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Simoni Lahud Guedes Copa do Mundo: ritual quadrienal de nacionalidade Édison Gastaldo O futebol como um drama da vida social no Brasil Ronaldo Helal Jogadores excepcionais e as jogadas brasileiras 334 Ano X 21.06.2010 ISSN 1981-8469 E mais: >> Frank Usarski: A busca de uma teologia das religiões >> Castor Bartolomé Ruiz: Lévinas e o pensamento do outro Futebol. A marca de uma identidade nacional?

IHUOnlineEdicao334 (Entrevista Com Frank Budismo e as Outras)

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Revista da IHU 334

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  • Simoni Lahud GuedesCopa do Mundo: ritual quadrienal de nacionalidade

    dison Gastaldo O futebol como um drama da vida social no Brasil

    Ronaldo Helal Jogadores excepcionais e as jogadas brasileiras

    334Ano X

    21.06.2010ISSN 1981-8469

    E mais:

    >> Frank Usarski: A busca de uma teologia

    das religies

    >> Castor Bartolom Ruiz: Lvinas e o pensamento

    do outro

    Futebol. A marca de uma

    identidade nacional?

  • IHU On-Line a revista semanal do Instituto Humanitas Unisinos IHU Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. ISSN 1981-8769. Diretor da Revista IHU On-Line: Incio Neutzling ([email protected]). Editora executiva: Graziela Wolfart MTB 13159 ([email protected]). Redao: Mrcia Junges MTB 9447 ([email protected]) e Patricia Fachin MTB 13062 ([email protected]). Reviso: Vanessa Alves ([email protected]). Colaborao: Csar Sanson, Andr Langer e Darli Sampaio, do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores CEPAT, de Curitiba-PR. Projeto grfico: Bistr de De-sign Ltda e Patricia Fachin. Atualizao diria do stio: Incio Neutzling, Greyce Vargas ([email protected]), Rafaela Kley e Cssio de Almeida. IHU On-Line pode ser acessada s segundas-feiras, no stio www.ihu.unisinos.br. Sua verso impressa circula s teras-feiras, a partir das 8h, na Unisinos. Apoio: Comunidade dos Jesutas - Residncia Conceio. Instituto Humanitas Unisinos - Diretor: Prof. Dr. Incio Neutzling. Gerente Administrativo: Jacinto Schneider ([email protected]). Endereo: Av. Unisinos, 950 So Leopoldo, RS. CEP 93022-000 E-mail: [email protected]. Fone: 51 3591.1122 ramal 4128. E-mail do IHU: [email protected] - ramal 4121.

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    Futebol. A marca de uma identidade nacional?

    Em meio s emoes que envolvem a Copa do Mundo de Futebol, a IHU On-Line prope como tema de capa desta semana a importncia do futebol na constituio da identidade nacional do povo brasileiro. Entrevistamos especialistas no tema, que discorrem sobre o sig-nificado do esporte mais venerado pelos brasileiros, bem como as principais transformaes que o futebol tem sofrido ao longo de sua histria.

    Participam do debate os antroplogos Arlei Damo, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS; Simoni Lahud Guedes, professora na Universidade Federal Fluminense UFF; dison Gastaldo, professor na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; a sociloga Ftima Ferreira Antunes, do Departamento do Patrimnio Histrico da Secretaria de Cultura de So Paulo; Ronaldo Helal, professor da Faculdade de Comunicao Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro UERJ, e os jornalistas Ruy Castro, Nando Gross e Fabiano Baldas-so. Um breve texto sobre o tema, que nos foi enviado pelo professor Jos Afonso de Oliveira, da Universidade Estadual do Oeste do Paran UNIOESTE, tambm publicado.

    Completam esta edio as entrevistas com Frank Usarski, professor e pesquisador do Pro-grama de Ps-Graduao em Cincias da Religio da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP, sobre a busca de uma teologia das religies, com Maria Eunice Maciel, profes-sora na UFRGS, e com Castor Bartolom Ruiz, professor e pesquisador do PPG em Filosofia da Unisinos, sobre Lvinas e o pensamento do outro, tema da prxima etapa do Ciclo de Estudos Filosofias da diferena - Pr-evento do XI Simpsio Internacional IHU: O (des)governo bio-poltico da vida humana, a ser realizado no dia 23 de junho, quarta-feira.

    A EBC e a TV Brasil: mais do mesmo?, de Rodrigo Jacobus, membro do Grupo de Pesquisa Comunicao, Economia Poltica e Sociedade (CEPOS/Unisinos) e A lucidez de Jos Sarama-go, de Rafael B. Vieira, mestrando em direito na PUC-Rio, so os artigos que compem este nmero.

    A todas e a todos uma tima leitura e uma excelente semana!

    Foto da capa: Bruno Alencastro

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    Leia nesta edioPGINA 02 | Editorial

    A. Tema de capa Entrevistas

    PGINA 05 | Arlei Damo: Futebol, um esporte agonstico PGINA 08 | dison Gastaldo: O futebol como um drama da vida social no Brasil PGINA 11 | Ftima Ferreira Antunes: Brasil: pas do futebol? PGINA 13 | Nando Gross: O Brasil no to poderoso quanto o futebol nacional PGINA 15 | Fabiano Baldasso: Aqui, no Rio Grande do Sul, no existe amor pela seleo brasileira. Aqui se ama o Grmio e se ama o Internacional

    PGINA 18 | Ronaldo Helal: Jogadores excepcionais tendem a fazer jogadas brasileiras PGINA 21 | Ruy Castro: Neste momento, no h dolos no futebol brasileiro PGINA 22 | Simoni Lahud Guedes: Copa do Mundo: ritual quadrienal de nacionalidade PGINA 25 | Jos Afonso de Oliveira: A ptria de chuteiras

    B. Destaques da semana Memria

    PGINA 29 | Rafael B. Vieira: Jos Saramago (1922-2010) Teologia Pblica

    PGINA 30 | Frank Usarski: O Budismo e as outras: em busca de uma teologia das religies Coluna do Cepos

    PGINA 34 | Rodrigo Jacobus: A EBC e a TV Brasil: mais do mesmo? Destaques On-Line

    PGINA 36 | Destaques On-Line

    C. IHU em Revista Agenda de Eventos

    PGINA 40| Castor Ruiz: Alteridade, dimenso primeira do sujeito PGINA 43| Maria Eunice Maciel: Sep, um emblema que ultrapassa fronteiras

    IHU Reprter

    PGINA 45| Maria Cristina Bohn Martins

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    Futebol, um esporte agonsticoJogo simula as regras de uma guerra, e une os torcedores em torno de simbologias que extrapolam a racionalidade, acentua o antroplogo Arlei Damo

    Por Mrcia Junges

    Espcie de guerra simulada, o futebol um esporte de natureza agonstica, destaca o antroplogo Arlei Damo. Repleto de simbologias, ele capaz de atrair atenes para as disputas da Copa do Mundo, sobretudo. No Brasil, isso ainda mais verdadeiro quando a seleo entra em campo. So-mos reconhecidos internacionalmente pela originalidade da nossa maneira de jogar, e isto se deve, em boa medida, maneira como a cultura corporal afro-brasileira processou as regras do ento

    chamado nobre esporte breto, disse Damo na entrevista que concedeu, por e-mail, IHU On-Line.Damo graduado em Educao Fsica, mestre e doutor em Antropologia Social pela Universidade Federal

    do Rio Grande do Sul - UFRGS, e leciona nessa mesma instituio. autor de Futebol e Identidade Social (Porto Alegre: UFRGS, 2002) e Do dom profisso: a formao de futebolistas no Brasil e na Frana (So Paulo: HUCITEC, 2007) e coautor de Ftbol y Cultura (Buenos Aires, Norma, 2001). Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Em outra entrevista nossa publicao1, o senhor afirma que o futebol o smbolo laico da nao. Como isso se exacerba em tempos de Copa do Mundo?Arlei Damo - A copa um evento que dura menos de um ms. E a equipe que representa o Brasil tem, a rigor, trs per-formances confirmadas, podendo ampliar para sete caso chegue s finais. Rigoro-samente, isto o que temos em termos de jogos propriamente ditos, mas a mo-bilizao para eles de fato bem mais ampla. A seleo que vai representar o Brasil nestes poucos jogos preparada ao longo de quatro anos, em jogos amis-tosos, durante as eliminatrias ou atra-vs da disputa de outras competies. Paralelamente preparao da equipe que, de fato, entra em campo, temos a mobilizao do pblico. Assim sendo, te-mos, por um lado, uma mobilizao per-manente do apreo pela seleo. Tende a ser reafirmada a prpria crena de que a equipe organizada pela CBF, uma enti-dade privada, o Brasil, a tal ponto que parece algo natural, incontestvel. Por outro lado, observa-se a intensificao

    1 Trata-se da entrevista Um campo de guerra, publicada na Revista IHU On-Line 184, de 12-06-2006, disponvel para download em http://migre.me/QY1r. (Nota da IHU On-Line)

    desta mobilizao, de forma gradativa, medida que a copa se aproxima. As-sim sendo, quando a seleo entra em campo, a impresso mesmo de que se est diante de algo derradeiramente importante, dramtico, inevitvel. S quem pensa diferente que est fora de contexto.

    IHU On-Line - Em que sentido o fu-tebol uma guerra simulada, meta-frica?Arlei Damo - Esta uma analogia anti-ga no espectro da literatura em cincias sociais. No creio que algum possa rei-vindicar os direitos autorais desta ideia, de to disseminada que . Eu tambm a tenho reproduzido, mas percebi, ultima-mente, que ela, por vezes, mal com-preendida, pois muitos a tomam como se fosse uma proposio que aprisiona o futebol na perspectiva da guerra. Diria, ento, que o espao do futebol pode ser pensado como tendo uma interseco com o da guerra (no sentido de dispu-ta, sobretudo), mas tambm com outros megaeventos (espetculos de msica, por exemplo), festas (religiosas ou pro-fanas, pouco importa), ritos coletivos, mercado de bens simblicos e assim por diante. De minha parte, pelo menos,

    quando afirmo que o futebol uma guer-ra simulada, tenho em mente a estrutu-ra mesma do jogo, que algo anterior ao prprio futebol, pois tal estrutura, de natureza agonstica, partilhada por to-dos os esportes. Sem exceo, mas com algumas variaes significativas, todas as competies esportivas partem de um ponto no qual os contendores so pensa-dos como estando em situao de igual-dade para, ao final de um perodo de tempo no qual eles se envolvem numa disputa altamente regrada, produz-se uma ciso entre vencedores e vencidos. A guerra produto de um impasse, de um empate diplomtico, digamos assim. No esporte, o impasse forjado, da a ideia de simulao.

    Dentre os vrios pensadores que se reportam a esta analogia, foi, sem d-vidas, Norbert Elias2 que a pensou mais

    2 Norbert Elias (1897-1990): socilogo ale-mo. De famlia judaica, teve de fugir da Ale-manha nazista exilando-se em 1933 na Frana, antes de se estabelecer na Inglaterra onde passou grande parte de sua carreira. Em 1954, comeou como professor na Universidade de Leicester. Suas obras focaram a relao en-tre poder, comportamento, emoo e conhe-cimento na Histria. Devido a circunstncias histricas, Elias permaneceu durante um longo perodo como um autor marginal, tendo sido redescoberto por uma nova gerao de teri-cos nos anos 1970, quando se tornou um dos mais influentes socilogos de todos os tempos.

