13
PeiqeT~nüisa FAPESP ESPECIAL Educação, ./\ . ciencia e sociedade A recentes mudanças nas administrações públicas federal e estaduais, garantidas pelas eleições de outubro, criaram um clima altamente propício para o deba- te aprofundado de temas cruciais para o desenvolvimento do país. Crescimento eco- nômico, modelos de inserção na economia mundial, distribuição de renda, combate à fome e à exclusão social, difusão da justiça, combate à violência corrupção tornaram-se expressões assíduas nas discussões de brasileiros, de todos os níveis e for- mações, que mantêm viva a esperança de que é possível fazer deste país um lugar melhor para a vida de todos os seus milhões de habitantes. Ea mantêm a despeito de todos os constrangimentos, dos formidáveis obstáculos nacionais e internacio- nais que a isso interpõe "um mundo globalizado, cuja essência filosófica é a do pragmatismo", como bem lembra o presidente da FAPESP, Carlos Vogt. Pesquisa FAPESP pretende contribuir para esse debate em curso no país e o faz, nesta edição, por meio de reflexões em torno de um tema - a relação entre educação, ciência e desenvolvimento - que de certa forma está no cerne das discussões polí- ticas, econômicas, sociais e culturais que se difun- dem hoje pelo país. Os autores dos seis artigos que compõem esse encarte são especialistas com total autoridade para tratar do tema, até em razão das funções públicas que exercem e que os comprome- tem, exatamente, com políticas e ações de educação, ciência e desenvolvimento. PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 57

Educação, ciência e sociedade

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Pesquisa FAPESP - Especial Ed. 85

Citation preview

Page 1: Educação, ciência e sociedade

PeiqeT~nüisaFAPESP

ESPECIALEducação,./\ .cienciae sociedade

Arecentes mudanças nas administraçõespúblicas federal e estaduais, garantidaspelas eleições de outubro, criaram umclima altamente propício para o deba-te aprofundado de temas cruciais

para o desenvolvimento do país. Crescimento eco-nômico, modelos de inserção na economia mundial,distribuição de renda, combate à fome e à exclusãosocial, difusão da justiça, combate à violência e àcorrupção tornaram-se expressões assíduas nasdiscussões de brasileiros, de todos os níveis e for-mações, que mantêm viva a esperança de que épossível fazer deste país um lugar melhor para avida de todos os seus milhões de habitantes. E amantêm a despeito de todos os constrangimentos,dos formidáveis obstáculos nacionais e internacio-nais que a isso interpõe "um mundo globalizado,cuja essência filosófica é a do pragmatismo", comobem lembra o presidente da FAPESP, Carlos Vogt.

Pesquisa FAPESP pretende contribuir para essedebate em curso no país e o faz, nesta edição, pormeio de reflexões em torno de um tema - a relaçãoentre educação, ciência e desenvolvimento - quede certa forma está no cerne das discussões polí-ticas, econômicas, sociais e culturais que se difun-dem hoje pelo país. Os autores dos seis artigos quecompõem esse encarte são especialistas com totalautoridade para tratar do tema, até em razão dasfunções públicas que exercem e que os comprome-tem, exatamente, com políticas e ações de educação,ciência e desenvolvimento.

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 57

Page 2: Educação, ciência e sociedade

I

II

I

ilij

CARLOS VOGT

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E SOCIEDADE

da de investimentos abrem definitivamente o paíspara as condições de plataforma de produção den-tro do cenário globalizado das relações do capital.

O esforço passa a ser, então, superar todo o le-gado de problemas sociais que se acumularam aolongo de nossa história. Duros desafios. Não sópela urgência e dificuldades em mudar as estrutu-ras institucionais como pelas enormes diferençasque caracterizam a sociedade brasileira e pelo altocusto social que a adequação do país a essa novaordem requer.

Na base de toda essa construção está a tecnolo-gia, em particular, as tecnologias da informação, oque reverte até mesmo o papel do conhecimentono processo de produção. Ao binômio capital/tra-balho substitui-se a tríade capital/trabalho/conhe-cimento, que enfatiza um novo conceito: o do co-nhecimento útil.

Converge-se, desse modo, para um mundo glo-balizado, cuja essência filosófica é a do pragmatis-mo e o desafio dessa pragmática mundializada éque a tornemos ética e social sobretudo aquelesque, humanistas, acreditamos na universalidade dohomem e que temos de conviver com a globalidadeda máquina e de seu protagonista mais espetacular,o computador pessoal e suas ações de informatiza-ção no quadro geral das tecnologias da informação.

O computador é a máquina universal que emu-la o homem. A universalidade do homem impõe aoposição com o local, o regional e funda o próprioconceito de nacionalidade e de diferenças culturaisentre nações. A universalidade da máquina funda aglobalidade dos padrões culturais e anula as dife-renças nacionais, criando a utopia asséptica daigualdade de oportunidades pela democratizaçãodo acesso à informação.

O Brasil, desde a Abolição da Escravatura e daProclamação da República, aspirou integrar o con-ceito das nações, foi país de Terceiro Mundo, sub-desenvolvido, país em desenvolvimento e, hoje,perfila-se entre os chamados de economia emer-gente. Para emergir efetivamente, precisa resolverproblemas sociais que permanecem e jogar à altu-

Indagações por um novo humanismoo imperativo da ética num mundo pragmático

Nadécada de 1930 abre-se, na histó-ria do Brasil, um ciclo de estudosvoltado para a nossa formação, in-cluindo aí aqueles traços própriosda formação cultural portuguesa e

que permanecem essenciais para a interpretaçãoda formação da cultura brasileira.

São inúmeras as obras que incluem em seu pró-prio título o termo formação e todas elas, até hoje,de leitura indispensável para o estudo e o entendi-mento da história e da sociedade brasileiras. Emordem cronológica: Casa Grande & Senzala: Forma-ção da Família Patriarcal Brasileira (1933), de Gil-berto Freyre; Formação do Brasil Contemporâneo(1942), de Caio Prado [r.; Formação Histórica deSão Paulo (De Comunidade a Metrópole) (1954), deRichard Morse; Formação da Literatura Brasileira(1957), de Antonio Cândido; Formação Econômicado Brasil (1958), de Celso Furtado; Os Donos do Po-der: Formação do Patriarcado Nacional (1959), deRaimundo Faoro; Formação Histórica do Brasil(1962), de Nelson Wernek Sodré; Formação Políticado Brasil (1967), de Paula Beiguelman; A Formaçãodo Federalismo no Brasil (1961), de Oliveira Torres.

Sob diferentes pontos de vista, este esforço in-telectual de "ajuste de contas" com o passado, re-sultou positivo em alguns casos e, em outros, foiatropelado pelas transformações mundiais que,gestadas na e pela Segunda Grande Guerra, flore-ceram no longo período da Guerra Fria e acaba-ram irrompendo com a queda do muro de Berlim,no final dos anos 80.

11A nova ordem da economia mundial, sob a égi-

de neoliberal da globalização, impõe aos países aabertura total de fronteiras para o livre trânsito dasunidades de capital.

No Brasil, a partir dos anos 90, os ventos dasmudanças escancaram de fora as portas e janelasque se queriam trancadas para dentro: a aberturada economia às importações, a estabilização damoeda com a criação do Real e o estímulo à entra-

CARLOSVOGT,poeta e lingüista, vice-presidente da SCPC, é presidente da FAPESP.Foi reitor da Unicamp de 1990 a 1994.

