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GENERALIDADES HABITAM a área do posto administrativo de Susana duas tribos: Felupe e Baiote. A fixação destas tribos no actual território português deve ter ocorrido há muitos séculos, não sendo possível averiguar a data exacta em que tal sucedeu. É de registar que, baseando-nos no número de jambacosses (sacerdotes) do xinabw katit, falecidos desde que existiu a povoação de Sabatule (local onde, segundo a lenda felupe, o Emit (Deus) lançou o primeiro casal que deu origem à tribo) se obtém um período de 3.000 anos, número que não temos meio de controlar mas que no entanto revela a antiguidade da fixação. Tudo indica que, a partir daí, a fixação se tenha realizado por 3 grupos distintos, explicando-se desse modo as diferenças de pronúncia e outras que existem dentro do dialecto. Sendo assim, o primeiro ter-sé-ia fixado no território que fica situado na margem direita do esteiro de Cassalol que, segundo a tradição, em tempos recuados se podia atravessar a vau, fundando a povoação de Sabatule; o segundo, ter-se-ia estabelecido no território que vai de Varela até à margem do rio de Sucujaque e o terceiro, o grupo constituído pelos indígenas que hoje se designam por

Felupes

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GENERALIDADES

HABITAM a área do posto administrativo de Susana

duas tribos: Felupe e Baiote.

A fixação destas tribos no actual território português

deve ter ocorrido há muitos séculos, não sendo possível

averiguar a data exacta em que tal sucedeu. É de registar

que, baseando-nos no número de jambacosses (sacerdotes)

do xinabw katit, falecidos desde que existiu a povoação de

Sabatule (local onde, segundo a lenda felupe, o Emit (Deus)

lançou o primeiro casal que deu origem à tribo) se obtém

um período de 3.000 anos, número que não temos meio de

controlar mas que no entanto revela a antiguidade da

fixação.

Tudo indica que, a partir daí, a fixação se tenha

realizado por 3 grupos distintos, explicando-se desse modo

as diferenças de pronúncia e outras que existem dentro do

dialecto. Sendo assim, o primeiro ter-sé-ia fixado no

território que fica situado na margem direita do esteiro de

Cassalol que, segundo a tradição, em tempos recuados se

podia atravessar a vau, fundando a povoação de Sabatule;

o segundo, ter-se-ia estabelecido no território que vai de

Varela até à margem do rio de Sucujaque e o terceiro, o

grupo constituído pelos indígenas que hoje se designam por

baiotes, teria ocupado os terrenos onde actualmente estão

as povoações de Elia e Arame.

O que se conseguiu averiguar, com base na tradição oral,

foi que os actuais moradores de ]ufunco, Igim e Catão

faziam parte do grupo de habitantes que actualmente se

encontram em Varela e que o seu desmembramento

resultou da destruição das palhotas feita pelas águas do

Oceano que invadiram os terrenos onde se encontravam,

obrigando os indígenas a procurar outro sítio para se

estabelecerem, o que fizeram, sem contudo se afastarem

muito do litoral.

A corroborar este facto existe a lenda de que a invasão

das águas do mar foi provocada por uma mulher, como

castigo da sua curiosidade, contando os felupes o caso da

seguinte forma: No tempo em que isto sucedeu, havia na

povoação, perto das palhotas, um sítio onde costumava

aparecer diàriamente um monstro que, saindo do solo,

entregava à primeira mulher que passasse uma quantidade

de peixes, desaparecendo novamente. Em certo dia uma

mulher, movida pela curiosidade, depois de ter recebido os

peixes, resolveu levantar uma espécie de tampa, que ()

monstro colocava para tapar a abertura por onde

desaparecia, e, ao levantá-la, irrompeu da referida abertura

uma tromba de ~gua que inundou o local, obrigando os

moradores a fugir.

É natural que a lenda tenha por base qualquer

fenómeno físico que provocasse a submersão de toda a

faixa de terreno que vai até à ponta de Bolor, pois que os

moradores desta povoação contam, segundo a tradição

transmitida de pais para filhos, que o esteiro que entra ali

em direcção a Susana era muito mais estreito, o que está

de acordo com o que dizem os actuais habitantes de

Susana, que afirmam que antigamente podiam ir a pé até

onde é hoje a povoação de Lala, de que os separa agora um

canal que dá passagem a embarcações de cerca de 40

toneladas.

Como atrás se disse, julgamos que felupes e baiotes

pertenceram primitivamente à mesma tribo, pois que os

seus usos e costumes são absolutamente iguais, havendo

unicamente a diferença de dialectos que certamente foi

motivada por um prolongado isolamento dos dois grupos.

Leva-nos a fazer esta afirmação o facto de algumas

palavras serem iguais às do baiote, como por exemplo:

Independentemente deste facto há a considerar que

todo o baiote fala o dialecto felupe e tanto uns como outros

se consideram

como pertencentes

ao mesmo grupo,

designando-se por

edjola, mas dentro

desta designação

genérica existe a de

kacikcnei - homens

do porto - aplicada

aos indígenas da

tribo baiote e às de

kajamutoko -

homens do mato -

aplicada aos felupes.

Se considerarmos como tribos diferentes os baiotes e

felupes teremos então de reconhecer que estes últimos

têm exercido uma influência enormíssima sobre os baiotes,

a ponto de os seus ritos funerários, religião e todos os usos

e costumes terem desaparecido para. serem substituídos

pelos dos felupes ; mas isso nunca teria sido possível em

face do pouco contacto havido entre as duas tribos até à

ocupação portuguesa, pois se eram más as relações

existentes entre as diversas povoações de íelupes, as

destes com os baiotes eram ainda piores.

A tribo felupe ocupa actualmente, dentro do território

português, toda a faixa do litoral que vai do Cabo Roxo à

ponta de Bolor e daí segue o esteiro que passa por Ossor,

Laia e Arame e sai pela fronteira próximo do marco número

174. Tem uma superfície aproximada de 320 quilómetros

quadrados e uma população computada em cerca de oito

mil almas, distribuída pelas seguintes povoações: Susana,

Bugim, Ejatem, Cassalol, Caruai, Basseor, Tenhate,

Sucujaque, Varela, Carão, Jufunco, Igim, Laia, Ossor e

Bolor.

Esta faixa de terreno não possui acidentes orográficos

e é sulcada, devido à sua proximidade com o Oceano

Atlântico, por inúmero') rios e canais. que tomam o nome

das povoações por onde passam.

Todo o território onde estão situadas as povoações de

Sucnjaque, Tenhate, Basseor, Caruai, Cassalol, Ejatem,

Bugim, Susana, Varela, Carão e Igim é densamente

povoado de palmeiras (Elaeis Guineensis), às quais o

felupe dá o nome Ebekalé.

Do fruto da palmeira quase só aproveitam a amêndoa

de palma, itau - para vender ao comércio, num total

aproximado de 300.000 quilos anualmente e a produção do

óleo de palma a que eles dão o nome de mitamu, pole

cifrar-se em uma dezena de toneladas, visto que aproveitam

parte para condimentar a sua comida e parte vendem ao

comércio (esta última computada em cerca de 5.000 quilos,

anualmente).

CAPÍTULO I. VIDA MATERIAL

1) Alimentação

O indígena felupe alimenta-se de arroz - eman,

mandioca - K ãt, batata doce - abatat, feijão frade -lIçak,

dos frutos da farroba - enol, do mampataz - unãdeb e da

bananeira - unana.

Do reino animal come a carne de bovídeos - ebá, de

caprmosejamen, de suínos - ekãb, todas as qualidades de

peixe - eol e mariscos.

A base da alimentação é constituída por arroz e peixe,

podendo calcular-se em novecentos gramas daquele cereal

e trezentos de peixe ou marisco, o consumo diário de um

indígena adulto.

