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tt- MARÇAL JUSTEN FILHO RAFAEL WALLBACI-{ SCHWI N D COORDENADORES S PTIBTICoPRIVADAS REFLEXÕES SOBRE OS 1O ANOS DA LEt 1 1.079/2004 Adilson Abreu Dallari " Alécia Paolucci Nogueira Bicalho ¡ Alexandre Wagner Nester " Aline Lícia Klein r André Guskow Cardoso r Augusto Neves Dal Pozzo ¡ Bernardo Strobel Guimarães r Carlos Vinícius Alves Ribeiro n Carolina Mota o Cesar A. Guimarães Pereira . Cristíana Fortini n Dìnorá Adelaide Musetti Grotli " Ëduardo Jordão o Egon Bocl<mann Moreira r Fernando Dias Menezes de Almeida o Fernando Vernalha Guimarães . Fernão Justen de Oliveira . Flavio Amaral Garcia ' Flávio Henrique Unes Perelra ¡ Floriano de Azevedo Marques Neto u Guilherme F. Dias Reisdorfer n Guilherme Jardim Jurl<saitis ¡ Gustar¡o Binenbojm o José Vicente Santos de Mendonça u Julìana Bonacorsi de Palma o Juliane Er-thal de Carvalho n Karlin Olbertz Niebuhr Luiz Felipe l-ladlich Miguel ' N/arçalJusten Filho n Marco Aurélio de Barcelos Silva'Marcos Augusto Perez, N/larina Fontão Tago . Mario Engler Pinto Junior " Mário Saadi , Mauricio Portugal Ribeiro * Odete Medauar ¡ Pedro Jatene ' Prìscila Giannetli Campos Pires , Ralael Wallbach Schwind ¿ Ricardo Barretlo de Andrade " Rodrigo Goulart de Freitas Pombo r Sergio Ferraz n Sérgio Guerra " Tarcila Reis * Vera Monteiro â Vitor Rhein Schirato

Equilíbrio Econômico-Financeiro nas Parcerias Público-Privadas...objetiva dos riscos envolvidos no contrato de PPP entre as partes:4.1 0s t'iscos nos contratos de PPP; 4.2 Constituciona

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MARÇAL JUSTEN FILHORAFAEL WALLBACI-{ SCHWI N DCOORDENADORES

SPTIBTICoPRIVADAS

REFLEXÕES SOBRE OS 1O ANOSDA LEt 1 1.079/2004

Adilson Abreu Dallari " Alécia Paolucci Nogueira Bicalho ¡ Alexandre Wagner Nester " Aline Lícia Klein r AndréGuskow Cardoso r Augusto Neves Dal Pozzo ¡ Bernardo Strobel Guimarães r Carlos Vinícius Alves Ribeiron Carolina Mota o Cesar A. Guimarães Pereira . Cristíana Fortini n Dìnorá Adelaide Musetti Grotli " ËduardoJordão o Egon Bocl<mann Moreira r Fernando Dias Menezes de Almeida o Fernando Vernalha Guimarães .Fernão Justen de Oliveira . Flavio Amaral Garcia ' Flávio Henrique Unes Perelra ¡ Floriano de Azevedo MarquesNeto u Guilherme F. Dias Reisdorfer n Guilherme Jardim Jurl<saitis ¡ Gustar¡o Binenbojm o José Vicente Santosde Mendonça u Julìana Bonacorsi de Palma o Juliane Er-thal de Carvalho n Karlin Olbertz Niebuhr Luiz Felipel-ladlich Miguel ' N/arçalJusten Filho n Marco Aurélio de Barcelos Silva'Marcos Augusto Perez, N/larina FontãoTago . Mario Engler Pinto Junior " Mário Saadi , Mauricio Portugal Ribeiro * Odete Medauar ¡ Pedro Jatene

' Prìscila Giannetli Campos Pires , Ralael Wallbach Schwind ¿ Ricardo Barretlo de Andrade " Rodrigo Goulartde Freitas Pombo r Sergio Ferraz n Sérgio Guerra " Tarcila Reis * Vera Monteiro â Vitor Rhein Schirato

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FI.I8[JCO-PRIVADAS

Cn¡snnrun FonrmDoutora em Direito Administrativo pela UFMG. Professora de Direito Administrativo da ta-culdade de Direito da UFMG. Membro da Diretoria do lnstituto Brasileiro de Direito Admi-nistrativo. Membro do Conselho Gestor de parcerias público-prívadas do município de BeloHorizonte. Ex-Coordenadora da área de Direito Administrativo da Escola Superior da 0AB-MG.Ex-Presidente do lnstituto Mineiro de Direito Administrativo. Controladora-geral do municí-pio de Belo Horizonte.

Pn¡sgm Grnrurunl Cnupos PlnrsAdvogada com atuação em Direito Regulatório

SuH¡Ánro:l.lntrodução:1.1 A razäoparanova modelagem jurídica:osurgimentoda Lei 11.07912004- 2. Parcerias da Administração: concessöes de serviços públicos e parcerias público-privadas -3. Equilibrio econômico-financeiro dos contratos de PPP: 3.1 Equilíbrio economico-financeirocomo expressão do interesse público;3.2 Evolução infraconstitucional do equilíbrio econômico--financeiro; 3.3 Equação econômico-financeira: inserção da noção de risco - 4. A repartiçãoobjetiva dos riscos envolvidos no contrato de PPP entre as partes:4.1 0s t'iscos nos contratos dePPP; 4.2 Constituciona lidade dos a rts. 4.o, lV e 5.", lll, da Lei 11 .079/2004; 4.3 Repartiçäo de riscos:possibilidades e limites - 5. Recomposição do equilíbrio ecbnômico-financeiro - 6. Consideraçoesfinais - 7. Referências bibliográficas.

1. lrurnoouçno

Nossas palavras iniciais são de agradecimento aos organizadores desta obra, ogrande jurista Marçal Justen Filho e o também destacado Rafael Schwind que nos

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284 PnRcrnrns PúsLlco-Fni\r4¡ot

honraram com o convite para integrarmos esta especial obra que celebra o décimoaniversário da entrada em vigor da Lei IL.079/2004, que introduziu no ordena-mento jurÍdico pátrio regras gerias para parcerias público-privadas, sem prejuÍzodaquelas estaduais e municipais.i

A inovação nas formas de parceria com o particular reflete a redefinição dopapel do Estado que, alegando ganhos de eficiência, incapacidade de atendimentoà generalidade das demandas sociais e a escass ez de recursos, experimenta novasformas de atuação.

Tiata-se de reflexo da postura do Estado,2 que diminui a promoção direta dedeterminadas tarefas executivas, passando a atuar primordialmente nos papéis decoord,enação, fomento e fiscalização. Importa ressaltar, contudo, que esse arranjonão signifrca a desnecessidade de atuação estatal ou autorizaçã,o para sua inérciana função de buscar o interesse público. É apenas o reconhecimento de que a ativi-dade privada pode auxiliar na implementação das ações de caráter coletivo, o queé permitido nos termos do art. I75 da CF/1988, que alude à prestação de serviçospúblicos de forma indireta, por meio dos institutos da concessão e da permissão.

Assim, os particulares colocam à disposição das políticas do Estado conheci-mento e recursos financeiros.3 O pressuposto de que o particular poderá contribuirnão apenas financeiramente, alavancando inicialmente atividades e permitindo queo Estado aloque recursos em outras áreas, bem como contribua com expertise prô-pria, são os aspectos encontrados na literatura jurídica e econômica sobre o pro-cesso de desestatização pelo qual diversos paÍses têm passado em especial a pafürdos anos 80/90.

Evidentemente, a diretiva de eficiência, no contexto de primazia dos direitosfundamentais, cuja tutela não escapa às funçÕes do Estado, deverâ buscar, con-forme leciona Moreira Neto (2008, p. 103), não apenas a dimensão econõmica,apartir de ganho de escala e produção, mas sim incremento de bens e serviços quediretamente beneficiem a sociedade,para de fato atender as necessidades dos cida-

1. Ressalta-se que antes mesmo do regramento federal, os Estados de Minas Gerais e São Pau-lo aprovaram, respectivamente, as Leis 14.868/2003 e I1.688/2004, estabelecendo marcolegal estadu al para essas parcerias.

2. No Brasil, adécada de 90 inicia-se com o plano nacional de desestatização e de oraetndiante, distintos governos intensificaram as parcerias, valendo-se de ajustes e insffumen-tos vários.

3. Em verdade, o que se busca primordialmente nas parcerias público-privadas, e a realídadeafirma isto, é a alavancagem financeira. Isto porque, a própria licitação exige o esforço doEstado no sentido de bem especificar e dimensionar as atividades delegadas, sob pena derestar infrutífero o contrato. A despeito de ser possÍvel menor detalhamento da forma pormeio da qual o privado aûJar, os resultados que se esperam devem ser delinea dos parapermitir um acompanhamento e frscalização adequados.

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EourlísnlorcoruÔn¡tco-FlNANCFIRoNASPARcERIAspÚeLtco-pRIVADAS 285

dãos e garantir o cumprimento damatriz constitucional. Assim, a preocupação não

é apenas com o aspecto quantitativo, mas o qualitativo, entendido como maximi-zaçâo de benefícios revertidos ao interesse coletivo'

É sob tal perspectiva, que a atuação do Estado deve buscar a permanente efeti-

vaçao dos diieitoi funda*enrais, que colocamos como objetivo geral do trabalho a

análise d.os contornos do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos parcerias

público-Privadas.

