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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 1/36
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 2/36
Título. original:
Terror in Tete,
a documentary report
of
PortUguese
atrocities
in
Tete district,
Mozambique-
1971 1972
Editado, em Dezembro de 1973, pelo Internationa:l Defence and Aid
Fund
Tradução: António Sousa Ribeiro
Arranjo gráfico: Joiio B.
A REORA_,D o JOGO,
Edições
Apartado 599 - Port ?
/16
lo
L c r ~ y
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d ;
. --o.- cu
t
ex - --:• l - v - ~
) v ;
INTRODUÇAO
Em 10
de
Julho
de 1973, foi publicada em The Times
uma
notícia de choque
sobre um
alegado
massacre
de
400 pessoas por tropas portuguesas,
numa
pequena aldeia
moçambicana
chamada
Wiriyamu, não longe da cidade
de Tete. Baseava-se
ela
num relatório elaborado
por um
grupo
de
padres
que
trabalhavam
na colónia portuguesa,
tornado
público por
um
padre inglês, Adrian
Hastings.
Juntamente
com os subsequentes desmentidos portugue
ses e as investigações de vários jornalistas a que se
permitiu acesso à área, o alegado massacre chamou a
atenção
para
o que
está
a acontecer
em
Moçambique
como resultado dos esforços do governo português para
derrotar a Frelimo, o movimento de Ubertação moçambi
cano que trabalha para a independência do país.
Porque teve lugar o massacre de «Wiriyamu>>? Que
aconteceu exactamente?
Como aconteceu?
Terá
mesmo
ocorrido efectivamente? Foi tal a confusão
engendrada
pelos desmentidos portugueses, pelas dificuldades encon
tradas
pelos
jornalistas
em determinar a localização
exacta
de Wiriyamu e em descobrir
testemunhas
oculares
e pelo complexo papel desempenhado pelos missionários
e pela
hierarquia
da Igreja em
todo
o caso,
que
não chegou
a surgir um quadro claro e documentado do
que
real
mente aconteceu.
Este
relato destina-se a fornecer essa
descrição, tanto quanto é possível a partir das fontes
disponíveis, dos acontecimentos de «Wiriyamu» e do
contexto em que eles ocorreram.
No debate que se seguiu à revelação dos aconteci
mentos, veio a considerar-se amplamente que o alegado
5
•
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 3/36
•
massacre não era · um incidente excepcional e isolado,
mas
parte
do modelo que caracteriza a estratégia
militar
portuguesa em Moçambique,
tal
como
na:s
colónias de
Angola e da Guiné-Bissau. Acontecimentos idênticos,
sobretudo em
menor
escala,
foram
quase lugar-comum
em Moçambique. Têm
lugar no
contexto de
um
país que
Portugal governou
durante
gerações, onde
se
recusou à
população a
maioria
dos direitos sociais e políticos fun
damentais e se
lhe
concedeu apenas acesso limitado a
serviços educacionais e médicos.
A guerra
que
os
Portugueses estão
a travar em
Moçambique não
está
só a ter lugar como resultado da
sua tentativa de manter o controle
da
colónia. Pode
tam-
bém
ser
vista como parte da estratégia comum
das
auto
ridades portuguesas,
do
regime rodesiano e
do
governo
sul-africano para manter p, colonialismo e o domínio da
minoria branca na Ãfrica Austral Os acontecimentos
aqui descritos,
importantes em si
mesmos, têm, portanto,
um
significado mais amplo para o
futuro
de todo o sub-
continente.
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 4/36
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A GUERR POR MOÇ MBIQUE
r.
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i ~ ~ ·
estilo do comportamento
militar
português
com
·espeito ao pov9 de Moçambique firmou-se
há
muito.
Foi
ilustrado em 1960, quatro anos antes
da
Frelimo
começar a sua luta armada. Nesse ano - o ano { Cf ,
também
.de Sharpeville ~ u m a manifestação pacífica de
1
;:;
vários milhares de pessoas dirigiu"se ao posto adminis-
\
. trativo local de Mueda,. no distrito
setentrional
de Cabo
Delgado. Quando a multidão protestava contra o tra-
tamento ap icado
aos
chefe.
s
da
sua
deputação,
as tropas
\ : x ~
receberam ordein de abrir ·fogo. Nunca
foram
reveladoê_ :: /
pormenores completos sobre mortos e feridos, mas pensa-
-se que devem
ter
sido
m o r t ~
quinhentas pessoas.
A Frelimo começou
as suas
operações
armadas
em
1964;.as suas primeiras acções
tiveram
lugar nos distritos
escassamente povoados de Cabo Delgado e Niassa.
Em
três
anos, os Portugueses
foram
limitados
às
suas bases
militares e as companhias concessionárias obrigadas a
retirar-se, .deixando a área (cerca de
um
quinto de
toda
\ colónia) efe-ctivamente libertada.
E.
m 1968, a ofensiva
\ eslocou.se
para
o
distrito
de Tete.
\ •
~ s t e
distrito
é .uma área ~ h v e na luta pela
i n ~ e p e n
\ /denCia .de Moçambique; Gonfmando com o Malaw1 e a ..
\
Zâmbia; proporciona acesso
muito mais
fácil
para
os
distritos do Centro
e
do
Sul que
Niassa ou Cabo
Delgado.
No grau· em que a Frelimo o controla, fornece
também
acesso
para
apoio ·logístico aos movimentos de libertação
que operam· no Nordeste da Rodésia. Também para
as
autoridades portuguesas, Tete
tem
uma importância estra-
tégica vital. lli mais densamente povoado ·que qualquer
•
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 5/36
•
um dos dois distritos Uberta.dos e é mais rico em recur
sos,
tanto
na agricultura como, potencialmente, em mine
rais. A t r a v é ~ dele.
corre
o rio Zambeze, no qual
está
a
ser cánstruído o gigantesco complexo hidro-eléctrico de
Cabora ·Bassa. Este complexo é ele próprio uma insta
lação estraté gica de cujo sucesso depende muito do futuro
de Portugal em Moçambique, mediante. o· projectado
desenvolvimento
de toda
a região do vale do baixo Zam
beze, com fixação em larga escala de colonos brancos
e actividade industrial. Isto, espera-se, protegerá a ã:rea
do avanço da Frelimo. O capital internacional atraído à
região reforçará
esta
linha de defesa. .
A África
do
Sul, que tem
um
interesse adquirido na ;
derrota
da Frelimo para
salvaguardar
a sua própria \ .
r.
fronteira, esteve ·centralmente envolvida desde o inicio í .. , ,
no projecto de Ca:bora Bassa, e
tropas
sul-africanas
estão Jv
presentes na vizinhança das instalações. A Afric a do Sul ' ,
será também o principal cliente da· electricidade de
Cabort}t
Bassa
e os longos cabos eléctricos para o sul
serão
vu}''
___
.....
neráveis a ataques enquanto a Frelimo·permanecer activ .
A
estratégia
politica e
militar
impõem, portanto, que não
A
se possa
permitir
que Tete
caia
nas
mãos
do movimento de 1 , ;. ·
libertação como aconteceu com Niassa e Ca;bo Delgado.Q
_
)yí
O regime rodesiano
de
Smith
tem
igualmente inte- \j\c
1
resses investidos na defesa
de
Tete, pois que o
distrito
confina com a sua fronteira nordeste, contiguamente. à
área
onde têm vindo a .operar
guerrilhas
com
um
êxito
sem Pt'llCedentes, desde os fins' de 1972. O sucesso da
Frelimo
em
Tete, levando à extensão das operações
para sul,
no• distrito
de Ma;nica e Sofala (onde a Frelinío
abriu uma nova frente, em 1972); representa uma nova
ameaça
às
ligações
por
estrada
e caminho
de ferrói
·da
costa, na Beira, a Salisbúria. Esta passa;gem é economi
camente crucial para uma Rodésia sem
saída
para ormar:
Também para as autoridades portuguesas, a luta· prolon
gada em Manica e Sofala
poria
em questão o seu controle
da metade sul
da
colónia.
10
~ ~ . ·
\ J
\ -
, .
V/L I / --v.(
'Apesar das forças ergui das contra ela, a Frelimo avan
çou rapidamente em Tete. Em 1971, conseguiu atravessar
o Zambeze e ala:rgar os seus ataques pa:ra suL
Os
alvos
militares incluíram vias de comunicação, como a estrada
internooional que
liga
a Rodésia e o Malawi e a via
férrea Beira-Tete. As deslocações das forças portuguesas
são emboscadas regularmente e o fornecimento de mate•
riais de construção para a
barragem
de Cabora
Bassa
foi afectado.
Em
resposta
a
esta
ofensiva, o exéricto português
intensificou
as suas
operações erp Tete,
que
se
tornou
o principal teatro de guerra· em Moçambique. Diz-se que
há
entre
dez e
vinte mil
soldados portugueses ali, de
frontando aparentemente consideráveis dificuldades de
vidas à intima ligação dos civis africanos com as guerri
lhas. Em 1971, Tete foi
transformado numa
área especial
sob jurisdição
militar:
o governador, um oficial do exér-
:f
cito, foi investido com plenos poderes tanto civis como ~
milita:res •. Entre outras coisas, isto significa que os
visitantes civis não são normalmente autorizados a
entrar
no
distrito;
toda
a
área
é considerada em
estado
de
guerra.
O exército português foi obrigado a modificar
as
·suas :tácticas para se adaptar ao
tipo
de guerra
que
deci
diu travar:. No passado, as unidades do exército estavam
estacionadas por todo o Moçambique para manter o domí
nio administrativo pela ameaça
da
força onde neces
sário, como em Mueda- pelo seu exercício. · A medid a
que a
guerra
avançava, fizeram·se
tentativas para
der
rotar a Frelimo com ofensivas convencionais maciça,s
como o bomba:rdeamento de áreas inteiras, como ·na
operação «N 6 GórdiO» que foi lança da em
1970.
Esta
A l ~ / _ t
fV
(_i
\.v,.r?C
; 1
V, O
* m 1972, o governador era o
Oor.
Armindo Marti.ns Videira,
um oficial pamquediata
de
consideráv 61 e xperiênci a; treinado
p elo
exélrcito francês e -comandante do prlmedro batalhão- p a l l t U J u ~ i s t a
pQl tuguês (Rwnd Daily
23/2/73 . · LA J'l-'l.-v}
-
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LC·lA·
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11
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-
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 6/36
táctica,,falhoii; contra uma força
de
guerrilhas que aban
donava, simplesmente a área, para regressar gradual·
mente :depois da ofensiva terminar e restabelecer rapi·
damente os seus laços com a população civil.
Os últimos três anos assistiram a uma nova forma
de ,ataque que compreende duas características princi- -ji )
pais. A primeira é a criação de «grupos especiais» -
, unidades de comandos e paraqued ista s
que
são móveis V
'
...
jo..
X e transportados por ar (normalmente por helicóptero).
il.t
.;.\Estas. u.nidades são treinadas especialmente: os
G r u ~ s
i
b f
EspeCW l8 GEs)
como,comandos e os Grwpo s p e m a ~ s
tf \
Paraquedistaa
(GEPs) como tropas paraquedistas e foram
descritas em Lourenço Marques como possuindo
<<quali-
dades excepcionais
para
levar a cabo operações localiza-
das e aniquilar infiltradores inimigos»
'.
A sua ferocidade
1
é alardeada aberta, llente
por
comandantes do exército: ~
«Eles são», disse um, «bastante difíceis de deter quando
U
lhes fe rve o sangue» '·
Estas
unidades são compostas
principalmente
por
soldados africanos - resultado de
uma política deliberada de «africanizar» o exército por-
tuguês das colónias, em
parte
para fazer
frente ao
pro
blema do potencial humano (Portugal tem
170 000
solda
dos nos três territórios, 60000 dos quais em Moçambique),
mas também para
garantir
que a população indígena se
empenhe ma'is directamente na vitória portuguesa. No
decorrer do treino, são encorajados
a
reagir rápida e /
brutalmente '. i
• \ ,
A segunda característica da nova estratégia é o
controle
da
população local
através da
criação de aldea
mentos (aldeias estratégicas). Isto tem sido adoptado
com vigor excepcional em Tete: entre 1969 e 1970, o
nú'
mero de aldeamentos elevou-se de 25
para
45, abrangendo
26 059 pessoas, ou pouco menos
de 6 da
população
total
2
' BBC, 9/4/78.
' Jam.., McManus,
Guardi<m
16/1/73.
' Ver Cspltulo Quatro,
nota 14.
;)
/\ }
l \
·U
Der: r
~ v . J _ · j
d.j
A
v·- w ~ /
?.J }.tYV,hO , , / v ( /
\
( ,
tYV'fa._
-..:
do distrito<.
Em
Julho de 1973, o
Daily Telegraph
noti
ciou que cerca de 170000 pessoas tinham acabado de ser
reinstaladas e que os que restavam dos 400 000 habi
tantes
iriam ser
transferidos para outros 55 aldea·
mentos, por volta do fim do ano •. Mesmo descontando
algum exagero, é evidente que o plano alargará o pro- .. -Á
grama dos aldeamentos até cobrir virtualmente todos ;;}
os africanos
de
Tete, privando, assim,
as
guerrilhas do
L /
seu apoio e de fontes de alimentação. O correspondente
do
Telegr01ph
visitou
três
aldeamentos, em Cassanha,
Nhambanzie e Degue, onde ca da família tinha uma porção
de terreno e a compra e venda se fazia numa base coope-
rativa. Nenhum dos povoados era fortificado'· Esta
descrição é, contudo, contradita
por um
relatório do
P.'
J
1
Luís Afonso
da
Costa, um missionário português, sobre / _ ;-:r
os aldeamentos (a que ele
chama <<Campos
de fnterna-
c
..
mento»- ver Apêndice
I).
Nele descreve como as pes-
soas são obrigadas contra a sua vontade a
entrarem
para
aquilo a que deram o nome
.de
«currais de cabras»,
com
entrada
e saída controladas e c e r c a d ~ s
por
ar;ame
~ ,
farpado. Durante o tempo . que passou em Tete, aftrma ·-
ele, nunca viu nenhum dos prometidos hospitais, escolas,
centros sociais ou abastecimentos de água limpa, a não
ser um único reservatório para dar de beber aos animais
e lavar roupa. Quem quer que saia de um aldeamento tem
que possuir um cartão que discrimina o nome do. proprie-
tário, povoação de origem e motivo
da
viagem.
Se
a
guerrilha estivesse activa perto de um aldeamento, os
, /
seus habitantes eram sujeitos a imediatas represálias:
«mulheres, crianças, velhos e novos são presos,
tortq
rados e, muitas vezes, mortos». Um missionário seu
colega contou ao P. • Costa que 200 pessoas que tinham
abandonado um aldeamento em Angónia (nordeste
'rete) foram encontradas mortas no dia seguinte. / /
•
ONU/A
8723/Add
3, 1/9/72.
(r
Daily Telegraph 21/7 78.
•
Ibld.
3
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 7/36
[
'
I.
Embora esta
espécie de tratamento não seja desco
nhecida dos aldeãos moçllmbiç,anos no decurso· normal dos
acontecimentos, já que a
sua sdrte
sob o colonialismo por
tuguês foi o trabalho forçado e as punições
arbitrárias,
a guerra significou uma intensificação do
mau trata
mento e desprezo. Durante
vários
anos, a Frelimo docu
mentou e denunciou a brutalidade portuguesa
para
com
os civis. Em Agosto de 1970 e de 1972, por exemplo,
testemunhas moçambicanas prestaram declarações
perante
o Grupo de Trabalho Ad Hoc de Especialistas em Direi
tos
Humanos das· Nações Unidàs sobre a amplitude dos
trabalhos forçados, prisão indiscriminada, severas con
dições de prisão, tortura e assassínios
7
• No seu relatório
à 29.• Sessão
das
Nações Unidas, o Grupo de Traba]ho
Ad Hoc sobre os iJJireitos ·Humanos concluiu que est as
acções
eram
generalizadas em Moça llbique.
