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“EGD2806” 2006/7/26 page 1 Introdu¸ ao a Geometria Simpl´ etica Henrique Bursztyn e Leonardo Macarini 26 de Julho de 2006

geometria simplética

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geometria simplética de Henrique Bursztyn e Leonardo Macarini.

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    Introducao a Geometria Simpletica

    Henrique Bursztyn e Leonardo Macarini

    26 de Julho de 2006

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    PREFACIO

    Geometria simpletica e a geometria das variedades munidas deuma 2-forma fechada e nao-degenerada. Embora tenha razes histori-cas na formulacao geometrica da mecanica classica, a geometria sim-pletica e hoje uma area de interesse independente, sendo alvo deintensa pesquisa, e com diversas aplicacoes.

    Um dos grandes propulsores do desenvolvimento recente da ge-ometria simpletica foi o surgimento, nas ultimas duas decadas, denovas tecnicas e resultados constituindo o que hoje se chama topologiasimpletica. Tendo os trabalhos seminais de M. Gromov e Y. Eliash-berg nos anos 80 como ponto de partida, tais resultados elucidarampropriedades fundamentais das variedades simpleticas, como a pro-funda rigidez das transformacoes simpleticas e a existencia de impor-tantes invariantes globais, dando a` area uma nova perspectiva.

    Paralelamente, outra importante fonte de estmulo para o cresci-mento da geometria simpletica e seu papel interdisciplinar na matema-tica, interagindo com topologia (especialmente em dimensoes 3 e4), teoria de representacoes e grupos de Lie, geometria algebrica,dinamica conservativa, analise microlocal, alem de campos da fsicamatematica tais como teoria de calibre e espacos de moduli, sistemasintegraveis e grupos quanticos, modelos sigma e teoria de cordas,entre outros.

    Estas notas apresentam uma breve introducao a` geometria simple-tica com foco em dois aspectos principais: por um lado, a ausenciade invariantes locais em variedades simpleticas, tendo como base ometodo de Moser; por outro lado, a construcao de invariantes globaisusando tecnicas de topologia simpletica.

    Devido a`s limitacoes de espaco e tempo, alguns topicos comu-mente presentes em textos introdutorios a` geometria simpletica naoestao aqui includos. Este e o caso, por exemplo, da importante teoriade acoes hamiltonianas e aplicacoes momento, que pode ser encon-trada em textos como [1, 8, 19].

    O material destas notas esta organizado da seguinte maneira: o

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    Captulo 1 apresenta uma breve exposicao da origem da geometriasimpletica em mecanica hamiltoniana. No Captulo 2, tratamos dosaspectos basicos da algebra linear simpletica. O Captulo 3 inclui adefinicao de variedades simpleticas, assim como as principais classesde exemplos: fibrados cotangentes, orbitas coadjuntas e variedadesKahler. No Captulo 4, discutimos o metodo de Moser, que ofereceuma tecnica fundamental na demonstracao de varios resultados derigidez local em geometria simpletica, incluindo o teorema cassico deDarboux e suas generalizacoes devidas a A. Weinstein. No Captulo 5,tratamos de hipersuperfcies de contato, que sao usadas no Captulo6 para o estudo de sistemas hamitonianos e dinamica em nveis deenergia. O Captulo 7 discute o problema da existencia de invariantesglobais, com foco na nocao de capacidade simpletica. Ainda nestecaptulo, apresentamos uma introducao ao teorema nonsqueezingde Gromov, incluindo um esboco de sua (difcil) demonstracao.

    Ao longo do texto, assumimos que o leitor tenha familiaridadecom aspectos basicos da teoria de variedades diferenciaveis, incluindoformas diferenciais. O material padrao pode ser encontrado, por ex-emplo, em [2, 39]. Varios livros de introducao a geometria simpleticanos serviram de referencia, entre os quais [7, 8, 21, 29, 41].

    Agradecemos a Walcy Santos e Manfredo do Carmo pelo convitepara apresentar o minicurso Introducao a Geometria Simpleticana XIV Escola de Geometria Diferencial, que nos deu estmulo paraa elaboracao destas notas. Agradecemos tambem a Cristian Ortize Thiago Drummond por comentarios e correcoes, e Rogerio DiasTrindade pela ajuda nas figuras.

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    Conteudo

    1 Origem da geometria simpletica 61.1 As equacoes de Hamilton via a equacao de Newton . . 61.2 Abordagem variacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71.3 Geometrizacao das equacoes de Hamilton . . . . . . . 10

    2 Algebra linear simpletica 122.1 Espacos vetoriais simpleticos . . . . . . . . . . . . . . 122.2 Subespacos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 142.3 Bases simpleticas e forma normal . . . . . . . . . . . . 152.4 Estruturas complexas compatveis . . . . . . . . . . . 16

    3 Variedades simpleticas 203.1 Definicao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203.2 Fibrados cotangentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 223.3 Outros exemplos importantes . . . . . . . . . . . . . . 25

    3.3.1 Variedades Kahler . . . . . . . . . . . . . . . . 253.3.2 Orbitas coadjuntas . . . . . . . . . . . . . . . . 33

    3.4 Obstrucoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 393.5 Subvariedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

    4 O metodo de Moser e formas normais 444.1 O truque de Moser . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 454.2 O teorema de Darboux . . . . . . . . . . . . . . . . . . 474.3 Teoremas de Weinstein para vizinhancas de subvar-

    iedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 494.4 Aplicacao a pontos fixos de simplectomorfismos . . . . 51

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    CONTEUDO 5

    5 Hipersuperfcies de contato 535.1 Definicoes e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 535.2 Forma normal de vizinhancas de hipersuperfcies de

    contato . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57

    6 Sistemas hamiltonianos 596.1 Definicoes e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 596.2 Dinamica em nveis de energia . . . . . . . . . . . . . 61

    7 Invariantes globais 727.1 Capacidades simpleticas e rigidez de simplectomorfismos 727.2 Esboco da prova do teorema nonsqueezing . . . . . . . 767.3 Rigidez de simplectomorfismos . . . . . . . . . . . . . 807.4 A capacidade de Hofer-Zehnder . . . . . . . . . . . . . 837.5 Capacidade de Hofer-Zehnder e orbitas periodicas . . . 89

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    Captulo 1

    Origem da geometria

    simpletica

    1.1 As equacoes de Hamilton via a equacao

    de Newton

    A geometria simpletica se originou no estudo dos sistemas hamilto-nianos, que descrevem a evolucao de sistemas mecanicos de naturezaconservativa. As equacoes que descrevem tais sistemas sao chamadasequacoes de Hamilton e podem ser derivadas diretamente da segundalei de Newton.

    Vamos considerar como ilustracao o exemplo do movimento deuma partcula de massa m > 0 em R3 submetida a um campo deforcas conservativo F , dado em cada ponto q = (q1, q2, q3) R3 por

    F (q) = V (q),onde V : R3 R e a energia potencial. Cada estado inicial, deter-minado por uma posicao e velocidade, determina completamente atrajetoria q(t) da partcula atraves da segunda lei de Newton:

    mq(t) = V (q(t)). (1.1.1)Seja p = mq o momento linear da partcula. Podemos rescrever o

    sistema de 3 equacoes de segunda ordem (1.1.1) como 6 equacoes de

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    [SEC. 1.2: ABORDAGEM VARIACIONAL 7

    primeira ordem nas variaveis qi e pi:

    q =p

    m, p = V.

    O espaco R3 = {q = (q1, q2, q3)} de possveis posicoes da partcula echamado de espaco de configuracoes, enquanto o espaco R6 = R3 R3 = {(q, p)}, consistindo de posicoes e momentos, e chamado espacode fase. Se denotarmos a energia total da partcula por H ,

    H(q, p) =

    3i=1 p

    2i

    2m+ V (q),

    podemos escrever (1.1.1) no espaco de fase como

    qi =H

    pi, pi = H

    qi. (1.1.2)

    As equacoes (1.1.2) sao as equacoes de Hamilton descrevendo o sis-tema nesse exemplo.

    1.2 Abordagem variacional

    Outra maneira de se obter as equacoes de Hamilton e via as equacoesde Euler-Lagrange, derivadas de princpios variacionais. Essa abor-dagem, alem de exibir a natureza variacional de sistemas naturais, ebastante util quando consideramos sistemas com vnculos. Existeminumeras referencias sobre o assunto, entre as quais, [1, 5].

    Um princpio fundamental que rege a mecanica classica e o prin-cpio da acao mnima. Mais precisamente, considere um sistema cujoespaco de configuracoes e o Rn, com coordenadas q = (q1, . . . , qn),de modo que o espaco de estados (i.e., posicoes e velocidades) sejaR2n, com coordenadas (q, v). Seja L : R2n R uma funcao suave,chamada funcao lagrangiana. Dada uma curva diferenciavel : [0, T ] R

    n, definimos sua acao por

    AL() =

    T0

    L((t), (t)) dt.

    Fixe agora dois pontos q0 e q1 em Rn e denote por C([0, T ], q0, q1)

    o conjunto de curvas suaves : [0, T ] Rn tais que (0) = q0 e

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    8 [CAP. 1: ORIGEM DA GEOMETRIA SIMPLETICA

    (T ) = q1. Buscamos neste conjunto pontos crticos para o funcionalde acao AL, ou seja, curvas para as quais

    dAL(s)

    ds

    s=0

    = 0,

    onde s C([0, T ], q0, q1), s (, ), e uma variacao suave ar-bitraria de curvas tal que 0 = .

    Proposicao 1.2.1. Uma curva e um ponto crtico de AL se esomente se satisfaz a equacao de Euler-Lagrange

    d

    dt

    L

    v((t), (t)) =

    L

    q((t), (t)).

    Demonstracao: Sejam ci : [0, T ] R, i = 1, ..., n, funcoes suavestais que ci(0) = ci(T ) = 0 para todo i. Defina a variacao

    (t) = (1(t) + c1(t), ..., n(t) + cn(t)),

    onde (t) = (1(t), ..., n(t)). E claro que C([0, T ], q0, q1).Temos que

    dAL()

    d

    =0

    =

    T0

    i

    L

    qi(0, 0)ci(t) +

    L

    vi(0, 0)ci(t) dt

    =

    T0

    i

    L

    qi(0, 0)ci(t) d

    dt

    L

    vi(0, 0)ci(t)

    +L

    vi(0, 0)ci(t)

    T0

    dt

    =

    T0

    i

    (L

    qi(0, 0) d

    dt

    L

    vi(0, 0)

    )ci(t) dt,

    onde a segunda igualdade segue por integracao por partes. Comoisto e valido para todo ci tal que ci(0) = ci(T ) = 0, conclumos ademonstracao.

    Diferentes funcoes lagrangianas correspondem a diferentes sis-temas fsicos, e a evolucao de cada sistema e descrita pelas solucoesdas equacoes de Euler-Lagrange associadas.

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    [SEC. 1.2: ABORDAGEM VARIACIONAL 9

    Veremos agora como uma mudanca de variaveis pode transformaras equacoes de Euler-Lagrange nas equacoes de Hamilton. Considerea aplicacao FL : R2n R2n, dada por

    FL(q1, ..., qn, v1, ..., vn) = (q1, ..., qn,L

    v1(q, v), ...,

    L

    vn(q, v)), (1.2.1)

    chamada transformada de Legendre associada a L. Supondo que FLseja um difeomorfismo, obtemos novas coordenadas (q, p) em R2n,onde p = Lv e chamado de momento generalizado. Definimos ahamiltoniana associada a L como

    H(q, p) =

    ni=1

    pivi L(q, v).

    Temos entao que

    H

    qi=

    nj=1

    pjvjqi

    Lqi

    n

    j=1

    L

    vj

    vjqi

    = Lqi

    H

    pi= vi +

    nj=1

    pjvjpi

    Lvj

    vjpi

    = vi.

    Consequentemente, as equacoes de Euler-Lagrange sao equivalente a`sequacoes de Hamilton

    dqidt

    =H

    pi,dpidt

    = Hqi

    .

