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7/21/2019 Discurso e Representao - A Imagem Dos Candidatos de Oposio Na Pr-campanha de 2014 - Gustavo Paravizo
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Discurso e representao: a imagem dos candidatos de oposio na pr-campanha de
20141
Gustavo Fernandes Paravizo Mira2
Universidade Federal de Juiz de Fora
RESUMO
Este artigo analisa a construo do lugar de falados partidos de oposio ao governo do Partido dosTrabalhadores (PT), reeleito na sucesso presidencial brasileira h trs pleitos. O objetivo analisaras estratgias e os sentidos propostos pelas siglas contrrias nos Programas Partidrios Gratuitos dospr-candidatos Presidncia da Repblica, Acio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Paraisso, recorre-se aos trabalhos de Bernard Manin e Alessandra Ald com o intuito de verificarelementos que sinalizam a reconfigurao da representao poltica, o papel dos partidos e a maneirapela qual os cidados consomem informao poltica. Desta forma, a valorizao dos candidatos emdetrimento dos partidos a base para a compreenso do rearranjo do campo poltico orientadopela/para a mdia. Neste sentido, este trabalho prope-se a identificar, a partir da textualidade dosprogramas partidrios, os trs sentidos de maior recorrncia na fala dos pr-candidatos por meio dametodologia de Anlise de Contedo, proposta por Laurence Bardin. Considera-se que os programasveiculados antes da efetivao das candidaturas podem sinalizar semanticamente alguns termos dadisputa eleitoral, tendo em vista que candidatos e partidos fazem uso da mdia como palco discursivoperpassado por relaes de poder.
Palavras-chave: Comunicao Poltica; Representao; Eleies 2014.
A midiatizao de campanhas polticas tratada pela literatura (Manin, 1995; Ald, 2001)
como um processo que acompanha e participa das transformaes do sistema representativo. A
reconfigurao da funo partidria e a nfase no carter personalista so evidncias sintomticas da
mudana de comportamento entre os agentes polticos e os eleitores no que se refere s prticas
estabelecidas na democracia.
A centralizao da disputa na figura dos candidatos, em contraposio organizao
partidria, sinaliza a diferenciao entre a democracia de partido e a democracia de pblico3, e
1Trabalho apresentado ao GT (1)Teorias e Interfaces da Comunicao, do XII Encontro Regional de Comunicao Juizde Fora (MG).
2Cursa disciplinas do Programa Ps-graduao em Comunicao Social, na linha Comunicao e Poder, na UniversidadeFederal de Juiz de Fora. Graduado em Comunicao Social pela Universidade Federal de Viosa. E-mail:[email protected] dos trs modelos de democracia e representao discutidos por Bernard Manin no texto As metamorfoses do governorepresentativo, de 1995.
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resguarda comunicao papel de destaque em funo dos novos arranjos sociais que modificam a
lgica da poltica.
Se at ento as deliberaes aconteciam de forma colegiada e cabia aos polticos reverberar
no parlamento as resolues provenientes dos espaos de discusso do partido, o deslocamento dainfluncia ideolgica partidria para a comunicao de massa tambm modifica os mtodos e as
tcnicas utilizadas na conquista do eleitorado.
neste contexto que o ativista partidrio perde espao para o poltico comunicador que
recorre s assessorias especializadas na manipulao de linguagens miditicas para promover uma
imagem pblica ideal, [...] de uma posio poltica, transformando os discursos em espetculos
prontos para o consumo dos espectadores (ROSSINI; LEAL, 2012, p.54). Desta forma, o voto
passa a ter carter reativo ante a especificidade de cada pleito e fica suscetvel s estratgias
discursivas da campanha.
Assim, torna-se funo dos polticos oferecer pontos de discusso e alternativas, alm de
propor termos de clivagem a um eleitor flutuante4a partir de pesquisas de opinio. De acordo com
Ald (2001, p.15), os eleitores passam a ter maior interao com as especificidades de cada eleio,
mais do que expressar suas identidades sociais ou culturais atravs de um voto segmentado partidria
ou ideologicamente em clivagens duradouras. A escolha do eleitorado, ento, decorre da avaliao
de aes relativamente independentes da classe poltica, permanentemente empenhada em identificar
as questes que melhor fracionam o pblico para organizar e adaptar o discurso as suas perspectivas.
