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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE BIOLOGIA GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE Os modelos pedagógicos de ensino de ciências em dois programas educacionais baseados em STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics) Campinas 2017

GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE - Unicamp · a descrição desses modelos pedagógicos, a partir de nossa releitura dos mesmos. A busca por esses modelos presentes nos programas ACES e

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE BIOLOGIA

GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE

Os modelos pedagógicos de ensino de ciências em dois

programas educacionais baseados em STEM (Science,

Technology, Engineering and Mathematics)

Campinas

2017

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GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE

Os modelos pedagógicos de ensino de ciências em dois programas

educacionais baseados em STEM (Science, Technology, Engineering

and Mathematics)

Dissertação apresentada ao Instituto de

Biologia da Universidade Estadual de Campinas

como parte dos requisitos exigidos para a

obtenção do Título de Mestre em Genética e

Biologia Molecular, na Área de Genética Animal

e Evolução.

Orientadora: Profa. Dra. Vera Nisaka Solferini

Campinas

2017

ESTE ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA [TESE / DISSERTAÇÃO] DEFENDIDA PELO ALUNO GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. VERA NISAKA SOLFERINI

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Campinas, 12 de dezembro de 2017.

COMISSÃO EXAMINADORA Profa. Dra. Vera Nisaka Solferini (Orientadora)

Profa. Dra. Alessandra Aparecida Viveiro

Prof. Dr. Eduardo Galembeck

Os membros da Comissão Examinadora acima assinaram a Ata de Defesa, que se encontra no processo de vida acadêmica do aluno

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Agradecimentos Agradeço a todos os professores e professoras que contribuíram diretamente com

minha formação acadêmica. Em especial ao Prof. Dr. Marcelo Bispo, que foi e ainda é minha

referência de um bom cientista. E ao Prof. Dr. Jorge Megid, com o qual posso dizer que me

tornei um aprendiz dos estudos pedagógicos e busco, a cada dia, tornar-me um educador

melhor.

Agradeço especialmente à Dra. Rebeca Fernandes, por toda a atenção e apoio

dados. Além de um referencial teórico, definitivamente ela fez toda a diferença em minha

pesquisa e eu sou eternamente grato por isso.

Agradeço à Profa. Dra. Vera Solferini, minha orientadora, por ter acreditado em

mim, ter me acompanhado durante toda a pesquisa e pela boa vontade em criar os próprios

meios para que ela existisse. E ao Prof. Dr. Rodolfo Azevedo pela credibilidade dada a mim,

por toda a atenção dada nos últimos 3 anos e pela aprendizagem que nós tivemos trabalhando

juntos.

Agradeço aos amigos do laboratório, Célia, Fernanda, Felipe, Jair, Natália, Beatriz

e João por todos os momentos juntos e pela nossa amizade.

Agradeço carinhosamente a todos os amigos do programa MESA: James, Phyllis,

Lucy, Kuulani e Abel, por terem sido tão acolhedores e terem feito minha vida muito melhor

desde que os conheci.

Agradeço aos colegas do programa ACES, Ana, Caue, Cora, Elis, Gabriel e Marina;

aos professores e professoras. Em especial à Ariane, por ter se mostrado tão companheira e ter

me auxiliado tanto a ir mais longe.

Agradeço aos meus pais e à minha irmã, à minha namorada Beatriz. Nossa vida

juntos dispensa qualquer razão para tal menção.

Agradeço à Ângela, a quem, coincidentemente ou não, tenho seguido a mesma

carreira e isso é motivo de orgulho para mim.

Agradeço também a todos os professores e professoras dos programas MESA e

ACES, a quem eu dedico esse trabalho e dou meu reconhecimento de serem, cada um deles,

especiais.

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Resumo

Os diversos programas educacionais de intervenção escolar possuem bases ideológicas e

objetivos muito distintos entre si. Contudo, recentemente, alguns programas de enriquecimento

do currículo de ciências têm tomado como base um movimento chamado de STEM (Science,

Technology, Engineering and Mathematics) education, o que vem sendo uma grande tendência

mundial. O STEM education teve sua origem nos Estados Unidos na década de 1990 e trabalha

com a ênfase nas quatro áreas do acrônimo, interferindo no currículo de ciências com uma

abordagem específica. Essa pesquisa busca avaliar dois desses programas educacionais

baseados em STEM, um brasileiro (programa ACES) e outro estadunidense (programa MESA),

e compreender de que forma podemos caracterizá-los em relação aos modelos pedagógicos de

ensino de ciências. Trabalhamos com seis modelos: Tradicional; Redescoberta; Construtivista;

Tecnicista; Sociocultural e Ciência, Tecnologia e Sociedade, apoiando-nos em revisões sobre

esses modelos. Partimos de um estudo de caso para fazer essa caracterização e também

estabelecer comparações entre os dois programas. Uma vez que ambos os programas trabalham

com o conceito de STEM education, realizamos também uma revisão da literatura para

compreender o movimento STEM education e como ele está relacionado aos modelos

pedagógicos de ensino de ciências que trabalhamos. Nossos resultados indicam que os

programas STEM estudados apresentam um hibridismo de modelos pedagógicos, o que indica

a necessidade de uma orientação metodológica mais bem definida que para o desenvolvimento

de dois elementos: a formação docente para o ensino de ciências e a construção de uma visão

abrangente sobre a natureza da ciência e seus aspectos sociais.

Palavras-chave

STEM education – Modelos pedagógicos de ensino de ciências – Programas educacionais –

Ensino de ciências

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Abstract

School intervention educational programs have very different ideological bases and objectives.

However, several science curriculum enrichment programs have recently emerged based on a

movement called STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics). More than that,

it has become a major worldwide trend. STEM education is a movement originated in the

United States in the 1990s and focuses on the four areas of the acronym, interfering with the

science curriculum with a specific approach. This research seeks to evaluate two of these

educational programs based on STEM, one Brazilian (ACES program) and another American

(MESA program), and understand how we can characterize them in according to the

pedagogical models of science teaching. We work with six models: Traditional; Rediscovery;

Constructivism; Technicist; Sociocultural; and Science, Technology and Society, from the

revision work carried out on these models. This characterization is done by means of a case

study, and we establish comparisons between the two programs. Once both programs work with

the idea of STEM education, through a review of the literature, we also carry out an

understanding of the STEM education movement and how it might be related to the pedagogical

models of science teaching on which we are based. Our results indicate that the programs have

a hybrid of pedagogical models coexisting, which reveals the need for a clearer methodological

orientation that allows the development of two main elements for its participants: teacher

education for science teaching and construction of a comprehensive view of the nature of

science and its social aspects.

Key words:

STEM education – Science Teaching Pedagogical Models – Educational Programs – Science

Education

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SUMÁRIO Contextualização ................................................................................................................ 10

Introdução ............................................................................................................................ 11

Programa MESA ........................................................................................................................... 11

Programa ACES ............................................................................................................................ 15

Capítulo 1: Modelos pedagógicos de Ensino de Ciências .................................... 17

1.1. Modelo Tradicional ..................................................................................................... 18

1.2. Redescoberta ............................................................................................................... 19

1.3. Tecnicista ....................................................................................................................... 20

1.4. Construtivista ............................................................................................................... 22

1.5. Sociocultural ................................................................................................................. 23

1.6. Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) ............................................................... 24

Capítulo 2: Metodologia .................................................................................................. 28

2.1. Tipo de pesquisa e questões de estudo .................................................................. 28

2.2. Objetivos ............................................................................................................................ 29

2.3. Procedimentos metodológicos .................................................................................. 30

2.3.1. Fontes de dados ...................................................................................................... 31

2.3.2. Análise de dados ..................................................................................................... 36

Capítulo 3: STEM education – Um panorama e sua relação com a educação

Brasileira ............................................................................................................................... 38

3.1. Introdução – O movimento STEM............................................................................. 38

3.2. Definição simplificada ................................................................................................... 38

3.3. Três fatores que explicam a corrida por STEM education nos EUA e as políticas em torno do movimento. ....................................................................................... 41

3.4. Movimento para além dos Estados Unidos: cenário internacional............... 44

3.5. Cenário Brasileiro ........................................................................................................... 46

3.6. Dentro da pesquisa em Ensino de Ciências, qual a caracterização mais precisa que se pode fazer de STEM education?............................................................... 51

3.7. Como o movimento STEM education pode contribuir com o desenvolvimento do ensino de ciências no Brasil? ........................................................ 57

3.8. Considerações .................................................................................................................. 60

Capítulo 4: Análise dos programas educacionais MESA e ACES ....................... 62

4.1. Objetivos e missão institucional do programa MESA ........................................ 62

4.2. Relatórios de atividades dos participantes do programa ACES ..................... 72

4.3. Observação das práticas .............................................................................................. 83

4.4. Questionários ................................................................................................................... 90

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4.4.1. Resultados e discussão adicionais referentes ao questionário ........... 106

4.5. Discussão e conclusões .............................................................................................. 108

5. Referências ............................................................................................................ 114

6. Anexos ..................................................................................................................... 123

6.1. Questionário aplicado no programa MESA .......................................................... 123

6.2. Questionário aplicado no programa ACES ........................................................... 128

6.3. Quadro de atividades do programa MESA ........................................................... 133

6.4. Ética em pesquisa ......................................................................................................... 134

6.5. Declaração ....................................................................................................................... 135

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Contextualização

A ideia dessa pesquisa parte da participação de seu autor como monitor no

programa educacional Aprendizagem e Ciências na Escola – ACES, descrito a seguir na

introdução. O programa atua em algumas escolas da rede pública de Campinas – SP, Brasil,

desenvolvendo e implementando atividades de ciências e conta com monitores, que são alunos

de licenciatura da Unicamp, para a realização das atividades nas escolas. O programa ACES

dispôs de uma parceria com o programa norte-americano Mathematics, Engineering and

Science Achievement – MESA, o qual é descrito a seguir.

Essa participação no programa ACES despertou diversos questionamentos que

motivaram este trabalho. Assim, esta pesquisa partiu da questão: a qual tipo de programa

educacional pertencem os programas ACES e MESA, no sentido de compreender como os

objetivos e ações dos programas se traduziam em termos de intervenção escolar? Mostrou-se

relevante compreender a maneira pela qual os programas poderiam ser classificados,

considerando os diferentes modelos pedagógicos e as propostas educacionais existentes, para

então dar significado aos resultados que ambos apresentavam.

Para começar a busca, foi preciso primeiro compreender os modelos pedagógicos

descritos para o Ensino de Ciências. Nesse processo, essa pesquisa se baseia essencialmente no

trabalho de Rebeca Fernandes (citada como Fernandes, 2015). Partimos da revisão da literatura

e descrição dos modelos pedagógicos de ensino de ciências realizadas pela autora para então

olhar para os programas educacionais que são objeto de estudo dessa pesquisa. A seção 2.3 traz

a descrição desses modelos pedagógicos, a partir de nossa releitura dos mesmos.

A busca por esses modelos presentes nos programas ACES e MESA leva,

inevitavelmente, ao estudo de uma tendência marcante nesses programas: o STEM (Science,

Technology, Engineering and Mathematics) education. Dessa forma, o capítulo 1 apresenta os

resultados de nosso estudo sobre essa tendência, além de algumas questões sobre a relação da

tendência com os modelos pedagógicos de ensino de ciências.

Por fim, o capítulo 2 traz os principais resultados e análises realizadas a partir desse

movimento de 3 etapas: compreender os modelos pedagógicos, compreender o STEM

education e observar os programas educacionais que são objetos de pesquisa.

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Introdução Programa MESA

Mathematics, Engineering and Science Achievement - MESA é uma organização

que foi criada em 1970 em Oakland, na Califórnia, Estados Unidos, através de um pequeno

estudo-intervenção em uma escola. A motivação inicial parte de um grupo de professores da

Universidade da Califórnia – Berkeley que estavam interessados em compreender as razões (e

intervir nelas) pelas quais havia poucas matrículas de minorias na faculdade de engenharia da

universidade, e criaram um programa de intervenção em uma escola de ensino médio e técnico

(pre-college) (MESA, 2017). Por minorias, a organização compreendia os seguintes grupos:

Negros (African American), latinos (Latino American) e indígenas (Indian American).

Atualmente, inclui-se também o grupo de mulheres e imigrantes asiáticos e africanos.

As barreiras pelas quais esses estudantes não seguiam carreiras de engenharia

infelizmente são basicamente as mesmas de hoje: baixa motivação, baixa autoestima,

segregação social, segregação racial, desigualdade de acesso, desigualdade na permanência na

escola, entre outros fatores como violência, situação de risco, pobreza, cultura familiar, etc. Na

época da criação do programa, a intervenção se dava no sentido de, através de atividades

escolares e com foco nessas minorias, aumentar as expectativas educacionais dos alunos,

desenvolver competências acadêmicas e a autoconfiança deles. O objetivo era fazer com que

mais alunos das minorias chegassem até a universidade.

Alguns anos depois, a intervenção foi ampliada para um programa que incluía

atividades de retenção acadêmica na universidade, baseada no fato de que depois das barreiras

de acesso ao ensino superior, havia o problema da retenção na universidade. Em função dos

resultados e da atuação dos idealizadores e apoiadores, o programa se expande rapidamente e

em menos de uma década assume a forma de uma organização. O número de apoiadores cresce,

a organização ganha patrocinadores como Hewlett-Packard e Chevron, entre outras grandes

indústrias e organizações filantrópicas (MESA, 2017). Além disso, há desde então o

financiamento do Estado no sistema dollar-for-dollar, sistema comum nos EUA, no qual o

Estado destina um dólar para cada outro adquirido do setor privado. O orçamento da

organização nessa época já ultrapassava a casa de um milhão de dólares. Com isso, a atuação é

expandida para todo estado da Califórnia, com os programas de intervenção no ensino básico

(pre-college e K-12) e superior (college/university).

Apenas o resumo da primeira década do programa já nos permite levantar questões

interessantes sobre modelos de atuação nos problemas sociais e educacionais. Desde o início, a

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organização trabalha com uma estrutura que se perpetuou nas outras décadas e se expandiu

nacionalmente. Essa estrutura envolve a extensão universitária, parte do financiamento oriundo

de grandes corporações e parte do poder público. Além disso, trata-se de um programa de

intervenção em uma estrutura de sociedade rígida, o qual busca através do acesso à educação,

promover equidade e justiça social. Mas isso é feito não diretamente a partir do aparato estatal,

do sistema educacional ou de uma política pública, e sim da atuação da sociedade civil e do

financiamento híbrido (Estado-empresa).

Após sua consolidação na primeira década, o programa MESA continuou operando

de maneira progressiva no sentido de ampliar os programas oferecidos, aumentar o número de

alunos atendidos e centros de atuação, obter mais recursos e ganhar visibilidade e suporte

governamental. Hoje, quase cinco décadas após o início, o cenário que a organização apresenta

é muito interessante de ser estudado. A seguir, apresentamos um quadro geral e atual da

organização.

Em termos de estrutura, o MESA existe com unidades em 11 estados dos Estados

Unidos (Califórnia, Arizona, Utah, Colorado, Havaí, Washington, Maryland, Novo México,

Oregon, Illinois e Pensilvânia) e uma administração nacional (MESA USA). Cada unidade é

independente em termos de recursos e administração, mas possuem programas muito similares.

As unidades em outros estados além da Califórnia foram sendo criados a partir da década de

1980 e concentram-se principalmente na região oeste dos EUA. Cada unidade de cada estado

possui centros (MESA center) distribuídos estrategicamente (ou em função dos recursos

adquiridos) nas cidades do estado. Em todas as unidades, há um diretor (a) principal e diretores

de programas que são contratados pelas universidades em que o programa é sediado. Nos

centros, há diretores e coordenadores contratados diretamente com os recursos dos programas,

recursos esses oriundos de doações, empresas e governos estaduais e municipais. A direção

nacional e os diretores estaduais atuam politicamente no sentido de conquistar cada vez mais

espaço entre os legisladores e suporte de grandes corporações.

Um dado relevante em relação ao quadro de funcionários, diretores e coordenadores

é que ele é composto em sua massiva maioria por representantes das minorias que o programa

atende. Ou seja, em regiões nas quais a população indígena é maior, os diretores e

coordenadores são também de etnia indígena e são escolhidos por serem membros ativos da

comunidade ou que sejam líderes locais. Além disso é bastante comum que os atuais

coordenadores e diretores dos centros locais tenham sido um dia alunos do próprio programa.

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Essa estrutura atende diretamente cerca de 50 mil estudantes anualmente em todo

os EUA, lidando com milhares de professores e escolas de ensino básico (Elementary, Middle

e High Schools), Community College, além de universidades e escolas de ensino superior. Cerca

de 85% desses estudantes pertencem a grupos historicamente marginalizados ou excluídos das

universidades e de carreiras em STEM. É marcante na organização a preocupação em atender

e destinar as ações exclusivamente para esse público-alvo.

Cada estado possui um orçamento distinto, uma vez que buscam

independentemente pelos recursos, mas a título de ilustração, o estado de Washington, possui

um orçamento anual de pouco mais de 10 milhões de dólares somando todas as fontes e

representa uma das maiores unidades do MESA.

Em termos de atividades e atuação direta nas instituições de ensino, podemos

elencar as seguintes ações:

Enriquecimento do currículo de ciências do Ensino Básico com atividades

baseadas em projetos e desafios de computação e ciências

Sessões de envolvimento de familiares dos alunos

Cursos de formação continuada para professores do Ensino Básico

Oferta de bolsas para professores e alunos

Visitas às empresas locais, museus, parques e atividades de educação

ambiental

Sessões de orientação vocacional, profissional e preparação para exames

nacionais de admissão em universidades, além de sessões de incentivo à busca

do ensino superior

Feiras de Ciências, competições estaduais e nacional para alunos

Há também uma série de outras atividades que não foram mencionadas, mas são

apresentadas no anexo 8.3. Todos esses programas são focados em STEM. Isso quer dizer que

as bolsas para estudantes universitários, por exemplo, são para estudantes matriculados nas

áreas STEM. E que a atuação com os professores é restrita aqueles das áreas STEM. A via de

intervenção para promover justiça social se dá pelo incentivo às carreiras STEM. Essa

característica também nos convida a colocar em debate o que significa justiça social e qual o

papel do STEM education nesse processo. É importante notar que a organização se estabelece

muito antes do próprio surgimento do movimento STEM education, como é discutido em

detalhes no capítulo 1. Além disso, esse debate precisa ser realizado sob a perspectiva do

movimento STEM education e do contexto estadunidense de sociedade.

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Segundo os diretores do programa, pode-se apontar como resultados qualitativos

gerais do programa:

Aumento do sucesso acadêmico: estudantes do MESA atingem níveis de

escolaridade mais elevados, quando comparados com a mesma população que

não participa do programa;

Aumento do interesse por STEM: estudantes aumentam o interesse por

ciência e engenharia. Isso gera mais estudantes interessados em seguir

carreiras STEM;

Identidade STEM: O programa MESA atua na desconstrução da ideia de que

ciência e engenharia não é para mulheres, negros ou outros grupos. Os

estudantes passam a se reconhecerem nessas profissões e a batalhar por essas

carreiras com mais segurança;

Aumento da autoconfiança e autoestima: por causa da orientação e suporte

que o programa oferece não só para os estudantes, mas também para os

professores e familiares, estudantes apresentam maior autoconfiança e

aumentam suas chances de sucesso profissional. Isso tem impacto não

somente na trajetória acadêmica, mas também na vida pessoal dos estudantes

e de suas famílias.

Aumento de oportunidades e opções: Estudantes que anteriormente não

possuíam acesso às carreiras STEM devido à desigualdade e à falta de

oportunidades, através do MESA possuem as mesmas chances e opções que

estudantes de escolas e famílias bem estruturadas.

Quanto aos resultados quantitativos como número de estudantes que seguem

efetivamente as carreiras STEM, a renda e situação social dos alunos egressos do programa, ou

até mesmo as mudanças demográficas absolutas nos locais onde o programa atua, a organização

não dispõe de uma sistematização e publicação desses dados, seja nacionalmente ou em cada

unidade estadual. Existem alguns estudos independentes e localizados que permitem delinear

os resultados do impacto do programa de forma qualitativa. De toda forma, hoje a organização

é reconhecida nacionalmente e recebeu inúmeros prêmios de reconhecimento e excelência de

indústrias, entidades e de sucessivas recomendações vindas da Casa Branca e de legisladores.

Algumas unidades estaduais conseguem manter um relacionamento próximo com os

governadores e senadores e existe uma demanda partindo de diversas universidades e estados

não atendidos pelo programa, solicitando que sejam estabelecidas novas unidades.

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Programa ACES

Aprendizagem e Ciências na Escola – ACES é um programa que foi criado a partir

de um edital da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, no

âmbito do programa Observatório da Educação – OBEDUC. Ele foi lançado em 2008 e foi

estabelecido pelo Governo Federal através do decreto n° 5.803, de 8 de junho de 2006

(BRASIL, 2006). Basicamente, o programa OBEDUC consiste na associação de pesquisa

acadêmica e ensino escolar para estabelecer melhorias no sistema de ensino público. O

programa é realizado através de parcerias entre Instituições de Ensino Superior e escolas de

Educação Básica. Até o ano de 2014, segundo dados do INEP, 483 programas de pós-graduação

já participaram do OBEDUC e 150 estavam em andamento, com um orçamento total de R$20

milhões (BRASIL, 2013). Entretanto, o programa não foi renovado após 2014 e está extinto

atualmente. Com isso, o programa ACES encerrou suas atividades nas escolas via programa

OBEDUC, em meados de 2017 e não tem perspectivas de ser reativado.

O ACES é, portanto, um dos projetos OBEDUC que foi aprovado em junho de

2014. É fruto de uma parceria entre a Unicamp e o MESA, através dos gestores do MESA e o

autor do projeto, Professor Dr. Rodolfo Jardim Azevedo, na Unicamp. Nessa parceria, o diretor

executivo do MESA, James B. Dorsey e o diretor do programa na Unicamp estabeleceram que

o projeto sediado na Unicamp usaria como molde os princípios de funcionamento do MESA,

para aplicar nas escolas públicas de Campinas, em um projeto piloto, atividades baseadas no

currículo STEM e voltado para as disciplinas de ciências.

Apesar de ter sido inspirado no programa MESA, o ACES foi se modelando com

muitas particularidades e se configurou como um programa independente do MESA. O seu

objetivo principal por exemplo era estimular os alunos a se engajarem nas disciplinas de

ciências e tornar as aulas mais interessantes e ricas para esses alunos. A promoção da justiça

social entra como um aspecto indireto do programa, principalmente porque atua com a classe

desfavorecida, nas escolas públicas.

Para caracterizarmos o programa, pode-se observar que ele teve dois momentos

distintos em termos de fases operacionais. A primeira delas ocorreu logo após a aprovação do

programa, consistindo no planejamento e execução de atividades piloto nas escolas envolvidas,

bem como recrutamento de monitores dos cursos de graduação da Unicamp para atuarem no

programa. Nessa fase, houve uma tentativa de traduzir o material utilizado no EUA pelo MESA

e também de propor atividades escolares similares aos utilizados pelo MESA, ou seja,

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enriquecimento do currículo de ciências do Ensino Básico com atividades baseadas em projetos.

Entretanto, essa investida não trouxe grandes avanços no estabelecimento de um corpo de

atividades e, somado à ausência de direcionamento e planejamento estratégico anual, foi

necessário a reformulação e reestruturação do programa, no que pode ser considerado como sua

segunda fase.

A segunda fase, de remodelamento, pode ser caracterizada como uma sequência de

reuniões de planejamento para reformulação do programa e elaboração de material didático.

Essa fase ocorreu nos meses finais de 2015, para que as atividades ocorressem no ano letivo de

2016. A partir de então, o programa foi reconfigurado para trabalhar com 4 módulos de ciências

previamente preparados e distribuídos em um ano letivo, com a realização de uma feira de

ciências ao final de cada módulo. Ao início de cada módulo, os professores e monitores

participavam de uma oficina sobre o material e as atividades previstas para o bimestre. A feira

de ciências consistia na apresentação dos projetos realizados pelos alunos durante o andamento

dos módulos. Em relação aos resultados do programa, impacto nas escolas e nas carreiras dos

docentes envolvidos, estabeleceremos uma análise aprofundada no capítulo 5.

O programa ACES atuou de 2014 a 2016 em cinco escolas públicas de Campinas.

O orçamento utilizado pelo programa durante esse tempo foi de aproximadamente 120 mil reais,

proveniente integralmente do financiamento CAPES/OBEDUC, além de 6 bolsas de graduação,

1 de mestrado, 1 de doutorado, e 8 para professor da educação básica. Em 2015 e em 2016, o

programa atendeu cerca de 500 alunos ao ano, do 5° ao 9° ano do Ensino Fundamental. O

programa atuou nas seguintes escolas E.M.E.F. Castelo Branco, E.E. Eunice Virgínia Ramos

Navero, E.E. Luiz Gonzaga da Costa, E.E. Professor Luis Galhardo, E.E. Julio de Mesquita.

Essas escolas foram selecionadas a partir de indicação de professores interessados em participar

do programa. Tanto os professores da rede pública, quanto os monitores alunos de graduação

receberam uma bolsa mensal durante a participação no programa. É importante mencionar que

o programa sofreu um corte de orçamento de quase 50%, na mesma época em que a CAPES e

CNPq realizaram diversos cortes orçamentários no 1° semestre de 2016. Com isso, a proposta

inicial de ampliar o programa para 1000 alunos anualmente não pôde ser efetivada.

* * *

A seguir, serão apresentados os modelos pedagógicos de ensino de ciências os quais

nos servem de base para a análise dos dois programas apresentados.

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Capítulo 1: Modelos pedagógicos de Ensino de Ciências

O termo modelo pedagógico possui vários domínios nos estudos pedagógicos, e

diferentes correntes fazem diferentes usos da ideia por trás do termo, como afirmam Parra

(1983) e Fernandes e Megid Neto (2012). De maneira ampla, um modelo pedagógico pode ser

entendido aqui como um recorte teórico e filosófico, bem como metodológico, que sustenta

determinada prática escolar. Trata-se de diferentes concepções e proposições que estabelecem

um modo de operar relativamente estável nas ações que envolvem a educação. Luckesi afirma

que “a pedagogia se delineia a partir de uma posição filosófica definida” (1994, p. 53). Desse

modo, é possível reconhecer as posições determinantes da prática pedagógica e organizá-las de

modo comparativo em modelos pedagógicos.

Uma tendência em determinada direção leva à criação de um campo de ideias que

pode ser representado de maneira simplificada por um modelo. Nesse sentido, o que permite

essa sistematização em modelos pedagógicos é justamente a presença de determinadas

tendências pedagógicas que culminam na consolidação de um ou outro modelo, uma vez que

tendência pode ser entendida como uma “força que imprime determinado movimento ou

orientação” (FERNANDES, 2015, p. 7). Apesar da sistematização ser uma forma eficaz de se

observar os vários modelos, é importante considerá-los como referências gerais, e não como

arquétipos totalmente rígidos, pois nem sempre os limites de um modelo para outro são

perfeitamente delineáveis.

É preciso ressaltar também que a própria sistematização em si é divergente entre os

diferentes teóricos da educação e um extenso número de propostas pode ser encontrado como

referenciais teóricos (PARRA, 1983; SAVIANI, 1987). Baseamo-nos principalmente no

trabalho de Fernandes (2015), que consiste em uma relevante e mais recente pesquisa sobre as

tendências e modelos pedagógicos para os anos iniciais. A autora parte do trabalho de Fahl

(2003), que já havia caracterizado os modelos pedagógicos a partir de uma revisão da literatura,

e acrescenta algumas releituras. Fahl (2003) e Fernandes (2015) constroem a partir de uma

revisão das principais tendências na educação brasileira ao longo da história, e também a partir

de autores importantes no campo da educação, uma espécie de síntese dessas tendências na

forma de modelos pedagógicos, o que nos constitui um referencial teórico bastante adequado

para os nossos interesses. Acrescentamos que é possível trabalhar com os modelos observando

o ensino em geral, ou, como é a ênfase dada nessa pesquisa, observando o ensino de ciências.

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A seguir, será apresentada uma síntese de seis modelos pedagógicos conforme a

sistematização apresentada por Fernandes (2015): Modelo tradicional, Modelo da

Redescoberta, Modelo Tecnicista, Modelo Construtivista, Modelo Sociocultural e Modelo

Ciência, Tecnologia e Sociedade. A autora faz uma importante consideração sobre essa

categorização em modelos, a qual transcrevemos antes de partirmos propriamente para a

descrição dos modelos:

Reiteramos que as teorizações das abordagens e tendências apresentadas pelos

autores estudados caracterizam as teorizações difundidas como inovações no

contexto escolar. Ressaltamos que na prática escolar cotidiana esses modelos

adquirem diversas caracterizações, podendo, até mesmo, muito

frequentemente, coexistirem e se superporem ao menos parcialmente. Boa

parte dos professores costumam, inclusive, misturar princípios e métodos de

dois ou mais modelos em suas práticas cotidianas, criando de certo modo

modelos híbridos. Não há, pois, em boa parte das práticas escolares em

ciências, ou até mesmo na maior parte delas, uma homogeneidade teórico-

metodológica na realização de uma ou mais práticas sequenciais. Mais comum

é o professor utilizar (ou misturar) diferentes modelos pedagógicos na sua lida

diária profissional (FERNANDES, 2015, p. 34).

1.1. Modelo Tradicional

Esse modelo pedagógico é referência para outros modelos, no sentido de que sua

recusa serve como ponto de partida para eles. Apesar de ter predominado no campo teórico até

a década de 1950 (FAHL, 2003), pode-se dizer que é o modelo cujas características ainda

vigoram nas práticas escolares atuais (FERNANDES; MEGID NETO, 2012). É pautado em

uma estrutura hierárquica autoritária na escola, na qual o aluno passivo recebe o conhecimento

transmitido pelo professor, através do cumprimento de tarefas e memorização de conteúdos

(FREIRE, 1996). Para Mizukami (1986), o modelo considera que o aluno chega à escola sem

conhecimento, portanto, depende dela e centralmente do professor para aprender; o docente tem

uma relação vertical com o aluno e o aprendizado depende apenas do sucesso do docente,

independentemente do interesse e vontade do aluno e cabe ao aluno apenas o bom

comportamento (MIZUKAMI, 1986, p. 8). O professor é aquele sujeito que acumula

conhecimentos e por isso “sabe mais” que os demais, é detentor da verdade e a personificação

da ciência (LIBÂNEO, 2009). Esse pensamento fundamenta algumas tentativas de atribuição

do fracasso da escola como resultado exclusivo da má qualidade docente.

No modelo pedagógico tradicional, os conhecimentos prévios do aluno não são

levados em conta (FAHL, 2003). É nesse modelo que encontramos o que Paulo Freire chama

de educação bancária, aquela na qual “em lugar de comunicar-se, o educador faz ‘comunicados’

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e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e

repetem” (FREIRE, 1987, p.33).

Em relação às concepções sobre ciência, esse modelo reforça uma visão neutra e

positivista dela. Ela é institucionalizada, ao passo que os discursos científicos são legitimados

e impostos como verdades absolutas por meio do poder social que ela detém, e as características

positivas da ciência e tecnologia são reforçadas, ignorando os aspectos positivos (FAHL, 2003).

Além disso o conhecimento científico é algo consolidado e descontextualizado na história de

sua construção (AMARAL, 1997). O conhecimento é encarado como algo cumulativo e a

perspectiva empirista da ciência se faz presente, pois desde que esteja de posse dos instrumentos

adequados, o ser humano deixa de ser uma tábula rasa e é capaz de compreender e dominar o

mundo natural através da experimentação (MIZUKAMI, 1986). A experimentação cumpre o

papel de verificar uma lei ou a teoria, pois ela aplica o conhecimento teórico apresentado pelo

professor, de modo que é sempre secundária à teoria. A metodologia científica deve ser aplicada

para se acessar as generalizações cientificamente válidas e é um método infalível. A variação e

o erro representam a má aplicação do método (AMARAL, 1997; BORGES, 2002).

1.2. Redescoberta

Esse modelo surge na década de 1950 a partir de propostas que visavam substituir

o modelo tradicional de ensino e atender ao novo contexto do pós-guerra, que demandava pelo

desenvolvimento tecnológico e pelas necessidades do consumo (FERNANDES, 2015). A

substituição do modelo tradicional seria feita com base na incorporação, nos currículos das

disciplinas de Física, Biologia e Química, “do que havia de mais moderno da ciência”; e

também a substituição de métodos expositivos pelos métodos ativos, com atividades práticas e

aulas baseadas em projetos (KRASILCHIK, 1987, p. 7). Essas propostas eram compostas por

projetos de ensino caracterizados pela “produção de textos, material experimental e treinamento

para professores, vinculados a uma valorização do conteúdo a ser ensinado” (FAHL, 2003, p.

