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dezembro/2011 Vida Judiciária Nº 161 - dezembro 2011 - 7,50€ ANÁLISE Crimes económicos e financeiros (Parte II) EM FOCO Nova Lei da Arbitragem Voluntária ENTREVISTA Maria do Rosário Costa Gomes “A rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do notário” IMITAÇÃO DE MARCAS Concorrência desleal

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Nº 161 - dezembro 2011 - 7,50€

ANÁLISECrimes económicos e financeiros (Parte II)

Em focoNova Lei da Arbitragem Voluntária

ENTREVISTA Maria do Rosário Costa Gomes

“A rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do notário”

ImITAÇÃo DE mARcAS concorrência desleal

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Novidade

Guia de Poupança Fiscal – IRS 2011

32

O campo do nº fiscal português fica em branco e os dados da entidade gestora ‘estrangeira’ é identificada nos campos mais à direita.

(585 € / mês – cada um), como este tipo de agregado não paga IRS até estes montantes, não terá uma vantagem fiscal com investimento (é muito idêntico ao exemplo 3).

Caso avance a proposta de OE2012, este tipo de dedução passa a ter, já a partir de 2012, um limite de dedução de 2.093,10 €, que até aqui não tinha.

4.2 - Deduções específicas da categoria B (trabalhadores independentes / empresários em nome individual / recibos verdes)Existem duas formas de apurar este tipo de rendimentos: através da contabilidade organizada ou através do regi-me simplificado.

Só o regime de contabilidade organizada permite dedu-ções específicas desta categoria e essa cai fora do âmbi-to deste guia.

4.3 - Deduções específicas da categoria F (rendimentos prediais)As despesas de manutenção e conservação que incidam sobre um bem arrendado são dedutíveis ao valor bruto recebido. Nos casos de propriedade horizontal, ou seja,

VERDADEIRA POUPANÇA FISCAL

Os montantes investidos nestas rubricas (seguros de vida, de acidentes pessoais e saúde para profissões de desgaste rápido) constituem uma verdadeira poupança, já que não há um limite a investir e, no caso do seguro de vida, é algo que num futuro acabará por reverter para alguém (ao contrário do seguro de saúde, que tem uma aplicação exclusivamente imediata).

Investir neste tipo de seguro até que valores?

Ex1. Não casados – Tratando-se de um sujeito passivo solteiro / viúvo ou divorciado e sem descendentes, se au-ferir abaixo de 8.000 € brutos / ano (571 € / mês), como não paga IRS, não terá uma vantagem fiscal.

Ex2. Não casados – Tratando-se de um sujeito passivo solteiro / viúvo ou divorciado mas com um descendente, se auferir abaixo de 11.000 € brutos / ano (785 € / mês), como este tipo de agregado não paga IRS até estes mon-tantes, não terá uma vantagem fiscal com investimento.

Ex3. Casados – Tratando-se de um casal sem descen-dentes, se auferirem abaixo de 16.000 € brutos / ano (585 € / mês – cada um), como este tipo de agregado não paga IRS até estes montantes, não terá uma vanta-gem fiscal com investimento.

Ex4. Casados – Tratando-se de um casal sem descen-dentes, se auferirem abaixo de 16.000 € brutos / ano

Realidade de 2012

CONSULTE O GUIA DE POUPANÇA FISCAL – IRS 2011

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editorial VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 1

o esvaziamento da função notarialPor: Sandra Miranda da Silva

As atuais atribuições exclusivas de um notário privado em Portugal estão praticamente reduzidas aos testamentos, certificações de factos e procurações irrevogáveis.Apesar de estar prevista desde junho de 2009 a intervenção dos notários nas diligências do processo de inventário, o certo é que tal ainda não é aplicável por falta de regulamentação.Por outro lado, acrescentaram-se às competências dos notários as atividades de mediação e de arbitragem. Contudo, também essas novas competências ainda não produziram efeitos práticos.Na entrevista concedida à “Vida Judiciária”, a notária Maria do Rosário Costa Gomes afirmou que “a rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do notário”.Na opinião da drª. Maria do Rosário Gomes, seria adequada a integração da função de mediador na atividade notarial, mas desde que se trate de matéria jurídica, na medida em que na mediação o notário irá orientar as partes e, por fim, redigir a certificação do seu acordo. Já no que se refere à arbitragem, esta notária entende que, uma vez que na função notarial não cabe impor às partes a resolução de qualquer conflito, esta nova competência não deveria ser atribuída aos notários.Segundo a dra. Maria do Rosário Gomes, era importante a regulamentação da situação da propriedade dos cartórios, na medida em que não parece justo que o profissional que organizou o seu cartório como unidade funcional não possa negociar a transmissão do mesmo a um seu colega como sucede presentemente.A dra. Maria do Rosário Gomes acredita que o atual Governo tome medidas que atribua aos notários portugueses as competências próprias do notariado (aproximando o nosso sistema do sistema do notariado latino), reforçando as características próprias de profissão liberal, terminando, por exemplo, com o limite de idade de 70 anos para o exercício desta atividade. Resta-nos esperar pelas mudanças!

ProprietárioVida Económica - Editorial, S.A.

Rua Gonçalo Cristóvão, 14 r/c

4000-263 Porto

NIF 507 258 487

diretorJoão Carlos Peixoto de Sousa

Coordenadora de ediçãoSandra Silva

Paginação e capaFlávia Leitão

direção ComercialPorto:

Teresa Claro

Madalena Campos

assinaturasMaria José Teixeira

E-mail: [email protected]

redação, administração Vida Económica - Editorial, S.A.

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delegação de lisboaAv. Fontes Pereira de Melo,

nº 6 - 4º piso

1069-106 Lisboa

Telef. 217 805 410

Fax. 217 805 415

impressãoUniarte Gráfica / PortoPublicação inscrita no Instituto

da Comunicação Social nº 120738

Empresa Jornalística nº 208709

Periodicidade: mensal

Nº 161 dezembro 2011REVISTA MENSAL

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SuMárioVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 20112

12 Em Foco Nova Lei da Arbitragem Voluntária

15 Atualidades Informações jurídicas

20 Registos & Notariado Alteração do contrato social - cessão de quotas

21 Análise Crimes económicos e financeiros (Parte II)

30 Marcas & Patentes IMITAÇÃO DE MARCAS – concorrência desleal

39 Jurisprudência

Resumos de Jurisprudência Jurisprudência do STJ e das Relações Sumários do STJ

62 Legislação Principal legislação publicada 1ª e 2ª séries do Diário da República

Notária Maria do Rosário Costa Gomes em entrevista à “Vida Judiciária”

“a rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do notário”4 Entrevista

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3ª Edição actualizada com as alterações introduzidas pela Lei nº 53/2011, de 14 de Outubro

Autor:Vida Económica

Páginas: 464

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Notária Maria do Rosário Costa Gomes em entrevista à “Vida Judiciária”

“a rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do notário”

“Como é possível, num Estado de Direito, o Governo privatizar uma atividade, publicar, inclusivamente, o diploma que declara extintos os notários públicos, estabelecer (Decreto-Lei 27/2004, de 4 de fevereiro) que “o exercício da atividade notarial depende da inscrição na Ordem dos Notários” e, apesar de tudo, cometer a outros profissionais não inscritos na Ordem dos Notários atos que são inequivocamente notariais?”. Esta é a pergunta que qualquer notário em Portugal ainda se faz e que também foi repetida, em jeito de desabafo, por Rosário Costa Gomes, notária, instalada e com escritório numa das principais artérias da segunda cidade do país, o Porto, nesta entrevista à “Vida Judiciária”.

Relutante ainda em afirmar se a re-nacionalização no notariado ocorrida em 2008 será mera concorrência ou “usurpação de funções praticada pelo Estado”, Rosário Costa Gomes não tem dúvidas quanto a um facto: “o que existe ao lado dos notários, ou seja, a atividade

notarial dos ditos cartórios notariais públicos, assenta no que me parece uma baralhada legislativa produto de um episódio, que reputo infeliz, de puro voluntarismo político”.Daí ser-lhe hoje “difícil incentivar um jovem licenciado a apostar no notaria-do em Portugal”, porque esta profissão “tem no caminho muitos escolhos”. Além de “sobrecarregada de obrigações que não dão lugar a qualquer remu-neração”, diz Rosário Costa Gomes, “a rentabilidade dos cartórios foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função” e, hoje, “na grande maioria dos meses chego ao final com um apuro líquido inferior ao salário que recebe-ria se me tivesse mantido na função pública”.

vida Judiciária - a senhora aderiu e instalou-se como notária em regime privado. Que avaliação faz desta sua opção profissional? valeu a pena?rosário Costa Gomes - Hoje posso dizer que fiz a opção certa, embora, na ocasião, não tivesse sido fácil deci-dir. Na verdade, confrontava-me com interrogações de toda a ordem, a mais preocupante das quais era a de saber que futuro teria uma profissão que o Partido Socialista tinha, no meu ponto de vista, como alvo a abater. Valeria a pena o esforço? Num quadro de grande incerteza quanto ao futuro, era preciso

decidir sobre a que cidade concorrer para o exercício no novo regime, esco-lher e contratar os colaboradores (ne-nhum dos funcionários que prestavam serviço no Cartório público a meu cargo quis arriscar deixar a função pública), dispor de capital para adquirir o mobili-ário e restante equipamento necessário, assim como para custear as obras nas instalações arrendadas necessárias ao exercício da profissão em condições condignas e aceites pela Tutela. A este propósito lembro que era condição pré-via de concessão do alvará a aprovação das instalações após vistoria exigente por um inspetor enviado pelo Instituto dos Registos e Notariado. E, depois, quantos trabalhadores con-tratar? Seriam necessários dois ou três? Ou 10 ou 12? Ou seja, que com-portamento teria o público, na cidade do Porto, já que continuariam abertos ainda sete cartórios notariais em regime de função pública? Acorreria aos três cartórios privados que iam constituir uma novidade, exigindo um corpo de trabalhadores numeroso ou, pelo contrário, preferiria concentrar-se nos sete cartórios cujo funcionamento já se conhecia?A questão dos colaboradores tornou-se o meu maior problema: os funcionários com experiência dificilmente aceitavam abandonar a função pública, dado que era de esperar que, mais tarde ou mais

