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5/27/2018 GuiadeEstudos2014-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/guia-de-estudos-2014 1/58 INSTITUTO RIO BRANCO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES Concurso de Admissão à Crreir de Di!"om# $ui de Es#udos %&'(

Guia de Estudos 2014

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  • INSTITUTO RIO BRANCOMINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES

    Concurso de Admisso Carreira de Diplomata

    Guia de Estudos 2014

  • GUIA DE ESTUDOS PARA O CONCURSO DE ADMISSO CARREIRA DE DIPLOMATA

    Ministro das Relaes Exteriores

    Embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado

    Secretrio-Geral das Relaes Exteriores

    Embaixador Eduardo dos Santos

    Diretor-Geral do Instituto Rio Branco

    Embaixador Gonalo de Barros Carvalho e Mello Mouro

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    APRESENTAO

    O Guia de Estudos do Concurso de Admisso Carreira Diplomtica, verso 2014 visa orientar e auxiliar o candidato que pretende ingressar na carreira diplomtica por meio do registro das questes abordadas no exame de 2013 acompanhadas de respostas que mereceram avaliao positiva por parte das respectivas Bancas Examinadoras, mantidos os textos originais dos candidatos, com eventuais incorrees e/ou deficincias.

    Braslia, em 2 de abril de 2014.

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    Orientao para estudo

    (Inclui programas para as provas do Concurso e exemplos de provas do Concurso anterior)

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    PROVA OBJETIVA

    A prova objetiva, de carter eliminatrio, visa a testar, de modo amplo, a capacidade de compreenso e a cultura dos candidatos, com base nos programas das provas discursivas que constituem a segunda e a terceira fases do Concurso e no programa de Histria Mundial estabelecido pelo edital.

    No Concurso de 2014 a prova objetiva ser constituda de 73 questes de Portugus, de Histria do Brasil, de Histria Mundial, de Geografia, de Poltica Internacional, de Ingls, de Noes de Economia e de Noes de Direito e Direito Internacional Pblico. Em virtude do carter interdisciplinar da prova, uma questo poder contemplar conhecimentos relativos a mais de uma disciplina.

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    PORTUGUS

    A prova de Portugus, de carter eliminatrio e classificatrio, constar de redao sobre tema de ordem geral, com a extenso de 600 a 650 palavras (valor: 60 pontos), e de dois exerccios de interpretao, de anlise ou de comentrio de textos, com a extenso de 120 a 150 palavras cada um (valor de cada exerccio: 20 pontos).

    Programa (Primeira e Segunda Fases):1. Lngua Portuguesa: modalidade culta usada contemporaneamente no Brasil.

    1.1 Sistema grfico: ortografia, acentuao e pontuao; legibilidade.1.2 Morfossintaxe.1.3 Semntica.1.4 Vocabulrio.

    2. Leitura e produo de textos.2.1 Compreenso, interpretao e anlise crtica de textos em lngua portuguesa.2.2 Conhecimentos de Lingustica, Literatura e Estilstica: funes da linguagem;nveis de linguagem; variao lingustica; gneros e estilos textuais; textos literrios eno literrios; denotao e conotao; figuras de linguagem; estrutura textual.2.3 Redao de textos dissertativos dotados de fundamentao conceitual e factual,consistncia argumentativa, progresso temtica e referencial, coerncia,objetividade, preciso, clareza, conciso, coeso textual e correo gramatical.2.3.1 Defeitos de contedo: descontextualizao, generalizao, simplismo,obviedade, parfrase, cpia, tautologia, contradio.2.3.2 Vcios de linguagem e estilo: ruptura de registro lingustico, coloquialismo,barbarismo, anacronismo, rebuscamento, redundncia e linguagem estereotipada.

    Orientao para a prova de Portugus

    A prova de Portugus afere o domnio, por parte do candidato, da norma culta na modalidade escrita da lngua portuguesa, sua competncia de leitura e anlise crticas, bem como a capacidade de sntese e de organizao de idias.

    A prova apresenta textos curtos que servem de base para uma redao (com o valor de 60 pontos) sobre tema suscitado pelos textos e para dois exerccios de interpretao (com o valor de 20 pontos cada um).

    Produto do complexo processo de domnio da lngua escrita, no nvel exigido pelo concurso, a redao deve revelar a maturidade intelectual do candidato. Este dever demonstrar pensamento crtico, proveniente da capacidade de incorporar e inter-relacionar leituras prvias, sem afastar-se do tema proposto. Ser avaliada a habilidade do candidato de redigir dissertao coerente e coesa, que exponha - com fluncia e adequao -informaes e argumentos fundamentados e logicamente encadeados. A aplicao de frmulas prontas, fruto de adestramento precrio e simplista, enfaticamente desaconselhada e ser penalizada.

    As questes de interpretao devem ser respondidas de forma direta e objetiva, o que no desobriga o candidato de estruturar sua resposta, elaborando texto coerente, apoiado em raciocnio slido. So critrios de avaliao nessas questes a objetividade, a preciso, a clareza e a conciso, alm naturalmente do adequado uso da lngua portuguesa.

    A legibilidade condio indispensvel para a correo da prova escrita de Portugus.

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    Prova de 2013

    PARTE I - REDAO

    Texto I

    um lamentvel fato da vida que o comrcio internacional tenha, apesar de suas imensas potencialidades, contribudo to pouco para o desenvolvimento econmico dos pases de baixa renda per capita, sobretudo nos ltimos tempos da histria humana. Em certos casos, atravs de mecanismos de deteriorao das relaes de troca, o comrcio internacional tem atuado at mesmo como fator de empobrecimento relativo dos pases subdesenvolvidos e como veculo de agravamento dos desnveis de rendas entre os pases desenvolvidos e os subdesenvolvidos.

    Fragmento de discurso proferido pelo Ministro de Estado das Relaes Exteriores na abertura da XVIII Sesso da Assembleia Geral das Naes Unidas, em 17/9/1963.

    Texto II

    Ao selecionar o embaixador Roberto Azevdo, a Organizao Mundial do Comrcio renova o compromisso com uma viso de multilateralismo que privilegia o dilogo, o respeito diversidade e a busca de consenso, conforme as nossas melhores tradies diplomticas; uma viso que incorpora as perspectivas de todos os membros, com particular ateno s dos pases em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo; uma viso segundo a qual o comrcio no um fim em si mesmo, mas uma ferramenta para o desenvolvimento e para a melhor distribuio da prosperidade entre as naes, e dentro delas, em benefcio de todos.

    Fragmento de circular telegrfica do Ministro de Estado das Relaes Exteriores transmitida em 22/5/2013.

    Discuta e emita opino sobre os fragmentos de texto acima apresentados, com ateno s semelhanas e s diferenas de percepo relativas ao comrcio internacional.

    Extenso do texto: 600 a 650 palavras [valor: 60 pontos]

  • ALEXANDRE PIANA LEMOS (52.5/60)Os fragmentos de texto apresentados tm como tema o sistema multilateral de

    comrcio. Os autores de ambos os textos reconhecem que o comrcio deve servir para promover o desenvolvimento das naes menos favorecidas, mas analisam essa necessidade de perspectivas distintas. Apesar das evidentes divergncias entre os dois textos, pode-se afirmar que ambos so representativos da tradicional defesa da diplomacia brasileira de um sistema multilateral de comrcio mais justo e democrtico. A diferena que, atualmente, o Brasil est em melhores condies de promover essa defesa.

    A posio tradicional da diplomacia brasileira a de que o comrcio no um fim em si mesmo, porquanto ele deve contribuir para o desenvolvimento de todos os pases, especialmente o dos mais pobres. Esse ponto de vista no se alterou entre 1963 e 2013, anos em que foram redigidos os textos referidos. A diferena que, em 1963, o Brasil era pas relativamente pouco desenvolvido, que era prejudicado pelo que os economistas cepalinos denominaram deteriorao dos termos de troca, realidade que afetava as exportaes brasileiras de forma negativa. Atualmente, dificuldades persistem, mas o Brasil uma das maiores economias mundiais. Os contextos histricos diferentes, portanto, explicam o relativo otimismo do pronunciamento de 2013, quando comparado ao discurso proferido em 1963.

    O contexto atual mais favorvel ao Brasil, mas isso no significa que no existam dificuldades a serem enfrentadas. O Brasil superou muitas das restries comerciais que lhe eram impostas na dcada de 1960; seu status de potncia econmica, contudo, fez que surgissem novos desafios, como as barreiras impostas a seus produtos industriais e a oposio que iniciativas brasileiras enfrentam, no mbito da Organizao Mundial do Comrcio, por parte das potncias tradicionais, preocupadas em conservar o status quo. O Brasil, todavia, est, atualmente, em condies de contribuir para a reforma e a democratizao do sistema multilateral de comrcio, diferena do que ocorria na dcada de 1960.

    A maior influncia do Brasil, no mbito do sistema multilateral de comrcio, atestada pela eleio do brasileiro Roberto Azevdo para a direo da Organizao Mundial do Comrcio (OMC). Se, na dcada de 1960, a diplomacia brasileira visava modificao de um sistema multilateral de comrcio desigual, atualmente, ela est em condies de conduzir esse processo de reforma, e tal realidade explica a perspectiva otimista do pronunciamento de 2013, quando comparado ao discurso de 1963.

    As diferenas no modo de compreender o sistema multilateral de comrcio, portanto, distinguem os textos de 1963 e de 2013. Apesar das divergncias evidentes, importante ressaltar, contudo, que os objetivos defendidos pelo Brasil, em 2013, so, fundamentalmente, os mesmos defendidos na dcada de 1960, e, nesse sentido, h evidente continuidade entre as duas perspectivas. O Brasil, em 2013, pretende reformar o sistema multilateral de comrcio, a fim de atingir objetivos que orientam a diplomacia brasileira historicamente. O compromisso com um sistema multilateral de comrcio democrtico, que represente as posies no apenas dos pases desenvolvidos, como tambm as dos pases em desenvolvimento, sempre caracterizou a diplomacia brasileira. Do mesmo modo, o entendimento de que o comrcio no um fim em si mesmo, mas um meio de promover a prosperidade das naes, no constitui nova orientao da diplomacia brasileira. Em 1963, quando o Ministro de Estado das Relaes Exteriores proferiu seu discurso, essa posio orientou sua apresentao.

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    Desse modo, pode-se afirmar que o Brasil no modificou sua tradicional defesa de um sistema multilateral de comrcio mais justo e democrtico. A busca de uma ordem econmica mais justa era objetivo vislumbrado em 1963 e continua a s-lo em 2013. O Ministrio das Relaes Exteriores, todavia, pode agir, atualmente, com mais desenvoltura e demonstrar maior otimismo, porquanto a nova ordem internacional possibilita que o Brasil influencie o sistema multilateral de comrcio com os valores que tradicionalmente defende.