37). O foco no treinamento do professor para executar roteiros pré-definidos permitiria que ele

otimizasse o aprendizado do aluno. É característica do modelo a criação de projetos de ensino

que

(...) tentavam suprir as deficiências de formação e o desconhecimento dos

docentes com relação às novas técnicas de ensino e aos novos conhecimentos

em Ciências, por meio do próprio material didático e com o auxílio dos guias

para o professor. (FERNANDES, 2015, p. 39)

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De modo semelhante ao modelo tradicional, o empirismo também é central, uma

vez que é focado no laboratório e experiências científicas para se estabelecer o processo de

ensino-aprendizagem e acessar “os conhecimentos prontos, sistematizados e tidos como

definitivos” (FERNANDES; MEGID NETO, 2012, p. 644). A experimentação é importante

nesse modelo, pois, a partir de princípios behavioristas, o aprendizado estaria na

experimentação e postura aprendidas pelo aluno e ele deveria ser condicionado segundo

determinados comportamentos, nos quais o aluno vivencia o trabalho do cientista e o método

científico (AMARAL, 1997). O aluno imita o trabalho do cientista nesse modelo, e esse é um

ponto criticado nessa visão comportamentalista, pois como aponta Borges (2002, p. 15), “As

atividades práticas e os experimentos científicos são bem distintos, com objetivos bastante

diferentes”.

De acordo com Fernandes (2015), a concepção de ciência ainda enfatiza uma

atividade neutra, mesmo tendo passado por uma renovação e rompimento com o modelo

tradicional:

(...) podemos dizer que o modelo da redescoberta marca, além do início da

renovação no ensino de ciências, a transição de uma concepção de ciência

como atividade neutra, que enfatizava o produto, para uma concepção de

ciência, ainda neutra e como verdade científica, porém, enfatizando-se o

processo interno da ciência, ou seja, o método científico. (...) O modelo da

redescoberta caracteriza-se também pela transição da concepção de ensino de

ciências enquanto transmissão de informações para uma concepção de ensino

de ciências enquanto vivência do método científico, sem prescindir da

incorporação das informações científicas por parte do aluno. (FERNANDES,

2015, p. 115)

Para Santos e Mortimer (2002, p. 2), a crença no cientificismo, na supervalorização

da ciência e a crença no mito da neutralidade científica repercutiram no currículo do ensino de

ciências dessa forma: no intuito de transformar o aluno em um “(...) minicientista por meio da

vivência do método científico”. Além disso, o modelo é criticado porque, apesar de propor a

redescoberta do conhecimento científico através da experimentação, o experimento é planejado

pelo professor e até mesmo executado por ele, não pelos alunos, e os conhecimentos prévios

dos alunos não fazem parte da experimentação (AMARAL, 1997).

1.3. Tecnicista

Esse modelo pedagógico de ensino de ciências possui muitas características do que

é a tendência liberal tecnicista proposta por Libâneo (2009). Conforme definem Fernandes e

Megid Neto (2012, p. 643), “busca-se integrar o aluno no sistema social global e produzir

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indivíduos competentes para o mercado de trabalho. A ênfase acentuada no planejamento de

ensino e o uso de recursos da tecnologia educacional são características desse modelo”.

Fernandes (2015) aponta as seguintes características do modelo:

São características do modelo tecnicista no ensino de Ciências a ênfase

acentuada no planejamento de ensino e a ampla gama de recursos da

tecnologia educacional. O ensino é um processo de condicionamento através

do reforço das respostas desejáveis e a motivação é externa, baseada em

estímulos (reforço). A metodologia é baseada na tecnologia educacional,

através principalmente da instrução programada, dos métodos

individualizados de ensino e do estudo dirigido. (FERNANDES, 2015, pp.

118-119)

Pode-se dizer que surge como modelo no contexto da ditadura militar no Brasil, na

década de 1970, a partir de vários acordos de políticas públicas entre o Brasil e os Estados

Unidos (FAHL, 2003), embora as tendências que influenciam esse modelo venham do período

pós-guerra, na década de 1950. As transformações provocadas pelo sistema de produção e a

crescente influência exercida pelos Estados Unidos em países da América Latina refletiram

nesse modelo. Na visão de alguns autores, o transplante de currículos e importação, nos países

provincianos, de ideias produzidas nas metrópoles culturais e econômicas, “é uma forma de

manutenção das relações de poder existentes” (SANDER, 1985 e HOLMES, 1977 apud

KRASILCHIK, 1992, p.14). É um contexto no qual a ciência brasileira começa a receber

políticas científicas e tecnológicas e a ser institucionalizada, como analisa Dias (2012), e a

pesquisa científica é amparada por instituições como a Coordenação de Aperfeiçoamento

Pessoal de Nível Superior – CAPES e Conselho Nacional de Pesquisas – CNPq, ambos criados

em 1951. Dentre os objetivos da CAPES, estava o fomento à formação de “pessoal

especializado em quantidades suficientes para atender às necessidades dos empreendimentos

públicos e privados que visam ao desenvolvimento do país. ” (CAPES, 2008). Há também nesse

contexto a criação de grandes Centros de Ciência vinculados às Universidades e que, dentre

outras atribuições, estavam ligados à produção de materiais para o ensino e articulação do

currículo escolar das disciplinas de ciências.

A educação é vista nesse modelo como um instrumento do desenvolvimento

econômico e a escola é articulada com o sistema produtivo fornecendo mão-de-obra técnica

(FAHL, 2003; LIBÂNEO, 2009). O professor, como em outros modelos, é um elo entre a

verdade científica e o aluno e aplica nele as instruções que permitem acessar o conhecimento.

A concepção de ciência aqui é a da neutralidade e objetividade, na qual o objeto de ensino deve

ser “apenas o que é redutível ao conhecimento observável e mensurável; os conteúdos decorrem

assim, da ciência objetiva, eliminando-se qualquer sinal de subjetividade” (LIBÂNEO, 2009,

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p. 29). Também conforme outros modelos, a abordagem comportamentalista é central no

modelo (MIZUKAMI, 1986).

1.4. Construtivista

Esse é o modelo mais abordado nas pesquisas sobre ensino de ciências nos anos

iniciais do ensino fundamental, predominando em mais da metade delas segundo Fahl (2003) e

Fernandes e Megid Neto (2012). É uma visão compartilhada por diferentes frentes da pesquisa

no ensino de ciências, como modelo a ser seguido (ASOKO et al. , 1999; KRASILCHIK, 1992;

BORGES, 2002). Ele surge na década de 1970 a partir de um contexto rico de “aproximação

da Pedagogia com a Epistemologia, a Sociologia, a Psicolinguística e a História da Ciência”

(FAHL, 2003, p. 46), e também após se constatar que o modelo da redescoberta não trouxe

avanços significativos em relação ao modelo tradicional.

Além das transformações na própria pedagogia, o caráter inquestionável da ciência

e seu papel como agente social e dominador é mais debatido dentro da sociologia e

epistemologia (LATOUR; WOOLGAR, 1997; BOURDIEU, 2004), e essa discussão é

incorporada no modelo (KRASILCHIK, 1987). O surgimento da perspectiva cognitivista na

pedagogia também é uma tendência pedagógica que norteia esse modelo; o modelo é, portanto,

apoiado em autores clássicos como Piaget, Ausubel e Vygotsky (FERNANDES, 2015). Há

algumas variações dentro desse modelo, não necessariamente confluentes, porém a construção

do conhecimento pelo aluno é central, assim como a mobilização das concepções prévias

(ASOKO et al. , 1999). Os conhecimentos prévios e culturais do aluno são usados na construção

do conhecimento, sendo alvo de confronto (não necessariamente litigioso) com o conhecimento

científico. Na perspectiva de Libâneo (2009), aproxima-se das tendências progressistas, e

também da abordagem cognitivista, conforme indica Mizukami (1986). Fernandes (2015) traz

no modelo a ideia de construção contínua do conhecimento:

No modelo construtivista, o conhecimento passa a ser considerado uma

construção contínua e a passagem de um estágio de desenvolvimento do

indivíduo para outro é sempre caracterizada por formação de novas estruturas

intelectuais e cognitivas que não existiam anteriormente no indivíduo.

(FERNANDES, 2015, p. 121)

Esse modelo trabalha com a concepção de ciência e a natureza do conhecimento

científico, articulando essas noções na construção do conhecimento. A ciência não é

apresentada como fonte da verdade. Além disso, o modelo concebe o conhecimento como algo

social e cultural, portanto, esses dois aspectos precisam ser levados em conta no processo de

aprendizagem, e a história do conhecimento científico é contextualizada (KRASILCHIK,

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1987). O aluno é visto como um sujeito ativo e crítico, por isso sua mobilização é fundamental,

enquanto o professor é um orientador do processo, não o detentor da verdade. O professor tem

um papel fundamental nessa visão, mas não como doutrinador de comportamentos, pois é

mediador da descoberta e não apenas um transmissor de conteúdo, usando da argumentação e

o preparo altamente consciente das aulas (BORGES, 2002). A argumentação do professor é

primordial, pois o aluno é o tempo todo desafiado a refletir, estruturar hipóteses e resolver

problemas; isso associado à forte interação social entre os alunos, o que incorpora a corrente

interacionista também para o modelo (FERNANDES, 2015).

1.5. Sociocultural

Esse modelo implica em uma abordagem cujos aspectos culturais, sociais e

políticos fazem parte da proposição de temas, seja no ensino de conteúdo em ciências naturais

ou humanas. A principal referência no modelo é Paulo Freire e tem sua origem na preocupação

com a democratização da cultura e acesso ao ensino (MIZUKAMI, 1986). O modelo

(...) parte sempre do que é inerente ao povo, sobretudo do que as pessoas

assimilaram como sujeitos, não lhes fornecendo, portanto, coisas prontas, mas

procurando trazer valores inerentes às camadas populares e criar condições

para que os indivíduos os assumam criticamente e não somente os consumam

(FERNANDES, 2015, p. 58).

A educação é vista, portanto, como um ato de emancipação e o ser humano é o

sujeito dessa transformação. O contexto social, econômico, cultural e político é levado em

conta, assim como a reflexão sobre esse contexto. Pode-se dizer que é um modelo que abarca

tendências como o humanismo e o neomarxismo, a partir da obra de Paulo Freire. É interessante

notar que a ênfase na modificação da realidade e no papel transformador da educação é uma

característica marcante no modelo, como se pode perceber a partir de Fernandes (2015).

Fernandes e Megid Neto (2012) trazem uma boa síntese sobre a concepção de educação, escola

e da relação professor-aluno no modelo sociocultural:

Para esse modelo, o homem cria a cultura na medida em que, integrando-se

nas condições de seu contexto de vida, reflete sobre ela e dá respostas aos

desafios que encontra. A escola é considerada um local onde é possível o

crescimento mútuo, do professor e dos alunos, num processo de

conscientização progressiva e de emancipação política, socioeconômica e

cultural. Em relação ao ensino-aprendizagem, o modelo sociocultural deve ser

forjado com as classes populares, numa luta incessante de recuperação da

humanidade do povo oprimido econômica e culturalmente. A educação deve

ser problematizadora, objetivando o desenvolvimento da consciência crítica e

da liberdade como meios de superar as contradições da educação bancária

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presente principalmente no modelo tradicional hegemônico. A relação

professor-aluno é horizontal, baseada no diálogo, em que educador e educando

se posicionam como sujeitos do ato do conhecimento, por isso não deve ser

imposta. A avaliação do processo consiste na auto avaliação e/ou avaliação

mútua e permanente da prática educativa por professores e alunos.

FERNANDES; MEGID NETO (2012, p. 645)

Em relação à concepção de ciência, ela não é isolada da cultura e história nesse

modelo. É parte do processo o questionamento do posicionamento da ciência enquanto

instituição de poder, e busca-se a conscientização acerca do desenvolvimento científico e

tecnológico. O componente social é relacionado ao componente científico, são indissociáveis

(MIZUKAMI, 1986). É um modelo pautado em tendências progressistas, na perspectiva de

Libâneo (2009), e se opõe às tendências liberalistas que embasam o modelo tecnicista, por

exemplo.

No contexto dos processos de ensino e aprendizagem numa abordagem

sociocultural, a relação professor-aluno é horizontal, não hierárquica, baseada na dialogicidade,

em que educador e educando se posicionam como sujeitos do ato do conhecimento; nada deve

ser imposto, de modo que o educador se torne educando e o educando, por sua vez, educador.

A avaliação do processo consiste na auto avaliação e/ou avaliação mútua e permanente da

prática educativa por professores e alunos.

1.6. Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)

O modelo CTS possui similitudes com o modelo sociocultural no sentido de que

está ligado a uma maior democratização do ensino e da ciência. Auler e Delizoicov (2006)

trazem um estreitamento muito grande entre esses dois modelos, dado que para eles isso é

fundamental no atual contexto da relação entre ciência e sociedade que vivemos:

Entende-se que, para uma leitura crítica da realidade, do “mundo”,

pressuposto freiriano, torna-se, cada vez mais, fundamental uma compreensão

crítica sobre as interações entre CTS, considerando que a dinâmica social

contemporânea está crescentemente vinculada ao desenvolvimento científico-

tecnológico. (AULER; DELIZOICOV, 2006, p 2)

Entendemos que a diferença entre esses dois modelos seja uma questão de foco e

abordagem alternativos para o mesmo problema. Afinal, como coloca Teixeira (2003), tanto o

modelo CTS quanto a Pedagogia Histórico-Crítica (a qual entendemos aqui como modelo

sociocultural), tratam a escola como “instrumento de formação para a cidadania” (TEIXEIRA,

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2003, p. 184). Contudo, a diferença entre o que ele chama de Pedagogia Histórico-Crítica e o

modelo CTS, estaria, segundo ele, na radicalidade da Pedagogia Histórico-Crítica, uma vez que

(...) ela não deixa dúvidas em suas asserções de que essa cidadania está

diretamente vinculada a um movimento que busca sérias transformações na

sociedade injusta e excludente que hoje se apresenta. Esse apelo

transformador nem sempre é percebido nos autores que escrevem sobre

Movimento C.T.S. (TEIXEIRA, 2003, p. 184).

Segundo Fahl (2003) e Fernandes (2015), o modelo CTS aparece no final da década

de 1980, em um contexto de maior abertura política e aumento das implicações políticas e

sociais da produção científica, apesar de Melo et al (2016) apontarem que tenha surgido antes,

ainda em meados nos anos 1960 e 1970. Auler e Delizoicov (2006) trazem que esse modelo

nasce quando a C&T passam a ser motivo de embate político, colocando que os “objetivos

centrais desse movimento consistiu na reivindicação de decisões mais democráticas e menos

tecnocráticas” (AULER; DELIZOICOV, 2006, p.2).

O modelo CTS trabalha, portanto, com a noção da ciência como instituição de poder

e traz elementos da ciência e sociologia da ciência, tipicamente representados por autores como

Pierre Bourdieu e Bruno Latour (ver: Latour; Woolgar (1997) e Bourdieu (2004)). Além disso,

propõe uma visão integrada dos três domínios, ciência, tecnologia e sociedade, daí decorre a

denominação. É um modelo que traz renovação na escolha crítica dos conteúdos. Segundo

revisão da literatura feita por Fernandes, o ensino CTS é um “campo que se encontra em

processo de construção dinâmica” (2015, p.133). A autora aponta para diversas dimensões do

modelo e para o fato de ele que não assume uma tendência metodológica própria.

O interesse pela ciência e tecnologia, integrados à componente sociedade, é

encorajado e apresentado como requisito para um ensino adequado e para a consciência

tecnológica. É nesse modelo que as palavras interdisciplinaridade e contextualização aparecem

com maior evidência e frequência, inclusive dentro dos Parâmetros Curriculares Nacionais

(PCN) (BRASIL, 1998). O modelo CTS procura “ampliar o olhar sobre o papel da ciência e da

tecnologia na sociedade e discutir em sala de aula questões econômicas, políticas, sociais,

culturais, éticas e ambientais” (SANTOS, 2007, p. 11). Apesar de não apresentar uma

metodologia própria, há uma utilização de sequências didáticas a partir de uma questão

problema contextualizada e pertinente à realidade dos alunos” (FERNANDES, 2015, p. 259).

Nesse sentido, é possível dizer que uma característica marcante do CTS é a busca pela

promoção do letramento científico. Para Santos e Mortimer (2002), a principal proposição dos

currículos com ênfase em CTS é alfabetizar os cidadãos em C&T, disponibilizando “(...) as

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representações que permitam ao cidadão agir, tomar decisão e compreender o que está em jogo

no discurso dos especialistas” (SANTOS; MORTIMER, 2002, p. 3).

Ainda segundo os autores,

O objetivo central da educação de CTS no ensino médio é desenvolver a

alfabetização científica e tecnológica dos cidadãos, auxiliando o aluno a

construir conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar

decisões responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e

atuar na solução de tais questões. (SANTOS; MORTIMER, 2002, p. 5)

O letramento científico, entretanto, pode assumir aqui duas tendências muito

distintas: uma corresponde à linha mais emancipatória e crítica da ciência e suas relações com

a sociedade, ligada inclusive ao modelo sociocultural. Há nessa linha a inclusão do componente

ambiente (CTSA), no sentido de trabalhar com mais evidência a interferência humana nas

questões ambientais. Contudo, para Santos (2007), o modelo CTS e CTSA se convergem

naturalmente: “em tese, pode-se dizer que, pela sua origem, todo movimento CTS incorpora a

vertente ambiental à tríade CTS” (SANTOS, 2007, p 1). A outra linha corresponde às

tendências mais liberais, em que o sujeito deve ser mais “participativo na sociedade (capitalista

e neoliberal) sem, contudo, pretender modificá-la. ” (FERNANDES, 2015, p. 132). As novas

formas de dominação político-ideológica, de exploração dos recursos naturais, o conhecimento

público em detrimento do privado, a ética da pesquisa científica, entre outras questões, não

seriam, portanto, temas dessa linha CTS liberal. Segundo Fernandes (2015), a primeira linha se

desenvolveu principalmente na América do Sul, enquanto que a segunda se desenvolveu

principalmente em países da América do Norte e Europa. Compreender que a sociedade

contemporânea é bastante marcada pela presença e atuação da ciência e tecnologia em todos os

setores, de modo que a sociedade se torna profundamente dependente delas, não

necessariamente implica em uma visão crítica dessa condição.

Por isso, Santos (2007) faz uma crítica ao tipo de contextualização que muitas vezes

é promovida erroneamente dentro das propostas CTS, identificando ao menos três formas

comuns em que ela aparece. A primeira é considerar que contextualizar significa descrever

situações do cotidiano em linguagem científica, “sem explorar as dimensões sociais nas quais

os fenômenos estão inseridos” (SANTOS, 2007, p. 5). A segunda é quando contextualizar se

traduz em mencionar o cotidiano, como se isso tornasse o ensino mais relevante. Nesse caso, o

cotidiano não é o ponto de partida, mas uma justificativa para uma abordagem conteudista. A

terceira forma ocorre ao utilizar-se da contextualização como facilitador da aprendizagem e

como fator motivador. Aqui a integração entre a tríade CTS passa a ser um mero instrumento,

e não uma concepção de que a ciência, tecnologia e sociedade são indissociáveis.

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Feita a apresentação dos modelos pedagógicos de ensino de ciências utilizados e de

nosso referencial teórico, trazemos a seguir a metodologia empregada na pesquisa que nos

permitiu avaliar esses modelos e analisar os programas educacionais em questão.

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Capítulo 2: Metodologia

2.1. Tipo de pesquisa e questões de estudo

Essa pesquisa está fundamentada como um Estudo de Caso de natureza qualitativa.

Para analisar os dois programas, foram usadas principalmente técnicas de estudos qualitativas.

Esse enquadramento é feito baseado no fato de serem tomados como caso, ou unidades de

análise como chama Yin (2001), os dois programas educacionais, ACES e MESA. Além disso,

foram utilizados o desenho experimental e as técnicas de coleta de dados características desse

tipo de pesquisa, conforme será descrito adiante.

Segundo Laville e Dione (1999), o estudo de caso permite que o pesquisador

transite entre o particular e o geral, reservadas as precauções nas conclusões a serem tomadas.

Conforme será demonstrado adiante, ambos os programas estão relacionados a um contexto

maior de STEM Education. Para Bogdan e Biklen (1994, p. 66), nesse tipo de pesquisa “a

preocupação central não é se os resultados são susceptíveis de generalização, mas sim a que

outros contextos e sujeitos eles podem ser generalizados”. Compartilhamos dos descritores

utilizados por esses autores para designar as características de uma pesquisa qualitativa

(BOGDAN; BIKLEN, 1994).

André (2008) enumera algumas vantagens do estudo de caso que corroboram a

relação desse tipo de estudo com a presente pesquisa. Segundo a autora, uma das vantagens é

justamente a visão dupla: aprofundada e ampla de um fenômeno social. Além disso, possui uma

capacidade heurística; no processo investigativo, não apresenta prejuízo à dinâmica natural dos

processos; e não parte de um esquema teórico fechado, ou seja, permite que o pesquisador “faça

novas descobertas e acrescente aspectos novos à problemática” (ANDRE, 2008, p. 35).

Cohen e Manion (1994) trazem que

Case studies recognize the complexity and ‘embeddedness’ of social truths.

By carefully attending to social situations, case studies can represent

something of the discrepancies or conflicts between the viewpoints held by

participants. The best case studies are capable of offering some support to

alternative interpretations. (COHEN; MANION, 1994, p. 123)1

1 Estudos de caso reconhecem a complexidade e o ‘embutimento’ de verdades sociais. Por atender cuidadosamente as situações sociais, estudos de caso podem representar algo das discrepâncias ou conflitos entre os pontos de vista que os participantes possuem. Os melhores estudos de caso são capazes de oferecer suporte para interpretações alternativas.” [Tradução livre nossa]

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Isso quer dizer que a escolha por um estudo de caso trabalha com a perspectiva

de buscar jogar luz sobre os nossos objetos de estudo e proporcionar ao leitor uma possibilidade

de compreensão dos fatos além daquela que está dada.

Dito isso, são apresentadas as questões de pesquisa. A principal delas é: Quais

modelos pedagógicos de ensino de ciências podem ser identificados nos programas

educacionais ACES e MESA. Entretanto, outras questões secundárias emanam dessa primeira,

por exemplo, Como é possível identificar e distinguir os modelos pedagógicos em um programa

ou escola, Como STEM education interfere nos programas educacionais analisados e O que é

STEM Education e qual seu impacto na educação.

2.2. Objetivos

O principal objetivo dessa pesquisa é identificar os modelos pedagógicos existentes

nos programas ACES e MESA. Desse modo, pretende-se identificar as características dos

programas e seus modos de operar, conforme seus objetivos.

Outros objetivos surgiram, naturalmente, a partir do primeiro. Dessa forma,

apontamos outros dois objetivos secundários: a compreensão de como o movimento STEM

education influencia esses programas e quais seus desdobramentos no sistema educacional

brasileiro; e o desenvolvimento de um instrumento de pesquisa que auxilie na identificação dos

modelos pedagógicos de ensino de ciências.

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2.3. Procedimentos metodológicos

Para atingir os objetivos dessa pesquisa, foram utilizados diversos procedimentos

metodológicos na coleta e análise de dados. Esses procedimentos geraram dados de diferentes

naturezas e, para análise de tais, foi realizado o procedimento de triangulação.

Antes de serem apresentadas as escolhas metodológicas e as etapas da pesquisa

adotadas, é relevante explicitar a relação do pesquisador com o objeto de pesquisa e os sujeitos

pesquisados. Dentro do programa ACES, o pesquisador principal deste trabalho atuou também

na coordenação do programa e a produção do material utilizado nas escolas, indo além da

função de sujeito investigador. A função de coordenador envolveu gerenciamento de atividades,

condução do processo de formação de professores, gerenciamento de monitores, produção do

material didático e organização geral do programa.

Considerando estritamente o processo investigativo, essa atuação dentro do

programa ampliou algumas possibilidades de coleta de dados. Por outro lado, impôs algumas

restrições quanto à metodologia empregada na análise de alguns documentos como o material

didático2. Dessa forma, é estabelecido desde já que os devidos cuidados foram assumidos em

relação a quais dados e de que maneira nos colocamos a observá-los. Não se trata de uma

pesquisa-ação, uma vez que esse tipo de pesquisa, além de não servir aos objetivos da

investigação em questão, possui procedimentos distintos daqueles adotados por nós (TRIPP,

2005).

O papel duplo no programa, todavia, não impediu que nossas análises fossem

realizadas de acordo com a metodologia de estudo de caso e pesquisa em ensino de ciências.

As devidas cautelas foram assumidas e embasadas pelos referenciais de estudo de caso:

(BOGDAN; BIKLEN, 1994; COHEN; MANION, 1994; LAVILLE; DIONNE, 1999; YIN,

2001; ANDRE, 2008;). Não cremos no investigador neutro, nem buscaremos defender análises

e conclusões objetivas e livres de ideologias, como em geral são conduzidos estudos na

metodologia convencional. De acordo com Megid Neto (2011, p.119): “O pesquisador, ao se

debruçar sobre determinada porção de realidade para estudo e investigação (objeto), já observa

essa realidade de maneira não neutra, em face de toda sua experiência de vida antecedente e a

todo o cabedal de conhecimento que acumula.” André (2008) nota que

2 Embora não tenhamos realizado a análise do material didático do programa ACES, disponibilizamos aqui o link que permite o acesso ao material. Para muitas das discussões realizadas no capítulo 4, principalmente aquelas que envolvem os relatórios de atividades dos professores do programa ACES, a leitura do material didático pode trazer um contexto mais preciso sobre as atividades desenvolvidas. Endereço eletrônico: http://educacaoedifusao.iqm.unicamp.br/web/aces/download

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Como no estudo de caso o instrumento principal é o pesquisador, um ser

humano, as observações e análises estarão sendo filtradas pelos seus pontos

de vista filosóficos, políticos ideológicos. E não poderia ser diferente. O

pesquisador não pode deixar de lado os seus valores, as suas crenças, os seus

princípios quando ele começa um processo de pesquisa (ANDRE, 2008, p.

38).

Para Cohen e Manion (1994), a matéria que interessa à pesquisa educacional é

composta de pessoas e é essencialmente significativa, fazendo parte de um mundo estruturado

subjetivamente. Para os autores, os estudos de caso nos quais o observador é participante,

favorecem a construção de relacionamentos em um ambiente mais natural e permitem aos

investigadores discernir sobre os contínuos comportamentos que ocorrem. Ainda segundo os

autores, o estudo de caso permite generalizações uma vez que as sutilezas e complexidades dos

casos sejam observadas. É importante observar que generalização não é entendida no “mesmo

sentido de leis que se aplicam universalmente” como coloca André (2008, p. 64), mas sim de

que os dados podem ser úteis para outros estudos, num processo de transferência, como a autora

cita a partir de outros autores. Cohen e Manion (1994, p. 111) colocam a questão: “Como

sabemos que os observadores não perdem sua perspectiva e se tornam cegos às peculiaridades

que eles supostamente deveriam estar investigando?” [Tradução livre]. Os autores relacionam

a natureza subjetiva e idiossincrática da observação do participante com a validação externa.

Nesse sentido, uma série de técnicas podem ser utilizadas para validação interna e externa das

interpretações, por exemplo, a triangulação dos dados.

Os referenciais de metodologia de pesquisa utilizados apontam para essa clareza na

condução da pesquisa qualitativa das ciências sociais e até mesmo nas ciências naturais,

contudo sem deixar de lado o rigor da pesquisa e a consistência metodológica. Latour (1997),

por exemplo, revela como a neutralidade e objetividade é inexistente até mesmo nas pesquisas

ditas mais objetivas o possível.

Dito isso, serão apresentadas a seguir as fontes de dados, suas respectivas

finalidades e as formas de análise desses dados.

2.3.1. Fontes de dados

Referencial teórico

Além do uso no embasamento metodológico e no estabelecimento de uma pesquisa,

o referencial teórico foi utilizado como fonte de dados em três temas distintos que podem ser

representados através das seguintes questões trabalhadas em fases distintas dessa pesquisa:

1. O que é (ou quais são) modelo pedagógico de ensino de ciências.

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2. Como criar um instrumento que permita classificar um modelo pedagógico de

ensino de ciências.

3. O que é STEM education.

Como mencionado, para entender o que é um modelo pedagógico de ensino de

ciências essa pesquisa se embasa principalmente no trabalho de Fernandes (2015). Os modelos

pedagógicos estabelecidos pela autora a partir da revisão da literatura, bem como alguns dos

referenciais teóricos originais foram revisitados e ressignificados. Conforme será discutido

adiante, as próprias fronteiras entre os modelos pedagógicos de ciências não são explícitas e

estáveis, sendo preciso fazer determinadas escolhas de referencial quando se trata de criar

esquemas teóricos com o intuito de perceber essas diferenças entre os modelos.

Esses referenciais teóricos também foram utilizados para estabelecimento do

questionário que apresentamos como instrumento de pesquisa voltado para a identificação dos

modelos pedagógicos. Para isso realizamos a comparação entre as diferentes perspectivas dos

autores no sentido de criarmos categorias para o questionário e torna-lo válido internamente.

Documentos

De acordo com André (2008, p 53), “documentos são muito úteis nos estudos de

caso porque complementam informações obtidas por outras fontes e fornecem base para a

triangulação de dados”. Como os documentos são fontes primárias estáveis e não passam pela

interferência do estudo que é conduzido, foram utilizadas diferentes fontes documentais

também para “corroborar e valorizar as evidências oriundas de outras fontes” (YIN, 2001, p.

109).

Foram consideradas fontes de documentos:

Relatórios produzidos pelos professores e monitores participantes do programa

ACES.

Esses relatórios fazem parte do processo de avaliação do programa por parte dos

professores e monitores participantes. O relatório é composto de uma série de questões com

resposta aberta as quais buscaram orientar a recepção das atividades nas escolas, a avaliação do

material didático, o engajamento dos alunos e a abrangência das sessões de formação com os

professores. Nesse sentido, apresentam-se como fontes ricas de informação para compreender

melhor os sujeitos investigados e como eles próprios percebem o programa. Além disso, esses

relatórios são relevantes para o confronto dessa fonte de dados com outras como o questionário

e a observação do pesquisador, pois revelam conflitos carregados de significado para o estudo.

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Material de divulgação do programa MESA e material informativo nas páginas

eletrônicas.

O programa MESA possui inúmeros documentos explicativos e informacionais

produzidos ao longo dos anos, além de uma vasta fonte de informações disponíveis nos websites

das subunidades do programa. Foram consideradas a missão institucional, os objetivos e outros

descritores como a seção about us disponíveis nos websites. Esses descritores revelam como o

programa se coloca enquanto instituição e permitem o contraste com fontes de informação do

tipo entrevista que são mais ligadas aos sujeitos que integram esses programas e carregam

ideologias e discursos nem sempre similares.

Livros didáticos e material instrucional do programa MESA.

O material didático produzido pelo programa MESA foi utilizado como fonte de

dados, com o objetivo de compreender de que maneira esses livros didáticos trabalham os

objetivos do programa, a natureza da ciência e de que maneira o conhecimento é trabalhado,

bem como as concepções de ciência e natureza em voga.

Questionários

Os procedimentos metodológicos detalhados referentes ao questionário, incluindo

a análise dos resultados, são apresentados no capítulo 2, seção 5.4, através de um artigo

publicado integralmente nos anais do XI ENPEC – Encontro Nacional dos Pesquisadores de

Ensino de Ciências, congresso realizado na cidade de Florianópolis, em agosto de 2017.

Observações

Uma outra fonte de dados a qual embasou as análises dessa pesquisa foram as

observações realizadas nos dois programas educacionais. Yin (2001) traz uma distinção entre

dois tipos de observações no estudo de caso, aquelas em que o pesquisador literalmente observa

os eventos, comportamentos e condições ambientais sem realizar qualquer interferência, como

um observador passivo. Do outro lado, estão aquelas nas quais o pesquisador participa nos

eventos ativamente e, consequentemente interfere até mesmo nos dados que serão obtidos com

a observação. As duas formas apresentam suas vantagens e desvantagens. De maneira sucinta,

a observação direta permite maior fidedignidade no relato dos fatos ocorridos, ao passo que a

observação participante permite produzir dados e controlar eventos de maneira que jamais

ocorreria sem intervenção. Nas visitas às escolas, eventos de formação de professores, reuniões,

aulas e situações não formais de interação entre os sujeitos, foram realizadas principalmente

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observações do tipo participante. Nelas, foram estabelecidos diálogos com os professores e

alunos, situações de aprendizagem, desafios, conflitos, questionamentos e manipulação de

instrumentos do ambiente.