58 • MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

Page 3: Educação, ciência e sociedade

" Cumpre-nos trabalharpela universalizaçãodo acesso aoconhecimentopara solucionara exclusão social"

ra da competitividade que o xadrez das relaçõesglobalizadas impõe.

Do país informado pelas novas tecnologias es-pera-se a formação de um Brasil quite com seupassado monárquico e colonial, pronto para osajustes finos de suas estruturas institucionais e cul-turais, sintonizadas de vez com o conhecimento, aeducação, as artes, a ciência, a tecnologia, a ética ea justiça social.

É para esse amplo fenômeno de mudanças quedevemos atentar.

IIINum mundo de eco-

nomia globalizada, deum pragmatismo finan-ceiro a toda prova, de umfinalismo utilitarista semprecedentes, de uma vio-lência urbana e de umaurbanização da violênciaincomuns, cabe ainda aoposição, presente em vá-rias línguas e que remon-ta à antiguidade clássica,entre cidade (civitas, pólis)e campo (rus, silva) comotopônimos analógicos de civilizado, polido emoposição a rústico e inculto?

Podemos ainda acreditar, com Fernando deAzevedo (A Cultura Brasileira, 6a edição, 1996),que, seguindo a distinção de Hunboldt entre cul-tura e civilização, vê na primeira uma espécie devontade schopenhaueriana da sociedade em pre-servar a sua existência e assegurar o seu progressoatendendo não apenas à satisfação das exigênciasde sua vida material, mas sobretudo e principal-mente as suas necessidades espirituais. Como es-creve o autor, "a cultura, [...], nesse sentido restri-to, e em todas as suas manifestações, filosóficas ecientíficas, artísticas e literárias, sendo um esforçode criação, de crítica e de aperfeiçoamento, comode difusão e de realização de ideais e de valores es-pirituais, constitui a função mais nobre e mais fe-cunda da sociedade, como a expressão mais alta emais pura da civilização". (p. 34)

Em outras palavras, é possível pensarmos, defato, em um novo humanismo, já que tantos falamde um novo renas cimento ligado às descobertasda tecnologia e à economia globalizada, como oprimeiro esteve ligado aos descobrimentos geo-gráficos, à internacionalização do comércio e aosprogressos orgânicos das ciências, das artes e dashumanidades?

Épossível, apesar dos estudos de Walter Benjamin,continuar a crer que a aliança da cultura e da civili-zação, que os povos latinos batizaram de humanis-mo, retomará o seu vigor explicativo e a força eficazde seu poder positivo de transformação, de desen-volvimento e de aperfeiçoamento da sociedade?

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 59

É possível continuar a conceber este equilíbrioharmonioso, caro aos humanistas, entre os elemen-tos da tradição nacional e os da tradição humana,isto é, entre as culturas nacionais e a universalida-de da cultura?

É possível, efetivamente, evitar um antagonis-mo de valores tal que sobre os valores humanos euniversais não se sobreponham valores particula-res e nacionais? E os nacionalismos, de esquerda ede direita? E as guerras étnicas e religiosas que per-sistem em meio à mais fantástica transnacionaliza-

ção da economia e dos pa-drões de comportamentosocial? E a violência gratui-ta e descontrolada das ci-dades, da ficção e da reali-dade, das ruas, do cinemae da televisão?

IVAlison Wolf, professor

de educação na Universi-dade de Londres, no livroDoes Education Matter?Myths about Education andEconomic Growth ("A Edu-cação Importa? Mitos so-

bre a Educação e o Crescimento Econômico"), apropósito do sistema educacional britânico, chamaa atenção para o risco de se tratar a questão apenasdo ponto de vista quantitativo e dentro de uma ló-gica de causalidade simplista entre educação ecrescimento econômico.

Sem propósitos culturais, morais e intelectuais,a educação perde seu caráter civilizatório e reduz-se a mero expediente de oportunidade, e mesmode oportunismo social na competição desenfreadapelas vagas do mercado.

Para diminuir esse aspecto utilitarista da culturae da educação é preciso aumentar a oferta de tra-balho, reduzindo as conseqüências perversamentesistemáticas das economias globalizadas no que dizrespeito à distribuição de renda e à justiça social.

Para países como o Brasil, ainda em passo deemergência, o problema se agrava, entre outrascoisas, pelo baixo índice de produção tecnológica ede inovação competitiva nos mercados internacio-nais, por falta de agregação de conhecimento, devalor à maioria de nossos produtos de exportação.

Desse modo, cumpre-nos, mais do que nunca,a todos os atores sociais ligados à educação e à pro-dução científica e tecnológica, governos, instituiçõesde ensino e de pesquisa, agências de fomento, a so-ciedade civil, como um todo, trabalharmos pela uni-versalização do acesso ao conhecimento, com pro-postas eficazes para solucionar, em número e emqualidade, esta que é a expressão mais grave da altaconcentração da riqueza, de um lado, e da dissemi-nação globalizada da pobreza material e do deses-pero espiritual, de outro: a exclusão social. •

Page 4: Educação, ciência e sociedade

ROBERTO AMARAL

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E SOCIEDADE

A revolução possívelConstruir o conhecimento é prioridade

os Relatórios do DesenvolvimentoHumano (1998 e 1999) divulgadospela Organização das Nações Unidasapontam um viés do desenvolvimen-to internacional que, há mais de 50

anos, desperta graves preocupações: os países in-dustrializados, que concentram apenas 19% dapopulação do planeta, detêm 86% do produto e doconsumo mundiais; 82% da exportação de bens eserviços; 71% do comércio; 68% dos investimen-tos estrangeiros diretos; 74% das linhas telefônicas;58% da produção de energia; 93% dos usuários daInternet. Enquanto isso, a outra banda, a dos 20%das populações mais pobres, onde nos encontra-mos, tem apenas 1% do produto mundial; 1% dasexportações; 1% dos investimentos diretos e 1,5%das linhas telefônicas.

Essa concentração cruel se repete no plano na-cional. No Brasil, os 50% mais pobres, que deti-nham 18% da renda nacional em 1960, ficaram em1995 com apenas 11,6%, enquanto os 10% mais ri-cos passaram, nesse mesmo período, de 54% para63% na apropriação dessa renda. Nos últimos 30anos, a concentração de renda só faz crescer. O fe-nômeno se repete nos desequilíbrios inter-regionais,igualmente dramáticos. Essas disparidades se ma-nifestam, no lado real da vida dos grupos sociais,como desigualdades na esperança de vida ao nas-cer, no acesso precário à educação, à saúde, à habi-tação, ao saneamento, à limpeza urbana. E, nos úl-timos tempos, na precariedade radical do acesso àsegurança pública e ao emprego.

A distribuição da riqueza entre nações está for-temente correlacionada com o domínio da tecno-logia. Em 1993, dez países já respondiam por 84%dos gastos em pesquisa e desenvolvimento, contro-lando 95% das patentes registradas nos EstadosUnidos nas últimas duas décadas, assim como80% das patentes concedidas nos países em desen-volvimento. Essa realidade - a exclusão tecnológi-ca - preocupa muito a ONU. O Relatório para oDesenvolvimento Humano afirma que "a privati-zação e a concentração de tecnologias estão indo

1 i!I

I

. '.

'1

l'i

i. :'1:I,

11:I :i ,i

longe demais. As corpo rações é que definem aagenda de pesquisa e controlam seus resultados. Ospaíses pobres correm o risco de ficar à margemdesse regime que controla o conhecimento no mun-do. Direitos de propriedade mais restritos impe-dem o acesso dos países mais pobres aos setores di-nâmicos do conhecimento': Tudo isso em umaépoca proclamada como sociedade do conhecimento.

