em discussão. trabalho escravo

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Revista de audincias pblicas do Senado Federal

Ano 2 N 7 maio de 2011

DIREITOS HUMANOS

A escravido que precisa ser abolida

INFORMAO PARA A CIDADANIAH 15 anos o Jornal do Senado retrata, de forma imparcial e objetiva, tudo o que acontece no Senado. As atividades do Plenrio, das comisses, da Presidncia, do Congresso, das lideranas e dos rgos da Casa so mostradas, em texto sucinto, nas edies que circulam de segunda a sexta-feira e tambm na internet. a transparncia da informao que ajuda voc a exercer sua cidadania.

www.senado.gov.br/jornal

A escravido que precisa ser abolidaEm discusso! traz nesta edio os debates realizados pela Frente Parlamentar Mista pela Erradicao do Trabalho Escravo em 3 de fevereiro de 2011 na Comisso de Direitos Humanos e Legislao Participativa (CDH) do Senado Federal. Convidados: MariadoRosrioNunes,ministradaSecretariaEspecialdeDireitosHumanosdaPresidnciada Repblica VeraAlbuquerque,secretriadeInspeodoTrabalhodoMinistriodoTrabalhoeEmprego LeonardoSakamoto,presidentedaorganizaonogovernamentalReprterBrasil LuizMachado,coordenadordoProjetoNacionaldeCombateaoTrabalhoEscravodaOrganizao InternacionaldoTrabalho LuisAntonioCamargo,subprocurador-geraldoTrabalho JosNery,ex-senadorepresidentedehonradafrenteparlamentar

Prezado leitor,Em discusso! nasceu para informar o pblico sobre os debates de temas importantes para o dia a dia do pas que acontecem nas comisses do Senado. Selecionar o tema para esta edio, num momento em que a Casa inicia uma legislatura renovada pelas eleies de 2010, com as comisses permanentes com novos membros e direo, no foi fcil. Mas a audincia pblica realizada pela Frente Parlamentar Mista pela Erradicao do Trabalho Escravo em 3 de fevereiro, logo aps o incio dos trabalhos legislativos, surgiu como opo, tanto pela importncia do tema quanto pela oportunidade. O debate, com a presena de militantes da causa em todo o pas e de 13 senadores, encerrou a 2 Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Nos dois nmeros anteriores, a revista abordou discusses sobre a reorganizao de grandes setores de infraestrutura (aviao civil e telecomunicaes). J nesta edio, a equipe se debruou sobre um fenmeno social, que acontece margem da lei e nas sombras da sociedade moderna que o pas tenta construir. Como resultado, em que pesem os esforos de rgos como o Ministrio do Trabalho e Emprego e a Secretaria Especial de Direitos Humanos, de ONGs e da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), a equipe de Em discusso! no contou com a mesma profuso de informaes para contextualizar o debate. Afinal, diferentemente do que acontece com a aviao e a banda larga, os que trabalham em condies semelhantes s dos escravos no movimentam grandes valores na economia, no tm como financiar estudos e pesquisas, ainda que produzam grandes riquezas com o seu suor. Mais que isso, o tema envolve um conceito subjetivo: a liberdade. De acordo com o filsofo Immanuel Kant, liberdade um conceito que todos entendem, mas nenhum homem sabe explicar. Ainda assim, Em discusso! faz nas prximas pginas uma descrio to completa quanto possvel do problema e da mobilizao do governo, do Congresso e da sociedade para erradicar o trabalho escravo. A revista tambm traz os argumentos de quem discorda das aes e propostas em anlise, apontando caminhos diferentes para erradicar esse problema, como deve acontecer em qualquer debate democrtico. Boa leitura, Os editores

Obs.: Ao fotgrafo Joo Roberto Ripper, o agradecimento especial da equipe pela cesso das imagens, sem as quais esta edio perderia muito em fidelidade condio dos trabalhadores em situao de escravido.

J.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

SUMRIOMesa do Senado FederalPresidente:JosSarney(PMDB-AP) 1vice-presidente:MartaSuplicy(PT-SP) 2vice-presidente:WilsonSantiago(PMDB-PB) 1secretrio:CceroLucena(PSDB-PB) 2secretrio:JooRibeiro(PR-TO) 3secretrio:JooVicenteClaudino(PTB-PI) 4secretrio:CiroNogueira(PP-PI) SuplentesdeSecretrio:gilvamBorges (PMDB-AP),JooDurval(PDT-BA),Mariado CarmoAlves(DEM-SE)eVanessagrazziotin (PCdoB-AM) Diretora-geral:DorisPeixoto Secretria-geraldaMesa:ClaudiaLyra

Contexto

Aes de combate

Trabalho escravo resiste ao tempo pgina 7Trabalhador domstico um dos mais vulnerveis pgina

Governo precisou de 25 anos para agir pgina 32Apenas 50% dos casos denunciados so investigadosJ.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS J.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

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pgina

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Antes valiosos, os escravizados de agora so descartveis pgina

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preciso ir alm da represso e prevenir o aliciamento pgina

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Expediente

Realidade brasileiraDiretor: Fernando Cesar Mesquita DiretordeJornalismo:Davi Emerich Arevista Em discusso!editadapelaSecretaria JornaldoSenado Diretor: EduardoLeo(61)3303-3333 Editores: JooCarlosTeixeiraeThmaraBrasil Reportagem:JooCarlosTeixeira,JulianaSteck, SilvioBurleeThmaraBrasil Diagramao: BrunoBazlioePriscillaPaz Arte:CssioCosta,DiegoJimenezePriscillaPaz Reviso:AndrFalco,FernandaVidigal,Pedro PincereSilvioBurle Pesquisadefotos:AnaVolpe,BrbaraBatista, BrazFlix,BrunoDantaseLeonardoS Produo: MauroVergne Tratamento de imagem: Edmilson Figueiredo e RobertoSuguino Circulao eatendimentoaoleitor:Shirley Velloso(61)3303-3333 Capa: famliadecarvoeirosescravizadosem Minasgerais.FotodeJooRobertoRipper Tiragem: 1.800exemplares pgina

Planos brasileiros de erradicao so elogiados internacionalmentepgina

Nmero de escravos pode ser maior do que se imagina pgina 14

44 47 49 51 58

Mesmo sendo crime previsto no Cdigo Penal, impunidade a regraVeja e oua mais em:

pgina

Senadores divergem sobre penas e atuao dos fiscaispgina

Cortes no Oramento ameaam estrutura de repressopgina

Senado e Cmara tm rgos permanentes de combatepginaJ.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

Propostas no Congresso

Estado omisso e misria esto na raiz do problemaJ.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

pgina

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Votao da segunda Lei urea sofre resistncias pgina 61Para defensores, expropriao significa nova abolio pgina

Trabalho escravo no se limita regio NorteSite: www.senado.gov.br/emdiscussao E-mail: [email protected] Tel.: 0800 61-2211 Fax: (61)3303-3137 PraadosTrsPoderes,Ed. AnexoI doSenadoFederal,20andar 70165-920 Braslia (DF)Impresso pela Secretaria Especial de Editorao e Publicaes - Seep

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Agronegcio concentra maioria dos casospgina

Ruralistas temem abusos no confisco de terras pgina

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Perfil dos escravizados tem pobreza, analfabetismo e trabalho infantilpgina

Para saber maispgina

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Contexto

Junho de 2010: trabalhadores escravizados em fazenda de canade-acar em Mato Grosso do Sul recebem suas refeies

Trabalho escravo resiste ao tempoEmbora o Brasil tenha reconhecido, em 1995, a existncia do trabalho escravo no pas e prometido combat-lo, hoje, passados 123 anos da promulgao da Lei urea, essa prtica parece longe de acabar

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J.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

termo escravido logo traz tona a imagem do aprisionamento e da venda de africanos, forados a trabalhar para seus proprietrios nas lavouras ou nas casas. Essa foi a realidade do Brasil at o final do sculo 19, quando, por fim, a prtica foi considerada ilegal pela Lei urea, de 13 de maio de 1888. Mais de um sculo depois, porm, o Brasil e o mundo ainda no podem dizer que esto livres da escravido. A Organizao Internacional do Trabalho (OIT) estima que existam pelo menos 12,3 milhes de pessoas submetidas a trabalho forado em todo o mundo, e no mnimo 1,3 milho na Amrica Latina. Estudos j identificaram 122 produtos fabricados com o uso de trabalho forado ou infantil em 58 pases diferentes. A OIT calculou em US$ 31,7 bilhes os lucros gerados pelo produto do trabalho escravo a cada ano, sendo que metade disso fica em pases ricos, industrializados. A mobilizao internacional para denunciar e combater o trabalho escravo comeou quatro dcadas aps a assinatura da Lei urea. Com base nas observaes sobre as condies de trabalho em diversos pases, a OIT aprovou,

em 1930, a Conveno 29, que pede a eliminao do trabalho forado ou obrigatrio. Mais tarde, em 1957, a Conveno 105 foi alm, ao proibir, nos pases que assinaram o documento, o uso de toda forma de trabalho forado ou obrigatrio como meio de coero ou de educao poltica; como castigo por expresso de opinies polticas ou ideolgicas; como mobilizao de mo de obra; como medida disciplinar no trabalho; como punio por participao em greves; ou como medida de discriminao. O Brasil, que assina as convenes, s reconheceu em 1995 que brasileiros ainda eram submetidos a trabalho escravo. Mesmo com seguidas denncias, foi preciso que o pas fosse processado junto Organizao dos Estados Americanos (OEA) para que se aparelhasse para combater o problema. De acordo com a Comisso Pastoral da Terra (CPT), entidade ligada Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e responsvel pelas primeiras denncias de trabalho escravo no pas, so escravizados a cada ano pelo menos 25 mil trabalhadores, muitos deles crianas ou adolescentes. Apesar dos esforos do governo e de organizaes no governamentais, faltam estimativas

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maio de 2011

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SUMRIO

ContextoREPRODuO VALTERCAMPANATO/ABR

Contexto

Em 1888, depois de longa batalha vencida pelos abolicionistas, promulgada a Lei urea. Em 1970, o pas comea a descobrir que a escravido no acabou

mais precisas, at por se tratar de uma atividade ilegal, criminosa. Sem informaes exatas, o poder pblico e a sociedade organizada ainda lutam para prevenir e erradicar essa prtica. Pior que isso, o pas enfrenta grandes dificuldades para punir os responsveis pelo trabalho escravo. Ainda assim, o Brasil avanou. O prprio reconhecimento e a consequente adoo de uma poltica pblica e de aes do Estado para reprimir a ocorrncia de trabalho escravo so apontados como exemplos pela OIT. Foram libertados 40 mil trabalhadores brasileiros de trabalho degradante desde a criao do Grupo Especial de Fiscalizao Mvel e do Grupo Executivo de Represso ao Trabalho Forado, ambos de 1995. Em 2003, foi lanado o Plano Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo, e para o seu acompanhamento foi criada a Comisso Nacional de Erradicao do Trabalho Escravo (Conatrae),