Não foram estabelecidas categorias de análise a priori e as observações foram do

tipo não estruturadas livres (LAVILLE; DIONNE, 1999). Foi feito uso de notas descritivas,

aquelas em que há maior objetividade e neutralidade possível em relação às situações

observadas, por exemplo, quando o pesquisador descreve “os alunos eram majoritariamente de

etnia branca” ou “a sala de aula possui laptops para todos os alunos”. Mas foi feito uso também

de notas analíticas, nas quais “(...) o pesquisador fala de suas reflexões pessoais; elas [notas

analíticas] compreendem as ideias e intuições frequentemente surgidas no fogo da ação (...)”

(LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 180).

A familiaridade dos sujeitos com o pesquisador foi favorável nesse processo no

programa ACES, por exemplo; tanto os alunos quanto os professores já possuíam uma relação

construída. Da mesma forma, a observação participante e o número de visitas a uma mesma

sala de aula favoreceram para que as relações fossem sendo construídas com o maior número

de alunos e o estranhamento foi sendo suavizado. Não havia uma relação anterior construída

com os alunos e professores do programa MESA, portanto, buscou-se focar em apenas uma

turma de alunos para que mais visitas pudessem ser realizadas e buscou-se também estabelecer

um diálogo, intermediado pelas professoras, com os alunos antes das observações serem

iniciadas.

Além das observações realizadas em sala de aula e atividades escolares, os diretores

do programa MESA e a equipe de administração do programa também foram sujeitos

observados, uma vez que o pesquisador principal permaneceu por 4 meses diariamente no

escritório do programa como pesquisador visitante, possuindo total e livre acesso a tudo que

fosse relativo à organização. Foram observadas reuniões, eventos, confraternizações, visitas de

campo a escolas e universidades do programa em várias cidades, várias sessões de formações

de professores e reuniões de planejamento. Ou seja, da própria rotina característica do

programa. As interpretações e análises apresentadas são resultados de um intenso convívio com

a organização e seus sujeitos, o que pode ser traduzido em um conhecimento mais aprofundado

sobre a organização.

Essas observações foram realizadas tanto no programa ACES quanto no programa

MESA e resultaram em um extenso caderno de campo. A tabela 1 traz uma relação do que foi

feito exatamente em cada programa.

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Tabela 1: Resumo das atividades de observação e acompanhamento dos programas ACES e MESA,

realizadas durante a pesquisa.

3 Do total de 30 horas é importante notar que aproximadamente metade foi realizada acompanhando uma única professora nas 3 diferentes classes que ela leciona.

MESA - Resumo das observações realizadas

Características gerais Detalhamento

Tem

po t

ota

l -

4 m

ese

s

O q

ue f

oi obse

rvado

Reuniões variadas, eventos, palestras, showcases

Escolas 6

Classes específicas

8 classes

Rotina diária, escritório principal e associados

Séries 5° e 4° anos

Total 30h3

Formações

Número 4 sessões

Confraternizações, jantares beneficentes, organizações

parceiras

Locais

Seattle, Tri-Cities,

Vancouver (WA)

Total 28h

Escolas, universidades e community colleges

Reuniões de planejamento (Coordenadores, diretores e

Board Meeting)

Número 7

Total 33h

Sessões de formação de professores e aulas

Instituições parceiras Número 8

Total 32h

Reuniões de planejamento institucional

Community College (Seattle Central College)

3 Visitas

Total 6h

ACES

Características gerais Detalhamento

Tem

po t

ota

l -

10 m

ese

s

O q

ue f

oi obse

rvado

Reuniões Sessões de formação de professores

Escolas Número X

Escolas

Classes específicas

Número X

Aulas e atividades extra-classe Séries 6° ao 9°

Feira de ciências Tempo X

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2.3.2. Análise de dados

Uma vez que os dados foram obtidos a partir de fontes diversas e são

essencialmente qualitativos, a análise dos mesmos foi realizada de modo variado, mesclando

entre análise de conteúdo para algumas fontes documentais, análise estatística para o

questionário e a interpretação para os demais dados. Laville e Dionne (1999) distinguem três

modos de análise e de interpretação qualitativas, das quais fazemos uso de uma delas: a

construção iterativa de uma explicação. Nesse processo o “pesquisador elabora pouco a pouco

uma explicação lógica do fenômeno ou da situação estudados” (LAVILLE; DIONNE, 1999, p.

227). Esse tipo de análise vem de um estudo exploratório que progride em aproximações

sucessivas de um sentido completo, e “é preferível não elaborar hipótese a priori. Esta é então

simultaneamente desenvolvida e verificada, ainda que em parte, em um vaivém entre reflexão,

observação e interpretação, à medida que a análise progride” (IDEM). Yin (2001) sugere

iteração como um procedimento de construção da explanação.

Nesse sentido, a explanação final pode não ter sido inteiramente estipulada no

começo de um estudo (...). Em vez disso, as evidências do estudo de caso são

examinadas, os posicionamentos teóricos são revisados e as evidências são

examinadas novamente de uma nova perspectiva, nesse modo iterativo. (YIN,

2001, p. 141)

Tendo em vista os processos explanatórios, foi utilizada a triangulação como

método de estruturação e validação das análises. Esse método (ou multi-method approach) é

caracterizado por confrontar diferentes fontes de dados e distintas formas de análise, conforme

Cohen e Manion (1994). Para eles,

(...) triangular techniques in the social sciences attempt to map out, or explain

more fully, the richness and complexity of human behavior by studying it from

more than one standpoint and, in so doing, by making use of both quantitative

and qualitative data (COHEN; MANION, 1994, p. 233)4.

A partir dessa colocação, é importante notar que a mescla de informações e

pontos de observação constrói os sentidos em um processo contínuo. Essa pesquisa se apropria

dessa ideia utilizando a triangulação para a validação de nossas observações. Cohen e Manion

(1994) denominam esse processo de triangulação metodológica, quando são utilizados

diferentes métodos para o mesmo objeto de estudo. A figura 1 traz um esquema desses

procedimentos adotados. É especialmente útil quando nos permite, por exemplo, estabelecer as

4 “As técnicas triangulares nas ciências sociais tentam traçar, ou explicar mais detalhadamente, a riqueza e a complexidade do comportamento humano ao estudá-lo de mais de um ponto de vista e, ao fazê-lo, fazendo uso de dados tanto quantitativos como qualitativos” (COHEN e MANION, 1994, p. 233) [Tradução livre nossa].

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relações entre os dados qualitativos e quantitativos obtidos na pesquisa. É o caso da comparação

das interpretações realizadas entre a observação qualitativa das aulas e os dados quantitativos

dos questionários respondidos pelos professores. E ainda, Cohen e Manion (1994) colocam que

a triangulação é particularmente apropriada em estudos de caso, fenômenos complexos (ex.

organizações e programas educacionais), avaliação de métodos de ensino (ex. o processo de

ensino em uma sala de aula); e estudos controversos (ex. as diferenças entre as concepções

teóricas e as práticas pedagógicas de professores).

Figura 1 – Representação da organização da pesquisa

Apresentados os objetivos, questões de estudo e metodologia empregada na

pesquisa, traremos no capítulo a seguir, o qual está apresentado no formato de artigo, uma

revisão do movimento STEM education e suas nuances no sistema educacional brasileiro.

Como afirmamos anteriormente, esse movimento embasa os princípios do programa ACES e,

principalmente, do programa MESA.

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Capítulo 3: STEM education – Um panorama e sua relação com a

educação Brasileira

3.1. Introdução – O movimento STEM

Em um planeta altamente globalizado, a interação entre sistemas políticos,

econômicos e culturais é bastante intrincada. Algumas nações tendem a atuar como produtoras

de tendências globais, enquanto outras, em maior ou menor intensidade, incorporam essas

tendências nos seus sistemas internos. As novas diretrizes econômicas são fortemente

influenciadas pelas grandes corporações que produzem ou demandam conhecimento de alta

complexidade e especialização, e isso gera consequências em outros setores além do

econômico. No que diz respeito aos sistemas educacionais, diversos países têm se voltado para

um formato de educação que enfatiza a Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, o

chamado STEM Education (Science, Technology, Engineering and Mathematics).

Esse novo formato ganhou proporções significativas principalmente nos Estados

Unidos, país no qual foi introduzido primeiro. O termo foi introduzido pela National Science

Foundation (NSF) nos anos 1990 como SMET (SANDERS, 2009; ENGLISH, 2016). Apesar

disso, apenas na última década começou a ganhar visibilidade, especialmente a partir de 2001,

quando uma das diretoras do NSF sugeriu o termo STEM ao invés de SMET (SANDERS, 2009;

BREINER et al. , 2012), e hoje se configura como uma tendência global.

STEM education pode significar o óbvio à primeira vista: o ensino de ciências e

matemática incrementado com novos conteúdos de novas áreas que ganharam espaço na

sociedade nas últimas décadas, principalmente a computação. Tudo isso acrescido de uma nova

metodologia de ensino. Entretanto, como veremos adiante, o termo hoje possui uma conotação

muito mais complexa e emaranhada de significados. Para não fugir do clichê que acontece em

diversas áreas emergentes, a definição de STEM education é ainda muito instável e não há uma

universal. Apesar de diferentes definições terem sido propostas, ainda é um termo confuso e

ambíguo (BREINER et al. , 2012; BELL, 2016; WONG et al. , 2016).

Para amenizar a profusão de sentidos que a busca por uma definição pode causar, é

possível, contudo, trabalhar com características comuns que permitem uma primeira

compreensão. Em termos gerais, a partir da literatura, mídia não especializada e informações

vindo de programas educacionais STEM, algumas constantes podem ser atribuídas ao

movimento como um todo.

3.2. Definição simplificada

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STEM education se apresenta como uma proposta inovadora no ensino de

ciências. Há uma ideia de rompimento com o ensino tradicional passivo de ciências, no qual o

aluno pouco interage com o objeto de estudo e não vê conexões com o mundo empírico.

Frequentemente os programas educacionais STEM5, tanto governamentais, quanto não

governamentais, advogam que STEM education é uma forma libertadora do tradicionalismo e

da aprendizagem não participativa, substituindo-os pela aprendizagem baseada em projetos

(BREINER et al. , 2012) e conectados às futuras escolhas profissionais (REISS; MUIJTABA,

2017). Como veremos adiante, a origem do movimento STEM education está intimamente

associada com o desinteresse de jovens pelas carreiras STEM (CANNADY et al. , 2014; RITZ;

FAN, 2015; REISS; MUJTABA, 2017). Por isso a preocupação em tornar a aula de ciências

interessante é quase que unânime entre os programas de ensino STEM e, em alguns casos, há

até mesmo direcionamento deliberado dos alunos para essas carreiras.

Também é característico do movimento, e isso é mais recente, a ideia de um

currículo multidisciplinar, que integra as quatro áreas. Diversos autores estabelecem

propostas e recomendações para STEM education e advogam pela ideia de STEM integration

como princípio norteador das práticas pedagógicas, mesmo que o significado de integração e

seus níveis sejam bastante controversos nas diferentes frentes (SANDERS, 2009; HONEY et

al. 2014; RITZ; FAN, 2015; KELLEY; KNOWLES, 2016; ENGLISH, 2016). Esses autores

argumentam que STEM tem a ideia de integração intrínseca em si, de modo que essas

disciplinas não poderiam ser isoladas e ensinadas separadamente. Entretanto, para Wong

(2016), a intenção original de trazer essas disciplinas díspares juntas é provavelmente obscura.

English (2016) nota que, mesmo que STEM carregue consigo uma ideia de

multi/transdisciplinaridade, a integração entre as áreas pode ficar restrita ao plano fictício, como

veremos adiante.

Além disso, o movimento STEM education é contemporâneo – no sentido de que

possui a atenção voltada para as demandas do século XXI e traz para dentro da sala de aula de

ciências áreas como computação (Tecnologia) e design (Engenharia). Nesse sentido, busca

atender à demanda por conhecimentos e habilidades que são considerados cruciais para o século

XXI (BECKER; PARK, 2011; OBAMA, 2014; HOEG; BENCZE, 2017), além de considerar

e estar conectado com o contexto atual de desafios globais (sociais e ambientais) (BYBEE,

2013). Para Ritz e Fan (2015), a reforma educacional STEM é essencialmente diferente das

5 Essas características podem ser observadas, por exemplo, através da consulta de documentos, artigos relacionados e missão institucional dos programas STEM education MESA (Estados Unidos), STEM Brasil (Brasil), Engineering is Elementary (Estados Unidos), STEM Learning (Reino Unido) e The NEED Project (Global).

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outras porque está atrelada a resolver os problemas globais e econômicos. Contudo, é possível

perceber nessa reforma um formato de ciência positivista neutra e determinista impresso nos

discursos, além de um otimismo tecnológico (FEINSTEIN; KIRCHGASLER, 2015;

ZEIDLER, 2016), principalmente quando se trata de justificar a ênfase em STEM como crucial

para a sustentabilidade do planeta. Feinstein e Kirchgasler (2015) pontuam sobre essa

abordagem:

Rather than supporting a generation of students to engage with science in

realistic and productive ways as they address sustainability challenges, this

approach might lead students to systematically misinterpret and underestimate

the challenges that confront their local, regional, and global communities6.

(FEINSTEIN; KIRCHGASLER, 2015, p. 123)

Ainda dentro da discussão sobre o que constitui a essência do movimento STEM

education, tem sido formada uma questão em torno da integração de STEM com as

humanidades, mais especificamente as artes, dando origem ao termo STEAM (Science,

Technology, Engineering Arts and Mathematics). Claramente esse ponto não é um território

pacífico, muito menos adotado amplamente pelos envolvidos, mas é uma questão relevante. Há

autores que argumentam pela necessidade de se utilizar STEAM ao invés de STEM e diversas

propostas já foram criadas nesse sentido (CUNNINGHAM, 2014; JOLLY, 2014; RADZWILL;

BENTON; MOELLERS, 2015; THURLEY, 2016). Há inclusive uma revista especializada em

STEAM, o Journal of STEAM Education. Porém, esses autores fazem ressalvas quanto à forma

pela qual as Artes entram nesse processo, que muitas vezes são encaradas como acessório lúdico

ou de uma forma estritamente utilitarista, não propriamente como um campo do conhecimento.

Nesse caso, as funções sensibilizadora, educadora, criativa, crítica ou estética não são

preconizadas, o que coloca em questionamento qual a verdadeira posição das artes no acrônimo.

Cunningham (2014) coloca que, ao contrário da ciência e tecnologia, o que as artes

têm a acrescentar ao sistema educacional vai além de retornos monetários, e que STEM por si

só se torna esvaziado de sentido. Radziwill et al. (2015) defendem a incorporação de

experiências significativas e a promoção de um ambiente rico para a aprendizagem

efetivamente STEAM através de uma abordagem de arte participativa. A arte e o design teriam

uma função de engajar os estudantes em ciência e tecnologia e tornar o ambiente de

aprendizagem mais produtivo e substancial. Para Blackley e Howell (2015, p. 17), “STEM

6 Ao invés de apoiar uma geração de estudantes para se envolver com a ciência de maneiras realistas e produtivas, como eles abordam desafios de sustentabilidade, essa abordagem pode levar os alunos a mal interpretar e subestimar sistematicamente os desafios que enfrentam suas comunidades locais, regionais e globais. (FEINSTEIN; KIRCHGASLER, 2015, p. 123) [Tradução livre]

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education as typically envisioned and practiced, lacks ‘‘STEAM.’’ A focus on STEM sans

‘‘Arts’’ necessarily excludes important areas that inform and contextualize science by

grounding them in sociocultural contexts7”. Na visão desses autores, artes incluem, por

exemplo, sociologia, psicologia, história, artes visuais, filosofia e educação.

3.3. Três fatores que explicam a corrida por STEM education nos EUA e as

políticas em torno do movimento.

Dado esse panorama, é imprescindível compreender que STEM education é um

movimento que nasce nos EUA e então se dissemina para outros países como um furor

generalizado. A partir de nossa revisão da literatura, é possível enumerar ao menos três fatores

importantes que explicam esse processo. O primeiro deles, mais intuitivo, é o espaço que a

inovação adquiriu nas sociedades, associado às transformações tecno-científicas as quais

nos influenciam seja na sala de aula, seja nas mais altas esferas políticas. Tornou-se impossível

ignorar que o mundo ao redor das crianças na sala de aula havia mudado profundamente e que

seria necessário acompanhar essas transformações e reformulando o currículo, no mínimo.

O outro fator foi a publicação de uma série de relatórios indicando que os EUA

passavam por uma escassez de profissionais capacitados nas áreas STEM e que perderiam

competitividade econômica por isso (MAY; CHUBIN, 2003; MATTHEWS; MANGAN,

2006; NATIONAL ACADEMIES PRESS, 2006; BECKER; PARK, 2011; KUENZI et al

2011; ENGLER, 2012; ANFT, 2013; KELLEY; KNOWLES, 2016). Esses relatórios causaram

grande perturbação nas agências reguladoras da Educação nos Estados e foram incendiários na

mídia gerando um senso generalizado de crise (presente até hoje) nas áreas STEM

(CHARETTE, 2013; SANDERS, 2009; RITZ; FAN, 2015; WONG et al, 2016; XUE;

LARSON, 2015).

Esse fator é um dos mais relevantes para compreender o movimento. Está em sua

gênese o senso de crise nas áreas STEM e a ideia de que essas áreas são vitais para a era

tecnológica na qual as sociedades estão inseridas atualmente. Breiner (2012) coloca que nos

EUA STEM se tornou a palavra-chave para os interessados que atenderam ao chamado para a

criação de escolas e universidades melhor preparadas para competir globalmente. Na mídia em

7 A educação STEM, tipicamente concebida e praticada, carece de "STEAM". Um foco em STEM sem “Artes’' exclui necessariamente áreas importantes que informam e contextualizam a ciência, fundamentando-as em contextos socioculturais. BLACKLEY; HOWELL (2015, p. 17)

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geral, relatórios, documentos oficiais, missões institucionais de programas e artigos acadêmicos

(tanto apoiadores quanto críticos do movimento STEM), é quase impossível não se deparar com

o mantra “Os EUA precisam de trabalhadores STEM capacitados, professores universitários

STEM e profissionais STEM para melhorar sua força técnica e seu quadro de profissionais que

garantem liderança em uma economia global” (GESS, 2015, p. 2) [tradução livre]. Contudo,

mesmo com toda a comoção em torno da ideia de crise, há autores que discordam ou relativizam

sua existência com argumentos e dados bastante convincentes para mostrar que ela, na verdade,

é um construto econômico e político e é puramente especulativa (ANFT, 2013; CHARETTE,

2013; TEILTEBAUM, 2014; XUE; LARSON, 2015; BLACKLEY; HOWELL, 2015).

A noção de perda de competitividade como catalisador do movimento é chave para

compreender a motivação em favor de STEM que vem principalmente do setor econômico.

Para Wong et al. (2016), a confusão sobre a natureza do STEM education não surpreende, uma

vez que o movimento se desenvolve mais a partir de uma racionalidade econômica do que

educacional. Segundo Hoeg e Bencze (2017), no Next Generation Science Standards a noção

de que uma educação STEM é importante para a economia é amplamente difundida. Em uma

análise que o autor faz desse parâmetro curricular estadunidense, trata-se de uma reforma

educacional neoliberal estreitamente relacionada com as pautas econômicas. O NGSS é um

documento com função muito equivalente à dos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) do

Brasil. Nesse documento, publicado em 2013, que representa uma profunda reforma no ensino

de ciências estadunidense, STEM education é visto como parte essencial do ensino de ciências

e é amplamente preconizado.

O terceiro fator se dá a partir da publicação de relatórios internacionais indicando

baixo desempenho e interesse dos estudantes norte-americanos em várias áreas, incluindo

ciências (OECD, 2003; AINLEY; AINLEY, 2011; KUENZI et al, 2006; NATIONAL

ACADEMIES PRESS, 2006; SAXTON et al 2014; CARO; LENKEIT, 2015; ZAKARIA,

2015; ZEIDLER, 2016). Saxton et al. (2014) e Kuenzi et al. (2006) apontam tanto para o

desempenho dos estudantes abaixo do esperado, quanto para a escassez de professores

capacitados em STEM education, como causas da crise. Gough argumenta que o ensino de

ciências como um todo passa por um estado de crise:

Aspects of this crisis include a diminishing proportion of students studying

sciences, particularly physical sciences, both at school and in universities, to

the point where there are shortages of skilled science professionals and

qualified science teachers, and continuing, if not growing, student

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disenchantment and disengagement with school science in the middle years8.

(Gough, 2014, p. 446)

Diversos autores (BREINER et al., 2012; RITZ; FAN, 2015; XUE; LARSON,

2015; WONG et al. , 2016) creditam boa parte dessa noção de crise nos EUA à publicação de

um relatório por parte do National Research Council, intitulado Rising Above The Gathering

Storm (NATIONAL ACADEMIES PRESS, 2006), o qual “sugere [o relatório] que a vantagem

competitiva dos EUA em ciência e tecnologia estava sendo erodida e argumenta que uma das

principais estratégias para atacar essa questão seria através da vasta melhoria de matemática e

ensino de ciências.” (WONG et al. 2016, p. 2348) [Tradução livre]. Banning e Folkestad (2012)

colocam que os autores do relatório “summarized that ‘participants expressed concern that a

weakening of science and technology in the United States would inevitably degrade its social

and economic conditions and in particular erode the ability of its citizens to compete for high-

quality jobs9.’” (AUGUSTINE 2008, apud BANNING; FOLKESTAD, 2012, p. 730)

O fato é que toda essa perturbação provocou uma reação em órgãos públicos norte-

americanos, entidades ligadas aos programas educacionais, legisladores e na Casa Branca, e

também em grandes corporações, os quais atuaram através de programas de incentivo à STEM

nas escolas, seja via financiamento público-privado, seja por patrocínio de programas

educacionais (OBAMA, 2014; THE WHITE HOUSE, 2016). Hoeg e Bencze (2017, p. 16) nota

que há até uma pressão política institucionalizada para implementação dos programas STEM:

“Os Estados não ganham recursos federais a menos que eles enfatizem STEM nas políticas

educacionais e conectado a instrumentos de avaliação de desempenho (por ex. pagamento por

mérito e sistemas de ranqueamento escolar). ” [Tradução livre]

Hoje, STEM education é uma top priority em termos de financiamento público

estadunidense (BREINER et al., 2012), como é possível perceber a partir da fala do ex-

presidente Barack Obama: “We need to make this a priority to train an army of new teachers

in these subject areas, and to make sure that all of us as a country are lifting up these subjects

8 Aspectos dessa crise incluem desde uma decrescente proporção de estudantes estudando ciências, particularmente física, tanto na escola quanto nas universidades, até o ponto no qual há escassez de profissionais de ciências capacitados e professores de ciências bem preparados, além do contínuo, senão crescente, desencanto e desengajamento estudantil com a ciência escolar no ensino básico. (Gough, 2014, p. 446) [Tradução livre] 9 "Sintetiza que ‘os participantes expressaram a preocupação de que um enfraquecimento da ciência e da tecnologia nos Estados Unidos inevitavelmente degradaria suas condições sociais e econômicas e, em particular, prejudicaria a capacidade de seus cidadãos competir por empregos de alta qualidade’". (AUGUSTINE 2008, apud BANNING; FOLKESTAD, 2012, p. 730) [Tradução livre]

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for the respect that they deserve.”10 (OBAMA, 2013b apud BELL, 2016, p. 63). Os

investimentos são massivos e ultrapassam a casa dos bilhões de dólares facilmente nos EUA.

Apenas para exemplificar, uma das organizações que dispõe de centenas de apoiadores por todo

os EUA dentre eles políticos, o governo de Barack Obama, fundações, corporações,

universidades representantes da mídia e organizações-não-governamentais, a 100Kin10 tem um

nome sugestivo e um objetivo único que diz muito sobre o movimento STEM education:

“100Kin10 is charting a course to bringing 100000 excellent STEM teachers to American

Classrooms by 202111”.

Essas ações resultaram na criação de um verdadeiro duto (pipeline, como os

próprios defensores de STEM se referem) para direcionar os alunos para as carreiras STEM,

principalmente sob o argumento de que a escassez de profissionais dessas áreas ameaça

seriamente a integridade nacional (NATIONAL ACADEMIES PRESS, 2006; CANNADY et

al. , 2014; BELL, 2016), e até mesmo a segurança nacional (BYBEE, 2013). Cannady et al.,

(2014) criticam duramente tanto o uso da metáfora, quanto a adoção de tais medidas, uma vez

que elas visam atender às necessidades econômicas e reforçam a ideia de que os alunos que não

seguem tais carreiras são inúteis para a prosperidade econômica ou, nos termos da metáfora,

são considerados como desperdício (leaky pipeline). A partir do trabalho de Svinth (2006),

Banning e Folkestad (2012, p. 735) resumem que “it [pipeline metaphor] considers only the

‘push’ effect not the ‘pull’ effect; it is unidirectional; it is value laden, and it does not consider

the entry problem.”12

3.4. Movimento para além dos Estados Unidos: cenário internacional

Apesar de ter focado aqui na origem do movimento nos EUA, trata-se claramente

de uma tendência internacional. A partir da literatura, nota-se que Reino Unido e Austrália são

os países nos quais, além dos EUA, o movimento assume maiores proporções e se desenvolve

há mais tempo (BLACKLEY; HOWELL, 2015; MARGINSON et al, 2013; RITZ; FAN, 2015;

WONG et al, 2016). No Reino Unido, por exemplo, o relatório Get SET for Success (2006) teve

10 “Nós precisamos fazer disso uma prioridade, para treinar um exército de novos professores nessas áreas [STEM], e ter certeza de que todos nós como um país estamos dando o devido reconhecimento que essas áreas merecem. ” Obama (2013b) apud (Bell, 2016, p. 63) [Tradução livre] 11 “100Kin10 está traçando um curso para trazer 100000 professores de STEM excelentes para salas de aula americanas até 2021”. [Tradução livre] 12 A metáfora do pipelineconsidera apenas o efeito "empurrar" e não o efeito "puxar"; é unidirecional; É um valor carregado, e não considera o problema de entrada. (BANNING E FOLKESTAD, 2012, p. 735) [Tradução livre]

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um impacto muito similar ao do relatório Rising above the Gathering Storm e, juntamente com

outros relatórios, desencadearam uma série de ações como a criação de um programa nacional

em STEM (STEM Cohesion Program), cujas ações foram coordenadas entre as diversas

iniciativas para garantir sua efetivação (WONG et al. , 2016). Os autores chamam a atenção

para a criação de redes políticas pelo Estado para “atacar o problema” (p. 2349). Segundo Bell

(2016), a estratégia utilizada lá para criar uma força-trabalho bem motivada e altamente

qualificada de professores STEM é através de incentivos financeiros. Na Austrália, as

motivações (ideia de crise) e as respostas (altos investimentos e a promoção de uma imagem

positiva da ciência) ocorrem de maneira muito parecida com o que ocorre nos EUA e Reino

Unido (BLACKLEY; HOWELL, 2015; MARGINSON et al e ROBERTS, 2013).

Além dos três países citados acima, Canadá, França, China, África do Sul, Japão,

para citar apenas alguns países, STEM education já faz parte dos debates educacionais

ocupando posição destacada (MARGINSON et al., 2013; RITZ; FAN, 2015). Um discurso de

STEM é prevalente em muitos outros países e autores sugerem que as lógicas para a agenda

STEM são variadas e limitadas ao mesmo tempo, e relacionadas principalmente para objetivos

vocacionais (formação de mão-de-obra) e econômicos (WONG et al. , 2016). Blackley e Howell

(2015) sugerem a partir da literatura que há quatro grandes reinos STEM: (1) English speaking,

(2) Western European countries, (3) Asian countries, and (4) developing countries. Os autores

os caracterizam da seguinte forma:

The STEM approach of the English-speaking countries is dominated by the

US and UK, and is characterized by widespread talk of a ‘STEM crisis’. There

are a number of Western European countries, such as France and Germany

that have emphasized STEM for some time as part of the framing of national

policy on education and industry; the focus in these countries has been on the

apparent ‘STEM shortage’ rather than ‘crisis’. Typically, these policies or

strategies involve: “promotion of a positive image of science; increasing

public knowledge of science; improving school-based mathematics and

science (teaching and learning); and increasing interest and participation in

school-based mathematics and science, tertiary STEM disciplines and the

STEM workforce” (Marginson et al., 2013, p. 104). […] Furthermore, strong

STEM performing countries in Asia have meritocratic career structures that

recognize excellence in teaching these subjects (Marginson et al., 2013). […]

Finally, in the fourth group, developing countries with an emerging industrial

base and/or low levels of education participation and supply of qualified

teachers, such as Brazil and South Africa, STEM is addressed in terms of

improving participation in basic education and developing a qualified teaching

workforce. BLACKLEY; HOWELL (2015, p. 110) 13.

13 A abordagem STEM dos países de língua inglesa é dominada pelos EUA e Reino Unido e caracteriza-se por falar amplamente sobre uma "crise STEM". Há uma série de países da Europa Ocidental, como a França e a Alemanha, que enfatizaram a STEM há algum tempo como parte do enquadramento da política nacional em educação e indústria; O foco nesses países tem sido a aparente "escassez de STEM" em vez de "crise". Normalmente, essas

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É difícil delimitar precisamente STEM education em cada país. Certamente faltam

estudos e evidências para estabelecer um estado da arte internacional, apesar de alguns autores

terem feito importantes avanços nessa direção MARGINSON et al, 2013; RITZ; FAN, 2015;

WONG et al, 2016). A maioria dos estudos em STEM education foca nas interpretações que se

faz do movimento, em como ele é visto nas escolas ou nas esferas políticas (WONG et al, 2016).

Entretanto, no que diz respeito à interpretação dos resultados de quase duas décadas de

investimento massivo em STEM, poucos se aventuram nesse trabalho, principalmente quando

se trata de compreender os impactos no letramento científico, nas atitudes em relação à ciência,

na melhoria da qualidade do ensino e no desenvolvimento das escolas. É evidente que as

análises do movimento são escassas. As interpretações são múltiplas e controversas

principalmente quando se contrasta os argumentos dos seus entusiastas com os de seus críticos.

Um passo importante que poderia ser dado no sentido de favorecer a compreensão

do panorama internacional, possivelmente seria o mapeamento de políticas STEM education

(ações, leis, parâmetros curriculares, investimentos e planos educacionais realizados pelos

agentes políticos); programas de STEM education (programas governamentais e não

governamentais, da iniciativa privada e pública); relatórios sobre STEM education (relatórios

estaduais e locais sobre o tema); consórcios e fundos STEM education (parcerias internacionais

e locais, alianças de grupos estratégicos, redes e consórcios da iniciativa privada); plataformas

STEM education (websites, plataformas, bibliotecas virtuais e produtores de conteúdo STEM);

e apoiadores independentes.

3.5. Cenário Brasileiro

Se compararmos com toda a atenção dada ao STEM education em diversos países,

no Brasil (e na América Latina) o movimento aqui ainda é tímido. Nas principais revistas

brasileiras especializadas em ensino de ciências14, não existe nenhuma publicação relativa à

políticas ou estratégias envolvem: "promoção de uma imagem positiva da ciência; crescente conhecimento público da ciência; melhorar a matemática e a ciência escolar (ensino e aprendizagem); e crescente interesse e participação em matemática e ciência escolar, disciplinas STEM terciárias e força de trabalho STEM "(Marginson et al., 2013, pág. 104). [...] Além disso, os países com sucesso da STEM na Ásia possuem estruturas de carreira meritocráticas que reconhecem a excelência no ensino dessas matérias (Marginson et al., 2013). [...] Finalmente, no quarto grupo, os países em desenvolvimento com uma base industrial emergente e/ou baixos níveis de participação e oferta de professores qualificados, como o Brasil e a África do Sul, STEM é abordado em termos de melhoria da participação no ensino básico e desenvolver uma força de trabalho qualificada. BLACKLEY;

HOWELL (2015, p. 110) [Tradução livre] 14 Fizemos uma pesquisa bibliográfica contendo os termos STEM education, STEM, Science, Technology, Engineering and Mathematics nas revistas: Ciência e Educação; Revista Brasileira de Ensino de Física; Revista

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STEM education. O banco de teses e dissertações do CEDOC (Centro de Documentação em

Ensino de Ciências), da Faculdade de Educação da Unicamp, não traz nenhum trabalho

publicado ou em andamento sobre o tema. Na mídia, o que se observa são pequenas reportagens,

feitas em caráter introdutório e reproduzindo a ideia de que se trata de uma proposta inovadora

e em alta no exterior, mas sem grandes aprofundamentos metodológicos ou debates sobre os

princípios pedagógicos15.