A governabilidade das nações - ou seja, o qua-dro de regras, instituições e práticas estabeleci daspara o comportamento dos indivíduos, das organi-zações e das empresas - está em risco, junto, obvia-mente, com a segurança dos países e das sociedadesnacionais. Sem esse quadro jurídico-institucionalfortalecido, alerta o mesmo Relatório, "os conflitosglobais serão uma realidade no século 21 - guerrascomerciais para promover interesses nacionais ecorporativos, volatibilidade financeira detonandoconflitos, o crime global inviabilizando a política,os negócios e a segurança".

Nesse contexto, o Estado não pode se resignarà condição de instância reguladora das relações so-ciais, tampouco a de mitigado r das desigualdadessociais e protetor dos segmentos sociais mais des-favorecidos nesse esquema de repartição selvagem.A economia é cada vez mais economia da informa-ção - já que a informação estruturada, a "indústriade convergência", é o elo condutor de todo o sistemaprodutivo. A construção do conhecimento, ao lon-go de toda a "cadeia produtiva" específica, há queser, portanto, uma prioridade nacional permanen-te. É fundamental dotar o sistema educacional decapacidade efetiva para a qualificação da força detrabalho do país. Ainda mais sem a implantação deum sistema de C&T efetivamente inovador - e nãoapenas adaptador de novidades -, o Brasil não con-quistará posição efetiva no mercado globalizado,podendo perder o controle do próprio mercado na-cional, deixando ainda escapar no horizonte visível aperspectiva de superação da dependência do capital,do qual a tecnologia é a expressão mais refinada.

O domínio da tecnologia só pode se dar com aexistência, no país, de um corpo de técnicos e cientis-

ROBERTOAMARAL,professor da PUC-Rio,é ministro da Ciência e Tecnologia.

60 • MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

Page 5: Educação, ciência e sociedade

C&T de 1% para 2% do PIE. O número de bolsasestá sendo elevado substancialmente. São mais 4.328bolsas de estudos para os programas atuais (de ini-ciação científica após-doutorado) e outras 10.250para novas modalidades, como iniciação científicajúnior para estudantes de ensino médio e bolsaprêmio. Além disso, seus valores serão atualiza dos,se possível ainda este ano.

O reforço do sistema de C&T terá, ainda, umprograma de implantação de laboratórios de ciên-cia em todas as escolas públicas de ensino médio,

visando a elevar a qua-lidade da educação emotivar talentos para acarreira científica. Esseincentivo continuará nosníveis de graduação e depós-graduação.

O desenvolvimentocientífico e tecnológicoé fundamental para odesenvolvimento dequalquer nação moder-na. Por isso, tem um pa-pel estratégico para ogoverno do presidenteLula. Assim, mesmo as-

segurando a mais ampla liberdade de investigação,seria temerário para uma política de Estado, que temresponsabilidades sociais, deixar-se conduzir erra-ticamente por algum tipo de mercado.

Neste governo, a política de C&T terá priorida-des bem definidas, seguindo dois eixos: o estratégi-co, que visa a garantir a soberania política do país,reduzir a dependência tecnológica e assegurar sus-tentabilidade técnica ao desenvolvimento a médioe longo prazos; e o de alcance imediato, que apoia-rá os programas de governos no atendimento àscarências mais agudas da sociedade brasileira. Noeixo estratégico, estão contemplados os ramos deP&D relacionados com energia, tecnologia da in-formação e aeroespacial, biotecnologia, nanotecno-logia. As ações de alcance imediato apoiarão prio-ridades como segurança alimentar e combate à fome,ampliação das exportações, fortalecimento - viadifusão tecnológica - das micro, pequenas e médiasempresas, geração de empregos, distribuição derenda, aproveitamento sustentável dos recursos na-turais, substituição seletiva de importações de bensestratégicos para o desenvolvimento nacional, me-lho ria da infra-estrutura social básica e de serviçospúblicos, conservação do meio ambiente e do equi-líbrio ecológico global e eliminação das desigual-dades sociais e inter-regionais.

Será por esse caminho que o governo em gerale a área liderada pelo MCT, em particular, tentarãoconsolidar, sem pontos de estrangulamento, o ci-clo educação-tecnologia-desenvolvimento, garan-tindo a soberania do país, a democracia e a eleva-ção dos níveis de bem-estar dos brasileiros. •

tas capacitados para a criação ou a assimilação dosseus princípios. A formação de recursos humanos ea capacidade para identificar oportunidades estra-tégicas é condição sine qua non para esse domínio.A preparação em C&T começa com a busca, aindana escola fundamental, de jovens com talento paraa carreira e prolonga-se com a iniciação científicanos cursos de graduação e de pós-graduação

O nível de um país, nesse campo, é em geral me-dido com base em indicadores que incluem o nú-mero de doutores formados anualmente e a pre-sença da ciência nacional nabibliografia internacional.Nossa presença nessa biblio-grafia tornou-se significativaa partir de 1970, com a cria-ção de cursos de pós-gradua-ção: dos 377.381 trabalhospublicados naquele ano emtodo o mundo, 64 eram debrasileiros (0,017% do totalindexado pelo Institute for 5ci-entific 1nformation - 151).Em 2000, dos 839.281 traba-lhos indexados pelo 1SI,9.5110,13%) já eram de pesqui-sadores nacionais. Entretan-to, a produção científica brasileira é ainda baixa: 53,3artigos por milhão de habitantes em 1999, apenas44% da média mundial ou 6% da média americana.

De todo modo, o crescimento da produtivida-de científica brasileira deve-se ao número de pro-fissionais formados nos cursos de pós-graduação eingressados no sistema de C&T: em 1991, forma-ram-se 1.750 doutores; em 2000, esse número sal-tou para 5.344, com incremento de 305%. É pou-co, todavia. Em 1992, quando o país formou emtorno de 2.000 doutores, os Estados Unidos forma-vam 39.754; a Alemanha, 21.438; e o Japão, 11.576.A meta projetada pelo governo do presidente LuísInácio Lula da Silva para 2006 é a de que o país es-teja formando pelo menos 10 mil doutores anual-mente, número considerado aceitável pela comu-nidade científica. Mas é preciso ir além.

O esforço para consolidar uma comunidadecientífica brasileira realizou-se nos últimos temposna contra-corrente dos gastos da União com C&T.O total de recursos aplicados pelo governo federalnessa área, entre 1991 e 2001, variou entre US$1,40 bilhão e US$ 1,68 bilhão ao ano, diminuindo-se a relação recursos/pesquisador e instalando-seum tipo de concorrência em que coube aos jovenspesquisadores a pior parte do resultado, quanto aingresso e permanência no sistema de C&T. O nú-mero de bolsas do CNPq teve uma redução da or-dem de 9% entre 1996 e 1999, passando de 8.616para 7.836. Isso sem contar que os valores nomi-nais dessas bolsas estão congelados desde 1995.

A determinação do governo do presidente Lulaé fazer dobrar, em quatro anos, o investimento em

" A determinação dogoverno Lula é fazerdobrar, em quatro anos,o investimentoem C&T de1% para 2% do PIB"

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 61

Page 6: Educação, ciência e sociedade

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CI~NCIA E SOCIEDADE

JOÃO CARLOS DE SOUZA MEIRELLES

A mais urgente tarefaOs que não tiveram formação precisam de trabalho

JOÃOCARLOSDESOUZAMEIRELLESé secretário de Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismodo Estado de São Paulo e está empenhado em implementar um novo modelo de desenvolvimento para o Estado.