Nesta situação de guerra, o pequeno número
de
mis
sionários que trabalhavam em Tete achou-se apanhado
numa situação
que não
tinha
criado e que não só difi
culta
as suas
actividades pastorais, como lhes cria graves
conflitos
de
consciência e acção. Por
um
lado, vivem entre
os aldeãos, compreendem a sua situação e tentam, con,
quistar os seus espíritos. Em muitos casos, .só as
missões proporcionam serviços religiosos, educacionais
e médicos à população local; os
padres
.procuramcom
pensar
as
deficiências
de
uma administra,ção colonial
mantida por um dos_ países ma)s pobres da Europa. Por
outro
lado, a situação da Igreja em Moçambique está
intimamente ligada à do d o m í ~ i o
colonial
português e a
Igreja
há
muito que escolheu tornar-se
um
elemento-chave
no
sistema
colonial. Os dilemas inerentes ll estes papéis
contraditórios agudizaram-se com o avanço
da
luta
de
libertação. ·Eles constituem o
assunto
do C<Lpítulo seguinte.
7
· ~ o z m b i q u e
Revolwtion n,us 45
(Out.-Dez.
1970
.e 53 (Out-
-Dez. lll i2). .
14
. ;
10
1\
\ ~ : f · · :f
31
.
2
DE ·QUE. LADO
ESTAMOS?
IGREJA E ESTADO EM MOÇAMBIQUE
A relação estreita entre . a Igreja Católica Romana
e o estado
português
é
tão
velha como a hi stória colonial
portuguesa. A partir do século quinze, vários
papas
con
cederam aos Teis portugueses padr oado régio para fundar
igrejas nos seus territórios de além-mar e serem «senho•
res dos mares_ e terras descobertas» com «jurisdição e
poder espirituaL . . .para
sempre .
,Mesmo hoje, ainda se
invoca algumas vezes o padr.oado.
A mesma ideia se exprimia, de
forma
mais moderna,
no Acto Colonial de- 1930, que determina:
Artigo 2. : «lll da essência orgânica da Nação Portu
guesa desempenhar a .função histórica de possuir e colp
nizar domíniPs .ultramarinos e de. civllizar
as
populações
indígenas
que
neles -se .oompreendam, exercendo também
a influência
moral
que lhe é
adstrita
pelo Padroado do
Oriente.»
O papel da igreja no ultramarera clarament e definido:
Artigo 24.':.
•«As
missões_ c_atólicas portuguesas do
ultramar,
.instrumentos de civilização _e influência nacio
na1
e: os estabelecimentos
de
_formação
_do
pessoal
para
o seu serviço e do Padroado. Português, terão perso
nalidade jurídica e . serão protegidos e auxiliados pelQ
Estado, como -instituições. de. ensino>>'·
A constituição
portuguesa . ~ c e n t e m e n t e
.revista
( 1971)
mantém
o papel especial
da
Igreja
como «instru
mento_
de
civilização>>.·
nas coló lias:
Citado
em
Bertulií,
F,
desare i «C O niPrOtniSsioil de l EkÍise»,
VL Va4tt
nivers
(Maio-Junho 1973 ·: · · ·
__
·
2 Acto
Ooloiltiü : ·de
i9áo:
5
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 8/36
F
[
li
l
I
I
Artigo 46. : «A religião católica apostólica romana
é considerada como religião tradicional da Nação Por
tuguesa.
A Igreja C ~ t ó l i c a
·goza ·de personalidade jurídica.
O regime das
r e l a ç õ e ~
·do
Estado
oom c Ó ~ f i s s õ e s reli
giosas é •
(le
separação, sem prejuízo
da
exi.stência de
concordatas u ácordos com a Sánta Sé. · ·
§ único:
As
missões católicas portuguesas do Ultra
mar
e os estabelecimentos de formação do seu pessoal
serão
protegidos e auxiliados pelo
Estado
como insti
tuições de ensino e de assistência e instrumentos de
civilização» ·
.A Igreja funciona, assim, virtualmente como braço
do governo. Esta situação foi formalizada dentro· da
Igreja
Católica, no
seu
conjunto,
por
vários «acordos com
a
Santa
Sé» que
abrangem as
actividades
da
Igreja nas
províncias ultramarinas. Os
mais
importantes destes
acordos
são
a Concordata
(7
de
Maio
de
1940), o Acordo
Missionário (20
de
Maio de 1940) e o
Estatuto
Missio
nário
( 1941). Reconhecem conjuntamente o controle por
tuguês sobre
todas as
actividades religiosas
nas
colónias.
«Com o Acordo», escreve
um
comentador, «os missioná
rios católicos serão, em princípio, portugueses. E,
se
não
forem,
estarão
submetidos à autoridade eclesiástica por
tuguesa» .
Ao abrigo dos acordos, a actividade missionária
nas
colónias é atribuída,
em
primeiro lugar, a padres de na
cionalidade portuguesa; quando
esta
fonte
de
recruta
mento
se mostra
insuficiente, podem achilitir-se missio
nários estrangeiros,
mas
com a• condição · de que se
integrem
na estrutura
missionária portugil.esa: «inteira
mente submetidos
à
jurisdição
ordinária
dos prelados
das dioceses e circunscrições missionárias»• · Ficam tam-
1
Constituição Partuguesa, revisão de
1971.
4
Sanches,
F. Jorge (Assistente Geral da
Congrega'çãó do
Espírito Santo), « Jes Miesians Cathç.Uques et Ia Politique de l Etat
Portugais>, piritus {Dez.
1972), · · ·
5
Concordata, Art. 28; Aoordo Missionário, ,Art.
3,
6
bém sob controle civil português, sendo obrigados a reco
nhecer
as
leis e
tribunais
portugueses • e fazendo-se as
nomeações para graus superiores após consulta ao
governo.
O Artigo 7.
·do Acordo estabelece que,
antes
de
nomear
um padre para um
posto
mais
elevado como arce
bispo ou bispo, o Vaticano tem que
consultar
o governo
português «para ver
se há
quaisquer objecções a ele de
natureza
política geral». Os padres superiores
nãio
podem
sair
da
colónia, ou mesmo
da
sua diocese, sem informa
rem o governo. Têm que
ser
apresentados relatórios
anuais
<<para informar
o governo
sobre
o movimento mis
sionário e a actividade
externa
das
missões>>
·
Em
troca
destas
concessões e à custa da sua inde
pendência, a
Igreja
obteve
duas vantagens
importantes:
vastos subsídios do estado, cedência de
terras
e isenções
fiscais, e responsabilidade
pela
educação de todos os afri
canos
rurais (isto
é, quase
toda
a população
africana)
.
«Em nenhum
outro
local», segundo
os Padres
Brancos,
<<gozaram os
missionários
de um estatuto tão
privile
giado.
Em
nenhum
outTO
local receberam auxilio .material
tão
directo e substancial de
um
governo>>
. As despesas
dos padres missionários,
para
cuidados
médiClos
viagens,
etc.,
são
reembolsadas por intermédio dos seus bispos,
enquanto os próprios bispos
são
tratados
como :governa
dores, com privilégios equivalentes, e recebem «subsídios
extraordináriOS»
para as suas
dioceses- proporcionais
à
«SUa
fidelidade
às
directivas oficiais e
seu
alinhamento
político»
•.
· A posição
da Igreja em
Moçàmbique
é por
conse
guinte, uma posição comprometida. Como agentes
da
edu:
b
Concordata, Art. 28; Acordo Missionário, Art. ; Estatuto
Mis-sionãrio, Art.
16.
7
Acordo
M . J s s ~ O i l l á r i o
18. Estatuto
MJ'Sslonárlo, Art-s.
77 e 78.
8
De'Claração
dos Padres
Brancos
q u ~ i da
Sua retirada de
M<>Qamblque
Roma,
15/5/71 (Ver
Apêndice II).
9 Bertulli,
op. cit.
17
' -c/
i
,
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 9/36
cação no est11do português, as missões têm um duplo
papel a ,desempenhar com respeito ao povo africano. Tra
zem .simultaneamente
o
catolicismo e a
cultura
portu
guesa. Os professores missionários, está estipulado, devem
respeitar tanto os «fins morais como
os
nacionais»
da
educação· que é destinada aos indígenas . Descreveu Se
a
tarefa das
missões como «dez milhões de indígenas
para catequisar, instruir e
integrar na
Lusitanidade>>
.
Em 1963-64,
todas
as <<escolas de adaptação>> (escolas
pré-primárias
para
africanos) excepto seis
eram
dirigi
das por missões com apoio financeiro do governo, tal
como cerca
de um
terço
de todas
as
outras
instituições
educativas do país.
Como,resultado da sua relação especial com o Estado,
a Igreja Católica possui influência e poder completamente
desproporcionados com o número dos seus membros. O
último recenseamento que registou a confissão religiosa
(1950) mostrou que mais de 90% dos africanos aderiam
a religiões tribais da fé muçulmana, enquanto apenas
5% eram católicos. A instituição
da
Igreja é predomi
nantemente
branca
e predominantemente portuguesa. As
tentativas
de
relacionar
a
doutrina
mais directamente
com Moçambique
são
dificultadas pela doutrina
da
lusi
tanidade; diz-se que um antigo bispo de Nampula afir
mou a um auditório de alunos africanos
12
: «Tendes que
ser
bons portugueses
para vos tornardes
bons cristãos>>.
Politicamente, a Igreja é
também
poderosa. As «duas
organizações com mais influência sobre o sector tradi
cional» (isto é,
0
s africanos)
são
a administração e a
Igreja . A Igreja, na realidade, está directamente repre
sentada na
administração. Grupos de interesses «morais
10
Estatuto Missionário Arts.
60
e 70
11 Ci-tado em BertuUi op. cit.
2 BertulH op. cit.
13
kbshire,
D. M. and
Samuels,
M.
A. eds.),
Portuguese
A[rlc :
Hcmàbook
(1969).
18
,
.-
,.;_- ·;·---
..
i · ~ ~
l
\
\
\ -- , ·
~ ~ - ·
I - ) ; : : - : ) , ; ~ s : ~ - ~ ~ - -
:
,,,/J;J:
'
, , , ~ , :
e culturais>> elegem seis membros da Assembleia Legis
lativa
e quatro membros do Conselho Consultivo; um de
cada grupo tem que ser um missionário católico romano .
Enquanto as áreas urbanas são
servidas
sobretudo
por padres residentes de
nacionalidade portuguesa,
as
missões
são
providas por padres missionários, a maioria
·
1J1
do·s quais são membros de ordens religiosas com sede
( numa
série
de pa.íses diferentes. Pelo menos doze ordens
diferentes
estavam,
até recentemente, a trabalhar em
• Moçambique -algumas
de Portugal, da
Itália, da Es-
.-$
panha, e algumas (como os
Padres
Brancos) internacio-
nais. Em 1964,
havia
58 padres
ordinários
e 437 membros
de ordens reliigiosas. Na diocese de Tete, os prinicpais. ~ - - - - .
grupos representados eram os Padres Brancos, os J e s u í / ~
tas, os
•Padres Combonianos
(uma ordem
italiana) e
os
Padres de
Burgos (não membros
de uma ordem,
mas
padres do
Instituto
Espanhol
para
as Missões Estran-
j
geiras). Como os missionários dos outros sítios, os de
Tete caíam sob a jurisdição do bispo,
q ~ e ,
durante parte
do período em discussão, foi D. Félix
Niza
Ribeiro (que
foi
transferido,
em Maio de 1972, para a diocese de Gaza e
substituído por D.
César
Augustg
da
SHva).
O a c t ~ a l Arcebispo de L o ~ r e n ç o Marques, ch efe ecle-
siástico supremo de todo Moçambique, apqia declarada-
'r-
mente os objectivos políticos do governo. ·«Deixada a si
l
própria,
esta parte do
continente
não
é capaz
de
governo
· f
a ~ t ó n o m o » ,
escreveu ele em 1970. «lil esta a responsa-
bilidade d velha
Europa
e da
Igreja de
CristO>>
15
• Uma
J
década antes, ele acentuou que era dever do clero o p o r s ~ ~ ~
ao terrorismo e abster,se mesmo de apoiar movi-
V
mento de independência pacífico,
visto
que a indepen-
dência no
resto da
Ãfrica tinha
trazido
desordem, revolta
e feito. o jogo do comunismo. O slógan
«a
Ãfrica para os
Documento da ONU
f C 109/L 843.
15
Oatholic Heraild
25/9/70.
19
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 10/36
Africanos»
era
um desafio à Cristandade, porque signi
ficava a África
para
o comunismo e o islamismo .
. A instit uição eclesial
não
teve geralmente muita difi
culdade em concordar com o Arcebispo Alvim Pereira.
Foi,. além disso, directamente arrastada
para
a guerra,
à medida que o conflito
militar se
intensificou,
ao
longo
dos anos desde 1964. Dioceses e ordens religiosas forne
cem regularmente padres
para
servirem no exército ( < >mo
capelães) e estes recebem «treinamento
psicológicO>>
antes de
ocuparem os seus postos, de
forma
a que possam
encarar ·o seu trabalho como
parte de
uma <<cruzada».
Um destes, da força aérea, «disse a
uma
assembleia de
missionários, em Amantongas (missão franciscana da dio
cese da Beira), que tinha ajudado um grupo a lançar pri
sioneiros de
guerra de
um avião, sem paraquedaS>> ·
Os padres
estão
plenamente integrados no corpo de ofi
ciais -desde o Arcebispo
de
Madarsuma, com o posto de
general, atê aos capelães comuns, com o
posto
de alferes.
«Nunca,
na
história portuguesa, houve uma presença tão
massiva e sistemática
da igreja
no seio do exército»
.
Em 1971, falando numa conferência realizada pelo ns-
tituto
Português de Altos Estudos Militares, o Bispo de
Carmona, em Angola, interpretou claramente a utilidade
militar da Igreja: «Enquanto Portugal se mantiver vigi
lante
em
que o
seu
povo pertença a Deus, Deus garantirá
que estas pessoas sejam portuguesas»
19
•
À
medida que a guerra progrediu, padres isolados
opuseram-se ocasionalmente à ,'política do governo ou cri
ticaram o comportamento do exército, como os aconte
cimentos
narrados neste
relato
mostrarão.
Não receberam
apoio
da
hierarquia, que, quando
confrontada
com pedi
dos para que
também
ela se manifestasse sobre
certas
16
Bertulli op.
cit.;
Sanches op clt.; Mondlane E. The
Strugg e for Mo.w,mbique (1969); Le Monàe, llj7j73-
17 Bertul:li op. cit.
te Sanches op.
cit
t
9
Citado em -Sanch eS, op. cit.
20
questões,
se
refugia
na
pretensa separação da,
igreja
e
do estado: «A hierarquia
não
deve envolver-se
na
politica
nem servir qualquer .ideologia ou partido» na s pala
vras de uma
«Carta ao Clero»
da
Conferência Episcopal
de Moçambique' ·
O Vaticano cala-se também;
por
que razão, é incerto.
Há, contudo, segundo parece,
alguma
crítica à politica
de
Portugal
dentro da Igreja Católica no seu conjunto,
porque, no Sínodo dos Bispos de 1971,
em
Roma, o Bispo
de Carmona retc;rquiu-lhe
da
seguinte maneira:
I
«No que
se refere
à condenação
da
presença de Por
tugal
em África, parece lógico que deveria caber ao Santo
Padre
fazê-lo ... Mas se, pelo contrário, são os
Papas
que,
0
numa série de bulas, favoreceram
esta
situação,
que
auto
ridade moral
têm
meia dúzia de bispos
para
condenar
hoje o que a Hierarquia suprema abençoou ontem?»
OS
PADRES BRANOOS RETIRAM-SE
Os Padres Brancos começaram a trabalhar em Mo-
çambique em 1946, em
resposta
a um convite da Igreja
local, para cobrir <<território missionário virtualmente
novo», nas dioceses da
Beira
e de_ Tete. Tinham cerca
de 40 padres, em oito postos missionários centrais (um
dos seus principais membros, o P • Bertulli, cujo artigo
em Vivant nivers foi frequentemente citado neste relato,
tinha estado continuamente
em
Moçambique, desde 1946.