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    detidamente, estabelecendo, inclu-sive, conexes empricas. O socilogo alemo mostrou que a inveno dos esportes modernos , em boa medida, paralela curializao dos guerreiros a partir do final da Idade Mdia. Fazer a guerra foi, durante a Idade Mdia, uma ocupao nobre, que instituiu, inclusi-ve, uma classe de nobreza. As campa-nhas eram permanentes porque estas configuraes precisavam se reprodu-zir. Ento havia um processo de recru-tamento permanente, de modo que as chances de algum do sexo masculino vir a ser convocado para a guerra era de fato muito alta. Ou seja, a guerra estava no horizonte de quase todos os homens. Progressivamente, dir Elias, as guerras vo perdendo espao para o dilogo, conquanto isto no deva ser pensado em perspectiva humanitria.

    Esportes e economia disciplinar

    O que ocorre, de fato, a emer-gncia de um tipo de organizao so-cial e poltica chamada Estado-nao, que define, entre outras coisas, certas fronteiras geogrficas e, fundamental-mente, a ideia de autonomia interna e respeito externo. Negociar, em todos os sentidos, torna-se mais importante do que brigar. Da surge um equilbrio dinmico. fato que a diplomacia que ajuda a preparar, evitar ou reparar a guerra adquire importncia cada vez maior. Os fluxos comerciais, atravs das fronteiras, ganham destaque em relao pilhagem e ao saque. A guer-ra passa a ser uma estratgia; um meio, e no um fim. Inevitavelmente, h um aquartelamento dos guerreiros e a ne-cessidade de criar uma economia disci-plinar que os mantenha apaziguados e, simultaneamente, alerta. Os esportes, na perspectiva de Elias, tm muito a ver com esta economia disciplinar, que ao mesmo tempo moral, emocional e corporal. A partir do sculo XIX, os esportes passaram por transformaes radicais, no sentido de codificao das regras, e assim puderam ser estendidos prtica de um espectro mais amplo da sociedade, com uma contribuio decisiva dos internatos religiosos ou

    A obra mais importante de Elias foram os dois volumes de O processo civilizatrio. (Nota da IHU On-Line)

    laicos, que em boa medida lembram, outra vez, os quartis. O sculo XX viu os esportes se autonomizarem do ponto de vista econmico, esttico e moral. Mas esta autonomia sempre parcial, pois os nexos com outras esferas s-cio-culturais podem ser recuperadas a qualquer momento, e nisto reside in-clusive os nexos com a guerra.

    IHU On-Line - A nacionalidade con-tinua sendo um critrio de escolha para os atletas que jogam na Copa do Mundo. Qual o sentido dessa pre-missa se levarmos em considerao que muitos desses atletas no jogam e no moram em seus pases h tem-po?Arlei Damo - Em um texto, publicado no livro Naes em Campo: Copa do Mundo e Identidade Nacional (Niteri: Intertexto, 2006), desenvolvi um argu-mento, retomado em outros momentos, que me parece bastante esclarecedor a este respeito. A FIFA uma entidade cor-porativa que se propagandeia, de modo muito convincente, como uma espcie de entidade supranacional sem fins lu-crativos e com interesses voltados ao congraamento entre as naes atravs do futebol. Se seguirmos esta perspecti-va, reproduzida como uma verdade in-conteste por quase todas as mdias e uma mentira dita um milho de vezes ser uma verdade, bem sabemos -, nos distanciamos de qualquer possibilidade de entendimento da realidade. A FIFA

    visa lucro, e o faz de modo muito inci-sivo, tanto que exigiu do governo brasi-leiro um estatuto especial que a isenta de tributao, algo ao alcance de poucas empresas capitalistas. Isto d uma ideia do poder de barganha desta entidade e, vale acrescentar, seus interesses, se que no se resumem ao empreendedo-rismo comercial, so no mnimo difusos ou pelo menos mais amplos e menos no-bres do que sua propaganda.

    Mas afinal, de onde provm tanto poder? Do fato da FIFA, diferena do que ocorre na maioria dos outros es-portes, deter o monoplio do futebol de espetculo. Ou seja, ela impe as regras do jogo, que no so apenas as regras do jogo jogado dentro de cam-po, pois essas esto a cargo da Inter-nacional Board, parceira da FIFA. A FIFA determina as regras fora de campo, de como os clubes e os jogadores devem se portar. Tem sua prpria justia, que por vezes se confunde com o sistema jurdico estatal, mas que de fato uma justia bastarda. A FIFA delega poder s confederaes continentais tipo UEFA (Union of European Football As-sociations ) e COMMEBOL (South Ame-rican Football Confederation) - e s fe-deraes nacionais CBF, por exemplo -, que podem, inclusive, delegar aos prprios clubes filiados a organizao das competies nacionais o caso de quase todos os pases europeus em que as chamadas ligas organizam as com-peties profissionais. Isto posto, fica mais claro perceber que existem, a ri-gor, dois sistemas de disputas no mbi-to do futebol de espetculo: um deles, denominado clubstico, e o outro, com o perdo do neologismo, nacionalsti-co. A FIFA controla os dois, obviamen-te, mas sobre o nacionalstico que ela detm o monoplio absoluto.

    Jogadores como mercadoria

    No sistema clubstico, a FIFA permi-te s equipes o vnculo com os atletas a partir de critrios trabalhistas, mui-to prximo do que ocorre com outros profissionais. O contrato entre indiv-duo e instituio ou seja, entre clu-be e jogador mediado por critrios legais e econmicos, sendo comum a circulao de jogadores conforme as

    Minha querida av,

    por exemplo, nunca

    achou a menor graa em

    um bando de homens

    correndo atrs de uma

    bola. Sempre pensou

    que isso fosse uma

    infantilidade, para no

    dizer uma estupidez

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    regras deste mercado particular. A FIFA impe algumas normas, entre as mais importantes, a impossibilidade de um jogador prestar servio a dois clubes simultaneamente. Mas, insisto, ela ad-mite o mercado que , no apenas um mercado laboral, mas um mercado de pessoas, pois os jogadores tm preo e so tratados como mercadorias.

    Finalmente, o grande segredo: a FIFA no permite que este tipo de mercado seja institudo em relao s selees nacionais. Aqui o vnculo pri-vilegiado de outra natureza, de ci-dadania. Ou seja, um jogador s pode atuar por uma seleo nacional, a de seu pas de nascimento, ou se tiver o ttulo de cidado de outra nao, mas tal aquisio passa por critrios que excedem o mbito esportivo. Isto pode parecer um mero detalhe do ponto de vista prtico, mas essencial do ponto de vista simblico. No caso do sistema nacionalstico de disputas, o engaja-mento dos indivduos se d mediante critrios de nacionalidade, razo pela qual o time recrutado pela CBF, por exemplo, acaba facilmente parecendo (e sendo) o Brasil, como se fosse um exrcito laico. Se a FIFA permitisse o recrutamento das selees mediante critrios econmicos, no tenho dvi-das de que a Arbia Saudita entraria na Copa como favorita. Mas, neste caso, as copas perderiam completamente o sentido e, portanto, o pblico, logo, os patrocinadores. A FIFA, mais do que ningum, sabe disso.

    IHU On-Line - Em que medida a Copa na frica do Sul representa uma de-mocratizao do futebol para fora do eixo do Primeiro Mundo como sede do evento?Arlei Damo - Foi o ex-presidente Joo Havelange quem instituiu que as Copas deveriam ser realizadas em continentes distintos, num sistema de rotatividade. Um dos objetivos era ampliar o mercado futebolstico, pari passu o processo de globalizao. Outro objetivo de Have-lange era o poder. A FIFA era dominada pelos europeus ainda hoje eles cons-tituem 1/3 dos participantes da copa, por exemplo , e Havelange teria mais chances de se reproduzir no poder se ampliasse o leque de votos, ampliando o

    leque de federaes e, por extenso, de representantes delas nas competies organizadas pela entidade. Foi estrat-gica, portanto, a ampliao do nmero de participantes nas copas, at as 32 se-lees atuais, bem como o rodzio que incluiu o continente africano. Havelange tenta fazer crer, insistentemente, que a copa da frica do Sul sua maior con-quista porque estaria cumprindo, afinal, o desgnio de irmandade entre as naes, contemplando os cinco continentes. Sem contestar, de todo, a plausibilidade des-ta perspectiva explicativa, afinada com o multiculturalismo, devem-se incluir outras, entre elas a multimercadolgica. Tanto verdade que, a partir de 2018, haver concorrncia aberta para a esco-lha do pas-sede. Afinal, o futebol est globalizado. A tendncia ser uma con-centrao maior de copas na Europa os demais que assistam pela TV - e a pre-dominncia dos interesses estritamente comerciais.

    IHU On-Line - Como podemos enten-der que o futebol, e em especfico a Copa do Mundo, tenha o poder de parar o Pas? Que outro aconteci-mento teria essa fora de mobiliza-o?Arlei Damo - A seleo brasileira de fato tem um poder simblico notvel. O esporte tem este poder de represen-tao. Como diria o historiador ingls Erick Hobsbawm3, no existe nada mais potente, em termos de representa-o, do que um smbolo humano. E os

    3 Eric Hobsbawm: historiador marxista do s-culo XX. Autor de inmeros livros, entre os quais A Era dos Extremos (So Paulo: Compa-nhia das Letras, 1995), A Era do Capital (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982), A Era das Re-volues (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982), A Era dos Imprios (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988), Bandidos (Rio de Janeiro: Forense Uni-versitria, 1976) e sua autobiografia, Tempos Interessantes: uma vida no sculo XX (So Pau-lo: Companhia das Letras, 2002).(Nota da IHU On-Line).

    atletas, individualmente ou coletiva-mente, so exatamente isso. difcil rivalizar com eles. Os heris de guerra talvez o faam, mas o Brasil no tem tradio nisso. Os pop stars podem ser alados s alturas, mas falta-lhes, na maioria das vezes, algo que os vincule s causas coletivas. De outra parte, o esporte precisa, desesperadamente, deste sentido que lhe exgeno. Mi-nha querida av, por exemplo, nunca achou a menor graa em um bando de homens correndo atrs de uma bola. Sempre pensou que isso fosse uma in-fantilidade, para no dizer uma estu-pidez. Eu concordo plenamente com ela. Mas para ela, tudo muda de sen-tido quando esses marmanjos vestem uma camisa verde e amarela. Somos humanos por conta disso, porque habi-tamos um universo de smbolos.

    IHU On-Line - O senhor percebe tan-to interesse em outros pases, como no Brasil, em relao ao futebol? Por que somos considerados a terra des-se esporte se o seu bero a Ingla-terra?Arlei Damo - H outros pases to ou mais interessados em futebol do que o Brasil. Argentina, Itlia, Inglaterra, Espanha, so apenas alguns exemplos. O que ocorre de diferente, talvez, que, no Brasil, h uma hegemonia do futebol em relao a outros esportes. Da a impresso que se trata de um esporte brasileiro. No se pode dei-xar de lembrar, todavia, que somos reconhecidos internacionalmente pela originalidade da nossa maneira de jo-gar, e isto se deve, em boa medida, maneira como a cultura corporal afro-brasileira processou as regras do ento chamado nobre esporte breto.