    Exerccio: Considere em R3 R3 a lagrangiana L(q, v) = m2

    P3i=1 v

    2i

    V (q). Verifique que, neste caso, a transformada de Legendre e um difeo-morfismo e a hamiltoniana associada e H(q, p) =

    P3i=1

    12m

    p2i + V (q), ouseja, a mesma da secao anterior.

    Observacao: Uma pergunta natural e quando pontos crtico deAL sao, de fato, pontos de mnimo do funcional de acao. Isso naoe verdade em geral (pense, por exemplo, nas geodesicas da esferaS2), mas pode-se mostrar que, se o determinante da matriz Hessiana

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    10 [CAP. 1: ORIGEM DA GEOMETRIA SIMPLETICA

    (2L

    vivj

    )for positivo, entao solucoes da equacao de Euler-Lagrange

    minimizam a acao em intervalos de tempo suficientemente pequenos.Sob certas condicoes de crescimento de L no infinito, prova-se aindaque sempre existe uma solucao ligando dois pontos quaisquer em Rn.

    1.3 Geometrizacao das equacoes de Hamil-

    ton

    Vimos nas secoes anteriores como as equacoes de Hamilton podem serderivadas das equacoes de Newton e de Euler-Lagrange. Nesta secao,colocaremos as equacoes de Hamilton em um contexto geometricoatraves de uma formulacao intrnseca. Isso nos permitira definir, noCaptulo 6, sistemas hamiltonianos em variedades diferenciaveis.

    Considere o espaco de fase R2n, com coordenadas (q1, . . . , qn, p1,. . . , pn). A escolha de qualquer funcao H C(R2n) determina umcampo hamiltoniano

    XH := J0H =3

    i=1

    H

    pi

    qi Hqi

    pi, (1.3.1)

    onde J0 e a matriz 2n 2n dada por

    J0 =

    (0 II 0

    ). (1.3.2)

    A funcao H e chamada de hamiltoniana, e as equacoes de Hamilton(1.1.2) assumem a forma

    c(t) = XH(c(t)), (1.3.3)

    onde c(t) = (q1(t), . . . , qn(t), p1(t), . . . , pn(t)). Note que H e semprepreservado ao longo das solucoes de (1.3.3):

    d

    dtH(c(t)) = H(c(t)) c(t) = H(c(t)) J0H(c(t)) = 0.

    Essa propriedade (junto a outras que veremos mais tarde) da ao for-malismo hamiltoniano seu carater conservativo.

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    [SEC. 1.3: GEOMETRIZACAO DAS EQUACOES DE HAMILTON 11

    Note que na definicao de XH em (1.3.1) usamos dois ingredientes:uma base de R2n (com respeito a qual calculamos o gradiente H) ea matriz J0. Esses dois ingredientes combinados definem uma formabilinear anti-simetrica nao-degenerada dada por

    0(u, v) := utJ0v,

    ou, equivalentemente, 0 =

    i dqi dpi. A equacao de Hamiltonpode entao ser vista como o gradientede H com respeito a 0, ouseja, XH e o unico campo que satisfaz a equacao

    0(XH , v) = dH(v)

    para todo v R2n. Isto motiva a definicao de espacos vetoriaissimpleticos que veremos no proximo captulo.

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    Captulo 2

    Algebra linear

    simpletica

    2.1 Espacos vetoriais simpleticos

    Seja V um espaco vetorial real, e seja : V V R uma formabilinear anti-simetrica. Dizemos que a forma e nao-degenerada, ousimpletica, se

    (u, v) = 0 v V = u = 0. (2.1.1)Nesse caso, o par (V,) e um espaco vetorial simpletico. Dois espacosvetoriais simpleticos (V1,1) e (V2,2) sao simplectomorfos se existeum isomorfismo linear : V1 V2 tal que

    2 = 1.

    Com a escolha de uma base {e1, e2, . . . , em} de V , podemos repre-sentar qualquer forma bilinear anti-simetrica unicamente por umamatriz anti-simetrica

    A = [Aij ], Aij = (ei, ej),

    de modo que (u, v) = utAv. E facil ver que a forma e simpleticase e somente se A e uma matriz invertvel. Por outro lado, a forma

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    [SEC. 2.1: ESPACOS VETORIAIS SIMPLETICOS 13

    define uma aplicacao linear

    ] : V V , ](u)(v) := (u, v),

    de modo que e simpletica se e somente se ] e uma bijecao.

    Exemplos 2.1.1.

    a) Se V = R2n, entao

    0(u, v) := utJ0v

    define uma forma simpletica representada pela matriz J0 defi-nida em (1.3.2) na base canonica {e1, . . . , en, f1, . . . , fn}. Emoutras palavras, 0 e definida pelas condicoes:

    0(ei, ej) = 0, 0(ei, fj) = ij , 0(fi, fj) = 0.

    b) Seja W um espaco vetorial real de dimensao n, e seja W seudual. Entao o espaco vetorial V = W W possui uma estru-tura simpletica natural dada por

    ((w, ), (w , )) := (w) (w),

    e todo isomorfismo T : W W determina um simplectomor-fismo T (T1) : V V .

    c) Seja V um espaco vetorial complexo de dimensao n sobre C.Seja h : V V C um produto interno hermitiano e =Im(h) a parte imaginaria de h. Entao define uma estruturasimpletica em V , visto como espaco vetorial real, e qualquertransformacao linear unitaria e automaticamente um simplec-tomorfismo.

    d) Se (V1,1) e (V2,2) sao espacos vetoriais simpleticos, entaoV1 V2 e espaco vetorial simpletico com a forma produto

    ((u1, u2), (v1, v2)) := 1(u1, v1) + 2(u2, v2).

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    14 [CAP. 2: ALGEBRA LINEAR SIMPLETICA

    2.2 Subespacos

    Em um espaco vetorial com produto interno, todo subespaco herdaum produto interno do espaco ambiente. Em um espaco vetorialsimpletico, por outro lado, subespacos podem herdar tipos de estru-turas diferentes.

    Seja (V,) um espaco vetorial simpletico. Dado um subespacoW V , definimos seu ortogonal simpletico como o subespaco:

    W := {v V |(v, w) = 0 w W}.O subespaco W V e chamado simpletico se W W = {0}, isotropico se W W, coisotropico se W W , lagrangiano se W = W.Note que W e isotropico se e somente se a restricao de a W

    e zero, e e lagrangiano se e somente se W e isotropico e maximal(i.e., nao esta propriamente contido em nenhum outro subespacoisotropico); por outro lado, W e simpletico se e somente se a re-stricao de a W e nao-degenerada, de modo que (W,|W ) e umespaco vetorial simpletico.

    Embora em geral V 6= W +W, em termos de dimensoes semprevale que

    dim(V ) = dim(W ) + dim(W). (2.2.1)

    Para provar (2.2.1), basta observar que a imagem de W pelo iso-morfismo ] : V V e Ann(W ), o anulador de W . Portanto

    dim(W) = dim(Ann(W )) = dim(V ) dim(W ).Segue ainda facilmente que (W) = W .

    Exemplos 2.2.1.

    a) Qualquer subespaco unidimensional e isotropico. Como umsubespaco W e coisotropico se e somente se W e isotropico,segue que todo subespaco de codimensao 1 e coisotropico.

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    [SEC. 2.3: BASES SIMPLETICAS E FORMA NORMAL 15

    b) No Exemplo 2.1.1, parte b), tantoW quantoW sao subespacoslagrangianos.

    c) Para cada i, o subespaco gerado pelo par ei, fi no Exemplo2.1.1, parte a), e simpletico.

    Exerccio: Se (V1,1) e (V2,2) sao espacos vetoriais simpleticos, mostreque um isomorfismo linear : V1 V2 e um simplectomorfismo se esomente se o grafico de e lagrangiano em V1 V 2, onde V 2 denota oespaco simpletico (V2,2).

    2.3 Bases simpleticas e forma normal

    Seja (V,) um espaco vetorial simpletico. Chamamos de base simple-tica de V uma base com 2n vetores {e1, . . . , en, f1, . . . , fn} para a qualvalem as relacoes

    (ei, ej) = 0, (ei, fj) = ij , (fi, fj) = 0. (2.3.1)

    Assim, numa base simpletica a forma e representada pela matriz(0 II 0

    ), (2.3.2)

    onde I e a matriz identidade n n.O proximo resultado e o analogo simpletico do fato de que todo

    espaco vetorial com produto interno admite uma base ortonormal.

    Teorema 2.3.1. Todo espaco vetorial simpletico (V,) admite umabase simpletica.

    Demonstracao: Escolha e1 6= 0. Como e nao-degenerada, existef1 V tal que

    (e1, f1) = 1.

    Seja W1 o subespaco gerado por {e1, f1}. Note que W1 e simpletico,e portanto V = W1 W1 .

    Como W1 e simpletico, podemos repetir a construcao ate obter-mos uma decomposicao

    V = W1 W2 . . .Wn,

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    16 [CAP. 2: ALGEBRA LINEAR SIMPLETICA

    onde cadaWi e gerado por ei, fi tal que (ei, fi) = 1. Por construcao,se i < j, entao Wj Wi , portanto seguem as relacoes (2.3.1).

    Corolario 2.3.2. Todo espaco simpletico e simplectomorfo a (R2n,0)(descrito no Exemplo 2.1.1, parte a)) para algum n.

    Em particular, todo espaco vetorial simpletico tem dimensao par.Alem disso, se (V,) e espaco simpletico de dimensao 2n, segue facil-mente de (2.2.1) que W V e lagrangiano se e somente se W eisotropico e

    dim(W ) =dim(V )

    2= n.

    Exemplo 2.3.3. Se {w1, . . . , wn} e base de um espaco vetorial W ,e se {1, . . . , n} e base dual, entao {w1, . . . , wn, 1, . . . , n} e basesimpletica de W W descrito no Exemplo 2.1.1, parte b).

    Por outro lado, se {e1, . . . , en} e base complexa ortonormal paraum espaco complexo hermitiano, entao {e1, . . . , en, ie1, . . . , ien} e basesimpletica para o Exemplo 2.1.1, parte c).

    2.4 Estruturas complexas compatveis

    Se V e um espaco vetorial sobre C munido de um produto internohermitiano h, vimos no Exemplo 2.1.1, parte c), que a parte ima-ginaria de h define uma forma simpletica em V (visto como espacovetorial real). Mostraremos agora a recproca: se (V,) e um espacovetorial simpletico, entao V admite uma estrutura de espaco veto-rial complexo e pode ser vista como a parte imaginaria de umaestrutura hermitiana.

    Se V e um espaco vetorial real, lembremos que uma estrutura com-plexa em V e um endomorfismo linear J : V V tal que J2 = Id.Note que fixar uma estrutura complexa J e equivalente a munir V deuma estrutura de espaco vetorial sobre C, ja que podemos identificaro operador J com a multiplicacao por i =

    1, i.e., J(v) = i v,para todo v V . Nos referimos ao par (V, J) como um espaco veto-rial complexo, e dizemos que (V, J) e (V , J ) sao isomorfos se existeum isomorfismo linear : V V tal que J = J .

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    [SEC. 2.4: ESTRUTURAS COMPLEXAS COMPATIVEIS 17

    Exerccio: Mostre que uma estrutura complexa J : V V e equivalentea escolha de um subespaco V10 V C tal que V C = V10V10. (Dica:considere os autoespacos de J .)

    Exemplo 2.4.1. A matriz J0, definida em (1.3.2), e uma estruturacomplexa em V = R2n. E simples verificar que a identificacao deR2n com Cn, (q, p) 7 q + ip, e um isomorfismo de espacos vetoriaiscomplexos.

    Seja (V,) um espaco vetorial simpletico. Uma estrutura com-plexa em V e compatvel com (ou simplesmente -compatvel) se,para u, v V ,

    g(u, v) := (u, Jv), (2.4.1)

    define um produto interno (nessas notas, a menos que se mencione ocontrario, sempre assumimos que produtos internos sejam positivo-definidos). Explicitamente, as condicoes de compatibilidade (i.e.,simetria e positividade de g) sao

    (Ju, Jv) = (u, v), e (u, Ju) > 0, u 6= 0. (2.4.2)

    Exerccio: Seja J uma estrutura complexa -compatvel em V . Se W Ve um subespaco, mostre que JW = W, onde W e o ortogonal de Wcom respeito ao produto interno (2.4.1).

