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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
BRASÍLIA MONUMENTO, REMEMORAÇÃO E CONHECIMENTO.
Por: Fernando Esteban Reynoso Acosta
Orientador
Prof. Vilson Sergio
Brasília
2013
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2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
BRASÍLIA MONUMENTO, REMEMORAÇÃO E CONHECIMENTO.
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Arte Educação e Saúde.
Por: Fernando Esteban Reynoso Acosta
3
AGRADECIMENTOS
....a Senhor Deus, doador de todas as
coisas, a minha amada esposa e aos
meus filhos, luzes divinas na minha
vida.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esta monografia a minha linda e
amada filha Natalia, que do seu jeito
silencioso me motivou a realizar esta
especialização.
5
RESUMO
Brasília impressiona pela vastidão das proporções e beleza dos prédios
e esculturas, este perfil tão caraterísticos da cidade monumento evidencia a
primeira vista traços modernistas e neoconcretos. Este gigantesco projeto
levou em consideração além do político e econômico, também aspectos
estilísticos, éticos referentes à produção de conhecimento no campo da
escultura.
O modernismo presente em Brasília através da escultura de Ceschiatti e
em relação à arquitetura neo-concreta reflete uma nova forma de
conhecimento, se manifesta como um elo entre o clássico e contemporâneo.
Esta forma de produção e sustentada e analisada neste trabalho segundo o
método indiciário decorrente do método moreliano, o qual se guia a traves de
indícios entendidos em forma de sintomas.
O projeto da capital O aspecto ideológico que validaria o caráter de
momento de Brasília e questionado seguindo o método indiciário a partir do
testemunho dos candangos no documentário de Vladimir Carvalho
“Conterrâneos velhos de guerra”. Em prol de chegar a entender de que modo
Brasília pode ser percebida, apreciado e refletida na rememoração dos
habitantes.
Em palavras de Manguel todo monumento leva implícita a frase pare e
pense. O conflito fica claro ao notar o paralelo da função do monumento em si
contrastado com o processo de construção de conhecimento que a cidade
representa.
6
7
METODOLOGIA
Pesquisa bibliográfica e vídeo gráfico sobre os temas vinculados:
Na busca de analises de conhecimento prévios na área cultural ou
cientifica a pesquisa bibliográfica pretende explicar um problema a partir de
publicações já reconhecidas.
Esta e um meio fundamental no processo de elaboração de básica para
estudos monográficos, nos quais se entende como alvo principal o conhecer o
estado geral do conhecimento sobre o assunto de estudo.
A pesquisa bibliográfica é meio de formação por excelência e
constitui o procedimento básico para os estudos monográficos, pelos
quais se busca o domínio do estado da arte sobre determinado
tema. Como trabalho científico original, constitui a pesquisa
propriamente dita na área das ciências humanas. Como resumo de
assunto, constitui geralmente o primeiro passo de qualquer pesquisa
científica. Os alunos de todos os institutos e faculdades devem,
portanto, ser iniciados nos métodos e técnicas da pesquisa
bibliográfica. (Moreira Vilela, pg. 15)1
1 MOREIRA VILELA, Maria Estela. Método e técnicas de estudo. Disponível em:
http://famanet.br/pdf/cursos/semipre/metodos_tecnicas_estudo_md3.pdf. Ultimo acesso em 15 de janeiro de 2013.
8
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I - Produção do conhecimento em artes 13
CAPÍTULO II – Método Moreliano 26
CAPÍTULO III – Problema ético na rememoração 31
CONCLUSÃO 39
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42
ÍNDICE 44
10
INTRODUÇÃO
O tema de estudo de esta monografia é “Caráter rememorativo em
Brasília para os candangos quanto monumento e produção de conhecimento
em escultura”. Sendo que a questão central esta focada na reflexão sobre
como o modernismo como novo paradigma trouxe com sigo a necessidade de
outra forma de escultura, de donde surge a pergunta como isso acontece em
Brasília quanto monumento.
Brasília impressiona pela vastidão das proporções e beleza dos prédios
e esculturas, o perfil tão característico da cidade monumento evidencia em
forma clara traços modernistas e neoconcretos, mas, além disso,
paralelamente chama poderosamente à atenção a multidão que passa quase
indiferente ao contexto artístico arquitetônico.
Este gigantesco projeto levou em consideração além do político e
econômico, também aspectos estilísticos, éticos e conceituas referentes à
produção de conhecimento no campo da escultura e arquitetura.
Mas estes aspectos confluem ou deveriam confluir e se validar no
momento no qual em quanto monumento Brasília pode ser percebida,
apreciado e refletida e prol da rememoração pelos mesmos habitantes. Em
palavras de Manguel todo monumento leva implícita a frase pare e pense. O
conflito fica claro ao notar o paralelo da função do monumento em si
contrastado com o processo de construção de conhecimento que a cidade
representa.
E nesta consideração que surge a necessidade de uma analise de
Brasília em três aspectos, quanto projeto de escultura no plano estendido,
como produção de conhecimento, e quanto o problema ético na rememoração.
De este modo se estabelece como principal objetivo da pesquisa a
compreensão de Brasília como expressão de arte contemporânea, analisando
11
seu caráter rememorativo quanto monumento tomando como base a descrição
da produção de conhecimento em escultura. Em decorrência também se
definem como objetivos específicos o descrever e analisar produção de
conhecimento em escultura; entender como o relevo e o plano são básicos
para compreensão da arte contemporânea; fundamentar a consistência da arte
contemporânea brasileira; caracterizar e conceituar monumento; relacionar os
conceitos estudados com Brasília.
12
CAPITULO I
PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO EM ARTES
Dentro do modernismo2 a escultura como linguagem consagrada sofre sua
maior crise ao ter que enfrentar as mudanças próprias da chegada da
contemporaneidade. A investigação experimental e a incorporação de
conceitos não tradicionais colocarão a escultura numa situação limiar onde as
definições absolutas perderão força.
Exemplo disso será a discussão sobre o espaço, quarta dimensão agora
necessária para circular à obra visando só a traves dela uma leitura completa;
também a aceitação do desenvolvimento de uma forma de escultura que se
direcione as massas levara a necessidade de reconsiderar a compreensão da
escultura como uma obra de arte pública abrindo as portas para aceitação da
realidade de um plano de percepção coletiva em espaços públicos.
Para poder tratar esta crise de mudança na escultura, motivada em parte
pelas transformações das grandes metrópoles do século XX, faz-se necessária
uma abordagem considere a tradicional enunciação sequencial de estilos
relacionados e ajustados, mas também que fuja da configuração historiográfica
meramente linear.
Para compreender o passo da escultura tradicional á contemporaneidade
resulta conveniente analisar alguma produção que posa ser tomada como
referência segundo a localidade e as condições, que escape aos
enquadramentos já enunciados como determinações estilísticas dentro do
campo da história da arte. Brasília, objeto de analises deste trabalho, e m
exemplo disso. Esta pode ser entendida em meteria de escultura como uma
concentração da construção do conhecimento da época, clara representante
2 O modernismo do inicio do século marca a ruptura com a tradição da escultura, esta vai escapar da representação, da monumentalidade e do conceito tradicional de grande Arte. As principais razões históricas desta ruptura com as convenções de desde a Renascença determinam seu gênero, são de ordem social e filosófica. http://www.uefs.br/nes/juracidorea/publicacoes/tradicao_modernidade.pdf
13
brasileira dentro do modernismo, e também desde a perspectiva do caráter do
monumento revela-se nela a presença de um conflito na rememoração.
