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Arlindo Ugulino Netto – FARMACOLOGIA – MEDICINA P3 – 2008.2 1 MED RESUMOS 2012 NETTO, Arlindo Ugulino. FARMACOLOGIA ANTIPSICÓTICOS (Professora Edilene Bega) Os antipsicóticos ou neurolépticos so frmacos que se caracterizam por sua ao psicotrpica, com efeitos sedativos e psicomotores. Por isso, alm de se constiturem como os frmacos preferencialmente usados no tratamento sintomtico das psicoses, principalmente a esquizofrenia, tambm so utilizados como “calmantes” e em outros distrbios psquicos. O uso dos antipsicticos , hoje, conduta padro na terapia de psicoses agudas. DEFINIO DE ESQUIZOFRENIA E FISIOPATOLOGIA Durante muito tempo, transtornos que caracterizam as esquizofrenias eram considerados como apenas uma doena de diagnstico isolado: esquizofrenia ou psicose. O termo esquizofrenia foi criado por Eugen Bleuler, em 1911, que determinou que a desorganizao de pensamento era o principal sintoma da patologia, e o termo usado para designar tal doena significa: mente fendida ou dividida. A esquizofrenia uma das formas mais importantes de doenas psiquitricas, afetando pessoas de todas as idades, inclusive as jovens, se mostrando como uma condio crnica e incapacitante de etiopatogenia obscura. Assim como ocorre com a doena de Parkinson, no h tratamento curativo, apenas efetivo, buscando diminuir a sua sintomatologia e evoluo. No que diz respeito sua fisiopatologia, vrias teorias foram lanadas no intuito de explicar as bases da doena. A teoria neuroquímica, por exemplo, defende que a esquizofrenia seja causada por um aumento da dopamina em uma das vias dopaminrgicas do crebro (a via mesolímbica), causando, em suma, uma hiperatividade desse sistema. A hiptese glutaminrgica, embora ainda no elucidada, defende que h uma reduzida expresso do receptor NMDA (n- metil, d-cido asprtico). A hipótese dopaminérgica para a psicose determina, portanto, que a hiperatividade dos neurnios dopaminrgicos na via mesolmbica pode mediar os sintomas positivos da psicose. O objetivo teraputico tem como base a hipótese do antagonista do receptor dopaminérgico na ação dos antipsicóticos, de modo que, com a via mesolmbica bloqueada, os sintomas positivos sero combatidos. OBS 1 : Alm da via mesolmbica, existem outras vias dopaminrgicas enceflicas importantes que tambm podem sofrer influncias medicamentosas indesejadas durante o tratamento farmacolgico da esquizofrenia. As vias dopaminrgicas do encfalo e os efeitos que sofrem sob ao de bloqueadores dos receptores dopaminrgicos so: 1. Via nigro-estriada: a utilizao de bloqueadores de receptores dopaminrgicos para evitar a psicose, pode alcanar esta via e gerar efeitos indesejados extra-piramidais, como o parkinsonismo farmacolgico. As reaes extra- piramidais ocorrem quando h deficincia de dopamina e excesso de acetilcolina na via dopaminrgica nigrostriada: normalmente, a dopamina suprime a atividade da acetilcolina. Uma vez bloqueada, no haver inibio da liberao de ACh, gerando os efeitos extra-piramidais. 2. Via mesolímbica: a ao de bloqueadores dos receptores dopaminrgicos deve ocorrer nesta via, quando se quer reduzir os efeitos dos sintomas positivos da psicose. 3. Via mesocortical: o uso de bloqueadores de receptores dopaminrgicos, ao afetar esta via, cria o aparecimento de sintomas negativos da psicose como efeitos adversos. 4. Via túbero-infundibular: bloquear a dopamina desta via significa inibir a inibio da secreo da prolactina, o que faz com que haja a liberao deste hormnio (desenvolve na mulher as glndulas mamrias e, no homem, ginecomastia). OBS 2 : O Haloperidol e a Tioridazina so frmacos utilizados como neurolpticos que bloqueiam os receptores dopaminrgicos. Porm, devido ao fato da tioridazina ter tambm uma maior efeito de bloqueio muscarnico, faz com que ele seja mais comumente utilizado, pois, ao bloquear os receptores dopaminrgicos (atuando sobre os efeitos da psicose) e muscarnicos (atuando sobre a captao da ACh, que, neste caso, desencadearia os efeitos do parkinsonismo farmacolgico), inibe tambm os efeitos adversos como a reao extra-piramidal, sendo, portanto, uma boa droga escolha. Em contrapartida, a Tioridazina apresenta uma vastido de efeitos adversos simpatomimticos perifricos (constipao, reteno urinria, midrase, etc).