Na
altura da retirada era
ele Superior Regional) . '
Os
Padres
Brancos encontraram-se entre os pri
meiros a
sentir
que a
situação
em .Moçambique, tanto
militar como eclesiástica, se
tinha
tornado
tal
que
já
não
o c:tado em
Bertulli op. cit
2
1 Citado em Bertulli op cit. O Sínodo dos Bispos elabo-rou
o documento episcopal
Justiça o Mundo
21
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 11/36
·l
podiam continuar a sua actividade missionária. Não se
tratava
de simples
factores materiais
ou · externos:
«A segurança dos nossos membros não está amea
çada. As condições de
vida
em Moçambique não são
desagradáveis ...
Em
nenhum
outro
sítio beneficiámos de
ajuda
material
tão
directa
e substancial de
um
governo.
E as autoridades de Lisboa
nunca
deram qualquer indi·
cação de que a ·presença dos
Padres
Brancos já não era
desejável em Moçambique>>
•.
A razão dada para a decisão
(em
Maio de 1971) de
deixar Moçambique foi a «gr ave ambiguidade>> da posi·
ção dos missionários.
Os
Padres eram impedidos dos seus
cuidados pastorais normais (que são dedicados à <<afri·
canização»
gradual
do
seu
clero,
baseada
no conheci·
mento das condições e cu
tura
locais) pela orientação
portuguesa do aspecto
da
Igreja em Moçambique. Para
além disso, descobriram que
Com
demasiada frequência,
certos actos de ministério apostólico, especialmente os
que
são orientados para a promoção de verdadeira justiça
social,
sãJo;
considerados actos subversivos e
dão
frequen
temente ocasião a penosos vexames, ou mesmo a prisão
ou
maus
tratos para
certos
dirigentes cristãos mais em
contacto com a
missão>> .
O BispQ da Beira, D. Sebastião de Resende, encara·
jou os Padres Brancos nos seus esforços para a
africani·
zação e justiça social, até à
s ~ a
morte em 1967
(e
foi
privado de muitos dos seus privilégios episcopais pelos
seus esiiorços; mesmo a alocução no seu funeral que lhe
chamava campeão dos pobres contra a injustiça foi pos
teriormente suprimida)
·
~ · . ·&--' ',.- ~ · · ~ ~ - ~ - ~ - - - · - - . ~ . - - . _ .. -.--.--:- . . · • ·
• Declareção
dos Pedres
Brancos, 15/5/71, ver Apêndice II
para o texto completo este ~ o c u m e n t o .
22
Declaração dos Pa Wes Brancoa
3
Ver Burr1dge W. <<Mozam blque- the EvJdence of the
White
F1athers», he Guar Uan; 3/8/73.
22
'
* I
-?
Nos anos que se seguiram, contudo, e à medida que
a guerra se deslocava .para o sul,
para
Tete, a situação
piorou. As actividades sacerdQtais eram perturbadas de
numerosas formas. Documentos
da
Igreja, como a
Paoem
n
erris
do
Papa
João
XXIII
e a Mensagem a África do
Papa Paulo VI, eram censurados; sermões sobre a justiçC...l::) _,
social 'ocasionavam repreensões do governador;
as
auto-
ridades civis opunham•se a cooperativas agrícolas e es·
colas secundárias para
africanos;
e a polícia
reunia
infor-
mações sobre os missionários. De modo
maís
sério,
parece terem c h e g a d ~ cada vez mais ao conhecimento
dos Padres
provas
da. brutalidade da polícia para com os
africanos. «Numerosos colaboradores meus
das
missões»,
contou o P
.'
Bertulli, «SOfreram desta forma. Eram inter·
rogados e
maltratados
sem motivo; os
instrumentos
de
tortura incluíam chicotes de pele de hipopótamo, palma·
tórias, cilindros de madeira colocados sob as rótulas com
todo o peso
do
corpo
assente
neles e suspensão pelas
pontas
dos dedos
apenas
com os
pés
a tocar no chão».
As freiras das missões tratavam das
vítimas
da tor·
tura até
se curarem, sabendo
que
V1oltariam
para
mais
«interrogatórios». O P.' Pille, de visita à prisão de Tete,
foi admitido por engano na ala dÓs prisioneiros políticos,
onde encontrou quatro; dos seus paroquianos africanos,
um reduzido a um simples esqueleto, outro com o crânio
rebentado,
outro com um braço partido e o último com
pele arrancada das costas .
A ordem pediu sem resultado à hierarquia para se
manifestar sobre
estas brutalidades. Isto,
juntamente
com
a
sua
crença de que «uma Igreja amordaçada pode .con-·
tinuar a ser um
sinal
válido num regime em que a Igreja
é oficialmente perseguida»,
mas
se torna
«Uma
teste·
munha
em
contrário
num país que se proclama
aberta-
mente católico e protector da Igreja, mas a longo prazo
utiliza a
Igreja para
fins que
não têm nada
a
ver
com
'
4
BertulH op. oit.
23
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 12/36
I
o Evangelho de Jesus Cristo» , fê-los decidirem que não
podiam, em consciência,>
continuar
em Moçambique •.
Logo que a decisão foi
tornada
pública, os
Padres
Branoos deixaram de ser benvindos
em
Moçambique. Em
fins de Maio de 1971, o P.• Bertulli foi
preso
pela polícia ,
de segurança, interrogado e expulso. O Ministro dos Negá- ')
cios ~ t r ~ n g e i r o s português ~ e n u n c i o u a Ordem, numa
/ -
conferencia
de
Imprensa
em
Lisboa. O Governador Gera1
1
1
)
de Moçambique declarou que ela
deixaria
i m e d i a t a m e n t e \ ~
de
funcionar no
território.
Várias alegações menores de -
mau comportamento
foram
lançadas aos padres que
partiam .·Partiram em quatro grupos, em fins de Maio
o mês
em que começou a
primeira
série de massacres
documentada neste relato.
Em Fevereiro de 1971, o ..superior da ordem, P.. Theo van
Asten, vd.sitou Lisbo-a e teve discussões com o Núncio Papal local e
com o Minilstro do Ultramar português. Foi também a Moçambique
e informou a Conferência Ep1is'oopa.L
de
da p ~ b J l l d a d e
de os
P a d ~ e s ·-Brancos partiz;em. Numa reunião .dos 37 padres que traba
llmvam então Moçambique, uma
maio·I)ia
Vl u a favor da par
tida, r evelando c inco que desejavam_ permanece-r,
pa.t::a
enfrentar
a ,situação «maia Vigorosamente».
Em
18
de
Maio
dle
1971, o
P.e
van
A Sten mandou pessoalmente cartas a
anunciar
a decisão e à data
d ret rada
1
de
Ju1ho
de 1971), ao
pa.d.r.e
pravi·sonamente encar-
r:egado da diocese da. Beira e ao ..secretário do Bl spo de Tete. Não
se
recebeu nenhuma. resposta a estas cartB n€-m
a.
uma à Cooferência
Epi'Soopal (Burl'lidge, «RepiY
to the
Blshop's OommunJ.qué»,
he
Tablet
26/6/71).
25
Declaração dos Padres Brancos.
The Ttmes 29f5f71;
Dúl1 io
de Noticias 29f5f71.
24
l
gl
I
J
J
\li
3
MASSACRES EM MUCUMBURA
Entre
o
rip
Zambeze e a
fronteira
Moçambique
-Rodésia a norte e nordeste de Salisbúria, estende•se uma
estreita faixa
de terra de
vinte
a trinta milhas de
lar-
gdra. A fronteira é formada,
em parte da sua
extensão,
por um rio chamado Mucumbura. O mesmo nome (pro
nunciado de várias formas) pertence à reserva
africana
do lado rodesia:no; da fronteira e à área do Norte de
Moçambique
paralela
à fronteira. Como
muitas
outras
partes
de Tete, não é virtualmente habitada
por
colonos
brancos.
Sem
indústria, e com pouca actividade comer
cial,
não
houve
nada
que atrafsse a oolonização por
tuguesa.
A área de Mucumbnra era servida por uma m i s s ã o
dirigida pelos padres conhecidos como
Padres
de Burgos,
de Espanha, e por freiras espanholas que também lá
tra-
balhavam. Para além da presença
administrativa
portu-
guesa mfnima,
eram
o único elemento
estrangeiro na
comunidade. Encontrando•se na comunidade,
mas
não
lhe pertencendo, foram inexoravelmente arrastados para
um papel central, que não procuraram, como testemunhas
do conflito em evolução em Tete. A garganta de Cabora
Bassa, onde está a
ser
construfda a b arrag em, fica a •
alguns dias de caminho de Mucumbura. A actividade
da
Frelimo na área aumentou desde 1970, e
as
medidas
·
defensivas militares
portuguesas aumentaram
confor
~ m e m e n t e .
Onde, como parece ser o caso em Mucumbura, a
maioria da população
africana
simpatiza, em
graus
varia
dos, com os objectivos e actividades da Frelinio, as medi-
25
:;_
,
,../
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 13/36
l
11
ti '
p
:
I
-
Q _ - - ~
das tomadas pelas auto.ridades tendem inevitavelmente
a assumir não apenas um
carácter
antiguerrilha, mas
um carácter antipopulação civil. Numa região
tão
atra-
sada, raramente há uma testemunha «independente» dos
acontecimentos. Mas os padres, vivendo e trabalhando
na área, sabem o que se passa à sua volta e em geral,
não possuem a motivação especial que os portugueses
e a Frelimo têm para, respectivamente, esconderem e
L
revelarem incidentes de brutalidade da polícia e do exér
. cito contra civis africanos. As provas das matanças de
~
Mucumbura provêm,
por
conseguinte, em larga medida
·
~ d e l e s
(especificamente, d.os Padres Alfonso Valverde e
Martin Hernandez, que compilaram
um
dossier baseado
·
nas suas próprias observações p08f: jlliCto e em declara-
; r ções de testemunhas oculares e parentes
das
vítimas).
',
1,r
1
r
1
: 1
i
:1
I
I
I
I
I
' Embora os P. Valverde e Hernandez fossem, mais tarde,
presos e mantidos sem julgamento durante quase dois
anos, não foram eles, em nenhum sentido, as principais
vítimas dos acontecimentos, como aliás seriam os
primeiros a salientar. As vítimas, que, por vezes, se
perderam de vista, na série de acontecimentos, afirma
ções e negações posteriores,
foram
aldeãos africanos -
um total de pelo menos
76
pessoas, mortas numa série
de incidentes ao longo
de
seis meses.
Em fins de Abril de 1971, uma mina da •Frelimo
explodiu perto do rio Mucumbura, matando
três
e ferindo
dois soldados rodesianos que
tinham
atravessado a fron
teira.
Em
4 de Maio,
tropas
·portuguesas capturaram e
torturaram lavradores africanos lohais
para
obterem in
formações sobre
as
actividades
da
Frelimo. Como resul
tado, os soldados foram a casa de um homem da zona
chamado Aroni, cujo sobrinho
tinha
ido
para
a Frelimo.
Aroni foi baorbaramente ·espancado e, depois, morto a
tiro, «para encorajar os outros>>. O seu corpo fui enter
rado mais
tarde
pelos ·dois padres.
Os padres foram imediatamente ter com o agente
local da DGS e com o capitão da companhia militar impli-
26
..)
c
.6
- - ~
cada,
para protestar
contra o assassínio de lavradores
locais por alegada «Colaboração·>>. Aquele disse-lhes: «0
terrorismo
tem
que
ser
combatido com o terrorismo ..
na guerra de guerrilhas não há julgamentos. Uma morte
a tempo pode
salvar
muitas vidas>> •. O capitão da
companhia exortou-os a pensarem nos cinco homens da
sua
companhia mortos por minas, tal como os três rode
sianos, e afirmou: «As povoações são culpadas, porque
são para
o
terrorismo
CJomo
a
água
é
para
o
peixe>>.
«Chegámos à conclusão>> dizem os padres, «de que a
tropa
pretende acabar com a água -
as
povoações -
para que morra o 'peixe'».
Por volta da mesma altura, 14 lavradores das aldeias
de Kapinga e Catacha foram espancados e mortos por
terem dado comida a guerrilheiros. Outros sete homens
foram mortos na aldeia vizinha de Mahanda. Os padres
foram informados disto pelos sobreviventes, principal
mente mulheres e crianças. Visitaram
as
povoações e
mostraram lhes os túmulos pouco profundos. « ..Como
havia várias pessoas enterradas nela, havia um forte
cheiro a carne humana em putrefacção. A seis metros da
CJova
encontrámos uma cabeça humana quase sem carne,
ossos das costelas, das pernas e bocados dos dedos das
mãos.» Encontraram também grande número de latas
vazias das rações de combate usadas pelos Portugueses,
a cerca de vinte
metms da
cova. No dia seguinte, 8 de
Maio, os mesmos soldados mataram quatro pessoas na
povoação de António. Quando os
padres
chegaram, no
dia 9 um domingo,
para
celebrar missa, encontraram
a povoação deserta. Ao fim
de algum
tempo, apareceu
um aldeão, expliC'Ou-lhes o que tinha acontecido e mostrou
-lhes os cadáveres:
um
tinha
três
balas
na
cabeça,
outro
* «0 Masse.cl le e
Mucumbura», relatório dos p os Alfonso
e Martin. ier Apêndice m para o texto completo.
As o ~ t r a ; s
cita
ções
deste
capítulo
~ s ã o
tiradas d-este documJento, ·salvo indicação
em
contrârl·o.
27
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 14/36
a
l
~
no peito, um terceiro a
cara
completamente desfeita e
o
quarto tinha sido esventrado. Os padres enterraram
os cadáveres e foram
então de
novo defrontar-se com o
capitão e o
agente
da i[)QS. O agente afirmou que
as
mortes
de
António
eram
resultado de
uma
emboscada
da Frelimo. Os padres sustentam que todas
as
vítimas
eram
lavradores
africanos
vulgares. Nem
um
único mem-
bro
da Frelimo. foi
morto
nem foram apreendidas armas
durante
as
operações - como o agente da DGS confir
mou. Os habitantes
da área
abandonaram
as suas
a:ldeias,
deixando
as
colheitas e o gado.
sem
cuidados, para salvar
a vida, segundo os padres.
À volta
da missão,
as
pessoas
viviam aterrorizadas: os homens que voltaram a uma
povoação depois
da primeira fuga foram
levados pela
tropa e não se
sabia
o que se
estava
a
passar noutra,
visto que a povoaÇão estava separada da missão
por
uma ··f · ·
'·
strada
minada. ·
fé.
O
protesto
dos
padres
produziu, contudo,
um
resul- · ~
tado.
No
princípio de Junho, chegou a MucumbJlra
um
2::
oficial do Tribunal de Justiça de Moçambique para falar
\
com os padres.
Tinha
sido enviado· pelo General K ~ u l z a
de Arriaga, Comandante-Chefe
das
o r ç ~ <
Moçambique. Descobrindo que os padres não tinham sido ' 1CJ
eles próprios
testemunhas
oculares
de
quaisquer mortes, h
rejeitou
as suas
provas:
«A vossa informação provém dos
pretos
e
estes
são
: : . ~
..
mentirosos por natureza. Se
q11.erem
que lhes diga o que /
penso, até é muito provável que a Frelimo, durante a
noite de sábado para
doming10,
tivesse feito essa mortan-
dade (em António),
para
inculpar a
tropa
portuguesa
perante as
povoações.>>
Os
padres
convidaram-no a
visitar
o lugar do mas-
sacre
para ver
com
os
próprios olhos; ele declinou e
i
partiu para l j ~ l a , depois de lhes
dar
uma lição sobre '
o e v a n g e l h o . ~
Os P. Alfonso e
Martin
notificaram o governador
de Tete, que os informou de que os responsáveis seriam
28
-
f - J z r ~ ~ ~ ~
punidos.
Notificaram
também
o Bispo d e - ' ' e t e ~ . Q . f
\2
Ribeim. Os padres tinhaiu catalogado sistematicamente
os massacres, a
partir
de 4 .de Maio, compilando uma
lista detalhada
de datas, lugares e nomes
das vítimas
e
i
•
tirando fotografias sempre
que possível.
Em
Junho/Julho, _
~ este
depoimento foi apvesentado a
uma
reunião
que
com
~ preendia o bispo e cerca de 36 missionários de diferentes
~
ordens que
trabalhavam em
e te
Padres
de Burgos, _
_,
-,_,
Jesuítas
e Combonianos. O bispo recusou-se a denunciar , ;:-.
publicamente
as
atrocidades ' e os missionários decidiram ~ -
.'
designar
um padre
comboniano português.
