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GIOVANA VECHI ESTUDOS QUÍMICOS E BIOLÓGICOS in vitro E in vivo DE DIFERENTES PARTES DE Eugenia mattosii Itajaí (SC) 2018

ESTUDOS QUÍMICOS E BIOLÓGICOS in vitro E in vivo DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovana Vechi 2018.pdf · Aos membros da banca, Prof. Dr. Rivaldo Niero, ProfaDr Priscila de Souza,

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  • GIOVANA VECHI

    ESTUDOS QUMICOS E BIOLGICOS in vitro E in vivo DE

    DIFERENTES PARTES DE Eugenia mattosii

    Itaja (SC)

    2018

  • UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS

    FARMACUTICAS

    REA DE CONCENTRAO EM PRODUTOS NATURAIS E

    SUBSTNCIAS SINTTICAS BIOATIVAS

    GIOVANA VECHI

    ESTUDOS QUMICOS E BIOLGICOS in vitro E in vivo DE

    DIFERENTES PARTES DE Eugenia mattosii

    Tese submetida Universidade do Vale do

    Itaja como parte dos requisitos para a

    obteno do grau de Doutor em Cincias

    Farmacuticas.

    Orientador: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho

    Itaja (SC)

    Maro, 2018

  • Ficha Catalogrfica

    V494e Vechi, Giovana, 1987-

    Estudos qumicos e biolgicos in vitro e in vivo de diferentes partes de Eugenia mattosii [Manuscrito] / Giovana Vechi. - Itaja, SC. 2018.

    194 f. ; il. ; tab. ; graf. ; fig.

    Bibliografias f. 173-194 (Cpia de computador (Printout(s)).

    Tese submetida Universidade do Vale do Itaja como parte dos requisitos

    para a obteno do grau de Doutor em Cincias Farmacuticas.

    Orientador: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho.

    1. Eugenia (Planta). 2. Plantas medicinais. 3. Farmacologia.

    I. Universidade do Vale do Itaja. II. Ttulo.

    CDU: 615.32

    Bibliotecria Eugenia Berlim Buzzi CRB - 14/963

  • Dedico essa conquista aos meus familiares, que nunca mediram esforos para que meus

    sonhos se tornassem realidade.

    Obrigada por estarem sempre presentes!

  • AGRADECIMENTOS

    Ao Professor Valdir Cechinel Filho, por me acompanhar nessa

    trajetria como professor e amigo, e confiar em mim em todos os

    momentos.

    Aos meus pais Jane e Juca, por sempre me apoiarem e

    incentivarem meus estudos, me deram amor e carinho e me ajudaram a

    me tornar a pessoa que sou.

    toda minha famlia e amigos pelo apoio, carinho e amor em

    tantos momentos importantes.

    Aos membros da banca, Prof. Dr. Rivaldo Niero, ProfaDr Priscila

    de Souza, Prof. Dr. Caio Maurcio Mendes de Crdova e Profa Dr. Maria

    de Lourdes Leite de Moraes.

    Aos meus colegas do laboratrio, s minhas amigas Cechinets

    (Adriana, Adrielli, Camila, Fabile e Lusa) e todas as amizades que esse

    caminho me proporcionou.

    Aos colaboradores e coordenao do Programa de Ps-

    Graduao em Cincias Farmacuticas, Prof. Dr. Clvis Antonio

    Rodrigues, Juliano dos Santos e Helenise Heyse Moreria.

    todas as pessoas que enriqueceram este trabalho com sua

    disponibilidade na realizao dos testes biolgicos in vivo e in vitro.

  • os professores (Prof. Dr Srgio Faloni de Andrade, Lusa Motta

    da Silva e Priscila de Souza), Ps-doutoranda Rita de Cssia M. V de

    A. F da Silva, e aos alunos do laboratrio de farmacologia.

    Ao prof. Dr. Luiz Carlos Klein Jr. e a Profa. Dra. Ftima de

    Campos-Buzzi e seus respectivos alunos.

    s instituies parceiras que auxiliaram nas avaliaes do

    potencial antiproliferativo (Universidade de So Paulo USP),

    antimicoplasmtico (Universidade Regional de Blumenau) e

    antiparasitria (Universidad Mayor de San Andrs, La Paz, Bolvia)

    Ao Prof. Thodoro Marcel Wagner, Pedro Pablo Perez Netto e

    Prof. Rogrio Corra pela ajuda nas tcnicas de CLAE, RMN e CG/EM,

    e ao prof. Dr. Franco Delle Monache (Roma/Itlia) pela inestimvel ajuda

    na elucidao estrutural de algumas molculas.

    s pessoas que me acompanharam e auxiliaram nos quatro

    meses de doutora-sanduche no CIPRONA (San Jos Costa Rica), em

    especial aos que acompanharam e auxiliaram meu trabalho, Lorena

    Hernandez-Gmez, Alice L. Prez, Rosaura Romero, Victor Vsquez e

    Godofredo Solano.

    s agncias de fomento: CAPES, pela concesso da minha

    bolsa e CNPq e FAPESC pelo auxlio financeiro ao laboratrio.

  • Talvez no tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para

    que o melhor fosse feito. No sou o que deveria ser, mas graas a

    Deus, no sou o que era antes

    (Marthin Luther King)

  • ESTUDOS QUMICOS E BIOLGICOS in vitro E in vivo DE

    DIFERENTES PARTES DE Eugenia mattosii Giovana Vechi

    Maro/2018

    Orientador: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho

    rea de Concentrao: Produtos naturais e substncias sintticas bioativas

    Nmero de Pginas: 194

    As plantas medicinais produzem compostos bioativos com grande potencial

    farmacolgico e teraputico sendo amplamente utilizadas na medicina

    tradicional para tratar diversas enfermidades. O gnero Eugenia apresenta

    metablitos importantes associados diversas atividades biolgicas. Tendo em

    vista os escassos dados na literatura sobre a Eugenia mattosii, conhecida como

    cambu, o objetivo deste trabalho foi avaliar a sua composio qumica, variao

    sazonal e potencial biolgico/farmacolgico. Folhas e caules passaram por

    extrao e partio com solventes de diferentes polaridades, e as respectivas

    fraes acetato de etila e clorofrmio passaram por processos cromatogrficos,

    levando ao isolamento de seis substncias: pinostrobin, cryptostrobin, fitol, cido

    urslico, avicularin e (-)-catequina. Os extratos, fraes e substncias isoladas

    foram avaliadas em relao ao seu potencial biolgico in vivo (atividade

    antinociceptiva, gastroprotetora e vasorelaxante) e in vitro (antiproliferativa,

    anticolinestersica, antiparasitria e antimicoplasmtica). O pinostrobin e

    algumas fraes de E. mattosii apresentaram promissora atividade

    antimicoplasmtica. Ambos extratos brutos e as fraes apresentaram potencial

    antinociceptivo, assim como as substncias isoladas, especialmente o avicularin.

    A avaliao da atividade gastroprotetora no apresentou resultados promissores.

    O extrato e a frao clorofrmio das folhas apresentam atividade antiproliferativa

    significativa, sendo esta influenciada pela presena de pinostrobin e

    cryptostrobin. Atividade anticolinestersica foi observada para ambos extratos e

    fraes acetato de etila. Resultados significativos foram evidenciados para os

    extratos, fraes das folhas, (-)-catequina e cryptostrobin com relao ao efeito

    vasorelaxante em animais normotensos e espontaneamente hipertensos.

    Atividade antiparasitria para leishmaniose foi demonstrada pela frao

    clorofrmio e para giardase pelo pinostrobin. Concluindo, pode-se afirmar que

    a planta avaliada tem grande potencial biolgico e mais estudos podem ser

    realizados a fim de descobrir novas atividades para folhas e caules de E. Mattosii,

    bem como a presena de outros princpios ativos produzidos em menores

    propores.

    Palavras-chave: Eugenia mattosii, fitoqumica, flavonoides, potencial

    antimicoplasmtico, atividade antinociceptiva, gastroproteo, efeito

    vasorelaxante, anticncer, ao antiparasitria, atividade anticolinestersica.

  • CHEMICAL AND BIOLOGICAL in vitro AND in vivo STUDIES

    OF DIFFERENT PARTS OF Eugenia mattosii

    Giovana Vechi

    March/2018

    Advisor: Valdir Cechinel Filho, Doctor

    Area of Concentration: Natural products and synthetic bioactive compounds

    Number of Pages: 194

    Medicinal plants produce bioactive compounds with good pharmacological and

    therapeutic potential, and for this reason they are used in traditional medicine to

    treat various diseases. The Eugenia genus presents important metabolites

    associated with several biological activities. Considering the scarce data in the

    literature on Eugenia mattosii, known as Cambui, the aim of this study was to

    evaluate its chemical composition, seasonal variation and pharmacological

    potential. Leaves and stems were extracted and partitioned with solvents of

    different polarities, and the respective ethyl acetate and chloroform fractions

    submitted to chromatographic processes, leading to the isolation of six

    compounds: pinostrobin, cryptostrobin, phytol, ursolic acid, avicularin and (-)-

    catechin. The extracts, fractions and isolated substances were evaluated for their

    biological potential in vivo (antinociceptive, gastroprotective and vasorelaxant

    activity) and in vitro (antiproliferative, anticholinesterase, antiparasitic and

    antimycoplasmic). Pinostrobin and some fractions of E. mattosii showed

    promising antimycoplasmic activity. Both extracts and fractions presented

    antinociceptive potential, as did the isolated substance avicularin. The evaluation

    of gastroprotective activity did not present promising results. The extract and

    chloroform fraction of the leaves presented significant antiproliferative activity,

    being influenced by the presence of pinostrobin and cryptostrobin.

    Anticholinesterasic activity was observed for both extracts and ethyl acetate

    fractions. Significant results were evidenced for the extracts, leaf fractions, (-)-

    catechin and cryptostrobin in relation to its vasorrelaxant effect in normotensive

    and spontaneously hypertensive animals. Antiparasitic activity for leishmaniosis

    was demonstrated for the chloroform fraction and for giardiasis by pinostrobin.

    In conclusion, it can be stated that the evaluated plant has good biological

    potential, and further studies are needed to discover new activities for the leaves

    and stems of E. Mattosii, as well as the presence of other active principles

    produced in smaller proportions.

    Keywords: E. mattosii, phytochemistry, flavonoids, antimycoplasmic potential,

    antinociceptive activity, gastroprotection, vasorelaxant effect, anticancer,

    antiparasitic action, antycholinesterasic activity.