1.1. Linearidade em Wölflin: As tendências
A evolução e os processos da escultura descritos pela Historia das
Artes, na perspectiva de Heinrich Wölfflin3 pode ser caracterizada e analisada
a partir dos elementos plásticos constitutivos. Isto e entender a obra como um
todo a ser dividido e subdividido em partes menores para um estudo
fraccionado que na soma posterior das partes possa oferecer uma
compreensão clara e distinta do objeto de arte.
Wölflin descreveu como formas artísticas podem se repetir através de
tendências ao longo do tempo. Ele enuncia leis que orientam a percepção
estética tendo como base a adequação dos períodos artísticos aos
movimentos históricos e culturais. Descreve uma sucessão de aspectos
formais classificados a traves de polaridades; toma como ponto de partida a
descrição dos conceitos de clássico e barroco como formas culminantes,
opostas e idênticas em importância. Wölflin revela como ressurge o Clássico
no Renascimento e o Helenismo no Barroco através de cinco indicadores de
análises:4 o linear e o pictório, forma aberta e fechada, plano e profundidade,
pluralidade e unidade, claridade absoluta e luz relativa. Com estes indicadores
chega a enunciar tendências que na sua visão regeriam a História da Arte
numa constante repetição alternada de características clássicas e helenísticas.
3 Heinrich Wölfflin (1864- 1945), historiador da arte e analista da imagem. Os esquemas analíticos propostos por ele são apresentados a partir de uma comparação entre obras de arte relativas aos períodos Barroco e Renascentista, seguindo uma linha de comparação que era comum à abordagem do autor.
http://www.ufsj.edu.br/portal2- repositorio/File/existenciaearte/Edicoes/6_Edicao/Heinrich_Wolfflin_e_sua_contribuicao_para_a_teoria_da_visibilidade_pura.pdf
4 WÖLFFLIN, Heinrich. Conceitos fundamentais de história da arte. 2 ed. São Paulo: Matins Fontes, 1989.
14
Estas tendências seriam dois núcleos conceptuais que oscilariam entre si, ora
de caráter racional regido por eixos estáticos, ora de caráter emocional regido
por eixos dinâmicos.
Visto de este modo as características definidas na escultura Grega
Clássica estariam presentes no Renascimento do trecento e quatrocento, e
Neoclássismo. Já as características definidas pela escultura Grega Helenística
poderiam ser identificadas no período de transição do Renascimento do
quinquecento ao Barroco e no Romantismo.
A crise derivada do impressionismo e do pós-impressionismo na Europa
(modernismo no Brasil) ocasionou uma mudança de paradigmas na definição
da obra de arte em si. Esta mudança esta intimamente ligada à forma de
construir e validar o conhecimento. Não mais a ciência ira procurar uma
verdade única e universal a traves do método de fragmentação da realidade e
da experiência de laboratório. Os limites das disciplinas de conhecimento se
permeiam entre si utilizaria para o processo de aquisição de conhecimentos.
1.2. Visão mecanicista do mundo
Na procura de entender a Historia das Artes pode se ver como os
métodos científicos se permeiam nos processos de leitura e interpretação das
produções artísticas. De este modo entende se que o método da ciência na
aquisição de conhecimentos interfere e modifica as formas adotadas pelos
historiadores e teóricos da arte no processo de análise e interpretação das
produções ao longo da historia e ate o presente.
Tem se mencionado no capitulo anterior a oscilação entre tendências
que desde o renascimento ate e ate o romantismo tem regido na Historia das
Artes. Esta forma de interpretação obedece ao que pode ser chamado de uma
visão mecanicista do mundo a qual tem sua origem na história mesma do
conhecimento. Esta leva a entender o mundo como um grande sistema,
composto de elementos agrupados e organizados como peças de uma enorme
15
maquinaria, na qual todas as partes podem ser estudadas em seus
componentes mais elementares. Em consequência tem se como pressuposto
que a união de todas estas partes reconfigura o mundo.
“As questões complexas devem ser divididas em questões, mais simples; deve-se partir das frações para se chegar ao todo. O todo deve ser ordenado. A ordem como o essencial do método inicia a transformação radical sobre a natureza do pensamento. Este já não pensa em coisas, e sim em relações. Depois da evidência, da divisão e da ordenação, o papel da enumeração tem a função de restabelecer a continuidade do pensamento fragmentado.” (Zamboni, 2000. p.12)
O cartesianismo segundo Zamboni (2001), fundamenta seu método na
razão, e entende o verdadeiro como aquilo que se apresenta como evidente
claro e distinto. Aborda aquilo que pode ser estudado mediante uma análise
racional, utilizando sempre o mesmo método. Para Descartes tudo o que e
suscetível de conhecimento pode ser formulado numa forma de pensamento
matemático. Dentro deste caminho encontram-se as contribuições de Bacón
(1558-1627) com o desenvolvimento do método experimental e de Galileu
Galilei (1564-1642) com a introdução do uso das matemáticas para explicar os
princípios da física. Segundo Newton (1642-1727), o mundo pode ser visto
como um grande conglomerado de elementos, reunidos como peças de uma
grande máquina, como um acúmulo de elementos onde o todo pode ser
reduzido para ser interpretado.
O conhecimento humano, inclusive das artes, pode ser organizado em
áreas e subáreas dando lugar, cada vez mais, a maiores especializações.
Perde-se em amplitude, mas se ganha em profundidade, sempre dentro deste
modelo também chamado de reducionista. Este acabou por sistematizar a
ciência em áreas e subáreas, na medida em que as diferenciações são
geradas, as novas ciências ganham razão para existir de modo independente.
O princípio do alfabetismo visual baseado nas propostas da Bauhaus
tem como fundamento o modo de ver mecanicista de ver o mundo. Nele a obra
de arte é reduzida a ínfimas partes, os chamados elementos plásticos puros,
como: linha, ponto, forma, cor, tensão, todos factíveis de uma análise
16
individualizada e que no conjunto reintegrado contribuiria ao sentido da
composição.
Uma nova ordem científica se estabeleceu no início do século XX com a
teoria da relatividade e da teoria quântica. Zamboni (2001) explica que um
novo paradigma foi adotado, já que os físicos não puderam pensar de acordo
com os moldes racionalistas anteriores. A investigação do mundo atômico e
subatômico colocou todos de frente com uma realidade que desestabilizou o
universo conceitual da época. Criou-se assim a imperiosa necessidade do
desenvolvimento de um novo paradigma distante das teorias científicas usuais.
1.3. O outro paradigma
A pesquisadora austríaca Knorr Cetina5 traz na sua obra “A construção
do conhecimento” uma série de questionamentos sobre a forma pela qual o
conhecimento é produzido, e com isso uma luz em relação a um novo
paradigma para a ciência compreender o mundo que em consequência
auxiliara a compreender as artes. Se a visão mecanicista reduzia em partes
cada vez menores num olhar microscópico, Cetina dirá que o laboratório como
lugar onde se pratica a redução e a produção do conhecimento não terá mais
como distinguir entre os aspectos sociais e os aspectos cognitivos antes tão
claramente separados.
Até este momento a escolha do que a ciência iria pesquisar estaria
dentro da perspectiva da total objetividade e como tal, da procura da verdade
universal, de uma única forma de ver o mundo e de interpretá-lo. Dentro dos
laboratórios a prática da produção do conhecimento se baseia em
5 Karin, Knorr Cetina nasce em 1944 na Áustria. Socióloga e doutora em Antropologia Cultural pela Universidade de Viena hoje é pprofessora na Universidade de Bielefeld na Alemanha. Publicou livros e artigos sobre sociologia e antropologia da ciência, sobre problemas metodológicos nas ciências sociais e sobre os níveis de análises micro e macro na dinâmica social.