- O que FAZER para o Brasil CRESCER?

Focar na produção rural com valoragregado; centrar esforços nas exportações;desenvolver tecnologia acessívele certificar a qualidade dos produtos;investir em infra-estrutura; tudo paracumprir a mais urgente tarefa hoje:oferecer trabalho.

Otema é absolutamente instigante enos leva a olhar para o futuro. Maso primeiro passo para se pensar oBrasil de hoje é mergulhar numaanálise crítica do processo históri-

co do nosso desenvolvimento, sobretudo nos úl-timos 50 anos.

Na década de 50, o Brasil iniciava sua conso-lidação como nação industrial, a partir do que jáhavia sido feito pela iniciativa privada ao longoda nossa história econômica - já a partir da se-gunda metade do século 19 as atividades indus-triais se desenvolvem, ganhando força no iníciodo século 20. Nos anos 20, quando a indústria dealimentação se impôs, e nos anos 30, quandohouve um surto industrial com crescimento mé-dio de mais de 100% ao ano, preparamos o terre-no para importantes realizações na década de 40- como o aparecimento de companhias como aSiderúrgica Nacional e a Vale do Rio Doce e,principalmente, da usina de Volta Redonda.

A criação do BNDE, Banco Nacional de De-senvolvimento Econômico, já anunciava, em 1952,o espetacular salto que o país daria com o gover-no Juscelino Kubitschek, que implantou todo umprograma de organização do processo industrialbrasileiro. Embora criticado pela ausência de umaverdadeira política industrial e pela forte presençado capital estrangeiro em sua gestão, Juscelino re-almente promoveu o processo de industrialização

62 • MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

do país - com tal impacto a ponto de disparar, si-multaneamente, como decorrência natural, o se-tor comercial e o de serviços.

Toda política de desenvolvimento do país nosúltimos 50 anos esteve focada no urbano, essa é aquestão. Fundamentalmente, privilegiou-se o in-dustrial, o comercial, os serviços, as atividadesdesenvolvidas longe do campo. Isso produziudois efeitos perversos. Primeiro, um lamentávelfator cultural: tudo o que é rural é atrasado; esseconceito se tornou uma crença difícil de comba-ter. Segundo, uma fortíssima migração não só docampo para as pequenas e médias cidades, mastambém dessas para as regiões metropolitanasdo Brasil inteiro. No entanto, enquanto isso, semque houvesse qualquer esforço nesse sentido, aagricultura e a pecuária se desenvolviam de for-ma extraordinária. Tanto que em 2002 nada me-nos de 43% da balança de exportações do país serefere ao produto do agronegócio (agropecuária+ agregações de valor) - sem dúvida, o negóciodo Brasil.

A partir de meados da década de 80, com aglobalização, a empresa brasileira, voltada tantopara o mercado interno quanto para o externo,foi submetida a uma inédita exposição à compe-titividade internacional. Apoiada na formidávelexpansão dos meios de comunicação e de trans-porte, a globalização se deu num cenário de au-tomação, Todo o processo de auto mação na in-dústria e no comércio ocorreu paralelamente àexigência de alto grau de capacitação para osagentes do setor de serviços, invadido por auto-serviços resultantes da informatização. A in-corporação de tantas novidades ao processoprodutivo levou à drástica redução do emprego"urbano", criando o desemprego estrutural nospaíses de economia desenvolvida e gerando con-seqüências ainda mais nefastas nos países econo-micamente menos saudáveis.

Se a indústria brasileira não é mais a mesma,o operário brasileiro também não: ele hoje preci-sa de uma série de capacitações insuspeitas em

Page 7: Educação, ciência e sociedade

" Queremos umdesenvolvimentosustentávelsob todos os pontosde vista,inclusive o social"

meados do século 20, nosso ponto de partidanesta avaliação. A robótica substituiu o homem,a alta tecnologia comprometeu a necessidade demão-de-obra. E não apenas na indústria, é claro.Estamos falando de alterações fundamentais emtodos os setores da economia: muito menos tra-balhadores produzindo muito mais, com grausde eficiência cada vez maiores. O grau de dificul-dade para a inclusão de novos trabalhadores noprocesso produtivo moderno se espelha no graude desemprego atual do país. E vice-versa.

A resposta para essequadro é contundente: tera humildade de entender aurgência de oferecer traba-lho para aqueles que nãotiveram preparação profis-sional adequada. Isso im-plica análise da estruturada produção rural brasilei-ra - hoje extremamentecompetitiva, mas exporta-dora de matéria-prima.

Aí está o primeiro pon-to. Sobre a extraordináriacompetência do setor ruralbrasileiro é possível estabe-lecer porteiras virtuais nos municípios e nas re-giões do interior do país para proceder à máximaagregação de valor, por meio da transformaçãode produtos - quer para consumo in natura, querpara a industrialização. Os produtos devem sairprontos e acabados das áreas de produção. Esseconceito embute um gigantesco potencial de in-corporação da mão-de-obra que hoje está viven-do na periferia das pequenas e microcidades dointerior do Brasil.

O segundo ponto: é imprescindível uma ob-jetiva e obstinada concentração no comércio ex-terior. A crise por que passa o mundo e o Brasilnão está permitindo o aumento do consumo in-terno a fim de gerar novos postos de trabalho. Sóa exportação pode criar um círculo virtuoso,porque amplia de imediato o mercado de traba-lho e, ao mesmo tempo, ao incorporar os traba-lhadores alijados, gera novos consumidores nomercado interno. Portanto, há um duplo efeitobenéfico do esforço exportador.

Para que isso aconteça, entretanto, há um ter-ceiro ponto, do qual dependem os dois anterio-res. É essencial um empenho profundo no desen-volvimento tecnológico acessível e incorporávelao esforço exportador. Assim, pode-se garantir emelhorar a competitividade. Mais: pode-se ofe-recer a indispensável certificação de qualidadedos produtos - sejam de eletrônica de ponta, se-jam de origem rural.

O quarto e último ponto, a vertente que fechao círculo virtuoso pretendido, é a infra-estrutu-ra. Ela deve ser entendida não só como uma rede

física, mas como um complexo que inclui a mão-de-obra qualificada para o exercício das diversasetapas produtivas, das mais simples às mais sofis-ticadas. Em várias regiões brasileiras, como emSão Paulo, a potencialidade da produção ruralestá limitada ao atoleiro na estrada: produz-seapenas o que pode ser transportado na seca.

Investir em infra-estrutura (a estrada rural, aponte rural) é requisito básico para a viabilidadeeconômica de produtos alternativos, para a am-pliação do leque atual. Ainda assim, não bas-

ta. É preciso ir além,no âmbito da infra-es-trutura, e criar condi-ções para operações deagregação de valor, demodo que se possa,nos municípios ou nasregiões, fazer seleção,classificação e embala-gem de produtos innatura; transformar osprodutos destinadosà agroindústria comtoda a tecnologia quepermita a certificaçãoda sua qualidade está

nessa chave.A mencionada qualificação do trabalhador

implica um fator extremamente importante. Es-tamos falando de educação - no mais amplo sen-tido, envolvendo ensino convencional, escolastécnicas, universidades públicas, faculdades detecnologia. Temos urgência de uma arrancada nosistema educacional como um todo, com umexemplar aumento de vagas e que contemple aeducação para o trabalho, a fim de garantir mão-de-obra capacitada para o sistema produtivo nosmoldes propostos.

