13
1 GENEROSO: UMA LENDA E UM MISTÉRIO 1 Eliane Martins Coelho 2 Alessandra Schettert Fava 3 Resumo: Uma cidade é formada por uma complexidade de fatores, dentre eles a sua população e os aspectos culturais. No entanto, alguns atrativos culturais parecem não receber o reconhecimento necessário e ficam à disposição da comunidade, mas em situação de esquecimento e, consequentemente, sem um aproveitamento mais adequado, como seu uso para desenvolvimento ou valorização do turismo cultural. Este artigo abordará a situação do mural de pastilhas vitrificadas com a imagem de um Índio Laçador Charrua, exposto na parede externa de um prédio no Centro da cidade de São Borja, apresentando sua história, as dificuldades de apresentar informações sobre este atrativo e sugestão de melhor aproveitamento para o mesmo. Palavras-chave: Turismo cultural, atrativo cultural, valorização cultural. Introdução Como a sociedade tem sua arte apresentada de diferentes formas, algumas expressões causam maior impacto ou chamam a atenção, outras ficam escondidas e de acesso restrito, e algumas, mesmo que explícitas a todo público, perdem seu sentido ou atrativo com o tempo, seja porque a sociedade local acostumou com a paisagem e não se encanta mais, ou porque o patrimônio se transforma pela ação do tempo e perde seu brilho, ou porque a rotina atual é tão rápida e intensa que uma expressão de arte não prende a atenção. Uma destas situações atingiu um painel de pastilhas vitrificadas, com a figura de um índio, exposto numa das paredes externas do prédio que fica localizado na esquina das ruas Cândido Falcão e Coronel Lago, no bairro Centro da cidade de São Borja. 1 Grupo de Trabalho (GT) Gastronomia e Turismo – 01 2 Bacharel em Turismo pela PRC/RS e mestre em Turismo pela UCS. Docente do curso tecnológico de Gestão do Turismo do IF Farroupilha, campus São Borja. E-mail: [email protected] 3 Acadêmica do curso tecnológico de Gestão de Turismo do IF Farroupilha, campus São Borja. E-mail: [email protected]

GENEROSO: UMA LENDA E UM MISTÉRIO1omicult.org/emicult/anais/wp-content/uploads/2016/10/GENEROSO_UMA... · parede externa de um prédio no Centro da cidade de São ... Tratam-se de

  • Upload
    ledieu

  • View
    213

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

1

GENEROSO: UMA LENDA E UM MISTÉRIO1

Eliane Martins Coelho2

Alessandra Schettert Fava3

Resumo: Uma cidade é formada por uma complexidade de fatores, dentre eles a sua

população e os aspectos culturais. No entanto, alguns atrativos culturais parecem não receber

o reconhecimento necessário e ficam à disposição da comunidade, mas em situação de

esquecimento e, consequentemente, sem um aproveitamento mais adequado, como seu uso

para desenvolvimento ou valorização do turismo cultural. Este artigo abordará a situação do

mural de pastilhas vitrificadas com a imagem de um Índio Laçador Charrua, exposto na

parede externa de um prédio no Centro da cidade de São Borja, apresentando sua história, as

dificuldades de apresentar informações sobre este atrativo e sugestão de melhor

aproveitamento para o mesmo.

Palavras-chave: Turismo cultural, atrativo cultural, valorização cultural.

Introdução

Como a sociedade tem sua arte apresentada de diferentes formas, algumas expressões

causam maior impacto ou chamam a atenção, outras ficam escondidas e de acesso restrito, e

algumas, mesmo que explícitas a todo público, perdem seu sentido ou atrativo com o tempo,

seja porque a sociedade local acostumou com a paisagem e não se encanta mais, ou porque o

patrimônio se transforma pela ação do tempo e perde seu brilho, ou porque a rotina atual é tão

rápida e intensa que uma expressão de arte não prende a atenção.

Uma destas situações atingiu um painel de pastilhas vitrificadas, com a figura de um

índio, exposto numa das paredes externas do prédio que fica localizado na esquina das ruas

Cândido Falcão e Coronel Lago, no bairro Centro da cidade de São Borja.

