desde quando um titulo judicial pode desconstituir-se pelo descumprimento da obrigação que incumbe a uma das partes? Não há nenhuma previsão legal excepcional autorizando esse efeito especial. (...) na verdade, títulos judiciais tem exatamente a função de permitir sua execução forçada quando forem cumpridos voluntariamente. E, conclui: “quando houver descumprimento de transação penal dever-se-á proceder à execução forçada, exatamente como se executam as obrigações de
fazer.32
A melhor solução para o descumprimento da transação penal seria a
obrigação de fazer a execução forçada nos termos dos Artigos 632 a 638 do código
de Processo civil.33 Poderíamos questionar que o direito das obrigações não é
aplicável à pena restritiva de direitos, já que sabemos que é de natureza penal,
devendo seguir as regras da LEP para sua execução.34 Mas notamos que a
proposta de transação penal conta com cláusula resolutiva, e qualquer inserção de
dispositivo nesse sentido careceria de previsão legal, constituindo construção
32
Cezar Roberto Bittencourt, Juizados Especiais Criminais Federais, São Paulo: Saraiva, 2003. 33
Art. 632 - Quando o objeto da execução for obrigação de fazer, o devedor será citado para satisfazê-la no
prazo que o juiz lhe assinar, se outro não estiver determinado no título executivo.
Art. 633 - Se, no prazo fixado, o devedor não satisfizer a obrigação, é lícito ao credor, nos próprios autos do
processo, requerer que ela seja executada à custa do devedor, ou haver perdas e danos; caso em que ela se
converte em indenização.
Parágrafo único - O valor das perdas e danos será apurado em liquidação, seguindo-se a execução para cobrança
de quantia certa.
Art. 634 - Se o fato puder ser prestado por terceiro, é lícito ao juiz, a requerimento do exeqüente, decidir que
aquele o realize à custa do executado.
Art. 635 - Prestado o fato, o juiz ouvirá as partes no prazo de 10 (dez) dias; não havendo impugnação, dará por
cumprida a obrigação; em caso contrário, decidirá a impugnação.
Art. 636 - Se o contratante não prestar o fato no prazo, ou se o praticar de modo incompleto ou defeituoso,
poderá o credor requerer ao juiz, no prazo de 10 (dez) dias, que o autorize a concluí-lo, ou a repará-lo, por conta
do contratante.
Parágrafo único - Ouvido o contratante no prazo de 5 (cinco) dias, o juiz mandará avaliar o custo das despesas
necessárias e condenará o contratante a pagá-lo.
Art. 637 - Se o credor quiser executar, ou mandar executar, sob sua direção e vigilância, as obras e trabalhos
necessários à prestação do fato, terá preferência, em igualdade de condições de oferta, ao terceiro.
Parágrafo único - O direito de preferência será exercido no prazo de 5 (cinco) dias, contados da apresentação da
proposta pelo terceiro (art. 634, parágrafo único).
Art. 638 - Nas obrigações de fazer, quando for convencionado que o devedor a faça pessoalmente, o credor
poderá requerer ao juiz que lhe assine prazo para cumpri-la.
Parágrafo único - Havendo recusa ou mora do devedor, a obrigação pessoal do devedor converter-se-á em perdas
e danos, aplicando-se outrossim o disposto no Art. 633. 34
NOGUEIRA, Fernanda Arcoverde Cavalcanti. “Descumprimento da transação penal
Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n, 57, jul,2002. Disponivel em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2941>. Acesso em: 05 Fev. 2009.
33
absolutamente odiosa, rompendo, novamente, com o princípio da legalidade. Mas é
bom lembrar que, embora estejamos nos referindo à pena restritiva de direitos, na
verdade o que temos, quando da celebração da transação penal, é uma medida
restritiva de direitos, o que, de imediato, afasta a possibilidade de aplicação da LEP.
Não existe razão lógica para que se admita da execução civil para multa e a
prestação de pecúnia, não se adota o mesmo raciocínio para as penas restritivas de
direito. De acordo com o CPC, deve-se tentar ao máximo a execução especifica da
obrigação de fazer e, caso não seja possível, parte-se para indenização.