TERESA SILVEIRA

[email protected]

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“Parece--me de todo adequada a integração da função de mediador na atividade notarial, desde que se trate de matéria jurídica, uma vez que na mediação o notário apenas orientará as partes, redigindo, a fi nal, a certifi cação do seu acordo, não lhe cabendo fi xar qualquer matéria”

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cedo, o PS viesse a constituir Governo. Todos sabíamos, efetivamente, da ver-dadeira catilinária que um deputado desse partido já fizera na Assembleia da República contra a privatização do notariado, posição esta que foi vista por mim e por outros colegas como combate ao próprio notariado.

vJ - Que principais diferenças aponta entre o notariado em regime público e em regime privado?rCG - No que respeita à essência, di-gamos, do exercício da função, não há, evidentemente, qualquer diferença: o notário faz o enquadramento legal do caso subjacente e aplica a lei em vigor, no que atua com total independência como já antes lhe competia. As comu-nicações (e são muitas) a que o notário estava obrigado continuam a ser-lhe

impostas, como é o caso da comunica-ção mensal, à respetiva Conservatória de Registo Comercial, de todos os atos relativos a sociedades; a comunicação mensal aos serviços de Finanças de grande parte dos atos notariais; a co-municação semanal à Conservatória dos Registos Centrais de todos os testamen-tos e outros atos com eles relacionados; a comunicação mensal a esta mesma Conservatória de todas as escrituras; o preenchimento “on line” aos Serviços Fiscais do formulário respeitante a cada contrato; as comunicações às conser-vatórias de Registo Civil de todas as escrituras de habilitação de herdeiros; o preenchimento de verbete estatístico para cada escritura; etc.Quanto ao regime de responsabilidade civil profissional, o notário, como acon-tecia já antes, responde totalmente

pelos seus atos, sendo, no novo regime, obrigado a subscrever um seguro de responsabilidade civil profissional de capital nunca inferior a 100 mil euros.A diferença manifesta-se nas condições desse exercício: o notário exerce em escritório próprio, com colaboradores escolhidos por si, e custeia totalmente a sua atividade, fixa os seus honorários e passou a cobrar IVA para entregar ao Fisco, como os restantes profissionais liberais. Daqui decorre que tem que suportar o prejuízo da sua atividade, ao contrário do que sucedia no regime de função pública, em que tinha sempre assegurado o seu vencimento, ainda que o Cartório fosse deficitário (neste caso, após envio da folha mensal ilus-trativa das receitas e despesas, o notário recebia as quantias em falta para paga-mento de salários e despesas).

“Gostaria que fossem tomadas medidas tendentes a agilizar os procedimentos relativos ao registo nacional das pessoas coletivas, assim como os procedimentos de registo predial e comercial, âmbitos estes em que penso que o notário pode dar um contributo muito mais significativo do que o sistema vigente permite”

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Acontece, ainda, que, no regime de função pública o notário entrava na carreira como notário de 3ª classe, podendo concorrer a cartórios classifi-cados de 3ª classe e, se quisesse, podia ir concorrendo a cartórios de 2ª classe e, depois, de 1ª classe, dependendo do tempo de serviço e da classificação que obtivesse nas inspeções a que o cartó-rio era submetido periodicamente. Ou seja, a lei orgânica apontava para que o notário iniciasse sempre a sua carreira em pequenos centros urbanos, em cartórios com pouco volume de serviço.

vJ - e ao nível da rentabilidade econó-mica da atividade, que avaliação faz? os custos de instalação superaram os gastos e vê a sua atividade hoje como atrativa e rentável?rCG - A rentabilidade dos cartórios notariais foi muito afetada pelo quase esvaziamento da função do Notário resultante da política legislativa para o setor adotada pelos governos de António Guterres e de José Sócrates. Como iniciei a atividade neste regime ainda muito cedo (tomei posse em 25 de maio de 2005), ainda tive opor-tunidade de beneficiar do exercício da minha atividade quase em pleno - digo “quase” porque já tinham sido retirados alguns atos à competência exclusiva dos notários, como, por exemplo, os reconhecimentos de assinaturas. Assim, pude recuperar o investimento feito. No entanto, com o prosseguimento dessa política, foi retirada aos notários a competência exclusiva para a maior parte dos atos e isso teve um reflexo demolidor ao nível financeiro. Hoje não posso con-siderar a minha atividade atrativa sob esse ponto de vista, porque, na grande maioria dos meses, chego ao final com um apuro líquido inferior ao salário que receberia se me tivesse mantido na função pública.

vJ - Que atribuições tem hoje um notário privado em Portugal? em exclusividade continuam a só fazer testamentos, certificação de factos e

procurações irrevogáveis ou houve já alargamento a outras áreas?rCG - É apenas isso, no essencial. Está prevista a intervenção dos notários nas diligências do processo de inventário, mas tal lei, publicada em junho de 2009, não foi ainda regulamentada. Também se acrescentaram às competências as atividades de mediação e de arbitra-gem, mas tal acrescento ainda não produziu efeitos práticos.

vJ - aconselharia os jovens recém- -licenciados em direito a apostarem no notariado em regime privado? em nome individual ou em sociedade?rCG - É difícil incentivar um jovem licen-

ciado a apostar no notariado em Por-tugal. A profissão de notário no nosso país tem no caminho muitos escolhos. É, no meu ponto de vista, uma profissão sobrecarregada de obrigações que não dão lugar a qualquer remuneração. O cumprimento de tais obrigações tem um peso enorme na atividade notarial, pelo que é necessário dispor de uma estrutura mínima que, além do trabalho próprio do notário, permita cumprir essas obrigações, repito, inteiramente gratuitas. A título de exemplo, cito as comunicações à Conservatória dos Re-gistos Centrais, ao Serviço Nacional de Estatística, às Conservatórias de Registo Civil, aos Serviços de Finanças, etc., etc.. Depois há a natural crispação que pode sentir o jovem profissional que se vê

obrigado, por exemplo, a assinar um reconhecimento de assinatura pelo qual cobra menos do que 15,00 euros num contrato de sociedade feito por outrem e para o qual o jovem notário tem que usar a sua ciência tanto como se fizesse a escritura, já que o reconhecimento da assinatura o faz incorrer na mesma obrigação de controlo da legalidade. Já para não falar dos reconhecimentos de assinatura que o responsabilizarão na totalidade do valor do contrato de “lea-sing”, por exemplo, que, podendo ter va-lor de muitos milhões de euros e várias páginas escritas, para ele ler e verificar, lhe deixam na gaveta os menos de 15,00 euros e, às costas, a responsabilidade

civil correspetiva aos milhões. E terá que fazer muito bem as contas porque, apesar de ser um profissional liberal, não pode esquecer que, atingindo os 70 anos de idade, a lei, estranhamente, não lhe permitirá prosseguir com a sua atividade, e como também não terá direito a fazer trespasse do seu cartório, habilita-se a terminar a sua carreira da pior forma, com um verdadeiro quebra-cabeças que será o de dar solução ao seu corpo de colaboradores.

vJ - e o público, os clientes? Como encaram o serviço do notariado em regime privado? Sente que estão satisfeitos com o serviço que é pres-tado?rCG - Tenho testemunhado o agrado

“Gostaria de ver regulamentada a situação da propriedade do cartório, porque não me parece justo que ao profissional que organizou o seu cartório como uma unidade funcional, com tudo o que isso implica de esforço organizacional e financeiro, não seja permitido negociar a sua transmissão a um colega”

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geral das pessoas que têm recorrido aos meus serviços, pelo facto de o notário as poder acompanhar de uma forma mais dinâmica e interventiva do que antes. Sabemos como a burocracia ainda é um problema no nosso país e poder contar com a ajuda do notário para reunir documentos e conseguir a resolução de difi culdades imprescin-dível à celebração da escritura, assim como continuar a dispor dos serviços do notário para a concretização do que necessário for subsequente à escritura e com esta relacionado, é considerado por muitos dos meus clientes uma van-tagem apreciável.

vJ - a área da Justiça é frequente-

mente apontada como sendo uma das com mais problemas e com pro-blemas mais sérios de resolver em Portugal, com isso condicionando e difi cultando a vida dos cidadãos, das empresas e a evolução da economia do país. Que contributo poderão dar os notários para mudar este estado de coisas?rCG - Os notários só podem dar o seu contributo para mudar este estado de coisas se o Governo e a Assembleia da República lhes derem condições para tal, legislando nesse sentido. Mas não me parece que, nos últimos tempos, o papel do notário tenha sido considera-do importante. Lembro a este propósito a publicidade do Ministério da Justiça

do tempo do então ministro António Costa: “Não vá ao Notário”!

vJ - tomou posse em 5 de dezembro de 2011 o novo bastonário da ordem dos Notários, João Maia rodrigues. o que espera da atuação do novo bastonário e da ordem?rCG - Espero que faça tudo o que lhe for humanamente possível para con-seguir que os atos notariais voltem a ser praticados exclusivamente por notários (nas conservatórias praticam--nos sob o nome de “procedimentos simplifi cados”).

vJ - Perspetiva mudanças a esse nível com o novo Governo e uma nova

“Sempre entendi que na função notarial não cabe impor às partes a resolução de qualquer confl ito. Por isso, vejo a arbitragem como uma competência que não gostaria que me fosse atribuída”, revela a notária Rosário Costa Comes.