    IHU On-Line - Como podemos enten-der que o Brasil tenha tanto sucesso no futebol em relao aos outros pa-ses? O que nos torna to diferente das outras naes, a ponto de termos vencido a Copa cinco vezes?Arlei Damo - Muita gente no gosta de explicaes sociolgicas, que a ri-gor so cientficas e, portanto, redu-zem a margem para as especulaes msticas. Este um caso. O Brasil o pas mais populoso do mundo no qual o

    A partir de 2018,

    haver concorrncia

    aberta para a escolha do

    pas-sede. Afinal, o

    futebol est globalizado

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    futebol o esporte mais popular. Pela lgica, ns temos o maior nmero de praticantes em termos absolutos. E como eu penso que a qualidade no alheia quantidade, no seria de es-perar seno que no Brasil se produzis-sem muitos profissionais qualificados. Mas isto no tudo. O quase mono-plio do futebol centrifuga os talentos esportivos. Os meninos podem apren-der outros esportes na escola ou em clubes, mas, o futebol, eles aprendem em toda a parte. Ento existe uma ex-tensa quantidade de talentos para ser recrutada, uma superabundncia, eu diria. Mas no se pode descartar tam-bm a qualidade dos nossos centros de formao, em boa parte, voltados para a produo de atletas-mercadorias. Somos efetivamente muito bons nisso, mas no me parece que seja apenas motivo de orgulho. Se pensarmos que o futebol uma modalidade de bem simblico que pode ser consumido como um teatro, cinema ou outro bem que no possui uma dimenso mate-rial -, temos que admitir tambm que a grande indstria de transformao est situada na Europa Inglaterra, Itlia, Espanha, especialmente. l que se realizam os jogos irradiados ao mundo inteiro. No Brasil, produzimos um espetculo de qualidade mediana, pois nossos talentos principais foram recrutados pelos europeus. Em snte-se, no mercado futebolstico, ocupa-mos a mesma posio que o Brasil se encontra no mbito mais amplo da economia: a de produtores de commo-dities.

    Leia Mais...>> Arlei Damo j concedeu outra entrevista

    IHU On-Line:

    * Um campo de guerra. Edio 184 da Revista IHU On-Line, de 12-06-2006, disponvel para download em http://migre.me/Q8IJ

    Ba da iHu on-Line>> Sobre o futebol, a IHU On-Line j publi-

    cou outra edio. Confira:

    * Futebol: mstica, identidade e comrcio. Edio nmero 184, de 12-06-2006, disponvel para down-load em http://migre.me/QIzc

    Segundo a viso de dison Gastaldo, de longe o futebol o esporte mais importante no contexto social brasileiro

    Por grazieLa WoLfart

    Para o antroplogo e professor dison Gastaldo, na entrevista que concedeu, por telefone, para a IHU On-Line, o futebol um cami-nho potencial para descobrirmos verdades profundas sobre a nossa cultura, sobre quem somos. Dentro de um campo de futebol, dra-matizam-se valores e aspectos fundamentais do que significa ser

    brasileiro. Para Gastaldo, a Copa do mundo o momento mais importante de celebrao da nacionalidade brasileira. E explica: isso aparece no ndice de audincia das partidas do Brasil na Copa que tradicionalmente, ao longo de dcadas, vem representando as maiores concentraes histricas de audincia miditica de todos os tempos. Uma partida do Brasil na Copa do Mundo con-centra normalmente de 97 a 98% dos televisores ligados. Nenhum outro evento concentra tanta gente na frente da TV para ver a mesma coisa. a hora em que todo mundo se veste de verde e amarelo, em que todo mundo canta o Hino Nacional, em que todos se abraam, choram, vibram. Um jogo do Brasil na Copa do Mundo o fato social total brasileiro. Concentram-se multides de pessoas no mesmo lugar, em torno de um nico valor: ns contra os outros. Por isso a Copa to importante. o momento de ver quem somos frente aos outros, expresso na metonmia de que 11 pessoas so o Brasil.

    dison Luis Gastaldo antroplogo. professor no Departamento de Letras e Cincias Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. autor dos Cadernos IHU Ideias nmero 10, intitulado Futebol, mdia e sociedade no Bra-sil: reflexes a partir de um jogo, disponvel para download em http://migre.me/QaBG, e do nmero 43, intitulado Futebol, mdia e sociabilidade. Uma ex-perincia etnogrfica, disponvel para download em http://migre.me/QaFm. Confira a entrevista.

    O futebol como um drama da vida social no Brasil

    IHU On-Line - Qual o significado antropolgico e social do futebol no Brasil? dison Gastaldo Quando falamos de esporte no Brasil, estamos falamos de futebol. De longe, o futebol o espor-te mais importante no contexto social brasileiro. Por muito tempo, as Cincias Sociais consideraram o futebol como um fato de menor importncia. Quando muito, concediam ao futebol um esta-tuto de alienao. Encerravam a ques-

    to dizendo que o futebol era o pio do povo, servia para mistificar as classes trabalhadoras e afast-las daquilo que deveria ser o seu verdadeiro motivo de preocupao. Com isso, deixava-se de lado toda a importncia e a riqueza conceitual do esporte. O futebol, no incio do sculo XX, foi visto por mui-tos intelectuais importantes, inclusive

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    Graciliano Ramos1 e Villa-Lobos2, como um estrangeirismo inconcebvel, como um modismo estrangeiro, que no tinha nada a ver com a cultura brasileira. Tem at um texto famoso do Graciliano Ra-mos que se chama Futebol fogo de palha, que dizia que era uma moda, como o ioi e o bambol. Ele dizia que o futebol tinha vindo, mas ia passar, pois o verdadeiro esporte brasileiro a ras-teira, de preferncia pelas costas. Des-de os anos 80, a Cincia Social brasileira tem desenvolvido uma nova perspectiva bem mais avanada sobre o futebol, sem preconceito, uma perspectiva mais an-tropolgica do esporte. O marco dessa perspectiva a publicao, em 1982, do livro Universo do futebol (Rio de Janei-ro: Pinakotheke, 1982), organizado pelo antroplogo Roberto da Matta3. Ali o fu-tebol apresentado sob uma nova luz, pensado como um fato social em si mes-mo e interpretado por da Matta e seus outros colegas que participaram do livro como uma espcie de drama da vida so-cial no Brasil. Segundo essa perspectiva,

    1 Graciliano Ramos (1892-1953): escritor ala-goano, nascido em Quebrngulo. Autor de nu-merosas obras, vrias delas adaptadas para o cinema, como Vidas Secas e Memrias do cr-cere, em 1963 e 1983, respectivamente, por Nelson Pereira dos Santos. A obra Vidas Secas foi o objeto de estudo do Ciclo de Estudos so-bre o Brasil, de 17 de junho de 2004. Quem conduziu o debate foi a Prof MS Clia Dris Becker, das Cincias da Comunicao da Uni-sinos. Confira uma entrevista que a professora concedeu sobre o tema na 105 edio da IHU On-Line, de 14 de junho de 2005, disponvel para download em http://migre.me/QYmV. Confira, tambm, a edio 274 da IHU On-Line, de 22-09-2008, intitulada Josu de Cas-tro e Graciliano Ramos. A desnaturalizao da fome, disponvel para download em http://migre.me/QYnR. (Nota da IHU On-Line)2 Heitor Villa-Lobos (1887-1959): compositor brasileiro. Aprendeu as primeiras lies de msica com seu pai, Raul Villa-Lobos, funcio-nrio da Biblioteca Nacional. Ele lhe ensinara a tocar violoncelo usando improvisadamente uma viola, devido ao tamanho de Tuhu (ape-lido de origem indgena que Villa-Lobos tinha na infncia). Sozinho, aprendeu violo na ado-lescncia, em meio s rodas de choro cariocas, s quais prestou tributo em sua srie de obras mais importantes: Os Choros, escritos na d-cada de 1920. (Nota da IHU On-Line)3 Roberto DaMatta (1936): antropollogo bra-sileiro, considerado um dos grandes nomes das Cincias Sociais brasileiras. autor de diversas obras de referncia na Antropologia, Sociolo-gia e Cincia Poltica, como Carnavais, Malan-dros e Heris, A casa e a rua ou O que faz o brasil, Brasil?. Confira a entrevista que conce-deu edio 184 da Revista IHU On-Line, de 12-06-2006, intitulada Ritual, drama e jogo, disponvel para download em http://migre.me/QYuy. (Nota da(Nota da IHU On-Line)

    num campo de futebol, dramatizam-se elementos profundos da cultura brasi-leira. No s no alienao, como ele um caminho potencial para descobrir-mos verdades profundas sobre a nossa cultura, sobre quem somos. Dentro de um campo de futebol, dramatizam-se valores e aspectos fundamentais do que significa ser brasileiro. Isso se exemplifi-ca na rejeio unnime das torcidas ao juiz e o prprio fato de, no Brasil, cha-marmos o rbitro de juiz. Essa rejeio unnime pessoa do juiz pode ser inter-pretada como uma reao do povo con-tra a tirania do Estado. O juiz no deixa as pessoas fazerem o que querem, um sujeito a favor do Estado, e no do povo. O juiz no campo de futebol expulsa o meu jogador, anula o meu gol, marca o impedimento do meu ataque. Ento o juiz ladro. A certeza dos torcedores de que o juiz est roubando expressa a desconfiana do povo brasileiro com seu Estado.

    IHU On-Line - Qual a importncia de discutir academicamente a Copa do Mundo? dison Gastaldo A Copa do Mundo um momento extraordinariamente im-portante no estudo do futebol como um elemento de identidade nacional no Brasil. o momento mais impor-tante de celebrao da nacionalida-de brasileira. Isso aparece no ndice de audincia das partidas do Brasil na Copa que tradicionalmente, ao longo de dcadas, vem representando as maiores concentraes histricas de audincia miditica de todos os tem-pos. Uma partida do Brasil na Copa do Mundo concentra normalmente de 97 a 98% dos televisores ligados. Nenhum outro evento concentra tanta gente na frente da TV para ver a mesma coisa.

    a hora em que todo mundo se veste de verde e amarelo, em que todo mundo canta o Hino Nacional, em que todos se abraam, choram, vibram. Um jogo do Brasil na Copa do Mundo o fato social total brasileiro. Concentram-se multides de pessoas no mesmo lugar, em torno de um nico valor: ns con-tra os outros. Por isso a Copa to im-portante. o momento de ver quem somos frente aos outros, expresso na metonmia de que 11 pessoas so o Brasil.

    IHU On-Line - O futebol tor-nou-se um importante elemen-to constitutivo das relaes internacionais que j no podem ser resumidas a questes diplomticas entre Estados? Como se do essas re-laes atravs do futebol?dison Gastaldo preciso ter caute-la nessa aproximao. O futebol repre-senta as naes s em metfora, nas figuras de linguagem. Aqueles onze jo-gadores no tm a bandeira do Brasil no peito. Eles tm o emblema da CBF. A FIFA no a ONU. O futebol no uma instncia diplomtica. Quem tem a dimenso da diplomacia internacio-nal a ONU. A FIFA organiza federaes nacionais de prticas futebolsticas. Quando falamos que o Brasil vai jogar com a Argentina, temos que ter em mente que est jogando o time da CBF contra o time da AFA (Asociacin del Ftbol Argentino). Tem um efeito sim-blico de que aqueles ali somos ns. Mas eles so os jogadores do Ricardo Teixeira. Ele que escolhe o tcnico, e este quem escolhe os jogadores. E a CBF, como as outras associaes de fu-tebol, no prestam contas a governos, no representam o Brasil em termos prticos. Em termos simblicos, sim. E essa metonmia muito lucrativa-mente explorada pela FIFA, pela CBF e por todas as outras associaes fute-bolsticas do mundo. As pessoas dizem que o futebol para as guerras, resolve os conflitos, e isso no verdade. s vezes isso pode acontecer, mas uma circunstncia especial de fatores. Por exemplo, a Coreia do Sul e a Coreia do Norte esto beira de uma guerra. A Coreia do Norte afundou um barco sul-coreano e provocou uma forte tenso militar na fronteira dos dois pases. E

    A certeza dos

    torcedores de que o

    juiz est roubando

    expressa a desconfiana

    do povo brasileiro com

    seu Estado

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    a Copa do mundo no amenizou em nada essa situao.