Os frutos do mampataz, da farroba e da bananeira,

depois de reduzidos a massa, servem de pequeno almoço,

sendo mais apreciados os frutos da bananeira, que são

considerados uma delícia. As restantes refeições, almoço e

ceia, constam quase sempre de arroz, no qual misturam

peixe cozido ou assado e, na falta deste, um marisco

conhecido na Colónia pelo nome de cumbé, a que o felupe

dá o nome de ejij.

Também costuma comer a mandioca, depois de

previamente cozida, mas isto só sucede se o arroz é pouco

ou se tem de seguir para qualquer sítio donde não possa

regressar antes do almoço.

Como condimento utiliza o sal que obtém pela

evaporação artificial da água dos rios que é levada a cabo

fervendo-a em grandes panelas de barro, depois de

previamente coada através de uma espessa camada de

palha para lhe tirar a maior quantidade possível de

impurezas. O processo foi, evidentemente, inspirado na

evaporação da água dos rios que fica depositada, quando

das marés vivas, em pequenas covas existentes nas suas

margens.

Não foi possível averiguar se a procura do sal motivou

emigrações, mas tudo leva a supor que tal facto se não

tivesse dado, visto

que, antes de

obterem o sal pela

evaporação, os

alimentos eram

cozinhados com a

água dos rios que

sulcam toda a região

ocupada pela tribo

felupe, O que ainda

hoje é praticado

pelos indígenas da

mesma raça de

algumas povoações

do vizinho território

francês. O sal foi e é

permutado com os

indígenas que moram distantes dos rios, permuta levada a

cabo pelas mulheres, pois que somente elas circulavam

livremente, em virtude das más relações que antigamente

existiam entre tabancas. Esta permuta, que ainda hoje se

mantém, embora em menor escala, era feita por arroz,

coconote, óleo de palma e mancarra, em medidas iguais.

Nos tempos primitivos quase todos os indígenas felupes

comiam terra, principalmente a proveniente dos morros de

térmite, conhecida na Colónia pelo nome de baqa-baqa,

costume que ainda se mantém, praticado principalmente

pelas mulheres quando se encontram grávidas e pelas

crianças.

Algumas ainda assim procedem com fins medicinais,

mas a maioria delas talvez o façam por acharem gostosa a

terra.

O felupe come carne de todos os animais que

constituem a fauna da região, com excepção da hiena, por

recearem que a ingestão da cante desta última seja a

causa da sarna, comendo também a dos animais

domésticos mortos por doença, assim como o peixe podre.

Praticou a antropofagia nos tempos passados e,

segundo se averiguou, por acreditar que a ingestão de

carne humana os tornaria mais robustos. Uma outra razão

dessa prática era a convicção de que se não comesse a

carne dos indivíduos que matava, acabaria por morrer

doido. Assim, ainda hoje, se o indígena por qualquer

circunstância tiver a infelicidade de matar outro, terá de

proceder no xinabt~ à cerimónia da matança de uma

galinha ou qualquer outro animal doméstico e beber,

misturado com vinho de palma, um bocado de sangue do

animal sacrificado, visto estar convencido que morrerá se

assim não proceder.

Apesar de hoje não praticarem a antropofagia, que em

tempos recuados se deveria ter estendido às pessoas

mortas por doença, ainda existe o costume de os parentes

mais chegados de qualquer indivíduo falecido ficarem de

guarda à sepultura durante oito a dez dias e, quando se

trate de um menor com menos de dez anos, este é

sepultado perto da palhota, algumas vezes na varanda da

residência dos pais, onde com mais facilidade a sepultura

poderia ser vigiada.

Nesses tempos, quando por falta de vigilância

conseguiam desenterrar um cadáver, este era mergulhado

na água salgada de um dos muitos rios que sulcam a

região, durante um dia, e depois cozinhado e comido.

O felupe não

se utiliza de

cisternas para

aproveitamento da

água das chuvas,

fazendo uso, na

época pluviosa, da

que se deposita

nas depressões do

terreno e, na

época seca,

abastece-se da

proveniente de

pequenos poços

que escavam

perto das bolanhas. Não tem quaisquer cuidados higiénicos

com a água para beber ou para cozinhar.

Quando viaja, leva sempre dentro de um pequeno 5<'lCO

feito de folhas de cibe (palmeira leque), um bocado de arroz

já cozinhado que come pelo caminho; mas, se a viagem

dura o tempo que vai de uma refeição a outra, come quando

sai de casa e quando regressa, pois que por princípio não

come em casá de nenhum indivíduo, com receio que lhe

misturem na comida qualquer droga venenosa.

2) Preparação dos alimentos - Cerâmica - Moagem -

Conservação dos alimentos

Em regra o felupe não come os alimentos crus. Muito

raramente costuma levar para as bolanhas um bocado de

arroz, ao qual, depois de o ter mergulhado na água durante

um certo tempo, junta um bocado de mel- mukun - para o

comer. Come cruas, mas também muito raramente, a

mandioca e a batata doce.

Como já se disse, a base ria alimentação do indígena

felupe é o arroz, que, depois de descascado no pilão, é

lavado em pequenos cestos que mergulham em água

repetidas vezes e, sem lhe tocar com as mãos, deitado na

panela para cozer; este trabalho é feito geralmente pelas

mulheres.

Na época, seca os homens geralmente não costumam

comer em casa, em virtude de saírem pela manhã para o

mato e só regressarem a casa alta noite. No mato são eles

que cozinham as suas refeições, levando de casa, num

cesto, o arroz previamente lavado pela mulher, o sal e o

peixe ou marisco. Para isso levam a panela no primeiro dia

e só a trazem no começo das chuvas.

Não fermentam os alimentos e o apodrecimento

intencional só é feito com o peixe que deixam apodrecer e

secar ao sol e guardam para consumir na época das

chuvas. Cortam em tiras a carne de qualquer animal e

secam-na ao fumo para evitar que se estrague.

O fogo é conservado na palhota tendo sempre a arder

um pau grosso que durante a noite cobrem com cascas de

arroz para que a combustão seja lenta.

São raparigas da mesma idade da que vai habitar a

nova palhota que acendem o primeiro lume e nele cozinham

uma panela de arroz que é distribuído pelas crianças da

povoação. Essa cerimónia tem o fim de desejar que na nova

habitação haja sempre abundância.

o combustível geralmente empregado pelo indígena

felupe, tanto para cozinhar como para se aquecer, é o

tarrafe que as mulheres, na época seca, cortam nas

margens dos rios e transportam para a palhota em

quantidade suficiente para as necessidades no tempo das

chuvas.

Também empregam qualquer outra lenha, mas é-lhes

expressamente vedado cozinhar ou aquecer a casa com a

proveniente dos matos onde estão os baxin, pela crença de

que, se tal fizessem, incorreriam em um sem número de

desgraças. No entanto, a lenha desses matos pode ser

utilizada no local, para se aquecerem, desde que a cinza

proveniente da combustão ali fique.

Nas fumigações diárias para afugentar os insectos,

principalmente os mosquitos e melgas, empregam a casca

do arroz e, na falta desta, a lenha verde.

Nos tempos primitivos, o fogo era obtido pela fricção da

casca dos frutos - ebak - da árvore chamada calabaceira -

ubak, - mas hoje fazem uso de fósforos que adquirem no

comércio.

Utilizam para

preparar os

alimentos panelas

feitas dum barro

macio com

mistura de cascas

de ostras

reduzidas a pó ou

pedaços de

outras panelas,

sendo a matéria-

prima

transportada para

junto da palhota, onde se fabricam. Feita e amassada a

mistura, iniciam a modelação, que é manual, empregando

urna espécie de colher feita de madeira para alisar

interiormente as peças fabricadas, que são postas depois a

secar durante cinco ou seis dias. Findo este tempo dão-

lhes a primeira cozedura, empregando como combustível a

casca do arroz. Depois de esfriarem procedem 11 nova

cozedura das peças empilhadas, separadas por uma leve

camada de lenha de tarrafe e rodeadas do mesmo

combustível.