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titular da pasta da Justiça, Paula teixeira da Cruz?rCG - Só mantenho a porta aberta por-que espero mudanças e confio em que a ministra Paula Teixeira da Cruz tome medidas que atribuam aos notários portugueses as competências próprias do notariado, tal como acontece nos países onde vigora o sistema de Nota-riado Latino -- que é o sistema adotado no nosso país e na grande maioria do países do Mundo.

vJ - Numa entrevista também à “vida Judiciária” em dezembro de 2010, o então bastonário dos Notários, alex Himmel, criticou a “renacionalização da atividade” ocorrida em 2008 e a “concorrência desleal” a que ainda estavam sujeitos por parte da rede pública de notários criada pelo esta-do. Partilha da mesma opinião?rCG - Completamente. Acrescento que me tenho interrogado como é possível, num Estado de Direito, o Governo priva-tizar uma atividade, publicar, inclusiva-mente, o diploma que declara extintos os notários públicos, estabelecer por Decreto-Lei (Decreto-Lei 27/2004, de 4 de fevereiro) que “O exercício da ati-vidade notarial depende da inscrição na Ordem dos Notários” e, apesar de tudo, cometer a outros profissionais não inscritos na Ordem dos Notários atos que são inequivocamente nota-riais. O próprio “site” oficial do Instituto dos Registos e Notariado anuncia os contactos dos “Cartórios Notariais Pú-blicos”, onde, inelutavelmente, alguém tem que responder pela qualidade de notário - profissional, que, entretanto, não tem, nem pode ter, inscrição na Ordem dos Notários.

vJ - Como é que essa concorrência evoluiu?rCG - E será concorrência ou será usurpação de funções praticada pelo Estado? A concorrência é salutar e ne-cessária e consiste na competição que se estabelece entre os profissionais do mesmo ramo, entre os pares. Com a pri-vatização do notariado foram atribuídas

licenças a centenas de profissionais, fazendo depender tal atribuição da resposta afirmativa a várias exigências. Esses profissionais concorrem entre si – e têm concorrido –, cumprindo as regras de concorrência a que estão obrigados, expressamente previstas na lei. A isso é que chamo concorrência. O que existe ao lado dos notários, ou seja, a atividade notarial dos ditos “Cartórios Notariais Públicos” assenta, nesse sentido da concorrência, no que me parece uma baralhada legislativa produto de um episódio, que reputo infeliz, de puro voluntarismo político.

vJ - a ‘troika’ impôs a Portugal que desse um novo impulso à mediação e à arbitragem. Como é que os notários vão responder a esse repto e exercer essa competência, quer na mediação, quer na arbitragem?rCG - Parece-me de todo adequada a integração da função de mediador na atividade notarial, desde que se trate de matéria jurídica, uma vez que na mediação o notário apenas orientará as partes, redigindo, a final, a certificação do seu acordo, não lhe cabendo fixar qualquer matéria, não lhe cabendo decidir. Sempre entendi que na função notarial não cabe impor às partes a resolução de qualquer conflito. Por isso, vejo a arbitragem como uma competência que não gostaria que me fosse atribuída. Do mesmo modo penso em relação à referida intervenção no processo de inventário por conceber a figura do notário como um profissional que intervém entre as partes quando entre elas há acordo ou em que tal acordo pode surgir pela intervenção do notário, sendo essa uma das caraterís-ticas distintivas da função notarial em relação às demais profissões jurídicas.

vJ – e como pensam responder no caso da mediação?rCG - Naturalmente, da forma como tem decorrido até agora o nosso exer-cício. Temos estrutura organizacional e temos experiência de assessorar juridicamente as partes, assim como

competência para redigir os seus acor-dos e conferir-lhes fé pública. E são essas as condições necessárias ao bom desempenho dessa tarefa.

vJ - Que orientações espera receber da ordem quanto a esse assunto?rCG - Para já, nada foi anunciado. Assim, limito-me a aguardar.

vJ - Que medidas concretas gostaria de ver tomadas por este Governo no domínio do notariado?rCG - Gostaria que fossem tomadas medidas que aproximem o notariado português do modelo de notariado latino. Isto implica reforçar as carate-rísticas próprias de profissão liberal, acabando, por exemplo com o limite de idade dos 70 anos, que não tem

“Perspetivo grandes dificuldades no desempenho dessa função [partilhas] por notários, não por falta de capacidade para realizar o trabalho, mas prevejo – pela experiência que tenho de outras situações – que os notários serão uma vez mais chamados a fazer investimentos de retorno financeiro muito incerto”

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qualquer justificação numa profissão liberal. Também gostaria de ver regu-lamentada a situação da propriedade do cartório, porque não me parece justo que ao profissional que organi-zou o seu cartório como uma unidade funcional, com tudo o que isso implica de esforço organizacional e financeiro, não seja permitido negociar a sua transmissão a um colega. Seria, aliás, mais tranquilizador para todos os que trabalham com o notário e para o próprio notário saber que o cartório em que laboram pode ser adquirido no seu todo por outro profissional, permitindo, assim, a continuidade do trabalho nas mesma instalações, com os mesmos equipamentos e mobiliário,

e com a mesma carteira de clientes. Não é o que se passa com a lei em vigor: falecendo ou afastando-se o notário por outro motivo, as instalações são encerradas, o arquivo fica tempora-riamente à guarda de outro notário, a licença vai a concurso, é atribuída a um novo notário que irá estabelecer-se onde quiser, tomando, então, conta do arquivo. Também gostaria que fossem tomadas medidas tendentes a agilizar os procedimentos relativos ao registo nacional das pessoas coletivas, assim como os procedimentos de registo predial e comercial, âmbitos estes em que penso que o notário pode dar um contributo muito mais significativo do que o sistema vigente permite.

vJ - Como notária, acredita que a classe dos notários pode ser um

interlocutor útil no processo de im-plementação das várias reformas no setor da Justiça em Portugal? rCG - Como disse acima, pode e, pelo que temos observado, quer. O ponto é que lhe seja dado espaço para desem-penhar esse papel. Assim acontece na generalidade dos restantes países da Comunidade, onde o notariado é, por exemplo, em conjunto com outros ramos de atividade, instrumento im-prescindível de combate à corrupção e ao branqueamento de capitais.

vJ - Não está fora de questão a re-alização de auditorias externas ao funcionamento do sistema judicial. admite que os notários possam ser

igualmente alvo de auditoria? Que implicações poderia trazer um pro-cesso desses?rCG - Os notários que, como eu, exerce-ram longos anos em regime de função pública habituaram-se a auditorias que podiam ocorrer de três em três anos. Eram inspeções exigentes que abran-giam todos os aspetos da atividade do notário. Era apreciada a sua compe-tência técnico-jurídica, tendo nós, fre-quentemente, que responder a quesitos para justificarmos a nossa interpretação da lei neste ou naquele caso em que o inspetor encontrara entendimento divergente do seu. Também era avaliada a nossa capacidade de direção do corpo de pessoal e, com grande cuidado, a contabilidade do cartório. As auditorias têm vantagens: desde logo podem detetar a tempo situa-

ções menos boas do ponto de vista do cumprimento dos procedimentos adequados e isso só contribui para o prestígio público de uma classe. E é recompensador para o bom profissional ver reconhecido o seu mérito. Ponto é que quem faz as auditorias tenha com-petência técnica específica e maturida-de para que essa ação resulte benéfica.

vJ - a tramitação dos processos de partilhas estava parada por falta de regulamentação da lei 29/2009, de 29 de junho, que se mantém sem regulamentação. Que expetativas tem quanto a essa nova atribuição de competências?rCG - Gosto muito de trabalhar com o Direito Sucessório, mas não me agrada ver-me envolvida em processos em que as partes estão em litígio, tendo eu que decidir. Pese embora essa decisão tenha que ser homologada pelo juiz do proces-so – regime de subalternidade, esse, que também me causa algum desconforto, pelos motivos óbvios. Por outro lado, tal trabalho exigiria uma organização muito diferente do meu escritório. Devo dizer, aliás, que perspetivo grandes dificulda-des no desempenho dessa função por notários, não por falta de capacidade para realizar o trabalho, mas prevejo -- pela experiência que tenho de outras situações -- que os notários serão uma vez mais chamados a fazer insvestimen-tos de retorno financeiro muito incerto.Por outro lado, embora possa parecer de somenos, a tarefa de impor às partes desavindas uma decisão, recomenda sobremaneira que o decisor tenha socialmente um estatuto socialmente reconhecido de exercício de autoridade, o que não me parece que seja o nosso caso, dada o ataque que tem sido des-ferido sobre o notariado português. Não se pode, como penso, ter andado seis ou sete anos a desautorizar toda uma classe e depois entregar-lhe funções próprias de tribunais. Além disso, resta saber como vai o notário ser retribuído pelo seu trabalho. Aqui, apetece-me acrescentar o que, se calhar, será consi-derado uma pequena picardia. Mas aqui

“Hoje não posso considerar a minha atividade atrativa sob esse ponto de vista [da rentabilidade], porque, na grande maioria dos meses, chego ao final com um apuro líquido inferior ao salário que receberia se me tivesse mantido na função pública”, assume Rosário Costa Gomes.