De acordo com Roberto Bitencourt, na sua obra Juizados Especiais Criminais Federais: análise comparativa das Leis 9.099/95 e 10.259/2001, entende que:
Verdade insofismável é que não há previsão legal para a conversão em prisão de transações penais inadimplidas. Essa lacuna não pode em hipótese alguma ser suprida com recursos hermenêuticos de nenhuma natureza. Enquanto não for regulada por lei, a solução deve ser encontrada no próprio sistema jurídico. A aplicação de pena alternativa transigida com o Ministério Público cria uma obrigação para o autor do fato. A questão preliminar é, afinal, definir a natureza dessa obrigação assumida e inadimplida. Mesmo com nossos parcos conhecimentos em mataria cível, quer-nos parecer que estamos diante de uma obrigação de fazer; e a execução das obrigações, em princípio, está disciplinada no Código de Processo Civil, inclusive a obrigação de fazer. Concluindo, em nossa concepção, para nos mantermos no plano da legalidade, quando houver descumprimento de transação penal dever-se-á proceder à execução forçada, exatamente como se executam as obrigações de fazer. Esse é o fundamento legal e essa é a forma jurídica de realizá-la, de lege lata. Continuará sendo inconveniente para as hipóteses de agentes insolventes, pois não se pode esquecer que, afinal, as execuções de obrigação de fazer resolvem-se em pardas e danos. Mas a insolvência do executado, convém registrar, não autoriza práticas ilegais nem legitima arbitrariedades.
35
É importante ter em mente que o espírito que orienta a Lei 9.099/95 é o de
promover a despenzalização, reduzindo os delitos de menor potencial ofensivo, a
estigmatização penal, através da aplicação de outras medidas. A solução de
execução de obrigação de fazer se adequa a este espírito e promove, em estrita
obediência aos princípios e garantias fundamentais do Direito penal, uma solução
prática para os casos concretos de descumprimento de transação penal.
TRANSAÇÃO CRIMINAL HOMOLOGADA. DESCUMPRIMENTO. O trânsito em julgado da decisão que homologa a transação criminal produz a
35
BITENCOURT, Cezar Roberto. Juizados Especiais Criminais Federais: análise comparativa das
leis 9.099/95 e 10.259/2001. 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, pp. 24-25
34
eficácia de coisa julgada. Com a superação da fase de conhecimento, a pretensão cabível é a de cunho executório, e não acusatória. Correição Parcial indeferida." (Correição nº 71000170126, Turma Recursal Criminal. Ijuí, Rel. Dr. Nereu José Giacomolli, 08.02.01, à unanimidade)
Caso tenha sido estabelecida a obrigação de o autor do fato fazer algo,
como prestar serviços à comunidade, por exemplo, cumpre ao Ministério Público
executar esta obrigação de fazer, com base na sentença homologada. Não se trata
de execução de pena, porque pena não é. Trata-se, isto sim, de execução do
conteúdo da sentença homologada pelo juízo criminal. Não se trata de uma
execução de pena e sim de um acordo.
35
3- TRANSAÇÃO PENAL: É UM DIREITO SUBJETIVO OU UMA
DISCRICIONARIEDADE RESERVADA AO MINISTÉRIO PÚBLICO?
Com a criação dos Juizados Especiais Criminais de acordo com a lei nº
9.099/95, foi instituído um modelo de justiça criminal consensual, com competência
para a conciliação, o julgamento e a execução de infrações penais de menor
potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, objetivando
sempre a reparação dos danos sofridos pela vitima e a aplicação da pena não
privativa de liberdade.
A natureza jurídica da decisão que homologa a transação é imprescindível
nesse estudo. A partir daí, poderemos saber como e até onde o juiz poderá controlar
a transação.
No modelo garantista, no Estado Democrático Brasileiro sem o devido
processo legal, comprovando a autoria e a materialidade do fato imputado, não é
possível uma sentença condenatória. A partir do momento que a transação penal se
desenvolve numa fase pré-processual, não poderá representar uma condenação
criminal, pois, para tanto, é imprescindível a existência de um processo prévio.
Já a sentença penal homologatória é fruto de consenso, de acordo entre o
ministério Público e autuado, antes da propositura da ação penal, sem julgamento
do fato que originou o termo circunstanciado.