17
conhecimentos previamente aceitos e validados a partir de outros
conhecimentos anteriores. O questionamento que traz a mudança se centra na
questão da validade, já que para Cetina e impossível reproduzir de forma
exata o mesmo fenômeno duas vezes. Nesta simples afirmação entendesse
que não há como validar todo tipo de conhecimento mediante este método
reducionista e que não haverá como encontrar um conhecimento único válido
para todos universalmente. Deste modo a autora afirma e comemora o
nascimento de uma zona onde os limites, antes claros e verdadeiros, se
confundem e desaparecem dando lugar a novos tipos de metodologias como a
“metodologia sensitiva” e o “método moreliano”.
O que no ascético e esterilizado ambiente do laboratório devia ser
absolutamente objetivo, na realidade não está distante nem isolado dos
movimentos sociais do tipo político, econômico e cultural. Pelo contrário estes
acabam orientando e definindo os interesses internos do mesmo laboratório.
“Para produzir toda esta inovação na interpretação da ciência, os sociólogos da década de 1970 consideravam necessário articular, paralelamente com a mudança conceitual, uma profunda troca de ordem metodológica. Devia-se estudar a ciência. Entretanto esta se faz, em vez de estudar a ciência feita. Entretanto esta última aparece como sacralizada e naturalmente verdadeira. [...] Observar a ciência entretanto e feita nos demonstra o caráter efetivamente construtivo da mesma. Neste processo de construção não há um recurso em favor da natureza, mas sim, relações sociais acima de todas as estratégias dos atores, os quais intentam impor seu ponto de vista aos outros atores e para isso, buscam formar uma aliança mais poderosa que a dos seus opositores[...]. Assim, o caminho que vai se impondo é o de penetrar nos espaços onde a ciência efetivamente se produz e isso nos leva ao descobrimento (veja o paradoxo) do laboratório como lugar de observação” (Cetina, 1981.p.20).
Knorr Cetina propõe quebrar com dois princípios comumente aceitos, o
primeiro é do reducionismo econômico. Este pressupõe que os cientistas
orientam suas atividades segundo interesses vinculados ao prestígio, o que os
ajudaria na obtenção de maiores aportes financeiros para a investigação. O
segundo princípio é o da autonomia. No trabalho diário do laboratório, os
18
cientistas se relacionam com outros de campos vizinhos e também com não
cientistas. A produção da maior parte dos seus trabalhos dependeria dessas
relações. Assim o processo de fabricação do conhecimento encontra-se
determinado por elementos internos ao laboratório e também por outros
externos, extra científicos como as “relações de recursos”.
Seguidamente entendemos que o processo ao qual Cetina denomina
como fabricação do conhecimento derruba a artificialidade dos limites das
disciplinas e de sua total autonomia. Já no campo das artes, do mesmo modo,
a leitura e interpretação das produções ficaria exposta à interferência de
fatores “extra artísticos”. Dito de outro modo pode-se entender que não tendo
mais a Academia como parâmetro universal, Bauhaus chega a enunciar anos
depois o final do limite entre arte e artesanato. Também entende se que a
validação da obra se abre para aceitar dentro do seu processo outros atores:
galerias, curadores, júris, bancas de concursos, salões e bienais. Assim
também os materiais dogmaticamente aceitos na produção das obras, agora
teriam a intromissão de outros elementos que levarão o mesmo conceito de
obra de arte em escultura ao de objeto tridimensional.
1.4. Mudança de paradigmas
Em Cetina encontramos que dentro do processo de construção do
conhecimento se reconhece aceitam os fatores extras científicos e o trânsito
entre diferentes disciplinas. Deste modo, no âmbito das artes, passa-se a
operar segundo um novo paradigma em detrimento dos enquadramentos
estilísticos absolutos como o descrito por Wölflin.
O modernismo revelou-se não somente como a apoteose do novo e do
revolucionário, mas também como a negação dos pilares definidos como
sustentadores da arte no século V de Péricles, a técnica depurada do artista e
a mimeses. Este é o momento em que o impressionismo com a sua proposta
de centrar seu interesse na pintura plain air para capturar não somente o
19
modelo, e sim, os condicionantes da sua percepção como: o aspecto climático,
luz, e horário. O pós-impressionismo na Europa, modernismo no Brasil, irá
representar a segunda etapa, a quebra, será o momento da procura de novos
rumos, novos temas e de instauração de uma nova estética onde se
incorporam elementos extra artísticos.
1.5. Novos horizontes em Rodin
Rosalind Krauss6 explica que a escultura na modernidade se manifestou
a traves de dois grupos com diferentes objetivos, um foi o dos restauradores
que com Rodin se definiu como principal característica o realismo visual, ao
qual irá a aderir um grupo importante de artistas como Maillol, Bourdelle,
Despiau. Por outro lado se desenvolveu a modernidade do grupo dos
originadores decorrentes da linguagem de Cézane como Picasso, Gonzales,
Brancussi, Archipenko, Lipchnitz e Laurents. Esta forma de interpretar
modernidade em escultura explica como Arp e Moore ainda não
compartilhando a estética de Rodin mantiveram um interesse em comum pelos
mesmos elementos próprios da escultura: a massa, jogo de espaços positivos
e negativos, articulação rítmica de planos, contornos e unidade de concepção.
Krauss ainda afirma que na modernidade integram se a escultura novas
experiências e materiais, esta não se desenvolve mais tão somente numa
dimensão espacial, mas também dentro de uma dimensão temporal:
“A história da escultura moderna é incompleta sem a discussão das consequências temporais de uma disposição particular da forma. [...] Um dos aspectos surpreendentes da escultura moderna é a maneira pela qual manifesta a consciência crescente de seus criadores de que a escultura é um meio situado de modo peculiar na junção entre quietude e
6 Rosalind Krauss Epstein: Rosalind Krauss; crítica de arte contemporânea, historiadora da arte e professora na Universidade de Columbia Passages in Modern Sculpture. Cambridge-London, The MIT Press, 1981, pp. 4-5, 15.In: Recontextualizando a escultura modernista de Annateresa Fabris. http://www.itaucultural.org.br/tridimensionalidade/arq/livro02.htm.
20
movimento, tempo parado e tempo que transcorre. Dessa tensão, que define a real condição da escultura, deriva seu enorme poder expressivo.”. (Krauss, 1981. Pg.405, 15)
Por esta razão a Porta do Inferno (1880-1997) de Rodin e colocada
como uma das primeiras realizações de escultura moderna, pela razão de
mostrar o fluxo do tempo sequencial em contraposição da narrativa linear na
obra. Rodin também como uma figura de transição abre as portas para uma
nova geração de escultores. Ainda fiel aos materiais tradicionais suas obras
marcadas pela poética do torso, do fragmento iniciam o caminho rumo a uma
escultura moderna ao permitir que a obra abandone seu caráter de
monumento para se introduzir no espaço do espectador, no espaço da vida
mesma.
1.6. Especificidades em escultura
Com o interesse distante já dos conceitos de beleza platônica
aristotélica, e da mera representação de acurada técnica, o artista escultor no
modernismo, irá desenvolver uma exploração sem precedentes referente a
materiais e formas. A mudança na construção do conhecimento na ciência
levada ao campo da escultura traz como resultado a multiplicação das
possibilidades criativas com a intromissão de técnicas, materiais, e conceitos
não tradicionais.
É de se destacar que esta mudança na estética em escultura será
marcada pela harmoniosa coexistência das técnicas fundamentais da
modelagem e entalhada junto com as novas técnicas. A introdução de técnicas
próprias de engenheira levará à produção de obras tridimensionais não
pautadas por nenhuma daquelas práticas tradicionais como o caso de
construções arquitetônicas e mecânicas. Exemplo disso são os artistas Henry
Moore e Naum Gabo, ambos representantes desta nova escultura do século
XX.