  • LISTA DE ABREVIATURAS

    ABIFISA Associao brasileira de empresas do setor fitoterpico, suplemento

    alimentar e de promoo da sade

    ACh Acetilcolina

    AChE Acetilcolinesterase

    AINE anti-inflamatrio no-esteroidal

    AM Azul de metileno

    ANVISA - Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    ATCC - American Type Culture Collection (Coleo de tipos de cultura

    Americana)

    BPI base peak intensity (intensidade do pico base)

    CAT extrato de alcaloides padronizado de Galipea longiflora

    CC coluna cromatogrfica

    CCD cromatografia em camada delgada

    CIM concentrao inibitria mnima

    CG/EM cromatografia gasosa acoplada espectro de massas

    cGMP - Guanosina monofosfato cclica

    DA Doena de Alzheimer

    DMEM - meio de cultura Dulbeccos modified Eagles

    DMSO dimetilsulfxido

    EARP software de anlise de imagens

    EDTA - Ethylenediamine tetraacetic acid (cido etilenodiamino tetra-actico)

    EMB extrato metanlico bruto

    FAE frao acetato de etila

    FCL frao clorofrmio

    FE Fenilefrina

    FURB Universidade Regional de Blumenau

  • IASP International Association for the Study of pain (Associao Internacional

    para o Estudo da Dor)

    INCA Instituto nacional do Cncer

    i.p. via intraperitoneal

    L-NAME - N()-nitro-L-arginina metil ester

    MTT Metil-tiazolil-tetrazlio

    NIQFAR Ncleo de Investigaes Qumico-Farmacuticas

    NRT Ratos wistar normotensos

    OMS Organizao Mundial da Sade

    PPGCF Programa de Ps-Graduao em Cincias Farmacuticas

    PBS Physiological buffered saline (Tampo salina fosfato)

    PMS - Metossulfato de fenazina

    PSS Physiological saline solution (Soluo salina fisiolgica)

    RMN H ressonncia magntica nuclear de hidrognio

    RMN C ressonncia magntica nuclear de carbono

    RPMI - Meio de cultura Roswell Park Memorial Institute

    SBF Soro bovino fetal

    SHR Ratos wistar espontaneamente hipertensos

    SNC Sistema nervoso central

    SUS Sistema nico de sade

    TYI-S-33 Meio de cultura para Giardia

    UPLC - Ultra performance liquid chromatography (Cromatografia lquida de alta

    performance)

    UV ultravioleta

    v.o. Via oral

    XTT Tetrazolium Salt (Sal de tetrazlio)

  • SUMRIO

    CAPTULO I ................................................................................................... 19

    1 INTRODUO ............................................................................................. 21

    2 OBJETIVOS .................................................................................................. 23

    2.1 Objetivo Geral ............................................................................................ 23

    2.2 Objetivos Especficos .................................................................................. 23

    CAPTULO II ................................................................................................. 25

    1 PLANTA MEDICINAIS E FITOTERAPIA ............................................................... 27

    1.1 Aspectos gerais ........................................................................................... 27

    1.2 Mercado ...................................................................................................... 30

    2 ASPECTOS RELACIONADOS PLANTA EUGENIA MATTOSII ................................ 33

    2.1 A famlia Myrtaceae ................................................................................... 33

    2.2 O gnero Eugenia ....................................................................................... 33

    2.3 A espcie Eugenia mattosii ......................................................................... 39

    3 POTENCIAL BIOLGICO DE PLANTAS MEDICINAIS ............................................ 41

    3.1 Ativiadade antibaceriana ............................................................................ 41

    3.2 Atividade gastroprotetora ........................................................................... 43

    3.3 Atividade antinociceptiva ........................................................................... 45

    3.4 Atividade antiproliferativa .......................................................................... 48

    3.5 Atividade anticolinestersica ...................................................................... 50

    3.6 Atividade hipotensiva .................................................................................. 52

    3.7 Atividade antiparasitria ............................................................................ 54

    CAPTULO III ............................................................................................... 57

    1 ANLISE FITOQUMICA .................................................................................... 59

    2 IDENTIFICAO E QUANTIFICAO DE SUBSTNCIAS ISOLADAS POR UPLC-

    PDA/ESI -QTOF ................................................................................................... 69

    CAPTULO IV ................................................................................................ 71

    COMPOSIO QUMICA E ATIVIDADE ANTIMICOPLASMTICA DE

    EXTRATOS, FRAES E SUBSTNCIAS ISOLADAS DAS FOLHAS E

    CAULES DE Eugenia mattosii ............................................................................

    CAPTULO V ................................................................................................. 85

    AVALIAO DA ATIVIDADE ANTINOCICEPTIVA E

    GASTROPROTETORA DE EXTRATOS, FRAES E SUBSTNCIAS

    ISOLADAS DAS FOLHAS E CAULES DE Eugenia mattosii ..

  • CAPTULO VI ............................................................................................. 101

    ATIVIDADE ANTIPROLIFERATIVA in vitro DO EXTRATO

    METANLICO, FRAES E COMPOSTOS ISOLADOS DAS FOLHAS DE

    Eugenia mattosii ..................................................................................................

    CAPTULO VII ............................................................................................ 113

    ATIVIDADE ANTICOLINESTERSICA DO EXTRATO METANLICO,

    FRAES E SUBSTNCIAS ISOLADAS DAS FOLHAS E CAULES DE

    Eugenia mattosii ...................................................................................................

    CAPTULO VIII .......................................................................................... 133

    EFEITO VASORELAXANTE DOS EXTRATOS, FRAES E COMPOSTOS

    ISOLADOS DAS FOLHAS E CAULES DE Eugenia mattosii...........................

    CAPTULO IV ............................................................................................. 159

    ATIVIDADE ANTIPARASITRIA in vitro DE EXTRATO, FRAES E

    COMPOSTOS ISOLADOS DAS FOLHAS DE Eugenia mattosii.......................

    CAPTULO X ................................................................................................169

    CONSIDERAES FINAIS ....................................................................... ..169

    REFERNCIAS ........................................................................................... ..173

  • 19

    CAPTULO I

    Introduo e Objetivos

  • 20

  • 21

    1 INTRODUO

    O tratamento de enfermidades com o uso de plantas medicinais to

    antigo quanto a prpria humanidade e as evidncias desta utilizao vo desde

    documentos escritos at monumentos muito bem preservados. Este uso o

    resultado de anos de luta contra diferentes doenas, onde o homem aprendeu a

    buscar medicamentos em cascas, sementes, razes, frutos, folhas e flores de

    diferentes plantas (ALVES; PONTES, 2017; PETROVSKA, 2012).

    Alguns exemplos desta utilizao so o pio (Papaver somnniferum)

    e a maconha (Cannabis sativa), utilizados h mais de 4.000 anos. O estudo dos

    constituintes das plantas, no entanto, se iniciou apenas no sculo 19, quando

    vrias substncias importantes comearam a ser isoladas e estudadas, incluindo

    a morfina, codena, cafena, atropina, salicina, entre outros (CECHINEL FILHO;

    YUNES, 2016).

    Segundo Newman e Cragg (2016), a maior parte dos medicamentos

    disponveis no mercado farmacutico atualmente foram desenvolvidos a partir

    de produtos naturais. O percentual de medicamentos naturais ou derivados de

    produtos naturais muito significativo, sendo que nas reas de agentes

    neoplsicos e antimicrobianos, o percentual de 75% e 73%, respectivamente.

    A qumica medicinal moderna vem identificando e validando a ao

    de diversas plantas utilizadas em tratamentos tradicionais por meio da pesquisa

    fitoqumica e farmacolgica, e inmeros medicamentos derivados de produtos

    naturais j so utilizados na medicina convencional (CECHINEL FILHO;

    YUNES, 2016; PETROVSKA, 2012).

    O desenvolvimento destes medicamentos pode se dar por meio de

    extratos, fraes, substncias isoladas, modificaes estruturais feitas a partir de

    sua estrutura qumica ou tambm por sntese de anlogos. Os avanos da cincia

    nesta rea so grandes, porm o alto custo com as pesquisas um fator limitante.

    Por esta razo ainda existem muitas espcies que so utilizadas popularmente

  • 22

    sem respaldo cientfico quanto sua eficcia e segurana (NEWMAN; CRAGG,

    2012).

    O Brasil o pas detentor da maior biodiversidade vegetal do planeta,

    alm de possuir um vasto conhecimento popular em relao ao uso de plantas

    medicinais e ter tradio em pesquisa fitoqumica, rea em que os cientistas

    brasileiros vem publicando muitos artigos. Por outro lado, falta apoio e interesse

    de indstrias farmacuticas brasileiras em obter parcerias com universidades e

    avanar nos estudos para o desenvolvimento de novos medicamentos de origem

    vegetal (DUTRA et al., 2016; CECHINEL FILHO, 2017).

    A famlia Myrtaceae uma das mais importantes da biodiversidade

    brasileira, pois abriga grande variedade de plantas medicinais com importantes

    metablitos secundrios, como terpenos, flavonoides e taninos. O gnero

    Eugenia um dos mais importantes desta famlia e conta com espcies de alto

    potencial farmacolgico, como a E. uniflora, E. dysenterica, E. jambolana, E.

    brasiliensis, E. umbelliflora e E. fruticosa. Muitas destas espcies apresentam

    propriedades biolgicas, tais como: atividade antioxidante, diurtica,

    antimicrobiana, gastroprotetora, antiproliferativa, antinociceptiva, anti-

    inflamatria, anti-hipertensiva, antidiarreica, antidepressiva e hipoglicemiante

    (BAG et al., 2012; BASTING et al, 2014; MAGINA, 2008; PRADO et al., 2014;

    SHAMS-UD-DOHA et al, 2012, TENFEN et al., 2017, CHAREPALLI et al.,

    2016, MEYRE-SILVA et al., 2009).

    Tendo em vista o potencial fitoquimico e farmacolgico do gnero

    Eugenia, surge a hiptese de encontrar novas substncias bioativas na espcie

    Eugenia mattosii, uma planta comum da regio sul do Brasil, popularmente

    conhecida como cambu ou pitanguinha de mattos e que ainda no foi avaliada

    quanto ao seu potencial biolgico (LEGRAND, 1969; SOBRAL et al., 2009).

    Desta forma, o objetivo dopresente trabalho foi avaliar a composio

    qumica e o potencial farmacolgico de diferentes partes de Eugenia mattossii.

  • 23

    2 OBJETIVOS

    2.1 Objetivo Geral

    Isolar e identificar princpios ativos de diferentes partes de Eugenia

    mattosii, verificar a variao sazonal dos seus metablitos secundrios e avaliar

    o seu potencial biolgico.

    2.2 Objetivos Especficos

    - Preparar extratos e fraes das diferentes partes de Eugenia mattosii

    (caules e folhas) e avaliar em diferentes modelos experimentais in vivo e in vitro.

    - Selecionar as fraes mais ativas para isolamento de princpios ativos

    via mtodos de cromatografia convencionais (colunas cromatogrficas,

    cromatografia em camada delgada);

    - Identificar os princpios ativos obtidos por tcnicas espectroscpicas

    usuais (CG/EM e RMN);

    - Realizar estudos de controle de qualidade considerando a variao

    sazonal dos extratos por UPLC-PDA/ESI+ - QTOF;

    - Avaliar a atividade biolgica das substncias obtidas em diferentes

    modelos experimentais in vitro como: atividade antiproliferativa, atividade

    antibacteriana, antiparasitria e anticolinestersica;

    - Avaliar a atividade biolgica das substncias obtidas em diferentes

    modelos experimentais in vivo como: atividade antinociceptiva, efeito

    gastroprotetor e efeito vasorrelaxante;

    - Comparar o efeito biolgico dos princpios ativos obtidos com

    medicamentos usados na clnica.

  • 24

  • 25

    CAPTULO II

    Reviso Bibliogrfica

  • 26

  • 27

    1 PLANTAS MEDICINAIS E FITOTERAPIA

    1.1 ASPECTOS GERAIS

    As plantas medicinais vm sendo utilizadas como agentes teraputicos

    em muitas culturas desde a antiguidade. Evidncias histricas e arqueolgicas

    demostram a utilizao de produtos naturais na medicina tradicional de diversas

    civilizaes antigas como: China, ndia, Egito e Grcia. Os relatos mais

    consistentes so da medicina tradicional chinesa e da medicina ayurvdica, que

    at os dias atuais guiam muitas pesquisas cientficas (ALVES; PONTES, 2017;

    BRUSOTTI et al., 2014).