A visibilidade proporcionada pela comunicao de massa, neste caso, tambm revela-se
importante para o acompanhamento e avaliao da classe poltica, uma vez que o comportamento e
os eventos de partidos e candidatos so modificados em funo de critrios de noticiabilidade
(ALD, 2001, p.15). A credibilidade do poltico, nesse mbito, substitui a possibilidade de
verificao de suas aes e compromissos de campanha.
Alm disso, as campanhas constroem antagonismos de imagem que permitem aos eleitores
distinguir os candidatos concorrentes. De acordo com Manin (1994), essas imagens constituemrepresentaes polticas simplificadas e esquematizadas dos candidatos. A importncia dessas
representaes esquemticas, portanto, provm do fato de que boa parcela do eleitorado no est
4Ald (2001, p.16) identifica o eleitor flutuante como aquele que passa a votar de acordo com a pauta de problemas equestes levantada a cada eleio, identificada pelos institutos de pesquisa e fartamente evidenciada pela cobertura
jornalstica.
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suficientemente capacitada para compreender os detalhes tcnicos das medidas propostas e as razes
que justificam as suas escolhas.
Por esta razo, so sugeridas representaes esvaziadas para solucionar o problema da
desproporo entre os custos da informao necessria para se votar e a influncia que o eleitorespera exercer sobre o resultado das eleies (MANIN, 1995, p. 30). Em funo do declnio da
identidade social ligada aos partidos e sua formao ideolgica, surge a necessidade de encontrar
alternativas para a obteno de informao poltica papel que ser desempenhando em larga
medida pela comunicao de massa.
Formao discursiva e lugar de fala
O discurso a principal ferramenta que a classe poltica dispe para atrair a ateno do
eleitorado. As categorias semnticas movimentadas para estabelecer o contato com o pblico so
fundamentais para determinar o lugar de onde falame o que falamos candidatos, tanto no contato
direto com as pessoas como nos espaos miditicos, em que se fazem necessrias tcnicas de
comunicao elaboradas.
A partir desta perspectiva, a definio de formao discursiva5cunhada por Orlandi (2005,
p.42) corrobora com a viso deste trabalho. Para ela, os sentidos so determinados por posies
ideolgicas acionadas no processo social e histrico nos quais as palavras so empregadas. Desta
forma, o encadeamento de diferentes formas lingusticas significantes pode originar enunciados
distintos em funo do lugar de fala6que d origem aos sentidos (ALMEIDA, 2010, p.70).
A aceitao de um discurso, neste mbito, depende no apenas de quem fala e em quais
termos, mas da sua capacidade de dialogar com pblicos especficos em um ambiente cognitivo em
que so definidos os limites para a adeso a determinadas condies de enunciao (ALMEIDA,
2010, p.70). Neste sentido, Rossini e Leal (2012, p.54) argumenta que a busca por atalhos
informacionais e o baixo nvel de envolvimento do eleitorado na poltica motivada pela diminuio
da influncia ideolgica dos partidos justifica a estratgia dos candidatos de incorporarpersonagens para fornecer ao pblico quadros de referncia para a deciso do voto. Segundo Ald
(2001, p.19):
5Segundo Orlandi (2005, p.43), a formao discursiva se define como aquilo que numa formao ideolgica dada ou seja,a partir de uma posio dada em uma conjuntura scio-histrica dadadetermina o que pode e deve ser dito.6Relao em que o falante est autorizado a falar sobre algo e do modo como fala (ALMEIDA, 2010, p.70).
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Os indivduos procuram justificativas vlidas para se orientar e agir num contextopoltico do qual, querendo ou no, so obrigados a participar e em relao ao qual, svezes contra sua vontade, precisam se posicionar. Para o cidado comum, aconstruo destas justificativas se apoia em discursos elaborados e recebidos.Discursos ao mesmo tempo informados e limitados pelos diversos quadros de
referncia a que os cidados recorrem. O prprio processo de construo das atitudespolticas um processo comunicacional, uma vez que estes quadros de refernciamais ou menos importantes na elaborao das explicaes com que organiza omundo da polticatm natureza discursiva (ALD, 2001, p.19).