Grinover, afirma que: Trata-se de sentença nem condenatória nem
absolutória, mas simplesmente de sentença homologatória de transação penal (...).36
A sentença da transação penal entre o Ministério público e o autuado não é
condenatória, e sim homologatória, pois inexiste condenação, até porque não houve
processo. É certo que não encerra qualquer presunção de culpa do autuado, não
servindo de título executivo judicial à disposição da vitima. Não é por acaso que o
suposto autor do fato conserva a sua primariedade e os bons antecedentes. A tal
conclusão chega-se facilmente com a leitura dos parágrafos do art. 76,
especialmente os §§ 4º e 6º, que afirmam não importar reincidência, antecedentes
criminais e efeitos civis à aplicação da pena acordada na transação penal. Nesta
fase, embora realizada em juízo, ainda encontram-se presentes as características de
36
Ada Pelegrini Grinover [et al.]. Juizados Especiais Criminais – Comentários à Lei 9.099 de 26.09.1995. 5 ed.
Ver. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 154.
36
um procedimento administrativo policial, no qual não existe acusação nem processo,
e muito menos é sabido se o acusado será absolvido ou condenado.
A sentença homologatória da transação penal, conforme lecionam Alda
Pellegrini, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Escarance Fernandes e Luiz
Flávio Gomes, é como o próprio nome já indica, simplesmente homologatória,
porquanto o juiz se limita a declarar a vontade das partes, homologando o pacto
avençado entre o autuado e o Ministério Publico, no qual o primeiro se compromete
a pagar uma multa ou a executar uma regra de conduta, enquanto o segundo deixa
de propor a ação penal, sem que isso importe em confissão de culpa ou
reincidência, sequer constando na folha penal do autor do fato.
Cesar Roberto Bitencourt também sustenta que a transação penal é um
provimento jurisdicional de caráter homologatório jamais condenatório, configurando
uma sentença declaratória constitutiva: declaratório, porquanto o juiz reconhece o
acordo entabulado entre o Ministério Publico e o autuado; constitutivo porque a
homologação da avença, de qualquer modo, repercutirá na esfera jurídica do autor
do fato, que não fará jus a nova transação penal nos próximos 05 (cinco) anos, ex vi
do artigo 76, § 4º, da Lei nº 9.099/95.37
A vítima não possui legitimidade para recorrer. Como ensina Mirabete, “não
pode a vitima apelar da decisão homologatória da transação, por falta de interesse
de agir. É o que se decidiu no I Congresso Brasileiro de Direito Processual e
Juizados Especiais (Tese 6).”38
TACRSP: Recurso – Apelação – Decisão homologatória de transação penal – Irresignação apresentada pela ofendida – Inadmissibilidade – Ausencia de interesse em recorrer – Vitima que não esta autorizada a intervir nesse procedimento ou a ele se opor – Recurso não reconhecido. Mesmo que a tentativa de conciliação tenha ficado frustrada, o acordo sobre a aplicação imediata da pena não privativa de liberdade não poderá sofrer qualquer oposição por parte da vitima (RJDTACRIM 36/270). TACRSP: Nos casos da lei nº. 9.099/95, não tem recurso o ofendido contra a decisão homologatória da transação penal (art.76), visto lhe falece a pertinência subjetiva da ação, isto é, o interesse de agir. O MP e o autor do fato são os que, unicamente, nesse ponto, tem voz no capitulo. (RJDTACRIM 41/403). TRSC: Transação penal não comporta a participação da vitima. Homologação da transação impede a possibilidade de ação penal. Inexistente a ação penal, não se admite a figura da assistência a acusação,
37
“Juizados Especiais Criminais e Alternativas a pena de Prisão”, ob. Cit., p. 107. 38
Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Atlas, 4ª. Ed., 2000, p.149.
37
falecendo-lhe legitimidade para interpor recurso de apelação. (RJTRTJSC 5/219).
A transação penal para uma grande parte dos doutrinadores é um direito
subjetivo do autor do fato. Diante dessa afirmação, presentes os requisitos legais
objetivos e subjetivos, o Ministério Publico estará obrigado a propor a transação
penal, e se não fizer, o juiz pode propor independentemente da proposta do MP. A
discricionariedade que se reserva ao Ministério Público é unicamente quanto à pena
a ser proposta na transação restritiva de direitos.
Assim, a proposta de transação penal realizada de oficio pelo juiz é
equivocada, que deve remeter o Termo Circunstanciado ao Procurador-Geral de
justiça se houver recusa injustificada do Ministério Público em fazer a proposta,
utilizando-se do art.28 do código de Processo Penal, preservando-se, assim, os
postulados do sistema acusatório.
