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JorNAL UNIvErsITárIo DE coImbrA a cabra 8 DE NovEmbro DE 2011 ANo XXI N.º 236 QUINZENAL GrATUITo DIrETor cAmILo soLDADo • EDITorEs-EXEcUTIvos INês AmADo DA sILvA E João GAspAr “A equação da inovação” Uma ideia para o Ensino Superior por J.Norberto Pires Pág. 20 CeM ANOs De FCtuC Condicionados pelas dificuldades económicas que se fazem abater sobre as famílias, muitos estudantes da UC passam por privações. Tam- bém o novo regulamento de bolsas, sucessor do decreto-lei 70/2010, vem retirar a ainda mais estudantes o di- reito de receber este apoio que, para muitos, se revela essencial para a per- manência no ensino superior. Quem deseja ficar é, cada vez mais, obrigado a definir estratégias e encontrar al- ternativas de financiamento. DestAque O sufoco financeiro dos estudantes A comemorar a sua 18ª edição o Festival Caminhos do Cinema Português, apresenta-se de 9 a 17 de novembro ao público com mais de 150 filmes. Com uma maior participação do público na vota- ção, o evento, entre documentá- rios, curtas e outros géneros, traz a Coimbra películas como “O Barão” de Edgar Pêra, “Viagem a Portugal” de Sérgio Tréfaut ou ainda “Cisne” de Teresa Villa- verde. CAMINhOs Um adulto festival de cinema português Pág. 2 e 3 Pág. 7 Estudantes presentes na greve geral dia 24 de novembro, após decisão em Magna Na AM de ontem, 7, ficou decidida a presença dos estudantes de Coimbra na manifestação de 24. Eleições para os corpos gerentes da AAC marcadas para os dias 28 e 29 presença dos estudantes de Coimbra na greve geral convocada pelas centrais sindicais, CGTP e UGT, para o próximo dia 24 de novembro, foi deliberada ontem,7, em Assem- bleia Magna(AM). A decisão resultou de uma moção proposta pela DG/AAC aprovada por larga maioria, numa intenção de demonstrar o de- sagrado dos estudantes face aos cor- tes anunciados para o ensino superior. Também em AM ficou acordado que as eleições para os corpos geren- tes da ACC vão realizar-se nos dias 28 e 29. Ao contrário do que vem sendo habitual, este ano as eleições não terão período de reflexão, devido à aprovação de uma moção apresen- tada em Magna. Dia 24, face à pre- sença dos estudantes na greve geral, não haverá campanha eleitoral. Pág.5 A Plataformas como o Puzzled By Policy surgem como instrumentos para ajudar a uma melhor infor- mação dos cidadãos. Numa con- juntura de crise a informação torna-se vital para um real exercí- cio da cidadania, em que os media são fundamentais para um conhe- cimento económico-social das po- pulações. CIDADANIA e INFORMAçãO É preciso informação para exercício cívico Pág. 17 A Faculdade de Ciências e Tecnolo- gia da Universidade de Coimbra ce- lebra um século de existência desde da reforma republicana de 1911, que uniu as Faculdades de Matemática e Filosofia, criadas pelo Marquês de Pombal. O último século de ensino é indissociável da reforma pomba- lina, que introduziu o ensino expe- rimental e modernização dos planos de estudo e descobertas in- ternacionais, como o lítio. A faculdade que se diz das ciências assinala o seu centenário desde a reforma republicana de 1911 Pág.14 Pág.10 Pág. 12 e 13 felipe grespan Linhas ferroviárias abandonadas e agora suspensas PET do atual governo prevê suspensão das linhas do Oeste e Vouga no próximo ano Mais informação em acabra. net @ As secções desportivas reclamam pelo esforço que fazem, todos os anos, para manter as condições do estádio, quando surge a notícia de que o estádio universitário vai pas- sar a ser pago. A medida, votada em Conselho Geral da Fundação Cultu- ral da Universidade de Coimbra e que já motivou as demissões dos elementos do Conselho Desportivo da Associação Académica de Coim- bra da comissão de gestão do Está- dio Universitário de Coimbra , vai entrar em vigor já no próximo mês de janeiro. Princípio “utilizador-pagador” no Estádio Universitário olga juskiewicz

Edição nº 236

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Jornal Universitário de Coimbra A CABRA - Edição nº 236

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Page 1: Edição nº 236

JorNAL UNIvErsITárIo DE coImbrA

acabra

8 DE NovEmbro DE 2011 • ANo XXI • N.º 236 • QUINZENAL GrATUIToDIrETor cAmILo soLDADo • EDITorEs-EXEcUTIvos INês AmADo DA sILvA E João GAspAr

“A equação da

inovação”

Uma ideia para o

Ensino Superior

por J.Norberto Pires

Pág. 20

CeM ANOs De FCtuC

Condicionados pelas dificuldadeseconómicas que se fazem abatersobre as famílias, muitos estudantesda UC passam por privações. Tam-bém o novo regulamento de bolsas,sucessor do decreto-lei 70/2010, vemretirar a ainda mais estudantes o di-reito de receber este apoio que, paramuitos, se revela essencial para a per-manência no ensino superior. Quemdeseja ficar é, cada vez mais, obrigadoa definir estratégias e encontrar al-ternativas de financiamento.

DestAque

O sufoco financeirodos estudantes

A comemorar a sua 18ª edição oFestival Caminhos do CinemaPortuguês, apresenta-se de 9 a 17de novembro ao público com maisde 150 filmes. Com uma maiorparticipação do público na vota-ção, o evento, entre documentá-rios, curtas e outros géneros, traza Coimbra películas como “OBarão” de Edgar Pêra, “Viagem aPortugal” de Sérgio Tréfaut ouainda “Cisne” de Teresa Villa-verde.

CAMINhOs

Um adulto festivalde cinema português

Pág. 2 e 3 Pág. 7

Estudantes presentesna greve geral dia 24de novembro, apósdecisão em MagnaNa AM de ontem, 7, ficou decidida a presença dos estudantes

de Coimbra na manifestação de 24. Eleições para os corpos

gerentes da AAC marcadas para os dias 28 e 29

presença dos estudantesde Coimbra na greve geralconvocada pelas centraissindicais, CGTP e UGT,

para o próximo dia 24 de novembro,foi deliberada ontem,7, em Assem-bleia Magna(AM). A decisão resultoude uma moção proposta pela

DG/AAC aprovada por larga maioria,numa intenção de demonstrar o de-sagrado dos estudantes face aos cor-tes anunciados para o ensinosuperior.

Também em AM ficou acordadoque as eleições para os corpos geren-tes da ACC vão realizar-se nos dias 28

e 29. Ao contrário do que vem sendohabitual, este ano as eleições nãoterão período de reflexão, devido àaprovação de uma moção apresen-tada em Magna. Dia 24, face à pre-sença dos estudantes na greve geral,não haverá campanha eleitoral.Pág.5

A

Plataformas como o Puzzled ByPolicy surgem como instrumentospara ajudar a uma melhor infor-mação dos cidadãos. Numa con-juntura de crise a informaçãotorna-se vital para um real exercí-cio da cidadania, em que os mediasão fundamentais para um conhe-cimento económico-social das po-pulações.

CIDADANIA e INFORMAçãO

É preciso informaçãopara exercício cívico

Pág. 17

A Faculdade de Ciências e Tecnolo-gia da Universidade de Coimbra ce-lebra um século de existência desdeda reforma republicana de 1911, queuniu as Faculdades de Matemáticae Filosofia, criadas pelo Marquês de

Pombal. O último século de ensinoé indissociável da reforma pomba-lina, que introduziu o ensino expe-rimental e modernização dosplanos de estudo e descobertas in-ternacionais, como o lítio.

A faculdade que se diz das ciências assinala o seu centenário desde a reforma republicana de 1911

Pág.14

Pág.10

Pág. 12 e 13

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an

Linhas ferroviárias abandonadase agora suspensas

PET do atual governo prevê suspensãodas linhas do Oeste e Vouga

no próximo anoMais informação em

acabra.net@

As secções desportivas reclamampelo esforço que fazem, todos osanos, para manter as condições doestádio, quando surge a notícia deque o estádio universitário vai pas-sar a ser pago. A medida, votada emConselho Geral da Fundação Cultu-ral da Universidade de Coimbra e

que já motivou as demissões doselementos do Conselho Desportivoda Associação Académica de Coim-bra da comissão de gestão do Está-dio Universitário de Coimbra , vaientrar em vigor já no próximo mêsde janeiro.

Princípio “utilizador-pagador” no Estádio Universitário

olga juskiewicz

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2 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | terça-feira

deStAque

O que a CRISE es

ingresso no ensino superior– com todas as dificulda-des que acarreta – já não éuma garantia de estabili-

dade. Aos constrangimentos que osjovens têm de contornar, soma-se,agora, um cenário de asfixia finan-ceira, no qual o estudante, com ousem apoio, tem de movimentar-se.

Espelho da crise económica queafeta as famílias, os jovens enfrentamlimitações agravadas pelas novas res-trições no âmbito da atribuição debolsas, bem como pela impotênciados serviços de ação social (SAS).Serviços esses que estão menos hu-manizados desde que em abril, pordespacho do ex-ministro da ciência etecnologia e ensino superior, Ma-riano Gago, é obrigatório que os SASprocessem as candidaturas às bolsasatravés da plataforma da direção-geral do ensino superior, ao invés detodo o processo ser tratado direta-mente nos serviços.

As perspetivas de futuro, condicio-nadas, desta forma, pelas posses eco-nómicas, passam pela intenção deabandonar um país que não garanteas condições necessárias para a me-lhoria do nível de vida dos estudan-tes. Apesar de preferir que Portugal“oferecesse condições de trabalho aosseus jovens”, o secretário de estadodo ensino superior, João Queiró,afirma que “havendo a atual situaçãode desemprego” é possível que “hajadiplomados que procurem essa opçãonoutros países”. No entanto, o secre-tário de estado tem dúvidas quanto àexpressão “fuga de cérebros”, pois“não há dados concretos”, mas reco-nhece que é “bem visível” que se estáa assistir a “uma fase de procura demelhores condições de vida” no es-trangeiro.

O ensino universitário atravessa,assim, uma etapa

crítica – etanto as

univer-s i d a d e s

como os estudantesfazem escolhas e poupanças

para sustentar a situação de crise.João Queiró acredita que, antes de asituação económica do país melhorar,“ainda vai piorar um bocado”.

Estudantes e SASfragilizadosNo ano letivo de 2010/2011, menos12 mil estudantes do ensino superiorreceberam bolsade ação sociale s c o l a r(ASE) emrelação aoano ante-rior. Devidoao regula-mento deatribuiçãode bolsas,e s t i p u l a d opelo decreto-lei70/2010, o factode os rendimentosfamiliares ultrapas-sarem os valores de-finidos fez comque 32 porcento dose s t u d a n t e svissem o seu pe-dido de bolsa inde-ferido. Também 19por cento dos candi-datos a bolsa nãoapresentou um nú-mero suficiente decréditos efetuados noano anterior.

Nesse ano, os Serviços de Ação So-cial da Universidade de Coimbra(SASUC) viriam a indeferir mais 700bolsas de ASE que no ano anterior,constituindo uma quebra de 35 porcento no número de bolsas atribuí-das. Para o presente ano letivo, asperspetivas não parecem melhorar.

João Queiró defende medidas maisrigorosas no que toca ao aproveita-mento escolar. Se no ano passado osECTS a realizar por um estudante de-veriam totalizar os 50 por cento, se-gundo o novo regulamentoapresentado pelo Ministério da Edu-

cação e Ciência, esta percentagemsobe para 60 no ano letivo2012/2013.

Apesar de o processo de atribui-ção não estar ainda concluído, pers-

petiva-se que, a nível nacional, cercade dez mil alunos possam vir a per-der o apoio para estudar, a maioriadevido ao fim do regime transitório,em vigor no ano anterior (que con-sistiu em atribuir a bolsa mínima aquem não preencheu os requisitos se-gundo o decreto-lei 70/2010). Aindaassim, João Queiró considera que a

estimativa de dez mil alunos é um nú-mero “exagerado”.

Como avança o jornal Público, emtodo o país, “os indeferimentos deve-rão chegar quase aos 30 por cento, onúmero mais alto dos últimos anos”.Contrapondo-se aos cálculos, o ad-ministrador dos SASUC, Jorge Gou-veia Monteiro, afirma que “écompletamente prematuro fazer esti-

mativas de quantosalunos vão ficar

sem bolsa esteano porque há

um cruza-mento de mui-

tos fatores quese alteraram”.

Segundo o admi-nistrador, no ano

passado, cerca de800 estudantes re-ceberam bolsa emCoimbra ao abrigodeste regime transi-tório.

É também emCoimbra que se vai

operar o maiorcorte nos servi-

ços de açãosocial. Se-

g u n d oGouveiaM o n -teiro, a

v e r b ac o n s i g -

nada peloOrçamento do

Estado (OE) paraos SASUC, passa de 5,5 milhões deeuros (verba que se mantinha há qua-tro anos seguidos) para 4,84 milhõesde euros. Ainda que o OE para 2012atribua aos serviços de ação social daUC a verba mais elevada dos SAS dopaís, as situações de carência e até deabandono do ensino superior pare-cem multiplicar-se. Face às desistên-cias, o administrador dos SASUCgarante que o número de 600 aban-donos da UC que se registou até feve-reiro de 2011 não pode ser usadocomo indicador por não ser preciso.“As anulações têm muitas outras ra-zões”, refere Gouveia Monteiro, queacredita que “o grande sinal de aban-dono são os estudantes que desapa-recem e não se voltam a matricular,nem nesta, nem noutra universidade,não tendo concluído os estudos”. Oadministrador lembra a importânciade um estudo que faça “esta despis-tagem de forma muito mais organi-zada, para se poder perceber qual é ovolume daqueles que desaparecemdo sistema de ensino superior”.

O

Foi em 2010 que as regras de atribuição de bolsa mais privaram

aceder a este apoio. Somando a atual conjuntura socioeconómic

permanecer no ensino superior. Por Inês Amado da Silva, An

Ilustrações de tIago dInIs

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8 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 3

deStAque

stá a tirar aos ESTUDANTES

Bárbara Antunes: “O meu pai diz que o curso é a herança que deixa”Estudante do segundo ano de Psicologia, Bárbara Antunes tem 20 anos.

É para ir a casa que, todas as semanas, diz poupar 10 euros do seu di-nheiro – porque ir a casa “faz falta”, e trabalha ao sábado num café de Viana do

Castelo, a sua zona. “Se trabalhar as oito horas de todos sábados do mês, consigo 50euros”, conta.

O pai, reformado, mantém uma pequena empresa que gera prejuízo; a mãe man-tém dois empregos, com os quais consegue 800 euros ao fim do mês. A

irmã está também no ensino superior (ES). Sempre lhe recusarambolsa: “quando me dizem que os meus pais têm rendimentos

a mais acho que está tudo maluco. É ridículo”. Quanto ao futuroprofissional, admite ser necessária adaptação e disponibilidade

para o que vier, “temos que nos sujeitar”. Nunca equacionou deixar deestudar: “o meu pai diz que o curso é a herança que deixa”, conta Bár-

bara - mas assegura que “o ES é cada vez mais para quem tem dinheiro”.

Ana Garcia: Quanto ao futuro, “não dá para ter uma visão positiva”A preocupação de tirar boas notas foi o motivo que a levou a re-petir o primeiro ano de Direito, que diz ser um curso “dispen-dioso”: “os livros todos para o semestre rondam os 150/200 euros”.Agora no segundo ano, “como, à partida, não tenho os 50 créditosexigidos, não terei bolsa”. É por isso que, de há três semanas paracá, trabalha num call center. Filha de pais divorciados, afirma que o pai, apesar de não ganhar“propriamente mal”, é consumido pelo valor do empréstimo à ha-bitação. A mãe está desempregada depois de a fábrica onde tra-balhava ter fechado. Recebe a bolsa mínima, valor que lhe paga oalojamento na residência e tem cortado “naquilo que, no fundo,não é essencial” (concertos, cd's). E assegura que, quanto ao futuro,“não dá para ter uma visão positiva quando se está a par do queacontece atualmente”.

Sofia Peres: Os SASUC aconselharam-na a desistir dos estudosSofia Peres vive dos abonos, da pensãoda avó, e dos trabalhos que a mãe fazocasionalmente. Ficou sem bolsaaquando da alteração das regras deatribuição, por estas não terem emconta as mudanças de curso. Este anovoltou a concorrer, mas um erro naavaliação das dívidas na segurança so-cial deixou o processo pendente.Confrontados com o seu “complicado”processo, os SASUC aconselharam-naa desistir dos estudos. Indignada pela

falta de apoios sociais, conseguiua ajuda do fundo do Justiça e

Paz que incumbe nos seusmembros o princípio de“retribuir e ajudar outrosalunos que estão namesma situação”, explicaa jovem de 19 anos.Com um bom aproveita-mento escolar e planospara montar o seu pró-

prio negócio, a aluna dosegundo ano de Estudos Artísti-

cos vê os seus horizontes limitadospelos constrangimentos económicos.“Já ponderei deixar de estudar quandoas coisas estavam mesmo difíceis”,lembra Sofia, que aponta a “incompe-tência na maneira como os SASUC ava-liam os processos, dos quais estãogeralmente sobrecarregados” comomotivo da má avaliação dos casos.

Tiago Cruz: “Aminha situaçãonão me permitepagar todas as despe-sas”Todos os dias de aulas, oestudante do ter-ceiro ano de di-reito faz ocaminho entreFigueira da Foz ea faculdade poisnão tem alojamentoem Coimbra. Apesar deter recebido bolsa noprimeiro ano, assim nãofoi no segundo e poruma cadeira ficou de forado sistema de atribuição de bolsas. Noentanto, com o rendimento do agre-gado familiar de uma empregada do-méstica e dois irmãos a estudar noensino básico, Tiago Cruz não se man-teria no ensino superior sem o InstitutoJustiça e Paz. “A minha situação nãome permite pagar todas as despesasinerentes à frequência no ES”. O estu-dante poupa em tudo o que pode:“evitar refeições fora das cantinas, tra-zer comida de casa, pedir livros em-prestados ao invés de os adquirir eandar a pé” são apenas algumasdas medidas paraTiago conseguircortar. Aúnica des-pesa men-sal fixa éo passesocial queusa parase deslo-car entrea Fi-gueira eC o i m -bra.

Filipe Salazar: “Não sei se vai ser

possível voltar”Sem bolsa no segundo ano de Jorna-lismo, com o pai desempregado háano e meio e a perda de um dos em-pregos da mãe, Filipe Salazar, com 20anos, congelou a matrícula quandodevia estar a frequentar o último anoda licenciatura. Residente na Maia, oestudante sentiu que “as coisas emcasa estavam muito apertadas” e nãose sentiria bem se não ajudasse. Depoisde já ter acumulado dois empregos eum deles ter fechado, Filipe trabalhanuma empresa de telecomunicaçõesna área do telemarketing em regime depart-time. O irmão mais velho tem 22anos e também trabalha, nunca tendotido hipótese de frequentar o ES. En-

quanto estudava emCoimbra, Filipe candi-datou-se às residênciasuniversitárias, sem su-cesso. O próprio re-vela que houve finsde semana em queos 50 euros de orça-mento semanais en-curtavam para 30 eficava sem ir a casa.“Tenho perspeti-vas de voltar”,

conta, “masnão sei sevai serpossível”.

Rosa Cardoso: “Preciso mesmo de ser independente”A frequentar o 5º ano de Medicina, Rosa Cardoso diz não passar fome nem lhefaltarem bens essenciais. “Tenho muitas amigas que me estão sempre a oferecerajuda”, conta. A estudante de 23 anos revela encontrar-se numa situação familiarcomplicada, que não lhe permite contar com ajuda dos pais, apenas com a dostios. A bolsa de cerca de 400 euros que lhe era atribuída passou para o montantemínimo: “o que é que eu vou fazer à minha vida, isso é impossível”, terá recla-mado nos SASUC, e a resposta que obteve foi que “há pessoas em situaçõesbem piores”. Entretanto, Rosa tem evitado as idas a casa ao fim-de-semana, emGuimarães. Vive numa residência, admitindo que lhe seria impossível pagar umquarto. “Comer na cantina ainda fica um bocadinho caro, tento fazer o máximopossível de refeições em casa”, conta também. O seu maior objetivo é poder sus-tentar-se “sem ter que recorrer a outras pessoas”: “preciso mesmode ser independente”.

Estudante de Direito: “Tenho medo que os meus pais medigam para desistir por não poderem pagar”Sem bolsa desde o ano passado, por não ter comple-tado os requisitos de aproveitamento escolar, a estu-dante de 20 anos do curso de Direito, que não se quisidentificar, voltou este ano a candidatar-se após tercompletado as cadeiras em falta. A “lenta verifica-ção das candidaturas à bolsa” faz com quetenha de fazer alguma ginástica financeirapara pagar propinas, rendas e material es-colar.Com ambos os pais a trabalhar com o ordenado mínimo nacional, ajovem de Leiria gasta algum dinheiro em deslocações e confessa evitar fazer al-

gumas viagens a casa. “Tenho medo que os meus pais medigam para desistir por não me poderem pagar os estu-dos”, confessa, explicando que tem de gerir um orça-mento mensal reduzido.A sua prioridade é acabar o curso e ter um empregoem concordância com as possibilidades económicas-tendo em conta o “desemprego” que a fará deixar

de lado a vontade de ser advogada.