Neste ponto, tambm importante destacar o papel central desempenhado pela televiso na
constituio das preferncias polticas do eleitorado e na capacidade de dar suporte s relaes de
poder advindas do campo da poltica. Para Weber (2010, p.163), em funo de sua abrangncia, a
televiso capaz de estabelecer comunicao direta com o eleitor, alm de organizar o debate
eleitoral como mediadora da discusso pblica.
Tendo em vista a disposio de suas gramticas, o marketingpoltico articula conjuntos de
aes que vo da anlise do contexto social, poltico, econmico e cultural, at a contratao de
especialistas e a construo de planos estratgicos de mdia para elaborar a proposta enunciativa do
candidato. A imagem, desta forma, enquanto sntese dos elementos do discurso, substitui o projeto
poltico e ajuda a determinar uma marca que, segundo Schwartzenberg, (1977, p.12-13), permite
conhecer ou reconhecer, criar e consolidar a notoriedade do poltico por servir como smbolo visvel
e tangvel.
Estratgias da oposio: de onde falam Acio Neves e Eduardo Campos
A definio das estratgias comunicativas empregadas nas campanhas eleitorais tem incio
muito antes da efetivao das candidaturas aos cargos eletivos. Ainda pouco estudadas pela
literatura, as pr-campanhas constituem-se como perodo profcuo de anlise da articulao da classe
poltica, tendo em vista os primeiros acordos, acertos, barganhas, retaliaes e compensaes
decorrentes da preparao para as eleies (MARANHO, 2007, p. 16).
Com vista aos aspetos semnticos sintetizados nos produtos desenvolvidos pelos pr-candidatos e suas respectivas coligaes, define-se como pr-campanha o perodo que antecede a
efetivao das candidaturas para a Presidncia da Repblica e que coincide com incio da restrio
propaganda partidria gratuita, encerrado em 10 de junho, conforme a Lei 9.066/95.
De acordo com esta legislao que tambm ordena o funcionamento, a criao e as
finanas dos partidos,o objetivo dos programas partidrios promover e divulgar mensagens aos
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filiados dos partidos sobre a execuo das diretrizes partidrias e de eventos e atividades
congressuais, bem como a posio da sigla a respeito de temas poltico-comunitrios. Alm disso,
para que os partidos faam uso do tempo de dez minutos disponibilizado em rede nacional,
necessrio que tenham elegido e mantenham filiados o mnimo de trs representantes de diferentesestados no Congresso Nacional.
Na pr-campanha, candidatos e partidos movimentam-se com o objetivo de apresentar as
primeiras agendas temticas e agregar atributos de credibilidade imagem de seus polticos,
sobretudo em eleies presidenciais. Neste perodo, de acordo com Maranho (2007, p.16) os
espaos miditicos so disputados diariamente por atores polticos interessados em maximizar a sua
exposio e submeter-se apreciao do pblico.
Nesta anlise, so estudados os programas dos partidos de oposio ao Partido dos
Trabalhadores (PT), atualmente na Presidncia da Repblica, exibidos no horrio destinado a sua
veiculao em rede nacional de rdio e televiso, entre s 19h30 e 22h. Para limitar o universo de
presidenciveis analisados, foram selecionados os candidatos Acio Neves (PSDB) e Eduardo
Campos (PSB)7em funo da maior porcentagem de ambos nas pesquisas inteno de voto entre os
meses de maro e abril de 20148, perodo em que a maior parte dos programas partidrios foi
exibida9. As estratgias discursivas construdas pelos candidatos foram verificadas tendo como base
de dados as transcries dos programas partidrios e a posterior anlise das categorias semnticas
que emergem do texto.