Farmacologia 11 antipsicóticos - med resumos (dez-2011)

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Arlindo Ugulino Netto – FARMACOLOGIA – MEDICINA P3 – 2008.2

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MED RESUMOS 2012NETTO, Arlindo Ugulino.FARMACOLOGIA

ANTIPSICÓTICOS(Professora Edilene Bega)

Os antipsicóticos ou neurolépticos s�o f�rmacos que se caracterizam por sua a��o psicotr�pica, com efeitos sedativos e psicomotores. Por isso, al�m de se constitu�rem como os f�rmacos preferencialmente usados no tratamento sintom�tico das psicoses, principalmente a esquizofrenia, tamb�m s�o utilizados como “calmantes” e em outros dist�rbios ps�quicos. O uso dos antipsic�ticos �, hoje, conduta padr�o na terapia de psicoses agudas.

DEFINI��O DE ESQUIZOFRENIA E FISIOPATOLOGIADurante muito tempo, transtornos que caracterizam as esquizofrenias eram considerados como apenas uma

doen�a de diagn�stico isolado: esquizofrenia ou psicose. O termo esquizofrenia foi criado por Eugen Bleuler, em 1911, que determinou que a desorganiza��o de pensamento era o principal sintoma da patologia, e o termo usado para designar tal doen�a significa: mente fendida ou dividida.

A esquizofrenia � uma das formas mais importantes de doen�as psiqui�tricas, afetando pessoas de todas as idades, inclusive as jovens, se mostrando como uma condi��o cr�nica e incapacitante de etiopatogenia obscura. Assim como ocorre com a doen�a de Parkinson, n�o h� tratamento curativo, apenas efetivo, buscando diminuir a sua sintomatologia e evolu��o.

No que diz respeito � sua fisiopatologia, v�rias teorias foram lan�adas no intuito de explicar as bases da doen�a. A teoria neuroquímica, por exemplo, defende que a esquizofrenia seja causada por um aumento da dopamina em uma das vias dopamin�rgicas do c�rebro (a via mesolímbica), causando, em suma, uma hiperatividade desse sistema. A hip�tese glutamin�rgica, embora ainda n�o elucidada, defende que h� uma reduzida express�o do receptor NMDA (n-metil, d-�cido asp�rtico).

A hipótese dopaminérgica para a psicose determina, portanto, que a hiperatividade dos neur�nios dopamin�rgicos na via mesol�mbica pode mediar os sintomas positivos da psicose. O objetivo terap�utico tem como base a hipótese do antagonista do receptor dopaminérgico na ação dos antipsicóticos, de modo que, com a via mesol�mbica bloqueada, os sintomas positivos ser�o combatidos.

OBS1: Al�m da via mesol�mbica, existem outras vias dopamin�rgicas encef�licas importantes que tamb�m podem sofrer influ�ncias medicamentosas indesejadas durante o tratamento farmacol�gico da esquizofrenia. As vias dopamin�rgicas do enc�falo e os efeitos que sofrem sob a��o de bloqueadores dos receptores dopamin�rgicos s�o:

1. Via nigro-estriada: a utiliza��o de bloqueadores de receptores dopamin�rgicos para evitar a psicose, pode alcan�ar esta via e gerar efeitos indesejados extra-piramidais, como o parkinsonismo farmacol�gico. As rea��es extra-piramidais ocorrem quando h� defici�ncia de dopamina e excesso de acetilcolina na via dopamin�rgica nigrostriada: normalmente, a dopamina suprime a atividade da acetilcolina. Uma vez bloqueada, n�o haver� inibi��o da libera��o de ACh, gerando os efeitos extra-piramidais.

2. Via mesolímbica: a a��o de bloqueadores dos receptores dopamin�rgicos deve ocorrer nesta via, quando se quer reduzir os efeitos dos sintomas positivos da psicose.

3. Via mesocortical: o uso de bloqueadores de receptores dopamin�rgicos, ao afetar esta via, cria o aparecimento de sintomas negativos da psicose como efeitos adversos.

4. Via túbero-infundibular: bloquear a dopamina desta via significa inibir a inibi��o da secre��o da prolactina, o que faz com que haja a libera��o deste horm�nio (desenvolve na mulher as gl�ndulas mam�rias e, no homem, ginecomastia).