O empilhamento das peças é feito com o máximo

cuidado e a cozedura final é vigiada com muita atenção

para que o fogo não seja demasiado, mas nenhuma

cerimónia fazem, nem observam qualquer rito, tanto

durante a modelação como na cozedura.

Dedicam-se a esta indústria, que é muito antiga mas

também muito rudimentar, as mulheres, que somente

fabricam panelas - eber - e potes serve para o seu

descasque. Este almofariz é geralmente construído com um

tronco de tarrafe ficando depois de escavado com igual

diâmetro tanto na boca como no fundo, sendo igualmente

feito de tarrafe o pau de pilar.

Em viagem, levam sempre um bocado de arroz já cozido

dentro de um saco feito de folhas de palmeira leque, mas

geralmente, se a viagem é longa, nunca saem da casa sem

comer; se .ela durar somente Q tempo que vai de uma

refeição à outra, comem quando saem e quando regressam.

Só costumam fumar a carne quando a têm em grande

quantidade, mas não abatem gado para isso, contentando-

se, cm regra, com a carne proveniente das caçadas que

fazem.

O peixe é conservado por dois sistemas. O primeiro, que

aplicam ao peixe miúdo, é a secagem ao sol tal como o

pescam, dando-se assim o apodrecimento seguido da

secagem. Depois de seco por este processo, o peixe é

metido em sacos feitos de folhas de palmeira Leque e

colocado por cima do local onde cozinham para apanhar

fumo, o que não evita que decorrido um certo tempo esteja

cheio de bichos; isto não impede que seja cozinhado e

comido.

O segundo sistema consiste na salga seguida de

secagem. Para isso aproveitam somente o peixe graúdo,

que previamente abrem e limpam, aplicando-lhe uma

pequena camada de sal e pondo-o também ao sol para se

dar a secagem; finda esta colocam-no num estrado que

constroem por cima da lareira para se conservar.

Não preparam manteiga e não aproveitam o leite para

beber porque dizem que «o homem só mama quando é

pequeno».

Possuem colmeias feitas de troncos de palmeira

escavados, donde retiram os favos fazendo fumo para

afugentar as abelhas. Espremem então os favos com as

mãos e ern seguida levam o mel assim obtido ao fogo para

o tornar mais espesso e guardam-no em panelas donde o

vão retirando para misturar com o arroz.

Não fazem o aproveitamento da cera por desconhecerem

a maneira de a preparar.

Algumas vezes reduzem o arroz a farinha, sendo esta

misturada depois com o mel. Tal prática só é usada pelos

que possuem grandes quantidades daquele cereal e de mel.

O arroz para tal fim é posto durante algum tempo dentro de

água e reduzido a farinha no mesmo almofariz que

3) Excitantes

A principal bebida do felupe é a seiva extraída da

palmeira, a que dão o nome de bunul« Como ao ser extraída

a seiva é doce, expõem-na ao sol, juntando-lhe malagueta

para activar a fermentação.

Também bebem aguardente de cana sacarina adquirida

no comércio., mas em pequenas quantidades, sendo o

maior consumo desta nas cerimónias que fazem no xinabu.

Há muito pouco tempo que a conhecem pelo que não tem

nome no dialecto felupe sendo conhecida pelo nome

português aguardente.

O felupe emprega como afrodisíaco uma infusão da

casca do bissilão - buneçor -, juntando-lhe as sementes,

depois de reduzidas a pó, de uma trepadeira que na Colónia

é conhecida pelo nome de nhanhima e do felupe pelo de

émok,

A esta infusão juntam depois uma porção de vinho de

palma doce para atenuar o gosto amargo com que a

mistura fica. Atribuem-lhe grandes propriedades de

.excitante dos apetites sexuais.

Fazem uso desta beberagem os indivíduos do sexo

masculino e às mulheres é ministrada pelos próprios

homens, para o que lhe juntam maior quantidade de vinho

de palma doce. Esta mistura é feita no mato e longe das

vistas das mulheres, para que estas ao bebê-Ia não

desconfiem da mistura que foi feita no vinho.

São grandes apreciadores do tabaco em folha, mas não

o cultivam e o que fumam é adquirido no comércio, não

fazendo a secagem ou o curtimento de qualquer planta com

o fim de a fumarem. Se por qualquer circunstância acabar o

tabaco no comércio local vão adquiri-lo a qualquer outro

centro comercial, por mais longe que este fique da sua

residência.

Fumam por cachimbos - errau-un - feitos de barro ou de

madeira. Tanto os cachimbos de barro como os de madeira

são fabricados pelos indivíduos do sexo masculino, sendo

estes últimos confeccionados com madeira do chamado

pau carvão, revestidos interiormente com folha zincada ou

chapa de cobre.

Estes cachimbos têm cerca de sete centímetros de

altura e dois de diâmetro e chios de tabaco dão para um ou

dois dias.

Somente fumam os indivíduos do sexo masculino dos

treze ou catorze anos em diante, isto é, desde que possam

subir à palmeira a colher os seus frutos para com o produto

da venda deles poderem adquirir tabaco.

O rapé é usado pelas mulheres e homens velhos, mas

estes, desde que comecem a usá-lo, deixam de fumar. É

preparado pelos próprios indígenas triturando o tabaco em

folha, ao qual adicionam depois pequena quantidade de

cinza proveniente da combustão dos troncos do poilão,

Ceiba pentandra. A preparação do rapé é feita

indistintamente por homens ou mulheres.

4) Habitação

Segundo a tradição oral o felupe habitou

primitivamente em cavidades abertas no solo, passando

depois a construir as suas habitações em estacaria

revestida e coberta com folhas de palmeira, e mais tarde

esse revestimento passou a ser feito com terra

amassada.

Actualmente as paredes das habitações são

construídas somente com lama - ekap -, sendo a terra

para a construção da palhota extraída perto do local da

construção; depois de bem molhada e modelada em

pequenas bolas é deixada em repouso durante dois ou

três dias, findos os quais começa a construção das

paredes da casa. A mulher, em regra, auxilia o homem no

transporte de água, cabendo a este a modelação do

barro.

Depois de as paredes estarem feitas e. bem secas,

passa-se ao travejamento – enijenun -, empregando-se

paus bastante fortes para suportar o peso de uma

camada de lama, com cerca de três centímetros de

espessura, que se destina a isolar o interior da habitação

no caso de incêndio.

Em seguida é construído com paus de tarrafe o

madeiramento - ka-ãd - que assenta sobre as paredes,

variando o feitio conforme o tipo de habitação, sendo o

mais vulgar o redondo; encontram-se também algumas

palhotas oblongas e quadradas numa tentativa de

imitação das casas dos civilizados.

Qualquer destes tipos de construção ocupa uma área

entre quinze a vinte e cinco metros quadrados, tendo as

paredes uma espessura de doze a quinze centímetros e

cerca de três metros de altura. A cobertura é feita a

palha - mujit -; o corte no mato e preparação da palha

para servir de cobertura é feito pela mulher, pertencendo

ao homem colocá-la.

Xxx

o felupe não inicia a construção da sua palhota - elup

– sem que, previamente, e acompanhado pelo jombacosse

do xinabu katit, vá ofertar uma porção de vinho de palma

e sacrificar uma galinha, pedindo ao emit (deus) para que

nada lhe suceda durante a construção que deseja fazer.

Finda a construção volta ao xinabu,. efectuando igual

cerimónia e pedindo desta vez autorização para a

habitar, pois que, se for residir para a nova casa sem que

realize esta cerimónia, está convencido que a morte o

não deixará habitá-la muito tempo.

A habitação felupe compõe-se geralmente de quatro

divisões e um pequeno corredor. A divisão que está em

comunicação COI11 o corredor serve de sala - kanãr - e é

onde geralmente cozinha e come as suas refeições;

outra destina-se a quarto de dormir do proprietário –

burun -; outra divisória destina-se a quarto de uma das

mulheres e dos filhos e outra serve ainda de celeiro e

armazém de utensílios agrícolas e domésticos. No

corredor ficam os animais que possui, dando ii este o

nome de utãp,

Há habitações que possuem seis divisões, mas a

divisória a mais serve também para guardar produtos. Só

os indígenas que possuem muito arroz constroem

palhotas tão grandes.

