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Contrato de trabalho nulo por falta de concurso público e registro na CTPS (Reflexões à luz da Teoria do Fato Jurídico) 1 Introdução Examina-se neste artigo se o contrato de trabalho eivado de nulidade por força do art. 37, II e §2º, da Constituição da República, pode ser objeto de registro na Carteira de Trabalho do empregado. É cediço que a Carta Federal de 1988, no citado dispositivo, exige como requisito para o ingresso válido em cargo ou emprego público da Administração direta e indireta, de regra, a prestação de concurso público, com as exceções consignadas no próprio art. 37, tais as nomeações para cargo em comissão. Nada obstante a Lei Maior esteja em vigor há quase vinte anos, a regra da impessoalidade para contratação pelos entes públicos continua sendo desafiada, notadamente nas esferas estaduais e municipais, com ênfase para as regiões menos desenvolvidas do País, nada obstante atuação incansável do Ministério Público do Trabalho , no sentido de combater as fraudes trabalhistas na Administração Pública, e a jurisprudência sumulada do Tribunal Superior do Trabalho desestimular os trabalhadores à aceitação do emprego sem o prévio certame público, uma vez que não lhes reconhece quase nenhum direito (Súmula 363). Nesse contexto surge o problema ora focalizado, levando a que se perquira até que ponto a mácula na admissão do empregado interfere na efetivação da anotação do contrato de trabalho na Carteira de Trabalho e Previdência Social – medida, em princípio, obrigatória, segundo os arts. 29 e seguintes, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 2 Breves considerações sobre os contratos individuais de trabalho nulos Alguns doutrinadores, ao conceituarem a invalidade do ato jurídico, notadamente na esfera trabalhista, confundem-na com os próprios efeitos da nulidade e com a existência desse ato, não distinguindo os planos do mundo jurídico. Daí a necessidade de buscar-se um conceito isento de tal

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Contrato de trabalho nulo por falta de concurso pblico e registro na CTPS (Reflexes luz da Teoria do FatoJurdico)

1 IntroduoExamina-se neste artigo se o contrato de trabalho eivado de nulidade por fora do art. 37, II e 2, da Constituio da Repblica, pode ser objeto de registro na Carteira de Trabalho do empregado. cedio que a Carta Federal de 1988, no citado dispositivo, exige como requisito para o ingresso vlido em cargo ou emprego pblico da Administrao direta e indireta, de regra, a prestao de concurso pblico, com as excees consignadas no prprio art. 37, tais as nomeaes para cargo em comisso.Nada obstante a Lei Maior esteja em vigor h quase vinte anos, a regra da impessoalidade para contratao pelos entes pblicos continua sendo desafiada, notadamente nas esferas estaduais e municipais, com nfase para as regies menos desenvolvidas do Pas, nada obstante atuao incansvel do Ministrio Pblico do Trabalho , no sentido de combater as fraudes trabalhistas na Administrao Pblica, e a jurisprudncia sumulada do Tribunal Superior do Trabalho desestimular os trabalhadores aceitao do emprego sem o prvio certame pblico, uma vez que no lhes reconhece quase nenhum direito (Smula 363).Nesse contexto surge o problema ora focalizado, levando a que se perquira at que ponto a mcula na admisso do empregado interfere na efetivao da anotao do contrato de trabalho na Carteira de Trabalho e Previdncia Social medida, em princpio, obrigatria, segundo os arts. 29 e seguintes, da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT).2 Breves consideraes sobre os contratos individuais de trabalho nulosAlguns doutrinadores, ao conceituarem a invalidade do ato jurdico, notadamente na esfera trabalhista, confundem-na com os prprios efeitos da nulidade e com a existncia desse ato, no distinguindo os planos do mundo jurdico.Da a necessidade de buscar-se um conceito isento de tal indistino:Diz-se vlido o ato jurdico cujo suporte ftico perfeito, isto , os seus elementos nucleares no tm qualquer deficincia invalidante, no h falta de qualquer elemento complementar. Validade, no que concerne a ato jurdico, sinnimo de perfeio, pois