com a participao de instituies da sociedade civil pioneiras nas aes de combate ao trabalho escravo no pas. Em dezembro do mesmo ano, o Congresso aprovou uma alterao no Cdigo Penal para melhor caracterizar o crime de reduzir algum a condio anloga de escravo, que passou a ser definido como aquele em que h submisso a trabalhos forados, jornada exaustiva ou condies degradantes, e restrio de locomoo em razo de dvida contrada, a chamada servido por dvida. O crime deve ser punido com priso de dois a oito anos. A pena pode chegar a 12 anos se o crime for cometido contra criana ou por preconceito. A iniciativa acompanhou a legislao internacional, que considera o trabalho escravo um crime que pode ser equiparado ao genocdio e julgado pelo Tribunal Penal Internacional. Porm, passados mais de seis anos, a legislao praticamente no foi aplicada, deixando no ar a sensao de impunidade, apontada pela OIT como uma das principais causas do trabalho forado no mundo. Tanto que j h propostas no Congresso que aumentam a pena e tentam definir de maneira mais precisa o crime da escravizao contempornea. Dvidas e ameaas Paralelamente, o aumento da fiscalizao do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) produziu provas oficiais das situaes j relatadas por entidades como a CPT. O MTE passou a publicar um cadastro, a chamada Lista Suja, com o nome das empresas e pessoas flagradas explorando mo de obra escrava, e a traar o perfil dos aliciadores e exploradores. A fiscalizao resgata, em geral, trabalhadores analfabetos em situao social vulnervel, de misria. Eles so aliciados em locais pobres e levados a fazendas distantes, a maioria isolada geograficamente na vastido da fronteira agrcola brasileira. Os relatos mostram claramen-

te que o principal instrumento de dominao so as dvidas atribudas aos empregados pelo patro. Sem saber, o trabalhador cobrado das despesas com o transporte ao local de trabalho, a alimentao e at a hospedagem durante a viagem, sempre em valores superiores aos cobrados no mercado. Com o tempo, os trabalhadores passam a dever mais do que os salrios a receber e, por essa razo, so forados a continuar no servio. Outra estratgia a ameaa constante, inclusive com o uso de homens armados. Tentativas de fuga so constantemente reprimidas a bala. Auditores assassinados Mas os fiscais do Ministrio do Trabalho passaram a incomodar fazendeiros que no garantem condies dignas de trabalho. Tanto que, em 28 de janeiro de 2004, trs auditores fiscais e seu motorista foram assassinados em Una (MG), em plena inspeo de fazendas locais. O crime causou comoo nacional. Levou a Cmara a votar, em primeiro turno, a proposta de Emenda Constituio que permite o confisco das terras onde for registrado o trabalho escravo (PEC 438/01). O Congresso tambm aprovou indenizaes s vtimas. E determinou, em 2009, que, a cada ano, o dia 28 de janeiro seja comemorado como o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. No entanto, no Judicirio, a reao ainda lenta: at o momento nenhuma das nove pessoas acusadas de participao no crime foi a julgamento. A impunidade que estimula a explorao do trabalho escravo faz com que os fiscais encontrem - ao invs de pessoas e empresas atrasadas e desinformadas estabelecidas em propriedades com baixa produtividade -, latifndios muito produtivos, muitos deles com o que h de mais avanadomaio de 2011

em tecnologia para produzir principalmente gado, madeira, carvo para siderrgicas e cana-deacar para etanol, produtos que atingem grande valor no mercado internacional. Ainda que a OIT identifique lucros bilionrios obtidos em cadeias produtivas de todo o mundo s custas de trabalho escravo, no Brasil j existem casos que comeam a provar o contrrio. Alm de arcar com as indenizaes trabalhistas (recolhimento previdncia, pagamento de salrios, frias, 13 salrio etc.), os empregadores j vm sofrendo condenaes por danos causados aos trabalhadores. Recentemente, o Tribunal Regional do Trabalho da 8 Regio condenou uma empresa agropecuria a pagar uma indenizao de R$ 5 milhes por dano moral coletivo a trabalhadores escravizados em fazendas do Par. Escravos urbanos Mesmo que a esmagadora maioria dos casos no Brasil se concentre na zona rural, o trabalho escravo tambm tem sido descoberto nas cidades ou em outras atividades. Tanto que a PEC 438/01 tambm prev o confisco de propriedades urbanas onde seSIgABEM

Trabalhadores rurais em Rubiataba (GO): instalaes precrias e condies de vida muitas vezes sub-humanas so a marca da escravido moderna

encontre trabalho escravo. Recentemente, imigrantes de pases latino-americanos, principalmente bolivianos, foram encontrados trabalhando na indstria txtil, em plena So Paulo, em condies degradantes. Os exploradores se aproveitam da fragilidade desses trabalhadores, distantes de casa e, geralmente, em situao irregular no

Caminhoneiros formam uma categoria considerada por especialistas vulnervel a condies de trabalho degradantes

Brasil, para pagar salrios irrisrios por jornadas de trabalho extensas, oferecendo condies sub-humanas de residncia e alimentao. As denncias de trabalho escravo tambm atingem os caminhoneiros. Muitos trabalham em torno de 18 horas dirias, pressionados pela exigncia de produtividade, j que recebem por carga entregue. Mais que isso, eles geralmente fazem dvidas para comprar seus veculos. O nvel de estresse desses profissionais, que trabalham em meio aos perigos do trnsito das rodovias brasileiras, leva constantemente a problemas de sade, como hipertenso e estafa, agravados por problemas ergomtricos por passarem muito tempo sentados, em constante trepidao. Da mesma forma, os trabalhadores martimos esto entre os mais vulnerveis ao trabalho escravo. A fiscalizao em embarcaes, principalmente em guas internacionais, praticamente inexiste. Com o isolamento, os navios podem ser transformados em cativeiros, e a situao agravada pela dificuldade na identificao de responsabilidades legais entre os tripulantes.

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SUMRIO

Contexto

Trabalhador domstico um dos mais vulnerveisutra categoria que sofre pela situao vulnervel em que se encontra: as empregadas domsticas. Na Amrica Latina, mais de 14 milhes de mulheres trabalham em casas de famlia. Menos de um tero das domsticas da regio so registradas e o percentual das que conseguem se aposentar ainda menor. O trabalho domstico remunerado uma das atividades com maior dficit de trabalho decente, afirma relatrio da OIT de 2010, que pretende adotar uma conveno para trabalhadoras domsticas. Elas geralmente esto distantes de suas comunidades de origem, importadas para o trabalho em casas de pessoas de classe mdia. Assdio moral e sexual, violncia, trabalho forado e pesado, jornadas extenuantes, alimentao limitada, baixos salrios, no pagamento de horas extras, ausncia de contribuio Previdncia Social e de acesso sade, e at a reteno de documentos esto entre os abusos registrados contra essas profissionais.M.FERNANDES/OPOPuLAR

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Como ocorreu com essa garota levada do interior de Gois para Goinia, uma vez sozinhas com os patres, as domsticas ficam sujeitas a maus-tratos

Um dos problemas a dificuldade de entrar em residncias para checar as condies de trabalho dessas profissionais, muitas vezes relegadas a pequenos cubculos inadequados. O empregado domstico j tem menor proteo legal do que os demais trabalhadores con-

quistaram com a Constituio federal de 1988. Ele no tem direito a jornada de trabalho fixada em lei, horas extras, adicional noturno, depsito obrigatrio no Fundo de Garantia do Tempo de Servio (FGTS) nem seguro-desemprego, entre outros benefcios sociais.

Grande parte das mulheres da Amrica Latina trabalha como domsticaNo Brasil, cerca de 16,4% da populao feminina, que de 97,3 milhes, adotou essa profisso, de acordo com a OIT

Paraguai Uruguai ArgentinaBrasil

20,6% - 260 mil 18,6% - 317 mil 17,3% - 3,5 milhes16,4% - 16 milhes

Mxico Costa Rica Equador Guatemala Nicargua Honduras El Salvador Peru Venezuela

10,5% - 5,5 milhes 10,2% - 220 mil 9,6% - 642 mil 9,1% - 1,3 milho 8,9% - 246 mil 8,4% - 338 mil 7,7% - 261 mil 7% - 1 milho 4,3% - 596 mil0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Chile Panam Rep. Dominicana Bolvia Colmbia0 10

14,3% - 1,2 milho 13,8% - 223 mil 13% - 667 mil 11,6% - 567 mil 11,1% - 2,4 milhes20 30 40 50 60 70 80 90 100

Fonte: Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe (Cepal), 2009

om a posse de Dilma Rousseff como presidente da Repblica e de novos ministros e quadros no governo, os militantes que lutam pela erradicao do trabalho escravo no pas renovaram este ano suas esperanas de que o Estado tenha maior eficincia no combate a essa prtica. A Frente Nacional e a Frente Parlamentar pela Erradicao do Trabalho Escravo, em debate realizado no Senado em 3 de fevereiro deste ano, com a presena, entre outras autoridades, da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosrio, entendem que ainda h um longo caminho at que o pas se livre do problema. Os participantes apostam em sensibilizar politicamente o novo governo para apoiar as iniciativas de combate ao trabalho escravo. A luta pela erradicao efetiva do trabalho escravo deve ser um dos pilares do pas que queremos, de tal modo que, daqui a alguns anos, no precisemos mais nem de Frente Parlamentar, nem de subcomisso no Senado ou na Cmara, nem de outros rgos para combater o trabalho escravo, afirmou o presidente de honra da frente nacional, o exsenador Jos Nery, durante a audincia pblica. Alm da presidente Dilma, os membros da frente iro buscar o apoio do presidente da Cmara, Marco Maia (PT-RS), para conseguir a aprovao final da PEC 438/01 pelos deputados. A proposta, que visa a expropriao das terras onde for observado o trabalho escravo, umawww.senado.gov.br/emdiscussao

das principais bandeiras do movimento de erradicao do trabalho escravo. A resistncia a essa e outras propostas defendidas pela frente nacional, como o aumento da pena pelo crime de explorao do trabalho escravo, porm, grande, principalmente a da bancada ruralista (leia mais na pg. 65). Em outro front, os membros da Frente Parlamentar, por iniciativa do deputado Cludio Puty (PTPA), recolheram as assinaturas necessrias criao de uma comisso parlamentar de inqurito (CPI) do trabalho escravo na Cmara dos Deputados. Agora, comea a batalha para a instalao da comisso, que pretende averiguar denncias de explorao de trabalhadores e propor aperfeioamentos na legislao, o que inclui mais um reforo na campanha pela aprovao da PEC 438/01 (leia mais na pg. 72). Do ponto de vista prtico, os militantes que lutam contra o trabalho escravo querem que o Estado continue se estruturando para fazer frente ao problema. Segundo eles, tanto o Judicirio, quanto o Ministrio Pblico e o Ministrio do Trabalho precisam estar mais bem aparelhados para reprimir e punir os exploradores. Ateno especial foi dada durante a audincia pblica aos grupos mveis de fiscalizao do MTE. Segundo dados apresentados pelo presidente em exerccio da Frente Parlamentar, senador Cristovam Buarque (PDT-DF), j houve 3.464 fiscais do trabalho

DAVIDRIBEIRO

Sociedade e parlamentares renovam compromissos

Parlamentares e militantes contra o trabalho escravo traam novas estratgias para o incio de governo e de legislatura

no pas, mas hoje eles so apenas 3.032. No por coincidncia, o nmero de fiscalizaes dos grupos mveis e o Oramento da Unio para o combate ao trabalho escravo j foram maiores (veja infogrfico na pg. 51). Outra linha de atuao da frente nacional garantir que as pessoas identificadas como exploradoras do trabalho escravo sejam condenadas. A impunidade e a omisso tm se perpetuado de modo a fazer com que os criminosos permaneam sem julgamento apesar das vrias aes nas varas federais, afirma o deputado Domingos Dutra (PT-MA), secretrio-geral da frente parlamentar. Nova oportunidade de se fazer justia pode, enfim, estar chegando. Depois de sete anos, em 2011, finalmente, devem ir a jri os acusados de assassinar trs auditores e um motorista do Ministrio do Trabalho em Una, Minas Gerais (veja mais na pg. 38). Desde 2004, a sentena do juiz da Vara Federal de Belo Horizonte que manda os nove acusados a julgamento vem sendo alvo de recursos especiais e embargos (ao considerada como sendo apenas protelatria) em instncias superiores, como o Superior Tribunal de Justia (STJ). Agora, a procuradora da Repblica Mirian Lima, responsvel pelo caso, acredita que recursos para adiar o julgamento se esgotaram. Sua esperana e das famlias dos mortos que a Justia se pronuncie este ano.