21
1.7. A Proposta de Hildebrand
Já para Hildebrand7 o problema a ser abordado na obra de arte está na
discussão do conceito de unidade na obra para o artista como produtor e para
o espectador como apreciador. A solução é dada na descrição de duas formas
de visão, a visão próxima e a visão à distância.
Visão próxima acontece com a participação de três atores, a obra o
espectador e a percepção do espectador. Ao ver a obra o olho faz um percurso
na forma para obter uma descrição compreensiva. Neste momento o olho não
somente identifica, mas também realiza uma ação de ajuste entre o que o está
sendo percebido e a obra. Este processo de ajuste dificulta e impossibilita a
percepção da totalidade e unidade da obra. Mas na visão à distância a imagem
se apresenta na sua totalidade, todos os elementos podem ser apreciados,
isso graças a que todos os elementos tridimensionais constitutivos da obra são
projetados num único plano, como se fosse uma imagem bidimensional. A
percepção da mesma obra acontece do mesmo modo que de uma pintura ou
um relevo.
Para Hildebrand a única forma de ter uma percepção totalizadora da
unidade da obra é através da visão à distância. Em decorrência o autor propõe
a definição de dois tipos de formas: forma de existência e forma de efeito. A
forma existência é a apresentação do objeto em si, já a forma efeito é o
resultado da interferência das condições ambientais na obra. Neste caso o
artista teria que traduzir a forma de existência do objeto à forma de efeito
através da ênfase dada às características que identificam o modelo.
É nesta construção teórica que Hildebrand chega a uma afirmação
ousada, o verdadeiro modelo de representação e o relevo, porque é onde as
7 Adolf von Hildebrand (Marburg, 6 de outubro de 1847 — Munique, 18 de janeiro de 1921) foi um escultor alemão, autor de O Problema da Forma na Pintura e Escultura, obra que influenciou historiadores da arte como Heinrich Wölfflin.
22
imagens ficam comprimidas entre dois planos paralelos permitindo que o
observador consiga a apreensão da forma na sua totalidade. Esta afirmação
aplicada à escultura a tuto tondo, ou de bulto8 orienta a elaboração de obras
onde a informação deve ser descrita dentro de uma única vista frontal.
Esta definição deixa claramente exposto o caráter anti naturalista da sua
estética, ao valorizar a percepção pictórica de um único ponto de vista,
impondo a submissão do volume a um único plano de leitura.
Ainda que sua obra não apresente total fidelidade e aderência e as
ideias de Hildebrand pode se dizer que Hildebrand chega ao Brasil em mãos
de Galileo Emendabili9. Este artista soube construir uma poética extremamente
singular e significativa dentro do marco da escultura ligada aos valores de
retorno a ordem internacional sem necessariamente chegar a ser uma viva
expressão das teorias de Hildebrand (Chiarelli, 2002).
Ainda assim pode se afirmar que a obra de Galileo Emendabili
desenvolveu em São Paulo colocou Hildebrand dentro do Brasil, e através dele
o vínculo com a visão a distancia, ou seja, com a compreensão do plano como
fundamental na leitura da obra,
1.8. O Plano na Arte Contemporânea
Longe do plano da parede e separada do pedestal, a escultura moderna
e suas derivações são entendidas em grande parte pela exploração do espaço
e do tempo real, interagindo diretamente como o observador de formas agora
inusitadas.
8 Forma de denominara a escultura que foi independida do plano, pode ser vista por trás, de lado e pela frente.
9 Emendabili Galileu (Ancona, Itália, 1898-São Paulo SP 1974). Estudou na Academia Rela de Belas Artes de Urbino, na Itália. Chega ao Brasil em 1923, trabalhou como entalhador no Liceu de Artes e Ofícios. Realizaram os de Pereira Barreto e a Ramos Azevedo ambos os heróis constitucionais de 1932. Executa monumentos fúnebres para os cemitérios de São Paulo.
23
Ainda assim se encontram atualmente produções artísticas de muito
interesse que se mantem fieis a utilização do plano com um ponto de leitura
ideal tão característico da pintura e da escultura da primeira metade do século
passado. Esta fidelidade se apresenta de um modo discreto e escondido e nas
produções que no seu discurso negam os postulados de Hildebrand.
“neste universo encontra se uma” produção escultórica que transita entre os limites das definições, mas comuns da escultura e pintura e que, neste trânsito se junta, e muitas vezes se confunde com uma produção que fundamentalmente pictórica, se recusa a assumir sem questionamentos sua prisão ao plano. Refiro-me a uma tendência significativa da produção contemporânea brasileira. (...) alguns escultores preservam um profundo apego ao plano, um terreno “pictórico” por excelência, em quanto alguns pintores demonstram um forte desconforto em relação ao plano, produzindo obras que tendem para o tridimensional”. (Chiarelli, 2002. p. 93)
Chiarreli10 faz referência a artistas contemporâneos que pela sua
importância podem ser chamados de “clássicos” como Hélio Oiticcica, Ligia
Clark, Amilcar de Castro, inclusive alguns que ele chama emergentes como o
paulista Gustavo Rezende, as curitibanas Eliane Polik, Leila Pugnaloni,
passando por alguns artistas paulistas mais velhos, como Jose Resende e
Carmela Gross. A esta lista também pedem se agregar Iole de Freitas, Fajardo,
Anna Maria Maioilino, Nuno Ramos e outros.
Nesta seleção de artistas se encontram reunidas poéticas de vertentes
diversificadas, entre elas não a características que levem a entender uma
10 Chiarelli, Domingos Tadeu; possui graduação em Educação Artística (1979), Mestrado (1989) e Doutorado (1996), pela Universidade de São Paulo. Prestou concurso para Livre-Docência, em 2005, e para Professor Titular, em 2010, também pela USP. Professor junto ao Departamento de Artes Plásticas, leciona na Graduação e Pós-Graduação. Orientador junto ao Programa de Pós-Graduação de Artes Visuais. Área de Concentração: Teoria, Ensino e Aprendizagem da Arte; Linha de Pesquisa: História, Crítica e Teoria da Arte. Atuação: História da Arte, Teoria da Arte, Crítica da Arte, Arte e Fotografia, Arte Brasileira Contemporânea. Entre 1996 e 2000 foi Curador-Chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Entre agosto de 2007 e maio de 2010 foi Chefe do Departamento de Artes Plásticas. Coordena o Centro de Estudos Arte&Fotografia e o Grupo de Estudos em Crítica de Arte e Curadoria, ambos no Departamento de Artes Plásticas da ECA-USP. Em abril de 2010 foi nomeado Diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP. Tem livros publicados sobre Arte e Crítica de Arte no Brasil. Possui bolsa produtividade CNPq (Nível 2), desde 2009.
Disponivel em: https://uspdigital.usp.br/tycho/CurriculoLattesMostrar?codpub=D7A0AE2A2F0D
24
tendência, mas segundo Chiarelli a um aspecto em comum entre eles que é a
permanência ainda que de forma discreta dos postulados que valorizam o
plano. O autor assinala como motivo desta presença pelo menos em dois
aspectos. O primeiro se trata de uma forte presença de pintura como “arte
maior” no Brasil tradição decorrente da implantação da Academia de Belas
Artes após a chegada da corte de Bragança ao território. E um segundo motivo
que justifica esta presença coloca a ausência de um ensino tradicional de
escultura devidamente instituído no Brasil.
Chiarelli destaca que ambos os motivos estão relacionados e que até
hoje existe uma valorização excessiva da pintura por causa da ausência de
uma tradição de escultura no país. Isso não implicaria que exista uma tradição
em pintura estabelecida.