Para concluir, uma abordagem final. A sus-tentabilidade do desenvolvimento econômicodeve se dar não apenas em relação ao meio am-biente; queremos um desenvolvimento sustentá-vel comprometido com as gerações futuras e sobtodos os pontos de vista, inclusive o social. Ob-viamente, o sistema de geração de inovação ins-talado no país deve disponibilizar ao mercado astecnologias necessárias à produção harmoniosacom o sistema ambienta!. Mas o centro das nos-sas atenções está no homem: o poder públicodeve trabalhar para melhorar a qualidade de vidada população - é uma questão de foco. Desenvol-vimento econômico implica desenvolvimentosocial, com a incorporação contínua e progressi-va de novos agentes ao processo, com redistribui-ção de renda, com acesso ao mercado de bens eserviços de maior parcela da população, antes ex-cluída. Em outras palavras, o Brasil só pode cres-cer com a melhoria da qualidade de vida de con-tingentes cada vez maiores da população. •

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 63

Page 8: Educação, ciência e sociedade

II ~

,li'liI

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E SOCIEDADE

GABRIEL CHALITA

formar atores sociais talentosos, com maturida-de intelectual e emocional suficiente para alcan-çar não apenas o sucesso profissional, mas a fe-licidade plena, em todos os aspectos de suasvidas.

Todos os nossos alunos compõem um com-plexo contingente educacional, mas, ao mesmotempo em que formam um grupo, uma coletivi-dade, são também seres únicos, dotados de histó-rias de vida singulares, ricas e de natureza incom-parável. São meninos e meninas, crianças e jovensprovenientes das mais diversas realidades e ori-gens. Muitos vivenciam uma infância e uma ado-lescência repleta de amor, de cuidado, de atençãoe de incentivo de suas famílias. Outros, no entan-to, sobrevivem a duras penas numa atmosferadensa, pesada, em nada parecida com o que de-veria ser o aconchego e a proteção de um lar es-truturado. São desprovidos dos referenciais maisbásicos.e têm por alimento da alma apenas a es-perança depositada em dias melhores.

Felizes ou apenas esperançosos têm, como to-dos nós, carências, problemas, alegrias, vontades,medos, posturas e os mais heterogêneos sonhos.Some-se a isso o fato de estarem atravessandouma fase de formação, de intenso aprendizado, dedúvidas, de questionamentos, de buscas incansá-veis ... Têm o privilégio, e também a grande res-ponsabilidade, de ter todo um futuro pela frente.

Nesse sentido, nossas políticas públicas edu-cacionais levam em consideração, em primeirolugar, as necessidades mais básicas desses cida-dãos do futuro: a compreensão, o respeito porsuas diferenças, por seus valores e pela históriapessoal de cada um.

O desempenho, o sucesso e a ampliação dopotencial dos aprendizes dependem de nossa sen-sibilidade para vê-los como seres humanos e nãoapenas como números registrados nas listas dechamada. Por meio dessa prática, nós, educado-res, poderemos ter a chance de ir além e de tam-bém aprender com nossos educandos. Sem essatroca essencial, estamos condenados a perder o

o poder de fogo da educaçãoA chance de formar atores sociais talentosos

J\gun:~spalavra~ têm o poder de traz~r, COnSigO uma imensa carga de senti-. mentos, emoções, expectativas, so-. nhos, desejos e quereres. São, a um

só tempo, misto de poesia, de filo-sofia, de arte ... Expressá-Ias e professá-Ias podesignificar a mudança, a transformação, a trans-cendênda. A junção de suas sílabas tem uma for-ça capaz de mudar o mundo e, em casos extre-mos, funciona como um artifício bélico do bem,utilizado pelos desbravadores de novos tempos epelos descobridores de novos caminhos. São ar-mas que injetam ânimo, coragem, sensibilidade,talento. Dessa forma, podemos definir o amploleque .de sentidos e potencial idades da palavraeducação, cuja beleza está em desvendar novosamanhãs e promissores horizontes.

A todos nós, educadores, foi concedida aoportunidade de contribuir para promovê-Ia,transmitindo e propagando o desejo pelo conhe-cimento. Colaboramos para a criação de realida-des mais belas e mais condizentes com os nossossonhos. Faz parte da natureza humana querersempre o melhor. Buscar a evolução, o desafio, asuperação de limites. Façanhas impossíveis sem aeducação como fundamento e passaporte.

Ciente da grandiosidade dessa missão e de tu-do o que ela pode proporcionar, o governo doEstado de São Paulo, por meio da Secretaria deEstado da Educação, tem trabalhado para fazerda rede estadual de ensino uma ponte capaz delevar nossos 6 milhões de alunos à aquisição desaberes, de competências e de habilidades capa-zes de torná-Ios cidadãos críticos e conscientes,aptos- à construção de um futuro erguido sobreos pilares da infinita capacidade humana (quedeve ser desenvolvida, incentivada e constante-mente aguçada).

Nossos programas, projetos e ações têm oobjetivo primeiro de despertar mentes e coraçõespara o prazer do aprendizado, da revelação, daepifania que caracterizam o fascinante processoda descoberta. Está sob nossa responsabilidade

GABRIELCHALITA, professor, é secretário de Estado da Educação de São Paulo.Doutor em Direito, Comunicação e Semiótica, e autor de 34 livros.

64 • MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

Page 9: Educação, ciência e sociedade

brilho, a seiva,o norte ... Educar é, sobretudo, nun-ca deixar de aprender e de acreditar.

O primeiro passo para fazer da educação umapossibilidade real para todos já foi dado na medidaem que promovemos a universalização do ensino.Os números mais recentes apontam um total de99% de crianças freqüentando a escola no Estadode São Paulo. Uma vez garantido o acesso aos ban-cos escolares, nossos esforços convergem direta-mente para as melhorias nas condições de aprendi-zagem - decorrentes do reflexo direto da mudançade filosofia da cultura es-colar. Agora, singramosos mares de forma maishabilidosa porque nave-gamos com um lema co-mum a todas as nossasrotas: "todo professor écapaz de ensinar, todoaluno é capaz de apren-der". E o inverso é abso-lutamente verdadeiro.

Um lema que nos fazrespeitar, por exemplo, oritmo próprio de apren-dizado e de assimilaçãode conteúdos de cada es-tudante. Um direito do indivíduo que vinha sen-do relegado, mas que ganhou força com a implan-tação, em janeiro de 98, do regime de progressãocontinuada da aprendizagem, que possibilita oavanço contínuo dos alunos ao longo do percursoescolar, organizando o Ensino Fundamental emdois ciclos de quatro anos cada. Para ampliar osbenefícios dessa prática aos estudantes de níveismais avançados, adotamos a flexibilização do cur-rículo no ensino médio, permitindo a matrículapor disciplina e evitando que o aluno refaça com-ponentes nos quais foi bem-sucedido.

Nessa viagem de importância histórica, a socie-dade civil organizada tem sido nossa grande com-panheira. Empresas, igrejas, ONGs, universidades,entidades e associações variadas têm contribuídopara que nossos alunos e professores desfrutemuma formação intelectual, física e emocional sóli-da, com direito ao esporte, à cultura, ao lazer, àarte, à profissionalização, à saúde e, enfim, à con-quista de uma vida melhor.