As habitações têm geralmente cinco portas, uma que

abre para o quintal e outra para o largo ou rua, abrindo

as restantes para a sala que serve de cozinha e

refeitório. Não possuem janelas propriamente ditas, mas

sim umas pequenas frestas - einun -, as quais são

atravessadas por pequenos paus formando uma espécie

de gradeamento.

Dormem no chão em cima de esteiras - kalei - ou

peles de bovídios curtidas - kabã -, notando-se já uma

certa tendência para a construção de pequenos estrados

em estacaria, que cobrem de esteiras ou peles.

O mobiliário limita-se a uns pequenos pedaços de

tronco, que servem de assentos – utenk - e a pedaços de

pau espetados na parede - eank - onde costumam

dependurar os arcos, terçados e outros utensílios, cons-

truindo também, a um dos cantos da casa que serve de

refeitório e cozinha, um estrado em paus que depois

cobrem com uma camada de lama e que serve para nele

colocarem as panelas, pratos e os potes com a água.

O aquecimento e iluminação das casas faz-se com

lenha. Quando desprevenido de combustível o indígena

lança mão da palha que arranca dos beirais da palhota.

O celeiro ou armazém é dentro de casa e constituído

por uma espécie de estrado em estacaria, elevado do

solo cerca de metro e meio para proteger o cereal do

ataque de qualquer animal e da humidade.

Quase todas as habitações têm um quintal anexo -

kakul- vedado por estacaria - bauler -, onde se cultiva a

mandioca, se plantam alguns rnangueiros e bananeiras e

se costumam fazer os viveiros de arroz.

Não usam habitações portáteis, mas na época seca

constroem no mato, perto dos palmares onde fazem a

extracção do vinho de palma, umas barracas em que

vivem quase todo o dia beberricando, fumando, conver-

sando e dormindo.

Os aldeamentos não obedecem a qualquer

disposição, construindo cada um a palhota no sítio que

mais lhe convém, geralmente no local onde já tenha

estado uma outra de um membro da mesma família.

Arruamentos propriamente ditos não existem, havendo

somente uns pequenos carreiros de acesso a cada

palhota.

As vedações, como já se disse, são feitas em

estacaria com paus de tarrafe espetados no chão e

amarrados depois com bambu no sentido horizontal,

havendo algumas feitas com ramos de palmeira

amarrados da mesma maneira.

Não usaram nunca nenhum sistema de fortificação,

quer da palhota quer do aldeamento, e a defesa a

ataques de animais ferozes consiste nas vedações acima

referidas e é quase nula. A entrada para essas vedações,

dentro das quais está a palhota, é defendida por paus

espetados no chão, com uma altura que varia entre

sessenta e oitenta centímetros, mais servindo para

defender o quintal dos animais domésticos que vagueiam

pela povoação, que de defesa contra os animais ferozes.

5) Higiene

o felupe desconhece quase por completo a higiene e

o asseio. O banho, para ele, consiste em meter-se dentro

de um rio ou qualquer lagoa e deitar com as mãos um

bocado de água pela cabeça e pelo corpo.

Não faz uso do sabão para tomar banho nem para

lavar os panos que, desde que os vestem até se

romperem, não conhecem água, salvo se apanham chuva

ou se os rnolharn por descuido quando vão à fonte.

Há mais cuidado com a boca, pois o felupe, depois

das refeições, nunca deixa de bochechar e palitar os

dentes com um graveto de arbusto a que dá o nome de

uçinbilit.

Desconhece o uso de fossas. Urina e defeca em local

privativo para cada sexo, perto das povoações, sendo no

entanto vedado aos homens irem satisfazer as suas

necessidades no local destinado às mulheres e vice-

versa.

6) Vestuário e adornos

Existe certo pudor tanto nos indivíduos do sexo

masculino como do feminino, pois nenhum homem ou

mulher aparece nu à frente de cutrém.

Se um homem estiver a tomar banho em uma lagoa e

uma mulher tiver de passar perto, previne-o de longe

para que se recate,

de igual modo

procedendo o

homem em relação

a uma mulher.

Rapazes e raparigas

costumam ir

banhar-se juntos

nas lagoas, mas

nunca tiram as

bandas ou os

pequenos pedaços

de fazenda com que

tapam os órgãos

genitais, única

parte do corpo que

para o felupe é objecto de pudor.

A mulher quando dentro da tabanca usa um pano que

vai da cintura até ao joelho e o homem um pequeno

pedaço de fazenda que lhe tapa os rins até ao meio da

coxa. As raparigas e os rapazes somente tapam os

órgãos genitais.

Como adornos usam colares e cintos feitos de contas

e pequenos búzios, mas somente até casarem, não

incrustando nada na pele.

i) Mutilações do corpo

o felupe não costuma pintar o corpo.

Pratica a tatuagem - bãga -, mas ela não é precedida de

qualquer cerimónia ou rito, por ser um costume

relativamente recente e adquirido dos soldados da

guarnição do Comando Militar de Susana que lhes ensi-

naram a técnica.

Faz a tatuagem dos braços e do peito, desenhando

linhas curvas e rectas, triângulos e círculos, por meio

de incisões feitas com uma faca, as quais são lavadas

em seguida com água bastante quente para queimar os

tecidos ou utilizando o líquido extraído da castanha de

caju.

Só ultimamente se tem generalizado a prática da

tatuagem cutre os rapazes e raparigas de quinze a vinte

e dois anos de idade, aproximadamente, não havendo

operador especial, pois que qualquer rapaz pratica a

operação.

Alguns felupes talham os dentes, mas nunca os

arrancam. A operação é feita tanto nos rapazes como

nas raparigas, geralmente dos 15 aos 25 anos, mas

somente naqueles que o desejem.

O talhe dos dentes é feito cm bico, com o auxílio de

uma faca e um pequeno machado e depois de o

paciente ter enchido a boca de sal, que serve de

anestésico à dor provocada pelas pancadas na faca.

Finda a operação, o paciente enterra os dentes numa

banana verde para que o tanino contido no fruto actue

sobre as gengivas, que ficam tão abaladas COm as

pancadas que o impede de comer.

Não pratica a castração, infibulação, amputação do

clitóris, 0U dos pequenos lábios, nem o desfloramento

articial, conservando-se a mulher, até ter relações

sexuais, tal qual como nasceu.

A circuncisão do prepúcio é quase obrigatória na

tribo felupe, Os indivíduos que não tenham sido

circuncidados são considerados como mninos e não

podem ter opinião nas reuniões dos qrandes, nem podem

assistir às cerimónias usuais no xinabu. da circuncisão.

Esta pode considerar-se recente e proveniente da

influência da tribo fula que habita o vizinho território

francês.

E tanto assim é que ainda hoje existe na lembrança

dos felupes o nome do indígena que lhes ensinou tal

prática - Jam Najana - o qual vero ao nosso teritório fazer

as primeiras operações para os iniciar na técnica.

A circuncisão criou foros de obrigatoriedade na tribo

felupe por os jambocosses (sacerdotes) verem nela mais

uma maneira de beber maior quantidade de vin ho de

palma e comer mais carne dos animais sacrificados no

xinabu.

A idade da circuncisão vai dos 6 anos pouco mais ou

menos até perto elos 30, visto que tal cerimónia só se

realiza, em cada povoação, de 30 em 30 anos

aproximadamente, pelo que sucede, mas raramente,

juntarem-se o pai e o filho, visto que o facto de não ser

ainda sido circuncidado não inibe de casa r.