De acordo com o art.76, caput, da Lei nº 9.099/95, fica claro que a proposta
de transação penal parte do Ministério Público. A interferência do juiz nessa seara,
além de imprópria, pois, acusar não é sua função, seria indesejável, porque
comprometeria a sua imparcialidade. Nesse caso, o que o juiz pode fazer é fiscalizar
a atividade do Ministério Publico, certificando-se do cumprimento regular de suas
funções, pois, se o juiz oferecesse a transação penal, estaria exercendo uma função
que não é sua.
PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL LESIVO. TRANSAÇÃO PENAL. LEI Nº 10.259/01 E LEI Nº 9.099/95. INICIATIVA DA PROPOSTA. I - A Lei nº 10.259/01, em seu art. 2º, parágrafo único, alterando a concepção de infração de menor potencial ofensivo, alcança o disposto no art. 61 da Lei nº 9.099/95. Assim, considerando que o delito pelo qual foi o paciente denunciado é apenado com detenção de 06 (seis) meses a 02 (dois) anos, ou multa, está ele inserido no rol dos crimes de menor potencial ofensivo, razão pela qual deve ser analisada pelo Ministério Público a possibilidade de oferecimento ao acusado de proposta de transação penal. II - O juiz, no entanto, não é parte e, portanto, inadmissível, em princípio, ex vi art. 76 da Lei nº 9.099/95 c/c os arts. 129, inciso I, da Carta Magna e 25, inciso III, da LONMP, que venha a oferecer transação penal ex officio ou a requerimento da defesa. Recurso parcialmente provido. (Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 14088 – SP, 5ª Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, j. 20/05/2003, D.J.U. de 23/06/2003, p. 393).
38
Da interpretação literal do artigo em comento, pode-se concluir que a
proposta de transação é liberalidade do Ministério Público, uma vez que a lei diz que
o membro do Parquet “poderá” propor a aplicação imediata de pena não privativa de
liberdade.
Não é essa, contudo, a interpretação mais correta. Tourinho Filho e Ada
Pellegrini Grinover, ao abordarem o assunto, afirmam que a transação é um direito
subjetivo do autor do fato e, uma vez presentes os requisitos para a proposta, não
pode o Ministério Público deixar de oferecê-la.
Cabe ao Promotor de Justiça oferecer a proposta de transação penal já que
é uma discricionariedade, uma faculdade. Não sendo um direito subjetivo do autor
do fato, não possibilita que seja apresentada contra a vontade do Ministério Público,
quer por iniciativa do juiz ou por requerimento do interessado. Não cabe ao juiz que
não é parte da ação formular a proposta de transação penal.
O juiz é o mediador, tendo o papel de conduzir a transação, não pode impor
sua vontade, na homologação, acordadas as partes na transação não pode ampliar
nem reduzir os seus limites, ele sugere as partes o que lhe parece justo.
A transação penal é um benefício. Ainda que o autor do fato preencha todos
os requisitos subjetivos e objetivos de ordem legal, não está o Ministério Público
obrigado a elaborar a proposta de transação penal. Tal situação estaria implícita,
pois se estiver ausente algum dos requisitos de ordem subjetiva ou objetiva, o
Ministério Público está proibido de oferecer a proposta, devendo denunciar. No caso,
se presentes todos os requisitos, o Órgão Ministerial, que estria obrigado a
denunciar pode, através do exercício de uma faculdade, invocando razões de
oportunidade e conveniência, propor a transação.
Ora, se a transação implica renúncia a algum direito, evidente que só as
partes podem dela participar, nunca o juiz, pois dele não se espera que abra mão de
algum direito, mas sim, que apenas exerça a tarefa jurisdicional, sob pena de estar
impedindo que o Ministério Público exerça sua função constitucional e legal de
titularidade da ação penal pública.
O principal efeito processual da transação é impedir o exercício da ação
penal, ainda que presentes as condições para a transação, aplicando o principio da
obrigatoriedade. Só o Ministério Publico pode tomar a iniciativa de propor.