Juntos, temos viabilizado a capacitação cons-tante dos educadores por meio de cursos, pales-tras, teleconferências e congressos. Em dezem-bro, por exemplo, presenciamos a formatura de7 mil professores pelo programa PEC - Forma-ção Universitária, programa de educação conti-nuada, cujo objetivo é fornecer aos professoresefetivos no ensino da 1" à 4" série, com formaçãode nível médio, de mais de 2 mil escolas de en-sino fundamental do Estado, a oportunidade deformação em nível superior fornecida pela USP,Unesp e PUC-SP.

Em todas as capacitações, encontros, visitas àsescolas e conversas com os representantes da ca-tegoria, sempre ressaltamos a importância da ali-ança entre o aperfeiçoamento técnico do profes-sor e a solidificação de uma postura afetiva emsala de aula. Queremos que nossos aprendizes en-xerguem no mestre um exemplo a ser seguido,um amigo com quem possam contar e não umaautoridade acima do bem e do mal.

Nas escolas, muitos programas e projetos têmfavorecido essa prática mais afetiva e integrada.

Os alunos sentem-se in-centivados a participar, adescobrir e a mostrar seustalentos. Por isso, é fun-damental que a comuni-dade do entorno escolare da sociedade como umtodo prestigie os eventosconstantemente promo-vidos pelos estabelecimen-tos de ensino. Foi o que asecretaria - juntamentecom a população quetransitava pelo Centro deSão Paulo - fez durante omês de dezembro de

2002. Nossos funcionários uniam-se aos popu-lares, sempre ao meio-dia, na Praça da Repúbli-ca, para prestigiar os corais natalinos de dezenasde escolas estaduais provenientes das mais diver-sas regiões do Estado.

O programa dos corais nas escolas, bem comoaqueles ligados à música clássica, ao teatro, ao ci-nema, à criação de bandas e fanfarras, à preserva-ção do meio ambiente, ao exercício dos direitos edeveres do cidadão - fortalecimento e reativaçãodos grêmios, campanhas comunitárias, combateàs drogas e à violência, etc. - têm propiciado umarevolução verdadeiramente positiva na vida dosestudantes.

Programas como Parceiros do Futuro, Comu-nidade Presente, Prevenção Também se Ensina,Escola em Parceria, Mutirão da Cidadania e Pro-grama Profissão estão, na verdade, plantando se-mentes e oferecendo não só para São Paulo, maspara todo o Brasil, a chance de ter, num futurobreve, uma colheita digna dos anseios e do traba-lho de todo o seu povo.

Que as nossas palavras, corroboradas - e im-pregnadas - pela verdade impressa em nossasações, possam colaborar para a discussão, para odebate e para a reflexão em torno dessa educaçãoafetiva e eficaz. Uma educação que privilegia acriação de gerações mais capacitadas, tanto paracontribuir para o desenvolvimento e o progressoda ciência quanto para desfrutar todos os seus be-nefícios. Uma educação que oriente e funcionecomo a bússola que desvenda as infinitas maneirasde navegar, com sucesso, pelos mares da vida. •

" A evolução,a superação de limitessão façanhas impossíveissem a educaçãocomo fundamentoe suporte "

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 65

Page 10: Educação, ciência e sociedade

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E SOCIEDADE

CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ

Uma nova mentalidade em formaçãoSistema tripartite para C& T avança no país

Razões históricas talvez não sejam sufi-cientes para explicar por que algumassociedades conseguiram, em poucasdécadas, sair da pobreza e mover-seem direção a uma relativa riqueza,

enquanto outras seguem patinando no charco deeconomias pouco eficientes ou até mesmo conhe-cem a experiência do empobrecimento depois deum período de prosperidade.

Charles I. Iones (Teoria do Crescimento Econô-mico), economista da Universidade de Stanford,prefere colocar a questão em outros termos: "Porque algumas economias desenvolvem infra-estru-turas que são extremamente propícias à produçãoe outras não?': A resposta de Ienes, quase uma tau-tologia, dificilmente deixará de fazer sentido: associedades desenvolvidas investem mais no co-nhecimento, e as pessoas que integram seu setorprodutivo destinam muito mais tempo ao apren-dizado de novas técnicas e tecnologias.

Por isso, para além de "razões históricas", nãohá nenhum determinismo na maneira pela qual asnações mais avançadas chegaram a seu alto grau dedesenvolvimento, abundância e bem-estar. Para [o-nes, uma vez que entre em jogo o fator conhecimen-to, há sempre "a promessa implícita de que a vita-lidade [do crescimento econômico 1 esteja apenasadormecida nas regiões mais pobres do mundo':

O advento da Internet e da Teia Mundial (aWorld Wide Web) escancarou as portas da infor-mação e tornou óbvio o primado da ciência, datecnologia e da cultura como elementos funda-mentais para o desenvolvimento econômico esocial. Já sabiam disso os chineses do século 14,quando a China chegou a ser a sociedade tecnolo-gicamente mais avançada do mundo graças a umincomparável domínio das técnicas de manufa-tura no campo da náutica, da tecelagem, da im-pressão, da fundição e outros. Foi também graçasà pesquisa sistemática e ao conhecimento acumu-lado em navegação oceânica que Portugal, uma co-munidade de 2 milhões de habitantes cujo gover-no tinha a pretensão de dominar o comércio de

II.I,,

especiarias, tornou-se uma das nações mais pode-rosas dos séculos 15 e 16. Que essas nações tenhamperdido sua hegemonia tecnológica ao longo dosséculos, é outra história.

David Landes, historiador do desenvolvimentoeconômico, destaca em seu A Riqueza e a Pobrezadas Nações que a invenção da invenção, isto é, a sis-tematização do método científico e da atividade depesquisa a partir do século 18, foi um dos grandesingredientes para uma revolução industrial na Eu-ropa e para o desenvolvimento que se seguiu. Torna-ram-se mais ricos os países que souberam criar umambiente propício à criação e disseminação do co-nhecimento e a sua aplicação na produção.

A "invenção da invenção" no século 18 foi segui-da pela "descoberta da invenção" na segunda meta-de do século 19.A nascente indústria química alemãpercebeu, por volta de 1870, que para o desenvol-vimento de seus negócios e a manutenção de suacompetitividade era necessário que a empresa ti-vesse uma capacidade de invenção própria. O Esta-do alemão percebeu também que precisava garantiro direito de propriedade intelectual àqueles capa-zes de terem idéias, e unificou e vitaminou sua lei depatentes em 1877. O respeito à propriedade intelec-tual e a percepção da importância do conhecimen-to levou ao nascimento dos primeiros grandes labo-ratórios industriais: Basf, Hõechst e Bayer foram asempresas que primeiro descobriram o poder dasidéias e da invenção, transformando essa atividade -a de desenvolver conhecimento - num fator essen-cial, permanente e profissional dentro da empresa.

Do outro lado do Oceano Atlântico, e na mes-ma época, Thomas Edison e Alexander GrahamBell começavam a criar, com suas invenções, o queviria a ser a moderna indústria eletrônica. Pelo fi-nal do século 19, com muitas das importantes pa-tentes de Edison expirando, a General Electric, queele criara, percebeu que precisava profissionalizare intensificar seu esforço de criação de idéias e co-nhecimento: em 1900, inaugurou o General Elec-tric Research Laboratory em Schenectady, NY.Hoje a equipe de cientistas e engenheiros do Cen-

CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ é reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)e ex-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

66 • MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

Page 11: Educação, ciência e sociedade

" Para que se consolide,o arranjo sistêmico entreempresa, universidadee governo precisaser tomadocomopolítica de Estado "

tro de Pesquisas e Desenvolvimento da GE tem1.130 pessoas. O "filhote" de Bell demorou mais aflorescer - no dia de Ano Novo de 1925 foraminaugurados em Manhattan os Laboratórios Bell,outra usina de idéias e invenções que mudou nos-so mundo: ali foi inventado o transistor em 1948.