Ruben Viegas:“No centro comercial, 70 porcento dos trabalhadores são licenciados”O seu futuro será fora do país. “É frustrante umapessoa andar a estudar 17 anos de uma vida para receber o ordenadomínimo”, justifica o estudante de 21 anos, a frequentar a licenciatura emAdministração Publico-Privada (APP). Candidatou-se a bolsa quando en-trou no ensino superior. “Entretanto o meu pai ficou desempregado e foi-me concedida a bolsa”, recorda. Na segunda matrícula, Rúben não obtevebolsa porque o ano de adaptação lhe correu “um bocado mal” e fez menosuma cadeira do que as necessárias para atingir o aproveitamento escolar. O estudante deAPP viu o seu pedido para a bolsa indeferido e começou a trabalhar. “Não foi uma ob-rigação mas ajudou bastante”, lembra. O estudante trabalha em regime part-time numcentro comercial onde garante que 70 por cento dos seus colegas são licenciados.

Nuno Margarido: “Mais do que uma instituição para gerir, os SASUC devem seruma instituição para cuidar”“Se não tivesse vindo para a faculdade poderia ter um futuro melhor, e não teriaestas preocupações”, defende Nuno Margarido, 23 anos, a frequentar o últimoano em Direito. O jovem acredita que há dois tipos de estudantes para doistipos de ensino superior público.À espera de saber se vai ser admitido na residência a que se candidatou, vive a

“situação embaraçosa” de morar com os amigos. Com uma irmã mais nova aindano ensino secundário, o pai desempregado e a mãe a ganhar pouco mais que o or-

denado mínimo, sente-se como apenas “mais um número” nas listas dos SASUC.Um dos constrangimentos que ultrapassa é a “vergonha” de não poder comprar os li-vros pedidos pela licenciatura. Considera a hipótese de ir trabalhar para o estrangeiro.Propõe ainda que os estudantes possam trabalhar nas cantinas, e outros espaços daUC, sem prejuízo na bolsa, afirmando a sua convicção de que os SASUC, “mais do

que uma instituição para gerir devem ser uma instituição para cuidar”.

Foi em 2010 que as regras de atribuição de bolsa mais privaram os estudantes de a receber. O novo regulamento vai cortar ainda mais o número de estudantes que podem

aceder a este apoio. Somando a atual conjuntura socioeconómica, são cada vez mais aqueles que passam dificuldades e se vêm obrigados a encontrar estratégias para

permanecer no ensino superior. Por Inês Amado da Silva, Ana Francisco e Camilo Soldado

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4 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

EnsIno suPErIor

Dos cartazes aos autocolantes Apesar de ainda não ser semana oficial de campanha, os projetos apostam já na

divulgação das suas ideias. Por detrás da difusão trabalham equipas com

estruturas diferentes, que se adequam ao orçamento disponível. Por Inês Balreira

poucos dias dos estudan-

tes da Universidade de

Coimbra (UC) serem cha-

mados às urnas para escolher os

novos corpos gerentes da Associa-

ção Académica de Coimbra (AAC),

os projetos já conhecidos ultimam

os pormenores para os tempos de

campanha que se avizinham.

Situada no número 91B da Ave-

nida Sá da Bandeira, fica a sede do

projeto “Desperta a Academia”. O

espaço, bastante amplo, era uma

antiga sucursal da Caixa Geral de

Depósitos, que se encontrava fe-

chado há mais de 10 anos. A sede

divide-se numa sala espaçosa,

onde se realizam as reuniões, e em

duas mais pequenas: uma sala en-

vidraçada para algumas das reu-

niões e outra, que funciona como

espécie de gabinete.

Os outros projetos já conheci-

dos – “Liga-te à Academia” e

Frente de Acção Estudantil (FAE)

– não têm ainda sede definida. Ri-

cardo Morgado, da “Liga-te à Aca-

demia” conta que tinham um sítio

certo para a sua sede, contudo, de-

vido a problemas, tiveram que

pensar numa segunda opção, que

ainda está a ser pensada. “O local

carecia de uma licença e não nos

quiseram emprestar o espaço”, ex-

plica. Por sua vez, Manuel Afonso,

elemento da FAE, conta que tam-

bém ainda não encontraram um

sítio para a sede. “Pedimos aos

Serviços de Acção Social da UC

uma sede permanente, mas eles

ainda não deram resposta. Apenas

nos disponibilizaram as cantinas”,

afirma.

Organização da campanha Por detrás de toda a divulgação

trabalha um conjunto de pessoas,

cuja organização vai variando de

projeto para projeto. No caso da

FAE, a equipa funciona por plená-

rio em que estão presentes todos

os membros. “Nunca começamos

a trabalhar do zero, tudo o que são

ideias já vêm de trás”, esclarece

Manuel Afonso. Sílvia Franklim,

também membro da FAE, conta

que para hoje à noite, dia 8, está

convocada uma reunião aberta

para todos os que queiram parti-

cipar no projeto.” Depois da reu-

nião vamos articular a questão da

lista, do programa e da campa-

nha”, acrescenta a estudante.

No projeto de Ricardo Morgado

existe um encarregado pela divul-

gação em cada faculdade. “O res-

ponsável trabalha com o diretor

de campanha, é assim que o ma-

terial é distribuído e as coisas fun-

cionam”, adianta o representante

da “Liga-te à Academia”. Contra-

riamente, a “Desperta a Acade-

mia” não tem diretor de

campanha, como esclarece o seu

representante, André Costa. “As-

sentamos no princípio de que

todos devem participar nas deci-

sões e na equipa de campanha.

Assim sendo, o nosso projeto não

tem diretor de campanha, tem

uma equipa coordenadora, de 19

elementos”, explica. Tal como a

“Liga-te à Academia”, a “Desperta

a Academia” tem um elemento da

equipa em cada faculdade e ainda

alguns elementos para funções es-

pecíficas, como a comunicação in-

terna e externa e o trabalho

gráfico.

Financiamento para asatividadesEm tempos de crise também os

projetos têm que encontrar for-

mas de se auto financiar. “Somos

um movimento que não é finan-

ciado, não temos apoio de ne-

nhuma juventude partidária nem

de nenhum lobby económico”, as-

severa André Costa. O estudante

revela que desenvolveram um sis-

tema de três níveis de financia-

mento: o primeiro provém do

contributo pessoal dos elementos;

o segundo é fruto de iniciativas

próprias, como jantares de projeto

ou a venda de postais aos turistas

durante o mês de agosto; o ter-

ceiro provém do que conseguem

ao mobilizar a sociedade, os co-

merciantes, a família e amigos.

Por sua vez, Ricardo Morgado

garante que os lucros conseguidos

até agora pelo seu projeto advêm

de “um esforço de equipa”, mas

que futuramente vão poder usu-

fruir do ‘plafond’ disponibilizado

pela AAC. “Estamos em crise, não

podemos andar a esbanjar di-

nheiro numa campanha, quando

esta vale cada vez mais pelas suas

ideias”, afirma o estudante. Sílvia

Franklim explica também que o fi-

nanciamento que têm conseguido

provém das coletas que fazem no

fim das reuniões. A estudante

acrescenta ainda que futuramente

contam também com a verba dis-

ponibilizada pela AAC.

A

O projeto “Desperta a academia” é o único com sede já definida

“Não podemos

esbanjar dinheiro na

campanha quando

esta vale cada vez

mais pelas ideias”

Pré-CamPanha eleitoral Para os CorPos gerentes da aaC

Inês BalreIraInês BalreIras

Inês BalreIra

Novo senadorda FLUC eleito a 12 dedezembro

No próximo dia 12 de dezembro os

estudantes da Faculdade de Letras da

Universidade de Coimbra (FLUC)

vão escolher o seu novo represen-

tante para o Senado Universitário.

Desde o início do ano letivo que a

FLUC não tem representatividade

orgão.

A senadora eleita o ano passado,

Diana Taveira deixou de ser aluna da

UC, encontrando-se a frequentar o

mestrado em Lisboa. Como tal, a es-

tudante teve de renunciar o cargo ao

fim do primeiro ano, que deveria ser

ocupado por um dos suplentes da

lista – Fábio Pereira e André Mendes.

Porém, nenhum dos dois aceitou o

cargo.

Diana Taveira explica que quando

se candidatou sabia que poderia ter

de abandonar o Senado, no entanto

“estava descansada” uma vez que os

suplentes “comprometeram-se a ocu-

par o lugar, o que acabou por não

acontecer”. “Eu ia informando-os das

reuniões para estarem a par dos as-

suntos quando um deles tivesse que

assumir o cargo”, acrescenta. O pri-

meiro suplente, Fábio Pereira, afirma

que a situação foi inesperada. “Já sa-

bíamos que a Diana iria sair, da

minha parte sugiram problemas e

não consegui aceitar as funções, as

razões do André não as sei”, explica o

estudante. Fábio Pereira revela ainda

o seu desconforto perante a situação:

“acho que é triste termos saído assim,

porque nos candidatámos para de-

fender os interesses dos estudantes

da FLUC e não conseguimos”.

O coordenador geral do pelouro da

Política Educativa e também respon-

sável pelo pelouro da Ligação aos Or-

gãos, Samuel Vilela, explica que o

esperado nesta situação é que “sejam

convocadas eleições intercalares para

cumprir o ano de mandato que falta”.

Samuel Vilela adianta que as eleições

vão ser convocadas hoje pela reitoria

e vão decorrer no dia 12 do próximo

mês. O coordenador diz ainda ter co-

nhecimento da renúncia dos dois su-

plentes, inclusive questionou André

Mendes acerca da possibilidade de

aceitar o cargo até novas eleições,

sem resposta positiva até ao mo-

mento. “Acho que é grave nenhum

dos dois ter assumido o cargo e se a

intenção não era de continuar, que o

assumissem até haver eleições para

manter a representatividade da fa-

culdade”, acrescenta Samuel Vilela.

Até ao fecho da edição não foi pos-

sível contactar o segundo senador su-

plente, André Mendes.

Inês Balreira

Page 5: Edição nº 236

8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 5

EnsIno suPErIor

6Eduardo Melo

O mandato da atual direção-geral da Associação Acadé-mica de Coimbra (DG/AAC)tem sido pautado por suces-sivas demissões. Porém, opresidente da DG/AAC ga-rante que não se vive umclima de instabilidade.

Na semana que passou houve

mais uma demissão, a do tesou-

reiro. Miguel Andrade afirmou

que se “sentia perseguido pela

falta de confiança” desde que

iniciou funções. Porque é que

existe uma falta de confiança

entre os elementos da tua

equipa? Essa falta de confiança não

existe dentro da minha equipa. A

única questão relativamente ao Mi-

guel prendeu-se com algumas falhas

técnicas que eu tive a oportunidade

de explicar. Acho muito estranho que

alguém queira provocar um caso des-

tes e referir-se a perseguição política,

fazendo-o publicamente da maneira

que o fez e que é assessorado pelo as-

sessor de uma lista candidata à DG.

O clima de instabilidade que

se vive na DG/AAC pode ser mo-

tivo para uma falta de confiança

dos estudantes nos seus diri-

gentes e um consequente afas-

tamento da AAC? Eu percebo que

as pessoas possam achar isso não co-

nhecendo a realidade, mas não é isso

que se passa. Acredito que neste mo-

mento se possa tentar colar a imagem

de instabilidade e percebo que isso

seja vantajoso para alguns. Acredito

que os estudantes saberão fazer esse

julgamento e saberão compreender

que nenhuma decisão é tomada com

leviandade, mas sim como forma de

proteger os seus interesses.

Quem é que vai ocupar o

lugar de tesoureiro? Philip San-

tos? Eu requeri ao Conselho Fiscal

indicação sobre o procedimento para

substituir o tesoureiro. Só depois de

ter essa indicação é que poderei rea-

lizar essa substituição. Poderá ser o

Philip como poderá não ser…

O facto de já vários elemen-

tos da DG/AAC acumularem

cargos pode prejudicar as fun-

ções para que foram inicial-

mente designados? Não acredito

nisso. Se assim fosse e se prejudicasse

as suas funções já teria havido outro

tipo de reorganização. Isso não se ve-

rifica e estamos descansados quanto

à atuação do Samuel Vilela e do João

Pereira.

Como é que vês os três pro-

jetos que já se apresentaram

como candidatos aos corpos ge-

rentes da AAC? Até este momento

não conheço o conteúdo dos três pro-

jetos. Sei apenas que, se houver a ten-

tação de criticar esta DG, cá estarei

para a defender. Obviamente tenho

as minhas opiniões, mas guardo-as

para mim. Acho que os estudantes

conseguem avaliar os projetos e es-

colher o melhor para a AAC.

O que esperas da próxima

DG/AAC, independentemente

da lista que ganhar? Espero uma

DG com uma postura cada vez mais

preocupada com a defesa dos direitos

dos estudantes, que seja capaz de

dizer que a AAC está presente e tem

ideias concretas para o desenvolvi-

mento da nossa sociedade. Penso que

será necessário ao longo do próximo

ano intensificar ainda mais a postura

reivindicativa da AAC.

Inês Balreira

“Acredito que se tente colar a imagem deinstabilidade e que seja vantajoso para alguns”

Presidente da Direção-Geralda Associação Académica de

Coimbra

Estudantes na greve geral dia 24 Manifestação do dia 24

vai contar com a

presença dos estudantes

de Coimbra. Em AM

ficaram marcadas as

eleições para os corpos

gerentes da AAC,

dia 28 e 29

Por deliberação da Assembleia

Magna (AM) realizada ontem, 7,

os estudantes da Universidade de

Coimbra (UC) vão sair à rua no

próximo dia 24 de novembro. A

Associação Académica de Coim-

bra (AAC) associa-se, assim, à

manifestação do dia da greve

geral de trabalhadores, convocada

pelas centrais sindicais CGTP e

UGT, em Lisboa. A decisão re-

sulta de uma moção proposta pela

direção-geral da AAC (DG/AAC),

como forma de demonstrar o des-

contentamento dos estudantes

face à atual conjuntura económica

e social do país, mas principal-

mente aos cortes já anunciados

para o ensino superior (ES). O

coordenador-geral do pelouro da

Política Educativa, Samuel Vilela,

salienta que esta não deve ser

“uma iniciativa isolada por parte

dos estudantes”.

A concentração está agendada

para as 15 horas no Largo Mar-

quês do Pombal, tendo como des-

tino final uma manifestação em

frente à Assembleia da República.

O presidente da DG/AAC,

Eduardo Melo, afirma que os es-

tudantes vão seguir o curso nor-

mal da manifestação, mas não

pode confirmar se os estudantes

se vão juntar desde o início aos

trabalhadores devido a questões

logísticas.

Um dos vários elementos do

quórum a congratular a iniciativa

da DG/AAC foi o estudante da Fa-

culdade de Direito da UC, Hugo

Ferreira, que depois da moção ter

sido proposta, confessou que iria

apresentar uma semelhante. Con-

tudo, o estudante da FEUC,

André Martelo, afirma que a “jun-

ção aos trabalhadores não faz sen-

tido. Não fazemos greve, somos

estudantes e não trabalhadores”.

André Martelo revela que existem

associações de estudantes que

estão a preparar uma manifesta-

ção nacional para o dia 29 deste

mês, à qual a AAC não vai aderir.

Segundo o aluno da FEUC a par-

ticipação nesta iniciativa seria

“muito mais concertada”. Em res-

posta, Eduardo Melo afirma que

a DG/AAC “não tem conheci-

mento” do evento agendado para

dia 29. “Acho curioso aqueles que

pedem manifestação, atrás de

manifestação venha agora criti-

car”, protesta o dirigente. André

Martelo adiantou que está tam-

bém convocada uma manifesta-

ção em Coimbra para o dia 24.

Definição do calendárioeleitoral Outro assunto que marcou esta

AM foi a discussão e aprovação do

regulamento eleitoral. Por deci-

são maioritária, os estudantes vão

escolher os novos corpos gerentes

da AAC nos dias 28 e 29 do pre-

sente mês. Caso haja necessidade

de se recorrer a uma segunda

volta esta vai ter lugar a 5 e 6 de

dezembro.

O regulamento estipula ainda

que os projetos candidatos te-

nham entre os dias 14 e 16 para

apresentarem a sua candidatura

oficial enquanto lista. O período

de campanha decorre entre os

dias 19 e 27, sendo que contraria-

mente aos outros anos, estas elei-

ções ficam pautadas por uma

ausência de período de reflexão.

A decisão provém de uma moção

proposta pelo estudante da Fa-

culdade de Letras da UC (FLUC),

André Amador. Ficou ainda esti-

pulado que dia 24 não haverá

campanha eleitoral, uma vez que

os estudantes se juntam à greve

geral. A proposta partiu do estu-

dante da FLUC, Tiago Martins.

Quanto às listas para o conselho

fiscal serão apresentadas separa-

damente das listas para a

DG/AAC e mesa da AM, sendo

que os elementos para o referido

órgão são eleitos pelo método de

Hondt, não havendo lugar para

uma segunda volta.

Na sequência da definição do

calendário eleitoral foi apresen-

tada uma moção relativa ao ‘pla-

fond’ disponibilizado pela AAC às

listas concorrentes durante a

campanha. O proponente, Diogo

Barbosa, estudante da FLUC, su-

geriu que as listas concorrentes

pudessem apenas utilizar as ver-

bas disponibilizadas pela Associa-

ção, de maneira a evitar “os

milhares de euros em materiais

de campanha”. No entanto, a

moção foi reprovada.

Inês Balreira

Ana Morais

este ano não haverá dia de reflexão para as eleições. a decisão provém de uma moção aprovada na aM.

rafaela carvalhO

Page 6: Edição nº 236

ENsiNo suPErior6 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

Fundação Cultural da UC reestruturada e com novas metas Numa fase de dinamização do órgão,vão ser incluídas trêsnovas estruturas. Entreelas está o Centro de Produção de Conteúdos, a situar-se na Casa dasCaldeiras

O Centro de Produção de Con-

teúdos, a Loja e Circuito Turístico

e a Rede da Universidade de Coim-

bra (UC), são unidades que vão

passar a ser geridas pela Fundação

Cultural da UC (FCUC). A inclusão

no órgão, que tem por objetivo pro-

mover, apoiar e dinamizar iniciati-

vas no âmbito das atividades

científicas, culturais e sociais da

UC, faz parte de um processo de di-

namização que a estrutura vai so-

frer nos próximos tempos.

A Casa das Caldeiras é o local es-

colhido para acolher o novo Centro

de Produção de Conteúdos. O cen-

tro “será uma unidade que vai en-

quadrar projetos da UC, como a

televisão web UCV, e o iTunes Uni-

versity, que consiste na divulgação

de um segmento da plataforma

iTunes de conteúdos produzidos

por universidades”, explica a vice-

reitora para a Cultura, Clara Al-

meida Santos. O objetivo é que este

funcione como um elo de ligação

entre as valências e recursos dis-

persos pela UC.

Quanto à integração da Loja e

Circuito Turístico, a aposta é im-

pulsionar o branding e merchandi-

sing da UC, bem como

disponibilizar uma oferta turística

de uma forma mais integrada. O

vice-reitor para a Inovação, Recur-

sos Humanos e Novos Públicos,

Henrique Madeira, explica que a

intenção é disponibilizar “material

a bons preços, mas acima de tudo

passar uma imagem apelativa e in-

teressante da UC”. O também coor-

denador da loja e circuito aponta o

início de 2012 como data de rees-

truturação da loja. “Vamos ter uma

loja online a sério, com uma grande

diversidade de produtos ao dispor

da comunidade universitária e dos

turistas em geral”, conta.

A dinamização do Circuito Turís-

tico da UC conta ainda com a cola-

boração da Câmara Municipal de

Coimbra. “A lógica da promoção

cruzada tem de ser implementada

e o grande objetivo é fazer com que

os turistas compreendam que esta

cidade tem muito mais a oferecer

do que uma visita de um par de

horas”, explica Clara Almeida San-

tos. A rentabilização do circuito tu-

rístico permite ainda a manutenção

do espólio e publicitar a imagem da

UC. “O espólio precisa ser bem cui-

dado e isso é um custo enorme. A

maneira como o orçamento de uma

universidade é formado tem pouco

em consideração este fator”, aclara

Henrique Madeira.

Um novo impulso para arestante FCUC Com a inclusão destas novas uni-

dades na FCUC, também as outras

já integradas - Teatro Académico

de Gil Vicente (TAGV), Auditório

da Reitoria, Palácio de S. Marcos e

Estádio Universitário de Coimbra

(EUC) – vão sofrer uma dinamiza-

ção. O TAGV vai apostar na “fo-

mentação e desenvolvimento das

redes de criação e produção”, como

refere a vice-reitora para a Cultura.

Contudo, Clara Almeida Santos es-

clarece que “o mais importante será

definir a dinâmica de programação

em curso, que tem as limitações a

que os tempos correntes obrigam,

mas que segue uma linha”.

Os objetivos quanto ao EUC pas-

sam por continuar a apoiar o des-

porto universitário. Contudo, foi

recentemente aprovado o regime

de utilizador-pagador. Clara Al-

meida Santos explica que “não é

possível à UC assumir todas as des-

pesas de funcionamento”. Relativa-

mente ao auditório da reitoria e ao

Palácio de S. Marcos vão continuar

a servir a mesma lógica de funcio-

namento. Porém, à semelhança do

EUC, a sua utilização vai passar a

ser paga, apesar de os “preços pra-

ticados serem quase simbólicos”,

esclarece a vice-reitora.