1 Grupo de Trabalho (GT) Gastronomia e Turismo – 01 2Bacharel em Turismo pela PRC/RS e mestre em Turismo pela UCS. Docente do curso tecnológico de Gestão

do Turismo do IF Farroupilha, campus São Borja. E-mail: [email protected] 3 Acadêmica do curso tecnológico de Gestão de Turismo do IF Farroupilha, campus São Borja. E-mail:

[email protected]

2

Este estudo foi motivado pela curiosidade em relação ao mural pelo fato de que

atualmente uma das autoras reside no prédio. Caracteriza-se como uma pesquisa exploratória,

pois observou-se a falta de materiais e documentos a respeito do objeto pesquisado. Também

há o suporte bibliográfico e a realização de uma entrevista estruturada com uma antiga

moradora do prédio.

O problema motivador deste estudo foi a averiguação quanto a representação expressa

no painel, pois o primeiro morador e idealizador do prédio escreveu um livro usando como

base uma lenda local de um índio chamado Generoso, e ficou a questão: seria este mural a

representação desta figura lendária?

O objetivo geral deste trabalho é buscar informações sobre esta figura, identificando

sua representação e origem. Como objetivos específicos busca-se compreender a história

desta expressão artística, valorizá-la como patrimônio cultural municipal e sugerir seu

aproveitamento em atividades turísticas locais.

Acredita-se que São Borja é uma cidade com real potencial turístico, e além dos

patrimônios culturais que são reconhecidos pela população e poder público, é possível que

existam mais atrativos não identificados e explorados, caracterizados como bens materiais e

imateriais, que poderão ampliar a estrutura do produto turístico local, motivando a

movimentação de turistas.

Turismo Cultural

O turismo é um fenômeno social complexo, de caráter humano, envolvendo a mútua

relação entre produção e serviços em uma localidade, visando o seu desenvolvimento

(econômico e social), a preservação ambiental, o prazer e a auto realização dos envolvidos.

É uma atividade dinâmica que envolve deslocamento, alojamento, alimentação,

aspectos culturais, paisagens, hospitalidade, trocas (econômicas, socais e culturais) entre os

envolvidos, oportunizando aos visitantes momentos de informação, lazer e entretenimento.

O fenômeno turístico, ou a atividade turística, tem um aspecto social tão importante

quanto o desenvolvimento econômico, isto é, a possibilidade de expansão do ser humano,

3

seja pelo divertimento ou pela possibilidade de conviver com novas culturas e enriquecer os

conhecimentos através das viagens.

Dentre as possibilidades de ações de desenvolvimento turístico de uma localidade está

a exploração dos atrativos culturais, que podem ser compreendidos como ações humanas que

geram produtos materiais e imateriais, que distinguem os povos entre si e, por isso, se tornam

atraentes (MARTINS, 2003).

O turismo é uma atividade que pode ser classificada mediante o tipo de atração que

promoverá o interesse pela viagem. Dentre as opções está o turismo cultural, que compreende

as atividades turísticas relacionadas à vivência do conjunto de elementos significativos do

patrimônio4 histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens

materiais e imateriais da cultura (BRASIL, 2006).

A partir disso, é possível interpretar que o turismo cultural se utiliza de cada fato,

história, lenda, paisagem e atrativo que torna aquele local único para motivar o turista a

conhecer o destino. Portanto, uma lenda pode também ser uma forma de atrair pessoas.

São Borja é uma cidade rica em patrimônio cultural e histórico e é evidente sua

potencialidade turística. No entanto, aspectos como a distância de outras localidades e o

acesso apenas por via terrestre no momento, fazem com que o local tenha a necessidade de

oferecer um roteiro bem estruturado, diversificado e repleto de possibilidades que ocupem o

tempo do turista e motivem seu deslocamento.

De acordo com Rodrigues (2009, p. 15)

O turismo cultural, tal qual o concebemos atualmente, implica não apenas na

oferta de espetáculos ou eventos, mas também a existência e preservação de

um patrimônio cultural representado por museus, monumentos e locais

históricos. Além do valor cultural específico, do ponto de vista do turismo

cultural, esses bens materiais possuem outro valor, o de serem objetos

indispensáveis, cujo consumo constitui a base de sustentação da própria

atividade.

4 Patrimônio é um bem, algo com valor agregado que se torna importante para uma sociedade e pode ser

identificado como natural, cultural ou histórico (FURNARI; PELEGRINI, 2009).