    IHU On-Line - Quais so as articula-es econmicas e diplomticas que se fazem em torno do futebol? Existe uma viso poltica do futebol? dison Gastaldo No vamos sobrevalo-rizar o futebol. Seu grande valor como fato social est no campo simblico, no que ele significa para as pessoas. Como um instrumento de ao poltica, ele tem valor relativo. Coincidentemente, todo ano de eleio para presidente no Brasil ano de Copa do Mundo. Todo ano vem algum jornalista me perguntar se a Copa de propsito em ano de eleio e se ela influencia no resultado das vo-taes. A resposta sempre a mesma: no. A Copa do Mundo no influencia o resultado da eleio. preciso rela-tivizar o tal poder do futebol, que de reunir uma audincia absurdamente grande em frente a uma tela de TV e de que, naquele momento, as pessoas se sentem mais brasileiras do que em qual-quer outro. A poltica do futebol um pouco pior do que a poltica normal. Na poltica normal, temos chance de votar a cada quatro anos. No futebol no te-mos chance de votar para nada. Os s-cios de um clube tm uma participao nfima na vida poltica de seus clubes. Os clubes de futebol no Brasil e a prpria CBF so entidades fechadas em termos de participao poltica. Por mais que os torcedores que resolvam pagar para ser scios dos seus clubes gostariam de influir nos destinos da instituio, eles no podem. Dentro de cada clube, de cada federao e de cada confederao, existem vrios mecanismos de barreira para interveno poltica. No por ou-tro motivo que Ricardo Teixeira4 est, h dcadas, no comando do futebol brasi-leiro. Ningum vai conseguir tirar ele de l enquanto ele no quiser sair. Ricardo Teixeira genro do Joo Havelange5,

    4 Ricardo Terra Teixeira (1947): dirigente desportivo brasileiro, 18 presidente da Con-federao Brasileira de Futebol, no cargo des-de 16 de janeiro de 1989. Seu quinto mandato consecutivo terminou em 2007, mas foi pro-longado, sob acordo, at o final da XX Copa do Mundo FIFA em 2014, que ser no Brasil. (Nota da IHU On-Line)5 Jean-Marie Faustin Goedefroid de Have-lange (1916): dirigente desportivo brasileiro, stimo presidente da FIFA de 1974 a 1998, su-cedendo Sir Stanley Rous e teve como sucessor Joseph Blatter. Desde 1963 Joo Havelange

    que foi, durante 28 anos, presidente da FIFA e, antes do Ricardo Teixeira, era ele o presidente da Confederao Brasilei-ra de Desportos - CBD. Tanto pequena a participao poltica que o sujeito foi presidente por dcadas da CBD, saiu di-retamente para a presidncia da FIFA e deixou no seu lugar o seu genro. Ou seja, uma questo de famlia.

    IHU On-Line Ento podemos dizer que na poltica do futebol a demo-cracia passa longe? dison Gastaldo Muito.

    IHU On-Line At o momento, qual sua avaliao da seleo de Dunga? dison Gastaldo Vimos pouco ainda. Cada jogo um jogo, essa a mxima do futebol. O primeiro jogo no serviu direito de parmetro. preciso pegar um time forte para vermos essa seleo jogando. A Coreia do Norte se colocou muito bem em campo. Considerando que estava enfrentando o Brasil, eles co-locaram oito jogadores na defesa. Onde um jogador brasileiro estava, tinha sete ou oito coreanos em volta. Foi um con-gestionamento na rea deles que impe-diu o Brasil de mostrar seu futebol. No vi o time brasileiro jogar, por mrito da Coreia, que soube amarrar o jogo. Eles entraram para deixar o placar em zero a zero. Se o jogo terminasse assim, po-deramos ter dito que a Coreia venceu de zero a zero, porque eles entraram em campo para no deixar o Brasil fazer ne-nhum gol. Tanto que o primeiro gol do Brasil foi sair quase na metade do segun-do tempo, numa jogada pelo lado, que no entrou pelo meio, foi um chute que deveria ter sido um cruzamento em qual-quer lgica do futebol. O goleiro estava no meio do gol esperando um cruzamen-to. Se fosse assim, a Coreia dominaria a bola e chutaria para fora da rea. Como ele fez algo inesperado, surpreendeu a defesa da Coreia. Uma vez que abriu o placar, a Coreia teve que sair mais para o jogo, para empatar. E da abriu espao para o Brasil fazer o segundo gol. Foi um jogo atpico. Para saber do que o time do Brasil capaz, precisamos v-lo jogar contra um time grande.

    membro do Comit Olmpico Internacional. Em 1998 ele foi eleito Presidente de Honra da FIFA , sendo tambm presidente de honra do Fluminense Football Club. (Nota da IHU On-Line)

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    Brasil: pas do futebol?Ftima Ferreira Antunes defende que a experincia de assistir a uma primeira Copa do Mundo vista como um marco na vida de um torcedor, uma experincia inicial de per-tencimento a algo maior, que ultrapassa a famlia e a escola

    Por grazieLa WoLfart

    Hoje est consolidada, no imaginrio popular, a ideia de que o Brasil o pas do futebol, de que os jogadores brasileiros so os melhores do mundo e de que os brasileiros tm um dom praticamente natural para esse esporte. Esse imaginrio, no entanto, re-sultado de um longo processo de construo, que passou pelo nacionalismo do perodo Vargas, pelo otimismo do ps-guerra e pela derrota de 1950, pelos ttulos mundiais de

    1958, 62 (que coincidiram com a euforia dos anos JK), pela Copa de 70 no contexto do milagre econmico, pela crise dos anos 1980, seguida de perto pelos 24 anos (entre 1970 e 1994) sem conquistar um novo ttulo. Imaginrio que est em permanente construo e reconstruo. A anlise da sociloga Ftima Ferreira An-tunes. Na entrevista que segue, concedida, por e-mail, IHU On-Line, ela explica que o que caracterizaria o brasileiro, pensando em termos de futebol, seria, sobretudo, gostar de futebol. Jogar como um brasileiro praticar o jogo bonito ou o futebol arte, enfrentar as dificuldades do jogo e da vida com ginga, jogo de cintura, e certa dose de molecagem, combinao de irreverncia e alegria.

    Ftima Ferreira Antunes doutora em Sociologia pela Universidade de So Paulo e sociloga do Departa-mento do Patrimnio Histrico da Secretaria de Cultura de So Paulo. autora do livro Com brasileiro no h quem possa! Futebol e identidade nacional (So Paulo: UNESP, 2004). Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Em que sentido o fute-bol influencia na formao da identi-dade nacional?Ftima Ferreira Antunes - No plano individual, o amor ao futebol costuma ser transmitido de pai para filho, de irmo para irmo, de tio para sobri-nho. quando se define a afinidade e a identidade por um determinado clu-be. O futebol desperta o sentimento de ns contra os outros. Essa iden-tidade despertada leva ao reconhe-cimento do outro como um igual ou como um rival. J a identificao com a seleo brasileira faz parte de ou-tro momento. A experincia de assis-tir a uma primeira Copa do Mundo vista como um marco na vida de um torcedor, uma experincia inicial de pertencimento a algo maior, que ul-trapassa a famlia e a escola. como se participssemos de um momento mgico: deixamos de ser botafoguen-ses, palmeirenses ou atleticanos para

    sermos, simplesmente, brasileiros.

    IHU On-Line - Qual a contribuio das ideias de Jos Lins do Rego, Mrio Fi-lho e Nelson Rodrigues para identifi-car o futebol como um dos elemen-tos mais importantes na construo do imaginrio popular?Ftima Ferreira Antunes - Esses cronis-tas atentavam para a originalidade das manifestaes populares em torno do futebol. Viam a paixo, a entrega, o so-frimento do torcedor e entendiam que tanto as derrotas quanto as vitrias ti-nham reflexos em outras esferas da vida. Os brasileiros eram o que eram dentro e fora de campo. O que estes cronistas fizeram foi difundir a ideia de que, ao ganhar autoconfiana por suas vitrias no futebol, o brasileiro tambm ficaria mais confiante em atuar em outras ati-vidades. Observando-se a atuao dos jogadores em campo, tomando como exemplo a seleo brasileira, seria pos-

    svel apontar os erros do brasileiro em geral e, a partir de sua conscientizao, promover a superao desses erros.

    IHU On-Line - A partir do futebol, o que significa ser brasileiro?Ftima Ferreira Antunes - H certas ideias que se tornaram senso comum. O que caracterizaria o brasileiro, pen-sando em termos de futebol, seria, sobretudo, gostar de futebol. Jogar como um brasileiro praticar o jogo bonito ou o futebol arte, enfren-tar as dificuldades do jogo e da vida com ginga, jogo de cintura, e cer-ta dose de molecagem, combinao de irreverncia e alegria.

    IHU On-Line - O que caracteriza o discurso de Jos Lins do Rego, Mrio Filho e Nelson Rodrigues acerca do futebol?Ftima Ferreira Antunes - Tanto Nel-son Rodrigues 1quanto o irmo Mrio

    1 Nelson Falco Rodrigues (1912-1980): dra-

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    Filho2, nas crnicas que publicaram em jornais e revistas nos anos 50, tenta-vam identificar as razes do insucesso brasileiro. Suas anlises convergiam, entre outras coisas, para o complexo de vira-latas de que sofria o brasi-leiro de modo geral e, por extenso, a seleo brasileira. O complexo de vira-latas, para Nelson, nada mais era do que o complexo de inferiorida-de que o brasileiro sentia em relao a outras nacionalidades. Mrio usava o termo complexo de ser brasileiro, mas com o mesmo sentido. Esse sen-timento estaria associado ao fato do brasileiro ser um povo miscigenado e de se ver como uma raa indefini-da. O sentimento de inferioridade se manifestava em momentos cruciais e nos fazia vacilar, nos deixava ap-ticos, como no jogo contra o Uruguai na Copa de 50. Mas os cronistas insis-tiram em mostrar o lado positivo da miscigenao. Viam em Garrincha3 o exemplo mximo da novidade da ex-perincia racial brasileira: da fuso do negro com o ndio nascera um sujei-to feio, torto e, no entanto, genial, nico, no qual anteviam o sucesso da seleo antes da Copa de 58. Nelson tambm associava o complexo de vira-latas a um sentimento tpico de povos subdesenvolvidos. Os ter-mos desenvolvimento e subdesenvol-vimento ocupavam lugar de destaque nas teorias econmicas em debate nos anos 50 e 60, dcadas marcadas pela Guerra Fria e pela diviso das naes entre capitalistas e socialistas aps a Segunda Guerra Mundial. Jos Lins do Rego4 insistia na identificao do fu-tebol como um importante fenmeno cultural. Assistindo a uma partida de

    maturgo, jornalista e escritor brasileiro. (Nota da IHU On-Line)2 Mrio Rodrigues Filho (1908-1966): jorna-lista e escritor brasileiro. (Nota da IHU On-Line)3 Manuel Francisco dos Santos (Man Garrin-cha 1933-1983): jogador de futebol que se notabilizou por seus dribles desconcertantes apesar do fato de ter suas pernas tortas. considerado um dos maiores jogadores da his-tria desse esporte em todos os tempos. Foi um dos heris da conquista da Copa do Mundo de 1958 e, principalmente, da Copa do Mundo de 1962 quando, aps a contuso de Pel, se tornou o principal jogador do time brasileiro. (Nota da IHU On-Line)4 Jos Lins do Rego Cavalcanti (1901-1957): escritor brasileiro, autor de, entre outros Ria-cho doce. (Nota da IHU On-Line)

    futebol e acompanhando as diferentes reaes dos jogadores em campo, con-forme sua nacionalidade, seria poss-vel captar o retrato psicolgico de um povo.