Aplica-se, neste trabalho, as ferramentas de anlise de contedo propostas por Laurence
Bardin (1977). Para a autora, esta metodologia tem como objetivo tomar em considerao a
totalidade de um texto, passando-o pelo crivo da classificao e do recenseamento, segundo a
frequncia de presena (ou de ausncia) de itens de sentido (BARDIN, 1977, p.36-37). Desta
forma, permite-se a explorao dos textos em profundidade, desde os aspectos semnticos referentes
aos sentidos presentes nas construes textuais at as formaes discursivas que participam da
constituio de determinados lugares de fala.
7Os partidos dispem de um programa de dez minutos e inseres que variam de 30 segundos a um minuto. Neste caso, soavaliados os programas de maior durao, cuja exibio acontece uma vez a cada semestre.8Na pesquisa de inteno de votos publicada pelo Instituto Datafolha em 7 de abril de 2014, Acio aparece com 16% eEduardo Campos com 10%. Na pesquisa referente ao ms de abril, publicada em 9 de maio, Acio soma 20% e Eduardocontabiliza 11%. No geral, os demais candidatos de oposio, mesmo que somados, no atingem a marca de 10%.9PSBD, PSB, PSTU, PSC, entre outros. O programa de Eduardo Campos foi exibido em 27 de maro e o de Acio Neves em17 de abril de 2014.
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De acordo com Bardin (1977), esta vertente de anlise oferece seis tipos de mobilizaes
tcnicas para o estudo do contedo nas comunicaes anlise categorial, de avaliao, de
enunciao, de expresso, das relaes e do discurso , cuja principal funo colaborar com
procedimentos que permitam a classificao dos elementos de significao constitutivos de umadeterminada mensagem (BARDIN, 1977, p.37).
Ademais, privilegia-se a anlise categorial, tendo em vista que o seu emprego admite a
organizao semntica de elementos prximos, seja por aspectos gramaticais ou de sentido (Bardin,
1977, p.117). Para isso, utiliza-se o princpio da inferncia10como ferramenta bsica para a anlise
dos dados e conhecimento dos termos propostos pelos pr-candidatos. Neste sentido, a articulao
deste aparato terico-metodolgico com a textualidade aferida dos programas deu origem s
categorias que sero discutidas neste estudo (ANEXO 1).
De maneira geral, as estratgias argumentativas de Acio Neves e Eduardo Campos diferem-
se e aproximam-se em diversos aspectos nos programas eleitorais gratuitos. Ambos procuram
familiarizar-se com o eleitorado brasileiro (pulverizado em cinco macrorregies) a fim de pontuar os
termos de discusso que lhes so caros para a disputa poltica, especialmente em funo da
necessidade de projetarem suas imagens para alm de suas reas de influncia eleitoral.
Com um tom argumentativo e aparentemente disposto a dialogar com as pessoas sobre o
Estado e os problemas cotidianos do cidado no programa, Neves enfatiza sua trajetria poltica e
descreve situaes desafiadoras enfrentadas enquanto agente poltico, que lhe exigiram posturas
consideradas valorosas do ponto de vista tico-moral no exerccio de seus cargos pblicos. Campos,
no entanto, opta por apresentar os valores de seu partido ao lado de sua candidata a vice-presidncia,
Marina Silva, que nas eleies de 2010 alcanou nas urnas a marca de vinte milhes de votos e,
inclusive, divide com Eduardo o protagonismo do programa. Fica evidente, a partir dessas
exposies iniciais, que os pr-candidatos adotaram formaes discursivas diferentes para a disputa
eleitoral. A dimenso das diferenas e semelhanas entre Acio e Campos, entretanto, fica mais
aparente com a categorizao e a quantificao proposta para as unidades textuais11
e semnticaselencadas pelos candidatos em seus produtos veiculados na mdia. Nas clivagens provenientes da
10Inferncia, segundo Bardin (1977, p. 39) uma operao lgica, pela qual se admite uma proposio em virtude da sualigao com outras proposies j aceites como verdadeiras.11 Unidades textuais so fragmentos de texto que representam uma ideia com sentido completo. Quando o pr-candidatoAcio Neves, no contexto do programa, se prope a fazer um Brasil que seja de todos, a mensagem transmitida tem umsentido otimista em relao ao futuro do pas, por isso classificada como otimista na respectiva categoria.