    E facil ver que se h(u, v) = g(u, v)+i(u, v) e um produto internohermitiano em (V, J), entao g e dado por (2.4.1). Segue, portanto,que J e -compatvel se e somente se e a parte imaginaria de umaestrutura hermitana em (V, J).

    Teorema 2.4.2. Seja (V,) um espaco vetorial simpletico. Entaocada produto interno G em V define, de forma canonica, uma estru-tura complexa J : V V que e -compatvel.Demonstracao: Seja G um produto interno em V . Como G] :V V , G](u)(v) = G(u, v), e um isomorfismo, segue que existe umunico automorfismo linear A : V V tal que

    (u, v) = G(Au, v), u, v V,

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    18 [CAP. 2: ALGEBRA LINEAR SIMPLETICA

    i.e., A = (G])1 ]. Note que A e anti-simetrico com respeito a G,ja que

    G(Atu, v) = G(u,Av) = (v, u) = G(Au, v).Como consequencia, temos que, na decomposicao polar de A,

    A = J |A|, onde |A| = (AtA)1/2 = (A2)1/2,o operador ortogonal J e o operador positivo-definido |A| comutam.Entao A2 = J2A2, e portanto J2 = Id. Note ainda que

    (u, Jv) = G(Au, Jv) = G(JAu, v) = G(|A|u, v)define um produto interno, mostrando a compatibilidade de J e .(Observe, contudo, que o produto interno associado ao par J e , emgeral, difere de G.)

    Observacao: A existencia de uma estrutura complexa -compatvelnum espaco vetorial simpletico pode ser facilmente obtida se usarmosuma base simpletica e1, . . . , en, f1, . . . , fn: basta definir Jei = fi eJfi = ei, i = 1, . . . , n. A vantagem da demonstracao apresentadano teorema anterior e que nao fazemos qualquer mencao a bases. Porser canonica (a menos da escolha do produto interno), a demonstracaose aplica diretamente a fibrados vetoriais simpleticos, e isso sera utilmais adiante.

    Seja J (V,) o conjunto de todas a estruturas complexas em Vque sao -compatveis, visto como subconjunto do espaco vetorialdos endomorfismos de V , e munido da topologia induzida. Denotepor Riem(V ) o conjunto de todos os produtos internos em V , quee um subconjunto aberto e convexo do espaco vetorial de todas aformas simetricas em V . O Teorema 2.4.2 nos fornece uma aplicacaocontnua : Riem(V ) J (V,). Seja : J (V,) Riem(V ) aaplicacao que associa a cada estrutura complexa -compatvel J oproduto interno (2.4.1).

    Exerccio: Verifique que = Id.

    Como Riem(V ) e um subconjunto convexo de um espaco vetorial,e contratil. Tome t : Riem(V ) Riem(V ) uma contracao, isto e,t [0, 1], 0 = Id e 1 e uma aplicacao tendo como imagem um unicoponto de Riem(V ).

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    [SEC. 2.4: ESTRUTURAS COMPLEXAS COMPATIVEIS 19

    Corolario 2.4.3. O espaco J (V,) e contratil.Demonstracao: Basta verificar que t define uma contracaode J (V,).

    A contratibilidade de J (V,) e um fato importante em topologiasimpletica e sera usado no Captulo 7.

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    Captulo 3

    Variedades simpleticas

    Vimos no Captulo 1 como a forma simpletica 0 =

    i dpi dqinasce a partir de uma geometrizacao das equacoes de Hamilton, ouseja, de maneira a expressar campos hamiltonianos como gradientessimpleticos. Em seguida, no Captulo 2, vimos que espacos vetoriaissimpleticos de dimensao 2n sao todos isomorfos a (R2n,0).

    Podemos definir uma variedade simpletica usando (R2n,0) comomodelo local e assumindo a existencia de um atlas simpletico, ouseja, um atlas cujas mudancas de cartas preservam 0. Seguiremosaqui, contudo, o caminho usual (e mais simples) de se definir umaestrutura simpletica como uma 2-forma fechada e nao-degenerada,e mostraremos no Captulo 4 a equivalencia desta definicao com aexistencia de um atlas simpletico.

    Neste captulo, assumiremos que o leitor tenha familiaridade coma teoria das variedades diferenciaveis, incluindo formas diferenciais,campos de vetores, derivadas de Lie, etc. O material pode ser encon-trado, e.g., em [2, 39].

    3.1 Definicao

    Seja M uma variedade suave. Dizemos que uma 2-forma 2(M)e nao-degenerada se x e nao-degenerada em cada ponto x M , demodo que cada espaco tangente e um espaco vetorial simpletico.

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    [SEC. 3.1: DEFINICAO 21

    Exerccio: Suponha que dim(M) = 2n. Verifique que 2(M) e

    nao-degenerada se e somente se n

    n! 2n(M) e uma forma de volume.

    Uma estrutura simpletica em M e uma 2-forma 2(M) quee nao-degenerada e tal que d = 0. Nesse caso o par (M,) e umavariedade simpletica .

    Segue do exerccio anterior que toda variedade simpletica de di-mensao 2n possui uma forma de volume

    :=n

    n!(3.1.1)

    chamada forma de Liouville . Portanto, toda variedade simpletica eorientavel.

    Duas variedades simpleticas (M1, 1) e (M2, 2) sao simplecto-morfas se existe um difeomorfismo : M1 M2 preservando asformas simpleticas, ou seja,

    2 = 1.

    Denotamos o grupo de simplectomorfismos de uma variedade simpletica(M,) nela mesma por Simp(M,) Dif(M).Exemplo 3.1.1. Seja U um aberto de R2n = {(q1, . . . , qn, p1, . . . , pn)},munido com a 2-forma

    0 :=

    ni=1

    dqi dpi.

    Em cada ponto de U , a matriz associada a 0 e (2.3.2), portanto 0e nao-degenerada. Obviamente, 0 e fechada, e portanto simpletica.Note que, de fato, 0 = d, onde =

    i pidqi.

    Veremos mais a frente que toda variedade simpletica e local-mente simplectomorfa a um aberto de R2n com a estrutura simpleticadescrita no ultimo exemplo (teorema de Darboux). Este resultadoilustra um aspecto fundamental da geometria simpletica: formassimpleticas sao localmente rgidas, nao somente na vizinhanca de pon-tos, mas tambem de certas subvariedades. Trataremos essas questoesno Captulo 4.

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    22 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Exemplo 3.1.2. Seja uma superfcie orientada, e seja 2()uma forma de area. Por definicao, e nao-degenerada. Alem disso,d = 0 automaticamente, ja que estamos em dimensao 2. Portanto e simpletica.

    Simplectomorfismos, nesse exemplo, sao difeomorfismos preser-vando area. Veremos no Captulo 4 que duas superfcies orientadascompactas sao simplectomorfas se e somente se elas tem o mesmogenero e mesma area total.

    Exemplo 3.1.3. Sejam (M1, 1) e (M2, 2) duas variedades simple-ticas. Seja M = M1 M2, e considere as projecoes pri : M Mi.Entao = pr11 + pr

    23 e uma forma simpletica em M .

    Exemplo 3.1.4. Como observamos no Exemplo 2.4.1, podemos iden-tificar R2n com Cn, de modo que a aplicacao linear J0 torna-se sim-plesmente a multiplicacao por

    1. Temos que para todo v R2n,0(v, J0v) = v2 6= 0 se v 6= 0. Em particular, 0 e nao-degeneradaem toda subespaco complexo de Cn. Consequentemente, qualquersubvariedade complexa de Cn e simpletica.

    3.2 Fibrados cotangentes

    Veremos nesta secao que todo fibrado cotangente possui uma estru-tura simpletica canonica, e portanto qualquer variedade esta natural-mente associada a uma variedade simpletica. Tal estrutura simpleticae a generalizacao da forma simpletica canonica em R2n e aparece nat-uralmente no estudo de sistemas mecanicos classicos, veja [1, 5, 28].Como veremos no proximo captulo, fibrados cotangentes servemtambem de modelo local para vizinhancas de certas subvariedades(veja Teorema 4.3.2).

    Sejam Q uma variedade e M = T Q seu fibrado cotangente. De-notamos por pi : M = T Q Q a projecao natural, e consideramos aaplicacao tangente dpi : TM TQ. Definimos a 1-forma tautologica 1(M) por

    p(Xp) := p, dppi(Xp), p M, Xp TpM. (3.2.1)Como p T pi(p)Q e dppi(Xp) Tpi(p)Q, o lado direito da equacaoacima denota a contracao usual entre um espaco vetorial e seu dual.

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    [SEC. 3.2: FIBRADOS COTANGENTES 23

    A forma canonica de T Q e definida como

    := d. (3.2.2)Para verificar que e de fato simpletica, vamos usar sua expressaoem coordenadas locais: tome coordenadas locais (x1, . . . , xn) em Q, esejam (x1, . . . , xn, 1, . . . , n) coordenadas cotangentes em T

    Q. Noteque

    dppi

    (

    xj

    p

    )=

    xj

    x

    , dppi

    (

    j

    p

    )= 0,

    onde p = (x, ) T Q. Usando (3.2.1) vemos que

    p

    (

    xj

    p

    )= j , p

    (

    j

    p

    )= 0,

    de onde segue que

    p =

    nj=1

    jdxj . (3.2.3)

    Portanto, em coordenadas locais, temos

    =n

    j=1

    dxj dj , (3.2.4)

    e vemos que e de fato uma estrutura simpletica em T Q.O proximo exerccio oferece uma caracterizacao util da 1-forma

    .

    Exerccio: Mostre que a 1-forma tautologica 1(T Q) e unicamentecaracterizada pela seguinte propriedade: para todo 1(Q),

    = , (3.2.5)

    onde, no lado esquerdo de (3.2.5), estamos considerando a 1-forma comouma aplicacao : Q T Q.

    Observe que todo difeomorfismo : Q1 Q2 induz, natural-mente, um difeomorfimo dos fibrados cotangentes,

    = (d1) : T Q1 T Q2, (3.2.6)

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    24 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    satisfazendo pi1 = pi2, onde pii : T Qi Qi e a projecaocanonica. Aqui d : TQ1 TQ2 e a aplicacao tangente de . Aaplicacao (3.2.6) e chamada levantamento cotangente de .

    Proposicao 3.2.1. O levantamento cotangente : T Q1 T Q2preserva formas tautologicas,

    ()2 = 1.

    Demonstracao: Temos, por definicao, que (i)pi = (dpipi)i, onde

    pi = (xi, i) T Qi, i = 1, 2. Portanto, se p2 = (p1), temos(dp1 )

    (p2) = (dp1 )(dp2pi)

    2 = (dp1pi)(dp1)

    2 = (1)p1 ,

    onde, na segunda igualdade, usamos que pi = pi, e na terceiraigualdade usamos que 1 = (dx1)

    2.

    Segue imediatamente da proposicao anterior que

    2 = 1,

    e portanto : T Q1 T Q2 e um simplectomorfismo. Temos assimuma inclusao natural

    Dif(Q) Simp(T Q,), 7 .Todavia, esta inclusao esta longe de ser uma identificacao. O

    exerccio abaixo ilustra outros simplectomorfismos de T Q. Veremosmuitos outros exemplos no Captulo 6.

    Exerccio: Tome 1(M), e defina : T Q T Q, (x, ) 7 + x.Mostre que

    = pi.

    Conclua que e um simplectomorfismo se e somente se e fechada.

    Existem tambem outras formas simpleticas em fibrados cotan-gentes obtidas da seguinte maneira: seja B uma 2-forma fechada emQ e considere em T Q a 2-forma

    B := + piB.

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    Evidentemente, B e fechada e e facil ver que e nao-degenerada, oque deixamos ao leitor como um exerccio. Tais formas simpleticas,chamadas formas simpleticas twist, possuem uma motivacao fsica emtermos de fluxos magneticos, como veremos no Captulo 6.

