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ENSINO E APRENDIZAGEM HISTÓRICA: NARRATIVAS DA JUVENTUDE SOBRE PROTAGONISMO POLÍTICO Jéssica Christina de Moura Universidade Estadual de Londrina Resumo: As produções no campo da Educação Histórica tornam possível ao pesquisador/professor romper com o tradicional ensino de História. Ao investigar a maneira como jovens alunos aprendem história, possibilita também compreender como pensam e expressam no meio social a vivência de tais conhecimentos. Desenvolver ideias que permitem a aprendizagem histórica, articulando as vivências dos alunos com a orientação da vida prática é mais um desafio para os professores de história. Ensinar história na perspectiva do trabalho com a consciência histórica pode promover, em sua essência, a compreensão de que o poder e suas esferas estão além do que partilhamos nos livros didáticos. O objeto de nossa investigação, a partir destas perspectivas, são as efervescentes discussões políticas que tomaram as mídias e redes sociais no Brasil em 2013 com as Jornadas de Junho, tornando-se um importante tema para debate em sala de aula. Assim, procuramos neste trabalho utilizar as narrativas de alunos do ensino médio ligadas ao protagonismo político dos jovens em 2013 e no Movimento dos Caras Pintadas em 1992, na perspectiva de entender como pensam as questões políticas a partir da história aprendida na escola, pesquisando ideias prévias acerca de situações importantes e investigando como essas experiências podem orientar a construção da consciência histórica de jovens alunos. Palavras chave: Educação Histórica; política; aprendizagem histórica; narrativa. Introdução O trabalho proposto neste texto é parte das reflexões feitas ao decorrer da produção de dissertação Mestrado em História Social, na linha de pesquisa de História e Ensino da Universidade Estadual de Londrina. Discutiremos, tendo a

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ENSINO E APRENDIZAGEM HISTÓRICA: NARRATIVAS DA JUVENTUDE SOBRE PROTAGONISMO POLÍTICO

Jéssica Christina de Moura Universidade Estadual de Londrina

Resumo: As produções no campo da Educação Histórica tornam possível ao

pesquisador/professor romper com o tradicional ensino de História. Ao investigar a

maneira como jovens alunos aprendem história, possibilita também compreender

como pensam e expressam no meio social a vivência de tais conhecimentos.

Desenvolver ideias que permitem a aprendizagem histórica, articulando as vivências

dos alunos com a orientação da vida prática é mais um desafio para os professores

de história. Ensinar história na perspectiva do trabalho com a consciência histórica

pode promover, em sua essência, a compreensão de que o poder e suas esferas

estão além do que partilhamos nos livros didáticos. O objeto de nossa investigação,

a partir destas perspectivas, são as efervescentes discussões políticas que tomaram

as mídias e redes sociais no Brasil em 2013 com as Jornadas de Junho, tornando-se

um importante tema para debate em sala de aula. Assim, procuramos neste trabalho

utilizar as narrativas de alunos do ensino médio ligadas ao protagonismo político dos

jovens em 2013 e no Movimento dos Caras Pintadas em 1992, na perspectiva de

entender como pensam as questões políticas a partir da história aprendida na

escola, pesquisando ideias prévias acerca de situações importantes e investigando

como essas experiências podem orientar a construção da consciência histórica de

jovens alunos.

Palavras chave: Educação Histórica; política; aprendizagem histórica; narrativa.

Introdução

O trabalho proposto neste texto é parte das reflexões feitas ao decorrer da

produção de dissertação Mestrado em História Social, na linha de pesquisa de

História e Ensino da Universidade Estadual de Londrina. Discutiremos, tendo a

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educação histórica como referencial teórico e metodológico, com o objetivo de

conhecer as ideias históricas dos alunos acerca de momentos políticos da história

do país, onde os jovens foram protagonistas como no Movimento Caras Pintadas1 e

as manifestações da Jornada de Junho de 20132.