significa a sua plena consonncia com o ordenamento jurdico.Ao contrrio, quando o suporte ftico se concretiza suficientemente, mas (a) algum de seus elementos nucleares deficiente (p. ex., vontade manifestada diretamente pelo absolutamente incapaz, ou pelo relativamente incapaz sem a presena do assistente, ou est eivada de vcio invalidante, como erro, dolo, etc., ou, ento, seu objeto ilcito ou impossvel), (b) ou lhe falta algum elemento complementar (no foi observada a forma prescrita em lei, e. g.), o sistema jurdico o tem como ilcito, impondo-lhe como sano a invalidade .Segundo a teoria civilista, a decretao da nulidade retroage, produz efeitos ex tunc e apaga as repercusses fticas j consumadas. O Direito do Trabalho, porm, desenvolveu sua teoria de nulidades, na qual se tem, como regra geral, o critrio da irretroao da nulidade decretada, a regra do efeito ex nunc da decretao judicial da nulidade percebida, de sorte que o contrato tido como nulo ensejar todos os efeitos jurdicos at o instante de decretao da nulidade que ter, desse modo, o condo apenas de inviabilizar a produo de novas repercusses jurdicas, em face da anulao do pacto viciado .A teoria trabalhista encontra aplicao plena, restrita ou, ainda, a inaplicao, conforme o motivo da nulidade, considerado o caso concreto.No aplicada, por exemplo, nos casos em que o trabalho constitua ilcito penal. Como conseqncia, tem-se que a decretao da nulidade retroagir, tal qual preconizado pela teoria civilista, negando-se qualquer repercusso trabalhista relao socioeconmica entre as partes .A teoria trabalhista tem aplicao plena, isto , com efeito ex nunc da decretao da nulidade contratual, em hipteses que se refiram forma do contrato ou capacidade das partes a celebrao de contrato de trabalho com o menor de dezesseis anos de idade, por exemplo, considerado o disposto no art. 7, XXXIII, da Constituio da Repblica. Nesse caso, todas as repercusses juslaboristas devero ser reconhecidas ao contrato irregularmente celebrado .Por fim, a aplicao restrita da teoria trabalhista, causadora de celeuma, em que se considera a natureza dos bens jurdicos tutelados, confrontando-os se necessrio, como ocorre no caso exigncia de concurso pblico para admisso em emprego pblico, no qual entram em coliso o valor trabalho e o interesse estritamente pblico, levando mitigao do primeiro . Aqui, o intrprete, diante do caso concreto, conforme entendimento de DELGADO , deve aplicar a teoria juslaborista das nulidades quanto ao perodo de efetiva prestao dos servios, tendo-se, porm, como anulado o pacto em virtude da inobservncia formalidade essencial do concurso. Em conseqncia, manter-se-iam como devidas todas verbas contratuais trabalhistas ao longo da prestao laboral, negando-se, porm, o direito a verbas rescisrias prprias dispensa injusta (aviso prvio, 40% sobre FGTS e seguro desemprego), dado que o pacto ter (ou teria) sido anulado de ofcio (extino por nulidade e no por dispensa injusta).3 A posio do TST sobre os efeitos do contrato celebrado com a Administrao Pblica sem concurso pblicoA jurisprudncia do Tribunal Superior do Trabalho adota restritivamente a teoria trabalhista, aproximando-se, quase, de sua inaplicao, pois reconhece efeito ex tunc decretao da nulidade do contrato laboral celebrado sem concurso pblico, excepcionando, somente, a contraprestao pactuada e os respectivos depsitos do FGTS.Confira-se a Smula 363 do TST:Contrato nulo. EfeitosA contratao de servidor pblico, aps a CF/1988, sem prvia aprovao em concurso pblico, encontra bice no respectivo art. 37, II e 2, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestao pactuada, em relao ao nmero de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salrio mnimo, e dos valores referentes aos depsitos do FGTS (D.J.U de 21.11.2003).Observe-se que o TST reconhecia apenas a contraprestao dos servios realizados, tendo em vista a impossibilidade de total restituio das partes ao estado anterior contratao, especialmente o trabalhador, que no tem como reaver o esforo despendido. Os depsitos do FGTS foram acrescidos ao texto da Smula depois da vigncia do art. 19-A , introduzido na Lei n. 8.036/1990 pela Medida Provisria n. 2.164/2001, estabelecendo que tais depsitos so devidos mesmo no caso de nulidade contratual decorrente do desrespeito ao princpio do concurso pblico, quando mantido o direito ao salrio. 