    Exerccio: Verifique que, se B,B 2(Q) sao cohomologas, com B B = d, entao : (T Q,B) (T

    Q,B ) e um simplectomorfismo.

    3.3 Outros exemplos importantes

    As duas subsecoes a seguir tratam de duas importantes classes de ex-emplos de variedades simpleticas: variedades Kahler e orbitas coad-juntas. Estas subsecoes usam alguns fatos elementares sobre variaveiscomplexas e grupos de Lie e sao independentes dos demais captulos.

    3.3.1 Variedades Kahler

    Vimos no Exemplo 2.1.1, parte c), e na Secao 2.4, a relacao entre es-truturas complexas e simpleticas em espacos vetoriais. Discutiremosnesta secao o problema analogo em variedades.

    Seja M uma variedade suave. Uma estrutura quase-complexa emM e um automorfismo J : TM TM tal que J2 = Id. Em ou-tras palavras, cada espaco tangente TxM e munido de uma estruturacomplexa Jx, de modo que Jx varia suavemente em x.

    Se (M,) e uma variedade simpletica e J e uma estrutura quase-complexa em M , entao dizemos que J e -compatvel se, para todox M , Jx e x-compatvel em TxM . Assim, e J definem umametrica riemanniana g em M dada por

    gx : TxM TxM R, gx(X,Y ) = x(X, JxY ).

    A metrica g e chamada de metrica associada. Denotamos por J (M,)o espaco das estruturas quase-complexas emM que sao -compatveis.

    Assim como no caso linear, temos:

    Teorema 3.3.1. Seja (M,) uma variedade simpletica. Entao exis-tem estruturas quase-complexas -compatveis.

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    26 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Para provar o teorema, escolha uma metrica riemanniana qualqueremM e note que a demonstracao do Teorema 2.4.2 pode ser adaptadasem problemas para o fibrado tangente.

    Exerccio: Mostre que, assim como no caso linear, o espaco J (M,) econtratil. (Dica: Note que J (M,) pode ser visto como o espaco de secoesde uma fibracao sobre M , com fibras J (TxM,x), e ja mostramos noCor. 2.4.3 que essas fibras sao contrateis.)

    Observacao: Note que nao foi usado ate aqui o fato de serfechada. Portanto o que discutimos vale, sem modificacoes, para2-formas nao-degeneradas, tambem chamadas de quase-simpleticas.

    Exerccio: Mostre a seguinte recproca do Teorema 3.3.1: se (M,J) euma variedade quase-complexa, entao existem estruturas quase-simpleticascompatveis com J . (Dica: Mostre que qualquer metrica riemanniana emM pode ser modificada de modo a satisfazer g(X, Y ) = g(JX, JY ), e defina por (X, Y ) = g(JX,Y ).)

    Uma variedade quase-Kahler e uma variedade simpletica (M,)equipada com uma estrutura quase-complexa compatvel J .

    Exerccio: Uma subvariedade N M de uma variedade quase-complexae uma subvariedade quase-complexa se J(TN) TN . Mostre que, seM e quase-Kahler, entao uma subvariedade quase-complexa N herda umaestrutura simpletica de M , e que, com respeito a`s estruturas induzidas, Ne uma variedade quase-Kahler.

    Uma estrutura quase-complexa J em M e integravel se existeum atlas {U, } no qual as cartas locais : U V R2nsatisfazem

    d J = J0 d, (3.3.1)onde J0 e a estrutura complexa canonica de R

    2n (Exemplo 2.4.1).Identificando (R2n, J0) com C

    n, a condicao (3.3.1) se torna

    d J = id, (3.3.2)e a aplicacao e dita J-holomorfa. E facil ver que, neste caso, asmudancas de coordenadas

    = 1 : V V

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    sao holomorfas (i.e., id = di), onde V = (U U) eV = (UU). Uma variedade munida de um atlas cujas funcoesde transicao sao holomorfas e uma variedade complexa, e este e o casode toda variedade quase-complexa integravel. Reciprocamente, todavariedade complexa admite, canonicamente, uma estrutura quase-complexa integravel (dada por multiplicacao por i =

    1 em cadacarta do atlas complexo).

    Uma variedade Kahler e uma variedade quase-Kahler (M,, J)tal que a estrutura quase-complexa J e integravel. Em outras palavras,M e uma variedade complexa equipada com uma forma simpleticacompatvel.

    Exemplo 3.3.2.

    a) R2n = {(q1, . . . , qn, p1, . . . , pn)}, munido com a estrutura simple-tica 0 =

    j dqj dpj (Exemplo 3.1.1) e a estrutura complexa

    constante J0 (Exemplo 2.4.1) e uma variedade Kahler; a metricaassociada e a metrica euclideana usual. Se identificarmos R2n

    com Cn, com coordenadas zj = qj+ipj , a estrutura complexa J0torna-se simplesmente a multiplicacao por i =

    1, enquantoque a forma simpletica canonica se escreve como

    0 =i

    2

    j

    dzj dzj ,

    onde dzj = dqj + idpj e dzj = dqj idpj .

    b) Em superfcies, pode-se mostrar que toda estrutura quase-com-plexa e automaticamente integravel. Como toda superfcie ori-entavel e simpletica, e como toda estrutura simpletica admiteestruturas quase-complexas compatveis, segue que toda su-perfcie orientavel e Kahler.

    c) Toda subvariedade complexa de uma variedade Kahler e Kahler.

    d) Os espacos projetivos complexos CP n sao variedades Kahler.Segue da parte c), portanto, que variedades projetivas nao-singulares sao variedades Kahler.

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    28 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Trataremos o exemplo dos espacos projetivos com mais detalheainda nesta secao. Antes, contudo, precisamos de uma descricao localmais explcita de formas simpleticas em variedades Kahler usandocoordenadas complexas.

    Seja (M,J) uma variedade complexa. Considere uma vizinhancaU com coordenadas complexas zj = xj+iyj , onde x1, . . . , xn, y1, . . . , ynsao coordenadas reais. Defina as 1-formas complexas dzj , dzk 1(U ,C),

    dzj = dxj + idyj , dzk = dxk idyk.

    Exerccio: Considere uma 1-forma arbitraria 1(U ,C), =Pj ajdxj +

    Pk bkdyk, onde aj , bk C

    (U ,C). Mostre que existem

    funcoes aj , b

    k C(U ,C), unicamente determinadas, satisfazendo

    =X

    j

    ajdzj +X

    k

    bkdzk.

    Como as formas dzj e dzk sao preservadas por mudancas de co-ordenadas holomorfas, segue do exerccio anterior que o espaco das1-formas complexas em M pode ser escrito como

    1(M,C) = 1,0 0,1,onde 1,0 e o espaco das 1-formas complexas que em coordenadascomplexas locais se escrevem como

    j ajdzj , enquanto que as formas

    em 0,1 se escrevem localmente como

    k bkdzk.Analogamente, o espaco das 2-formas complexas em M admite a

    decomposicao2(M,C) = 2,0 1,1 0,2,

    onde, em coordenadas complexas locais, elementos de 2,0 sao daforma

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    [SEC. 3.3: OUTROS EXEMPLOS IMPORTANTES 29

    outros operadores:

    = pir+1,sd : r,s r+1,s e = pir,s+1d : r,s r,s+1.(3.3.3)

    Exerccio: Para f C(M,C), observe que df = f + f . Use este fatopara concluir que d = + em geral. Como d2 = 0, conclua que

    2 = 0, = , 2

    = 0.

    Proposicao 3.3.3. Seja (M,J) uma variedade complexa e 2(M,C).Entao define uma estrutura Kahler se e somente se:

    i) 1,1,ii) Localmente, temos = i2

    hjkdzj dzk, onde (hjk) e uma

    matriz positiva-definida em cada ponto,

    iii) = 0, = 0.

    Demonstracao: Em coordenadas complexas locais, escrevemos

    =

    ajkdzj dzk +

    bjkdzj dzk +

    cjkdzj dzk,

    onde ajk, bjk , cjk C(U ,C). A primeira condicao de compatibil-idade entre e J em (2.4.2) e que J = . Usando as relacoesJdzj = idzj e J

    dzj = idzj , e facil ver que J = se e somentese ajk = cjk = 0, i.e., 1,1. Tomando bjk = i2hjk, temos aexpressao local

    =i

    2

    jk

    hjkdzj dzk,

    e vale que toma valores reais (i.e., = ) se e somente hjk = hkj ,ou seja, a matriz (hjk) e hermitiana em cada ponto. Alem disso, e nao-degenerada se e somente se a matriz (hjk) e nao-singular,enquanto que a segunda condicao de compatibilidade entre e J((X, JX) > 0 para X 6= 0) equivale a (hjk) ser positiva-definida emcada ponto.

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    30 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Finalmente, como 2,1 e 1,2, segue que d = + = 0 se e somente se = 0 e = 0.

    Considere numa carta complexa local os operadores

    zj:=

    1

    2

    (

    xj i

    yj

    )e

    zj:=

    1

    2

    (

    xj+ i

    yj

    ).

    Exerccio: Mostre que se f C(M,C), entao, em coordenadas com-

    plexas, temos f =P f

    zjdzj e f =

    P fzj

    dzj

    Corolario 3.3.4. Seja f C(M,R) tal que, em coordenadas com-plexas locais, a matriz

    (2f

    zjzk

    )e positiva-definida em todo ponto.

    Entao := i2f e uma forma simpletica Kahler.

    Demonstracao: Usando os dois ultimos exerccios, e imediato ver-ificar as condicoes i), ii) e iii) da Prop. 3.3.3.

    Podemos agora exibir a estrutura Kahler dos espacos projetivoscomplexos explicitamente.

    Exemplo 3.3.5 (Espaco projetivo complexo). O espaco proje-tivo complexo CP n e definido como o quociente de Cn+1\{0} pelarelacao de equivalencia (z0, . . . , zn) (z0, . . . , zn), onde C.Denotamos a classe de equivalencia de (z0, . . . , zn) por [z0, . . . , zn].

    Para cada {0, 1, . . . , n}, considere o subconjunto de CP n dadopor

    U := {[z0, . . . , zn] | z 6= 0},e seja : U Cn a aplicacao dada por

    ([z0, . . . , zn]) =

    (z0z, . . . ,

    z1z

    ,z+1z

    , . . . ,znz

    ).

    Exerccio: Considere o atlas de CPn dado por {(U, ), = 0, 1, . . . , n}.Mostre que as funcoes de transicao =

    1 sao dadas por

    (w1, . . . , wn) =1

    w(w1, . . . , w, 1, w+1, . . . , w1, w+1, . . . , wn),

    (3.3.4)e portanto sao holomorfas.

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    [SEC. 3.3: OUTROS EXEMPLOS IMPORTANTES 31

    Assim, temos em CP n uma estrutura complexa. Agora apresenta-mos a construcao de uma estrutura simpletica compatvel. Considereem Cn a funcao complexa

    f(z) = log(|z|2 + 1),para z = (z1, . . . , zn) Cn. Um calculo direto mostra que a matriz(

    2fzjzk

    )e positiva-definida em todo ponto (daremos um argumento

    alternativo abaixo), e segue do Corolario 3.3.4 que a 2-forma

    F S =i

    2f =

    i

    2

    [j dzj dzj

    1 +

    j zjzj (

    j zjdzj) (

    k zkdzk)

    (1 +

    j zjzj)2

    ](3.3.5)

    define uma estrutura Kahler em Cn. Para definir uma estruturaKahler em CP n, basta observarmos que F S e preservada pelas funcoesde transicao (3.3.4) do atlas construdo acima. Por exemplo,

    01(z1, . . . , zn) =1

    z1(1, z2, . . . , zn),

    e temos que

    01f(z) = f(z) log(|z1|2) = f(z) log(z1) log(z1).Portanto

    01F S =i

    201f =

    i

    2f +

    i

    2log(z1) i

    2log(z1) = F S.

    A forma simpletica em CP n dada em cartas por F S e chamada formade Fubini-Study .