Clara Almeida Santos refere

ainda que, num futuro próximo,

“terá de haver uma preocupação

alargada, caso a UC venha a ser

classificada como património da

Humanidade”.

Contas vão ser pagas atéao final do mandato daatual DG/AAC, revela ocoordenador geral dos núcleos. Falta de tesoureironão deverá afetar o processo

Anualmente, os 26 núcleos da As-

sociação Académica de Coimbra

(AAC) recebem da direção-geral da

AAC (DG/AAC) a quantia referente

aos lucros que obtiveram na Festa

das Latas desse ano. No entanto, exis-

tem contas de 2010 ainda por saldar.

O coordenador geral dos núcleos,

José Amável confirma esta situação,

afirmando ainda que “os processos de

tesouraria são complexos e a

DG/AAC não teve possibilidade de

pagar aos núcleos antes”, atendendo

a que é necessário “ter em conta ou-

tras despesas”. No entanto, foi esti-

pulado um prazo em conselho

inter-núcleos para o pagamento das

contas em atraso, que o coordenador

aponta para dois a três meses após a

latada de 2011. José Amável revela

ainda que para além das contas de

2010 vão ser pagas já as referentes a

2011. Questionado sobre a falta de te-

soureiro o coordenador afirma que “a

questão temporária do tesoureiro

está a ser tratada com a maior celeri-

dade e não vai afetar a continuação

deste processo”. O núcleo de estu-

dantes de Química é um dos exem-

plos que ainda não recebeu os lucros

de 2010, como confirma a sua presi-

dente Cristiana Marques.

No entanto, houve já núcleos que

receberam a quantia de 2010. O pre-

sidente do núcleo de Engenharia In-

formática, Tiago Abrantes, revela que

a “DG/AAC pagou a núcleos que esti-

vessem numa situação financeira

mais apertada”, mas que, não é o caso

do seu núcleo. Um dos que já recebeu

o pagamento foi o núcleo de Psicolo-

gia e Ciências da Educação, confirma

o seu presidente, Ricardo Viegas. “Fi-

zemos um pedido de agilização de

verbas porque tínhamos saído de

uma presidência complicada e quere-

mos realizar umas jornadas científi-

cas e, apesar de já estarmos numa

situação melhor, queríamos esse

acerto de contas”.

Existem ainda outros núcleos que

não vão receber quantia alguma, uma

vez que têm contas em atraso com a

DG/AAC. José Amável explica que,

com estes núcleos, foi feita uma “mo-

dalidade em que a dívida seria sub-

traída ao valor que têm para receber”.

O núcleo de Economia é um dos que

se encontra nesta situação e abdicou

do montante de 2009 e 2010 para

saldar as dívidas, como confirma o

presidente do núcleo, Dino Alves.

Pagamento dos lucros da Latada 2010 em atraso

arquIvo - rafaela Carvalho

Para além do Centro de Produção de Conteúdos, que vai funcionar na Casa das Caldeiras, vão ser integrados na Fundação Cultural a loja e o circuito turístico, bem como a Rede UC

Inês Balreira

Inês Balreira

Ana Francisco

Inês BalreIra

Page 7: Edição nº 236

CuLTurA8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 7

cápor

Cinema

tagv 21h30 • 3 a 4 euros

cultura

exposição

sala arte à parte

entrada livre

tertúlia

BiBlioteCa muniCipal

18h • entrada livre

músiCa

vários loCais

sessões às 21h ou 21h30de 0 a 5 euros

exposições

CapC – Casa muniCipal da Cultura

3ª a sáB - 14h às 18h

s/inFormação de preço

Por Rafaela Carvalho

17NOV

ConFerênCia e leituras

FluC e tCsBvários horários • entrada livre

15NOV

exposição e Colóquio

Colégio das artes

18h • entrada livre

Curso livre de paleograFia

arquivo históriCo

15h • 10 a 15 euros

Cinema

FluC - sala 1020h• entrada livre

“À CoNvErsA CoM… GAsPAr sobrAL”

Cinema

auditório do msCav21h30 • entrada livre

“véNus NEGrA”DE AbDELLATiF KEChiChE

“o PoDEr DA EsCriTA DoCuMENTAL”

9NOV

“brANCo”DE KrzyszToF KiEsLowsKi

FEsTivAL DE MúsiCA DE CoiMbrA 2011

“reesCrever o pós-moderno”de Jorge Figueira

18NOV

“soNNENALLEE”DE LEANDEr hAubMANN

21NOV

“i CouLD Do ThAT”DE MAriANA roquE

“DoN’T shiT whErE you EAT” E “A sALA”

18 anos a gerar visibilidade nopanorama do cinema nacional

ilmar em português. A roda-

gem de películas em idioma

lusitano passa há dezoito

anos por Coimbra, com um festival a

trilhar as novidades recentes da pro-

dução cinematográfica portuguesa.

Neste outono, contam-se algumas

novidades mas a matriz é sempre a

mesma: desafiar as pessoas a ver o

que de melhor há no nosso cinema.

O Festival Caminhos do Cinema

Português, único no país, destaca-se

igualmente pela escolha de uma ci-

dade fora do circuito das grandes me-

trópoles. Organizado pelo Centro de

Estudos Cinematográficos (CEC) da

Associação Académica de Coimbra, o

Caminhos é composto por uma

equipa de colaboradores, que traba-

lham desde a formação em works-

hops até à programação de todo o

evento. O presidente do CEC, Vítor

Ferreira, ressalva o esforço interino,

aumentado pelos “problemas cróni-

cos de falta de pessoal” na secção. Sa-

lienta ainda que nada é feito em vão,

pois o fim último faz com que todos

tentem “levar o festival a bom porto e

dar-lhe um palco cada vez melhor”.

As novidades são várias, confe-

rindo um novo rosto a esta edição.

Acolhe-se como novo espaço o Cen-

tro Cultural Dom Dinis, a gratuiti-

dade de sessões para idosos -

“Caminhos Séniores” - a decorrer nos

dias 12 e 13 de Novembro. Realizam-

se também as “Master Sessions”,

onde o conteúdo dos filmes dá azo a

discussão entre realizadores e au-

diência. E como a atração de público

é sempre relevante, este ano pro-

move-se, ainda, a sua participação di-

reta na classificação de filmes: em

todas as sessões é distribuído um bo-

letim de votação para a eleição do

melhor filme segundo a audiência.

Filmes,realizadores e júriDe longas a curtas, documentários a

animações, os géneros espelham a di-

versidade e a consagração dos auto-

res selecionados a concurso. Na

secção competitiva, há João Canijo,

com “Sangue do meu Sangue”, o

filme de ficção português mais visto

do último ano e Teresa Villaverde

com “Cisne”, só para nomear alguns.

A aposta em novos talentos é refor-

çada pelos “Ensaios Visuais”, que

destacam jovens amantes da sétima

arte. Em “Retrospetiva” revisitam-se

outros tempos e na categoria de “Ci-

nema Mundial” viaja-se pelo trabalho

de diferentes realizadores estrangei-

ros.

A seleção dos filmes passa por vá-

rios critérios. Vítor Ferreira defende a

representatividade das obras a con-

curso e dos seus criadores: expõe “a

qualidade dos filmes em si” e “todo o

cinema produzido em Portugal du-

rante um ano”. Para Rodrigo Barros,

co-realizador da curta metragem

“Nocturnos”, este festival revela-se

importante pelo facto de nunca ter

realizado um filme antes: “conheci a

Aya Koretzky [co-realizadora de

“Nocturnos”] e decidimos fazer este

trabalho. Abordámos a forma de vida

dos indigentes, assunto esse com

pouco espaço mediático”, explica. No

caso de Tiago Cravidão, autor de

“Magiae Naturalis”, foi através da

promotora Andar Filmes que a cola-

boração se concretizou.

Na opinião do presidente do CEC,

o júri é uma mais-valia para o festi-

val. Heterogéneo, com elementos re-

conhecidos pela opinião pública, este

encontra no seu seio jurados prove-

nientes de “diversas tendências” para

fomentar a “discussão” aquando da

deliberação dos possíveis galardoa-

dos. São José Correia, um dos ele-

mentos, encontra neste festival

“grande mérito” e crê que “há uma

geração a mudar de atitude”, to-

mando “o gosto pelo cinema portu-

guês”. O painel de jurados estende-se

às três secções: para além do júri ofi-

cial, há o júri da Revista C, o júri de

Ensaios Visuais e o júri da Federação

Internacional de Cineclubes.

O que esperarMas o “Caminhos” vai para além da

mostra de filmes. “A ideia de fazer um

ciclo de formações completas já vem

de há algum tempo”, adianta o for-

mador do workshop de edição de som

e imagem e membro do CEC, Tiago

Santos. A ideia é fornecer uma com-

ponente mais profissional aos parti-

cipantes, dar-lhes a parte prática que,

na opinião do formador, é quase ine-

xistente. Os módulos vão desde lin-

guagem cinematográfica com o

doutorado em Cinema Fausto Cru-

chinho, pré-produção com o produ-

tor de documentários da RTP José

Farinha e montagem com João Brás.

“Isto é um ensaio”. Apesar de já

terem algumas inscrições garantidas

para as atividades dos workshops,

Vítor Ferreira admite a hipótese de a

ideia falhar. No entanto, Tiago San-

tos espera que “haja formandos sufi-

cientes para fazer o curso inteiro e, a

partir daí, haver uma linha que una

todos os módulos”.

Expetativas para a edição-Vítor Ferreira espera que “com a he-

terogeneidade do painel de jurados,

saia dali uma decisão que seja repre-

sentativa daquilo que é, efetivamente,

o melhor do cinema portuguêsde

2010/2011”. No que diz respeito à re-

lação visibilidade/retorno, Tiago San-

tos não tem pudor em afirmar que a

visibilidade “é enorme”, mas a reper-

cussão da mesma não se efetiva da

mesma forma : “é dificil porque os or-

çamentos são baixos”.

D.r.

“sangue do Meu sangue”, da autoria de João Canijo será um dos muitos filmes a exibir, assim como “Cisne”, de Teresa villaverde

o único festival de cinema português do país atinge a maioridade. Numa semana commais de 150 filmes, construir um curso prático de cinema e aumentar a participação dopúblico na votação são as novidades. Por Liliana Cunha e Ana Duarte

F

8 e 9NOV

Jornadas de dramaturgia

espanhola Contemporânea

14 a 18NOV

19NOV

Até

7DEZ

Até

9DEZ

Até

D.r.

Page 8: Edição nº 236

CulTuRa8 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

Há vida por detrás das paredes doIngote e da Rosa. E vem à varanda

AnA pAtRíciA AbReu

Até dia 30, é possível ver fotos de “4 mulheres extraordinárias” nos bairros

AnA pAtRíciA AbReu

Quatro mulheres distintase, no fundo, com algo emcomum, que vale a penamostrar: é este o tema daexposição fotográfica“Mulheres do Bairro”

Uma exposição de fotografiapouco convencional. No Bairro daRosa e no Bairro do Ingote, de 15 deoutubro a 30 de novembro, será pos-sível admirar, espalhadas pelos bair-ros e suspensas em varandas,fotografias de “quatro mulheres ex-traordinárias”, que fazem parar até omais distraído transeunte. “Atrás dascasas vivem pessoas e foi isso quequis mostrar”, explica Francisco Pa-ramos, recém licenciado em Comu-nicação, Design e Multimédia, pelaEscola Superior de Educação deCoimbra, que promoveu e trabalhoutoda a exposição “Mulheres doBairro”.

A escolha das mulheres não foi aoacaso. Há várias razões que levamFrancisco a preferir estas e não ou-tras, ainda que com histórias seme-lhantes. Com isto, conheceumulheres a quem hoje chama de “fa-mília” e para quem é o “menino deouro”. A exposição que, a princípio,tencionava realizar no Parque de Nó-madas, acabou por vir a tomar formanestes bairros, depois de se ver con-frontado com as suas realidades.

“Histórias de Vida”, o nome doprojeto, pretende conceder vitali-dade a estes locais, dando a conhecero quotidiano de quem lá vive e des-pertando, ainda, a comunidade paraa cultura. E foi assim que conheceuManuela Braz, Ludovina Santos,Adriana Colotto e Elisa Teixeira, quepartilharam com Francisco as suasvivências, deixando-o entrar não sónas suas vidas, mas também nas suascasas. “Foi um menino de ouro queme apareceu aqui. Agora considero-o um neto”, refere Ludovina – “TiBina” para as gentes do bairro.

“Queremos uma cidadesem fronteiras”

Numa primeira impressão, podeparecer difícil receber uma ideiacomo esta – um projeto de partilhaintensa, onde a vida das pessoas é (li-teralmente) exposta. Mas o feedbackfoi bom e a exposição ganhou vida.“As pessoas dos bairros receberammuito bem o projeto e acarinharamdesde logo o Francisco, chegando atéa vê-lo como um membro da comu-nidade”, refere a presidente da Asso-ciação de Moradores do Bairro daRosa, Manuela Braz. Essa intimidadefoi crescendo e, sem tabus, o recém-licenciado tomou conhecimento dadura realidade que se vive por ali:pais que lutam para sustentar a suafamília, casas degradadas que ser-vem de abrigo a idosos, imigrantesdistribuídos pelos lotes e, acima detudo, a criminalidade.

Mas os fantasmas do planalto nãoafastaram o “rapaz das fotos” – comoficou conhecido para os habitantes –, muito pelo contrário. “Senti neces-

sidade de fazer alguma coisa poraquele sítio, por aquelas pessoas, edurante três meses andei por lá atirar fotos e a conhecer aqueles quesão marginalizados” explica Fran-cisco, lamentando profundamente asituação. E Manuela acrescenta: “éuma coisa fenomenal, que retrata avida das pessoas e mostra que hámuito para conhecer por detrás dasparedes destes edifícios”.

Da parte da Câmara Municipal deCoimbra, o apoio foi total. O verea-dor da Habitação, Francisco Queirós,defende a filosofia do “este é umbairro como os outros” e salienta aimportância deste tipo de atividades.Apesar disso, no início, houve algumreceio: Francisco Queirós reconheceque, no seio de uma crise, “esta ideiapodia não resultar”. Os moradoresforam convocados, em jeito de con-ferência, para aprovação, e a sur-presa não poderia ser melhor: “foimuito bem recebida e toda a gentemostrou interesse em ser um dosrostos do trabalho do Francisco”, re-força o vereador.

Pelo facto de a experiência tervindo a revelar-se enriquecedora,tanto para os moradores como para adinamização dos próprios bairros,projetos futuros ficaram em sus-penso para mais tarde ali voltarem.O intuito? Desmistificar a velhalenda do perigo latente que paira naRosa e no Ingote e fazer saber a todosque há mais para além disso. Essatem sido, aliás, a batalha de Fran-cisco Queirós: “queremos uma ci-dade sem fronteiras, uma cidade semguetos, onde toda a gente se conhecee onde o preconceito não existe”.

Ana Duarte

Mariana Santos Mendes

Coimbra vai acolher no próximo dia nove de novembro o primeiro espetáculo da digressãonacional da peça "À procura de Ricardo III"

“É noite?/ É de noite?/ Que noite éesta?” pergunta Ricardo III. Shakes-peare transpõe para o papel a vidadaquele que foi o último rei de Ingla-terra e em cinco atos, temos umdrama histórico. Hoje, pela mão doencenador Luís Mestre, há a busca domonarca. “À procura de Ricardo III”é a reescrita do texto shakespearianodo século XXI. António Durães inter-preta a obra, que estará no TeatroAcadémico Gil Vicente (TAGV)quarta-feira, 9 de novembro, pelas21h30.

É em Coimbra que “À procura deRicardo III” inicia a sua digressão na-

cional, depois de ter tido a sua estreiaabsoluta na Casa das Artes de VilaNova de Famalicão. O diretor doTAGV, Fernando Matos de Oliveira,classifica a vinda deste espetáculo aCoimbra como a afirmação da cidadenum “circuito de teatro de nível, qua-lidade e referência do panorama cul-tural”. Deste modo, Matos de Oliveirapretende também dar um contributoà cidade e gerar a oportunidade dacomunidade contactar com “grandesartistas portugueses, sejam atores,dançarinos ou músicos”.

Para além da aposta em novos con-ceitos culturais, a nova programaçãodo TAGV prevê uma aproximaçãoentre instituição – público: “quere-mos dar a experiência às pessoas detrabalhar com várias personalidadesda cultura, através de, por exemplo,workshops”. E com este propósito,Luís Mestre irá trabalhar numa “ofi-cina de escrita” a 7 e 8 deste mês,onde será abordada a escrita parateatro e a prática teatral.

Àcerca de “À procura de RicardoIII”, Luís Mestre define-a como uma

“reescrita”. “Já tinha pensado nesteprojeto e já o tinha discutido com al-gumas pessoas, inclusivé com o An-tónio Durães [ator principal da peça],que aceitou de imediato”, acrescenta.Mas porquê um palco tão escasso depersonagens? O encenador explicaque esta é uma peça onde existe um“homem só, aparentemente doente eque padece de algo desconhecido”.Apesar de aparecer um enfermeiroem cena, aquele que trata do homemenfermo, este não fala e, ainda assim,revela-se importante na peça: “ohomem que se auto-denomina Ri-cardo III revê sempre várias pessoasligadas a ele próprio nessa persona-gem secundária e é isso que torna odrama intrigante”, justifica Luís Mes-tre.

“À procura de Ricardo III” apre-senta-se como um processo gradual:“as expetativas para a digressão de-pendem de várias fases de apresenta-ção e de trabalho”, aclara Mestre. Nopróximo ano, irá decorrer uma novareescrita da peça, para tentar perce-ber quem é, realmente, a persona-

gem: “no início de 2012 já iremosapresentar um novo homem, com ca-racterísticas diferentes, mas talvezcom as mesmas incertezas”. O con-vite é feito ao público para aparecer e

acompanhar o “homem aleijado e só”numa bebida: “Tragam-me whisky/E sirvam-se./ Não gosto de beber so-zinho”.

Com Daniel Silva

A revisitação de Shakespeare por um homem só

Ana Duarte

D.R.

Page 9: Edição nº 236

despoRTo8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 9

fuTSALAMSAC x Académica16h • Pavilhão Escola Eb 2.3general Humberto Delgado

bASquETEbOLAcadémica de Coimbra x barcelos-H. Terço-givec16h • Pavilhão MultidesportosMário Mexia

12NOV

12NOV

12NOV

12NOV

a g e n d a d e s p o r t i v a

VOLEIbOLS. Mamede x Académica de Coimbra16h • Pavilhão S. Mamede

RugbyAcadémica x Técnico16h • Estádio universiário deCoimbra

A Académica pode ser a últimaetapa de Orlando SimõesUma semana após a suaapresentação, o técnico debasquetebol ainda não con-seguiu inverter os maus re-sultados, averbando maisdois desaires. Finda a par-tida frente ao Barreirense,Orlando Simões abriu o jogoe contou os seus planos. O que é que o fez aceitar este

convite da Secção de Basquete-

bol da Associação Académica de

Coimbra?

Foi, de alguma maneira, o desafio deestar todos os dias no pavilhão. Umacoisa é durante muitos anos ter feitoisso, outra coisa é treinar as seleçõesnacionais, em que apenas se trabalhanos períodos de férias com os joga-dores. Prefiro o frenesim dos treinose jogos. Este foi um grande desafioque tinha que aceitar pelo envolvi-mento e pelo respeito que tenho peloemblema da Académica e pelo seusignificado. E, apesar de ser umgrande desafio, por causa da épocaque a equipa fez no ano passado, nãoregateio esforços, sei muito bemaquilo que me espera. E há condiçõespara a equipa crescer.

Acredita que ainda é possível al-

cançar as metas do ano pas-

sado?

O resultados da época regular nãoestão muito condicionados. Mas, cla-ramente, o número de derrotas doano passado foi muito pequeno. Aparticipação no play-off e a capaci-dade de lá chegar vai depender doque façamos daqui para a frente. Aparada estava muito alta e o desafioelevado.

E o plantel, está à altura?

Eu direi que não. Perdemos estes doisjogos. Mas não me vou desculparcom os jogadores. Temos a neces-sidade de melhorar e, se for pos-sível, reforçar o plantel. Desde oprimeiro momento em quecheguei, identifiquei doispontos débeis. Um delesera não termosum jo-

gador que intimidasse, que ressal-tasse na área próxima de cesto.

Como tem sido a sua relação

com o ex-treinador Luís Santa-

rino, agora dirigente da secção?

Normalíssima. Eu conheço o Luís, eleconhece-me, não houve qualquer tipode problema na passagem de teste-munho.

E para quando será possível ver

uma Académica com ambições

de conquistar títulos?

Esse é um problema que a direção e acidade têm que perceber. Até agoratêm jogado para estar nos pontosaltos. Mas o salto ainda é grande. En-quanto existirem plantéis como os doPorto, Benfica e CAB-Madeira, quesão totalmente profissionais, com jo-gadores que treinam duas vezes pordia, é difícil. A grande maioria dos jo-gadores da Académica é compostapor estudantes ou trabalhadores.

Está nos seus horizontes pes-

soais dar esse salto na AAC?