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eNtreviSta VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 11

vai: é que a atuação do anterior Governo faria esperar que, com toda a desenvol-tura de quem não domina as matérias, fixaria uma cifra de dois dígitos na casa dos euros; acrescentada de outros dois dígitos, diferentes de zero, na casa dos cêntimos, isto para vincar a menoridade do profissional em causa.

vJ - Que mudança é que isto represen-ta para as partes que, muitas vezes, estão até em litígio? Haverá maior celeridade deste tipo de processos com a desmaterialização?rCG - Se vier a entrar em vigor, veremos. Sou cética sobre essa matéria. Não será por acaso que o Governo anterior deixou este diploma a aguardar “em banho-maria” – quando sabemos que determi-nava a entrada em vigor de legislação acabada de publicar sem, quantas vezes, dar tempo à sua cabal leitura.

vJ - e ao nível da segurança da tra-mitação? a ordem garante total con-fiança, segurança e maior celeridade no seu tratamento?rCG - Penso que posso afirmar que tudo o que tem sido entregue a notários tem corrido bem. Confiança, segurança e celeridade têm sido, ao que sei, atri-butos do trabalho desenvolvido pela generalidade dos notários. Penso é que dos notários deve ser aproveitado o seu potencial de juristas especialmente bem apetrechados para assessorar as partes e redigir os seus atos e contratos, sobretudo em matéria de Direito Civil e de Direito Comercial. Foi para exercer nesse âmbito que fizeram o seu tirocí-nio. Notários em cujo número me incluo trabalharam nessas matérias durante décadas e em pouco tempo veem-se hoje quase completamente arredados desse trabalho. Pretender colmatar as dificuldades verificadas noutros setores, nomeadamente nos tribunais, aproveitando a situação de míngua de trabalho em que fomos colocados, não me parece lisonjeiro para o notariado.

vJ - está confiante que com as medi-das que Portugal se obrigou a imple-

mentar na sequência da assinatura do memorando de entendimento com a ‘troika’, o sistema judicial e, concretamente, o notariado ganhe um novo impulso?rCG - Como já lhe disse atrás, é a es-perança de que novos atores na cena política venham modificar a situação de declínio em que foi colocado o nota-riado português que me tem impedido de desistir. Alguns notários, como é sabido, já fecharam os seus cartórios. Tenho esperança, no entanto, de que o notariado em Portugal vai resistir e assumir o papel que nos restantes paí-ses lhe é reconhecido, de instrumento imprescindível de controlo da legalida-de, de função propiciadora de certeza e de segurança jurídica e, assim, de impulsionador da atividade económica. Confio em que a ministra Paula Teixeira da Cruz tem esta sensibilidade. Quanto ao memorando de entendimento com a “troika”, agradou-me, especialmente, a menção do compromisso de regular as profissões jurídicas, que interpretei como exigência de delimitação de com-petências. Sei que as medidas previstas em tal memorando serão tomadas ao longo dos tempos. Espero é que as que vierem a incidir sobre o notariado venham em tempo útil. Sei que muitos notários esperam, como eu, melhores condições de sustentabilidade dos seus cartórios. Só espero que muitos dos melhores profissionais não tenham que desistir por impossibilidade de equilíbrio da sua tesouraria. Falo assim porque sei o quão dispendioso é manter um cartório a funcionar.

vJ – e a propósito, precisamente, do compromisso de regular as profissões jurídicas, que mudanças traz para os notários a liberalização do acesso às profissões, resultante da aplicação do decreto-lei nº 92/2011, criado no âmbito das medidas acordadas com a “troika”? rCG - No que o “regime de liberaliza-ção de acesso às profissões” significa de liberdade de estabelecimento de notários portugueses noutros países da

Comunidade Europeia ou de notários de outros países da Comunidade no territó-rio português, já tal medida se encontra plasmada nos estatutos da Ordem dos Notários, por alteração aos estatutos pu-blicada em janeiro de 2010. Em concreto, não tenho, no entanto, conhecimento de qualquer efeito prático desta medi-da até hoje. A barreira da língua, mas, sobretudo, o conhecimento seguro do Direito do Estado para onde se vai, não sendo o da própria nacionalidade, não têm sido, certamente, dificuldades fáceis de ultrapassar.No que esse regime de liberalização pode significar de exigência de menor qualificação não será, certamente, alte-rado o regime vigente. Na generalidade dos países, a profissão de notário é re-servada a quem tem licenciatura em Di-reito e um estágio profissional. E assim está vertido nos Estatutos da Ordem.

vJ - ao introduzir uma maior abertura do mercado de trabalho, esta nova legislação possibilitará mais oportu-nidades de trabalho para os notários e a redução do desemprego como garante o Ministério da economia? rCG - Teoricamente, sim, na medida em que se abre à possibilidade de estabelecimento de cartório um terri-tório incomensuravelmente maior. No entanto, pelo menos a curto prazo, essa faculdade de liberdade de estabeleci-mento, ao que penso, não terá qualquer expressão nesse sentido. Embora o risco de se verem confrontados com uma concorrência exercida por colegas, que de outros países venham aqui exercer, possa representar, num primeiro mo-mento, dificuldades acrescidas para os notários portugueses. Penso, no entanto, que esse contacto pode ser impulsionador de revitalização do no-tariado português. Quero crer que só pode beneficiar o notariado português a influência desses colegas vindos de outros Estados membros onde a função notarial é muto respeitada, tendo uma grande tradição de motor da economia e de instrumento fundamental da paz social e da prevenção de litígios.

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eM foCoVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201112

A nova Lei aplica-se aos processos ar-bitrais que se iniciem após 14.3.2012. Todavia, este novo regime é também aplicável aos processos arbitrais ini-ciados em data anterior, desde que ambas as partes nisso acordem ou se uma delas formular proposta nesse sentido e a outra a tal não se opuser no prazo de 15 dias a contar da respe-tiva receção.O diploma que aprova o novo regime de arbitragem introduz, em conformidade, alterações aos arts. 812º-D, 815º, 1094º e 1527º do Código de Processo Civil e re-voga o nº 2 do art. 181º e o artº 186º do Código de Processo nos Tribunais Ad-ministrativos, assim como o art. 1097º do Código de Processo Civil.De acordo com o novo regime, qualquer litígio respeitante a interesses de na-tureza patrimonial pode ser cometido pelas partes à decisão de árbitros, des-de que por lei especial não esteja sub-metido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, mediante convenção de arbitragem.Mesmo que os litígios não envolvam interesses de natureza patrimonial, é igualmente válida a convenção de ar-bitragem desde que as partes possam vir a celebrar transação sobre o direito controvertido.Podem ser sujeitos a arbitragem litígios atuais ou litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contra-tual ou extracontratual (cláusula com-promissória). Por outro lado, as partes também podem acordar em submeter a arbitragem, para além das questões de natureza contenciosa em sentido estrito, quaisquer outras que requeiram a intervenção de um decisor imparcial,

designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar e adaptar contratos de prestações dura-douras a novas circunstâncias.

formalidades da convenção de arbitragem:A convenção de arbitragem tem de constar de documento escrito, valen-do como tal o documento escrito as-sinado pelas partes, troca de cartas, te-legramas, telefaxes ou outros meios de telecomunicação de que fique prova escrita, incluindo meios eletrónicos de comunicação.Assim, considera-se como escrita a con-venção que conste de suporte eletróni-co, magnético, ótico, ou de outro tipo, que ofereça as mesmas garantias de fidedignidade, inteligibilidade e con-servação.De referir que tem o valor de conven-ção de arbitragem a remissão feita num contrato para documento que con-tenha uma cláusula compromissória, desde que tal contrato revista a forma escrita e a remissão seja feita de modo a fazer dessa cláusula parte integrante do mesmo.O requisito da forma escrita da conven-ção de arbitragem também se considera cumprido quando exista troca de uma petição e uma contestação em proces-so arbitral, em que a existência de tal convenção seja alegada por uma parte e não seja negada pela outra.O compromisso arbitral tem de deter-minar o objeto do litígio, sendo que a cláusula compromissória deve especi-ficar a relação jurídica a que os litígios respeitem.A convenção de arbitragem que viole

os requistos acima indicados é consi-derada nula.A convenção pode ser modificada pelas partes até à aceitação do primeiro árbi-tro ou, com o acordo de todos os árbi-tros, até à prolação da sentença arbitral. Em matéria de revogação,a convenção de arbitragem pode ser revogada pelas partes até ser proferida a sentença arbi-tral, desde que essa intenção conste de acordo escrito.Regra geral, a morte ou extinção das partes não faz caducar a convenção de arbitragem nem extingue a instân-cia arbitral.

designação dos árbitros:As partes podem, na convenção de arbitragem ou por escrito posterior, designar o árbitro ou os árbitros que constituem o tribunal arbitral ou fixar o modo pelo qual estes são escolhidos, nomeadamente, cometendo a designa-ção de todos ou de alguns dos árbitros a um terceiro.Se o tribunal arbitral for constituído por um único árbitro e não haja acordo en-tre as partes quanto a essa designação, o árbitro é escolhido, a pedido de qual-quer das partes, pelo tribunal estadual.No caso de o tribunal arbitral ser com-posto por três ou mais árbitros, cada parte deve designar igual número de árbitros e esses árbitros devem escolher outro árbitro, que atua como presidente do tribunal arbitral.

Providências cautelares:O tribunal arbitral pode, a pedido de uma parte e ouvida a parte contrária, decretar as providências cautelares que considere necessárias em relação ao ob-

Nova lei da arbitragem voluntária

No próximo dia 14 de março entra em vigor a nova Lei da Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011, de 14.12), data a partir da qual se considera revogada a lei da arbitragem atualmente em vigor (Lei nº 31/86, de 29.8), com exceção do disposto no nº 1 do artigo 1º (convenção de arbitragem), que se mantém em vigor para a arbitragem de litígios emergentes de ou relativos a contratos de trabalho.

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eM foCo VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 13

jeto do litígio. Trata-se de decretar me-didas de caráter temporário, através das quais, em qualquer altura antes de ser proferida a sentença, o tribunal arbitral ordena a uma parte que:- mantenha ou restaure a situação an-

teriormente existente enquanto o li-tígio não for dirimido;

- pratique atos que previnam ou se abs-tenha de praticar atos que provavel-mente causem dano ou prejuízo rela-tivamente ao processo arbitral;

- assegure a preservação de bens sobre os quais uma sentença subsequente possa ser executada;

- preserve meios de prova que possam ser relevantes e importantes para a resolução do litígio.

Para que seja decretada uma providên-cia cautelar é necessário que haja pro-babilidade séria da existência do direito invocado pelo requerente e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão e o prejuízo resultante para o requerido do decretamento da provi-dência não exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pre-tende evitar.