    Segundo a OMS, cerca de 65-80% da populao mundial utiliza plantas

    medicinais como primeiro recurso teraputico no tratamento de doenas. Essa

    utilizao se d principalmente porque as plantas apresentam efeitos benficos

    para o tratamento de diversas doenas e na maior parte das vezes possuem poucos

    efeitos colaterais e baixo custo (MAZZARI; PRIETO, 2014; RAHMAN;

    SINGHAL, 2002). No Brasil, a realidade semelhante, uma vez que 66% dos

    brasileiros no tem acesso aos medicamentos tradicionais (TROJAN-

    RODRIGUES et al., 2012).

    No Brasil, o uso de plantas medicinais iniciou-se na poca dos ndios, e

    logo em seguida houve a insero dos conhecimentos dos negros e europeus

    (principalmente portugueses) na medicina popular brasileira. A fitoterapia se

    fazia muito importante naquela poca porque nas reas rurais do pas, os mdicos

    eram escassos. O conhecimento tradicional dessas culturas ainda hoje de grande

    importncia para a etnofarmacologia, guiando os primeiros passos de muitas

    pesquisas na rea das plantas medicinais (ALVES, 2013; NEWMANN;

    CRAGG, 2012).

    As plantas possuem uma vasta diversidade de molculas qumicas, uma

    vez que produzem metablitos secundrios importantes para sua prpria

  • 28

    sobrevivncia. Estes metablitos possuem uma infinita diversidade de estruturas

    qumicas e so os responsveis por grande parte das atividades biolgicas

    descobertas e j descritas para as plantas medicinais. Estima-se que j foram

    identificados aproximadamente 120 mil compostos naturais provenientes de

    plantas de todo o mundo (CECHINEL FILHO; YUNES, 2016).

    As plantas so capazes de desenvolver estratgias de proteo contra

    diferentes fatores estressantes. Como mecanismos de defesa, desenvolvem

    barreiras fsicas (produzem espinhos e pelos glandulares, por exemplo), e

    barreiras qumicas, como os metabolitos secundrios. Estes compostos atuam na

    defesa contra predadores e agentes patognicos, inibindo o crescimento e

    desenvolvimento de insetos, aumentando a atrao de polinizadores, resistncia

    a vrus, proteo contra a radiao e como agentes antioxidantes. Os metablitos

    secundrios variam qualitativamente e quantitativamente entre diferentes pocas

    do ano (MASA et al., 2016).

    Estes compostos qumicos servem para o desenvolvimento de

    medicamentos, pois assim como atuam na defesa das plantas, podem atuar na

    defesa dos seres vivos. Atualmente 44% dos medicamentos disponveis no

    mercado so provenientes de produtos naturais ou derivados dos mesmos, e este

    nmero tende a crescer ainda mais. A cincia tm ajudado a comprovar a eficcia

    do uso tradicional de muitas plantas e estruturado sua utilizao de forma segura

    para a populao. Atenta a este fato, a indstria farmacutica mundial vem

    percebendo essa demanda e inserindo no mercado novos medicamentos

    derivados de produtos naturais (NEWMANN; CRAGG, 2016; CRAGG;

    NEWMANN, 2013).

    Na busca por novos fitoterpicos, a pesquisa etnofarmacolgica uma

    pea fundamental, que visa conhecer o uso tradicional das plantas para guiar a

    anlise fitoqumica e biolgica inicial. Seguindo esta primeira etapa, a anlise

    fitoqumica busca conhecer os constituintes qumicos da espcie e isolar as

  • 29

    substncias presentes para o segundo passo, que a pesquisa farmacolgica.

    Nesta etapa testam-se extratos, fraes e substncias puras em diferentes

    modelos experimentais, com a utilizao de animais e/ou testes in vitro

    (BRUSOTTI, 2014; MALHEIROS et al., 2010; CECHINEL FILHO, 2017).

    Durante a pesquisa preciso tambm levar em considerao as

    variaes temporais e espaciais do contedo total de metablitos secundrios

    produzidos pelas plantas nas diferentes horas do dia, pocas do ano ou nveis de

    maturao. Apesar de serem as mesmas geneticamente, a expresso gnica pode

    sofrer modificaes resultantes da interao de processos bioqumicos,

    fisiolgicos, ecolgicos e evolutivos (GOBBO-NETO; LOPES, 2007).

    Alguns pases ao redor do mundo so classificados como

    megabiodiversos, por apresentarem uma vasta diversidade de biomas e

    consequentemente grandes possibilidades na busca por novos compostos

    bioativos. O Brasil est na lista dos 15 pases com maior biodiversidade do

    mundo, e esta lista tambm inclui: China, ndia, Costa Rica, Indonsia, Congo,

    Equador, Madagascar, Panam, Peru, Colmbia, Equador, Malsia, Mxico e

    Austrlia (ALVES; PONTES, 2017).

    Vale ressaltar que das cerca de 250.000 espcies existentes no mundo,

    apenas 5-15% j foram estudadas, e mesmo assim no em sua plenitude. Esse

    nmero mostra a infinidade de metablitos secundrios e estruturas qumicas que

    podem ajudar na descoberta de novos compostos com poucos ou nenhum efeito

    colateral para o tratamento de muitas doenas que hoje em dia so denominadas

    focos de estudo: cncer, doenas cardiovasculares, doenas do sistema nervoso

    central, doenas anti-inflamatrias e infecciosas (WAGNER, 2016, JTTE et al.,

    2017).

    Dentre os biomas brasileiros a mata atlntica vem se destacando por ser

    considerada um dos hotspots da biodiversidade mundial. Ela apresenta grande

    riqueza de espcies vegetais, apesar de toda a devastao sofrida ao longo dos

  • 30

    anos por parte da humanidade (BOLZANI; FLAUSINO-JUNIOR; VALLI,

    2016). Dentro deste bioma, a famlia Myrtaceae uma importante representante

    de espcies com caractersticas qumicas promissoras e potencial biolgico j

    comprovados. Esta famlia abriga o gnero Eugenia, objeto de estudo da presente

    pesquisa.

    1.2 MERCADO DOS FITOTERPICOS

    Os medicamentos fitoterpicos representam uma poro significativa do

    mercado mundial de medicamentos, com crescimento nas vendas de 15% ao ano

    contra 4% do setor de frmacos sintticos (RODRIGUES, 2016). No Brasil, esse

    mercado comeou a se expandir recentemente e movimenta cerca de 500 milhes

    de dlares por ano, segundo estimativas da Associao Brasileira da Indstria de

    Fitoterpicos (ABIFISA) (ABIFISA, 2017).

    O mercado mundial de medicamentos fitoterpicos movimenta mais

    dinheiro em pases desenvolvidos, principalmente os da Europa (50% somente

    na Alemanha), fato interessante, pois estes pases detm pouca biodiversidade.

    Em contrapartida, a Amrica Latina, com sete pases considerados

    megabiodiversos (Brasil, Colmbia, Costa Rica, Equador, Mxico, Panam e

    Peru) representam apenas 5% desse mercado (ALVES, 2013).

    Alm da questo financeira, os pases desenvolvidos tambm

    pesquisam mais na rea de fitoterpicos. Um estudo recente demonstra a forte

    ligao entre publicaes na rea de produtos naturais com o ndice de

    Desenvlvimento Humano (IDH). Dentre os pases com maior ndice, se destacam

    tambm queles que mais publicam nesta rea, e so justamente os pases menos

    megabiodiversos (pases europeus e da amrica do norte), com mais de 50% das

    publicaes. Dentre os que possuem megabiodiversidade, o Brasil o terceiro

    que mais publica artigos relacionados produtos naturais, depois de China e

    ndia (ALVES; PONTES, 2017).

  • 31

    No Brasil, dos mais de 10.000 artigos sobre plantas medicinais

    publicados por cientistas brasileiros entre 2011 e 2013 e da grande

    biodiversidade brasileira (o pas detm 20-22% do total de espcies de plantas

    medicinais existentes no mundo), apenas um medicamento fitoterpico

    legitimamente brasileiro encontrado atualmente como um dos 20 fitoterpicos

    mais vendidos nas farmcias brasileiras, o Acheflan, antiinflamatrio de uso

    tpico (DUTRA et al., 2016).

    Alm disto, o mercado brasileiro de fitoterpicos movimenta cerca de

    261 milhes de dlares, o que representa 5% do mercado total de medicamentos.

    Pode-se concluir que ainda h muito trabalho a ser desenvolvido entre academia

    e as indstrias farmacuticas para que novos medicamentos fitoterpicos

    cheguem ao mercado (DUTRA et al., 2016).

    Segundo dados recentes, existem 332 medicamentos registrados a

    base de produtos naturais e 27 combinados, totalizando 359 registros no Brasil.

    Destes, 145 devem ser vendidos com prescrio mdica, um deles com reteno

    da receita. Considerando a vasta biodiversidade brasileira e o potencial para

    produo de fitoterpicos, poucos so os produtos disponveis no mercado

    atualmente (CARVALHO et al, 2017).

    No entanto, o sistema mdico no pas ainda prioriza o tratamento

    convencional, apesar da grande fonte de recursos naturais disponveis na rica

    biodiversidade brasileira. O governo brasileiro vem tentando ampliar as opes

    teraputicas ofertadas pelo Sistema nico de sade (SUS), incluindo o tratamento

    com plantas medicinais. Em 2006 foi ento criada a Poltica Nacional de Plantas

    Medicinais e Fitoterpicos, em vigor at os dias de hoje (FIGUEIREDO;

    GURGEL; GURGEL JR., 2014).

    Entre 2013 e 2015, o Ministrio da Sade registrou um aumento de

    161% na procura pelos medicamentos fitoterpicos no SUS. Talvez esta

    expressiva mudana seja decorrente de outras aes governamentais que

  • 32

    impulsionaram a prescrio por parte dos profissionais da sade, como

    lanamento do Memento Fitoterpico em 2016, importante documento que guia

    a prescrio de espcies vegetais (CECHINEL FILHO, 2017).

    Alm desta ao, em 2016 ainda foi lanada a Poltica e Programa

    Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterpicos, que tem como objetivo garantir

    o uso seguro, racional e sustentvel das plantas medicinais, alm de desenvolver

    uma cadeia produtiva e a indstria nacional de fitoterpicos (CECHINEL

    FILHO, 2017).

  • 33

    2. ASPECTOS RELACIONADOS PLANTA EM ESTUDO

    2.2 A FAMLIA Myrtaceae

    A famlia Myrtaceae uma das mais importantes da biodiversidade

    brasileira, compreendendo cerca de 100 gneros e 3.500 espcies de rvores e

    arbustos. Ela est distribuda por todos os continentes, nas regies tropicais e

    subtropicais e no Brasil ela pode encontrada predominantemente no sul.

    (GRESSLER; PIZO; MORELLATO, 2006).

    Wilson e colaboradores (2005) classificaram esta famlia em duas

    subfamlias, Myrtoideae e Psiloxyloideae e 17 tribos. No Brasil so encontradas

    somente espcies da subfamlia Myrtoideae, de apenas uma tribo, Myrteae, que

    por sua vez se divide em trs subtribos Eugeniinae, Myrciinae e Myrtinae. Os

    gneros mais importantes (que possuem mais de 100 espcies), so Eugenia,

    Myrcia e Calyptranthes.