Depende dos objetivos que a di-reção tenha. Pa-rece-me queexiste umaa m b i ç ã og r a n d eda di-r e ç ã oem, sepossí-vel, seintro-mete-r e mnestea n oo u

já no próximo nos lugares cimeiros.Mas é muito cedo para se falar sobreisso. É evidente que, para quem entrano comboio em andamento como eu,as preocupações são tantas que nãose pode pensar em altos voos. Aminha preocupação, neste momento,é consolidar o grupo e fazer de cadajogo uma final.

Gostaria de ficar por Coimbra?

Eu penso a curto prazo. Assumi ocompromisso para esta época comoutra de opção, mas é preciso as pes-soas estarem satisfeitas com os resul-tados. Não aponto a logo prazo. Épreciso fazermos uma boa época, re-cuperarmos este atraso que temos.

Depois de momentos melhores,

como o Eurobasket em 2007, vê

a possibilidade de momentos

assim na Académica?

O período das seleções nacionais temum timing. Foram seis anos em queestive nos seniores e em que conse-guimos um feito histórico. O nonolugar no campeonato é uma coisa queprovavelmente Portugal não vai mais

repetir. Mas diria que esse espaçojá passou. Enquanto treinador

de clube, gostava de o ter-minar com algum su-cesso. Quando treinei oOliveirense, ganhámos aTaça da Liga. Vamos vero que conseguimosfazer aqui.

Quando pretende

terminar essa

c a r -

reira?

Eu não gostava de me alongar muitomais. Tinha previsto por volta dos 60anos. Este desafio, a confirmar-se,pode projetar-me para além disso, jáque fiz 59 agora. Estes dois anos es-tariam dentro dos limites.

Então há a hipótese de terminar

a carreira em Coimbra?

Sim, acho que sim.

E depois disso, equaciona conti-

nuar?

Tenho um objetivo, que é treinar jo-vens. Irei fazer isso, é algo que játenho traçado há muito tempo. Ouem Coimbra ou em Sangalhos, ondecomecei.

Então pode ficar na formação

da Académica…

Sim, não fecho a porta a isso. Quemrecolheu tanto do basquetebol temobrigação de dar um contributo tam-bém à formação.

Depois da sua passagem pelos

sub-20, considera que a Acadé-

mica tem jogadores com capaci-

dade para lá estarem?

Eu conheço mal a formação da Aca-démica porque não trabalhamos con-juntamente. Acho que é um problemaque a direção tem em mãos, com aCâmara Municipal de Coimbra, e seique estão a tentar resolvê-lo já no fu-turo. Têm de encontrar uma oficinade trabalho, ter um pavilhão. Eu gos-tava de estar em cima de tudo, por-que posso-lhe dizer que o distrito deCoimbra tem tido pouca presença dejovens nas seleções nacionais. Issosignifica que o basquetebol de forma-ção, aqui, não tem tido um nível tãobom quanto se esperava.

Quer deixar algum apelo à

cidade?

Eu gostava de ver mais genteno basquetebol. Também sei

que não é um desportomuito tradicional. Mas as

pessoas só vêm pratica-mente quando se joga

com as equipas maisconceituadas. A equipamerece um apoiomaior do público.

Fernando Sá Pessoa

Futsal universitárioprestes aarrancar

O treinador da equipa da secçãode fustal da Associação Académicade Coimbra (AAC), João Oliveira,garante ter um “conjunto forte, te-mido pelas outras universidades”.Depois dos treinos de captaçãorealizados no passado mês de ou-tubro, a Académica voltará a mar-car presença no campeonatouniversitário de futsal, a ter inícionos dias 23 e 24 deste mês, emVila Real, e o objetivo é chegar àfase final, que terá lugar em Braga.As expectativas da equipa depen-dem da disponibilidade de algunsjogadores, que constituem aequipa profissional da Acadé-mica/OAF.

O treinador queixa-se da falta depreparação constante, ao alegarfazerem “apenas três a quatro trei-nos antes de cada encontro”. Talfacto poderá ser determinantepara baixar o rendimento daequipa. Esta situação deve-se à in-compatibilidade da agenda dos jo-gadores da Académica/OAF defutsal. Refere ainda que, “quandoesses jogadores estão presentes, ascoisas correm um pouco melhor”.Mas nem sempre podem contarcom eles, e é por isso que o técnicoprocura “uma equipa mais oumenos mista”, onde pode contarcom jogadores que, apesar de nãocompetirem ao mais alto nível,”têm total disponibilidade paraservir a equipa”.

Contudo, o plantel está prepa-rado e conta, para além dos joga-dores da Académica/OAF, comaqueles que participaram nos re-centes treinos de captação prota-gonizados pela Académica. Ainiciativa, já levada a cabo nos úl-timos três anos, é ideia de JoãoOliveira, por causa “da saída de al-guns jogadores”, tendo, por isso,proposto “fazer alguns treinos decaptação”. Aylton Rita, coordena-dor de desporto da DG/AAC, re-vela que, “apesar de não serematletas de cariz profissional, mui-tos deles têm uma qualidade ra-zoável”. O mesmo afiança que estaação advém da “necessidade de re-novar os plantéis das equipas” e,segundo o próprio, “o número deestudantes que participaram nestainiciativa, este ano, foi, sem dú-vida, o mais elevado, com 87 ins-critos”.

Recorde-se que a Académica jáfoi campeã em 2008 e vice-cam-peã no ano passado, neste torneio,para além de já ter marcado pre-sença no campeonato europeu.

Fábio Santos

OrlandO SimõeS • TreinadOr da SecçãO de BaSqueTeBOl da aac

olgA juskiewicz

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DESPorTo10 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

Prolongamento

BASQUETEBOL

Depois detrês derro-tas nos trêsp r i m e i r o sjogos do

campeonato,a Académica, agora com Or-lando Simões ao leme, via noencontro com o Barreirense aoportunidade de mudar orumo dos acontecimentos.Pouca sorte para o novo trei-nador, que viu a equipa sairvencida do Pavilhão Multi-desportos. 57-61 foi o resul-tado final. Está difícilreencontrar o caminho das vi-tórias, depois do excelenteterceiro lugar do ano passado.

RUgBy

No passadodia 29 deOutubro, aequipa sé-nior de

rugby daAAC foi a Lisboa vencer ocampeão GD Direito. A contarpara o Campeonato SuperBock – fase de apuramento, aAcadémica alcançou umgrande resultado (21-18).Com a vitória sobre os advo-gados, a equipa sobe aoquarto lugar, posto que dáacesso à fase final.

fUTEBOL

Em jogo acontar paraa sexta jor-nada doC a m p e o -

nato da Divi-são de Honra da Associaçãode Futebol de Coimbra, Aca-démica-SF recebeu, no pas-sado dia 6 de Novembro, oCarapinheirense. O resultadopara com o líder acabou porser uma derrota, por 1-0, peloque agora a luta pela subidaestá mais equilibrada. Os es-tudantes prosseguem o cam-peonato em terceiro lugar,com apenas um ponto amenos do que o primeiroposto.

ANDEBOL

Em jogo dasétima jor-nada da ter-ceira divisãodo campeo-

nato nacio-nal, a Académica recebeu evenceu, no Pavilhão nº 3 doEstádio Universitário, o lan-terna vermelha Almeirim eascendeu assim ao segundolugar, embora com mais umjogo que o Académico e Viseu.Mantêm-se abertas as possi-bilidades de subida.

Fernando Sá Pessoa

A decisão sobre o princípio de “utilizador-pagador” do Estádio Universitário continua a

motivar discordâncias entre todos. Apesar do dinheiro que as secções desportivas

usaram para a manutenção do mesmo, a medida vai avançar. Por Fernando Sá Pessoam carta enviada à reitoriapor Eduardo Melo, presi-dente da direção-geral As-

sociação Académica de Coimbra(DG/AAC) e do Conselho Desportivo(CD/AAC), são usados como argu-mentos contra o princípio de “utiliza-dor-pagador” os investimentos feitospelas secções desportivas no EstádioUniversitário de Coimbra (EUC).“Cerca de 600 mil euros”, pode ler-se, é o valor que foi por elas gasto, sónos últimos cinco anos, na manuten-ção do estádio. Instado a comentar adecisão da Fundação Cultural da Uni-versidade de Coimbra (FCUC), naqual o EUC está inserido, o membrodo CD/AAC, Miguel Franco, não tempudor em afirmar a postura contra adecisão tomada. E lança a dúvida se“o estádio ficará a ganhar com isto”.Na referida carta, esta posição é fun-damentada com a “ausência de apoiopela UC para o desporto universitá-rio”, pelo que a decisão da FCUC éconsiderada “incompreensível”.

Não obstante o posicionamento doCD/AAC, é mostrada disponibilidadepara ouvir a outra parte, pelo que éum Eduardo Melo compreensívelaquele que diz entender “as necessi-dades de investimento” no estádio,

A coordenadora do pelouro do des-porto da DG/AAC, Filipa Godinho,aproveita para deixar, também ela, asua deixa. Este princípio não sepauta, para a dirigente associativa,por princípios de “justiça”, dado osvalores que já foram pagos pelas sec-ções para que o estádio se pudessemanter aberto. “Se tem condiçõesque permitem a prática desportiva, éporque as secções têm lá estado”.

A vice-reitora para a Cultura daUC, Clara Almeida Santos, atual res-ponsável pela FCUC, prefere dizer, noentanto, que o documento que vãopropor “, tem em consideração as es-pecificidades das secções e a singula-ridade do desporto universitário”.Defende, por isso, “o trabalho emconjunto”.

Manter o EUC em funcionamentoOtimista, Clara Almeida Santos, prin-cipal rosto desta resolução, avançaque a situação que até aqui se vivia

era “insustentável e sem paralelo”,apontando o dedo à exclusividadedeste caso relativamente ao resto dopaís. Responsável pela FCUC, a vice-reitora considera que não estão emcausa os investimentos realizados an-teriormente, mas sim o trabalho emconjunto entre a FCUC e as secçõesdesportivas que deverá ser feito, para“benefício das mesmas”. Admite que“talvez se possam operar algumasmelhorias no estádio”, em resposta aopiniões que visam a falta de quali-dade das atuais infraestruturas e apossibilidade de esta taxa não se vira traduzir em benefícios mateiais.

Falta de diálogo e de informaçãoA respeito de uma suposta ausênciade conversações, a vice-reitora de-fende-se, retorquindo que só aindanão houve reunião com as secçõesdesportivas “por indisponibilidadede agenda do presidente daDG/AAC”, primeiramente e, numafase posterior, por a própria ter-seausentado do país.

Sobre a convocação de EduardoMelo para a reunião onde foi votadoo princípio “utilizador-pagador”, Mi-guel Franco lamenta que ela tenha

sido feita apenas com uma hora deantecedência. E queixa-se ainda quenenhuma das outras partes foi ou-vida, pelo que, na sua opinião, ocor-reu uma “decisão unilateral”. Noentanto, convidada a comentar a de-missão de Miguel Portugal e de JaimeCarvalho do CD/AAC, Clara AlmeidaSantos assegura que esses “elemen-tos foram auscultados exploratoria-mente” e que Eduardo Melo tambémteve direito de voto.

Jaime Carvalho, taxativo, mantém-se firme, ao afirmar que “tudo de-pende da forma como as coisas foremfeitas”.

“Querem pôr a AAC forado EUC?” O presidente da secção de Ténis,Eduardo Cabrita, vai mais longe nasdeclarações que faz. Para o membroda comissão de gestão do estádio uni-versitário, as recentes declarações davice-reitora, que dão conta da possi-bilidade de o estádio fechar caso assecções não cedam, são, ironiza, “en-graçadas”. Numa alusão ao desportoa que está ligado, Cabrita diz que noténis, muitas vezes, “é o adversárioque provoca o erro”. Deixa, por isso,o alerta, ao temer “que tudo isto

acabe numa grande salsada”. E dizainda que é preciso perguntar: “quemé que está a ganhar com isto?”.

Lançando duras farpas à formacomo as coisas estão a ser conduzi-das, sublinha várias vezes o até agoraquase total desconhecimento sobreaquilo que se está a passar, e apro-veita para lembrar que, “dentro doestádio, não existe só a AAC, há ou-tras entidades que a utilizam, como aFaculdade de Ciências do Desporto eEducação Física”.

Para o próximo ano civilJá sobre o timing em que a decisãofoi tomada, o dirigente desportivoadianta que os membros da fundaçãocultural “não foram, provavelmente,esclarecidos sobre o que é a realidadedesportiva”. “Não é lógico”, completaEduardo Cabrita, “que, num setordesportivo que funciona de agosto ajullho, virem propor alterações paraas quais não estão preparados”. Mi-guel Franco lamenta que, até agora,ninguém fora da FCUC “tenha a mí-nima noção dos valores em causa”,mas lembra que “o que está decididoformalmente é o princípio utilizador-pagador entrar em vigor a partir dejaneiro”.

E

O Estádio Universitário de Coimbra vai passar a ser pago pelas secções da AAC

olga juskiewicz

Investimento das secções noEUC não vale como argumento

A VOZ DAS SECÇÕESEm cima da mesa não estará, no entanto, apenas a decisão em si, como é sabido, mas a forma como o processo tem sido conduzido. De entre as várias secções

desportivas da academia, Rui Pita, presidente da secção de Futebol, coloca-se até ao lado do princípio aprovado a 17 de outubro passado, temendo, única e ex-clusivamente, a forma como as coisas se poderão vir a processar. “Concordo com o “utilizador-pagador”, desde que existam condições para trabalharmos”, reitera.Existe, pois, entre as várias modalidade que usufruem do estádio, a ideia de que poderão a vir a pagar uma taxa extra, “sem que isso se traduza em melhorias conc-retas”. Mais receoso está Rui Fonseca, presidente da secção de Judo, que, augura, se o princípio avançar, revelar-se-á uma “machadada muito forte, tendo que seequacionar toda a atividade das secções conforme estão a ser”.

Com vista, no entanto, a formar uma posição coesa sobre o assunto, para posteriormente se encetarem as almejadas negociações com a Fundação Cultural,decorreu ontem, dia 7 de novembro, (já após o fecho de edição d’A CABRA) uma reunião entre as secções desportivas. Com efeito, visou-se encontrar uma “posiçãoconjunta”, como esperava Filipa Godinho. Posteriormente, refere a coordenadora, a ideia será alcançar um ponto intermédio de consenso com o organismo da re-itoria, tentando salvaguardar que as secções “não saiam prejudicadas”. Aguardam-se agora novidades sobre a matéria.

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8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 11

CiDADE

os autarcas e funcionários da administração local são a face mais visível do Estado junto da população.

Para o bom exercício das suas competências, é necessária uma formação adequada - proporcioná-la é a

função do Centro de Estudos e Fomação Autárquica, com sede nacional em Coimbra. Por Ana Morais

CEFA, a formar autarcas desde 1980

formação ministradaaos funcionários da ad-ministração públicacentral ou local é funda-

mental para assegurar a qualidade deserviços prestados aos cidadãos”, as-segura o vice-presidente do Centro deEstudos e Formação Autárquica(CEFA ), Nuno Marques Pereira.Criado na década de 80 com “a mis-são de desenvolver ações na forma-ção do pessoal da administraçãolocal”, ainda enquanto instituto pú-blico e sob a tutela do Estado, o CEFApassou a fundação de direito privadode utilidade pública em dezembropassado, na sequência do Programapara a Reestruturação da Adminis-tração Central do Estado.

A Fundação CEFA tem funções quelhe são “atribuídas por lei” e que só o

CEFA pode prestar, certifica o vice-presidente - as formações para car-reiras específicas da administraçãolocal, isto é, a formação inicial ondese podem incluir polícias e bombei-ros municipais ou fiscais e adminis-trativos. Para além desta formaçãoexistem ainda dois cursos destinadosa altos dirigentes. Mas quando sequestiona a formação de um presi-dente de câmara, por exemplo, a res-posta é negativa – “o CEFA não fazformação para autarcas eleitos”, ad-mite Nuno Marques Pereira. Con-tudo, o vice-presidente revela anecessidade de a situação ser repen-sada e encara-a como um “desafio”,

lembrando que “também tem dehaver vontade política”.

A formação prestada é descentrali-zada, ou seja, estende-se para alémda sede – “desde Monção a Vila Realde Santo António, e nas ilhas quandoé preciso”. São fundamentais as par-cerias estabelecidas e os acordos comos Países Africanos de Língua OficialPortuguesa fazem parte do círculo doCEFA, “sobretudo em Angola e Mo-çambique”. Os formadores são “fun-cionários autárquicos de exceção,professores universitários e outrosnomes sonantes da administraçãopública”, refere Marques Pereira.

Formação “fundamental”O responsável pela Divisão de Patri-mónio e Aprovisionamento da Câ-mara Municipal de Coimbra, AntónioCarvalho, frequentou o primeirocurso do CEFA e considera que estelhe permitiu “ter um acesso mais rá-pido a uma carreira administrativa naautarquia local”, e encara este traba-lho de formação autárquica como“fundamental”. É necessário que se“atualizem os conhecimentos na ad-ministração local, pois a legislação al-tera-se rapidamente e é importanteque se esteja em permanente atuali-zação”, assegura. Com a profunda re-forma da administração local queestá a acontecer, o CEFA tem vindo apensar em formações nesse âmbito e“a criar espaço de discussão”.

No passado mês de outubro, depoisde serem notificados pelo CEFA deque poderiam cessar a sua qualidadede funcionários públicos ou até deque poderiam ser dispensados, osfuncionários da instituição foramconvocados pelo Sindicato dos Tra-balhadores da Administração Públicae de Entidades com Fins Públicos(SINTAP) para uma greve. Segundoo responsável sindical, José Abraão,esta situação era “injusta e ilegal”. No

dia da greve, os funcionários desloca-ram-se a Lisboa para exporem a si-tuação ao Secretário de Estado daAdministração Local, Paulo Júlio,que lhes deu garantias de que tal nãoaconteceria. Assim, José Abraãoafirma que “está o problema resol-vido”, acrescentando também que onúmero de funcionários (cerca de 40)“não é excessivo”.

Cortes do OEDepois da extinção, em 2011, doCEFA enquanto instituto público, osórgãos de gestão da Fundação são no-meados pela Associação Nacional deMunícipios Portugueses e pela Asso-ciação Nacional de Freguesias. Se-gundo Marques Pereira, a passagema fundação privada “trouxe vantagensem termos de gestão, tornou tudo

mais flexível e maleável”.Notícias recentes dão conta de uma

diminuição da transferência do Orça-mento do Estado (OE) para 2012,num financiamento que provém tam-bém de fundos comunitários e depropinas pagas pelos formandos. Ovice-presidente revela que esta dimi-nuição já tem vindo a notar-se aolongo dos últimos anos e lamenta queisso possa implicar “reflexos na ge-rência da instituição”. Contudo, Mar-ques Pereira assegura que estáprevisto para breve uma revisão dosestatutos da fundação e só depoisdisso é “que poderá decidir-se ondecortar”.

“A

“A fundação CEFAnão faz formaçãopara autarcas eleitos,mas isso deve ser repensado”

“A diminuição datransferência do OEpode ter reflexos nagerência da instituição”

inês amado da silva

inês amado da silva

A missão do CEFA é a de “desenvolver ações na formação do pessoal da administração local”, afirma Nuno Marques Pereira

inês amado da silva

inês amado da silva

Page 12: Edição nº 236

Ferrovia esquecida, aband o peT lançado pelo Governo atual prevê a suspensão das linhas do oeste, Vouga e um troço da linha do es

linhas ferroviárias e munícipes. a má gestão da Cp e a não-renovação da ferrovia são apontadas com

ão se vê vivalma, nemgente que chega, nemgente que vai, nem gente

que fica. A estação da MarinhaGrande parece fugir da cidade que seagita de manhã, criando um subter-fúgio de silêncio onde nem o tic-tacdo relógio do apeadeiro se ouve, componteiros parados desde há dez anospara cá. E na calmaria escutam-se ospassos de um andar que se faz vaga-roso, como que aceitando o compassodo lugar. É um idoso, com os seussacos, a chegar à estação. Deixa-osencostados a um poste e volta paratrás, certo de que ninguém por láanda para se apoderar dos seus per-tences. Numa esquina, e apoiado auma árvore também ela esquecida, ovelho urina e fá-lo ali porque até ascasas de banho se mostram cerradas.Foi há dez anos que a estação da Ma-rinha Grande fechou portas apesar dea circulação na linha se ter mantido.“Ó se era diferente!” lembra Joaquim,dono de um café que se prostra emfrente da referida estação, não perce-bendo o porquê de esta ter fechado há10 anos: “havia tanto movimento, tí-nhamos isto sempre cheio”. Agora,valem-se dos clientes das redondezase não de passageiros que por aliparam, porque esses são coisa parca einconstante.

Na estação ferroviária de Leiria ocenário é idêntico. Três taxistasparam à frente da mesma, mas de-pressa se repara que a sua funçãolembra mais um paciente pescador delinha, que clientes nem vê-los. Ao

contrário da paragem da MarinhaGrande, em Leiria a estação mantém-se aberta, apesar de a bilheteira le-vantar a placa “Encerrado” o diainteiro. O movimento da estação faz-se com uma conversa entre os mes-mos taxistas que lá esperam, mas queperto do almoço lá desistem, pormeia dúzia de pessoas que aguardamum comboio a sair em direção à Ma-rinha Grande e um pequeno café,dentro da estação, que lembra o visi-tante da suspensão, em janeiro dopróximo ano, da linha do Oeste,assim como da do Vouga, e de um pe-queno troço da linha do Este. “Querassinar?”, pergunta de imediato aempregada de balcão assim que al-guém pede café, apontando para umapetição. Conta que até para o mer-cado de Leiria a levou, “com a ajudade mais dois moços”, onde, garante,“apresentamos soluções”. “Isto estáuma bagunça, está esquecido”, desa-bafa um dos clientes do café.