O ano da circuncisão é marcado depois de os

jambacosses e grandes se lerem reunido no xinabu, logo

após a época das chuvas, para sacrificar um galo, que

depois é aberto para verificarem se as grândulas do

escroto apresentam cor branca ou escura. Se

apresentarem a cor branca é porque o irã da circuncisão

autoriza que a cerimónia se realize, mas se for escura

será necessário esperar nova consulta 110 ano seguinte.

No caso do irã se pronunciar favoravelmente, os

jambacosses e grandes convidam os homens da povoação

que já tenham sido circuncidados a comparecer no xina.

karen e levar cada um uma certa quantidade de vinho de

palma. Uma vez reunidos, o amañenau (jombacosse no

xinabu. da circuncisão) informa os presentes que o xinabu

autorizou que nesse ano sejam circuncidados todos os

incircuncisos e que a reunião tem por fim dar-lhes

conhecimento de tal facto e que, por consequência,

devem fornecer o vinho a ofertar de 6 em 6 dias, ao

atomit (enviado de Deus).

Começam então os bailes da circuncisão, que se

realizam de 6 em 6 dias com bebedeira colectiva de

ambos os sexos.

Uma semana antes do dia marcado para a

circuncisão, começam as cerimónias propiciatórias, que

se realizam no xinabju karen, sendo sacrificados, diária e

alternadamente suínos e caprinos, fornecidos pelos

moradores da povoação, servindo a carne dos animais

sacrificados para os jambacosses e grandes se

banquetearem regando o repasto com grandes quan-

tidades de vinho de palma.

Iniciam então a construção de um enorme cercado

feito de paus e folhas de palmeira que abrigará as

barracas necessárias para alojar os indivíduos que vão

ser sujeitos à operação. Ao mesmo tempo vão juntando a

lenha necessária para queimarem dentro das barracas

durante as noites que ali permanecerem.

Nas vésperas do dia da circuncisão sacrificam no

xinabu algumas cabeças de gado bovino, cuja carne é

destinada aos indígenas que vêm assistir à festa, sendo

o sangue dos animais sacrificados derramada no xinabu.

No dia da festa, logo de manhã muito cedo, cozinham

grandes quantidades de arroz com carne de suíno para

oferecerem aos indígenas de outras povoações que vêm

assistir à festa. Findo o repasto, começa então o baile

dos indivíduos que vão entrar para o cercado da

circuncisão, distanciado geralmente 1.500 a 2.000

metros da última casa da povoação.

Antes do amanhecer, são circuncidados os filhos dos

indígenas proprietários do terreno onde foi construído o

cercado e cerca das 9 horas os restantes.

0 trajecto da entrada do cercado para a barraca onde

estão os operadores - jibánór - os grandes incutem-lhes

coragem, dizendo-lhes que tal operação nada custa, para

o que devem estar sossegados e não gritar enquanto ela

durar, mas que se não estiverem quietos ou tentarem

resistir lhes darão a matar com um pau de que estão

munidos.

Uma vez dentro da barraca, onde também se

encontra o amañenau (jambacosse da circuncisão), os

operadores, geralmente três ou quatro, ajoelhados no

chão e empunhando afiada faca, procedem ao corte do

prepúcio, que é feito em dois golpes. Em seguida

transportam o paciente ensanguentado para fora da

barraca por uma porta oposta àquela por onde entrou, ao

extremo do cercado, onde fica aguardando que terminem

todas as operações, devendo conservar-se de joelhos,

para que o sangue que escorre do ferimento caia no

chão, cantando e tocando com dois paus que lhe são

fornecidos quando sai da barraca.

Findas todas as operações, os operadores envolvem

com folhas de tarrafe a parte operada, atando-a com uma

fina corda feita da fibra dos ramos da palmeira, cujas

pontas são apertadas atrás das costas para assim

poderem manter numa posição certa o órgão operado.

Durante as operações, para abafar os gritos ou

gemidos que os pacientes soltem, tocam

desenfreadamente uma meia dúzia de tambores, ao som

dos quais dançam e cantam os circuncisos da povoação

e das vizinhas, para que o barulho seja maior, ao mesmo

tempo que vão enchendo os estômagos com o vinho de

palma que durante três ou quatro dias toda a povoação

juntou para se beber nesse dia, Ao circunciso, enquanto

dura a cicatrização, não é permitido comer carne, peixe,

marisco ou azeite de palma, mas só o arroz cozido em

água e sal misturado com uma papa feita com os frutos

da árvore chamada mandiple (Spondias lueta}. É-lhes

também vedado fumar, beber vinho e tomar banho.

As folhas de tarrafe que servem de penso são

substituídas todos os dias, o que não evita que surjam

infecções que algumas vezes são fatais; mas, se tal

suceder a família só terá conhecimento do facto na

véspera da saída dos circuncisos da barraca e não lhe é

permitido prantear o morto. No caso de falecimento o

cadáver é enterrado dentro do cercado.

A permanência dos circuncisos nas barracas dura em

média cinquenta a sessenta dias. Durante esse tempo

nada mais fazem do que dançar, mesmo que o seu

estado de saúde não lho permita, pois a isso são

obrigados pelos grandes, e, ouvir prelecções sobre a

maneira como se devem portar para o futuro, sendo-lhes

desvendados então os mistérios das cerimónias que se

realizam no xinabu karen, como se faz o sacrifício dos

animais e tudo o que possa interessar a um felupe, com a

obrigação, porém, de ocultar às mulheres, tudo quanto

se relacione com os segredos que lhes foram revelados,

sob pena de morrer.

Durante a permanência dos circuncidados nas

barracas, nenhuma mulher se pode aproximar do

cercado, sendo a comida, destinada aos mesmos,

deixada a uma distância de cerca de 1.000 metros, onde

os grandes a vão buscar.

Entre os felupes não se pratica a deformação dos

lábios, orelhas ou

crânio e é raro

notarem-se

deformações naturais.

As crianças, tanto

do sexo masculino

como do feminino,

somente costumam

furar as orelhas com

uma agulha, durante o

período da ama-

mentação, para mais

tarde nelas enfiarem

argolas de latão ou de alumínio; tal acto não é revestido

de qualquer cerimónia.

8) Enfeites com objectos ligados ao corpo

Os indivíduos do sexo masculino, dos 10 anos até

casarem, fixam adornos no cabelo, tais como contas,

pequenos búzios, penas, plumas e pequenas chapas de

alumínio dos mais variados feitios,

Depois dos 10 anos, pouco mais ou menos, os pais

dos rapazes começam a colocar-lhes estes enfeites,

primeiro só um pequeno círculo no vértice da cabeça e, à

medida que os anos vão passando, o círculo vai aumen-

tando até formar uma espécie de gorro, que no último

ano de solteiro remata por um cordão feito de lã,

geralmente de cor vermelha.

Também colocam contas, botões brancos, búzios ou

chapas de alumínio, em fiadas, que, partindo do vértice

da cabeça, vêm terminar nos parietais e frontal. Estas

contas, búzios, botões brancos ou chapas de alumínio

são enfiadas em linha que depois é entrançada com o

cabelo, previamente deixado crescer para esse fim,

sendo as restantes partes da cabeça, rapadas à faca.

Usam ainda, tanto nas pernas como nos braços,

búzios maiores, chifres de cabra de mato, unhas de

gazela ou de onça e algumas vezes guizos e campainhas.

Além destes enfeites usam cintos feitos de búzios

pequenos que servem para segurar uma banda, cheios

também de pequenos búzios e botões, com franjas feitas

com linha branca, que colocam à frente da púbis.

As raparigas antes de casarem usam como enfeites

cordões feitos de contas e algumas também costumam

adornar a cabeça com chapas de alumínio e contaria,

vestindo nos dias de festa uma saia que lhes chega até

aos tornozelos, feita de fibra dos ramos da palmeira, ou

então um pano no qual cosem, com linhas de diversas

cores, pequenos búzios e guizoz.