    Observacao: Apresentamos aqui um argumento alternativo paraa condicao de positividade da forma de Fubini-Study, baseado naseguinte propriedade de simetria. Seja U(n + 1) o grupo das trans-formacoes lineares de Cn+1 que preservam o produto interno hermi-tiano canonico. A acao natural de U(n+ 1) em Cn+1 leva qualquerlinha complexa em qualquer outra, e portanto induz uma acao deU(n+ 1) em CP n que e transitiva.

    Exerccio: Verifique que F S e preservada por essa acao.

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    32 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Em particular, para mostrar que a forma de Fubini-Study satisfaza condicao de positividade do Corolario 3.3.4, e suficiente mostrar queisto vale em um unico ponto. Usando a expressao explcita para F Sem (3.3.5), e facil ver que no ponto z = 0 (que corresponde ao ponto[1, 0, . . . , 0] em U0), esta forma coincide com a forma canonica de Cn.Concluimos que a condicao de positividade e satisfeita em todo pontode CPn.

    E natural perguntarmos se toda variedade complexa que admiteuma estrutura simpletica, admite tambem uma estrutura simpleticaque seja compatvel. W. Thurston [37] mostrou que isso nao e ver-dade, ou seja, existem variedades que sao ao mesmo tempo complexase simpleticas mas nao admitem uma estrutura Kahler. Daremos aquios ingredientes basicos do exemplo.

    Exemplo 3.3.6 (Thurston). Considere R4, com coordenadas (x1, x2,y1, y2), munido da forma simpletica = dx1 dx2 + dy1 dy2. Para(a, b) Z2 Z2, considere o difeomorfismo de R4 dado por

    a,b(x1, x2, y1, y2) = (x1 + a1, x2 + a2, y1 + b1 + a2y2, y2 + b2)

    onde a = (a1, a2) e b = (b1, b2). Temos que = {a,b | (a, b) Z2 Z2} e um subgrupo do grupo de difeomorfismos de R4. Cadaelemento de e um simplectomorfismo de R4, e portanto o quocienteM = R4/ e uma variedade simpletica compacta (localmente sim-plectomorfa a (R4, )). Topologicamente, M e um fibrado de torosT2 sobre o T2, e possui tambem uma estrutura complexa (como con-sequencia da classificacao de Kodaira [25]).

    Como e o grupo de transformacoes de recobrimento de R4 M ,segue que M tem grupo fundamental pi1(M) = . Como o primeirogrupo de homologia e a abelianizacao do grupo fundamental, segueque H1(M,Z) = /[,], onde [,] e o ideal gerado por comuta-dores em . Pode-se checar que [,] = 0 0 Z 0, e portantoH1(M,Z) = Z Z Z. Com isso, segue que o primeiro numero debetti de M e mpar, o que contraria o fato de que os os numerosde betti mpares sao pares em uma variedade Kahler compacta (istosegue da decomposicao de Hodge, veja [44, Cap. V]).

    Para uma discussao sobre outros exemplos (em variedades sim-plesmente conexas, em dimensao maior, etc.), veja [29, Secao 3.1] eas referencias la contidas.

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    3.3.2 Orbitas coadjuntas

    Exemplos importantes de variedades simpleticas aparecem na teoriados grupos de Lie. Faremos aqui uma breve incursao no tema. Oleitor pode consultar, por exemplo, [19, 28] para mais detalhes.

    Um grupo de Lie e um grupo G munido de uma estrutura devariedade diferenciavel para qual a multiplicacao m : G G G euma aplicacao suave; neste caso, a inversao g 7 g1 tambem e suave,como consequencia do teorema da funcao implcita.

    Para cada g G, as aplicacoes Lg : G G, a 7 ga, e Rg : GG, a 7 ag sao difeomorfismos, com (Lg)1 = Lg1 e (Rg)1 = Rg1 .Dizemos que um campo de vetores X X(G) e invariante a` esquerdase (Lg)X = X , e invariante a` direita se (Rg)X = X , g G. Oespaco dos campos de vetores invariantes a` esquerda (resp. direita)e denotado por XL(G) (resp. XR(G)). Note que cada u TeGdetermina campos de vetores ul XL(G) e ur XR(G),

    ulg = deLg(u), e urg = deRg(u),

    e isso nos define um isomorfismo de espacos vetoriais:

    XL(G) = TeG = XR(G). (3.3.6)

    Uma algebra de Lie (real) e um espaco vetorial (real) g munido deum colchete [, ] : g g g que e bilinear, anti-simetrico e satisfaz aidentidade de Jacobi:

    [[u, v], w] + [[w, u], v] + [[v, w], u] = 0.

    Como o colchete de Lie de dois campos de vetores invariantes a` es-querda e invariante a` esquerda, podemos definir um colchete

    [, ] : TeG TeG TeG, [u, v] = [ul, vl](e),

    com respeito ao qual TeG e uma algebra de Lie, que denotamos porg e denominamos algebra de Lie de G.

    Observacao: A definicao do colchete em TeG em termos de camposinvariantes a` direita resultaria no mesmo colchete com o sinal oposto.

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    34 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Qualquer espaco vetorial V e um grupo de Lie abeliano com res-peito a soma de vetores. O grupo das matrizes reais nn invertveis,denotado GL(n,R), e um grupo de Lie com respeito ao produto.Como GL(n,R) e um aberto no espaco das matrizes Mn(R), seuespaco tangente na identidade e o proprio Mn(R). O colchete de Liee o comutador

    [A,B] := AB BA.Outros exemplos importantes sao dados por subgrupos deGL(n,R).

    Exemplo 3.3.7.

    a) O grupo linear ortogonal O(n) = {A GL(n,R) | AtA =Id}, ou seja, as transformacoes lineares de Rn que preservam oproduto interno canonico. A algebra de Lie associada e u(n) ={A Mn(R) | A = At}.O grupo O(n) tem duas componentes conexas, caracterizadaspelas condicoes det(A) = 1 ou det(A) = 1. O subgrupoSO(n) = {A O(n) | det(A) = 1} e chamado grupo ortogonalespecial, e tem a mesma algebra de Lie de O(n).

    b) Podemos considerar tambem matrizes complexas. Assim temosGL(n,C), o grupo das matrizes complexas invertveis. A algebrade Lie associada e Mn(C), com colchete dado pelo comutador.

    Definimos o grupo U(n) = {A GL(n,C) | AA = Id} dasmatrizes complexas que preservam o produto interno hermi-tiano canonico de Cn. Sua algebra de Lie e u(n) = {A Mn(C) | A = A}. Note, por exemplo, que U(1) = S1 eo grupo dos numeros complexos com valor absoluto igual a 1.

    De maneira mais geral, se V e um espaco vetorial (real, de di-mensao finita), consideramos o grupo de Lie GL(V ) das transforma-coes lineares invertveis de V em V . A algebra de Lie gl(V ) associadae dada pelo espaco de todos os endomorfismos lineares de V , e ocolchete e o comutador.

    Uma representacao de um grupo de Lie G num espaco vetorial Ve um homomorfismo de grupos de Lie : G GL(V ). A derivadadessa aplicacao na identidade, de : g gl(V ), e entao um homo-morfismo de algebras de Lie, e define uma representacao de g emV .

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    Dada uma representacao : G GL(V ) e um ponto x V , aorbita de x e a subvariedade imersa Ox = {y V | g G, g(x) =y} V , e vale que

    TxOx = {de(u)(x) | u g}, (3.3.7)usando a identificacao TxV = V .

    Duas representacoes canonicas associadas a qualquer grupo de Liesao as seguintes:

    Exemplo 3.3.8 (Representacoes adjunta e coadjunta).

    a) Para g G, considere a aplicacao Ig : G G, Ig(a) = gag1.Como Ig(e) = e, temos uma aplicacao linear

    Adg := deIg : g g.O homomorfismo Ad : G GL(g), g 7 Adg , e a representacaoadjunta de G em g. Neste caso, a representacao de g em ginduzida pela derivada e

    ad : g gl(g), u 7 adu,onde adu(v) = [u, v].

    b) Podemos dualizar a representacao adjunta e obter a representacaocoadjunta

    Ad : G GL(g), g 7 Adg := (Adg1),ou seja,Adg(), u = ,Adg1u, para g, u g. Note anecessidade de tomarmos a adjunta com respeito a g1 para quetenhamos um homomorfismo de grupos. Ao nvel das algebrasde Lie, temos a representacao

    ad : g gl(g), u 7 adu,definida por adu(), v = , [u, v].

    Exerccio: Suponha que g tenha um produto interno , que seja Ad-invariante, ou seja, Adgu,Adgu = u, v, para todo g G. Mostre que aidentificacao g = g induzida por este produto interno identifica tambemas representacoes adjunta e coadjunta.

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    36 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Como veremos agora, toda orbita coadjunta O g possui umaestrutura simpletica canonica. Este fato e comumente atribudo aKostant-Kirillov-Souriau.

    Considere g, e seja O a orbita coadjunta que passa por .Segue de (3.3.7) que os vetores da forma adu() geram o espaco TO,

    TO = {adu() | u g}.Note que se adu() = ad

    u(), entao

    , [u u, v] = (adu adu)() = 0,para todo v g. Portanto, para g fixo, o valor de , [u, v]depende apenas de adu e ad

    v no ponto . Podemos, com isso, definir

    uma forma bilinear anti-simetrica em TO por(ad

    u(), ad

    v()) := , [u, v], (3.3.8)

    e segue imediatamente da definicao que e nao degenerada. Obte-mos assim uma 2-forma nao-degenerada em cada ponto de O.Teorema 3.3.9. Seja O g uma orbita coadjunta. Entao (3.3.8)define uma 2-forma simpletica em O.Demonstracao: E um fato basico que a representacao adjuntapreserva o colchete de Lie, [Adg(u),Adg(v)] = Adg([u, v]). Portanto

    (Ad)g, [Adg(u),Adg(v)] = Adg,Adg([u, v]) = , [u, v],o que mostra que a 2-forma definida pontualmente por (3.3.8) einvariante pelas transformacoes adjuntas Adg . Como estas trans-formacoes agem transitivamente na orbita O, segue que e de fatosuave. Resta verificar que e fechada.

    Como g = (g), podemos considerar g C(g). Dado u g,temos que du 1(g) e definido por (du)() = (u). Assim

    (iadu())(adv()) = , [u, v] = (du)(adv()),

    e portanto iadu = du e exata (aqui pensamos em adu como um

    campo de vetores em g, definido em g por adu() g = Tg).Usando a formula de Cartan e a invariancia de , temos

    iadud = Ladu diadu = 0,

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    ou seja, d = 0.

    Exemplo 3.3.10.

    a) Considere o grupo

    SO(3) = {A GL(3,R) | AtA = Id, det(A) = 1}.

    Sua algebra de Lie e so(3) = {A M3(R) | A = At}. Pode-mos identificar so(3) com R3 de acordo comu1u2

    u3

    7 0 u3 u2u3 0 u1u2 u1 0

    .Com esta identificacao, o colchete de Lie em R3 e o produtovetorial, i.e., [u, v] = u v, e a representacao adjunta toma aforma

    AdA(u) = Au, adu(v) = u v.Como o produto interno usual de R3 e invariante pelas trans-formacoes de SO(3), a identificacao R3 = (R3) por ele induzidaidentifica tambem as representacoes adjunta e coadjunta. Por-tanto as orbitas coadjuntas em R3 sao as esferas centradas naorigem, incluindo a orbita singular {0}. Assim, para cada r > 0,temos a orbita coadjunta

    Or = { R3 | = r}.

    A forma simpletica em Or definida pelo Teorema 3.3.9 e

    =1

    rr, (3.3.9)

    onde r e a forma de area da esfera Or.

    Exerccio: Use a identidade u (v w) = vu,w wu, v para mostrarque r(u , v ) = r, u v. Com isso, prove (3.3.9).