O desabafo repete-se também nosbancos de quem espera o comboio,como quem também espera por pro-messas que se fazem “há mais de 20anos”, recorda o presidente da Câ-mara Municipal de Caldas da Rainha,Fernando José da Costa, apontandopara os vários programas eleitoraisde “todos os partidos”. Em vez disso,a política de transportes parece vi-rada para o transporte automóvel erodoviário: “estamos a observar umabandono completo da utilização docomboio”, critica o membro da Co-missão de Defesa da Linha do Oeste,

Heitor Castro. Daniel Conde, cidadãoassociado ao Movimento Cívico PelaLinha do Tua, sustenta este aban-dono: “a nível nacional perdeu-se umterço de ferrovia, mais de 40% depassageiros desde 1989 e 50% de fun-cionários nos caminhos de ferro”.“Estamos a ir completamente emcontraciclo àquilo que têm sido as li-nhas orientadoras da União Europeiapara os transportes”, aponta HeitorCastro, deixando também a sua in-credulidade por esta medida ser to-mada, através de imposições da“troika”, no Plano Estratégico deTransportes (PET), lançado peloatual governo.

Sem modernização não há utentesE, no que toca ao abandono dos com-boios, a culpa recai em quem? Nos ci-dadãos ou na gestão das linhas?Daniel Videira Murta, professor dacadeira Economia dos Transportes naFaculdade de Economia da Universi-dade de Coimbra (FEUC), consideraque, “apesar de haver alguma negli-gência por parte dos governos notransporte ferroviário, a culpa tam-bém é dos utentes que preferem otransporte individual”, garantindoque, em Portugal, “para cada român-tico do comboio há 1000 latinos apai-xonados pelo carro”. Já na ótica deHeitor Castro, o problema reside namá gestão por parte da ComboiosPortugal (CP): “se se realizasse umarenovação, modernização, eletrifica-ção e duplicação de linhas no Oeste, a

SuSpenSão de linhaS12 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

N

“Vemos um

abandono

completo da

utilização do

comboio , o que

é um contraciclo

daquilo que têm

sido as diretrizes

da União

Europeia”, critica

Heitor Castro

Page 13: Edição nº 236

Ferrovia esquecida, abandonada e, agora, suspensao peT lançado pelo Governo atual prevê a suspensão das linhas do oeste, Vouga e um troço da linha do este. a motivação financeira desta medida não é encarada como justificação possível para os utentes das

linhas ferroviárias e munícipes. a má gestão da Cp e a não-renovação da ferrovia são apontadas como causas que fomentam o abandono da utilização do comboio. Texto e Fotografia por João Gaspar

procura de passageiras poderia sermultiplicada em quatro, cinco ou seisvezes”, reiterando que a mobilidadeno Oeste “está intimamente ligadacom a revitalização da linha ferroviá-ria”. Na linha do Vouga, apesar deesta representar um maior fluxo depassageiros, 68% dos passageiros quevão ser afetados pela suspensão daslinhas, também a oferta condiciona aprocura e a utilização daquele meiode transporte.

Jorge Almeida, vice-presidente daCâmara Municipal de Águeda (CMA),município afetado pela suspensão do“Vouguinha” (apelido que a linha ga-nhou), considerava os horários como“absolutamente inadequados”: “Atésetembro de 2010, o primeiro com-boio chegava a Águeda às 8h30, istonum conselho francamente empresa-rial”, o que tornava impossível a uti-lização deste meio de transporte portodos os trabalhadores que iniciariamo seu trabalho às 8 horas. Também aofinal da tarde, o mesmo problema severificava, segundo Jorge Almeida,com o último comboio a sair às18h30, “o que impossibilitava o usodo comboio para quem trabalhasseno comércio ou noutro tipo de servi-ços que saia depois das 19 horas”.Este “desajuste completo de horá-rios”, levou a que a câmara refizesse,em conjunto com a CP, um horáriomais adequado para o ramal doVouga. Resultado? “Nos primeirostrês meses aumentámos em 13% onúmero de passageiros, e no primeirosemestre deste ano obtivemos um au-mento de 30% relativamente aomesmo período em 2010”.

“Não há no país nenhuma linha acrescer desta forma”, atesta o vice-presidente da CMA, lembrando tam-bém que, a suspensão da linha ocorrenum momento em que foram feitosinvestimentos na melhoria do já cen-tenário Vouguinha. “Temos váriostrabalhos ainda a decorrer na estaçãode Águeda, em taludes, supressão depassagens de nível”, explica. A indig-nação está sempre presente no dis-curso de José Almeida, que nãoencontra qualquer justificação paraesta decisão para além da “cegueira eirracionalidade de pessoas que nemvieram ao terreno – decidiram emcima do joelho e pronto!”, lembrandoque não há, de momento, nenhumeixo rodoviário entre Águeda e Aveiroonde seja possível fazer uma ligaçãomais rápida. “É mau de mais para serverdade”, desabafa, afirmando que“as populações têm todo o direito emse sentirem defraudadas”.

Na Linha do Oeste, apesar de per-correr uma zona de elevada densi-dade populacional, o problema residetambém na questão da oferta de ser-viço: “demora-se tanto a ir das Caldas

da Rainha para Lisboa hoje como hácem anos atrás e assim não há trans-porte ferroviário que resista”, asse-vera o Presidente da CMCR, quelembra também a má oferta de horá-rios. A ligação de Leiria a Lisboa-En-trecampos é feita apenas cinco vezespor dia e demora quatro horas, a li-gação Caldas da Rainha a Lisboa-En-trecampos já tem uma oferta de dezviagens por dia e demora duas horase meia e Torres Vedras a Leiria exis-tem apenas quatro opções e a viagempode demorar duas horas, tudo op-ções duas a três vezes mais longasque o uso do transporte rodoviário ouautomóvel. “Assim é impossível com-petir com os outros meios de trans-porte”, comenta Fernando José daCosta.

O presidente da CMCR acreditaque a modernização da Linha doOeste também seria uma soluçãopara outro problema que a CP atra-vessa – a saturação da Linha doNorte. Para além desse argumento,Fernando José da Costa aponta tam-bém para a ferrovia como um “alíviono tráfego automóvel e rodoviárioque Lisboa recebe diariamente”, con-siderando que “os cidadãos apenasnão utilizam o comboio porque nãoos serve ou em termos de tempo ouem termos de horário”. Heitor Castroteme mesmo o encerramento total dalinha, que vai apenas estar disponívelpara o transporte de mercadorias: “éinviável a linha viver do transporte demercadorias e, mais tarde ou maiscedo, vai deixar de existir”.

Urgência na aposta ferroviária“A situação mais chocante é a daLinha do Oeste”, censura o membroda comissão executiva da AssociaçãoComboios XXI, Nuno Oliveira, lem-brando que a mesma zona “ia ter umaconcessão de autoestradas, mas emtermos de linha ferroviária é cons-tantemente negligenciada”. “Não hánenhuma direção estratégica para ne-nhum meio de transportes, muitomenos para a articulação dos váriosmeios”, explana Nuno Oliveira, quenão aceita como motivo principal ode redução de custos: “a suspensãode linhas representa uma fração mi-núscula dos prejuízos”.

“É lamentável que o argumento fi-nanceiro seja evocado sistematica-mente e que prevaleça sobre todos osoutros”, reprova Heitor Castro, re-cordando que “nenhuma empresa detransportes no mundo tem lucro”. Omesmo reitera que “o negócio dostransportes não pode ser visto comouma fábrica de salsichas, em que seolha para um cliente à procura de for-mas de lucrar”. De acordo com omembro do movimento cívico quedefende a Linha do Oeste, se as polí-ticas de transportes continuarem namesma linha, “vai existir mais umfator que leva à desertificação do país,com aldeias a deixarem de ter o seuúnico meio de transporte público dis-ponível”.

Situação que toca a Daniel Conde,defensor da manutenção das linhasdo Tua, Corgo e Tâmega que, se-gundo, o PET vão continuar suspen-sas. “No vale do Tua há várias aldeiasque não têm qualquer tipo de trans-porte alternativo, estão completa-mente isoladas, com a maior parte dapopulação idosa e reformada”,afirma. O mesmo lança duras críticasà tutela que tomou a decisão de sus-pensão das linhas, considerando queas tomou através de “dados absurdose manipulados”, como o caso de cadapassageiro no Tua custar 29 mil eurosao Estado por ano, ou as automoto-ras “consumirem 140L/100km,quando consomem, em média, ape-nas 37L/100Km”. Daniel Conde ob-serva ainda que “há sempreinvestimento para levantar a linha epara desfazer tudo mas nunca maishá verba para a repor”.

Na estação de Leiria, Mário Al-meida, 76 anos, espera pelo comboiopara a Marinha Grande. Ao seu ladotem uma bicicleta que usa para fazero restante caminho de Leiria para aOrtigosa, onde mora o seu filho. Apartir de 2012 a alternativa é o auto-carro e ficar-lhe-á seis euros maiscaro dos 2,25 que paga hoje pela via-gem. “Ver o meu filho? Só se ele de-pois quiser vir cá a casa!”.

“O negócio dos

transportes não

pode ser visto

como uma fábrica

de salsichas. Não

se olhar para um

cliente à procura

de formas de

lucrar”

8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 13

SuSpenSão de linhaS

Page 14: Edição nº 236

CIÊNCIA & TeCNologIA14 | a cabra | 8 de novembro de 2010 | Terça-feira

FCTUC: mais de cem anos de Ciência

celebrar o seu centenário,

a Faculdade de Ciências e

Tecnologia da Universi-

dade de Coimbra (FCTUC), assi-

nala uma longa e natural evolução

desde a reforma republicana de

1911, que caracteriza o modelo

atual, mas também nela estão pre-

sentes os primeiros passos dados

no ensino experimental com a Re-

forma Pombalina de 1772.

“A Reforma Pombalina de 1772

foi um verdadeiro terramoto inte-

lectual”, define o professor catedrá-

tico, Carlos Fiolhais, no qual foi

fundado um ensino baseado na ob-

servação e na experiência, já in-

cluindo autores da Revolução

Científica, como Galileu e Newton,

nos planos de estudo. Pretendia-se

um “estatuto internacional” para a

instituição. O mais importante

nesta mudança estrutural de ensino

terá sido a criação da Faculdade de

Matemática e da Faculdade de Fi-

losofia, aponta o historiador de

Ciência, Décio Martins.

“Em 1759, houve um desmante-

lamento do nosso sistema educa-

tivo, que era essencialmente

dominado pelos jesuítas e oratoria-

nos em Lisboa”, explica o também

diretor do Museu de Física da UC.

Com a expulsão dos jesuítas do

país, faltavam pessoas que garan-

tissem o funcionamento de um

curso na área das ciências. Para

esses lugares foram contratados

mestres estrangeiros e construídas

novas infraestruturas, entre elas, o

Laboratório Químico, o Gabinete

de Física Experimental, agora si-

tuado no Museu da Ciência, ou o

Jardim Botânico.

Décio Martins elogia a ação do

Marquês de Pombal que criou con-

dições muito específicas para o en-

sino da física. O gabinete de física, à

altura, “podia ser considerado

como um dos mais bem equipados

da Europa”, apetrechado com seis

centenas de instrumentos fabrica-

dos em Portugal. Da mesma forma,

“o Laboratório Químico terá sido

caso único no mundo”, construído

de raiz para o ensino da química.

Estava previsto, também, um Ob-

servatório Astronómico que, por

falta de financiamento, foi adap-

tado a uma unidade de menores di-

mensões, no Pateo das Escolas da

UC, demolido aquando do Estado

Novo.

Faculdades de Filosofia eMatemática Nas faculdades de Matemática e de

Filosofia surgia uma complementa-

ridade no ensino: “os estudantes de

filosofia deviam frequentar algu-

mas cadeiras na Faculdade de Ma-

temática, e os de matemática

deviam frequentar algumas cadei-

ras de filosofia”, conta o historiador

e refere ainda que este era “um mo-

delo bem desenhado na altura, que

acabava por ser uma gestão de re-

cursos”.

O brasileiro Vicente Coelho Sea-

bra foi um dos primeiros estudan-

tes da Reforma Pombalina,

concluiu o curso de filosofia, fez o

curso de medicina e continuou in-

teressado na química, marcando a

história da faculdade quando “pu-

blicou “uns” Elementos de Quí-

mica, publicados um ano antes de

Lavoisier [criador da Química mo-

derna] publicar “os” Elementos de

Química”.

Durante a reforma destacaram-

se várias personalidades no ensino

em Coimbra. Tomé Henriques So-

bral usava o Laboratório Químico,

durante as invasões francesas, para

o fabrico de pólvora em ajuda ao

exército, ou no combate a epide-

mias. Por sua vez, José Bonifácio de

Andrade e Silva, numa viagem à Es-

candinávia, descobriu o terceiro

elemento químico - o lítio.

Uma nova abordagem ao traba-

lho científico foi conseguida por

António dos Santos Viegas, profes-

sor da casa durante mais de 50

anos, que “procurou que os estu-

dantes desenvolvessem teses e dis-

sertações sobre temas atuais”,

destaca Décio Martins. Um dos

seus alunos, Henrique Teixeira

Bastos, fez os primeiros estudos do

raio-x em Coimbra, em fevereiro de

1896, dois meses após a descoberta

dos mesmos.

A ideia de televisão, na forma

mais técnica do termo, já era pen-

sada por um estudante de Coimbra.

Adriano Paiva é tido como perso-

nalidade que lançou a “possibili-

dade de transmitir imagens através

de impulsos elétricos, utilizando as

propriedades fotossensíveis do se-

lénio”, sublinha o físico.

Reforma de 1911 Carlos Fiolhais assevera que “a Re-

forma Pombalina não continuou

com o mesmo vigor do início. Há

cem anos, houve outra reforma,

esta republicana”, na qual “as duas

faculdades pombalinas da área das

ciências se uniram para formar a

Faculdade de Ciências”. A cidade

universitária tinha avançado até

determinado ponto, “mas foi pre-

ciso fazer ajustes”, indica o diretor

do Museu de Física. Era necessário

acompanhar os avanços da física e

desdobrar essa cadeira anual em

duas, criar mais institutos e criar

cadeiras mais específicas, como a

ótica, a acústica, a eletricidade -

“uma evolução natural”, refere

Décio Martins.

“Em 1973, a Faculdade de Ciên-

cias da Universidade de Coimbra

passou também a ser de Tecnolo-

gia, formando engenheiros. Foi-se

tornando a grande escola de ciên-

cias e tecnologia que é hoje”, carac-

teriza Carlos Fiolhais.

Referente à situação atual, Décio

Martins deixa a crítica à falta de

condições que alguns investigado-

res sentem: “infelizmente, muitos

dos nossos melhores cérebros pro-

curam condições no estrangeiro,

mas isso depende da capacidade

política e económica do país”. “Se

não tivessem investido em dez es-

tádios de futebol há uns anos atrás,

talvez tivéssemos ganho muito

mais”, conclui.

Com Juliana Pereira

Centenário da FaCuldade de CiênCias e teCnologia

fotomontagem por felipe grespan:

Num século, a FCTUC acumulou um vasto património, viu passar nos seus corredores figuras de importânciainternacional, conceptualizou a ideia de televisão, descobriu um elemento químico e acompanhou avançoscientíficos. Mas não são apenas 100 anos que desenham a história desta faculdade. Por Filipe Furtado

Afoto CeDiDa por imagoteCa mUniCipal De CoimBra

D.r:

foto CeDiDa por imagoteCa mUniCipal De CoimBra

pUBliCiDaDe

“A reforma

pombalina de 1772

foi um verdadeiro

terramoto

intelectual”

“Se não tivessem

investido em estádios

há uns anos atrás,

talvez tivéssemos

ganho muito mais”

filipe grespan

Page 15: Edição nº 236

8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 15

CIÊNCIA & TeCNologIA

Falta de informação leva utilizadores a subscrever serviços aoperadoras e a fazer gastos desnecessários

A partir de 12 de Janeiro de

2012, toda a zona litoral vai deixar

de receber o sinal analógico para

dar lugar ao digital – o que tem

sido designado por Televisão Digi-

tal Terrestre (TDT). Contudo “a

mensagem não está a passar da

forma correta” e “verifica-se um

desconhecimento deste novo sis-

tema” pela maioria da população,

assegura o técnico de áudio e vídeo

da Associação Portuguesa para a

Defesa do Consumidor (DECO),

António Alves, ainda que o apagão

decorra dentro de dois meses. “As

perguntas têm sido muitas, numa

altura em que estamos próximos

do ‘swich-off‘, o que é preocu-

pante”, acrescenta o técnico.

Por outro lado, o funcionário da

Portugal Telecom (PT) Bluestore,

André Cabral, declara que "a in-

formação tem estado a escoar bas-

tante bem", mas defende que "as

pessoas se acomodam às operado-

ras que lhes dão uma maior aber-

tura de canais". Também o técnico

da DECO alerta para a situação:

"as empresas de serviços de televi-

são paga têm aproveitado a oca-

sião para impingir o seu produto

aos consumidores”, e garante que

“as pessoas vão ter que fazer a

transição para a TDT agora ou

quando deixarem de subscrever

esses serviços, por isso o melhor é

fazerem-no já”. António Alves sa-

lienta ainda que "as pessoas têm

direito a ter televisão gratuita".

Ao contrário do que se pensa, a

TDT pode trazer também alguns

problemas na transmissão. A qua-

lidade de imagem aumenta e “tem,

de facto, uma nitidez acrescida”,

admite António Alves. No entanto,

quando a intensidade do sinal es-

tiver fraca ou se situar numa zona

de refleção de sinal (em vales ou

rodeado por prédios muito altos),

“pode ocorrer uma interrupção da

transmissão do sinal ou a pixeliza-

ção de imagem”.

António Alves aconselha a po-

pulação a “verificar se está ou não

numa zona de cobertura de sinal

terrestre” e só depois passar para a

instalação do equipamento. Na

maioria dos casos, será apenas ne-

cessário comprar o aparelho des-

codificador e fazer a sintonia dos

canais. Porém, em raras exceções,

“poderá ter de haver uma mu-

dança da antena” por falta de pre-

paração daquele equipamento

para receber o sinal digital, explica

o funcionário da PT. O técnico da

DECO garante que “essa é uma si-

tuação que vai corresponder a

poucos casos”, mas que tudo isso

implica custos que podem ascen-

der a mais de duzentos euros, caso

haja mais do que um aparelho te-

levisivo na habitação.

TDT pode implicar despesas elevadas

Juliana Pereira

Anonymous – ‘hacking’ social

Camilo solDaDo

grupo Anonymous nas-

ceu em 2008 e debru-

çara-se, há pouco tempo,

com a ideia de terminar com o Face-

book - a rede social que agrega, se-

gundo estatísticas do próprio ‘site’,

cerca de 800 milhões de pessoas. 5

de novembro foi a data estabelecida

como meta para esse propósito,

como pode ser ouvido em diversos ví-

deos disponibilizados na plataforma

YouTube. A ideia, contudo, foi poste-

riormente abandonada “por existir

alguma discussão interna sobre

avançar ou não com a operação”, co-

meçou por referir ‘TheAnonMes-

sage’, nome pelo qual o membro do

grupo Anonymous deseja ser men-

cionado. “O Facebook é, hoje em dia,

o principal mensageiro de informa-

ção de todas as revoluções e movi-

mentos mundiais. Logo, se o ataque

acontecesse neste momento, seria

uma má mensagem por parte dos

Anonymous, a de que não nos preo-

cupamos com os protestos mun-

diais”, sustenta ainda

‘TheAnonMessage’.

Elísio Estanque, sociólogo do Cen-

tro de Estudos Sociais (CES) da Uni-

versidade de Coimbra, destaca “o

potencial que a Internet apresenta de

utilização bondosa, progressista, de

denúncia e maior transparência das

instituições; por outro lado, pode ser-

vir como uma estratégia de controlo

da vida privada de cada um”. Opinião

que fica patente quando ‘TheAnon-

Message’ declara que “o Facebook

está a usar a privacidade, vendendo

informação confidencial a governos

corruptos, como é o caso da Síria. Há

uma grande probabilidade que, após

a resolução de todas as pontas soltas

no mundo, possa haver um ataque

em grande escala ao Facebook, como

forma de dizer que estamos aqui e de

que estamos atentos.” Os últimos co-

municados dos Anonymous apontam

essa mesma investida para 2012.

Atacar os males da internetMas nem só do Facebook vive a in-

ternet. “A rede está disponível, pelo

menos em potência, para grupos neo-

nazis, de extrema-direita, ou de pe-

dofilia”, acrescenta Elísio Estanque.

E a ‘Operação DarkNet’, lança-se

também para esses problemas. Em

outubro, o grupo internacional en-

cerrou 40 sítios de pornografia in-

fantil, expondo cerca de 1500

pedófilos. ‘TheAnonMessage’ asse-

vera que “os Anonymous pretendem

dar um exemplo: expor um molesta-

dor faz com que haja menos um pe-

dófilo na internet e menos uma

pessoa a abusar de crianças”.