O Superior Tribunal de Justiça partilha deste entendimento, conforme
decisão ora transcrita:
39
Infração de menor potencial ofensivo. Suspensão do processo/transação penal (possibilidade). Ministério Público (iniciativa). 1. Há um só conceito de infração de menor potencial ofensivo, exatamente o constante da Lei nº 10.259, de 2001. 2. Havendo elementos que, em tese, justifiquem a transação penal, o exame do caso deve ser feito à luz dos textos legais pertinentes; defeso, portanto, deixar o Ministério Público de fazê-lo ao abrigo de eventual poder discricionário. 3. Hábeas corpus deferido, determinando-se seja feito o exame à luz dos textos pertinentes; em caso de proposta não-feita, sejam os autos encaminhados ao Procurador-Geral de Justiça (STJ, 6ª. T., HC 36557/SP, rel. Min. Nilson Naves, j. 23-11-04, DJ 02 maio 2005, p. 419).
Esse pensamento foi novamente esposado pelo STJ no julgamento do HC
37888/SP, de relatoria do Min. José Arnaldo da Fonseca, e pelo Tribunal Regional
Federal da 1ª. Região, ao julgar o HC 200701000437303/PA, relatado pelo
Desembargador Federal Mário César Ribeiro.
Dito isto, chega-se à seguinte questão: o que fazer se o Promotor de
Justiça deixar de oferecer a proposta de transação penal quando o autor do fato está
apto a recebê-la? Considerando que a transação penal é um acordo feito entre o
titular da ação penal e o autor do fato, é inconcebível a tese de que o juiz possa
oferecer a proposta de ofício, uma vez que estaria usurpando atribuição específica
do Ministério Público. Não pode o juiz ofertar de ofício, pois não é parte, devendo o
autor do fato impetrar habeas corpus ou o Magistrado aplicar o art. 28 do CPP – em
analogia ao disposto na Súmula 696 do STF:
REUNIDOS OS PRESSUPOSTOS LEGAIS PERMISSIVOS DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO, MAS SE RECUSANDO O PROMOTOR DE JUSTIÇA A PROPÔ-LA, O JUIZ, DISSENTINDO, REMETERÁ A QUESTÃO AO PROCURADOR-GERAL, APLICANDO-SE POR ANALOGIA O ART. 28 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
39
Em sendo assim, a solução mais adequada, e atualmente consagrada pela
maioria dos Tribunais, é a aplicação analógica do art. 28 do Código de Processo
Penal40, no sentido de remeter os autos ao Procurador-Geral de Justiça, para que
39
STF Súmula nº 696 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5 40
Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do
inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões
invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia,
designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só
então estará o juiz obrigado a atender.
40
este, analisando o caso, ofereça a proposta, designe Promotor para fazê-lo ou
insista no não oferecimento.
O Superior Tribunal de Justiça - STJ, no julgamento do recurso especial n.
155.426/SP (5ª Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. em 17.02.98, unânime), encampou
a aplicação analógica do art. 28 do CPP, ao decidir que:
"I - Incumbe ao Ministério Público a proposta de suspensão condicional do processo (...), não podendo em princípio ser esta realizada pelo julgador. II - Na hipótese de divergência entre juiz e promotor acerca da oferta da suspensão, os autos devem ser, por aquele, encaminhados ao procurador-geral de justiça. III - Recurso conhecido e provido".
Caso o Procurador-Geral de Justiça concorde com o Promotor, insistindo,
portanto, no não oferecimento da proposta, o próximo passo será a designação de
audiência de instrução e julgamento, dando-se continuidade ao processo.
A proposta de transação penal deve ser formulada na audiência preliminar
(art. 72 da Lei 9.099/95), e pressupõe a não instauração da ação penal. A sua
aceitação é reservada exclusivamente ao autor do fato, que deve fazê-lo
pessoalmente. Se o autor do fato e seu defensor não aceitarem a proposta o juiz
não pode homologá-la. Nem mesmo aquele que tiver poderes específicos para
aceitar a proposta poderá assim proceder.
O autuado, no entanto, deverá estar necessariamente acompanhado de
advogado. Não sendo aceita a proposta, o Promotor de Justiça oferecerá denúncia e
terá início a instrução processual.