Entretanto, é possível perceber certa incipiência do movimento no Brasil através de

programas educacionais de apoio ao ensino de ciências, algumas empresas com produtos

educacionais e até mesmo escolas que criaram um programa STEAM, como descreve Lopes

(2017). Um exemplo é o programa bilíngue da International School, com surgimento em 2006

em Fortaleza – CE, que manifesta utilizar STEAM education como metodologia. Já em termos

de programa educacional voltado para a rede pública, um dos exemplos é o STEM Brasil, é

uma iniciativa que veio dos EUA através da World Fund, cuja atuação se dá em escolas através

de suporte como formação de professores, disponibilização de currículos e material didático. A

World Fund, segundo dados do próprio programa, já trabalhou com mais de 2500 professores

e influenciou diretamente 316 mil alunos de escolas públicas brasileiras. A principal estratégia

do programa é o estabelecimento de parcerias com as secretarias estaduais de educação para

oferecer os cursos aos professores. É curioso notar que se trata de uma organização não-

governamental originalmente estadunidense, portanto, trata-se de um programa importado.

Além da World Fund, existe o Code Club Brasil, que não se intitula como um programa STEM,

mas desenvolve atividades cujo objetivo é ensinar programação para crianças de escolas

públicas no ensino fundamental. Segundo o site do programa, a abrangência é de quase 200 mil

escolas só no Brasil. É importante destacar que há também algumas empresas brasileiras

oferecendo produtos educacionais em uma linha muito próxima com os princípios STEM

education, usando inclusive as mesmas terminologias, mas sem apresentar-se como parte do

movimento (MUNDO MAKER, 2017).

Em termos de políticas de financiamento STEM, a CAPES e o Conselho

Britânico/Fundo Newton lançaram um edital em 2015 chamado Programa de Cooperação

Internacional STEM, cuja proposta era financiar estágios em programas STEM no Reino Unido

para pesquisadores brasileiros que pudessem, ao retornar, implementar programas e fomentar

iniciativas em STEM.

Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências; Ensaio: Pesquisa em Educação em Ciências; Ciência e Ensino; e Alexandria. 15 Por exemplo: (Diniz, 2016; Gomes, 2013, 2015; Lopes, 2017; Santos, 2014).

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O desenvolvimento ainda incerto do STEM education no Brasil não significa que

sua febre internacional apenas tangenciou o país. Muito pelo contrário, há muito significado

nessa baixa expressividade de programas STEM education no Brasil, quando comparado com

outros países. A partir de nosso levantamento, o que parece haver é uma incorporação incipiente

dessa tendência e concentrada em alguns grupos da rede privada de ensino básico, escolas

privadas bilíngues, escolas de programação e robótica para crianças, iniciativas isoladas em

algumas escolas públicas e algumas organizações educacionais. Nesses casos, STEM é

apresentado como uma metodologia que embasa as atividades escolares. Entretanto, a mais

recente reforma curricular do Ensino Médio aprovada na forma de Projeto de Lei de Conversão

(PLV 34/2016) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) prevista para entrar em vigor a

partir de 2019, foram embasadas e justificadas por sistemas educacionais de outros países,

incluindo os EUA (BRASIL, 2016; RIGHETTI, 2017; TAKAHASHI, 2017), mesmo assim não

fazem referência direta ao movimento de STEM education. Um questionamento que surge a

partir disso é se O Brasil tende a seguir essa tendência, e da mesma maneira com que ocorre

nos EUA, em algum momento? Essa questão exige uma intensa análise de no mínimo quatro

tópicos:

As políticas públicas educacionais recentes e atuais;

O tipo de mão-de-obra e conhecimento técnico-científico demandado pela

indústria e setores econômicos brasileiros;

O grau de atualização e alinhamento do sistema educacional brasileiro com os

sistemas educacionais de outros países;

Os fatores culturais e sociais, além da influência da mídia, que fazem com que a

sociedade brasileira não tenha sido STEMatizada.

Apesar de não ser objetivo desse artigo responder essas questões ou analisar esses

tópicos, algumas considerações podem ser feitas. Na história da educação brasileira, não é

novidade a importação de modelos educacionais estrangeiros. STEM education é uma

tendência global que aos poucos se dissemina no Brasil, ainda que inicialmente através de

escassos programas educacionais, iniciativas independentes, ou de tímidas políticas públicas,

como é o caso do Programa de Cooperação Internacional STEM da CAPES. Mas talvez por

se tratar de uma economia que mais consome do que produz tecnologia, além do carro-chefe da

indústria brasileira não ser a tecnologia, a demanda explícita por STEM education ainda não

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seja percebida. Para Ritz e Fan (2015) o movimento talvez não se materialize em muitos países,

porque pode não ser apropriado para determinadas culturas, no caso, econômicas.

Indiretamente, todavia, o Brasil valoriza cada vez mais as áreas STEM, como é o

caso da reforma curricular do Ensino Médio, que prioriza um ensino técnico e

profissionalizante, ainda que não seja explicitamente aderindo ao movimento STEM. No

Ensino Superior e no Ensino Básico, há uma clara valorização das áreas “estratégicas” ou

“fundamentais”, como são comumente designadas as áreas STEM, ao passo que há a

desvalorização e sucateamento das áreas humanas e ciências sociais. Os grandes programas de

apoio ao ensino público são voltados principalmente para essas áreas STEM, mesmo que não

se declarem programas STEM education, como é o caso do Ciências sem Fronteiras. Nas

universidades e nos recém-criados Institutos Federais, há um claro contraste entre as áreas

tecnológicas e as áreas humanas em termos de distribuição de recursos, o que coincide

exatamente com os princípios do funcionamento do STEM education nos EUA, principalmente,

em que as mudanças curriculares ocorrem no sentido de atender demandas do setor econômico.

Em termos de percepção pública dos brasileiros em relação à Ciência e Tecnologia

(C&T), a partir de uma pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, pode-se dizer

que o brasileiro se mostra dentre os mais positivos e otimistas em relação à C&T, quando

comparado com diversos países. Por exemplo, 61% dos brasileiros se declaram muito

interessados ou interessados em C&T, percentual maior que os 53% registrados na União

Europeia (EU) em 2013. A grande maioria dos brasileiros (73%) declara acreditar que C&T

traz “só benefícios” ou “mais benefícios do que malefícios” para a humanidade. Os cientistas

ligados a instituições públicas têm o nível mais alto de confiança entre os atores sociais

pesquisados (Militares, médicos, políticos, jornalistas, escritores, religiosos) (MINISTÉRIO

DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA, 2015). Quando perguntados se os brasileiros acreditam

que os investimentos em C&T deveriam aumentar, os resultados são ainda mais positivos em

relação à C&T, destoando muito dos demais países pesquisados, como mostra a figura 2:

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Figura 2: Percepção sobre os investimentos em C&T. Adaptado de: MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA, 2015

Apesar da população brasileira ter uma visão muito positiva em relação à C&T, os

resultados da última avaliação do PISA (Programme for International Student Assessment) em

2015, ou qualquer outro ano, mostram que o desempenho escolar das crianças brasileiras em

ciências não é tão positivo. O desempenho médio dos estudantes brasileiros em ciências, 401

pontos, é significativamente abaixo da média dos países da OCDE (Organization for Co-

operation and Development) que é 493 pontos. A diferença é ainda mais acentuada em

matemática: (377 pontos para os estudantes brasileiros, e 490 pontos para a média da OCDE)

(OECD, 2016). Assim como os adultos, a população de 15 anos participante do PISA 2015

revelou alto interesse em seguir carreiras na área de ciências: 40% dos alunos brasileiros,

enquanto a média da OECD é 25% (OECD, 2016).

Essas comparações mostram que a C&T possuem um enorme prestígio na

sociedade brasileira, ao passo que o ensino de ciências e matemática é extremamente defasado

em relação aos outros países da OCDE. Como já foi explorado anteriormente, é com base

justamente a partir dos resultados do PISA e outros indicadores que países como EUA e

Austrália desenvolveram suas corridas para o STEM education. A partir desses dados, é

possível especular que a ideia por trás de STEM education tem suporte no Brasil antes mesmo

de existir como um movimento declarado. A visão positivista da ciência, o otimismo

tecnológico e os baixos resultados no PISA, bastante presentes nas justificativas das políticas

STEM pelo mundo, já são um pré-requisito cumprido pelo país. Medidas como a reforma do

0,0% 20,0% 40,0% 60,0% 80,0% 100,0%

Brasil (2015)

Finlândia (2010)

Reino Unido (2010)

Alemanha (2010)

Portugal (2010)

Itália (2010)

Suécia (2010)

França (2010)

Argentina (2012)

EUA (2012)

Comparação sobre a opinião a respeito dos investimentos em C&T, 2015 (Adaptado)

Aumentar Manter Diminuir Não Sabe/Não Respondeu

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ensino médio têm espaço para serem muito bem recebidas pela população, afinal, é de comum

acordo que a educação para ciências e matemática precisa de reformas.

Fato é que, em uma pesquisa nacional encomendada pelo Ministério da Educação

ao IBOPE, em 2016, observou-se que 72% da população aprova a Reforma do Ensino Médio

(MPV 746/2016), e que 70% dos entrevistados acredita que os alunos devem poder escolher

pelo ensino técnico profissionalizante ou optar pelas matérias que querem cursar. Isso mostra

que há muito a se refletir sobre a percepção pública sobre o papel da escola. Uma educação

profissionalizante ou que direcione os alunos para as áreas STEM, como é discutido por Reiss

e Mujtaba (2017) e Aldemir (2016), tem ampla margem de possibilidade para ocorrer no Brasil,

seja pela aprovação política, seja pela aprovação popular. Se compreendermos o movimento

STEM education como sendo fruto de uma tendência contemporânea e global de valorização

dessas áreas, vemos que o Brasil segue essa tendência, mesmo que sem ser um signatário

declarado do movimento STEM education.

Dado esse panorama no qual o STEM se encontra, é válido buscar maneiras de se

compreender profundamente seu real significado e impacto no Brasil. As interpretações dessa

tendência estão longe de serem esgotadas, principalmente do ponto de vista da pesquisa

educacional em ciências. Portanto, apresentamos a seguir as duas questões que buscamos

desenvolver.

3.6. Dentro da pesquisa em Ensino de Ciências, qual a caracterização mais

precisa que se pode fazer de STEM education?

Nessa primeira questão, na esfera da pesquisa em ensino de ciências, não há

consenso em relação ao que representa STEM education (BREINER et al. , 2012; BELL, 2016;

RADLOFF; GUZEY, 2016; WONG et al. , 2016). Para Bell (2016, p. 65), “STEM is

understood to be a human construct, rather than as a ‘fixed’ body of knowledge and, therefore,

is subjective and open to constant interpretation, construction and reconstruction by the

individual.”16 Breiner et al. notam que a interpretação do movimento é difusa e alterna de

acordo com a perspectiva em questão:

Generally speaking, most stakeholders who hold interests in promoting STEM

would claim to understand the meaning, yet the finer points of this construct

16 STEM é entendido como uma construção humana, e não como um corpo de conhecimento "fixo" e, portanto, é subjetivo e aberto a uma constante interpretação, construção e reconstrução pelo indivíduo. (BELL, 2016, p. 65) [Tradução livre]

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often cause confusion. Stakeholders may include government officials who

are allocating billions of dollars into this enterprise, teachers in the K-12

system who are expected to teach STEM to their students, parents who may

struggle to understand the need for different pedagogies and curricula,

businesses that need to invest in their future employment pipeline, and of

course the students who are ultimately the product of these efforts. (BREINER

et al. , 2012, p. 3) 17

Dessa forma, apresentamos possíveis dimensões que STEM education pode

adquirir. A partir de uma perspectiva do campo educacional, identificamos ao menos quatro

principais direções, não mutuamente excludentes, nessa representação de STEM education. A

figura 3 representa essas quatro possíveis direções.

Figura 3 – Possíveis interpretações que o movimento STEM education pode assumir

(1) Na primeira direção, STEM education pode ser visto como sendo apenas uma

abordagem ou metodologia (BECKER; PARK, 2011; KELLEY e KNOWLES, 2016; GAMSE

et al. , 2017). Nesse método, a aprendizagem ocorre a partir da interação com o objeto de estudo,

no estilo hands on. STEM education estaria mais ligado a uma forma de se ensinar ciências,

cujo método é baseado em solução de problemas (Problem Based Learning), desafios e

construção de protótipos. Enquanto metodologia, não necessariamente ela é única. É possível

notar discrepância no que diz respeito a como deve ser conduzida, como vimos no caso do

STEM integration, em que a maneira pela qual as disciplinas interagem ainda carece de

17 Em termos gerais, a maioria dos interessados em promover STEM atestariam que compreendem o significado,

ainda que os pormenores desse construto sempre causem confusão. Esses interessados incluem representantes do governo que alocam bilhões de dólares nessa empreitada, professores de ensino básico que esperam ensinar STEM para seus alunos, pais que se debatem para compreender a necessidade de novos currículos e pedagogia, negócios que tendem a investir nos seus futuros empregados e, é claro, os estudantes, que são finalmente os produtos desses esforços. (Breiner et al. , 2012, p. 3) [Tradução livre]

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discussão (BECKER; PARK, 2011; HONEY et al. , 2014; ENGLISH, 2016; KELLEY;

KNOWLES, 2016). Honey ressalta:

Despite the arguments for making connections across the STEM disciplines

and the increased number of efforts to design learning experiences that will

foster such connections, there is little research on how best to do so or on

whether more explicit connections or integration across the disciplines

significantly improves student learning, retention, achievement, or other

valued outcomes. (HONEY et al. , 2014, p. 22)18.

(2) Na sua segunda direção, STEM education pode ser encarado como um currículo

de ciências incrementado. Nesse aspecto, a diferença é que o currículo STEM incorpora

competências como programação e conceitos da engenharia e design, comumente ausentes no

ensino básico. Se encarado como uma metodologia ou um currículo, possui uma dimensão

menor e restrita a uma abordagem de ensino de ciências. Não trataria, portanto, de ações

ideologicamente coordenadas em um plano político-pedagógico complexo nem seria motivado

por fatores externos à escola, como é possível ocorrer em muitas situações nas quais o

movimento STEM está presente. Esse seria o caso, por exemplo, de programas educacionais

cujo objetivo é atuar nas aulas de ciências das escolas envolvidas com um currículo STEM, ou

de algumas escolas privadas que manifestam a utilização de um currículo STEM, mas que seus

impactos são restritos ao grupo que atendem. As consequências geradas por esses programas,

como a melhoria do ensino de ciências, capacitação de professores ou aumento do interesse de

crianças pelas aulas de ciências, são indiretas no sentido de que não são fruto de uma mudança

legislativa ou do estabelecimento de um parâmetro curricular nacional, nem têm a pretensão de

se tornarem políticas públicas ou de serem sistematicamente expandidas. Ocorrem mudanças

sociais na população envolvida, mas no sentido de reparo dos problemas gerados pelo sistema

educacional vigente. Afinal, não se trata de mudanças na macroestrutura que interferem na sala

de aula em última instância.

(3) A terceira representação que STEM education pode assumir é a de política

pública, a qual visa criar um contingente de professores e profissionais STEM e direcionar os

alunos para essas áreas. Pode estar vinculada ou não à escolha de um novo modelo educacional,

ou seja, tratar-se-ia de uma política pública educacional com influência em outros domínios,

como o currículo escolar, ou ser restrita apenas a ações de capacitação de professores STEM.

18 Apesar dos argumentos para se criar conexões entre as disciplinas STEM e dos crescentes esforços para desenhar experiências de aprendizagem que irão promover tais conexões, há pouca pesquisa sobre a melhor forma de fazer isso ou se conexões mais explícitas e integração ao longo das disciplinas melhora significativamente a aprendizagem dos estudantes, retenção, realizações, ou outros resultados importantes. (HONEY et al., 2014, p. 22). [Tradução livre]

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Nos EUA, Reino Unido e Austrália, esse viés de política pública é claramente perceptível, pois

são inúmeras as ações vindas do poder público (MARGINSON et al, 2013; OBAMA, 2014;

RITZ; FAN, 2015; THE WHITE HOUSE, 2016; WONG et al, 2016; REISS; MUJTABA,

2017).

É importante notar que enquanto política pública, acaba englobando as outras duas

representações: atua-se modificando o currículo e a metodologia para atingir determinados fins.

E, se adotarmos essa concepção, é possível argumentar que não se trata apenas de uma política

pública educacional, mas de uma política educacional-econômica. Motivados principalmente

pelos índices de oferta de trabalho em setores STEM, há um claro senso de que STEM é a casa

de máquinas e deve ser privilegiado nas políticas educacionais e receber mais investimento do

que as humanidades. Diversos governadores, políticos e até mesmo o ex-presidente Barack

Obama adotaram declaradamente esse discurso (JASCHIK, 2011; KILEY, 2013; JASCHIK,

2014; THE EDITORS, 2016). Esse investimento tem se traduzido em recursos tecnológicos,

equipamentos de laboratório e materiais de consumo escolares, cursos de capacitação de

professores e até mesmo espaço na agenda política. Inclusive, já foram criadas

aproximadamente 100 escolas secundárias especializadas em STEM em 32 Estados nos EUA

de acordo com o NCSSS (2017), um consórcio criado para estimular a criação dessas escolas e

propostas STEM.

Em uma outra face dessa política pública STEM é preciso mencionar que diversas

organizações se valem do STEM education para promover justiça social através de programas

educacionais voltados especificamente para minorias não representadas em áreas STEM, como

é o caso do programa MESA (Mathematics, Engineering and Science Achievement), e o MWM

(Million Women Mentors) entre muitos outros. Essa estratégia para diminuir as diferenças

sociais foi amplamente utilizada pelo governo de Barack Obama através do financiamento

dessas organizações (THE WHITE HOUSE, 2016). O raciocínio nesse caso é que mulheres,

negros, asiáticos e latinos não seguem essas carreiras por falta de acesso, oportunidades,

equidade e diversas barreiras, além do fato de que sofrem com a desigualdade salarial e

preconceito entre outras questões, quando atuam em áreas STEM, tradicionalmente

representadas por maioria branca e do sexo masculino. Considerando que essas áreas são a via

para a promoção da igualdade social e que são justamente as mais bem remuneradas e de maior

prestígio social, organizações, corporações e o Estado estabelecem ações pró minorias na

tentativa de reverter essa desigualdade.

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Por outro lado, ainda do ponto de vista de justiça social, críticos veem que STEM

education pode ao mesmo tempo servir para reforçar estigmas e estratificações sociais já

existentes, ou seja, acaba por reforçar a desigualdade no acesso às carreiras STEM. Isso porque

as medidas tomadas em direção à disseminação de STEM tendem a favorecer apenas essa classe

já privilegiada (BASILE; LOPEZ, 2015), enquanto que os programas que tentam reverter esse

quadro não são suficientemente apoiados (RINCON et al. , 2014). Rincon et al., (2014)

examinaram 48 programas STEM, cujo público-alvo é a população não representada nessas

áreas, e constatou que, apesar da mensagem de equidade ser difundida como lema pelas

instituições, os níveis de suporte e investimento dos administradores colocam essa questão em

cheque.

Wong et al (2016) mostra que, para muitos educadores, apesar dos argumentos de

justiça social serem mais importantes que os argumentos econômicos, o suporte para

diversidade presente nos documentos oficiais não foi operacionalizado de fato, nem parece ter

havido algum esforço para definir objetivos ou melhorias. Para os autores, “It is difficult, to say

the least, to deliver effective education for all based on the needs of an industry that will

ultimately employ only a tiny proportion of each cohort, yet this research suggests that the

impact of organizations which were involved in the STEM policy network is ongoing and even

increasing”19 (WONG et al, 2016, p. 2362).

(4) Por fim, na quarta direção que STEM education assume, é possível que seja

encarado como um modelo pedagógico de ensino de ciências ou um modelo educacional.

Afinal, se é possível reconhecer no movimento STEM education uma clara visão do papel

político pedagógico da escola, metodologia, ideologia, proposta de currículo, ciência, etc.,

distintos dos modelos existentes, tudo indica que estamos tratando de um modelo insurgente,

seja ele educacional ou pedagógico. Ou, mesmo que não seja distinto, seria possível reconhecer

suas similitudes com os modelos já existentes. Fernandes (2015) analisa e descreve seis

modelos pedagógicos de ensino de ciências no Brasil, que seriam: Tradicional, Redescoberta,

Tecnicista, Construtivista, Sociocultural e Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS), e distingue

modelos pedagógicos e modelos educacionais da seguinte forma:

Modelos Educacionais são formulações de quadros interpretativos baseados

em pressupostos teóricos utilizados para explicar ou exemplificar as ideias

educacionais e servem de referência para se refletir sobre o fenômeno

educativo em sua totalidade. Modelos Pedagógicos são formulações de

19 É difícil, para dizer o mínimo, oferecer uma educação eficaz para todos com base nas necessidades de uma indústria que, em última análise, empregará apenas uma pequena proporção de cada parte, embora essa pesquisa sugira que o impacto das organizações envolvidas na rede política STEM esteja em movimento e até mesmo progredindo. (WONG et al, 2016, p. 2362) [Tradução livre]

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quadros interpretativos baseados em pressupostos teóricos utilizados para

explicar ou exemplificar as ideias pedagógicas e servem de referência e

parâmetro para se entender, reproduzir, controlar e/ou avaliar a prática

pedagógica, entendida como uma parte do fenômeno educativo.

(FERNANDES, 2015, p. 26–27)

A autora acrescenta ainda que os modelos pedagógicos sofrem influência dos

modelos educacionais, uma vez que este último tem maior amplitude e é mais abstrato,

enquanto o segundo é mais localizado e focado na prática pedagógica. Modelo pedagógico de

ensino de ciências é entendido aqui, portanto, como um recorte do todo, que seria o modelo

educacional.

Nessa perspectiva de modelos, STEM education tem a dimensão de um modelo

educacional no qual as lideranças políticas se apropriam e, a partir dele, transformam todo o

sistema educacional para além do ensino de ciências; ou, em uma dimensão mais restrita,

constitui-se como um modelo pedagógico de ensino de ciências cuja revolução se dá no

âmbito do ensino de ciências?

Quando se trata de privilegiar STEM em detrimento de humanidades, ou de assumir

que todas as crianças devem ser letradas em STEM para atender às demandas do séc. XXI e

que o ensino deve ser profissionalizante, estamos falando de um modelo de educação

assumido20. Isso ocorre da mesma forma se adota a metáfora de pipeline nas ações pró STEM:

diplomas de doutorado e carreiras em ciência se transformam nos objetivos da educação

(SVINTH, 2006; BANNING; FOLKESTAD, 2012). Por outro lado, quando se trata de uma

reforma curricular e metodológica do ensino de ciências, essa mudança está, de certa forma,

delimitada à dimensão do ensino de ciências como modelo pedagógico. Características como a

incorporação da tecnologia e da computação no currículo, o uso de situações-problema

baseadas em desafios ambientais e globais e a integração de diferentes áreas, entre outras

evidências, levam a crer que STEM education é muito próximo do modelo pedagógico CTS. Já

as demandas que o setor econômico imprime no movimento, como a formação

profissionalizante, aproximam-no do modelo pedagógico tecnicista.

Zeidler nota que

(…) STEM education presently advocated, fails to be embedded in a coherent

developmental or sociological framework that explicitly considers the

psychological and epistemological growth of the child and ignores the

development of character or virtue (…). Missing, is explicit attention to

20 O trecho de um discurso do ex-presidente Barack Obama ilustra esse modelo: “Nós temos que assegurar que todas as nossas crianças estarão preparadas para os empregos do futuro – o que significa não somente estar apto a trabalhar com computadores, mas desenvolver habilidades analíticas e de programação para suprir nossa economia de inovação. Na nova economia, a ciência da computação não é uma habilidade opcional – é uma habilidade básica (...).” (The White House, 2016, p. 1) [Tradução livre]

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socioscientific and sociocultural perspectives central to forming a fully

developed sense of scientific identity that necessarily entails the enactment of

moral responsibility. (ZEIDLER, 2016, p. 16)21

Para a autora, falta no modelo STEM, a preocupação com as questões éticas e

sociais da ciência, bem como uma preocupação com a literacidade científica e a construção do

conhecimento sobre a natureza da ciência. Não é por coincidência que se nota, como já

abordado, um otimismo tecnológico, visão determinista da ciência e positivista (FEINSTEIN;

KIRCHGASLER, 2015). Para Gough (2014), parece persistir a ideia de que o desenvolvimento

futuro e as aplicações da ciência e tecnologia são a salvação de problemas encarados pela

sociedade e governos. Prevalece uma abordagem instrumentalista: “This approach to STEM

education is similar to the instrumentalist approach to environmental education (…) where the

accepted role of education was as a tool for achieving environmental goals”22 (GOUGH 2014,

p. 450). Nesse caso, na tríade Ciência-Tecnologia-Sociedade, o último componente tem um

papel figurativo, pois não se reconhece a tecnologia e a ciência como processos sociais

complexos. A função de ilustrar o conteúdo é notada por Santos (2007) como presente em

muitos currículos CTS. Da mesma forma, reforça-se a ideia de neutralidade da ciência e a da

não-subjetividade das descobertas científicas. Faltam os aspectos socioculturais e

sociocientíficos centrais para a formação de um senso de identidade científica que

necessariamente implica a promulgação da responsabilidade moral, de acordo com Zeidler

(2016). Tais aspectos, diga-se de passagem, são principais no modelo pedagógico sociocultural.

Toda essa configuração do movimento STEM education coloca em cheque uma

possível aproximação com o modelo CTS e conduz à hipótese de que se trata de um novo

modelo híbrido, com elementos CTS e tecnicista ao mesmo tempo. CTS em seu argumento,

tecnicista em seu contexto de sociedade. Acrescido de uma abordagem que exalta bastante as

ideias de maker, design inovador e mão na massa.

3.7. Como o movimento STEM education pode contribuir com o desenvolvimento do ensino de ciências no Brasil?

21 A educação do STEM atualmente defendida falha em não se inserir em um quadro de desenvolvimento ou sociológico coerente que considere explicitamente o crescimento psicológico e epistemológico da criança e ignore o desenvolvimento de caráter ou virtude (...). Falta uma atenção explícita às perspectivas socio-científicas e socioculturais, centrais para formar um senso plenamente desenvolvido de identidade científica que implica necessariamente a promulgação de responsabilidade moral. (ZEIDLER, 2016, p. 16) [Tradução livre] 22 Esta abordagem da educação STEM é semelhante à abordagem instrumentalista da educação ambiental (...) na qual o papel aceito da educação é como uma ferramenta para alcançar objetivos ambientais. (GOUGH 2014, p. 450). [Tradução livre]

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Em relação à segunda questão, sobre como o movimento STEM education pode

contribuir com o desenvolvimento do ensino de ciências no Brasil, é preciso primeiro observar

o que a experiência em STEM tem a nos ensinar.

Ninguém parece discordar (felizmente) que é preciso uma revolução no ensino de

ciências, de que a tecnologia e engenharia precisam ser incorporadas em sala de aula, ou de que

é preciso inserir métodos de aprendizagem mais participativos e contextualizados na realidade

das crianças. Zeidler (2016, p. 14) traz que: “(…) Science needs to be more interesting and

relevant — but for all global citizens whose everyday actions and decisions will inevitably

impact all. That many students find science to be impersonal, irrelevant and removed from their

immediate lives is unfortunate.”23 No entanto, a partir de nossa revisão da literatura, pode-se

dizer que há duas críticas predominantes: uma está na visão de ciência disseminada, conforme

já trabalhado nesse artigo, e é bem sintetizada por Feinstein e Kirchgasler:

What concerns us, in particular, is the possibility that science education will

advance an oversimplified idea of sustainability that diminishes its social and

ethical dimensions, exaggerating the role of technology and the importance of

technical expertise at the expense of non-STEM (science, technology,

engineering, and mathematics) disciplines and nontechnical expertise.24

(FEINSTEIN; KIRCHGASLER 2015, p. 123)

A outra crítica reside na implementação. Para Breiner (2012), a reforma

educacional STEM é mais uma das que falharam. Ela é pervasiva, mas sem foco comum. Na

sua implementação, as disciplinas STEM foram trabalhadas da forma tradicionalmente

individualizada, com pouca integração com outras disciplinas e de forma pouco relevante para

os estudantes. Para Gough (2014, p. 53), as ações muitas vezes não levam em conta que “the

teachers may not be prepared for or confident in handling such approaches in the classroom.”

Blackley e Howell (2015) colocam que:

Two key reasons for lack of success for STEM education as a concept to be

implemented were (1) the curriculum structure, and (2) the skill level and/or

reparation of the teachers. These two issues lie at the heart of why STEM

initiatives have failed, and continue to fail, to achieve the expectations placed

upon them25. (BLACKLEY; HOWELL, 2015, p. 106).

23 A ciência precisa ser mais interessante e relevante - mas para todos os cidadãos globais cujas ações e decisões cotidianas inevitavelmente afetarão todos. Que muitos estudantes acham a ciência como impessoal, irrelevante e removido de suas vidas imediatas é infeliz. (ZEIDLER, 2016, p. 14) [Tradução livre] 24 O que nos preocupa, em particular, é a possibilidade de que a educação científica promova uma ideia simplificada de sustentabilidade que diminua suas dimensões sociais e éticas, exagerando o papel da tecnologia e a importância do conhecimento técnico à custa de disciplinas não-STEM e conhecimentos não técnicos. (FEINSTEIN; KIRCHGASLER 2015, p. 123) [Tradução livre] 25 Dois motivos fundamentais para a falta de sucesso para a educação STEM como um conceito a ser implementado foram (1) a estrutura curricular, e (2) o nível de habilidade e/ou a reparação dos professores.

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Alguns autores trazem à tona as escassas conquistas do movimento STEM em

relação à qualidade do ensino, à inclusão e a uma melhor compreensão da ciência. Boa parte

dos estudos que partem de perspectivas sociológicas trazem um posicionamento crítico, por

vezes avesso, aos resultados que o movimento STEM tem produzido na sociedade, entre eles a

manutenção da desigualdade (BLACKLEY; HOWELL, 2015; WONG et al, 2016), racismo

(BASILE; LOPEZ, 2015) e desigualdade de gênero (SADLER et al. , 2012; GOUGH, 2014).

Ou, como é o caso de Blackley e Howell (2015), que são contundentes ao afirmar que mesmo

após bilhões de dólares investidos e a criação de inúmeros programas, ao longo das últimas

décadas os EUA, por exemplo, não apresentou sequer sinais de melhora no ensino de ciências

e matemática, avaliados pelo PISA.

There are declining results in the PISA scores (Programme for International

Student Assessment) particularly in areas that focus on the application of

STEM knowledge; and there is an apparent inability of primary school

teachers to robustly teach all of the STEM subjects (Marginson et al., 2013).

This is despite more than 14 years of STEM promotion and funding. This is a

remarkable statistic and belies why STEM has persisted as a strategy.

(BLACKLEY; HOWELL, 2015, p. 106)26

Mesmo quando se defende que a falta de STEM integration como metodologia é a

causa para o insucesso do movimento STEM, há estudos que contestam isso. Eles atestam que

poucas evidências suportam essa tese, ou que a própria metodologia STEM integration é

implementada de modo ineficaz (ENGLISH, 2011; HONEY et al, 2014). Aparentemente, o

discurso sobre a interdisciplinaridade se faz presente, mas restrito ao nível superficial. Blackley

e Howell (2015) trazem, por exemplo, que STEM se faz SteM nas escolas e sTEm fora delas.

A partir desse cenário, a próxima questão é refletir sobre qual tipo de reforma

STEM education beneficiará nosso sistema educacional. É preciso incorporar a Educação

Ambiental que não seja instrumentalista e baseada no otimismo tecnológico. Como nota Gough

(2014. P. 453) “Scientists firmly believe that as long as they are not conscious of any bias or

political agenda, they are neutral and objective, when in fact they are only unconscious27.” O

Essas duas questões estão no cerne de porque as iniciativas STEM falharam, e continuam a falhar, para alcançar as expectativas colocadas sobre elas. (BLACKLEY; HOWELL, 2015, p. 106) [Tradução livre] 26 Existem resultados significativos nas pontuações PISA, especialmente em áreas que se concentram na aplicação do conhecimento STEM; e há uma aparente incapacidade de professores da escola primária ensinar de forma robusta todos os assuntos do STEM (Marginson et al., 2013). Isso, após 14 anos de promoção e financiamento STEM. Esta é uma estatística notável e desmente porque o STEM persistiu como uma estratégia. (Blackley; Howell, 2015, p. 106). [Tradução livre] 27 “Os cientistas acreditam firmemente que, enquanto não estiverem conscientes de qualquer polarização ou agenda política, são neutros e objetivos, quando na verdade eles são apenas inconscientes.” (Gough, 2014, p. 453)[Tradução livre]

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caminho parece seguir uma associação entre a perspectiva sociocultural e a CTS. Zeidler

(2016), por exemplo, defende a integração de STEM em um modelo sociocultural holístico para

que não se produza outra geração de cientistas desinteressados, desengajados e desinformados.

