GORZ, Andre. O Imaterial Conhecimento Valor e Capital

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perodo em que coexistem muitos modos de produo. O capitalismo rncdemo, centrado sobre a valorizao de grandes massas de capital fixo material, cada vez mais rapidamente substitudo por um capitalismo psmoderno cenbado na valorizao de um capital dito imaterial, qualificado tambm de 'capital humano', 'capital conhecimento'ou'capital inteligncia'. Essa mutao se faz acompanhar de novas metamorfoses do trabalho. O tmbalhoabsbatc simples, que, desde Adam Smith, era considerado como a fonte do valor, agora substitudo por trabalho complexo. O trabalho de Pmduo material, mensurvelem unidades de produtos por unidades de tempo, substituido por babalho dito imaterial, ao qual05

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Crtica ContemporneaDirigida por Josu Pereira daSilva

Nota do dirrior da Coleo: Esta edio de O Imaicriol difere da ediqo francesa por ji i n c l u i r a modilicaes feitas p c l o aiitor para v r r u do l i v r o em alemo, que sair em h r i v r .

padres clssicos de medida

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Andr. Gorr C Immatkriel, 0 Editians Galilee, 2001

Centro de Documentao e Infurmao Polis Instituto de Estudos, Pormao e Assessoria em Politicas SuciaisGtiti9 Gorz, Andrk O imatcrial: conhecimento, valor e capntal. Tradii~o Cclso de Arwn Jnior. / AndrA tiorz. So Paulo: Annablurne, 2005. 107 p., 14 x 21 cm Traduzido do original francs: L ' Immoilrirl. Cori~ioissnrice, voleur e1 eapiro. Patis: Galilke, 2003

ISBN : 85-7419-489-11. Trabalho. 2 Relaes Trabalhistas. 3. Capitalismo. 4. Conhecimento. 5. Direitos Sociais. I . Tnila, 11. Azzan Jniar, Celso, T r ~ d .CDU 331.048.1 CDD 101.55

Coorder,zri{ciiili>gia, pa;cgia. dr quando falia As empriras pessoal imediatamente pronto pura os rmprrgt,s'-.

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Captulo II

O "Capital Imaterial"1. A Crise do Conceito de ValorSe no for uma metfora, a e x p r e s s o w a do conhecimento" significa transtornos importantes para o sistema econmico. Ela indica que o conhecimento se tornou a principal fora produtiva, e que, . conseqentemente, os produtos da atividade social no so mais, principalmente, produtos do trabalho cristalizado, mas sim do conhecimento cristalizado. Indica tambm que o valor de toca_@ mercadorias, sejam ou no materiais, no mais determinado em ltima anlise pela quantidade de trabalho social geral que elas contm, mas, principalniente, pelo seu contedo de conhecimentos, informaes, de inteligncias gerais. esta -Itima, e no mais o trabalho social abstrato mensurvel segund~ nico um pa.+o, que se toma a principal substncia s.o~cial.~omum todasas a mercadorias. eiaque se toma aprincipal fonte de valor e de lucro, e assim, segundo vrios autorisia principal forma do trabalho e do capital. - ~O conhecimento, diferentemente do trabalho social geral, impossvel de traduzir e de mensurar em unidades abstratas simples. Ele no redutivel -~. . .~ a uma -ele de trabalho abstrato de-que - sena o ewi%l$"tF, 6 r%Itado ou o produto. Ele recobre e desb.="*axgdedi"ersidade- de --.--.~ capacidades hilele%gZteas, ou seja,-sem medida comum, entre as quais o iulgamento, a intuio, o senso esttico, o nvel de formao e de informao, a faculdade de aprender e de se adaptar a situaes imprevistas; !+tacidades elas mesmas o p e r a d a s - p o ~ g e a d e heterogneas que vo do s @lcul,o matemtico rctri&-c i arte de convencer o interlocutor; da Pesquisa tcnico-cientfica ajweno de normas estticas. das A heter~~eneidade atividades de trabalho ditas "cognitivas", dos Produtos imateriais que elas criam e das capacidades e saberes que elas implicam. tg1ayluuur.heis t g t o ~ l ~ r _ df ags p ~ d ~ t r ~ ~ a l h ~ ~ u ~ bos seus ~roduto- As escalas de avaliao do trabalho se tomam um tccido ~' de contradi~es.A impossibilidade de padronizar e estandardizar todos os~