    PARTE II - EXERCCIO 1

    As fbulas indgenas tm uma participao intensa na literatura oral brasileira, mas sempre atravs da interpretao mestia, mudados os termos, substitudo o heri, trocadas s vezes as finalidades do conto por efeito da influncia catequista. O mestio transmite a fbula indgena aproveitando quanto no contrarie sua maneira pessoal de viver, agir e compreender. As gides indgenas no satisfazem a mentalidade do mameluco e do caboclo. Transfere, para a estria, os valores que o impulsionam e justificam, aos seus olhos, a conduta.

    Luis da Camara Cascudo. Literatura oral no Brasil. 2.a ed., Rio de Janeiro: ]os Olympio/INL, 1978, p. 97 (com adaptaes).

    Com base no fragmento acima apresentado, discuta como a ideia de "interpretao mestia" repercutiu nos movimentos sociais e culturais do Brasil no sculo XX.

    Extenso do texto: 120 a 150 palavras [valor: 20 pontos]

    VINICIUS FOX DRUMMOND CANCADO TRINDADE (18.76/20)

    Durante o sculo XIX, diversos autores, como Oliveira Viana, Silvio Romero e Nina Rodrigues, conferiram significado negativo miscigenao do povo brasileiro. O Modernismo representou uma inflexo em relao a esse pensamento. Os estudos etnolgicos e folclricos de Mrio de Andrade ressaltaram a interpretao mestia do brasileiro, como se depreende da obra Macunama. Esse entendimento influenciou cientistas sociais de dcadas seguintes, como Gilberto Freyre e Darcy Ribeiro.

    A constatao da matriz multitnica do povo brasileiro repercutiu nos movimentos sociais do sculo XX. A excluso do negro na sociedade, conforme demonstrada por Florestan Fernandes, motivou a adoo de polticas de afirmao social em universidades e em concursos para cargos pblicos. Medidas significativas foram adotadas, igualmente, no mbito de proteo das culturas indgenas, como a demarcao de terras tradicionais e a criao de instituies pblicas de representao poltica.

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    PARTE II - EXERCCIO 2

    (...)

    Porque os homens no me escutam! Por que os governadoresNo me escutam? Por que no me escutamOs plutocratas e todos os que so chefes e so fezes?Todos os donos da vida?Eu Ihes daria o impossvel e Ihes daria o segredo,Eu Ihes dava tudo aquilo que fica pra c do gritoMetlico dos nmeros, e tudoO que est alm da insinuao cruenta da posse.E se acaso eles protestassem, que no! que no desejamA borboleta translcida da humana vida, porque preferemO retrato a leo das inauguraes espontneas,Com bstias de operrio e do oficial, imediatamente inferior,

    E palminhas, e mais os sorrisos das mscaras e a profunda comoo,Pois no! Melhor que isso eu Ihes dava uma felicidade deslumbrante

    De que eu consegui me despojar porque tudo sacrifiquei.(...)

    Mriode Andrade. A meditao sobre o Tiet. In: Poesiascompletas.So Paulo: Martins, 1974, 4.a ed., p.311-2, (com adaptaes).

    Com base no texto acima apresentado, discorra sobre as recentes manifestaes pblicas nos planos nacional e internacional, relacionando-as, em especial, ao fragmento: "Por que os governadores / No me escutam? Por que no me escutam / Os plutocratas e todos os que so chefes e so fezes?".

    Extenso do texto: 120 a 150 palavras [valor: 20 pontos]

    FILIPE BRUM CUNHA (17.51/20)

    As manifestaes pblicas so a maneira pela qual as populaes expressam seu descontentamento em relao conduo das polticas nacionais. O texto de Mrio de Andrade demonstra a inconformidade do autor com o fato de que os governantes no parecem importar-se com suas reivindicaes, porquanto preferem escutar o som das palmas em detrimento dos gritos de protesto.

    As recentes manifestaes em pases como Brasil, Egito e Sria representam a insatisfao de populaes que cansaram de no ser ouvidas por todos os que so chefes. Ainda que motivadas por problemas distintos, como a corrupo, no Brasil, e a falta de representatividade poltica, em alguns pases rabes, elas tm em comum a busca de mudanas. Uma vez que o principal afetado pelas aes de seus dirigentes, o povo conhece o segredo a que se refere Mrio de Andrade: as medidas necessrias para a consecuo do interesse coletivo.

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    HISTRIA DO BRASIL

    A prova de Histria do Brasil consistir de quatro questes discursivas, duas das quais com o valor de 30 (trinta) pontos cada uma e duas com o valor de 20 (vinte) pontos cada uma. As respostas s questes com o valor de 30 (trinta) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 90 linhas; as respostas s questes com o valor de 20 (vinte) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 60 linhas.

    Programa (Primeira e Terceira Fases): 1 O perodo colonial. 1.1 A configurao territorial da Amrica Portuguesa. 1.2 O Tratado de Madri e Alexandre de Gusmo. 2 O processo de independncia. 2.1 Movimentos emancipacionistas. 2.2 A situao poltica e econmica europeia. 2.3 O Brasil sede do Estado monrquico portugus. 2.4 A influncia das ideias liberais e sua recepo no Brasil. 2.5 A poltica externa. 2.6 O Constitucionalismo portugus e a independncia do Brasil. 3 O Primeiro Reinado (1822-1831). 3.1 A Constituio de 1824. 3.2 Quadro poltico interno. 3.3 Poltica exterior do Primeiro Reinado. 4 A Regncia (1831-1840). 4.1 Centralizao versus descentralizao: reformas institucionais. 4.2 O Ato Adicional de 1834 e revoltas provinciais. 4.3 A dimenso externa. 5 O Segundo Reinado (1840-1889). 5.1 O Estado centralizado; mudanas institucionais; os partidos polticos e o sistema eleitoral; a questo da unidade territorial. 5.2 Poltica externa: as relaes com a Europa e os Estados Unidos da Amrica; questes com a Inglaterra; a Guerra do Paraguai. 5.3 A questo da escravido. 5.4 Crise do Estado Monrquico. 5.5 As questes religiosa, militar e abolicionista. 5.6 Sociedade e cultura: populao, estrutura social, vida acadmica, cientfica e literria. 5.7 Economia: a agroexportao; a expanso econmica e o trabalho assalariado; as polticas econmico-financeiras; a poltica alfandegria e suas consequncias. 6 A Primeira Repblica (1889-1930). 6.1 A proclamao da Repblica e os governos militares. 6.2 A Constituio de 1891. 6.3 O regime oligrquico: a poltica dos estados; coronelismo; sistema eleitoral; sistema partidrio; a hegemonia de So Paulo e Minas Gerais. 6.4 A economia agroexportadora. 6.5 A crise dos anos 20 do sculo XX: tenentismo e revoltas. 6.6 A Revoluo de 1930. 6.7 A poltica externa: a obra de Rio Branco; o pan-americanismo; a II Conferncia de Paz da Haia (1907); o Brasil e a Grande Guerra de 1914; o Brasil na Liga das Naes. 6.8 Sociedade e cultura: o Modernismo. 7 A Era Vargas (1930-1945). 7.1 O processo poltico e o quadro econmico financeiro. 7.2 A Constituio de 1934. 7.3 A Constituio de 1937: o Estado Novo. 7.4 O contexto internacional dos anos 1930 e 1940; o Brasil e a Segunda Guerra Mundial. 7.5 Industrializao e legislao trabalhista. 7.6 Sociedade e cultura. 8 A Repblica Liberal (1945-1964). 8.1 A nova ordem poltica: os partidos polticos e eleies; a Constituio de 1946. 8.2 Industrializao e urbanizao. 8.3 Poltica externa: relaes com os EUA; a Guerra Fria; a Operao Pan-Americana; a poltica externa independente; o Brasil na ONU. 8.4 Sociedade e cultura. 9 O Regime Militar (1964-1985). 9.1 A Constituio de 1967 e as modificaes de 1969. 9.2 O processo de transio poltica. 9.3 A economia. 9.4 Poltica externa: relaes com os EUA; o pragmatismo responsvel; relaes com a Amrica Latina, relaes com a frica; o Brasil na ONU. 9.5 Sociedade e cultura. 10 O processo democrtico a partir de 1985. 10.1 A Constituio de 1988. 10.2 Partidos polticos e eleies. 10.3 Transformaes econmicas. 10.4 Impactos da globalizao. 10.5 Mudanas sociais. 10.6 Manifestaes culturais. 10.7 Evoluo da poltica externa. 10.8 MERCOSUL. 10.9 O Brasil na ONU.

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    Prova de 2013

    QUESTO 1

    Disserte acerca das relaes entre a Inglaterra e o Brasil no perodo compreendido entre 1808 e 1831.

    Extenso mxima: 90 linhas[valor: 30 pontos]

    CAIO GROTTONE TEIXEIRA DA MOTA (30/30)

    As relaes entre Brasil e Inglaterra, no perodo que vai de 1808 a 1815, foram condicionadas pelo contexto das guerras napolenicas. Diante do bloqueio continental e do ultimato de Napoleo para declarar guerra Inglaterra, Portugal enfrentou o dilema de ter seu territrio metropolitano invadido pelos franceses ou de expor suas colnias ao poderio naval ingls. A corte de D. Joo decidiria por migrar para o Brasil com o respaldo da esquadra britnica, sendo que a restaurao do territrio metropolitano tambm caberia Inglaterra. Portugueses e ingleses mantinham, principalmente desde o Tratado de Methuen, relao em que Portugal fazia concesses econmicas em troca de garantias polticas. A permanncia da corte lusa no Rio de Janeiro, mesmo aps a derrota de Napoleo, e a conduo do processo de independncia pelo legtimo herdeiro do trono dos Bragana acabaram por transplantar jovem nao o enquadramento desigual que caracterizava a relao de Portugal com a Inglaterra.

    Ao chegar ao Brasil, a corte portuguesa decretou, em 1808, a abertura dos portos s naes amigas. Embora essa medida tenha favorecido os ingleses, estes a receberam com qualificaes, pois esperavam um porto exclusivo. O regime de livre comrcio derivou, na verdade, das convices liberais do Visconde de Cairu, influente junto ao regente D. Joo, e das presses das elites locais, ansiosas por livrar-se das amarras do exclusivo metropolitano. Os desgnios ingleses seriam atendidos plenamente nos tratados desiguais de 1810. O Tratado de Comrcio e Navegao imps tratamento preferencial aos produtos ingleses, que pagariam tarifa de 15%, inferior dos demais pases (24%) e mesmo dos produtos lusos (16%). O Tratado de Amizade e Aliana imps limitaes ao trfico de escravos, que poderia ocorrer somente em possesses portuguesas.