É notável que na teoria econômica sobre o de-senvolvimento o conhecimento só passe a figurarcomo elemento explícito a partir da Nova Teoria

'de Crescimento estabeleci da por Paul Romer, deStanford, e seus colaboradores, a partir de 1987. Atéentão o conhecimento eraconsiderado uma variávelexterna à teoria econômica,embora vários autores su-pusessem seu efeito sobre aprodutividade do trabalho.

Um destes foi RobertSolow, professor do MIT,premiado com o Nobel deEconomia em 1987. Solow,no final dos anos 50, obser-vou que o crescimento daeconomia norte-americanaao longo do século 20 nãopodia ser explicado apenasrecorrendo ao crescimentodo capital e da mão-de-obra disponíveis. Foi esta-belecido assim que havia outras fontes de cresci-mento econômico, denominadas em conjunto "re-síduo de Solow". No caso dos EUA, um terço docrescimento anual da renda per capita deriva,Solow mostrou, dessas outras fontes. Aqui entrao conhecimento no jogo do desenvolvimento.

Romer desenvolveu o modelo básico da NovaTeoria do Crescimento considerando que o conhe-cimento afeta a produtividade do trabalho. Porisso, 1 milhão de trabalhadores-com acesso ao co-nhecimento mais moderno produzem mais doque 1 milhão de trabalhadores sem esse acesso.

Conhecimento só pode ser gerado e ser acessí-vel quando há pessoas educadas para isso. Sua in-clusão como variável de destaque para o desenvol-vimento econômico traz para a teoria econômica aeducação e a cultura como parâmetros deterrni-nantes do desenvolvimento de uma nação.

A escolaridade média do brasileiro, de apenascinco anos, não nos ajuda a ter mais competitivida-de. Formar 6 mil doutores por ano poderia ajudarmais, se empresas usassem uma fração apreciáveldesses doutores para criar idéias e gerar inovaçãona empresa e competitividade. Enquanto os dou-tores brasileiros têm tido seu mercado restrito aomeio acadêmico e ao setor público, os doutores co-reanos vão engrossar as fileiras de cientistas na in-dústria. Com efeito, dos 90 mil cientistas de que aCoréia dispõe - praticamente o mesmo número decientistas disponíveis no Brasil-, cerca de 80% de-dicam-se a fazer pesquisa e desenvolvimento (ino-vação, portanto) na indústria, enquanto, entre nós,

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 67

a indústria não absorve mais que 10% dessa quali-ficada força de trabalho. Essa disparidade explica oalto volume de patentes coreanas depositadas emescritórios americanos no ano passado - mais de3.400, contra apenas 113 patentes brasileiras.

Aqui vale a pena mencionar novamente Ienesquando diz que "o estoque de qualificação nos paí-ses em desenvolvimento é tão baixo porque as pes-soas qualificadas não conseguem auferir o retornopleno de suas qualificações': Essa realidade é aindamais impressionante quando se considera a massa

industrial brasileira -mais significativa que acoreana - e, não poracaso, a relativamentebaixa competitividadedos produtos brasilei-ros. Não só a capacida-de empreendedora, mastambém a política naci-onal para a ciência etecnologia estavam, atéhá pouco - digamos,até 1998 -, baseadas nofundamento equivoca-do de que o lugar dainovação era a universi-

dade, não a indústria.A partir dos últimos anos vem se impondo en-

tre nós a idéia de que a inovação é um elementofundamental do desenvolvimento econômico, e deque a indústria é o lugar privilegiado de sua mate-rialização, À universidade cabe desenvolver C&T,mas seu papel principal é o de formar pessoas qua-lificadas que vão gerar o conhecimento necessáriopara a inovação. Finalmente, o fato relevante dessamudança foi a entrada em cena de um terceiro ator- o governo - com uma política facilitadora que vádos incentivos fiscais ao uso do poder de comprado Estado para viabilizar projetos de P&D no inte-rior das empresas. Tem sido assim até mesmo (esobretudo) nos Estados Unidos, onde se calculamgastos anuais de US$ 20 bilhões em compras tec-nológicas pelas agências governamentais. O apoioestatal tem-se revelado um círculo virtuoso emque cada dólar investido pelo Estado corresponde,em geral, a outros US$ 9 aplicados pela empresa.

Pode-se concluir, com algum otimismo, que estáse formando no país uma mentalidade capaz de le-var a empresa a investir no conhecimento para au-mentar sua competitividade, dando maior sentidoao papel formador da universidade e compelindoo Estado a cumprir sua função de todos os tempos,que é a de criar um ambiente propício à geração eà disseminação do conhecimento e à sua aplicaçãona produção. Para que isso se consolide é precisoque esse arranjo sistêmico tripartite se torne efeti-vamente uma política de Estado, e não de governosque se sucedem; e que não haja interrupções queponham a perder o que já foi feito. •

Page 12: Educação, ciência e sociedade

ESPECIAL: EDUCAÇÃO, CI~NCIA E SOCIEDADE

SERGIO M. REZENDE

o desafio da inserção na sociedade

ricanos realizavam experiências pioneiras e dispu-tavam com os europeus grandes descobertas. Con-tribuíram muito para o desenvolvimento do ele-tromagnetismo na segunda metade do século 19,que resultou na invenção do gerador e do motorelétrico, responsáveis pelo uso da energia elétricana iluminação e em inúmeras aplicações domésti-cas e industriais.

Também inventaram o telégrafo, o telefone eo rádio, que revolucionaram as comunicações.Surgiram então os primeiros grandes empreen-dedores em tecnologia. Alexander Bell, inventordo telefone, criou uma empresa para explorá-locomercialmente que, posteriormente, tornou-se aAT&T. Thomas Edison inventou a lâmpada elétri-ca e o microfone de carvão para telefones, e criou aRCA. Bel e Edison não eram cientistas, mas sabiamque sem ciência suas empresas não poderiam com-petir e ganhar mercados. A AT&T e a RCA cria-ram centros de pesquisa e contrataram os primei-ros Ph.Ds. formados em Harvard, MIT, Yale, etc.Mas, para consolidar seu domínio tecnológico, fal-tava mais ciência. Então a América abriu suas por-tas para os cientistas que fugiam dos perigos dasguerras na Europa. O trabalho desses cientistas nosEUA foi essencial para dar um grande impulso aosistema de C&T e à criação de um programa deformação em massa de pesquisadores por meiodos cursos de mestrado e de doutorado.