Tanto os rapazes como as raparigas usam também

pulseiras e manilhas nos braços e nas pernas, feitas de

cobre, ferro ou alumínio, mas principalmente deste

último metal, que adquirem no comércio em barras que

são depois trabalhadas pelos ferreiros da povoação ao

gosto de cada um,

A todos estes enfeites não ligam qualquer significado

mágico, religioso, terapêutico ou preventivo, sendo

somente uma manifestação de luxo e bom-gosto, pois

que se morrer algum parente chegado da família do

rapaz ou da rapariga, estes imediatamente retiram todos

os adornos, não os usando durante o tempo que

estiverem de luto,

A mulher usa geralmente o cabelo rapado, costumando

cortá-lo mensalmente, assim como depila os sovacos e o

pu bis, também periodicamente, como medida higiénica,

usando para tal fim uma faca bem afiada, As raparigas

também procedem da mesma forma, mas o cabelo é

cortado parcialmente, conforme o gosto de cada uma,

visto que o corte do cabelo na totalidade somente é

obrigatório para as mulheres casadas ou viúvas a partir

de uma certa idade.

Os homens e os rapazes também depilam os sovacos

e o púbis mas não com tanta frequência como as

mulheres, rapando a barba até cerca dos 45 anos de

idade, deixando-a depois crescer para a irem aparando

de vez em quando. O cabelo usam-no crescido ou rapado

conforme desejam, empregando, tanto para cortar o

cabelo como a barba, uma faca.

9) Fabrico de tecidos e confecção de

vestuário

Nos tempos primitivos e antes de conhecerem os

tecidos de algodão que o comércio lhes vende, o

vestuário do felupe, tanto do sexo masculino como do

feminino, consistia numa espécie de lopé, feito de peles

de animais, cingido à volta dos rins e que lhes tapava os

órgãos genitais e as nádegas.

Estas peles, geralmente provenientes de animais que

caçavam, eram curtidas dentro da água salgada dos rios,

onde as mergulhavam durante dois ou três dias,

retirando-as depois para lhes rasparem os pêlos, o que

era feito com o auxilio de um pau, pisando-as em seguida

durante algum tempo para as tornarem macias. Na falta

destas tapavam os órgãos genitais com um espécie de

saia feita da fibra das folhas de palmeiras.

Hoje não aproveitam as plantas para a confecção de

vestuário e desconhecem a tecelagem e estampagem de

tecidos. Nota-se, actualmente, uma certa tendência para

a tinturaria, pois que adquirem no comércio a chamada

banda branca, para, depois de a tingirem geralmente de

azul, confeccionarem os seus panos.

O vestuário do indígena felupe, enquanto rapaz

consiste num1 lopé feito de pano, mais ou menos largo

para tapar os órgãos sexuais <! depois de casado

continua a usar o mesmo lopé; mas, se tem necessidade

de vir a um centro civilizado traça um pano pelos ombros

e usa um outro mais pequeno que cinge à cintura e que

geralmente lhe chega ao meio da perna.

As raparigas, dentro das suas povoações ou no mato,

usam uma banda ou um lenço e as mulheres um pequeno

pano, mas tanto as raparigas como as mulheres se têm

de sair das suas povoações, vestem por cima da banda,

lenço ou pano um outro maior que lhes chega até aos

joelhos, tapando com ele os seios.

Não existe qualquer moda na maneira de trajar,

vestindo-se cada um da maneira que lhe apetece, mas

ultimamente alguns, devido aos esforços das

autoridades, já se apresentam vestidos com calções,

camisolas e camisas de diversos feitios.

O vestuário dos mortos compõe-se de uma espécie

de túnica feita de panos azuis, aos quais dão o nome de

xaulen. Estes panos são rasgados de maneira que uma

parte sirva para serem envolvidos os braços e as mãos,

separados do corpo, e da cabeça à ponta dos pés, sendo

depois cosidos com qualquer qualidade de linha e na

falta desta com fibra extraída da folha de palmeira.

Primitivamente, antes de conhecerem os panos, os

cadáveres eram amortalhados em folhas de bananeira ou

de palmeira e cosidas estas folhas com a fibra das

mesmas.

O sinal de luto do indígena felupe consiste em

cordões feitos de linha preta ou azul, mais ou menos

grossos conforme o grau de parentesco, que colocam no

pescoço, braços e até nas pernas.

O grau de limpeza dos panos dos indígenas pode

dizer-se que não é nenhum, visto que nunca os lavam

com receio, certamente, que lavando-os com frequência

mais rapidamente se romperão; o mesmo não sucede

com as camisas, camisolas e calções que vestem, pois

estes, de vez em quando, já vêem um pouco de água.

O felupc usa chapéus e barretes que adquire no

comércio e outros que confecciona com folhas de cibe e

aos quais dá o nome de unkuau, apreciando mais o

barrete, geralmente de cor vermelha. Não faz uso de

calçado de qualquer espécie.

10) Meios de existência.

Instrumentos, ferramentas e

armas

Os instrumentos agrícolas usados pelo indígena felupe

são três. Um é o arado, que é constituído por uma

espécie de colher de madeira, com o feitio mais ou

menos oval, de 50 centímetros de comprimento por 15 a

20 centímetros de largura, revestida na ponta por uma

chapa de ferro batido, ligada a um cabo, cujo

comprimento varia

entre 2 a 2,5 metros,

por uma espécie de

vime a que dão o

nome de kaçit. Este

instrumento a que o

felupc dá o nome de

bujãd é por eles

confeccionado com

madeira de tarrafe e

destina-se à

preparação dos

terrenos para a

cultura do arroz,

mandioca c batata-

doce, para a abertura

de covas e valas e, ainda, para a extracção de barro para

as suas construções.

Antes de conhecerem o ferro com que hoje revestem

a ponta deste instrumento, submetiam a madeira ao fogo

para que oferecesse maior resistência.

O segundo é um instrumento que se compõe de um

cabo de madeira com cerca de 5D centímetros de

comprimento, tendo encaixada na extremidade uma

lâmina de ferro batido cujo tamanho varia entre 12 a 15

centímetros de comprimento e 3 a 5 centímetros de

largura, instrumento a que dão o nome de ikanumai e se

destina principalmente ao corte dos ramos das palmeiras

e dos respectivos frutos, servindo também algumas

vezes para a abertura de pequenas covas.

O terceiro é o chamado terçado que adquire no

comércio, sendo com ele que corta as árvores e arbustos

e que serve também como arma de defesa ou de ataque.

Dá a este instrumento o nome de endip e pode-se dizer

que é o principal instrumento do indígena felupe, pois

com ele faz os mais variados trabalhos.

Além do referido terçado usa ainda a flecha - emer -

que é atirada com um arco a que dão o nome de kau-ajã

e em cuja construção empregam a madeira de tarrafe. As

flechas são feitas com tara - ugau-u - e terminam numa

ponta em ferro que .tanto pode ser de feitio triangular,

como aguda ou de arpão; quando ainda não conhecia o

ferro utilizava para as pontas das flechas os ossos que

um peixe conhecido na colónia por esquilão tem na parte

dorsal e nas barbatanas. O ferro é metido na haste da

tara ligando-o depois com a fibra - koná-inême - tirada da

casca da árvore conhecida por farroba, O arco é

confeccionado com pau de tarrafc e fibra da palmeira ou

vime.

O indígena felupe tem mais receio de ser ferido com

uma flecha que tenha como ponta o osso do peixe acima

referido, a que dá o nome de kulógé-u, do que com uma

de ferro, pois estão convencidos que os ferimentos

provocados com a primeira causam a morte, mesmo que

não atinjam qualquer órgão essencial, caso não sejam

aplicadas imediatamente à ferida folhas de tarrafe

depois de bem pisadas.

Possui também facas que servem para os mais

variados serviços, sendo principalmente com elas que

confecciona os arados, colheres e pratos onde come, e

empregando-as também como armas de defesa e instru-

mento agrícola, visto que servem de foice para o corte

de arroz.

O ferro para as suas necessidades é adquirido ao

comércio em barras e depois manufacturado pelos

ferreiros - é-ilei.