    A questo do trfico permeou as relaes entre Brasil e Inglaterra durante todo o perodo. No Congresso de Viena, aps Napoleo ser derrotado e Portugal ter seu territrio europeu restaurado, foi firmado o compromisso de limitar o trfico de escravos ao sul do Equador. Em 1817, foram estabelecidos tribunais mistos para julgar os casos de trfico ilcito, no Rio de Janeiro e em Serra Leoa. A Inglaterra, senhora dos mares, incomodava-se com o papel geopoltico que o trfico de escravos exercia no Atlntico Sul e na costa africana. O processo de independncia do Brasil, em que a Inglaterra exerceu mediao, teve seu reconhecimento condicionado pelos britnicos ao compromisso brasileiro de extino do trfico. Este estaria proibido trs anos aps a ratificao do documento, ou seja, a partir de 1830. A lei brasileira de 1831, embora propusesse regulao do tema, acabou no sendo aplicada com rigor at a Lei Eusbio de Queirs de 1850, de modo que ficou conhecida como a lei para ingls ver.

    O reconhecimento da independncia brasileira envolveu outras temticas, que se somaram questo do trfico no processo tripartite entre Portugal, Brasil e Inglaterra.

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    Embora tendo conquistado a Independncia pelas armas nacionais, com a participao de mercenrios ingleses como o Almirante Cochrane , o Brasil acabou por sujeitar-se a presses. Segundo Cervo, at meados de 1823, o processo foi conduzido, no lado brasileiro, pelo santista Jos Bonifcio, partidrio de perspectiva mais nacionalista. Contudo, o Patriarca da Independncia acabou afastado, dando lugar a um grupo que, em detrimento dos interesses nacionais, privilegiava os interesses dinsticos de D. Pedro I. Ao fim das negociaes, o Brasil comprometeu-se a no reivindicar a anexao das possesses lusas na frica, a pagar indenizao de dois milhes de libras a Portugal e a reconhecer os ttulos de D. Joo VI, que os transmitiria a seu filho. Sem ameaa real de interveno estrangeira para uma reconquista, o Brasil fez concesses excessivas, desgastando a imagem do Imperador. O Brasil poderia ter feito uso da disputa entre os dois sistemas europeus o da Santa Aliana, associado tentativa de sobrevida do Antigo Regime, e o da trplice revoluo atlntica, liderado pelo desejo britnico pela abertura de mercados a seus manufaturados.

    Nesse sentido, o reconhecimento britnico da Independncia, conseguido em 1826, seria alcanado, de qualquer jeito, em 1827, quando o interesse pela renovao do tratado comercial de 1810 levaria a Inglaterra a passar por cima de sua aliana poltica com Portugal. Na verdade, durante o perodo em questo (1808-1831), os ingleses tiveram foco negociador no Brasil, mesmo que a corte lusa mantivesse perspectiva metropolitana nas negociaes de 1810. No auge do bloqueio continental, a Amrica Latina serviu como vlvula de escape, representando 35% das vendas externas inglesas. Depois de derrotar Napoleo, a Inglaterra desejou manter a supremacia nesses mercados. Em 1827, o tratado comercial com o Brasil renovado, com a manuteno do privilgio odioso da jurisdio especial do juiz conservador da nao inglesa, mas sem o tratamento preferencial, substitudo pela clusula da nao mais favorecida, sem comprometer a supremacia comercial britnica.

    Alm de alcanar seus objetivos no domnio econmico, a Inglaterra logrou xito como mediadora nos conflitos do Prata, especialmente na Guerra da Cisplatina entre o Brasil e as Provncias Unidas do Rio da Prata. A independncia do Uruguai, como "algodo entre dois cristais", consagrou a paz e a livre navegao nos rios platinos, conforme os interesses comerciais britnicos. A Conveno de Paz de 1828, nesse sentido, favoreceu a Inglaterra e o nativismo artiguista.

    De 1808 a 1831, as relaes entre Brasil e Inglaterra foram marcadas pelos privilgios comerciais, pela questo do trfico de escravos, pela participao no processo de independncia e pela mediao no Prata. Essas temticas consolidaram o papel hegemnico que a Inglaterra exerceu no perodo, enquadrando o Brasil no esquema desigual que ela mantinha com Portugal. Nesse momento, os formuladores da poltica externa brasileira mostraram autonomia excessiva em relao sociedade, prejudicando os interesses dela. O "sistema de tratados", conforme Cervo, impuseram imobilismo ao Brasil at 1844, quando se ensaia um projeto de robustecimento da vontade nacional. No perodo em questo, contudo, os tratados de livre comrcio no favoreceram as elites agrrias, visto que os mercados europeus permaneceram fechados aos produtos brasileiros; obstaram o surgimento de setores mais dinmicos, como a indstria; e prejudicaram a arrecadao fiscal, dependente de tarifas de importao. O fracasso da ao externa poca da Independncia desgastou o Imperador, que renuncia em 1831, e motivou o surgimento de uma tradio antitratados comerciais no Parlamento, a qual consiste em verso brasileira de um iderio pan-americanista.

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    QUESTO 2

    O Brasil manteve, na Primeira Repblica, a poltica econmica da defesa das exportaes, bem como a de atrao de imigrantes e capitais. A respeito desse momento histrico, analise os seguintes aspectos:

    iniciativas voltadas para as exportaes de produtos brasileiros para a Europa; a mudana da lei alfandegria; as iniciativas no campo das imigraes.

    Extenso mxima: 90 linhas

    (Valor: 30 pontos)

    FELIPE EDUARDO LIEBL (25/30)

    A Primeira Repblica (1889-1930) marcada por um interesse nacional muito ligado pauta econmica. A base da economia nacional, segundo Celso Furtado, tinha como centro a produo para a exportao. Ainda se adaptando s mudanas decorrentes da abolio da escravido e da modernizao mundial, o pas busca usar a poltica externa como vetor promoo comercial dos produtos brasileiros e promoo da imigrao ao pas, esta fundada tanto em questes econmicas de fornecimento de mo de obra quanto em uma perspectiva de branqueamento populacional. Pode-se argumentar que um dos principais objetivos da diplomacia econmica brasileira desse perodo foi maximizar os ganhos possveis em um contexto de economia primrio-exportadora.

    A balana comercial brasileira poca era muito dependente das receitas provenientes da exportao de caf (algo em torno de 70% do total). Promover as exportaes de caf significava melhorar as contas pblicas e fortalecer os interesses dos grupos econmicos mais significativos. As importaes brasileiras de capital ainda eram majoritariamente inglesas, sendo que os americanos j comeavam a ganhar fora, o que tambm acontecia no caso das importaes de bens. A balana comercial estava muito centrada na exportao de poucas commodities primrias, o que tornava o pas sensvel a mudanas abruptas, como a Primeira Guerra Mundial.

    Um dos meios de aumentar os ganhos econmicos foi a poltica de promoo do caf. Misses brasileiras foram Europa para tentar criar o hbito de beber esse produto, tendo sucesso marcante primeiramente na Alemanha e, nos anos de 1920, na Europa Central. O caf era favorecido por auxiliar a produtividade fabril em pases em industrializao. Cabe ressaltar que essa promoo deve escassos resultados na Inglaterra, onde a bebida nacional continuou a ser o ch. Essa poltica permitiu ao pas diversificar seus parceiros comerciais, ainda que centrados na exportao de uma nica commodity. As exportaes de caf para a Europa possibilitaram a expanso do plantio e so parte do fato que, posteriormente, em 1938, a Alemanha tornou-se, por um ano, o principal parceiro comercial do pas, conforme exemplifica Gerson Moura.

    A promoo do caf era centrada no recolhimento do grande poder de mercado brasileiro na produo desse insumo. Os empresrios do ramo adotaram prticas oligopoltiscas para elevar seus lucros inclusive com conflitos com o Sherman Act norte-americano. Esse tipo de poltica, sob o eufemismo de valorizao do caf, passar a um

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    nvel governamental com as polticas iniciadas pelo Convnio de Taubat e que se expandiu ao longo do perodo. O uso de poder de mercado para aumentar os lucros leva a protestos, mas no resulta em punies efetivas. Os maiores preos relativos do produto no impedem a expanso do consumo, sobretudo na Europa, alvo da promoo comercial brasileira, conforme demonstra Clodoaldo Bueno.

    Outros produtos da pauta de exportao comercial tambm so promovidos. Exemplo disso a borracha, principalmente antes do incio do plantio no Sudeste Asitico. Com a expanso do processo de urbanizao, produzir borracha torna-se economicamente benfico. O Brasil exporta em grande quantidade esse produto, inclusive para as fbricas de bicicleta inglesas no norte da ilha. A promoo consular de novos produtos tropicais tambm presente, em menor escala, no caso do cacau, considerando-se o potencial energtico e calrico do chocolate, til em tempos industriais. Outros produtos tm sorte menor, como o acar, que sofre a concorrncia de diversos produtores e do acar de beterraba e o algodo que passa sofrer a concorrncia no apenas dos EUA, mas tambm da insero do Egito como exportador desse produto Europa.

    A legislao aduaneira brasileira passa por relevantes mudanas no perodo. O primeiro deles a alterao da base tributria de um modelo centrado em receitas aduaneiras para um que se sustenta em tributao domstica. Exemplos disso a criao do Imposto de Renda no incio do sculo XX e a expanso dos tributos sobre a circulao de bens e de servios internos. A reforma tributria seria ampliada na dcada de 1930 e concluda somente na dcada de 1960, com a consolidao do modelo de tributao interna. Outra inovao nesse sentido o fim da averso do Segundo Reinado a tratados bilaterais de comrcio, com a assinatura do efmero Tratado Blaine-Mendona de 1891. Alteraes aduaneiras em matrias fitossanitrias e de regulao acerca do envase de trigo trazem atritos no relacionamento brasileiro com a Argentina, grande exportadora desse insumo.

    Para produzir o caf, para branquear o pas e para ocupar regies do Brasil, a imigrao foi incentivada. Escritrios de promoo da imigrao foram estabelecidos e o principal modelo de imigrao o colonato subsidiado foi adotado em substituio ao modelo de parceria anterior. Paralelamente, uma poltica de imigrao para ocupar o territrio foi adotada no sul, que passou a ter um modelo de pequenas propriedades. A promoo da imigrao teve relativo sucesso, com a vinda de italianos, de portugueses, de espanhis, de alemes e de eslavos em grande nmero ao pas. J a partir de 1908, a busca de imigrantes leva aceitao da imigrao de japoneses, sobretudo para o Paran e para So Paulo. Deve-se ressaltar a naturalizao automtica de 1891.

    Para atrair os imigrantes, o Brasil passou a competir com outros pases receptores. O caso mais emblemtico dessa rivalidade o que ocorreu com a Argentina. O pas platino tambm almejava promover a imigrao, estabelecendo vrias representaes na Europa para tal. Havia uma disputa de opinies na imprensa estrangeira, e as boas condies para o imigrante levaram muitos europeus para a Argentina. O mpeto imigracional, que tambm se manifestava nos destinos citadinos, como o Rio de Janeiro, somente comea a cair aps a Primeira Guerra Mundial, seguido de alteraes socioeconmicas que mudaram os fluxos e consolidados nas leis de imigrao varguistas, ainda que os japoneses continuassem a migrar pouco aps.