1.1 A rozoo p1ro novl modelogem jurídtco:o surgimento d0 Le¡ '11.07912004

A Lei 8.666/Lgg3 nasce em momento de profunda instabilidade econômica, sem

grandes perspectivas quanto ao crescimento do país. A preocupação com infraes-

rutura não possuía o local privilegiado que a agenda política e econômica reservou

a partir da decada de noventa. Some-se ao contexto econômico a opção jurídica de

rutelar o interesse público pelo controle dos passos adotados pelos agentes públicos.percebe-se a maioi disparidade de forças entre as partes, conferindo lugar de desta-

que para à Administração Pública (como tutora do interesse público), sobretudo em

fu.. ãur cláusulas exorbitantes e d.a previsão de garantias em mão única, afavorccè-ladiante do contratado. Lado outro, como forma de "compensar" a existência de prer-

rogativas públicas, compreendeu-se (e ainda assim se compreende) que a garantia de

*ã'rrnr.t {ao da proposta, acolhida no afi..37 ,XXI, da CE e alguns dispositivos da Lei

8.666/Lgg3 (destacá a combinação entre os arts. 78, XVII e79,I),fazemd.o cenário

da Lei de LicitaçÕes zona dê maior conforto ao contratado, quando se compara ame-nor ,,proteção" que ele teria diante de relaçÕes privadas que viesse a estabelecer. Pen-

sandó especifi.camente em contrataçÕes voltadas às obras públicas, o contorno jurídi-co que dåla sobressai envolve pagamentos periódicos diante de mediçÕes executadas,

observadas as especifi.caçÕes do projeto executivo que sucedeu o projeto básico'

A Lei d"e ConcessÕes de Serviços Públicos, Lei 8.987/1995, por srtaYezJ edita-

da no contexto da desestatização, volta-se a um objetivo mais pontual. Está em

questão a prestação de serviços públicos precedidas ou não de obras. Seus focos

principais são o investimento e gerenciamento pelo particular de determinadosserviços públicos. As concessÕes de serviço público, projetadas pela lei, são con-tratos dotados de autossustentabilidade,4 visto que a remuneração do particular se

asseguraria por meio de tarifas pagas pelo usuário acrescidas de outras possíveisfontes alternativas, são aqueles a que se refere a Lei 8.987/L995'5

4. Não há intenção de aþord,ar aspectos ideoiógicos ligados à desestatizaçã,o neste trabalho'O recorte que utilizamos é estritamente técnico-jurídico'

5. Ressalta-se que t¡ fato cla coricessionária ser remltnerada por rneio das iarifas não impedeque a contraprestação se rca\ize de outro modo. A lei, ao possibilitar o uso de receita al-

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286 PnncrRrns Púeuco*PntvADAS

Os contornos da citada lei impedem e impediam que a concessão fosse empre-gada para alem de sen¡iços definidos como públicos. E mais. Mesmo os serviçospúblicos, assim aclamados pela ordem juridica, mas que por razões econômico-fi-nanceiras, não se ajustavam ao cerne das concessÕes, a envolver a remuneração portarifas como forma básica de contraprestação, demandavam nova solução d.ntroda perspectiva privatizante.

Outro desafio era atrair a participação do particular, capaz de impulsionar fi-nanceiramente o Estado. Efeito óbvio, como forma de exercer tal atração, estava naimperiosidade de fixar-se ambiente de confiança e estabilidade.

Todos estes aspectos são importantes para a compreensão dos passos que leva-ram à Lei 1I.079/2004, as novas modelagens contratuais nela disciplinadas e osdemais institutos e regras que ela apresenta.

A Lei de PPPs cria dois tipos de concessão, voltados à execução de serviço (nãonecessariamente público, no caso de concessÕes administrativas), a ele podendose acoplar obras e fornecimento,6 definindo prazos distintos e mais largos, maiorhorizontalidade do vínculo, prevendo formas de incentivo para melhoria do ge-renciamento e qualidade das utilidades públicas disponibilizadas, bem como paraa prestação tempestiva,T determinando também a distribuição objetiva de riscoss eadmitindo remuneração pautada em indicadores de desempenho,e buscando resul-tados mais satisfatórios para a coletividade. Nesse sentido, ainda que os detalhes

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ternativa como mecanismo de remuneração pelos serviços prestados peia concessionária,rompeu o dogma doutrinário de que a única maneira de remunerar a empresa seria coÍltarifas, e abriu a oportunidadeparaque o Poder Público complementasse ou at¿ substituís-se a tarifa por outro meio de remuneração. Assim, em situaçÕes excepcionais, admite-se opagamento de subsÍdios aos concessionários pela Administração Pública, quando este temcomo fundamento garantir a continuidade do serviço, ou, por exemplo, sanar eventuaisdesequilíbrios à equação econômico-frnanceira.Conceitos de concessão administrativa e patrocinada estão presentes no art. 2." da LeirL.079/2004."Art. 7.o A contraprestação da Administração Pública será obrigatoriamente precedida dadisponibilização do serviço objeto do contrato de parceria público-privada.,"Art. 5.o As ciáusulas dos contratos de parceria púbiico-privada atenderã,o ao disposto noart.23 da Lei n.8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também pÍeveri(...)III - a repartição de riscos entre as partes, inciusive os referentes a caso fortuito, forçamaior, fato do príncipe e áIea econômica extraordinaria.',Outro mecanismo que permite estimular a eficiente prestação do objeto contratado noârnbito da Lei de Parcerias Priblico-Privad.as é a remuneração do particular de acord o coÍeindicadores de desempenho, auferidos, por exemplo, por verificador independente.Im'porta ressaltar que instrumento tal não é obrigatório.

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Eour LÍenro ECoN0Mrco-Fr NANCn R0 NAS pARCERTAS púBLrc0- pRTvADAS 287

quanto ao modus operandi do contrato não sejam parte integrante do edital, distan-ciando-se do ritual da Lei 8.666/L993, certo é que os objetivos e resultados devemestar desde cedo delineados.

O instituto do equilÍbrio econômico-financeiro também terá contorno diversoquando aplicado às PPPs, principalmente se contraposto às ideias lecionadas peladoutrina em sua maioria, de que a igualdade necess áría entre ônus e benefÍciosdeveút ser necessariamente preservada, não importando as disposiçÕes contratu-ais' A alocação objetiva de riscos consensualmente pactvada, urii- compreendidadiante da possibilidade de participação dos licitantes na construção do eåital pelosmecanismos de consulta pública e eventuais road shows, af.eta o regime jurídico doequilÍbrio econômico-fi nanceiro.

2. Pnncrnlns DA ADMINIsTRAÇno: coNcESSöES DE sERVIÇgs púBUCgs E pARcERtASpÚgUco-pRIVADAS

Antes de abordarmos sobre o tema da manutenção do equilíbrio econômico--financeiro nos contratos de parceria público-privada s, far-se necessário passoanterior, para a compreensão do contexto no qual tal instrumento jurídico seinsere.

Conforme já exposto, em que pese a ediçâo da Lei 8.g87/Igg5 já em ambiente demaior estabilidade econômica e olhar voltado à delegação, o regime contratual nãoera suficiente para atender todos os anseios, considerando que a logica empregadapela Lei 8.987/L995 pressupÕe a delegação daqueles serviços coñstitucionalmenteaclamados' e que pudessem ser remunerad"os por intermédio de tarifas. Desta for-ma, restou essencial a inserção das modalidades patrocinada ou administrativa pelaLei 1L0L9/2004.

A primeira seria, nos termos do art. 2.", g 1 o, da referida lei, o estabelecimentoda concessão de serviços públicos ou obras, devendo o parceiro público compor aremuneração do particular a partir de contraprestaçÕes, somando-as àquelas perce-bidas pela tarifação.

Por sua vez, a concessão administrativa pressupÕe que a Administração pú-blica seja usuária, direta ou indireta, de determinaào serviço prestado pelo par-ceiro particular, podendo o contrato prever execução de obra ou forneci-"rio .instalação de bens. Segundo Sundfeld (2007, p.3l), é possível idenrificar d.uasespécies nessa modaiidade de parceria: a "concessão administrativa de serviçopúblico" quando o objeto englobar aqueles servi.ços previstos no art. L75 daCE eque "sejam prestados diretamente aos administrados sem a cobranÇa de qualquertarifa, remunerando-se o concessionário poï contraprestação versacla em pecúniapelo conceclente". Lado outro, a concessão administrativa será de "serviços ao Es-[ado" quando o cerne da PPP for coincidente corn os serviços lisfaclos no art. 6.o

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288 Pcncrntns Púeitco-PnlvADAS

da Lei 8.666/1993, aproximando, assim, dos contratos administrativos regidospela Lei de LicitaçÕes.10

Nesse ponto, aLei das Parcerias Público-Privadas provoca uma alteração subs-tancial no objeto de delegação ao particular se comparada à Lei de Concessões. Istoporque, a partir da edição da nova lei, outras atividades necessárias à Administra-,ção Pública, que não apenas os serviços públicos, e obras a ele vinculadas pode¡q,ser objeto de arranjo contratual. Conforme leciona Vernalha (20L2,p.54), no novo,modelo de delegação rompe-se com a lógica dos "efeitos jurídicos trilaterais",que presenre a figura do usuário alheio à Administração Pública. Ademais, háteração da lógica de remuneração, tendo em vista não vigorar a necessidadeautossustentabilidade da parceria, devendo o Estado contribuir diretamentecompor com a remuneração.