OBS2: O Haloperidol e a Tioridazina s�o f�rmacos utilizados como neurol�pticos que bloqueiam os receptores dopamin�rgicos. Por�m, devido ao fato da tioridazina ter tamb�m uma maior efeito de bloqueio muscar�nico, faz com que ele seja mais comumente utilizado, pois, ao bloquear os receptores dopamin�rgicos (atuando sobre os efeitos da psicose) e muscar�nicos (atuando sobre a capta��o da ACh, que, neste caso, desencadearia os efeitos do parkinsonismo farmacol�gico), inibe tamb�m os efeitos adversos como a rea��o extra-piramidal, sendo, portanto, uma boa droga escolha. Em contrapartida, a Tioridazina apresenta uma vastid�o de efeitos adversos simpatomim�ticos perif�ricos (constipa��o, reten��o urin�ria, midr�ase, etc).

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SINTOMAS DA PSICOSEPsicose � um termo psiqui�trico gen�rico que se refere a um

estado mental no qual existe uma "perda de contacto com a realidade" ou a pr�pria esquizofrenia. Embora nenhum sintoma estritamente patognom�nico possa ser identificado, para fins pr�ticos, � �til dividir os sintomas de acordo com as fases da doen�a, tais como:

Características pré-morbidas: introvers�o, isolamento social,timidez, indiferen�a emocional, funcionamento social e escolar insatisfat�rio.

Início dos sintomas (fase prodrômica): em geral ocorre na adolesc�ncia e adulto jovem, com sintomas prodr�micos inespec�ficos (perda de energia, iniciativa e interesses, comportamento estranho, neglig�ncia com apar�ncia e higiene pessoal).

Sintoma da fase aguda: surge o processo psic�tico, com a perda do contato com a realidade. Ocorrem del�rios, alucina��es (60-70% destas na forma auditivas), incoer�ncia e desagrega��o do pensamento, inadequa��o afetiva, estereotipias e maneirismos.

Sintomas da fase crônica: embotamento afetivo, discurso empobrecido, aboli��o da vontade, distraibilidade, ensimesmamento.

OBS1: Costuma-se tamb�m agrupar os sintomas da esquizofrenia em positivos e negativos, a depender do padr�o de “atividade” destes sintomas:

Sintomas positivos: s�o sintomas mais “ativos”, e est�o presentes com maior visibilidade na fase aguda da doen�a e s�o as perturba��es mentais "muito fora" do normal, como que “acrescentadas” �s fun��es psicol�gicas do indiv�duo. Entende-se como sintomas positivos:

Del�rios; Alucina��es; Distor��es ou exageros da linguagem e da comunica��o; Discurso desorganizado; Comportamento catat�nico; Agita��o.

Sintomas negativos: s�o sintomas menos “ativos”, mas que afetam suas rela��es sociais, pois s�o resultado da perda ou diminui��o das capacidades mentais, acompanhando a evolu��o da doen�a. Entende-se por sintomas negativos:

Afeto embotado; Dificuldade de relacionamento; Passividade; Retraimento social ap�tico; Dificuldade de pensamento abstrato; Falta de espontaneidade; Pensamento estereotipado; Pobreza afetiva – express�o.

TRATAMENTO DA ESQUIZOFRENIADe uma forma geral, o tratamento das esquizofrenias pode ser socioter�pico e farmacol�gico, com base no uso

de neurol�pticos. Tratamento socioterápico: psicoterapia, terapia familiar e ocupacional. Tratamento farmacológico:

o Neurol�pticos t�picos (afinidade por receptores D2) Diminuem sintomas positivos e previnem reca�das (80% recaem no 1� ano sem medica��o,

apenas 20% usando antipsic�ticos). Efeitos adversos: acatisia, parkinsonismo, hiperprolactinemia, discinesia tardia.

o Neurol�pticos at�picos (afinidade por receptores 5HT2a, H1, D4) S�o mais efetivos nos sintomas negativos em compara��o aos t�picos, mas tamb�m s�o efetivos

nos sintomas positivos. A Clozapina est� relacionada com agranulocitose

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Os neurol�pticos, uma sub-divis�o dentro dos antipsic�ticos, foram os primeiros f�rmacos desenvolvidos para o tratamento de sintomas positivos da psicoses (alucina��es e del�rios). Seus efeitos adversos s�o caracterizados por um conjunto de sintomas conhecido vulgarmente como impregan��o neurol�ptica ou efeitos extrapiramidais.

Como se sabe, a superatividade das vias neuronais de dopamina (e a diminui��o dos n�veis de acetilcolina) em n�vel do sistema l�mbico cerebral � importante na patogenia da esquizofrenia. O receptor mais importante dessas vias � o receptor dopamin�rgico D2. Os antipsic�ticos funcionam como antagonistas do receptor D2, diminuindo a sua ativa��o pela dopamina end�gena. Os efeitos de controle sobre os sintomas da esquizofrenia surgem quando 80% dos receptores D2 est�o bloqueados pelo antagonista. Atualmente, certos neurol�pticos t�m a capacidade de atuar nos receptores serotonin�rgicos, acetilcolin�rgico, histam�nico e noradren�rgico.