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    38 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    b) Considere o grupo de Lie U(n) (Exemplo 3.3.7, parte b)). Suaalgebra de Lie u(n), dada por matrizes complexas anti-hermiti-anas, possui um produto interno invariante pela representacaoadjunta,

    (A,B) 7 tr(AB).Podemos usar este produto interno para identificar u(n) comu(n). Como u(n) = iH, onde H = { Mn(C) | = } eo espaco das matrizes hermitianas, temos a identificacao H =u(n) dada por

    , u = tr(iu), u u(n), H.Com esta identificacao, a representacao coadjunta de U(n) emH e

    AdA() = AA1.

    Portanto duas matrizes em H estao na mesma orbita coadjuntase e somente se elas tem o mesmo espectro. Assim, cada listade n numeros reais = (1, . . . , n), com 1 2 . . . n,define uma orbita coadjunta

    O = { H | espectro() = }.

    A topologia das orbitas varia de acordo com . Por exemplo, se1 < 2 = . . . = n, entao cada O e totalmente caracteri-zado por uma linha complexa em Cn; pense nesta linha como oautoespaco associado ao autovalor 1, de modo que o seu com-plemento ortogonal em Cn e o autoespaco associado ao outroautovalor. Portanto a linha complexa caracteriza a matriz completamente. Assim, para 1 < 2 = . . . = n, temos

    O = CPn1,

    e obtemos, pelo Teorema 3.3.9, uma famlia a dois parametrosde formas simpleticas em CP n, todas multiplas da forma deFubini-Study.

    Mais geralmente, no caso 1 = 2 = . . . = k < k+1 = . . . =n, cada ponto da orbita O e totalmente determinado por umk-plano complexo em Cn, visto como o autoespaco associado ao

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    autovalor 1, com multiplicidade k, de modo que o autoespacoassociado a k+1, com multiplicidade (n k), e o seu comple-mento ortogonal. Assim, neste caso, temos

    O = Gr(k, n),

    a grassmanniana de k-planos em Cn.

    Para 1 < 2 < . . . n, cada O e caracterizado pelos nautoespacos Lj , ou, equivalentemente, pelos subespacos Ei =ijLj ,

    E1 E2 . . . En = Cn.Em outras palavras, O e uma variedade flag completa. Paraos outros tipos de espectro, as orbitas sao variedades flagincompletas.

    Os exemplos anteriores ilustram ainda o fato geral de que orbitascoadjuntas de grupos de Lie compactos sao nao apenas simpleticas,mas de fato Kahler.

    3.4 Obstrucoes

    Vimos que toda variedade simpletica tem dimensao par e e orientavel.Uma questao central em geometria simpletica e se, dada uma var-iedade M satisfazendo essas condicoes, existe ou nao alguma estru-tura simpletica em M . Descreveremos nessa secao uma simples ob-strucao na cohomologia de M .

    Proposicao 3.4.1. Seja M uma variedade compacta de dimensao2n. Se M admite alguma estrutura simpletica, entao existe um ele-mento a H2

    dR(M,R) tal que an 6= 0. Em particular, H2k

    dR(M,R) 6= 0

    para todo k = 1, . . . , n.

    Demonstracao: Se 2(M) e forma simpletica, seja a = [] H2

    dR(M,R). Como n 2n(M) e uma forma de volume, temos que

    M

    n 6= 0.

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    40 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    Por outro lado, se an = 0, entao n e exata, n = d. Pelo teoremade Stokes, temos

    M

    n =

    M

    d =

    M

    = 0,

    o que nao e possvel. Portanto an 6= 0.

    Segue diretamente da proposicao anterior que variedades comoS2n, n > 1, ou S3 S1, nao admitem estruturas simpleticas, ja queem todas temos H2

    dR= 0.

    Exerccio: Verifique que o mesmo argumento dado na prova da Prop. 3.4.1mostra que nao ha subvariedades simpleticas compactas de (R2n, 0).

    Existe ainda um outro tipo de obstrucao, de natureza topologica,que impede certas variedades de dimensao par e orientaveis de ad-mitirem sequer uma estrutura quase-simpletica. Observe que, comovimos na Secao 3.3.1, uma variedade admite uma estrutura quase-simpletica se e somente se admite uma estrutura quase-complexa (eessas estruturas podem ate mesmo ser escolhidas de forma a seremcompatveis). As obstrucoes topologicas para a existencia de estru-turas quase-simpleticas/complexas podem ser expressas em termos declasses caractersticas, e sao usadas para mostrar, por exemplo, quedentre as esferas de dimensao par, apenas S2 e S6 admitem estruturaquase-complexa/simpletica.

    Se M e uma variedade aberta (i.e., sem componentes compactas),segue do trabalho de Gromov, veja e.g [29, Cap. 7], que se M ad-mite uma estrutura quase-simpletica, entao admite uma estruturasimpletica homotopica a ela (homotopia via estruturas quase-simple-ticas). Para variedades compactas, nao e verdade que a existenciade uma estrutura quase-simpletica garanta que a variedade admiteuma estrutura simpletica (ainda que a condicao necessaria dada pelaProp. 3.4.1 seja satisfeita). Por exemplo, foi provado por Taubes [36],usando a teoria dos invariantes de Seiberg-Witten, que a soma conexaCP 2#CP 2#CP 2 e quase-complexa mas nao e simpletica (esta var-iedade tambem nao e complexa, como consequencia da classificacaode Kodaira [25]).

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    [SEC. 3.5: SUBVARIEDADES 41

    Como ja observamos, os problemas de existencia de estruturasquase-simpleticas e quase-complexas sao equivalentes. Mas isso naoe mais verdade se impusermos as condicoes de integrabilidade. Porexemplo, existem variedades simpleticas que nao admitem estruturascomplexas [14]. E podemos usar a Prop. 3.4.1 para dar um exemplode uma variedade complexa que nao e simpletica:

    Exemplo 3.4.2 (Superfcie de Hopf). Considere Z agindo emC2\{0} por

    n (z1, z2) = (2nz1, 2nz2),de modo que a relacao de equivalencia dada pelas orbitas e (z1, z2) (2z1, 2z2). Como a acao e via transformacoes holomorfas, preserva aestrutura complexa. Temos assim uma estrutura complexa induzidano quociente M = (C2\{0})/ , para a qual a aplicacao quociente eum biholomorfismo local.

    Para ver que M nao admite nenhuma estrutura simpletica, ob-serve que C2\{0} e difeomorfo a S3 R atraves da aplicacao

    f : S3 R C2\{0}, f(z1, z2, t) = (2tz1, 2tz2).

    Com essa identificacao, a acao de Z em S3 R e n (z1, z2, t) =(z1, z2, t + n). Portanto M = S3 S1, que nao e simpletico pelaProp. 3.4.1.

    Note que o Exemplo 3.3.6 ilustra ainda o fato de que existemvariedades que admitem estruturas complexas e simpleticas, mas es-tas nao podem ser escolhidas de forma compatvel (o que e semprepossvel para estruturas quase-simpleticas/complexas). O leitor podeachar mais detalhes sobre a discussao de obstrucoes, com referenciasaos artigos originais, em [7, 8, 29].

    3.5 Subvariedades

    Em uma variedade simpletica (M,), existem tipos de subvariedadesanalogos aos subespacos descritos na Secao 2.2.

    Uma subvariedade N M (ou, mais geralmente, uma imersao)e chamada coisotropica (resp. isotropica, lagrangiana, simpletica) se,

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    42 [CAP. 3: VARIEDADES SIMPLETICAS

    para todo x M , TxN e um subespaco coisotropico (resp. isotropico,lagrangiano, simpletico) de (TxM,x).

    Por exemplo, toda curva e uma subvariedade isotropica, e todahipersuperfcie e coisotropica. Nosso foco principal sera, no entanto,nas subvariedades que sao ao mesmo tempo isotropicas e coisotropicas,i.e., lagrangianas. Ilustraremos nesta secao como varios objetos natu-rais em geometria simpletica podem ser expressos como subvariedadeslagrangianas.

    Sejam (M1, 1) e (M2, 2) duas variedades simpleticas, e denotepor M2 a variedade simpletica (M2,2).Proposicao 3.5.1. Um difeomorfismo : M1 M2 e um simplec-tomorfismo se e somente se o grafico de , graf() = {(x, (x)), x M1}, e subvariedade lagrangiana de M1 M2.Demonstracao: Considere o mergulho : M1 M1M2, (x) =(x, (x)). Entao

    (pr11 pr22) = (pr1 )1 (pr2 )2 = 1 2,

    e o resultado segue imediatamente.

    Observamos agora como alguns objetos geometricos associados auma variedadeQ sao representados por subvariedades lagrangianas deT Q. Lembre que, em coordenadas cotangentes (x1, . . . , xn, 1, . . . , n),a forma canonica e

    =

    j

    dxj dj .

    E simples ver que tanto as fibras da projecao pi : T Q Q quantoa secao zero Q T Q sao subvariedades isotropicas de dimensaomaxima (= 12dim(T

    Q)), portanto sao lagrangianas. Esses dois ex-emplos sao casos particulares da proxima proposicao.

    Proposicao 3.5.2. Suponha que Q tem dimensao n, e seja S Quma subvariedade de dimensao k. Entao o fibrado conormal de S,

    NS := {(x, ) T Q | x S, T xQ, tal que |TxS = 0}

    e subvariedade lagrangiana de T Q.

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    [SEC. 3.5: SUBVARIEDADES 43

    Demonstracao: Podemos escolher coordenadas locais (x1, . . . , xn)em Q tais que S e definida localmente pelas condicoes

    xk+1 = . . . = xn = 0.

    Nas coordenadas (x1, . . . , xn, 1, . . . , n) de TQ, o fibrado conormal

    NS e definido por

    xk+1 = . . . = xn = 0, 1 = . . . = k = 0.

    Portanto, em pontos de NS, podemos escrever =

    j>k jdxj , e

    vemos que se anula nos vetores xi , i = 1, . . . , k. Isso mostra que = 0, onde : NS T Q e a inclusao.

    A proxima classe de exemplos e importante no estudo de in-tersecoes de variedades lagrangianas, veja Secao 4.4.

    Toda 1-forma 1(Q) define uma subvariedadeN := {(x, x) , x Q} T Q,

    caracterizada pela propriedade de que pi : T Q Q projeta Ndifeomorficamente sobre Q.

    Proposicao 3.5.3. A subvariedade N, 1(Q), e lagrangianase e somente se d = 0.

    Demonstracao: Note que N e a imagem da aplicacao : Q T Q. Lembrando que

    = ,

    onde e a 1-forma tautologica (veja exerccio na secao 3.2), segueque

    = d = d = d,e portanto = 0 se e somente se d = 0.

    Portanto subvariedades de Q e 1-formas fechadas em Q estaonaturalmente associadas a subvariedades lagrangianas de T Q.

    No artigo [43], a importancia de subvariedades lagrangianas e ex-pressa no credo simpletico de A. Weinstein: tudo e uma subvar-iedade lagrangiana. Em outras palavras, objetos e construcoes emgeometria simpletica podem, em geral, ser entendidos em termos desubvariedades lagrangianas.

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    Captulo 4

    O metodo de Moser e

    formas normais

    O metodo de Moser, descrito neste captulo, e peca fundamentalna demonstracao de varios resultados de rigidez local em geometriasimpletica. O metodo se baseia na construcao de simplectomorfismosatraves de deformacoes do difeomorfismo identidade. De forma maisprecisa, consideraremos famlias a 1-parametro de difeomorfismos deuma variedade M , t : M M , tal que 0 = Id. Nos referimos atal famlia como uma isotopia.

    Toda isotopia define um campo de vetores tempo-dependente Xtatraves da equacao

    dtdt

    = Xt t. (4.0.1)Reciprocamente, se os campos de vetores na famlia Xt forem com-pletos, entao (4.0.1) define uma isotopia t, t R, veja [2, Cap. 4].

    A derivada de Lie pode ser usada na descricao da variacao deformas diferencias atraves de isotopias pela formula

    d

    dtt =

    tLXt, (4.0.2)

    onde k(M), veja [2, Secao 5.4]. A equacao (4.0.2) pode ser gene-ralizada para tratar, ainda, a variacao de formas diferencias tempo-

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    [SEC. 4.1: O TRUQUE DE MOSER 45

    dependentes t:

    d

    dttt =

    d

    dxxt

    x=t

    +d

    dyty

    y=t

    = t (LXtt +d

    dtt). (4.0.3)

    Com essas preliminares, podemos passar ao metodo de Moser.