Feitas essas ponderaçÕes, destaca-se que o entrelaçamento realizado pelolador repercutirá no regime supletivo a ser utilizado, devendo ser observadosditames da Lei 8.987/1995, quando houver tal remissão.1I

3. Eoutlíenlo EcoNoMtco-FtNANcEIRO Dos coNTRATos DE PPP

O equilÍbrio econômico-flnanceiro é. garantiacontratual que objetiva adequartermos pactuados quando da contratação às circunstâncias decorrentes docurso do tempo, com intuito de proteger os interesses legitimamente consti

No âmbito privado, foi acolhtda a aplicação da cláusula rebus sic stontibuso início do século XIX, segundo a qual circunstâncias excepcionais, queàs prestaçÕes e contraprestações, ensejariam a recomposição das condiçÕesmente estipuladas.l2 Tal cláusula, sob o enfoque do direito privado, flexi

10. Carlos Ari Sundfeld pondera que apesar das semelhanças destacam-se as seguintes

ças: o investimento mínimo será de 20 milhões de reais; enquanto o invesdmentoticular não for amortizado a infraestrutura continuará como patrimônio deste; aexecução terão como tempo mínimo de 5 anos. SuNoneLn, Carlos Ari Vieira. Guiadas parcerias público-privadas. In:

-

(org.). Parcenøs público-privadas. Sãto

Malheiros, 2007. p.32.11.. A exemplo, o art. 3 da Lei Ll.07g/20A4, determina que se aplica adicionalmente às

cessões administrativas o disposto nos arts. 2I,23,25 e27 a39 daLei8.987/I995,art. 31 da Lei 9.074/Lgg5. Quanto às concessÕes patrocinadas, apiica-se o disposto na

8.987 / 199 5 subsidiariamente.12. Nesse sentido, Florivaldo Araújo preleciona: "Um dos resultados das ideias em torno

contrato foi a ampla aceitação, tanto nos contratos privados, guanto nosda chamada cláusula rebus sic stantibus, oriunda do direito romano. ConsideradaimplÍcita em todos os contratos cujas prestações se estendem no tempo, vata-se de

princípio segundo o qual as alteraçÕes substanciais ocorridas no ambiente

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EouriÍsn¡orcoruôurco-FTNANCETR0NASpARCERTASpúaLlco-pRtvADAS 289

a aplicação da força obrigatória dos contratos (pacta sunt sewanda), tendo comoprisma a proteção das garantias fundamentais, tais como igualdade e vedação deenriquecimento ilícito.

No direito administrativo, Wald (20L2,p. 864) aponta que a noção de equilíbrioeconômico-financeiro nos contratos, remonta ao início do século XX, quando a

.jurisprudência do Conselho de Estado da França adotou a tese de que haveria umarelaçã,o de equivalência entre aquilo que uma parte se propõe a fazer e a propostafinanceira que compÕe o contrato, razã,o pela qual deveria ser assegurada ao con-trataîtejusta indenização caso esse fosse excessivamente onerado. Importa des-tacar que inicialmente a doutrina francesa aceitava tal recomposição apenas paraas alteraçÕes unilaterais da Administração, como uma compensação do gozo dasprerrogativas estatais (SuNoFELD, 20L2, p. BB0).

Entretanto, a garar\tia do reequilíbrio apenas nos casos de utilização das cláu-sulas exorbitantes não era suflciente para a proteção das partes, tendo em vistaque os contratos estavam sujeitos às variações da economia e fatores externos quepoderiam, mesmo sem qualquer conduta da administração, desequilibrar os termosinicialmente pactuados e inviabilizar/dificultar a sua execução. Desenvolveu-se a

teoria da imprevisão na jurisprudência francesa, permitindo que também nos casosexcepcionais e supervenientes os contratos pudessem ser reequilibrados.t3

Respeitada doutrina pâtria indica que o princípio ao equilíbrio econômico-fi.-nanceiro encontra alicerce no art. 37, XXI, da atual Constituição senão, vejamos:

"Art. 37. (...)XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, com-

pras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que as-segure igualdade de condiçÕes a todos os concorrentes, com cláusulas que esta-beleçam obrigaçÕes de pagamento, mantidas as condições efetivas da propostd, nostermos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e eco-nômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigaçÕes" (grifos nossos).

Contudo, alguns autores, dentre eles Maurício Portugal e Marcos Pinto, sustentamque a Constituição Federal não mencionou expressamente a proteção do equilíbrio

das avenças implicam na necessária revisão das prestaçÕes das partes, de modo a resta-belecer o equilÍbrio contratual que iniciaimente estipularam". AnAú.¡o. Florivaldo Dutra.Repactuaçáo e equilibrio econömico-financeiro nos contratos administrativos. In: BtcALHo,Alécia Paulucci Nogueira: Dras, Maria Tereza Fonseca (Coord.). Contratøçoes públicas: es-tudas em homenagem ao Professor Carlos Pinto CoeJho Motq. Belo Horizonte: Fórum,20L3.p.73-87.

i3. O professor Carios Ari Sundfeld aborda com maior profundidade a evoluçáo dessa teoriana rlcr:trina. e jrrrisprurlânr:ia francesa no trairalho "Reajirsiamentr¡ c1e preÇos nos contralosadministrativos".

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290 Pnncrnins FúnLrco-PntvAoAS

econômico-financeiro, rnas sim, a rnanutenção das condiçÕes pactuadas na proposta.Por tal motivo, apesar de tênue, existiria diferença. entre a terminologia adotada peioconstituinte. Nesse sentido, Maurício Portugal (20I1, p. 10B) indica que o dispositi-vo apenas garante a manutenção das condições da proposta, em relação às obrigaçõesde pagamento, estabiiizando assim a equação econômico-fi.nanceira, ou seja, "cone-xão entre o objeto do contrato,.o conjunto de riscos transferidos pelo contrato parao parceiro privado e a remuneração prevista, para tanto, no contrato". Não haveria,portanto, nenhuma garantia constitucional de equilÍbrio econômico contratual, masapenas a estabilização da equação que foi determinada quando assinado o contrato.Para Marcos Pinto (2006, p 163) não há na atual Constituição Federal o princípiodo equilíbrio econômico-financeiro propriamente dito, mas sim proteção dos termospactuados entre os contratantes, afi.rmando o autorl

"Se examinarmos a Constituição com cuidado, perceberemos que não há, entrenós, um princípio do equilíbrio econômico-ûnanceiro, mas sim um princípio damanutenção do equilÍbrio econômico-flnanceiro. A Constituição não autoriza a

modifrcação ou suspensão das obrigaçÕes previstas em um contrato administrativosob o pretexto de que ele não é economicamente equilibrado. Na verdade, o que a

Constituição determina é que as condições propostas pelo licitante sejam mantidasrrmaYez celebrado o contrato,"

A despeito dos relevantes argumentos suscitados pelos autores, parece-nos quea menção constitucional à manutenção das condições efetivas da proposta, traduz,no ordenamento jurÍdico pátrio, o princípio do equilÍbrio econômico-financeiroaplicável aos contratos administrativos. Tal orientação não importa, contudo, naconcepção de que a equação econômico-financeira será estática, e que qualqueralteração quantitativa ou qualitativa será necessariamente recondutível à revisão.Assim, a existência desse princípio não impede que as partes disponham sobre ostermos do contrato, alocando de forma objetiva os riscos atribuíveis às partes, em-bora assim não se costume interpretar.

Além disso, não se deve confundir o direito à manutenção da equação econô'mico-financeira com direito à percepÇão dos valores que a concessionária entendemerecer. A insatisfação da concessionária pela não realizaçao das suas expectativasnã,o gera o direito à mudança na equação.

Por fi.m, presume-se que o contrato é inicialmente equilibrado, sendo impossí-vel, sobre o viés legal, que uma recomposição tenha por causa a falta de equilíbrioeconômico do contrato, sem a ocorrência de qualquer fato modificativo.

3.1 Equtlíbrio ecanomico-finonceiro camo expressôo do interesse pública

A garantia do equilíbrio econômico-financeiro, entendida como a manuteîLÇãOno tempo dos termos acordados na proposta, re{lete expressão do interesse público'

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EoulLísnro rco¡lol¡lco-FtNANcEtno NAS pARCËRtAs púsLrco*pRrvADAS Zg1

pois tem como objetivo conter possíveis arbitrariedades da Administração frenteaos particulares.

l\ão seria possível alicerçar a imposição de prejuízos e gravames ao particular,ao não proceder uma recomposição dos termos ajustados, na supremacia do inte-resse público sobre o privado, pois a plena realizaçã,o deste, perpassa pela proteçãode um interesse privado constitucionalmente aclamado.

Sobre o assunto, Ceiso Antônio Bandeira de Mello elucida que se a atuaçãoestatal, ao defender o interesse público, acaba por afrontar a lei ou desatender di-reito alheio, não pode ser considerada lÍcita e tão pouco legitima.ia Desta forma, aoffatar da necessidade de respeito ao equilíbrio econômico-financeiro, o ProfessorBandeira de Mello defende que não se autoríza à Administração, por supostamentecumprir o interesse público, obter vantagens patrimoniais em detrimento dos di-reitos do particular.

l',1ão fosse tal argumento sufi"ciente, frisa-se que também nos contratos da Ad-ministração prevalece o princípio da boa-fé das partes, na medida em que for-mado voluntariamente por estas, e tendo como intuito a consecuÇão de suasaspiraçÕes.15 PressupÕe-se, portanto, que as partes se comprometam a cumprir ostermos pactuados.