    O quadro econmico e migracional brasileiro da Primeira Repblica marcado pela predominncia de um modelo agroexportador perifrico. A diplomacia brasileira de ento buscava aumentar as possibilidades desse modelo, com a promoo de produtos nacionais e com incentivos imigrao para o fornecimento de mo de obra. Essa situao seria grandemente alterada com a crise de 1929, que leva o governo brasileiro, sob a direo de

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    Vargas a partir do ano seguinte, a alterar as bases da insero nacional, ao valorizar a industrializao por substituio de importaes e a consolidao de um modelo de um modelo de povo brasileiro menos aberto imigrao do que o da Primeira Repblica.

    QUESTO 3

    Disserte acerca da relevncia do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb) no que tange ao pensamento poltico e social brasileiro, bem como suas repercusses para os conceitos de poltica externa brasileira.

    Extenso mxima: 60 linhas

    (valor: 20 pontos)

    TAIN LEITE NOVAES (18/20)

    O pensamento social progressista brasileiro da segunda metade do sculo XX teve no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) um dos seus principais centros. Ali, surgiram concepes de poltica econmica nacional-desenvolvimentista e de poltica externa autnoma que seriam basilares na conduo dos governos de Getlio Vargas, Juscelino Kubitschek e Joo Goulart, e, embora de forma no explcita, permeariam, inclusive, a conduo dos governos militares, notadamente durante a presidncia de Ernesto Geisel.

    Durante a dcada de 1950, o pensamento social brasileiro era bastante polarizado entre aqueles que se convencionou chamar "nacionalistas" e "entreguistas". Os primeiros defendiam um Estado mais atuante no plano econmico como meio de viabilizar o desenvolvimento nacional por meio, principalmente, da industrializao: sendo o Brasil uma nao dependente, assolada pelo fenmeno da deteriorao dos termos de troca, seu desenvolvimento pleno s poderia advir da superao de sua condio primrio-exportadora, o que apenas poderia ser feito por meio de ao estatal que canalizasse os escassos recursos para os setores prioritrios, no caso, os industriais. Era esse, em linhas gerais, o pensamento de poltica econmica dos intelectuais que compunham o ISEB, aos quais se contrapunham os mencionados "entreguistas" muitos dos quais concentrados nos organismos-anittese do ISEB, o IPES e o IBAD. Para estes, a poltica econmica deveria seguir os cnones liberais da no-interveno estatal na economia, do absoluto rigor fiscal e da extrema ortodoxia monetria.

    No que concerne ao pensamento brasileiro de poltica externa no perodo, a polaridade se repetia. Nesse campo, aos "entreguistas" chamava-se "americanistas", pois estes defendiam um alinhamento potncia hemisfrica, com argumentos que iam desde o pertencimento comum civilizao crist-ocidental em contraposio ao materialismo sovitico at aspectos de complementariedade econmica e "guarda-chuva" nuclear. Para os americanistas, o alinhamento aos EUA seria a forma menos onerosa de dependncia para uma potncia de segunda classe como o Brasil.

    Os intelectuais do ISEB, por sua vez, pensavam de forma diametralmente oposta. Muitos deles, como Hlio Jaguaribe, por exemplo, defendiam uma poltica externa neutralista. Para eles, o grande embate internacional em que o Brasil estava inserido no

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    era o Leste-Oeste, mas o Norte-Sul. Nesse sentido, o Brasil deveria articular-se com as emergentes naes afro-asiticas que compartilhavam consigo a saga pelo desenvolvimento socioeconmico. A poltica externa brasileira, portanto, deveria ser universalista, desideologizada e pragmtica, tendo sempre como norte o desenvolvimento nacional.

    As formulaes isebianas so, conforme mencionado, flagrantes no nacional-desenvolvimentismo econmico do segundo governo Vargas, por exemplo, bem como no projeto das Reformas de Base do governo Joo Goulart. Em poltica externa, o auge das ideias isebianas encontra-se na Poltica Externa Independente (PEI), que Brito Cruz classifica como quase-neutralista. Na PEI, bvia a desideologizao da poltica externa brasileira e sua busca por novos horizontes, para alm de fronteiras fsicas e ideolgicas. Nesse ponto, vale ressaltar que, apesar de bastante identificadas com ideias de esquerda, as formulaes isebianas tiveram reflexos at mesmo nas polticas econmica e externa do regime militar, o que pode ser verificado no II PND e no Pragmatismo Responsvel e Ecumnico de Geisel e Azeredo da Silveira.

    Percebe-se, nesse sentido, que o pensamento isebiano basilar do pensamento social progressista brasileiro, tendo influncias at os dias atuais, quando se percebe, a partir do governo Lula, a retomada de ideias nacional-desenvolvimentistas no plano econmico e de uma poltica externa que galga sua autonomia na diversificao de parceiros e de prioridades.

    QUESTO 4

    A Petrobras completa, em 2013, sessenta anos de sua criao. Comente sua evoluo histrica na formao do cenrio brasileiro nos anos 1970 e na poltica externa nacional desse perodo.

    Extenso mxima: 60 linhas (valor: 20 pontos)

    FELIPE EDUARDO LIEBL (17/20)

    A Petrobras uma das maiores empresas no ramo petrolfero mundial. Sua criao, no segundo governo Vargas (51-54), corresponde ao resultado de intensos debates nacionais e de um jogo poltico de membros da UDN. Inicialmente monopolizadora da extrao e de grande parte do refino, a Petrobras apresentava pouca produo de petrleo, centrada, principalmente, na Bahia. Uma alterao significativa ocorre com o aumento brusco dos preos do petrleo no cenrio internacional em 1973, que leva os governos brasileiros a valorizarem a Petrobras como mecanismo de diminuio da dependncia energtica brasileira e de fortalecimento de polticas de pesquisa e de desenvolvimento tecnolgico nacionais, o que transforma a Petrobras em importante varivel na poltica externa brasileira.

    A economia brasileira, no incio da dcada de 1970, era muito dependente da importao de petrleo. Com o choque nos preos de 1973, houve efeitos significativos no balano de pagamentos brasileiro e no funcionamento da economia nacional. Para diminuir

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    essa dependncia, o governo investe na Petrobras, que passa a fazer a prospeco de petrleo em guas profundas, com a descoberta da Bacia de Campos. Monopolizadora de importante parte do sistema do petrleo, a estatal passa a desempenhar um papel relevante na poltica de subsdios e de taxao do modelo adotado pelo regime de 1964 a 1985. A valorizao da Petrobras foi tambm percebida pela poltica de aprimoramento das condies e do nvel, tanto qualitativo como quantitativo, de seus empregados, em uma empresa com o prestgio elevado.

    O choque do petrleo conferiu mais nfase a algumas das premissas da poltica externa brasileira. Um exemplo disso a valorizao do pleito, j muito forte no governo Mdici, de expanso do mar territorial brasileiro at o limite de 200 milhas nuticas. Esse pleito viu-se reforado pela necessidade de colocar os novos campos de petrleo a serem explorados sob a jurisdio brasileira e gerou atritos com pases como os EUA. O discurso em prol do desenvolvimento tambm valorizado, na medida em que as dificuldades nacionais tambm so percebidas por pases em situao semelhante brasileira.

    A nova situao brasileira levou o pas a buscar, na diversificao de parcerias, uma maneira de reduzir sua dependncia. J detentor de capacidade de refino, o Brasil almeja ampliar o rol de parceiros comerciais exportadores. Data desse perodo acordos com pases africanos exportadores de petrleo. Jerry Dvila descreve, em Hotel Tropico, os acordos do Brasil com a Nigria, nos quais a Petrobras trocava petrleo por manufaturas tropicais sob a marca TAMA. O Brasil tambm aproximava-se de pases do Oriente Mdio, com o fito de trocar manufaturas por petrleo, como ocorreu, com sucesso, no caso do Iraque. Deve-se verificar que esses novos parceiros e as novas necessidades impuseram outras condicionantes poltica externa brasileira no perodo. A oposio nigeriana posio brasileira na desvalorizao portuguesa e na questo da frica do Sul, com ameaas a boicotes ao pas e a mudana para um posicionamento mais pr-rabe, inclusive com o voto antissemita na AGNU, correspondem a reflexos dessa nova perspectiva.

    A crise do petrleo levou o pas a buscar a valorizao de novas tecnologias energticas, como no caso do uso do etanol e da energia nuclear. Ao valorizar o elemento tecnolgico, o pas buscou novos parceiros, como a Repblica Federal da Alemanha. Esse pensamento estratgico tambm estava presente na Petrobras, na medida em que o presidente Geisel havia presidido a prpria Petrobras anteriormente. A estatal no fazia apenas intermediaes de comrcio exterior, mas tambm agia para formular centros de capacitao e de treinamento de pessoal, sobretudo centrados no Rio de Janeiro, que aumentavam a capacidade tcnica de extrao e de refino do petrleo. Ao investir na Petrobrs, o Estado brasileiro no apenas reduzia a dependncia tecnolgica, mas tambm capacitava o Brasil em uma indstria muito relevante.

    A poltica de valorizao da Petrobras teve vrios legados, tanto na poltica interna como na externa. No que concerne poltica externa, foi mais um passo no sentido do ecumenismo de parceiros do Brasil, conduzido de maneira pragmtica e que alterou algumas posies do Brasil. No mbito interno, houve avanos significativos na capacidade tcnica e no tamanho da Petrobras, atualmente uma das maiores empresas do ramo no mundo. a nfase na prospeco marinha foi muito positiva, na medida em que possibilitou a descoberta e a extrao de petrleo em reas de guas profundas, com destaque ao pr-sal contemporneo. Investir na Petrobras fez o pas no apenas diminuir sua dependncia energtica, mas tambm capacitar-se para ser, no futuro prximo, um grande exportador.