Quando se fala nos Anonymous,

pensa-se numa estrutura altamente

organizada. Contudo, a realidade é

outra, como nos mostra ‘TheAnon-

Message’: “nós funcionamos como

uma organização descentralizada,

sem líder. As ideias surgem através

dos vários membros e são partilha-

das através do IRC (Internet Relay

Chat, um protocolo de comunicação)

ou comunicados públicos”, explica,

afirmando que as más ideias acabam

“simplesmente por morrer”. “Se és

um Anonymous, acreditas em liber-

dade, justiça, igualdade, discurso

livre e exclusão de censura”, aponta

o membro do grupo ativista como

fundamentos da organização.

Apesar dos ideais pelos quais os

Anonymous se pretendem reger, o

grande público pode ter uma perce-

ção distorcida destes “hacktivistas”,

nome pelo qual preferem ser intitu-

lados. O membro do grupo refere que

“qualquer coisa dita sobre nós é pura

especulação, como foi o caso da FOX

(canal televisivo norte-americano),

que nos apelidou de demónios e ci-

berterroristas”.

‘Hacktivismo’“Há determinados grupos que se es-

pecializam e se aperfeiçoam em do-

minar os instrumentos que permitem

aceder a sítios e plataformas protegi-

dos”, afirma o sociólogo do CES, re-

ferindo a Wikileaks como um

exemplo óbvio. A associação dos

Anonymous com esta organização in-

ternacional levou a algumas baixas

entre os membros, presos por sus-

peita de ligação aos ataques à PayPal

e à Mastercard, entre outras empre-

sas. TheAnonMessage encara esta si-

tuação como “um sacrifício do

coletivo. Todavia, o nosso apoio à Wi-

kileaks continua e queremos que as

pessoas entendam que a cadeia é

para criminosos, não para hacktivis-

tas que querem devolver direitos às

pessoas”.

Ainda na memória recente estão as

insurreições no Magrebe, com revo-

luções em países como a Tunísia,

Egito e Líbia. ‘TheAnonMessage’

considera que “os Anonymous, jun-

tamente com outros grupos, funcio-

nam como primeiros

impulsionadores da mensagem, atra-

vés da internet. Depois, o encerra-

mento desta pelos governos, que

mostra haver algo a esconder, levou

as pessoas para a rua”.

No final da conversa realizada via

Skype, retém-se uma das frases de

TheAnonMessage: “seremos sempre

a faísca que acende o fogo do conhe-

cimento”.

Com Filipe Furtado

o grupo internacional Anonymous lança-se na internet numa luta contra os problemas sociais e pela liberdade de direitos. Rótulo? "Hacktivistas", respondem para quebrar ideias erradas do público acercada sua atividade, dos seus propósitos e da forma como o fazem. Por Paulo Sérgio Santos

A organização descentralizada do grupo luta contra problemas sociais e pela liberdade de direitos

Oolga jUskiewiCz

Page 16: Edição nº 236

16 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

PAís

Sem conceber, Portugal perde geraçõesA população mundialnão cessa de aumentar,mas Portugal regista amenor taxa de fertilidade desde há trêsdécadas. Habitantes comvida mais longa serão o futuro

Vir ao mundo significa deixardescendência, renovar gerações epropagar a humanidade. No en-tanto, a população portuguesacontraria esta necessidade e o nú-mero de nados vivos que nasce nopaís é cada vez menor: nos próxi-mos quatro anos, Portugal vai sero país com a segunda pior taxa defecundidade em todo o mundo.“Não asseguramos a substituiçãode gerações desde 1982”, afirma aespecialista em demografia Cris-tina Sousa Gomes. Tal poderá, alongo prazo, significar a dispari-dade entre faixas etárias, comuma população mais envelhecida:“progressivamente vão existirmais pessoas de idade e menos jo-vens na sociedade”, sustenta a do-cente da Universidade de Aveiro(UA).

Nas últimas três décadas, a ten-dência de decréscimo manteve-se.Se o valor médio para garantir arenovação de gerações é de 2,1 fi-lhos, “em oitenta e noventa, o in-dicador reduziu-se até 1,49crianças por mulher”, sendo que,entre 1995 e 2000, veio a verifi-car-se “uma ligeira recuperaçãopara 1,56” e, no ano de 2009, atin-

giu-se o valor de 1,39, resume aresponsável pelo serviço de comu-nicação do INE, Isabel Silva. Pararecolher dados indicativos destaprogressão, o Instituto Nacionalde Estatística (INE) apura, combase nas Conservatórias do Re-gisto Civil, “o número de nadosvivos por cada 1000 mulheres”.“Os dados são enviados de formaeletrónica”, explica Isabel Silva, eo Índice Sintético de Fecundidadeé a ferramenta utilizada paramedir a oscilação demográfica.

Condicionantes da baixa fecundidade“A dinâmica populacional inter-fere na contração da economia”,analisa a secretária geral da Asso-ciação Portuguesa de Famílias

Numerosas (APFN), Ana Cid.Contrariando o convencional, asfamílias numerosas são um con-tributo importante para a renova-ção de gerações, pois o número defilhos é maior. Todavia, tambémelas estão a diminuir: “não só sen-timos, como é um facto compro-vado pelos dados do últimoCensos”.

Como lamenta a secretáriageral, esta é uma situação que sedeve “às penalizações que existemsobre as famílias numerosas commuitos filhos a cargo”. Existem

“despesas essenciais como a ne-cessidade de uma casa maior ou ocálculo da água por escalões quenão entram na tributação ao Es-tado”, explica Ana Cid, que ga-rante ainda: “as mulheres queremter mais filhos, só não estão a terporque não podem”.

Já a obstetra da maternidadedos Hospitais da Universidade deCoimbra, Teresa Sousa Fernan-des, constata o contrário na suaexperiência. “As pessoas formadasnão estão motivadas para serempais porque têm outras opções devida”, afirma a obstetra. “princi-palmente gente que tem aspira-ções na vida e com uma maiorformação académica”. Para AnaCid a barreira económica é, aindaassim, a mais gravosa. Ressalvaainda uma outra, “a cultural”, poisnão se considera o nascimento decrianças como “a possibilidade deum futuro melhor, amanhã”. Dis-tingue ainda que, por vezes, “den-tro da própria família” seequaciona a chegada de um novomembro “como mais encargos,mais preocupação”. “Isso com-promete toda a nossa situação de-mográfica”, compadece.

Poderá descer mais?Em prospetiva, a especialista emdemografia da UA adianta que ataxa de fecundidade não descerámuito mais -“ já está tão baixa”,constata. É tempo de pensar emcomo será a pirâmide etária dopaís mais tarde, “um estreita-mento ao nível dos mais jovens”,mas salienta que o envelheci-mento da população não é neces-sariamente mau: “significa apossibilidade de ter as pessoas atémais tarde”.

Liliana Cunha

“As pessoas formadas

não estam motivadas

para serem pais

porque têm outras

opções de vida”

Ilustração de tIago dInIs

Resolver processos queenvolvam o corromperdo dinheiro públiconunca foi consensual,mas o poder público nãose pode elevar ao poder judicial

A imagem da administração pú-blica portuguesa tem sido abaladapor casos em que as figuras que acompõem são constituídas argui-das em casos de corrupção,fraude fiscal e desvio de capitaispúblicos. Existe a possibilidadedestas se recandidatarem aosmesmos cargos, não lhes sendoatribuída nenhuma penalização.Para o constitucionalista JorgeMiranda, “a condenação penalnão pode envolver uma restriçãode um direito fundamental comoo de se candidatar e ser eleito”. No

momento de votar, “o eleitor faz aavaliação do político não em fun-ção da sua conduta moral e doabuso que possa ter feito do cargopolítico, mas da obra que omesmo terá realizado” explica ainvestigadora do Centro de Inves-tigação e Estudos Sociológicos daUniversidade de Lisboa (ISCTE),Ana Maria Belchior. Dá comoexemplo “o cenário assistido re-centemente na Madeira com areeleição de Alberto João Jar-dim”.

É do senso comum a diferençaque existe entre alguém que éconstituído arguido e alguém con-siderado culpado: “a Constituiçãodeclara todo o arguido inocenteaté transito em julgado da decisãode condenação”, lembra JorgeMiranda. No entanto, refere tam-bém que a condição de culpado“não deveria impedir que o ar-guido condenado seja preso”, ha-vendo até a hipótese deabsolvição no final com “direito aindemnização”. Isto serviria para

que não houvesse “recurso a milexpedientes processuais” e paraque se “valorizasse o tribunal deprimeira instância”. Quanto aossetores das contratações e das ne-gociações, a investigadora doISCTE considera que “há umaimagem de pureza na condutaética”. Apesar de não “grassar acorrupção” na Administração Pú-blica, há setores em que “esta as-sunção não é propriamentenova”. Acrescenta ainda que “hátodo um historial que se temvindo a consolidar”, devido à“falta de mecanismos de vigilân-cia e de fiscalização, assim comoa incapacidade de por vezes fazerfuncionar o sistema de punição”.Esta falha acaba por funcionar“como estímulo”.

Recursos no processopenal Para o professor de Direito Pro-cessual Penal da UniversidadeNova de Lisboa (UNL), FredericoCosta Pinto, a libertação ou o não

cumprimento das penas como re-sultado do recorrer do processopenal “não é problema das figurasda administração pública”.

“Os casos têm uma maior co-bertura mediática e aquilo que éuma árvore é tomada pela flo-resta”, explica. Costa Pinto evocaas “centenas e centenas de pro-cessos que terminam pelo país eque as penas são cumpridas”. Elu-cida que “o que se passa é que ar-guidos de elevado estatutosocioeconómico têm possibili-dade de contratar escritórios deadvogados que conseguem susci-tar mais problemas ao término doprocesso”. Tal, deve-se, segundoo mesmo, à postura “mais agres-siva” desses escritórios. O recor-rer da decisão do processo,condição a que todos os arguidostêm direito, tende “a modificarum pouco as penas concretasaplicadas”. Esta alteração “deveser vista” como o “bom funciona-mento do sistema”, já que, as de-cisões dos tribunais superiores

“podem estar erradas e devem sercriticadas”, de modo a fazer-se“boa justiça”, explica Costa Pinto.A possibilidade de recorrer a vá-rias instâncias pode ter o “pressu-posto implícito de que as pessoasdeviam ser responsabilizadas deforma mais severa”.

“Não podemos substituir umajustiça de tribunais por justiça deopinião pública”, atenta o docenteda UNL. A reflexão pública decasos de corrupção dentro do Es-tado pode atingir níveis de con-testação elevada, mas, numestado de direito, “a responsabili-dade criminal é atribuída pelostribunais”. Para se desfazeremequívocos, há que reconhecer adevida importância às instânciasjurídicas para se saber “em quebase se decidiu e com que ele-mentos, então aí poderemos verse havia razão ou não para baixara pena”, esclarece Frederico CostaPinto.

Com Liliana Cunha

Opinião pública não substitui justiça nos tribunais

Joana Castro

Page 17: Edição nº 236

8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 17

Vive-se, no momento atual, uma conjuntura de crise, na qual toda a informação é pertinente e necessáriapara se exercer o conceito de cidadania.Plataformas como Puzzled By Policy surgem para ajudar. Por Maria Garrido

revisto em instrumentosinternacionais como a De-claração Universal dos Di-reitos Humanos, o direito

à informação “é indissociável da li-berdade de opinião, que é o seu fun-damento, e exige concatenação àgarantia de objectivismo e plura-lismo”, sublinha a professora de Di-reito Constitucional da Faculdade deDireito da Universidade do Porto(FDUP), Luísa Neto.

Entendendo o sistema informa-tivo como “suporte da ação políticae do diálogo” entre os órgãos dopoder e os cidadãos, e a sua difusão“essencial ao conhecimento econó-mico-social”, a docente defendeainda que “a possibilidade de acessoà informação deve ser igual paratodos, devendo pertencer à socie-dade e em seu nome ser exercida”.

“Informar os cidadãos com as car-tas todas, acho que é imperioso”.Quem o diz é a professora de Socio-logia da Comunicação da Universi-dade da Beira Interior, Antónia doCarmo Barriga. Considerando que ainformação tem “sobretudo umvalor social muito elevado”, a do-cente relaciona a questão com o con-ceito de cidadania: “se quisermos sercidadãos por inteiro, temos que estarinformados”. “É uma questão de ci-dadania e também uma questão deeconomia pessoal”, acrescenta. Jó-natas Machado, professor de Direitoda União Europeia da Faculdade deDireito da Universidade de Coimbra(FDUC), consolida esta acepção, aoafirmar que “sem informação sepode perder a cidadania”, tornando-se o “cidadão em súbdito”.

Cidadania e democraciaparticipativa Assim, para o indivíduo poder conti-nuar a ser cidadão e a agir como talnum sentido mais participativo, háuma necessidade de informar e es-clarecer. Mas estes atos não podepartir apenas dos media. Devempartir, também, da própria iniciativado cidadão em procurar essa infor-mação: “é preciso que as pessoasqueiram ser esclarecidas e que,aqueles a quem compete esse escla-recimento, esclareçam bem”, asse-

vera o professor de Direito Comuni-tário da Faculdade de Direito daUniversidade de Lisboa, FaustoQuadros. No entanto, Quadros acre-dita que um dos entraves pode ser a“falta de informação e a informaçãoerrada” a que acedemos.

“A aquisição destas competênciasde informação é um dos pré-requisi-tos para uma cidadania activa ecompleta: hoje, de facto, «saber époder» ”, completa Luísa Neto.Sendo “os meios de comunicação asveias e as artérias, as informaçõesque estes facultam devem ser abran-gentes, diversificadas, críticas, fiá-veis, justas e de confiança”, conclui.

Na atual situação de crise, onde ademocracia parece, também, dealgum modo, afectada por esta con-juntura, Jónatas Machado afirmaque “se vive uma crise democrática,no sentido de que não basta existirinformação”. Para o professor, “porvezes o problema não é a falta de in-formação”, mas o facto de os cida-dãos não serem dotados de meios deacção: “informar sim, mas tambémdotá-los de meios para agir, desig-nadamente quando se verifica que asinstituições que deviam proteger osseus interesses não protegem”. Sepor um lado “os sistemas de obten-ção de informação, de acountability

[responsabilização], de prestação deinformação e de exigência dessa in-formação falham”, por outro “tam-bém é verdade que por vezes aquelesque deviam ter agido com base nainformação disponível, não agiram”,refere.

Para Fausto Quadros, não se viveuma crise democrática. “Não direique estamos a viver uma crise de-mocrática; direi antes que a demo-cracia está a ser posta à prova emmomentos de crise, e é nestes mo-

mentos que a democracia mostra oseu valor e a sua força”, acredita oprofessor. “Nos tempos que correm”,alerta já Antónia do Carmo Barriga,“não convém estar-se desatento”.Para a docente é “fundamental”haver “interpretação, debate e parti-cipação cívica”, bem como é “umdever de qualquer cidadão ser parti-cipativo e activo, envolver-se nos as-suntos da Sociedade: é umaobrigação”, lembra.

Como tal, há consequências queemergem da falta de esclarecimentosobre as medidas que são tomadas eque nos governam. Falta de esclare-cimento que resulta, diz Fausto Qua-dros, nas “opiniões disparatadas eerradas sobre a crise e não sermoscapazes de a ultrapassar”. Tal comodestaca Luísa Neto, “a comunicação– entendida como um debate ani-mado e civilizado entre cidadãos – éo elemento vital da democracia”.

Puzzled By Policy Corroborando a ideia inicial de que oacesso à informação deve estar dis-ponível a todos, surge um projectointitulado “Puzzled By Policy”, fun-dado com o suporte da ComissãoEuropeia no âmbito do Programa deApoio à Política de TIC. Liderado

pela National University of Ireland,Galway e constituído por um con-sórcio de 12 parceiros em nove paí-ses europeus (onde entra Portugalcom a Agência LUSA), o projeto“tem como objetivo principal forne-cer a todos os cidadãos europeus, in-dependentemente da suaalfabetização ou conhecimentos tec-

nológicos, uma atraente e simplesplataforma de participação nasquestões políticas atuais, com espe-cial enfoque na questão da imigra-ção”, refere a responsável por parteda agência portuguesa, TeresaGomes.

No comunicado de imprensa en-viado pela agência, podemos encon-trar o propósito desta iniciativa faceà “situação preocupante” que é a “di-ficuldade de acesso e utilização deinformações, recursos e ferramen-

tas, para o cidadão médio da UniãoEuropeia (UE) ”. “Os governos reco-nhecem hoje que, para realizarempolíticas públicas eficazes, precisamde encorajar a participação do cida-dão e da comunidade em geral noprocesso de decisão política”, explicaainda o mesmo comunicado.

A plataforma propõe-se então “en-frentar o défice democrático, combi-nando conceitos e tecnologias departicipação eletrónica, totalmentetestados”, trabalhando a redução da“complexidade da elaboração de po-líticas e processos legislativos, anível da UE, e capacitando os cida-dãos no processo de decisão polí-tica”. A coordenadora do projecto,Deirdre Lee, justifica que a “eParti-cipation não pretende substituir osmodos tradicionais de participação,mas sim complementá-los para faci-litar uma inclusão mais ampla”.

Deirdre Lee acredita que “a plata-forma pode encorajar uma maiorparticipação através do forneci-mento de uma política de informa-ção, da facilitação de um discursoinformativo entre as partes interes-sadas e da capacitação dos cidadãospara se tornarem mais ativos nacriação de modelos políticos”.

Com Diana Teixeira

P

O sistema informativo age como “suporte da ação política e do diálogo” com os cidadãos, afirma Luísa Neto

“Informar oscidadãos comas cartas todas”

MarIa garrIdo

Mundo

O direito à

informação é

consagrado em vários

instrumentos

internacionais

A cidadania e a

informação são dois

conceitos

diretamente

relacionados

Page 18: Edição nº 236

ArteS18 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | terça-feira

cinema de horror temsido caracterizado poruma falta de originali-

dade crónica, compensada apenaspor alguns artifícios que, de formaesporádica, resultam, mas quetêm sido levados até à exaustão.exemplo disso é o estilo câmarana mão, onde somos voyeurs davida captada pelas próprias mãosdas personagens principais.

exemplos de uma boa execuçãodeste estilo contam-se pelos dedosdas mãos. ruggero deodato des-poletou este engenho com o filmeholocausto canibal, em 1980, echega a ser estranho que só maistarde, no final dos anos 90, é quea febre tenha pegado com o jáclássico Projecto Blair Witch, dedaniel myrick e eduardo Sán-chez. A partir daí, o género foi-sereinventado com poucos casos desucesso, como cloverfield, onde seintroduziu o elemento “monstrogigante ataca cidade” e a produçãoespanhola [rec], que traduziu deforma exímia a sensação de claus-

trofobia associada ao género“zombie”.

Actividade Paranormal foi umsucesso nas bilheteiras, em parteporque Steven Spielberg viu ofilme e decidiu investir, não só nadistribuição, mas também na pro-dução de um novo final, franca-mente mais fraco que o original,mas que deixou em aberto a pos-sibilidade para sequelas. Foi issoque aconteceu. Um filme que viveem torno da tensão e dos poucos,mas memoráveis, momentos desusto, transformou-se num fran-chise de sucesso destinado a umaestreia por cada dia das Bruxas.

este ano estreou Actividade Pa-ranormal 3 e, espantem-se, é umaprequela dos dois filmes anterio-res. Aqui, a acção decorre em1988 e podemos assistir ao desen-rolar dos eventos que levaram àmaldição das irmãs Katie e Kristirey. É sem dúvida um festival desustos, ideal para um momentobem passado no cinema, mas queperde em suspense. Aquilo que

funcionou no primeiro filme, eque foi aqui completamete postode parte, é o facto de não termosde ver tudo. As câmaras não têmde ser omnipresentes e estar sem-pre no local da acção, isso acon-tece em Actividade Paranormal 3e desafia todo o propósito de es-tarmos confinados a uma câmaracaseira. Apesar de um final re-compensador, acaba por dar de-masiadas respostas a algo queganha com o factor “desconhe-cido”. Se queriam oferecer res-postas talvez não fosse má ideia ouso de uma narrativa convencio-nal.

As interpretações estão bastanteacima do esperado, especialmenteda parte das duas jovens actrizes,que nos convencem na perfeiçãoque existe uma entidade desco-nhecida a acompanhá-las.

Um filme de emoções fortesmas lamentavelmente fáceis. me-morável apenas para quem nãoestá regularmente exposto ao gé-nero.