Sobre a aplicação do princípio daboa-fe nos contratos da Administração, prele-ciona Celso Antônio Bandeira de Mello (20L2, p. 601), cirando Gordillo:

"Diz-se assim, que os contratos administrativos são essencialmente de boa-fé, doque resulta que a Administração não deve atuar como se se tratasse de um negóciolucrativo, nem intentar obter ganhos ilegítimos às custas do contratado, nem a apro-veitar-se de situaçÕes legais ou fáticas que a favoreçam em prejuízo do contrataclo,"

E rnais, a Administração, ao iniciar uma licitação proclama seu interesse deconsecução de algum fim, formando com o particular, ainda que a partir de contra-posição de interesses (em regra o particular visa o lucro e a Administração, o cum-primento de um objeto), um ajuste equilibrado, uma yez que nenhum particular seprontifrcaria a contratar, caso tivesse que absorver todo o prejuízo. Nesse sentido,opina Celso Antônio Bandeira de Mello (.2012,p.596):

"Com efeito, interessa ao con[ratante governamental resguardar seus contra-tados no caso de alter:açoes econôrnicas que the descornponhara a economi.a d"ocontra[o como meio para obstar que tais efeitos danosos se reflitam no bom, fiele lempestivo cumprimento de urna tarelaque é necessária ao interesse coletivo."

L+. B"tNoEtnt os lVisll-o. Celso;{ntônia. Contrato aclminisrratir¡o in: Ðr Pt¡rlo, L;l¿ria S"vÌvia,SL;NnRELi--'', Carlos i\ri Vleira (org.). Ðout'rinas ess¿n.ciais. Dircít,: ç.l,mínlstratit¡*.Sao Faulc:EC. Rr, 2ûi2. p óût-õ03.

15. Icle:æ, p. 55Ç.

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292 Psncenlns PúnLrco-PntvADAS

Assim, resta claro que o interesse público será efetivado por meio da consecu-çâo do contrato que tem como intuito beneficiar a coletividade, e não causar a ru-ína do contratado. Distinto fosse o interesse,razão não haveria para a contrataçãoem primeiro plano. Desta forma, cabe à Administração resguardar também os in-teresses dos particulares, principálmente no que tange ao equilíbrio econômico--financeiro inicialmente formado no contrato, para garantir o bom cumprimentodo ajustado.

3.2 Evol uçoo i nfroconstituciono I d o equ i I íbrio economico-fi n0 ncei ro

Antes de explorarmos as previsões infraconstitucionais que explicitam a pro-teção ao equilíbrio econômico-financeiro, é essencial rcalizar algumas anotaçÕessobre a teoria das áleas.

Os contratos da Administraçã.o envolvem três espécies de áieas ou riscos a queos contratados se sujeitam, além do caso fortuito e força maior: a áiea ordináriaou empresarial, que se refere ao risco que todo contratante se submete em face deflutuações do mercado; a áÅea administrativa, que inclui a possibilidade de alte-ração unilateral do contrato, fato do prÍncipe e o fato da Administraçã,o, e a áÃea

econômica, que corresponde às circunstâncias imprevisÍveis e inevitáveis alheias aocontrato, que causam desequilíbrio a este.

Dentre os riscos acima detalhados, apontam-se como recondutÍveis à recompo-sição do equilíbrio econômico-fi.nanceiro, além dos ordinários com consequênciasimprevisÍveis, aqueles abrangidos pela á.lea extraordinária, isto é (i) modlfr,caçãounilateral do contrato, (ii) fato do príncipe, (iii) fato da Administração, (iv) e fatosimprevisíveis e excepcionais ou álea econômica.

No âmbito da Lei 8.666/L993, as hipóteses acima descritas foram abraçadas,sendo o ponto central para atração da responsabilização da Administração a

ocorrência de algum destes eventos extraordinários, posterior à assinatura docontrato.l6

Neste ponto, poder-se-ia indagar se, tendo a lei geral de LicitaçÕes e Contratos,especificamente disposto que o particular estaria tutelado diante de ocorrência dos

16. É possível verificar essas hipóteses a partir da leitura dos arts. 57, g 1.o (fato da Adminis-tração),58, g 2.",56, g 6." (modificação unilateral),65,II, d (teoria da imprevisão) e 65'3 5." (fato do príncipe) constantes na Lei 8.666/1993.Para maiores consideraçÕes sobreo tema yide o artigo "A inconstitucionalidade do dever da Administraçâo Pública custearindenização por rescisão contratual causada por força maior e casos fortuito". FoRrlNt,Cristiana. Direito do contratado, equilÍbrio econômico-financeiro, pagamento pontual e

decorrências de seu desatendimento. In:.

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Prnrtne; Maria Fernanda Pires de Carvalha,Cavenao, Tatiana Martins da Costa (org.). Licitaçoes e contratos: øspectos relevantes.2. ed.

Beio Horizonte: Fórum. 2008.

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Eou¡iíanro rcoruôurco-FtNAr\cEtRo NAS eARCERIAs púsLlco-pRtvADAS 293

eventos extraordinários, não poderiam as partes negociar contratualmente uma re-partição distinta dos riscos. Isto porque, respeitada doutrina aponta que a Lei deLicitaçÕes explicita no ordenamento pátrio o princípio do equilíbrio econômico-fl-nanceiro, disposto no art. 37, XXI, constituindo, portanto, um parâmetro aplicávelaos contratos administrativos, o que impediria, via de consequência, a disposiçãocontratual sobre o tema. Igualmente, sendo as parcerias público-privadas espéciede contrato administrativo, poderia ser aplicada a estas o tratamento dado pela Lei8.666/L993.

Contudo, esse posicionamento não deve prevalecer, pois a Constituição nãoveda a autorregulação das partes, mas sim estabelece que aquilo que foi efetiva-mente determinado por estas será intangível. Desta forma, conforme ressalta Ver-nalha (20L2, p. 306) "aregra constitucional apenas assegura a intangibilidade dascondiçÕes fixadas na proposta, protegendo o pacto de intervençÕes administrativasautoritárias na esfera das cláusulas econômicas do contrato".

Ademais, a própria Lei 8.987/1995, nos mesmos termos da Constituição Fe-deral, determina no art. 10, que está mantido o equilíbrio econômico-frnanceiroquando atendidos os termos do conirato, demonstrand"o que há sim espaç o parucomposição pelas partes da matriz de riscos.

Por fim, ressalvamos que o art. 2." da Lei de ConcessÕes, como já antecipado,há a previsão de que a delegação corre "por conta e risco" do concessionário, o quepoderia significar, em uma leitura apressada, que o particular não estaria protegidona hipótese de materíaïização de eventos extraordinários. Porém, é preciso recor-dar que o risco a que se submete a concessionária não é absoluto. Por exemplo,a ausência d"e usuários a acarcetar a ausência de remuneração provocaria ruína daempresa e, assim, a descontinuidade do serviço público, ainda que por certo lapsotemporal. Certamente esse nã,o e o objetivo do legislador, devendo a expressão "porconta e risco" ser relativizada. Em análise à dicçáo "por conta e risco" no âmbito daLei de Concessões, assim uma das autoras pontou em outra oportunidade (FonlNl,2009 , p.43):

"A Lei 8.987/L995 derrubou alguns conceitos. A nova compreensão do legisla-dor reflete, na verdade, a preocupação com o interesse púbiico e com a continuida-de dos serviços públicos. (...)

Assim, o risco da concessionária ha de ser moderado, A própria LeiB9B7/L995reflete tal preocupação, quando, no art. 11, cuida das fontes alternativas de remu-neração à concessionária que, por fim, poderá invocar a seu favor o direito ao equi-líbrio econômico financeiro, consolidado no art. 37, XXI, da CF ern vigor.

Por isso, o pagamento de subsídios, em situaçÕes especialíssimas, a serem tecni-camente identificadas, não deve ser refutadr¡."

Û legislador da Lei cle PPPs optou por expiicitar por meio dos arts. 4.o e5.n aliistnbuicãr,. r.rbjetiva ulos risccs"

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294 PRncrRl¡s PúsLlco-PntvADAS

3.3 Equoçoo econCImico-financeiro:inserçoo do noç0o de risca

A opção do legislador, retratada na Lei I 1.079/2004, incorpora de forma expressae obrigatória nas parcerias público-privadas a noção de risco, fator constante na re-lação constituída entre as partes.. Isto porque a complexidade dos contratos ora emestudo e a diretiva de alocação objetiva de riscos do contrato, revelam a existênciade uma expressão numérica, o que vale dizer que não há igualdade neces sária entrefatores matemáticos relacionados no decorrer do tempo. Nesse sentido, MaurÍcioPortugal (201I, p. 103), apresenta a relação matemática que julga mais adequada:

"objeto + risco = reÍtuneração."Tal assertiva considera que, no momento da proposta, o parceiro privado assume

tanto a prestação do objeto do contrato quanto os riscos a ele alocados, e que parao somatório destes receberá uma remuneração específica. Assim, não há relaçãonecessária de igualdade no tempo, pois a materialização de um risco previamentealocado ao particular, anteriormente previsto e precificado, não ensejará recom-posição da equação econômico-financeira, ainda que não necessariamente o ônus,decorrente do fato extraordinário, corresponda exatamente à contraprestação quefoi precificada. O que importa é o permanente cumprimento d.a matrizde riscos.