No século XIX foram poucos escultores brasileiros que deixaram uma
produção de projeção consistente. De entre eles no modernismo podem se
encontrar alguns casos isolados que não chegaram a desenvolver escola ou
criar um grupo de seguidores ou pupilos. Podemos citar Emnendavili, Bruno
Giorgi e Alfredo Ceschiatti, sendo que estes últimos chegaram a uma enorme
visibilidade graças a sua participação no projeto da nova capital. Em Brasília
temos obras importantes deles.
A falta de formação específica e ausência de tradição favoreceu a
criação de produções que seriam um tipo de contestação à compreensão
pictórica da escultura, mas sem abandoná-la completamente. Esta
característica se identifica na ênfase dada ao plano em quase todas as
produções de objetos tridimensionais contemporâneos. Seguindo a Hildebrand,
pode-se afirmar que a produção contemporânea de “escultura”, o que inclui os
grupos escultóricos naturalistas de Ceschiatti, opta pela visão em distância por
ser a mais apropriada para conseguir uma visão unitária da obra. Dali que a
produção brasileira ainda estando presa ao plano, e ao se manter numa faixa
limiar entre o que é escultura e pintura, se mantem dentro da visão em
proximidade também pelo fato de oferecer uma relação mais intensa entre o
espectador e a obra. Exemplo disso é “Casulos” de Lygia Clark que na sua
25
proposta inicial estava a participação do espectador modificando e brincando
com o objeto desenhado.
26
CAPITULO 2
METODO MORELIANO
Este método foi criado pelo médico italiano Giovanni Morelli, que entre
os anos de 1874 e 1876 publicou uma série de artigos sobre pintura italiana
sob o pseudónimo de Ivan Lermolieff. Este método serviu para identificar a
verdadeira autoria de pinturas que segundo Morelli teria sido atribuída de forma
incorreta a pintores errados.
“... distinguir os originais das cópias. Para tanto, porém (dizia Morelli), é preciso não se basear, como normalmente se faz, em características mais vistosas, portanto mais facilmente imitáveis, dos quadros. Pelo contrário, é necessário examinar os pormenores mais negligenciáveis, e menos influenciados pelas características da escola a que o pintor pertencia: os lóbulos das orelhas, as unhas, as formas dos dedos das mãos e dos pés. Dessa maneira, Morelli descobriu, e escrupulosamente catalogou a forma de orelha própria de Botticelli, a de Cosme Tura e assim por diante: Traços presentes nos originais, mas não nas cópias.” (Ginzburg, 2002. p. 144).
Devido a que Morelli formou-se em medicina o diagnóstico por sintomas
é o método moreliano apresentam aspectos em comum, ambos parecem partir
do modelo da semiótica médica: disciplina que permite diagnosticar as
doenças inacessíveis à observação direta na base de sintomas superficiais, às
vezes irrelevantes aos olhos do leigo. No final do século XIX começou a se
estabelecer nas ciências humanas um paradigma indiciário baseado
justamente na semiótica e seguindo as iniciativas de Morelli.
27
2.1. O paradigma indiciário
O paradigma indiciário tem como caraterística a capacidade de, a partir
de dados aparentemente irrelevantes, descrever uma realidade complexa.
Estes dados são considerados por um observador de tal modo que possa levar
a uma nova formulação. Carlo Ginzburg11 na explicação do paradigma
menciona que talvez a mesma narrativa tenha sua origem numa sociedade de
caçadores pela mesma experiência de ter que decifrar pistas. Segundo ele o
homem por milênios foi caçador, e que na luta pela sua sobrevivência teve que
desenvolver a capacidade de se guiar a traves da identificação e analises de
rastros tais como pegadas, ramas quebradas, bolotas de esterco e outros.
“Aprendeu a farejar, registrar, interpretar e classificar pistas infinitesimais como fios de barba. Aprendeu a fazer operações mentais complexas com rapidez fulminante, no interior de um denso bosque ou numa clareira cheia de ciladas.”(Ginzburg, 1990. p. 151)
Ginzburg explica de este modo como diferentes áreas da ciência
permitem análises qualitativas baseadas na observação de detalhes. A ideia
de pesquisar o particular, o diferente, aproxima a semiologia médica da arte.
Assim como o médico produz seus diagnósticos observando, investigando os
sintomas, no paradigma indiciário os indicadores a ser interpretados serão
sinais, pistas e indícios.
11 Um dos fundadores da Microhistória, escola historiográfica que reduz a escala de observação e dá notoriedade a fatos que são ignorados dentro de um contexto, além de utilizar como recurso documental uma série de fontes que não era considerada pela história tradicional.
28
2.2. Brasília vista através do método indiciário
No contexto da escultura contemporânea brasileira, a utilização do
termo escultura oferece uma grande dificuldade porque o que se observa
quanto à produção e uma série de obras que não se adequam à caraterização
tradicional desta disciplina de modelar adicionar ou retirar volumes.
Visto desde o novo paradigma de construção de conhecimento que
admite a intromissão de elementos extra artísticos pode se falar de uma
atividade multidisciplinar. Uma denominação que melhor se aproxima a este
produto é “objeto tridimensional”, este identifica a produção artística agora já
expandida no espaço. Este fenômeno observado em meados dos anos 60
coincide e envolve estilisticamente a construção da capital. Na concepção do
projeto do Plano Piloto os espaços deviam manter um diálogo fluente entre
escultura e arquitetura, a tal ponto que o limite entre ambos em alguns casos
insinua desaparecer. Observa-se de este modo uma forma de produção da
qual Brasília e um representante.
Mas se se considera o paradigma indiciário dentro do espectro da
capital pode se encontrar entre seus grandes espaços, monumentos e
esculturas grandes contrições que abrangem o estilístico o ideológico e o
rememorativo.
Para identificar e entender como em Brasília se revela a coexistência de
opostos no estilístico pode fazer uma simples analise dos conjuntos
escultóricos de Alfredo Ceschiatti através dos critérios expostos Tadeu no seu
artigo Plano em repouso/plano em tensão, Hildebrand e a arte contemporânea
brasileira.
Chiarreli traz a discussão da presença de Adolf Von Hildebrand no
contexto escultórico brasileiro. Ele assinala que as características próprias da
escultura tradicional ou clássica permanecem vigentes dentro da nova
29
escultura modernista, neste caso a produção de objetos tridimensionais. Para
esta afirmação ele parte de aspectos relacionados à perspectiva e a leitura da
obra, e seguindo o paradigma indiciário, expõe aspectos que verificam como
estilisticamente o objeto tridimensional, neste caso os Evangelistas de
Ceschiati, mantem se fiel ao classicismo. O que seria em outras palavras um
nexo entre a arte de objeto tridimensional contemporâneo derivado dos
escultores modernistas originadores e clássico mediterrâneo derivado dos
escultores modernistas restauradores.
2.3. Brasília lugar de antagonismos
Para compreender a distância entre escultura tradicional e
contemporânea, e o nexo que entre eles acontece em Brasília pode se recorrer
aos os dois pilares que Chiarelli descreve:
O primeiro pilar seria a influência das teorias de Adolf Von Hildebrand
referentes ao plano e relevo no contexto europeu durante a primeira metade do
século, e trazidas posteriormente ao Brasil. O que seria o resgate das
caraterísticas hieráticas e idealizadas da escultura num momento no qual esta
de um modo geral caminhava para uma aderência a copia do real.
O segundo pilar seria a arte produzida a partir da segunda metade deste
século, onde fica clara uma forte aderência ao plano em produções que não
chegam a serem propriamente esculturas nem pinturas, onde já não são
reconhecidas as características expostas pelas teorias de Hildebrand, a não
ser as que às vezes se apresentam como permanentes em outra ocasional do
plano mesmo.