4 O problema da anotao do contrato nulo na CTPS: a viso da jurisprudnciaDo mesmo modo que a teoria trabalhista da nulidade contratual suscita questionamentos quanto ao alcance e extenso dos efeitos pecunirios, subsistem dvidas acerca da possibilidade, ou no, de o contrato nulo ser registrado na CTPS.O TST pacificou seu entendimento no sentido da impossibilidade dessa anotao ou registro, como ilustram os dois arestos adiante:RECURSO DE EMBARGOS. CONTRATO NULO. EFEITOS. AUSNCIA DE CONCURSO PBLICO. DEPSITOS DO FGTS. Declarada a nulidade do contrato de trabalho, os efeitos da advindos no possibilitam o pagamento de parcelas decorrentes do contrato havido, a no ser aquelas referentes contraprestao pactuada, em relao ao nmero de horas trabalhadas, respeitado o valor hora do salrio mnimo, e dos valores relativos aos depsitos do FGTS, sendo indevida a anotao na CTPS, conforme j pacificado nesta C. Corte. Smula n 363 do C. TST. Recurso de embargos parcialmente conhecido e provido. (Proc. n. TST-E-ED-RR-792.593/2001.8, rel. Min. Aloysio Corra da Veiga, publ. em 04/5/2007).CONTRATO NULO. EFEITOS. I Esta Corte, por meio da Smula n 363, j sedimentou o entendimento jurisprudencial de que a contratao de servidor pblico aps a Constituio da Repblica de 1988, sem prvia aprovao em concurso pblico, encontra bice no respectivo art. 37, II, e 2, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestao pactuada, em relao ao nmero de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salrio-mnimo e dos valores referentes aos depsitos do FGTS. II Quanto anotao na CTPS, a Smula/TST n 363 teve sua redao ratificada em 10/11/2005 pelo julgamento do Incidente de Uniformizao de Jurisprudncia n ERR-665159/2000, que versava sobre anotao na CTPS em caso de nulidade contratual, motivo pelo qual se impe a excluso da condenao em anotar a CTPS dos reclamantes (Proc. n. TST-RR-2077/2004-051-11-00.9, rel. Min. Barros Levenhagen, publ. em 04/5/2007).Observa-se, assim, que o TST considera a anotao da CTPS, com registro do incio e fim do contrato de trabalho nulo por falta de concurso pblico, tambm atingida pelo vcio da nulidade. E, como a decretao da nulidade, segundo essa concepo, retroage (efeito ex tunc), no devem ser procedidos os registros.H, porm, na jurisprudncia, decises de Tribunais Regionais do Trabalho antigas e recentes que seguem entendimento contrrio ao do TST, citadas, por ementa, adiante, para melhor visualizao dos fundamentos divergentes:Fundao CTPS Anotao Contrato de trabalho Nulidade. 1- Princpio de tutela ao trabalho. Como observa o saudoso jurista Orlando Gomes, em direito do trabalho, a regra geral h de ser a irretroatividade das nulidades. O contrato nulo produz efeitos at a data em que for decretada a nulidade. Subverte-se, desse modo, um dos princpios cardeais da teoria civilista das nulidades (in Curso de Direito do Trabalho, Ed. Forense, 1984, p. 152). 2- que a fora de trabalho no pode ser devolvida e o direito repele o enriquecimento ilcito. 3- Absurda e injurdica a pretenso da fundao estatal de fugir anotao da carteira de trabalho e ao pagamento dos direitos trabalhistas, a pretexto de que irregular a contratao, por ela prpria procedida, at porque a ningum dado invocar em juzo a prpria torpeza (art. 104, do CCB, com art. 8 da CLT). Recurso provido, s inteiras. (TRT-1 Regio, 3 T., Proc. n. RO-1691, rel. Juiz Azulino Joaquim de Andrade Filho, publ. no DJ-RJ-III em 09-7-1990).Servidor no concursado. Direito legal de anotao da CTPS para efeito previdencirio. Do mesmo modo que uma empresa obrigada a recolher as contribuies previdencirias pertinentes ao servio prestado, com ou sem relao de emprego, com mais razo devem as entidades pblicas assumir a mesma responsabilidade perante a Previdncia Social, permitindo ao servidor no concursado, no futuro, requerer a contagem daquele tempo de servio para fins de sua aposentadoria, na forma do art. 40, pargrafos 12 e 13, da CF, e dos arts. 94 e ss. da Lei 8.213. Ainda que o contrato nulo no gere efeitos