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ContextoLuIZVASCONCELOS/ACRTICA

Contexto

Se comparamos os trabalhadores escravizados de hoje com os escravos de antes de 13 de maio de 1888, eles tm uma vantagem: no so vendidos. Mas a desigualdade entre eles e seus patres hoje maior. O atendimento mdico a um escravo no era muito diferente do atendimento ao dono do escravo, porque a medicina era muito primitiva na poca. As condies de moradia eram desiguais, mas naquela poca no tinha ar-condicionado, as facilidades que temos. Na capacidade de locomoo, antes, se andava a p, a cavalo, ou carregado. Hoje, se dispem de avies, avalia o senador Cristovam Buarque. Mais cruel Segundo Vera Albuquerque, secretria de Inspeo do Trabalho do Ministrio do Trabalho e Emprego, o escravo era uma propriedade, uma ferramenta que precisava de cuidado, j que sua morte representava uma grande perda. J os escravos atuais so absolutamente descartveis e a escravido muito mais cruel, afirma. O deputado Cludio Puty destaca que a libertao dos escravos atendeu aos interesses dominantes na poca, que migraram para formas mais eficientes de gerao de riqueza. Hoje a economia, no entanto, no mostra dificuldades para conviver com a escravido, argumenta o deputado. No sculo 19, falava-se da abolio do escravo como uma libertao da terra, do capital, de uma forma de trabalho que no servia mais aos interesses da acumulao de capital. No sculo 21, temos uma expanso do trabalho anlogo ao escravo como forma de precarizao absoluta do trabalho, como fruto do neoliberalismo, explica Puty. Confirmando essa tendncia, a Organizao Internacional do Trabalho afirma em seu relatrio global de 2005 que a nova escravido to vantajosa para os empresrios quanto a da poca dowww.senado.gov.br/emdiscussao

A pobreza e o desemprego acabam por deixar os trabalhadores sem opes, o que os impede de reclamar seus direitos ou exigir dos patres melhores condies de trabalho

Brasil Colnia e do Imprio, pelo menos do ponto de vista financeiro e operacional. A afirmao tambm se sustenta nas concluses de estudo do socilogo norte-americano Kevin Bales, que, em seu livro Disposable People: New Slavery in the Global Economy (Gente Descartvel: A Nova Escravido na Economia Mundial) compara a escravido contempornea com aquela que durou at o sculo 19 no Brasil. Kevin Bales demonstra que, atualmente, h mais crueldade do que havia naquela poca. Hoje, o trabalhador descartvel, confirma o subprocurador-geral do Trabalho Luis Antonio Camargo. O senador Pedro Taques (PDT-MT) cita o professor Oscar Vilhena Vieira, da Fundao Getlio Vargas, que divide os brasileiros em categorias como os invisveis e os imunizados. Os invisveis so esses trabalhadores que so escravizados, que precisamos trazer luz. Para isso, precisamos fazer com que os imu-

nizados sejam responsabilizados, inclusive aqueles que fazem parte do Congresso, com denncia no Supremo Tribunal Federal pela prtica de trabalho escravo. No podemos fazer com que os imunizados possam se sobrepor aos invisveis, declarou Taques. Cludio Puty denuncia que o novo trabalho escravo herdeiro das relaes sociais arcaicas que somente subsistem por estarem associadas ao agronegcio e produo de mercadorias e commodities que tm papel importante na pauta de exportao brasileira, como carne, soja, madeira ou carvo (para produo de ferro). H uma relao entre formas arcaicas de servilismo, de submisso, e os setores mais modernos da pauta de exportao brasileira. No h justificativas em termos de produtividade e no h justificativas no clculo econmico que permitam que aceitemos essa imoralidade chamada trabalho escravo, alerta o deputado.

Antes valiosos, os escravizados de agora so descartveisH mais de 200 anos, durante a Revoluo Francesa, a escravido foi considerada intolervel para a Humanidade. Apenas um sculo depois, o Brasil aboliu as leis que permitiam a um homem ser dono de outros homens. No entanto, a deciso transformada na Lei urea, de 1888, embora tenha significado um gigantesco passo na direo da justia social, no resolveu o problema da insero dos escravos libertos na economia de ento. Na maioria dos casos, eles deixaram de ser parte de um processo produtivo em que tinham garantida a subsistncia para se tornarem prias, ainda que declarados livres. O problema j tinha aparecido de maneira ntida em 1871, quando o Congresso aprovou a Lei do Ventre Livre, que dava liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir de ento. O efeito da lei, porm, foi separar as crianas de seus pais, que continuavam escravizados. Afinal, os senhores de fazendas estavam desobrigados de prover o sustento das crianas negras, que eram abandonadas nas ruas ou, quando afortunadas, recolhidas por instituies religiosas. Muitas delas morriam, ou se submetiam a situaes degradantes, como a prostituio e o crime, para sobreviver. A mesma coisa aconteceu em 1885, com a promulgao da Lei dos Sexagenrios, que deu liberdade aos escravos com mais de 60 anos de idade. Alm de no receber mais abrigo ou alimentos de seus antigos donos, os negros, velhos e enfraquecidos, j no tinham o vigor necessrio para continuar trabalhando. E, com a Lei urea, contingentes de negros trazidos fora da frica, ou seus descendentes, foram despejados, sem assistncia oficial, e sem que fossem includos no mercado de trabalho. A situao vulnervel em que passaram a viver os deixou expostos a todo tipo de explorao. E base para a grande disparidade entre ricos e pobres no Brasil de hoje.maio de 2011

Nova escravido ainda mais perversa, diz a OITAo contrrio dos antigos, valiosos para os seus senhores e por isso de alguma forma bem cuidados, os escravos de hoje so totalmente descartveisAntiga Escravido Propriedade legal Custo de recrutamento de mo de obra Lucros Permitida Alto. A riqueza de uma pessoa podia ser medida pela quantidade de escravos Baixos. Havia altos custos com a manuteno dos escravos Escassa. Dependia de trfico negreiro, priso de ndios ou dos novos escravos nascidos nas fazendas Longo perodo. O dono cuidava dos escravos pela vida inteira Relevantes para a escravizao Nova Escravido Proibida Muito baixo. No h compra e, muitas vezes, gasta-se apenas com o transporte Altos. Se algum fica doente ou velho pode ser mandado embora, sem nenhum direito Descartvel, dado o grande contingente de trabalhadores desempregados Curto perodo. Terminado o servio, no mais necessrio prover o sustento do empregado Pouco relevantes. Qualquer pessoa pobre e miservel pode se tornar escravo, independente da etnia Ameaas, violncia psicolgica, coero fsica, punies exemplares e at assassinatos

Mo de obra

Relacionamento

Diferenas tnicas

Manuteno da ordem

Ameaas, violncia psicolgica, coero fsica, punies exemplares e at assassinatos

Extrado de Disposable People: New Slavery in the Global Economy, Kevin Bales,1993

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realidade brasileira

Nmero de escravos pode ser maior do que se imaginaDados sobre escravido so incompletos. Mas Ministrio do Trabalho, OIT e Pastoral da Terra conhecem a dinmica e as causas que levam brasileiros escravido. Casos se concentram na fronteira agrcola, mas j surgem nos canaviais e na indstria txtil

A

s pegadas do pas do futuro, do agronegcio pujante, da indstria em expanso deixam um rastro difcil de imaginar: o crescimento do nmero de trabalhadores brasileiros atrados por falsas promessas, isolados, endividados, coagidos e exauridos por longos turnos de trabalho. Mais de 39 mil trabalhadores nessa situao foram resgatados pela ao dos grupos de fiscalizao do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) entre 1995 e 2010. Enquanto apenas 84 trabalhadores foram libertados em 1995, o nmero anual cresceu acentuadamente a partir de 2001, chegando a quase 6 mil em 2007. Mas voltou a cair para 2.617 no ano passado (veja infogrfico na pgina 16 ). O aumento de casos at 2007 tambm se explica pelo incremento da fiscalizao, a partir da mudana do Cdigo Penal em 2003 que passou a caracterizar melhor o crime e a prever maior punio , da ao do governo e da atuao das organizaes no governamentais (veja mais a partir da pg. 32). Mas a queda do nmero de resgatados a partir de 2007 significa que houve menos fiscalizao ou que o problema diminuiu? Mesmo com os poucos dados, fornecidos em geral por informantes e fugitivos, Xavier Plassat,

da Comisso Pastoral da Terra (CPT), acredita que as duas hipteses esto corretas: o problema se revela quando intensificada a fiscalizao e se agrava com o crescimento econmico do pas. Segundo Plassat, a discrepncia entre os dados da CPT, que desde os anos 1970 recebe e encaminha denncias, e os do MTE deve-se a um dficit na apurao das denncias recebidas, o que ele chama de subfiscalizao. Difcil mapear Mesmo com todo o histrico e dados colhidos nos ltimos anos,

ainda no to fcil mapear o problema por se tratar de uma atividade clandestina, criminosa. A falta de integrao dos planos de combate, aes e rgos nas esferas estadual e federal tambm impede que dados oficiais sejam organizados. Organizaes no gover-

Dezembro de 2001: trabalhadores escravizados da fazenda Tuer, localizada em uma vicinal da Transamaznica, no municpio de Senador Jos Porfrio, Par

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J.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

Realidade brasileira

Realidade brasileira

ONGs apontam subfiscalizao e cobram mais apuraoNmero de resgatados cresceu principalmente porque a atividade nos canaviais exige mais trabalhadores, apontam os especialistas300 250 200 150 100 50 0 0 2.000 4.000 6.000 8.000Fontes: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010 e Relatrios Especficos de Fiscalizao para Erradicao do Trabalho Escravo, Ministrio do Trabalho e Emprego, 2010

Estado omisso e misria esto na raiz do problema2008 2009

Denncias Operaes de fiscalizao1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Trabalhadores resgatados Trabalhadores envolvidos

namentais (ONGs) tentam preencher essas lacunas com pesquisas prprias. Mas, segundo documento da Pastoral da Terra, muito difcil conseguir informaes exatas sobre o nmero de pees escravizados. O peo fala, no mximo, do grupo que foi com ele, do local onde estava.