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anlise textual de ambos, foram enumeradas sete categorias presentes nos programas, e mais uma
categoria especfica de cada pr-candidato, as quais ordenam as passagens de texto e sentido que
constituem o material analisado. Contudo, sero discutidas neste trabalho as trs categorias mais
empregadas por cada candidato: Reforo de Valores, Crtica ao Governo e Otimismo12. Foramcontabilizadas 48 mobilizaes de sentido em Acio Neves e outras 57 em Eduardo Campos, em um
total de 105 ocorrncias.
A categoria Crtica ao Governo, neste plano, rene os principais apontamentos de ambos os
pr-candidatos em relao conduo do pas. Alm disso, sinaliza os termos do debate sugeridos ao
eleitorado ao longo da campanha. Acio, por exemplo, utilizou-se da crtica ao governo 24 vezes, o
que corresponde a 25,53% das suas mobilizaes de sentido. Entre outros trechos, o tucano afirmou
que vivencia-se no Brasil denncias vergonhosas.
Para ele, quando o governo vira o problema, a sade vira problema, a educao vira
problema, a segurana pblica vira problema. Suas crticas tambm se espraiam para as
manifestaes de junho de 2013. Para Acio Neves, o brasileiro no aceita mais passivamente o
desgoverno, afinal, este um governo que no conversa, um governo que se omite nas questes
essenciais como segurana e sade. Alm desses trechos, o senador tambm fez meno
propaganda estatal, dificuldade de estabelecer dilogo com o governo, questes de infraestrutura,
conduo de estatais como a Petrobras e a Eletrobras, e, especialmente, inflao, discutida direta e
indiretamente em seis ocasies.
Eduardo e Marina, ao seu turno, fizeram 19 crticas ao governo, com 21,34% das
mobilizaes de sentido de seu programa. Os dois pr-candidatos, ex-ministros do Governo Lula e
antigos companheiros de Dilma Rousseff, destacaram os contrassensos econmicos, sociais e
ambientais da poltica energtica. Assim como Acio Neves, embora com foco na Petrobras,
criticaram a conduo e a desvalorizao da estatal com citao nominal presidente, algo que no
acontece no programa tucano, apesar de Acio compartilhar um iderio poltico mais distante de
Dilma do que Eduardo Campos.Ainda que tenham citados os avanos de outros governos, Campos e Silva afirmam que o
Brasil est numa trajetria de retrocessos. Segundo eles, governante que no ouve d as costas
para o povo e ela [Dilma] poderia ter feito mais pelo Brasil, mas desmanchou o que estava
12Outras categorias encontradas, cuja anlise sero analisadas em outros trabalhos, so: Capacidade de Gesto, TrajetriaPoltica, Capacidade de Dilogo, Mudana, Afetividade e Mrito de Outros Governos.
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sendo feito. Tambm no faltaram referncias agenda socioambiental e inflao, citada trs
vezes no programa e, naquele momento, frequentemente mencionada nos noticirios em funo dos
sequentes aumentos no perodo analisado: 0,69 e 0,92%.
Na categoria Reforo de Valores, os pr-candidatos elencam as caractersticas consideradasimportantes para governar o pas, desde aspectos tico-morais at propriedades e valores que o pas
deve cultivar para desenvolver suas potencialidades. Esta categoria no se ope perfeitamente s
crticas ao governo, mas indica quais so as premissas que norteiam as futuras agendas dos
presidenciveis.
Acio Neves faz uso destes sentido 20 vezes (21,27%) para afirmar a necessidade de
planejamento e transparncia, tica e eficincia e boa aplicao do dinheiro pblico. Para ele,
seriedade, integridade pessoal e honestidade de princpios so valores essenciais para uma
gesto planejada e eficiente. Valores como a proteo das riquezas naturais, sustentabilidade e
desenvolvimento sustentvel so alguns dos termos propostos por Eduardo Campos e Marina
Silva. Com 20 sentidos mobilizados (22,47%), eles ressaltam a importncia de uma poltica em que
sejam garantidos os valores democrticos, com vistas ao cuidado com o patrimnio humano e
natural. Ambos repetem mntricamenteos termos luta e paz em cinco situaes, possivelmente
como estratgia de fixao desses sentidos nas respectivas imagens.