    As mirtceas, como so chamadas no Brasil, abrigam numerosas

    espcies medicinais e frutferas bastante conhecidas e comercializadas, como a

    Psidium guajava L (goiabeira), a Myrciaria cauliflora Berg (jabuticabeira) e a

    Eugenia uniflora L. (pitangueira), e por essa razo elas so economicamente

    muito importantes. O gnero mais importante das mirtceas o gnero Eugenia,

    com 1.200-1800 espcies (tambm conhecido como gnero Syzygium)

    (BRIGGS; JOHNSON, 1979; MCVAUGH, 1968; GRESSLER; PIZO;

    MORELLATO, 2006).

    2.3 O GNERO Eugenia

    O gnero Eugenia um dos mais importantes da sua famlia, possuindo

    350 a 400 espcies nativas no Brasil, muito utilizadas na medicina tradicional

    para tratar inmeras enfermidades. O seu potencial biolgico vem sendo muito

  • 34

    estudado e as pesquisas tm mostrado um grande nmero de resultados positivos

    (MAGINA et al., 2009; QUEIROZ et al, 2015).

    As plantas do gnero Eugenia apresentam rvores ou arbustos verdes

    durante o ano todo. Seu fruto esfrico e geralmente comestvel, constitudo de

    uma baga de at 3 centmetros de dimetro, coroado pelo clice e achatado nas

    extremidades (AURICCHIO; BACCHI, 2003).

    As espcies deste gnero so amplamente estudadas por apresentarem

    grande potencial farmacolgico e importantes metablitos secundrios. A

    espcie E. uniflora, conhecida popularmente como pitangueira, a planta mais

    estudada, e tem aplicao diurtica, antifngica, antimicrobiana, antidiabtica,

    antirreumtica, gastroprotetora, entre outros (ALMEIDA; FARIA; SANTOS et

    al., 2011).

    Alm da pitanga, podem ser citadas muitas outras como a Eugenia

    dysenterica (Cagaita), utilizada no tratamento de diarreia e lcera (DUARTE et

    al., 2010; PRADO et al., 2014); Eugenia pyriformis (Uvaia), com propriedades

    antimicrobianas (CHAVASCO et al., 2014; STIEVEN; MOREIRA; SILVA,

    2009); Eugenia jambolana (Jamelo ou Joo-bolo), com potencial

    gastroprotetor, antiproliferativo, antidiabtico e antimicrobiano

    (CHATUVERDI et al., 2007; BAG et al., 2012; CHAREPALLI et al., 2016);

    Eugenia brasiliensis (Grumixama), utilizada como agente antimicrobiano e

    antiproliferativo, alm de ser usada tratamento de diarreia e reumatismo

    (COLLA et al., 2012; MAGINA et al., 2009; MAGINA et al., 2012; TEIXEIRA

    et al., 2017), a Eugenia umbelliflora (Baguau), com propriedade

    gastroprotetora, antimicrobiana, antileishmanicida (CECHINEL et al., 2013;

    FAQUETTI et al., 2015; MAGINA et al., 2009; MEYRE-SILVA et al., 2009) e

    a Eugenia euosma, (conhecida como Guamirim ou Murta), com potencial de

    inibio da adipognese, sendo um aliado para o tratamento da obesidade

    (OIKAWA et al., 2016).

  • 35

    2.3.1 Composio qumica

    Dados sobre o perfil qumico das espcies de Eugenia demonstram uma

    composio qumica bastante ampla, que varia de acordo com o estgio de

    desenvolvimento e principalmente em funo das variaes climticas

    (QUEIROZ et al., 2015).

    Muitos compostos j foram isolados de espcies de Eugenia, dentre

    eles: compostos fenlicos (olivetol), flavonoides (keampferol, quercetina,

    isoquercetina, quercitrina, rutina, myricitrina, myricitina, catequina,

    epicatequina) antocianinas, taninos (cido elgico, acido glico, metill gallato,

    casuarinina), triterpenos (cido betulnico, betulina, -amirina, -amirina, cido

    urslico, cido oleanlico, nilocitina, cido maslnico) e esterides (-sitosterol,

    stigmasterol) (TENFEN et al., 2018).

    As classes de compostos mais importantes do gnero Eugenia so os

    terpenoides e os flavonoides. Os flavonoides so compostos facilmente

    encontrados em diversas espcies de Eugenia, sendo os mais conhecidos a

    quercetina, mirecetina, canferol e as catequinas (QUEIROZ et al., 2015).

    Os metablitos fenlicos so vastos na natureza, sendo abundantes em

    frutas, vegetais e algumas plantas medicinais. A ingesto de algumas classes

    especficas destas substncias na dieta (flavonis, antocianinas,

    proantocianidinas, flavonas, flavanonas e catequinas) est fortemente

    relacionada preveno de doenas cardiovasculares, que atualmente so a

    principal causa de morte nos pases desenvolvidos (WANG et al., 2014).

    Os mecanismos pelos quais este compostos atuam como

    cardioprotetores esto relacionados ao seu efeito antioxidante, vasodilatador e

    atividade anti-inflamatria. Estas atividades relatadas tambm so relacionadas

    preveno de doenas neurodegenerativas e cncer, pois ambas doenas tem

    suas respectivas patogneses ligadas ao estresse oxidativo (MUSCHIETTI,

    MARTINO, 2016; WANG et al., 2014).

  • 36

    Os flavonoides so produtos de origem biossinttica mista, sintetizados

    atravs da via do cido chiqumico (ou chiquimato) e tambm do acetato (acetil

    coenzima A). A via do cido chiqumico origina o cido cinmico e seus

    derivados (cidos cafeico, ferlico, sinpico, etc.). A via do acetato origina um

    tricetdeo, que pode ser condensado com algum derivado de cido cinmico,

    gerando uma chalcona com 15 tomos de carbono, que o precursor inicial de

    toda a classe dos flavonoides (DEWIK, 2002).

    Os terpenides so considerados a maior classe de metablitos

    secundrios, com 30.000 compostos j descritos. A classe dos triterpenos a

    mais importante deste grupo de substncias, e apresenta grande atividade

    biolgica, principalmente anti-inflamatria, antitumoral e analgsica (NIERO,

    MALHEIROS, 2016; SULTANA, 2017).

    Os triterpenos do tipo pentacclico so os mais encontrados na literatura

    para este gnero, em especial os com esqueleto do tipo lupano e oleanano, como

    a betulina, -amirina e -amirina (MAGINA et al, 2012). Alguns exemplos de

    triterpenos encontrados em espcies j estudadas so: cido barbinrvico, isolado

    das folhas da E. punicifolia (LEITE et al., 2014), o taraxerol, -amirina, -

    amirina, betulina e cido betulnico, isolados das folhas da E. umbelliflora

    (MEYRE-SILVA et al., 2009) e os cidos triterpnicos isolados da E. moraviana,

    o cido betulnico, -hidroxibetulnico e o cido platnico (LUNARDI et al.,

    2001).

    Em um trabalho de reviso sobre o gnero Eugenia, Tenfen e

    colaboradores (2018) descrevem algumas estruturas qumicas j isoladas de

    espcies deste gnero. As figuras a seguir demonstram exemplos de compostos

    fenlicos (Figura 1) e terpenoides j descritos na literatura para este gnero

    (Figura 2).

    https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81cido_xiqu%C3%ADmicohttps://pt.wikipedia.org/wiki/Xiquimatohttps://pt.wikipedia.org/wiki/Acetatohttps://pt.wikipedia.org/wiki/Acetil_coenzima_Ahttps://pt.wikipedia.org/wiki/Acetil_coenzima_Ahttps://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81cido_cin%C3%A2mico

  • 37

    Figura 1. Compostos fenlicos isolados de espcies de Eugenia.

  • 38

    Figura 2. Terpenoides isolados de espcies de Eugenia

  • 39

    Novos compostos isolados do gnero Eugenia tem sido descritos

    constantemente na literatura, como os eugenial C, isolado da E. umbelliflora

    (FAQUETTI et al., 2015) e o triterpeno indito 24,25-epoxi-28-

    hidroxicicloartan-3-ona, isolado da E. involucrata (VECHI, 2015).

    2.4 A ESPCIE Eugenia mattosii

    A espcie E. mattosii D. Legrand (Figura 3) foi descoberta perto da

    dcada de 1950 pelo engenheiro agrnomo Joo Rodrigues de Mattos, nos

    arredores de Blumenau (SC), e por essa razo foi classificada pelo botnico

    uruguaio Diego Legrand com este nome, em homenagem Mattos. conhecida

    popularmente como Cambu ou Pitanguinha de mattos e encontra-se em risco de

    extino (LEGRAND, 1969; SOBRAL et al., 2009)

    Os frutos de E. mattosii, j foram estudados previamente por nosso

    grupo de pesquisa, tendo sido demonstrado por CCD a presena de compostos

    fenlicos, terpenos e esteroides. Avaliou-se tambm o potencial antinociceptivo

    e gastroprotetor do extrato metanlico bruto do fruto inteiro. No teste de dor

    induzida por cido actico em camundongos (dose de 10 mg/kg de peso), o

    extrato apresentou um percentual mdio de 43% de inibio das contores

    abdominais, demonstrando efeito antinociceptivo. Na avaliao do potencial

    gastroprotetor, houve diminuio da rea lesada do estmago de camundongos

    submetidos aos modelos de lcera por etanol e indometacina na dose de 250

    mg/kg de peso (NESELLO, 2015; DOS SANTOS et al., 2018).

    Quanto ao aspecto fitoquimico, Apel e colaboradores (2005),

    verificaram por meio de cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de

    massas (CG/EM) a presena de 21 compostos no leo voltil das folhas de E.

    mattosii, identificados atravs do espectro de massas como sesquiterpenos

    oxigenados (17,6%) e hidrocarbonetos sesquiterpenos (78,8%), representando

    96,4% da composio do leo.

  • 40

    Figura 3. Foto ilustrativa das partes areas de E. mattosii (A) e no local de coleta

    da planta (B).

    Fonte: o autor

    A

    A

    B

  • 41

    3 POTENCIAL BIOLGICO DE PLANTAS MEDICINAIS

    As plantas medicinais representam uma inesgotvel fonte de

    substncias qumicas para a pesquisa e descoberta de novos compostos com

    potencial farmacolgico para a preveno e tratamento de diversas doenas

    (CECHINEL FILHO, 2017; CRAGG; NEWMANN, 2013).

    De acordo com estas informaes, imprescindvel que se realize um

    estudo qumico e farmacolgico abrangente quando se inicia um trabalho com

    uma planta potencialmente medicinal que ainda no foi estudada em relao s

    suas caractersticas qumicas. Desta forma, neste trabalho, objetivamos realizar

    uma triagembiolgica amplo para conhecer melhor o potencial farmacolgico da

    planta em questo.

    Foram selecionadas algumas atividades biolgicas especficas in vitro

    e in vivo para avaliar a planta escolhida, E. mattosii. Sobres estas respectivas

    atividades, uma breve descrio foi preparada, conforme descrito abaixo:

    3.1 Atividade antibacteriana

    As mudanas que a globalizao trouxe para a sociedade atual tm

    aumentado o nmero de casos de doenas infecciosas na populao. Entre essas

    mudanas podemos citar as imigraes, alteraes do ambiente, aumento da

    populao, sedentarismo e m-alimentao, alm do consumo indiscriminado de

    agentes antimicrobianos. Estes fatores somados falta de novos antibiticos

    disponveis no mercado vem gerando um grave problema de sade pblica: a

    resistncia antimicrobiana (GOLDSTEIN et al., 2012; AGUIAR et al., 2012).