Nem sempre tem contato com o todo. Quem sabe da realidade so os gerentes ou proprietrios, que sempre negam. Em 2001, a OIT j alertava para a necessidade de mais informaes e anlises sobre o problema. Em relatrio, afirmou que as formas contemporneas de

trabalho forado requerem urgentemente mais pesquisas e ateno, para preparar o terreno para indicadores e avaliaes mais precisos e com perspectiva de gnero como base para uma definio poltica e ao futura. Estimativas As estimativas da Pastoral da Terra do conta de que, para cada trabalhador escravizado do qual a entidade tem conhecimento, existem outros quatro ou cinco na mesma situao. Ou seja, existiriam hoje no pas entre 25 mil e 30 mil pessoas trabalhando em condies semelhantes escravido. H setores que falam em at 100 mil. Para o subprocurador do Trabalho Luis Antonio Camargo, apenas 50% das denncias so apuradas. Ento, mesmo tendo sido resgatados quase 38 mil (de 1995 a 2010), h ainda um nmero enorme de trabalhadores aguardando pela interveno do poder pblico, aguardando pelo resgate da cidadania. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) alerta para os objetivos anuais a serem cumpridos e a dramaticidade da situao atual. Eu quero chamar a ateno para este dado: 25 mil entram na escravido por ano. Isso significa que, se a gente no resgatar 25 mil, o nmero est aumentando.maio de 2011

Fiscais no conseguem checar todas as dennciasEm mdia, apenas 60% das denncias recebidas so efetivamente investigadas

Total (2003-2009):

denncias

1.788 1.108

fiscalizaes

denncias

fiscalizaes

240

2009

169

70% 77% 57% 51% 59% 55% 64%percentual de denncias fiscalizadas

280 2008 216 265 2007 150 265 2006 136 275 2005 161 230 2004 126 233 2003 150

Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010

As disparidades sociais no Brasil, histricas e atuais, associadas a uma das maiores concentraes de renda do mundo, se tornam ainda mais gritantes para a sociedade quando surgem notcias de que ainda h, alm de fome e misria, trabalho escravo no pas. A persistncia da escravido, ainda que em suas formas contemporneas, tem relaes com o passado, mas tambm com fatores culturais e econmicos, que se materializam na caracterstica do poder pblico nacional de no desenvolver, at muito recentemente, polticas suficientes em favor dos excludos ou dos mais pobres. Para o deputado Amauri Teixeira (PT-BA), historicamente o Estado brasileiro no foi estruturado para reconhecer direitos. O Estado brasileiro historicamente foi montado para negar os direitos dos desfavorecidos. O deputado Cludio Puty (PT-PA) tambm v razes culturais no problema, agravadas pelas modernas polticas econmicas: O trabalho escravo, apesar de estar presente nas cidades, est muito associado expanso da fronteira. E a expanso da fronteira no deve ser vista simplesmente como a expanso de atividades consideradas arcaicas, com relaes sociais arcaicas, mas, sim, como relaes associadas ao agronegcio e a ciclos de exportao de mercadorias e commodities, que tm um papel importante na pauta de exportao brasileira. No entanto, relatrio da OIT afirma que, embora produtores rurais das regies com incidncia de trabalho escravo afirmem que esse tipo de relao de trabalho faz parte da cultura ou tradio, ela utilizada apenas por uma minoria dos fazendeiros dessas regies.www.senado.gov.br/emdiscussao

Para Rodrigo Schwarz, juiz e professor de Direito do Trabalho, s causas histricas e culturais somam-se problemas crnicos do pas: A insuficincia das polticas agrrias, a concentrao de renda, o uso socialmente nocivo da propriedade, as largas desigualdades sociais e regionais e a consequente pobreza e excluso social e econmica de um grande nmero de pessoas. O professor vai mais alm, af irmando que, no Brasil, a transio do modo de produo baseado no escravismo para o modo de produo baseado no trabalho livre sequer foi efetiva. Segundo Schwarz, as relaes de trabalho do Brasil contemporneo no romperam em definitivo com o modelo escravista, apenas foram reformuladas as formas de produzir, sem que as regras impostas a trabalhadores fossem essencialmente alteradas. De fato, na maioria dos estudos e relatrios sobre o tema h referncias a trs situaes que estariam na raiz do problema: a concentrao de terras nas mos de poucos, a falta de alternativas de renda para as pessoas, o incentivo financeiro indiscriminado s empresas independentemente de como elas produzem e a vulnerabilidade social dos trabalhadores em razo da pobreza e da baixa escolaridade. O senador Wellington Dias (PT-PI) reconheceu que a pobreza e baixos ndices educacionais j fizeram do seu estado um dos que mais cederam pessoas para o trabalho escravo. Barras (PI), informou, j foi a cidade que mais forneceu mo de obra escrava. Porm, o senador, que foi governador do estado nos ltimos oito anos, informou aos presentes ao debate da Frente Parlamentar Mista pela Erradicao do Tra-

JOSCRuZ

Senador pelo Piau, Wellington Dias sugere educao e reduo da pobreza no combate escravido

balho Escravo que a situao vem sendo contornada. E sugeriu formas de combater o problema. Em Barras, disse, foram criados cerca de 70 assentamentos para a populao local. Com isso, tivemos uma reduo muito grande no ndice de trabalho escravo. A educao, continuou, teve papel importante nisso. O Estado teve o maior crescimento no nmero de matrculas na prescola, tem mais matriculados frequentando a escola no ensino fundamental no Brasil, com um ndice de 98,5%. Cresceu no ensino mdio, no ensino superior e no profissionalizante, relatou.

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Realidade brasileira

Realidade brasileira

Trabalho escravo no se limita regio Norteres libertados acima da mdia, de acordo com estudo de Xavier Plassat, da Comisso Pastoral da Terra: Tocantins, Maranho, Bahia e Gois. Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Minas Gerais tambm tm ndices elevados (veja infogrfico abaixo). Segundo Plassat, "essa mudana reflete a intensificao da fiscalizao, especialmente em regies aonde ela no costumava chegar e, mais ainda, em setores de No Par, quase metade dos atividades at ento remunicpios tem trabalho escravo servados fiscalizao trabalhista comum". J Alagoas e Pernambuco so fornecedores de mo de obra Para Plassat, a muPar dana reflete tambm 48% Mato Grosso as condies prprias 47%Tocantins Maranho Mato Grosso do Sul Acre Amap Gois Esprito Santo Rondnia Amazonas Piau

Par e Mato Grosso sempre lideraram as estatsticas de explorao do trabalho escravo. No entanto, dois estados produtores de carvo para siderrgicas, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, vm se destacado nos ltimos anos. De 2003 a 2009, alm do Par e Mato Grosso, quatro estados tiveram nmero de trabalhado-

de expanso e transformao do agronegcio. As modificaes recentes nas leis e na forma como o governo trata o trabalho escravo tambm esto na base dessa nova realidade. Ainda conforme a anlise de Xavier Plassat, o nmero mdio de estabelecimentos fiscalizados pelo MTE cresceu 140% entre 2003 e 2009, se comparado ao perodo entre 1995 e 2002. Nas regies Centro-Oeste e Sul, o ministrio praticamente triplicou as operaes (170% a mais). J na regio Norte foram fiscalizados quase quatro vezes mais estabelecimentos (aumento de 280%). No Nordeste e no Sudeste, o crescimento foi menor, 80%

e 20%, respectivamente. O nmero mdio de libertaes aumentou 490%, mas, dessa vez, o maior crescimento foi no Nordeste (830%), no Sudeste (1.770%) e no Sul, que passou de zero a 153 libertados. Nas demais regies, o incremento foi menor: 320% no Norte e 450% no Centro-Oeste. Entre os 15 estados com mais trabalhadores libertados entre 2003 e 2009, cinco so da Amaznia Legal (PA, MT, TO, MA e RO). Seis estados tiveram suas primeiras libertaes entre 2003 e 2009 (GO, MS, RJ, PE, PR e ES). Fiscalizao em canaviais No perodo entre 1995 e 2002, somente em dez estados seis deles na regio Norte foram libertados trabalhadores. J no perodo entre 2003 e 2009, 24 estados (exceo feita ao Amap, Paraba e ao Distrito Federal) registraram a libertao de pessoas. Para Xavier Plassat, o surgimento de novos estados nos registros nacionais de trabalho escravo deve ser interpretado dentro do contexto de descobrimento que ainda est sendo feito quanto realidade atual do trabalho escravo no Brasil com modalidades que vo desde as condies

38% 33% 29% 28% 20% 16% 16% 13% 10% 7% 7%

PA e MT lideram ranking de libertadosPrincipal misso dos escravizados desmatar para expandir fazendas

posio

ranking 1995-2002

evoluo

ranking 2003-2009

Cidades que lideram as denncias(entre 2003-2009)

Rio de Janeiro Paran Bahia

6%

Santa Catarina Minas Gerais Alagoas

4% 4% 4%

So Paulo Cear

3% 3%

legenda

Rio Grande do Norte Pernambuco Rio Grande do Sul

2% 2% 2%

PA PA MA PA PA PA PA PA PA PA PA TO PA TO PA GO PA MT MA

So Flix do Xingu Marab Aailndia Rondon do Par Pacaj Dom Eliseu Novo Repartimento So Geraldo do Araguaia gua Azul do Norte Itupiranga Goiansia do Par Araguana Rio Maria Anans Paragominas Mineiros Sapucaia Santa Rita do Trivelato Bom Jardim

106 88 58 49 42 41 34 32 28 30 18 16 15 18 18 10 9 7 11

1 - - - - - - - - - - - Par 2 - - - - - - Mato Grosso 3 - - - - - - - Maranho 4 - - - - - Minas Gerais 5 - - - - - - - - - - Piau 6 - - - - - - - - - - Gois 7 - - - - - - - So Paulo 8 - - - - - - - Tocantins 9 - - - - - - - - - Alagoas 10 - - - - - - - - Rondnia 11 - - - - - - - - - - - Acre 12 - - - - - - - Amazonas 13 - - - - - - - - - Amap 14 - - - - - - - - - - Bahia 15 - - - - - - - - - - Cear

Par Mato Grosso Gois Bahia Tocantins Mato Grosso do Sul Maranho Minas Gerais Rio de Janeiro Pernambuco Alagoas Rondnia Paran Piau Esprito Santo

degradantes at o aprisionamento puro e simples. Na realidade, poderia se dizer que, aonde chega o holofote da fiscalizao, a se descobre a prtica do trabalho degradante que caracteriza boa parte das lavouras brasileiras, de norte a sul. Os nmeros apresentaram uma nova realidade em Gois, Bahia, Tocantins e Mato Grosso do Sul, que esto entre os seis primeiros colocados, ganhando entre trs e 12 posies em relao ao ranking anterior. Tambm ganharam posies o Rio de Janeiro (+13 posies), Pernambuco (+10), Paran (+8) e Esprito Santo (+2). A explicao para esse crescimento, segundo Plassat, so as operaes nos canaviais, que registraram a maior proporo de libertados por operao. Plassat alerta ainda para o risco de interpretar as mudanas geogrficas como um deslocamento do trabalho escravo para a regio Sudeste. Ele atribui esse crescimento sistematizao e ao aumento da fiscalizao nos canaviais do Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste e subfiscalizao na regio Norte e nos estados do Maranho e de Mato Grosso, tradicionais lderes do ranking por concentrarem a principal rea de

expanso da fronteira agrcola. De acordo com a Pastoral da Terra, na regio Norte, 52% dos casos denunciados no perodo 1995-2009 deixaram de ser fiscalizados. Esse percentual de 37% no Nordeste, 22% no CentroOeste, 8% no Sudeste, 0% no Sul, perfazendo uma mdia nacional de 44% (veja infogrficos na pg. 16 ). Fornecedores Mais difcil ainda que identificar os estados que exploram o trabalho escravo descobrir de onde vm esses milhares de trabalhadores. Leonardo Sakamoto, da ONG Reprter Brasil, afirmou durante a audincia pblica no Senado que, considerando os nmeros entre 2003 e 2009, o Maranho foi o estado que mais forneceu gente para o trabalho escravo: 28% dos resgatados so maranhenses. De acordo com Sakamoto, outros estados em que aliciada a maioria desses trabalhadores so Par, Bahia, Mato Grosso do Sul, Piau, Minas Gerais, Tocantins e Pernambuco (veja infogrficos nas pgs. 18 e 24). J Amambai, em Mato Grosso do Sul, lidera o ranking de municpios fornecedores de mo de obra para o trabalho escravo.