Assim, a formação de tal equação será fundamental para amanutenção do cum-primento datarefa contratada ao longo do contrato, efetivando o interesse público,

4. A nrpnnrtÇAo oBJETIvA DOS Rtscos ENVoLVIDos N0 coNTRATo DE PPP ENTREAS PARTES

Considerando o lapso temporal de um contrato de parceria público -privada,tTsão necessárias estratégias para gerenciamento e mitigação dos riscos no caso dasua materialização por força de evento posterior, tendo em vista que estes poderãoonerar excessivamente uma ou ambas contratantes, e, no limite, impedir a execu-ção do contrato.

Desta forma, sabe-se que um dos pontos centrais para o sucesso e viabilidadeI

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de qualquer empreendimentocificação dos riscos. A tarefaum signifrcado econômico. Asugeridos por Nobrega (2011,e Varma:18

de infraestrutura são a correta identificação e a pre-é complexa, tendo em vista que incorpora tambémpresentam-se, para frns didáticos, alguns conceitosp.2), em referência ao trabalho depadiyar, Shankar

17. Nos termos do art. 5.o, I, da Lei geral de parceria público-prívada, os contratos têm dura-ção entre 5 e 35 anos.

18. Peolvan, Vaijayantiç; SHaNxen, Tarun; VARuR, Abhishek. Risk management. In: ppp. Di-sponível em: Iwww.globalclearinghouse.org /Infladev/assetso/o5CI0/documents/

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Eourlísnrorcoruo¡¡rco-FrNANcErR0NASpARcERrnspúnuco-pRtvADAs 295

"- Situação na qual não se conhece o resultado final;

- A variedade de possíveis resultados em razã,o na natureza da situação;

- Grande possibilidade de fracasso;

- Falta de previsibilidade de sobre a estrutura, resultado frnal, consequência deuma decisão ou planejamento;

- A chance de evento posterior impactar nos objetivos . TaI ê medido em relaçãoa consequências e probabilidade".te

Irlo citado trabalho, os autores estrangeiros identificam que os projetos de infra-estrutura têm como essência: (i) a possibilidade do risco impactar no negócio, (ii)a probabilidade do risco ocorrer em determinado período de tempo e (iii) impactoeconômico resultante da materializaçã,o do risco.

O risco, contudo, não é visto sob a perspectiva econômica apenas como negati-vo. Os próprios autores identificam que o risco pode ser considerado sob a ótica daoportunidade, pois pode aumentar o potencial de ganhos e perdas; do perigo, ten-do em vista que a materialização pode afetar o desempenho econômico e objetivosdo projeto; ou como incefieza, emrazã,o da volatilidade do resultado final.

Assim, a correta identificação e modelagem contratual, a partir do diagnósticoencontrado nos estudos preliminares, serão cruciais para o sucesso e viabilidadedo empreendimento. Não por outra razã,o, este ponto foi objeto de preocupaçäodo legislador brasileiro, ao editar a Lei LI.079/2004, Trata-se do aspecto que maisdiscussões acarreta no período gestacional dos editais de PPP

4.1 0s nscos nos controtos de PPP

O legislador, tomando como base as experiências internacionais, inovou o orde-namento jurÍdico ao determinar, nos arts. 4.o,IV e 5.o, III,20 que os contratos devem

Padiyaro/oL}eto/o2}alo/oZ}-o/oz}Risk%20Managemento/o20ino/o20PPPo/o20(200a).pdfl .

Acesso em: 13.03.20L4.19. "A situation where there exists no knowledge of its outcome. The variation in possible

outcomes that exist in nature in a given situation. High probability of failure. Lack of pre-dictability about structure, outcome, or consequences in decision or pianning situations.The chance of something happening that will have an impact on objectives."

20. "Art. 4.o. Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretri-zes: (...)VI - repartição objetiva de riscos entre as partes.""Art. 5.o As cláusulas dos contratos de parceria púbiico-privada atenderão ao disposto noart.23 da Lei 8.987, de l3 de {evereiro de 1995, no que couber, devendo tambémprever:(.. )iII - a repartição de riscos entre as partes, inciusive os referenles a caso fortuito, tbrçamaior, fato do príncipe eâlea econÕmica extraordinária."

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296 Pnncrnl*s PúaLlco-PntvADAS

ter como alicerce uma repartição objetiva dos riscos, inclusive os referentes ao casofortuito, força maior, fato do prÍncipe e álea econômica extraordinária.

Em verdade, a partilha ou compartilhamento dos riscos são a tônica das parce-rias público-privadas, em que o poder concedente deve solidarizar,se com o par-ceiro privado, com o intuito de atrâir maior número de interessados que, não fosseeste fato, não se disporiam a assumir as tarefas contratadas.

Da redação de tais artigos, extrai-se que a alocação dos riscos, nas PPPs, serárealizada pela via contratual, a partir do consenso2l entre a Administração, quefarát a minuta do contrato contendo aquela divisão que considera mais razoétve!, eo particular, que adequara a sua proposta financeira ao disposto no edital. O quese buscou com a inserção deste instrumento regulatório foi a maximização da efl-ciência do contrato, uma vez que a partir da livre pactuação das responsabilidadeshá maior chance de mitigação do dano pelo encarregado contratual no caso deocorrências futuras, e de adequação da precificação do projeto.22 Como risco erecompensa caminham juntos, a transferência ocasiona um incentivo ao particularpara atuar de forma eficiente e econômica, buscando os melhores resultados naprestação do serviço, percebendo, assim, vantagens fi"nanceiras.23

A eficiência contratual poderá ser constatada, por exemplo, na alocação de maisinvestimentos na construção da obra, com o objetivo de reduzir posteriormente ocusto de manutenção. Outra vantagem é que a Administração Pública poderá focarno resultado, por meio de frscalização da execução e prestação dos serviços, cabendoapenas ao parceiro privado escolher os meios e tecnologias a serem empregadas.2a

A repartição dos riscos tem o intuito de prever e designar a cadaparte a assunçãode responsabilidade no caso da materialização de ocorrências futuras. Do ponto de

21. Importa ressaltar que o consenso deve ser entendido como a coordenação dos interessesentre atores estatais e não estatais, através de mecanismos de participação popular, taiscomo consultas púbiicas, que possibilitam sugestões e críticas às contratações, tendo papelde inclusão. Nesse sentido, o art. 10, da Lei II.07gl20}4, determina a obrigatoriedaãe desubmissão à consulta pública do edital e da minuta do contrato de PPi possibilitando aparticipação social. A participação de road" shows, embora não obrigatória, também podeser salutar, dado que a licitação deve atrair o maior número de interessados.

22. FneNçn. Maria Adelaide de Campos. Parcenøpublico-pnvadas: repartiçao obietiva de nscos.Tèse de Doutorado em direito, São Paulo, USB 2011, p.I03.

23. Nesse sentido Con¡{en pondera: "The main benefit of transferring risk from the public sectoris that it should generate the incentives for the private sector to supply cost effective andhigher quality services on time. Risk and reward go hand in hand." ln.: Con¡¡en, David.The United Kingdom Private Finance Initiative: The Challenge of Allocating Risk. OECDJournal OnBudgeting. voI.5. n. 3, p. 38-55

24. Rr¡srno, Maurício Portugal. ConcessÕes e PPPs: melhores prdticas em licttações e contratos.São Paulo: Atlas, 20ÌL p. 69.

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Eourlíenro rcorrrotvrco-FtNANcEtR0 NAS pARCERtAs pÚailco-pRtvADAs 297

vista semântico, a expressão "repartição de riscos" não significa, necessariamente,que os riscos serão suportados igualitariamente entre as partes, mas sim, que elesserão alocados entre contratante e contratado, sem que isso represente riscos comigual expressão fi.nanceira.

Trata-se da parte mais central de um contrato de PPP que, em nosso sentir, reve-la um amadurecimento da disciplina dos ajustes entre público e privado. Sua cen-ralidade ê. tãto evidente que o maior ou menor sucesso quer da atratividade da lici-taçã,o, quer da própria saúde do contrato, guardam dependência direta das escolhasadotadas na fase doméstica da licitação, quando se decide a respeito da alocaçã,o.25

Sobrecarregar o privado pode afastá-lo do certame ou pode induzir à precifica-ção do risco. Sobrecarregar o público pode tornar desinteressante essa modelagemcontratual.

A sabedoria está em, casuisticamente, desvendar qual risco melhor se ajusta aopúblico e ao privado, evitando transportar para um ou outros riscos, com os quais oerLcaffegado não consegue lidar. Ao assumir o risco, via contrato, o particular reco-nhece que não poderá demandar reequilíbrio. Sua postulação somente encontrarárespaldo se o risco tiver sido absorvido pelo contratante.

A repartição objetiva de riscos vai ao encontro das diretrizes e experiências in-ternacionais, que apontam como um fator do sucesso do empreendimento e depreocupaçã,o para o Poder Publico a correta distribuição dos riscos envolvidos.Nesse sentido, a Comissão Europeia manifestou-se no "Guia de parcerias público--privadas bem-sucedidas" que a alocação dos riscos é parte fundamental das PPPs,e que estes d,everão ser distribuídos de acordo com a capacidade de lidar com orisco de forma mais eflciente e econômica possível.26

Ademais, recentes estudos da European PPP Expertise Centre (Epec)27 indicamque a Administração deve se preocupar com a análise da distribuição de riscos

25. Sátbia, assim, a decisão de se exigir consuhas públicas de maneira a propiciar o diálogorepublicano entre interessados e Poder Púbiico.