4

Sendo assim, cada espaço ou expressão identificado com significados diferenciados

deve ser analisado pelos agentes do desenvolvimento turístico local, buscando ampliar as

possibilidades de atrativo da cidade. Neste sentido, o painel de pastilhas vitrificadas do Índio,

no Centro da cidade de São Borja, torna-se um interessante objeto de estudo.

Atrativos e Representações culturais

Os atrativos estão relacionados com a motivação de viagem do turista e a avaliação

que os mesmos fazem deste elemento. Conforme Ignarra (2002, p. 28) “atrativo turístico é o

recurso natural ou cultural que atrai o turista para visitação”.

De maneira geral, as diferentes formas de manifestação da cultura são constituídas a

partir da convivência em sociedade, e a valorização e reconhecimento destas expressões

estabelecem os patrimônios, que se constituem na materialização das tradições, costumes,

modo de viver, através de expressões artísticas, religiosas, comportamentais, entre outros.

Conforme Martins (2003, p. 45), “a ideia de patrimônio cultural abarca todos os

aspectos da atividade humana e conduz a uma revalorização do natural e do meio ambiente

como algo relacionado com o homem e manipulado por ele”. Desta forma, cada grupo social

desenvolve sua própria cultura e institui seus patrimônios, que são revelados de forma

material e imaterial, através de experiências e vivências, e passados de uma geração a outra

de diferentes formas.

As lendas são exemplos de patrimônios culturais. Tratam-se de narrativas transmitidas

oralmente pelas pessoas com o objetivo de explicar acontecimentos misteriosos ou

sobrenaturais (ARAÚJO, 2016). As lendas podem envolver e mesclar fatos reais e fantasiosos

e, por vezes, representar uma forma de atrativo turístico a um local ou comunidade.

A representação cultural de uma lenda pode ser manifestada não apenas pela

expressão tradicional que ocorre pelo relato oral, mas também através de outras

representações como a forma escrita, esculturas e murais, passando a conviver com o

cotidiano da comunidade local de forma física e, por vezes, tornando-se um atrativo que

motiva outras pessoas a conhecer aquele local ou, de forma mais modesta, integrá-lo em um

5

roteiro turístico, juntamente com um conjunto de outros atrativos, que torna um destino

atraente.

Ignarra (2002, p. 48) destaca que “é bastante usual que elementos que compõem o

cotidiano das pessoas que residem em determinada localidade não lhes chame a atenção e se

mostrem extremamente atrativos para os visitantes que não participam deste cotidiano”.

Situação semelhante a esta parece ocorrer com o mural do Índio, localizado em um prédio no

Centro da cidade de São Borja, uma obra de arte que é corriqueira aos olhos locais, apesar da

sua beleza e história intrigante.

A Cidade de São Borja

Localizada na fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul, a cidade de São Borja é

rica em questões patrimoniais e culturais.

Originada a partir da instalação da Redução Jesuítica de São Francisco de Borja, no

ano de 1682, a cidade é conhecida como o primeiro dos sete povos das missões, pois foi a

primeira redução a ser criada no lado oriental do rio Uruguai (RODRIGUES et. Al., 2013).

Enquanto município, São Borja nasceu a partir do desmembramento do município de

Rio Pardo em 12/12/1887, através da Lei nº 1.614. A Comarca foi criada através da lei 1.020,

de 11/03/1833 desmembrado de Rio Pardo. É sem contestação, o núcleo habitacional

permanente mais antigo do território rio-grandense do sul. Até a derrocada em 1756, os

Jesuítas incrementaram a pecuária extensiva, o artesanato, o cultivo da terra e deixaram o

primeiro plano diretor do município (SÃO BORJA, 2016).

A área total de São Borja é de 3.371.051 Km², sendo que apenas 71 Km² se

caracterizam como área urbana, sendo a restante área rural. Conforme censo do IBGE5 de

2010 a população do município é de 61.433 habitantes. Não foram encontrados registros

exatos, mas sabe-se que a maior parte da população reside na área urbana.

5 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, dados do censo de 2010, disponíveis em

http://www.saoborja.rs.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=68&Itemid=1331. Acesso em

julho de 2016.

6

Apesar de não existir resquícios edificados deste período inicial, São Borja ainda

apresenta a mesma estrutura urbana no Centro da cidade que remete ao período missioneiro.