Processo arbitral:A língua ou línguas a utilizar no pro-cesso arbitral é livremente escolhida pelas partes.O processo arbitral relativo a determina-do litígio tem início na data em que o pedido de submissão desse litígio a ar-bitragem é recebido pelo demandado.Nos prazos convencionados pelas par-tes ou fixados pelo tribunal arbitral, o demandante apresenta a sua petição, em que enuncia o seu pedido e os fac-tos em que este se baseia, e o deman-dado apresenta a sua contestação, em que explana a sua defesa relativamente àqueles. As partes podem fazer acom-panhar as referidas peças escritas de quaisquer documentos que julguem pertinentes e mencionar nelas docu-mentos ou outros meios de prova que venham a apresentar.Qualquer das partes, no decurso do processo arbitral, pode modificar ou completar a sua petição ou a sua con-testação, a menos que o tribunal arbi-

tral entenda não dever admitir tal altera-ção. De referir que o demandado pode deduzir reconvenção, desde que o seu objeto seja abrangido pela convenção de arbitragem.Cabe ao tribunal arbitral decidir se se-rão realizadas audiências para a produ-ção de prova ou se o processo é apenas conduzido com base em documentos e outros elementos de prova. Todavia, o tribunal deve realizar uma ou mais audi-ências para a produção de prova sempre que uma das partes o requeira, a menos que as partes hajam previamente pres-cindido delas.As partes devem ser notificadas, com antecedência suficiente, de quaisquer audiências e de outras reuniões convo-

cadas pelo tribunal arbitral para fins de produção de prova.As peças escritas, documentos ou in-formações que uma das partes forneça ao tribunal arbitral devem ser comuni-cadas à outra parte, assim como deve ser comunicado às partes quaisquer relatório pericial ou elemento de prova documental que possa servir de base à decisão do tribunal.Só podem ser admitidos a intervir num processo arbitral terceiros vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se baseia, quer o estejam des-de a respetiva conclusão, quer tenham aderido a ela subsequentemente. Esta adesão carece do consentimento de to-das as partes na convenção de arbitra-

gem e pode ser feita só para os efeitos da arbitragem em causa.Se o tribunal arbitral estiver constituído, só pode ser admitida ou provocada a in-tervenção de terceiro que declare acei-tar a composição atual do tribunal. Em caso de intervenção espontânea, essa aceitação presume-se. De referir que a admissão da intervenção depende sem-pre de decisão do tribunal arbitral, após ouvir as partes iniciais na arbitragem e o terceiro em causa.Os árbitros julgam de acordo com o di-reito constituído, mas as partes podem determinar, por acordo, que aqueles julguem segundo a equidade. Contu-do, se o acordo das partes quanto ao julgamento segundo a equidade for

posterior à aceitação do primeiro árbi-tro, a sua eficácia depende de aceitação por parte do tribunal arbitral. O tribunal também pode decidir o litígio por ape-lo à composição das partes na base do equilíbrio dos interesses em jogo.

Sentença arbitral e recurso:A sentença que ponha termo ao pro-cesso arbitral só é suscetível de recurso para o tribunal estadual competente no caso de as partes terem expressamente previsto tal possibilidade na convenção de arbitragem e desde que a causa não haja sido decidida segundo a equida-de ou mediante composição amigável.Num processo arbitral com mais de um árbitro, qualquer decisão do tribu-

Num processo arbitral com mais de um

árbitro, qualquer decisão do tribunal arbitral

é tomada pela maioria dos seus membros. Se

não puder formar-se maioria, a sentença é

proferida pelo presidente do tribunal.

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eM foCoVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201114

nal arbitral é tomada pela maioria dos seus membros. Se não puder formar-se maioria, a sentença é proferida pelo pre-sidente do tribunal.As questões respeitantes à ordenação, à tramitação ou ao impulso processual poderão ser decididas apenas pelo ár-bitro presidente, se as partes ou os ou-tros membros do tribunal arbitral lhe tiverem dado autorização para o efeito.Se, no decurso do processo arbitral, as partes terminarem o litígio mediante transação, o tribunal arbitral deve pôr fim ao processo e, se as partes lho so-licitarem, dá a tal transação a forma de sentença proferida nos termos acorda-dos pelas partes, a menos que o con-teúdo de tal transação infrinja algum princípio de ordem pública.Proferida a sentença, esta é imediata-mente notificada através do envio a cada uma das partes de um exemplar assinado pelo árbitro ou árbitros, produ-zindo efeitos na data dessa notificação.A sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja suscetível de alteração tem o mesmo caráter obriga-tório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em jul-gado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual.Salvo se as partes, até à aceitação do pri-meiro árbitro, tiverem acordado prazo diferente, os árbitros devem notificar às partes a sentença final proferida sobre o litígio que por elas lhes foi submetido dentro do prazo de 12 meses a contar da data de aceitação do último árbitro.O processo arbitral termina quando for proferida a sentença final ou quando for ordenado o encerramento do processo pelo tribunal arbitral, nomeadamente:- se demandante desistir do seu pedi-

do, a menos que o demandado a tal se oponha e o tribunal arbitral reco-nheça que este tem um interesse le-gítimo em que o litígio seja definiti-vamente resolvido;

- as partes concordem em encerrar o processo;

- o tribunal arbitral verifique que a pros-secução do processo se tornou, por qualquer outra razão, inútil ou im-possível.

O presidente do tribunal arbitral deve conservar o original do processo arbitral durante um prazo mínimo de dois anos e o original da sentença arbitral durante um prazo mínimo de cinco anos.

anulação da sentença:Qualquer das partes pode pedir a anu-lação da sentença com base nos seguin-tes fundamentos:- Ficar demonstrado que uma das par-

tes da convenção de arbitragem es-tava afetada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou;

- que houve no processo violação de al-guns dos princípios fundamentais, ou

- a sentença se pronunciou sobre um li-tígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou

- a composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram con-formes com a convenção das partes, ou que não foram conformes com a lei da arbitragem e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou

- o tribunal arbitral condenou em quan-tidade superior ou em objeto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; ou

- a sentença foi notificada às partes de-pois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado.

Outros dos fundamentos para a anula-ção da sentença são: o tribunal verificar que o objeto do litígio não é suscetível de ser decidido por arbitragem nos ter-mos do direito português; ou o conteú-do da sentença ofender os princípios da ordem pública internacional do Estado português.

execução da sentença arbitral:A parte que pedir a execução da sen-tença ao tribunal estadual deve forne-cer o original daquela ou uma cópia certificada conforme e, se a mesma não estiver redigida em língua portu-

guesa, uma tradução certificada nes-ta língua.A sentença arbitral pode servir de base à execução, ainda que haja sido impug-nada mediante pedido de anulação, mas o impugnante pode requerer que tal impugnação tenha efeito suspensi-vo da execução desde que se ofereça para prestar caução, ficando a atribui-ção desse efeito condicionada à efeti-va prestação de caução no prazo fixado pelo tribunal (cfr. nº 3 do artigo 818º do Código de Processo Civil).À execução de sentença arbitral pode o executado opor-se com qualquer dos fundamentos de anulação da sentença acima indicados, desde que, na data em que a oposição for deduzida, um pedido de anulação da sentença arbitral apre-sentado com esse mesmo fundamento não tenha já sido rejeitado por sentença transitada em julgado.Na oposição à execução da sentença arbitral também podem ser deduzidos quaisquer dos demais fundamentos previstos para esse efeito na lei de pro-cesso aplicável, nos termos e prazos aí previstos.

arbitragem internacional:Entende-se por arbitragem internacio-nal a que põe em jogo interesses do comércio internacional. A arbitragem internacional regula-se pelas normas aplicáveis à arbitragem interna, salvo as seguintes especificidades:- Quando a arbitragem seja internacional

e uma das partes na convenção de arbi-tragem seja um Estado, uma organiza-ção controlada por um Estado ou uma sociedade por este dominada, essa par-te não pode invocar o seu direito inter-no para contestar a arbitrabilidade do litígio ou a sua capacidade para ser par-te na arbitragem, nem para de qualquer outro modo se subtrair às suas obriga-ções decorrentes daquela convenção.

A nova lei da arbitragem voluntária é aplicável a todas as arbitragens que tenham lugar em território português, bem como ao reconhecimento e à exe-cução em Portugal de sentenças pro-feridas em arbitragens localizadas no estrangeiro.

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atualidadeS VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 15

eletricidade – revogação da prestação de serviço de interruptibilidade

No dia 22 do passado mês de dezem-bro entrou em vigor a Portaria n.º 310/2011, de 21.12, que revoga o

regime transitório aplicável, durante o ano de 2011, à prestação de serviço de inter-ruptibilidade por consumidor de eletrici-dade em muita alta tensão (MAT), alta ten-são (AT) e média tensão (MT) ao operador da rede de transporte.Recordamos que a extensão do serviço de interruptibilidade aos consumidores de eletricidade em MAT, AT e MT abrangidos pelo escalão de potência máxima inter-

ruptível consubstanciou uma medida adi-cional, com carácter transitório, destinada a fomentar a comercialização de eletricidade em regime livre. Em face da atual evolução, que aponta para a retração da procura, e atentas as orientações de política energé-tica do atual governo, tornou-se necessário cessar a vigência da referida medida adicio-nal. Assim, os contratos de adesão ao servi-ço de interruptibilidade celebrados com o Operador da Rede Nacional de Transporte vigoram apenas até ao dia 31 de dezembro de 2011, não podendo ser prorrogados.

limite legal do fundo de Garantia de depósitos fixado em 100 000 eurosNo dia 1 de janeiro de 2012 entrou em vigor o DL n.º 119/2011, de 26.12, que estabelece, de forma permanente, em 100 000 euros o limite legal da garantia do reembolso de depósitos constituídos nas instituições de crédito participantes por parte do Fundo de Garantia de Depósitos e do Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, no caso de se verificar uma situação de indisponibilidade dos depósitos.

atribuição de ajudas de custo aos deputados – alterações

A Resol. da AR n.º 164/2011, de 29.12, introduz alterações aos princípios gerais de atribuição

de despesas de transporte e alojamen-to e de ajudas de custo aos deputados. De acordo com as citadas alterações, a partir de 1.1.2012, as deslocações em missão oficial de comissões, delega-

ções ou deputados para participarem nos trabalhos de organizações interna-cionais de que a Assembleia da Repú-blica é membro ou outras de idêntica natureza passam a ser feitas em classe económica quando, a partir de Lisboa, tenham uma duração igual ou inferior a quatro horas de voo.