26. "A major component of any PPP is risk aliocation. Who will assume risks in the delivery ofa service or in the construction, operation and maintenance of infrastructure is often thecentral question in a PPP (...) nist< should be ailocated to the p^rty who can best assumeit in the most cost effective manner". In: Guidelin"t jo, Successful Public - Pnvate Partner-ships. 2003 ,p.79.

27 . "Risk distribution and balance sheet treatment are important aspects of any PPP structure.Understanding the underlying issues, and their consequences, is of great concern toprocuring authorities. (...) This document is intended to give practical advice on the impacton government deficits and debt of the risk distribution between government and the PPPpartner". Rish Distribution a.nd Balance .Shsst keatment - Europtean PPP F,rpertise Centre,2013, p. 5-6.

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298 FnncEnlns PúsLrco-PnlvADAS

em razão do impacto nos balanços públicos e do endividamento do Estado nocaso da materializaçao do risco. Assim, torna-se imprescindivel a aiocação préviados riscos para mapear e delimitar os riscos atribuídos às partes, evitando queelas sejam posteriormente surpreendidas. Tal alocação incentivará não apenas apostura proativa das partes, para.lidar e evitar os eventos indesejáveis, bem comose trata de medida essencialpara o Poder Público, pois permite melhor planeja-mento orçamentário.

Outro ponto favorável à correta e prévia alocação dos riscos está na sua impor-tante contribuição'para a formulaçäo da proposta financeira feita pelo licitante. Ainformação sobre a responsabilidade na materializaçã,o de um evento será conside-radapara determinação da proposta que o parceiro privado apresentará.

Para que tal alocação seja real:u,ada de forma desejável, indispensáveis estudosprévios, por meio dos quais a Administração Pública esboce a previsibilidade daocorrência dos múltiplos fatores de risco. Estudos que delimitem o máximo pos-sÍvel expectativas de demanda, problemas oriundos de desapropriações, questõesrelativas a licenciamento, entre outros fatores, são a alma de uma PPP Nele repou-sam as decisões administrativas.

Passo seguinte, para a acertada alocação dos riscos, como propoe MaurÍcioPortugal (2011, p.80-Bl) concomitantemente: (i) deve-se alocar o risco paraaparte que consiga reduzir as chances de ocorrência do evento indesejável, ou quepromova o evento desejável com o menor custo possível, que (ii) consiga melhorgerenciar e mitigar o evento indesejável, (iii) que tenha menor possibilidade de"externalizar" as consequências do evento danoso. Por frm, caso não seja claraqual a alocação mais efi.ciente, deve-se alocar apafie a qual o risco recaía natu-ralmente.

Outro ponto sensível na repartição de riscos é o efeito que tal critério de aloca-ção poderá gerar sobre um futuro reequilíbrio econômico-financeiro, no caso desua materialização.Isto porque, conforme destacam Prado e Ribeiro (2007,p. 105)"a depender da forma como eles forem confi.gurados, riscos que foram transferidosno corpo do contral-o para os privados podem retornar para a Administração Pú-blica". A materialização desta hipótese se daria, por exemplo, segundo os mesmosautores, em casos em que se tem a taxa interna de retorno como único critério pararecomposição do equilíbrio econômico-financeiro. Isto porque, a diminuiçãro dademanda, partindo do pressuposto que está no âmbito dos riscos assumidos peloparceiro privado, impactará na projeção darentabilidade da concessão (TRI), tendocomo decorrência lógica a revisão do contrato, que terá os efeitos financeiros assu'midos usuários ou à Administração Pública. Desta forma, em razão da mâ escolhana forma de recomposição do equilíbrio causará distorção na matriz previamenteestabelecida. Resta claro que uma eficiente repartição de riscos deverá projetar osimpactos da materialízaçã,o, a fi.m de assegurar que os interesses da administraçãoestejam resguardados.

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Eourrísn¡oeco¡ron¡rco-FrNANcErR0NAspARcERtRspúsLlco-PRtvADAS 299

A partir da assinatura do contrato de PPPs é. frxada uma matriz de riscos quedisciplina as responsabilidades de cada parte em relação às incertezas que possamaf"etar a atividade. Hâ, portanto, a establlização do conjunto de encargos e benefí-cios correspondentes a cada uma das partes, refletindo parte dos componentes da"equação econômico-financeira" do contrato.28

4.2 Constitucíonolidode dos orts. 4.o, IV e 5.o, Ill, do Leí 11.079/2004

A previsão d.a repartição objetiva dos riscos é compatível com a previsão cons-titucional de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, disposto no artigo37, XXI?

Como anteriormente anotado, subsistem no ordenamento pátrio duas visõessobre o instituto do equilÍbrio econômico-financeiro: a primeira decorrente da pre-visão do art. 65 dalei de Licitações, e a outra apaftfu da interpretação do art. 10 daLei 8.987/L995 e, sobretudo, dos artigos ora discutidos. Haverá incompatibilidadese não considerada a diferença entre os instrumentos da distribuição objetiva dosriscos e da manutenção do equilíbrio econômico-fi.nanceiro.

Isto porque a Lei de Parcerias Público-Privadas, pela disposição do art. 4.", de-termina que:

"Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes di-retrizes:

(...)VI - repartição objetiva de riscos entre as partes.))

Em seguida, o legislador exemplifica, no mesmo texto legal, quais riscos seriampassíveis de repartição:

"Art. 5.". As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão aodisposto no art. 23 dal-ei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, deven-do tambem prever:

(...)III - a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito,

força maior, fato do prÍncipe e âlea econômica extraordinária."Privilegia-se a alocação objetiva de riscos para o caso concreto, rompendo a ló-

gica da regulação legal via predeterminação dos e.feitos dos riscos.Restando claros os benefícios do instrumento ora analisado, poder-se-ia questio-

nar se a possibilidade de alocação de riscos, inclusive aqueles oriundos de caso for-

28. Importa destacar que não se pode falar em totalidade de tal equação, pois essa tambémconterá os indicadores de serviços e o sistema de pagamentos. RIBETRo. Maurício Portugal.Concessões e PPPs... cit., p. 78.

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300 PnRcrn¡es FúsLlcc-PntvADAS

tuito, força maior, fato do príncipe e alea econômica extraordinária, ofenderia o deverde manutenção das condiçÕes da proposta, determinada no ar-.37,xxl, da CE

Destaca-se que a propría Constituição delega ao legislador ordinário delimitaras licitaçÕes e contratos, e só haveria inconstitucionalidade se esse, ao fazê.-Io, vio-lasse os contornos constitucionais.

A alocação de riscos preserva a transparência e a adequação das propostas ao ob-jetivo licitação, adiantando os efeitos das hipóteses de reequilíbrio, desestimulandomanobras para futuros aditamentos contratuais e recomposição das cláusulas eco-nÔmicas. A defrnição desde a contratação dos riscos establliza a matriz econômicado contrato, de forma que a ocorrência de fatos futuros apenas poderá ser suscitadapara frns de recomposição, caso assim definidos.

Também não há qualquer inconstitucionalidade de se distribuir/alocar riscosdecorrentes de caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômic a extra-ordinária. O que o citado artigo faz e apenas possibilitar a transferência ou não dosriscos desde a formação da matriz de riscos, que comporâ a equação do equilíbrioeconômico-financeiro, de forma que o equilíbrio inicial do contrato ja inclua arepartição de riscos.

Assim, entendemos pela constitucionalidade de tais dispositivos legais, tendoem vista que possibilitam a eficiência e maximização da vantajosidade da contra-tação, além de primarem pela transparência e retidão do procedimento licitatório.

4.3 Reportiçoo de riscos: possib¡lidades e limites

Assentada a premissa de que é constitucional a repartição objetiva dos riscosnos contratos de PPP, analisa-se, a partir do viés prático, se todo e qualquer riscopode ser alocado a qualquer uma das partes, ou se há limitações para tanto.

O primeiro ponto a ser suscitado, seriam os contornos da transferên cia ao par-ticular do risco da demanda nas PPPs, tendo em vista que nas concessÕes comunsvigora a díretriz de autossustentabilidade da delegação, a partir da remun eraçãopor meio de tarifa.2e

A Lei IL.079/2004 traça apenas os contornos gerais que possibilit am a transfe-rência objetiva de riscos, sem, contudo, esgotar quais seriam os conceitos empre-gados acadaum desses riscos.

Quanto ao risco de demanda, importa destacar que a depender do projeto, porexemplo, no caso de transporte metroviário e rodovia, por vezes o parceiro tem

Conforme anteriormente anotado, o particular poderá ser remunerado por formas a1terna-tivas, como, por exemplo, a cessão de espaço publicitario ou de vendas, contudo, pressu,põe-se que estas receitas não devem ser o alicerce do contrato.

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Eourrísnro rcoruourco-FrNANcEiRo NAS pARCERTAS púsLrco'pRrvADAS 301

pouco controle desta, não sendo a melhoria do serviço relação necessáriaparao au-mento ou manutenção da demanda. Por talrazã,o Rocha (20L4,p. L39-L40) destacaque este risco, em tais casos tende a ser compartilhado entre as partes, por intermé-dio de complementação de receita fixa ou remuneração variável, partindo do pres-suposto de que o serviço foi efetivamente disponibiLtzado. O mesmo autor lecionaque a variaçã,o de demanda não se confunde com a âlea econômica, tendo em vistaque não é evento imprevisível, mas sim aferívei a partir dos estudos prévios. Destaforma, para que a alocação do risco seja eficiente, afirma o autor que estando ademanda abaixo da expectativa quando da contratação, poderia o parceiro privadorequerer a recomposição da equação econômica, e por outro lado, sendo a demandaexcedente a tal valor inicial, deveria beneficiar os usuários, a partir de redução dastarifas, ou ao próprio contratante, diminuindo o montante da contraprestação.