Também possui estatuárias e artefatos sacros em locais com acesso público (igrejas e

museus), além que alguns lugares e espaços do município apresentarem nomes guaranis.

A riqueza cultural de São Borja ainda se apresenta através do slogan “Terra dos

Presidentes”, fazendo referência aos políticos Getúlio Vargas e João Goulart, tendo

patrimônios materiais vinculados a suas memórias. A população também tem seus artistas

locais, que se destacam em diferentes formas de expressão cultural, além de mitos e santos

populares, e todo este conjunto de itens formam um patrimônio cultural representativo da

sociedade são-borjense.

Os Angüeras e a Lenda do Índio Generoso

O Grupo Amador de Arte “Os Angüeras” foi criado em 10 de março de 1962, com

atuação nos campos da música, do teatro, da literatura regional e da pesquisa do folclore. O

grupo surgiu a partir do chamado “clube dos dez”, composto por um conjunto de amigos que

se reuniam com objetivo de passar o tempo.

A palavra “anguera”, de acordo com o dicionário guarani (Diaz, 1991), significa alma.

De acordo com Rillo (2016), Angüera significa espírito que volta ou alma que volta ao corpo.

Conforme a lenda, o "Angüera" antes triste e caladão, virou cantador e tocador de

viola, depois que os padres das Missões o batizaram e lhe deram o nome de Generoso e,

assim, na mitologia missioneira "Angüera" pode ser considerado o patrono da música e da

alegria gaúcha.

O Grupo Amador de Arte “Os Angüeras”, desde outubro de 1982, mantém à

disposição da comunidade o Museu da Estância, espaço especializado em ergologia

campeira, com peças e cenários que remetem a história de desenvolvimento das lidas do

campo.

7

Além disso, o grupo ainda possui um espaço de eventos, para realização de atividades

privadas ou com entrada por adesão, sempre com o enfoque nativista. Este grupo também é

responsável por promover o Festival da Barranca6.

Tratar sobre a lenda do Índio Generoso sem mencionar este grupo de arte amador é

deixar de estabelecer um vínculo importante entre a origem deste patrimônio imaterial e sua

disseminação local.

Painel do Índio

O Generoso é uma figura emblemática, ou misteriosa, enaltecida pelo Grupo Amador

de Arte Os Angüeras através da música “Canto a Angüera”. Apesar da comunidade são-

borjense conhecer e fazer referência aos Angüeras, nem todos conhecem o significado do

nome de origem indígena.

Rillo (2012, p. 44), ao tratar sobre o tema crendice popular, explica que a lenda local

do Generoso, não se trata da mesma figura expressa pelos Angüeras como sendo o índio

missioneiro que tomou este nome após haver sido batizado pelos Padres das Reduções.

O Generoso são-borjense é uma espécie de bom fantasma que

aparece para aqueles que, especialmente pobres e doentes, têm

dificuldades em levar a cabo uma tarefa: carpir uma roça, cortar

lenha, repontar uma ponta de gado, lavrar uma pequena lavoura

com arado de boi. Revestido de forma humana, vestido como um

gaúcho pobre, faz com que seu protegido, logo após dar-se conta da

sua presença, adormeça. Assume, ele, a tarefa difícil. Ao acorda-se

o auxiliado, minutos após, o “Generoso” já desapareceu e o serviço

está pronto e acabado.

Seguindo esta representação são-borjense, o médico e escritor Ivo Drago7 lança em

2002 a obra “Generoso... A lenda que o rio levou”, e demonstra seu apreço pela cidade e sua

beleza patrimonial imaterial, expressa na utilização da lenda como base para seu livro. No

6 Festival de música nativista que ocorre às margens do rio Uruguai desde 1972.Tem como características

ocorrer durante a Semana Santa, não permite a presença de mulheres e as composições são realizadas em

período inferior a 24 horas. 7 O médico Ivo Schiavo Drago, nasceu em São Borja, dia 26 de outubro de 1924 e faleceu em 2008. Autor dos

livros: Generoso, A lenda que o Rio Levou, No Caminho das Estrelas. E seu último livro, lançado in memoriam,

“O Contador de Histórias – Causos do Rio Grande”. Fonte: http://palavrasfrancas2.blogspot.com.br/2013/09/o-

imortal-apaixonado-pelo-rio-grande.html.