trabalhistas em favor do servidor no concursado, mesmo quando presentes todos os requisitos dos arts. 2 e 3 da CLT, h de se aplicar contra a Administrao Pblica o disposto no inciso I, a , do art. 195 da CF, mandando-se anotar a CTPS para efeito de custeio previdencirio, pois o regime da Previdncia Social no est limitado ao segurado trabalhador. Inclui tambm os seus dependentes legais, os quais devem receber do Estado a mesma proteo previdenciria. A anotao da Carteira Profissional a nica prova que o servidor no concursado tem para requerer a contagem do tempo de contribuio. (TRT-2 Regio, 9 T., Proc. RE02-22412-2002-902-02-00, rel. Juiz Luiz Edgar Ferraz de Oliveira, publ. no DJ-SP de 28/02/2003).Alado ao nvel constitucional o trabalho como direito social art. 6 da Carta Magna os efeitos do labor humano em contrato com ente pblico na esfera trabalhista no podem ser desconhecidos por vcio de nulidade contratual respaldada no art. 37 inciso II da norma fundamental. So distintos os conceitos de contrato laboral nulo e inexistente. O registro da carteira profissional determinvel de officio pelo juzo por fora do art. 39 2 da CLT visa atestar a existncia da relao empregatcia havida e no a sua validade. Remessa parcialmente provida para assegurar o registro em CTPS de contrato de trabalho ainda que nulo. (TRT-21 Regio, Pleno, Proc. n. REO 00974/1995, rel. Juiz Ronaldo Medeiros de Souza, publ. no DOE/RN em 09-7-1997). II- SERVIO PBLICO. ADMISSO SEM PRVIO CONCURSO. NULIDADE DO ATO. ANOTAO DA CTPS.A admisso que viceja nos autos foi realizada em desapreo ao requisito do concurso pblico agasalhado pela Constituio Federal. Mesmo rrito o contrato de trabalho, por preterio de forma essencial sua validade, devida a anotao da CTPS, eis que tal registro tem destinao previdenciria em razo de possibilitar a contagem do tempo de servio para efeito de aposentadoria do trabalhador. (TRT-22 Regio, Pleno, Proc. n. RO-00243-2003-102-22-00-0, rel. Des. Fausto Lustosa Neto, publ. no DJ-PI de 29/11/2005, p. 03).Observa-se a preocupao desses acrdos regionais, basicamente, com dois aspectos: a distino entre existncia, validade e eficcia do negcio jurdico, no caso, o contrato de trabalho, e o aproveitamento do tempo de servio prestado sob a contratao invlida para fins previdencirios .Alis, nenhuma teoria poderia explicar como anular ou tirar o efeito do tempo despendido pelo trabalho no cumprimento da contratao, at a data da decretao da nulidade, mormente quando a experincia tem demonstrado a existncia de contratos no precedidos de concurso pblico que vigoram h mais de dez, quinze anos lapso considervel que no pode, razoavelmente, ser desprezado pelo Direito.5 Os planos do mundo jurdico: existncia, validade e eficcia No se pode adequadamente compreender o mundo jurdico sem identificar seus planos formadores.Com objetividade, MELLO esclarece que o mundo jurdico formado pelos fatos jurdicos e estes, por sua vez, so o resultado da incidncia da norma jurdica sobre o seu suporte ftico quando concretizado no mundo dos fatos. No plano do ser ou da existncia ingressam todos os fatos jurdicos, independentemente da sua licitude, bastando que o suporte ftico sofra a incidncia da norma jurdica juridicizante .Apura-se, aqui, apenas a existncia, a qual no se confunde com a validade. A propsito, PONTES DE MIRANDA , ao explicar a existncia do fato jurdico e validade, adverte para a distino entre ambas. Cogitar-se- de existncia sempre que o suporte ftico descrito na norma jurdica estiver presente, ainda que deficiente.Conseqentemente, sempre que houver insuficincia (no a mera deficincia) desse suporte ftico haver a inexistncia do ato jurdico. Assim, por exemplo, nos casos em que se exige declarao de vontade, ou declarao expressa de vontade, ou qualquer ato humano, mas tal no ocorreu. Por isso que se diz que no existe renncia herana prevista na lei civil (ver art. 1.086 do Cdigo Civil de 2002) se no houver a manifestao da vontade de renunciar expressa por atos, e no meramente por palavras, posto que no se implementa todo o suporte ftico ou seja, insuficiente .Tambm por insuficincia do suporte ftico que no existir e nem sequer precisa ser desfeito judicialmente