revisão ao regime do arrendamento urbano. limites aos valores das rendas

No Conselho de Ministros do passa-do dia 29 de dezembro de 2011, foi aprovada a proposta de lei que

procede à revisão do regime jurídico do ar-rendamento urbano. O objetivo desta re-forma é criar um verdadeiro mercado de arrendamento, por forma a oferecer solu-ções de habitação mais ajustadas às neces-sidades dos portugueses. As principais al-terações respeitam aos contratos de arren-damento para habitação, tendo por base as seguintes linhas de intervenção: maior liberdade às partes, promovendo o apare-cimento de contratos de duração variada, nomeadamente mais curtos; reforço do mecanismo de resolução do contrato de arrendamento quando o arrendatário se encontre em mora, permitindo uma mais rápida cessação do contrato e consequen-te desocupação do locado; e, em terceiro

lugar, a agilização do procedimento de de-núncia do contrato de arrendamento cele-brado por duração indeterminada.Segundo tem vindo a ser anunciado, este novo regime impõe um limite ao valor das rendas, no sentido de que as futuras ren-das não possam pesar mais de 25% no rendimento mensal bruto do agregado fa-miliar. O cálculo do rendimento para este efeito tem em conta o número de filhos e cada dependente reduz em 242,5 euros o rendimento considerado. Será natural, por isso, que as rendas antigas pagas por famílias da classe média, com rendimentos brutos mensais até 2400 euros, possam su-bir, no máximo, até 600 euros. Já para as famílias com rendimentos brutos até 500 euros, a subida fica limitada, com uma taxa de esforço máxima de 10%. Nestes casos a renda não pode ir além dos 50 euros.

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atualidadeSVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201116

extinção dos Juízos liquidatários dos tribunais

administrativos e fiscais

Pela Port. n.º 320/2011, de 30.12, foram declarados extintos, com efeitos a 1 de

setembro de 2011, os juízos liquidatários do Tribunal Administrativo e Fiscal do

Porto, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra e do Tribunal Administrativo

e Fiscal de Sintra. Os processos pendentes nos Juízos

Liquidatários ora extintos transitam para os Tribunais Administrativos e Fiscais das

respetivas comarcas.

Censo sobre a viabilidade das fundações nacionais e estrangeiras

Entrou em vigor no passado dia 4 de janeiro a Lei n.º 1/2012, de 3.1, que determina a realização de um cen-

so dirigido às fundações, nacionais ou estrangeiras, que prossigam os seus fins em território nacional, com vista a avaliar o respetivo custo/benefício e viabilidade financeira e decidir sobre a sua manuten-ção ou extinção, sobre a continuação, re-dução ou cessação dos apoios financei-ros concedidos, bem como sobre a ma-nutenção ou cancelamento do estatuto de utilidade pública.Compete ao Ministério das Finanças pro-ceder à avaliação do custo/benefício e viabilidade, com base no questionário, documentação e informação disponi-bilizados pelas fundações e pelas enti-dades públicas, bem como promover a

publicação dessa avaliação no Portal do Governo. No prazo máximo de 30 dias após publicação da avaliação, o Ministé-rio das Finanças emite, em conjunto com a respetiva tutela setorial, decisão final a determinar:- A manutenção ou a extinção da funda-ção no caso de fundações públicas de di-reito público ou de direito privado;- A continuação, a redução ou a cessação de apoios financeiros à fundação, que te-nham sido concedidos pela administra-ção direta ou indireta do Estado, Regiões Autónomas, autarquias locais, outras pes-soas coletivas da administração autóno-ma e demais pessoas coletivas públicas;- A manutenção ou o cancelamento do estatuto de utilidade pública da fun-dação.

alterações ao Cire

No Conselho de Ministros do pas-sado dia 30 de dezembro foi aprovada uma proposta de lei

que revê o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – CIRE. Esta reforma tem como objetivo principal reorientar o CIRE para a promoção da recuperação, privilegiando-se, sempre que possível, a manutenção da empre-sa em dificuldade no giro comercial, criando-se uma nova oportunidade antes da liquidação do seu património.Por outro lado, reforça-se a respon-sabilidade dos devedores, bem como dos seus administradores, de direito ou de facto, no caso de estes terem sido causadores da situação de insol-vência com culpa. Promovem-se tam-bém a simplificação de procedimen-tos, o ajustamento de prazos, a possibilidade de adapta-ção do processo ao caso

concreto, o reforço das competências do juiz em termos de gestão proces-sual, a delimitação clara do âmbito de responsabilidade dos administrado-res da insolvência, o reforço da tutela efetiva dos dependentes do devedor insolvente com direito a alimentos e a melhoria da articulação entre a ação executiva e o processo de insolvência.No que se refere ao processo especial de revitalização, pretende-se que ele seja um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização da empresa que se encontre em situação económi-ca difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda

não tenham entrado em situação de insolvência atual.

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atualidadeS VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 17

acesso ao direito – fiscalização do pagamento das compensações aos defensores/patronos oficiosos

No último dia de 2011 entrou em vigor a Port. n.º 319/2011, de 30.12, que introduz a terceira al-

teração à regulamentação da lei do aces-so ao direito. Em 2008, o diploma que regula a Lei do Acesso ao Direito estabeleceu, entre ou-tros, o modo da admissão dos profissio-nais forenses no sistema de acesso ao di-reito, a forma da nomeação de patrono e de defensor, o pagamento da respetiva compensação e o valor da taxa devida pela prestação de consulta jurídica. Posteriormente, foram alterados os me-canismos de nomeação dos profissionais forenses e de gestão do sistema informá-tico. Com essas alterações eliminou-se a necessidade de confirmação da infor-mação remetida pela Ordem dos Advo-gados ao Instituto de Gestão Financeira e de Infraestruturas de Justiça, I. P. (IGFIJ) pelas secretarias dos tribunais, referente ao pagamento das compensações devi-das aos profissionais forenses. Embora permaneça por esclarecer se se trata ou não de verdadeiras irregularidades, o cer-to é que o Ministério da Justiça já anun-ciou publicamente que detetou inúmeras desconformidades nos pedidos de paga-mento de honorários formulados pelos profissionais forenses no âmbito do apoio judiciário. É urgente, por isso, moralizar o sistema, pelo que foram agora reintrodu-

zidos os tais mecanismos de fiscalização. Assim, de acordo com as alterações ora introduzidas, o pagamento da compen-sação devida aos profissionais forenses deve ser processado pelo IGFIJ, I. P., até ao termo do mês seguinte àquele em que é confirmada no sistema, pela secretaria do tribunal ou serviço competente junto do qual corre o processo, a prática dos factos determinantes da compensação. Para efeitos de confirmação no sistema, o IGFIJ, I. P cria e disponibiliza uma página da internet, de acesso reservado às enti-dades junto das quais corra processo em que tenha sido concedido apoio judiciá-rio, com os mecanismos para tal neces-sários. As entidades junto das quais corra processo em que tenha sido concedido apoio judiciário devem verificar quin-zenalmente a página da internet acima mencionada. De referir que, no caso da consulta jurídica realizada em escritório de advogado, a sua realização tem de ser confirmada por remessa eletrónica, em formato PDF, pelo profissional forense ao IGFIJ, I. P. da declaração assinada pelo be-neficiário da consulta jurídica atestando que a mesma lhe foi prestada, para efeitos do pagamento da compensação devida. Estas alterações aplicam-se aos pedidos de pagamento efetuados pelos profissio-nais forenses inscritos no sistema de aces-so ao direito, pendentes em 31.12.2012.

liquidação da taxa de justiça em duas prestações mantém-se até 31.12.2012Foi recentemente aprovada a Port. n.º 1/2012, de 2.1, que introduz alterações ao art. 44.º da Port. n.º 419-A/2009, de 17.4, (estabelece a regulamentação do modo de elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, processamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades), determinando que até 31 de dezembro de 2012 a taxa de justiça poderá ser liquidada em duas prestações iguais e sucessivas, a primeira no momento da entrega da peça em juízo e a segunda nos 90 dias subsequentes.

taxa de juros comercial desce para os 8% no 1.º semestre de 2012

De acordo com o aviso Aviso n.º 692/2012, de 17.1 (II série), a taxa supletiva de juros moratórios re-

lativamente a créditos de que sejam ti-tulares empresas comerciais, singulares ou coletivas, nos termos do § 3.º do arti-go 102.º do Código Comercial, para vigo-rar no 1.º semestre de 2012, foi atualizada para os 8 %. A taxa que vigorou no semes-tre anterior estava fixada nos 8,25% (avi-so n.º 14190/2011, de 14.7), sendo que do

2.º semestre de 2009 ao 1.º semestre de 2011 manteve-se fixada nos 8%, tal ago-ra acontece. Dispõe o n.º 4 do artigo 102.º do Código Comercial que a taxa de juro não poderá ser inferior ao valor da taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu à sua mais recente operação principal de refinanciamento efetuada antes do 1.º dia de janeiro ou de julho, consoante se este-ja, respetivamente, no 1.º ou no 2.º semes-tre do ano civil, acrescida de 7%.