P.'
Luís Afonso
da Costa, para viajar pelo país para
consultar
e discutir ' ~
com
todÕS
os
outros
missionários
l o c i ~
católicos. e
Pf L
testantes. ---::':\
r / · J1
CC' I, jç
O
P.'
Costa foi preso e interrogado
várias
vezes, -
durante
as suas
viagens. Documentos
na
sua posse, que
incluíam descrições de discursos papais contra a tortura
e descrições e fotografias das
matanças
de Mucumbura,
foram apreendidas
2
•
Escreveu o
seu
próprio relatório,
«Mais de um Ano de Agonia... Sem
Esperança
de Res
surreição»*, que se baseava profundamente no material
fornecido pelos P. Alfonso e Martin, mas incluía o seu
próprio
material
de
outras
partes de Tete. '
SEGUNDA SlliRlE DE MASSACRES
Entretanto, ocorreu o grupo de
matanças
seguinte
documentado pelos
P.
Alfonso e Martin, no início de
Setembro.
Desta
vez, tomou a forma de uma acção de
retaliação de
tropas
rodesianas.
The Observer
15/7/73; S'UII dwy
Times 15/7/73.
2 The Observer
ibid.
*
Apêndice IV.
3
er
Apêndice IV. O material adicional diz respeito aos
lderunrentbs e à atitude
dos
m s s l o n ã r ~ o s que. traba:lhavam
na
região.
29
:::-
'\
c
- ·- C ·· ~ : - ,
;) - - ~
c::
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~
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 15/36
Em fins de Agosto guerrilheiros da Frelimo
atra
vessaram temporariamente para a Rodésia em persegui
çãio
de
um
informador. O exército rodesiano sabendo
disto depois do acontecimento mandou
tropas
e um
helicóptero para a região de Mucumbura onde
durante
um
perlodo de cerca de uma semana
tiveram
lugar
as
matanças
documentadas no segundo relatório dos Padres
de Burgos.
Em
3 de Setembro foi
morto um
africano
chamado David
quando
ia
buscar
o
gado para
casa
para
a noite. O
seu
corpo foi encontrado
três
dias
depois
e
no
dia
do funeral os
padres falaram
em inglês com sol
dados Todesianos que admitiram ter-se enganado (« ... uma
coisa muito lamentável srs. padres .. pensámos que era
um terrorista»)
. O corpo de outro africano que os rode
sianos tinham morto foi trazido de helicóptero para o
posto de Mucumbura.
Em 5 de Setembro tropas rodesianas mataram
a
tiro
o chefe
da
aldeia de
Singa
e oito membros
da
sua
famllia
na maior
parte mulheres e bebés. Era de
novo
· Um
erro» que os soldados
tentaram
esconder quei
mando
os
corpos. Dois rapazes
que fugiram levaram
os
padres a Singa uma semana depois: wam identificáveis
carne carbonizada e oito esqueletos. Os
padres mandaram
fotografias juntamente com
um
relatório ao Bispo de
Tete Mons Ribei ro. Dois
dias
mais
tarde,
o coronel do
distrito
disse-lhes que tinha ouvido que eles tinham
tirado
fotografias e ordenou-lhes que
entregassem
a pelicula.
Informruram-no de
que já
a
tinham dado
ao bispo. «Sabe
mos
agora
que o bispo a
tinha
mandado para Lourenço
Marques para ser revelada e que receia jamais receber
as
fotografias.>>
Os
padres
narraram
apenas
os incidentes de que
tinham
visto
provas
pessoalmente·. Muitas
testemunhas
lhes contaram outros acontecimentos
durante
a
primeira
semana de
Setembro-
«essa
semana
de autêntico terror,
em que o povo
só
via helicópteros e
gente armada por
toda
a parte». Helicópteros
trouxeram outros
corpos e
30
1
: ; ~
l
··;
_. .
alguns aldeãios feridos ao posto de Mucumbura. Cerca
de doze pessoas
foram
levadas paTa a Rodésia p r ~ serem
interrogadas *.
No
seu relatório o
P.
Costa registou outras matan
ças deste .perlodo incluindo
um ataque
de helicóptero
à
povoação de Cambewe
da
qual
foram timdos
todos os ho
mens. Dois dias depois dois corpos- sendo um o do chefe
de sessenta anos de idade foram lançados de um heli
cóptero acompanhados por
um
aviso grit ado «a embos
cada
terrorista
custou-vos
trinta
mortos>>
.
A MATANÇA CONTINUA
«Durante os primeiros 15 dias do mês de Outubro
as povoações ao longo do rio Dak foram cenário de nume
rosas torturas e mortes>> causadas por «grupos espe
ciais>> do exército português.
As
vitimas eram pessoas
inocentes. Os grupos especiais
obrigaram
a população a
permanecer
nas suas
aldeias ameaçando
matar
quem
quer
que
tentasse fugir
ou fosse encontrado no mato.
O envolvimento de tropas
r o d e s i ~ ~ s .fo i,
mai·s tarde con-
firmado pelo
P.e
Enrique Fer:rando, que passou
oito dos seus
catorze
em Moç.ambique na .missão de Mucumbura. Ele lembrava-se
de
v.er helicóptero;s: rodesia.nos e portugueses a t-omarem
parte numa
operação militar a cerca
de
15 milhas
para
o .interior
da
fronte-ire;
tinha
falado
e dado água ft ·soldados rodesianos. A
carta
de pro
testo
do p_e Enrique ao Dr. Caetano foi· também publ,icada na jornal
catóHco .espanhol
Vida
Nuerva ver eune Afrique
22flf72).
As auto
ridades rodesianas e o embaixador de P o r t u g ~ l em Londres
negaram
o envolvimento rodesiano.
Mas
o Gen. Arri·aga admitiu que
um
acordo permitia às tropas rodesianas
atravessarem
a fronteira
«em perseguição
·and.mada».
Notícias
de
jornais
de
1973 .i-ndicavam
que
o exércitn rOOesiano
estava
a actuar «em força»
no
:interior
de Moçambique, e pensa-se que foram aa suas
investigações
sobre
o alcance
desta
colaboração rodesian:o-portuguesa que valeram a
Peter
N esewand a
.sue.
detenção e prf.são The Guardian 18/5/73).
•
ewne
Afrique
9/9/72.
31
~
.
t
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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4
S CONSEQUÊNCI S DE MUCUMBUR
; y \ ~
h J
\ / O Ano Novo de 1972
abriu
com a celebração do Dia
1
Mundial da Paz nas igrejas católicas romanas, por todo
o mundo. O ano velho
não tinha
feito
uma
exibição muito
boa em M o ç a m b i ~ u e no que se referia à paz, e o novo
também não
se mostraria nada
melhor. Mas
estava
a
começar a e d i f i c a r ~ s e uma reacção aos acontecimentos
de Mucumbura, que acabaria
por chamar
a atenção do
mundo exterior
para
os factos.
·
Os P.
Alfonso e
Martin
tinhllim falado do apoio que
receberam de outros misisonál ios, a ~ u m .também cau
sava
aversão o desprezo
brutal
patenteado pelas autorida
des coloniais para com os membros das suas congregações
africanas
. Mostrando alguma da coragem dos dois Padres
de Burgos, parece que, outros padres exprimiram os seus
próprios protestos, embora .não .se preocupassem em for
necer quaisquer provas de novos ou velhos massacres.
Uma. das vozes
pertencia
ao Bispo de Nampula,
Mons., Vie\ra .Pinto.
Quatro
meses antes, el.e ,tinha defen
dido os Padres Brancos .contra as alegações de má con,
duta
feitas contra eles pelos Portugueses, quando os
seus colegas episcopais se tinham recusado a fazê-lo, e
tinha
ady,ertido o povo de Moçambique dos perigos que
estavam iminentes, a não· ser
~ u e
rejeitassem «O egoísmo,
a injustiça;
ô
medo e
·a
f
0
rça>>
e eliminassem «Corajosa
m@nte todas
as
formas de exploração, todo o abuso do
poder e todas
as
atitudes macula.:Í.as pelo racismo». Seria
melhor ter «Uma Igreja perseguida ( uma Igreja
que recebe auxílio de; mas
éstá
·gravemente .comprome-
37
~
· ~ ~
ti i
l1 .3..1ll.1111111.11l.1111 111
, ~ _ t _ t j ' j _ _ j j , _ k t t t f i i . ~ ~ - ~ . ~ J t
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 19/36
~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~
I
tida
com forças
temporais» .
Segundo o P.• Bertulli,
Mons.
Pinto
foi virtualmente repudiado pelos seus cole·
gas de
episcopado e
era
vigiado de
perto
pelo governo,
que
teria
gostado de o
afastar,
se pudesse .
No Dia Mundial
da
Paz, Mons. Pinto fez um sermão
em que denunciava de novo a injustiça social e o racismo.
No mesmo dia, o pároco
de
Macúti, perto
da
Beira, fez
um sermão semelhante
sobre
o
tema «Se
queres a paz,
trabalha
pela justiça». Abordando primeiro a supremacia
Tacial e a degradação e exploração dos africanos em
Moçambique, passava então à falar
da
guerra, dizendo:
«A uma gueiTa de opressão ·nã o pode responder-se
com
outra guerra
de repressão, ao terrorismo de sub·
versão
não
pode responder-se com o
terrorismo
de repres·
são
.. Celebramos o Dia Mundial
da
Paz, estando em
gueiTa em Moçambique ... Sabemos um pouco do que se
passa no Norte, em Cabo Delgado e Tete; sabemos por
testemunhas oculares e com dados concretos que, em
Novembro de 1971, chega
à
região de Mucumbura um
grupo de 40 comandos e queima e
extermina
.. » '
Continuava, citando mais dos incidentes de Mucum·
bura, e terminava afirmando que a culpa da guena
era
decididamente dos que perpetuavam
as
injustiças a que
se
tinha
referido anteriormente.
Os ânimos
entre
a população
branca
e a imprensa
da Beira
foram fortemente
atiçados contra
o padre, P.•
Sampaio, por pregar este sermão e tornar público o que,
até
então, tinha apenas sido
1
discutido dentro da Igreja
I Citado em The Tablet, 30/9/71. Esta
men.sagem
foi publi·
Cada em 13 de
Agosto
de 1971 pelo Con Selho Clerical da Beira {cuja
reunião
oi
presidida por Mons. Vi-eira Pinto,
na
.sua qualidade
de·
Administrador Apostólico, jã que não hav-ia Bi·spo da Beira,
naquela altura . O.s Superiores Regiona:s quer
da
Ordem Jesuíta,
quer
da
Fra.nci-soana,.
eram membros
do Conselho.
·
2
Bertuut,
oP
cit. ··
3
~ e x t o
do · s e ~ ã o
do
P."' Teles Sampaio, lf l/72. Cf..
J u Z g a ~
mento· dos Padrea ào MacútL Ed.
Afrontamento
Agosto de 1973.
38
~
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a
1
1
I
•
UMA·
~ k
~ W - 1 ~
e presumivelmente) . do exército. No espaço de
uma
quin
zena, o P.• Sampaio e o seu
ajudante,
P. Mendes, tinham
sido presos.
Em Fevereiro de 1972, havia quatro padres na prisão
por divulgarem informações relativas aos massacres de
Mucumbura. Disse-se que o Governador, Pimentel dos
Santos, e o Comandante-Chefe, General Arriaga, tinham
a impressão de que a melhor
maneira
de os silenciar
era
expulsá-los a todos. Insinuou-se, além disso, que Mons.
Pinto o
tinha
impedido ameaçando deixar ele próprio o país
se as expulsões tivessem lugar.
Em
vez disso, os padres
do Macúti foram submetidos a julgamento, um ano depois
da
sua
prisão, acusados de diversos crimes contra o
estado,
entre
os quais, encorajar a separação de Moçam
bique de Portugal e espalharem notícias
falsas .
A notícia
do Notícias da Beiro
(5/2/73)
fornecia o resumo do juiz
no julgamento, mas as provas
da
defesa que atestavam
a
verdade
daquilo que o ·P • Sampaio disse
que
se
estava
«a passar
no
Norte» foram censuTadas. Os padres de
Mucumbura, acusados de traição e subversão, de ajudarem
a Frelimo e espalharem falsos boatos de atrocidades, não
foram julgados. Quase dois n o ~ depois
da
sua prisão,
concedeu-se-lhes uma amnistia e foram expulsos .
Durante os meses em que os padres estiveram
na
pri
são, contudo, outras coisas
estavam
a acontecer. O Núncio
Papal
em Lisboa, disse-se, foi mandado pelo Vaticano
em visita a Moçambique; viu os
quatro padres
e o Gover
nador
Geral . Recebeu uma carta • de 40 padres e freiras,
na maior parte de Burgos e Combonianos, acentua.ndo
'
Rhoà6sia Herald,
16/1/73; Ram d Dai y
Mal ,
24/1/73.
s Ver atrás. O jornalista BrUce Loudon relatou de Vsboa
que o governo 'bem a uma renovaçã O de
toda
a h:l.stória do massacre,
-se
o julgamento
se
realizasse
DaUy
Telegraph, ·17 11/73";-
Financial
TW..es 20/11/73).
ó
Agence
France Presse,
11/2/73;
Le·Monde
27/5/73.
* Ve r Apêndice V.
39
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 20/36
t
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r; ct./e.
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· c
- . i } '
.
n
0
f \v - , _
l
\ :.-l
v
de novo a posição ambígua da
Igreja
em relação às atro
cidades e pedindo orientação na situação de guerra:
«Não temos o direito de abandonar os milhares de
cristãos simpatizantes que, nesta luta, ajudam os vários
movimentos que
tentam
Ub,ertar-se de uma situação ana
crónica ..
não
podemos permanecer indiferentes face
às
aspiraçõe s presentes deste povo ... » '
O P.' Costa continuou a
reunir
informações: em
Fevereiro, um homem abatido a
tiro
em lnhaticoma; em
Março, uma
mulher grávida morta,
que ele enterrou pes
soalmente, em lnhantondo. Em 16 de Março, um velho
espancado até à
morte
em António; em 18 de Março,
outros dois aldeãos abatidos a tiro; em 2Ô de Março, um
homem de António torturado até à morte e um casal
O P.'
cumbura • acresce ltou o
e destruição :
até à morte e queimado'·
padre
de Burgos de Mu
,óróprio testemunho das ma-
não conseguiam
encontrar
rtinguém,
abatiam
o gado e
cabras
a
tiro,
de helicópteros,
para
privar
de comida a população desta
área
já necessi
tada. COntei mais de 200 cabeças de gado mortas e cerca de
50
cabras.
Fui
também a uma aldeia onde eles
tinham
morto
dois velhos e
abatido
todo ti; gado no curral. Vi uma
mulher cujas mãos foram esmagadas pelos torcionários
portugueses. Mas, segundo
um
inquérito oficial português,
estas coisas não aconteceram.»
10
Pouco tempo -depois, o Cor. Craveiro Lopes informou
o P.' Enrique de que o Alto Comando Militar tinha emi
tido uma
ordem que proibia o pessoal missionário de
entrar em certas áreas enquanto estivessem a decorrer
operações militares; para sair, deveria pedir-se autori-
40
1 Ver .Apêndice
v
8
Costa Mais de
u
An o ...
Ver Capitulo Três.
10
Ttnws 12 7 73.
i
t:: , . , p . h
~ c , ~ J I
'
d
L c S : ~ O .
..i
I
zação ao exército, que 4ecidiria
se
isso era ou não «con
veniente>>. A missã o de Mucumbura foi, mais tarde, encer
rada e o P.• Enrique expulso de Moçambique, em Julho
de 1972 "·
Em kbril, o P.' Costa foi convocado pela polícia e
deram-lhe a escolher
entre
ir
para
a
prisão ou abandonar
o país. Em consulta com os padres seus colegas e com o
bispo
de
Nampula, concordou-se em que ele deixasse
Moçambique e utilizasse a oportunidade para dar publi
cidade
ao
que tinha vindo a acontecer; sendo português,
estava numa posição mais forte para o fazer que os
outros. Em Maio de 1972, o P.' Costa completou o seu
relatório, que cobria os doze meses anteriores, e partiu
para a Europa, onde passou um ano a
contar
às pessoas
o que
estava
a acontecer aos africanos
em
Tete
12
•
Salientou sempre que os incidentes incluídos no
seu relatório
eram
apenas os que ele
ou
os seus colegas
tinham podido verificar, de uma
ou
de outra forma.