A partir destes eventos da história política do país pensamos ser importante

entender como os alunos possam utilizar a temática para repensar a importância da

experiência na história, e assim construir uma consciência que não se restrinja a

reprodução de discursos prontos e mal elaborados, onde a superficialidade de

informações limita o pensamento crítico.

Entre diversas abordagens do ensino de história, nos direcionamos a área

da Educação Histórica, que trabalha sobre a perspectiva de orientação e

consciência história, tendo por base os referenciais epistemológicos da ciência

histórica. Um dos objetivos deste campo de pesquisa é buscar aproximação com a

realidade dos professores, jovens e crianças compreendendo como se relacionam

com o conhecimento histórico, a partir de ferramentas que os ajudem a perceber as

diversas formas de ver o passado, “para que possam ter acesso a saberes,

situações, referências práticas e vivências que estimulem consciências críticas”

(GAGO, p.63).

1 Movimento juvenil e estudantil brasileiro ocorrido em 1992, que exigia o impeachment do presidente Fernando Collor de Mello e a prisão e prisão de Paulo César Farias, articulador do esquema de corrupção montado durante o mandato de Collor. “O “rosto pintado” rapidamente tornou-se um símbolo da contestação e foi adotado nas outras manifestações, em especial pelos estudantes. Não tardou e os meios de comunicação de massas criaram a expressão “caras-pintadas”, que passou a designar os adolescentes que participavam das manifestações.” (DIAS, Luiz Antonio. Política e participação juvenil: os “caras-pintadas” e o movimento pelo impeachment. Revista História Agora, n. 4, jan. 2008.) 2 Manifestações populares iniciadas no mês de junho de 2013 pelo Movimento do Passe Livre (MPL) em protesto ao aumento da passagem de ônibus em São Paulo. Segundo Fernandes “no ato do dia 13 de junho, mais de 20 mil pessoas foram às ruas de São Paulo apoiar o MPL. Apareceram cartazes anunciando: ‘Não é só por 20 centavos’. No dia 17 de junho, as passeatas generalizaram-se pelas principais capitais do país e tornaram-se maciças. A revolta da juventude tinha se transformado numa revolta urbana de grande envergadura. Aproveitando a visibilidade gerada pela Copa das Confederações da Fifa, até o último dia de junho, os protestos continuaram com força inaudita.” (FERNANDES, Florestan. Jornadas de Junho e Revolução Brasileira. Disponível em: http://interessenacional.com/index.php/edicoes-revista/jornadas-de-junho-e-revolucao-brasileira/. Acesso : 04 de julho de 2016.)

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Na perspectiva de estudarmos esta área do ensino de história sobre

pensamento histórico de alunos, a partir da formação de uma consciência política,

precisamos também compreender como a aprendizagem histórica se concretiza a

partir de aspectos sociais e culturais junto à cultura escolar.

Desde a graduação os temas que envolvem ensino de história e política

estiveram entre os nossos objetivos de pesquisa, as dúvidas e anseios cresceram

através da experiência em sala de aula. Foram a partir de muitas aulas,

questionamentos e debates que se despertou o interesse de aprofundar um estudo

para compreender como os alunos pensam questões políticas. Entre novas

metodologias de ensino que procuram fugir de moldes tradicionais, onde os sujeitos

escolares são vistos apenas como recipientes vazios, o campo da Educação

Histórica proporcionou atingir os objetivos de pensar o aluno como formador de seu

próprio conhecimento. Assim a partir desta metodologia pretendemos desenvolver

um estudo que procure entender as ideias históricas dos alunos relacionadas à

consciência histórica partir da perspectiva política.

No trabalho deste tema pela Educação Histórica estamos investigando como

a aprendizagem histórica promove a discussão do político em sala de aula, partindo

de ideias prévias dos alunos, trazendo a percepção, formação e aplicação de seus

saberes dentro da escola e também fora dela. Pensar o ensino de história nessas

perspectivas nos coloca pontos de vista diferenciados a partir desta disciplina,

segundo Cerri (2011) “ela é resultado de necessidades sociais e políticas na

formação de novas gerações” e, portanto, os trabalhos com as narrativas produzidas

pelos sujeitos escolares devem ser contextualizados à medida que aprendam a

questionar para se orientar.