Regies de desmatamento tm mais resgatados Trabalhadores Norte e Centrolibertados Oeste concentram a por regio maior parte dasoperaes de fiscalizao

1.59537%

Norte

Nordeste

94022%

(mdia anual entre 2003-2009)

Centro-Oeste

Regio* Operaes Estabelecimentos fiscalizados

Norte

CentroOeste 22% 23%

1.22228%

Nordeste

Sudeste

Sul

Total

Sudeste

43010%

36% 40%

46

29 57

21% 16%

27

11% 13%

15 15

10%

12

100% 100%

130

manteve a posio caiu ou saiu do ranking subiu ou entrou no rankingFonte: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010

98

38

198%

245

Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010

1%

Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010

*mdia anual entre 2003-2009

1534%

Sul

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SUMRIO

Realidade brasileira do, a situao flagrada na oficina de costura seria, para a entidade, um dos motivos para a reduo drstica de empregos formais no setor. Pernambucanas Em maro deste ano foi a vez de a rede Pernambucanas ser autuada pelos fiscais. Em tudo semelhante ao da Marisa, o caso resultou em multa de R$ 2,2 milhes e em 43 autos de infrao por irregulariddades na contratao e nas condies de trabalho oferecidas por uma empresa terceirizada a 16 trabalhadores bolivianos, entre eles dois menores de idade, que costuravam das 8h s 22h. Isso diferente de terceirizar servios de apoio, como limpeza ou segurana, diz o juiz do trabalho Marcus Barberino. (Com informaes da ONG Reprter Brasil, que acompanha as fiscalizaes)

Ao dos fiscais do trabalho de SP que resultou na autuao da Marisa flagrou imigrantes trabalhando em condies degradantes

MAuRCIOHASHIZuME/REPRTERBRASIL

Trabalhadores param grandes obras de infraestruturaAlvodeprotestosporpartedeONgs e representantes de comunidades indgenaseribeirinhas,ausinaHidreltricadeBelo Monte,norioXingu, noPar,chamouaatenodasenadoraMarinorBrito(PSOL-PA)pela possibilidadede,indiretamente,estimular o trabalho escravo. Emmaro,aComissodeDireitos Humanos e Legislao Participativa (CDH) aprovou pedido da senadora paraqueumacomissovisitassea regio e ouvisse a sociedade local. Noinciodeabril,aOrganizaodos EstadosAmericanos(OEA)sugeriu queasobrasdeBeloMontefossem paralisadasatqueumasriedeexigncias,ambientaisesociais,fossem acatadas. Essasituaonospreocupa,porque noexiste,atagora,annciodogoverno sobre programas de preveno detrabalhoescravo,trabalhoinfantil eviolnciasexualenvolvendoasredesdeprostituiojdenunciadas naregio,afirmaMarinor.Segundo ela,aobradeveatraircercade100 miltrabalhadoresparaareaprximausina.Noentanto,estima-se que,naconstruo,sejamgerados apenas 20 mil empregos diretos e 23 mil indiretos. Deacordocomasenadora,estariam criadascondiesquepodemfavorecer o aliciamento de mo de obra paratrabalhodegradante.Naregio,temos19mildesempregados eestsendoanunciadaageraode novos20milempregos.Issosignifica quemaistrabalhadoresseconcentraro para ficar em situao de vulnerabilidade social. Mais trabalhadores se concentraro numa regio quejnotemempregonemsaneamentobsico,notemperspectivas emmdiooucurtoprazodeincluir socialmenteopovo,afirmou. MembrosdaCDHestiveramemBelo Monteem16deabrileorelatrio davisitaestsendofinalizadopara apresentao Comisso por MarinorBrito. Algumasdelasdizemrespeitoacondies de trabalho a n loga s ao t raUsina de Belo Monte balho escravo. Por Com capacidade total instalada de 11.233 meconta da rebelio gawatts (MW), segundo dostrabalhadores, nmeros do governo, a s obra s f ic ara m a Usina Hidreltrica paralisadas por sede Belo Monte dever manas,atrasandoo ser a terceira maior do cronograma e caumundo, atrs apenas sando rejuzos. p de Trs Gargantas, na AlmdeJirau,ouChina, e da binacional tras grandes obras Itaipu, na fronteira do Brasil com o Paraguai. enfrentaram recentemente problemas por causa das condies de trabalho. ocasodasobrasdoscomplexos porturios de Suape (PE), Pecm (CE)ePortoAu(RJ),edausinaSo Domingos (MT). Segundo as centrais sindicais e as construtoras,82miltrabalhadoresde obrasdoProgramadeAceleraodo Crescimento(PAC)pararamparareivindicarmaioressalriosemelhores condies de trabalho. Comoosprojetosrecebemrecursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES),umaequipedobancovisitou Jirau 20 dias antes dos conflitos, sem, no entanto, relatar qualquer irregularidade.

Imigrantes so escravizados na maior cidade do continenteEm agosto de 2010, a Superintendncia Regional do Trabalho e Emprego de So Paulo flagrou na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte da capital paulista, 17 imigrantes trabalhando em condies anlogas escravido numa pequena confeco que fornece peas de roupa para a Marisa, grande rede de lojas de vesturio do pas. Nenhum dos que operavam mquinas de costura tinha carteira assinada. Foram apreendidas anotaes sobre cobranas de passagens da Bolvia para o Brasil e outros descontos ilegais, registrados com termos como fronteira e documentos o que, segundo a fiscalizao, consiste em fortes indcios de trfico de pessoas. H registros de salrios de R$ 202 e R$ 247, menos da metade do salrio mnimo da poca (R$ 510) e menos de um tero do piso da categoria (R$ 766) em So Paulo. As jornadas de trabalho comeavam s 7h e se estendiam at 21h. As refeies eram feitas de modo improvisado, nos fundos do edifcio da oficina. O irmo do dono atuava como vigia permanente dos imigrantes. Vrios problemas graves de sade e segurana do trabalho foram detectados, entre eles instalaes eltricas irregulares e alojamentos inadequados, com infiltraes, umidade excessiva, falta de ventilao, mau cheiro e banheiros precrios. Cadeia produtiva Na cadeia produtiva, uma empresa compra os tecidos, faz o primeiro corte e subcontrata a costura; a segunda faz a costura das peas; e uma terceira presta servios de acabamento, reviso, arremate e controle de qualidade. Caracterizadas pelos f iscais como pseudoempresas interpostas, essas confeces funcionavam, na avaliao dos auditores, como verdadeiras clulas de produo da Marisa, encobrindo relao de emprego, razo pela qual o magazine foi responsabilizado pelas multas e acertos financeiros com os empregados da pequena confeco. O magazine recebeu 43 autos de infrao, num total de R$ 633,6 mil em multas, dos quais R$ 394 mil se referiam sonegao do Fundo de Garantia do Tempo de Servio (FGTS). Os auditores tambm exigiram que a empresa fizesse o registro e a resciso dos contratos de trabalho, e pagasse os direitos correspondentes. Por conta de denncias anteriores, a Marisa e outros magazines do setor txtil j haviam assinado um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministrio Pblico do Trabalho (MPT) em 2007, comprometendo-se a evitar ligaes com oficinas com trabalho ilegal. Aps a fiscalizao de 2010, a Marisa anunciou que implantaria um novo modelo de certificao para combater o trabalho degradante. Novo TAC foi assinado em setembro de 2010, responsabilizando a empresa por verificar as condies e contratos de trabalho dos empregados de toda a sua cadeia produtiva. Entre os imigrantes libertados em So Paulo, 16 so bolivianos entre eles um adolescente e um peruano. A maioria dos bolivianos vinha de El Alto, cidade vizinha capital La Paz. Eles disseram terem sido atrados pelas histrias de sucesso de parentes que vieram para o Brasil. O nico peruano disse que era de Cusco e no tinha o visto temporrio. Segundo o Sindicato das Costureiras de So Paulo e Osasco, o nmero de costureiras na regio caiu de 180 mil, na dcada de 1990, para cerca de 80 mil, em 2006. Como a demanda do setor cresceu muito nesse mesmo peromaio de 2011

ViolnciaSituaesdeviolnciaemobrassemelhantesjocorreram.Operrios da usina de Jirau, no Alto Xingu, Rondnia,serebelaram em 15 de maro,destruindoalojamentos.Cerca de 10 mil dos 22 mil trabalhadoresenvolvidosnaobrativeramque deixarolocal.Trsdiasdepois,os cercade16miltrabalhadoresque constroemausinadeSantoAntnio, tambmemRondnia,cruzaramos braos em solidariedade aos colegas deJirau. Entreasqueixasdostrabalhadores, estodiferenasentreosbenefcios pagospelasempresasdoconsrcio que toca a obra, maus-tratos por partedosmotoristaseseguranas, faltadeplanodesadeeosaltos preos dos remdios vendidos no canteirodeobras.Outrasreclamaesdizemrespeitoaosbaixossalrios e ao no pagamento de horas extras.RIANANDR/RONDONIAgORA

Operrios da usina de Jirau, em Rondnia, se rebelaram em maro de 2011, exigindo melhores condies de trabalho

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SUMRIO

Realidade brasileira

Realidade brasileira 1980, pressionada pelos baixos preos praticados no mercado internacional, especialmente pelos produtos chineses. Ao mesmo tempo, com a crise econmica argentina, a migrao de cidados bolivianos foi redirecionada para o Brasil, especialmente para So Paulo, onde so explorados por empresrios do setor txtil e de confeces (leia mais na pg. 17). Alm dessas atividades, o trabalho escravo tambm aparece em um setor que deveria estar acima de qualquer suspeita: as grandes obras financiadas pelo governo. Tm sido encontrados trabalhadores em situaes precrias na construo de hidreltricas e de estradas, contratados pelas empresas ganhadoras das licitaes ou por seus parceiros (leia mais na pg. 19).

Agronegcio concentra maioria dos casosO agronegcio o setor da economia que mais recruta pessoas para trabalhar em regime semelhante ao da escravido. E entre as atividades rurais com maior nmero de trabalhadores resgatados, o desmatamento para expanso da fronteira agrcola, especialmente na Amaznia, figura em primeiro lugar no ranking. No entanto, segundo Xavier Plassat, a expanso da cana-deacar para a produo de etanol exacerbou a prtica do trabalho escravo desde 2007. O crescimento do setor sucroalcooleiro e do agronegcio de gros no Cerrado, em regies de nova fronteira agrcola, explica boa parte do aumento observado: metade dos libertados de 2009, assim como os de 2008 e 2007, foram encontrados em nmero reduzido de fazendas de cana-de-acar. Em 2007, o senador Paulo Paim (PT-RS) j alertava para a gravidade da situao. Ele pediu ao Congresso que aprovasse projeto proposto por ele (PLS 226/07) que fixa jornada mxima de 40 horas para cortadores de cana, com direito a adicional de 20% por executarem atividade insalubre e perigosa. Alm disso, a proposta prev contratao de seguro de vida em grupo para esses trabalhadores e aposentadoria aos 25 anos de servio. S nos ltimos cinco anos (de 2002 a 2007), 1.383 trabalhadores morreram na lavoura de cana e muitos deles, fatigados, tombaram em pleno canavial, afirmou poca o senador. O PLS 226/07 est na Comisso de Agricultura (CRA) e o senador Ivo Cassol (PP-RO) foi designado relator. A partir de 2007, a proporo de libertados no setor canavieiro aumentou at atingir quase a metade do total de trabalhadores resgatados: 51% em 2007, 49% em 2008 e 45% em 2009 (leia mais na pg. 36 ). Por causa disso, afirma Plassat, a regio Norte, que sempre liderou o ranking em todas as categorias, agora est sendo superada pelo Sudeste e pelo Nordeste quanto ao nmero de libertados (veja infogrfico na pg. 19). Outra atividade conhecida dos que combatem o trabalho escravo so as carvoarias em geral localizadas no interior do Maranho, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso , que operam entre a escravido e o trabalho superexplorado na produo de carvo para a indstria do ao. Cadeia produtiva Um estudo da ONG Reprter Brasil, elaborado em 2004, seguiu os caminhos que percorria a produo das 96 fazendas que constavam da Lista Suja do Ministrio do Trabalho na poca. E revelou que a carne bovina, a cana-deacar, o caf, o carvo, a soja, o algodo e a pimenta-do-reino abasteciam 200 empresas nacionais e estrangeiras, algumas delas entre as maiores do pas (veja infogrfico na pgina ao lado). Pelo estudo, deve ser questionada a lgica dessas empresas de reduzir os custos de produo sem levar em conta as prticas de fornecedores, que podem estar explorando trabalho escravo. Indstria txtil A grande novidade dos ltimos anos foi a descoberta de que setores econmicos utilizam mo de obra escrava de imigrantes vindos de pases vizinhos da Amrica Latina, como a Bolvia. Um dos setores que mais crescem no Brasil, a indstria txtil vive um ambiente extremamente competitivo depois da liberalizao econmica da dcada de