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    HISTRIA MUNDIAL (Prova Objetiva)

    Programa (Primeira Fase): 1. Estruturas e ideias econmicas. 1.1 Da Revoluo Industrial ao capitalismo organizado: sculos XVIII a XX. 1.2 Caractersticas gerais e principais fases do desenvolvimento capitalista (desde aproximadamente 1780). 1.3 Principais ideias econmicas: da fisiocracia ao liberalismo. 1.4 Marxismo. 1.5 As crises e os mecanismos anticrise: a Crise de 1929 e o New Deal. 1.6 A prosperidade no segundo ps-guerra. 1.7 O Welfare State e sua crise. 1.8 O Ps-Fordismo e a acumulao flexvel. 2 Revolues. 2.1 As revolues burguesas. 2.2 Processos de independncia na Amrica. 2.3 Conceitos e caractersticas gerais das revolues contemporneas. 2.4 Movimentos operrios: luditas, cartistas e Trade Unions. 2.5 Anarquismo. 2.6 Socialismo. 2.7 Revolues no sculo XX: Rssia e China. 2.8 Revolues na Amrica Latina: os casos do Mxico e de Cuba. 3 As relaes internacionais. 3.1 Modelos e interpretaes. 3.2 O Concerto Europeu e sua crise (1815-1918): do Congresso de Viena Santa Aliana e Qudrupla Aliana, os pontos de ruptura, os sistemas de Bismarck, as Alianas e a diplomacia secreta. 3.3 As rivalidades coloniais. 3.4 A questo balcnica (incluindo antecedentes e desenvolvimento recente). 3.5 Causas da Primeira Guerra Mundial. 3.6 Os 14 pontos de Wilson. 3.7 A Paz de Versalhes e a ordem mundial resultante (1919-1939). 3.8 A Liga das Naes. 3.9 A teoria dos dois campos e a coexistncia pacfica. 3.10 As causas da Segunda Guerra Mundial. 3.11 As conferncias de Moscou, Teer, Ialta, Potsdam e So Francisco e a ordem mundial decorrente. 3.12 Bretton Woods. 3.14 O Plano Marshall. 3.15 A Organizao das Naes Unidas. 3.16 A Guerra Fria: a noo de bipolaridade (de Truman a Nixon). 3.17 Os conflitos localizados. 3.18 A dtente. 3.19 A segunda Guerra Fria (Reagan-Bush). 3.20 A crise e a desagregao do bloco sovitico. 4 Colonialismo, imperialismo, polticas de dominao. 4.1 O fim do colonialismo do Antigo Regime. 4.2 A nova expanso europeia. 4.3 Os debates acerca da natureza do Imperialismo. 4.4 A partilha da frica e da sia. 4.5 O processo de dominao e a reao na ndia, China e Japo. 4.6 A descolonizao. 4.7 A Conferncia de Bandung. 4.8 O No-Alinhamento. 4.9 O conceito de Terceiro Mundo. 5 A evoluo poltica e econmica nas Amricas. 5.1 A expanso territorial nos EUA. 5.2 A Guerra de Secesso. 5.3 A constituio das identidades nacionais e dos Estados na Amrica Latina. 5.4 A doutrina Monroe e sua aplicao. 5.5 A poltica externa dos EUA na Amrica Latina. 5.6 O Pan-Americanismo. 5.7 A OEA e o Tratado do Rio de Janeiro. 5.8 As experincias de integrao nas Amricas. 6 Ideias e regimes polticos. 6.1 Grandes correntes ideolgicas da poltica no sculo XIX: liberalismo e nacionalismo. 6.2 A construo dos Estados nacionais: a Alemanha e a Itlia. 6.3 Grandes correntes ideolgicas da poltica no sculo XX: democracia, fascismo, comunismo. 6.4 Ditaduras e regimes fascistas. 6.5 O novo nacionalismo e a questo do fundamentalismo contemporneo. 6.6 O liberalismo no sculo XX. 7 A vida cultural. 7.1 O movimento romntico. 7.2 A cultura do imperialismo. 7.3 As vanguardas europeias. 7.4 O modernismo. 7.5 A ps-modernidade.

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    GEOGRAFIA

    A prova de Geografia consistir de quatro questes discursivas, duas das quais com o valor de 30 (trinta) pontos cada uma e duas com o valor de 20 (vinte) pontos cada uma. As respostas s questes com o valor de 30 (trinta) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 90 linhas; as respostas s questes com o valor de 20 (vinte) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 60 linhas.

    Programa (Primeira e Terceira Fases): 1. Histria da Geografia: 1.1 Expanso colonial e pensamento geogrfico. 1.2 A Geografia moderna e a questo nacional na Europa. 1.3 As principais correntes metodolgicas da Geografia. 2 A Geografia da Populao. 2.1 Distribuio espacial da populao no Brasil e no mundo. 2.2 Os grandes movimentos migratrios internacionais e intranacionais. 2.3 Dinmica populacional e indicadores da qualidade de vida das populaes. 3 Geografia Econmica. 3.1 Globalizao e diviso internacional do trabalho. 3.2 Formao e estrutura dos blocos econmicos internacionais. 3.3 Energia, logstica e re-ordenamento territorial ps-fordista. 3.4 Disparidades regionais e planejamento no Brasil. 4 Geografia Agrria. 4.1 Distribuio geogrfica da agricultura e pecuria mundiais. 4.2 Estruturao e funcionamento do agronegcio no Brasil e no mundo. 4.3 Estrutura fundiria, uso da terra e relaes de produo no campo brasileiro. 5 Geografia Urbana. 5.1 Processo de urbanizao e formao de redes de cidades. 5.2 Conurbao, metropolizao e cidades-mundiais. 5.3 Dinmica intraurbana das metrpoles brasileiras. 5.4 O papel das cidades mdias na modernizao do Brasil. 6 Geografia Poltica. 6.1 Teorias geopolticas e poder mundial. 6.2 Temas clssicos da Geografia Poltica: as fronteiras e as formas de apropriao poltica do espao. 6.3 Relaes Estado e territrio. 6.4 Formao territorial do Brasil. 7 Geografia e gesto ambiental. 7.1 O meio ambiente nas relaes internacionais: avanos conceituais e institucionais. 7.2 Macro diviso natural do espao brasileiro: biomas, domnios e ecossistemas 7.3 Poltica e gesto ambiental no Brasil.

    Prova de 2013

    QUESTO 1

    O acordo de Sykes-Picot, assinado em 1916 entre Frana e Gr-Bretanha, definiu a partilha de territrios pertencentes ao antigo Imprio Otomano no Oriente Mdio. Aponte qual o princpio geopoltico que norteou a diviso dos territrios e explique como foram divididas as fronteiras entre os dois pases.

    Extenso mxima: 90 linhas (valor: 30 pontos)

    FELIPE NEVES CAETANO RIBEIRO (30/30)

    O Oriente Mdio constitui, historicamente, um hotspot da geopoltica mundial. Seja nas concepes de Spykman acerca do Rimland, reas peninsulares que circundam o heartland, ou nas concepes de Zbigniew Brzezinski acerca da rea balcnica eurasiana, constata-se a grande importncia dessa regio no apenas em decorrncia de sua

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    topopoltica, mas tambm devido sua fisiopoltica e a seus recursos naturais de poder, ainda valorizados pela geopoltica atual. O acordo Sykes-Picot, negociado durante a Primeira Guerra Mundial entre Frana e Inglaterra, dispondo acerca das divises do esfacelado Imprio Otomano, baseou-se no princpio geopoltico das esferas de influncia e prestou-se a promover interesses britnicos e franceses na regio.

    O esfacelamento do Imprio Otomano revelava as reminiscncias do chamado grande jogo geopoltico na Europa, caracterizado pelos esforos ingleses de conter a Rssia e seu acesso a mares quentes, sobretudo durante o sculo XIX. Ocorre que as revoltas enfrentadas pelo Imprio Otomano nos Balcs e nos pases rabes enfraqueciam, crescentemente, o grande enfermo europeu, abrindo um vcuo de poder em uma regio estratgica, principalmente para os interesses britnicos. A Primeira Guerra Mundial, em que o Imprio Otomano se colocou ao lado da trplice aliana liderada pelo Imprio Alemo, em oposio trplice entente, foi o golpe final para o Imprio Otomano e para o que Eric Hobsbawm denominou de Eras dos Imprios, ainda que o imperialismo franco-britnico permanecesse na regio.

    Diante do fim do Imprio Otomano, protegido pelos ingleses no sculo XIX para evitar o expansionismo russo, Frana e Inglaterra entabulam negociaes que vo ocorrer em detrimento da comunidade judaica, do sionismo e do povo rabe. Na concepo inglesa, mais importante que o sionismo e a futura declarao Balfour, em que prometeria apoiar um Estado judeu na Palestina, ou mesmo as promessas feitas aos governantes da Jordnia e do Iraque, era garantir que o vcuo de poder na terra dos cinco mares no fosse preenchido por outra potncia, em especial aquelas s quais se opunha durante a guerra. nesse cenrio de redefinio geopoltica, anterior Revoluo Russa, que se estabelece o acordo Sykes-Picot, definindo as fronteiras de territrios antes pertencentes ao Imprio Otomano, com base no princpio das reas de influncia e sem descuidar dos interesses estratgicos dos pases envolvidos.

    O acordo Sykes-Picot dividiu as fronteiras entre Inglaterra e Frana em uma rea que se estende do Mediterrneo ao golfo prsico, de maneira a atender os interesses das duas principais potncias envolvidas. Nesse contexto, relevante considerar que os interesses franco-britnicos no Oriente Mdio e na sia menor remontam presena no Egito em meados do sculo XIX, que permitiu aos franceses construir o canal de Suez, at a tomada do poder pelos britnicos, aumentando rivalidades entre essas duas potncias, apaziguadas aps a crise de Fashoda. Alm do canal de Suez, estratgico para permitir o acesso do Mediterrneo ao oceano ndico, cumpre destacar o carter igualmente estratgico do golfo de caba e do estreito de Ormuz, dos quais a Inglaterra se aproximaria por meio do acordo Sykes-Picot. A Frana, por sua vez, expandiria sua influncia, com acesso a novos portos no Mediterrneo e maior ascendncia sobre territrios j conquistados, como a Arglia.

    A partilha feita pelo acordo Sykes-Picot dividiu territrios do Imprio Otomano da seguinte forma: a Frana teria controle sobre Lbano, Sria e sudeste da Turquia, enquanto a Inglaterra controlaria territrios do Iraque Palestina, tendo grande influncia sobre as autoridades da Arbia e da Jordnia. Dessa forma, consagrava-se o princpio das reas de influncia, perfazendo fronteiras contguas entre os territrios sob o controle da Inglaterra e da Frana, o que visava tambm a conter os interesses de outras potncias, em um espao que configurava a grande hinterlndia do Oriente Mdio. A Frana controlaria o norte da regio, ao passo que a Inglaterra controlaria uma rea prxima ao canal de Suez, na iminncia da independncia do Egito, alm do Iraque, prximo ao Ir alvo crescente dos interesses ingleses, com a descoberta de reservas de hidrocarbonetos.

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    A forma como se deu o acordo Sykes-Picot e suas reas de influncia teriam grande impacto na configurao geopoltica da regio, com repercusses ainda nos dias atuais. A independncia das reas sob o domnio franco-britnico coincide, aps a Segunda Guerra Mundial, com o perodo em que o Oriente Mdio passa a ser visto como um hotspot geopoltico no apenas devido a seus recursos, mas tambm devido ao surgimento de animosidades e de conflitos. As fronteiras artificiais do acordo Sykes-Picot ignoraram as diferenas religiosas e tnicas existentes na regio. De modo similar ao acordo de Lausanne, que definiu as fronteiras da Turquia, o acordo Sykes-Picot no se preocupou, por exemplo, com as populaes curdas no Iraque e no norte da Sria, o que repercute, ainda, em conflitos atuais.

