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Especialização em Tradução Português-Inglês Depto. de Letras & CCE –PUC-Rio - 2004.1 Módulo: TEORIAS DE LEITURA E TRADUÇÃO Professora: Marcia Martins Aluna: Dilma Machado Resenha Textos:”A questão do texto literário” e “ A questão da fidelidade”. ARROJO, Rosemary - Oficina de tradução – A teoria na prática. São Paulo: Ática, pp. 25-45. Robert Frost disse, com a maior seriedade, que poesia é aquilo que se perde nas traduções, pois todos nós estamos conscientes de que a matéria que a poesia organiza, nos seus momentos de maior felicidade, atinge um grau de condenação e complexidade na língua de partida que mesmo a tradução mais laboriosa e competente não consegue igualar na língua de chegada. Para Steiner, qualquer leitura atenta de um texto é um ato de interpretação plural que, na maioria dos casos, acontece sem a mediação de uma percepção consciente. Sabemos da existência dos 'falsos amigos' que, em um texto em língua diferente à do leitor, atraem sua tendência interpretativa para significados próximos às palavras de som similar de seu próprio idioma. Assim, lemos morbido, em italiano, pensando inconscientemente em "doentio" (doentio), e somente uma segunda leitura pode corrigir a interpretação e remeter para "suave". Também há falsos amigos no idioma próprio. Steiner oferece alguns exemplos significativos, como o de interest e simplicity, que têm em

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Especialização em Tradução Português-Inglês

Depto. de Letras & CCE –PUC-Rio - 2004.1

Módulo: TEORIAS DE LEITURA E TRADUÇÃO

Professora: Marcia Martins

Aluna: Dilma Machado

Resenha

Textos:”A questão do texto literário” e “ A questão da fidelidade”. ARROJO, Rosemary - Oficina de

tradução – A teoria na prática. São Paulo: Ática, pp. 25-45.

Robert Frost disse, com a maior seriedade, que poesia é aquilo que se perde nas traduções, pois todos

nós estamos conscientes de que a matéria que a poesia organiza, nos seus momentos de maior felicidade,

atinge um grau de condenação e complexidade na língua de partida que mesmo a tradução mais laboriosa

e competente não consegue igualar na língua de chegada.

Para Steiner, qualquer leitura atenta de um texto é um ato de interpretação plural que, na maioria dos

casos, acontece sem a mediação de uma percepção consciente. Sabemos da existência dos 'falsos amigos'

que, em um texto em língua diferente à do leitor, atraem sua tendência interpretativa para significados

próximos às palavras de som similar de seu próprio idioma. Assim, lemos morbido, em italiano, pensando

inconscientemente em "doentio" (doentio), e somente uma segunda leitura pode corrigir a interpretação e

remeter para "suave". Também há falsos amigos no idioma próprio. Steiner oferece alguns exemplos

significativos, como o de interest e simplicity, que têm em Shakespeare um significado muito diferente do

que lhes atribuiria facilmente um leitor contemporâneo.

Steiner sustenta que a língua evolui com o tempo, não somente o histórico, mas também o subjetivo.

Além disso, as reflexões metalingüísticas acerca da língua estão destinadas a modificar essa mesma

língua de que falamos.; portanto, nosso argumento é muito dúctil e difícil de avaliar em um momento de

observação.

Quanto à busca do significado, os métodos interpretativos podem ser úteis sempre que não

estabeleçam previamente significados que devam ser descobertos. Uma palavra ou uma frase sempre tem

várias interpretações. Até o mais elementar dos enunciados tem um contexto que permite ampliar seu

significado em círculos concêntricos cada vez mais amplos.

O sentido de um texto é fruto da interação entre a liberdade do texto que evolui no tempo e a

liberdade do leitor. Estas duas liberdades removem muito peso do arbítrio do dogma interpretativo, que é

um ente ideológico que tenta forçar as pessoas a sustentar regras interpretativas precisas - como no caso

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das religiões - ou que é uma teoria da interpretação que pressupõe que o texto tem um significado

"genético" e que o leitor possa somente ser bem-sucedido ou não em descobri-lo.