    IHU On-Line - Como descrever o imaginrio popular sobre o futebol hoje?Ftima Ferreira Antunes - Hoje est consolidada, no imaginrio popular, a ideia de que o Brasil o pas do fu-tebol, de que os jogadores brasileiros so os melhores do mundo e de que os brasileiros tm um dom praticamen-te natural para esse esporte. Esse imaginrio, no entanto, resultado de um longo processo de construo, que passou pelo nacionalismo do perodo Vargas5, pelo otimismo do ps-guerra

    5 Getlio Dornelles Vargas (1882-1954): po-ltico gacho, nascido em So Borja. Foi pre-sidente Repblica nos seguintes perodos: 1930-1934 (Governo Provisrio), 1934-1937 (Governo Constitucional), 1937-1945 (Regime de Exceo), 1951-1954 (Governo eleito po-pularmente). Sobre Getlio o IHU promoveu o Seminrio Nacional A Era Vargas em Questo 1954-2004, realizado de 23 a 25 de agosto de 2004. Paralela ao evento aconteceu a Expo-sio Eu Getlio, Ele Getlio, Ns Getlios, no Espao Cultural do IHU. A revista IHU On-Line publicou os seguintes materiais referentes a Vargas: edio 111, de 16-08-2004, intitulada A Era Vargas em Questo 1954-2004, dispon-vel em http://migre.me/QYAi, e a edio 112, de 23 -08-2004, chamada Getlio, disponvel em http://migre.me/QYBn. Na edio 114, de 06-09- 2004, em http://migre.me/QYCb, Da-niel Aaro Reis Filho concedeu a entrevista O desafio da esquerda: articular os valores de-mocrticos com a tradio estatista-desenvol-vimentista, que tambm abordou aspectos do poltico gacho. Em 26-08-2004 o Prof. Dr. Ju-remir Machado da Silva, da PUCRS, apresentou o IHU Ideias Getlio, 50 anos depois. O even-to gerou a publicao do nmero 30 dos Ca-dernos IHU Ideias, chamado Getlio, romance ou biografia?, tambm de autoria de Juremir, disponvel em http://migre.me/QYDR. Vale destacar o Cadernos IHU em formao nme-

    e pela derrota de 1950, pelos ttulos mundiais de 1958, 62 (que coincidiram com a euforia dos anos JK6), pela Copa de 70 no contexto do milagre econmi-co, pela crise dos anos 1980, seguida de perto pelos 24 anos (entre 1970 e 1994) sem conquistar um novo ttulo. Imaginrio que est em permanente construo e reconstruo.

    IHU On-Line - Qual a principal con-tribuio dos textos desses escrito-res enquanto documentos histricos para o processo de construo da identidade nacional?Ftima Ferreira Antunes - As crnicas de futebol de Nelson Rodrigues, Ma-rio Filho e Jos Lins do Rego, toma-das como documentos histricos, so importantes por registrarem a cons-tituio de ideias sobre o Brasil e os brasileiros, as preocupaes e os sen-timentos mais candentes entre os anos 50 e 60. O Brasil tentava encontrar o seu lugar no cenrio internacional. As Copas do Mundo se apresentavam como momentos especiais para os cronistas refletirem sobre o carter nacional, sobre a identidade nacional. Nesses momentos, o sentimento de pertenci-mento a uma comunidade despertava de modo bem diferente.

    IHU On-Line - Qual a importncia de revisitar o passado do futebol para verificar como ele ecoa no presente e traa elos entre o futebol atual e a brasilidade? Ftima Ferreira Antunes - A leitura dessas antigas crnicas nos permite desvendar a origem de certos senti-mentos ou de modos de pensar o brasi-leiro ainda em formao. Descobre-se a origem de sentimentos e ideias que j esto consolidadas e o contexto e/ou circunstncias em que foram geradas.

    ro 1, publicado pelo IHU em 2004, intitulado Populismo e Trabalho. Getlio Vargas e Leo-nel Brizola, disponvel em http://migre.me/QYEE. (Nota da IHU On-Line)6 Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976): mdico e poltico brasileiro, conhecido como JK. Foi presidente do Brasil entre 1956 e 1961, sendo o responsvel pela construo de Braslia, a nova capital federal. Sobre JK, confira a edio 166, de 28-11--2005, A imagi-nao no poder. JK, 50 anos depois, disponvel para download em http://migre.me/qkeQ. (Nota da IHU On-Line)

    As Copas do Mundo

    se apresentavam como

    momentos especiais para

    os cronistas refletirem

    sobre o carter nacional,

    sobre a identidade

    nacional

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    O Brasil no to poderoso quanto o futebol nacionalPara o jornalista Nando Gross, o primeiro esporte nacional o futebol, o segundo aque-le onde algum brasileiro tem chances de vitria

    Por grazieLa WoLfart

    Em entrevista concedida, por e-mail, para a IHU On-Line, o jornalista Nando Gross defende que o futebol contribui no sentido de dar a todos os brasileiros uma maior autoestima. Quando a seleo brasileira est jogando, todos se envolvem, at mesmo quem no gosta de futebol. um processo de unio nacional em torno de uma causa. No dia-a-dia, o futebol sempre motivo para um bom papo ou, infelizmente, para muitas brigas. No entanto, ele alerta: tentar utilizar o futebol para

    fins de identidade nacional sempre algo perigoso, cheira a manipulao e fbrica de iluses. O Brasil no to poderoso quanto o futebol nacional. E dispara: no futebol valem os mesmos valores morais e ticos do que em qualquer outra ocasio.

    Luis Fernando Moretti Gross formado em Jornalismo pela PUCRS e comentarista esportivo da Rdio Gacha de Porto Alegre, RS. Confira a entrevista.

    IHU On-Line - No seu blog, voc dei-xa claro que o assunto preferido no Brasil futebol. O que justifica a preferncia, em geral, do brasileiro por esse esporte? Nando Gross - O futebol o primeiro esporte de vrios pases, especialmen-te no continente europeu. Os brasi-leiros sempre foram apaixonados por futebol, mas isto aumentou na medida em que nossos jogadores conseguiram se impor nas copas de 1958 e 1962. O brasileiro torce por quem tem chances de vitria. Como, no futebol, somos o que existe de melhor, a popularidade aumenta ainda mais. Na Frmula-1, quando temos algum para realmente vencer, todos torcem euforicamente, no por nada que Ayrton Senna1 con-quistou o corao de todos. Foi assim no tnis, com Guga2; no vlei, desde que passamos a ter um time vence-

    1 Ayrton Senna da Silva (1960-1994): piloto brasileiro de Frmula 1, trs vezes campeo mundial, nos anos de 1988, 1990 e 1991. Foi tambm vice-campeo no controverso campe-onato de 1989 e em 1993. Morreu em acidente no Autdromo Enzo e Dino Ferrari, em mola, durante o Grande Prmio de San Marino de 1994. (Nota da IHU On-Line)2 Gustavo Kuerten (1976): conhecido como Guga, um ex-tenista profissional brasileiro, considerado o maior nesse esporte da histria do pas. (Nota da IHU On-Line)

    dor; na natao, mais recentemente com Csar Cielo3; enfim: o primeiro esporte nacional o futebol, o segun-do aquele onde algum brasileiro tem chances de vitria.

    IHU On-Line - Como caracterizar a paranoia Grenal? Nando Gross - A rivalidade saud-vel, a paranoia no. Os clubes perdem patrocinadores e dinheiro com isso. Quando um deles faz alguma promo-o, obrigado a convidar o rival, caso contrrio, ningum quer patroci-nar, com medo de represlias. Sem fa-lar no processo de idiotizao que o fanatismo impe em algumas pessoas, que passam a agir de forma agressiva e perdem por completo o contato com a terra. Vejo pessoas que se compor-tam, no ambiente do futebol, de uma forma como jamais fariam em outros ambientes. O termo paranoia j deixa claro o quanto isto ruim.

    3 Csar Augusto Cielo Filho (1987): nadador brasileiro, campeo olmpico dos 50 metros li-vre nos Jogos Olmpicos de Pequim, em 2008, campeo e recordista mundial dos 100 metros livres e campeo mundial dos 50 metros livres em Roma, em 2009. Ganhou trs medalhas de ouro e uma medalha de prata nos Jogos Pana-mericanos de 2007, no Rio de Janeiro. (Nota da IHU On-Line)

    IHU On-Line - Qual a peculiaridade do futebol gacho atual? Como a cultura do povo gacho se relaciona com a forma dos rio-grandenses viverem o futebol? Nando Gross - Os gachos curtem o futebol da mesma forma que todos os brasileiros, no h grandes diferenas. Podemos apenas salientar que, por termos um estado dividido pela paixo entre dois clubes, a rivalidade maior porque um contra o outro. Grmio e Inter tm pouqussimos jogadores nascidos no Rio Grande do Sul em seus elencos. O estilo gacho depende do treinador em questo e das caracters-ticas dos jogadores em atividade.

    IHU On-Line - Em uma entrevista re-cente, o ex-jogador Scrates asso-ciou a conduo de Dunga na seleo com o fato de ele ser gacho, e fez uma conexo entre o conservadoris-mo do time e as origens do tcnico. Isso tem fundamento? Nando Gross - Pobre do filsofo Scra-tes4, o ex-jogador nada tem em comum

    4 Scrates (470 a. C. 399 a. C. ): filsofo ateniense e um dos mais importantes cones da tradio filosfica ocidental. Scrates no valorizava os prazeres dos sentidos, todavia escalava o belo entre as maiores virtudes, jun-to ao bom e ao justo. Dedicava-se ao parto

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    com ele. Teramos de discutir o que conservadorismo. Seriam conservado-res os gachos que se insurgiram contra o imprio na Guerra dos Farrapos5, ou na campanha da legalidade, ou quando sediaram o Frum Social Mundial6 para combater a turma de Davos? Os ga-chos foram os primeiros a experimen-tar um governo do PT, e o primeiro es-tado a aceitar o atual presidente Lula. Mas toda generalizao burra, um erro achar que todo o gacho isto ou aquilo. Scrates no faz a menor ideia do que disse, no saberia desenvolver o assunto. At para criticar o tcnico da seleo, ele se atrapalha com as pala-vras. Jogou bem futebol, mas ficamos por a, no d para levar muito a srio o que ele fala.

    IHU On-Line - Os gachos so os mais reacionrios ou so vistos de manei-ra diferente pelos outros? Nando Gross - Os gachos so brasi-leiros como todos os demais, com suas caractersticas e estilos prprios de quem convive com o frio e na ponta do pas. Porto Alegre uma capital de vanguarda e no tem nada de reacio-nria. Os baianos so diferentes dos cariocas, que so diferentes dos pau-listas, que so diferentes dos minei-ros, que so diferentes dos baianos. O Brasil um pas continental, com diversas culturas, e, por isso, ele to fascinante.

    IHU On-Line - Em que medida o fu-tebol contribui para a formao da identidade nacional? Nando Gross - Contribui no sentido

    das ideias (Maiutica) dos cidados de Atenas. O julgamento e a execuo de Scrates so eventos centrais da obra de Plato (Apologia e Crton). (Nota da IHU On-Line)5 Revoluo Farroupilha: Tambm conhecida como Guerra dos Farrapos. Conflito separatis-ta ocorrido entre 1835 e 1845 na ento Provn-cia do Rio Grande do Sul, alcanando a regio de Santa Catarina, na regio Sul do Brasil. poca do perodo regencial brasileiro, o termo farrapo era pejorativamente imputado aos li-berais pelos conservadores (chimangos) e com o tempo adquiriu uma significao elogiosa, sendo adotado com orgulho pelos revolucion-rios, de forma semelhante que ocorreu com os sans-cullotes poca da Revoluo France-sa. (Nota da IHU On-Line)6 Sobre o tema, confira a edio 129 da Re-vista IHU On-line, de 02-01-2005, intitulada Frum Social Mundial: indagaes de um novo sculo, disponvel em www.unisinos.br/ihu. (Nota da IHU On-Line)

    de dar a todos uma maior autoestima. Quando a seleo brasileira est jogan-do, todos se envolvem, at mesmo quem no gosta de futebol. um processo de unio nacional em torno de uma causa. No dia-a-dia, o futebol sempre moti-vo para um bom papo ou, infelizmente, para muitas brigas. Mas ele contribui na medida do esporte, no o fundamen-tal. Tentar utilizar o futebol para fins de identidade nacional sempre algo pe-rigoso, cheira a manipulao e fbrica de iluses. O Brasil no to poderoso quanto o futebol nacional.