    De forma semelhante, possvel relacionar o acordo Sykes-Picot a importantes questes polticas e geopolticas que marcaram o sculo XX, a exemplo da queda de Mossaddeq no Ir em 1953, at ento sob a influncia britnica, ao conflito palestino-israelense, considerando-se as dificuldades para definir as fronteiras regionais, alm da criao do Kuait, revelando o intento de manter a influncia estrangeira na regio. Nesse sentido, o acordo Sykes-Picot e seus desdobramentos revelam-se importantes para a compreenso da geopoltica no incio do sculo XX, resultante de interesses que remontam ao sculo anterior e que repercutem atualmente.

    O acordo Sykes-Picot entre Inglaterra e Frana baseou-se na ideia de reas de influncia e dividiu antigos territrios do Imprio Otomano, de modo a favorecer desgnios franco-britnicos no Oriente Mdio. As fronteiras no levaram em conta os interesses da populao regional, o que resultou em conflitos em uma rea que permanece central para a compreenso das questes geopolticas no mundo atual.

    QUESTO 2

    Estados Unidos da Amrica, China e Rssia possuem vises bastante distintas a respeito de seu prprio futuro energtico. Discrimine quais so estas vises, identificando at que ponto cada uma delas se ajusta ou no ao paradigma do "desenvolvimento sustentvel".

    Extenso mxima: 90 linhas (valor: 30 pontos)

    CAIO GROTTONE TEIXEIRA DA MOTA (30/30)

    O desenvolvimento sustentvel, em mbito global, depender, em grande medida, das estratgias das grandes potncias quanto ao seu futuro energtico. Nesse cenrio, destacam-se recentes desdobramentos nos EUA, na Rssia e na China. De maneira geral, os hidrocarbonetos tm mantido importncia estratgica crucial para a economia e para a geopoltica dessas naes. O impacto sobre o meio ambiente, contudo, deve ser analisado caso a caso, dada a emergncia de novas oportunidades e desafios no sculo XXI.

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    Nos EUA, uma nova fronteira energtica foi aberta, nos ltimos anos, com a tecnologia do fraturamento de rochas de xisto, impregnadas de hidrocarbonetos. Antes invivel, a explorao do "shale gas" e do "tight oil" pode transformar os EUA no maior produtor mundial de gs natural (superando a Rssia por volta de 2015) e mesmo de petrleo (superando a Rssia e a Arbia Saudita por volta de 2017). Os EUA, ademais, possuem essas reservas perto de grandes centros industriais, o que poupar gastos de infraestrutura, como oleodutos e gasodutos.

    As consequncias da revoluo do xisto so inmeras. A oferta de gs natural barato dever atrair para o territrio estadunidense investimentos de indstrias eletrointensivas, gerando empregos locais, mas prejudicando pases emergentes. O dficit na balana comercial, que agrava a dependncia de financiamento externo no atual contexto de discusso sobre o teto da dvida pblica, ser mitigado. O impacto ambiental, por sua vez, tem dividido a opinio pblica. De um lado, o aumento da participao do gs natural na matriz energtica, ao substituir o carvo mineral pelo gs natural, contribui para a reduo da emisso de gases-estufa, coadunando-se com os esforos de reduo da poluio do ar e do aquecimento global. De outro lado, a tecnologia do fraturamento emite gs metano, mais nocivo para o efeito estufa do que o gs carbnico, e pode contaminar, com produtos qumicos, lenis freticos e aquferos. O ajuste da nova estratgia energtica estadunidense ao desenvolvimento sustentvel depender, portanto, dos avanos da tecnologia do fraturamento em evitar impactos ambientais.

    Outra consequncia da produo estadunidense do gs de xisto tem sido a exportao de carvo mineral a preos mais baixos para a Europa Ocidental. Embora isso contrarie esforos da UE de combate mudana climtica, o alvio financeiro no contexto de crise inegvel. Esse movimento pode ser capaz de reduzir a dependncia energtica da Europa em relao ao gs russo, que envolve a "geopoltica dos dutos". Os EUA, para reduzir o poder de barganha russo diante dos europeus, haviam apoiado a construo do gasoduto Nabucco, que levaria o gs natural dos pases do Mar Cspio Europa passando pela Turquia (membro histrico da OTAN). Esse projeto foi sobrepujado por iniciativas russas mais bem-sucedidas, como o South Stream e o Nord Stream, que consolidaram grande participao do gs russo nas matrizes energticas do leste europeu, da Alemanha e da Itlia.

    A estratgia energtica russa baseia-se, de maneira geral, em dois pilares: a exportao dos hidrocarbonetos de suas extensas bacias sedimentares Europa e a submisso poltica dos pases que compem seu "Exterior Prximo". No contexto da guerra ao terror, quando a Rssia tambm era ameaada por separatismos em territrios de maioria muulmana, Putin consentiu com o estabelecimento de bases estadunidenses em algumas das repblicas que compunham a URSS. Hoje, essas bases aumentaram a influncia dos EUA sobre os recursos do Mar Cspio, reeditando o "grande jogo" do sculo XIX, travado entre russos e britnicos. Os estadistas russos tendem a enquadrar sua poltica energtica em perspectiva geopoltica, visto que seus recursos naturais tm possibilitado a manuteno de sua influncia poltica e a recuperao econmica com Putin, aps anos de crise com Yeltsin. A possibilidade favorvel ao desenvolvimento sustentvel decorre dos fundos soberanos formados a partir da receita obtida com tarifas de exportao sobre hidrocarbonetos. A exemplo de pases do Oriente Mdio, a Rssia pode financiar, com esses fundos, o desenvolvimento de tecnologias para energia alternativa, visando a um contexto futuro de escassez de petrleo.

    A China, por sua vez, deve tornar-se a maior importadora lquida de petrleo do mundo em 2013, ultrapassando os EUA. Embora seja a lder mundial em investimentos "verdes", o maior poluidor do mundo, devido ao carvo mineral predominante em sua matriz. As reformas propostas por Xi Jinping vo ao encontro da necessidade de fortalecer o

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    pilar ambiental do desenvolvimento sustentvel chins. O apoio produo de painis solares, que tm ganhado destaque no mercado europeu e que originaram grande contencioso comercial na OMC, exemplifica esse quadro. De todo modo, a China no descuidou dos hidrocarbonetos. Suas petrolferas estatais lanaram, nos ltimos anos, agressiva poltica de investimentos no mundo. Alguns temem que a ideia seja suprir a demanda chinesa crescente por petrleo. Contudo, essas empresas tm vendido petrleo no mercado internacional, mostrando maior interesse na aquisio de tecnologia. Disso decorre sua participao no recente no leilo de Libra no Brasil: acesso tecnologia da Petrobrs sobre explorao em guas profundas.

    Recentes desdobramentos sobre poltica energtica oferecem prs e contras para o desenvolvimento sustentvel. importante ressaltar que o foco recente na "revoluo do xisto" no deve ofuscar os avanos tecnolgicos experimentados por fontes alternativas. O Brasil, que, ao lado dos EUA e do Canad, ser um dos maiores contribuidores para o aumento da produo mundial de petrleo, tem uma matriz energtica relativamente limpa, est na vanguarda dos biocombustveis e apresentou, em 2012, crescimento de 87% na gerao de energia elica. Ainda assim, os hidrocarbonetos, tradicionalmente apontados como "viles ambientais", podem fortalecer os trs pilares do desenvolvimento sustentvel (econmico, social e ambiental), desde que polticas pblicas adequadas acompanhem sua explorao. Se EUA, China e Rssia se pautarem pelo equilbrio que caracteriza as polticas brasileiras, o desenvolvimento sustentvel poder ser fortalecido.

    QUESTO 3

    O avano da cafeicultura em territrio paulista foi marcado por um novo padro geogrfico de ocupao do solo, que contrariava alguns elementos bsicos do modelo de organizao territorial estabelecido desde os tempos coloniais. Aponte a inovao bsica introduzida, fazendo uma explanao comparativa entre os modelos.

    Extenso mxima: 60 linhas (valor: 20 pontos)

    ALEXANDRE PIANA LEMOS (20/20)

    O avano da cafeicultura em territrio paulista deu incio a um novo padro de ocupao do solo, que se diferenciou tanto do modelo de organizao territorial consolidado desde os tempos coloniais quanto do modelo adotado inicialmente pelos cafeicultores das reas mais antigas do Vale do Paraba. O novo Oeste paulista distinguiu-se pela maior densidade tcnica de seu modelo, assim como pelo uso que fez da mo-de-obra imigrante e, finalmente, por seu carter menos autrquico, que favoreceu a maior integrao do territrio nacional, aluindo as bases do modelo de arquiplagos que ento vigorava.

    O modelo vigente desde os tempos coloniais era de uma ocupao extensiva da terra, com baixo nvel de produtividade e com pouca preocupao com o desgaste do

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    solo. Ao esgotar-se a produtividade de certas pores do territrio, passava-se a outras, sem a preocupao com a recuperao do solo. O avano da cafeicultura paulista no novo Oeste deu-se em outras bases. Iniciou-se um uso mais intensivo da terra a rica terra roxa do planalto paulista , assentado em maior densidade tcnica. Os capitais ingleses permitiram o incremento tecnolgico da produo e, assim, maior produtividade.

    A maior produtividade, evidentemente, tambm est relacionada qualidade da mo-de-obra. Enquanto o modelo territorial tradicional baseou-se no intenso uso da mo-obra escrava, o novo modelo paulista, j prevendo a escassez de mo-de-obra servil desde a lei Eusbio de Queirs (de 1850), incentivou a vinda de imigrantes, que, trabalhando crescentemente sob o regime de colonato, contriburam com seu cabedal de conhecimentos tcnicos para o incremento da produtividade e, ao mesmo tempo, foram fundamentais, como mo-de-obra livre, para fomentar um mercado interno.

    Ao fomentar um mercado interno, por sua vez, o novo modelo paulista comeou a romper com o modelo de produo autrquico que vigeu durante a maior parte de nossa histria. A cafeicultura paulista incentivou o investimento em ferrovias, silos de armazenamento, portos, alm de fomentar a crescente urbanizao e industrializao do territrio brasileiro. Os cafeicultores, em grande parte, passaram a habitar em cidades, ao passo que o processo produtivo concentrava-se no campo. Essa separao entre local de produo e as cidades foi possibilitada pela maior fluidez que os investimentos em infra-estrutura conferiram ao territrio brasileiro.