Fato é que não nos beneficiará uma reforma STEM com princípios do modelo CTS, mas que

seja praticada como CTs.

Da mesma forma, não nos beneficiará o modelo de STEM education voltado para

justiça social em que se defenda a inclusão no STEM como um benefício para a economia do

país, mas sim um que se paute em benefícios para as próprias minorias, em como essas minorias

podem usufruir do acesso às áreas STEM, algo que é realizado através da alfabetização

científica e tecnológica. Um desses inúmeros benefícios é estar apto para acessar a

confiabilidade das alegações científicas relevantes para a tomada de decisão pessoal e social,

de acordo com Allchin (2014).

Ainda, segundo Santos e Mortimer (2002),

É preciso compreender, também, o contexto dos países em que as propostas

curriculares de CTS foram desenvolvidas. Por se tratar de países

desenvolvidos, a estrutura social, a organização política e o desenvolvimento

econômico são bastante diferentes daqueles presentes no contexto brasileiro.

Isso implica que seria um contra-senso a transferência acrítica de modelos

curriculares desses países para o nosso meio educacional. (SANTOS;

MORTIMER, 2002, p. 17)

3.8. Considerações

É cedo para falar que STEM irá ocupar parte do vocabulário dos professores no dia-

a-dia. Porém, não é razoável afirmar que não há o menor indício de que o movimento, aquele

herdado de outros países (em especial os EUA), apresenta sinais de vida no Brasil. Conforme

discutimos, STEM education é e faz parte de uma tendência global ao mesmo tempo, e essa

tendência precisa ser encarada e pesquisada para além da terminologia.

Aderir ao movimento STEM não é a solução para os problemas no ensino de

ciências. Haja visto que países que apresentam consistentemente excelentes resultados em

ciências e matemática avaliados pelo PISA, não fazem de STEM education uma bandeira.

Porém, principalmente em seu caráter inovador e de incorporar a tecnologia e a engenharia no

ensino, alguns aspectos do movimento têm muito a contribuir com a educação pública

brasileira, que é extremamente anacrônica nos conteúdos e tradicionalista nos princípios

pedagógicos.

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Por mais que STEM education tenha todos os indícios de uma reforma neoliberal

(HOEG; BENCZE, 2017), no seu ponto final, a sala de aula, é possível tirar proveito de sua

forma e construir uma educação em ciências mais voltada para o desenvolvimento humano,

ético e cognitivo das crianças. É preciso reconhecer o que se tem de positivo nessas propostas

STEM em termos de melhoria para o ensino de ciências, para sermos capazes de direcionar o

movimento para uma reforma positiva. Principalmente quando entendemos sua forte origem

neoliberal, a qual pode se traduzir em práticas agressivas de auto disseminação nos sistemas

educacionais.

Além disso, é muito importante acompanhar e dimensionar os programas STEM

education já em atividade no Brasil e identificar a relação que eles têm com a tendência

internacional, sobretudo estadunidense, bem como as políticas públicas que se aproximam da

tendência STEM education.

* * *

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Capítulo 4: Análise dos programas educacionais MESA e ACES

Este capítulo apresenta os dados obtidos durante a pesquisa e suas respectivas

análises. Conforme discutido na seção de metodologia, os documentos, os questionários e as

observações realizadas junto aos dois programas serão colocadas em debate e examinadas de

acordo com a técnicas convenientes. No programa ACES, a investigação se aprofundou no

sentido dos parâmetros que pudemos observar (aulas, atividades, tempo de acompanhamento,

situações informais e não monitoradas, reuniões, formações, etc.), ao passo que no programa

MESA a investigação foi mais ampla no sentido do número de professores que conseguimos

aplicar o questionário e do tamanho da estrutura organizacional avaliada. A percepção do perfil

da organização é muito mais clara no programa MESA, dada sua trajetória, enquanto a

compreensão da escola e das relações entre as pessoas no programa ACES são mais evidentes

dada nossa proximidade com essa realidade.

Sendo assim, iniciaremos com seções separadas para cada um dos programas. Para

o programa MESA, trazemos a análise documental dos objetivos e da missão institucional. Na

sequência, para o programa ACES, traremos a análise dos relatórios de atividades. Fazemos

essa separação porque os objetivos e da missão institucional só foram observados no programa

MESA, enquanto que os relatórios de atividades só foram analisados no programa ACES. Já as

demais fontes de dados – observação das práticas e questionários aplicados –serão discutidas

de modo conjunto para os dois programas, pois foram observadas em ambos.

4.1. Objetivos e missão institucional do programa MESA

Uma das formas de compreender a dinâmica das várias unidades do programa

MESA nos EUA é através da análise da missão institucional do programa. Como mencionado,

o programa está presente em 11 estados nos EUA, cada estado possui seu centro operacional

que trabalha de modo independente dos demais, como em uma autarquia, embora compartilhem

dos mesmos objetivos e princípios. Cada um desses centros estaduais do programa possui uma

apresentação da missão institucional disponível nas páginas eletrônicas de divulgação dos

centros, são informações como Quem somos, O que fazemos e Nossa missão (em inglês: About

us/Who we are e Mission/Vision). Foi feito uso dessas informações, selecionando-as para serem

analisadas de modo comparativo. Partimos de uma seleção delas, disponibilizadas por 5 centros

do programa: Washington, Califórnia, Oregon, Novo México e Maryland. Essas informações

foram reunidas e estão apresentadas no quadro 1.

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Utilizando a técnica de análise de conteúdo e tomando Franco (2005) como

referencial teórico, foi realizada uma leitura preliminar dessas informações e em seguida elas

foram classificadas em categorias criadas a posteriori, conforme a recorrência. Escolhemos

como unidade de análise diferentes temas que aparecem nos documentos analisados. As

categorias de análise foram determinadas respeitando os princípios da exclusão mútua,

pertinência e objetividade (FRANCO, 2005), buscando representar os aspectos que mais

interessam na análise dos programas educacionais sob a luz dos modelos pedagógicos.

A tabela 2, a seguir, mostra as categorias criadas e inclui o número de ocorrências

nos documentos analisados.

Categorias de análise Ocorrências

Foco ou direcionamento em carreiras STEM 17

Promoção de justiça social 13

Tradição do programa ou seu estabelecimento como modelo 14

Ações, programas e como é operacionalizado 13

STEM education como caminho para justiça social ou como modelo correto 6

Excelência educacional ou foco em melhoria do sistema educacional 5

Necessidade de mão de obra STEM ou competências do séc. 21 4

Produzir força de trabalho competitiva 3

Tabela 2: Categorias de análise criadas e respectivas ocorrências de acordo com os enunciados apresentados na quadro 1.

Page 64: GUSTAVO OLIVEIRA PUGLIESE - Unicamp · a descrição desses modelos pedagógicos, a partir de nossa releitura dos mesmos. A busca por esses modelos presentes nos programas ACES e

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Quadro 1: Informações sobre o programa MESA obtidas nas páginas eletrônicas dos centros do programa em 5 Estados: Washington, Califórnia, Oregon, Novo México e Maryland.

Washington State MESA28

About us/Who we are Mission/vision

Mathematics, Engineering, Science Achievement (MESA) is nationally recognized for its

innovative and effective academic development program. MESA engages thousands of

educationally disadvantaged students so they excel in math and science and graduate with math-

based degrees. MESA partners with all segments of higher education as well as K-12 institutions.

With a proven track record of over 40 years, we focus on producing math-based graduates

by providing support such as classes, hands-on competitions, counseling, transfer support and a

community environment to students from middle school through university.

Since 1970, MESA has helped students become scientists, engineers and mathematicians,

filling an urgent need for qualified technical professionals. Through three programs of MESA

(MESA Pre-College Program (K-12), MESA Community College Program and MESA First Nation

Program), students from all segments of education are served through local centers. MESA

partners with industry and all the major educational institutions throughout the United States.

We will be a catalyst and model for educational excellence and equity. We will

accomplish this through a partnership of higher education, school districts, industry and

business, government, community organizations, families, and alumni.

MESA’s efforts are directed toward Washington K-14 students. Through MESA’s activities,

participating students receive educational enrichment experiences and practical help needed to

prepare for university-level studies in a variety of science and technology related fields.

Washington MESA programs address the need as stated by the National Action

Council for Minorities in Engineering (NACME):

“Effective pre-college minority engineering programs enrich the student and

community by intervening in the cycle of minority isolation, low self esteem, low teacher

expectations and poor academic performance. They counter the underdevelopment of minority

students with strategies designed to break down the obstacles to achievement in scientific and

technological fields.”

California MESA

About us/Who we are Mission/vision

Mathematics, Engineering, Science Achievement (MESA) helps thousands of educationally disadvantaged students to become engineers,

scientists and other math-based professionals urgently needed by industry.

MESA provides a unique combination of enrichment activities, hands-on competitions, academic support, industry involvement and a supportive

community environment. MESA is nationally recognized for its innovative and effective academic development program for science, technology,

engineering and math (STEM) fields.

MESA serves middle school, high school, community college and university level students through local centers throughout California. Since its

inception in 1970, MESA has had a strong partnership with industry. MESA also partners with all segments of California higher education as well as

K-12 institutions. California MESA’s model has been replicated in 12 other states, and is the basis for many other programs.

Filling the STEM pipeline

MESA provides the resources and

support for underserved students to

succeed. / MESA provides a solution.

California needs STEM professionals

and isn’t on track to fill the 1.1 million

open jobs. Here’s how we do it.

Oregon MESA

To provide students underrepresented in the fields of mathematics, engineering, science, and technology with the skills, knowledge, and opportunities to develop their talents, explore

technology-based careers, enter college, and compete successfully in the workforce.

New Mexico MESA

28 Fonte de dados: WASHINGTON MESA (2017); CALIFORNIA MESA (2017); OREGON MESA (2017); NEW MEXICO MESA (2017); MARYLAND MESA (2017)

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About us/Who we are Mission/vision

New Mexico Mathematics, Engineering, and Science Achievement (NM MESA and/or MESA) is a pre-college program that prepares students for college

and careers in mathematics, engineering, science or technically related fields. The MESA program is coordinated through seven regional offices, each staffed by a

Regional Coordinator, that is hosted at a local higher education institution, including: UNM main-campus (2), Highlands University (1), UNM Gallup (1), NMSU

(1), Santa Fe Community College (1) and ENMU Roswell (1).

MESA supports student programs in middle and high schools throughout the state. Each school program is administered by a teacher (typically a STEM

education teacher) from the school who receives a stipend for this work from his or her school district. Through these programs, MESA students participate in a

variety of enriched math, science and engineering activities including field trips, speakers, workshops, regional and state-wide academic competitions, community

service and leadership development projects. NM MESA provides funding and logistical support for these and other activities.

NM MESA also offers a senior “Loyalty Award” to graduating high school seniors who enroll in college the fall they graduate from high school. This

award, which can go as high as $1,000.00 per student, is based on the student’s MESA participation during middle and high school, academic grades and standardized

test scores.

Empower and

motivate New Mexico’s

culturally diverse students

with science, technology,

engineering, and math

(STEM) enrichment.

Diverse, well-

educated, professionals who

reach their full potential as

leaders through Math,

Engineering, Science, and

technology Achievement.

Maryland MESA

About us/Who we are Mission/vision Maryland MESA educators, tutors,

mentors, and advisors come from a wide variety of

backgrounds and professions—many of whom are

volunteers. For example, MESA Day

Competitions could not occur without volunteers.

In addition to the APL administrative

staff, schools that sponsor MESA afterschool

programs provide teachers and administrators.

APL and other organizations also recruit

mentors from their staff of scientists,

mathematicians, engineers, and anyone who wants

to volunteer their time to guide students on their

projects, give them insights into the life and work

of a STEM professional, and advise them on their

STEM education path.

Mission

Advocate for STEM Education, Equity, and Access in Maryland.

Vision Contribute to a competitive global workforce by increasing the yield and diversity of STEM graduates in Maryland.

Established at APL in 1976 with just two schools in Baltimore City, Maryland MESA today has more than 100 participating schools throughout

the state.

As a structured, afterschool, precollege program designed to prepare students for academic and professional careers in a STEM field,

Maryland MESA seeks to:

Increase the number of engineers, scientists, mathematicians, and related professionals at technical and management levels, and

Encourage and assist minorities and females in achieving success in these fields.

To provide a superior education process that enables Maryland students to achieve their full potential, we:

Partner with school systems, colleges and universities, industry and business, government, community organizations, families, and alumni to

offer enriching STEM activities and programs for students.

Provide services and programs to over 2100 students and 180 teachers from Anne Arundel, Baltimore, Calvert, Charles, Howard, Montgomery,

and Prince Georges Counties. Since its inception, Maryland MESA has served more than 24,000 Maryland students.

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Capital cultural

Esses dados nos mostram que o programa MESA como um todo tem antes de tudo

uma orientação muito forte em direção ao STEM education, apresentando-se como um

programa educacional que trabalha exclusivamente com essa frente, como é possível perceber

a partir da categoria “Foco ou direcionamento em carreiras STEM”. Isso é especialmente

interessante quando confrontamos essa orientação com a seguinte, a de promover justiça social.

Fica evidente que no programa MESA a justiça social é feita através do direcionamento para as

carreiras STEM. Como é possível notar a partir da figura 4, um dos resultados do qual o

programa MESA do Estado de Washington se orgulha é o fato de 58% de seus alunos

completarem quatro anos de matemática e ciências nas universidades, ao passo que a média

para o Estado é de 33%. Isso repete uma tendência que outras organizações estadunidenses

seguem, como vimos no capítulo 1. Para essas organizações e para muitos agentes políticos (ver

THE WHITE HOUSE, 2016), a saída para o combate à desigualdade de oportunidades está, de

alguma forma, na oferta de STEM education e de uma carreira em STEM.

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Figura 4: Material de divulgação utilizado pelo programa MESA

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O ideário presente é de que através do incentivo às áreas STEM para todos, as

minorias terão acesso a um futuro digno e realizar-se-á a transformação social. De fato, não há

dúvidas de que as áreas STEM historicamente são aquelas que apresentam maior exclusão das

minorias, com alto grau de elitização. Por outro lado, é curioso e carece de mais estudos as

formas pelas quais esse tipo de intervenção social se manifesta em sociedades altamente

industrializadas e capitalistas, como é o caso dos EUA.

Sem dúvidas, “a alfabetização científica e tecnológica pode extrapolar o espaço da

escola, quando ressaltado seu caráter universal visando o slogan ciência para todos os

cidadãos” (MELO et al, 2016, p. 594). Esse slogan cria espaço, segundo o autor, para uma

oportunidade de inclusão social. Isso fica ainda mais claro quando entendemos, a partir da

noção de capital cultural em Bourdieu (2004). Claussen e Osborne (2013) partem dessa noção

para defender que parece estar embutida de alguma forma a ideia de que

Conceiving of science education as a contribution to “cultural literacy” and

the development of individual capital, however, would mean seeing the goal

of science education first and foremost as an education—a contribution to an

individual’s embodied capital (Hirsch, 1987; Osborne & Collins, 2000). As

such, its goal would be to provide students with scientific knowledge, not

primarily because they will be future scientists, nor because such knowledge

is useful in daily life, nor because it might enable them to contribute to

socioscientific decisions (though these may be valuable outcomes), but

simply because scientific knowledge is an essential means of access to the

dominant groups within society29. (CLAUSSEN; OSBORNE, 2013, p.

67) [grifo nosso]

Embora não esteja claro se o programa MESA utilize essa estratégia de modo

consciente ou mesmo involuntariamente, a hipótese de que o capital cultural que a ciência traz

influencia os objetivos do programa se faz plausível. Principalmente quando associado com o

embate racial, o qual discutiremos adiante. Segundo Claussen e Osborne (2013), nos EUA, os

estudantes que carecem do capital cultural necessário para entrar nas universidades, dado que

desconhecem os requerimentos básicos para admissão e isso não é trabalhado nas escolas de

ensino básico, deveriam ter mais fontes de acesso a esse capital, tais como orientação específica.

29 Conceber a educação científica como contribuição para a "alfabetização cultural" e o desenvolvimento do capital individual, contudo, significaria ver o objetivo da educação científica em primeiro lugar como uma educação - uma contribuição para o capital embutido de um indivíduo (Hirsch, 1987; Osborne & Collins, 2000). Como tal, seu objetivo seria proporcionar aos alunos conhecimentos científicos, não principalmente porque serão futuros cientistas, nem porque esse conhecimento seja útil na vida diária, nem porque possa permitir que contribuam para decisões sociocientíficas (embora estes possam ser valiosos resultados), mas simplesmente porque o conhecimento científico é um meio essencial de acesso aos grupos dominantes dentro da sociedade. (CLAUSSEN E OSBORNE, 2013, p. 67) [Tradução livre]

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E como notam Katsh-Singer et al (2016), escolas com baixo padrão socioeconômico são muito

menos prováveis de oferecer experiências e oportunidades desafiantes de aprendizagem de

ciências, o que contribui para o ciclo de desigualdade. O programa MESA, principalmente

através do Pre College orientation e nos Community College, reconhece essa condição nos seus

alunos e atua exatamente dando essa orientação, como foi observado nas visitas aos Community

Colleges. Pode-se dizer que é exatamente esse o ponto que o programa ataca nos Community

College. Da mesma forma, atua principalmente nessas escolas de baixo status socioeconômico

oferecendo essas experiências em sala de aula.

Tendo isso em vista, é necessário nos questionarmos: o que significa, dentro do

contexto no qual o país está inserido, atuar com esse foco na promoção da justiça social? Além

disso, por que as organizações e iniciativas políticas privilegiam ou dão exclusividade a um

campo do conhecimento para tornar os estudantes competitivos globalmente ou ofertar-lhes o

acesso a camadas socioeconômicas mais altas? Afinal, qual é o modelo de emancipação dos

indivíduos e desenvolvimento humano que está em jogo?

Sabemos que a resposta para esses questionamentos passa, em parte, pelo modelo

econômico do país. Entretanto, é nítido que quando se trata de organizações com motivações

claramente genuínas em defesa das minorias, como é o caso do MESA, outras forças agem para

que haja uma luta por inserir os estudantes nas áreas STEM. A partir das observações, do

período vivenciado pelo programa e pelo convívio com os sujeitos que trabalham no próprio

programa, pude notar que há outras motivações além da busca pela igualdade de oportunidades

para todos ou da empatia pelas minorias que explicam as ações e os focos do programa MESA.

Há um embate étnico-racial claro, possivelmente ligado à história dos conflitos raciais nos EUA

e à forma que a questão racial se desenvolve hoje país. A busca por espaço nas áreas STEM

não aparenta ser apenas uma questão de distribuição numérica em uma área cujo predomínio é

de homens brancos para estabelecer um equilíbrio. Parece haver, por exemplo, um sentimento

de busca por espaço nas áreas STEM motivado por questões ideológicas, históricas e,

principalmente, identitárias. Durante o período no qual passei com as pessoas ligadas à

organização, perguntava-me por que elas faziam o trabalho que fazem. E o quão simbólico é o

fato dos diretores e coordenadores pertencerem também aos grupos para os quais eles

trabalham, atuando sobre uma materialidade (STEM) no contexto do país em que vivem.

Por que o foco não está necessariamente em transformar toda a escola de uma

comunidade ou todo o sistema educacional, de uma maneira holística, com a ênfase em

transformar o ensino de ciências e a relação da sociedade com a ciência, alfabetizando a

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sociedade para a ciência? O embate étnico-racial parece fazer parte do jogo e supera a

necessidade por uma educação de qualidade para todos. Mas é necessário outro tipo de análise

para realmente elucidar essas questões, uma que não seja ludibriado pela nossa perspectiva e

que seja pautado em outros olhares das ciências sociais.

Relação com a indústria

Igualmente curioso é a relação entre a organização e a indústria, a qual é uma das

principais bases para que o programa tenha se constituído desde o início. Assim como nas

questões anteriores, é preciso compreender a filantropia de corporações estadunidenses sem o

nosso enviesamento analítico natural. Entretanto, chama a atenção o fato de que justamente os

principais responsáveis por um predomínio da etnia branca e do sexo masculino nas áreas

STEM sejam os maiores apoiadores dessas organizações. Para Basile e Lopez (2015), essas

corporações tratam o problema como uma questão puramente estatística, dado que a tendência

recente e para os próximos anos tem sido de aumento da diversidade étnica e de diminuição da

população não branca:

Furthering the notion of Students of Color as a resource available on demand

for one-sided benefit, several documents have expressed the inclusion of

Students of Color in STEM fields as a need necessitated out of sheer statistical

numbers only (…). Rather than a call for immediate inclusion out of ethical

or moral grounds or for the benefit of people and communities of color, this

document suggests the engineering enterprise will not be able to continue to

be viable as demographic changes occur. We are left to question as scholars

why a decrease in the percentage of Whites in the United States is a cause to

address racial exclusion from STEM fields. One potential answer is that in

having control of STEM policies, practices, and knowledge, predominantly

White owners and operators of STEM enterprises have not until now had

anything to gain economically from changing embedded systemic racially

exclusionary practices. D. Martin (2009b) states of his similar findings, this

demonstrates "that workforce needs and the threat of demographic changes,

not moral compunction, are often what drive increased attention to

underrepresentation issues in mathematics and science” (p. 310).30 (BASILE;

LOPEZ, 2015, p. 536)

30 Prosseguindo a noção de Estudantes de Cor como um recurso disponível em benefício unilateral, vários documentos expressaram a inclusão de Estudantes de Cor nos campos STEM como uma necessidade somente por números estatísticos abstratos (...). Em vez de um pedido de inclusão imediata de motivos éticos ou morais ou em benefício de pessoas e comunidades de cores, este documento sugere que as grandes companhias não serão viáveis se as mudanças demográficas ocorrerem. Como acadêmicos, nos questionamos por que uma queda na porcentagem de brancos nos Estados Unidos é motivo de atenção sobre a exclusão racial dos campos STEM. Uma resposta potencial é que, ao ter controle das políticas, práticas e conhecimentos do STEM, os proprietários e operadores predominantemente brancos das empresas STEM, até agora não tinham nada para ganhar economicamente a ponto de mudar práticas de exclusão racial embutidas sistematicamente. D. Martin (2009b) afirma a partir de semelhantes constatações que isso demonstra "que as necessidades da força de trabalho e a ameaça de mudanças demográficas, e não a compunção moral, são muitas vezes o que leva a maior atenção a questões de sub-representação em matemática e ciência. (BASILE e LOPEZ, 2015, p. 536) [Tradução livre]

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Como vemos, o autor endereça a questão para um interesse econômico dessas

empresas e não exatamente para uma obrigação moral ou justiça social, a qual é a bandeira

desses programas sociais e educacionais. As corporações e os políticos tratariam a inclusão das

minorias mais como um investimento ou como uma contenção de danos futuros do que como

uma oferta de oportunidade. Essas reflexões nos levam às questões: o que é a filantropia nos

EUA e como uma sociedade altamente neoliberal encara o que é papel do Estado, o que é papel

da sociedade civil e quais são as obrigações das corporações? As observações dentro do

programa MESA e de outras organizações mostraram que as estratégias para atuar no problema

das minorias e dos desavantajados revela diferenças culturais entre os EUA e o Brasil. Isso

porque as organizações estadunidenses, dado seu contexto de sociedade, trabalham em uma

outra relação com o Estado e as empresas, se nos é permitido fazer generalizações.

Da mesma forma, como já constatado no capítulo que trata do movimento STEM

education, o programa MESA também trabalha com a tendência de crer no futuro de todas as

profissões como relacionadas e dependentes de alguma forma das áreas STEM31. Os poucos

enunciados que tratam sobre as transformações na qualidade do ensino ou das escolas de

maneira holística parecem ainda estar vinculados à ideia de que a melhoria no ensino passa

necessariamente pelo STEM education. Isso nos revela uma concepção específica de papel da

escola.

Como consequência, é possível perceber nos enunciados institucionais certa

inevitabilidade ao focar em formar profissionais STEM que atendem às chamadas competências

do século 21. Isso é colocado sobretudo como uma necessidade, como consta em muitos dos

enunciados analisados e especialmente na figura 4, a qual traz um material de divulgação sobre

o programa MESA – Washington contendo informações básicas sobre o programa. Preencher

as futuras vagas STEM é apresentado como a demanda ou necessidade (The need). Também se

faz presente a incorporação do discurso oriundo da indústria e de lideranças políticas de que é

31 De acordo com uma ficha informativa da Casa Branca, “There are nearly half a million open tech jobs in the United States today, and that number is projected to more than double within the next 4 years. These jobs pay 50 percent more than the average private sector job. One recent analysis of 26 million job postings found that nearly half of all the jobs in the top quartile in pay require some coding knowledge or skills”. (THE WHITE HOUSE, 2016) Tradução livre: Há quase meio milhão de empregos de tecnologia aberta nos Estados Unidos hoje, e esse número é projetado para mais de dobrar nos próximos 4 anos. Esses empregos pagam 50% a mais do que o emprego médio do setor privado. Uma análise recente de 26 milhões ofertas de emprego revelou que quase metade de todos os empregos no quartil superior de remuneração exigem algum conhecimento ou habilidades de codificação

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preciso salvar a nação da suposta perda de hegemonia econômica mundial, conforme

discutimos no capítulo 3 (Ver: National Academies Press (2006) e Xue (2015)).

Por fim, nota-se que é marcante nos enunciados dos diversos centros estaduais do

MESA a defesa da organização como um modelo a ser seguido: “MESA is nationally recognized

for its innovative and effective academic development program”. De fato, a organização tem

ganhado cada vez mais respaldo dos governos estaduais e até mesmo da Casa Branca, sendo

listada como uma das organizações exemplares na oferta de acesso às oportunidades de STEM

education aos estudantes não representados (THE WHITE HOUSE, 2016). Segundo o diretor

do programa MESA, a organização precisa se legitimar no cenário político como sendo

singular, pois inúmeras outras organizações disputam esse mesmo espaço e os recursos que as

grandes corporações destinam à filantropia.

4.2. Relatórios de atividades dos participantes do programa ACES

A seguir, trabalharemos com a análise dos relatórios de atividades do programa

ACES. Os relatórios foram solicitados aos professores e monitores ao final de cada módulo do

programa, totalizando 4 relatórios por participante durante o ano de 2016. O relatório consiste

em um roteiro de perguntas, portanto, possui um modelo fixo a ser seguido, conforme mostra a

tabela 4. Além disso, seu preenchimento era obrigatório aos participantes do programa no final

de cada módulo, mesmo que alguns professores não o tenham feito.

Tod

os

1. Situações de aprendizagem (Descreva aqui situações em que você observou que algum conceito foi aprendido pelos alunos, situações nas quais eles estabeleceram relações entre conceitos, momentos em que eles fizeram interpretações, ou que houve aprendizagem direta dos conceitos propostos no material ou pelo professor)

2. Situações nas quais as relações interpessoais foram valorizadas (Descreva aqui momentos em que houve aproximação entre os alunos e as professoras, ou entre os alunos e monitores, e também momentos nos quais os alunos foram colaborativos e cooperativos entre si)

3. Participação e interesse dos alunos. (Descreva como foi o interesse e a participação dos alunos ao longo das aulas, se você nota alguma diferença, se você acredita que eles gostaram e se sentem motivados com a aula. Em geral as atividades têm uma curva de distribuição normal para o interesse, como você avalia essa distribuição em cada turma? Você é capaz de avaliar se eles estão mais interessados pelas aulas com o ACES do que por outras aulas?)

4. Avaliação do material didático: atividades bem-sucedidas, problemas e sugestões. (O material didático está adequado às situações, aos alunos e às limitações em geral? Quais melhorias podem ser feitas? O que é positivo e funciona bem a partir dele?)

5. Observações e comentários livres. (Este espaço não é de preenchimento obrigatório, mas você pode usá-lo para fazer comentários, reclamações, sugestões, críticas ao projeto, etc.)

Pro

fes

sore

s

6. Diferenças observadas entre as turmas que trabalhou (Você observou alguma diferença relevante a ser relatada, em relação às diferentes turmas de alunos que trabalhou o módulo? A aprendizagem foi diferente? Houve alguma turma na qual as aulas fluíram melhor? Por quê?)

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Tabela 4: Modelo de perguntas do relatório. Cinco das questões são comuns aos monitores e

professores, três são exclusivas aos professores e duas são exclusivas aos monitores.

Ao todo, dispomos de 42 relatórios dos quais utilizamos 34. Ao analisar o que foi

relatado pelos participantes, é fácil notar que apenas esses dados como fonte são suficientes

para uma extensa pesquisa sobre o programa ACES, sobre como se dão as relações entre os

sujeitos e quais os impactos em cada um deles. Todavia, infelizmente não é possível ir

demasiado a fundo nessas questões, uma vez que isso nos limita na busca de nossos objetivos,

bem como restringe a análise de outras fontes de dados. Como o foco está nos modelos

pedagógicos, conduzimos uma análise que permitisse de alguma forma explicitá-los.

Assim como para os documentos institucionais do programa MESA, partimos da

análise de conteúdo como técnica para organizar e classificar as unidades de análise que

emergiram a partir dos relatórios, tomando por referencial teórico Franco (2005). Contudo, não

nos restringimos à análise de conteúdo apenas para organizar os dados, tomando também como

base os princípios da análise do discurso para entender as condições de produção e demais

elementos passíveis de análise nesses relatórios. É importante ressaltar que utilizamos as bases

conceituais da análise do discurso, sem realmente utilizá-la como uma das técnicas de análise

dos dados propriamente dita. Como coloca Orlandi (2007, p. 61), o analista do discurso não

interpreta, “mas trabalha nos limites da interpretação”. A autora faz essa colocação

confrontando justamente a análise do discurso com a hermenêutica, a qual está mais voltada

para o domínio da interpretação. Nesse sentido, nos aproximamos mais do que Bogdan e Biklen

(1994, p. 54) colocam como uma abordagem fenomenológica, na qual os estudos fazem sim

uso da interpretação e ela é privilegiada com o objetivo de “compreender os sujeitos com base

no seu ponto de vista”.

7. Mudanças na prática docente (Avalie em que medida as atividades do ACES se relacionam com sua prática docente do dia-a-dia. Por exemplo: você tem modificado a forma que as outras aulas são preparadas? Você tem conseguido maior envolvimento nas outras atividades que você prepara? Qual o impacto que o projeto tem na sua experiência como professor (a)? Você se sente à vontade e motivado (a) para trabalhar com as atividades do programa ACES?)

8. Mudanças no campo de atuação (Por impacto, entende-se os efeitos produzidos pelo projeto que tenham gerado modificações em algum aspecto do seu campo de atuação. Trata-se de identificar, compreender e explicar as mudanças ocorridas na sala de aula envolvida ou no contexto da aula de ciências)

Mo

nit

ore

s

9. Situações de aprendizagem de docência (contribuições para a licenciatura) (Levando em conta que é uma atividade de iniciação à docência, como as monitorias contribuíram na sua formação e aquisição de experiência? O que você gostaria de melhorar? Você conseguiu envolver alguns alunos, argumentar, criar situações de aprendizagem e construir algo com eles?)

10. Como você caracteriza as ações dos professores. (Identifique a forma pela qual os professores lidam com os alunos, com os conteúdos, se eles procuram criar situações de aprendizagem, se eles procuram envolver o maior número de alunos possível.)

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Dito isso, apresentaremos as categorias de análise criadas e em seguida nos

voltaremos à análise de enunciados relacionando-os ao nosso contexto da pesquisa. Tomamos

como unidade de análise temas, conforme estabelece Franco (2005). Para organizar os dados,

observamos a prevalência de 6 categorias, as quais foram estabelecidas a posteriori a partir da

primeira leitura dos relatórios:

Aspectos positivos do programa (Superação de expectativas,

aprendizagem, interesse, valorização pessoal, estímulo, melhorias, atividades

produtivas e outros pontos que podem ser vistos como resultados positivos do

programa)

Aspectos positivos da docência (Aprendizagem, ganho de experiência,

satisfação pessoal, visão crítica sobre os processos de ensino e aprendizagem,

aperfeiçoamento, postura participativa, entre outros pontos referentes ao papel do

professor ou monitor que podem ser vistos como impactos positivos proporcionados

pelo programa)

Problemas com o material didático (Situações em que o material

didático foi avaliado como inadequado, insuficiente ou que tenha interferido

negativamente no processo)

Frustrações (Situações em que os professores ou monitores denotam

frustrações e decepções em relação ao programa)

Críticas ou aspectos negativos

Autocrítica ou críticas em relação aos processos de ensino

Estabelecidas essas categorias, cada resposta individual de cada um dos 4 relatórios

foi evidenciada segundo as categorias destacadas anteriormente, de modo classificatório. O

quadro 2 a seguir ilustra um exemplo dessa classificação, trazendo trechos isolados de cada

um dos 4 relatórios:

Situações de aprendizagem

(Descreva aqui situações em que você observou que algum conceito foi aprendido pelos alunos, situações nas quais eles estabeleceram relações

entre conceitos, momentos em que eles fizeram interpretações, ou que houve aprendizagem direta dos conceitos propostos no material ou pelo

professor)

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Mo

nit

or:

Lu

iza

(p

seu

nim

o)

Cabe dizer aqui que os alunos conseguiram entender logo na primeira aula que a computação está além do uso de um

computador, tablet, celular ou qualquer dispositivo tecnológico, pois era justamente o que eles pensavam, com exceção de um menino

na Luis Galhardo que já sabia até o modo como os computadores funcionavam. Apesar das atividades serem um pouco abstratas do

meu ponto de vista, acredito que eles captaram a ideia, porém atividades práticas em um computador seriam mais explicativas.