Acentuou também que todas as pessoas
mortas eram
civis inocentes. Só
tinha encontrado um cadáver
de um
guerrilheiro. Este jazia num campo e o crânio esmagado
tinha sido enchido com terra na qual se tinha plantado
um ramo de uma árvore. Um bilhete em cima do cadáver
dizia: «0 resultado da vossa emboscada: um morto e uma
arma.
Isto
não é uma brincadeira de merda, isto foi feito
pelos comandos; Temos muito
prazer
em que tenteis
outra investida contra nós.» "
Numa
entrevista, ele afirmou que a maioria
das
atro
cidades eram cometidas não por
tropas
regulares por
tuguesas, mas rpelos «grupos especiais paraquedistas»,
as unidades de comandos africanos especialmente treina-
r
das, comandadas por brancos. o seu treinamento, sus
.
~ tentou ele, incluía filmes de horror para embrutecer.
:1 1., osta, .Ma.is
de
wm Ano ..
sunday Times
15/7 73; BBO 25/7 73.
Der Spiegel 21/8/73.
41
/ ' ~
t :::7
f
. I
~ 111l 11 tU·
· ·
J_ í1
.L f.rJr.J.1._'l.'i'JK.J: . L:I..
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 21/36
\
Parentes de comandos VInham contado a missionários
que, quando voltavam à vida civil, muitos estavam men
talmente transtornados. «Como se sob coacção;
um
deles
começou a
matar
um frango da forma mais sádica e
outro, sempre que ouvia o som de um veiculo militar,
atirava-se
para
o chão e fingia
disparar
uma metra
lhadora.»
14
O
P.'
Costa também apresentou relatórios ao Con
selho' Mundial das Igrejas e
à
Comissão dos Direitos
Humanos da ONU, escreveu ao Papa e apelou
para
orga
nizações internacionais a favor dos padres que
estavam
na prisão da Machava. Em Fevereiro de 1973, foi subi
tamente nomeado para uma aldeia
remota
no Perú ·
14
I b ~ d .
Outras :entrevistas
foram transcritas em Th e Guar dian,
5j8j72; Jeune Afrique
9j9j72;
Le
Mande 3/11/72.
Sunday
Timê8,
15/7/73;
BBO 25}7j73; Diário de Notl·
oia.s 2/9/73.
42
I
JI
:<.
i
5
CHAWOLA WIRIYAMU E ]UWAU
As matanças de Mucumbura, documentadas e divul
gadas
como foram.
não atrairam
muita atenção do mundo
exterior. Talvez não tivessem sido
mortas
pessoas sufi
cientes para tornar os acontecimentos merecedores de
noticia.
1li
possivel que os que Ihes prestatam atenção
os considerassem como fenómenos isolados, mais uma
aberração
do
que a consequência predizivel de uma política
de reprimir pela
força
militar um movimento
popular
para
a independência política. Seriam necessárias mais e piores
atrocidades pa:ra alertar o
resto
do mundo para a
sua
situação e sofrimentos.
segunda metade de 1972 assistiu a uma intensifi
cação
da
actividade
da guerrilha em
Tete.
Em
Julho, a
Frelimo anunciou o inicio de operações no distrito a sul
de
Tete'.
Entre Agosto e Novembro, reivindicaram ter
abatido quatz<o aviões e um helicóptero, ter afundado
seis barcos no Zambeze e ter
destruído
trinta e seis
veículos'. Só em Novembro, segundo noticias da imprensa
da Africa do Sul, Rodésia e Grã-Bretanha, a Fre imo
dinamitou o caminho de ferro Beira-Tete
em
vinte sítios,
entre
Moatize e Caldas Xavier, e
atacou
o aeroporto de
Tete e a própria cidade com foguetões de morteiro '·
Frelimo confirmou isto, reivindicando que um hangar e
1
Antigamente um distrito Manica e Sofala; agora 1 de
Janeiro
de 1 9 7 4 ~ J
dividido
em
dois, Vila.
Bery
e Beira. Comunicado
da Frelimo 20/72, 27/10/72.
'
Comunicado
da Frellmo 24j72, 27/12/72.
' The
Gua1'dian,
16/11}72; Rand
D >il>y
Mail 16/11/72; Rho·
de ia Herald
17/11/72;
D<>ily Telegraph
27/11/72; Star
25/11/72.
43
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 22/36
17 aviões foram destruídos e a
pista
muito danificada,
enquanto,
na
cidade, projécteis
atingiram
uma série de
instalações militares e
administrativas
4
• Os
portugueses
negaram os ataques'·
Em
Outubro, o exército anunciou
que os comboios diários escoltados através de Tete pela
estrada Rodésia-Malawi
seriam
limitados a duas vezes
por semana
6
•
Havia sinais de que estes novos acontecimentos está
varo a provocar inquietação
junto
dos governos sul
-africano e rodesiano.
Em
·Outubro,
Ian
Smith, Primeiro-
-Ministro da Rodésia; visitou Lisboa e houve considérável
especulação sobre que o principal
assunto
discutido era
a deterioração
da
situação
em
Tete '.
Pouco depois,
numá
clara
referência
às
inquietações rodesianas e sul-africa
nas, o Dr. Marcelo ·Caetano acentuou que Portugal estava
com o completo controle
da
situação.
Numa transmissão
televisiva nacional, referiu-se a «Vários vizinhos com
menos experiência (que) não esc:ondem as suas inquie
tações e fazem, assim, o jogo do
inimigo>>.
Disse que
tinha
sido firmemente explicado «mais de uma vez» que
~
não havia
razão para
receios sobre Moçambique '·
Em
princípios de Dezembro, o General Arriaga voou
para Lisboa, aparentemente para dar ao
Dr. Caetano um
,relato actualizado do avanço
da
guerra.
Numa
conferência
'
t -1' de imprensa de duas horas, ele afirmou que a
situação
t
~ . não e ratão séria como alguns.jorn.ai.s s u l ~ f r i c n o s ti.nham
suposto.
As suas
forças' tinham a situação
bem
sob con
trole, disse ele, e tentativas
da
Frelimo
para
se infiltrar
L :, no istmo
estavam
a ser contrariadas, embora persegui-
'><.. -los levasse algum tempo «porque eles se
vestiam
como
civis e
enterravam
as
armas»'·
Noticiou-se- que vol-
44
• Comunicado da Frelimo 23f72,
20fllf72.
' Star, 25fllf72;
Rhoàosía
Herald, 23/11/72.
• Capo TimBB 31f10f72.
' Dat y
Telegraph,
27/11/72.
Rhdàesla
Heralà,
16/11/72;
Star,
18/11/72.
•
Rhaàesia
Heralà; 7/12f72:
taria a MOÇambique por volta de 21 de
Dezembm para
\ _
passar o
Natal
com
as suas
tropas '
C Efectivamente, ele e a sua
mulher
e o Governador-
1
·
;
S -Geral e a
mulher
passaram o Natal e o Ano Novo em \ _j
Tete ,
altura durante
a
qual
visitou
várias
guarnições.
Que ele,
por
conseguinte, se
eucontrava
em
Tete
pouco
'\:
depois da altura
em
que se afirma que o
massacre
de
«Wiriyamu» teve lugar (16 de Dezembro de 1972), não é.?
pai'ece t r sido mencionado por Arrmga em
qualquer
· ~
~
das suas declarações posteriores sobre o assunto, nem
foi mencionado o facto de que a sua
visita
coincidiu com
uma
importante
ofensiva
portuguesa na área, entre
De
zembro e Janeiro. Mais tarde, limitou-se a admitir que
tiveram
lugar «operações .de combate»
12
•
Na
altura,
contudo; houve menos esforço para ocul
tar a ofensiva. A rádio
de.
Lourenço Marques disse que
o General
Arriaga tinha
prolongado a
sua visita
a Tete
para
ver com os próprios olhos o.
progresso
realizado
pelas operações aéreas e terrestres combinadas que en
volviam a infanta-ria e
as
unidades especiais de comandos
e paraquedistas
12
• O comunicado n.' 16/17 das
Forças
Armadas de MOÇambique dava mais informações:
«1. A
área
de Mucumbura, Magoé (Mague), Daque
e
Matapa
foi identificada como área de actividade
ter
rorista.
Tropas operacionais, incluindo unidades de caça
dores, comandos, grupos especiais
paraquedistas
e grupos
de pistoleiros de combate, apoiados pela aviação, desen
cadearam operações
na área.
As operações
deram
os
seguintes resultados: 51 terroristas mortos, 26
bases
des
truídas, 19 outras instalações destruídas, 16 armas sub
traídas
ao controle inimigo.
2. As intenções dos terroristas· de se aproximaTem
Ibid-, 19-20/12/72; Star,
23/12/72.
Rhoàesla .Herala, 3/1/73; Star,. 6/1/73.
1
2 he hnes
14/7/73
BBC,
11/1/73.
45
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 23/36
t
4
/ Jl
.
) ?_
'
'.'. ··· .... · · · . ' f 1 . ~ i t \9i
··.·.a•
J' 'd. } l ~ t ~ fo_:am d ~ t e c t a d a s . Como resultado, o
i \ 1 , ~ pgmand,o de Operaçoes da Zona
de
Tete desencadeo,u
~ Q P Í ~ I J . ç õ e s específicas em tempo oportuno, empregando
1 - gÜmas
·das suas tropas normais e unidades de coman
dos».· Foram mortos na acção noventa e
três
terroristas.
'
i
j
I
'
l
3. Em todas estas operações, os Portugueses sofre
ram apenas 6 feridos graves.»
A imprensa e rádio sul-africana e rodesiana deram
considerável relevância ao
comuDJicado.
Continuaram a
aparecer notícias sobre esta ofensiva até cerca do fim de
Janeiro:
ele incluía a destruição de um acampamento
da
Frelimo na área de Mucumbura e um total final de mais
de 200 guerrilheiros mortos
15
• Embora uma boa parte
da
operação pareça ter tido
.lugar
nas proximidades de Mu
cumbura, a ofensiva parece ter coberto a mwior parte de
Tete a
sul
do Zambeze, incluindo a área em torno da
cidade de Tete. Uma operação específica teve
lugar
(com
fim em 20 de Dezembro) na zona de Changara
16
• «Wi
riyamu» foi descrita mais tarde como
uma
«povoação
vizinha» da sede da missão de Changara pelo
seu
padre,
P.• Berenguer
.
Vários jornais noticiaram o avanço da ofensiva por
tuguesa. Em 16
de
Dezembro, o Star de Joanesburgo
disse que houve:
«Um ataque, apoiado pela aviação, dos comandos
portugueses a um acampamento rebelde
na
área de Tete ..
que foi
assaltado
e destruído
por
comandos transportados
em helicópteros armados e protegidos
por
aviões.
Foram
mortos oito guerrilheiros e captürados algumas muni
ç·ões.» s
"
Provmci<l.
ele
Angola., 8/1/73.
" Rcmà Dai y Mail, 8f1f73; Rhoàesia. Heralà, 11-12(1/73;
Oape Times, 11-12/1/73; BBO.
15/1/73; 9/2/73; Dai y
Te egraph,
10/1/73.
46
" BBO, 29/12/72; Dai y Te egraph, 23/1/73.
Finwncicü
Times
16/7
73.
a
Star
23/12/72.
I
: ~ 1
iii
- ~ .
: ~ 1
ft
l
ii
J,l
\
Bruce Loudon, correspondente em Lisboa do Daily.
Telegraph, .descreveu a ofensiva como tendo começado
«em grande segredo, no <início do ano, com ataques
aéro-transportados
de comandos e forças dos GEPs, uma
força de intervenção especial negra que actua como
ponta
de lança em muitos ataques contra a Frelimo.»
Localizando
as
áreas envolvidas como Mucumbura,
Mague, Daque,
Matapa
e Changara, ele dizia que foi «a
maior operação desencadeada em Moçambique desde
há
muitos meses» e considerada como «um avanço im
portantíssimo na
luta para proteger
Cabora Bassa contra
ataques terroristas.>>
Foi este o contexto em que os
Padres
de Burgos
winda a trabalhar na área (tendo a missão de Mucumbura
' f
sido encerrada e os padres presos ou expulsos) ouviram
1 a população local falar de um ataque do exército, numa
' escala invulgarmente grande, a algumas povoações afri-
·
/ {canas e do massacre de várias centenas dos seus habi-
.:{
tantes.
A partir do que lhes contaram, depressa reuniram
ij
~ um dossier sobre o incidente. A
primeira
parte l -
«Ü
Massacre no Regulado do Chefe
Gandali»-
foi com
V pletada
três
dias depois do acontecimento ( 19 de Dezem
~ , bro de 1972) e pormenorizava o massacre na aldeia de
_;':1
Chawola. A segunda parte, «Mais sobre o Massacre de
Wiriyamu e Juwau>>, cobria as duas povoações nomeadas
e está
datado de
6 de
Janeiro
de 1973
20
•
L
O primeiro relatório afirma que,
por volta
das 2 da
:
tarde, no sábado, 16 de Dezembro, aviões a
jacto
bom-
V
1/;-,1?-··J,., .
19
aily
Telegraph
10 22/1/73.
f) ,(tr
.
} v ' ~ - . . ~ '
20
Ver Apêndi'ce VI. r,;,,.
•
*
O
texto
de
ambas
as
partes está
reproduzido
no
Apên
dice V . A notícia do Times
de
10 7 73 que
d e s e n c ~ e o u
a
~ n d e
ntrovérsza o , aseava se ·apenas na . Q J ; a parte. /
A
t e
ãüge.stao. de q ü é " " ã ' _ P ~ e s t ; ; v e .
1 e n v o l r v i ~ ~ ;
povoação, Wir.lyamu, e. de que todas as quatrocentas e t·al ví-timas
provinham de lá causou
alguma
confusão. Fez
também
que todo o
acontecimento, um tanto ·enganadoramente, viesse a ser conh,ecido
47
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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i ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~ · · · · · · · ~ ~ · · · · · · · ·
;
.
tecido através
das
árvores e
tinham
fugido o mais de
pressa
que puderam para o mato.
Ao longo
das
bordas
da estrada para
Tete havia
muitas
palhotas
quehnadas
e, quando o
autocarro
chegou
à cidade, já lá
estavam
mais refugiados.
<<Havia muita
agitação, com
toda
a
gente
a pergun
tar a todos os
outros
por parentes ou amigos desapare
cidos. Muita gente
estava
a chorar.» "
Pelas reacções
da
população,
era
manifesto que
as
matanças tinham
sido
numa
escala
maior
do que em
qualquer
outra
altura anterior. Suplicaram aos
padres
que fizessem qualquer coisa
para
deter
a carnificina;
muitas pessoas
estavam
convencidas de
que
a operação
estava
a prosseguir e que
em
breve
os
atingiria.
Os padres dos vários postos missionários
da
área
consultaram-se,
por
conseguinte,
uns
aos outros,
falaram
com os sobreviventes e compilaram um relatório
tão
com
pleto
quanto
possível, omitindo
tudo
o não confiTmado.
O
P.'
Berenguer
sustentou
que
fázer
pouco caso
do
teste
munho dos aldeãos
apenas
porque eles
eram
africanos,
equivalia a «racismo psicológico>> e acrescentou que,
entre
os sobreviventes ouvidos,
tinha
havido crianças, lnocentes
da
política. Disse ele:
«Todos os
africanos
que
interrogámos
coincidiam
nos nomes que nos davam, mesmo
se
o
seu
testemunho
foi recolhido por
padres
diferentes e
em
alturas diferen
tes.
Falavam sem nenhum
conhecimento de que estáva
mos a fazer listas.»
.11
''
(íl
@
i1
•
: , ~
,,,,,,,
,,,,
· · · · · ·
·.. ) é J : u ~ ~ t . : : s
,
Uma
descrição ocular dos acontecimetnos
foi,
mais
''· ·
jarde, feita
a
um jornallsta b r i t â n i ~ o por um dos.
sobre
/viventes, António:
«Reuniram-nos todos no centro
da
aldeia.
