9
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE PSICOLOGIA INTRODUÇÃO À PESQUISA EM PSICOLOGIA Como as questões de gênero, idade e etnia afetam as expectativas das crianças no processo de adoção Gabriel Alexandrino

Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

  • Upload
    giovana

  • View
    229

  • Download
    7

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOINSTITUTO DE PSICOLOGIA

INTRODUÇÃO À PESQUISA EM PSICOLOGIA

Como as questões de gênero, idade e etnia afetam as expectativas das crianças no processo de adoção

Gabriel Alexandrino

Giovana Abreu

São Paulo, Novembro de 2014

Page 2: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

I. RESUMO DO TRABALHO

Temos no presente trabalho o objetivo de promover uma reflexão a respeito do processo de adoção no Brasil e, a partir dela, articular uma pesquisa tendo como foco as expectativas da criança nesse processo. Com base na revisão bibliográfica de trabalhos e exposição de dados das preferências dos pais em relação a um filho adotivo, bem como os preconceitos, mitos e crenças envolvidos nessas preferências e na visão da população sobre o processo de adoção em geral, propomos uma perspectiva que relacione esses dados à subjetividade da criança e então, através de uma pesquisa qualitativa, procure compreender como eles afetam as fantasia que elas tem em relação a uma família adotiva ideal e ao processo de adoção como um todo. Visto que a maioria das pesquisas no campo da adoção adotam uma visão direcionada apenas às questões relacionadas aos pais e as possíveis complicações e dificuldades na família adotiva já formada, nossa pesquisa propões uma direção inovadora a esses estudos, com o enfoque na criança e, portanto, que possibilita também uma análise de como seus ideais de família e expectativas em relação ao processo de adoção, ou seja, a história previa da criança – que é muito frequentemente desvalorizada e ignorada - principalmente aquela construída por ela na inserção no abrigo, interfere em sua qualidade de vida e na adaptação futura a um ambiente familiar. Sendo assim, essa pesquisa tem como fim último, após a observação do ambiente dos abrigos e a coleta de informações, testes e dados qualitativos relacionados às expectativas da criança inserida no sistema de adoção, a realização de uma pesquisa-ação, na qual o pesquisador pode trabalhar as informações coletadas e questões levantadas com cada criança em conversas individuais, de forma a amenizar seu sofrimento e promover uma melhora na qualidade de vida, além de amenizar questões que podem surgir em uma futura inserção em uma família adotiva.

II. INTRODUÇÃO

Page 3: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

A etimologia da palavra adoção, de acordo com o Dicionário Houaiss, remete ao latim adoptĭo,ōnisação e tem como significado 'efeito de adotar, de aceitar (alguém ou algo).A revista "Em discussão!", do Senado Federal, define adotar como “o ato de aceitar, acolher, tomar por filho, perfilhar, legitimar, atribuir (a um filho de outrem) os direitos de filho próprio.” A partir dessas definições, percebe-se claramente que o a adoção envolve uma construção de escolha, além de uma identificação da criança que será adotada com a família que pretende adotá-la. Esse processo envolve diversas variáveis que muitas vezes, por parte dos pais, são construções sociais de mitos e crenças ou preconceitos, seja aqueles enraizados na sociedade ou mesmo na individualidade dos adotantes.

Diversas pesquisas acadêmicas têm como intuito o estudo e análise dessas variáveis, muitas delas que dão destaque, principalmente, a reflexões sobre as preferências dos pais em relação ao filho adotivo, ou seja, uma visão prévia de filho adotivo ideal, principalmente em características como gênero, idade e etnia, além de reflexões sobre os mitos e crenças com relação ao processo de adoção em geral pela população. A psicóloga e pesquisadora Lidia Weber faz, em seu artigo “DA INSTITUCIONALIZAÇÃO À ADOÇÃO: UM CAMINHO POSSÍVEL?” uma enumeração de algumas dessas questões, as quais ela nomeia preconceitos, mitos e crenças da população, na medida em que foram de observação recorrente em diversas pesquisas que realizou com pais e filhos adotivos e com a população em geral. Dentre elas, algumas de grande relevância a esse trabalho são as que grande parte das pessoas:

1. teriam medo de adotar crianças mais velhas (acima de 6 meses) pela dificuldadena educação;2. teriam medo de adotar crianças de cor diferente da sua pelo "preconceito dosoutros";3. teriam medo de adotar crianças com problemas de saúde pela incapacidade delidar com a situação e pelas despesas altas que teriam;4. teriam medo de adotar uma criança que viveu muito tempo em orfanato pelos"vícios" que traria consigo;6. medo de adotar crianças sem saber a origem de seus pais biológicos, pois a"marginalidade" dos pais seria transmitida geneticamente;8. pensam que uma criança adotada, cedo ou tarde, traz problemas;9. acreditam que a adoção visa primordialmente o adotante e não a criança, sendoum último recurso para pessoas que não conseguem ter filhos biológicos;

Weber, L.N.D. (1995).