    Este um problema bastante complexo e tem causas variadas, mas o

    fato que ao longo dos anos, as bactrias desenvolveram mecanismos capazes

    de diminuir ou mesmo inativar a ao dos frmacos. As cepas podem adquirir

    resistncia por meio de mutaes genticas, produo de enzimas, alterao dos

  • 42

    stios receptores impedindo a absoro do frmaco ou, ainda, podem sintetizar

    protenas que inibem a ao dos antibiticos. Na maioria das vezes, esta

    resistncia ocorre quando o tratamento no seguido de forma adequada como,

    por exemplo, no uso de subdoses, durao prolongada ou insuficiente dos

    medicamentos (TANWAR et al., 2017).

    Os antimicrobianos utilizados na prtica clnica mdica e veterinria

    tambm representam um grande risco ambiental, se no forem utilizados com

    precauo ou descartados de maneira correta. Vrias substncias existentes nos

    frmacos so resistentes ao processo de tratamento, permanecendo no meio

    ambiente por longos perodos, acarretando srios riscos socioeconmicos e

    ambientais. Muitos antibiticos acabam por selecionar os microorganismos mais

    resistentes, ocasionando uma futura resistncia este medicamento quando

    utilizado por pessoas que foram expostas alimentos ou gua contaminada por

    antibiticos, por exemplo (BALBINO; BALBINO, 2012).

    Algumas bactrias, chamadas molicutes ou micoplasmas, no possuem

    parede celular e por esta razo so mais propensos a no responder ao tratamento

    com antibiticos convencionais, pois a maioria deles atua justamente sobre a

    parede celular. Estas bactrias, consideradas os menores microrganismos

    capazes de autorreplicao, so responsveis por diversas doenas em seres

    humanos (algumas doenas sexualmente transmissveis), mas tambm em

    animais e plantas. Em humanos j foram descritas cerca de 17 espcies, sendo

    que cinco delas so patognicas (ZANETTI, 2015; BENFATTI et al., 2010).

    Somando-se todos estes fatores, se faz necessria a busca por novas

    terapias que possam servir de tratamento contra os molicutes. Levando em

    considerao que a maioria dos medicamentos utilizados no controle de

    infeces derivada de produtos naturais, a pesquisa com plantas medicinais

    representa uma estratgia para a obteno de novos compostos que possam ter

    ao antimolicute (NEWMAN; CRAGG, 2012).

  • 43

    Muitas plantas vem sendo estudadas nesse sentido, e compostos como

    cumarinas, flavonoides, taninos, alcaloides e terpenides tem sido considerados

    substncias chaves para resultados positivos na atividade antimicrobiana

    (SILVA; FERNANDES JNIOR, 2010).

    O gnero Eugenia foi recentemente estudado quanto sua atividade

    antimolicute. As espcies E. beaurepaireana, E. brasiliensis, E. umbelliflora

    foram avaliadas por Benfatti e colaboradores (2010), que observaram uma

    atividade antimolicute interessante para a primeira espcie descrita. No caso da

    E. platysema, cujas folhas so ricas em compostos fenlicos, o extrato

    hidroalcolico e as fraes apresentaram resultados promissores, sendo o a

    frao de diclorometano a mais ativa (125 g.mL-1) frente a algumas cepas

    testadas (TENFEN et al., 2016). O leo essencial das folhas de E. hiemalis,

    demonstrou bons resultados frente s cepas avaliadas por Zatelli e colaboradores

    (2016).

    3.2 Atividade gastroprotetora

    A gastrite e a lcera pptica so ocasionadas por modificaes na funo

    celular e estrutura tecidual, gerando um desequilbrio entre os fatores de proteo

    da mucosa gstrica (muco, fluxo sanguneo, mecanismo antioxidante) e os

    fatores agressores (cido clordrico, espcies reativas de oxignio), que podem

    gerar leses na parede do estmago (PRABHU; SHIVANI, 2014; NAJIM, 2011).

    Diversos fatores esto relacionados estas doenas, podendo ser

    internos: gentica, patologias infecciosas e/ou patologias granulomatosas

    associadas a doenas crnicas ou externos: qualidade de vida, estresse, consumo

    de lcool, cafena, drogas e medicamentos comos anti-inflamatrios no

    esteroidais e/ou a infeco pela bactria Helicobacter pylori

    (MALFERTHEINER; CHAN; McCOLL, 2009; PRABHU; SHIVANI, 2014).

  • 44

    O tecido gstrico possui mecanismos de defesa prprios: a

    reconstituio do epitlio, produo de suco gstrico, barreira de muco e

    bicarbonato, secreo de protenas de choque trmico, alm da perfuso

    adequada de sangue no trato gastrintestinal (NAJIM, 2011; TULASSAY;

    HERSZENYI, 2010).

    Os sintomas dos pacientes com lcera e gastrite so dor epigstrica,

    sintomas disppticos (plenitude), distenso abdominal, saciedade precoce,

    nuseas e dispepsia (HIRUMA-LIMA et al., 2009).

    Os frmacos mais utilizados no tratamento da lcera gstrica atuam

    inibindo a secreo cida gstrica, como a cimetidina e a ranitidina (que so

    frmacos antagonisstas do receptor H2 da histamina), ou inibindo a bomba de

    prtons (como o omeprazol e esomeprazol). Apesar de efetivos, estes

    medicamentos apresentam baixa qualidade na cicatrizao da leso ulcerativa e

    recidivas constantes da doena, com necessidade do prolongamento do

    tratamento (ARAKAWA et al., 2012; KANGWAN et al., 2014).

    O uso prolongado dos medicamentos anti-secretores tambm provoca

    uma srie de efeitos adversos, como ginecomastia, cefaleia, dor abdominal,

    diarria, vmito, fraturas osteoporticas (devido baixa calcificao ssea) e no

    osteoportica (originada de trauma), alm de hipergastrinemia, que em casos

    mais acentuados pode contribuir para o desenvolvimento de neoplasia gstrica

    (MOULI; AHUJA, 2011).

    Neste sentido, imprescindvel investigar alternativas farmacolgicas

    capazes de promover a preveno e a cicatrizao de lceras, com ausncia ou

    reduo de efeitos colaterais, e as plantas medicinais so uma alternativa

    interessante. Alguns metablitos secundrios produzidos pelas plantas, como

    alguns flavonoides, terpenos e alcalides, so capazes de proteger o estmago e

    at de tratar leses j instaladas (KLEIN-JNIOR et al., 2012).

  • 45

    Muitas plantas medicinais estudadas por nosso grupo de pesquisa j

    apresentaram potencial gastroprotetor: Achyrocline satureoides, Polygala

    cyparissias, Rubus imperialis, Maytenus robusta, Brassica oleracea, Baccharis

    dracunculifolia. No mercado farmacutico tambm existem fitoterpicos para o

    tratamento da lcera gstrica, como o caso de cpsulas de Maytenus ilicifolia,

    que comercializada por diversos laboratrios (SOMENSI, 2015).

    Dentre os metablitos que mais se destacam por seu potencial

    antioxidante, anti-inflamatrio e consequentemente gastroprotetor esto os

    flavonoides, compostos bastante encontrados nas plantas do gnero Eugenia

    (MAGINA et al., 2010). Algumas espcies j estudadas demostraram atividade

    gastroprotetora: E. jambolana (DONATINI et al., 2009), E. umbelliflora

    (MEYRE-SILVA et al., 2009), E. punicifolia (BASTING et al., 2014).

    3.3 Atividade antinociceptiva

    Nocicepo ou algesia o termo mdico para a recepo de estmulos

    aversivos, transmisso, modulao e percepo de estmulos agressivos, que so

    interpretados e transmitidos pelo sistema nervoso perifrico at o sistema

    nervoso central onde interpretado como dor (KLAUMANN; WOUK; SILLAS,

    2008; OMS, 2012).

    A dor caracterizada por experincias sensoriais e emocionais, e pode

    ser crnica, quando perdura por um longo tempo ou aguda, quando acaba em um

    curto espao de tempo. O conjunto das percepes de dor que o ser humano

    capaz de distinguir pode ser induzida em um receptor de trs formas especficas.

    A primeira forma a mecnica (capaz de excitar um mecanorreceptor); a segunda

    a do tipo trmica (capaz de excitar um termorreceptor) e a terceira a do tipo

    qumica (que afeta quimioceptores) (KLAUMANN; WOUK; SILLAS, 2008).

    Sentir dor, apesar de representar uma sensao desagradvel, um

    processo fisiolgico muito importante para o ser humano. Esta sensao permite

  • 46

    que o indivduo tenha conscincia de que algo est ameaando o bom

    funcionamento do seu organismo e muitas vezes ela o nico sintoma para o

    diagnstico de vrias doenas. A IASP (International Association for the Study

    of Pain) descreve a dor como uma experincia sensorial e emocional

    desagradvel que est associada com leses reais ou potenciais (OMS, 2012).

    Um estudo epidemiolgico realizado pela SBED (Sociedade Brasileira

    para estudo da dor) com 919 pessoas das cinco regies do Brasil, demonstrou

    que 42% relataram algum tipo de dor e 37% disseram conviver com dor h pelo

    menos seis meses. A pesquisa revelou que a dor acomete mais mulheres que

    homens e demonstrou algumas diferenas entre as regies. A maior incidncia

    (42%) no Sul, seguido do Sudeste (38%) (SOUZA et al., 2016).

    A dor crnica no um problema somente no Brasil, j que 20 a 40%

    da populao mundial em algum momento da vida acometido por ela, que causa

    sofrimento, inaptido ao trabalho, problemas psicossociais e prejuzos

    econmicos (SBED, 2016).

    A OMS recomenda que para o tratamento da dor, seja seguido um

    protocolo chamado Escala Analgsica. O primeiro degrau recomenda o uso de

    medicamentos analgsicos simples e anti-inflamatrios para dores fracas. O

    segundo degrau sugere opioides fracos, que podem ser associados aos

    analgsicos simples ou anti-inflamatrios do primeiro degrau, para dores

    moderadas. O terceiro degrau consta de opioides fortes, associados ou no aos

    analgsicos simples ou anti-inflamatrios, para dores fortes (OMS, 2012).

    Todos os medicamentos descritos nesta escala, at mesmo os do

    primeiro degrau podem causar efeitos adversos indesejveis aos pacientes com o

    uso contnuo. Estes efeitos incluem nuseas, dor de cabea, vmitos, gastrites e

    lceras. J os opioides podem tambm causar dependncia e crises de abstinncia

    (POLSKI et al., 2014).

  • 47

    Considerando que a dor um problema de sade pblica e que o

    tratamento convencional provoca muitos efeitos colaterais, se faz necessria a

    busca por novos medicamentos, menos agressivos. Nesse sentido, a busca por

    compostos derivados de plantas medicinais se faz justificvel e imprescindvel

    para a sade mundial (BAHMANI et al., 2014).