Pecuria ainda concentra maior parte do trabalho escravoNos ltimos anos, no entanto, tem sido descoberto que outras atividades fazem uso de mo de obra forada antes encontrada principalmente na Amaznia , inclusive em grandes cidades do pas

65%

Desmatamento e pecuria

Trabalho escravo por atividade econmica (2003-2009)

2%

Reflorestamento

10%

Carvo

8%

Outra atividade ou no informadoO trabalho escravo produz principalmenteVALTERCAMPANATO/ABR

11% 1%Extrativismo Cana-de-acar

Outras lavouras

3%

caf

Em 2006, fiscais do trabalho apuraram denncias de trabalho escravo no corte da cana, em Rubiataba (GO)

3% 3% 3%

Desmatamento/pecuria75% 3%

Carvo Outras lavouras 20%2%

acar e etanol pimenta-do-reino outros Trabalhadores libertados

Outros ou no informado

Carvo 7% Outras lavouras17% 8%

30% Cana-de-acar 1%

3% 10%

algodo e soja carne e leite

Outros ou no informado 2% Reflorestamento

35%

Extrativismo

Desmatamento/pecuriaFonte: Trabalho escravo: 25 anos de denncia e fiscalizao, Xavier Plassat, 2010

Fonte: Trabalho escravo no Brasil, Organizao Internacional do Trabalho, 2005 Fonte: Trabalho escravo no Brasil, Organizao Internacional do Trabalho, 2005

80%

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SUMRIO

Realidade brasileira

Realidade brasileira acesso educao e informao, mais da metade deles est em situao irregular no pas, fceis, portanto, de intimidar com a ameaa de serem denunciados e deportados. Alm disso, a maioria dos imigrantes no fala portugus, desconhece a lei brasileira de proteo aos trabalhadores e no mantm contato com sindicatos. Eles ficam, portanto, merc dos intermedirios e patres no que diz respeito a alimentao, alojamento e tratamento mdico.

Perfil dos escravizados tem pobreza, analfabetismo e trabalho infantilUm estudo citado pela Organizao Internacional do Trabalho (OIT), com 121 trabalhadores resgatados de quatro estados, principalmente Par e Mato Grosso, mostrou que a maioria deles se desloca constantemente e apenas 25% residem no estado de nascimento. Quase todos comearam a trabalhar antes dos 16 anos e mais de um tero, antes dos 11 anos, em geral para ajudar os pais nas fazendas. Do total de entrevistados, 40% foram recrutados por meio de amigo ou conhecido e 27%, por meio de agente de recrutamento, o chamado gato, ou diretamente na fazenda. Dados da ONG Reprter Brasil informam que 95,5% das pessoas que trabalham em regime semelhante ao da escravido so homens. Do total, 40,1% so analfabetos. Apenas 27,9% chegaram a cursar os primeiros anos do ensino fundamental, sem, no entanto, completarem o quinto ano (antiga quarta srie). Outros 21,2% prosseguiram os estudos, mas sem conclurem o ensino fundamental. A maioria dos trabalhadores (63%) estava entre os 18 e 34 anos no momento do resgate, idade em que teriam, em tese, completado os ensinos fundamental e mdio (veja infogrfico abaixo). Mas tambm nessa idade que esto no auge do vigor fsico, capazes de executar tarefas pesadas e extenuantes. Outro dado que chama a ateno o uso de adolescentes no trabalho nas fazendas, ainda que perfaam apenas 2,5% do contingente de resgatados. As poucas mulheres encontradas pelos fiscais em geral trabalhavam como cozinheiras ou eram esposas de trabalhadores, muitas acompanhadas de crianas, que j ajudavam nas tarefas domsticas. Imigrantes A pobreza e baixa escolaridade no explicam apenas a vulnerabilidade dos trabalhadores recrutados no Norte e Nordeste. A Pastoral do Migrante informou relatora da ONU sobre Formas Contemporneas de Escravido, Gulnara Shahinian, que h 100 mil bolivianos trabalhando em So Paulo, muitos em condies anlogas de escravido. Alm da falta de recursos e de

Despesas de viagem e taxas ilegais descontadas dos salrios: trabalhador fica escravo das dvidas

Condies de trabalho desumanas e absurdas, diz OITAs condies impostas aos trabalhadores escravizados variam entre o desumano e o absurdo, segundoaOrganizaoInternacionaldo Trabalho (OIT). Em seu relatrio sobreotrabalhoescravonoBrasil, de2005,aentidadeafirmaqueos pioresalojamentossooferecidosa quemtrabalhanaderrubadadeflorestanativa,emlocaisinacessveis, sem transporte para voltar sede da fazenda. Em geral so apenas barracas de lona ou de folhas de palmeira nomeiodamata,emqueopisoa prpriaterra. Aassistnciasadequaseinexistente,dizorelatrio.Nafronteiraagrcola,doenastropicaiscomo malriaefebreamarelasoendmicas. Tambm h alta incidncia dedoenasrarasnorestodopas, como a tuberculose. Quando sofrem acidenteouficamdoentes,ostrabalhadores se tornam estorvo para gatos (agentes de recrutamento) e patresesodeixadosprpriasorte.Algunsandamquilmetrosato postodesademaisprximo.Aqueles em estado mais grave esperam mesesatquemelhorem,aparea algumquepossalev-loscidade oumorram.Comoosndicesdedesempregosoaltosnessasregies, sempre h pessoas para ocupar o vaziodeixadopelosdoentes. Nessa realidade, continua a OIT, itens de segurana so raros ou compradospeloprpriotrabalhador.H atividades,comoeliminarajuquira (ervadaninharasteira),queenvolvemaplicaodeveneno,semque sejamfornecidosmscaras,culos, luvasouqualquerequipamentode proteo. Depois de semanas nesse trabalho,ospeesficamcomapele carcomida pelo produto qumico, comcicatrizesquenocuram,alm detonturas,enjooseoutrossintomasdeintoxicao. Quantoalimentao,segundoa OIT,osprpriospeeschamamde cativootrabalhadorcujasrefeiessodescontadasdosalrio.O dever de honrar essa dvida ilegal com o gato ou o dono da fazendaumadasprincipaismaneirasde manterapessoaescravizada.Jo trabalhadorquetemaalimentao fornecidapelopatrochamadode livre.Acomidaresume-seafeijo earroz.Amistura(carne)raramentefornecidapelospatres. AOITnarraqueaguaquesebebeMPF/RO

BIANCAPyL/REPRTERBRASIL

Vulnerveis, trabalhadores no conseguem escapar do aliciamentoA maioria dos libertados formada por homens entre 18 e 34 anos, j que a dureza do trabalho exige pessoas no auge da fora fsica

Estado de origem1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Maranho Par Alagoas Pernambuco Minas Gerais Mato Grosso Bahia Tocantins Paran Piau 16,01% 10,96% 10,39% 10,09% 9,96% 7,33% 7,00% 5,54% 3,99% 3,90%

SexoMasculino

EscolaridadeAnalfabeto 40,14% 27,99% 7,55% 13,69% 3,02% 5 ano incompleto 5 ano completo 9 ano incompleto 9 ano completo Ensino mdio incompleto 1,80% Ensino mdio completo 1,74% Superior incompleto 0,05% Ignorado 4,02%

95,49%Feminino

4,51%

nos acampamentos na maioria das vezesnopotvel:nohpoos artesianosouinstalaessanitrias. umnicocrregousadoparatomarbanho,cozinhar,lavarpanelas eequipamentossujosdeveneno,e para o gado beber. AviolnciaoutrodositensapontadospelaOIT.Orelatriode2005 afirmaque,muitasvezes,quando os pees reclamam das condies ouqueremdeixarafazenda,capatazes armados os fazem mudar de ideia.Rarossoosresgatadosque no contam histrias de intimidao, ameaa, agresses e mortes noslocaisdetrabalho.Completa-se entooconjuntodecondiesque caracteriza o trabalho escravo: endividamento,pssimascondiesde alojamento,alimentaoetrabalho, isolamentogeogrficoeameaa vida do trabalhador.

Idade*At 17 anos 2,51%

Tempo de trabalho29,05% 33,24% 19,73% 11,43% 3,94% 0,10%

Libertados em Porto Velho (RO) trabalhavam em acampamentos improvisados no meio da floresta

18-24 anos 25-34 anos 35-44 anos 45-54 anos 55 ou mais Ignorado

3 15

meses ediasFonte: Reprter Brasil, 2011

a mdia de tempo trabalhado at o momento da libertao (entre 2002 e 2009)

*no momento da libertao (mdia entre 2007 e 2009)

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Realidade brasileira prometido. Para comear, o gato informa que eles j esto devendo. O adiantamento, o transporte e as despesas com a viagem j foram anotados em um caderno de dvidas, onde sero registradas da por diante todas as compras de comida, remdios etc, feitas no estabelecimento mantido pelo fazendeiro. Os gastos tambm envolvem a construo de alojamentos. Alm disso, o peo fica sabendo que ser cobrado pelo uso do alojamento e que o custo de todas as ferramentas de que vai precisar para o trabalho foices, faces, motosserras, entre outros corre por sua conta, assim como botas, luvas, chapus e roupas, tudo anotado no caderno a preos muito acima dos praticados no comrcio. costume o gato no informar o valor dos produtos, s anotar, deixando para informar depois ao trabalhador o montante da dvida. Meses se passam sem que o trabalhador seja pago. Com a promessa de receber tudo ao final, ele continua a derrubar a mata, aplicar veneno, erguer cercas, roar os pastos, entre outras tarefas, sempre em situaes degradantes e insalubres. O acordo verbal com o gato costuma ser quebrado e o peo recebe um valor bem menor que o combinado. No dia do pagamento, a dvida do trabalhador maior que o saldo a receber. Depois de meses, ele continua devedor do gato e do dono da fazenda e tem de continuar a esforar-se para quitar a dvida. 5. Sem alternativas Em razo dos laos que mantm com os gatos, da mobilidade e da falta de alternativas de subsistncia, muito difcil que os resgatados deixem em definitivo esse tipo de relao de trabalho degradante. Eles tendem a voltar mesma situao pela falta de solues a longo prazo, que acenem com novas possibilidades de ganhar a vida com dignidade.