Tendo em mente essas preferências e pressupostos em comum entre adotantes, é necessário, a fim da compreensão da perspectiva proposta nesse trabalho, voltar à discussão abordada na referência à definição do termo adotar. Algo que é muito frequentemente ignorado é o fato de que, para a obtenção de sucesso na construção de uma família adotiva, esse “efeito de aceitar (alguém ou algo)”, que define a adoção, não é exclusivo da parte dos pais no processo de escolha e burocracia da adoção de um filho, mas depende muito da aceitação da própria criança em relação a esses pais e, por conseguinte, da história previa da criança– e destaca-se aqui as expectativas- em relação a essa construção. Nesse âmbito, é imprescindível para compreender o processo de adoção, perceber que as preferências e pressupostos muitas vezes preconceituosos e frutos de

Page 4: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

construções sociais, que, como afirmamos e exemplificamos acima, permeiam o comportamento dos indivíduos que pretendem adotar crianças, refletem de forma extremamente forte nas expectativas de crianças em espera por uma adoção. Pretendemos analisar aqui, portanto, como esses conceitos prévios afetam a subjetividade da criança e pensar o papel do psicólogo nesse ambiente frente aos resultados obtidos, no intuito de melhorar a qualidade de vida da criança e facilitar um futuro processo de inserção em uma família adotiva. Através desse convívio e interação o psicólogo pesquisador pode também colaborar no sentido do âmbito jurídico da adoção. Segundo o ECA (Estatuto da Criança e do adolescente, 1990), o simples interesse dos adultos adotantes não é suficiente, e para que o processo de adoção de uma criança ocorra com sucesso. É necessário, acima de tudo, que o juiz decida se ela trará à criança ou ao adolescente reais vantagens para seu desenvolvimento físico, educacional, moral e espiritual. Sendo assim, o psicólogo, na medida que pode conversar com ambas as partes participantes do processo, pode auxiliar nessa decisão e auxiliar na burocracia relacionada ao processo de adoção.

Page 5: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

III. JUSTIFICATIVA

Segundo Amin, I. e Menandro, P., 2007, a preferência nacional de adotantes na escolha de um futuro filho é por recém-nascidos do sexo feminino e de pele branca. Conforme é dado o processo de adoção atualmente (Estatuto da Criança e do Adolescente, 1990), as expectativas dos adotantes para alguns critérios são considerados na busca pela criança adequada, enquanto o consentimento da criança acerca da adoção por determinada família só é requerido em casos de crianças maiores de 12 anos. A pesquisa acerca das expectativas dessas crianças pode ser uma ferramenta útil no trabalho de psicólogos e assistentes sociais para diminuir o número de casos de devolução de crianças adotas, ainda que tal prática seja proibida juridicamente, já que a filiação por adoção, uma vez consolidada, é de caráter irrevogável. Ouvir as demandas dos menores, portanto, pode ajudar na busca por uma família que em que eles possam se encaixar e desenvolverem-se, assim como qualquer família de filiação biológica.

IV. METODOLOGIA

O trabalho elaborado pretende-se utilizar do aparato metodológico da Psicologia Social e, mais especificamente, tomando os preceitos da escola de Chicago como Norte da pesquisa. Dessa forma, assim como Malinowski, 1922, estabelece a pesquisa de campo e a inserção em outras culturas para entendimento das mesmas, a assimilação do mundo da criança no abrigo a partir da observação deve ser essencial para entender o ponto de vista do grupo estudado, caracterizando este estudo pela sua natureza empírica (construção de dados a partir da observação e do trabalho prático).