Alguns obstáculos surgem à medida que investigamos sobre o processo de

aprendizado histórico, muitos alunos rejeitam estudar história, mesmo não tendo

dificuldade e displicência com a matéria. Eles não encontram um contato entre suas

realidades e “o tempo histórico tal como aparece na narrativa de caráter quase

biográfico das nações ou da humanidade”. A partir desses problemas a área da

Educação Histórica pretende desenvolver um aprendizado onde os sujeitos se

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reconheçam no tempo no qual estão vivendo, por isso é importante que aprendam a

se questionar, e encontrar no passado histórico um meio de resolver as carências do

presente.

Protagonismo Político Juvenil

Tanto a história como a sociologia assenta a concepção do jovem como um

agente transformador, pois tem a oportunidade de aproveitar o conhecimento

adquirido pelos mais velhos e a partir de novas oportunidades construírem um

melhor futuro, por isso é o jovem que introduz mudanças na sociedade mais

facilmente. Pensar na ação de mudança dos jovens em aspecto político e

compreender suas posturas é perceber que elas se diferenciam de acordo com o

contexto histórico.

Nos anos 60 e parte dos anos 70, o problema apareceu como sendo o de toda uma geração de jovens ameaçando a ordem social nos planos políticos, cultural e moral, por uma atitude de crítica à ordem estabelecida e pelo desencadear de atos concretos em busca de transformação – movimentos estudantis e de oposição aos regimes autoritários, contra a tecnocracia e todas as formas de dominação, movimentos pacifistas, as proposições da contracultura, o movimento hippie. (ABRAMO, 2007, p.82)

A juventude neste período vislumbrou a oportunidade de mudanças em

vários setores da sociedade, os movimentos culturais questionavam padrões de

comportamento, entre eles os sexuais, morais, os de consumo. Era o momento

modificar os modelos que não se encaixavam aquela geração. Os jovens da década

de 1960 consolidaram-se como uma geração idealista que se comprometeu com a

mudança social. No campo político a autora compara a postura da juventude no

período entre os anos de 1930 e 1970, que se destacou a luta pela democratização

do país e o combate às estruturas conservadoras.

Neste período citado a politização dos movimentos estudantis lutava por

uma universidade mais democrática, entretanto o golpe militar reagia com a intenção

de desmobilizar o campo acadêmico. Segundo Rodrigues (1993) a ditadura previa

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punição aos militantes pautada em uma legislação nas entidades estudantis. Os

anos de 1966, 1967 tornaram-se representativos nas lutas contra a repressão,

tornaram maior força em 1968.3

Ao final da década de 1970 onde tais movimentos juvenis já haviam entrado

em refluxo, a imagem da juventude da década passada foi assimilada de forma

positiva, vista agora como idealista e ousada e que de fato havia feito diferença.

A partir da década de 1980, os movimentos que envolvem a juventude e sua

atuação na política perderam a força. O consequente desinteresse pelas questões

políticas, além do distanciamento e desqualificação de alguns movimentos juvenis,

trouxeram problemas que vão além da renovação no interior das organizações. Eles

se estenderam a própria ação destes sujeitos a não pensarem temas, problemas e

projetos levantados para eles. O resultado acabou deixando de lado não só a

política, mas, de um modo mais geral as questões sociais, acentuando o

individualismo e pragmatismo, geralmente “a-político”.