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atualidadeSVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201118

A Proposta de Lei n.º 27/XII, que apro-va a lei do Orçamento do Estado para 2012, introduz inúmeras alterações ao Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT). Estas alterações traduzem, em geral, um aumento do valor das coi-mas previstas e um agravemanto das penas (de multa e presão) aplicáveis nesta matéria, como veremos nal-guns dos exemplos que passamos a descrever:De acordo com as citadas alterações passam a considerar-se contraorde-nações simples as puníveis com coi-ma cujo limite máximo não exceda € 5750, e contraordenações graves as puníveis com coima cujo limite má-ximo seja superior a € 5750. Recorda-mos que o limite atual para efeitos de classificação das contraordenações está fixado nos € 3750.No que concerne ao limite máximo do valor das coimas a aplicar às pes-soas coletivas passa de 110.000 € para 165.000 €, em caso de dolo, e de 30.000€ para 45.000€, em caso de ne-gligência. Estes limites máximos são reduzidos a metade no caso das pes-soas singulares, tal como já sucedia anteriormente. A percentagem da redução das coimas sofre agora uma diminuição. Assim, essa redução passa dos atuais 30%

para 12,5% do mínimo legal sempre que o pedido de pagamento seja apre-sentado nos 30 dias posteriores ao da prática da infração e não tiver sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado procedimento de inspeção tributária; e passa dos atuais 50% para 25% do mínimo legal, sempre que o pedido de pagamento seja apresentado de-pois daquele prazo, sem que tenha sido levantado auto de notícia, rece-bida participação ou iniciado procedi-mento de inspeção tributária.A punição do crime de burla tributária é agravada nos casos em que a atribui-ção patrimonial seja de valor elevado. Nestes casos, a pena que era de prisão até cinco anos ou multa até 600 dias, passa a ser de prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e a de multa de 240 a 1200 dias para as pessoas coletivas. Quanto ao crime de fraude no trans-porte de mercadorias em regime sus-pensivo, a respetiva punição também sofre alterações. A pena aplicável, que era de pena de prisão até 3 anos ou pena de multa até 360 dias, se o valor da prestação tributária em falta fosse superior a € 15 000 ou, não havendo lugar a prestação tributária, a merca-doria objeto da infração fosse de valor

aduaneiro superior a € 50 000, passa a ser de prisão até 3 anos ou pena de multa até 360 dias, se o valor da pres-tação tributária em falta for superior a € 15 000 ou, não havendo lugar a pres-tação tributária, a mercadoria objeto da infração for de valor aduaneiro su-perior a € 50 000.O crime de introdução fraudulenta no consumo introduz a incriminação da-queles que, com intenção de se sub-trairem ao pagamento dos impostos especiais sobre o álcool e as bebidas alcoólicas, produtos petrolíferos e energéticos ou tabaco, obtiverem, mediante falsas declarações ou qual-quer outro meio fraudulento, um be-nefício ou vantagem fiscal. Este crime passa a ser punido com pena de pri-são até 3 anos ou com pena de multa até 360 dias, se o valor da prestação tributária em falta for superior a € 15 000 ou, não havendo lugar a presta-ção tributária, se os produtos objeto da infração forem de valor líquido de imposto superior a € 50 000. Esta pena é também aplicável a quem, com in-tenção de se subtrair ao pagamento da prestação tributária devida introdu-zir no consumo veículo tributável com obtenção de benefício ou vantagem fiscal mediante falsas declarações, ou qualquer outro meio fraudulento, se o

Proposta do oe para 2012 – alterações ao rGit

registo predial – certidões online

Os pedidos de certidão de Registo Predial são, desde o passado dia 1 de janeiro de 2012, feitos exclu-

sivamente online. Estes pedidos de certi-dão realizam-se, desde então, apenas via internet, a partir do site Predial Online.Os interessados devem aceder à área Certidões Online (portal do cidadão) e selecionar essa opção, sendo encami-nhados para o site do Instituto dos Regis-tos e Notariado, onde poderão solicitar a certidão permanente.O serviço Certidões Online está dispo-nível no Portal do Cidadão e continua

a possibilitar o pedido de certidões de Registo Civil com menos de 100 anos e a disponibilizar os acessos aos sites onde é possível efetuar os pedidos de certidões permanentes de Registo Civil, Comercial e Predial.Desde o início do corrente ano, quais-quer questões relacionadas com pedidos de certidões de Registo Predial passam a ser colocadas através da Linha Regis-tos, pelos telefones 707 20 11 22 (Portu-gal) ou (+351) 21 54 44 75 (estrangeiro); ou pelo e-mail - [email protected].

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atualidadeS VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 19

valor da prestação tributária em falta for superior a € 15 000.A punição da qualificação deste crime é alterada da atual pena de prisão até 5 anos ou pena de multa até 600 dias para a seguinte pena de prisão até cin-co anos ou pena de multa até 600 dias para a seguinte pena – prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e de multa de 240 a 1200 dias para as pessoas coletivas.O crime de contrabando de mercado-rias suscetíveis de infligir a pena de morte ou tortura passa a ser punido com com pena de prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e de multa de 240 a 1200 dias para as pes-soas coletivas. Actulamente este crime é punido com pena de prisão até cinco anos ou pena de multa até 600 dias.As coimas prevista para o descami-nho e para à introdução irregular no consumo são elevadas dos atuais € 150 a € 150 000 para o valor de € 250 a € 165 000.A recusa de entrega, exibição ou apre-sentação de escrita, contabilidade, de-clarações e documentos ou a recusa de apresentação de mercadorias às enti-dades com competência para a inves-tigação e instrução das infrações adu-aneiras passa a ser punível com coima de € 150 a € 15 000. Os valores atuais da coima aplicável são de €100 a € 10 000.Já a coima aplicável à falta de entrega ou atraso na entrega das declarações fiscais passa a ser de € 75 a € 3750, en-quanto atualmente é de € 50 a € 2500.A violação do dever de cooperação, assim como as omissões e inexatidões nas declarações ou em outros docu-mentos tributariamente relevantes, bem como a aquisição de mercadorias objeto de infração aduaneira passam a ser punidos com coima de € 75 a € 7500. As coimas atuais não ultrapas-sam os € 5000.A recusa de entrega, exibição de escri-ta e de documentos fiscalmente rele-vantes passa a ser punida com coima mais elevada do que a atualmente prevista, ou seja, com coima de € 375 a € 75 000.

A coima aplicável ao pagamento do imposto por forma diferente da legal-mente também sofre um acréscimo, tendo agora como limites mínimo € 75 e máximo € 2000.A coima que pune a violação do segre-do fiscal passa de € 50 a € 1000, para € 75 a € 1500.A falta de declarações que para efei-tos fiscais devem ser apresentadas a fim de que a administração tributária especificamente determine, avalie ou comprove a matéria coletável, bem como a respetiva prestação fora do prazo legal, passa a ser punível com coima de € 150 a € 3750. A falta de apresentação, ou a apre-sentação fora do prazo legal, das de-clarações de início, alteração ou ces-sação de atividade, das declarações autónomas de cessação ou alteração dos pressupostos de benefícios fis-cais e das declarações para inscrição em registos que a administração fiscal deva possuir de valores patrimoniais é agora punível com coima de € 300 a € 7500, sendo que a falta de apresenta-ção no prazo que a administração tri-butária fixar dos elementos referidos no n.º 8 do artigo 66.º do Código do IRC passa a ser punível com coima de € 500 a € 10 000.A falsificação, viciação e alteração de documentos fiscalmente relevantes passará a ser punivel com coima vari-ável entre € 750 e o triplo do impos-to que deixou de ser liquidado, até € 37 500. As coimas aplicáveis às omissões e ine-xatidões em documentos fiscalmente relevantes passam dos atuais € 250 a € 15 000, para € 375 a € 22 500.A inexistência de contabilidade ou de livros fiscalmente relevantes passa a ser punível com coima entre € 225 e € 22 500. E a não organização da con-tabilidade de harmonia com as regras com coima de € 75 a € 2750.A falta de apresentação, no prazo le-gal e antes da respetiva utilização, de livros, registos ou outros docu-mentos relacionados com a conta-bilidade ou exigidos na lei é punível

com coima de € 75 a € 750, sendo a coima atual aplicada fixada entre os € 50 e os € 500.A violação do dever de emitir ou exi-gir recibos ou faturas é agora punida com coima que pode ir dos € 150 aos € 3750.A punição pela falta de designação de representantes perante a administra-ção tributária passa a ser de coima de € 75 a € 750, atualmente fixada entre € 50 e € 5000.Sempre que o representante fiscal do não residente, quando pessoa diferen-te do gestor de bens ou direitos, não apresentar à administração tributária a identificação do gestor de bens ou direitos é punível com coima de € 75 a € 3750. O pagamento indevido de rendimen-tos é punível com coima entre € 35 e € 750. E a falta de retenção na fonte relativa a rendimentos sujeitos a esta obrigação, é punível com coima de € 375 a € 3750.A transferência para o estrangeiro de rendimentos sujeitos a imposto, obti-dos em território português por enti-dades não residentes, sem que se mos-tre pago ou assegurado o imposto que for devido, é punível com coima de € 375 a € 37 500. A coima atual é de € 250 a 25 000.A violação da obrigação de possuir e movimentar contas bancárias é puní-vel com coima de € 270 a € 27 000. Por outro lado, a falta de realização atra-vés de conta bancária de movimentos e a realização de pagamento através de meios diferentes dos legalmente previstos é punível com coima de € 180 a € 4500. Por último, importa referir uma nova situação que passa ser punível com coima. Trata-se das omissões ou ine-xatidões relativas aos atos, factos ou documentos relevantes para a apre-ciação de pedidos de informação vin-culativa, prestadas com caráter de ur-gência, apresentados nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária, que passa ser puníveis com coima de € 375 a € 22 500.

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reGiStoS e NotariadoVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201120

A alteração ao contrato social pode consistir na introdução, supressão ou modifi cação de algu-mas das suas cláusulas. As mudanças devem ser resultado de uma delibe-ração dos sócios, tomada em conformidade com o tipo de sociedade que detêm.Estas modificações po-dem ocorrer, por exem-plo, através de aumento ou redução de capital ou cessão de quotas, sen-do, inclusive, possível realizar uma cessão de quotas e aumento de capital em simultâneo. Além destas operações, pode igualmente haver lugar a alteração de fi rma, mudança do objeto social ou modifi cação de sede da sociedade.A minuta que a seguir publicamos traduz um exemplo de contrato de cessão de quotas com al-teração de contrato social.

alteração do contrato social - cessão de quotas

MiNuta de CoNtrato de CeSSÃo de Quota CoM alteraÇÃo do CoNtrato SoCial

Data da celebração:Dia ……………...mês de………………………de ……………………..…….Local: -

Entidade sujeita a registo comercial (IDENTIFICAÇÃO)- fi rma/denominação social: - “ …………………...................., Lda.”- natureza jurídica - sociedade …………….. por quotas – (*1)- sede – Rua ………………, freguesia de ......, concelho de …….…….…- capital social - ……………………………………………….…… euros- matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ... sob o nº…………………..../NIPC

Cedente:- o sócio F…………….........……, viúvo, natural de ……….......…, NIF …....………, residência

………………………………….…, valor nominal da quota cedida: ……………………………eurosPreço da cessão: ……………………………………………………euros

Cessionário: - F…………………………………………………………, NIF .........…,- residência ………………………………………………………………Os cedentes afi rmam, sob sua responsabilidade exclusiva, que são os legítimos donos e possui-

dores das quotas cedidas, as quais se encontram totalmente liberadas e livres de quaisquer ónus ou encargos e não são objeto de qualquer litígio de natureza judicial ou extrajudicial.