A terceira categoria mais recorrente no discurso dos pr-candidatos, contudo, difere-se
significativamente das duas primeiras. Acio Neves faz a opo de valorizar os atributos que lhe
credenciam a concorrer ao cargo de presidente ao reforar as suas habilidades como gestor pblico.
Na categoria Capacidade de Gesto, o pr-candidato menciona 13 vezes (13,82%) os feitos de suas
administraes e as medidas adotadas para solucionar os problemas financeiros do estado de Minas
Gerais. De acordo com Acio, ocorreu poca de sua gesto o enxugamento da mquina pblica,
a reduo do nmero de secretarias, de cargos comissionados, alm dos exemplos pessoais
dados por ele e seus secretrios estaduais, como o corte do prprio salrio e o congelamento das
remuneraes de todo o primeiro escalo. Neves ainda relembra a sua contribuio para o fim daimunidade parlamentar e narra uma situao em que teria devolvido cem milhes de reais ao
Governo Federal, do ento presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Os esforos de Marina e Eduardo, por outro lado, concentraram-se na empreita de transmitir
mensagens de otimismo sobre o brasileiro e em relao ao pas. So aferidas 18 unidades de sentido
(20,22%) referentes categoria Otimismo. Enquanto Acio escolheu apresentar suas caractersticas
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de gestor, Campos refere-se a si e a Marina como filhos da esperana em quatro trechos. Segundo
ele, o brasileiro um povo alegre, mestio, misturado, guerreiro, generoso. Sua vontade ver o
povo animado, reivindicando, sonhando, desejando, participando da poltica. Para Marina e
Campos, o que une os dois no mesmo projeto o desejode o Brasil voltar a melhorar.No que se refere categoria Otimismo, Neves mobiliza quatro sentidos, 4,24%, os quais
fazem referncia a construo de um Brasil que seja de todos. Mesmo com a problematizao, o
pr-candidato afirma que o Brasil tem jeito, o Brasil tem muito jeito, afinal, extraordinrio o
esforo e a capacidade produtiva da nossa gente. Acio, no entanto, compensa a baixa recorrncia
nesta categoria com demonstraes de afetividade pelo Brasil e pelos brasileiros. Estes sentidos
deram origem categoria Afetividade, com sete mobilizaes (7,44%). Nela, so destacados desde
sentimentos pessoais como a dor pela morte de Tancredo, o sonho no realizado do av de Acio,
at o amor enorme pelo Brasil. Tendo em vista a diferena de estratgias dos candidatos, percebe-se
aqui, em funo da recorrncia nestas categorias, a guinada de Acio para valorizao de suas
qualidades de gesto, com flexibilizaes que perpassam o sentimentalismo e o sonho que pode ser
materializado, ao passo que Eduardo adota uma postura pragmtica e motivadora em relao ao
povo brasileiro e suas expectativas polticas ligadas mudana e melhoria dos servios pblicos.
Por fim, o fato de os programas serem exibidos na televiso faz com que os sentidos e as
estratgias adotadas pelos pr-candidatos ganhem amplitude e penetrao e forneam ao eleitorado
quadros de referncia capazes de orientar o seu posicionamento a respeito da disputa poltica e
tambm a materializao de suas percepes para a deciso do voto.
Consideraes finais
O principal efeito colateral dos programas partidrios gratuitos, na concepo deste trabalho,
pode ser observado na pesquisa de inteno de votos realizada pelo Instituto Datafolha aps a
exibio das peas de ambos os pr-candidatos. Na sondagem13publicada em 9 de maio (referente a
abril), Dilma Rousseff recua um ponto percentual em relao pesquisa anterior, na qual marcava38%; Acio Neves sobe quatro pontos percentuais e alcana a marca de 20%; Eduardo Campos, por
sua vez, sobe um ponto e totaliza 10% das intenes de voto.