Reconl:l.eci
um
deles,
um
africano, que todos sabíamos ser
um
infor
mador
do exército. Quando
estávamos
todos agrupados
no meio
da
povoaçã:o, eles disseram-nos
para
baterroos
as
palmas e, então, ll briram fogo. Muitos de nós caíram.
Eu
fui atingido
por
uma
bala
no ombro
pelas costas.
Eles
amontoavam
erva em
cima
dos
que
tinham
caído;
eu
estava
entre
.eles. Incendiaram
a erva e foi entã.o que
eu
consegul
fugir
parà
o mato.
O meu amigo ]\{anue
(também
mencionado no rela
tório
dos padres como
tendo cerca
de 15 anos) conseguiu
também
escapar. Vi..o
ir ajudar um rapaz
que tinha sido
atingido e que
estava
a
gritar por um
gole de água. Deu-
,. -lhe alguma e, depois, fugiu. Vi um soldado
chegar junto
,,. do
rapaz
fer-ido e
disparar
outra
vez
sobre
ele.
Fugi
então.»
22
/
António foi, mais
tarde,
tratado
pelas
irmãs do
hos- .
V
-
..
~ . ~
Os padres
mandaram
cópias do
seu
relatório às •
:;·
~ : . , . )
r'n
pita de Tete.
l
autoridades
Civis
e
militares
portug uesas, ao Vaticano, . ~ /
ao Núncio
Papal
em Lisboa, à sede da sua missão, em
"v\
\
;:...._ J
\ .
Madrid, e a todos os bispos de
Moçambique .
O seu ,.,y
bispo de Tete, Mons.
Augusto
César
da
Silva,
estava
• t '
ausente em Que imane, mas, quando regressou, apresen-
tou
um
firme protesto .ao governador sobre
as
matan-
'·ii ... _.-·
'
1
<:
decla:mção do
P.e B e r e n g u e ~
foi d ~ d a a público em . ,-
: ças
24
•
Este
prometeu aos missionários
que
se investiga
'' · riam as suas alegações, mas a
única
demonstração disto •
foi
um grupo
médicô-sanitário
que
voou sobre a área
ulho de 1973, depois de rebentar a tempestade, pelo Director-Geral
do Instituto -Espanhol
das
Missões, em Madrid os Padres de
o i
tmnscrtta em
Financia
Times
13-16/7
73;
Time8,
.
14·16·18/7/73; 6/8/73;
Guarài<>n,
16/7/73.;
Daily Telegra.p_h,
16/7/73; ,
Le Monde . 17/7/73; e The Univer.se. 10/8/73. O P. Ber enguer
fOl
apoiado pelo·s P. ' Julio Moure, Mtguel Buendia,
Jose
Lenchudi e {
Albert Font, os quais tinham também ·regressado a Espanha, ~ \ t ;
no p r i n c l p ~ o de 1978, depois dé vários
anos
de -serviço em
T e t e . ~
50
~ ~ : \ i
> t
;-
c;
(.;::) i ···
'
~ : ~ . . _
,· . .J
,_. . , ~
Í ' '
;
'{'-.:
'
....
-SI
-\
22
Bwnday
Times 5/8/73;
Times
6/8/73: Ver também o Capíw
tulo Seis.
21
TimF;S, 6 7 / ~ / 7 3 i
Tf ,e
UnWer:Je,.
10/8/73.
4
Foi
nomeado para Tete, em Maio
de
1972, quando Mona.
Ribeiro foi transferido para o episcopado de Gaza,
no
aul
de
Mo
çambique.
51
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 26/36
de Chawola, Wiriyamu e Juwau, na
primeira
semana de
Janeiro. A Irmã Lúcia, uma fréira espanhola do grupo,
disse aos padres que
tinha
visto cadáveres ainda espa
lhados . Uma fonte não identificada relatou que o
bispo d·isse ao comandante
do
exército local que, se ·os
corpos não fossem enterrados pelo exército, então ele,
o bispo, teria que o fazer ele próprio ".
Os
militares
concordaram finalmente, mas, como os
"\
cadáveres estavam
já
em adi mtado estado de decompo- J
sição, os soldados terminaram a
tarefa
o
mais
depressa
iZ
'file puderam
e
por isso, os túmulos eram muito pouco j
FJrofundos
".
f Por outros relatórios, parece· claro que os massacres
feram
do conhecimento geral em Tete, mas, como toda a
{
área estava ·sob ju:l'isdição militar, havia pouco que quem
quer que fosse pudesse fazer no próprio local para o con
firmar ou o
divulgar
.,
O · bispo, depois de apresentar os seus protestos,
) ~
recusou-se a manifestar-se publicamente, com receio de
que as suas palavras fossem usadas para fins .políticos ".
* Isto suglere que
·
bÚ3po não coil.s:t: gulu fazer com que as
autoridades
investigassem
tis matanças. Só al-eg:a.n.do que os cadá
veres
eram
um
perigo
sanitário se
pôde
provocar qualquer reac
ção oficlaJ..
25
O
P:· Miguel Buendia
afirmou
que'<>
bispo_
protestou
tanto
para o governador como parti o. iQvenl.o de Li.$boa Financial
Times 13 7 73).
tb. Datzy TfJlegraph 12/7/73; Observer 15/7/73; Times
23/7/73.
27
Tinnes
18/'1/73; Qu.a.rái( l)t.,
21/7/73 Uma fonte
.inesperada
foi
a
Sr.m
~ b e l
~ m e r
a.dvogOOa_
portug.tle,sa_ residente na. Grã-
-Bvetanha.
Em
Dezembro,
um m é d i c ~
.
& r t ~ u ê ~
&eu conhecid-o
tinha atervado
em
Tete, <iepo:s
de
o
avião
em que ::·e enrontrava
ter
tido
unia
avaria
mecânica. Ali,
ele
falOu
com três
crl.ancinha.s
que
se dizia
sererq
os úpicos s o b r e v i v e n t e ~ de uma
alde:a lúeal.
ViSiitou a
aldeia
oPde
elas
_Be
Unham refugiado e contaram-lhe
o ma.osacre (.l lvenmg stam< a.ro., 12/7/73).
;
i
t l
ij
i
;i
,1
s
NotíCia·
da
carta
·de·
Mons.
Silva ao
NúnciD
Papal em
Lisboa, em Sundt y Timos 5j8j73.l
52 I.Y . { } . ; ~ ;l
_M A Conferênc ia Episcopal de . Moçambique, contudo, reu-
• \ - nindo-se a 31 de Março de. 1973, escreveu ao GovÇ>rnador-
\ -Geral sobr" o massacre. A Conferência permitiu a publi
cação de ex.tra.ctos da carta:
«Tendo .ouvido detalhes, que estão. a ser difundidos,
dos acontecimentos que tiveram
lugar nas
regiões do
Régulo Gandali, não longe
da
cidade de Tete, durante o
último mês de Dezembro, acontecimentos de acordo com
os quais centenas de pessoas, algumas delas absoluta
mente inocentes, podem
ter
perdido a vida, pela acção
das forças armadas, inda:gámo.s do Bispo de Tete o que
há de verdade com relação aos factos e circunstâncias
que os rodearam.
Soubemos que (ele) tinha tentado o])ter das autori
dades do distrito, bem como de Vossa Excelência, infor
mações cuidadosas sobre a verl cidade dos factps, para
evitar, em ocasiões futuras, o que possa contradizer as
normas
da
moralidade e da
justiça
em operações mili
tares. Devido à natureza desses acontecimentos, repreen
sível a todos os níveis e cada vez mais difundida, com
repercussões nocivas no nosso meio, unimos as nossas
vozes à do Bispo de Tete.
Em
vista
de ocorrências
desta
natureza, quando per
pretadas pelas forças armadas ou
por
elementos da Fre-
limo, ou, na verdade, por quaisquer outros, não podemos
senão exprimir a nossa mais violenta indignação e pro
testo, visto que um comportamento desses está em com
pleta contradição com as leis mais elementares de sã
moralidade e contradiz o espírito e o sentido
das
leis
que nos governam. Esperamos, por conseguinte, que, pela ·
divulgação da verdade e a atribwição
das
responsabili
dades, haja um aumento de confiança na
administração
pública e a ·criação de um clima de segurança para o
povo das
áreas
afectadas, que se encontra geralmente
entre dois fogos e, portanto, sujeito a constante sofri
mento»
29
•
29
T i m e s ~ 20f9f13
53
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 27/36
· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·
I
O Governador-Geral respondeu nos seguintes termos:
«Sobre o incidente de Gandali, como Vossa Exce
lência Reverendíssima sem dúv·ida sabe, as ordens do
governo central, do governo geral e do comando superior
das forças armadas sã.o absolutamente rigorosas, no sen
tido de evitar o mais possível mortos e feridos, bem como
sofrimentos ou prejuízos para a população. Infelizmente,
nas áreas onde os terroristas estão espalhados entre ela
ou ·beneficiam do seu apoio voluntário ou forçado, podem
acontecer incidentes, que são, não obstante, objecto per
manente de investigação e aplicação de medidas ade
quadas pelas autoridades militares.
Com referência ao caso em questão, está a ser con
duzido um inquérito
por um
Inspector de Justiça da
região militar de Moçambique, cujo resultado eu comu
nicarei a Vossa Excelência Reverendíssima» ·
Parecia
que as coisas fi<lariam por aqui. Não havia
mais nada que quem quer que fosse pudesse fazer em Tete.
•a Times
20
9 73.
54
I
j;
@
r
i i i i i i i i i i · · · · · · · \ \ \ \ \ \ \ \ ~ ~ ·
6
REBENTA
A
TEMPESTADE
Seis meses depois do massacre, o
P.'
Adrian
Has
tings, um padre católico britânico, visitou a Espanha
para um encontro ecuménico. Historiador com especial
interesse pela África, encontrou-se com alguns padres. de
Burgos e soube deles o que tinha
acontecido e da exis
tência do relatório, uma cópia do qual
tinha
sido trazida
de Moçambique. Enviou, mais
tarde, parte
dele, que cons
tituiu a base de uma reportagem jornalística publicada> em
The Times em 10 de
Julho de
1973
' -publicada
porque,
como o director explicou, dava confirmação às alegações
de brutalidade portuguesa
por parte
da Frelimo ', em que
não se
podia
confiar, porque «Sentíamos que a Frelimo
tinha
um motivo tão óbvio
para
fazer acusações dessas. s
missionários nã o
têm
esse motivo ..
0
relatórto) é a
exposição colectiva de um grupo dE ,, religiosos, qualquer
um dos quais podia destrui-lo se
não
fosse verdadeiro e
vários dos quais são colocados em risco pessoal pela sua
publicaçãO»
'.
A publicação do relatório em Londres • provocou
uma tempestade de areia internacional que andou em
torno das cabeças do P.'
Hastings, do
governo
português
e de vários correspondentes de imprensa. O P.• Hastings.
Ver
Capítulo Cinco.
2
Ver Capitulo
Um
notas 7 e 8.
Times 13/7773.
* Que :se deu fortuitamente :em vésperas
da
celebraçã-o do
600.
0
aniversário
da Aliança Anglo-Portuguesa e da visita do
primeiro-ministro português Dr. Ga-etano
à
Grã-Bretanha.
55
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 28/36
fez, noutro local, um relato do caso *: quanto ao resto,
as tentativas (que ocuparam
os
jornais durante várias
semanas) de
provar ou refutar,
clarificar
ou
confundir
o que tinha acontecido
em
Wiriyamu,
Juwau
e Chawola
_ f foram algo como uma tentativa de desviar a conversa.
; ~
As
tácticas portuguesas
foram, primeiro,
negar
tudo,
..) depois,
«refutar» as
alegações e, finalmente,
admitir
ape-
(
nas um
incidente. A imprensa,
voluntária
ou
involutaria-
~
1
ente, auxiliou
estas
tentativas ao procurar «provas».
1
Quando
não
conseguiram encontrar muit s procurando,
i i
I
i
l
como estavam, seis meses depois do acontecimento, em
território completamente desconhecido, com o exército
português
a
guiá- los-
a conclusão foi que
as
alegações
«não
estavam
demonstradas>>, quase como se o
relatório
dos
padres
não tivesse
sido
escrito. A confusão e a incoe
rênci quase todas
ocorrendo
mais
tarde e
nenhuma
emanada do relatório original dos p dres foram toma
das como lançando dúvidas sobre
toda
a «história» do
massacre.
l
'
A
reacção
portuguesa
inicial começou
este
processo.
A edição de 10 de Julho do
The
Times foi retirada
da
venda
Portugal.
A
Secretaria da
Informação
atacou
o jornal, o P.• Hastings e o
suposto
autor
do
relatório,
«um missionário que saiu.
da província
depois de
provas
de cump1icidade com a Frelilllo>>. Verificações junto dos
comandantes
militares e policiais
em
Tete e
noutros sitias
não
tinham
revelado nenhum incidente semelhante e o
lugar onde se dizia ter tido
lugar
o massacre, Wiriyamu,
não pôde ser
encontrado em
nenhum mapa . As povoa
ções
africanas
não estão,
naturalmente,
necessariamente
assinaladas
em mapas
oficiais;
em qualquer
caso, o
P.• Berenguer não tardou a ser ouvido,
afirmando
que a
povoação
estava certamente assinalada
no
mapa
dioce-
*
Wiriyamu
pubicado ·em Janeiro de 1974 pela Search Pr-ess.
Tradução portuguesa:
Ed
Afrontamento, Outubro.de 1974.
• .Times,
11-12/7/73; Gum'IZU.n,.
11/7/73;
DaUy
Telegraph
12/7/73.
56.
;;
-
L A I . b t ~
_
j--t.U--
r- ~ ~ t . . . . v ~
sano, em Tete, e localizando-a precisamente· a· cerca de
25-30 .kms.
de
Tete,
ao largo da
estrada
Tete-Changara
(ver cap. 5 e mapa) .
Mais
tarde,
a
Secretaria
da
Informação
anunciou
que
estava «já em
curso»
um
inquérito . Isto foi negado. no
•próprio local, por um jornalista que
tinha
entrevistado
o
governador
de Tete, Cor. Armindo Videira e tinha sido
informado
de
que não tinha
sido pedido nem empreen
dido
nenhum inquérito .
Neste momento, o Primeiro-Ministro
português,
Dr.
Caetano, chegou a Londres, na sua
visita
oficial.
Numa
i onferência de
imprensa,
ele disse que um inquérito tinha IA
mostrado
que «os
massacres não
tinham
tido
lugar como ~ : . \
se tinha
alegado>>.
O Governador-Geral tinha
sido
res- I
ponsável pelo inquérito e um inquérito
da
ONU não
era
1
. aceitável para
Portugal,
já que a sua composição seria
predisposta contra Portugal .
Esta
versão oficial foi
\é--
v
depois
confirmada
pelo Gen.
Arriaga. Tinham
chegado
\ j \ aos seus ouvidos
rumores de comportamento
irregular na
"J{
área sul de
Tete, nos
fins de
1972, disse ele.
Foram
ime-
,
" diatamente investigados - «talvez
em Janeiro»
- e as
'
·· < alegações.
não
se tinham provado. Os
resultados
da inves-
/J '. - - ~ l -
tigação
não
seriam
<<Obviamente>> publicados, mas
ela
1 • •
não
tinha revelado nada fora do normal
'
•.
Desejando talvez demonstrar que não tinham nada a
esconder, as autoridades portuguesas permitiram que jor
nalistas entrassem
em
Tete
para
verem
com os
próprios
olhos.
(Vários
voluntários, entre os
quais
o correspon-
dente
do
Times viram,
não
obstante, os seus
vistos
recu-.
'
Times
16/7/73;
Guamian
16/7/73; Daily
Telegraph
16/7/73.
• Guardi<l n,
13/7
73.
' Ibld-, 16/7/73.
Times
19j7j73;
G u a ~ d l a 4 1 . , 19/7/73.