Sobre o assunto, Mirabete diz que a iniciativa da transação penal é instituto
decorrente do princípio da oportunidade de propositura da ação, que confere ao seu
titular, o Ministério Público, a faculdade de dispor da ação penal, ou seja, de
promovê-la, sob certas condições, nas hipóteses previstas legalmente, desde que
haja a concordância do autor da infração e a homologação judicial. Trata-se,
portanto, de hipótese de discricionariedade regrada (limitada ou regulada), princípio
vigente no que diz respeito ao instituto ora estudado, em que cabe ao Ministério
Público a atuação discricionária de fazer a proposta, de exercitar o direito subjetivo
41
de punir do Estado quando da aplicação de pena não privativa de liberdade, em
oferecimento de denúncia e instauração de processo.41
O Ministério Público também está vinculado ao princípio da legalidade, em
que os tipos incriminadores e suas consequências estão submetidos à lei formal
anterior.42 É o que dizem o inciso XXXIX do artigo 5º da Constituição Federal de
1988 e o artigo 1º do Código Penal, em que “Não há crime sem lei anterior que o
defina. Não há pena sem prévia cominação legal”, e, por isso, ao aplicar uma pena é
que se deve detectar se encontram-se presentes os requisitos objetivos e subjetivos,
já mencionados.
Desta forma, ao analisar os princípios citados, entende-se que houve uma
flexibilização do princípio da obrigatoriedade, quando se passou a vincular o
Ministério Público ao princípio da discricionariedade regrada. O juiz, neste caso,
deve se distanciar na hora da proposta, em decorrência do que já foi dito, e porque
cabe a ele uma última análise, em que será verificada a legalidade da proposta e a
sua conveniência, ou seja, analisar-se-ão as condições de aplicabilidade da pena, e
a proporcionalidade com relação ao fato discutido em juízo, nunca se afastando da
vontade das partes – entendam-se estas como sendo o Promotor de Justiça e o
ofendido.43
Sobre isto, Damásio de Jesus ensina que, ao Juiz, “é-lhe defeso, na
homologação da transação, agravar a qualidade ou o quantum da pena proposta e
aceita. Pode, entretanto, reduzi-la quando lhe parecer excessivamente gravosa ao
autor do fato, cabendo apelação” 44.
Da mesma forma que, presentes os requisitos, não se propondo a
transação, deve o Juiz oficiar à Procuradoria Geral para que tome as devidas
providências: designando outro órgão do Ministério Público para oferecer a
denúncia, ou insistindo no pedido de arquivamento, pelo que, então, o juiz é
obrigado a atender. Estas disposições seguem, por aplicação subsidiária, o que
dispõe o artigo 28 do Código de Processo Penal.
41
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 3. ed. São
Paulo: Atlas, 1998, p. 84. 42
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro: parte geral, arts. 1º a 120. 6. Ed. ver. aual. e ampl.
São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006, p. 129- 130. 43
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados Especiais Criminais: Comentários à Lei 9.099 de 26.09.1995. 5.
ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 166. 44
JESUS, Damásio E. de. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva,
1997, p. 81.
42
Se houver dissenso entre o autor do fato e o seu defensor, prevalecerá a
vontade do agente, até por analogia ao disposto no art. 89, § 7º da lei n. 9.099/95.45
Art. 89- Nos Crimes em que a pena mínima cominada for igual ou superior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois ou quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes nos demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (artigo 77 do código Penal). § 7º- Se o acusado não aceitar a proposta prevista nesse artigo, o processo prosseguira em seus ulteriores termos
45
MOREIRA, Romulo de Andrade. Juizados Especiais Criminais. Ed. Ver. Ample atual. Salvador: Editora Jus
Podivm, 2009, p.19.
43
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A lei Nº 9.099/95 trouxe consideráveis alterações no âmbito das infrações de
menor potencial ofensivo, de grande importância para nossa legislação. Além de ser
muito usado, traz muitas vantagens frente ao processo penal tradicional,
principalmente com a criação do instituto da transação penal, que busca evitar o
oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. Sendo assim, a proposta de
transação somente será veiculada se houver justa causa, suficiente para o exercício
da ação penal.
A aceitação da Transação Penal não é obrigatória. Nesse caso, o Promotor
de Justiça oferecerá uma denúncia (pedido ao Juiz para iniciar a ação penal) e o
suposto autor do fato será processado criminalmente, oportunidade em que será
citado (chamado a se defender em Juízo) para participar de uma audiência de
instrução e julgamento, onde deverá estar obrigatoriamente acompanhado de
advogado, podendo apresentar testemunhas.