    Ao longo da histria o homem tem buscado as plantas medicinais para

    o tratamento da dor. Alguns exemplos comuns so: a morfina, isolada da Papaver

    somniferum; a Cannabis sativa, conhecida popularmente no Brasil como

    maconha; a capsaicina, substncia isolada de vrias espcies de Capsicum, as

    populares pimentas vermelhas, amplamente utilizadas na culinria (ALMEIDA;

    NAVARRO; BARBOSA-FILHO, 2001; CALIXTO et al., 2000).

    A descoberta mais importante neste sentido foi a da salicina, isolada de

    espcies de Salix alba por Rafaele Piria em 1832. Aps muitas modificaes

    estruturais foi sintetizado o cido acetilsaliclico, com propriedades analgsicas

    e antipirticas, dando origem famosa Aspirina, lanamento que foi

    acompanhado pelo surgimento de uma gigante indstria farmacutica na

    Alemanha, a Bayer (DUTRA et al., 2016).

    O Ncleo de investigaes Qumico-Farmacuticas da UNIVALI

    (NIQFAR), trabalha h 20 anos com plantas medicinais, e j demosntrou

    atividade antinociceptiva para diversas plantas da flora catarinense, como a

    Aleurites moluccana (nogueira-da-ndia), Chrysophyllum cainito (abiu-roxo),

    Cipura paludosa (alho do mato), Garcinia achaicharu (bacupari), Ipomoea pes-

    capae (p-de-cabra), Lichi chinensis (lichia), Marrubium vulgare (maromba),

    Phyllanthus niruri (quebra-pedra), Plinia glomerata (cabeludinha), Polygala

    cyparissias (avenca da praia), Rubus imperialis (amora-branca), Wedelia

    paludosa (vedlia), Eugenia involucrata (cerejinha do mato), Campomanesia

    reitziana (gabiroba) e Myrcianthes pungens (guabiju) (CECHINEL FILHO,

    2017).

  • 48

    Algumas espcies do gnero Eugenia que j foram estudadas quanto ao

    seu potencial antinociceptivo como E. punicifolia (BASTING et al., 2014), E.

    fruticosa (SHAMS-UD-DOHA et al., 2012) e E. involucrata (VECHI, 2015;

    VECHI et al., 2017), apresentaram promissores resultados.

    3.4 Atividade antiproliferativa

    O cncer uma doena considerada multicausal e crnica, que afeta

    milhares de pessoas ao redor do mundo, tanto em pases subdesenvolvidos

    quanto em pases em desenvolvimento. uma doena na qual as clulas sofrem

    alteraes genticas e crescem de forma anormal, invadindo outros tecidos e

    perdendo sua funo original (MIRANDA et al., 2013; SAN FELICIANO;

    CECHINEL FILHO, 2014).

    A etiologia do cncer ainda no muito bem esclarecida, porm, as

    neoplasias podem surgir devido s mutaes genticas espontneas ou induzidas

    por agentes patognicos como metais, radiaes, radicais livres do oxignio,

    inflamaes crnicas e exposio xenobiticos (tabaco, lcool, pesticidas, etc).

    Este processo termina com a proliferao de clulas anormais (tumorais),

    gerando os tumores (CAMPOS et al., 2014; FERNANDES; MAFRA, 2005).

    O National Cancer Institute (NCI), afirma que os EUA gastam 125

    bilhes por ano no tratamento de cncer e a projeo de novos casos de cncer

    s tende a aumentar, com possibilidades de se tornar a doena que mais mata no

    mundo, ultrapassando as doenas cardiovasculares. No Brasil, o INCA (Instituto

    Nacional do Cncer) aponta a ocorrncia de aproximadamente 600 mil novos

    casos de cncer entre 2016-2017 (INCA, 2017; MARIOTTO et al., 2011).

    A utilizao de compostos bioativos para o tratamento do cncer

    conhecida ao longo da histria da humanidade. Estudos populacionais sugerem

    que um risco reduzido de cncer est associado ao alto consumo de vegetais e

  • 49

    frutas devido presena de fitoqumicos naturais com poder quimiopreventivo

    (GULLET et al., 2010; GREENWELL; RAHMAN, 2015).

    Os compostos de origem vegetal possuem um grande potencial na

    preveno do cncer devido sua segurana, baixo custo e biodisponibilidade

    oral. Atualmente, a maioria dos medicamentos para o tratamento de cncer do

    mercado farmacutico so derivados de produtos naturais, chegando um

    percetual de aproximadamente 75% (NEWMAN; CRAGG, 2016; CAMPOS et

    al., 2014).

    Estudos tm demonstrado que as principais vias de sinalizao

    desreguladas no cncer so afetadas por nutrientes: metabolismo carcinognico,

    reparo de DNA, proliferao celular/apoptose, diferenciao, inflamao,

    desequilbrio na proteo antioxidante e angiognese. Entre os nutrientes com

    ao preventiva podem ser elencados o clcio, zinco, selncio, cido flico,

    cidos graxos essenciais, vitaminas (C, D e E). Alm dos nutrientes, muitos

    compostos bioativos encontrados em plantas tem demonstrado proteo em

    vrias fases do desenvolvimento do cncer, dentro os quais pode-se citar os

    flavonoides (apigenina, kaempferol, quercetina), carotenoides (licopeno,

    betacaroteno), terpenoides (taxol), vitaminas (A, C, D e E), sulforafano, alguns

    polifenis (resveratrol) (VALENTE et al., 2014).

    Alm destas substncias isoladas, alguns extratos de plantas

    demonstram atividade como Viscum album, Hypericum perforatum, Withania

    somnifera (Ashwagandha), Melaleuca alterniflia (melaleuca ou tee tree),

    Zingiber officinale (gengibre), Curcuma longa (crcuma), Calendula officinalis

    (margarida), Rosmarinus officinalis (alecrim) tambm podem ter ao anticncer

    por diferentes mecanismos, principalmente induzindo a apoptose, apresentando

    atividade antiproliferativa e anti-metasttica (CHINEMBIRI et al., 2014).

    Espcies de Eugenia so geralmente ricas em flavonoides e terpenoides

    e por essa razo podem ser promissoras na busca por novos agentes anticncer.

  • 50

    Recentemente algumas espcies vem demostrando potencial antiproliferativo,

    como a E. jambolana e a E. brasiliensis (CHAREPALLI, 2016; TEIXEIRA et

    al., 2017).

    3.5 Atividade anticolinestersica

    A atividade anticolinestersica est relacionada inibio da

    acetilcolinesterase (AChE), uma enzima que degrada a acetilcolina em colina e

    cido actico. A acetilcolina (ACh) por sua vez um neurotransmissor

    importante nas fendas sinpticas e possui uma funo essencial para o organismo

    e para o sistema nervoso central (SNC), pois decisivo no desempenho

    cognitivo. Alguns elementos qumicos, classificados como neurotoxinas, podem

    afetar a atividade desta enzima, provocando principalmente

    espasmos musculares (FORTUNATO, 2016; OLAZARN; NAVARRO;

    ROJO, 2013).

    Apesar de ser uma enzima importante, inibir sua ao por meio de

    agentes anticolinestersicos pode ser uma importante soluo para algumas

    doenas como a miastenia gravis, glaucoma e a doena de Alzheimer (DA), alm

    de serem utilizados como agentes analgsicos (FORTUNATO, 2016).

    Atualmente, a maioria dos tratamentos teraputicos para a DA esto

    relacionados inibio da enzima acetilcolinesterase para aumentar o nvel de

    acetilcolina nas sinapses nervosas, melhorando os sinais de vrios distrbios

    neurolgicos (SENOL et al., 2010; TAKIZAWA et al., 2015).

    A DA umas das principais causas de demncia no mundo. Ela

    uma das doenas neurodegenerativas relacionadas idade mais prevalente em

    idosos, junto com as deficincias cognitivas. O aumento da prevalncia desta

    doena em todo o mundo uma ameaa sade pblica, uma vez que cerca de 5

    a 8% das pessoas com mais de 60 anos apresenta a DA (OMS, 2018; SAEEDI et

    al., 2017).

    https://pt.wikipedia.org/wiki/Neurotoxinahttps://pt.wikipedia.org/wiki/Espasmohttps://pt.wikipedia.org/wiki/Miastenia_gravishttps://pt.wikipedia.org/wiki/Glaucomahttps://pt.wikipedia.org/wiki/Mal_de_Alzheimer

  • 51

    Em todo o mundo, cerca de 47 milhes de pessoas tm demncia, e

    se identifica quase 10 milhes de novos casos a cada ano. Sendo a DA a causa

    mais comum de demncia (60-70% dos casos), possvel calcular que existam

    cerca de 6 a 7 milhes de novos casos de DA anualmente. O nmero total de

    pessoas com demncia projetado para cerca de 75 milhes em 2030 e em 2050

    para 132 milhes (OMS, 2018).

    Nos ltimos anos, investimentos considerveis foram dedicados ao

    desenvolvimento de medicamentos para o tratamento desta enfermidade, que

    est relacionada destruio e envelhecimento celular, responsveis pela

    desordem neurolgica caracterstica da DA. Os sintomas incluem a perda de

    memria, disfuno cognitiva, distrbios de comportamento e dificuldade na

    realizao das atividades dirias (MAGINA et al., 2012; SIEBERT et al., 2015).

    A DA considerada grave, incapacitante e at o momento sem cura.

    Considerando o aumento da expectativa de vida da populao mundial e o

    consequente aumento da incidncia de DA, a busca por novos agentes com

    potencial anticolinestersico se faz imprescindvel (DIAS et al., 2015). Neste

    sentido, as plantas medicinais podem ser aliadas, como o caso da galantamina,

    isolada de plantas da famlia Amaryllidaceae (GIORDANI et al., 2008).

    O gnero Eugenia apresenta algumas espcies j estudadas quanto ao

    seu potencial anticolinesterasico, como a E. dysenterica e E. brasiliensis

    (GASCA et al., 2017; SIEBERT et al., 2015). Muitas espcies tambm

    apresentam potencial anti-inflamatrio, tendo relao desta forma com a

    preveno e tratamento da DA (DZOYEM et al., 2017). Desta forma, se justifica

    a busca por substncias bioativas com potencial anticolinestersico nas folhas e

    caules de E. mattosii.

  • 52

    3.6 Atividade vasorrelaxante

    A presso arterial (PA) elevada a condio mais prevalente na

    ateno bsica sade e est relacionada a diversas patologias importantes como

    as doenas relacionadas ao corao e a falncia renal (JAMES, 2013).

    Segundo a OMS, a hipertenso e suas complicaes so responsveis

    por 17,7 milhes de mortes a cada dia (cerca de 31% de toda mortalidade

    mundial), tanto em pases em desenvolvimento quanto em pases de primeiro

    mundo. Apesar dos esforos governamentais, a sua prevalncia continua a

    aumentar (GALLARDOORTZ et al., 2015; OMS, 2017).

    As doenas cardiovasculares (DCVs) so distrbios relacionados ao

    funcionamento do corao e dos vasos sanguneos . Os indivduos com presso

    arterial aumentada, alteraes de glicemia e lipdeos plasmticos e com

    sobrepeso ou obesidade apresentam alto risco para o desenvolvimento destas

    doenas, que so a causa nmero um de mortes em todo o mundo (OMS, 2017;

    OMS, 2007, WANG et al., 2014).