Também percebi o desenvolvimento do raciocínio lógico deles nas atividades de algoritmos e a pensar em mais de uma maneira de

resolver um mesmo problema. Acho que os alunos dessas turmas têm um grande potencial e que atividades mais desenvolvidas e

práticas teriam sido de grande ajuda para desenvolver o potencial deles, pois apesar de um pouco maçante o módulo eles se

mantiveram sempre atentos às explicações e realizaram as atividades sem necessitar que as professoras ficassem chamando atenção

deles todo momento. Outra aprendizagem válida foi a de gramática da língua portuguesa na atividade da segunda aula pois além de

entender algumas regras da gramática eles viram como ela tem importância na computação e que uma frase escrita errada pode

ocasionar em ambiguidade e não ter o resultado desejado. Além de perceberem como matérias que eles nem imaginavam estão

envolvidas na computação de várias formas, isso ajudou no pensamento “fora da caixa” em que os alunos são incentivados a fugir

do óbvio.

Notei maior aprendizagem com os experimentos do que com os textos da aula 1. Além disso foi relativamente fácil

relacionar o experimento da bobina com o motor elétrico, a ideia de desmontar o motor e mostrá-lo foi ótima pois os alunos

entenderam muito bem. Gostei muito de ver os desenhos dos circuitos com pilhas, pois eles mostraram que entenderam sobre as

polaridades tanto da pilha quanto dos LEDs e aparentemente se expressaram melhor na forma de desenho, pois percebi certa

dificuldade com relação na construção de uma resposta coerente.

Em uma sala da Julio Mesquita eu acompanhei uma parte da construção da ponte de 60 cm e ensinamos para os alunos

como usar escalas para fazer a planta da ponte, e percebi que apesar de alguns deles não terem afinidade com matemática e terem

pouco interesse por essa parte eles entenderam o princípio do uso de escalas, o que foi muito bom. Também nessa mesma aula

percebi em vários grupos a divisão de trabalho por conta deles, enquanto uns faziam treliças, outros faziam a base da ponte e agora

percebi que perdi a oportunidade de falar mais sobre isso com eles.

Ao perguntar qual a funcionalidade da folha de boldo conter as nervuras e eles não conseguiram pensar em algo e no caso

eu acabei respondendo para eles e também falando sobre as diferenças e semelhanças com as nervuras das asas da borboleta

Para o desafio final percebi que as ideias para invenção biomimética eram muito boas, porém os alunos careciam de

material por diferentes motivos, a professora levou alguns materiais usados que poderiam ser reutilizados para este fim, porém isso

acabou restringindo os alunos em suas criações, apesar de um grupo ter realizado sua invenção que continha uma boca articulada

utilizando os materiais disponíveis o que foi o diferencial com relação a outros grupos que acabaram fazendo algo muito parecido.

Criando uma relação com o que vi na escola Julio Mesquita e com o que vi na feira de ciências da Luiz Galhardo, os inventos estavam

muito parecidos, o que deve ter sido influenciado pelos materiais disponibilizados pela professora.

Quadro 2. Exemplo de classificação utilizada na análise dos relatórios dos monitores e professores do

programa ACES, a partir de trechos isolados extraídos dos relatórios. Esse mesmo formato de

classificação se repetiu para todos os demais participantes. Legenda de cores - Cor Amarela: Aspectos

positivos do programa. Azul: Aspectos positivos da docência. Roxo: Problemas com o material didático.

Cinza: Autocrítica ou críticas em relação aos processos de ensino.

A partir dessa classificação que nos serviu para organizar os dados, ao trabalhar

com todos os relatórios de todos os participantes, foi possível observar tendências

predominantes nas respostas. A primeira e mais marcante é a de prevalecer nos relatórios dos

professores, grande presença de respostas genéricas ou superficiais, elaboradas, segundo nossa

interpretação, com base no senso comum acerca do tipo de atividade que foi desenvolvida.

Quando os professores foram perguntados sobre qual a avaliação do material didático ou sobre

a participação e interesse dos alunos, foram comuns as respostas do tipo Os alunos estavam

muito interessados pelos experimentos, ou O material didático é bom. E ainda, foram comuns

respostas tais como Os alunos aprenderam bastante, Os alunos passaram a prestar atenção

nas aulas, ou ainda Os alunos trabalharam de maneira colaborativa. Classificamos essas

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respostas como genéricas não porque elas não trazem significado, mas porque é possível notar

pouca precisão em relação ao que é perguntado e podem sugerir, por exemplo, uma percepção

incompleta das situações de aprendizagem, das múltiplas e infinitas interações que ocorrem e

das próprias dificuldades apresentadas ao lidar com o material didático. Embora seja importante

apontar que dentre as condições de produção do questionário estejam a obrigatoriedade no

preenchimento com um prazo pré-estabelecido e o preenchimento individual, sem discussões

em grupo, notamos que os relatórios carecem de exemplos, demonstrações, detalhamentos e

sustentações, o que não ocorre nas respostas dos monitores. Além disso, é curioso notar que

esse perfil de resposta se mostra ainda mais presente nos professores que se envolveram menos

com o projeto, apresentando mais dificuldades em trabalhar com as atividades e experimentos,

ou com os professores que revelam mais inconsistências nas respostas do questionário,

discutido na seção 4.4.

A outra tendência encontrada é de um contraste nos relatos dos monitores. Ele se

manifesta no confronto de trechos como “Também percebi o desenvolvimento do raciocínio

lógico” e trechos do tipo “Sinceramente não sei se os alunos aprenderam muitos conceitos”,

quando se trata de uma aula em uma mesma sala de aula observada por dois monitores

diferentes. Ou ainda “[a atividade] rendeu perguntas interessantes” e “Os alunos tiveram

muita dificuldade com o conceito de computação”. Isso revela o quão heterogêneos são os

impactos do programa em diferentes classes e o quanto varia a percepção dos sujeitos

envolvidos, mesmo que para uma única sala de aula. É absolutamente esperado que haja

variação entre diferentes turmas de alunos, porém nos questionamos qual é (ou quais são) os

principais fatores que causam essas variações? Estão ligados aos fatores intrínsecos ao

programa e seu modelo pedagógico ou estão ligados aos fatores externos ao programa?

Uma terceira tendência que predomina é a constatação, tanto por parte dos

monitores, quanto dos professores, de que as atividades teóricas “deram errado” e que as

atividades práticas “deram certo”. Como já discutido na seção de metodologia, não entraremos

na análise do material didático, apesar de reconhecermos sua grande influência nessas

constatações bem como a existência de algumas atividades no formato pergunta-e-resposta. O

que nos interessa aqui é que, a partir de nossas observações realizadas durantes as atividades,

nota-se que o prático, lúdico e interativo tem uma recepção muito positiva por parte dos alunos.

Ao passo que havia uma dificuldade muito grande de se trabalhar na sala de aula com atividades

que envolvam diálogo, leitura, rodas de conversa ou formatos de aula mais centrados no

professor, como a explicação sobre um conceito, por exemplo.

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Entretanto, é preciso ressaltar que o fato dos professores e monitores relatarem que

uma atividade prática “deu certo”, não quer dizer que o formato prático e interativo tenha sido

necessariamente trabalhado em uma perspectiva construtivista ou CTS, por exemplo, segundo

a qual o material didático estaria pautado. Dar certo assume múltiplos sentidos subjetivos

baseados no que os sujeitos envolvidos entendem pelas formas de construção do conhecimento

e das relações na sala de aula. Por exemplo, a partir de nossas observações das atividades

identificamos uma reprodução do que Santos (2007, p. 5) coloca como uma concepção

predominante “(...) na qual a contextualização significa um método de ensino que aumenta a

motivação e facilita a aprendizagem”. Ou seja, há uma ideia de sucesso quando os alunos se

interessam bastante por uma placa fotovoltaica apresentada na sala de aula, pois é uma

tecnologia que é utilizada na cidade em que moram, mesmo que desconheçam as características

desse tipo de geração de energia e sua relação com as outras formas, ou até mesmo como uma

placa fotovoltaica produz energia.

Fazemos essa distinção porque é exatamente uma das bandeiras do movimento

STEM education: o rompimento com o formato tradicional. Entretanto, é possível notar

claramente que sem a garantia de outros inúmeros componentes, apenas a atividade prática,

lúdica, interativa e contextualizada com a sociedade não foi suficiente para determinar a

prevalência do modelo construtivista ou CTS, por exemplo.

Em relação aos monitores, predominaram relatos que mostraram o quanto o projeto

foi significativo em termos de iniciação à docência, revelando que um dos fortes componentes

foi a formação continuada dos alunos de graduação. Isso mostra que o projeto propiciou

experiências construtivas que permitissem aos graduandos encarar a docência como uma

profissão de constante aprendizagem e que exige muito preparo, planejamento e estrutura,

diferentemente do que se apregoa em muitos lugares sob o senso comum de que qualquer um

pode dar aula desde que domine determinado assunto.

Ver que o projeto que começou pequeno e se transformou tanto e para melhor e

que fiz parte desse crescimento foi realmente muito bom e enriquecedor para minha

experiência de iniciação à docência, muito mais do que algumas horas de estágio em uma

escola apenas observando a aula de outros professores.

Ainda há muitos obstáculos a serem superados para que possamos contemplar

todos os alunos, nesse ponto acredito que eu como um futuro docente preciso aprender mais.

Assim como qualquer aula sempre é necessário ter um planejamento.

Particularmente acredito que esse módulo demonstrou que ser um professor é um constante

aprendizado. (...) Sem planejamento as coisas perdem um pouco o foco. O que eu quero

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ensinar? Que conceitos os alunos precisam aprender? Com qual idade consigo trabalhar esse

conteúdo.

Acredito que o projeto me ajudou a crescer muito com relação a licenciatura e

eu pude me conhecer melhor e enxergar mais facilmente a dificuldade dos alunos e encontrar

a melhor forma de ajudá-los. Atuando na monitoria aprendi que devo saber mais de uma

maneira de explicar alguma atividade, pois nem todos os alunos entendem da mesma forma,

alguns têm mais facilidade, enquanto outros não tanto. Os alunos sempre tiveram a liberdade

para me chamar e tirar dúvidas e sempre que o fizeram percebi que eu consegui ajudá-los, o

que no começo era um pouco mais difícil devido à falta de experiência em trazer a explicação

em uma linguagem que eles pudessem entender. Além disso consegui perceber melhora nas

minhas aulas particulares, onde meus alunos evoluíram rapidamente conseguindo recuperar

suas notas, mesmo com uma diversidade muito grande de alunos.

Cada vez sinto mais nas dúvidas dos alunos que tenho que me preparar melhor,

porque eles sempre conseguem achar uma pergunta de algo que eu não fazia ideia, não havia

previsto, como um aluno perguntou sobre a energia da mitocôndria. Porém também noto que

são nestes momentos que há maior envolvimento e aprendizado, normalmente entre a

apresentação do experimento e a tentativa de teorizar o que está acontecendo ali, é onde

surgem as melhores perguntas. E, seguindo os passos da Ana, notei que este resultado dá

tremendamente mais certo caso eu não dê uma resposta, mas apenas aponte um caminho, uma

dica, e deixe eles pensando. Esse tipo de percepção creio que me auxiliará muito enquanto

professora.32

Da mesma forma, foi possível observar, a partir das respostas de alguns professores,

o quanto o projeto impactou nas práticas de ensino, revelando o despertar do olhar para novas

formas de interação com os alunos, abordagem de temas e conceitos, planejamento de aulas e

construção do conhecimento:

Percebi uma maior proatividade deles e estão tentando sair um pouco da zona

de conforto deles de aulas comuns para aula mais experimentais [Resposta de um monitor

sobre a atuação dos professores]

Eu me sinto motivada e a vontade para trabalhar no programa ACES. Os

projetos têm me ajudado à ampliar meu campo de visão em relação a participação dos alunos

em sala de aula, com questionamentos no sentido do professor para o aluno e do aluno para o

professor. Também na interação com outras disciplinas que acabam ocorrendo naturalmente,

visto que os alunos fazem comentários sobre já terem visto alguma coisa na aula do professor

de ciências, por exemplo, ou comentar o que aprendeu em minha aula com professores de

outras disciplinas.

As práticas docentes sempre sofrerão mudanças a partir do momento que nós

nos abrimos para inovações. Aprendemos muito com os projetos propostos e de como

diversificar as aulas para torna-las mais atrativas.

32 Esses trechos foram extraídos dos relatórios e mantidos em anonimato. Cada tópico corresponde a um trecho diferente e de sujeitos diferentes.

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Tenho modificado a preparação de algumas aulas e também incentivando os

alunos a pesquisarem mais e se envolver mais com os estudos. Sou uma professora que gosta

de trabalhar com formas diferentes de dar aula, por isso me sinto à vontade e também

motivada para trabalhar com as atividades do programa ACES. (...) Todos os projetos da

ACES desenvolvidos até agora têm contribuído muito, pois força professor sair da zona de

conforto, isso é faz com que ele pesquise mais sobre o assunto, incentiva os alunos também a

pesquisar mais, e, principalmente que eles sintam capazes de produzirem e criarem coisas

diferentes.

Sou professora da disciplina de Matemática, a partir do momento que os alunos

me viram dando aulas de outros temas e fazendo experimentos, passaram a me perguntar qual

é a minha formação acadêmica, ou seja, quais minhas áreas de atuação como profissional.

Surgiu um interesse de quem é realmente a minha professora de Matemática, este interesse

abriu uma discussão interessante nas salas dos 9ºs anos, de o que é ter uma profissão e de

como devemos sempre estar aprendendo mais e interagindo os conhecimentos adquiridos.

Os alunos estão aprendendo a trabalhar em grupo, estratégia que até então eu

não utilizava (no máximo, trabalhava em duplas) exatamente pela dificuldade com tal prática.

Observamos também muitas críticas dos monitores em relação ao material didático

e às ações dos professores. Para os monitores, o material didático era muitas vezes abstrato para

os alunos ou sem uma linha clara. Em relação aos professores, muitas das críticas se dão no

sentido de utilizarem de autoritarismo para manter a disciplina, privilegiarem alunos ou grupos

de alunos ou trabalharem baseados em um formato de aula tradicional (aqui o termo tradicional

acaba coincidindo com o modelo pedagógico tradicional). Pelas justificativas e argumentação

desenvolvida, e até mesmo pela coerência das respostas no questionário, os monitores

denotaram compreender, no geral, que pode ser considerado um formato tradicional.

Se nos basearmos nessa tendência presente nas respostas deles, verificamos que há,

portanto, uma frequente presença de práticas pedagógicas tradicionais e tecnicistas, ora isoladas

em eventos específicos, ora entremeadas por outras situações características de outros modelos.

Por exemplo: relatou-se que certa professora coibia alguns alunos de participarem das

atividades por acreditarem que eles seriam incapazes ou, em determinadas atividades, partiu-se

do princípio que era importante chegar a um resultado correto quando não havia esse resultado

na realidade. Ao mesmo tempo, foram relatadas situações em que essa mesma professora

revelou “sair da zona de conforto” e buscar novas formas de trabalhar com os alunos, tendo

descoberto junto com eles como isso poderia ser feito, mostrando uma postura ativa.

Além disso, é unânime entre os monitores que as sessões de treinamento oferecidas

aos professores são insuficientes e comprometem bastante o andamento das atividades. Dada a

dinâmica das sessões de formação e o que foi relatado pelos monitores, revelou-se que

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predominou o princípio de treinar os professores a aplicar o material, ao invés de realmente

capacitá-los em relação aos temas, auxiliá-los em um movimento de formação continuada e

aprimoramento didático, o que dá um caráter mais tecnicista às sessões de treinamento.

Curiosamente, contudo, nenhum dos professores manifestou a mesma opinião em um outro

questionário aplicado. Para os professores, nem o material didático nem o treinamento

insuficiente seriam fatores que prejudicam as atividades. Entretanto, foram poucos os relatos

de que os professores fizeram apropriações do material, adequando as atividades para o

contexto em questão. Os monitores relataram inclusive que muitos dos professores se sentiam

bastante inseguros para trabalhar com o material, por motivos que vão desde a formação

científica deficiente até as insuficientes formações do programa ACES.

Confrontados esses relatos com as observações feitas em sala de aula, é possível

afirmar que o projeto impactou muito mais facilmente apenas os professores que já

apresentavam uma formação mais sólida e possuíam um bom relacionamento com os alunos.

Por exemplo, uma das professoras relatou que se apropriou completamente da atividade e foi

muito além, levando os alunos para conversarem com profissionais da construção em uma obra

ao lado da escola quando estava trabalhando com o tema arquitetura. Porém, como relataram

os monitores, para os demais professores o mesmo formato de aula prevaleceu, acrescentando

apenas experimentos e aulas práticas durante as atividades.

Dessa forma, é possível concluir que os relatórios revelam a coexistência de

características de distintos modelos no aspecto formação docente. Ao mesmo tempo, revelam

que o programa ACES impactou de maneira muito particular (e às vezes oposta) em cada sala

de aula, em cada monitor e em cada professor. Segundo relatado, houve situações em que

turmas “chegaram até a quebrar material e por fim a classe disse que não queria o projeto lá,

pra levarmos pra outro lugar”, até situações em que uma monitora relatou: “fiquei

absurdamente contente com os levantamentos que os alunos fizeram”. Houve situações nas

quais os monitores relataram que o professor entregava a turma para os monitores, enquanto

outros professores passaram a trabalhar no contra turno voluntariamente com o projeto.

Essa variação no engajamento não é nenhuma novidade, afinal é esperado que

programas educacionais dessa natureza produzam esses resultados. Mas o que queremos

chamar a atenção é para a suspeita de que a estrutura organizacional do programa, as

características do material didático e das formações de professores tenham feito com que o

projeto apenas funcionasse e cumprisse seus objetivos para determinado grupo de professores

e em determinadas turmas. E que tenha reproduzido uma tendência comum em programas da

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mesma natureza, de transformar os professores em aplicadores das inovações e das reformas

curriculares que deixam as aulas mais interessantes. Essa tendência revela uma concepção do

papel do professor característica do modelo pedagógico tecnicista e não sociocultural. Afinal,

sobretudo transfere majoritariamente a causa dos insucessos nos resultados para o professor,

independentemente da formação, suporte e relacionamento que ele teve com o programa.

Em relação ao envolvimento dos professores no programa, é importante mencionar

que houve uma tentativa de trazê-los para funções mais ativas, especialmente a de serem

sujeitos responsáveis pela elaboração do material didático e seleção das atividades a serem

desenvolvidas nas próprias classes. Isso ocorreu no momento de reformulação do programa, ao

final de 2015, como mencionamos na seção de introdução ao programa. Entretanto, diversos

fatores fizeram com que isso não ocorresse de fato e os professores acabaram por não ter

participação nessas escolhas e etapas de planejamento, as quais são justamente as mais

importantes para o desenvolvimento profissional e são a garantia de que o programa opera em

conjunto e pelos professores, não através deles. Esse é inclusive um dos objetivos do programa

ACES. Em uma perspectiva sociocultural, a qual particularmente acreditamos ser adequada

para atingir os propósitos de emancipar os professores e atuar na qualidade do ensino de

ciências ofertado aos alunos, seria um pré-requisito o envolvimento dos professores nessas

etapas.

Podemos listar causas individuais e causas gerais que expliquem essa não atuação

dos professores como colaboradores ativos do planejamento do programa. As causas gerais

perpassam a alta carga de trabalho de todos os professores, o que impossibilita uma dedicação

aos projetos extracurriculares. Uma outra causa geral que explica essa ausência dos professores

vem da gestão do programa que não conseguiu estruturar e organizar de maneira eficiente e

efetiva essa participação dos docentes em conjunto com os monitores na elaboração dos

materiais didáticos.

As causas individuais estão relacionadas, para uma parcela dos professores, a uma

cultura mais passiva e receptiva frente ao projeto. A experiência com os professores ao longo

do programa mostrou que é recorrente a baixa expectativa e motivação enquanto profissionais,

algo que não é exclusivo dos professores do programa ACES, mas dos professores da rede

pública em geral. Em função de problemas maiores da educação que refletem em como o

docente se vê e em como ele deve atuar, prevalece a expectativa por materiais didáticos prontos,

preferencialmente no estilo apostilado, os quais ele deve aplicar nos alunos. Isso pôde ser

notado tanto nas observações realizadas em sala de aula, quanto durante as sessões de formação

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ministradas no âmbito do programa ACES. Até mesmo pelos relatórios isso fica evidente,

quando os monitores revelam que os professores poderiam ser “mais ativos nas atividades”, ou

que alguns professores permaneceram na zona de conforto durante a maior parte dos projetos.

Ou quando se nota poucas apropriações e adequações dos professores em relação ao material

didático e conteúdos voltados para os alunos, utilizando-os mais como um protocolo do que

como um referencial. Infelizmente as condições precárias de trabalho e de formação para a

docência contribuem com essa cultura.

Outro fator individual que contou foi que os professores não se sentiram seguros o

suficiente para trabalhar com os temas propostos. Afinal, o programa apresentou-lhes temas até

então muito distantes da realidade com que vinham trabalhando e para professores de áreas

distintas. Por exemplo, temas como computação, arquitetura ou microscopia foram

intimidadores e excessivamente desafiadores para professores que nunca tinham trabalhado

com esses temas e vêm de cursos de magistério, por exemplo. Como pode ser notado, uma

postura acrítica nos relatórios e nas reuniões em relação ao material e a algumas das falhas do

programa pode ser explicada justamente pelos diversos vãos que foram sendo criados ou que já

estavam pré-estabelecidos desde o início do programa.

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4.3. Observação das práticas

Conforme já apresentado no capítulo de metodologias, fizemos uso de observações

participantes dado sua versatilidade para lidar com muitas das dificuldades metodológicas e ir

diretamente ao encontro com as questões que queremos investigar, especialmente no estudo de

caso que conduzimos. De acordo com a tabela 1, foram realizadas observações em eventos,

reuniões, aulas, sessões de formação de professores, palestras, visitas de campo, diálogos

informais, entre outras situações. O período de 10 meses como pesquisador/coordenador do

programa ACES e o período de 4 meses como pesquisador visitante no programa MESA

geraram um montante considerável de notas em diferentes cadernos de campo. Muito além das

notas, foi possível também utilizar essas observações para compreender profundamente a

estrutura dos dois programas e delinear as relações, contradições, diferenças e aproximações

entre os dois programas.

Parte dessas observações já foram apresentadas e trabalhadas nas seções anteriores,

ao confrontarmos as diferentes fontes e dados. Apresentaremos a seguir um resultado geral

dessas observações privilegiando as situações mais relevantes para as nossas questões de

pesquisa, ou seja, aquelas que nos dão indícios dos modelos pedagógicos de ensino de ciências.

Esses resultados não serão apresentados conforme uma ordem cronológica nem de modo

específico para cada programa.

Formações de professores

As sessões de formação de professores, chamadas de Professional Development são

particularmente interessantes no programa MESA. Nas várias sessões acompanhadas durante o

estágio no programa, foi possível notar que elas possuem em geral três pontos de preocupação

por parte tanto dos professores quando dos formadores. Um deles gira em torno, naturalmente,

do conteúdo que será trabalhado, do material didático em questão. Ou seja, os temas que serão

aprendidos. Outro ponto abordado nas sessões de formação diz respeito ao que é pedagógico e

didático. O terceiro ponto diz respeito à promoção da equidade, igualdade de gênero,

autoestima e inclusão.

Assim como foi observado nas sessões de formação no Brasil, os professores

denotam certa preocupação e insegurança em formações cujos temas são alheios à realidade

deles, por exemplo computação e microscopia. Mas demonstram ao mesmo tempo excitação e

grande satisfação pessoal à medida que o treinamento avança e eles vão se familiarizando e se

engajando com a proposta de trabalhar esses temas em sala de aula com os alunos. Uma das

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falas mais comuns em muitas das sessões é os alunos vão adorar isso. Não raro, os professores

do programa MESA demonstraram muita satisfação quando diziam “aprendi a fazer um

programa de computador!”.

Contudo, há aí uma diferença clara entre as sessões de formação do programa

MESA e do ACES. Os professores do MESA recebem para participar das formações, ajuda de

custo para estar no local, além de ganharem horas de capacitação para promoção de carreira.

Algumas sessões chegam a durar até 2 dias consecutivos. Já no programa ACES, não há auxílio

de custo, horas certificadas para promoção de carreira, tampouco remuneração, o que

impossibilita que as sessões sejam longas e contem com a participação plena de todos os

professores.

Um outro elemento que conta muito para as diferenças entre os dois programas é a

experiência de realização das atividades planejadas para as sessões de formação. Ao passo que

o MESA tem décadas de experiência com essas sessões e com o desenvolvimento profissional

dos professores e um suporte financeiro para contratar inclusive especialistas para elaboração

de material didático e mediar as sessões de formação, o programa ACES não possuía nem

mesmo um ano com essas sessões quando elas foram realizadas. Desse modo, as sessões

tiveram um caráter muito mais experimental do que orientado a seguir propósitos específicos e

pré-definidos.

As consequências principais desse formato são que no programa MESA os

professores têm tempo suficiente para trabalhar quase todas as dúvidas e detalhes do que diz

respeito ao conteúdo, material didático e execução das atividades. Os professores passam por

todas as atividades programadas simulando como se fossem os alunos em sala de aula. Isso não

ocorre no programa ACES e gera consequências negativas na sala de aula, como foi discutido.

No ACES, exige-se mais um autodidatismo dos professores, o que não é suficiente mesmo para

aqueles mais interessados e pró ativos. A incompletude sessões de formação escassas e de curta

duração do programa ACES, refletem em sala de aula como insegurança dos professores

durante a realização das atividades.

Augusto e Amaral (2015) trazem observações interessantes que vão ao encontro ao

que vimos como resultado do formato das sessões de formação do programa ACES. Em uma

pesquisa a qual trabalha com a concepção de professores em um curso de formação continuada

em ensino de ciências, a autora observa que as temáticas de maior impacto para as professoras

foram aquelas que lhes eram mais acessíveis, ou seja, já possuíam alguma familiaridade. Além

disso, a autora traz que “os cursos de formação de professores para as séries iniciais do Ensino

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Fundamental destinam poucas horas para Ciências, produzindo uma formação insuficiente

nessa disciplina. ” (AUGUSTO; AMARAL, 2015, p. 494), especialmente quando se trata dos

antigos cursos de Magistério, que é o caso de alguns professores do programa ACES. Dessa

forma, os autores trazem resultados de sua investigação, os quais identificamos ser a realidade

para muitos desses professores do programa, tanto a partir da sala de aula, quanto das sessões

de formação:

Os resultados da presente investigação denotam que as lacunas na formação

em conteúdos específicos tornam a professora insegura para: problematizar

(isto é, formular questões que, de fato, possibilitem a construção do

conhecimento pelo aluno), estar aberta aos questionamentos os alunos, e

conseguir selecionar e desenvolver os conteúdos mais pertinentes sem que,

para isso, precise recorrer sempre a livros didáticos. Portanto, estão

despreparadas para compreender e desenvolver, com autonomia, inovações

programáticas, o que também enfraquece os resultados das inovações

metodológicas, para os quais se encontram bem melhor preparadas. Portanto,

mesmo que pretendam problematizar os conteúdos a serem desenvolvidos,

não os compreendem suficientemente para colocá-los em questão, nem

adequá-los ao nível de seus alunos; mesmo que estejam convencidas da

importância de trabalhar com hipóteses levantadas pelos alunos, têm

dificuldades de lidar com elas e encaminhá-las produtivamente; ainda que

queiram fazer aproximações entre as concepções alternativas dos alunos e o

saber erudito, não conhecem suficientemente as nuances que separam as duas

formas de pensamento; mesmo que queiram praticar uma educação ambiental

intimamente integrada aos conteúdos de Ciências, não os compreendem

suficientemente para explorar essa perspectiva; ainda que sejam adeptas da

interdisciplinaridade, esbarram no desenvolvimento dessa problemática no

âmbito interno das Ciências Naturais e das alternativas programáticas que

propiciam esse enfoque naturalmente; e assim por diante. (AUGUSTO;

AMARAL, 2015, p. 506)

Mudando o foco para o segundo ponto de atenção nas sessões de formação, que é

em relação aos aspectos de didática e de pedagogia, pode-se afirmar que isso é bastante

desenvolvido no programa MESA. Especialistas no tema auxiliam o formador principal (que

trabalha o que é mais ligado ao conteúdo), providenciando dicas, orientações pedagógicas,

relatando experiências prévias bem-sucedidas e solucionando dúvidas particulares sobre

possíveis estratégias para alguns casos específicos. Muitas dessas questões são discutidas entre

todos os participantes das sessões, o que revela um caráter colaborativo.

Segundo relatos dos próprios professores, eles não se sentem empurrados para

frente como acontece nas formações de outras organizações e as sessões só avançam à medida

que todos podem caminhar juntos. Além disso, revelaram que as formações servem para

empoderá-los. Durante a abordagem dos temas, é constante o olhar voltado para algumas

reflexões como:

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Pensar sobre o que os estudantes estão pensando, como eles percebem a

atividade, o que eles entendem por engenharia ou ciência.

Estratégias de verificação para saber se os objetivos da aula foram

contemplados e quais as formas que a aprendizagem se manifesta nos

alunos.

Estratégias de engajamento dos alunos, motivação e construção do senso de

persistência.

Diferentes estratégias para se trabalhar com um conceito ou atividade.

Estratégias para desenvolver a argumentação, capacidade de negociação,

interpretação e criatividade.

Como avaliar os alunos sem depender de avaliações tradicionais.

Como envolver mais a família na vida escolar dos alunos.

Quais pontos precisam ser modificados nas atividades e material didático.

No programa ACES, há também um olhar voltado para essas mesmas questões,

porém, como relatado, houve muito menos espaço e tempo para que elas fossem articuladas

com profundidade, elas não constituem um ponto claro de atenção no programa, embora essa

seja uma necessidade muito grande conforme pudemos observar nas aulas regulares e nas

atividades que envolviam o programa. Alguns professores carecem de orientação didática e

pedagógica, por vezes até reconhecem eles próprios que precisam aprender mais sobre isso, o

que é interessante, já que alguns chegam a completar mais de uma década de atuação em sala

de aula. O fato é que as dificuldades organizacionais do programa ACES em estabelecer sessões

de formações mais abrangentes e com maior duração, revelam que essas sessões têm um caráter

muito mais tecnicista e voltado para o conteúdo do que para a formação docente. É uma

formação mais técnica e menos pedagógica.

Por fim, como dissemos, o terceiro ponto de atenção nas sessões de formação do

programa MESA está ligado à promoção da equidade, igualdade de gênero, autoestima e

inclusão. Isso quer dizer que há um tempo destinado específico para debater sobre estratégias

para engajar mais meninas nas atividades de ciências, por exemplo. Os professores e os

formadores discutem sobre estereotipação, empoderamento e sexismo na ciência e

manifestações disso já cedo na fase escolar. Uma outra preocupação é sobre estratégias para

estimular alunos com baixa autoestima a participarem das atividades, dado que os professores

confirmam que alunos imigrantes não são bem aceitos muitas das vezes, têm grandes

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dificuldades de se envolver nas atividades de ciência e despertar interesse ou curiosidade pelas

aulas. Os professores discutem como fazer com que crianças pouco estimuladas e amparadas

em casa desenvolvam suas habilidades durante as aulas e tenham atitudes positivas. Quanto a

esse ponto de atenção, para o programa ACES, se o segundo já não têm espaço, esse tem menos

ainda. O programa, apesar de se voltar para um público pertencente às classes desfavorecidas,

não conseguiu endereçar essas questões em sala de aula ou nas sessões de formação, revelando-

se incompleto do ponto de vista sociocultural.

Nas salas de aula e escolas

Um aspecto muito curioso para qualquer observador estrangeiro, especialmente

acostumado ao grau de descontração das escolas brasileiras, é a preocupação com a segurança

e a sensação de perigo constante. Há nas salas de aula um manual de segurança que ensina os

alunos a lidarem com situações adversas como incêndio, terremotos, furacões, ataques à bomba,

terrorismo e tiroteios. Não que nenhum desses eventos seja realmente comum, mas é curioso

como a sensação de ameaça está sempre presente. Por exemplo, em algumas das escolas

visitadas, um adulto é proibido de permanecer no parque das crianças por questões de segurança

(exceto se for da segurança), e as crianças não podem em hipótese alguma correr ou brincar nos

corredores, devendo fazer isso nas áreas específicas destinadas e apenas nas horas recreativas.