Em contraponto a tal entendimento, Maria Adelaide França (2011, p. 105-106)aduz que contraríaria os princípios da legalidade, supremacia do interesse públicoe razoabllidade a possibilidade de transferência de riscos inerentes à própria ativi-d,ade empresarial ao parceiro público, no qual por decorrência lógica, poderíamosincluir o risco de demanda. Isto porque segundo a autora, ainda que seja partecontratual, a Administração está vinculada à finalidade pública e deverá adotar osmeios escolhidos pelo legislador, não sendo integralmente suscetivei à autonomiada vontade. Ademais, a autora elucida que a assunção de um risco decorrente daálea ordinaria "cantsará aos cofres públicos muito maiores prejuízos econÕmico--financeiros do que qualquer outro tipo de contrato, emrazã,o de sua longa duraçãoe da contraprestação pecuniária a comprometer o erário público".

Neste ponto, não concordamos com a opinião da referida autora, pois o legis-lador buscou justamente efetivar o princÍpio da eficiência, e, por decorrência, dasupremacia do interesse público, ao possibilitar a alocaçao dinâmica dos riscos docontrato, de forma a adequar-se caso a caso. Proibir seria fazer da dicção dos ar-tigos citados acima letra morta. No Estado de Minas Gerias, podemos citar, comoexemplo, o compartilhamento do risco da demanda nas Unidades de AtendimentoIntegrado (UAI), como forma de mitigar a transferência de custos indiretos para ovalor total da parceria. No caso concreto, o Estado de Minas Gerais assumiu 70olodo risco da demanda, garantindo uma parcela anual complementar caso não atinjao patamar rnínimo estabeleciclo, reduzindo os custos totais embuticlos na precifica-ção do risco para o caso de desocupação das unidades.

Em caso distinto" mas que também tem corno cerne a demanda, a concessão ad-rninistratíva paru a prestação cle serviços de apoio à operação dos centros de saúdeem Belo Horizonle,'u prevê a possibilidade de reequiiíbrio econômico-financeiro

30 "l- 7 l Salvc f;tllressr. previsão nesle e$ntrai-o. sotrientt rslletá a recomll{l.Eìcãrr do eiìitilíbriceconômico-financeiro da ccncessão nas hipóteses abaixo descritas:

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apenas quando a demanda peio serviço sofrer variação maior qve 20o/o daquilo quefoi contratualmente determinado como parâmetro. Dessa forma, resta claro à con-cessionária, desde a licitação, que caso a variaçã,o da demanda não seja nessa ordemde grandeza, näo haverâ revisão do contrato nesta hipótese.

No que tange aos riscos de ionstrução e disponibilidade, alguns autores afir-mam que este deverá ser integralmente assumido pelo parceiro privado, tenrdo emvista o critério de controle do risco. Isto porque se espera que o parceiro privado, aoser o responsável pela obra, terá maior compromisso com sua funcionalidade e per-feição, evitando sua própria oneração. Em contraponto a tal posicionamento, Ro-cha (2014, p. 153-t 54) afrrma que seria aceitável o compartilhamento de riscos deforma que o parceiro público assumisse os riscos extrínsecos aos contratos ligadosà construção e disponibilização, de ordem polÍtica e macroeconômica, de forma aotimizar os incentivos gerados ao particular. Assim, sob o prisma da eficiência docontrato, seria possivel o compartilhamento do risco decorrent e da áiea ordinária.

Como dito, o compartilhamento não está preso a uma receita legal, mas, ao re-ves, deve atentar para o caso especÍfico.

Ponto interessante seria analisar a possibilidade de alocaç ão ao parceiro privadode riscos decorrentes de fato do prÍncipe. Sobre tal assunto, leciona França (2011,p. 110) que seria inaceitável responsabilizar o particular que não concorreu para osprejuízos provocados pelo Poder Público. Discordamos, visto que, dentro da searada consensualidade, não parece haver impedimento. Todavia, ,ráo pur..e, ao menosem princÍpio, conveniente assim decidir porque riscos sobre os quais o particularnão tem nenhuma governabilidade devem ser posicionados no rol dos riscos comos quais o Poder Público deve lidar.

Quanto aos riscos de caso fortuito e força maior, importa ressaltar que, em al-guns, casos pode ser interessante à transferência parcial desses riscos ao Poder pú-blico sob o prisma da otimização contratual. Nesse sentido, podemos citar o exem-plo da concessão administrativa para expansão da rede educacional municipal deBelo Horizonte, que alocou ao poder concedente os riscos de caso fortuito. fotçumaior que não são cobertos por seguros privados, nos termos do item 29.2.3,3rexpressamente prevendo a possibilidade de reequilibrio econômico-frnanceiro paraocorrência de tal hipótese. Ademais, a cítada cláusula remete ao disposto no item

17.I.7 a demanda pelos serviços sofrer variação acima de20o1o (vinte por cento) da esøbe-lecida nos limites do anexo V do contrato"."29.2 Salvo expressa previsão neste contrato, somen te caberá,a recomposição do equilíbrioeconômico-financeiro da concessão nas hipóteses abaixo descritas:(...)29.2.3 ocorrência de eventos de caso fortuito ou força maior não cobertos pelos seguroscuia contratação seja obrigação da concessionária, nos termos deste contratã, observadosos limites de responsabilidade indicados na cláusula 31."

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EoulLiento ¡CoruOn¡¡Co-tlNANCEIR0 NAS PARCERIAS pÚaL¡Co-pRIVADAS 303

3l do mesmo contrato,3'qr. exonera as partes de qualquer responsabilidade pelonão cumprimento de suas obrigaçoes exclusivamente emrazã,o do evento, e facultaa revisão extraord"ináriaou extinção do contrato. Da mesma forma, foi estruturadoo contrato de concessão administrativa do Hospital Metropolitano de Belo Hori-zoîte, tendo a ocorrência de caso fortuito ou força maior o condão de exonerar as

partes no não cumprimento de suas responsabilidades, em virtude d.essas consequ-

ências, nos termos da cláusula 17.5.1.

Trata-se de estratégia interessante pata aftair possíveis investidores, além de

diminuir os custos indiretos embutidos no preço fi.nal, tendo em vista a provávelprecificação do risco caso permanecesse na esfera particular.

Outro ponto que destaca atençâo e a possibilidade de recomposiçao do equilí-brio econômico-flnanceiro por omissão ou atraso do Poder Público, especialmente,

no que tange às desapropriações, constituição de servidÕes e liberação de alvarás

que tenham impacto no resultado econÔmico da concessão.

Nesse sentido, o contrato de concessão administratwa da rede educacionalmunicipal de Belo Horizonte possibilita a recomposição aos casos supracitados,e explicita que não se limitam a estes. l\ovamente, trata-se de modelagem inte-ressánte tendo como razã,o a f.a\ta de governabilidade deste risco por parte do

particular.Ressaltamos que a negociação contratual poderá beneficiar diretamente a

Administração, diminuindo o quantum devido, tendo como fonte um efi-ciente

compartilhamento d.e riscos. Como exemplo, tem-se a previsão no contrato de

parcãria público privada do Estádio Governador Magalhães Pinto - Mineirão, de

q.r. or gãnhor decorrentes em razã,o da efrciente gestão empresarial reverterãoao poder Público, devendo ser reduzida a contrapartida nessas hipÓteses, senão

vejamos:"26.L A concessionária deverá compartilhar com o poder concedente os ga-

nhos econômicos que obtiver pela execução do contrato, sejam os decorrentes da

efrciência empresarial da concessionâría na exploração do complexo do Mineirão,sejam os d"ecorrentes d,e novos empreendimentos comerciais desenvolvidos sob sua

responsabilidade na á,rea inserida no levantamento topográfrco, anexo Xl, desde

que devidamente autorizados pelo poder concedente.

32. "31.1 A ocorrência de caso fortuito ou de força maior, cujas consequências não sejamcobertas por seguro , tem o eJeito de exonerar as pdrtes de responsabilidade pelo nao-curnpri-mento dai obrigaçoes decowentes do contrata, descurnpridrts em virtude de tais ocorrências.(grifo nosso)31.2 na ocorrència d.e caso fortuito ou força maior, cujas consequências não sejam cober-tas por segur$, a parte afetada por oneïûsidacle excessiva poderá requerer a extinção ou a

revisão extraordinária do contrato. "

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304 PnRceRrRs PúsLrco-PntvADAS

26'1.1 O compartilhamento será feito por meio da redução correspondente dovalor da remuneração imediatamente vincenda, ou, por meio de pagamento a serfeito ao poder concedente, na hipótese de não ser devido qualquervalor a título deremuneração."

Por frm, importa ressaltar que é possÍvel rediscutir as cláusulas atinentes aosriscos, mesmo depois da formaiizaçã,o do contrato, desde que haja menção expressapara tanto neste instrumento, que fixe data paru tal evento. Essa previsão permiteque o conftato seja atualízado de acordo com o contexto fático no momento darevisão, tendo em vista a possibilidade de duração de até 35 anos.