    Segundo as Diretrizes Brasleiras de Hipertenso Arterial, a PA a

    fora que o sangue bombeado pelo corao exerce contra a parede distensvel

    dos vasos sanguneos. O volume de sangue que sai do corao (dbito cardaco)

    e a resistncia que ele encontra para circular na periferia (resistncia perifrica

    vascular) que determinam essa presso. Em humanos, a presso arterial mdia

    gira em torno de 120 mm Hg para a presso sistlica e 80 mm Hg para diastlica

    (SBC, 2016).

    A regulao da PA em curto prazo (reao em segundos)

    desempenhada pelos barorreflexos, quimiorreflexos e SNC. O controle da PA em

    longo prazo (horas ou dias) desempenhado pelos rins. Em mdio prazo

    (minutos), a regulao ou modulao ocorre principalmente por ao dos

    sistemas hormonais (GUYTON, 1991; SILVA, 2011).

  • 53

    O endotlio vascular capaz liberar substncias que relaxam a

    musculatura lisa, controlando a presso arterial, como por exemplo o xido

    ntrico. O endotlio est localizado na parede interna dos vasos sanguneos, que

    so constitudos de trs camadas histolgicas: a camada externa que formada

    por tecido conjuntivo; a camada mdia, formada por clulas musculares lisas e a

    camada ntima, constituda por uma nica camada de clulas que reveste

    internamente os vasos sanguneos. Em condies normais existe um equilbrio

    entre a liberao desses fatores, mas em condies patolgicas como a de

    hipertenso arterial, acontece um desequilbrio que est associado ao

    desenvolvimento de complicaes relacionadas s DCVs (SILVA, 2011).

    Os riscos causados por essa enfermidade fazem com que seja cada

    vez mais necessria a busca por tratamentos alternativos para o controle da

    hipertenso. No Brasil e no mundo, muito comum o uso de plantas medicinais

    como fonte alternativa no tratamento desta complicao. As propriedades

    calmantes e anti-hipertensivas de determinadas plantas tm sido alvo de novas

    descobertas farmacolgicas (SILVA et al., 2015).

    O atratamento farmacolgico da hipertenso inclui uma variedade de

    drogas que atuam em diferentes vias, com o objetivo teraputico de reduzir a PA

    sistlica e diastlica para valores mais aceitveis fisiologicamente. No entanto,

    muitos pacientes no apresentam reduo eficiente da PA com uso de drogas

    anti-hipertensivas convencionais (SBC, 2016; MANCIA et al., 2013).

    Neste sentido, o desenvolvimento de novas ferramentas

    farmacolgicas pode ajudar a melhorar o manejo clnico da hipertenso arterial.

    Plantas medicinais podem ser grandes aliadas no controle da presso arterial,

    muitas delas j so utilizadas na medicina tradicional: Cymbopogon citratus

    (DC.) Stapf (capim-limo), Cynara scolymus L. (alcachofra), Rosmarinus

    officinalis L. (alecrim), Allium sativum L. (alho), Coleus barbatus Benth (falso

    boldo) (FARIAIS et al., 2016).

  • 54

    As espcies de Eugenia so geralmente ricas em flavonoides,

    compostos j conhecidos por seu potencial cardioprotetor, antioxidante e anti-

    inflamatrio (WANG et al., 2014). Por esta razo, justifica-se a busca por novas

    substncias biotivas provenientes de plantas medicinais como a Eugenia

    mattosii, que possam reduzir a presso arterial, uma vez que esta espcie faz parte

    de um gnero to promissor quando se trata de doenas cardiovasculares.

    3.7 Atividade antiparasitria

    As parasitoses so muito comuns em todo o mundo, gerando graves

    consequncias para a sade pblica. Cerca de 50% da populao mundial e 36%

    da populao brasileira sofrem com algum tipo de doena relacionada parasitas

    (OMS, 2016). Apesar deste tipo de doenas estar relacionado precrias

    condies de vida (falta de higiene e saneamento bsico, desnutrio, gua

    poluda), sendo mais prevalente em pases em desenvolvimento, os pases

    desenvolvidos tambm so afetados pelas parasitores (MUKBELl et al., 2017).

    Estas doenas so normalmente negligenciadas pelo setor mdico e

    farmacutico, pois no representam um mercado lucrativo, alm de tambm

    serem esquecidas por pesquisadores. Faltam avanos tecnolgicos para o

    desenvolvimento de novas ferramentas de diagnstico, drogas ou vacinas que

    possam combater estas parasitoses to comuns. A giardase e a leishmaniose,

    provocadas por parasitas, so doenas normalmente negligenciadas e bastante

    prevalentes em pases em desenvolvimento. (ARVALO-LOPZ et al., 2018).

    A giardase provocada por espcies de Giardia, sendo a principal

    delas a G. lamblia (ou G. intestinalis/duodenalis). Animais domsticos e crianas

    so os mais afetados por esse parasita intestinal (THOMPSON, 2011). A

    giardase causa diversos problemas intestinais, entre eles a infeco intestinal, a

    diarreia e a m absoro de nutrientes, sendo que pode ocasionar danos mais

  • 55

    severos em casos graves. A principal via de transmisso a oral-fecal (BARRY

    et al., 2013; MUKBELl et al., 2017).

    Muitos medicamentos existem para o tratamento da giardase, no

    entanto, eles provocam muitos efeitos colaterais. No mundo das plantas

    medicinais, algumas alternativas j so descritas para combater a giardase. Uma

    delas a curcumina, o principal metablito isolado da Curcuma longa, um

    rizoma de cor alaranjada bastante utilizado na culinria indiana (GUTIERRZ-

    GUTIRREZ et al., 2017).

    No caso da leishmaniose, existem muitas espcies associadas

    patologia, que costuma acometer humanos e animais. Costumava ser encontada

    somente na rea rural, mas atualmente pode ser diagnosticada em ambientes

    urbanos. A doena se manifesta de trs maneiras: leishmaniose cutnea (lceras

    drmicas), mucocutnea (lceras na pele, boca, nariz) ou visceral (forma mais

    grave, causa febre de longa durao, perda de peso, astenia, anemia e pode levar

    bito (GOBBI et al., 2016; OMS, 2016).

    Existem mais de 300.000 casos de leishmaniose visceral e mais de 1

    milho de casos de leishmaniose cutnea. No Brasil, a maior parte das infeces

    por Leishmania acontece em adultos e so do tipo cutnea (OMS; 2015).

    Para o tratamento de leishmania se utiliza alguns medicamentos

    especficos como o Antimoniato de Meglumina (desde 1946) e a anfotericina B

    (desde 1957). Miltefosina a droga mais recente em utilizao, aprovada para

    em 2008 nos Estados Unidos pela FDA (Food and Drug Administration). Todos

    esses tratamentos so altamente txicos e mostram efeitos secundrios graves.

    Portanto, importante desenvolver novas alternativas para o tratamento destas

    doenas e os produtos naturais desempenham um papel crucial na descoberta de

    novos medicamentos nesta linha (ARVALO-LOPZ et al., 2018).

    A Bolvia o pas que mais apresenta casos de Leishmaniose no

    mundo, e vem buscando alternativas dentro de sua prpria biodiversidade para o

  • 56

    tratamento desta doena. Recentemente foi publicado um estudo com vrias

    plantas de uma comunidade boliviana, levando em considerao o uso popular

    das mesmas. Cinco plantas apresentaram potencial leishmanicida: Jacaranda

    glabra, Scoparia dulcis, Tessaria integriflia, Thalia geniculata e Ejije Bidu.

    As plantas medicinais so grandes aliadas na busca de novas

    substncias capazes de combater estes parasitas. Muitos metablitos secundrios

    vem sendo estudados em relao atividade antileishmanicida e antigirdia. O

    Brasil, sendo um grande foco de zoonoses e ter uma grande biodiversidade, pode

    ser local de descoberta de plantas com potecial antiparasitrio.

  • 57

    CAPTULO III

    Resultados e Diiscusso

  • 58

  • 59

    1 AVALIAO FITOQUMICA

    Neste item, ser exposto toda a parte fitoqumica que permeia a tese,

    sendo a parte inicial da pesquisa e tambm servindo de auxlio durante as

    avaliaes biolgicas que sero descritas nos artigos posteriores a este item. As

    metodologias apresentadas foram a base do estudo com a planta.

    1.1 Material vegetal

    O material vegetal foi coletado entre agosto de 2015 a novembro de

    2016, nos jardins da UNIVALI, na cidade de Itaja, SC, Brasil. Foram realizadas

    quatro coletas, a cada trs meses, de acordo com as diferentes estaes do ano,

    sempre no ltimo ms de cada estao. A planta foi identificada pelo Prof. Oscar

    Benigno Iza (UNIVALI) e uma exsicata foi depositada no Herbrio Barbosa

    Rodrigues (Itaja-SC) sob o nmero VCFilho 150.

    1.2 Anlise fitoqumica

    As folhas e os caules frescos de E. mattosii foram picados e extrados

    separadamente por macerao com metanol durante 7 dias temperatura

    ambiente. A relao planta-solvente variou entre 1:3 a 1:5 (para cada 100 g de

    planta fresca foram utilizados de 300 a 500 ml de metanol), dependendo da parte

    da planta. Os extratos foram filtrados e concentrados em um rotaevaporador sob

    presso reduzida (50C) fornecendo os respectivos extratos metanlicos brutos

    (EMB), que seguiram para o processo de isolamento de compostos atravs de

    colunas cromatogrficas (CC), conforme demonstra a Figura 4.

    A fim de comparar os rendimentos de cada estao do ano, todos os

    extratos foram realizados seguindo o procedimento j descrito acima, sempre

  • 60

    utilizando as partes da planta in natura. Os rendimentos de cada extrato esto

    descritos na Tabela 1.

    Figura 4. Fluxograma do procedimento de extrao e partio das folhas secas

    de E. mattosii.

    Tabela 1. Dados de coleta e rendimentos de extratos sazonais de E. mattosii.

    Amostras E. mattosii Data

    coleta

    Rendimento (%)

    EMB-Folhas Primavera Nov 2016 8,96

    EMB-Caules Primavera Nov 2016 2,91

    EMB-Folhas Vero Fev 2016 7,73

    EMB-Caules Vero Fev 2016 2,09

    EMB-Folhas Outono Maio 2016 6,73

    EMB-Caules Outono Maio 2016 2,29

    EMB-Folhas Inverno Ago 2015 10,94

    EMB-Caules Inverno Ago 2015 2,4

    * EMB= extrato metanlico bruto

  • 61

    1.3 Isolamento e identificao de compostos

    O processo de triagem inicial da planta foi realizado na primeira

    coleta, em agosto de 2015 com o extrato das folhas frescas. Uma CC inicial foi

    preparada com 15g de extrato metanlico bruto das folhas (EMB-inverno) em

    coluna de vidro de 125ml com 62g de slica gel 60 da marca Macherey-Nagel

    (0,04-0,063 mm / 230-400 mesh ASTM). Esta coluna de triagem foi

    recromatografada algumas vezes e levou ao isolamento de pequenas quantidades

    de fitol (1mg), lcool palmtico (32 mg) e cido urslico (11 mg), que foram

    identificados por CG/EM. Nesta fase do trabalho pode-se observar o grande

    potencial fitoqumico da planta atravs da cromatografia em camada delgada

    (CCD), conforme demonstra a Figura 5.

    Figura 5. Cromatografia em Camada Delgada (CCD) das subfraes obtidas da

    primeira Coluna Cromatogrfica (CC) com o extrato bruto de E. mattosii.