    O novo modelo paulista, desse modo, constituiu modelo de transio entre complexos agrrios e complexos agroindustriais, sendo que estes viriam a consolidar-se ao longo do sculo XX. O complexo cafeicultor paulista, assim, contribuiria para acabar com o modelo territorial de arquiplagos, vigente desde a Colnia, e para integrar, aos poucos, o territrio brasileiro, processo de integrao que seria liderado por So Paulo e que levaria conformao da regio concentrada (a que se referia Milton Santos) e a um modelo territorial extremamente concentrado no Sudeste.

    QUESTO 4

    Depois de dcadas em declnio, a populao rural de alguns pases comea a se estabilizar e at a apresentar leve crescimento. Explique os motivos atribudos pelos demgrafos a tal comportamento dessa varivel populacional e discorra sobre suas potencialidades nos prximos anos.

    Extenso mxima: 60 linhas (valor: 20 pontos)

    FELIPE NEVES CAETANO RIBEIRO (20/20)

    A terra um planeta urbanizado. Desde 2008, a populao urbana supera a populao rural, o que no implica a inexistncia de mobilidade humana em sentido inverso. A estabilizao e o leve crescimento da populao rural em alguns pases desafiam uma das leis da migrao de E. Ravenstein e mesmo a tendncia atual de associar o crescimento demogrfico aos centros urbanos, que, de acordo com W. Thompson, configuram um espao favorvel ao aumento populacional. Nesse contexto, os motivos

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    atribudos por demgrafos para a estabilizao e para o crescimento da populao rural em alguns pases envolvem a saturao do meio urbano, a disseminao de atividades de servios no meio rural, alm de greenfields, que implicam possibilidades econmicas para a populao no campo.

    O primeiro motivo que explica a estabilizao e at o aumento da populao rural em alguns pases est relacionado saturao do meio urbano. Esse elemento refere-se perda de qualidade de vida, englobando servios e facilidades, como transporte pblico e sade dos cidados, afetados pelo stress e pela poluio, por exemplo. Tal fenmeno est ligado, em alguns casos, involuo metropolitana, referindo-se perda da qualidade de servios nas metrpoles, e tambm ao esgotamento da fronteira urbana, relacionado, por sua vez, periferizao e especulao imobiliria. Alm disso, h o processo de detroitizao de algumas cidades, que tambm leva diversos cidados a procurarem o campo e nele permanecer.

    Um segundo motivo que explica a estabilizao e o crescimento da populao rural relaciona-se a novas oportunidades que emergem nas reas rurais, como o oferecimento de servios e de outras atividades econmicas. Maximilien Sorre afirma que o fato capital a ubiquidade do homem, capaz de explicar suas tendncias de ocupao de mobilidade. Nesse sentido, servios relacionados aos setores a montante e a jusante da atividade agrcola conduzem indstrias ao campo, o que favorece a permanncia no meio rural, em que surgem greefields industriais, demandando mo-de-obra. A disseminao do ecoturismo ou agroturismo, existentes no interior da Frana e dos Estados Unidos, constituem outro elemento usado por demgrafos para explicar a permanncia da populao no campo. Cumpre ressaltar, ainda, os incentivos conferidos por governos para a permanncia no meio rural e mesmo para a migrao, conforme verificado na Europa, o que fortalecido por programas de concesso de subsdios, como a PAC europeia, ou os estmulos ao algodo nos Estados Unidos, tornando a cotonicultura um elemento de atrao.

    Quanto s potencialidades para os prximos anos, relevante destacar a perspectiva de um maior equilbrio entre a populao urbana e a populao rural em alguns pases desenvolvidos, onde a tendncia em comento merece destaque. Embora no seja possvel falar na reduo do ritmo de urbanizao global, capitaneado atualmente pela frica e pela sia, possvel referir-se a um maior equilbrio nos pases desenvolvidos e at em alguns pases emergentes, o que configura uma perspectiva de longo prazo. Outra tendncia que deve ser acentuada o potencial de aumento da renda da populao rural e da atratividade do campo, em que se verifica uma melhor difuso do meio tcnico-cientfico-informacional, em espaos outrora caracterizados pela opacidade, viscosidade e lentido. A emergncia crescente do fato capital no campo, somada a um adensamento tcnico, configura uma janela de oportunidade para a disseminao de prticas sustentveis, conforme j se verifica em servios comerciais e tursticos oferecidos no campo, bem como em indstrias, que compreendem a importncia da preservao para sua renda e sustentabilidade.

    A estabilizao e o aumento da populao rural de alguns pases so, em suma, explicados por fatores que incluem a saturao urbana, surgimento de um mercado lucrativo de servios (como o turismo) e at o fator industrial em reas rurais, alm de estmulos diretos e indiretos oferecidos por governos, potencializando a atratividade do campo, o equilbrio e a sustentabilidade.

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    POLTICA INTERNACIONAL

    A prova de Poltica Internacional consistir de quatro questes discursivas, duas das quais com o valor de 30 (trinta) pontos cada uma e duas com o valor de 20 (vinte) pontos cada uma. As respostas s questes com o valor de 30 (trinta) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 90 linhas; as respostas s questes com o valor de 20 (vinte) pontos tero, cada uma, a extenso mxima de 60 linhas.

    POLTICA INTERNACIONAL (Primeira e Terceira Fases): 1 Relaes internacionais: conceitos bsicos, atores, processos, instituies e principais paradigmas tericos. 2 A poltica externa brasileira: evoluo desde 1945, principais vertentes e linhas de ao. 3 O Brasil e a Amrica do Sul. 3.1 Integrao na Amrica do Sul. 3.2 O MERCOSUL: origens do processo de integrao no Cone Sul. 3.3 Objetivos, caractersticas e estgio atual de integrao. 3.4 A Iniciativa de Integrao da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). 3.5 A Unio Sul-Americana de Naes: objetivos e estrutura. 3.6 O Conselho de Defesa da Amrica do Sul. 4 A poltica externa argentina; a Argentina e o Brasil. 5 A poltica externa norte-americana e relaes com o Brasil. 6 Relaes do Brasil com os demais pases do hemisfrio. 7 A Poltica externa francesa e relaes com o Brasil. 8 Poltica externa inglesa e relaes com o Brasil. 9 Poltica externa alem e relaes com o Brasil. 10 A Unio Europeia e o Brasil. 11 Poltica externa russa e relaes com o Brasil. 12 A frica e o Brasil. 13 A poltica externa da China, da ndia e do Japo; relaes com o Brasil. 14 Oriente Mdio: a questo palestina; Iraque; Ir. 15 A Comunidade dos Pases de Lngua Portuguesa. 16 A agenda internacional e o Brasil: 16.1 O multilateralismo de dimenso universal: a ONU; as Conferncias Internacionais; os rgos multilaterais. 16.2 Desenvolvimento. 16.3 Pobreza e aes de combate fome. 16.4 Meio ambiente. 16.5 Direitos Humanos. 16.6 Comrcio internacional e Organizao Mundial do Comrcio (OMC). 16.7 Sistema financeiro internacional. 16.8 Desarmamento e no-proliferao. 16.9 Terrorismo. 16.10 Narcotrfico. 16.11 A reforma das Naes Unidas. 17 O Brasil e o sistema interamericano. 18 O Brasil e a formao dos blocos econmicos. 19 A dimenso da segurana na poltica exterior do Brasil. 20 O Brasil e as coalizes internacionais: o G-20, o IBAS e o BRIC. 21 O Brasil e a cooperao sul-sul.

    Prova de 2013

    QUESTO 1

    Leia os seguintes trechos.

    I "Os desdobramentos preocupantes no campo da paz e da segurana internacional demonstram a necessidade de valorizao cada vez maior da diplomacia e dos meios pacficos de soluo de controvrsias. Neste, assim como em outros casos, estaremos atentos para a contribuio que o Brasil pode e deve dar, especialmente num contexto de uma j inadivel transformao da governana internacional, que inclui a reforma do Conselho de Segurana"

    Discurso de Posse do Embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado no cargo de Ministro de Estado das Relaes Exteriores, 28 de agosto de 2013.

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    II "O trao definidor do multilateralismo no apenas que ele coordena as polticas nacionais entre grupos de trs ou mais Estados (...), mas adicionalmente que o faz com base em certos princpios de ordenamento das relaes entre os Estados".

    John Ruggie. Multilateralism: The Anatomy of an Institution. In: International Organization, 46, vero de 1992.

    Considerando os trechos acima como motivadores, elabore o conceito de multilateralismo, examine as funes do Conselho de Segurana e, com base nisso, analise o tratamento internacional do conflito na Sria.

    Extenso mxima: 90 linhas (valor: 30 pontos)

    VITOR AUGUSTO CARVALHO SALGADO DA CRUZ (27/30)

    O fato de a Arbia Saudita ter sido recentemente eleita para o Conselho de Segurana das Naes Unidas e ter renunciado ao posto logo em seguida soma-se letrgica ao desse rgo em relao crise na Sria e situao do povo palestino para evidenciar os problemas que perpassam a atual governana global, em especial no que concerne o tema da paz e da segurana internacional. Em face desses desafios, o Brasil, pas historicamente vinculado defesa do multilateralismo, prope a reforma da governana global com base em parmetros de legitimidade e eficcia.

    O conceito de multilateralismo elaborado por John Ruggie diz respeito cooperao nas relaes internacionais em consonncia com princpios compartilhados. Em um mundo caracterizado por desafios que afetam todos os Estados, nos mbitos da segurana, da economia e do meio-ambiente, o multilateralismo a melhor forma de se alcanar solues concertadas. Segundo Kofi Annan, o multilateralismo, por si s, no garante o sucesso, no entanto, o unilateralismo representa a certeza do fracasso. Nesse sentido, as aes unilaterais devem ser evitadas, o que corroborado pelos recentes fracassos de pases que optaram por empreender iniciativas de forma unilateral. As mudanas que perpassam a atualidade determinam o surgimento de novos polos de poder, o que estimulou Jochen Prantl a formular a ideia de que o mundo atual caracterizado por uma multipolaridade sem multilateralismo. Esse cenrio enseja instabilidades recorrentes, na medida em que o multilateralismo deve ser entendido como a expresso jurdica de uma ordem multipolar. Ademais, pode-se ressaltar que a multipolaridade no representar uma ordem mundial mais justa e equilibrada caso no seja acompanhada por regras claras que sejam aplicveis a todos os pases em igual medida. Assim, para se evitar uma multipolaridade de confrontao, faz-se necessrio trabalhar por uma multipolaridade benigna, capaz de organizar e fomentar a cooperao entre os povos.