É neste momento que, em palavras de Grinzburg, seguindo as pegadas
quase ocultas encontramos os indícios de uma ligação entre o presente e o
passado, a presença do plano como forma de leitura na escultura ou objeto
tridimensional. Para Krauss vem a sintetizar a poética da escultura tradicional e
30
passa a ser um elo entre o clássico e o contemporâneo como um indício de
uma realidade que vá mais além do objeto de arte.
Este nexo se evidencia nos Evangelistas de Ceschiatti. Por um lado se
apresentam dentro de uma proposta clara de sínteses formal, onde as
proporções são alteradas para conseguir que a escultura, que inicialmente não
tinha pedestal, se elevasse concentrando os volumes na parte superior e
afiando os mesmos na inferior. Esta desproporção proposital enfatiza o
aspecto severo e monumental na obra. Clara adesão ao modernismo em
escultura. Mas também pode se observar o resgate das caraterísticas
hieráticas quando para ter uma apreensão clara totalizadora e unificadora da
composição só basta permanecer num ponto ideal de observação, o que seria
a aderência ao plano. A leitura dos Evangelistas não exige do observador o
recorrido ao redor da obra, na realidade as quatro permanecem hieráticas
emoldurando como custódios permanentes o aceso a catedral.
Esta não renuncia ao plano deve ser tomada como um elemento
saudável para escultura brasileira já que num país que carece do peso da
tradição escultórica que estabeleceria um diálogo de continuidade ou oposição,
possibilitou o desenvolvimento de uma forma de arte questionadora dos seus
próprios paradigmas e da sua própria tradição artística, este talvez seja o maior
benefício que acarretou o estabelecimento de um sólido fundamento para o
crescimento de uma consistente arte contemporânea brasileira.
“... esses dados marginais, para Morelli, eram reveladores porque constituíam os momentos em que o controle do artista, ligado à tradição cultural, distendia-se para dar lugar a traços puramente individuais “que lhe escapam sem que ele se dê conta”.(Ginzburg, 2002. p150).
31
CAPÍTULO 3
PROBLEMA ETICO NA REMEMORAÇÃO
Seguindo o paradigma indiciário Brasília quanto monumento oferece
elementos que podem ser tomados como indícios, e através dos quais pode se
observar a coexistência de elementos contraditórios nos estilístico ideológico e
rememorativo.
Como já e conhecido a construção e transferência da capital brasileira
de Rio de Janeiro para Brasília se realizou através de um plano estratégico que
pretendia mediante a ocupação do Centro Oeste uma melhor articulação entre
as diferentes regiões do país, e, em consequência um maior desenvolvimento.
Dentro do desenho urbanístico Lucio Costa propôs se engajar na poética do
“concreto leve”, do estilo Neo-concreto na arquitetura e Modernista na
escultura, ambos amalgamados nos traços do arquiteto Oscar Niemayer.
Neste projeto confluem três grandes eixos de abordagem, o primeiro a
questão do problema ético ao se tratar de um projeto eminentemente
ideológico, e como tal testado na sua realização, a segunda abordagem se
refere à questão estilística nele embutido, e a importância do mesmo como
representante da escultura e arquitetura para o Brasil e o mundo; e a terceira
abordagem se refere a Brasília como representante da produção de
conhecimento, ao ter nela estilos artísticos que adotaram novos elementos
dentro do processo de elaboração da arte.
O modernismo adotado em Brasília representa o período em que a
escultura passa pela sua maior crise em direção a uma mudança rumo á
contemporaneidade. O conceito de espaço e a sua investigação experimental
irão repercutir na definição da escultura em si. A incorporação da orientação da
arte às massas em pro da sua inserção no plano de percepção coletiva em
32
espaços públicos, trará ao campo da teoria da arte a necessidade de
reconsiderar como compreender e analisar a escultura como uma obra de arte
publica.
Para poder tratar esta crise de mudança na escultura motivada em parte
pelas transformações das grandes metrópoles do século XX, se faz necessária
uma abordagem que fuja da histografia meramente linear.
Surge a necessidade de analisar pontualmente algumas produções que
podem ser tomadas como referência em determinadas localidades, e que
escapam aos enquadramentos já enunciados como determinações estilísticas
dentro da história da arte. Brasília como conjunto de monumentalidade,
concretismo e modernismo é um exemplo disso.
No aspecto ideológico, Oscar Niemayer como membro do partido
comunista propõe a criação de monumentos num espaço que seja símbolo da
democracia, uma cidade para homens livres que pudessem desenvolver suas
vidas com plenitude circulando facilmente através das quadras e super
quadras . Dentro do projeto do traçado urbano se destacam grandes espaços
destinados a jardins e parques, nenhum prédio poderia superar os seis
andares no setor residencial, para que nenhum dos prédios supere a altura das
árvores regionais. Deste modo a paisagem urbana se integra com a natureza.
Neste contexto caminhar por Brasília se sente como tudo parece ser igual para
todos.
O “Eixo Monumental”, grande avenida central que organiza a cidade em
duas “asas” e, finaliza no prédio do Congresso Nacional na Praça dos Três
Poderes, dividindo simetricamente o Plano Piloto. Este é o coração onde ainda
bate o caráter ideológico do projeto da cidade a qual lhe foi atribuído o caráter
de monumento. Aqui o monumento não e mais um espaço nem uma
construção somente, na realidade é o projeto da cidade como um todo. Esta é
a representação de um Brasil moderno e progressista, orgulhoso do seu
patrimônio, um país que acredita na solidez do seu futuro. Esta outra forma de
entender o monumento encontra seu fundamento no fenômeno que desde a
33
pós guerra vinha acontecendo, o que define a identidade na cidade não seria
mais um espaço ou construção especifica para essa finalidade, mas como
Maderuelo12 coloca o “aranha-ceu”.
“(L) já não necessita construir monumentos comemorativos porque carece de representação figurativa. O capital impulsa o monumento especulativo como o aranha-ceu que se impõe aos cidadãos no campo ideológico como ao próprio espaço da cidade (MADERUELO, 1990, p. 130)
3.1. Brasília: Monumento e memória
Brasília celebra um novo Brasil democrático e plural, projetada para
mostrar igualdade e progresso sugere uma reflexão em relação ao caráter de
monumento que se lhe atribui. Alberto Manguel observa: “Todos os
monumentos trazem tacitamente a inscrição lembre e pense”.
Quando o historiador de arte Alois Riegl define monumento menciona e
explica um aspecto chave, o intencional, esta seria a função de recordar um
evento ou personagem do passado numa comemoração. Pra chegar a isso se
deve passar por um processo de “configuração”, no qual se analisam os
valores e significados que serão lembrados. A memória para Riegl deve
estabelecer uma relação entre o passado e os valores artísticos e históricos
para chegar através de um objeto a uma reconstrução de ideais que estejam
além do simples aspecto físico do monumento visando a preservação para
gerações futuras. Brasília, desse modo se define como monumento porque
reúne aspectos estéticos, geográficos, atributivos e culturais que apontam para
um tipo de conhecimento pré-existente de conteúdo e significado pela parte do
público. A Capital Federal vista deste modo condensaria e faria concreta a
memória de um modo muito mais amplo do que os monumentos propõem,
para compreender melhor este questionamento deve-se tomar em conta a
opinião dos pioneiros candangos, o que eles celebram ao ver Brasília.
12 MADURELO, J. El espacio raptado. Interferencias entre arquitectura y escultura.
34
Para o sociólogo francês Maurice Halbwachs as memórias são
construções dos grupos sociais, ainda que sejam indivíduos os que lembrem
quem determina o que será memorável e a forma como será lembrado é o
grupo social. Isso porque os indivíduos se identificam unicamente com os
acontecimentos públicos relevantes para seu grupo. Ainda assim, conforme
Peter Burke se faz necessário identificar quais são os princípios de seleção e
observar como os mesmos variam de lugar a lugar ou de um grupo a outro
(^). (BURKE, 2000, p.73).