  • 62

    Para isolamento de compostos, foi utilizado um extrato obtido das

    folhas secas da primeira coleta, que aconteceu em agosto de 2015 (coleta de

    inverno), pois esta coleta demonstrou um maior rendimento. Os procedimentos

    de extrao e partio foram idnticos aos j mencionados anteriormente.

    Aps a partio, ambas fraes foram submetidas colunas

    cromatogrficas a fim de isolar os principais constituintes ativos. 15 g da frao

    clorofrmio (FCL) foram submetidas a CC aberta em coluna de vidro de 200 ml

    com 130 g de slica gel 60 eluda com gradiente de hexano:acetona, resultando

    na coleta de 183 subfraes (10 ml cada) nesta coluna inicial.

    As subfraes similares da primeira coluna foram combinadas com

    base em seus perfis em CCD, utilizando-se de placas pr-revestidas Merck

    Kieselgel 60 F254 (0,25 mm) eludas com gradiente hexano:acetona. As manchas

    foram visualizadas por UV e reveladas com reagente anisaldedo. Algumas

    subfraes foram recromatografadas seguindo o mesmo procedimento, conforme

    Figura 6. As subfraes 75-85 (664 mg) e 86-89 (373 mg) forneceram o

    isolamento de um total de 362 mg de um slido branco puro, identificado como

    pinostrobin, enquanto as subfraes 153-165 (231 mg) e 166-177 (810 mg)

    levaram ao isolamento de um total de 84 mg de outro slido branco puro,

    indentificado como cryptostrobin.

    Ambas substncias foram identificados com base nos dados espectrais

    (FIGURA 7 a 10) e comparadas com dados da literatura (SOLLADI et al.,

    1999; MASSARO et al., 2014).

  • 63

    Figura 6. Fluxograma do procedimento de isolamento de compostos da FCL-

    folhas de E. mattosii.

  • 64

    Figura 7. RMN de H1 do flavonoide isolado pinostrobin.

    Figura 8. RMN de C13 do flavonoide isolado pinostrobin.

  • 65

    Figura 9. RMN de H1 do flavonoide isolado cryptostrobin.

    Figura 10. RMN de C13 do flavonoide isolado cryptostrobin

  • 66

    Em relao frao de acetato de etila (FAE), 12g foram submetidos

    a procedimentos cromatogrficos em coluna de vidro de 200ml com 80 g de slica

    gel 60 utilizando-se gradiente de clorofrmio:metanol. Conforme descrito na

    Figura 11, 138 subfraes foram coletadas na primeira coluna e combinadas de

    acordo com a similaridade. A subfrao 50-79 (450 mg) foi recromatografada

    duas vezes e permitiu o isolamento de avicularin (15 mg) e (-)- catequina (6 mg),

    identificadas com base nos dados espectrais de RMN (FIGURAS 12 a 15) e

    comparadas com dados da literatura (LEE et al., 2014; AYRES et al., 2009). As

    estruturas dos compostos isolados podem ser observadas na Figura 16.

    A CCD tambm foi usada para monitorar a combinao das

    subfraes e a pureza dos compostos. Neste caso elas foram eludas com

    gradiente clorofrmio:metanol e reveladas com cloreto frrico (FeCl3).

    Figura 11. Fluxograma do procedimento de isolamento de compostos da FAE-

    folhas de E. mattosii.

  • 67

    Figura 12. RMN de H1 do flavonoide isolado (-)-catequina.

    Figura 13. RMN de C13 do flavonoide isolado (-)-catequina.

  • 68

    Figura 14. RMN de H1 do flavonoide isolado avicularin.

    Figura 15. RMN de C13 do flavonoide isolado avicularin.

  • 69

    Figura 16. Estruturas dos compostos isolados das folhas de E. mattosii. (A)

    Pinostrobin, (B) Cryptostrobin, (C) (-)catequina e (D) Avicularin.

    O

    OH O

    OCH3

    O

    CH3

    OOH

    OH

    O

    OH

    OH

    OH

    OH

    OH

    (A) (B)

    (C)

    O

    OH

    OH

    OH

    OH

    O

    O

    O

    OH

    OH

    OH

    (D)

    2. Identificao e quantificao de substncias isoladas por UPLC-

    PDA/ESI+ - QTOF

    2.1 Equipamento

    O equipamento utilizado foi um cromatgrafo lquido Acquity da

    marca Waters, equipado com um detector de arranjo de fotodiodos (PDA)

    acoplado a Quadrupole Time of Flight (Q-ToF) (Waters Synapt G1), (Waters

    Corp., Milford, MA, USA). Os dados foram processados por software da Waters,

    MassLynx V4.1.

    2.2 Condio experimental

    Todas as anlises foram realizadas em modo positivo e V ptico (ESI-

    V +), e usando sistema de cromatografia de fase reversa. A coluna utilizada para

    o mtodo UPLC foi um Acquity UPLC BEH C18 (1.7m 2.1 mm x 100 mm).

    Os componentes da fase mvel foram A: gua com 0,1% de cido frmico e B:

    acetonitrila. A coluna foi eluda no fluxo 0,2 ml.min-1. O gradiente comeou com

  • 70

    15% de B em A e manteve-se durante 5 minutos, aumentando para 35% em 10

    minutos, para 55% em 20 minutos, para 70% em 22 minutos, para 80 % em 24

    minutos, retornando s condies iniciais gradualmente em 35 minutos e mantido

    durante 2 minutos para o equilbrio da coluna. O volume injetado foi de 1 l.

    Os dados de espectrometria de massas foram adquiridos utilizando uma

    fonte de eletrospray, faixa de varredura de massa de 70-1000 m / z, temperatura

    da fonte 120 C, temperatura de dessolvatao 250 C, fluxo de gs de cone 10

    Lh-1, gs de desolvatao 450 Lh-1 e tenso capilar de 3.0 kV.

    Todas as amostras foram preparadas em 1ml de metanol grau LC-MS,

    utilizando 10mg de extratos e 1mg de compostos puros (padres). Como

    marcador qumico foram utilizados os compostos catequina, pinostrobin e

    cryptostrobin.

    2.3 Quantificao de compostos

    As amostras foram comparadas pelos cromatogramas MS XIC,

    utilizando a massa dos compostos para identificao dos mesmos. Para

    identificar e quantificar o pinostrobin e o cryptostrobin no cromatograma,

    utilizou-se a massa destas substncias para sua extrao, 271. No caso da (-)-

    catequina, a sua respectiva massa, de 291, foi utilizada para extrao.

    Para calcular a concentrao destes compostos nos extratos e fraes, a

    rea total do cromatograma foi relacionada rea composta isolada

    (cromatograma padro). A porcentagem em m / m foi transformada em

    concentrao mg.g-1, assumindo linearidade.

  • 71

    CAPTULO IV

    Composio qumica e atividade antimicoplasmatica de

    extratos, fraes e substncias isoladas das folhas e caules de

    Eugenia mattosii

    Este artigo foi submetido ao peridico Qumica Nova, com fator de impacto

    igual a 0.627. Submisso em 02-fevereiro-2018.

  • 72

  • 73

    Composio qumica e atividade antimicoplasmtica de extratos, fraes e

    substncias isoladas das folhas e caules de Eugenia mattosii

    Giovana Vechi1, Adrielli Tenfen1, Ariela Mana Boeder2, Lorena Hernandez-

    Gmez3, Caio Maurcio Mendes de Crdova2, Franco Delle Monache1, Valdir

    Cechinel Filho1

    1 Programa de Ps-Graduao em Cincias Farmacuticas, Universidade do

    Vale do Itaja, CEP: 88302-901, Itaja, SC, Brasil 2 Departamento de Cincias Farmacuticas, Universidade Regional de

    Blumenau, CEP: 89030-001 Blumenau, SC, Brasil 3 Centro de Investigacin em Productos Naturales - CIPRONA, Universidad de

    Costa Rica, San Jos, Costa Rica

    Resumo

    A espcie Eugenia mattosii pertence a um gnero importante da famlia

    Myrtaceae, conhecida pela diversidade de substncias bioativas, utilizadas na

    medicina tradicional para curar diferentes tipos de doenas. Como no h muita

    informao sobre esta espcie de Eugenia em literatura, o objetivo deste estudo

    foi avaliar a composio qumica e a atividade antimicrobiana das folhas e caules

    da E. mattosii. O extrato metanlico de folhas e caules e suas respectivas fraes

    de clorofrmio (FCL) e acetato de etila (FAE), alm de trs substncias isoladas,

    pinostrobin, cryptostrobin e (-)- catequina, foram avaliados em relao ao seu

    potencial antimicrobiano, contra cepas de bactrias sem parede celular,

    conhecidas como molicutes. Ambos extratos metanlicos demonstraram

    atividade moderada (MIC = 250-500 g.mL-1). As fraes apresentaram

    melhores resultados em comparao com o extrato metanlico bruto (MIC = 125-

    1000 g.mL-1), especialmente as FAE das folhas, que mostraram atividade em

    concentraes de 125-250 g.mL-1 para todas as cepas testadas. O pinostrobin e

    o cryptostrobin apresentaram boa atividade antibacteriana contra M. pneumoniae

    FH e M. Genitalium, sendo que o pinostrobin apresentou MIC de 12,5 g.mL-1

    frente cepa de M. pneumoniae FH. A (-)-catequina no demonstrou atividade.

    Em concluso, as fraes de E. mattosii e os compostos isolados (pinostrobin e

    cryptostrobin) apresentaram uma promissora atividade antibacteriana.

    Palavras-chave: Eugenia mattosii; atividade antimicoplasmatica; pinostrobin;

    cryptostrobin, catequina.

  • 74

    1 Introduo

    Molicutes so bactrias sem parede celular, responsveis por vrias

    doenas humanas e animais, incluindo pneumonia, vaginite e pielonefrite.

    Devido resistncia relatada esses microrganismos, essencial buscar novas

    terapias antimicrobianas que sejam efetivas contra os molicutes, e o gnero

    Mycoplasma considerado de grande importncia para esta classe de bactrias

    (LOWE et al., 2014; TAYLOR-ROBINSON, 2017).

    Estudos anteriores realizados em nossos laboratrios demonstraram

    que algumas espcies do gnero Eugenia, como E. beaurepaireana, E.

    brasiliensis, E. umbelliflora, E. hiemalis e E. platysema, apresentaram promissor

    potencial antimolicute (BENFATTI et al., 2010; TENFEN et al., 2017;

    ZATELLI et al., 2015).

    A Eugenia mattosii, foco deste estudo, popularmente conhecida

    como Cambui e ocorre no sul do Brasil, entretanto, pouco se conhece sobre sua

    composio qumica e atividade biolgica.

    Considerando as importantes atividades j descritas para este gnero

    e as diversas infeces problemticas causadas por molicutes, este estudo tem

    como objetivo avaliar o potencial antimicoplasmtico de extratos, fraes e

    substncias isoladas das folhas e caules de E. mattosii, alm de quantificar os

    principais compostos por Cromatografia lquida de ultra performance (UPLC).

  • 75

    2 Material e Mtodos

    2.1 Anlise fitoqumica

    A anlise fitoqumica est descrita no captulo II, item 4.

    ` Para avaliao do potencial antimicoplasmtico foram utilizados os

    extratos e fraes das folhas e caules secos, provenientes da coleta de inverno,

    alm das substncias isoladas destas amostras.

    2.2 Ativid