    4.1 O truque de Moser

    Comecamos ilustrando o metodo, ou truque, de Moser no seu con-texto original [30].

    Teorema 4.1.1 (Moser). Seja M variedade compacta e orientadade dimensao n. Sejam 0 e 1 formas de volume tais que

    M

    0 =

    M

    1.

    Entao existe um difeomorfismo : M M tal que 1 = 0.Demonstracao: O primeiro passo e construir o difeomorfismo atraves de uma isotopia t Dif(M), 0 = Id, de modo que = 1.Para tal, consideramos a famlia

    t = t1 + (1 t)0,notando que cada t e ainda uma forma de volume. A hipotese deque 0 e 1 tem a mesma integral sobre M assegura que essas formassao cohomologas, ou seja, existe n1(M) tal que 1 = 0 + d,de modo que

    t = 0 + td.

    Como estamos a procura de uma isotopia t e M e compacto, pode-mos defini-la atraves do campo de vetores dependente do tempo Xtque a gera,

    d

    dtt = Xt t.

    E suficiente construrmos uma isotopia tal que t t = 0, ou seja,usando (4.0.3),

    d

    dt(t t) =

    t

    (d

    dtt + LXtt

    )= 0.

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    46 [CAP. 4: O METODO DE MOSER E FORMAS NORMAIS

    Usando a formula de Cartan e o fato de que dt = 0, vemos que aultima equacao equivale a

    d

    dtt + diXtt = d( + iXtt) = 0.

    Portanto, para a construcao da isotopia, e suficiente achar Xt satis-fazendo

    iXtt + = 0. (4.1.1)

    Como t e uma forma de volume, a aplicacao X(M) n1(M),X 7 iXt, e um isomorfismo para cada t. Portanto, para cada t,(4.1.1) tem solucao unica. O fluxo de Xt define uma isotopia t satis-fazendo t t = 0, e = 1 e o difeomorfismo desejado.

    Uma aplicacao tpica do metodo de Moser em geometria simpleticamostra a rigidez, ou estabilidade, de famlias de formas simpleticasdentro de uma mesma classe de cohomologia.

    Teorema 4.1.2. Seja M uma variedade compacta, e seja t umafamlia suave de formas simpleticas, t [0, 1]. Suponha que existauma famlia suave t 2(M) tal que

    t = 0 + dt. (4.1.2)

    Entao existe uma isotopia t Dif(M) tal que tt = 0 para todot [0, 1].Demonstracao: Seguindo o truque de Moser, definiremos a isotopiat atraves de seu gerador infinitesimal Xt. Exatamente como naprova do Teorema 4.1.1, temos que a condicao tt = 0 e equiva-lente a

    d

    (d

    dtt + iXtt

    )= 0.

    Portanto basta resolver a equacao

    iXtt +d

    dtt = 0,

    o que e sempre possvel ja que t e simpletica para todo t.

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    [SEC. 4.2: O TEOREMA DE DARBOUX 47

    Exerccio: Considere a bola aberta B2n em (R2n , 0) com a estruturasimpletica induzida. Mostre que as formas simpleticas t = et0 em B2n

    nao sao simplectomorfas umas as outras (por exemplo, verifique que ovolume definido por cada uma e diferente). Conclua que o Teorema 4.1.2nao e valido sem a hipotese de compacidade de M .

    Observacao: E claro que se (4.1.2) e satisfeita, entao [t] = [0],t [0, 1]. Pode-se mostrar que, na verdade, vale a recproca, i.e.,se a classe de cohomologia de t independe de t, entao existe umafamlia suave t satisfazendo (4.1.2). O ponto delicado e mostrar adependencia suave da famlia t em t, mas isso pode ser feito, porexemplo, usando teoria de Hodge, veja [29, Secao 3.2].

    4.2 O teorema de Darboux

    Usaremos agora o metodo de Moser para mostrar a rigidez de estru-turas simpleticas na vinhanca de subvariedades.

    Seja Q M uma subvariedade de uma variedade M . Precisare-mos da seguinte generalizacao do lema de Poincare:

    Lema 4.2.1. Seja k(M) uma k-forma fechada tal que |TxQ = 0para todo x Q. Entao existe uma vizinhanca U de Q em M e umak 1-forma em U tal que = d e |TxM = 0 para todo x Q.Demonstracao: Pelo teorema da vizinhanca tubular, Q possui umavizinhanca U para qual existe um difeomorfismo : U V , onde Ve uma vizinhanca de Q no fibrado normal NQ = TM/TQ

    pi Q e(x) = x, x Q. Podemos, ainda, escolher a vizinhanca V coma propriedade de que, se (x, v) V , entao (x, tv) V , t [0, 1].(Com a escolha de uma metrica em M , identificamos NQ com TQ,e podemos definir como a aplicacao exponencial restrita a umavizinhanca suficientemente pequena de Q em TQ.)

    Basta, portanto, provar o resultado para a vizinhanca V em NQ.Para cada t [0, 1], considere a aplicacao t : V V , t(x, v) =(x, tv). Seja Xt o campo tempo-dependente cujo fluxo gera t, ouseja, ddtt = Xt t para t > 0. Como e fechada, usando (4.0.3),temos

    d

    dtt =

    tLXt = t d(iXt) = d(t iXt).

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    48 [CAP. 4: O METODO DE MOSER E FORMAS NORMAIS

    Como limt0 t = pi

    = 0, onde : Q NQ e a inclusao, e1 = Id, temos

    = 1 limt0

    t = limt0

    1t

    d

    dtt dt = d,

    onde = 10

    t iXt dt. Como t(x) = x, x Q, temos que

    Xt|Q = 0, e portanto |Q = 0.

    O proximo exerccio mostra que a tecnica usada na demonstracaodo lema anterior pode mostrar um resultado mais geral, veja e.g. [2,Cap. 6].

    Exerccio: Sejam M1,M2 variedades, e f0, f1 : M1 M2 aplicacoessuaves homotopicas. Denote a homotopia (suave) por f : M1[0, 1] M2.Mostre que o operador H : k(M2) k1(M1),

    H :=

    Z[0,1]

    f,

    satisfaz f1 f

    0 = dH + Hd, onde ft(x) = f(x, t). (O operador H echamado operador de homotopia.)

    Observacao: No exerccio anterior, note que, se d = 0, entao(f1 f0 ) = d(H) e exata. Segue desse resultado, por exemplo, ainvariancia homotopica da cohomologia de de Rham.

    Passemos agora ao teorema de Darboux para vizinhancas de sub-variedades.

    Teorema 4.2.2. Sejam 0 e 1 formas simpleticas em M satis-fazendo

    0|TxM = 1|TxM x Q.Entao existem vizinhancas U0 e U1 de Q e um difeomorfismo :U0 U1 tal que

    (x) = x x Q, e 1 = 0.Demonstracao: Pelo Lema 4.2.1, Q possui uma vizinhanca ondeexiste 1-forma tal que

    d = 1 0, e |TxM = 0, x Q.

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    [SEC. 4.3: TEOREMAS DE WEINSTEIN PARA VIZINHANCAS DE SUBVARIEDADES 49

    Considere a famlia de 2-formas fechadas nessa vizinhanca dada por

    t = (1 t)0 + t1 = 0 + td.Para cada t [0, 1], a forma t e simpletica em todo ponto de Q. Por-tanto cada x Q possui uma vizinhanca em M onde t e simpletica.Diminuindo essa vizinhanca se necessario, podemos assumir que nelatodo t e simpletico se t

    esta numa vizinhanca de t. Como [0, 1]e compacto, conclumos que existe uma vizinhanca de x onde t esimpletica para todo t [0, 1]. Tomando a uniao desses abertos,obtemos uma vizinhanca U0 de Q onde t e simpletica para todot [0, 1].

    Seguindo o metodo de Moser, sabemos que para achar uma iso-topia t com

    tt = 0, basta resolvermos a equacao

    iXtt = ,o que e sempre possvel ja que t e simpletica.

    Como x = 0 para x Q, Xt|Q = 0. Portanto, diminuindo U0se necessario, podemos assumir que o fluxo t, integrando Xt, estadefinido para todo t [0, 1]. Como Xt|Q = 0, temos t|Q = Id, eassim = 1 e U1 = 1(U0).

    Tomando Q como um ponto em M , obtemos o teorema de Dar-boux:

    Corolario 4.2.3 (Teorema de Darboux). Se (M,) e variedadesimpletica de dimensao 2n, entao todo x M possui vizinhanca sim-plectomorfa a uma vizinhanca de 0 R2n munida da forma simpleticacanonica.

    Como consequencia, toda variedade simpletica possui uma atlassimpletico. Para uma demonstracao alternativa do teorema de Dar-boux sem o uso do metodo de Moser, veja e.g. [5, 7].

    4.3 Teoremas de Weinstein para vizinhan-

    cas de subvariedades

    Vamos agora usar o Teorema 4.2.2 para estudar vizinhancas de sub-variedades, seguindo Weinstein [40].

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    50 [CAP. 4: O METODO DE MOSER E FORMAS NORMAIS

    SeQ (M,) e uma subvariedade simpletica, temos que TM |Q =TQ (TQ). Portanto, para x Q, (TxQ) e subespaco simpleticode TxM . Em outras palavras, (TQ

    , |TQ) e um fibrado vetorialsimpletico sobre Q.

    Teorema 4.3.1. Sejam 0 e 1 formas simpleticas em M , e seja : Q M uma subvariedade simpletica com respeito a 0 e 1.Suponha que 0 =

    1 e que exista um isomorfismo de fibradossimpleticos : TQ1 TQ2 cobrindo a identidade . Entao existemvizinhancas U0 e U1 de Q e um difeomorfismo : U0 U1 tal que|Q = Id e 1 = 0.Demonstracao: Como TM |Q = TQ TQi , i = 0, 1, segue queexiste uma identificacao natural TQ1 = NQ = TQ2 , onde NQ eo fibrado normal de Q. Pelo teorema da vizinhanca tubular, existeuma vizinhanca V0 de Q em M difeomorfa a uma vizinhanca de Q emNQ. Portanto, o isomorfismo de fibrados : TQ0 TQ1 induzum difeomorfismo : V0 (V0) satisfazendo

    |Q = Id, e d|TQ0 = . (4.3.1)Considere as formas simpleticas 0 e

    1 em V0. Como preservaas formas simpleticas nas fibras, segue de (4.3.1) que

    0|TxM = 1|TxM , x Q.O resto da demonstracao segue do Teorema 4.2.2.

    Suponha agora que : L (M,) e uma subvariedade lagrangiana.Teorema 4.3.2 (Teorema da vizinhanca lagrangiana). Existeuma vizinhanca U0 da secao zero L T L, uma vizinhanca U de Lem M , e um difeomorfismo : U0 U tal que (x) = x, x L, e e a forma simpletica canonica de T L.

    Demonstracao: Sabemos que o fibrado TM |L sobre L e simpleticoe contem TL como subfibrado lagrangiano. Seja J uma estruturaquase-complexa em M compatvel com . Segue da compatibilidadeque E := J(TL) e um subfibrado lagrangiano de TM |L tal que

    TM |L = TLE.

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    [SEC. 4.4: APLICACAO A PONTOS FIXOS DE SIMPLECTOMORFISMOS 51

    (Veja o exerccio anterior ao Teorema 2.4.2.)Note que, para x L, temos

    x((u, a), (v, b)) = x(u, b) x(v, a), (4.3.2)

    onde u, v TxL e a, b Ex.

    Exerccio: Mostre que a aplicacao E (TL), a (, a)|TL e um iso-morfismo de fibrados.