    IHU On-Line - Podemos afirmar que o futebol contribui para determinar o carter e a ao das pessoas? Nando Gross - Com certeza. J achei que conhecia algumas pessoas, e, quando me deparei com elas envolvi-das numa causa futebolstica, fiquei surpreso. A paixo clubstica leva pes-soas de bem a agirem como verda-deiros animais muitas vezes. J perdi alguns amigos simplesmente porque no tinha a mesma opinio que eles. O futebol passa s pessoas uma sen-sao de impunidade, tipo: no futebol vale tudo, hora de extravasar. No assim, no futebol valem os mesmos va-lores morais e ticos do que em qual-quer outra ocasio.

    IHU On-Line - Quais os desafios de ser comentarista no futebol gacho? Nando Gross - O maior desafio a paranoia Gre-Nal. Qualquer opinio sua que desagrade um torcedor, o mais comum se ouvir: est dizendo isso porque gremista ou colorado. sem-pre esta simplificao. Alm disso, por termos apenas dois clubes de massa, o torcedor cobra que voc fale sem-pre sobre este assunto. Na Gacha, comando o Sala de Domingo, progra-ma de debates uma hora da tarde. Costumamos sair da dupla e falar de futebol em geral. Sempre h quem re-clame. Mas quem vai comentar futebol precisa ter a clara medida de que est se metendo em algo muito delicado. Criticar o time de algum como falar de um parente muito prximo, aquela histria, voc pode criticar seu filho ou sua me, mas no gosta que ningum critique. No diferente no futebol, e preciso saber lidar com isto.

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  • SO LEOPOLDO, 21 DE JUNHO DE 2010 | EDIO 334 15

    Aqui, no Rio Grande do Sul, no existe amor pela seleo brasileira. Aqui se ama o Grmio e se ama o Internacional Para o jornalista esportivo gacho Fabiano Baldasso, a rivalidade da dupla Gre-Nal deve ser preservada, sem clima amistoso entre Grmio e Internacional. Tem que ser cada um do seu lado, sem violncia, mas de vez em quando com alguma provocao, defende

    Por grazieLa WoLfart e Patricia facHin

    Somos um estado de dualidades: maragatos e chimangos, PT e anti-PT. Sempre fomos as-sim. Temos dois lados no Rio Grande do Sul. Ou estamos de um ou estamos de outro. No caso da dupla Gre-Nal, isso absolutamente representativo. Dentro dessas dualidades importantes, a rivalidade da dupla Gre-Nal a principal do Rio Grande do Sul. Aqui, no estado, ou se torce para Inter ou para Grmio, e quem disser algo diferente disso est

    mentindo. (...) A maior rivalidade do futebol brasileiro certamente a do futebol gacho. A afirmao do jornalista esportivo gacho Fabiano Baldasso, na entrevista que concedeu, por telefone, IHU On-Line. Ele confessa que tem muito orgulho de ser jornalista esportivo no Rio Grande do Sul. Pelo que a dupla Gre-Nal e pelas suas conquistas, e, especialmente, pela prpria caracterstica da imprensa gacha, que forte, que cobra bastante, e tem a ver com a forte rivalidade que temos aqui.

    Reprter e apresentador, graduado em Jornalismo pela Unisinos, Fabiano Baldasso jornalista esportivo da Band/RS desde 2009. Na Rdio Bandeirantes, apresenta os programas Atualidades Esportivas e Jogo Aberto, e coordenador de esportes. Na TV, participa do Jogo Aberto RS. Antes, trabalhou na Rdio Ga-cha, onde ingressou, em 1996, como estagirio e, dois anos depois, passou a reprter, alm de apresentar os programas Sbado Esporte e Pr-Jornada. Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Qual a peculiaridade do futebol gacho atual? Como a cultura do povo gacho se relaciona com sua forma de viver o futebol? Fabiano Baldasso Para caracterizar diferenas do futebol gacho em re-lao a, por exemplo, o futebol que praticado no resto do pas, no s no que acontece dentro do campo, mas na sua organizao, temos que esta-belecer algumas ressalvas. No sou daqueles que acha que, no Rio Grande do Sul, se faz um futebol totalmente diferente de outras regies do pas. um pouco de presuno do gacho pensar dessa forma. O Inter e o Gr-mio precisam de bons jogadores para executar um bom futebol, como qual-quer outro time. No Rio Grande do Sul, temos uma paixo maior pelos nossos clubes. Basta ver que, at mesmo em perodo de

    Copa do Mundo, a ateno dos tor-cedores do estado continua muito mais voltada para o Grmio e para o Inter-nacional do que propriamente para a seleo. Isso uma particularidade e uma diferena que aumenta a respon-sabilidade da dupla Gre-Nal. Aquela discusso de que o futebol gacho mais aguerrido se perdeu um pouco com o tempo. Temos grandes times que foram vencedores, que eram ti-mes bem organizados, com bons joga-dores. Basta ver que um dos jogadores mais habilidosos surgidos no Brasil nos ltimos 30 anos - que no tem nada a ver com pancadaria, com raa, mas tem a ver com qualidade Ronaldi-nho Gacho1. Ento, as particularida-

    1 Ronaldo de Assis Moreira (Ronaldinho Ga-cho ou Ronaldinho - 1980): futebolista brasilei-ro que atua como meia-atacante. Atualmente, joga pelo Milan. (Nota da IHU On-Line)

    des do futebol gacho so restritivas.

    IHU On-Line - Quais os principais pontos que marcam a trajetria his-trica do futebol gacho? Fabiano Baldasso Existem vrios pon-tos importantes na histria do futebol gacho que o tornam especial. No cito apenas a dupla Gre-Nal. Se fizermos uma recuperao histrica, veremos que o Cruzeiro de Porto Alegre, que subiu para a primeira diviso esta semana, sendo um time que fez uma excurso na d-cada de 50 pela Europa e empatou com o Real Madrid, teremos um confronto absolutamente emblemtico em 1972, no Beira Rio, em que a seleo brasileira empatou com a seleo gacha em 3 x 3, com o estdio lotado, e todos curio-samente no estavam torcendo para a seleo brasileira, e sim para a seleo gacha. Tanto que esta estava encami-

  • 16 SO LEOPOLDO, 21 DE JUNHO DE 2010 | EDIO 334

    nhando uma vitria e foi feito um acordo no intervalo para que a seleo gacha deixasse empatar o jogo. Esse um mo-mento emblemtico no que diz respeito nossa paixo pelo futebol no Rio Gran-de do Sul. E da temos a histria de ttu-los da dupla Gre-Nal. Temos o Interna-cional conquistando o Brasil em 1975, a primeira conquista de maior expresso no futebol gacho; tem o ttulo invicto do Inter em 1979, no campeonato brasi-leiro, que nunca mais, certamente, vai se repetir; tem o Grmio conquistando o mundo em 1983, e isso abriu para o fute-bol gacho e brasileiro uma fora maior na prpria Libertadores da Amrica, tan-to que o Internacional lutou muito nos anos seguintes para conquistar essa Li-bertadores, que s veio conquistar em 2006; tem o time do Felipo2, do Grmio de 1995, que era tido por muitos como um time violento, mas que, na verdade, era um time de muita qualidade e s por isso foi campeo das competies em que participou. Temos figuras do futebol gacho que so emblemticas, como o Ronaldinho Gacho, o Falco3, que inclu-sive no gacho, catarinense, mas representativo do futebol gacho como um jogador de absoluta finesse no fute-bol, que jogava de cabea erguida e tido como exemplo por muitos at hoje.

    IHU On-Line - Como definir a rivalida-de entre Grmio e Internacional? O que caracteriza esse duelo futebols-tico e como isso acaba passando para outros setores da sociedade, que transcendem o cenrio esportivo?

    2 Luiz Felipe Scolari (1948): mais conhecido como Felipo, um ex-futebolista e treinador brasileiro que atuou como zagueiro. Atual-mente treinador do Palmeiras. Foi campeo do mundo de futebol como tcnico da Seleo Brasileira em 2002 na Copa do Mundo do Japo e Coreia do Sul. (Nota da IHU On-Line)3 Paulo Roberto Falco (1953): ex-futebolista brasileiro. Jogou no meio-campo do Interna-cional de Porto Alegre na dcada de 1970; era, tecnicamente, um volante, mas jogava avan-ado e marcou muitos gols, comandando o Internacional na campanha das conquistas do campeonato brasileiro de 1975-1976 e 1979, alm de ter ganho cinco estaduais (1973, 1974, 1975, 1976 e 1978). Jogador de tcni-ca brilhante e de estilo clssico e elegante, considerado at hoje um dos maiores dolos da histria do clube. Atua como comentarista esportivo da Rede Globo e na Rdio Gacha, num programa semanal de entrevistas, alm de ser comentarista esportivo no canal fecha-do Sportv. (Nota da IHU On-Line)

    Fabiano Baldasso Totalmente trans-cende o cenrio esportivo. Somos um estado de dualidades: maragatos e chi-mangos, PT e anti-PT. Sempre fomos assim. Temos dois lados no Rio Grande do Sul. Ou estamos de um ou estamos de outro. No caso da dupla Gre-Nal, isso absolutamente representativo. Dentro dessas dualidades importantes, a rivalidade da dupla Gre-Nal a prin-cipal do Rio Grande do Sul. Aqui, no estado, ou se torce para Inter ou para Grmio, e quem disser algo diferente disso est mentindo. Existem vrios jornalistas esportivos que dizem torcer para o Cruzeiro ou que nunca tiveram time. Que nada. Todos, um dia, tiveram time, todos, um dia, torceram para o Inter ou para o Grmio. Tanto que, aqui no estado, qualquer jornalista esporti-vo que frequenta estdio de futebol decidir abrir o time para o qual torce no consegue mais trabalhar do outro lado. Isso s ns temos. A maior rivali-dade do futebol brasileiro certamente a do futebol gacho. Temos outros estados com a dualidade, mas no uma rivalidade to forte. Por exemplo, em Minas Gerais, temos o Atltico Mi-neiro e o Cruzeiro, que so duas gran-des equipes, os dois maiores clubes do estado. Mas, esses tempos, um deles ganhou de cinco a zero do outro e foi tratado como um resultado expressivo, mas, no outro dia, estava esquecido. Aqui, no Rio Grande do Sul, se d cinco a zero para o Inter ou para o Grmio num clssico Gre-Nal, no outro dia, cai a direo, cai o tcnico e caem os jo-gadores do time que perdeu; acontece uma hecatombe no Rio Grande do Sul. A rivalidade da dupla Gre-Nal deve ser preservada. E aqui no falo de violn-cia. Porque ns temos alguns setores de torcidas organizadas que acham que

    rivalidade isso, e no . Mas tambm acho que no se deve ter um clima ab-solutamente amistoso entre Grmio e Internacional. Tem que ser cada um do seu lado, sem violncia, mas, de vez em quando, com alguma provocao. Essa histria de que o Grmio est de-cidindo um campeonato, ento eu que sou colorado vou torcer para o Grmio porque o futebol do Rio Grande do Sul algo que no existe, e quando existir aqui no estado acaba a rivalidade.