13Disponvel em: . Acesso em: 16 ago. 2014.
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A constatao de similitudes e contrastes existentes nas formaes discursivas auxilia na
evidenciao de que as candidaturas fazem escolhas e assumem posicionamentos especficos ainda
na pr-campanha. Desta forma, a constituio de sentido em torno da imagem dos pr-candidatos
presume lugares de falaj na produo e veiculao das primeiras peas publicitrias, mesmo queos principais acertos polticos estejam sendo realizados nos bastidores.
A partir desta compreenso, a anlise serviu como ferramenta de observao e ampliao das
percepes a respeito dos programas partidrios gratuitos, cuja veiculao acontece em momento
especial para as campanhas, nos quais so gestados alguns dos principais arranjos intrapartidrios e
as primeiras referncias cognitivas voltadas ao eleitorado.
Referncias BibliogrficasALMEIDA, Jorge. Lula, Serra e o luar de fala da mudana em 2002 . In: MIGUEL,Luiz Felipe, BIROLI, Flvia (Orgs). Mdia representao e democracia. So Paulo:Editora Hucitec, 2010, p.68-91.
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BARDIN, Laurence. Anlise de contedo. Lisboa: Editora Edioes 70, 1977.
LEAL, Paulo R. F; ROSSINI, Patrcia G. C. As campanhas eleitorais no contexto da
poltica personalizada.In: QUEIROZ, A. C. F; TOMAZIELLO, P. S; MACEDO, R. G.Comunicao poltica e eleitoral no Brasil: perspectivas e limitaes no dinamismopoltico. Americana: Politicom, 2012. p.45-63.
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MANIN, Bernard. As metamorfoses do governo representativo . In: Revista Brasileirade Cincias Sociais, n. 29, Ano 10, outubro de 1995.
MIGUEL, Luiz Felipe, BIROLI, Flvia (Orgs). Mdia representao e democracia. SoPaulo: Editora Hucitec, 2010.
ORLANDI, Eni P. Anlise do discurso: princpios e procedimentos . 6. ed. Campinas,SP: Pontes, 2005.
SCHWARTZENBERG, Roger-Grard. O Estado Espetculo: Ensaio sobre e contra ostar systemem poltica. Crculo do Livro. So Paulo: 1977.
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ANEXO 1
CATEGORIASA CIONEVES
EDUARDOCAMPOS
% A CIONEVES
% EDUARDOCAMPOS
Reforo deValores
Elenca os valores consideradosimportantes pelo candidato paragovernar o pas.
20 20 21,27% 22,47%
Crtica aoGoverno
Rene as crticas diretas ouindiretas ao governo. Reforam anecessidade mudana.
24 19 25,53% 21,34%
Otimismo
Trechos e sentidos em que soreforadas caractersticas positivassobre o brasileiro e de otimismo emrelao ao pas.
4 18 4,24% 20,22%
Capacidadede Gesto
Momentos em que so reforadascaractersticas positivas de gestoque supostamente o pr-candidato
possui.
13 5 13,82% 5,61%
TrajetriaPoltica
Trechos em que so rememoradosos cargos e as filiaes polticasdos pr-candidatos. Esforo paradar visibilidade ao capital poltico.
12 8 12,76% 8,98%
Capacidadede Dilogo
Aglutina os trechos e sentidos queremetem ao dilogo com o povo e capacidade de articulao poltica.
9 3 9,57% 3,37%
Mudana
Elenca os sentidos de mudana queemergem direta ou indiretamentedos discursos construdos no
programa
5 11 5,31% 12,35%
Afetividade*
Momentos em que soevidenciados aspectos afetivos do
pr-candidato, sejam pessoais ouem relao ao pas.
7 - 7,44% -
Mrito deOutros
Governos**
Situaes em que so afirmadas asconquistas e os avanos de outrosgovernos, desde a retomada das
eleies diretas.
- 5 - 5,61%
TOTAL 94 89 100% 100%
*Categoria que emerge apenas no discurso de Acio Neves.** Categoria que emerge apenas no discurso de Eduardo Campos e Marina Silva.