Neste trabalho Brasília e colocada em foco do método indiciário na
tentativa de compreender e identificar o sentido da rememoração da capital e a
qual grupo este pertence. Nesta tentativa se toma com registro o documentário
“Conterrâneos velhos de guerra”, o diretor Vladimir Carvalho questiona e
denuncia acontecimentos relevantes referentes à construção de Brasília que
desde a época da inauguração foram negados insistentemente ao público e à
história. Durante um período de 18 anos, o cineasta filmou a vida dos
candangos que participaram como operários na construção da Capital Federal.
No filme documentário os “protagonistas” contam suas experiências e
decepções diante das condições “escravistas” (como um deles descreve) de
trabalho as quais foram expostos. Também se relata sobre uma sublevação de
operários que teria acontecido no carnaval de 1959, um ano antes da
inauguração devido às terríveis condições de trabalho, a mesma teria acabado
num massacre executado pela Guarda Especial de Brasília.
Os obreiros organizados em dois turnos deviam trabalhar dezesseis
horas por dia acompanhado de alimentação balanceada e hospedagem para
descanso apropriado e um salário. No documentário se registra o testemunho
de um carpinteiro que abandonou o “emprego” depois de presenciar a morte
trágica de um companheiro de serviço.
“Estávamos na estrutura do prédio do congresso no piso onze, e como a
pressão para terminar a obra na data estabelecida era muita não podíamos
descer; em algumas oportunidades passávamos dois dias trabalhando sem
dormir e comendo mal, um jovem vencido pelo sono ao momento de dar o
35
golpe com a marreta no arrebite na via, simplesmente foi embora levado pelo
impulso do golpe caindo do décimo primeiro andar, no momento passamos o
aviso naquele desespero e baixamos como loucos para tentar ajudar ao
companheiro, mas quando chegamos ao térreo não encontramos mais o
corpo, ninguém lá embaixo sabia o que tinha acontecido com o rapaz. Depois
descobrimos que sempre estavam sete pessoas embaixo com umas lonas e
que eles ao ver alguém cair deviam buscá-lo rápido, cobri-lo, e às escondidas
transportá-lo de camioneta a Luziânia ou outra cidade distante. Nunca mais
ninguém teria noticias dele, nem a família nem a gente, era simplesmente
apagado da terra”. (Conterrâneos velhos de guerra, 1990).
Os candangos que trabalharam até a conclusão de Brasília foram
hospedados em precárias cidades dormitório chamados de núcleos satélites.
Depois da inauguração foram expulsos da área da nova capital. Na época se
contou um número aproximado de 300.000 habitantes deixados fora da
atmosfera de simbolização e desenvolvimento arquitetônico urbanístico do
plano piloto (SERGER, 1975, p. 228-9).
Um grupo importante foi levado junto com suas famílias em caminhões a
uma distancia de trinta quilômetros da cidade. Foram abandonados numa zona
na qual não existia nada mais que vegetação natural do “cerrado”. Este setor
foi chamado de Centro de Erradicação de Invasões e conhecido pela sigla
C.E.I.. Este centro hoje chamado de Ceilândia tem se desenvolvido
rapidamente chegando a ser uma cidade estruturada com serviços como água,
luz, asfalto, escolas, hospital. A propriedade dos terrenos foi legalizada dez
anos depois da inauguração de 1960.
3.2. Rememoração encontrada
Os indícios nos levam a ver em Brasília quanto monumento um conflito
ético na sua rememoração, ao se manter viva ainda nos diferentes grupos
lembranças diametralmente opostas e distantes.
36
O relato oficial permite a leitura da proeza da construção em tempo
recorde de uma cidade planejada, perfeita e moderna, anunciada como parte
da campanha presidencial de Juscelino Kubischtek, que teve como frase
motivadora “cinquenta anos em cinco”.
Por outro lado pode se reconhecer o relato da memória do candango,
registrada no documentário em questão, mas verificada também no contraste
observado no o traçado urbanístico tosco e apertado da cidade satélite, hoje
chamado de região administrativa da Ceilândia.
Mèlich traça uma diferença interessante entre o rememorar e o
relembrar, para ele a memória envolve além do relembrar também o esquecer,
na rememoração se busca preservar algum evento do passado mediante uma
ação de escolha do que deverá ser esquecido. Memória e esquecimento é
parte de uma mesma coisa. O autor também destaca que tentar manter viva a
memória na sua integralidade, ou seja, sem o esquecimento seria uma
tentativa de “desumanizar” o passado já que o esquecimento é característico
da finitude humana.
Ele nos fala da erosão da memória, que também é um direito de cada
pessoa e sociedade, dado que seria extremamente cruel manter num presente
contínuo fatos dolorosos, como por exemplo, os de Auswitch aos que o autor
faz referência nesta reflexão:
“A memória é (L) um trajeto espaço temporal, desde o presente rumo ao passado e desde o presente rumo ao futuro, e por esta razão memória também é esquecimento. Não é possível a memória humana sem que se dê a recordação corroída pela erosão do esquecimento”. (MÈLICH, 2004, p. 20).
3.3. Final do sono
Oferece certa dificuldade pensar que cidadãos de um mesmo país
tenham trabalhado liderando postos durante a construção, conscientes das
reais e extremas condições nos canteiros de obra. Como entender que seres
37
humanos tenham compactuando com estratégias modernas de construção que
venham acompanhadas de sistemas tão primitivos de submissão do homem.
Como é possível que políticos absorvidos e alienados pelas suas promessas
de campanha tenham entregado a morte física aos seus eleitores. Mèlich na
“Lección de Auschwitz” descreve o desafio de ter que pensar na possibilidade
de que pessoas “normais” possam desenvolver suas vidas como membros ou
partes de uma máquina de morte.
(L) a morte em Auschwitz, é a morte moderna, industrial, tecnicamente avançada. O assassinato (L) está programado tecnologicamente. A morte (L) é trivial, cotidiana, burocrática. Em lugar da morte a fabricação de cadáveres em série. (MÈLICH, 2004, p.22).
Foi, realmente, na finalização de Brasília, o momento no qual as
máscaras caíram, o final do sonho diante da dura realidade. Este é o clima que
Sergio Ferro descreve tão graficamente,
“antes da inauguração, no isolamento do “chapadão”, se ensaiaram as
primeiras possibilidades da criação coletiva, do projeto em que se
empenharam todos. Fantasia deslocada, não compartilhada. Mas que a todos
acompanhava diariamente, as vinte quatro horas do gigantesco e ininterrupto
trabalho. Havia empenho maior que o esperado de assalariados – ingênuo
empenho sordidamente estimulado pelo poder. A festa acabou os donos de
repente ficaram cegos. Que foi do sonho? Que aconteceu? O candango veio
do campo - latifúndio, capangas, solidão, doença, seca, terras boas cercadas,
trabalho irregular, quando havia. Em Brasília, um salário e o aprendizado de
uma ocupação que garantiria o mesmo salário, esforço coletivo, cujo vazio
dissimulado e a produção hipócrita não percebiam a vida agradável do Núcleo
Bandeirante , com sua gente, cachaça e prostitutas importadas. Técnicos,
arquitetos, operários, e até o presidente em aparente cooperação consentida.