o casamento realizado por quem no tenha autoridade para casar, tal um delegado de polcia . Cogitando-se de relao de emprego, constituem suporte ftico, isto , os elementos ftico-jurdicos para sua existncia:a) prestao de trabalho por pessoa fsica a um tomador qualquer; b) prestao efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; c) tambm efetuada com no-eventualidade; d) efetuada ainda sob subordinao ao tomador dos servios; e) prestao de trabalho efetuada com onerosidade .Presentes todos esses elementos descritos na norma jurdica, qual seja, o art. 3 da Consolidao das Leis do Trabalho, existir a relao de emprego. Eis, portanto, identificado o contrato de trabalho no plano da existncia.Constatada a existncia, veja-se o plano da validade, e, como se disse linhas atrs, considera-se vlido o ato jurdico cujo suporte ftico perfeito, em plena consonncia com o ordenamento jurdico .Registre-se, porm, que a existncia antecede validade e eficcia, de sorte que se dispensa a perquirio dos dois ltimos planos do mundo jurdico se o primeiro no estiver implementado. Ento, para que se indague se o ato ou o negcio jurdico vlido ou invlido, parte-se da premissa que ele existe, isto , que o suporte ftico foi apanhado pela norma jurdica.As normas jurdicas invalidantes atuam no plano da validade e alcanam, somente, os atos jurdicos stricto sensu e os negcios jurdicos, por serem os nicos sujeitos apreciao da validade .A doutrina costuma classificar em trs categorias os pressupostos de validade dos atos jurdicos, ou seja, quanto ao sujeito, quanto ao objeto e quanto forma da exteriorizao da vontade, tendo, porm, o legislador, liberdade para dar validade (e invalidade) o tratamento que lhe parea mais adequado .O Cdigo Civil de 2002, no art. 166, diz que nulo o negcio jurdico quando: celebrado por pessoa absolutamente incapaz; for ilcito, impossvel ou indeterminvel seu objeto; o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilcito; no revestir a forma prescrita em lei; for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; tiver por objetivo fraudar lei imperativa; a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prtica, sem cominar sano.E, note-se, a Carta Federal de 1988, art. 37, II, 2, determina que a no-observncia do disposto nos incisos II e III implicar a nulidade do ato e a punio da autoridade responsvel, nos termos da lei. No que interessa ao presente estudo, infere-se que a no observncia do princpio do concurso pblico como regra geral para ingresso no servio pblico, com as excees consignadas no mesmo artigo, leva nulidade do ato de admisso.O texto constitucional fala de invalidade e, no, de inexistncia ou de ineficcia do ato referenciado. Trata-se de caso de declarao legal taxativa da nulidade por desateno a requisito especial e constitucional de validade, qual seja, a aprovao em concurso pblico.Observe-se que, seguindo a tradio doutrinria, o vigente Cdigo Civil, no art. 169, preconiza que o negcio jurdico nulo no suscetvel de confirmao, nem convalesce pelo decurso do tempo.Portanto, o contrato de trabalho ou a relao de emprego cujo suporte ftico se implemente existir, mas ser invlido por expressa proclamao legal, no passando ao plano da validade, posto que ficar retido na triagem feita pelo Direito entre o que perfeito e o que no .Resta perquirir, finalmente, o plano da eficcia.A eficcia jurdica, segundo MELLO, expressa os efeitos prprios e finais dos fatos jurdicos, no considerando possveis efeitos interimsticos ou imprprios que podem gerar. A simples entrada do fato no plano da existncia suficiente para que produza efeitos, s vezes apenas efeitos mnimos, que denominamos situao jurdica bsica, mas que j so efeitos jurdicos .Interessa aqui, porm, focalizar os efeitos do ato invlido.Reitere-se que no se confundem ineficcia com invalidade e inexistncia dos atos jurdicos. A existncia do ato independe de sua validade e eficcia. A eficcia, porm, no prescinde da existncia desse ato, ou seja, para que produza efeitos preciso que o ato j exista. Embora, na maioria das vezes, o ato jurdico, para que seja eficaz, necessite ser vlido, no existe uma relao inafastvel entre eficcia e validade do ato: nem sempre o