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O Imaterial - Conheciniento. vaiar e capital

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parmetros das prestaes demandadas se traduz em vs tentativas para quantificar sua dimenso qualitativa, e pela definio de normas de rendimento calculadas quase por segundo. que no do conta da qualidade "comunicacional" do seMo exigido por outrem. A crise da medio do trabalho engendra inevitavelmente a crise da medio do valor Quando o tempo socialmente necessrio a uma produo se toma incerto, essa incerteza no pode deixar de repercutir sobre o valor de troca do que produzido. O carter cada vez mais qualitativo, cada ver menos mensurvel do trabalho, pe em crise a p d n n c i a das noes de "sobretrabalho" e de "sobrevalor". A crise da medio do valor pe em crise a definio da essncia do valor. Ela pe em crise, por conseqncia, sistema das equivalncias que regula as trocas comerciais. No sentido econmico, o "valor" designa sempre o valor de troca de uma mercadoria na sua relao com outras. Ele essencialmente relativo. c no respondc a pergunta: "Oque isso vale?", mas sim a: "Quanioisso vale?". O valor designa as divinas quantidades de diversas mercadorias pelas quais uma quantia de uma mercadoria determinada pode ser trocada. Ele designa a relao de equivulncia das mercadorias, umas em relao s outras. O valor define cada mercadoria como permutvel por todas as outras em propores determinadas pela sua relao de equivalncia. Essa relao expressa em unidades de uma mercadoria-padropela qual todas as mercadorias so sempre permutveis, e que permutvel por todas: o dinheiro. O dinheiro vale por seu valor de troca, pelo seu "poder de compra", como as outras mercadorias. Do mesmo modo, a fora de trabalho uma mercadoria cujo valor o das mercadorias pelas quais ele se troca para assegurar a (re)produo." O conceito de valor, no sentido econmico de valor de troca, no se aplica seno as mercadorias, ou seja, aos bens e aos servios que foram produzidos em vislu d e s u a ~ r o c ucomercial. O que no foi produzido pelo trabalho humano. assim como. a.fortiori, o que no se pode produzir, ou ainda o que no permutvel nem destinado a troca,

23. No vou enirur aqui rias surilerar du lriiria do valor. Deixo de lado a questo da substncia do valor e ocupo-me exclusivamente da questo da grandeza de valor. ns qual o valor iiianilerra-se como rclago sociil. Para a econoinia no existe valor sem eraridera. O valor no sentido eeuniriieo sempre o valor de mercadorias. Ele sc rcalizu aperias quando a nicrcadoria encontra no mercado um comprador Cl. Drrs Kapitai, I, capitulo 1. 111. "A forma do valor" ["Die Wenform"1, onde Marx aponla que a realidade social do valor das inercsdorias somente "pode vir a se iiianikstar nas rclapes de u n s ciim os outros O valor d o tecido s pode ser cxprcsso por urria oulra mcriadorii, isiu . de modo rrliiiiro." O valor sempre vrin a scr erprcsso apenzis na rrlapu de equiruleniiii rnire mercadorias diferentes. irsi, 6 , como granderii de valor.