Assim, tais pontos devem ser considerados quando da alocação dos riscos, ten-do em vista o objetivo de eficiência do projeto de PPP Importa destacar, contudo,que nem sempre a alocação em princípio mais clara serâ amelhor, devendo ser essaestudada dentro da lOgica econômica do contrato, de forma a otimizar os incenti,-vos para o privado e ganhos para a Administraçã,o pública.

5. Rrcon¡posrÇÃo D0 EourLíBRIo ECONôn¡rco-nNANCETRo

Explorados nos tópicos anteriores os contornos do equilíbrio econômico-finan-ceiro nos contratos de PPP, e a possibilidade de distribuição dos riscos atinentes aocontrato de forma objetiva, resta analisarmos a relação entre o equilíbrio econômi-co-financeiro e os instrumentos de recomposição.

Decorrência lógica do exposto até então, é que será cabível a recomposição doequilíbrio econômico-financeiro nos contratos de PPPs quando houvei perturba-ção da equação econômica inicialmente pactuada, gerada por evento posterior àconcretização do contrato ou circunstâncias imprevistas, que cause agravamento auma das partes, e que não tenha sido previamente alocado a uma delas.

Desta afirmativa se extrai um dos méritos da alocação objetiva dos riscos con-tratuais: uma definição, ainda que preliminar, das hipóteses que poderão ensejarreequilíbrio de um contrato de PPP, tendo em vista que cada puri. saberát ex 6nteaqueles eventos que são de sua responsabilidade no caso de materia\ização. Istoporque, conforme debatido no capítulo anterior, a assunção do risco impofiará. naresponsabilidade em lidar com os seus efeitos, sejam positivos ou negativos, nocaso de concretizaçã,o. A exemplo, sendo o risco de construção assumião integral-mente pelo parceiro privado por disposição contratual, possíveis gastos imprevistosemrazã,o de atrasos na execuçã,o na obra não ensejará a recomposição da equaçãoeconômico-frnanceira, tendo em vista que foi a ineñciên cia d,apårr. responsável emlidar com o fato que aumentou o seu custo.

Lado outro, ocorrendo à transferência do risco da deman da, ainda que parcial-mente, ao parceiro público, na hipótese do fluxo não ser aquele contratualmenteprojetado, o parceiro privado poderá requerer a recomposição do equilíbrio, tendoem vista a forma como foi fixada a matriz de riscos.

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EOU I LÍS RIO ¡COITIOIi¿ I CO-FI NANCEIRO NAS PARCERIAS PÚ SiICO- PRI\iADAS 305

Importa ressaltar que, conforme lição de MarçalJusten Filho (Z1LZ, p. 890),não enseja a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro ausência d.e nexode causalidade entre o evento e a majoração dos encargos suportados pelo parceiroprivado. Isto porque, além da materialização o risco, é imprescindível q.,. á pertur-bação da equação econômica tenha decorrência lógica de tal evento.

Feitas tais consid"eraçÕes, passa-se a análise dos instrumentos contratuais utili-zados par a a reequilíbrio econômico-fi nanceiro.

O reajuste financeiro é instrumento apto a adequar os valores envolvidos nacontratação às variaçÕes decorrentes do processo inflacionário, que paulatinamen-te corroem o poder de compra do dinheiro. Este instrumento contratual acometeos contratos celebrados pela Administraçã,o Pública, com periodicidade mínimaanuaI, nos termos da Lei do Plano Real,33 que atend erá, ao índice e aos parâmetrospercentuais defrnidos em edital, com o intuído de refletir avariação doi custos doconcessionário ou dos preços ao consumidor.

As revisÕes, por slJa vez, têm como objeto a manutenção das condições e va-lores pactuados quando firmado o contrato, de forma que o decorrer do tempo, eo advento de fatos exteriores, imprevisÍveis ou unilaterais da Administração, nãotornem inexequÍvel o acerto.

Sobre o tema, MaurÍcio Portugal Ribeiro assevera (2011, p. ll0) que, em regra,a metodologia aplicada no sistema de revisão das parcerias público-piivadas e pãu-tada no exemplo inglês que prevê a recomposição na ocorrência d"os compensationevents e benchmarhing. O primeiro instrumento tem como finalidade ináenizar apatte que sofrer com a ocorrência de determinado fato, e que o risco de sua ma-tetialização tenha sido alocado para a outra contratante. Lado outro, segundo omesmo autor, as remarcaçÕes financeiras (benchmarhíng) ocorrem quando há alte-ração substancial no objeto do projeto que impacte a equação formada, d.evendo oacréscimo ou a supressão de determinada obrigação ser considerado para fins damargem de lucro. Aplicando ao caso brasileiro, tal ocorreria, por exemplo, com asalteraçÕes unilaterais da Administração.

Ressalta-se que o parâmetro para a recomposição d.everá ser a equação econômi-co-financeira inicialmente formulada, devendo a alocaÇão de riscos no instrumentocontratual pautar as negociaçÕes. Não ignoramos, também, que caso o objeto docontrato seja reduzido, tal deverá impactar na remuneraçåo do parceiro, que terápor seguinte um custo atrelado ao projeto reduzido, devendo, pois, ser o "ganho"repassado à AdministraÇão.

,As revisÕes podem ser periódicas, de acordo com o cronogïama estabelecidopelo contrato de parceria, ou extraordinárias, a partir d"a ocorrêrriiu d" um dos fatos

Nesse senrido determina o art. 1.", g 3.o, da Lei I0.192/2001, que dispoe sobre medidascomplementares ao Plano Real.

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3t6 Pnncrntns PúsLrco*PnrvADAs

que ensejarfta recomposição, sendo prorrocadas pelo par"ceiro pú'blico ou privadç,tendo em consid eração a distribuição de riscos predeterminada.

Importa destacar que os efeitos da revisão podem ser variados, a depender doobjeto do contrato. Por exempio, esciarecem Prado e Ribeiro (2007, p. i30-l3t)que podem resultar no pagarnento de indenização, alteraçao do servrço, plano d.einvestimento, contraprestação pública, entre outros. Tatr se dará,, contudo, confor-me previsão contratual, considerando o contexto fático da parceria, de forma amelhor atender o interesse coletivo.

6. CorusrornAçöES FtNAts

O equilÍbrio econômico-frnanceiro, tal como exposto ao longo do trabalho, éimportante princípio constitucional que beneficia não apenas o particular, mastambém rnaterializa o interesse público, entendido como interesse coletivo, bemcomo o dever de boa f,e daAdministraçã,o.

Frisa-se que não são intangíveis os fatores em si da equação econômico-fi-nanceira, mas sim seu valor de proporção, dentro da lógica de distribuição deriscos, conforme apresentamos no capÍtulo4. Com isto, ressalta-se que a equaçãoé formada também pela ideia de risco, e tendo este sido previamente alocado auma das partes, a ocorrência de sua materializaçã,o não ensejará a revisitação docontrato. Nesse sentido, a autorregulação das partes possui como alicerce legal osarts. 4.o, VI e 5.", III, não existindo qualquer vedação constitucional para tanto. Oque há como visto, é o dever de manutenção dos termos pactuados na proposta,e estando os riscos definidos neste momento, não existe qualquer ilegaiidad e emsua distribuição.

Como méritos dessa alocação, aponta-se o ganho de eficiêncía, a partir dos ín-centivos de desempenho do particular, previsibilidade da assunç ão deresponsabili-dade no caso de materializaçãto e diminuição da transferência dos custos indiretos,e consequentemente, diminuição da precifrcação. Ademais, uma coreta alocaçãode riscos, explicitará quais são as hipóteses que ensejam reequilíbrio, diminuído amargem para condutas oportunistas das partes a fim de obter vantagens indevidas.Tais benefícios são reconhecidos também pelas experiências internacionais que pri-mam pela correta alocaçã,o dos riscos nos contratos de parceria público-privada.

Por fim, será cabível a recomposição do equilÍbrio econômico-financeiro nos con-tratos de PPPs quando houver perturbação da equação econômica inicialmerúepac-tuada, desde que gerada por evento posterior à concretização do contrato, que cÃ1rseagravamento a uma das partes, e que a responsabilidade paraliðar com a ocorrënciadeste não tenha sido previamente alocada a uma delas, ou fosse imprevisível.

Neste caso, a aLocaçã,o de riscos contratuais funciona como parâmetro pata arecomposição do equilíbrio econômico-fi.nanceiro, tendo em vista que delimrta asresponsabilidades de cada parte.

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EoulLíento ËcoNoMrco-FrNANcEtR0 NAS eARCERIAS púBLtco-pRtvADAs 3O7

Desta forma, a Administração Pública, por meio do instrumento de parceriaestudado , viabllizará a implementação da utilidade pública desejada, criando am-biente estável aos investimentos por garuîtir a consecução do contrato no tempo,adequando as circunstâncias de cada ajuste à distribuição de riscos, possibilitando,assim, ganhos de economicidade.

Ante ao exposto, reafirma-se que as díretrizes implementadas pela Lei de Par-cerias Público-Privadas reforçam o dever do Estado de primar pela efrciência, nosentido de atender as necessidades dos cidadãos e garannr o efetivo cumprimentoda matriz constitucional.

A celebração de PPPs não resulta, contudo, a desoneração do Estado, a quemcaberâ, a partir da ótica da eficiência, regular, gerenciar e fiscalizar os contratos.

7. RrrrnÊrr¡crAs BtBLtocRÁFtcAS

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