Actividade paranormal 3

Cin

em

a

Actividade paranormal a mais

CríTiCa de josé sanTiago

de

Henry JooSt

Ariel ScHulmAn

Com

cHriStopHer nicHolAS SmitH

lAuren Bittner

2011

amília, mulheres, Áfricae vergonha. Algumas pa-lavras que regem este

filme de Oliver Schmitz, um reali-zador sul-africano que se preo-cupa, mais uma vez, em levar parao grande ecrã os problemas dacomplexa sociedade do seu país. Oenredo desenrola-se numa pe-quena vila nos subúrbios de Joa-nesburgo e gira à volta de chanda,uma promissora pré-adolescenteque tem como única preocupaçãoos estudos. A situação muda dras-ticamente quando morre umairmã mais nova e chanda se vê emapuros para evitar a desagregaçãoda família. A jovem, aparente-mente imune a sentimentos, ébastante madura para a idade queleva. À morte da irmã, junta-se oalcoolismo do padrasto, a prosti-

tuição da melhor amiga e a doençada mãe.

com excepção de chanda, tem-se a sensação de que paira pelo arum grande vulto de ignorância, fo-mentado pelo medo e pela incom-preensão. A mãe, atingida pelaSidA, chega a visitar um falso mé-dico. chanda insiste que ela sedeve deslocar ao hospital, mas avergonha faz com que permaneçaem casa. O problema, para alívioda comunidade, é parcialmenteresolvido pela vizinha mrs. tafa.com recurso a uma vidente, estaconvence lillian, a mãe dechanda, de que a sua casa estáamaldiçoada e que deve partir. Acasa e os dois irmãos mais novosficam ao cuidado de chanda, que,nada convencida com as históriassobrenaturais, faz todos os esfor-

ços para encontrar a mãe e desco-brir a verdade. Schmitz, que atéaqui tinha tornado esta películafortemente emotiva sem ser sen-sacional, acaba o filme com umgrande cliché à hollywood.chanda consegue trazer a mãepara casa e miraculosamente re-verte as opiniões dos vizinhos emseu favor. O que num instante erauma multidão enraivecida dis-posta a apedrejar a jovem passapara um pacífico coro religioso.

contudo, isso não estraga ofilme. mostra-nos mulheres, luta-doras, que enfrentam os precon-ceitos e o ostracismo de umacomunidade que outrora lhes foiamigável para simplesmente semanterem juntas como uma famí-lia.

Schiuu!

a Vida, acima de Tudo”

joão Valadão

“ O

F

ve

r

Artigo disponível na:

filme

De

Oliver Schmitz

eDitora

PriSvideO

2011

Page 19: Edição nº 236

FeitAS8 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 19

orna-se praticamenteimpossível falar deAllen halloween sem

fazer menção ao álbum que veiodar um abanão ao rap português,no ano de 2006. Sem que nada ofizesse prever, Projecto maryWitch deu início a um fenómenode culto nacional só comparávela dealema e valete. A expecta-tiva sobre um próximo disco queseria aquele de Janeiro, deAgosto, do dia das Bruxas e atédo Natal, foi fugindo semprepara as mesmas datas do ano se-guinte.

contudo, não é propriamentefácil escutar a Bruxa. Qualquerdesculpa serve para não se gos-tar, desde a voz cavernosa aoritmo lento, passando pela du-reza do conteúdo, sem nunca es-quecer algum défice napós-produção e/ou no processode gravação.

É um álbum que vale mais pelaenvolvência do que pela perfei-

ção. As batidas são negras, ora espelham o terror, ora a expec-tativa angustiante de um qualquer filme de suspense. houveuma evolução clara e a diversidade na produção é evidente. em“O Ódio”, parecemos regressar a Augustus Pablo; em “O con-vite”, é distinta a forma como o tema ganha força pela junção dobaixo em conjunto com as teclas; “hora de Ponta” transporta-nos para um ambiente de perseguição citadina com os ecos e asbackvocals tão característicos.

A lírica é forte, Allen relata o quotidiano, é um storyteller natoe, apesar da dureza das palavras, a mensagem não é de todo ne-gativa. trata-se de uma espécie de “ouve o que eu vi, não quei-ras o que eu vivi”, reforçada pelos seus “tropas” Johnny Ganza(já falecido), Buts mc e Ka tha Brabo bem como Psydin Ató-mico, J-cap e lord G. O ponto negativo do álbum prende-se nanova abordagem aos refrões feita por halloween. O estilo maiscantado não abona a favor e o exemplo disso é o tema “crazy”,talvez dos piores do artista.

É imperfeito, é duro, é sujo mas é real. Precisa de ser ouvidode olhos fechados pois esta realidade é a deles, não a nossa.

solidão ainda almejava na-quela casa ao pé da praia.Ali, alguém vivia sozinhocom um boneco de boca

traçada por botões vermelhos. O bo-neco era o filho que crisóstomo, aos40 anos, desejava ter. Sentia-se ape-nas metade do que era. A força doseu desejo de paternidade faz comque vá à procura. camilo, rapazinhofranzino que tinha perdido o seu avô,encontra-o. tão naturalmente comonasce o dia, camilo e crisóstomoeram pai e filho. Já isaura era a mu-lher que diminuía, vivia sentindo-semenos que os bichos do quintal.isaura encontra crisóstomo. e ca-milo ganha uma mãe. O Antoninoera maricas. Ao falar, parecia emanarflores. dizia as palavras certas, masera profundamente rejeitado. A suamãe, matilde, acreditava que deveriaodiar o seu filho. Pensa que errou. Aanã tem uma história que comove efacilmente identificamos com situa-ções conhecidas. A prontidão comque todos a ajudavam não nascia dagenerosidade que classifica as almascristãs, mas sim de um desejo de des-graça alheia que secretamente oscilana mão dedicada.

mas não esqueçamos o preconceitohomossexual. Passando-se o enredonum meio rural, observamos a cons-trução de uma imagem repleta demitos que não detêm vestígios de ló-

gica e facilmente se tornam saberesuniversais.

As personagens apresentadasnesta obra acabam por se encontrar ecomo peças de um puzzle, comple-tam-se. Juntas, tornam-se felizes. Aindolência que percorre os senti-mentos mais tristes pode ser confun-dida com auto-comiseraçãopermanente. Porém, já FernandoPessoa nos dizia que o homem é umser descontente. Sentir-se apenas“metade do que se é” é comum. Nasua obra, O filho de mil homens, val-ter hugo mãe não deixa escapar aspequenas coisas que nos impedemde ser mais essa metade. com umolhar sensível, ao longo de páginasonde a simplicidade impera, o autorconta-nos a história de pessoas tam-bém simples. mas nada de confu-sões: a simplicidade não é sinónimade pobreza. Através desta obra per-cebe-se como não são necessáriascomplicadas peripécias para cons-truir um enredo envolvente. Aqui,clama-se pela atenção do leitor paraas peculiaridades da vida. com umfinal que satisfaz todos os desejos defamília e felicidade, compreendemoscomo as mentes humanas se ocupamde coisas insignificantes e como semantêm lutas para procurar aquiloque pode estar a um mero passo dedistância.

oje em dia, nem mesmo vi-deojogos maiores são capa-zes de nos presentear cominesperadas formas, de tão

cristalizado se tornou o vocabulário vi-deolúdico; um pequeno relance é agorasuficiente para caracterizar uma obraaté ao seu mais intimo detalhe. “Nier”carrega esse fardo em peso ao assumir-se como pastiche, parecendo meraobra de carácter copista. Se fosse qua-dro, teria em foco uma cena tirada aregra e esquadro dos beat’em ups deKamiya (“Bayonetta”), simplesmentedesprovida do carácter genial e trans-gressor neles; à sua volta, um enqua-dramento estrutural de “zelda”ortodoxo, mas sem a elegância carac-terística de miyamoto; e como pano defundo figurativo algo como uma nar-rativa J-rPG com marca de qualidadeSquare enix, embora na base deenorme influência temática e estéticade Fumito Ueda. Ficando-nos por aí nanossa análise, descartaríamos “Nier”como produto inferior e derivativo, in-digno de posterior reflexão.

mas o jogo está para além de tais re-preensões pois demonstra conhecer aessência das suas apropriações,usando-as quer como forma de elevarcontextos dramáticos, quer como viapara um meta-discurso humorista

onde brinca com a memória de títulosmatriciais como “Advent” ou “residentevil” para os elogiar e parodiar. Assim,a habilidade não se encontra nas infi-nitas apropriações em si mesmas (em-bora elas sejam sintomáticas de umincomum conhecimento histórico dogénero), mas na leveza com que Yokotaro (realizador) as usa como pedrasde toque para esconder a sua fealdadee depois abordar um tema sentido euniversal – o pai que busca salvar afilha de uma doença mortal – apesarde todo o artificialismo formal com queo esconde. É a bizarria constante quetorna a acção interessante e esta ape-nas é expressa através da sua capaci-dade para percorrer uma imensapaisagística de outros videojogos, re-sultando em convulsões estéticas, nar-rativas e mecânico-diagramáticasexcitantes e inauditas. mas é sempre ocoração e alma por detrás da subver-são de códigos de género e falta de ori-ginalidade que fazem com que “Nier”seja mais que uma mera inflexão sobreos caminhos do passado. Uma obraque por aparentar ser falsa acabou in-compreendida (foi o canto de cisne doestúdio), mas que não deixa ser bemmais genuína que a falsa originalidadeque a rodeia.

oUvir

de

VAlter Hugo mãe

ediTora

AlFAguArA

2011

de

HAlloween

ediTora

SonoterApiA

2011

Árvore Kriminal”

Carlos Braz

Artigos disponíveis na:

Ao filho de mil Homens”

rUi CraVeirinHa

niCole inÁCio

nier”

JoGar

pigmaleão

GUerra DaS CaBraS

A evitar

Fraco

Podia ser pior

vale a pena

A cabra aconselha

A cabra d’Ouro

ler

Fly nigga, Fly!

h

Ser mais metade

PlaTaforma

XBoX 360/pS3

ediTora

SquAre eniX

2011

t

Page 20: Edição nº 236

soLtas20 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | terça-feira

uma ideia PaRa o ensino suPeRioR

a equação da inovação: humanidades e ciências

J. noRBeRto PiRes • PResidente do conseLho de administRação do coimBRa iPaRque

Eles não sabem nem so-nham, que o sonho co-manda a vida, que sempre

que um homem sonha, o mundo pulae avança, como uma bola colorida,entre as mãos de uma criança”, diziaAntónio Gedeão na sua “Pedra Filo-sofal”. Eu acredito muito no poder daimaginação e da intuição. São facto-res distintivos que devem ser devida-mente considerados. O nosso

modelo de ensino considera es-

sencial a acumulação de conhe-

cimento específico, amemorização de informação, e umacerta tendência de análise rigorosa(“científica,” como dizem), muito for-mal e padronizada, em detrimento

do apelo à imaginação e à capa-

cidade de ver mais à frente. As

duas coisas são necessárias, e a

questão está em saber onde co-

locar o foco para que encontre-

mos o ponto de equilíbrio.

Albert Einstein é um excelenteexemplo. Jogou com a sua intuição ecapacidade imaginativa, e grandeparte das suas realizações mantêm-seválidas até hoje. Perguntava-se váriasvezes quando fazia determinadas su-posições ou avaliava certas teorias, seDeus seguiria aquele caminho. JamesMaxwell escreveu as equações funda-mentais sobre o electromagnetismo.E fê-lo em grande parte por intuição,para manter a simetria entre propa-gação da luz em matéria e no vazio,usando a sua capacidade de imaginarcomo deveria ser. Nicola Tesla, paramim o maior inventor de todos ostempos, imaginou como poderia co-mandar à distância e como criarrobôs. E com isso nasceu a “tele-au-tomática” e foram realizadas expe-

riências inovadoras de tele-robótica.O obsessivo John Nash ficava horas aolhar para quadros e paisagens, comose estivesse a imaginar ou a ver maisalém, e depois escrevia as suas ideiase propostas. Steve Jobs imaginou umnovo mundo e das suas mãos saíramalgumas das peças de engenhariamais inovadoras dos últimos 100anos.

O que fazemos é uma mistura deimaginação, intuição, intelecto

e trabalho, muito trabalho.

Todos os que hoje reconhecemoscomo génios tinham estas caracterís-ticas. Davam muito valor à imagina-ção e à intuição, tanto ou mais valordo que davam à inteligência, e traba-lhavam muito, incansavelmente.

A equação da inovação tem,

portanto, de ter estes 4 elemen-

tos. Mas em que medida?

Hemingway escreveuum livro fabulosochamado “Ovelho e o Mar”.Nele o velhoSantiago, quenão pescava umsimples peixe há84 dias, tinha nosmagníficos olhosazuis o brilhod e

querer apanhar o maior peixe da suavida. Mesmo muito cansado, com umbarco a cair de podre, e a vela remen-dada. E conseguiu, ganhando de novoo respeito de todos. E nós viajamos aCuba com ele. O Principezinho, deSaint-Exupery, descobriu que afinalmais importante do que navegar, vere desvendar novas realidades, é im-portante descobrir o valor das coisase das pessoas, e que isso exige tempo.

A Universidade de Coimbra temestas valências todas e pode realizar,com os seus alunos, a fórmula da ino-vação. É uma universidade clássica,devia explorar esta sua mais-valia.Nenhum aluno de ciências ou enge-nharia deveria poder concluir o seucurso sem estudar a história dasideias, sem ter conhecimentos musi-cais de alguma valia, sem falar de li-teratura com alguma profundidade,ou sem ter um curso de escrita cria-tiva. São estímulos à imaginação e àcriatividade que me parecem essen-

ciais. Nenhum aluno de humanida-des deveria poder concluir o seucurso sem falar de matemática, fí-sica, discutir a história do pensa-

mento científico ou estar numlaboratório a resolver um problemaprático.

Faríamos uma autêntica

revolução se trabalhás-

semos mais na

fronteira entre as

humanidades e

as ciências:

porque é lá

que mora a

i n o v a ç ã o .Sejam arroja-dos nos curri-cula.

o amaRe(Lamento) do PRato sociaL

Fito a montra de mãos que reviram as distintas mesclas aritmo mecanizado. Recolho o prato dianteiro, como quemnão espera melhor que o aceitável - o trágico discernimentoque mais tarde vim a raivosamente lamentar. Após o recos-tar cómodo no assento, arrasto a pequena malga, meia vaziade caldo. Sorvo sofregamente a mistura aguada, que graças adeus vem quente, fazendo escorregar as pequenas víscerasde esparguete, a compensar a mígua de ingredientes da so-lução, que se derrama ligeiramente pelo canto da boca. Aca-bada, agora sim, preparo-me para o mata-bicho. Mirofixamente a mixórdia. Um empadão acompanhado de saladatimidamente temperada a azeite. Não será assim tão mau.Manejei os talheres, procurando o melhor ângulo para abor-dar o bloco ressequido, que deixava adivinhar a sua estadiaprolongada em stock. Trespassei a dura carapaça, cujo inte-rior desvendou o recheio de batata mole, tragicamente con-

jugado com a enorme porção de legumes. As aparências iludem. Aamálgama contorceu-se entre os maxilares, revelando o doce do milhoe da cenoura, a frescura das ervilhas, e a cebola despropositada, que alíngua procurava incessantemente evitar. Meia ingestão serviu paracompreender que o hábito não ia atenuar vómito que, contudo, cum-priu a malfadada missão de me saciar. Benta a água que lubrificouvezes sem conta o canal que lentamente deixava deslizar a aberrantemistura. Desarmada de vida nas papilas gustativas, capitulei. Repou-sei a minha ténue esperança na pequena taça de maçã cozida, qual pa-pinha de bebé, que deixava adivinhar o seu manuseamento prévio.Desviei a atenção com o polvilhar da canela, e lancei-me vorazmenteao viscoso líquido. Salivei por mais, inconsolável ainda assim pela ca-rência de algo mais consistente.

Por Patrícia Cunha

tom

ai e

co

mei

inêS Balreira

aRte.Ponto

m foco de luz iluminava umacadeira vazia e uma guitarra.Senta-se uma mulher, faz-se

silêncio para melhor se ouvirem osphados que ela tem para cantar.Lula Pena regressa quase um anodepois ao TAGV, desta vez como 1ªparte duma sessão que seria con-cluída por B Fachada. Mas concen-tremo-nos agora na música de LulaPena. Uma voz rouca, sussurrante,inconfundível.

“Está aqui qualquer coisa que nãodeixa…”, confidencia ao público,quando tem de recomeçar a sua mú-sica. Lula queria proximidade, maso palco estava demasiado distanteda plateia. “Estão confortáveis?”,questionou, pouco antes de recome-çar a tocar. Apenas se escuta a gui-tarra e a voz, que transportam oauditório para outras paragens,onde nacionalidades e sonoridadesdiferentes se misturam. E para ter-minar a viagem da melhor maneirapossível chama ao palco o compa-nheiro que irá prosseguir a noite. BFachada senta-se ao piano para in-

terpretar o seu dueto com Lula Penaincluído no último registo da can-tora, Troubadour.

B Fachada não é só para meninos.E nesta noite, em particular, não foimesmo recomendado a meninos.Num concerto maioritariamenteconstituído por temas tocados aopiano, com espaço também para aguitarra (quando o concerto já iamais adiantado), o músico de Cas-cais canta sobre o amor, obsceno ouapaixonado, e pormenoriza a “Horada passa” - temas novos, que serãoincluídos no disco que será editadoperto do final do ano.

Quando pega na guitarra, alguémsugere que toque “Monogamia”. Bacede ao pedido. “É assim?”, ques-tiona ao auditório sobre a correçãodas palavras que ia cantando. Comletras irónicas e uma postura empalco descontraída, o artista arrancagargalhadas do público, que se deixacativar até pelos erros – “Atéquando me engano batem palmas!”– exclama, surpreso. E para quemnão aceita que se vá embora, como

uma certa senhora que abandonouo concerto. Talvez esperasse umoutro artista e se tenha irritado comum Fachada demasiado sincero, quereagiu com um honesto “Se pudesseia eu!”, após o fechar da porta.

Perto do final surgiram temas doregisto anterior “de Inverno”, queculminou num regresso de LulaPena ao palco para cantar em con-junto o “Barrigão”. A cumplicidadeentre os dois artistas foi bem evi-dente, sobretudo num encore abso-lutamente único: os músicosregressaram ao palco, onde ao pianoe guitarra recriaram um tema tradi-cional. Lula deu o mote, pedindo aopúblico para repetir os versos ”Noalto daquela serra está um lenço aacenar, está dizendo viva viva,morra quem não sabe amar”. Fa-chada no piano também cantou coma guitarrista, e o público respondeuao apelo da nova música portuguesaque também respeita e reinventa atradição, terminando assim da me-lhor maneira uma noite memorável.

Por Daniel Silva

uma noite de cumplicidade(s)Roque Beat #3 - B Fachada e LuLa Pena • taGV • 20 de outuBRo

Daniel Silva.

U

d.r.

Page 21: Edição nº 236

Já tinham terminado a refei-ção há algum tempo mas man-tinham-se sentados à mesa,

olhando para a televisão em silêncio.O noticiário abrira com pormenoressobre um novo caso de corrupção en-volvendo políticos e, logo de seguida,passara a antecipar e detalhar a fortepossibilidade de duas ou três agên-cias de rating descerem a notação dealguns bancos; eles ouviam, indife-rentes e apáticos, como se o que es-cutavam não tivesse nada a ver comas suas vidas (na verdade, não tinha)e apenas se mantivessem aparente-mente atentos porque não havia ne-nhuma alternativa melhor.

Então, por fim, ela levantou-se damesa e levou os pratos cobertos derestos de salmão para a cozinha, cam-baleando ligeiramente; ele deixou-seestar sentado durante uns segundosmas, de repente, acabou por se deci-dir a ir à casa de banho, onde lavouas mãos cuidadosamente, até sentirque extinguira o odor a casca de la-ranja. Quando ambos regressaram àsala (quase em simultâneo, o que nãodeixou de ser peculiar: se a compa-nhia do outro não era desejada, por-que não aproveitaram aoportunidade para se refugiaremnum qualquer recanto seguro dacasa?), ainda falavam de agências derating e aumentos de juros e possibi-lidades de falências na televisão. Eledeslizou para o sofá e deixou-se estar,imóvel e inerte, como se se prepa-rasse para se desligar do mundo (outalvez apenas da sua vida familiar),entrando numa espécie de hiberna-ção protectora; ela, por seu lado, re-colhia algumas migalhas acumuladasna mesa (migalhas dele, ela nunca to-cava em pão), uma a uma, com ex-cessiva e desnecessária concentração;e apanhava uma microscópica fibra

de casca de laranja (dele), que caíraao chão e fora inadvertidamente es-magada.

Quando ia a passar junto da televi-são (migalhas e casca de laranja bempresas na mão), ela parou e disse(sem o olhar):

– Espanta-me que nunca nin-guém se tenha lembrado decriar uma agência de ratingque se dedique a prever osriscos de falência dos casa-mentos. Que analise umarelação e diga: prevejo con-sideráveis riscos de incum-primento a curto prazo. Ou:na actual conjuntura, é al-tamente previsível que asexpectativas se deteriorem.

Ele continuou prostradono sofá, estático e silencioso,respirando devagarinho,com os olhos quase fechados;mas, ao ouvi-la, sorriu timi-damente, quase com gosto. Erespondeu:

– Uma escala que medisse orisco de falência dos casamentos,antes das pessoas se casarem? Tinha-nos dado muito jeito, não achas?

Ela, então, aproximou-se dele e es-tendeu a mão na direcção do seurosto, como se o fosse acariciar; masnão lhe tocou: limitou-se a abrir amão e deixar cair sobre o seu cabelodesgrenhado as migalhas (e a casqui-nha de laranja) que tinha recolhidona mesa. Ele abriu os olhos mas nãose mexeu, olhando-a com alguma cu-riosidade, com alguma surpresa, com(alguma?) vontade de se indignar; eela, quando percebeu que ele nem seiria dar ao trabalho de sacudir as mi-galhas do cabelo, suspirou em silên-cio (um suspiro interior,simultaneamente secreto e ostensivo)e marchou para a cozinha, onde ligou

a máquina de lavar louça e ficou à es-pera durante cinquenta minutos parade lá retirar dois pratos, quatro ta-lheres e um copo (os mesmos queiriam servir para o jantar do dia se-guinte, de todos os dias seguintes).