No entanto, é ponto de grandes discussões entre doutrina e jurisprudência,
embora ela possua grande eficácia no combate à criminalidade. Questionou-se,
então, a possibilidade de ocorrer a transação nos casos em que couber ação
privada, chegando-se à conclusão de que é possível, nas infrações de ação penal
privada, admitir os institutos da transação penal e da suspensão condicional do
processo, os quais podem ser propostos pelo Ministério Público, desde que não haja
discordância da vítima ou seu representante legal, o que impõe considerar que o
ofendido é quem detém discricionariedade para a propositura.
A transação penal só pode ser proposta se a infração penal praticada pelo
autuado não exceder à sanção máxima superior a 2 (dois) anos, de acordo com o
art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/01. O art. 76, § 2º da lei dos Juizados
Especiais expressa claramente os requisitos, as hipóteses de cabimento, o
procedimento e os efeitos da transação criminal. A transação só será possível se
forem atendidos os requisitos. Feita a proposta, ela é submetida à aceitação bilateral
pelo autor do fato e pela defesa técnica. Se aceita por ambos, o juiz verificará se
estão presentes os seus requisitos objetivos e subjetivos e aplicará a pena não
privativa de liberdade discriminada na proposta. Em situação alguma poderá ser
transacionada pena privativa de liberdade. A aceitação é benéfica para o autor do
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fato, pois não haverá anotação para efeito de reincidência. O registro da transação
impede apenas nova transação em até cinco anos.
É certo que estas anotações estarão integralmente disponíveis para as requisições
judiciais quando o mesmo agente estiver sendo julgado em outro processo pela
prática de outro delito qualquer. Entretanto, quando o autor do fato requerer certidão
de seus antecedentes penais para finalidades civis ou funcionais, nela não constará
a incidência delituosa dirimida pela transação penal e com a consequente extinção
da punibilidade pelo seu cumprimento. Porém, todas as informações processuais
daquele fato ilícito ficarão devidamente anotadas no cadastro criminal e disponíveis
para nova instrução processual.
A transação penal, embora possua grande eficácia no combate à
criminalidade, essa medida também é o ponto de grandes discussões entre doutrina
e jurisprudência. O art. 5º, LIV e LV da Constituição Federal prevê que ninguém será
privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, garantindo a
qualquer acusado em processo judicial o contraditório e a ampla defesa, com meios
e recursos a ela inerentes.
No art. 76 da lei 9.099/95, quando o legislador fala da aplicação imediata da
pena, trata-se de uma medida penal, não tendo caráter de punição, mais, sim, de
uma medida penal aceita pelo autor do fato para evitar o processo. No Brasil só é
permitido aplicar uma ação penal depois de instaurado o devido processo legal.
Nesse caso não aceitando a pena, mas sim a medida penal evitando o processo. Ao
aceitar a proposta feita pelo Ministério Público, o autor do fato não reconhece a
culpa, simplesmente conforma-se, evitando o ajuizamento de uma ação penal
condenatória.
Sendo assim, consideramos a transação penal como um benefício, proposta
na fase pré-processual que representa uma via alternativa à ação penal, evitando o
processo criminal. A aplicação da pena não tem caráter de punição e sim de medida
penal. Na transação penal, não existe acusação, o que existe é um termo
circunstanciado. Importante lembrar que isso acontece numa fase pré-processual.
Trata-se de um beneficio, chamado transação penal, que o promotor oferece ao
cidadão. Como já foi dito, o cumprimento da pena acordada não gera reincidência,
tampouco será indicada em registros criminais ou gerará efeitos civis (§§ 4º. e 6º. do
art. 76), sendo registrada apenas para impedir nova transação nos cinco anos
subsequentes.
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O cidadão que comparecer a uma audiência preliminar não precisa estar
acompanhado por advogado. Contudo, em caso de aceitação do benefício da
transação penal, há a necessidade a presença de um procurador, que pode ser o
defensor público de plantão. O que se recomenda, no entanto, é que o cidadão que
tiver condições vá à audiência acompanhado por seu advogado, pois essa é a
melhor forma de defender seus interesses em juízo.