É em contraste com essa imagem que a juventude dos anos 80 vai aparecer como patológica porque oposta à da geração dos anos 60: individualista, consumista, conservadora e indiferente aos assuntos públicos, apática. Uma geração que se recusa a assumir o papel de inovação cultural que agora, depois da reelaboração feita sobre os anos 60, passava a ser atributo da juventude como categoria social. O problema relativo à juventude passa então a ser a sua incapacidade de resistir ou oferecer alternativas às tendências inscritas no sistema social: o individualismo, o conservadorismo moral, o pragmatismo, a falta de idealismo e de compromisso político são vistos como problemas para a possibilidade de mudar ou mesmo de corrigir as tendências negativas do sistema. (ABRAMO, 2007, p.83)

Os movimentos juvenis da década de 1980 não mostraram a mesma

unidade e posição de frente dos anos anteriores, tomando assim lugar secundário

nas questões políticas. Segundo Rodrigues (1993) apesar do movimento estudantil

estar sempre na conjuntura, não mantiveram o perfil de notoriedade e mobilização.

Na década de 1990 a atuação da juventude passa de certo modo a crescer e

dá indícios que se mostraria forte, de fato existe a presença de figuras juvenis nas

3 “A morte do estudante Édison Luís, em 28 de março daquele ano, comoveu o país e desencadeou protestos e conflitos com a política, que duraram dez dias. Na “sexta-feira sangrenta” de 21 de junho, um conflito entre tropas e estudantes deixou vários mortos e feridos, e centenas foram presos.” (RODRIGUES, Alberto Tosi. Estudantes na Política em Tempos de Mobilização e Crise”. São Paulo em Perspectiva, 7(1): 138-144, janeiro/março 1993.)

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ruas, envolvidas em diversos tipos de ações individuais e coletivas, mas que ainda

apresentou traços de individualismo e fragmentação.

Outro fator importante que se deve levar em conta são os problemas sociais

que de maneira mais explícita se tornaram um padrão para construir o perfil desta

juventude e que estão ligados á violência, vandalismo, drogas e a criminalidade.

Fruto de uma situação anômala, das falências das instituições de socialização, da profunda cisão entre integrados e excluídos, de uma cultura que estimula o hedonismo e levam a um extremo individualismo, os jovens aparecem como vítimas e promotores de uma “dissolução do social”. O pânico, aqui, se estrutura em torno da própria possibilidade de uma coesão social qualquer. (ABRAMO, 2007, p.83)

O parâmetro que pretendemos fazer, mesmo que de forma breve, sobre o

comportamento político da juventude nestas décadas, é relacionar a forma de como

cada contexto histórico nos coloca a atuação destes jovens.

Da busca pela democracia em 1960 como conquista de validade geral, à

queda de representatividade dos movimentos nos anos de 1980 e a frustação social

com as “diretas-já”, a política para os jovens de 1990 “parece não ter imposto

dilemas tão cruciais aos estudantes mobilizados [...] em nenhum momento colocou-

se em xeque, por exemple o neoliberalismo da gestão de Collor” (RODRIGUES,

1993, p. 143). O que não descaracteriza o movimento de fato, mas que possibilita

pensar em uma atuação política mais incisiva.

O caráter oscilante de manifestações são apenas uma faceta das relações

dos jovens e a política neste período. Apesar de atuações dos jovens serem mais

visíveis no processo de impeachment em setembro de 1992, o movimento não teve

continuidade, as manifestações políticas foram apenas episódicas em toda a década

de 90.

A temática que envolve discussão sobre juventude e política possibilita

pensar como as atuações destes sujeitos implicam sobre momentos chave na

história de nosso país, e como a aplicação destes temas envolvem discussões para

o ensino de história.

Narrativas- O que contam os jovens sobre o protagonismo político

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Propomos algumas narrativas de jovens do ensino médio, realizada como

parte da discussão da pesquisa em educação histórica, que busca levantar ideias

dos alunos sobre momentos de participação política juvenil em dois momentos:

Caras Pintadas em 1992 e as Jornadas de Junho de 2013. A pesquisa tem por

objetivo de compreender como esse fato histórico é visto no presente, no

questionário foi proposto que os jovens (da 3ª série do Ensino Médio) escrevessem

uma narrativa sobre as duas situações históricas. Como estão na faixa de 16 e 17

anos, os jovens não haviam nascido ainda em 1992, então não presenciaram o

impeachment do então presidente Fernando Collor de Melo. Porém, em 2013

estavam cursando o 9º ano do Ensino Fundamental II e tiveram contato através das

mídias sobre as manifestações da Jornada de Junho.