Após o divórcio, encontra-ram-se algumas vezes paratratar de assuntos práticos

relacionados com os resquícios – ofuneral, por assim dizer – do casa-mento (e também, mais secreta-mente, para se vigiaremmutuamente; para constatarem se ooutro não estaria demasiado feliz, de-masiado cedo). Curiosamente, acaba-vam sempre por rir (rir mesmo, comgosto e vontade, com prazer; juntos:como já não acontecia há anos)quando recordavam a expressão dojuiz perante a resposta deles à sua úl-tima questão; “e, já agora, de quemconsideram que foi a responsabili-dade por o vosso casamento não ter

resultado?”, perguntara o juiz. “Dasagências de rating, claro”, tinhameles respondido quase em coro (eporquê?, por que motivo tinhamdado aquela resposta imprópria e dis-paratada, em uníssono?). Riam e,pouco depois, despediam-se, um

pouco surpreendidos con-sigo próprios; algo

aliviados porperceberem

que, afinal,o outronão pare-cia assimtão feliz;algo em-baraçadospor teremrido (teriasido maisp r ó p r i od i s c u t i -r e m ? ) ,por terem

apreciadoesse riso

partilhado.E riso após riso, foram prolon-

gando o pós-divórcio, forçando umaaproximação ténue e artificial (obvia-mente inconsequente), acalentandouma indefinida e inconfessável (ob-viamente desesperada?) possibili-dade de regressão. Até que, certo dia,um deles (não importa quem) se in-teressou súbita e inesperadamentepor um – ou uma – colega lá do es-critório e tudo se precipitou: houveumas saídas e uns copos e umas gar-galhadas e uns toques e, por fim,umas fodas (umas valentes fodas); e,nesse momento, esqueceram-seagências de rating e juízes surpreen-didos e risos partilhados, esqueceu-se tudo. E a vida lá seguiu em frente,finalmente.

soLtas8 de novembro de 2011 | terça-feira | a cabra | 21

Risco de FaLência (Remixed) Por Paulo Kellerman micRo-conto

ia de Romaria da Festa dasLatas - o justiceiro solitáriodesce a avenida com a efígie

do ministro espetada numa lança.Certamente que tal metáfora é coisaque só fez sentido numa mente asso-berbada por consumo literário. Afi-nal, quem me garante que não setratava de uma procissão? Com estatimidez, ao transeunte distraído maisparece uma cruzada em prol dohomem que agravou a austeridadesuperior do ensino moderadamenteuniversitário?

Aquela carantonha era o estan-darte de uma tropa fandanga, umaorda mongol, que não conhece a lei ea ordem. Na sua marcha de terraqueimada, ocupa os dois lados daavenida. A praça, livre da acampadamunicipal, agora é para cortar a di-reito. Alguns há que atalham no ca-minho para a terra santa, cortandosenda pelos jardins, não sei se do há-bito, se para cumprir mais uma cape-linha na sua peregrinação.

Os infiéis atacam a coluna que vai

partida. Pelo meio lá aparecem coma sua politização! Não sabem quecada macaco deve ficar no seu galho?Que este não é momento para falardessas coisas sérias? O que vai pen-sar a minha mãezinha que me veiover descer a avenida, mais despidoque uma garota de uma escola desamba do carnaval da Mealhada,numa euforia ébria? Que eu virei umbolchevique? Ai dEUS nos acuda!

A fauna aqui é outra. Nasce da cria-tividade creacionista e anti-darwi-nista dos “doutores”. No génerofeminino, o magote consiste em vá-rios especímenes a cuja designação sepode acrescentar o sufixo “inho”, que,como diz a publicidade, é bem portu-guês. Joaninhas, ratinhos (!!!), leoa-zinhas, coelinhas – ou seja, qualquercoisa a que se possa ajuntar um parde orelhas e uma cauda. No géneromasculino, a matrafona é rainha e se-nhora, tradicionalmente uma apostaganha nas comemorações pagãs doEntrudo. Voltando ao início, é bicha-rada que é pouco dada à evolução, e

mais à preservação da espécie.Lá pelo meio, uns quanto engana-

dos, ainda trazem uns dixotes sobreo estado do país, sobre o ensino su-perior, enquanto enterram a dentuçano térreo nabo. Já há vacina contra aMononucleose? (lá vão os hipocon-dríacos a correr para a wikipedia)

Outros há, que equivocados sem

dúvida, pensam que aquele apetrechode alcova serve para pedinchar di-nheiro. Talvez tivessem ficado con-fundidos com a iniciativa simbólicada DG. Meus caros, desenganem-se,qualquer penico, por mais coloridoque seja, de plástico da toga ou por-celana das caldas, serve para mijar!

Olhando agora para a retaguarda,

vem lá o carro vassoura. Literal-mente. Tenta-se limpar por estas pa-ragens o que por outras se sujou. Ocandidato a carregador do pianoainda tem de se contentar com umlugar na cauda do pelotão. Os dafrente são roladores, já partem com avantagem de conhecer o terreno, ojovem aspirante é um trepador, naverdadeira acepção da palavra.

Não serão com certeza as latas queapanhou que se irão tornar no lastroque não lhe permitirá chegar aosprint final. Também desse lado hámuito veterano das clássicas, que jápor várias vezes foram ao controloanti-doping.

Enfim, Dom Quixote lá seguiu, pauno ar, contra os seus moinhos simbó-licos. Não leva escudeiro. Os sanchosde pança farta foram escorraçados apontapé. Outros virão para tomar oseu lugar. Também o Lone Rangertinha o seu Tonto.

*Por escolha do autor este texto

não segue as regras do novo Acordo

Ortográfico da Língua Portuguesa.

monumentais Panados sociaisPor doutorando Paulo Fernando • facebook.com/paulofernandophd

Drafaela Carvalho

the Lone RanGeR

natural de leiria, Paulo Kellerman,cedo se lançou para a escrita, cola-borando com pequenas histórias nosjornais diário de leiria, região de lei-ria e no suplemento dna do diáriode notícias. Cresceu a gostar de Paulauster, salman rushdie e Calvin &Hobbes. É nos contos que se ex-pressa e foi com eles que em 2005ganhou o Prémio de Grande ContoCamilo Castelo Branco, com o livro“Gastar Palavras”. das palavras quemais gasta conta “foder, angústia esexo”, coisa que o irrita profunda-mente – essa de gastar palavras. Fun-cionário público, Kellerman lança assuas reservas sobre o desejo de serescritor a tempo inteiro. “Trabalhopara isso, mas não digo logo quesim”. Para além da escrita, fez rádiodurante 12 anos e é um confessoapaixonado de música eletrónica. Ir-rita-se com o extremismo técnico delobo antunes e com o piloto auto-mático em que entrou saramago n’aCaverna ou n’o Homem duplicado.não tem pressa em escrever um ro-mance, continuando pelos contos,que normalmente publica no seu blo-gue agavetadopaulo.blogspot.com.o seu último livro intitula-se “Chegade Fado” e foi lançado em 2010.

João Gaspar

Paulo Kellerman • 37 anos

I

IIiluStração por ana Beatriz MarqueS

Page 22: Edição nº 236

opinião22 | a cabra | 8 de novembro de 2011 | Terça-feira

Cartas ao diretorpodem ser

enviadas para

[email protected]

8 de Novembro. Celebra-se o dia

mundial do Urbanismo. Temos por

hábito dedicar um dia, que apodamos

de mundial, a coisas que, manifesta-

mente, se encontram em posição de

desprezo, de desvantagem, ou de sub-

jugação excessiva. Assim, num con-

texto global marcado pela presença

insistente das guerras regionais, ce-

lebramos o dia mundial da Paz. Cele-

bramos o dia da mulher, dada a

condição de desigualdade de género.

Celebrámos em tempos o dia do ope-

rário, por se tratar de uma classe ex-

plorada e subjugada. Até chegamos a

celebrar o dia da Terra, para nos lem-

brarmos do desgaste que exercemos

sobre o planeta.

Neste caso, não é propriamente o

Urbanismo que se encontra debili-

tado, são as cidades. Ou, por outra, é

a incapacidade de o urbanismo tratar

o grave problema das cidades con-

temporâneas que o torna frágil, quase

inútil.

Onde radica essa incapacidade?

Radica, em meu entender, em duas

origens distintas, embora comple-

mentares.

Por um lado, o vazio programático

do poder contemporâneo. O Urba-

nismo sempre foi uma ciência ema-

nada do poder político, embora em

determinados momentos, anteriores

à crise de 1929, o tenha sido também

do poder económico. Dado o esvazia-

mento de conteúdos programáticos

firmes, os governos democráticos

contemporâneos, quer sejam locais

ou nacionais, tendem para a degene-

rescência da esfera decisória, ver-

tendo-a em gestos de mera

simulação, onde não há mais lugar

para a regulação firme e efectiva do

espaço urbano, para o Urbanismo.

Por outro lado, e agora tão na

moda, a instituição do “fim” da ci-

dade, profeticamente prenunciada

por teóricos oriundos de várias áreas

do saber, inclusivamento do próprio

urbanismo. Confrontados com o alas-

tramento das áreas metropolitanas,

difuso, irracional e irresponsável pelo

espaço que desperdiça e pelos gastos

infraestruturais acrescidos que gera,

os pensadores contemporâneos do

urbanismo preferem, ao jeito neo-li-

beral, encarar o problema como uma

“fatalidade” dependente do livre e li-

bertino funcionamento dos merca-

dos, de solos e imobiliário.

A cidade fica então entregue a si

própria e às suas vivências e culturas,

agora cada vez mais marginais. O seu

funcionamento deixa de ser inteli-

gentemente delineado e regulado,

passa a diluir-se no espaço metropo-

litano indiferenciado, tábula rasa di-

fundida a partir de um centro que

contem em si uma cidade, igual-

mente vazia.

Apesar disso, et pour cause, ainda é

possível pensá-la num sentido mais

global, concebê-la enquanto entidade

que, no quadro de determinados pa-

râmetros, se insinua como alternativa

sólida, credível e realista, ao fenó-

meno hegemónico e inelutável do

crescimento difuso. Sim, apesar des-

ses novos determinismos metropoli-

tanos, muito up to date, atrevo-me a

pensar que subsiste ainda uma enti-

dade, ontologicamente reconhecível,

que se inscreve numa matriz de con-

tinuidade histórica, a que continua-

mos, e continuaremos, a chamar

cidade. Os modelos a partir dos quais

podemos balizar essa entidade são

globais, embora deva reconhecer que,

para o que aqui nos interessa, são de

salientar aqueles que se identificam

segundo uma matriz de localização

geográfica centrada na bacia do Me-

diterrâneo, com especial incidência

na Europa do Sul. Há, contudo, por

toda a Europa, provas incontestáveis

de subsistência, e de florescimento,

de cidades de média dimensão, que

não se inscrevem em vórtices de ab-

sorção metropolitana e que se inse-

rem em redes de articulação, quer

com as suas regiões de influência,

quer com outros pólos urbanos con-

géneres. Não seria possível enumerá-

las, nem será necessário citá-las.

Visitamo-las, reconhecêmo-las e

identificamo-las a partir das suas es-

pecificidades culturais. Conseguimos

circunscrever os seus limites, en-

canta-nos a vida dos espaços públi-

cos, potenciada por consideráveis

índices de densidade populacional.

São mais fáceis de manter e mais ba-

ratas de infraestruturar que o espaço

peri-urbano difuso. Por isso, e pela

qualidade de vida urbana, insinuam-

se como uma incontestável alterna-

tiva à metropolitanização global.

Resisto, portanto, na consideração

da cidade como uma possibilidade,

como uma opção operativa. Fran-

çoise Choay considera que o urbano,

modelo cultural hegemónico, se des-

vinculou da ideia de espaço que lhe

estava associada e alastrou por todo

o território, provocando a morte da

cidade1. Por muito que nos deixemos

seduzir por esta ideia, é também im-

possível deixar de constatar uma rea-

lidade dinâmica e futurante, através

da qual um elevado número de cida-

des de média dimensão sobrevive e

floresce, sem serem absorvidas pela

voracidade metropolitana e sem se

insinuarem elas próprias como pólos

expansionistas. Para isso, muito con-

tribuem medidas políticas concerta-

das, quer de carácter nacional, quer

de carácter local, que fixam e clarifi-

cam autonomias e influências de ca-

pitalidade territorial e

administrativa, medidas que ajudam

a sobrevivência da centralidade ur-

bana, face à utilização indestinta do

território metrolitano periférico.

*Por escolha do autor este texto

não segue as regras do novo Acordo

Ortográfico da Língua Portuguesa.

*Docente do Departamento de Ar-

quitectura e investigador do Centro

de Estudos Sociais

não é propriamente o urbanismo que seencontra debilitado,são as cidades. ou, por outra, é a incapacidade de o urbanismo trataro grave problema dascidades contemporâneas

diA MundiAl do urBAnisMo - As cidAdes. soBrevivênciA e perenidAde de uMA AlternAtivA

josé António BAndeirinhA*

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A Cabra errou: Na edição 235, no

artigo “A Coimbra queirosiana re-

descoberta” é referido que Eça de

Queirós habitou a República Bota-

Abaixo. De facto, o escritor habitou

uma república que ficava ao lado do

que é hoje a Bota-Abaixo. Apresen-

tamos as nossas desculpas.

Page 23: Edição nº 236

OpiniãO8 de novembro de 2011 | Terça-feira | a cabra | 23

Secção de Jornalismo,

Associação Académica de Coimbra,

Rua Padre António Vieira,

3000 - Coimbra

Tel. 239821554 Fax. 239821554

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Diretor Camilo Soldado Editores-Executivos Inês Amado da Silva, João Gaspar Editoras-Executivas Multi-média Ana Francisco, Catarina Gomes Editores Inês Balreira (Ensino Superior), Ana Duarte (Cultura), Fernando SáPessoa (Desporto), Ana Morais (Cidade), Filipe Furtado (Ciência & Tecnologia), Liliana Cunha (País), Maria Garrido(Mundo) Secretária de Redação Nicole Inácio Paginação Inês Amado da Silva, Rafaela Carvalho Redação DianaLima, Diana Teixeira, Félix Ribeiro, Joana de Castro, Paulo Sérgio Santos Fotografia Ana Patrícia Abreu, Camilo Sol-dado, Daniel Silva, Felipe Grespan, Inês Amado da Silva, Inês Balreira, João Gaspar, Olga Juskiewicz, Rafaela CarvalhoIlustração Ana Granado, Ana Beatriz Marques, Tiago Dinis Colaborou nesta edição Mariana Santos Mendes, DanielSilva, Juliana Pereira, Mariana Neves Colaboradores Permanentes Carlos Braz, João Miranda, João Ribeiro, JoãoTerêncio, João Valadão, José Afonso Biscaia, José Miguel Pereira, José Santiago, Lígia Anjos, Luís Luzio, PedroMadureira, Pedro Nunes, Rafael Pinto, Rui Craveirinha Publicidade João Gaspar 239821554; 917011120 ImpressãoFIG – Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: [email protected] Tiragem 4000 exemplaresProdução Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coim-bra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, J.Norberto Pires, Serviços de Acção Social da Universi-dade de Coimbra, Paulo Kellerman

editorial

Uma QUestão de direito

ode parecer redundante mastorna-se inevitável voltar afalar de regulamentos deatribuição de bolsas e ação

social escolar (ASE) que, a par coma também já propalada asfixia fi-nanceira das instituições do ensinosuperior (IES), deveria estar notopo da lista de assuntos mais pre-mentes a tratar pelo Ministério daEducação e Ciência.

Depois de o decreto-lei 70/2010ter varrido uma parte significativadas bolsas de ASE (menos 12 mil anível nacional no ano letivo de2010/2011), o novo documento queregula a atribuição de bolsas parececlaramente insuficiente pois conti-nua a excluir estudantes com difi-culdades em encontrar recursospara a manutenção no ensino supe-rior (ES).

Posto isto, está em causa o direitoà liberdade de aprender, consa-grado na Constituição da RepúblicaPortuguesa. Para um ensino que sequer público, gratuito e universal,os últimos anos têm indicado o ca-minho contrário, com a exclusão dequem não tem possibilidades de su-portar os custos inerentes à fre-quência no ES.

É arrepiante a facilidade com quese encontra casos de quem congeloua matrícula na Universidade deCoimbra por não ter possibilidadesou teve que começar a trabalharpara sustentar a permanência. Che-gámos a um ponto em que os estu-dantes evitam ir comer às cantinaspor ser impossível suportar duas re-feições de dois euros e quarenta pordia, só para nomear um dos muitosexemplos de poupança.

É legítimo perguntar até queponto um estudante com este tipode necessidades consegue aguentaras despesas (alimentação, propinas,alojamento, viagens a casa, etc…)até meio do ano letivo sem lhe veratribuída a bolsa.

Com esta marginalização, o en-sino superior como degrau socialdeixa de existir, perdendo-se aoportunidade de melhoria de condi-ções de vida de uma camada da po-pulação portuguesa. É retirar ahipótese de formação no ensino su-perior a toda uma geração. Perde-seaqui também uma oportunidade dedesenvolver o país através da quali-ficação superior e, consequente-mente, alavancar a recuperaçãoeconómica.

Numa altura tão crítica em que sóagora os Serviços de Ação Social da

Universidade de Coimbra recebe-ram os dados do aproveitamentoescolar relativos ao anterior ano le-tivo, pode depreender-se que a con-clusão do processo de atribuição debolsas acontecerá novamente de-pois de janeiro.

Enquanto isto, a academia pareceandar mais entretida com o períodopré eleitoral e respetivas jogadas doque com os problemas efetivos queos seus sócios em maiores dificulda-des enfrentam. Mais do que esperarpor saber quem vai ser o eleito nodia 29 de novembro para ocupar acadeira da presidência, espera-seque o atual mandato cesse para quequem venha a seguir tome medidasrealmente eficazes no combate àssucessivas medidas negligentes einsensíveis tomadas pela tutela.

Camilo Soldado

É arrepiante a facilidade com que se encontra casos de quem congelou a matrícula na UC por não ter

possibilidades de sustentar a permanência“

P

Inês balreIra

Page 24: Edição nº 236

acabra.netRedação:Secção de JornalismoAssociação Académica de CoimbraRua Padre António Vieira3000 CoimbraTelf: 239 82 15 54

Fax: 239 82 15 54e-mail: [email protected]

Conceção e Produção:Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra

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Abrir e fechAr de cortinAs por Joana de Castro 200

x 100

Cortinas. De fumo, de fogo, de

água, de engano e de mentira.

Que nos abrem e fecham con-

forme a vontade de outrem.

Conforme a vontade de alguém

que não nos deixa arredá-las

para ver aquilo que é. Como se

vivêssemos com a realidade cen-

surada pelo abrir e fechar de

cortinas e de portas, de barrei-

ras à verdade a que todos nós

aspiramos conhecer, vencer e

ultrapassar. Como se vivêsse-

mos no centro da cebola e qui-

séssemos, desesperadamente,

sair para o lado de fora da casca.

Como se do lado de fora da ce-

bola não houvesse mais portas e

mais cortinas que abrem e fe-

cham e sobem e descem até ao

derradeiro cair do pano das cor-

tinas da vida.

Segundo o Plano Estratégico dos

Transportes, integrado na Secreta-

ria de Estado das Obras Públicas,

Transportes e Comunicações, até ao

final do ano as linhas ferroviárias

do Oeste e Vouga vão ficar suspen-

sas. A mobilidade sustentável fica

descurada, assim como uma polí-

tica ferroviária sólida. Também a

Comboios de Portugal merece a re-

primenda pela má gestão das linhas

ferroviárias que dão origem a um

decréscimo de passageiros. Os ho-

rários dos comboios e a oferta de

serviços parcos e de má qualidade

impedem muitos utentes de pode-

rem utilizar este meio para se des-

locarem. A.M.

Eduardo MeloMin. Economia e

EmpregoFCUC

Desde que Eduardo Melo iniciou o

mandato que se vive um clima de ins-

tabilidade na AAC. A sua direção

ficou marcada de início pela história

mal contada do secretário-geral da

Queima das Fitas. Seguiu-se a demis-

são do administrador, e com ele, os

coordenadores dos pelouros de liga-

ção aos órgãos e relações internacio-

nais abandonaram a DG. Na última

semana foi o tesoureiro que se demi-

tiu, também em situação um pouco

ambígua. Há quem alegue jogadas

políticas em torno das próximas elei-

ções. A verdade é que mais uma vez

Eduardo Melo pouco ou nada clarifi-

cou a situação, aliás, como aconteceu

das outras vezes. I.B.

A Fundação Cultural da Univer-

sidade de Coimbra votou, em Con-

selho Geral, o princípio do

“utilizador-pagador”, no que con-

cerne ao regime de utilização do es-

tádio universitário de Coimbra.

Assim sendo, as secções desportivas

da AAC vão passar, a partir do pró-

ximo ano, a ter de prestar contas

com uma “renda de casa”. Para

muitas, mais não é que passar a

pagar por um espaço que têm sus-

tentado sozinhas. Conselho Des-

portivo e Associação Académica

souberam da proposta pouco antes

da sua votação. Esperam-se, pelo

menos agora, negociações.

F.S.P.

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Jornal Universitário de Coimbra

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