Na prensa, discursos, e o elogio pomposo, enganador. Depois, a verdade do
sistema, sua imensa indiferença terminada a exploração, “danem-se os
candangos!”.”(FERRO, s.d.38-9)
38
O documentário de Vladimir Carvalho adquire um caráter de documento
probatório que exibido ao espectador produz imediatamente a reação e a
reflexão valorativa sobre o sentido rememorativo de Brasília, ou seja, sua
qualidade de monumento. O preço da construção em tempo recorde e a beleza
do desenho tiveram como paralelo a morte não somente física, mas também a
morte da ilusão e da confiança no novo Brasil, a negação do ideal que
sustentou o projeto. A rememoração desde esta perspectiva passa a ser
exemplar e inegável,
“dar uma lição significa dar a ler” (L) Lê-se e depois se transmite o que se tem lido. Assim funciona a educação: (L) O mestre de verdade pretende que seu discípulo renove a leitura e volte a ler de outra maneira. Então o discípulo recebe a lição e volta a se a lecionar. E a cada nova leitura, ainda que seja do mesmo texto, o aluno volta a se a lecionar (MÈLICH, 2004, p.20)
O lugar da memória, segundo Halwachs, é o lugar no qual muito além
do que a construção em si evoque, também solicita a existência de um tipo de
convenção do grupo social onde a presença do passado pretende ser mantida.
Deste modo Brasília que guarda para si histórias de glória e horror, concebida
como monumento produz na rememoração o contemplar uma grande
contradição brasileira, a utopia de uma cidade para homes livres, mas tão
somente os não candangos
39
CONCLUSÃO
Todas as áreas de estudo incluindo a História das Artes, sofreram
grandes mudanças em consequência a mudança de paradigmas no processo
chamado de produção de conhecimento cientifico, em outras palavras a
grande mudança epistemológica. Em função disso Zamboni descreve um
ponto de partida ao que chama de chama de visão mecanicista do mundo na
qual o os processos de estudo no laboratório são orientados a ver o todo que
rodeia como um grande sistema divisível em componentes elementares, tendo
como pressuposto que a união de todas estas partes reconfigura o objeto de
estudo. Nas artes Wölflin ainda dentro deste paradigma coloca o clássico e
barroco como pilares norteadores para Historia das artes.
A mudança epistemológica descrita por Cetina surge do
questionamento do processo do laboratório, abrindo as portas para outra forma
entender a construção do conhecimento. Ela admite o transdisciplinar e os
fatores extra científicos como protagonistas nos processos de construção de
conhecimento. Em decorrência abrem-se as portas para novos tipos de
metodologias como a metodologia sensitiva derivada do método moreliano,
estes guiados por indícios não se restringem a uma disciplina em si nem a
única forma de interpretação, de fato exploram novas possibilidades a traves
do “diagnostico por sintomas”. A dessacralização da ciência levada ao campo
da escultura traz como resultado uma multiplicação das possibilidades
criativas, passa a se aceitar a intromissão de técnicas e materiais não
tradicionais, de tal forma que vieram a constituir outra forma de escultura não
ajustada aos padrões de tal, desse modo passa a se falar dos objetos
tridimensionais.
Brasília colocada no foco do método indiciário nos oferece algumas
descobertas em quanto à sua constituição em aspectos vinculados aos
conceitos de moderno e de monumento.
Em quanto estilo pode se notar ao citar o conjunto de Ceschiatti como
acontece um nexo entre a arte de objeto tridimensional contemporânea e o
clássico, em palavras de Krauss a produção de artistas restauradores e de
40
originadores. O ponto de contato estaria no ponto de vista ideal para
percepção total da escultura defendido por Adolf Von Hildebrnad, quem
defendia o relevo como forma mais transparente de obra escultórica. Ele
partia da afirmação de que a única forma de ter uma percepção totalizadora da
unidade da obra é através e um único ponto de vista desde o qual todos os
detalhes podem ser apreciados num primeiro momento. O moderno de estas
obras esta no tratamento da forma e na resolução dos volumes que
repensados e redistribuídos exaltam o aspecto o monumental dos
Evangelistas.
Isto leva a entender como a produção brasileira de escultura
contemporânea, ou objetos tridimensionais ainda que esteja presa ao plano, se
mantem numa faixa limiar entre o que é escultura e pintura, o que oferece uma
relação mais intensa entre o espectador e a obra. A escultura de Ceschiatti
moderna, mas ainda naturalista também contrasta com a simpleza das líneas
da arquitetura desprovida de detalhes supérfluos. Brasília, a traves de este
indício fica exposta a unidade do contraste, o nexo entre o clássico e o
contemporâneo.
Já no aspecto ideológico, Oscar Niemayer, membro do partido
comunista, propõe nos projetos de Brasília a representação de um novo Brasil,
cria espaços simbólicos que circundam monumentos que exaltam o caráter de
uma cidade para homens livres num pais progressista e moderno. No
documentário de Vladimir Carvalho pode se detectar um conflito no caráter
mesmo de Brasília monumento,
“A memória, onde cresce a história, que por sua vez a
alimenta, procura salvar o passado para servir ao presente e
ao futuro. Devemos trabalhar de forma que a memoria coletiva
sirva para libertar e não para submeter aos homes”. (LE GOFF,
1994, p.477).
O preço da construção em tempo recorde e a beleza do desenho
tiveram como paralelo, a exploração do homem pelo homem, a morte e
desaparecimento de muitos operários, neste sentido o sentido ideológico do
projeto perdeu se no caminho, e o caráter rememorativo da cidade capital
41
quanto monumento se dividiu entre a rememoração oficial e a rememoração do
candango.
A cidade de Ceilandia, fruto da expulsão dos operários das imediações
de Brasília representa o outro lado da moeda, o traçado urbanístico apertado e
tosco evidencia o descuido e desinteresse das autoridades pelo ideal que
impulsionou a construção da capital. Não mais homens livres que circulem de
igual a igual nos espaços simbólicos e sim uma massa de famílias separas e
escondidas no meio da nada para que não tirem a beleza da cidade. Tao
somente em Brasília a favela e chamada de invasão.
Ceilanda como Centro de Erradicação de Invasões vem a ser
involuntariamente outro espaço simbólico e rememorativo, o lugar de encontro
de uma vontade de esquecer e lembrar, esquecer a exploração abuso e
decepção, o lugar de lembrar-se do homem brasileiro, do nordestino
trabalhador que fugiu da seca em busca de uma nova vida, de uma ilusão.
Deste modo Brasília analisada nos detalhes geralmente esquecidos
pelos livros de Historia das Artes, guarda para si histórias de glória e horror,
concebida como monumento produz na rememoração o contemplar uma
grande contradição brasileira, a utopia da cidade para homes livres, mas não
os candangos, tão somente os de terno e gravata.
42
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ZAMBONI, Silvio. A pesquisa em Arte: um paralelo entre arte e ciência.
2.ed. Campinas, SP : Autores Associados, 2001.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTOS 3
DEDICATORIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 9
INTRODUÇÃO 10
CAPITULO I
Produção de conhecimento em escultura
12
1.1. Linearidade em Wölflin: as Tendências
1.2. Visão mecanicista do mundo
1.3. Outro paradigma
1.4. Mudança de paradigmas
1.5. Novos horizontes em Rodin
1.6. Especificidades em escultura
1.7. A proposta de Hildebrand
1.8. O plano na arte contemporânea
13
14
16
18
19
20
21
22
CAPTIULO II
Método Moreliano
26
2.1. O paradigma Indiciário
2.2. Brasília através do método Indiciário
2.3. Brasilia lugar de antagonismos
27
28
29
CAPITULO III
Problema ético na rememoração
31
3.1. Brasília: Monumento e Memória
3.2. Rememoração encontrada
33
35
45
3.3. Final do sono 36
CONCLUSÃO
39
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42
INDICE 44