A investigação parte dos pressupostos metodológicos da Educação

Histórica, que se baseiam em levantar as ideias dos sujeitos, interpretação dos

dados, categorização conceitual, e na identificação das relações que se

estabelecem entre ambos.

Segundo Cainelli (2009)

Este modelo de investigação qualitativa expôs, para o ensino de história, o pensar dos sujeitos sobre questões como: o sentido da História, o sentido do passado, as verdades históricas, a provisoriedade do conhecimento. Tais conceitos são categorias centrais para a Educação Histórica. Outro desafio do pesquisador está relacionado à valoração dos sujeitos, sejam estes crianças, adolescentes ou adultos, como fonte para investigação em ensino de História. (CAINELLI, 2009, p.120)

No questionário propomos a elaboração da narrativa a partir das seguintes

imagens:

Escreva uma narrativa contando o que foram as duas situações históricas

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1992-CARAS PINTADAS

2013- Jornadas de Junho

A perspectiva da produção da narrativa era de que os alunos expusessem

suas ideias a partir de manifestações políticas onde os jovens foram os

protagonistas, e assim estabelecer relações de semelhanças e diferenças entre

ambas, ou seja, a “sensibilidade de perceber diferenças entre temporalidades, as

mudanças entre passado e presente” (Cainelli, p.123). A partir das produções dos

alunos podemos especificar algumas categorias de análise do instrumento de

pesquisa que relacionam: a motivação dos atos, a política e o jovem;

Entre as vinte narrativas analisadas dentro da categorização das respostas

sobre a explicação histórica dos fatos, oito narrativas se pautaram e direcionam se

na motivação dos acontecimentos, entre elas as mais significativas para nossa

pesquisa:

Fonte: http://acervo.oglobo.globo.com/fotogalerias/jovens-de-caras-pintadas-9666114

http://guia.folha.uol.com.br/cinema/2014/06/1465256-veja-eventos-que-abordam-as-

manifestacoes-que-pararam-o-pais.shtml

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“Movimentos sociais ocorridos no Brasil, com intuito de impeachment do presidente,

por causa da insatisfação dos brasileiros com a corrupção, no caso de Collor, já no caso das

Jornadas de Junho, ocorreu um aumento das passagens de ônibus, o que foi a gota d’água,

fez com que os brasileiros fossem as ruas protestar, no início foi só isso, mas com o passar

do tempo às manifestações tiveram um campo de reinvindicações maiores” (Lucas)

“Em 1992 os manifestantes queriam o impeachment de Collor, pois o seu governo

não estava satisfazendo a vontade da população. Em 2013 a situação não mudou, pois

houve o aumento de impostos e no preço dos ônibus em São Paulo, e, no final das contas,

nada foi mudado infelizmente” (Matheus)

O aluno estabelece uma relação temporal com os dois momentos históricos,

quando compara a situação política de 1992, evidenciando a insatisfação da

população, o que se torna motivo para os acontecimentos de 2013. Conclui em sua

narrativa que, apesar dos esforços, que tudo continua como estava.

“Em 1992 houve um impeachment em que os jovens saíram às ruas protestando

para que o Collor, que não estava sendo um bom presidente, perdesse seu cargo. Já em

2013 o protesto inicial foi pelo fato de ter aumentado o preço da passagem, e toda a

população se revoltou com isso, e como já estavam insatisfeitos com outras várias coisas,

acabaram “explodindo” e saíram ás ruas” (Mariana)

Os alunos enfatizam a corrupção do governo de Collor como o maior motivo

para o protesto dos jovens e da população em geral, já as manifestações que

acontecem em 2013 são explicadas por um motivo inicial – aumento da passagem

de ônibus- que tomam maiores proporções, quando somadas a outros motivos,

como o aluno Lucas explicita “às manifestações tiveram um campo de reivindicações

maiores”, justificando a corrupção que aparece também como algo recorrente na

atualidade, ainda completa “com outros princípios a serem defendidos em seu

âmago, estavam os casos de corrupção, coisa que já se tornou frequente no

senado”.