    A Carta da ONU representa um dos mais significativos compromissos assumidos pela sociedade internacional em relao ao multilateralismo. A ONU foi criada para evitar que os Estados incorressem em aes unilaterais, como aquelas que conduziram o mundo a duas Guerras Mundiais. O Conselho de Segurana o principal rgo da ONU para questes relativas manuteno da paz e da segurana internacional, cabendo a ele adotar

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    medidas soluo de controvrsias de carter pacfico (Captulo VI) ou coercitivo (VII). Deve-se observar, entretanto, que o atual formato do Conselho, com dez membros no permanentes e cinco permanentes, muitas vezes cria impasses, que tm altos custos humanitrios. O Conselho foi projetado para que os desafios internacionais fossem resolvidos por meio da concertao multilateral, porm frequentemente as disputas entre seus membros o tornaram inativo e ineficaz. Um dos fatores que contribuem para esse cenrio que alguns membros percebem o Conselho como mero legitimador de intervenes em outros pases ao invs de foro de concertao poltica capaz de gerar solues pacficas.

    O conflito na Sria foi iniciado no contexto da chamada Primavera rabe em 2011, mas o Conselho somente foi capaz de emitir uma deciso em 2013. A resoluo 2118, que incorpora o acordo entre EUA e Rssia sobre a Sria e o uso de armas qumicas, foi um importante avano, no entanto, a demora em se alcanar um acordo determinou a morte de centenas de milhares de pessoas, assim como a existncia de milhes de refugiados e de deslocados internos. A letrgica ao do Conselho permitiu, portanto, a consubstanciao do que a presidenta Dilma Rousseff chamou de a maior tragdia humanitria do sculo XXI. A questo sria complexa, porquanto envolve diversos atores e interesses tanto no contexto interno quanto no externo. Assim, no h soluo militar para o conflito, visto que nenhum dos lados consegue obter clara vantagem na guerra civil. O uso de armas qumicas e a existncia de segmentos terroristas entre os grupos oposicionistas apenas complexifica ainda mais a questo. Apesar dos avanos decorrentes da colaborao entre a ONU e a OPAQ, faz-se necessrio que o Conselho de Segurana atue de forma mais assertiva, por exemplo, por meio de decises que cortem o fornecimento de material blico para ambas as partes da disputa.

    Para que o Conselho tenha capacidade de atuar de modo mais ativo, deve-se empreender uma reforma no rgo, visando incrementar sua legitimidade e sua eficcia. A legitimidade est diretamente relacionada ao dficit de representatividade do atual formato do Conselho. O fato de a categoria de membros no permanentes ter sido expandida apenas uma vez, na dcada de 1960, e de a categoria de membros permanentes nunca ter sido objeto de ampliao demonstra o anacronismo da atual configurao do Conselho. Vale lembrar que, quando foi fundada, a ONU tinha apenas 51 membros, enquanto na atualidade so 193. Uma reforma que ampliasse ambas as categorias torna-se imprescindvel para que o Conselho seja dotado de maior representatividade, o que renovaria seu compromisso com o multilateralismo e evitaria tragdias como a da Sria, pois seria mais eficaz. O incremento da eficcia do rgo decorreria precisamente da capacidade de articular consensos que envolvam mais atores de relevo, como, por exemplo, Brasil, ndia, Japo e Alemanha e alguns pases do continente africano.

    Essa posio defendida pelo Brasil, pas que, segundo Amado Cervo, apresenta um compromisso histrico com o multilateralismo normativo. O multilateralismo possibilita aos Estados institucionalizar princpios de conduta que contribuam para a construo de uma ordem internacional mais justa e equilibrada. Nesse sentido, a estagnao do processo de reforma do Conselho de Segurana enfraquece o sistema de segurana internacional, na medida em que desrespeita a deciso adotada na Cpula Mundial de 2005. Em um mundo globalizado, no qual as ameaas so crescentemente fragmentadas e difusas, somente uma concertao no mbito multilateral ser capaz de enfrentar desafios que so comuns e inter-relacionados, os quais ocorrem nos mbitos econmico, social, ambiental e no de paz e de segurana.

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    QUESTO 2

    A cooperao para o desenvolvimento internacional tem sido componente importante da poltica externa brasileira, com ramificaes em reas como cooperao tcnica e humanitria. Ela orienta-se por princpios e prticas tais como o apoio ao progresso socioeconmico dos povos e o respeito s peculiaridades dos pases que a recebem. Os analistas dividem-se com respeito a essa cooperao: para uns, ela constitui posio idealista, decorrente de perspectivas romnticas da ordem internacional e pouco compatvel com a extenso dos desafios internos; para outros, ela fortalece a imagem do Pas, consolida sua liderana e aporta benefcios econmicos de longo prazo. A partir dessas consideraes, examine as principais caractersticas e condicionantes da cooperao brasileira para o desenvolvimento, bem como suas implicaes para a insero internacional do Brasil.

    Extenso mxima: 90 linhas (valor: 30 pontos)

    VICTOR CAMPOS CIRNE (29/30)

    A cooperao brasileira para o desenvolvimento um aspecto fundamental da poltica externa brasileira contempornea. A instrumentalizao da poltica externa para o desenvolvimento, objetivo primordial do Brasil, segundo Amado Cervo, desde a concepo de uma insero internacional nacional-desenvolvimentista, na dcada de 1930, no se restringe, hodiernamente, ao desenvolvimento nacional interno. Em uma perspectiva solidria, a diplomacia brasileira tem envidado esforos, historicamente, para estabelecer uma cooperao com outros pases do Sul. A noo de que esse esforo seria incompatvel com a necessidade de resoluo de problemas internos sobrepujada pelas vantagens de longo prazo e pelas caractersticas essencialmente tcnicas da cooperao realizada pelo Brasil.

    O estabelecimento da cooperao internacional uma prtica tradicional do Brasil, pas que foi receptor de grande cooperao internacional, mas que, ao longo do tempo, transformou-se em um pas que, majoritariamente, implementa a cooperao internacional para o desenvolvimento. Essa longevidade representada na prpria poca de criao da Agncia Brasileira de Cooperao (ABC), vinculada ao Ministrio das Relaes Exteriores (MRE). A ABC foi estabelecida, j na dcada de 1980, como rgo necessrio para a articulao das diversas iniciativas que eram empreendidas pela diplomacia brasileira. Desde essa poca, a capacitao e o expertise brasileiros em cooperao internacional, alm da emergncia do pas no sistema internacional, tm incentivado o aumento crescente dessas iniciativas.

    A reverso do papel tradicional da cooperao Norte-Sul para uma cooperao Sul-Sul, como a realizada pelo Brasil, acarreta algumas mudanas em relao s caractersticas tradicionais dessa poltica. Basicamente, a concepo de cooperao brasileira horizontal, fugindo do padro verticalizado de implantao de prticas pr-definidas. A diplomacia brasileira busca uma construo conjunta de projetos com outros pases, tendo o objetivo de entender a realidade local, para ter maior sucesso na realizao dos objetivos. O carter multicultural, multirreligioso e diversificado da sociedade brasileira auxilia o estabelecimento dessa noo dialgica de cooperao, que respeita a identidade e as particularidades das diferentes sociedades.

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    Isso no implica que o Brasil rejeite a participao do Norte. Assim como busca a triangulao de iniciativas em um contexto Sul-Sul, a partir de grupos como o IBAS (ndia Brasil - frica do Sul), a cooperao triangular com parceiros do Norte tambm realizada. O Japo um parceiro importante nesse tipo de empreitada, auxiliando iniciativas como o desenvolvimento agrcola em Moambique. Essas parcerias so, usualmente, realizadas segundo as concepes brasileiras, sem as tpicas exigncias de condicionalidades feitas pelos pases centrais. Recentemente, o BNDES, por exemplo, aprovou recursos para a implantao de sistemas de monitoramento florestas na Amrica Andina via o Fundo Amaznia. Os recursos do Fundo Amaznia so integralizadas, especialmente, por Estados escandinavos, mas a administrao dos financiamentos feita pelo BNDES e, nesse caso, a execuo do projeto ser realizada pela Organizao do Tratado de Cooperao Amaznica (OTCA).

    A Amrica Latina e os pases africanos da Comunidade dos Pases de Lngua Portuguesa (CPLP) foram, tradicionalmente, os espaos de atuao da cooperao brasileira. Entretanto, na ltima dcada, ocorreu uma expanso desse espectro de atuao, sob a lgica da autonomia pela diversificao descrita na obra de Tullo Vigevani. Pases da frica, sia e Oceania, importantes parceiros na lgica de uma insero internacional ampla do Brasil como global player, tm estabelecido projetos de cooperao para o desenvolvimento com o Brasil. A instalao de um escritrio da Embrapa em Gana um exemplo desse aprofundamento em novos eixos.

    O caso da Embrapa, assim como o do escritrio da Fiocruz em Moambique, ressalta a relevncia do aspecto tcnico sobre o financeiro na poltica de cooperao brasileira. O desenvolvimento de solues para a realidade brasileira extremamente compatvel com as necessidades de outras regies tropicais e em desenvolvimento. Adicionalmente, o Brasil no tem a mesma disponibilidade de recursos econmicos que outros Estados, mas apresenta essa vantagem comparativa tcnica, demonstrada repetidamente no continente africano.

    Em termos de princpios, essa concepo desenvolvimentista pode acarretar, inclusive, em disputas com os pases centrais. A perspectiva brasileira de que a fabricao de produtos farmacuticos para pases de menor desenvolvimento relativo admite a flexibilizao dos acordos de propriedade intelectual (TRIPS) da Organizao Mundial do Comrcio (OMC) motivo de controvrsia com alguns Estados centrais. A defesa de uma articulao Sul-Sul, em bases mais equitativas, pode ir de encontro com os interesses do Norte.

    Apesar desses relativos constrangimentos, a implementao de uma estratgia de cooperao internacional ocasiona diversos benefcios para o Brasil. Em um momento de afirmao como Estado emergente, pronto para assumir responsabilidades no sistema internacional, o Brasil demonstrou seu engajamento na soluo dos desafios encontrados para a promoo do desenvolvimento sustentvel. A comprovao da efetividade do eixo Sul-Sul nas relaes internacionais sustenta a defesa da atual multipolaridade do sistema e a perspectiva de que essa multiplicao de plos pode ser benigna para a comunidade internacional, fomentando a estabilidade, o multilateralismo e o desenvolvimento.

    Para a perspectiva das relaes bilaterais, essa poltica ocasiona uma aproximao com novos espaos geogrficos, incentivando o estabelecimento de novas parcerias estratgicas. A ascenso de novos espaos econmicos, pela cooperao para o desenvolvimento, propicia um incentivo para a retomada do crescimento econmico em um perodo de crise internacional, abrindo novos mercados para a expanso do comrcio exterior brasileiro e para a internacionalizao das empresas brasileiras.

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    O Estado e a sociedade brasileira no simplesmente realizam projetos de cooperao. Eles implementam estratgias estruturadas, de longo prazo, com grande efetividade. Essas iniciativas so tradicionais e, simultaneamente, so necessrias para a redefinio da insero internacional brasileira no contexto internacional moderno. A escassez de recursos e a relativa menor capacidade de potncia do Brasil no