8

entanto, percebe-se que esta admiração ultrapassa a literatura e atinge a expressão visual,

concretizada através de um mural exposto em uma parede externa de sua residência.

Conforme entrevista concedida pela senhora Rejane Maria Drago8, o prédio de dois

andares localizado na esquina das ruas Cândido Falcão e Coronel Lago levou 7 anos para ser

construído, entre os anos de 1953 e 1960. Abriga na totalidade da parede desta segunda rua

(lado norte do prédio), um mural com dimensões de aproximadamente 7 X 4 metros, feito em

pastilhas vitrificadas, com autoria do artista Danúbio Gonçalves9. A entrevistada acrescentou

a informação de que obras feitas em metal e pastilhas o autor não costumava assinar.

Figura 1: Mural do Índio.

Fonte: Acervo das autoras.

Nas primeiras páginas do livro anteriormente referendado aparece a imagem desta figura e a

indicação de que se trata de um Índio Laçador Charrua. No entanto fica um questionamento:

A figura do mural é também a representação do índio Generoso? A entrevistada informou que

8 Rejane Maria Drago é filha do Dr. Ivo Drago e informou que a casa foi construída durante sua infância, além

de confirmar o laço de amizade entre seu pai e o artista plástico Danúbio Gonçalves. 9 Danúbio Gonçalves, nascido em Bagé/RS no ano de 1925, é conhecido principalmente por sua atuação como

gravurista. Retrata camponeses e trabalhadores, seu cotidiano e suas festas. A partir de 1960 parra a utilizar

técnicas variadas, como tinta acrílica, aquarela e gravura. Fonte:

https://www.escritoriodearte.com/artista/danubio-goncalves/

9

esta obra é uma homenagem aos índios Charruas, e que o Generoso foi um personagem

criado para homenagear o índio Charrua.

Através de pesquisa bibliográfica foi identificado que Ivo Drago, além dos livros,

escreveu uma monografia sobre os Índios Charruas. Isto demonstra seu interesse e afeição

pela figura e história indígena, justificando a obra artística elaborada na parede externa de sua

residência. No entanto, a construção do prédio e elaboração do mural são anteriores aos

trabalhos escritos mencionados.

Ainda conforme expresso pela senhora Rejane Drago, “a cidade de São Borja, não

valoriza essa obra que foi feita por um artista plástico de gama mundial. O Danúbio

Gonçalves, entre tantas obras, fez também os painéis da sede da ONU”.

Também foi informado que esta obra foi doada pelo Dr. Ivo Drago para a prefeitura

de São Borja e o poder público municipal deixou a obra sem manutenção, mas existe uma

ação junto ao Ministério Público, encaminhada em 2015, com o objetivo de proteger imóveis

considerados patrimônios culturais do município de São Borja e esta ação inclui o Mural do

Índio Laçador Charrua. O prédio não pertence à família Drago desde o ano de 2012, quando

foi adquirido por outra família que desde então reside no local.

Figura 2: Denúncia ao Ministério Público.

Fonte: Site do Ministério Público.

A senhora Rejane indicou, ainda, que na prefeitura municipal existe o documento de

doação, e que pessoas vinculadas a área do patrimônio histórico entraram em contato e foram

10

na residência do artista plástico Danúbio Gonçalves, situação em que foi confirmada a autoria

da obra.

Até o momento da entrega desde artigo não foi possível verificar os documentos na

prefeitura, situação que impede uma análise mais elaborada sobre a informação concedida.

No entanto, este estudo continuará mesmo após a data de entrega deste material.

Possibilidades do Uso Turístico

Uma obra de arte como o Mural do Índio Laçador Charrua é um patrimônio que não

deve ser ignorado ao desenvolver um roteiro turístico no município de São Borja. Entende-se

que apenas esta obra não gera motivação suficiente para uma movimentação turística, mas

aliar este patrimônio ao contexto da cidade pode ampliar o interesse do turista.

Importante destacar que a localização do mural é bastante acessível e está no caminho

de deslocamento a atrativos turísticos já reconhecidos e procurados. Esta situação é um

incentivo ao aproveitamento deste recurso cultural, pois de acordo com Ignarra (2002, p. 48)

“o turista procura sempre conhecer aquilo que é diferente de seu cotidiano. Assim, aquele

atrativo que é único, sem outros semelhantes possui maior valor para o turista”.