As restantes matérias-primas, tais como a madeira

de tarrafe, tara, fibras de palmeira ou de vime são

próprias da região e quase todos os indígenas

confeccionam os instrumentos e utensílios que

necessitam, só recorrendo ao ferreiro para lhes modelar

as peças de ferro.

Não extrai da terra substâncias minerais.

A cordoaria para as suas necessidades é feita

principalmente com a fibra dos ramos de palmeira, de

casca da árvore conhecida na Colónia pelo nome de

calabaceira e à qual o felupe dá o nome de bubabul,

empregando algumas vezes uma espécie de trepadeira a

que dá o nome ele bulilab.

Estas fibras, depois de despojadas da parte exterior,

são torcidas para ficarem mais maleáveis e entrançadas

a seguir; fazem maior uso da casca da calabaceira por a

fibra desta árvore ser mais macia e cferecer maior

resistência, depois de entrançada.

Confecciona cestos para o que emprega como

matéria-prima a folha da palmeira leque, depois de a

expor ao sol durante um a dois dias. Estes cestos - ekut -

têm diversos tamanhos, sendo confeccionados pelas mu-

lheres. Os cestos destinados à lavagem do arroz - kapaçíi

- são feitos de vime ou da parte mais resistente da folha

de palmeira.

Raro é o felupe que se dedica à aprendizagem de

ofícios e têm pouca ou quase nenhuma aptidão para os

aprender.

O único ofício que existe na tribo felupe é o de

ferreiro, mas este só pode ser exercido pelos filhos

varões de outro ferreiro, ou pelos netos dele havidos de

filha ou filho.

É crença entre eles que se o filho varão de um

ferreiro ou neto deste pela linha materna, na falta de

filho, se recusar a seguir o ofício de seu pai ou do seu

avô, o irã castigá-lo-á dando-lhe uma doença que lhe

atacará a pele, enchendo-a de flictenas como se tivesse

sido queimada.

11) Caça

o indígena felupe caça a gazela - kuku-iél -, a gazela

de lala - uiiteku -, a cabra de mato - erijel-, a lebre -

jabenden -, o macaco - eñer -, o hipopótamo - éóga -, a

galinha de mato - uçiñei - e a perdiz - ujab.

Fazem caçadas colectivas antes de começarem as

chuvas, com o fim de saberem se o ano agrícola que se

aproxima será bom ou mau; se matarem muita caça é

sinal de que será óptimo e se por qualquer circunstância

não abaterem nenhuma peça de caça grossa, isto

significa que o emit (Deus) não está satisfeito com eles.

Se assim acontecer a povoação reune-se a convite do

aleleu (jambacosse do xinabu katit) que determina que

se arranje uma

cabeça de gado

bovino para

sacrificar no

referido xinabu,

pedindo-lhe

perdão por não

terem feito

sacrifício há

mais tempo.

No dia

seguinte voltam

novamente a fazer a caçada que então é dirigida pelo

aleleu e se matarem caça grossa é sinal de que o emit os

desculpou e que talvez o ano agrícola seja bom. A caça

abatida é depois repartida por todos os varões da

tabanca, mesmo que sejam de mama, sendo vedado às

mulheres comer desta carne.

Nestas caçadas fazem uso de espingardas de carregar

pela boca a que os felupes dão o nome de kapunbenek e

flechas, Levando também terçados e facas para acabar

de matar a caça que fique ferida.

Antes de saírem para a caçada vão ofertar ao xinabu

katit uma porção de vinho de palma, pedindo-lhe para

que esconda as onças ou qualquer outro animal feroz, a

fim de se não encontrarem com eles.

Só costuma fazer ratoeiras para apanhar o

hipopótamo, não usando laços ou armadilhas, nem

imitando o canto das aves ou som de outros animais,

assim como também nâo emprega disfarces ou animais

auxiliares.

Não respeita ninhos ou ninhadas de qualquer espécie

e, nas batidas colectivas, em que o mato é cercado,

convergindo todos os caçadores para o mesmo ponto,

abate todas as aves ou animais que passam ao alcance

das suas flechas e longas e aproveita todos os animais

abatidos para a sua alimentação.

Nestas caçadas não podem sair dos limites entre

eles convencionados para cada povoação e se por

qualquer circunstância uma peça de caça que tenha sido

ferida vai morrer dentro do limite de outra povoação, ela

pertence não ao caçador que a abateu, mas sim ii

povoação onde foi cair morta.

Não costuma caçar individualmente, mas como

nunca vai para o mato sem ir munido do seu arco e

respectivas flechas, se vê alguma peça de caça, não

resiste à tentação de lhe atirar.

12) Pesca

A pesca é livre dentro das águas territoriais de cada

povoação, não podendo no entanto um felupe de Susana

ir pescar em águas da povoação de LaIa ou o daqui nas

da povoação de Bolor.

Após a época das chuvas e quando se inicia a pesca

intensiva, vão ao xinabu katit ofertar-lhe vinho de palma

ou aguardente de cana para que a pesca seja abundante.

Pescam o barbo - utin -, a tainha - açuk -, a bicuda -

ékul - ,o jótó - étu -, o bagre - ejãten -, o esquiIão - kulógé-u

-, o camarãov - bakõ - e o caranguejo - ékub -, que

destinam parte à sua alimentação e outra à venda ou

permuta por vinho de palma.

Não costuma fazer o envenenamento das águas para

apanhar f) peixe, fazendo uso da rede ou da linha; pesca

também com as flechas, mas a maior quantidade de

peixe é apanhada nas gamboas que faz, geralmente, nas

embocaduras dos rios mais pequenos.

Estas gamboas - iálen - são construídas com paus de

tarrafe e folhas de palmeira entrelaçadas. As redes são

confeccionadas com linha que adquire no comércio,

designando-as por ebelem, comprando também os anzóis

- aliçor - e o fio próprio para a pesca à linha ao qual dão o

nome de ekol.

Tanto as redes como as gamboas são

confeccionadas pelo indígena felupe, fazendo cada um a

sua, pois que não há indivíduos que se dediquem à sua

construção para venda.

A pesca nos rios é feita tanto pelos homens como

pelas mulheres, mas estas dedicam-se mais à pesca da

bentana - kakabine - que se realiza geralmente nas

bolanhas com um cesto especial, por elas construído

com folhas da palmeira.

O indígena felupe pesca geralmente durante todo o

ano, mas a pesca intensiva é efectuada durante a época

seca, visto que é nesta altura que procede à secagem do

peixe.

Esta secagem, como já se disse, é feita por dois

modos, não oferecendo qualquer deles grande garantia.

Com o peixe miúdo dá-se primeiramente o

apodrecimento intencional.

O mesmo não sucede com o peixe de tamanho maior

que é aberto para urna ligeira limpeza, deitando-lhe em

seguida um bocado de sal antes de ser posto a secar.

O peixe, logo que esteja seco, é metido numa espécie

de saco feito de folhas da palmeira leque, com

capacidade para cerca de dez quilos de peixe e em cuja

embalagem é vendido.

Costuma guardar algum peixe seco para o seu

consumo durante a época das chuvas, colocando os

sacos por cima do local onde cozinham, para que o fumo

o conserve durante mais tempo, o que não evita que o

mesmo não se encha de bichos; mas, mesmo assim, é

cozinhado e comido.

13) Aqricultura

O felupe aproveita para comer os frutos das árvores e

arbustos que seguem:

Também come as raízes do nhame às quais dá o

nome de kubak.

Das provisões acumuladas pelos animais o indígena

felupe somente se utiliza do mel, para o que coloca nas

árvores colmeias de troncos de palmeira, não

aproveitando no entanto a cera produzida pelas mesmas.

O felupe, como quase todo o indígena da Guiné,

encontra-se ainda numa fase atrasada da agricultura,

não empr:egando a charrua tirada por animais, fazendo

somente uso do instrumento atrás mencionado a que na

Colónia dão o nome de arado.