VALTERCAMPANATO/ABR

Cortador de cana de Rubiataba (GO): um dos raros que usam equipamentos de segurana

Trabalho degradante + dvidas, isolamento e ameaas = escravidoPara a OIT, todo trabalho escravo degradante, mas nem todo trabalho degradante considerado escravo. O que diferencia um do outro a privao da liberdade.So basicamente trs os fatores que levam as pessoas a permanecerem trabalhando como escravos: o endividamento (servido por dvida), o isolamento geogrfico e a ameaa vida. No se trata, portanto, de simples descumprimento das leis trabalhistas, mas de um conjunto de condies degradantes. Segundo a Pastoral da Terra, as etapas da escravizao no Brasil compreendem o aliciamento em regio distante, o pagamento antecipado de gastos pelo trabalhador (transporte, alojamento, alimentao) e o transporte at a frente de trabalho. A instituio registra relatos de trabalhadores resgatados pela fiscalizao sobre o que acontece desde suas cidades at as frentes de trabalho: 1. Terceirizao Os empregadores em geral terceirizam a contratao de mo de obra usando os chamados gatos. Eles recrutam os trabalhadores e servem de fachada para que os fazendeiros no sejam responsabilizados pelo crime. A estratgia se repete tambm para os imigrantes: intermedirios contratados por empresrios brasileiros so enviados a comunidades bolivianas pobres e recrutam trabalhadores por meio de anncios, inclusive nas rdios. 2. Falsas promessas J os gatos buscam pessoas em regies distantes do localmaio de 2011

onde sero prestados os servios ou em penses de cidades prximas. No primeiro contato, so simpticos, agradveis e oferecem boas oportunidades de trabalho, com garantia de salrio, alojamento e comida. Para seduzir o trabalhador, oferecem adiantamentos para a famlia e transporte gratuito at o local do trabalho. H ainda os pees do trecho, que no tm residncia fixa, passando de uma frente de trabalho para outra. Nos chamados hotis peoneiros, onde se hospedam espera de servio, so encontrados pelos gatos, que compram suas dvidas (fazem um refinanciamento informal) e os levam s fazendas. A partir da, os trabawww.senado.gov.br/emdiscussao

lhadores j esto endividados e devem trabalhar para pagar. 3. Paus de arara O traslado feito em nibus em pssimas condies de conservao ou por caminhes improvisados os paus de arara sem qualquer segurana. Como a f iscalizao tem aumentado, hoje os gatos emprestam o dinheiro para as passagens, chegando at a alugar nibus de turismo, para no serem descobertos. O destino principal so as regies de expanso agrcola. 4. Servido por dvida Ao chegarem ao local do servio, os trabalhadores so surpreendidos com situaes completamente diferentes do

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Realidade brasileira

Z Pereira: 14 anos em busca de reparaoEmnovembrode2003,terminoucomumacordohistricooprocessodeJosPereiraFerreira,opeoque foibaleadoequasemortoporfugirdeumafazenda noPar,ondetrabalhavacomoescravo. OcasofoidenunciadopelasorganizaesnogovernamentaisAmericasWatcheCentropelaJustiaeo DireitoInternacional(Cejil)ComissoInteramericanadeDireitosHumanos,daOrganizaodosEstados A mericanos(OEA). Nodecorrerdoprocesso,em1995,oBrasilreconheceupelaprimeiravezsuaresponsabilidadepelaexistnciadetrabalhoescravonopasesecomprometeu ajulgarepunirosresponsveiseaadotarmedidas para prevenir outros casos. NascidoemSoMigueldoAraguaia(gO),ZPereira foiparaoParaos8anos,nacompanhiadopai,que tambmtrabalhavaemfazendas. ElechegouFazendaEspritoSanto,emSapucaia,no Par,ondetrabalhouemcondiessemelhantess deescravido.Emsetembrode1989,com17anos, fugiudosmaus-tratosecaiuemumaemboscadapreparadapelogatoeoutrostrsfuncionriosdafazenda,quelhederamumtironacabeapelascostas. Sangrando,Pereirafingiu-sedemortoefoijogado emumafazendavizinhajuntocomseucompanheiro defuga,oParan,mortonamesmaemboscadapelos jagunos.Atingidoemumdosolhos,caminhouata sededapropriedadeepediusocorro.EmBelm,capitaldoestado,denunciouascondiesdetrabalhona fazendaPolciaFederal.Semrespostaefetivadas autoridades,levouocasosONgs,quedecidiram apresentaradennciaOEA. Noacordoquepsfimaoprocesso,oBrasiltambm prometeu reparar financeiramente os danos causados aZPereira,que,14anosdepoisdefugir,recebeu a primeira indenizao paga pelo Estado brasileiro a um cidado por ter trabalhado em regimedeescravido,no valordeR$52mil.A indenizao foi aprovada pelo Congresso ( n o S e n a d o, P LC 23/03).

ADAMZWERNER/CC

Os relatos de Z Pereira...Em tudo semelhante s dos demais resgatados, a histria contada por esse goiano, poca com 17 anos, mostra a violncia e o isolamento a que so submetidos os escravizados na fronteira agrcola do pasAgentetrabalhavacomelesvigiandons,armadoscomespingardacalibre20.Agentedormiafechado,trancado,trabalhavaasemanatoda... Elesnodeixavamagenteandarmuito,entoeusconheciaoquefazia osqueestavamnobarracocomagente.Processo na OEA levou Brasil a deciso histrica: reconhecer a existncia de trabalho escravo no pas

Canteiro de obra em Nanjing, China, onde lei no reconhece que adulto seja vtima de trabalho escravo

Escravido resiste e at cresce com a globalizao e a modernidadeBenjamin Skinner, jornalista e autor do livro A crime so monstrous: face-to-face with modern-day slavery (Um crime monstruoso: face a face com a moderna escravido), afirma que o sul da sia, em geral, e a ndia, em particular, possuem mais escravos do que todas as naes do mundo somadas. Segundo Skinner, tambm h centenas de milhares, talvez milhes, de escravos na Amrica Latina. O Haiti teria cerca de 300 mil crianas escravas. Elas so oferecidas em troca de US$ 50 nas ruas de Porto Prncipe. Dezenas de milhares de pessoas so traficadas da Amrica Central e do Mxico. Nos Estados Unidos, a maior parte dos escravos mexicana ou l chega por meio do Mxico. De acordo com o relatrio global da Organizao Internacional do Trabalho, as prinwww.senado.gov.br/emdiscussao

Ogatojdiziaquensestvamosdevendomuito.Agentetrabalhavaeelesnofalavamopreo queiampagarpragente,nemdascoisasqueagentecompravadeles,nemnada.Ea,nsfugimosde madrugada,numafolgaqueogatodeu.Andamosodiatododentrodafazenda.Elaeragrande. Masafazendatinhaduasestradas,ensssabiadeuma.Nessa,quensia,elesnopassavam.Mas elesjtinhamrodeadopelaoutraetinhabotadotrincheiranafrente,tocaia,n.Nsnosabia...Mais decincohoraspassamosnaestrada,pertodamata.Equandonssamosdamata,fomossurpreendidospeloChico,queogato,emaistrs,queatiraramnoParan,nascurvasdele,eelecaiumorrendo.Elesforam,buscaramumacaminhonetecomumalonaeforraramacarroceria.Acolocaramele de bruos e mandaram eu andar. Eu andei uns dez metros e ele atirou em mim. Pegouportrs.Aeucadebruosefingidemorto.Elesmepegaramtambmemearrastaram,me colocaramdebruos,juntocomoParan,meenrolaramnalona.Entraramnacaminhonete,andaram uns20quilmetrosejogaramnsna[rodovia]PA-150emfrenteda[fazenda]BrasilVerde.

Jos Pereira no se deixa fotografar por temer por sua segurana

Seeuforsubmetidoatrabalhoescravo,eudenunciotudodenovo.Easpessoasqueforemsubmetidasatrabalhoescravo,achoquenodevemseintimidarno.Apessoatemqueprocurarasautoridades,osindicato,aCPT,oMinistriodoTrabalhoedenunciarotrabalhoescravo,poisissonopodeexistir.Fonte: Trechos da entrevista concedida por Z Pereira a Leonardo Sakamoto, da ONG Reprter Brasil.

cipais formas assumidas pela escravido contempornea so a prostituio e o trabalho forados, este caracterizado como servido por dvida. A escravido tambm desconhece fronteiras. Segundo a OIT, h escravido de nativos e tambm de estrangeiros em quase todos os pases. Mulheres, crianas, indgenas e migrantes sem documentos so os principais alvos em todo o mundo, pela vulnerabilidade social em que se encontram. Os migrantes que entram de forma legal muitas vezes tm seus passaportes confiscados pelos exploradores. Veja as peculiaridades do trabalho escravo em alguns pases, descritas pela OIT. China As atividades econmicas que mais utilizam mo de obra forada so a indstria de ti-

jolos, as minas de carvo e a construo civil. A legislao chinesa no reconhece homens como vtimas de trfico ou adultos como vtimas de trabalho escravo. Alm disso, a poltica de limitao da natalidade, juntamente com a preferncia cultural por filhos homens, contribui para levar mulheres e crianas ao casamento forado, o que as deixa vulnerveis servido domstica ou explorao sexual. H evidncias de trabalho infantil forado em fbricas e fazendas, sob pretexto de formao profissional. A extenso do trabalho escravo na China no clara, em parte porque o governo limita a divulgao de informaes. ndia Milhes de indianos vivem em condio de servido por dvida. Eles esto em olarias, moinhos de arroz e na agricul

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Realidade brasileira Os casos de escravido na Inglaterra so relatados pela organizao no governamental AntiSlavery International, de 1839, uma das mais antigas organizaes abolicionistas do mundo. Mxico A maioria das vtimas estrangeiras proveniente da Amrica Central. Alm de cartis de drogas mexicanos, redes de crime organizado de todo o mundo estariam envolvidas em escravido no Mxico. Em 2007, o pas criou lei para proibir todas as formas de escravido, com penas de priso de seis a 12 anos. Quando a vtima for criana ou mentalmente incapaz, as penas podem chegar a 18 anos de priso. Estados Unidos O trabalho forado acontece em servios domsticos, agricultura, indstria e construo civil. H casos em que trabalhadores so vtimas recrutadas em outros pases, principalmente da Amrica Latina, e pagam para obter emprego nos EUA, o que os torna vulnerveis servido por dvida. Entre os norte-americanos, o trabalho degradante ocorre mais sob a forma de escravido sexual do que de trabalho forado. O pas, no entanto, probe todas as formas de escravido por meio de leis aprovadas h quase 150 anos. As penas hoje variam de cinco anos de recluso priso perptua. Apesar da proteo federal s vtimas, apenas nove dos 50 estados oferecem benefcios pblicos s vtimas de escravido. Haiti A maioria dos casos de escravido encontrada entre os cerca de 225 mil restavecs (do francs rester avec, ficar com) filhos de pais pobres entregues a famlias mais ricas. Existem ainda cerca de 3 mil restavecs haitianos na vizinha Repblica Dominicana. Restavecs fugitivos compem proporo significativa da populao dewww.senado.gov.br/emdiscussao

Realidade brasileira crianas de rua, que frequentemente so foradas a trabalhar na prostituio ou no crime. A limitada capacidade das instituies do pas para responder escravido foi ainda mais enfraquecida pelos danos do grande terremoto de janeiro de 2010, que deixou mais de 200 mil mortos e 1 milho de desabrigados. Mianmar (antiga Birmnia) Um dos pases mais pobres do sudeste asitico, Mianmar isolado do Ocidente e limita a movimentao das pessoas. O governo confisca terrenos e dinheiro, apreende alimentos e propriedades e persegue religiosos. Homens e mulheres da etnia crist Chin so frequentemente usados para limpar campos minados. Em certas reas, o exrcito construiu templos usando trabalho forado.Casal fabrica biscoitos de barro, gordura e sal em Cit Soleil, bairro pobre de Porto Prncipe, Haiti