No que concerne à liberdade do leitor, este é um outro fator que descentraliza o controle sobre o

significado do autor para o resto do mundo, para outros cronotopos. As teorias e as práticas de

interpretação/tradução dos textos estão gradualmente se movendo do interesse para o léxico, para o

dicionário, para os tradutores, para o interesse pelo não-dito nas culturas, para as redes de significados,

para a polissemia, para a não-definibilidade do significado final. “Não existe uma ciência do sentido nem

teoria do significado e do efeito, se se devem levar a sério estas altas designações” (Steiner).

Quando afirmamos que desejamos prestar grande atenção ao processo de tradução na ciência da

tradução, é para obter uma melhor percepção dele em um sentido amplo, e não porque o consideremos

como elemento complementar do produto da tradução. O processo tradutivo se entende como uma relação

entre o texto original e o traduzido.

O tradutor que lê o texto que vai traduzir o faz projetando os possíveis metatextos em um espaço

virtual, no qual o novo texto começa a tomar forma; primeiro, como material mental (processamento do

material tal como percebe o tradutor) e, a seguir, como a inserção concreta de tal material em uma

estrutura rígida e convencional: o código do futuro metatexto (a linguagem do texto traduzido). A mente

humana examina, de maneira veloz e nem sempre totalmente consciente, as diferentes possibilidades de

projeção do prototexto na língua do metatexto e, mediante um processo de eleição, que guarda muito em

comum com a teoria dos jogos, decide-se pela solução que considera ótima entre as previstas.

Optar por uma palavra em lugar de outra exclui algumas possibilidades semânticas e acentua outras,

cria novos vínculos intratextuais e intertextuais ao mesmo tempo em que elimina outros.

No âmbito das discussões teóricas sobre tradução mais recentes, a "fidelidade" na tradução não é mais

entendida como a tentativa de "reproduzir" o texto de partida, mas está sendo relacionado à inevitável

interferência por parte do tradutor, à sua interpretação e manipulação do texto. O tradutor é entendido

como um sujeito inserido num certo contexto cultural, ideológico, político e psicológico - que não pode

ser ignorado ou eliminado ao elaborar uma tradução.

A tradução é um acontecimento que deflagra a língua e as várias línguas presentes num mesmo sistema

lingüístico. A postura de Derrida frente à tradução vai numa direção diferente da postura estrutural e da

pós-estruturalista ao chamar a atenção para o jogo de significação entre as línguas que ocorre em qualquer

tradução - desconstrução. Para Derrida, o domínio em que as línguas se reconciliariam e se

completariam não pode ser tocado pela tradução. Com isso, o filósofo quer dizer que "nunca atingiremos

a equivalência, que se situaria nesse suposto reino ideal de harmonia entre as línguas". Ainda, segundo

Derrida, a tradução "não é equivalência, não é complemento, é suplemento: uma significação substitutiva

que se constrói em uma cadeia de remissões diferenciais como a escritura". A tradução, pois, preenche

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um vazio e "vai se produzir de alguma maneira como obra original". Para ele a tradução não é, pois,

secundária em relação a um todo a ela externo, pois é necessária para a sobrevivência do original.

O conceito de recriação - no caso da tradução poética – é a peça fundamental para se entender a tarefa

específica do tradutor "poético" (enquanto poeta também). No momento em que se chega à significância

das palavras, ou seja, ao seu modo de significar, o tradutor se embate nos seus limites: de fato, a cada

palavra está associado um modo de significar e, para manter essa significância, deve-se escolher a forma

mais apropriada na língua de chegada. Isso é mais difícil na poesia, onde som, ritmo, prosódia contribuem

para se criar o sentido. O tradutor profissional, ao chegar a esse ponto, por incompetência ou por medo de

fazer as escolhas necessárias da tradução livre, se prende ao literal, ao significante, à forma. Por sua vez,

o poeta conhece o processo criativo que está atrás de uma frase; sabe que antes de traduzir um poema,

tem que traduzir e compreender o sentir poético do outro autor. É esse sentir poético do autor que o leva a

escolher aquela e não uma outra combinação específica de palavras. Como da Costa afirma, numa

tradução poética deve-se permanecer fiel à criação poética, ao processo criativo, ao pensamento que está

atrás da palavra.

A simples escolha do poeta e/ou do poema que se traduz de logo denota alguma forma de afinidade

entre o autor e o tradutor e é essa afinidade, ou o fato de ser uma escolha do poeta, que faz da tradução

poética uma recriação paralela do texto original, uma recriação da emoção, e é justamente a forma, a

realização dessa emoção.