no tem "valor" no sentido econmico. o caso. por exemplo, das riquezas naturais que, como o sol, a chuva, no se podem produzir, nem deles pode-se apropriar; principalmente o caso dos bens comuns a todos e que no podem ser nem divididos, nem trocados por nada, como o patrimnio cultural. No entanto, verdade que, se no podem ser apropriadas ou "valorizadas", as riquezas naturais e os bens comuns podem ser confiscados pelo vis das barreiras artificiais que reservam o usufmto delas aos que puderem pagar um direilo de u c e ~ s o .A privatizao das vias de acesso permite transformar as riquezas naturais e os bens comuns em quase-mercadorias que proporcionaro uma renda aos vendedores de direitos de acesso. O controle do acesso, como ns veremos, uma forma privilegiada de capitalizao das riquezas imateriais. A questo do "valor" dos saberes e dos conhecimentos deve ser I/ posta a luz das observaes que precedem. Os saberes so parte integrante do patrimnio cultural, so competncias comuns da vida cotidiana. sobre essa base das competncias comuns que s e constroem a s competncias profissionais certificadas, que so produzidas em vista das trocas comerciais de servios. Quanto aos conhecimentos, eles so o produto d o "comrcio universal entre os homens", ou seja, das interaes e das comunicaes no comerciais. Thomas Jefferson j dizia que eles "no se prestam apropriao privada", nem troca , )..''., ' ' comercial, pois imp~ssv:l re+irlos a uma substncia social q.omm ! mensurvel que permita determinar -- l a P ~ d $ ~ q u i v a l n c entre rrY , ' ,.i' as r e ia -- I_C , eles.h--Um mercad~dconhecimentos quee1e.s pos>&m se trocar por -. . - .- S. em c : s e - ~ a l ~ i m p e n s v e l No podendo se-mp*/r . em. unidades de ~. valor, sua avaliao como capital r ~.s t a - p r o ~ g ~ a t ~ a ~ ~ e Essa irredutibilidade dos conhecimentos ser uma fonte de . . ! ; dificuldades. de incoerncias, de trapaas e de fantasias econ6micas. + O c a p i t a l n o p o d e d e i x a r de t r a t a r e d e f a z e r f u n c i o n a r o ,,&' conhecimento conto se ele fosse u m capital. O problema, para o/ capital, o de se apropriar, valorizar e subsumir uma fora produtiva ., que, em si mesma, no se deixa devolver as categorias da economia poltica. O capital tudo far para "capitalizar o conhecimento", para faz-lo corresponder as condies essenciais pelas quais o capital funciona e existe como tal, a saber: o conhecimento deve economizar mais trabalho do que originalmente custou, deve submeter ao seu controle a utilizao que dele feita; e, enfim, deve-se tornar a . " ' propriedade exclusiva da firma que o valoriza incorporando-o nas , mercadorias que com ele se produzem. Porm, antes de examinar de que maneird os conhecimentos e saberes .,' ; podem fiincionar como capital imaterial, preciso definir melhor o que, afinal. distingue uns dos outros. .. , . .,,. . , ; , , .< ' , . p . .~ ~

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32.

Chrirtian Mszran, Liipluce des choussenrs

op. c/,.. p. 104.

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O Imaterial - Coiiliecinieiito valor e capital