9
Times
30j7f73
* O Gen. Arriaga. não disSle que ele p r ó p r i o ~ tinha estado
em/
ete
-exactamente nessa altura ver üapítulo Oinco
k
/
57
lJ__ ,.liJJ_..J. UKLliL", : l \ 1 \ : : J ~ ~ ~ ~ ~ ~ ~
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 29/36
'
sados,
foram
expulsos ou estorvados de outras formas
na sua tarefa)
10
• Viajavam sob a protecção do exército
e forneciam-lhes intérpretes oficiais. Apesar disso, pa
rece terem acreditado que a sua mrssão foi uma inves
tigação
independente: o P.• Hastings não foi o único a
salientar
que dificilmente seria provável que o povo de
Tete falasse livremente a entrevistadores deste
tipo
11
•
A primeira diligência dos jornalistas foi localizar e
visitar
o
teatro
do
crime.
No
decorrer disto,
foram
leva
dos a uma série de povoações desertas, nenhuma das
quais parece ter sido Wiriyamu,
Juwau
e Chawola.
O primeiro a
chegar
foi Bruce Loudon, correspon
dente do Daily Telegraph em Lisboa, que visita frequen
temente
as
colónias e não é hostil à politica de Portugal.
Foi primeiro à aldeia de Mariano, várias centenas de
milhas a oeste de Tete e Wiriyamu, pela razão de
um porta-voz da Frelimo ter
situado
a povoação na
quela área, não longe de Mucumbura. Não surpreende
que não tenha encontrado vestigios de massacres .
De
volta
à
cid·ade de Tete, oficiais superiores por
tugueses, entre os qua:is o Major José Carvalho, segundo
--t"comandante do 17.• batalhão de caçadores estacionado
I
em Tete, de quem se dizia que conhecia bem a zona, sus
tentaram que
nunca
tinham ouvido falar em Wiriyamu ·
No entanto, no sábado, 14 de Julho, apresentaram o sol-
' dado Tomás Cangorongondo, descrito por um correspon
dente como «Um africano simples de
cuja
palavra não
duvido>> que afirmou
saber
de
uma
povoação chamada
Wiliamo
14
• O soldado Cangorongondo disse que tinha
·estado
presente
quando os
habitantes desta
aldeia
tinham
sido ·transferidos para um aldeamento, cerca de quatro
'
Ra>n t
Daiily
Ma4l, 23/7/73;
Times 24/7/73; Guardian,
27j7j73; unday Times,
5j8j73.
Time:s,
16/7/73.
58
Daily Tolegraph, 13/7/73.
"
wnday Mail, 15/7/73; Gua.TttW.., 16/7/73; B·tar, 21/7/73.
Btar, i i d ~
meses antes (quer dizer, em Março). Levou, seis jorna
listas * a esta povoação abandonada e
destruida
pelo
fogo, acompanhados .pelo Major Carvalho e ;por um pelo
tão de soldados armados
até
aos dentes ·
«Wi iamo» e «Wiriyamu» são manifestamente versões
diferentes do mesmo nome africano. É duvidoso se os
jornalistas foram de facto levados à aldeia. Na melhor
das alturas, teria sido difícil verificar exactamente onde
eles
tinham
sido levados.
Numa situação
de guerra, sem
mapas,
era
virtualmente impossivel que os jornalistas
provassem se o lugar identif icado como Wiliamo» ·con-
dizia ou não com o relatório dos
padres
sobre Wiriyamu,
Juwau e Chawola. Os jornalistas não
puderam
senão fazer
conjecturas sobre o sitio onde tinha estado:
Sete milhas a sudeste de Tete ( Telegraph,
16/7
73),
doze milhas a
sul
de Tete Guaxrdiwn,
16/7/73)
, sete milhas
a sudeste de Tete
Guardiwn,
19/7 73), 12 kms. a sul de
Tete
Star,
21/7/73; Sunday
Mail,
15/7/73). Viajaram
de camião pela estrada Tete-Rodésia, durante cerca de
9kms. Star)
e
depois, cortaram a pé pelo mato dentro,
durante «mais de duas horas>> (Telegraph)
ou
uma hora e
meia (Guardian), numa distânica avaliada
em
4 ou 5 kms.
Star)
e menos de 5 kms.
Telegraph).
Embora estivesse
incluido na área entre a estrada Tete-Changara (para
oeste) e o rio Zambeze
(para
leste) , dificilmente era sufi
cientemente longe de Tete
para ser
Wiriyamu, que é pelo
menos a 25 kms. de Tete, segundo o P
.•
Berenguer *, e
há
poucas dúvidas de que os jornalistas nã10 foram,
de
forma
alguma, levados ao local do massacre. Como o P.' Has
tings
salientou, «entre
as
dúzias de povoações queimadas
*
W:ilf
Nussey
Btar
de
Joanesburgo e
fotógrafa; James
McManus (Guardiatn
;
dois correspondentes
da
BBC; e Bruce Loudon.
Star,
21/7 73.
*
Bruce
Loudon in sinuou que a d1fJculdad e em localizar
«Wiriyramu» invalidava o relatório dos pad.res:
«Além disso, fui, com algum risco p.essoal, a pé a uma povoa-
ção abandonada. com um
n.ome
que pode ser .interpretado
de
forma
59
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 30/36
I
I
:]
•
ri
I,
I
i<
:
I
a sul de 'l'ete, não
há
possibilidade de um estrangeiro poder
distinguir
Wiriyamu de qualquer outra»
·
A busca
do
local não provou absolutamente nada.
Mais
importantes
que
os
vãos argumentos sobre a
localização precisa foi a admissão de que o
lugar
men
cionado
no
relatório dos
padres
e>eistia
na
realidade, não
longe de 'l'ete. Isto enfraqueceu a credibilidade dos des
mentidos portugueses
anteriores
e deu alguma consis
tência
ao relatório.
Estavam, contudo, a
ser
obtidas pelos jornalistas
informações adicionais, a maioria das quais pareciam
indicar que os relatórios
eram
verdadeiros. De Madrid;
os Padres de Burgos
tornaram
claro que
tinha
sido
não apenas uma povoação (Wiriyamu, a única mencio
nada até então), mas três,
que
tinham estado
envolvidas.
Na
mesma altura, o correspondente· do Star em Joanes
burgo soube • das alegadas
matanças
em
Juwau
(que ele
escreveu J oao) :
«Contudo, foi nomeada
outra
povoação como alegado
teatro
de
um
massacre
no distrito
moçambicano de Tete.
O nome é J oao e supõe-se que fica
perto da
aldeia de
Wiliamo ...
»
17
•
concebível como bastante seme:lhan te ao Wiriyamu fantasma. Trata
-se de Wi:liamo ..
...
Conrs:iderando
outras coordenadas entre
as
nluitas apresen
tadas, resta o
rio
Ya.rilratawata {mencionado no relatório), i·ndicado
como
perto dre
WJriyamu, _Willamo
ou:seja
o que for. Tenh O a certeza
de
que
este
não pode encontrar...se -na proximidade
~ m e d i a t a
de Tet·e
ou mesmo
na
região.»
(SW11td.a:r J Telegraph
15/7/73 .
1
6 Times 2/8/73.
*
De
«um
português
educado, cujas
credenci·ais parecem
de
ccmftança
e
que
conhece bem
e.
área
de
Tete
embora não
seja
ODigínãrJ.o
de
1á.
Ele
admitiu que
não
tinha
visto provas em p ~ i m e i r a
mão das matanças, mas. dieae que· tinh;:t ali ouVido ponnenores de
tantos africanos que acreditava que havia quàlque·r -co:i:sa nisso.
Dls.se que era. inteiraemnte possível que t1ves·sem ooor.rido mM
sacres e que o facto. tivesse · sido re·scondido
das
autoridades».
Star,
28j1f73)
"
Star;
21-2Sj7
73.
60
~ ~ ~
J
i
2i
J
li
I
l
i
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I
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, , ~
-"
;fi
~ 1 ·
%
• ' _ ;
c;;r
?,
Em
consequência, foi
montada outra
expedição pelo
exército, para procurar «Joao>> e também Chawola (men
cionada pelos
padres
·em Madrid). Desta
vez
eles •
passaram além do «Wiliamo>> inspeccionado antes e por
outras
povoações abandonadas até uma, identificada como
<<Joaa>>: esta
não
estava
queimada •«mas a começar a
desfazer•se. Não· mostrava nem sombras
de
violência ..
só as
quinquilharias e
haveres
abandonados peios aldeãos
quando se mudaram, como afirmam os Portugueses,
para
uma das
novas grandes povoações protegidas .. A
terceira
povoação, Chawola, não pôde ser encontrada. Ninguém
tinha
ouvido
falar
dela>> ·
Até este ponto, a «investigação>> jornalística só tinha
conseguido conf11.ndir todo o caso. Talvez eles compreen
dessem que estavam .a
ser
deliberadamente enganados:
apesar dos seus pedidos, o exército não conseguiu encon
trar nenhuns aldeãos dos
três
sítios. Isto foi acolhido
cepticamente:
«Üs portugueses podiam certamente ter seguido a
pista
de antigos residentes de Wiliamo,
Joao
e Chawola
e tê-los apresentado vivos' e sãos. Mas os portugueses
diziam «não>>. Não tinham conservado registos de quem
foi
para
onde ...
.
E
«ÜS oficiais reagiram hoje rispidamente à insinuição
de· que,
se
o exército os
tinha transferido,
devia
ser
capaz
de
se
lembrar para onde» ' · ·
A
partir
disto, eles podiam
ter tirado
a conclusão
evidente. E, do mesmo modo, a partir do seu fracasso
em
arrancarem alg Uma
coisa a eclesiásticos locais. Todos·
os padres entrevistados
foram
descritos como parecendo
*
Os presentes
incluíam
Nussey,
Michael Knipe Ti?ri es), e
uma
equipa
da
ITN
(Independ•ente
T-elevi.sion New..s), com cerca
de 30
soldados portuguese-s a escoltâ-Ios.
" Star,
ll/8/73.
19
Ibid.
2
Guardian 19/7/73.
61
~ . . l . J
.
. l l l l . l j ~ 1
J J t f f ~
~ · ; 1 1 1 J t J t . l L L ~ ~ ~ ~ \ t
__ L \ t _ J L ~ 1 f l f _ 1 L 1 \ _ 1 ~ - ~ x : _ : ~ t : ~ t _ ~ __
z
'1
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 31/36
•
~ ~ ~ e ~ v ~ ~ ~ : = ·
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 32/36
i
foi informado
por uma freira
«compreensivelmente ner
vosa»,
no
hospital de Tete, de que Wiriyamu era do
conhecimento corrente
tanto
das autoridades como da
igreja de Tete
26
• E, numa entrevista secreta com oois
padres, Wilf Nussey foi informado de que nem eles nem
o Bispo
se atreviam
a manifestar"se, com receio de
pôr
em perigo os seus dois colegas que estavam na prisão.
Contudo,
insistiram
em
que mais
de. 400
africanos tinham
sido mortos em Wiliamo, Joao e Ohawola. Não o tinham
testemunhado pessoalmente, mas
tinham
obtido porme
nores de africanos que tinham fugido da área. Ele não
podia falar-lhes, porque eles só
falavam
a língua local
e, em qualquer caso, «estavam com tanto medo da DGS
e simplesmente a desfalecer que não falariam certamente
com um branco»
27
,
Quando o Bispo saiu do seu retiro, fez um jogo pru
dente publicamente.
Ele
próprio
tinha
estado ausente
de
Tete de 16 a 24 de Dezembro, disse. Recusou-se firme
mente a responder a quaisquer
perguntas
precisas ou a
confirmar
ou
negar quaisquer
factos,
sustentando
que a
sua responsabilidade
para
com a sua igreja e o seu povo
o impedia de se envolver em política"·
Quando interrogado sobre a verdade dos vigorosos
protestos que alegadamente
tinha
dirigido ao governador
e do pedido de
um
grupo para fazer os enterros, replicou
que os padres em questão
eram
responsáveis pela verdade
das suas afirmações. Quando perguntado se estava satis
feito,
na sua maneira
de ver, com o que
tinha
acontecido,
ele replicou que estava satisfeito apenas por estar a
fazer o que
era
bom
para
o seu povo.
Em
resposta ao
comentário
de que
a melhor
maneira
de
servir
o
seu
povo era investigar os r elatos de massacres, ele. afirmou
que a sua missão não era ·andar às voltas com jornalistas
:<
Guardian
21/7/73
2
Ver
nota
24
8 Times
23/7/78
I
:li
j l
§,
: ~ :
I
' ;
'
}j
i
e a envolver-se nos assuntos do g<:>vemador; E t a m b ~ m não
faria
comentitrios sobre os·dois padres p res os - n ão
era da
sua
conta envolver-se em questões dessas
29
•
Bruce Loudon, do Daily ·Telegraph, interpretou estas
evasivas como significando que o Bispo
não
pensava ver
dadeiramente que tivesse havido um massacre e não queria
envolver-se em alegaçpes «Sensacionais» _de alguns pa•
dres
••.
Por
outro
lado, o Bispo
nunca_
negou
categorica
mente a
história dú
massacre. E, se ela aconteceu mesmo,
ele deve ter sabido dela, como afirmam os padres, porque
a questão foi levada à Conferência Episcopal
·e
ele era
a única pessoa que podia
ter
feito isto. Numa pequena
comunidade eclesiástica como Tete, com cerca de. 40
membros, dificilmente
era
provável que ele ·não tivesse
ouvido
falar
nos incidentes. Como o P.• Hastings salien_-
tou, a explicação mais plausível
da sua
posição pública
é que:
«Ele sabe que os relatórios
são
substancialmente
verdadeiros; mas dizê-lo como bispo português seri_a criar
uma
confrontação
directa entre
ele e todo o estado por
tuguês e acha-se incapaz de o fazer. Ao mesmo tempo,
como bispo, é incapaz
de negar _o
que sabe ser·verdade>> "·
Tendo descoberto pouco de valor, o
grupo
principal
de jornalistas
partiu
de Tete. Pouco tempo depois, Peter
Pringle, do
Su'l'lday Titmes,
chegou a Tete.
Tinha
viajado
para Moçambique via Madrid, onde
tinha
tido discussões
preliminares com os
Padres
de Burgos.
Trazia
com ele
uma mensagem gravada do director-geral da ordem, P.•
Jenaro
Artzacos.
Esta
convidava-os a manifestarem-se
«pela verdade e pela justiça, pelo bem da Igreja e pelo .
bem
do
povo de
Moçambique>>.
I
ringle
viajou para Tete no mesmo ·avião que o P.•
.Jesus Camba, superior regional dos padres colocados em
" Times, 17·23j7j73; Guarài<tn, 17j7j73.
"
Daily
Telegraph
20/7
73·
31
Times 2/8/73
M •
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
http://slidepdf.com/reader/full/idaf-1974-terror-em-tete-excerpt 33/36
Tete, que o levou à missão de São Pedro. A princípio,
os
padres dali recusaram-se a ajudar, com o pretexto de que
precisavam de falar primeiro com o Bispo e pedir-lhe para
falar em seu nome. Se ele recusasse,
então
eles falariam.
O Bispo recusou-se efectivamente a
ajudar
e portanto,
os padres reuniram-se com colegas de duas
outras
mis
sões, Moatize e Maturtdo, para
elaborar
o
texto
de uma
declaração ap seu Director-Geral de Madrid.
Entretanto, Pringle
tentou localizar
um
sobrevivente
do massacre que não fosse
apresentado
pelos padres.
Na
quarta-feira, 25 de Julho, falou com António, de
15
anos de idade, cujo nome aparece no primeiro relatório
dos massacres, como sobrevivente de Chawola (ver Apên
dice VI). Obteve de António uma descrição dos aconte
cimentos semelhante à do relatório. Não tinha sido feito
nenhum aviso prévio
na forma
de panfletos
ou
emissão
por alto-falantes.
Ele tinha
fugido ferido, tal como o seu
irmã<> mais novo, Domingos,
enquanto
os soldados empi
lhavam erva
em
cima dos corpos antes de os pôr a arder.
Tinham sido tratados pelas irmãs, no hospital de Tete, e
não
tardaram
a recuperar,
embora
o
seu
irmão tivesse,
disso, morrido num aldeamento.