Milhares de sudaneses fugidos da guerra civil, da violncia e da escravido se abrigaram na vizinha Repblica Centro-Africana

tura. Crianas so submetidas a trabalho forado como operrias, empregadas domsticas, trabalhadores agrcolas ou mendigos. H leis proibindo o trfico sexual, o trabalho forado e o trabalho infantil, com penas que vo de sete anos de recluso priso perptua. Mas condenaes por trabalho escravo so raras, em razo de tribunais sobrecarregados e falta de comprometimento de autoridades locais. Sudo Milhares de sudaneses foram sequestrados e escravizados durante a ltima guerra civil no pas. Trabalho forado domstico, na agricultura e na pecuria foi o destino de crianas, homens e mulheres, as quais tambm foram submetidas explorao sexual. Adultos e, principalmente, crianas foram recrutados fora, por praticamente todos os grupos armados envolvidos no conflito, inclusive as foras governamentais. Um nmero estimado de 10 mil crianas ainda se encontra vincu-

lado a diversas milcias armadas no sul do Sudo. Contudo, o governo no reconhece que trabalho ou prostituio forados existam no pas. Sucia destino e pas de trnsito para mulheres e crianas vtimas de trfico de pessoas, principalmente para prostituio forada. Em muitos casos, as vtimas pensam que trabalharo como danarinas, por exemplo, mas depois seus documentos so confiscados e sofrem ameaas de abuso sexual para que aceitem se prostituir. O pas tem tambm casos de homens, mulheres e crianas trabalhando de maneira forada em servios domsticos, restaurantes, estradas, construo e jardinagem. Pessoas do leste europeu tambm so encontradas mendigando ou roubando na Sucia a mando de mfias. Turismo sexual outro grande problema: estimase que os suecos que viajam ao estrangeiro compram servios sexuais de crianas entre 4 mil e 5 mil

vezes por ano. A legislao antiescravido do pas, de 2002, probe trabalho escravo tanto para explorao sexual como para trabalho forado, e prev penas de dois a dez anos de priso. Reino Unido Todas as formas de escravido so proibidas, com penas que podem chegar a 14 anos de priso. Ainda assim, crianas britnicas so escravizadas no pas para prostituio e estrangeiros so obrigados a mendigar ou roubar. Migrantes so submetidos a trabalhos forados na agricultura, construo civil, indstria de alimentos e servios domsticos. Crianas vietnamitas e chinesas so envolvidas em servido por dvida pelo crime organizado e obrigadas a trabalhar no cultivo de Cannabis. O governo, no entanto, adota poltica de no penalizar vtimas de escravizao ou trfico humano, j que muitas delas continuam a ser processadas por crimes de imigrao.maio de 2011

Migrantes atravessam a fronteira do Mxico para os EUA, onde ficam expostos a trabalhos forados

COuRTNEySARgENT/CRONkITENEWSSERVICE

L.A.SANCHO/CC

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ALEXANDREgIRO/SENADOFEDERAL

aes de Combate

Dezembro de 2001: Polcia Federal acompanha fiscalizao e liberta escravizados da fazenda Tuer, em Senador Jos Porfrio, Par

Governo precisou de 25 anos para agirMesmo confrontado pelas denncias, que comearam na dcada de 1970, o pas s reconheceu o problema em 1995, perante a OEA

O

Estado brasileiro s se moveu para combater o trabalho escravo empurrado pela sociedade civil. Entre as primeiras denncias feitas por dom Pedro Casaldliga, ento bispo de So Flix do Araguaia (MT) em meio ditadura militar, no incio da dcada de 1970 e o compromisso com a Comisso Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organizao dos Estados Americanos (OEA) em que o pas reconheceu a existncia da escravido no seu territrio, em meados dos anos 1990 , passaram-se quase 25 anos de silncio e omisso por parte de governos e poderes pblicos.www.senado.gov.br/emdiscussao

Na iminncia de receber uma sano internacional por conta do caso Z Pereira (leia mais na pg. 28), o Estado finalmente acordou. Em 1995, o ento presidente Fernando Henrique Cardoso reconheceu oficialmente o problema e tomou as providncias para a criao de uma estrutura que, com ajustes e avanos alcanados no governo Lula, se mantm na linha de frente no combate escravizao da mo de obra. Para planejar as aes, Fernando Henrique criou o Grupo Executivo de Represso ao Trabalho Forado (Gertraf ), substitudo em 2003 pela Comisso Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo (Conatrae). Tambm

instituiu o Grupo Especial de Fiscalizao Mvel (GEFM), que se transformou no mais importante instrumento de represso aos escravagistas. Hoje, o pas chega a ser referncia para o mundo nesse combate. Jamais a sociedade civil esteve longe desse processo. Por meio de entidades como a Comisso Pastoral da Terra (CPT) e a ONG Reprter Brasil, colaborou ativamente para os resultados que o pas comeou a colher. E como ficou claro na audincia pblica no Senado, continua sendo fundamental para cobrar iniciativas do governo. Afinal, para eliminar o trabalho escravo, o Brasil ainda tem muito o que fazer.

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J.R.RIPPER/IMAgENSHuMANAS

Aes de combate

Apenas 50% dos casos denunciados so investigadoso centro do combate escravizao da mo de obra no Brasil est o Grupo Especial de Fiscalizao Mvel (GEFM), ligado Secretaria de Inspeo do Trabalho (SIT) do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE). Ele formado por auditores fiscais do trabalho que coordenam as operaes de campo , policiais federais e procuradores do Ministrio Pblico do Trabalho (MPT). Criado em 1995, o grupo foi essencial para que a OIT reconhecesse o Brasil como referncia na luta contra a explorao da mo de obra escrava (leia mais na pg. 45). No entanto, depois de quase 40 mil trabalhadores libertados em 16 anos de atuao, o GEFM tem hoje uma estrutura ainda pequena comparada ao tamanho do problema.SINAIT

garantir que pessoas e comunidades sem condio de pagar advogados tenham acesso Justia. Papel dos parceiros Responsvel pelas operaes de campo destinadas a resgatar trabalhadores escravos, o Grupo Especial de Fiscalizao Mvel normalmente parte de denncias que chegam s delegacias regionais do trabalho, polcia ou a entidades da sociedade civil (veja infogrfico ao lado). O planejamento e a surpresa so fatores decisivos para o sucesso das aes. Cada integrante das equipes mveis tem um papel especfico. Os auditores fiscais do trabalho coordenam as aes e se encarregam dos autos de infrao documentos oficiais que geram, por exemplo, indenizaes imediatas para os trabalhadores e processos administrativos para incluso dos infratores na Lista Suja do trabalho escravo (leia mais na pg. 40). Aos procuradores do trabalho cabe o apoio aos auditores fiscais e, posteriormente, o encaminhamento de aes civis pblicas Justia trabalhista, com o objetivo de obter o pagamento de multas e novas indenizaes. Os policiais federais garantem a segurana das equipes e atuam como polcia judiciria, colhendo provas para o Ministrio Pblico Federal (MPF), responsvel por mover aes penais contra os empregadores. A Polcia Rodoviria Federal tambm parceira constante do GEFM na segurana dos fiscais. Eventualmente, integrantes de outros rgos pblicos so convidados para essas aes. Uma operao da equipe mvel pode durar dias. O grupo s deixa a propriedade depois de apurar todas as irregularidades e de serem pagas as indenizaes trabalhistas. O trabalhador tem seus direitos registrados em carteira e, se no possuir o documento, ele providenciado no local. A ao no campo se encerra com o cadastramento e o transporte dos trabalhadores para seus locais de origem (leia mais na pg. 42).www.senado.gov.br/emdiscussao

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O MTE conta com cerca de 3 mil auditores para fiscalizar as relaes de trabalho, no campo e na cidade, em todo o Brasil. Desse total, apenas 25 pessoas esto diretamente envolvidas com a ao das cinco equipes mveis que compem o GEFM. H tambm equipes como essas nas superintendncias regionais do MTE nos estados onde historicamente maior a incidncia do trabalho escravo. Segundo o ministrio, houve ao longo dos anos um crescimento no nmero de auditores destacados para o combate a esse tipo de crime. Mas a opinio no compartilhada pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait). O nmero de fiscais do trabalho j foi de 3.464. As equipes de trabalho escravo j foram nove, lamentou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), destacando na audincia pblica as preocupaes do sindicato. Os grupos mveis hoje organizados no do conta. Apenas 50% das denncias so apuradas, estimou o subprocurador-geral do Trabalho Luis Antonio Camargo de Melo, que representou o Ministrio Pblico do Trabalho no encontro (veja os dados na pg. 16). Ampliando as reivindicaes do Sinait, o deputado Amauri Teixeira (PT-BA) pediu o fortalecimento da estrutura do MTE. No adianta aumentar apenas o quadro de auditores fiscais. Eu conversei recentemente com a superintendente do Ministrio do Trabalho na Bahia e ela me dizia que o seu quadro administrativo est se esvaziando, que ela no tem musculatura administratiSindicato dos auditores do trabalho participa do esforo para aumentar o percentual de denncias apuradas

va para dar apoio aos auditores, contou. No MPT, a histria um pouco diferente. Nos ltimos cinco anos, foram preenchidos por concursos pblicos 300 cargos de procurador do trabalho, o que praticamente dobrou o tamanho da categoria. Atualmente, o MPT conta com 735 procuradores do trabalho em todo o pas, lotados na Procuradoria-Geral (Braslia), em 24 procuradorias regionais instaladas em capitais e em cem procuradorias em municpios. Em cada procuradoria regional, h coordenaes dedicadas exclusivamente aos casos de trabalho escravo, com dois procuradores em cada ncleo. Ou seja, so 48 procuradores do trabalho debruados sobre a questo. Mas assim como o MTE, o MPT ainda precisa melhorar muito sua estrutura administrativa. Um dos problemas mais graves o dficit de servidores em relao ao nmero de procuradores do trabalho, explica Dbora Tito, que dirige a Coordenadoria Nacional de Erradicao do Trabalho Escravo (Conaete), rgo do MPT. Na audincia, o deputado Amauri Teixeira tambm destacou a importncia de tornar a Defensoria Pblica da Unio (DPU) mais presente nas questes relativas ao trabalho escravo. Ns temos que entender que no possvel garantir a dignidade da pessoa humana sem fortalecer a Defensoria Pblica, disse. A DPU tem hoje 57 unidades no pas mais de uma sede por estado , 477 defensores pblicos federais e 978 servidores. No h uma coordenao nacional do rgo para atuao sobre o trabalho escravo, mas intervenes pontuais em alguns estados. A Defensoria foi criada em 1995 para

RENATOALVES/MTE

Auditores do MTE evitam ser identificados em fotos: eles temem por sua segurana

Grupo mvel de fiscalizao atua a partir de dennciasA maior parte delas feita por familiares dos trabalhadores escravizados e por aqueles que conseguiram escapar DennciasQuem denunciaVtimas Familiares ComissoPastoraldaTerra EntidadessindicaiseONGs

Quem recebe as dennciasDelegaciasdoTrabalhoesuasunidadesnointerior SecretariadeInspeodoTrabalho(SIT)Braslia PolciaFederal ComissodeDireitosHumanosdaCmara dosDeputados SecretariaNacionaldeDireitosHumanos Meiosdecomunicao

apuraOQuem apuraMinistriodoTrabalhoeEmpregoePolcia Federal,nombitodesuascompetncias MinistrioPblicodoTrabalho MinistrioPblicoFederal

O que apuradoCondiesgerais,inclusiveparaapuraodecrimepela PolciaFederal Relaesdetrabalho Condiesdeseguranaesade Trabalhodecrianaseadolescentes

aesprovidncias imediatasLavraturadeautosdeinfrao,interdioe notificao Regularizaodasituaotrabalhista (pagamentodetodasasobrigaes) Retiradadostrabalhadoresquequiseremsair Priso,quandoforocaso,doproprietrio, gerenteoualiciadorFonte: Ministrio do Trabalho e Emprego

DesdobramentosOrelatriodaoperaoencaminh