Cultiva o arroz - emãn - em quantidade suficiente para

as suas necessidades alimentares, bem como a

mandioca - kãtak -, cultivando em menor escala a batata

doce - abatatai - e o feijão frade – kuçak. Não se dedicam

à cultura do tabaco e nem à de plantas medicinais ou

venenosas, assim como não sabem extrair a borracha.

O felupe do nosso território desconhece a maneira

como se cultivam as oleaginosas, colhendo somente os

frutos da palmeira - kataç - para vender no comércio e

respectiva amêndoa - itau -; mas, a maioria dos

indígenas despresa uma grande riqueza - o óleo de palma

- visto que para fazerem o aproveitamento da amêndoa,

deixam ficar amontoados no mato os frutos, para que

com a chuva se dê o apodrecimento da polpa.

Seguem-se os nomes das árvores que conhece bem

como a aplicação que lhes dá:

O felupe cultiva os terrenos de aluvião, onde realiza

a plantação de arroz. Nestes terrenos são lançadas,

perto da época das chuvas, as cinzas provenientes da

combustão da lenha que utiliza para cozinharem e excre-

mento dos bovinos que acumula durante o ano.

Cultiva também terrenos onde semeia o chamado arroz

de sequeiro, geralmente um pouco distanciados das

povoações, escolhendo para isso os mais ricos em

humus. Estes terrenos são deixados em repouso durante

4 ou 5 anos findos os quais se procede ao corte dos

arbustos que, depois de secos, são queimados.

Depois de feita a queimada, o terreno é levemente

mexido com o auxílio do arado e são lançadas à terra

pelas mulheres as sementes que as primeiras chuvas se

encarregam de meter pela terra dentro.

Os terrenos para a cultura do arroz, mandioca, batata

doce c feijão frade, são preparados com o arado, em

camalhões mais ou menos largos, sendo a mandioca

cultivada, geralmente, nos quintais.

Faz uso de valas para escoante das águas das

chuvas, quando estas são demasiadas e desde que o

terreno permita tal escoante.

O felupe aproveita os terrenos das margens dos rios

para a cultura do arroz, construindo barragens a fim de

evitar que a água salgada os

invada. Nestas barragens, e um pouco acima do nível dos

terrenos, coloca um tronco de cibe ou de palmeira

escavada que as atravessam a toda a largura e que se

destina a dar saída à água em excesso, ou dar entrada à

do rio, na maré cheia, se a chuva escasseia; mas só em

último recurso assim procede pois que sem água das

chuvas a produção de arroz é menor.

Antes de iniciar a preparação dos terrenos para as

culturas e semear o arroz nos viveiros, vai ao xinabu katit

ofertar vinho de palma e sacrificar uma cabeça de gado

bovino, que é adquirida por toda a povoação, para que as

lavouras corram conforme o seu desejo.

Logo que tenha feito as plantações, principalmente

do arroz, novamente volta ao xinabu com mais vinho e

sacrifica então um suíno em sinal de reconhecimento,

caso a chuva tenha sido abundante, ao mesmo tempo

que pede para que o arroz produza bem. Mas se por

qualquer circunstância a chuva tiver sido pouca, então

sacrifica ao xinabu katit uma cabeça de gado bovino

pedindo ao emit para mandar chuva em abundância.

Depois de terminada a ceifa e guardado o arroz na

palhota faz nova cerimónia de agradecimento e, se a

produção foi abundante, sacrifica dois ou mais suínos e

vinho de palma em maior abundância.

O indígena felupe conhece a época das sementeiras

pelas chuvas.

Logo após as primeiras chuvas prepara os terrenos

semeando em seguida o arroz de sequeiro, ao mesmo

tempo que lança nos viveiros o que mais tarde

transplantará para as bolanhas : esta transplantação é

levada a cabo assim que as plantas atingem uma altura

de trinta centímetros, pouco mais ou menos, e à medida

que os terrenos vão ficando prontos para as receber.

A ceifa do arroz é feita logo que este atinja a

maturação, sendo amarrado em pequenos molhos, que

depois são transportados para a palhota e guardados

nuns estrados feitos de paus. A debulha somente é

efectuada à medida que o arroz vai sendo necessário

para consumo ou para vender.

Os instrumentos que empregam nas suas culturas

são como já se disse, o arado, o terçado, um pedaço de

pau destinado a abrir as covas para a transplantação do

arroz e uma faca para proceder o seu corte, quando

esteja sazonado.

Logo que o arroz forme a espiga começam a ser

vigiadas as culturas, para evitar que os animais e aves

as danifiquem, estando este trabalho a cargo dos

rapazes de 6 a 12 anos, que constroem no local uma

pequena barraca para se abrigarem do sol.

Nos trabalhos agrícolas empregam-se homens,

mulheres, rapazes c raparigas depois dos 15 anos de

idade, pertencendo, aos indivíduos do sexo masculino, a

preparação dos terrenos e, aos do sexo feminino, o

arranque das plantas dos viveiros, o seu transporte para

as bolanhas, trabalhos de plantação e monda, quando

esta é necessária, colheita e condução do cereal para

casa.

O indígena felupe basta-se a si próprio sob o ponto de

vista agrícola, não necessitando de recorrer aos

produtos de fora da região, pois que uma parte do arroz

que colhe, embora pequena, é vendida ao comércio para

satisfazer as suas necessidades de artigos de algodão e

outros.

14) Animais domésticos

o felupe cria suínos -Ekunb -, caprinos –Ejamem

-, ovinos - Eqirininei -, bovinos - Ébé - e galinhas - Ekerin.

Destes animais os que lhe merecem mais cuidados

são os suínos e as galinhas, visto que uns e outros

servem para serem sacrificados no xinabu, Aos suínos

costuma dar os restos da comida e a água proveniente

da lavagem dos pratos onde comem e das panelas onde

cozinham.

Com as galinhas os cuidados reduzem-se a guardá-

las enquanto são pequenas, chegando-as a levar para o

mato, dentro de um cesto, caso a família tiver de sair de

casa durante todo o dia, para evitar que o falcão lhas

apanhe.

Na época seca, tanto os suínos, como caprinos e

ovinos vagueiam pelas povoações e pelo mato à volta,

só sendo recolhidos à noite; mas, durante as chuvas,

prendem-nos para que não estraguem as culturas.

O gado bovino é pastoreado pelos rapazes dos 7 aos

12 anos, que não escolhem zonas apropriadas para nelas

o apascentarem, limitando-se a levá-lo pela manhã para

as bolanhas ou para o mato durante at época pluviosa;

no tempo seco o gado vai para onde quer, chegando a

dormir no mato Se a noite ali o surpreende, pois que só

nas chuvas têm o cuidado de o recolher, para que não

danifiquem o arroz, metendo-o no corredor da palhota ou

numa das divisões da mesma.

Não conhecem ervas impróprias para a alimentação do

gado, nada fazendo para o defender delas, acontecendo

algumas vezes os animais morrerem por terem ingerido

ervas venenosas, o que é sempre atribuído a manejos do

feiticeiro. Não defendem os animais dos parasitas por

desconhecerem a maneira de o fazer.

O felupe não tem épocas fixas para a matança de

gado e geralmente só o abate nas cerimónias que fazem

no xinabu ou nos funerais indígenas, sendo incapaz de

abater uma cabeça de gado destinada exclusivamente à

sua alimentação ou para venda.

Dos bovinos abatidos nos funerais ou no xinabu,

aproveitam as peles para servirem de cama, os chifres

para fazerem flautas e dos ovinos c caprinos também

aproveitam as peles para forrarem os tambores mais

pequenos e os chifres para colocarem nas pernas e nos

braços dos mancebos, como enfeite.

Raramente um felupe vende uma cabeça de gado

bovino e isso só acontece se tem uma necessidade

urgente de dinheiro.

(Continua]

António da Cunha

Taborda Chefe de Posto