A busca pelos caracteres culturais que atravessam as expectativas dos menores quanto à futura família assentam-se em três pilares: o gênero, ou seja, as diferenças idearias entre meninos e meninas, a idade do menor e a consciência deste acerca das estruturas familiares conforme a faixa etária e a raça (deve-se ressaltar que o conceito de raça abordado no presente trabalho também é cultural, pois, assim como Lévi-Strauss, 1952, entende tal diferença como uma construção artificial e não como uma determinação biológica). Seguindo esses parâmetros para o delineamento do objeto, pretende-se trabalhar com um grupo total de cerca de 15 menores em situação de institucionalização, separando-os conforme a variável em análise. A duração do estudo é estimada em um ano, podendo durar mais ou menos, dependendo das facilidades ou resistências encontradas pelo pesquisador para penetrar no universo do grupo pesquisado.

A partir do convívio no abrigo, a observação participante torna-se o principal meio de apreensão de informações: como a idade dos pesquisados varia bastante dentro do grupo, um trabalho analítico (similar a uma conversa) seria talvez a melhor forma de descobrir as expectativas e fantasias das crianças mais velhas em relação a adoção, enquanto para as menores a aplicação de atividades lúdicas similares às que elas desenvolvem em seu tempo livre caracterize-se como método mais efetivo: o uso de desenhos e pequenos testes usando jogos de palavras para descobrir qual é o modelo de família que elas carregam em si. Tal

Page 6: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

aplicação já insere-se como uma pesquisa de cunho qualitativo, método mais adequado para o tamanho da amostra e para o tipo de informação que pretende-se extrair. Características como o tamanho da família (número de irmãos), presença de um ou dois dos pais, a cor da pele e raça imaginada pelas crianças, tipo de vestimenta presente nos desenhos, são indicativos das fantasias construídas pelos menores e uma forma de constatar se as variáveis no estudo influenciam na determinação de tais expectativas.

V. RECURSOS NECESSÁRIOS

Quanto ao aparato necessário para a aplicação da metodologia, será necessário primeiro o consentimento dos órgãos públicos responsáveis por cuidar dos abrigos no qual as crianças se encontram enquanto esperam pelo processo de adoção, para dar início a parte empírica de coleta de dados, os materiais físicos necessários para a aplicação de testes (na forma tanto de questionários quando de atividades lúdicas), além de acesso à bibliografia sobre o assunto, como a legislação jurídica acerca do processo de adoção e pesquisas anteriores sobre crianças em condições de abandono jurídico (institucionalizadas), para a produção do corpo do trabalho e amparo teórico para a inferência dos dados coletados.

VI. RESULTADOS ESPERADOS

Espera-se observar uma diferença de expectativas nas crianças conforme seus aspectos culturais inerentes (gênero, idade e raça). Quanto ao gênero a principal diferença encontrada talvez seja no número e no gênero de irmãos imaginados, enquanto idade e raça apresentem diferenças mais acentuadas. Quanto à idade: em crianças mais novas talvez impere no ideário a estrutura clássica de família, com um pai e uma mãe, e irmãos ou irmãs (esse ideário comum talvez possa ser amparado pela presença de animais de estimação nos desenhos elaborados pelas crianças), ou então uma estrutura mais próxima daquela da família biológica, uma vez que estas foram retiradas do convívio dos pais biológico mais recentemente; crianças mais velhas talvez apresentem uma apreensão mais plural do conceito de família devido à maior vivência e experiências observadas no universo do abrigo, já que segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina que não apenas casais heterossexuais, mas qualquer pessoa acima de 21 anos, casadas ou não, e família homoafetivas podem entrar com um pedido de adoção. Quanto à raça: deve-se observar se, assim como acontece com os adotantes, a preferência dos adotados se dá por pais da mesma etnia e tom de pele que as crianças em

Page 7: Helloooooo Trabalho de Ipp Final Eba Versao Lindona

questão, ou se há um modelo hegemônico considerado ideal como a boa família para serem inseridos.

Entender as preferências das crianças, assim como já acontece com as preferências dos adotantes no processo de adoção, pode ser uma ferramenta essencial para diminuir o número de devoluções ocorridas no contexto brasileiro (por mais que a adoção seja juridicamente irrevogável), evitando a dor de uma possível segunda experiência de abandono para essas crianças. Pode ser uma ferramenta eficaz também no sentido de resgatar uma subjetividade e história pessoal muitas vezes perdidas por essas crianças, além de poder promover com elas, em conversas individuais, reflexões que tenham como resultado uma melhora em sua qualidade de vida. Tudo a fim de garantir o direito mais básico da criança e do adolescente, garantido pela Constituição Brasileira, art. 227:” É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”