Esta insatisfação da população segundo os jovens é frisada em outras

narrativas, utilizando a expressão “foi à gota d’agua”, fortalece a ideia que além do

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aumento da passagem do ônibus já havia outras questões que colocavam em

evidência o fato de que população estava de fato prestes a se revoltar:

“Sobre 2013 eu penso que muitos estavam lá por motivos sérios e concretos, e

como todos diziam: ‘não é apenas por 0,20 centavos’, foi a ‘gota d’água’ de todos os

impostos e regalias do governo que o povo tem que pagar”. (Laura)

“A segunda (Jornadas de Junho) começou pelo preço de ônibus que aumentou,

isso foi a gota d’água para o copo transbordar, o povo foi a rua para manifestar e depois

disso foram percebendo que ainda muita coisa ainda por baixo do pano.” (Maria Eduarda)

Segundo Fernandes (2013) os acontecimentos iniciais das Jornadas de

Junho são resultado de uma sequência de acontecimentos, que levaram uma revolta

urbana a proporções inusitadas, “a bronca das ruas interrompeu um longo ciclo de

‘paz social’”, onde os protestos colocam em xeque instituições frágeis, “colocaram

na ordem do dia a necessidade de mudanças substanciais na forma de organização

da economia e da sociedade”.

No início do mês de junho o MPL (Movimento Passe Livre) convocou um

protesto pelo aumento da passagem de ônibus, o reajuste que normalmente ocorria

durante as férias aconteceu no meio do ano letivo, o que levou 6 mil jovens a

protestaram sendo reprimidos pela política militar, o movimento dobrou no dia

seguinte. A sucessão dos fatos e o número expressivo da população que passa a

crescer nas ruas se justificam também pela repressão policial e o descaso do

governo, permanecendo inflexível a negociar com os manifestantes.

As perspectivas políticas presente nas narrativas dos alunos indicam como

os alunos compreendem os atos, e que sentidos atribuem a estes:

“As manifestações tanto em 1992 quanto em 2013 nas Jornadas de Junho, ocorre

pela insatisfação da população aos governos. A forma mais eficiente do povo ganhar a voz é

através das manifestações. No caso das manifestações contra Collor eles conseguiram de

certa forma alcançar seus objetivos.” (Maria Fernanda)

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A aluna ao comparar os acontecimentos coloca que ocorreu pelo mesmo

motivo, a visão política que ela destaca é de que as manifestações são um meio

para que o povo seja ouvido. Para ela, as manifestações contra Collor tiveram seus

resultados alcançados. Outras duas narrativas falam sobre os desfechos das

manifestações e o papel da mídia:

“A população reivindicava por todos os problemas que aconteciam no pais, como

corrupção, falta da investimentos na área de educação e saúde. Além das ruas , as redes

sociais também de mobilizaram dizendo que “O gigante acordou” porém parece que ele

acabou adormecendo novamente”. (Brenda)

“A segunda situação demonstra as Jornadas de Junho, greve que obteve grande

repercussão em toda mídia, representando a voz que o povo possui, conquistando suas

reivindicações.” (Mariana Gabriely)

As duas narrativas explicam o alcance das manifestações como atos

políticos eficazes para representar o poder do povo, e denota a importância do

envolvimento das mídias para o maior alcance do movimento, porem as narrativas

se mostram desconexas em relação ao desfecho das manifestações.