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iniciada em 2000. O interesse da Bolsa pelos "ativos imateriais", tambm chamados "intangveis", foi, na segunda metade dos anos 1990, a i.,,., excrcscncia mais espetacular de uma alta daBolsaque no teve precedentes. '"'~ Essa alta era alimentada por massas de capital financeiro sem emprego, 7 , 6 ' ,&To reengineering tinha desencadeado e acelerado o inchao. Esse ' reengineering, no qual a "revoluo digital" desempenhava um papel J determinante, havia consistido essencialmente em aliviar as estruturas 1, produtivas e os fatores de produo: a organizao, o aparelho de gesto e de administrao, o capital fixo, os efetivos. os custos salariais duetos e indiretos, e os custos de comereiali~a~.o. Evidentemente, como conseqncia de toda essa poupana, a massa de salrios distribuda encolheu e o volume do lucro distribudo pde dar um salto. Os mais ricos ficaram ainda mais ricos, 80% da populao ficou mais pobre. A crescente massa de finanas disponivel ultrapassou de longe as possibilidades de apl?caona economia real. A procura de possibilidades de investimentos que trouxessem lucros, o capital financeiro acabou ganhando uma autonomia cada vez mais forte em relao ao sistema econmico. Os bancos se superaram nos assim chamados paises em desenvolvimento ao concederem crdito a governos e m sua maioria corruptos. Eles facilitaram as famlias americanas a tomada de crdito especificamente crdito para o consumo. No fim da dcada de 1990, a dvida da economia privada atinge, por ano, cerca de 125% de seus rendimentos disponveis. Enquanto rendem juros aos bancos, as dvidas de seus clientes aparecem nos balanos bancrios como ativos. Porm, se os clientes no podem amortizar suas dvidas, nem pagar os juros veneidos, essas dvidas aparecem nos balanos como perdas. No final dos anos 1980, ficou cada vez mais claro que uma parte crescente do crdito dos bancos mal podia ser amortizada, e mesmo o pagamento dos juros cm easo de uma quebra de mercado se tomaria altamente problemtico. A fm de protegcr os bancos daameaa de falncia, o Fundo Monetrio Internacional (FMI) teve de "reciclar" as dvidas esmagadoras de vrios paises em desenvolvimento, e for-los a "sanear" suas finanas pblicas. Em vrios casos (o ltimo na Argentina em 2003), esse saneamento levou ao colapso total da economia. Contudo, tambm a solvneia e a possibilidade de consumo das economias privadas americanas. superendividadas, teriam de ser mantidas a qualquer preo. Para esse fim, os prprios bancos tiveram de emprestar aos clientes o dinheiro de que precisavam para o pagamento dos juros vencidos, e a eles conceder novos crditos para o consumo. S assim se pde evitar a iminente quebra de mercado. O banco central amcricano colocou uma quantidade enorme de dinheiro em circulao, para que os bancos pudessem continuamente

renovar a oferta de crdito em condies favorveis a seus clientes altamente endividados.'? No final dos anos 1990, a divida da economia privada atingiu uma taxa de crescimento anual de 4%. O dficit da balana comcrcial americana. por sua vez, alcanou 4?4 do Produto Interno Bmto. Os Estados Unidos de certa forma exportaram sua dvida interna, transformaram-na em uma cresccnte divida com o exterior, e, mais comprando que vendendo, aqueceram o mercado mundial. Para possibilitar e ao mesmo tempo disfarar essa evaso, era indispensvel suprir os ativos dos bancos atravs de uma nova fonte milagrosa de valores. Na metade dos anos 1990, acreditou-se que essa fonte havia sido descoberta: teve incio uma fantstica e aparentemente irresistivel alta das bolsas. O ndice Dow Jones precisou de 30 anos para passar de 1.000 para 4.000 pontos. Em julho de 1997. j atingia 8.000 puntos. Em julho de 1999, havia subido para 11.000. Depois de ter estimulado as famlias a gastar seus rendimentos futuros, o capitalismo r)''$h i P estabelecia ento, nas bolsas, as cotaes das expectativas de lucro com i' .:J " ' base no crescimento futuro. As bolsas pareeiam uma fonte inesgotvel A. de enriquecimento. Aproximadamente um tero das familias emprestava cada vez mais dinheiro de seus bancos para a compra de aes, confiando que, com uma parte dos dividendos, em ponco tempo obteria o retorno do investimento. Mesmo financistas experientes acreditaram ter descoberto a comuepia?' Um administrador americano de fundos de investimentos vaticinou que o indice Dow Jones atingiria no ano de 2097 a marca de 750.000 pontos. Especialistas do governo, ministros e dirigentes de bmndes grupos asseguraram que no futuro a alta irrefrevel permitiria financiar as

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3 3 . evidente, no entanto, que apenas podem continuar a ac endividar os 30% mais ou menos bem siluados da pupuliiqo. 'O milagre americano produziu muilos perdedores e poueos ganhadorrs". rscrcvr Edwnrd Luiiuak. "55% da populao ativa americana trabalham corno vendedores. servidores. enipregadas e empregados domestieos, jardineiros. governanlas e babs de crian~as,e a inetadc deles de trabalbsdores provisbrios, que 1ni baixos salarios; mais de iim quarto se coostinii de w o r k i n g p o o r cuja renda est ahaixn da linha da pobreza, mesmci quando ocupam doia ou trs empregos". C Turbo-