Em
diversas ocasiões,
durante
a
entrevista,
António mencionou os nomes de
vítimas, correspondendo todos
às do
relatório dos
padres.
Pringle falou também com
um
velho que tinha vivido
numa
povoação não 1onge
do
teatro dos massacres e se
lembrava de ver aviões a
fazer sortidas
de ataque. Tam
bém ele forneceu nomes de
vítimas
que conferiam com
o relatório original.
Antes de poder
entrevistar mais
sobreviventes, Prin-
gle foi preso pela DGS, quando ia a caminho
para
entre
vistar
o Bispo de Tete. Os
seus
livros de apontamentos,
filmes revelados,
mapas
e a
cassete gravada
em que
António tinha
contado a
sua
história,.
foram
todos confis
cados. O inspector da DGS, disse Pringle, «estava bem
manifestamente satisfeito com a sua caçada.
Embora
não
66
)
•I
I
•
I
i
J
ij
•
i
· 1
.,
i
S:
falasse inglês, folheava os meus cadernos de apontamen,·
tos e reconheceu obviamente alguns dos nomes dos padres
e freiras. Ficou particularmente encantado quando en
controu a éleclaração dos
padres
ao P.' Artazcos de Ma
drid. Tinham acabado de mo dar».
As suas
coisas nunca
foram
devolvidas, embora ele conseguisse
tirar
secreta
mente um rolo de películas da secretária do inspector
o filme que continha fotografias de António e de alguns
dos padres que ele tinha
entrevistado:
P.• Eduardo, P.'
Domingos
(um
africano) e
P.'
Camba.
Sob
uma
escolta da DGS permitiram-lhe
ir
ver o
bispo, que
não estava
em casa.
Foi então
posto num avião
para Lourenço Marques onde,
numa
outra
entrevista no
quartel-general da DGS, foi acusado
de
espionagem em
instalações militares.
Saiu
então de Moçambique.
O seu
artigo
que
contava
estes detalhes foi publi
cado
em
5 de Agosto de
1973. No dia
seguinte, Loudon
noticiou a reacção portuguesa
de Lisboa, que alegava
que o simples
relato
de António de incidentes de fuzila
mentos não correspondia às descrições «quase
surrea-
listaS>>
de
jogar
futebol com cabeças e
retalhar
mulheres
grávidas. (De facto,
estes
acontecimentos
foram
descri
tos
como
tendo
acontecido em
Witiyamu;
o
relato
de
António conferia bem com a parte do relatório sobre
Chawola). Sugeriu-se que António tinha sido industriado
pela Frelimo ou pelos padres
.
Continuava a
não
haver indicações de que Portugal
estivesse a conduzir
um
inquérito.
Na
realidade, dois dias J:.
depois, Loudon escreveu ·que «é possível» que o governo
português nomeasse
uma
comissão judicial interna para •
proceder a
uma
investigação
sobre as
alegações de mas- · ::S
sacres, em vista do receio do governo dos «efeitos de {
bola de neve» da publicação da entrevista com António.
O não se
ter
realizado
um
inquérito,
apesar
das promes-
12
Daily Telegraph 6/8/73
67
8/18/2019 IDAF 1974 Terror Em Tete - Excerpt
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\
sas. anteriores, era uma coisa que Loudon não podia
ocultar ·
A seguir a estas notícias, Loudon parece ter voltado
para
Moçambique.
Em
11 de Agosto, entregou um des
pacho de Lourenço Marques
que
descrevia <<Um relatórLo
pouco divulgado que me chegou às mãos», relativo a
operações militares
portuguesas
em Tete, que revelava
que
tinham
sido mortos 98
terroristas na
área, em Dezem
bro de 1972 Citava o relatório como dizendo que, como
resultado de indicações de que os terroristas estavam a
tentar a;proximar-se
da
cidade de Tete, o Comando de
Operações da Zona de Tete lançou <<Operações específicas
em tempo oportuno, empregando algumas das suas tropas
normais e unidade s de comandos>>. Isto, concluía ele, podia
ser
a chave de todas as alegações: como resultado desta
operação, tinham sido apanhados civis entre dois fogos
·
A verdade estava a começar a surgir.
Em
si próprio,
o <<relatório pouco divulgadO>>
de Loudon
era
irrelevante
- e r a nada menos que o comunicado 16/72 citado no
Capítulo Cinco, que
tinha
sido largamente
transcrito na
altura,
por
Loudon entre outros · Mas, em qualquer
altura da semana seguinte, ele foi levado pelo exército
a uma povoação identificada como <<Chawola>>. Com eles;
- : ~
;i:
1
l
f
iam um jornalista francês, um
do
Notíoia
da
Beira e
. . / ,
alguns investigadores portugueses. Foram guiados
por 1
três
africanos,
menCI··.onados
como antigos residentes •J/
de
Chawola-
Guizado Xavier,· Laise· Marizane e Podista.
Esta última tinha cicatrizes de uma ferida de bala; uma
mulher jovem com o mesmo nome aparecia
no
relatório
dos padres como sobrevivente de Chawola.
Desta
vez, parece que eles
foram
efectivamente leva-
31
Dai.ly T e l e g r a p h ~ · 8 f 8 1 ~ i inancial Time.s 8/8/73
*
Dai y
Tetegraph 11/8/73.
Ibid.,
19-22 1/ta:
* Um dos quais vinha do. aldeame nto de Mpadua o qu e lan-
çava dúvidas sobre aflirmações anteriores
de
que era i m p o s s í v e ~ loca-
lizar
antigos
residentes.
dos a Chawola. Calculou-se que
distava
cerca de·15·milhas
(24 ~ m s de Tete. E aqui eles viram caveiras e
outros
despojos humànos e haveres pessoais queimados. Podista
(que não sabia contar, segundo Loudon) não foi capaz
de avaliar o número de mortos, mas o Régulo 'Ilra.buco,
antigo residente de
uma
povoação vizinha e que
agora
vivia também no aldeame nto de · Mpadua, afirmou que
tinha
visitado· a aldeia,
em 17 de
Dezembro, depois de
Podista
e seis outros sobreviventes terem chegado à sua
povoação. Disse que
tinha
contado 53 mortos. Não con
seguiu reconhecer alguns dos mortos. Loudon concluiu
que estes eram, por conseguinte, pmvavelmente guerri
lheiros da Frelimo aboletados na povoação. O
relatório
de Burgos, por outro lado, indica que a impossibilidade
de identificar alguns cadáveres
era
menos um caso
de
caras desconhecidas que de mutilação que impedia o reco
nhecimento. Os portugueses sugeriràm que
havia
homens
da Frelimo na aldeia e que se tinham escondido
por
trás
dos aldeãos. Nenhum dos três sobreviventes corroborou
isto ·
No mínimo dos mínimos,
este
passeio a Chawola
provou que a afirmação anterior .do exército
de
que
<<ninguém
tinha
ouvido
falar
de Chawola; não podia en
contrar-se>> era uma mentira.
A versão oficial portuguesa dos acontecimentos,
publicada .em Lisboa pouco depois de Loudon ter sido
escoltadO
até
Chawola,
era
a que se segue:
<<Logq após. terem sido feitas acusações sobre o com
portamento
de
certos membros das forças
armadas
de
Moçambique, o governo determinou instituir um rigoroso
inquérito.
Os .primeiros resultados
desta
investigação
mostra
ram
que os · acontecimentos alegados· nunca ocorreram
nos locais e com
as
características mencionadas pelos
acusadores. Istó foi confirmado
por
muitos jornalistas
estrangeiros que
viajaram
livremente pelo interior de Tete.
Dai/ y Telegrapk
20-21/8/7-3.
M I ®
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Jij
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il
'
V'
(;
.:-(
No decurso do inquérito, verificou-se que unidades
isol'adas, contrariando ordens, cometeram, pelo menos
/)
num caso, actos repreensíveis
no.
utra parte da mesma área./
1
De acordo com a
prática
que sempre foi
afirmadi/
pelo governo português, as autoridades competentes
t o m a ~
rão medidas apropriadas>> ·
Para
resumir os
testemunhos
opostos, pareceria que,
uma vez entrevist ado António, :llornecendo provas em pri
meira mão das
matanças de
Chawola, se decidiu que se
admitissem es tas- como compreensíveis, senão como
desculpáveis, em vista
da
intensidade
da batalha
que se
dizia que grassava nessa
altura
entre os portugueses e a
Frelimo. Não tendo sido entrevistado pelos jornalistas
nenhuns sobreviventes de Juwau ou Wi:riyamu, contudo,
as
autoridades decidiram cingir-se aos seus relatos ante
riores, apoiados ostensivamente
pekls relatos dos
jorna-
listas que tinham visto «J
oao>>
e «
Wiliamo>>
com os pró
prios olhos, afirmando que
não tinha
tido
lugar
nenhum
massacre semelhante nestas duas povoações ; elas tinham
sido. evacuadas pacificamente.
Em vista das
provas directas fornecidas pelos
afri-
canos que
prestaram
declarações aos padres, este desmen
-tido tem pouca credibilidade. O exército português con
trola toda
a
área de
Tete e não se permitiu nem permitirá
que
tenha lugar uma
investigação independente.
Logo a seguir ao comunicado do governo sobre Cha
wola, noticiou-se que um brigadeiro
do
exército português
tinha sido designado
para preparar
um libelo detalhado
contra os responsáveis pelas matanças,
para ser
apre
sentado a um tribunal militar
.
Dizia-se que uma
figura central
no
tribunal
marcial
que ia realizar-se
era
um agente ·africano da polícia de
segurança portuguesa, <<Um homem enorme e muito te
mido» conhecido como Chico. O relatório dos padres meu-
r·)-
---
-
iário de NotlcUul, 19/8/73.
J
'" Daily Telegraplt 21/8/73;
T>mes,
28/8/73.
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1
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cionava um homem deste nome que exortou continua-
---
'/
mente os soldados a
matarem.
Contudo, Chico morreu
\/
subitamente, em circunstâncias misteriosas--despedaçado
// ::;)
por duas .granadas arremessadas
pára
dentro da sual7
casa, nos arredores de Tete .
Por esta
altura, António
tinha
também desaparecido
- segundo se disse, levado de casa do seu tio pelo Padre
José Sangalo. O P.' Sangalo negou saber do paradeiro
de
António. As autoridades portuguesas qualificaram os
Padres de Burgos como <<Virtulamente raptoreS>> e disse
-se que o seu
tio tinha
encetado diligências formais
para
o recuperar. Os portugueses afirmavam que queriam falar
com António sobre Chawola e disse-se que eles estavam
irritados com boatos de que o Vaticano tinha um
pla _lo
secreto
para
o fazer sair clandestinamente
do
país, com
o fim de
assegurar
a
sua protecção ·
Tinha-se noticiado
antes que
tanto
o Vaticano como chefes da igreja euro
peus estavam directamente envolvidos em
manobras
se
cretas
para garantir
a segurança dos cinco sobreviventes
conhecidos .
Para
os fins de Agosto, o P.• Sangalo foi expulso
de Moçambique, juntamente com o Superior Regional dos
Padres
de Burgos, P.•
Jesus
Camba, e
um
terceiro
padre
espanhol da missão de São Pedro.
Foram
todos rigorosa
mente revistados, depois de serem detidos
por
agentes
de segurança portugueses, segundo se disse preocupados
com que não levassem nenhum
material
com eles
para
posterior distribuição a jornais britânicos ·
Também em Agosto, o Gen.
Arriaga
retirou-se de
Comandante-Chefe
das
·Forças Armadas em Moçambique.
Sucedeu-lhe o General Tomás
José Basto
Machado, que'
se disse
estar
a preparar uma ofensiva importante
" Daii Y Telegraph
4/9/73;
8unday Times
9/12/73.
Ibid., 22/8/73; Cape Tihnes,
22/8/73
" Daily Telegraph 20-21·22/8(13.
2
Sumday Timés 12/8/73
\
71
..
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contra guerrilheiros da Frelim9, em Tete. A imprensa
sul'africana
noticiou consideráveis movimentos de
tropas
para Tete, em meados de
Agosto .
Em
Setembro, o Cor. Videira, governador e coman
/ · \
dante
militar
de Tete, foi subitamente destituído. Noticiou
'\\
\ se que lhe·
tinham
iiado vinte e
quatro horas para sair
("j
de Teté e
voltar
a Lisboa. Aparentemente, sentia-se que,
' soubesse ele
ou
não
das matanças, era, em
última análise,
responsável
por
elas. Anunciou-se também que a adminis,.
tração der distrito de Tete voltaria ao sistema duplo usual
de governador civil e comandante militar.
Isto
destinava
-se, segundo se noticiou, a restringir «a autoridade militar
dominante no distrito
de
Tete e
permitir à
autoridade
civil fiscalizar a militar contra novos excessos>>. O Ministro·
da Defesa português, Gen. Sá Viana Rebelo, empreendeu
uma ronda detalhada de inspecçru } ao distrito .
. ~
~ ~
Também em Setembro, o Bispo de Tete e dois outros
bispos de M oçambiqiJe visitaram o Vaticano a convite do
Papa. Noticiou-se que
tinham
discutido os
massacres
e
a situação missionária em Moçambique
;
subsequente
m<;nte
a isto, notícias de jornais não confirmadas
de
Roma
revelaram que o massacre tinha·sido imediatamente in
vestigado,
por
ordem do Bispo de Tete,
por
dois padres,
um deles africano, qiJe conheciam bem a área. Estes
tinham apresentado um relatório sobre Chawola e
um
outro sobre Wiriyamu e Juwau; disse-se que
as
suas des
cobertas haviam sido confirmadas
por
oficiais portu
gueses que tinham visitado a' área
três
semanas d e p o i )
de o. massac.re
t
er tido lugar, Estes .relatórios foram a.pre
sentados à Conferênica Episcopal
<'>m
Janeiro
e informou-
-se representantes de países católicos romanos em Lou-
Agence
rance
Presse
3/8 /73;_
Daily
TelegraphJ
3 8 73;
Star
4-18/8/73.
Times, 10j9j73; Daily Telegraph,
19/9/73;
Star 29/9/73.
" Daily Telegraph, 10/9/73; T>mes, 14/9/73.
1 72
,l
' ; '
@I
'li
'i
renço Marques. Posteriormente,
foram
apresentados pro
testos em Lisboa .
Na mesma altura,
foi publicada pelà Conferência
Episcopal Metropolitana de Portugal uma declaração, que
era
essencialmente
uma
declaração
da
Conferência Epis
copal de Moçambique. Depois de
citar
a carta enviada
em
31
de Março
por esta
Conferência ao Governador de
Tete
(ver
Cap. Cinco) e a
resposta
do Governador de que
estava a
ser
conduzido
um
inquérito, referia-se à admis
são
oficial de
<<actos
repreensíveis
numa
localidade>> e ex
primia o repúdio do Bispo po·r todos os actos semelhantes.
Obliquamente,
isto
implicava que o
seu protesto
original
se tinha
justificado .
As novas revelações parecem
ser
a confirmação última da validade do relatório dos
Padres
de Burgos, se alguma era precisa.
O Comité Especial dos 24 sobre a descolonização
realizou uma reunião especial
na
sede das Nações Unidas, I
em 20 de Julho de
1973, para ouvir
depoimentos sobre os
acontecimentos
aqui
relatados. O acordo
que
aprovou
concluía:
«Agora, mais que nunca, é obrigação da comunidade \
internacional apoiar a causa do povo que sofre nestes
i
territórios. Deverá aumentar a todos os níveis a pres- I ,
são exercida sobre o Governo de Portugal. Ao mesmo
1
, \ , .
tempo,
tem
que
se aumentar
o auxilio internacional aos
.::S::
movimentos de libertação destes territórios.
Da
mesma f\:)
forma, todos os governos devem
negar
ao Governo de
Po:vtugal qualquer auxílio que lhe permita continuar
as
suas guerras
coloniais».
Em
13 de Dezembro de 1973, um ano depois dos m a s ~
sacre s de Wiriyamu, ,Juwau e Chawola, a Assembleia
Geral das Nações Unidas votou esmagadorament e a favor
de que uma comissão
da
ONU investigasse alegadas atro
cidades portuguesas em Moçambique.
%
Times
21/9/73-
" Ibid., 20/9/73.
73