    IHU On-Line - Quais as principais marcas deixadas em voc nas cober-turas de tantos Gre-Nais? Fabiano Baldasso Existem vrias. Sou jornalista esportivo desde 1996. Sem dvida, a primeira principal marca de um clssico Gre-Nal que eu cobri foi o jogo dos cinco a dois, em 1997, em que o Internacional venceu o Grmio por uma goleada no estdio Olmpico. Existem outros Gre-Nais importantes, em que o Grmio ganhou. Lembro de uma sequncia forte do Internacional de vitrias em clssicos. No ano de 2003, em que o Grmio corria o risco de cair para a segunda diviso, e o Inter tinha um time fantstico naquele ano, e o Grmio conseguiu vencer o clssico Gre-Nal com gol do Christian. Foi um momento emblemtico, mostrando que, no Gre-Nal, as foras se igualam. J estive em coberturas de ttulos im-portantes da dupla Gre-Nal e que fo-ram marcantes, como a conquista do Grmio da Copa do Brasil de 1997, ou do Internacional na Libertadores e no Mundial de 2006. Tenho muito orgulho de ser jornalista esportivo no Rio Gran-de do Sul. Pelo que a dupla Gre-Nal e pelas suas conquistas, e especialmente pela prpria caracterstica da imprensa gacha, que forte, que cobra bastan-te, e tem a ver com a forte rivalidade que temos aqui.

    IHU On-Line - Como entender a pai-xo do brasileiro pelo futebol?Fabiano Baldasso porque gostar de futebol de graa. Assistir futebol no . Mas bater uma bola com os amigos de graa. O povo brasileiro, que sempre foi sofrido, teve uma espcie de escape no esporte. E o nosso esporte foi o fute-bol desde sempre. Os ingleses que inven-

    Ser brasileiro e

    ser amante do futebol

    so coisas que se

    confundem pelo que

    significa o futebol para

    nossa nao

  • SO LEOPOLDO, 21 DE JUNHO DE 2010 | EDIO 334 1

    taram o futebol no o amam tanto quan-to o brasileiro. Isso acabou se tornando uma bola de neve, porque foram surgin-do grandes jogadores, que serviram de exemplo para crianas, que quiseram se tornar grandes jogadores tambm e, com isso, temos uma renovao interminvel no futebol brasileiro. E como conquista-mos ttulos importantes em nvel inter-nacional, nosso futebol continua sendo exemplo para essa meninada que segue apaixonada pelo esporte. Ser brasileiro e ser amante do futebol so coisas que se confundem pelo que significa o futebol para nossa nao.

    IHU On-Line - Em que medida o fu-tebol contribui para a formao da identidade nacional?Fabiano Baldasso Totalmente. Lem-bro que, em 1994, foi feita uma pes-quisa sobre a felicidade do povo bra-sileiro. Depois de vrios anos em que o brasileiro no se colocava como um povo feliz, naquele ano de 1994, em que o Brasil tinha reconquistado o t-tulo mundial com a Copa do Mundo, o brasileiro se considerou um povo feliz. Se o futebol tem a capacidade de fazer com que qualquer brasileiro, de qualquer canto do pas, possa dizer neste ano eu fui feliz porque a minha seleo foi campe do mundo, ele j se justifica. A algum pode dizer que isso para fugir dos problemas, um escape. Isso no me interessa. Se a pessoa se considera feliz por causa do futebol porque o futebol j se justifi-ca por isso. Outra coisa: futebol uma fonte de empregos. Quantas pessoas, no Brasil, so envolvidas com futebol? Temos aquela imagem da meia dzia de jogadores dos grandes clubes que ganham R$ 200 mil ou R$ 300 mil. Mas quantos salrios mnimos ganham mui-tos e muitos jogadores de futebol por qualquer canto do pas e se sustentam pelo futebol? E no s o jogador. o cara que cuida do gramado, o que cuida das finanas do clube. Em todos os cantos, existe algum envolvido com o futebol, ganhando dinheiro com o esporte e, muitas vezes, sustentan-do-se com ele. O futebol refletido em todo e qualquer canto deste pas, em toda e qualquer sociedade, seja a mais pobre, a classe mdia, ou a rica.

    IHU On-Line - Quais as principais di-ferenas na relao do torcedor bra-sileiro com a seleo (principalmente agora, em poca de Copa do Mundo) e com seus times do corao? Fabiano Baldasso Temos algo, no Rio Grande do Sul, que est embutido na cabea de muitas pessoas - eu at nem concordo com isso - que a histria da Repblica do Pampa. Existe um senti-mento, aqui no estado, de que ns somos diferentes do resto do Brasil, que somos uma ptria diferente dentro de outra ptria, por isso, a relao com a sele-o brasileira complemente diferente do resto do pas. Aqui, no Rio Grande do Sul, no existe amor pela seleo brasi-leira. Aqui se ama o Grmio ou se ama o Internacional. possvel que a maioria tora, de alguma forma, para a seleo durante a Copa do Mundo, mas tambm possvel que muitos no toram para a seleo brasileira, ou at sequem a seleo por considerarem que o Grmio e o Internacional so muito mais impor-tantes. E, no resto do pas, vamos perce-bendo algumas diferenas. Por exemplo, no Rio de Janeiro, neste momento, em meio Copa do Mundo, h ruas fecha-das, pintadas de verde e amarelo, com as pessoas parando para torcer para a seleo brasileira. No nordeste, aconte-ce da mesma forma. Quanto mais para o sul se chega, isso vai diminuindo. Mas tambm, em Santa Catarina e Paran, se torce bastante para a seleo brasileira. Agora, no Rio Grande do Sul, se torce pouco.

    IHU On-Line Qual sua avaliao de Dunga na conduo da seleo bra-sileira?

    Fabiano Baldasso Eu sou gacho, e o Dunga4 no est me representando na seleo brasileira. Porque se ser ga-cho ser mal-educado, eu no quero ser representando dessa forma. Dunga tem algumas coisas positivas e muitas coisas negativas no comando tcnico da seleo brasileira. E estou falando isso em meio a uma Copa do Mundo, em que ele pode ser campeo. No vou mudar minha opinio nem se ele for campeo do mundo. Vejo no Dunga um tcnico inexperiente, que est fazendo um tra-balho de razovel para bom e que est buscando o ttulo. Dunga no entende que existem algumas situaes na vida em que precisamos ser polticos. Ele no tem essa inteno e considera uma qua-lidade no ser poltico. Eu considero um defeito. Quem tcnico da seleo bra-sileira, no momento em que est dando uma entrevista, como treinador, deixa de ser simplesmente um profissional de futebol. Ele passa a ser o embaixador do Brasil no planeta Terra. E isso Dunga no conseguiu entender. Essa briga do Dunga com a imprensa no serve para ele e fica feio, porque se foi o tempo em que o Dunga apenas ficava bravo quando sofria crticas que considerava injustas. Dunga simplesmente abriu uma guerra contra a imprensa. E o torcedor no quer sa-ber disso. Ele est pouco preocupado se Dunga est prejudicando a imprensa ou vice-versa. Ele extrapolou todos os limi-tes. Foi mal-educado, grosseiro, desres-peitou a figura dos jornalistas. Ele no estava preparado para ser tcnico da seleo brasileira justamente por no estar preparado para sofrer presso. Tcnico da seleo brasileira vai sofrer presso e ser criticado 24 horas por dia. Se no estiver preparado para isso, vai fazer outra coisa na vida: vai ser caixa de banco, que uma profisso admir-vel, mas que no sofre presso nenhu-ma. Acho que o Dunga podia pensar nisso para a sequncia.

    4 Carlos Caetano Bledorn Verri (Dunga - 1963): treinador e ex-futebolista brasileiro que atuava como volante. Atualmente, dirige a Seleo Brasileira. Como jogador, sua maior conquista foi a Copa do Mundo de 1994, dispu-tada nos Estados Unidos, sendo o capito da equipe. Como treinador, teve sua nomeao para ser o tcnico do Brasil em 24 de julho de 2006, conquistando at ento a Copa Amrica de 2007 e a Copa das Confederaes de 2009. (Nota da IHU On-Line)

    O futebol refletido

    em todo e qualquer

    canto deste pas, em

    toda e qualquer

    sociedade, seja a mais

    pobre, a classe mdia,

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  • 18 SO LEOPOLDO, 21 DE JUNHO DE 2010 | EDIO 334

    Jogadores excepcionais tendem a fazer jogadas brasileirasPara Ronaldo Helal, o Brasil ainda o pas do futebol, mas outras coisas no pas tambm esto dando certo

    Por grazieLa WoLfart, Mrcia Junges e Patricia facHin

    Com a globalizao, o professor Ronaldo Helal considera que a relao do brasileiro com a seleo brasileira mudou. Essa relao ainda forte, mas menor do que h 30 anos. Se voc pergun-tar para os torcedores se eles torcem mais para seus times locais ou para a seleo brasileira, a pesquisa ir tender para os times locais. Essa mudana se deve globalizao, ao fato de muitos jogadores brasileiros jogarem na Europa, explica. Na entrevista que concedeu, por telefone,

    IHU On-Line, Helal acrescenta que hoje tambm existe o fenmeno da desterritorializao do dolo. Jo-gadores muito jovens saem do Brasil muito cedo (...) e ficam pouco tempo nos seus clubes. Ento, forma-se uma seleo com pouca identificao. Antigamente, era possvel identificar a que time cada jogador estava vinculado. Hoje, isso no existe mais. Para Ronaldo Helal, muito perigosa a equao misria = grande futebol. Se voc me convencer que o grande futebol nasce da misria, eu iria preferir que o Brasil no ti-vesse grande futebol e nem miserveis. H uma falcia nessa questo que as pessoas no percebem, nem o jornalista, porque, se voc estender esse argumento, acaba defendendo a pobreza.