A história da formação dos políticos e empre-sários de nosso país é muito diferente. Na época deFranklin o Brasil era dirigido por governadores ge-rais, ou vice-reis, que se revezavam no poder pro-tegendo seus interesses pessoais e mantendo a co-lônia submissa. Nossos colonizadores portuguesesnão permitiam que aqui houvesse tipografias paraimprimir panfletos, jornais ou livros, veículos es-senciais para a educação e a difusão de idéias. Cemanos depois ainda vivíamos uma monarquia escra-vocrata. Nossos empresários eram os usineiros decana-de-açúcar, os barões do café e os fazendeirosde cacau, que dominavam a política, protegendoos interesses da elite e atuando em sintonia com os

C& T precisa entranhar-se na cultura nacional

i I

Nomomento em que os EstadosUnidos da América, respaldadospelo poderio militar e riqueza eco-nômica, impõem ao mundo seuscaprichos belicosos, o Brasil prati-

camente não tem voz no cenário internacional. Éclara a diferença entre as duas nações. Portanto,cabe indagar: por que dois países, com áreas e re-cursos naturais comparáveis, descobertos e colo-nizados na mesma época pelos europeus, chegamao terceiro milênio com tamanha discrepância,sobretudo quanto às condições de vida de suaspopulações?

Sem dúvida, um fator determinante dessa dife-rença é o domínio da tecnologia, que os america-nos têm e nós não. Essa situação já é conhecida porparcela considerável de nossa sociedade, mas o queisso representa não é bem compreendido. Políti-cos, empresários e economistas em geral entendemcomo tecnologia apenas algo que pode ser com-prado, e consideram nosso problema fundamen-talmente econômico. Assim, a percepção geral éque a pesquisa e a inovação não estão ao nosso al-cance, e que com políticas públicas adequadas opaís poderia se desenvolver economicamente e, en-tão, comprar a tecnologia que desejar. Ledo enga-no, tecnologia é conhecimento e, portanto, está in-timamente ligada à ciência.

Os americanos têm um formidável domíniotecnológico porque começaram a fazer ciência hámuito tempo. Em torno de 1750, quando a ciênciaparecia restrita à Europa, Benjamin Franklin járealizava experiências de eletricidade e contribuíapara a descoberta das leis de conservação de cargaselétricas. Franklin foi o primeiro físico americanoe, além de pesquisador, foi militante político. Fun-dou um jornal que pregava idéias libertárias, foideputado pela Filadélfia, e teve uma importanteparticipação na redação da declaração da indepen-dência americana em 1776.

Cem anos depois, os EUA já eram uma Repú-blica Federativa independente, soberana e em rápi-do processo de industrialização. Os cientistas ame-

, ,

liI.li,I·I I

SERGIO M. REZENDE, físico, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco,é presidente da Financiadora de Estudos e Projetos - Finep

68 . MARÇO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 85

Il

Page 13: Educação, ciência e sociedade

tria, possibilitando redefinir a inserção de nossaeconomia no sistema internacional.

O Ministério da Ciência e Tecnologia terá pa-pel importante no novo projeto nacional de de-senvolvimento e, com ele, a Financiadora de Es-tudos e Projetos - Finep. Os planos para a Finepna nova gestão ainda estão em fase de elaboração.A Finep é parte integrante do MCT e vai traba-lhar em estreita articulação com todas as unida-des do ministério, em particular o CNPq. O MCTvai elaborar seu programa em articulação com

outros ministérios e ou-tras agências e discutiras propostas com a so-ciedade.

Nos últimos anos aFinep firmou-se comoa Agência Nacional deInovação, aproximan-do-se muito das em-presas e criando diversosprogramas para esti-mular o setor empresa-rial a aumentar suas ati-vidades de pesquisa einovação. Esses progra-mas serão aperfeiçoados

e ampliados, adequando-se à política industrialque será elaborada como parte do programa paramudar o país. Essa política será capitaneada peloMDIC e pelo BNDES, e terá grande participaçãodo MCT. A Finep tem um papel importante acumprir nesta nova política industrial, desde via-bilizar financiamentos a empresas, combinandorecursos reembolsáveis com recursos a fundo per-dido, assim como incentivos fiscais e outros instru-mentos. O firme exercício dessas atividades dará àFinep um forte poder de indução de atividadesvoltadas para a pesquisa e inovação, essenciais parao aumento da competitividade. O que resultaráem uma participação ativa das empresas: absorvermais mestres e doutores e interagir mais com asuniversidades.

Cabe à Finep ampliar suas ações junto às em-presas ao mesmo tempo em que se reaproxima dasuniversidades e da comunidade científica, pois aíreside o grande trunfo que o Brasil dispõe para queo conhecimento contribua decisivamente para odesenvolvimento do país. Em articulação com oCNPq, ela financiará programas de apoio às ativi-dades da comunidade, desde a pesquisa básica àpopularização da ciência. Na execução desses pro-gramas, a Finep se tornará uma agência mais efici-ente em todos os sentidos, inspirando-se no exem-plo bem-sucedido da FAPESP. Contribuirá comtodo seu potencial para que o Brasil desenhe e co-loque em execução um projeto de nação, soberanae com melhor distribuição da riqueza. É o que es-peram milhões de pessoas que elegeram Lula pre-sidente do Brasil. •

" Pesquisa einovação devemser massificadasno sistema produtivoe o trabalho de P&Dse tornar rotina "

detentores do capital internacional. Nossa inde-pendência não foi conquistada, mas consentidapor razões que eram convenientes aos nossos do-minadores. E foi assim que o Brasil se desenvolveu,sempre tolhido pelos interesses externos, com in-justiça social e sem empresas que tivessem suasriquezas promovidas com base na educação, naciência e tecnologia, mas sim na produção de pro-dutos simples e na exportação de matéria-prima.Até o século 20 aqui não havia universidades, nemum sistema amplo de ensino básico, nem indústriasnacionais. Nossa primeirauniversidade, a USP, só viriaa ser fundada em 1934.

O país só despertoupara o papel da ciência apósa Segunda Grande Guerra.O ensino de pós-graduaçãofoi institucionalizado nadécada de 1960 e o sistemade financiamento da pes-quisa e formação de pes-soal ganhou dimensão nadécada de 1970. Assim,apesar do atraso, o Brasilconta hoje com um con-tingente de mais de 50 milcientistas e engenheiros de alto nível, formandoum complexo sistema de C&T, que é de longe omaior e mais qualificado da América Latina. Po-rém, chegamos ao final do século 20 sem conso-lidar o sistema de C&T, com fraca articulaçãoentre universidades, centros de pesquisa e em-presas, e com poucas atividades de pesquisa e deinovação tecnológica nas empresas.

Enfrentamos hoje, portanto, uma questão cru-cial: os países sem tradição científico-tecnológicaestão condenados ao eterno subdesenvolvimento!Alguns países asiáticos mostraram que não. Coréiae Taiwan, por exemplo, acordaram para a educa-ção, ciência e tecnologia apenas na década de 70,mas souberam fazer delas a base para o seu desen-volvimento e para multiplicar seus PIEs. Evidente-mente, o problema do Brasil é bem mais comple-xo. Nossa área geográfica e nossa população sãomuito maiores do que as da Coréia e Taiwan. Temoshoje, felizmente, um regime democrático, mas queexige muita articulação e muito trabalho para cons-truir soluções coletivas. E a eleição do presidente Lularepresenta o sinal para a mudança.

É chegada a hora de tornar educação e C&T pi-lares da agenda nacional e de um projeto de nação,com soberania e com grande parte da populaçãoinserida no sistema produtivo. Para isso, é necessá-rio que a pesquisa e a inovação sejam massificadasno sistema produtivo e que a realização de traba-lho de pesquisa e desenvolvimento se torne rotinaem nossa sociedade. É preciso colocar como prio-ridades a substituição de importações e o aumen-to do valor agregado dos produtos de nossa indús-

PESQUISA FAPESP 85 • MARÇO DE 2003 • 69