As crianças são constantemente lembradas de que elas precisam permanecer em segurança e há

diversas músicas a elas ensinadas a cantar, cujo tema é estar seguro. Absolutamente contrastante

com as escolas brasileiras convencionais, por exemplo, é o que acontece em uma das escolas

observadas (e que parece ser o padrão nas demais) quando os alunos descem para o almoço.

Todos descem em absoluto silêncio e organizados em filas simetricamente estabelecidas.

Dessa forma, é possível notar que, do ponto de vista das escolas brasileiras, há

características de um modelo tradicional muito evidentes nas escolas estadunidenses visitadas,

o que não corresponde necessariamente ao que é o programa MESA, tampouco a todas as

escolas estadunidenses. A hierarquia é surpreendentemente rígida. Não é concebível, por

exemplo, referir ao professor sem o pronome de tratamento. As relações entre os adultos e as

crianças é muito engessada e formal, quando comparadas às escolas brasileiras. Em uma das

classes observadas (e esse é um procedimento comum em muitas outras), existe uma cota de

pontos negativos que os alunos não podem ultrapassar. Quando eles ultrapassam, devem ir para

a cadeira dos alunos “mal comportados” até o fim da aula. O agravante é que correr nos

corredores ou nas escadas, por exemplo, é considerado uma infração. Dependendo da situação,

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falar sem levantar a mão ou pedir ao professor antes, também pode ser considerado uma

infração. Um dos professores acompanhados, faz questão de mostrar a lista das infrações a

todos os alunos, deixando claro que é preciso sempre “andar na linha”.

Entretanto, essas observações lançaram luz sobre uma questão que já havíamos

constatado com os questionários: o que significa ser autoritário em uma escola brasileira e o

que significa isso em uma escola estadunidense? O que significa pensar em

comportamentalismo em uma relação professor-aluno nos EUA? Ficou claro a partir das

observações realizadas que possivelmente algumas classificações que utilizamos para perceber

um modelo pedagógico de ensino de ciências podem ser mais culturalmente dependentes do

que o esperado. Falar em uma sala de aula comportamentalista e em uma concepção de escola

tecnicista em um país altamente neoliberal é muito diferente do que falar em um país cujas

relações humanas são diferentes e o sistema econômico não é exatamente o mesmo.

Casos específicos

Uma das professoras observadas no programa MESA parece trabalhar em uma linha

construtivista, revelando inclusive utilizar Jean Piaget como referencial, segundo o

questionário. De fato, isso se confirma pelas respostas do questionário e pelo que revelam as

observações. Contudo, não é possível fazer generalizações para os demais professores do

programa. O que parece estar sendo reproduzida é a mesma tendência encontrada no programa

ACES: uma heterogeneidade muito grande de concepções, orientações e backgrounds, algo que

se manifesta claramente nos questionários. Por um lado, isso mostra que o questionário dá luz

de alguma forma às concepções dos professores. Por outro lado, mostra que para caracterizar

um programa cujo número de professores participantes é grande, torna-se uma tarefa difícil

justamente pela grande variação nas concepções desses professores.

Ao passo que essa professora mencionada trabalha com os alunos sobre a natureza

da ciência, história da ciência, formulação de hipóteses e questões científicas, investigação,

variáveis, métodos, análise, princípios de design, desempenho e criatividade; as sessões de

formação de professores não contemplam muitos desses temas. Por exemplo, não se discute

com profundidade sobre a natureza da ciência ou filosofia da ciência, e o pouco que é

desenvolvido gira em torno de uma visão neutralista e positivista da ciência.

Não é pauta das sessões de formação de professores debater esses elementos

característicos dos modelos sociocultural, CTS ou construtivista, por exemplo, contribuindo

para a manutenção da visão da ciência perfeita e do otimismo tecnológico. Esse otimismo é,

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inclusive, facilmente notado em muitas das atividades. Os desafios apresentados aos alunos

giram sempre em torno da ideia: utilize a ciência, engenharia, tecnologia e a matemática para

solucionar os problemas ambientais, sociais e econômicos. Há claramente uma

contextualização e uma preocupação evidente com o meio ambiente e o consumo de energia.

Esses podem ser descritos como sendo os principais temas de todas as atividades. Contudo, são

sempre conduzidos sem nenhuma discussão social ou que coloque a ciência, ou o método

científico em questão.

Parece emergir aí um princípio tecnocrático. Reconhece-se que é necessário

contextualizar os temas, torna-los transdisciplinares, tornar a aprendizagem participativa e

ativa, enquanto sustentabilidade é a palavra da vez. Todavia, como discutimos no capítulo de

STEM education, qual é essa visão de sustentabilidade que se cultiva nos programas baseados

em STEM? Para Feinstein e Kirschgasler (2015), preocupa o fato de que mudanças climáticas

globais sejam encaradas como um problema de engenharia e que as dimensões sociopolíticas

dos problemas sejam ocultadas como se não fossem fatores que contam. Nas abordagens dos

problemas, é esperado que os alunos saibam como crescer plantas em marte ou como resolver

o problema energético. Mas não é esperado que eles saibam conduzir um debate sobre os

processos de industrialização e exploração dos recursos, ou das relações político-econômicas

envolvidas no aquecimento global. Ao menos nas observações realizadas no programa MESA,

essas discussões não parecem ter o mesmo espaço que as atividades de engenharia e design.

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4.4. Questionários

Para apresentar o questionário e alguns de seus resultados, apresentamos a seguir a

versão integral33 do artigo publicado no XI ENPEC – Encontro Nacional de Pesquisadores de

Ensino de Ciências. O regulamento do congresso determinou diretrizes específicas para a

apresentação dos trabalhos, de modo que houve uma limitação em relação ao número de páginas

do artigo. Por isso apresentaremos na sequência outros dados e uma discussão aprofundada

ainda sobre a elaboração e aplicação dos questionários. Realizaremos uma problematização

com relação ao uso do questionário na pesquisa e algumas particularidades na determinação

dos modelos pedagógicos de ciências através de um questionário. O questionário completo

encontra-se na seção 8.1 como arquivo anexo.

33 O artigo segue inclusive com a formatação original.

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XI Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências – XI ENPEC Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC – 3 a 6 de julho de 2017

Identificação de modelos pedagógicos presentes nas concepções sobre ensino de ciências de

professores da educação básica

Assessment of pedagogical models present on K-12

teachers’ beliefs about science teaching

Gustavo Oliveira Pugliese

Instituto de Biologia – Universidade Estadual de Campinas

[email protected]

Rebeca Chiacchio Azevedo Fernandes

Instituto de Geociências – Universidade Estadual de Campinas

[email protected]

Resumo

Este artigo descreve o processo de desenvolvimento e aplicação de um instrumento de pesquisa

que busca identificar modelos pedagógicos no ensino de ciências. Ele resulta de pesquisa

anterior sobre caracterização de programas educacionais segundo modelos pedagógicos de

ensino de ciências propostos por Fernandes (2015): Tradicional, Redescoberta, Tecnicista,

Construtivista, Sociocultural e Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS). A partir do

estabelecimento das tendências dos modelos pedagógicos retratados em pesquisas sobre

práticas pedagógicas no Brasil, identificou-se a necessidade de criar um instrumento que

auxiliasse a identificação desses modelos nas práticas escolares e que contribuísse para a

pesquisas em ensino de ciências. Portanto, elaboramos um questionário que apresentamos como

instrumento de identificação de modelos pedagógicos. Como resultado do processo de

elaboração e aplicação desse questionário, identificamos que ele fornece indícios das crenças e

tendências prevalentes no processo de ensino e pode, portanto, ser utilizado como um dos

instrumentos para identificação dos modelos pedagógicos de ensino de ciências.

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Palavras chave: modelos pedagógicos; ensino de ciências; metodologia de pesquisa;

instrumentos de pesquisa em educação; concepções de professores

Abstract

This paper describes a research tool development and use. This tool aims to identify

pedagogical models in science teaching and it results from previous research about

characterization of educational programs according to six pedagogical models presented by

Fernandes (2015): Traditional, Rediscovery, Technicist, Construtivist, Sociocultural, and

Science-Technology-Society (STS). After establishing pedagogical models trends portrayed in

research about pedagogical practices in Brazil, we recognize that research tools capable of

identifying these models in the school practices are needed; as well as a research tool that

contributes to research in science education. Therefore, we created a questionnaire that we

present as a pedagogical models identifying instrument. As result of the process of creating and

application, we identified that it provides evidences of trends and beliefs prevalent on the

teaching process, and, therefore, it can be employed as an instrument to identify science

teaching pedagogical models.

Key words: pedagogical models, research instruments on education, science education,

research methodology, teachers’ beliefs

Introdução

Modelos Pedagógicos de Ensino de Ciências

A compreensão dos modelos pedagógicos de ensino de ciências que predominam nas práticas

escolares é um dos pontos de partida para investigação. Diversas escolas pedagógicas e

programas educacionais, sejam eles formais ou não, valem-se de concepções acerca do que

deve e como deve ser ensinado e aprendido. A partir dessas variadas concepções, uma série de

tendências e direcionamentos emergem, sendo possível classificar e organizar essas tendências

em quadros teóricos e modelos conceituais. Pesquisadores do grupo FORMAR – Ciências, da

Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, vêm trabalhando no

estabelecimento do Estado da Arte das pesquisas em Ensino de Ciências (ver: FERNANDES,

2015; FERNANDES & MEGID NETO, 2012; MEGID NETO, 1998). Com base no estudo

sobre as diferentes tendências pedagógicas que inspiraram as práticas escolares ao longo da

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história da educação brasileira, Fernandes (2015) propôs seis modelos pedagógicos para a

analisar práticas retratadas em teses e dissertações sobre ensino de ciências no Ensino

Fundamental I: Tradicional, Redescoberta, Tecnicista, Construtivista, Sociocultural e Ciência-

Tecnologia-Sociedade (CTS)34.

Segundo Fernandes,

Modelos Pedagógicos são formulações de quadros interpretativos

baseados em pressupostos teóricos utilizados para explicar ou

exemplificar as ideias pedagógicas e servem de referência e parâmetro

para se entender, reproduzir, controlar e/ou avaliar a prática

pedagógica, entendida como uma parte do fenômeno educativo. (2015,

p. 27)

Partindo dessa definição, entendemos que um modelo pedagógico descreve uma posição teórica

e filosófica, bem como metodológica, que sustenta determinada prática escolar. Ou seja, ele

descreve as concepções e proposições que estabelecem um modo de operar relativamente

estável nas ações que envolvem o processo educativo.

Essa categorização em modelos ocorre principalmente no plano teórico, como uma forma de

classificar as diferentes concepções e ações em uma situação de ensino-aprendizagem.

Entretanto, é necessário considerar que os limites entre os modelos não são completamente

estáticos e fáceis de serem distintos mesmo no nível teórico e certa relativização é esperada

nessa sistematização. Fernandes (2015) ressalta que os modelos frequentemente coexistem e se

superpõem nas práticas cotidianas. A autora destaca ainda que eles “não são estanques e nem

surgiram ou tiveram maior repercussão em uma determinada época por acaso. Eles estão

vinculados às ideias pedagógicas que vigoraram com maior ou menor intensidade em

determinada época, atreladas à conjuntura histórica, social e política do país” (Idem, p. 144).

A importância de identificar os modelos pedagógicos presentes nas ações e crenças reside no

fato de que em uma situação de ensino e aprendizagem é preciso ter clareza metodológica para

se alcançar os objetivos esperados. O planejamento de propostas ou programas educacionais

precisa apresentar consistência em suas escolhas e percepções sobre o que é o ensino de

ciências, o que se espera transformar e o que significa o processo de educação. Para permitir

essa identificação, é essencial que tenhamos mecanismos permitindo distinguir uma prática de

outra, ou quais são as crenças que orientam uma decisão tomada por um professor na sala de

34 Para maior detalhamento sobre cada modelo pedagógico de ensino de ciências, recomendamos a leitura de

Fernandes (2015) e Fernandes; Megid Neto (2012).

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aula ou determinada postura adotada por uma instituição de ensino. Destaca-se, assim, nossa

questão de pesquisa: É possível, através de um questionário, identificar os modelos

pedagógicos presentes nas concepções de professores da educação básica sobre ensino de

ciências? Apresentaremos adiante o processo de elaboração e aplicação do questionário.

Procedimentos Metodológicos

Este trabalho focará na discussão sobre um instrumento de pesquisa e é parte de uma pesquisa

maior do tipo Estudo de Caso sobre dois programas educacionais de ensino de ciências, um no

Brasil (programa A) e outro no Estado de Washington nos Estados Unidos (programa B). O

objetivo principal da pesquisa é identificar os modelos pedagógicos predominantes nesses

programas. Ambos desenvolvem atividades de ensino baseadas em solução de problemas,

exploram atividades envolvendo engenharia, ciência e matemática e realizam sessões contínuas

de formação de professores ao longo do período letivo. Os programas são institucionalmente

independentes das escolas em que atuam e configuram-se como Organizações Não

Governamentais, além disso oferecem bolsas para os professores participantes. O programa

brasileiro atua em quatro escolas públicas de Campinas, alcançando cerca de 400 alunos e 8

professores anualmente. O programa americano atua em escolas públicas e Community

Colleges públicos no estado de Washington (EUA), alcançando cerca de 4000 alunos e 100

professores anualmente.

Nosso principal objetivo com essa parte da pesquisa é construir um instrumento de pesquisa

para auxiliar a identificação dos modelos pedagógicos presentes nas concepções sobre ensino

de ciências de professores da educação básica. O questionário foi desenhado para facilitar a

identificação dos modelos pedagógicos tanto em um contexto específico, tal como um programa

educacional, quanto em um grupo de professores em uma escola. O objetivo secundário é

apresentar alternativas de pesquisa para a caracterização de concepções sobre ensino de ciências

de professores da educação básica, bem como os desafios e cuidados necessários na aplicação

de questionário para caracterização de modelos pedagógicos e crenças de professores.

Instrumento de pesquisa: Questionário

Para caracterizar uma proposta pedagógica ou um conjunto de aulas, um dos mecanismos de

pesquisa utilizados em um Estudo de Caso é o questionário (ANDRE, 2008). Apesar das

ressalvas quanto a utilização de métodos padronizados como questionários para identificar

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opiniões (ver: LEDERMAN et al., 2002; RYAN; AIKENHEAD, 1992), eles fornecem pistas

sobre as concepções predominantes dos entrevistados e são vistos aqui como uma ferramenta

capaz de dar corpo e expressão a um conjunto de ideias presentes no plano mental dos

envolvidos em uma pesquisa. Em muitas pesquisas sobre a natureza da ciência e sobre o ensino

de ciências, os questionários são amplamente utilizados como principal instrumento de coleta

de dados (CASTELFRANCHI et al. , 2013; KIND, 2013; LEDERMAN, 1992, LEDERMAND

et al. , 2002; MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2010). A atenção em relação ao

tipo de informação que se busca obter determina a maneira como o questionário deve ser

estruturado, conforme discutiremos a seguir. Reconhecemos que as crenças e ideologias em

relação a determinada ideia apresenta demasiada complexidade para ser capturada por um único

instrumento (PARK e OLIVER, 2008), por isso frisamos que o questionário deve ser visto como

uma das ferramentas possíveis na identificação dos modelos pedagógicos de ensino de ciências,

não como um instrumento categórico para descrever os modelos.

O grupo pesquisado é o de professores, porque conforme já demonstrado (KATSH-SINGER et

al., 2016; KIND, 2015; LEDERMAN, 1992; PAJARES, 1992), as crenças dos professores

impactam significativamente no processo de ensino e aprendizagem e as escolhas que os

professores fazem na sala de aula. Entendemos por crença, algo que envolve as ideologias,

orientações filosóficas, opiniões e posicionamentos políticos de um sujeito, sendo influenciada

pela história, contexto social e memória discursiva desse sujeito. Segundo Bejarano &

Carvalho, “as crenças dos professores passam a ser, portanto, os melhores indicadores das

decisões que os indivíduos fazem através de suas vidas. (...) Percepções e julgamentos, por seu

lado, afetam comportamentos dos professores em sala de aula” (2003, p. 2). Dessa forma,

valendo-nos da metodologia de estudo de caso, e da revisão sobre os modelos pedagógicos de

ensino de ciências (FERNANDES, 2015), nos propusemos a elaborar um questionário que

possibilite identificar os modelos pedagógicos que influenciam (ou que baseiam) as concepções

dos professores de ciências sobre o ensino de ciências.

A seguir descreveremos as etapas de elaboração e aplicação do questionário.

Escolha de critérios

Para a sistematização dos modelos em um questionário, partimos do estudo de autores da área

para definir critérios que auxiliassem a delimitação de um modelo pedagógico. Utilizamos

principalmente o trabalho de Fernandes (2015) que apresenta um quadro síntese dos modelos

pedagógicos no ensino de Ciências no Brasil a partir dos critérios concepção de educação;

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relação escola-sociedade; abordagens do processo de ensino e aprendizagem; concepção de

Ciência; concepção de ambiente; concepção de ensino de ciências; papel da experimentação.

Baseamo-nos também em Fahl (2003), Mizukami (1986), Amaral (1997) e Libâneo (2009),

para compreender as categorias utilizadas por esses autores para descrever as tendências

educacionais. A partir deste estudo teórico, estabelecemos seis critérios que auxiliam a delimitar

um modelo pedagógico, conforme figura 1.

Figura 1: Representação esquemática dos seis critérios utilizados para determinar um modelo

pedagógico e a interação entre esses critérios.

O Papel Político e Social da Escola está relacionado a qual visão se tem da Escola enquanto

instituição, quais papéis se pode atribuir a ela e quais são as expectativas e impactos que ela

pode trazer na sociedade. As Abordagens do Processo de Ensino e Aprendizagem, conforme

descrito por Mizukami (1986), versam sobre como o processo de Ensino e Aprendizagem é

construído, fundamentado e encarado pelos educadores. A Relação Professor-Aluno trata das

estruturas hierárquicas na sala de aula, do papel do professor e do aluno. O Currículo está

ligado às escolhas que se faz em relação ao que deve ser ensinado e aprendido; ao que deve ser

priorizado e como o conteúdo deve ser sistematizado. A Concepção de Ciência é o critério que

mais aproxima nossa análise dos modelos pedagógicos em relação ao Ensino de Ciências: como

a Ciência é vista pelos educadores, quais funções ela possui enquanto instituição, por meio de

quais instrumentos ela opera, o que é o método científico e qual a relevância da filosofia e

epistemologia da ciência. Por fim, a Concepção de Ambiente versa sobre como a Educação

ambiental é trabalhada nos processos de ensino e aprendizagem. O cruzamento desses seis

critérios poderá fornecer um panorama do modelo pedagógico em questão.

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Estrutura do Questionário

Estabelecidos os critérios que sustentam o questionário, elaboramos, para cada um deles, ao

menos uma afirmação que relacionasse o critério a um modelo pedagógico, conforme ilustra a

figura a 2, além de algumas questões de validação interna, totalizando 46 afirmações. Para cada

afirmação há uma escala de resposta do tipo Likert adaptada com 5 alternativas (concordo

totalmente, concordo, discordo; discordo totalmente e não compreendi a afirmação). O

questionário foi elaborado e validado em português, traduzido e revalidado em inglês. Ele foi

aplicado nas sessões de formação de professores de ambos os programas apenas para os

professores que se voluntariaram a responder. O tempo médio para que seja respondido é de 15

minutos e não foram feitas interferências durante a aplicação. Para validação do questionário

em português, foram realizados dois testes pilotos, com 6 alunos de graduação participantes do

programa no Brasil e com 2 pesquisadores universitários externos ao programa. Para validação

do questionário em inglês, foram realizados também dois testes pilotos, com 2 diretores e 2

professores do programa.

Figura 2: Representação da estrutura parcial do questionário. A coluna “critério” e a coluna “modelo”

não aparecem no questionário apresentado aos professores.35

As afirmações foram estabelecidas a partir de uma revisão principalmente do trabalho de

Fernandes (2015). Entretanto outras pesquisas foram usadas como referência para a elaboração

das afirmações (ASOKO et al., 1999; FAHL, 2003; KATSH-SINGER et al., 2016;

LEDERMAN, 2006; LEDERMAN et al., 2002; MIZUKAMI, 1986; SANTOS, 2007).

Estabelecidos os seis critérios, buscou-se representar os modelos da forma mais objetiva

possível, dadas as variáveis que influenciam um participante a responder com precisão um

questionário, mas também da maneira mais abrangente possível, sem torna-lo exaustivo. Não é

nosso escopo penetrar nas nuances de cada modelo através do questionário, pois isso o

invalidaria.

A escolha por afirmações e não por perguntas se deu porque buscamos avaliar se os professores

35 Para acessar a versão completa do questionário, solicitamos contatar os autores.

Critério Afirmações ModeloAfirmação 1 TradicionalAfirmação 2 Redescoberta

Afirmação 3 Construtivismo

Afirmação 4 Tecnicista

Afirmação 5 Sociocultural

Afirmação 6 CTS

Papel político-

social da escola

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concordam ou não com o modelo pedagógico em questão sintetizado em afirmações. A partir

da análise de outras experiências com questionários que buscam extrair as concepções sobre

ciência e natureza da ciência como Katsh-Singer et al. (2016), Kind (2015), Lederman et al.

(2002), Pajares (1992), Ryder, Leach e Driver (1997), mantivemo-nos atento a três questões:

eliminar ao máximo ambiguidades e múltiplas interpretações de uma mesma questão, evitar

afirmações cuja interpretação daquele que entrevista não fosse a mesma daquele que é

entrevistado, assegurar que o entrevistado respondesse o questionário sem nenhuma pressão ou

que não respondesse de maneira desatenta. Não pretendemos apresentar um questionário isento

de vieses e ideologias dos entrevistadores, uma vez que essa é uma tarefa impossível em uma

visão discursiva (ORLANDI, 2007). Entretanto, perguntas abertas como “Qual a sua definição

de ciência?” ou “Qual o papel da escola?” são demasiadamente complexas e as respostas

trazem pouca direção ou ordem para que sejam categorizadas em modelos pedagógicos. Por

isso, foi feita a escolha de algumas afirmações por vezes engessadas nos discursos escolares

(por ex.: “a ciência é capaz de descrever a realidade (...), pois é uma disciplina neutra”), a fim

de garantir que as ambiguidades entre a interpretação do entrevistado e do entrevistador fossem

minimizadas.

Além disso, a escolha por afirmações padronizadas permite o estudo de uma amostra maior de

professores, o que nos atende na avaliação dos dois programas educacionais. A realização de

entrevistas individualizadas e com perguntas abertas gera uma enormidade de dados ricos,

porém que exigem profunda análise do discurso para serem analisados, limitando a pesquisa a

poucos participantes. Uma vez que nossa pretensão é de avaliar os programas como um todo,

dados mais abrangentes e quantitativos são mais adequados. Nossa experiência prévia com os

professores participantes da pesquisa já sugeria que nem sempre as concepções teóricas

correspondem à atuação nas práticas educacionais, por isso optamos por elaborar um

instrumento abrangente em termos de amostra, mas que possa ser complementado com outras

técnicas quando o objetivo é a análise detalhada de casos individuais ou a análise das práticas

e não das concepções teóricas.

Resultados

Aplicamos o questionário em uma amostra total de 36 professores (8 participantes do programa

no Brasil e 26 participantes do programa nos EUA) e obtivemos os seguintes resultados:

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Figura 3: 3A Média das respostas obtidas no grupo de professores do programa A (Brasil).

N= 8; 3B Respostas obtidas com o professor 1 do programa A (Brasil). N=1; 3C Média das respostas

obtidas no grupo de professores do programa B (EUA). N=26; 3D Respostas obtidas com a professora

6 do programa B (EUA). N=1. As respostas foram padronizadas em porcentagem. O eixo Y representa

a porcentagem das respostas e o eixo X representa os diferentes modelos pedagógicos analisados. As

respostas ausentes ou do tipo “não entendi a afirmação” não foram computadas.

Observamos que, em ambos os programas educacionais (Figuras 3A e 3C), os professores

apresentam crenças bastante heterogêneas, concordando com aspectos conflitantes

(metodologicamente, filosoficamente, socialmente) dos diferentes modelos e com visões

antagônicas, sugerindo que essas percepções não são claramente orientadas. Analisando os

questionários individualmente observamos que há professores que concordam e discordam

simultaneamente de afirmações correspondentes a um mesmo modelo pedagógico. Notamos

assim que, salvo algumas exceções, em ambos os grupos analisados, não há coerência interna

nas concepções dos professores sobre o ensino de ciências.

Em ampla revisão sobre pesquisas com questionários que visam acessar as concepções de

professores sobre ciência, Lederman (1992) observou que, independentemente do instrumento

utilizado para acessar essas visões, há alta frequência de visões ecléticas entre os professores

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pesquisados.

Observamos também que a distribuição dos modelos pedagógicos predominantes se espalha

mais à medida que a amostra aumenta. Isso evidencia que, no coletivo de professores, as ideias

pedagógicas se encontram dispersadas e não há um direcionamento pedagógico claramente

definido.

Esse ecletismo nas respostas, contudo, pode ser utilizado a favor dos programas educacionais:

ambos os programas realizam formação de professores, e nas sessões de formação é criada a

oportunidade de alinhar as metodologias e debater as diferentes visões sobre como e o que

ensinar. Além disso, é uma oportunidade para revisitar e discutir concepções consideradas

impróprias. Por essa razão, acreditamos que o questionário proporciona a possibilidade de

levantamento prévio de concepções para planejamento das sessões pelos formadores.

Por outro lado, observamos também que há professores que demonstram crenças bem

direcionadas aos modelos Construtivista, Sociocultural e CTS, como é o caso dos professores

6 e 3 (Figura 4A e 4B).

Figura 4: 4A Respostas obtidas com o professor 6 do programa A (Brasil). N=1; 4B Respostas

obtidas com a professora 3 do programa B (EUA). N=1.

Essas conclusões foram corroboradas também por entrevistas e observação de aulas feitas pelo

primeiro autor desse artigo, indicando, inclusive, que os dois professores revelam se orientar

metodologicamente para o preparo e execução das aulas, o que pôde ser captado pelo

questionário. A correlação entre os resultados dos questionários, das entrevistas e da observação

das aulas, é um fator que contribui para validação do questionário. Assim, notamos que, embora

o questionário seja um instrumento para identificar as concepções teóricas dos professores, e,

portanto, há que se ter cautela e flexibilidade nas conclusões dos panoramas traçados a partir

de sua aplicação, ele oferece certo grau de verossimilhança com as práticas desenvolvidas em

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sala de aula.

Apesar do ecletismo e dispersão destacados anteriormente, pudemos notar que em ambos os

grupos estudados, as respostas dos professores apresentam certo alinhamento entre dois grupos

de modelos pedagógicos.

Figura 5: Média da soma das respostas obtidas com o grupo de professores do Programa A

(Brasil) e do Programa B (EUA). N= 36.

Em ambos os programas (Figura 3A, 3C e 5), os professores discordam mais das afirmações

sobre os modelos Tradicional, Redescoberta e Tecnicista (mais presentes até a década de 1970)

enquanto que os modelos Construtivista, Sociocultural e CTS apresentam mais respostas do

tipo concordo ou concordo totalmente, demonstrando que, em linhas gerais, estes são os

modelos mais aceitos atualmente no ideário dos professores.

Esses dados apresentam certa sintonia com resultados encontrados anteriormente

(FERNANDES, 2015). Notamos que embora no campo das ideias pedagógicas o Modelo

Construtivista tenha exercido maior influência no ensino de ciências a partir da década de 1990

(e mais recentemente o Modelo CTS), no campo das práticas pedagógicas ainda se manifestam

características dos Modelos Tradicionais, Tecnicista e Redescoberta. Os resultados encontrados

na presente pesquisa podem ser reflexos desta distância entre o ideário pedagógico e a prática

desenvolvida em sala, sugerindo que, embora o conjunto de professores apresente certo

direcionamento em relação às tendências mais atuais de ensino, as contradições presentes em

suas afirmações evidenciam incoerências teórico-metodológicas.

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Considerações finais

O principal desafio no processo de representação dos modelos através de afirmações reside no

fato de que é preciso conciliar a abrangência e variedade no conteúdo das afirmações para

garantir consistência e validação internas, com o tempo que o entrevistado dedica atentamente

para as respostas. Além disso, apesar da existência e estabelecimento dos modelos pedagógicos

de ensino de ciências na literatura, é uma árdua tarefa distinguir os limites entre os modelos em

um questionário, principalmente dentro do universo de possibilidades em cada prática

educacional. Em seu quadro síntese dos modelos pedagógicos, Fernandes (2015) apresenta

algumas características que são comuns aos diferentes modelos. Essa semelhança

inevitavelmente se reflete nas afirmações do questionário.

A utilização de um questionário, ao contrário de uma entrevista semiestruturada, permitiu

avaliar as crenças de um número maior de professores, mesmo que a análise dos dados obtidos

não possa ser realizada qualitativamente, como em uma análise do discurso, por exemplo, e

favoreceu uma maior abrangência de professores. Nesse sentido, o questionário pode ser

considerado mais abrangente e facilita a identificação de modelos pedagógicos em um

programa educacional que conta com um grande número de envolvidos. Além disso, pode ser

bastante adequado como primeira abordagem, trazendo indícios e sugerindo direções para

etapas posteriores da pesquisa.

Entretanto, como notado em Katsh-Singer et al. (2016), ambos os métodos devem ser

explorados para eliminar possíveis inconsistências e ambiguidades. Uma alternativa proposta

pela autora que equilibra os dois métodos é a realização do questionário com uma larga amostra

de participantes e a seleção de uma amostra representativa para realizar entrevistas que

detectem possíveis inconsistências do questionário. A associação desses dois métodos traz uma

avaliação significativa das concepções dos participantes (LEDERMAN et al., 2002).

Friedrichsen (2011) recomenda que as investigações sobre as orientações acerca do ensino de

ciências sejam investigadas a partir de uma perspectiva multiangular, ou seja, com uma

combinação de outras técnicas. A observação em sala de aula, por exemplo, pode complementar

os dados obtidos nos questionários.

Pretendemos dar continuidade ao estudo com a aplicação do questionário em uma amostra

maior e com a realização de entrevista semiestruturada com uma parcela dos professores que já

responderam o questionário. Como parte do estudo de caso, iremos também realizar a

observação das aulas de uma amostra de professores.

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Agradecimentos

Agradecemos ao Prof. Dr. Rodolfo J. Azevedo, à Ph.D. Phyllis Harvey-Buschel e James B.

Dorsey, por possibilitarem a aplicação dos questionários. Agradecemos à CAPES pelo

financiamento.

Esta pesquisa possui aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa

Referências

AMARAL, I. A. Conhecimento Formal, Experimentação e Estudo Ambiental. Ciências &

Ensino – FE-UNICAMP, v. 3, p. 10–15, 1997.

ANDRE, M. E. D. A. DE. Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional. Brasília:

Liber Livro, 2008.

ASOKO, H.; DRIVER, R.; LEACH, J.; MORTIMER, E.; SCOTT, P. Construindo

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106

4.4.1. Resultados e discussão adicionais referentes ao questionário

O artigo apresentado traz os principais resultados e discussões em relação ao

questionário, sua elaboração e execução. Como mencionado anteriormente, faremos ainda

alguns adendos em relação a essa etapa de nossa pesquisa, uma vez que havia uma restrição

quanto ao tamanho do artigo que poderia ser submetido para o congresso ao qual foi

apresentado.

O questionário passou e continua passando por modificações desde sua primeira

versão. Mesmo após a submissão do artigo, fizemos ainda pequenas alterações no número de

afirmações. Dessa forma, as duas versões que apresentamos nos arquivos anexos 6.1 e 6.2, uma

em português e outra em inglês, contêm 36 e 40 afirmações respectivamente e são ligeiramente

distintas das versões as quais discutimos os dados apresentados anteriormente no artigo. Além

disso, é preciso notar que as afirmações não são igualmente distribuídas entre os modelos

pedagógicos de ensino de ciências, o que é corrigido pela padronização que realizamos. Isto é,

se um modelo aparece mais vezes que outro nas afirmações, ele tem um peso proporcionalmente

menor na contabilização das respostas.