O descumprimento da transação penal ainda é um dos problemas não
solucionado no âmbito dos juizados especiais criminais. Formaram-se várias
correntes a fim de se buscar uma solução. Primeiro, a conversão de penas
alternativas em pena de prisão que viola os direitos constitucionais fundamentais
como o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal. Segundo a
retomada do processo, com o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, no
qual seria impossível, pois a transação penal já foi feita e homologada, violando
dessa forma a coisa julgada.
A melhor solução encontrada para o descumprimento da transação seria a
obrigação de fazer, a execução forçada, de acordo com o artigo 632 a 638 do CPC.
Já que a orientação da lei nº 9.099/95 é promover a despenalização, reduzindo os
delitos de menor potencial ofensivo. A solução de execução de obrigação de fazer
respeita os princípios e garantias fundamentais do direito penal.
Não existe nenhuma possibilidade de se aplicar ao autor do fato pena
privativa de liberdade, por força da transação penal, pois é absolutamente
impossível, à luz do nosso direito positivo, converter-se a pena restritiva de direitos
ou a multa transacionada e não cumprida e pena de privação da liberdade.
A aplicação da pena restritiva de direitos transigida com o Ministério Público
gera uma obrigação ao autor do fato. Portanto deve-se proceder a execução
forçada, exatamente como se executam as obrigações de fazer.
Outro ponto de grandes discussões é se a transação penal é um direito
subjetivo ou uma discricionariedade reservada ao Ministério Público, grande parte
dos doutrinadores diz que é um direito subjetivo do autor do fato. Mas, entendemos
que é uma discricionariedade, uma faculdade do Ministério Público. A natureza da
sentença da transação penal é simplesmente homologatória, pois aplica-se a pena
em face do consenso dos interessados, quando, preenchidos os requisitos objetivos
e subjetivos, o Ministério Público poderá propor a transação, cabendo ao autor do
fato aceita-lá ou não. A recusa não fundamentada ou injustificada do órgão
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acusatório em oferecer proposta de transação é regida pelo art. 28 do CPP (cabe ao
juiz enviar os autos do processo ao Procurador Geral de Justiça). Se o Procurador-
Geral insistir em não formular a proposta, nada se poderá fazer do que designar a
audiência prevista na lei para o rito sumaríssimo, o que também ocorrerá se tratar de
queixa-crime e não quiser o querelante oferecer proposta de acordo penal.
O ofendido não tem qualquer interferência na tentativa de transação penal.
Mas, fica claro no art. 76 da Lei dos Juizados Especiais que o direito é reservado ao
Ministério Público de propor a transação penal. O Ministério Público suscinta a
narração do fato com indicação das partes que é o autor do fato e o ofendido. Não
exigindo que obedeça ao artigo 41 do Código de Processo Penal, que diz: “A
denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa
identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.”
Devendo, entretanto conter a individualização do fato, fixa os limites objetivos da
coisa julgada e oferece a proposta propriamente dita e a aceitação pelo autuado.
A interferência do juiz seria imprópria, além de não ser a sua função, e
comprometeria a sua imparcialidade. Nesse caso, o juiz poderia fiscalizar a atividade
do Ministério Público. Cabe ao juiz a verificação da legalidade da proposta da
transação penal, levando em conta a vontade dos partícipes.
Com a aceitação da proposta da transação penal não gera ao autor do fato:
condenação, reincidência, o lançamento do nome do autor do fato no rol dos
culpados, efeitos civis e maus antecedentes.
Encaminhando-se à conclusão deste trabalho, é pertinente repensar na
complexidade em que a sociedade atual está inserida, na constante busca por novas
formas e mais eficazes de solução para o problema da criminalidade. Mudanças no
sistema são sim necessárias, estabelecendo alternativas para as penas de detenção
e, por outro lado, a criação de novos institutos dentro do direito de punir.
Com a inovação da criação dos Juizados Especiais Criminais surgiu a
realização desse novo processo, dessa nova forma de pensar a Justiça e a
concretização dos direitos. Com o objetivo de propiciar uma justiça criminal mais ágil
e mais adequada à conjuntura social em um Estado democrático, simplificam-se
procedimentos, e impedindo a estigmatização do acusado do processo penal. O
consenso e a ampla discussão são imprescindíveis na busca por soluções que
diminuam a impunidade e possam ao mesmo tempo, oferecer opções, alternativas
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aos conflitos sociais sem ferir ou suprimir princípios institucionais já consagrados
pela Constituição Federal Brasileira.
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