Duas narrativas apenas relatam sobre violência das ligadas ás

manifestações de 2013,

“Os jovens de 2013 apresentaram estas manifestações com muita violência e muito

caos, também causados por “outros” infiltrados para o vandalismo nas ruas“. (Otávio)

“Na segunda situação as manifestações foram causadas primeiramente pelo

aumento de 20 centavos nas passagens do transporte público, e com o decorrer do tempo

vários outros motivos, como o descontentamento com o governo da Presidente, tornaram os

movimentos mais intensos na cidade de São Paulo, porém houveram grupos isolados que

aproveitaram a situação para praticar o vandalismo”. (Marcela)

Nota-se que os dois alunos que citaram a presença da violência e

vandalismo se referem a “grupos isolados” ou “outros” tem percepções diferentes

dessas ações, o primeiro denota a violência aos jovens e outros, porém não explica

quem seriam e o que os diferencia da maioria. A aluna tem a visão de que o

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vandalismo cometido foi um ato separado em relação à causa inicial das

manifestações.

A juventude aparece em quase todas as narrativas no coletivo,

compreendem a voz ativa do jovem na sociedade como parte importante nas

relações sociais e política.

“Para mim esses dois movimentos dizem muitos sobre a juventude, pois o jovem

tem esperança e anseio pela mudança. Eu sei muito poucos sobre 1992, apenas que o povo

queria tirar o Collor do governo e eles conseguiram. Na minha opinião, isso foi um fato muito

importante para a política e história do Brasil.” (Laura)

O superficial conhecimento do contexto histórico dos fatos que ocorreram

em 1992 da aluna, não permite aprofundar uma discussão sobre o os jovens, porém,

em sua opinião ela sabe apenas que o que fizeram se tornou algo positivo na

história do país, sem relacionar classes sociais ou perfil dos jovens. Entende que

sua presença é importante, pois quando fala “o jovem tem esperança e anseio pela

mudança” denota que o pensamento e ação política da juventude são relevantes

além do contexto histórico de 1992 ou de 2013.

Concluímos que a partir da análise do questionário, pudemos observar de

forma breve, que os alunos denotam conhecimento histórico não muito elaborado

sobre o protagonismo político juvenil, entretanto entendem a dimensão dos atos e

dos movimentos como propulsores da mudança na sociedade e no curso da história

do país.

Consideramos, portanto, que as discussões feitas na escola e na sala de

aula, por professores de história e outras áreas afins como a sociologia e filosofia,

possam abordar a participação juvenil através do contexto histórico de forma sempre

positiva e necessária para o presente, lançando um olhar atento para a formação de

uma juventude que reconheça a luta política, como luta contra a intolerância e a

desigualdade, para que esta geração assuma um compromisso de formação de uma

sociedade mais democrática, solidária e acima de tudo, de limpo caráter.

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REFERÊNCIAS

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CAINELLI, Marlene. Educação Histórica: o desafio de ensinar História no ensino fundamental. In: BARCA, Isabel; SCHMIDT, Maria Auxiliadora (Org.) Aprender História: perspectivas da Educação História. Ijuí: Ed. Unijuí, 2009. p.117-137.

CERRI, Luís Fernando. Ensino de História e consciência histórica. Implicações didáticas de uma discussão contemporânea. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2011.

DIAS, Luiz Antônio. Política e participação juvenil: os “caras-pintadas” e o movimento pelo impeachment. Revista História Agora, n. 4, jan. 2008.

FERNANDES, Florestan. Jornadas de Junho e Revolução Brasileira. Disponível em:http://interessenacional.com/index.php/edicoes-revista/jornadas-de-junho-e-revolucao-brasileira/. Acesso: 26 de junho de 2013.

GAGO, Marília. Construtivismo e Multiperspectiva no Processo de Aprendizagem. Moçambique, EPM/CELP, 2012.

RODRIGUES, Alberto Tosi. Estudantes na Política em Tempos de Mobilização e Crise”. São Paulo em Perspectiva, 7(1): 138-144, janeiro/março 1993.