Desperdiçar a oportunidade de explorar, de forma gratuita, uma obra de importante

artista plástico gaúcho e estabelecer uma relação com a origem indígena do município e com

uma lenda que caracteriza um dos atrativos mais visitados na cidade, como é o caso do

Museu Ergológico de Estância (conforme dados da Secretaria Municipal de Turismo, Cultura

e Eventos), do Grupo de Arte Amador Os Angüeras, significa retroceder no processo de

desenvolvimento turístico.

O turismo cultural evolui de forma mais dinâmica quando há valorização e

reconhecimento do patrimônio por parte de sua comunidade. Perceber o orgulho e

envolvimento da comunidade com a atividade turística também a torna atraente. Desta forma,

a inclusão desta representação artística em um roteiro turístico de São Borja somará

resultados positivos, pois agregará valor através do reconhecimento de mais uma atração

cultural.

11

Considerações Finais

O desenvolvimento deste estudo possibilitou conhecer um pouco mais da história de

São Borja e redescobrir um patrimônio que parece estar sendo negligenciado pela população

local. O turismo precisa de diversidade de atrações para conquistar o turista e provocar sua

movimentação. Cada atrativo que é reconhecido e acrescentado a um roteiro agrega valor aos

que já foi desenvolvido até o momento.

No entanto, percebe-se a necessidade de uma ação de incentivo à valorização da

cultura local junto à população. Uma comunidade que não entende e conhece sua história,

dificilmente conseguirá ter no turismo cultural uma forma de desenvolvimento econômico,

pois não percebe sua importância enquanto sociedade.

A dificuldade para encontrar informações sobre uma obra artística e de relevante

representação cultural, que está exposta de forma gratuita em uma localização movimentada

da cidade, chama a atenção de maneira desfavorável e provoca uma nova indagação: Por que

a sociedade, aqui interpretada como o conjunto formado pelos cidadãos e instituições

públicas, ignora este atrativo?

No entanto, acredita-se que este estudo conseguirá cumprir parcialmente seu objetivo,

através do fornecimento de informações à comunidade sobre esta obra e incentivo de seu

aproveitamento como atrativo turístico. Entende-se também que este trabalho pode servir de

motivação para outras pesquisas semelhantes a esta, não apenas relacionada a este mural, mas

apresentando outros atrativos ainda não explorados na cidade de São Borja.

12

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Ana Paula de. Mitos ou Lendas. Disponível em:

http://www.infoescola.com/redacao/mito-ou-lenda/. Acesso: maio de 2016.

BENI, Mário Carlos. Análise Estrutural do Turismo. São Paulo: SENAC , 2000.

BRASIL, Ministério do Turismo. Segmentação do Turismo: Marcos Conceituais. Brasília:

Ministério do Turismo, 2006.

DIAZ, Dario Orlando. Avañée Guarani – Introduccion. Santo Tomé: 1991.

DRAGO, IVO. Generoso... A lenda que o rio levou. São Borja: Gráfica Impresul, 2002.

FURNARI, Pedro Paulo; PELEGRINI, Sandra C. A. Patrimônio Histórico e Cultural. 2ª

ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009.

IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do Turismo. 4ª ed. São Paulo: Pioneira Thomson

Learning, 2002.

MARTINS, Clerton. Patrimônio Cultural e Identidades in Turismo, Cultura e

Identidade. São Paulo: Roca, 2003.

OMT. Introdução ao Turismo. São Paulo: Roca, 2000.

RILLO, Apparício Silva. Grupo Amador de Arte “Os Angüeras”. Disponível em:

http://www.angueras.com.br/. Acesso: maio de 2016.

RILLO, Apparício Silva. São Borja em Perguntas e Respostas. 3ª edição. Coleção

Tricentenário. São Borja: Câmara Municipal de Vereadores, 2012.

RODRIGUES, José Fernando C.; PINTO, Muriel; COLVERO, Ronaldo B. História

Missioneira de São Borja. São Borja, 2013.

13

Pedro Paulo; PINSKY, Jaime. Turismo e Patrimônio Cultural. 4ª ed. São Paulo: Contexto,

2009. SÃO BORJA. História. Disponível em:

http://www.saoborja.rs.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=66&Itemid

=1329. Acesso: julho de 2016.