    Ronaldo Helal professor da Faculdade de Comunicao Social da Universidade Estadual do Rio de Janei-ro - UERJ e autor de Passes e Impasses: Futebol e Cultura de Massa no Brasil (Petrpolis: Vozes, 1997) e A Inveno do Pas do Futebol: Mdia, Raa e Idolatria (Rio de Janeiro: Mauad, 2001). Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Qual o nexo que une mdia, raa e idolatria na perspectiva do futebol?Ronaldo Helal Houve um momento, na histria do Brasil, em que no havia uma identidade nacional definida. Co-meou-se a tentar buscar uma identi-dade nacional, primeiro, em 1922, com a Semana de Arte Moderna1, em So Paulo, e, depois, a partir da dcada de 1930, com o nacionalismo de Getlio Vargas, o Estado Novo, o projeto inte-gracionista deste governo, e com novas

    1 Semana de Arte Moderna: tambm chama-da de Semana de 22, ocorreu em So Paulo nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro daquele ano, no Teatro Municipal. Representou uma verdadeira renovao de linguagem, na busca de experi-mentao, na liberdade criadora da ruptura com o passado e at corporal, pois a arte pas-sou ento da vanguarda para o modernismo. Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mrio de An-drade, Oswald de Andrade, Vctor Brecheret, Plnio Salgado, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Guilherme de Almeida, Srgio Milliet, Heitor Villa-Lobos, Tarsila do Amaral, Tcito de Almeida, Di Cavalcanti entre outros. (Nota da IHU On-Line)

    formas de conceituar o pas a partir da obra de Gilberto Freyre2, Casa Grande e Senzala, e de Srgio Buarque de Ho-landa3, Razes do Brasil. At a dcada

    2 Gilberto Freyre (1900-1987): escritor, pro-fessor, conferencista e deputado federal. Colaborou em revistas e jornais brasileiros. Foi professor convidado da Universidade de Stanford (EUA). Recebeu vrios prmios por sua obra, entre os quais, em 1967, o prmio Aspen, do Instituto Aspen de Estudos Huma-nsticos (EUA) e o Prmio Internacional La Madoninna, em 1969. Ainda recebeu o ttulo de Doutor Honoris Causa da Universidade de Mnster (Alemanha) e da Universidade Cat-lica de Pernambuco. Sua produo literria muito importante. Entre seus livros, citamos: Casa grande & Senzala e Sobrados e Mocam-bos. O Prof. Dr. Mrio Maestri, do PPG em His-tria da Universidade de Passo Fundo (UPF), apresentou o segundo livro na programao do II Ciclo de Estudos sobre o Brasil, promovi-do no dia 15-04-2004, pelo IHU. Sua palestra originou o artigo publicado no Cadernos IHU nmero 6, de 2004, intitulado Gilberto Freyre: da Casa-Grande ao Sobrado. Gnese e Disso-luo do Patriarcalismo Escravista no Brasil. Algumas Consideraes, disponvel para down-load em http://migre.me/NKWS. (Nota da IHU On-Line)3 Srgio Buarque de Holanda (1902-1982): historiador brasileiro, tambm crtico literrio

    de 1930, tnhamos uma maneira de conceituar o pas pelas lentes de um pensador como Oliveira Viana4, ou Nina Rodrigues5, que era uma maneira que via a mistura racial do Brasil como algo negativo, que poderia explicar o atra-

    e jornalista. Entre outros, escreveu Razes do Brasil, de 1936. Obteve notoriedade atravs do conceito de homem cordial, examinado nessa obra. A professora Dr. Eliane Fleck, do PPG em Histria da Unisinos, apresentou, no evento IHU ideias de 22-08-2002, o tema O homem cordial: Razes do Brasil, de Srgio Buarque de Holanda e, no dia 8-05-2003, a professora apresentou essa mesma obra no Ci-clo de Estudos sobre o Brasil, concedendo, nessa oportunidade, uma entrevista IHU On-Line, publicada na edio n 58, de 5-05-2003, disponvel em http://migre.me/NM6x. Sobre Srgio Buarque de Holanda, confira, ainda, a edio 205 da IHU On-Line, de 20-11-2006, intitulada Razes do Brasil, disponvel para do-wnload em http://migre.me/NM6Q. (Nota da IHU On-Line)4 Francisco Jos de Oliveira Viana (1883-1951): professor, jurista, historiador e soci-logo brasileiro, imortal da Academia Brasileira de Letras. (Nota da IHU On-Line)5 Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906): m-dico legista, psiquiatra, professor e antroplo-go brasileiro. (Nota da IHU On-Line)

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    so do pas. A partir da dcada de 1930, principalmente com a obra de Freyre, a mistura passa a ser um valor positivo. Onde entra a mdia e o futebol? Nesse momento, o jornalista Mrio Filho, que pode ser considerado o fundador do jornalismo esportivo no Brasil, come-a a perceber que o futebol seria um veculo interessante para se construir uma ideia de nao brasileira. Ele era amigo de Gilberto Freyre, o que facili-tou muito seu trabalho. Ento, nas suas crnicas esportivas, Mrio Filho come-a a louvar a abertura racial, com um estilo que mostrava o brasileiro como fruto dessa mistura. Em 1938, duran-te a copa do mundo, Gilberto Freyre, que tambm era jornalista e escrevia uma coluna no Dirio de Pernambuco, escreveu um artigo chamado Football mulato, em que ele lana as bases para a simbologia do futebol brasileiro. E Mrio Filho, nessa esteira, escreve, em 1947, O Negro no Futebol Brasilei-ro (Rio de Janeiro: Civilizao Brasilei-ra, 1964), com o prefcio de Gilberto Freyre. Esse um livro que trata da saga do negro no futebol brasileiro, mostrando o negro como fundador des-se estilo que seria nico do Brasil. Essa foi uma construo simblica que teve muita eficcia. Os brasileiros at muito recentemente, e alguns at hoje, acre-ditam que somos os nicos a praticar um determinado estilo de futebol, e que esse estilo teria sido o resultado da mistura de raas.

    IHU On-Line - Quais as relaes que podemos perceber entre o futebol e uma projeo do torcedor em seus dolos? O craque o brasileiro que deu certo?Ronaldo Helal O craque um indivduo extremamente talentoso e impossvel explicar o seu talento. Para chegar ao estrelato, os jogadores renunciam v-rias coisas. H um glamour na garotada que quer ser jogador de futebol, e eles acham que jogadores so milionrios, tm vrias mulheres e carros importados do ano. Esses so pouqussimos. Muitas famlias pobres colocam em seus filhos essa ideia de que basta ser jogador de futebol para tirar a famlia da misria. O craque acaba sendo o modelo, a ido-latria. H uma tenso que bsica da cultura de massa. essa tenso entre a

    massificao crescente, que a ps-mo-dernidade enfatiza, e o desejo das pes-soas de ser singular. Ento, s existem os famosos porque existem os annimos. O dolo uma pessoa singular por natureza porque ele tem um dom extraordinrio. O f, para no ser mais um no meio da multido, quer ser o f nmero 1. Ele tem essa necessidade de se singularizar dos demais. Se o craque um exemplo do Brasil que deu certo, no sei. Penso que o pas tambm tem dado certo em ou-tros aspectos. Se observarmos a maneira como o brasileiro vivenciou a derrota da Copa do Mundo de 50, no Maracan, e a maneira como ele comemorou a Copa de 70, no Mxico, e se compararmos com as vitrias do Brasil em 94, nos EUA, e em 2002, na Coreia e Japo, e a derro-ta da final para a Frana, em 98, temos uma diferena. Nas dcadas de 50 e 70, essas derrotas transcenderam o universo esportivo e foram vividas como derrota e vitria de um projeto de nao brasi-leira. Quando, em 1994 e 2002, o Brasil venceu, e, em 1998, o Brasil perdeu, as vitrias e derrotas foram celebradas no campo esportivo. Isso porque, naquele momento, se vivia uma poca de con-solidao dos estados/naes no mundo todo. A globalizao fala em fragmenta-o de identidades, desterritorializao do dolo. Desde 1994, o cenrio brasilei-ro est mudando e, h 16 anos, temos estabilidade econmica. O pas est as-sumindo cada vez mais uma posio de liderana na Amrica Latina. A constru-o do Brasil - pas do futebol foi exitosa e com eficcia simblica muito grande para jornalistas como Mrio Filho, Nel-son Rodrigues e outros. O Brasil ainda o pas do futebol, mas outras coisas no pas tambm esto dando certo.

    IHU On-Line - Como podemos com-

    preender que um nmero expressivo de atletas seja originrio de camadas populares? A partir disso, possvel pensarmos no futebol como uma ex-perincia de igualdade e justia so-cial?Ronaldo Helal Ele visto como uma via de acesso para os mais desfavorecidos. O Kak de classe mdia, mas, em ge-ral, jovens de classe mdia, mesmo com talento, no querem passar por prova-es para seguir a carreira de jogador de futebol. No Brasil, a maioria dos jogado-res vem de camadas mais pobres, mas uma falcia pensar que o bom futebol s surge dali. Temos muito mais pobres do que ricos. Ento, dos jovens pobres que foram jogadores de futebol, outros milhares que tambm foram jogadores continuam pobres, desempregados, ou com empregos subalternos. A mdia en-fatiza muito a origem do dolo, e mostra seu bero pobre. Isso no mentira, mas ningum questiona que outros meninos ficaram ali. E, mais, quando um jogador brasileiro faz um gol bonito, o Galvo Bueno fala: Esse um gol tipicamente brasileiro, que saiu das favelas do Brasil e das misrias brasileiras. muito peri-gosa essa equao misria = grande fute-bol. Se voc me convencer que o grande futebol nasce da misria, eu iria preferir que o Brasil no tivesse grande futebol e nem miserveis. H uma falcia nessa questo que as pessoas no percebem, nem o jornalista, porque, se voc esten-der esse argumento, acaba defendendo a pobreza.

    IHU On-Line - O que define o futebol brasileiro hoje em relao aos de-mais pases do mundo?Ronaldo Helal Grandes jogadores de futebol, de qualquer pas do mundo, tm um estilo parecido. Jogadores excepcio-nais tendem a fazer jogadas brasileiras. Isso prprio do esporte. O Brasil pro-duz jogadores mais excepcionais porque tem mais jogadores federados. Digo que o pas capaz de montar trs selees brasileiras em condies de vencer a copa do mundo. Mas se fosse uma Copa do Mundo Tabajara, o Brasil tambm teria condies de ganhar o ttulo taba-

    No Brasil, a maioria

    dos jogadores vem de

    camadas mais pobres,

    mas uma falcia

    pensar que o bom

    futebol s surge dali

  • 20 SO LEOPOLDO, 21 DE JUNHO DE 2010 | EDIO 334

    jara. Se observarmos o Zidane6, o Zico7 e os melhores jogadores da Copa de 54, veremos que eles fazem coisas seme-lhantes. Houve, no caso brasileiro, um perodo, de 50 a 70, em que produzimos selees fantsticas e jogadores mara-vilhosos: Pel8, Garrincha, Paulo Csar. Nesse momento, ratificou-se a confuso que Mrio Filho fazia de que o futebol brasileiro era nico, um futebol esttico, uma dana dionisaca, como dizia Gilber-to Freyre. Isso eficaz. Eu trabalho com a eficcia simblica. Essa crena existe. Empiricamente, no possvel comprar isso. As pessoas mais velhas, que viram a seleo na Copa de 54, iro dizer que ela tinha um estilo brasileiro. interessante de ver que esse mito to pregnante, que os prprios argentinos, que tm uma posio simblica parecida com a nossa, dizem que o futebol argentino fundado

    6 Zindine Yazid Zidane (1972): ex-jogador de futebol francs, de origem argelina, que atua-va como meia. tido como um dos melhores jo-gadores da histria do futebol mundial, sendo frequentemente comparado a seu compatriota Michel Platini. Durante sua carreira, defendeu equipes como Juventus e Real Madrid, estando presente tambm, na fase mais vitoriosa da histria da seleo francesa, que conquistou uma indita Copa do Mundo e o segundo ttulo da Eurocopa de sua histria. Atualmente, alm de participar de partidas beneficentes, Zidane embaixador da ONU na luta contra a fome. (Nota da IHU On-Line)7 Arthur Antunes Coimbra (Zico - 1953): trei-nador e ex-futebolista brasileiro que atuava como meia. Atualmente diretor de futebol do Flamengo. Notabilizou-se como o carism-tico lder da vitoriosa trajetria do Flamengo nas dcadas de 1970 e 1980, com pice nas conquistas da Taa Libertadores da Amrica e do Campeonato Mundial de Clubes pela equi-pe carioca, alm de quatro ttulos no Campe-onato Brasileiro e de suas participaes pela Seleo Brasileira nas Copas Argentina 1978, Espanha 1982 e Mxico 1986. considerado por muitos especialistas, profissionais do es-porte e, em especial, pelos torcedores do Fla-mengo, o maior jogador brasileiro da histria do clube e o maior futebolista brasileiro desde Pel. No so poucos, tambm, os que o con-sideram como o melhor jogador de futebol dos anos 1980, sendo chamado frequentemente no exterior de Pel Branco. (Nota da IHU On-Line)8 Edison Arantes do Nascimento (Pel - 1940): ex-futebolista brasileiro