    Segue imediatamente do exerccio anterior e de (4.3.2) que temosum isomorfismo

    TM |L TL (TL) (4.3.3)que cobre a identidade e preserva a estrutura simpletica em cadafibra. De maneira totalmente analoga, obtemos um isomorfismo

    T (T L)|L TL (TL) (4.3.4)

    com essas mesmas propriedades.A discussao anterior mostra que os fibrados normais de L em

    T L e M sao isomorfos, ja que ambos podem ser identificados como fibrado T L L. Pelo teorema da vizinhanca tubular, existeum difeomorfismo entre vizinhancas de L em T L e M , e tal qued|L : TM |L T (T L)|L e a identificacao induzida por (4.3.3) e(4.3.4). Portanto d|L preserva a estrutura simpletica das fibras.Segue que can|L = |L. Podemos agora usar o Teorema 4.2.2para obter o resultado desejado.

    O Teorema 4.3.2 pode ser generalizado para subvariedades isotro-picas e coisotropicas, veja e.g. [17, 27].

    4.4 Aplicacao a pontos fixos de simplec-

    tomorfismos

    Discutiremos aqui, brevemente, uma aplicacao do teorema da vizi-nhanca lagrangiana ao problema de se estimar o numero de pontosfixos de simplectomorfimos.

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    52 [CAP. 4: O METODO DE MOSER E FORMAS NORMAIS

    Seja (M,) uma variedade simpletica e seja f : M M umsimplectomorfismo. Sabemos que o grafico de f , denotado por f ,e uma subvariedade lagrangiana de M M = (M,) (M,). Adiagonal em MM tambem e uma subvariedade lagrangiana, e ospontos fixos de f podem ser identificados com os pontos na intersecaode f e .

    Proposicao 4.4.1. Seja (M,) uma variedade simpletica compactacom H1dR(M,R) = {0}. Entao todo simplectomorfismo f suficiente-mente proximo da identidade na topologia C1 tem pelo menos doispontos fixos.

    Demonstracao: Como = M , segue do teorema da vizinhancalagrangiana que podemos identificar uma vizinhanca U de em MM com uma vizinhanca U0 da secao zero M T M atraves de umsimplectomorfismo : U U0 tal que (x, x) = x, para x M .

    Se f Simp(M,) esta suficientemente proximo da identidadena topologia C0, entao f esta contido em U . Ademais, se f estaproximo da identidade na topologia C1, entao nao so f U ,mas tambem (f ) U0 e o grafico de uma 1-forma f . Comoeste grafico e lagrangiano, temos que df = 0, e o fato de queH1dR(M,R) = 0 implica que existe h C(M) tal que f = dh.Como M e compacta, h tem pelo menos dois pontos crticos, ou seja,f intersecta a secao zero M T M em pelo menos dois pontos. Efacil ver que esses pontos correspondem, via , a pontos em f .

    A proposicao acima ilustra a relacao entre o numero de pon-tos fixos de simplectomorfismos de M e o numero mnimo de pon-tos crticos de funcoes em M . Sem assumir a hipotese na coho-mologia, a proposicao continua valida para difeomorfismos hamil-tonianos, ou seja, simplectomorfismos dados pelo tempo 1 de umfluxo hamiltoniano (tempo dependente ou nao), proximos da iden-tidade. O problema de dar uma limitacao inferior ao numero depontos fixos de difeomorfismos hamiltonianos quaisquer, sem neces-sariamente estarem proximos da identidade, e parte da conjecturade Arnold , que tem sido uma das principais motivacoes para o de-senvolvimento da topologia simpletica, veja [21, 29, 33] para umadiscussao com referencias.

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    Captulo 5

    Hipersuperfcies de

    contato

    5.1 Definicoes e exemplos

    Seja N2n1 uma variedade de dimensao mpar. Dizemos que uma 1-forma em N e de contato se (d)n1 e uma forma de volume emN . Se e uma forma de contato em N , chamamos o par (N,) umavariedade de contato. Variedades de contato sao consideradas objetosanalogos a variedades simpleticas em dimensao mpar, e existe umavasta teoria sobre o assunto, veja e.g. [29, Secao 3.4].

    Iremos neste captulo considerar hipersuperfcies de variedadessimpleticas que possuem uma forma de contato relacionada a` formasimpletica. Mais precisamente, uma hipersuperfcie S de uma var-iedade simpletica (M2n, ) e uma hipersuperfcie de contato se existeuma forma de contato em S tal que d = , onde : S M ea inclusao.

    Nveis de energia de sistemas hamiltonianos dados por hipersu-perfcies de contato possuem propriedades especiais de estabilidade desua dinamica, como veremos no Captulo 6. Tais propriedades decor-rem do teorema a seguir, que caracteriza hipersuperfcies de contatopela existencia de campos conformemente simpleticos transversais aelas.

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    54 [CAP. 5: HIPERSUPERFICIES DE CONTATO

    Teorema 5.1.1. Uma hipersuperfcie compacta e orientada S deuma variedade simpletica (M 2n, ) e de contato se e somente se ex-iste um campo vetorial X definido em uma vizinhanca U de S talque

    i) X e conformemente simpletico, ou seja, LX = ;ii) X e transversal a S.

    Exerccio: Mostre que um campo X satisfaz a equacao LX = see somente se seu fluxo t satisfaz t = e

    t para todo t R, onde testa definido. Esta e a razao de tal campo ser chamado conformementesimpletico.

    Demonstracao: Suponha que existe o campo X e defina = iX.Pela formula de Cartan, temos que

    d = LX = .

    Como S possui dimensao mpar, existe Y TxS tal que x(Y, v) = 0para todo x S e v TxS. Como e nao-degenerada, x(Y ) =x(X(x), Y ) 6= 0. Portanto

    Dx = {v TxS;x(X(x), v) = 0}

    define uma distribuicao de hiperplanos em S complementar a Y , demaneira que d|D = |D e nao-degenerada. Consequentemente, (d)n1 6= 0.

    Para provar a recproca, temos que estender a forma de contato em S para uma vizinhanca de S como uma primitiva de :

    Lema 5.1.2. Existe uma vizinhanca U de S e uma 1-forma em Utal que d = e = .

    Demonstracao: Pelo teorema da vizinhanca tubular, como S ecompacta e orientada, existe uma vizinhanca U de S e um difeomor-fismo : S (1, 1) U tal que (x, 0) = x para todo x S. Com-pondo a inversa de com a projecao no primeiro fator de S(1, 1),obtemos uma aplicacao r : U S. Seja = r. Temos que = r = , pois |S e a identidade.

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    [SEC. 5.1: DEFINICOES E EXEMPLOS 55

    Considere agora a 2-forma := d em U . Repare que efechada e = 0. Com efeito, d = d = 0 e

    = d = d d = 0.Pelo Lema 4.2.1, existe uma 1-forma em U tal que = d e = 0.

    Definimos entao a 1-forma = + . Como d = d( + ) =d + d = e = = , concluimos a demonstracao dolema.

    Considere agora o campo X em U dado pela equacao iX = .Afirmamos que este e o campo desejado. Com efeito,

    LX = d(iX) = d = .Para mostrar que X e transversal a S, considere em S o campo Yunicamente caracterizado pelas equacoes

    (Y ) = 1 e iY d = 0.

    Agora, note que(X,Y ) = (Y ) = 1.

    Mas, se X e tangente a S em algum ponto x S, temos que(X(x), Y (x)) = d(X(x), Y (x)) = 0,

    chegando a um absurdo.

    O teorema acima nos permite dar varios exemplos de hipersu-perfcies de contato:

    Exemplo 5.1.3. Note que o campo radial X(x) = (1/2)x, onde x =(q, p) R2n, e claramente conformemente simpletico com respeito a0 =

    i dqidpi, pois iX0 = 12

    i qidpipidqi. Portanto, segue do

    teorema acima que a esfera S2n1 e de contato com forma de contato12

    i pidqi qidpi.

    Exemplo 5.1.4. Considere o fibrado cotangente T Q munido comsua forma simpletica canonica . Seja X(q, p) = p o campo radialao longo das fibras de T Q. Note que iX =

    i pidqi = ,

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    56 [CAP. 5: HIPERSUPERFICIES DE CONTATO

    onde e a 1-forma tautologica definida na Secao 3.2. Fixe umametrica riemanniana em Q e defina o fibrado unitario cotangenteUQ = {(q, p) T Q; p = 1}. Como X e sempre transversal aUQ, temos que UQ e uma hipersuperfcie de contato com forma decontato .Exemplo 5.1.5 (Hipersuperfcie em R2n que nao e de con-tato). Seja R > r e considere uma hipersuperfcie S em R2n difeo-morfa a` esfera que tangencia o bordo dos cilindros Z(R) e Z(r), onder < R e Z(r) := {(q, p) R2n; q21 + p21 r}, como na figura 5.1.

    Figura 5.1: Hipersuperfcie que nao e de contato.

    Seja n um campo normal a S que em pontos na intersecao de Scom Z(r) aponta para dentro de Z(r) e na intersecao de S com Z(R)aponta para fora de Z(R) (tome, por exemplo, n tal que

    n(q1, ..., qn, p1, ..., pn) = (q1, 0, ..., 0, p1, 0, ..., 0)

    em Z(R) S en(q1, ..., qn, p1, ..., pn) = (q1, 0, ..., 0, p1, 0, ..., 0)

    em Z(r) S). Note que J0n e um campo tangente a S e, como0(n, J0v) = n, v = 0 para todo v TS, o nucleo de 0|TS egerado por J0n.

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    [SEC. 5.2: FORMA NORMAL DE VIZINHANCAS DE HIPERSUPERFICIES DE CONTATO57

    Suponha que S possui uma forma de contato , de maneira que(J0n(q, p)) > 0 para todo (q, p) S ou (J0n(q, p)) < 0 para todo(q, p) S. Suponhamos, sem perda de generalidade, que (J0n) > 0.Pela construcao de S, J0n possui duas orbitas periodicas r e R naintersecao de S com Z(R) e Z(r) tangentes ao plano (q1, p1) comdirecoes opostas (ver Figura 5.1)

    Seja =

    i pidqi, de forma que d = 0 em S. E facil ver quer

    = pir2 e

    R

    = piR2,

    de acordo com a orientacao indicada na Figura 5.1.Por outro lado, como S e difeomorfa a` esfera, existe uma funcao

    f em S tal que |S = df . Consequentemente,r

    =

    r

    > 0 e

    R

    =

    R

    < 0.

    Mas (J0n) > 0, absurdo.

    5.2 Forma normal de vizinhancas de hiper-

    superfcies de contato

    Seja agora (N,) uma variedade de contato. A partir de (N,)podemos construir uma variedade simpletica, denominada de simple-tizacao de N , dada por N R com a 2-forma = d(et).

    Exerccio: Mostre que e simpletica.

    O teorema seguinte diz que localmente uma hipersuperfcie decontato e equivalente a sua simpletizacao:

    Teorema 5.2.1. Seja S uma hipersuperfcie de contato compactae orientada de uma variedade simpletica (M,). Entao existe umavizinhanca U de S, > 0 e um simplectomorfismo

    : (U, ) (S (, ), d(et)).

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    58 [CAP. 5: HIPERSUPERFICIES DE CONTATO

    Demonstracao: Considere um difeomorfismo f : U S (1, 1)sobre uma vizinhanca U de S tal que f |S e a identidade. Podemos es-colher f de maneira que fX =

    t , ondeX e o campo conformemente

    simpletico dado pelo Teorema 5.1.1.Tome a 2-forma := fd(et) em U , de maneira que = ,

    onde : S M e a inclusao. Seja Y o campo em S dado pelasequacoes

    (Y ) = 1 e iY d = 0.

    Para cada x S, seja W1 TxM o nucleo de e W2 TxMo subespaco gerado pelos vetores X(x) e Y (x). Note que TxM =W1 W2 e que W1 e W2 sao -ortogonais. De fato,

    x = f(d+ dt) = d+ fdt,

    para todo x S. Consequentemente, (Y, v) = d(Y, v) = 0 e(X, v) = (v) = 0 para todo v W1, pois fdt(X) = 1. Por outrolado, W1 e W2 sao tambem -ortogonais, pois (Y, v) = d(Y, v) = 0e (X, v) = (v) = 0 para todo v W1.

    Como |W1 = d|W1 = |W1 e |W2 = |W2 , segue que |TxM =|TxM para todo x S. O resultado segue agora d