NEUROL�PTICOS “T�PICOS” (CL�SSICOS OU DE PRIMEIRA GERA��O)Os antipsic�ticos de primeira gera��o s�o medicamentos que bloqueiam preferencialmente os receptores D2 da

dopamina nos sistemas dopamin�rgicos mesol�mbico e mesocortical (objetivos do tratamento), nigroestriatal e t�bero-infundibular (relacionados com os efeitos colaterais). S�o eficazes para tratar alucina��es, del�rios, desagrega��o do pensamento e agita��o psicomotora, e produzem efeitos colaterais importantes (vide abaixo).

S�o medicamentos eficazes para o tratamento de epis�dios psic�ticos agudos ou cr�nicos. S�o predominantemente eficazes para os sintomas positivos e n�o t�m a��o importante nos negativos. Os principais s�o:

Fenotiazinas: Clorpromazina (Amplictil�), Flufenazina, Levomepromazina (Neozine�) Butirofenonas: Haloperidol (Haldol�), Droperidol (Droperdal�) Tioxantinas: Clopentixol, Tiotixeno

Efeitos colaterais: Prolactina aumentada (pois bloqueiam os receptores dopamin�rgicos da via t�bero-infundibular), Efeitos anticolin�rgicos (porque bloqueiam os receptores muscar�nicos, que inclusive reduz os efeitos extrapiramidais), Seda��o (porque bloqueiam receptores histamin�rgicos), Ganho de peso, Sintomas extrapiramidais (bloqueio dos receptores dopamin�rgicos da via nigro-estriada), Rea��es de hipersensibilidade (favorece e produ��o mastocit�ria de histamina), Hipotens�o (bloqueiam os receptores α-adren�rgicos).

NEUROL�PTICOS “AT�PICOS” (RECENTES OU DE SEGUNDA GERA��O)Os antipsic�ticos at�picos s�o os neurol�pticos de segunda gera��o, que atuam em outros s�tios da dopamina e

que produzem menos efeitos parkinsonianos. S�o medica��es mais bem toleradas, mais eficazes para sintomas negativos, por�m, de alto custo.

S�o medicamentos que constituem a primeira op��o para o tratamento do primeiro epis�dio psic�tico, quando h� intoler�ncia aos neurol�pticos t�picos ou predomin�ncia dos sintomas negativos. Os mais indicados s�o a Risperidona e a Olanzapina. Os principais representantes s�o:

Clozapina (Leponex�): seu uso est� mais correlacionado � agranulocitose, e quando os leuc�citos caem abaixo de 3.000, a medica��o deve ser interrompida.

Olanzapina (Zyprexa�) Risperidona: bloqueia os receptores 5-HT2 da serotonina e D2 da dopamina. Efeitos colaterais: ins�nia,

agita��o, ansiedade, efeitos extra-piramidais, pseudoparkinsonismo, discinesia, etc. Sulpirida, Remoxiprida e Pimozida: manifestam menores efeitos piramidais Sertindol (associado a arritmias) e Quetiapina (associado a taquicardia).

ESCOLHA DO ANTIPSIC�TICO (NEUROL�PTICO) Problema: alto risco de distonia (homem abaixo dos 30 anos, mulher abaixo de 25 anos). Escolha: Risperidona. Problema: Riscos geri�tricos (muito anticolin�rgico, ortostatismo, seda��o), comprometimento cognitivo ou

delirium. Escolha: Alta pot�ncia (exemplo: Haloperidol) ou Risperidona. Evitar Clozapina ou Olanzapina. Problema: sintomas negativos predominantes ou severos. Escolha: Risperidona ou Clozapina. Problema: Resistente ao tratamento. Escolha: depois de potencializar o tratamento, optar por Risperidona

ou Clozapina. Problema: risco de convuls�es. Escolha: alta pot�ncia (ex: Haloperidol). Evitar Clozapina. Problema: obesidade. Escolha: Alta pot�ncia. Evitar neurol�pticos de baixa pot�ncia. Aconselhar o

paciente a perder peso. Evitar Clozapina, Risperidona e Quetiapina. Problema: Arritmia card�aca. Escolha: Alta pot�ncia; evitar Sertindol e Quetiapina. Problema: agita��o extrema. Escolha: Alta pot�ncia (Haloperidol). Problema: ader�ncia m�nima ao medicamento. Escolha: Decanoato de Haloperidol ou Flufenazina (dep�sito,

alta pot�ncia).