ato nulo ineficaz, quer dizer, o ato jurdico pode ingressar no plano da eficcia sem ter ingressado no plano da validade.Em regra, os atos jurdicos nulos so ineficazes. A ineficcia constitui uma conseqncia da circunstncia de o ato jurdico no poder alcanar, no mundo jurdico, o plano da eficcia, o que, em geral, mas nem sempre, acontece em casos de nulidade. H situaes em que a lei, considerando certas circunstncias especiais, atribui, excepcionalmente, efeitos jurdicos a atos jurdicos nulos . Recorre-se, mais uma vez, lio de MELO , que assim resume a distino entre os planos do mundo jurdico:a) no plano da existncia entram todos os fatos jurdicos, lcitos ou ilcitos, vlidos, anulveis ou nulos (o ato jurdico lato sensu nulo ou anulvel , existe, apenas defeituosamente) e ineficazes; b) pelo plano da validade somente tm passagem os atos jurdicos stricto sensu e os negcios jurdicos, por serem os nicos sujeitos apreciao da validade; c) no plano da eficcia so admitidos e podem produzir efeitos todos os fatos jurdicos lato sensu, inclusive os anulveis e os ilcitos; os nulos, quando a lei, expressamente, lhes atribui algum efeito.No caso do contrato de trabalho nulo por afronta ao art. 37, II, da Carta Federal de 1988, o legislador, expressamente, reconheceu-lhe os efeitos pecunirios e trabalhistas constantes do art. 19-A da Lei n. 8.036/1990 , isto , a efetivao dos depsitos para o FGTS, quando mantido o direito ao salrio.O prprio Cdigo Civil em vigor, no art. 182, determina que, no caso de anulao do ato jurdico, as partes devem ser restitudas ao status ostentado anteriormente, ou, se impossvel isso, devem ser indenizadas com o equivalente.Quando se cogita, porm, de uma relao jurdica de trato sucessivo, como o contrato de trabalho, impraticvel devolver ao trabalhador o esforo fsico e mental aplicado na execuo dos servios, de sorte que no possvel a restituio da partes ao status quo ante. Por isso que dele no se pode retomar a remunerao pertinente ao trabalho executado sob uma contratao nula. Alis, nisso que constitui a indenizao reconhecida pelo TST na Smula 363. Pode-se dizer, ento, que o contrato de trabalho no precedido de concurso pblico, at a data da proclamao da nulidade produz vrios efeitos inerentes natureza dessa relao jurdica, imbricados com a impossibilidade ftica e temporal de devolver as partes ao estado anterior contratao viciada.Como exemplo desses efeitos constam os j mencionados contraprestao pelos servios executados e os respectivos depsitos para o FGTS, bem assim a preservao dos atos de ofcio praticados pelo servidor irregularmente investido . E outros podero ser reconhecidos por lei.6 Consideraes finais: se o contrato de trabalho existe, deve ser anotado, independente da invalidadeNada obstante possa parecer, sob o ngulo do argumento da autoridade que acoberta a jurisprudncia do TST acima evidenciada, que o problema esteja solucionado, ou seja, no se deve anotar contrato de trabalho nulo na CTPS, na verdade o assunto no est esgotado.Com efeito, deve ser observada a distino entre os planos da existncia, da validade e da eficcia do ato ou do negcio nos planos do mundo jurdico, como evidencia a Teoria do Fato Jurdico sistematizada nos trs volumes da Teoria do Fato Jurdico, do jurista alagoano Marcos Bernardes de MELLO.Ora, o contrato de trabalho no precedido de concurso pblico nulo, conforme expressa letra do art. 37, II e 2, da CF (plano da validade), mas existe (plano da existncia), isto , ingressa no mundo jurdico, uma vez que a norma jurdica incide sobre o suporte ftico com a constatao da presena dos elementos configuradores da relao de emprego, e produz alguns efeitos (plano da eficcia) previstos em lei ou decorrentes da prpria execuo do contrato laboral no tempo. A anotao do contrato na CTPS tem a ver com o plano da existncia e, no, com o da validade ou o da eficcia do fato jurdico. A proclamao da nulidade da admisso do trabalhador no servio pblico, seja com efeito ex nunc, seja com efeito ex tunc, no diz respeito ao plano da existncia nem lhe afeta.Ento, se o contrato existiu, embora nulo, ele pode e deve ser anotado na CTPS, com datas de incio e da extino da relao jurdica, sem meno invalidade.da