Sobre a seleção da amostra, no caso do programa ACES, ela representa 100% dos

professores. Já no caso do programa MESA, foi possível obter a participação de 28 professores,

o que representa aproximadamente 25% dos professores do programa MESA/Washington. A

impossibilidade de trabalharmos com uma amostra maior não representou um problema para

nossas análises, uma vez que não nos baseamos no questionário unicamente para determinar os

modelos pedagógicos de ensino de ciências predominantes no programa MESA. Isso porque,

como já discutido, não são apenas as concepções teóricas dos professores que são capazes de

fazer essa determinação, uma vez que elas dependem de inúmeros outros fatores. O artigo traz

a informação de que seu principal objetivo é “Construir um instrumento de pesquisa para

auxiliar a identificação dos modelos pedagógicos presentes nas concepções sobre ensino de

ciências de professores da educação básica. ” Nesse sentido, cabe aqui enfatizar que nossa

utilização dos dados obtidos com as respostas dos professores se deu muito mais no intuito de

perceber as consistências e inconsistências em relação às concepções dos professores, bem

como de perceber as diferenças entre essas concepções teóricas e as práticas realizadas em sala

de aula. A partir dos resultados obtidos, principalmente a partir do contraste com as outras

fontes de dados, é possível perceber que o questionário cumpre satisfatoriamente esse propósito.

Em relação ao estabelecimento das afirmações utilizadas no questionário, é fato que

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nos valemos de afirmações ora estereotipadas sobre um modelo, ora que abrangessem

possivelmente mais de um modelo. Entretanto essa foi uma escolha consciente e pautada não

no propósito de delimitar com exatidão o princípio e o fim de cada modelo pedagógico, mas

ideia geral sobre cada um deles, ou sobre cada grupo de modelos. Afinal, não é razoável esperar

que algum professor, por mais elaborada que seja sua orientação metodológica, siga à risca um

ou outro modelo pedagógico. Nas etapas de validação inicial e baseados em nossa literatura de

referência sobre composição e aplicação de questionários, foi possível notar que seria preciso

evitar afirmações demasiadamente elaboradas e complexas, principalmente em questionários

longos como é o nosso caso. Caso contrário, perderíamos qualidade e fidedignidade nas

respostas obtidas. A criação de tantas categorias e o cruzamento com tal número de modelos

nos serviu sobretudo para termos variabilidade e robustez necessárias na busca por tendências

gerais nas respostas analisadas tanto individualmente, quanto coletivamente.

A seguir integraremos os resultados obtidos e nossas análises, realizando uma

comparação direta entre os dois programas.

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4.5. Discussão e conclusões

Modelos pedagógicos coexistentes

É possível perceber ao longo de nossas análises realizadas e apresentadas aqui que

características de diferentes modelos pedagógicos de ensino de ciências podem ser notadas em

ambos os programas educacionais avaliados. Mas afinal, predomina algum modelo em cada um

deles? Durante a coleta de dados, essa pergunta se mostrou cada vez mais complexa, dado que

à medida que avançávamos em nossa investigação, um hibridismo de modelos se tornava mais

evidente.

Ao trabalhar com os questionários, por exemplo, observamos que havia grande

direcionamento para os três grupos de modelos pedagógicos mencionados, em parte dos

professores, em ambos os programas, embora haja muitos casos de indivíduos nos quais as

concepções não parecem ser orientadas. No programa MESA, cuja amostra de professores

participantes da pesquisa aumentou gradativamente, percebemos que a heterogeneidade de

modelos pedagógicos presentes nas respostas, ao menos no campo das concepções dos

professores, também aumenta à medida em que envolvíamos mais participantes na pesquisa.

Isso levantou a questão sobre como distinguir os modelos presentes no programa educacional

dos modelos presentes nas concepções de seus sujeitos participantes. O mesmo se aplica para

o programa ACES o qual, apesar de possuir um número pequeno de professores participantes,

à medida que observávamos as atividades, as aulas e as sessões de formações, ficava evidente

que a heterogeneidade de concepções teóricas, práticas pedagógicas e concepções

predominantes variavam em muitos aspectos ainda que se tratasse de um único professor ou

professora.

É sabido que as concepções dos professores impactam diretamente nos programas

educacionais e na escola e estudos têm chamado a atenção para o quanto essas concepções

interferem especialmente na visão que os alunos têm sobre ciência (PAJARES, 1992; KATSH-

SINGER et al, 2016; ALLCHIN, 2014). Esses estudos têm apontado a relação entre uma

imagem ingênua e mal formulada sobre a natureza da ciência por parte dos professores

refletindo diretamente na visão neutralista e determinista da ciência. Por isso, não poderíamos

desvincular totalmente o que os professores pensam e fazem em sala de aula do que os

programas assumem como ideologia e têm como objetivos, nem deixar de notar o quanto os

programas se dedicam a construir em conjunto com os professores uma determinada concepção

de ciência e concepção de ambiente. Afinal, em se tratando de programas embasados no ensino

de ciências, queremos compreender como eles lidam com essas concepções.

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O fato é que a busca pelos modelos predominantes nos programas estudados

revelou, por um lado, algo que já é esperado: os diversos modelos pedagógicos coexistem em

cada programa. Isso pode ser explicado por alguns fatores como o fato dos programas

envolverem muitos sujeitos, instituições, serem complexos, lidarem com universidade, escolas

e governos. Eles lidam simultaneamente com a cultura de diferentes escolas, alunos e

professores. Lidam também com diferentes comunidades escolares, ou seja, cada bairro que

uma escola participante do ACES está inserido, revela um microcosmo com suas crenças

condições sociais, questões relacionadas à violência e descaso do poder público. As escolas do

programa ACES revelam diferentes modelos de gestão. Há escolas cujas relações entre os

docentes e da gestão com os professores é conturbada, ou escolas em que a gestão pedagógica

é pouco ativa e orientada. Há também escolas cuja gestão se faz bastante presente e trabalha,

na medida do possível e das suas orientações, no estabelecimento de uma estrutura de respaldo

e apoio ao trabalho do professor.

No programa MESA, para cada bairro ou cidade das escolas é possível encontrar

um modelo de sociedade distinto: há escolas com predomínio de alunos indígenas nas quais as

questões de identidade se fazem mais presentes; escolas em que há enorme presença de alunos

latinos e negros nas quais a violência e a luta de gangues estão embutidas ali; escolas na zona

rural nas quais os alunos trabalham clandestinamente em fazendas e desconhecem qualquer

realidade além da que vivem; e há escolas em que alguns alunos trazem de casa o cultivo à

xenofobia e ao racismo, reproduzindo comportamentos opressores desde muito cedo.

Padrões

Apesar disso, percebemos que, mesmo diante do hibridismo e da aparente

aleatoriedade, alguns padrões também se fazem presentes. Principalmente as observações das

atividades realizadas em sala de aula do programa ACES, das sessões de formação e da gestão

do programa MESA, mostraram certas características de determinados modelos confirmando

alguns padrões.

Por exemplo, notamos que o modelo da transmissão cultural é marcante nas

concepções dos professores do programa ACES e que o programa MESA, em termos de

concepção de ciência, utiliza de um otimismo tecnológico (FEINSTEIN; KIRSCHGASLER,

2015) em suas práticas em sala de aula. Da mesma forma, é possível perceber um componente

sociocultural muito forte no programa MESA quando se trata de emancipar os estudantes e

trabalhar contra a opressão de classes, mas que é ambíguo do ponto de vista da emancipação

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cultural e da formação humana: não há preocupação alguma com a formação literária, artística

e cultural dos alunos. Enquanto no programa ACES há alguns componentes do modelo CTS no

material didático, mas que não são totalmente explorados nas práticas em sala de aula e sessões

de formação de professores. No programa ACES alguns professores trabalham na perspectiva

freiriana do professor reflexivo, buscam ativamente sua própria formação continuada, ou têm

um olhar mais voltado para o resgate dos alunos que perderam a escola como referência; mas

outros professores acreditam que determinados alunos são marginais e não devem estar na

escola ou não possuem formação adequada à disciplina que ministram em sala de aula.

Em termos de gestão e fonte de recursos, o programa ACES foi gerido por

professores universitários, mas sem dedicação exclusiva ao programa. Além disso, é pautado

pelos princípios da extensão universitária e da universidade pública como agente social dotado

de responsabilidades sociais. Também trabalhou com o financiamento do poder público a partir

de um programa governamental de intervenção no sistema educacional. Isso representa um

sistema de intervenção social diretamente ligado ao Estado, o que é positivo em um modelo de

sociedade no qual o Estado garante direitos básicos e é atuante, mas que por outro lado revela

a fragilidade financeira do programa, pois os cortes nacionais da CAPES no ano de 2015

incidiram diretamente no programa e o fato do edital OBEDUC não ter sido renovado

inviabilizou a continuidade do programa.

Isso conferiu um caráter efêmero e paliativo para as ações do programa, já que todo

o investimento não pôde ser continuado e para gerar resultados e impactos a longo prazo no

sistema educacional, mesmo que local. A cultura da escola não modifica e nem a educação em

ciências como um todo – um resultado que é bastante característico dos programas financiados

pelas agências de fomento estatais e privadas do Brasil: tem a duração muito restrita ao período

de financiamento. Entretanto, é preciso também explicitar os benefícios que o programa traz:

tem impactos positivos nos professores, e os alunos são beneficiados, pois aprendem conceitos

e procedimentos que, de outra forma, não aprenderiam; embora a cultura da escola não

modifique, nem a educação em ciências como um todo. Além disso, os monitores são

beneficiados com experiências muito ricas de iniciação à docência, como pôde ser notado pelo

que eles mesmo expressam nos relatórios.

Sobre a gestão do programa MESA, ele é gerido por representantes da universidade

e dispõe de uma estrutura organizacional complexa com hierarquias e papeis muito bem

definidos, além de dispor de uma remuneração competitiva aos seus gestores. O programa

possui um corpo de funcionários próprios e uma alta estabilidade financeira, a qual explica em

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partes a existência do programa por mais de 4 décadas e o ininterrupto crescimento, bem como

assegura que as ações do programa têm impacto tanto a curto quanto longo prazo. O programa

MESA acumula sobretudo números louváveis em relação à ruptura do ciclo de exploração e

falta de oportunidades, mostrando que há uma transformação social estrutural perene. Mas,

diferentemente do programa ACES, utiliza um modelo de financiamento dependente tanto do

Estado quanto de corporações, o que não seria um problema se não houvesse nenhuma relação

dessas corporações com as próprias desigualdades sociais as quais o programa busca combater,

e se não houvesse nenhuma motivação oculta no interesse dessas corporações ao investir na

equidade e justiça social, conforme discutimos na seção 3.7. Afinal, como os autores colocam,

o investimento dessas corporações nessas minorias e em STEM education pode ser muito mais

uma questão estatística e de retorno financeiro do que humanística. A partir dessa configuração,

podemos concluir que o MESA dispõe de um modelo de financiamento imerso em um sistema

econômico neoliberal que acredita em um formato de escola e sociedade bastante tecnicista,

mas é um programa com princípios socioculturais muito fortes para o papel da escola em

emancipar os indivíduos e tornar a sociedade mais justa.

Concepções não orientadas

Por um lado, encontrarmos o hibridismo de modelos pedagógicos em cada um dos

critérios que utilizamos para identifica-los revela que esses programas não fogem do que é a

realidade das políticas de ensino do Brasil e dos EUA: repleta de contradições e contrastes.

Nesse sentido, não se trata de nenhum resultado novo. Por outro, isso nos leva a refletir sobre

como esse ecletismo de concepções e modelos pedagógicos impacta nos alunos e nos objetivos

que os programas buscam atingir.

No caso do programa ACES, esses resultados mostram como o ecletismo nas

concepções dos professores, a falta de clareza metodológica e as inconsistências nas práticas

em sala de aula fazem com que o programa tenha resultados muito mais limitados do que se

tivesse um modelo pedagógico claro e todos os seus participantes trabalhassem sob a mesma

orientada e organizada perspectiva. É preciso notar que as diferenças de concepções são

enriquecedoras, mas até certo ponto. Além disso, não se trata de concepções orientadas e

metodologicamente assumidas, mas sim de deficiências na formação profissional dos

professores e deficiências estruturais na orientação do programa.

Já no caso do programa MESA, em relação às concepções dos professores, só é

possível nos pautar pelos questionários, dado que o número de professores envolvidos a serem

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analisados individualmente é muito maior. Por isso, não é possível afirmar de forma

contundente que há uma falta de clareza metodológica justificando o ecletismo nas respostas

obtidas com os questionários, tampouco que observamos inconsistências revelando conflitos

entre as concepções teóricas e as práticas em sala de aula de cada um deles. Mas é possível

notar que certas condições culturais influenciam nesse ecletismo manifestado no questionário,

conforme discutido anteriormente sobre as diferenças entre o que significa uma escola rígida

no Brasil e nos EUA. Além de, obviamente, a amostra de 28 professores ser relativamente alta

para esse tipo de questionário com muitas categorias, gerando uma variabilidade maior nas

respostas apresentadas.

ACES, MESA e STEM

O aspecto final que queremos discutir é a relação dos programas educacionais

baseados em STEM education, mais especificamente os programas ACES e MESA, com os

modelos pedagógicos de ensino de ciências. Seja por causa dos valores e da cultura aos quais

estão inseridos, ou por dificuldades operacionais em implementar uma abordagem diferente, os

dois programas seguem a tendência do movimento STEM education de não integrar

coerentemente as quatro áreas, tampouco abordarem a natureza social da ciência e os impactos

da tecnologia na sociedade.

Para Santos e Mortimer (2002),

Um estudo das aplicações da ciência e tecnologia, sem explorar as suas

dimensões sociais, podem propiciar uma falsa ilusão de que o aluno

compreende o que é ciência e tecnologia. Esse tipo de abordagem pode gerar

uma visão deturpada sobre a natureza desses conhecimentos, como se

estivessem inteiramente a serviço do bem da humanidade, escondendo e

defendendo, mesmo que sem intenção, os interesses econômicos daqueles que

desejam manter o status quo. (SANTOS; MORTIMER, 2002 p. 12)

Não parece razoável crer que sem estabelecer um melhor entendimento da ciência,

sem promover a alfabetização científica e sem levantar as questões que são sociocientíficas,

seja possível conquistar ganhos no sistema educacional através da reforma STEM. Segundo

Delizoicov (2006), o modelo CTS precisa adotar três ações (e aqui entendemos que o

movimento STEM precisa igualmente fazer através dos programas educacionais): Superação

do Modelo de Decisões Tecnocráticas; Superação da Perspectiva Salvacionista/Redentora

Atribuída à Ciência-Tecnologia; e Superação do Determinismo Tecnológico.

Por isso, é mais do que necessário que os programas educacionais baseados em

STEM adiram ao movimento de maneira crítica e orientada metodologicamente. Isso deve ser

feito conhecendo bem o perfil dos professores com os quais trabalha e incentivando uma

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formação continuada voltada tanto para a alfabetização científica, quanto para a formação para

o ensino de ciências. Sobretudo no caso dos programas ACES e MESA, o hibridismo de

modelos pedagógicos nas concepções dos professores deve ser melhor orientado e alinhado em

torno dos propósitos comuns aos quais os programas querem chegar. Segundo Friedrichsen

(2011), as orientações dos professores sobre o ensino de ciências precisam ser definitivamente

investigadas, e para isso, instrumentos específicos precisam ser criados, para se investigar as

visões deles sobre a natureza da ciência. O autor aponta ainda para a necessidade de uma

formação para o Pedagogical Content Knowledge, não apenas para o conteúdo, como tem sido

nos cursos de formação de professores. Por isso, tanto no programa MESA quanto no ACES, é

importante que a construção do currículo seja um processo mais colaborativo, envolvendo as

diferentes perspectivas a fim de que o como ensinar também faça parte das escolhas sobre o

que ensinar.

* * *

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6. Anexos 6.1. Questionário aplicado no programa MESA

Teacher's questionnaire

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Dear teacher, Below are several statements about various aspects of education. For each statement, please answer if you strongly agree, agree, disagree, or strongly disagree. IMPORTANT: Take into account that your answers must be in accordance with your own beliefs, and not in accordance with some situation in the school that you work or how you think the society see the statement. For example, read the statement: The students' self-evaluation and group evaluation are tools that may take the place of conventional exams to evaluate students' performance. If you believe that this tool can take the place of conventional exams, even though your school does not accept this idea, you must answer you agree or strongly agree.

This column is not shown in the questionnaire.

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Criteria Statements Model Reference for the statement

School's social and

political role

The main role of School is to instruct students to take SAT and ACT exams or to pursue a profession because this ensures a good future for them.

Traditional (LIBÂNEO, 2009)

The role of School is to offer students an instruction which adapts them to current social and economic values. Rediscovery (FAHL, 2003)

The role of School is to create a democratic and collective sense. That is, It is a learning environment, promotes socialization and dissemination of collective values and collective moral. For this reason, children reach intellectual and moral autonomy through the School. Constructivism

(MIZUKAMI, 1986)

The School should develop specialized and competitive students so they can act in the job market. It should stimulate students to professions highly demanded, recognized or those which boost the country's economy.

Technicist

(CLAUSSEN e OSBORNE, 2013; FAHL, 2003; FERNANDES, 2015; LIBÂNEO, 2009)

The role of School is to offer conditions to students so that they are not inserted into the economic system or exploited, in a way that they are capable of changing the system, the reality and the conditions in which they live. In brief, the main role of school is to emancipate individuals.

Sociocultural (FERNANDES, 2015)

The debate about environment, ethics, citizenship, and technological advances must be build by School. It is responsible for discussing how science and technology affect society.

STS (SANTOS, 2007)

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Learning and

teaching process

approaching

The knowledge is transmitted to students. In this process, songs and games working as memorizing technics are resources that promote learning.

Traditional (FAHL, 2003; FERNANDES, 2015)

A good behavior influences student's learning process. The fact of having organized students in a classroom, well dressed in their uniforms, and standardized may help them in their learning process.

Traditional

In the science classes, experiments and their protocols should mold the individuals to the scientific activity. Rediscovery

(FAHL, 2003; FERNANDES, 2015)

It is the child himself/herself who build his/her own knowledge. In this process, he/she must be challenged to change his/her concepts continuously by way of argumentation and conflict articulated by a teacher. Constructivism

(ASOKO et al. , 1999)

The teacher must be trained to use textbooks and perform activities, and these materials must contain detailed instructions for the teacher to be able to apply activities and experiments in the classroom.

Technicist (FERNANDES, 2015)

The teaching process must problematize and create conditions for the individuals to be critical and conscious about the dominant systems in our society.

Sociocultural (FERNANDES, 2015)

Debates about political, philosophical, and social issues must be encouraged during the science classes as if they are part of the methodology. After all, It is a science teaching duty to create an understanding of domains that science have a place.

STS (SANTOS, 2007)

Teacher/student

relationship

It is necessary to have an hierarchy in the school and classroom. Traditional

(FERNANDES, 2015)

Arranging the students in rows facilitates a good behavior and focus so the students can be ready to receive the knowledge that the teacher has to offer.

Traditional

The teacher must be adequately trained to address student's learning in a way that he/she be able to access the knowledge produced by science.

Redescoberta (FERNANDES, 2015)

Teacher's role is to provide experiences and encourages reflection. However, he acts as a mediator, not as the one who transfers his/hers knowledge to the student. Construtivista

(ASOKO et al. , 1999)

The teacher can be compared to a classroom's administrator; he manages the student's learning and content transmission. He is also a communicating point between the science and the student.

Tecnicista (FERNANDES, 2015; SAVIANI, 1987)

In the classroom, the relationships must be horizontal, not hierarchical, and based on dialogue. In addition, nothing can be mandatory for the students nor for teachers.

Sociocultural

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In the science classes, problem-based situations are one of the most powerful tools; especially when they are solved cooperatively between students groups and teacher facilitation.

STS (FERNANDES, 2015; SANTOS, 2007)

Curriculum

The scientific knowledge accumulated along the history must be passed down to students. But the process in which the knowledge was built, that is, the history of science, is not an essential subject in the science classes.

Traditional

Laboratory activities and experimental scripts are the most important resources in the science classes. Rediscovery

(FERNANDES, 2015; MIZUKAMI, 1986)

Open student activities must be part of the curriculum and prevalent. Those activities are characterized by challenges or questions without rigid instructions and answers, respectively; they are also characterized by giving the student freedom to conduct inquiry and resolution to these problems in their own way. Constructivism

(BORGES, 2002)

Excellent resources such as textbooks, technology in the classroom, and great infrastructure in the school may compensate for a teacher who is not well prepared and conscious about his/her practices.

Technicist

The students' self-evaluation and group evaluation are tools that may take the place of conventional exams to evaluate students' performance.

Sociocultural (FERNANDES, 2015)

Philosophy and science history are as important as specific science contents like understanding of atoms or heat transfer. STS

Science understandi

ng

Science is capable of describing reality, and one of its roles is to show the truth about the facts then society can evolve based on scientific knowledge, after all, it's a neutral discipline.

Traditional (KIND, 2015; LEDERMAN, 2006)

There is only one valid scientific method in Science. Redescoberta

(LEDERMAN et al. , 2002)

The scientific method is essential in science. Follow this method strictly and without mistakes make the experiments results true.

Redescoberta (FAHL, 2003; FERNANDES, 2015)

Knowledge is built and not discovered, that is, interests and ideologies influence the scientific descriptions of natural phenomena. Construtivista

(ASOKO et al. , 1999)

Science, Engineering, and Technology develop a healthy country. Therefore these fields should be priotized in the schools as the country's development relies on them.

Tecnicista

(FAHL, 2003; FERNANDES, 2015; LIBÂNEO, 2009; MIZUKAMI, 1986)

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Science is an activity that has social implications and must, therefore, be contested once the results of this activity can not be automatically translated to progress.

Sociocultural

The population must be consulted about questions such as GMO or nuclear energy, even if they do not have technical knowledge about this subjects.

STS

(AULER e DELIZOICOV, 2006; CASTELFRANCHI, 2008)

World and environmen

t understandi

ng

Men are naturally objective. This is the reason why boys are better than girls in some math and computer activities: these activities are purely objective.

Traditional (KELLER, 1985)

The real and practical world must be considered in the science classes as a way to apply theories taught and illustrate contents so they can be better understood.

Rediscovery

Students' conceptions about world and society organization are indispensable in the science classes. It is from these conceptions that new knowledge are created. The environment around the students is the starting point and not the endpoint to develop knowledge. Constructivism

(ASOKO et al. , 1999; FERNANDES, 2015)

Environment problems which are caused by technological progress are acceptable because the benefits caused by technological progress make them worth.

Technicist

The local knowledge and values of communities must be the starting point in a learning process. Sociocultural

(FERNANDES, 2015)

The environment is the theme that generates, articulates, and unify the knowledge in the science classes. STS

(FERNANDES, 2015; SANTOS, 2007)

Teacher/student relationship

There should not exist a hierarchy in the classroom; the teacher is an apprentice just like the student. Learning is a collaborative process.

Sociocultural

Professional information Sex ( ) male ( ) female

Teaching grade: ( ) Kindergarten ( ) Elementary ( ) Middle School ( ) High School ( ) Community College

Age: years old

Academic education: ( ) Undergraduate ( ) Graduate ( )PhD Year of completion:

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How long have you taught science/mathematics ( ) up to 5 ( ) 6-10 ( ) 11-15 ( ) 16-20 ( ) > 20 years

Weekly workload (hours):

Do you find difficult to find resources and strategies to teach science or elaborate your classes? ( ) Yes ( ) No

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6.2. Questionário aplicado no programa ACES

Essa coluna não aparece no questionário

Caro (a) professor (a), você encontrará diversas afirmações a seguir a respeito de vários aspectos da educação e deve responder se concorda, concorda totalmente, discorda ou discorda totalmente com essas afirmações. IMPORTANTE: leve em conta que as respostas devem ser dadas de acordo com suas crenças pessoais, não de acordo com o que acontece determinada situação na escola em que trabalha ou como a sociedade vê determinada afirmação. Por exemplo, sobre a afirmação: "A autoavaliação feita pelos alunos e a avaliação mútua é uma ferramenta que pode substituir a prova convencional como maneira de avaliar a aprendizagem dos alunos", se você acredita que essa ferramenta pode substituir a prova convencional, mesmo que sua escola não o faça, você deve marcar que concorda ou concorda totalmente.

Essa coluna não aparece no questionário

Critério Afirmações Modelo

Papel político-social da escola

A principal função da escola é preparar o aluno para uma profissão, o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) ou vestibular, pois isso garante um bom futuro e a possibilidade de transformação social do aluno.

Tradicional

O papel da escola é oferecer aos alunos uma formação que os adapte aos valores sociais e econômicos atuais e proporcionar condições para atuarem no mundo competitivo atual.

Redescoberta

A escola é o ambiente de construção do senso democrático e coletivo, ou seja, é um ambiente de aprendizagem, socialização e disseminação dos valores e da moral coletiva. É através dela que a criança chegará à autonomia intelectual e moral. Construtivista

A escola deve formar alunos especializados para atuarem no mercado de trabalho, estimulando-os a ingressarem em áreas de maior demanda de profissionais ou prestígio e alavancar a economia do país.

Tecnicista

O papel da escola é oferecer condições para que os alunos não sejam inseridos no sistema econômico como explorados, de forma que eles sejam capazes de trasformar o sistema, a realidade e as condições nas quais vivem.

Sociocultural

A escola deve trazer para os alunos o debate sobre meio ambiente, ética, cidadania e os avanços tecnológicos. Ela é a responsável por problematizar como a ciência e tecnologia afetam a sociedade.

CTS

Abordagens do processo de

Ao transmitir conhecimentos ao aluno, músicas e jogos que servem como técnicas de memorização são recursos que estimulam os alunos a aprender.

Tradicional

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ensino e aprendizagem O bom comportamento influencia na aprendizagem que o aluno tem. O fato dos alunos estarem organizados na sala de aula, bem

uniformizados e padronizados ajuda na aprendizagem que eles terão.

Tradicional

A ciência deve ser vivenciada pelos alunos, ou seja, eles devem aprender ciências principalmente por meio da experimentação e descobertas científicas. As atividades experimentais e de laboratório são os recursos mais importantes para a aprendizagem.

Redescoberta

É a própria criança quem constrói o próprio conhecimento, para isso ela deve ser constantemente desafiada a modificar seus conceitos através da argumentação feita pelo professor. Construtivista

O professor deve receber treinamentos de especialistas para utilizar os materiais didáticos e atividades, sendo que esses materiais devem conter orientações detalhadas ao professor para que ele consiga aplicar as atividades e experimentos em sala de aula.

Tecnicista

O ensino de ciências deve ser problematizador e trabalhar com as questões econômicas e sociais para desenvolver a liberdade e a consciência crítica sobre o próprio conhecimento

Sociocultural

Relação professor/aluno

Deve existir uma hierarquia na sala de aula e na escola, pois ela facilita que os alunos fiquem bem comportados e aprendam a partir dos conhecimentos que o professor domina.

Tradicional

Certas turmas possuem alunos que nunca estão interessados e são indisciplinados. Uma boa estratégia para resolver isso é colocando esses alunos desinteressados juntos em uma única turma, pois alguns alunos nunca irão de fato se envolver com atividade alguma e só prejudicam a aula do professor e os demais alunos.

Tradicional

O professor de ciências tem a função de moldar o aluno para a atividade científica, oferecendo a ele experimentos e atividades que imitem a prática do cientista.

Redescoberta

O papel do professor é fornecer as experiências físicas e encorajar a reflexão, mas ele atua como mediador, não como aquele que transmite seu conhecimento para o aluno. Construtivista

O professor pode ser comparado a um administrador da sala de aula, gerenciando a transmissão da matéria e a aprendizagem dos alunos, sendo também um ponto de comunicação entre a ciência e o aluno

Tecnicista

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Não deve existir uma hierarquia na sala de aula, o professor é tão aprendiz quanto o aluno, pois a aprendizagem é um processo colaborativo.

Sociocultural

Currículo

O conhecimento científico que é acumulado ao longo da história deve ser repassado aos alunos, mas o processo de construção desse conhecimento, ou seja a história da ciência, não deve ser abordada pois o conhecimento atual é mais importante e já ocupa muito tempo para ser ensinado

Tradicional

Para que os alunos aprendam sobre ciências, as aulas devem ser baseadas na realização de projetos e roteiros experimentais que simulem descobertas nos laboratórios de ciência.

Redescoberta

As atividades mais abertas de investigação em ciências devem fazer parte do currículo. O ensino de ciências com atividades abertas é caracterizado pela existência de questões com instruções e respostas sem uma direção rígida, deixando o aluno mais livre para conduzir a investigação e resolução desses problemas a seu próprio modo. Construtivista

Se um professor não é bem instruído e consciente de suas práticas, recursos como um excelente material didático, recursos de mídia e uma ótima infraestrutura podem compensar essa deficiência.

Tecnicista

A autoavaliação feita pelos alunos e a avaliação mútua é uma ferramenta que pode substituir a prova convencional como maneira de avaliar a aprendizagem dos alunos.

Sociocultural

A contextualização dos temas faz parte do currículo em ciências, ou seja, a ciência, tecnologia e a sociedade têm que ser consideradas sempre em conjunto.

CTS

Concepção de ciência

A ciência é capaz de descrever a realidade e uma de suas funções é apresentar a verdade dos fatos para que a sociedade evolua baseada no conhecimento científico, pois ela é uma disciplina neutra.

Tradicional

Ciência é a busca por verdades objetivas sobre o mundo. Redescoberta

O método científico é essencial na ciência, pois ao seguir esse método rigorosamente e sem falhas os resultados de experimentos são verdadeiros e infalíveis.

Redescoberta

O conhecimento é construído pela sociedade e não descoberto, ou seja, a descrição que a ciência faz dos fenômenos da natureza é influenciada por interesses e ideologias. Construtivista

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A ciência será cada vez mais capaz de solucionar os problemas do homem, ela é uma das áreas que mais merece atenção da sociedade e os alunos devem ser formados para se tornarem cientistas.

Tecnicista

A ciência deve ser sempre contestada e criticamente analisada porque não detém as verdades sobre o mundo. Sociocultural

A população, mesmo não tendo conhecimentos técnicos ou científicos, deve ser consultada sobre questões como organismos transgênicos ou energia nuclear.

CTS

Concepção de ambiente/mundo

O mundo real e prático deve ser utilizado nas aulas como meio de aplicar as teorias ensinadas e ilustrar os conteúdos para que eles sejam melhor compreendidos.

Tradicional

Os homens são naturalmente mais objetivos, por isso os meninos se saem melhor em algumas atividades de matemática e computação.

Redescoberta

As concepções dos alunos sobre o mundo e a organização da sociedade fazem parte indispensável nas aulas de ciências, pois é a partir dessas concepções que novos conhecimentos são construídos. O ambiente ao redor do aluno é o ponto de partida e não de chegada para o desenvolvimento do conhecimento. Construtivista

As áreas de engenharia, tecnologia e ciência devem ser priorizadas, pois o desenvolvimento do país depende mais dessas áreas do que de sociologia, filosofia e humanidades em geral.

Tecnicista

Parte II - Informações profissionais: Sexo ( ) masculino ( ) feminino

Instituição de ensino:

Idade: ( ) até 25 anos ( ) 26 a 35 anos ( ) 36 a 45 anos ( ) > 45 anos.

Formação acadêmica: ( ) Ensino médio ( ) Superior.

Instituição que concluiu o curso superior, curso e ano de conclusão:

Há quantos anos ensina Ciências? ( ) até 5 ( ) 6-10 ( ) 11-15 ( ) 16-20 ( ) > 20

Em que série(s) ensina? ( ) Ensino Fundamental I ( )6° EF II ( )7° EF II ( )8° EF II ( )9° EF II ( )1° EM ( )2° EM ( )3° EM

Carga de trabalho semanal (em horas):

Salário mensal (somente com ensino) SM = Salários-Mínimos (R$880,00): ( ) < 2 SM ( ) 2 a 3 SM ( ) 4 a 5 SM ( ) 6 a 7 SM ( ) > 8 SM

Leciona em mais de uma escola? ( ) não ( ) apenas escola pública ( ) escola pública e particular

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Tem fonte de renda adicional (não relativa a ensino)? ( ) sim ( ) não

Você se considera atualizado (a) em relação aos conteúdos de ciências e às novas tecnologias? ( ) sim ( ) não

Costuma participar de congressos/encontros de Ciências/Educação? ( ) sim ( ) não. Por quê?

Quais são as principais fontes de informação que você utiliza para preparar suas aulas?

Você sente dificuldade para encontrar recursos e fontes de informação ao preparar suas aulas? Explique.

Com que frequência interage com as universidades locais (visitas científicas, cursos de extensão, pesquisas, congressos etc.) além do Programa ACES? Justifique:

Pretende fazer algum curso de Pós-Graduação? ( ) sim ( ) não. Por quê?

Comentários adicionais sobre o aperfeiçoamento profissional:

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6.3. Quadro de atividades do programa MESA

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6.4. Ética em pesquisa

Esta pesquisa possui aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, de acordo com a

resolução 466 de 12/2012.

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6.5. Declaração