Os sócios cedentes que exerciam o cargo de gerentes renunciam à gerência, nesta data, e sob sua inteira responsabilidade declaram:

- que a sociedade não tem trabalhadores ou outro tipo de assalariados ao seu serviço;– que a situação contributiva da sociedade perante o Fisco e a Segurança Social se encontra

regularizada; – que a sociedade, para além da faturação já facultada ao cessionário, cujo vencimento ocorre

após a celebração deste contrato, não tem outras dívidas perante terceiros, nem foi notifi cada, até ao momento presente, para o pagamento de quaisquer responsabilidades, incluindo as resultantes de fornecimento de bens ou de serviços.

– que o capital social está integralmente realizado e os elementos contabilísticos fornecidos, em anexo, refl etem a real situação líquida da sociedade, não tendo havido, até à presente data, diminuições patrimoniais.

Os cedentes declaram que o estabelecimento principal da sociedade se encontra instalado em local tomado de arrendamento por contrato particular celebrado em ……, de cuja relação cons-tituída não decorre nenhum litígio, e pelo qual vem sendo paga a renda mensal de ………….., resultante da última atualização, conforme cópia da comunicação feita pelo senhorio, em anexo.

As partes declaram que a celebração do contrato defi nitivo dá cumprimento ao contrato-promessa de divisão e cessão de quotas celebrado no dia ....................................................

As partes declaram aceitar o contrato, nos termos exarados.

(assinaturas)

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aNáliSe VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 21

Por: José Rui Nunes de Almeida

Economista e Jurista

(Continuação da edição de Novembro da VidaJudiciária 2011)

- Este desigual sancionamento é injus-to, tornando-se necessário um endu-recimento das instâncias formais de controlo;A estas reflexões, nós acrescentamos uma outra que é a seguinte: - A prática destes crimes económicos e financeiros é perpetrada, na sua grande maioria, por sociedades comerciais.

2.3 - CoNeXÃo doS CriMeS CoM aS SoCiedadeS CoMerCiaiS

Ao longo de muitos anos do século XIX e grande parte do XX, as empresas, en-quadradas numa economia liberalizada sem qualquer intervenção do Estado, foram adquirindo grande capacidade organizativa, a qual se desenvolveu com uma intervenção do Estado muito residual. Num período pós-Revolução Industrial começou a existir maior inter-venção do Estado, por via das Institui-ções Públicas e do próprio Governo com os seus organismos, na economia. Esta

situação obrigou os Estados a criarem mecanismos de intervenção através de novas metodologias acompanhadas de uma institucionalização crescente. A fase de transição do liberalismo econó-mico para a intervenção dos Governos na atividade económica, como diz SAN-TOS33, nem sempre foi bem compreen-dida pelo homem de negócios e pelo público em geral, que sofreriam, assim, um conflito de valores, divididos entre uma antiga perspetiva da economia e os novos tempos do intervencionis-mo estatal, com os diferentes padrões de comportamento que este acarreta. Como se referiu acima, pela aquisição do saber tradicional, o mundo dos ne-gócios possui uma firme organização no sentido de permitir a infração das normas que o regem, já a sociedade está muito menos organizada no que se refere à criação de mecanismos aptos a impedirem aquela violação. A firmeza da comunidade empresarial na preser-vação das práticas ilícitas contrasta com a fraqueza da estrutura política na erra-dicação das mesmas. Na mesma linha, SUTHERLAND34, pelo segundo ponto da teoria geral que possa explicar o crime “white-collar”, ou seja, a “desorganização social” culmina

a prática de crimes, porque a socieda-de não está organizada para os preve-nir. É referida a importância do estudo das condições sócio-estruturais, como o capitalismo e a busca do lucro no cri-me “white-collar”.Dentro da mesma opinião dos autores referidos, entendemos que as práticas criminosas contra a economia, na sua grande maioria, são perpetradas por so-ciedades comerciais, as quais, dentro do universo das pessoas coletivas, são, na atualidade, as que têm no seu objeto a prática de negócios ou atividades lucra-tivas35. Assim se entende que as práticas negociais ilegais, que motivam as socie-dades, por serem lucrativas, vão con-tinuar até a comunidade política estar efetivamente organizada contra elas36. SANTOS37 diz que em torno do conceito de “crime de colarinho branco” surgiram novas categorias criminológicas, alega-damente mais determinadas e, por isso, menos passíveis de dúvidas quanto aos comportamentos por si abarcados. BRAI-THWAITE38 entende que os progressos teóricos relativos ao “white-collar crime” só surgiram no final dos anos setenta do século XX, com a rejeição da originá-ria construção de cunho individualista e a aplicação ao estudo do fenómeno

Crimes económicos e financeiros (Parte ii)

33 SANTOS, Cláudia Cruz; “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 51; Coimbra Editora (2001).

34 CRUZ, José Neves; “O Crime de Colarinho Branco: complexidades de definição do objeto de estudo”, p. 8, “Criminologia”, Universidade do Porto, Faculdade de Direito (2010).

35 O art. 1º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) diz que são sociedades comerciais aquelas que tenham por objeto a prática de atos de comércio. O seu art. 6º, nº1, considera que a capacidade da sociedade compreende os direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução do seu fim (obtenção do lucro). O art. 2º do Código Comercial diz que serão considerados atos de comércio todos aqueles que se acharem regulados neste código, e, além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio ato não resultar. O art. 13º do Código Comercial considera que são comerciantes também as sociedades comerciais. Com este enquadramento jurídico das atividades de natureza comercial e de iniciativa societária, não se pretende dizer que a constituição de sociedades comerciais visa a prática de atos ilícitos. O que quere-mos dizer é que com as atividades lícitas motivadas com a constituição de sociedades comerciais existe o oportunismo de lhe juntar e esconder atividades ilícitas e algumas criminosas.

36 Apud VOLD, George e BERNARD, Thomas, “Theoretical Criminology”, Oxford University Press, 1986, cit. por SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 51; Coimbra Editora (2001).

37 SANTOS, Cláudia Cruz; “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 75; Coimbra Editora (2001).

38 Apud BRAITHWAITE JOHN, “White-collar crime”, in Anual Review of Sociology, 1985, cit. por SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 75; Coimbra Editora (2001).

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aNáliSeVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201122

dos paradigmas da teoria das organi-zações – o que veio a manifestar-se na especial atenção prestada ao crime or-ganizacional.BLOCH e GEIS39, na procura de alguma homogeneidade nas várias espécies de condutas delituosas, conduziram ao surgimento de classificações que distinguiram os delitos económicos co-metidos: 1) por indivíduos contra indi-víduos; 2) por empregados contra seus empregadores; 3) por indivíduos que desempenham funções de fiscalização no interesse das organizações; 4) por agentes da organização contra o públi-co em geral; 5) por comerciantes contra consumidores. Nesta classificação mais precisa ou determinada de crime de co-larinho branco, na opinião, CLINARD e QUINNEY40 temos: a) os crimes cometi-dos por indivíduos, no seu próprio inte-resse e no exercício das suas ocupações profissionais (“occupational crime”); b) os crimes cometidos por funcionários de uma organização no interesse des-ta (corporate crime). Na afirmação de BRAITHWAITE41, como refere a autora, o conceito de “corporate crime”, ao abran-ger comportamentos dotados de uma maior uniformidade, poderá ser espe-cialmente útil para uma coerente teo-rização daquelas infrações.No Direito Penal substantivo não existe como tipo legal do crime “o crime de co-larinho branco”, existem sim, no Código

Penal, vários tipos legais de crime tipifi-cados nos crimes contra o património e contra pessoas, e cujos agentes podem ser designados de criminosos de colari-nho branco. Nas palavras de ALMEIDA42, criminalidade económica ... mais sofisti-cada, organizada e perigosa porque tra-vestida de colarinho branco com acesso fácil ao poder político, social, económi-co e financeiro. Como se pode retirar da análise até aqui exposta, uma grande parte dos crimes económico-financeiros estão relacionados com uma atividade or-ganizada e no interesse de uma asso-ciação de pessoas. Nas palavras de SANTOS43, uma parte significativa das infrações praticadas por pessoas coletivas no mundo ne-gocial repercutir-se-á em danos para o próprio sistema económico que, em última análise, acabarão por se propa-gar e atingir, com maior ou menor in-tensidade, os vários membros da co-munidade.Em termos de Criminologia, CLINARD e QUINNEY44 consideram que o crime “white-collar”, além de estar conectado com o “occupational crime”45, também o está com o “corporate crime”46. CRUZ47 relaciona o crime “white-collar” ao exer-cício de negócios próprios da atividade das sociedades comerciais, nomeada-mente, omissões relativas à situação fi-nanceira das empresas, a manipulação

da cotação dos títulos, o recurso a prá-ticas de suborno... o desvirtuamento da informação aos consumidores com pu-blicidade enganosa... a fraude fiscal e as falências fraudulentas”. Os autores48, sobre a análise do crime organizado, apontaram dez elementos fundamentais que de forma muito re-sumida assentam que a prática dos cri-mes, objeto deste estudo, são de base organizativa e com atividades defini-das e direcionadas a parte das neces-sidades da população (clientes), tendo por objeto ou fim a maximização do lucro. Para a obtenção dos fins a que a organização se propôs, há funções bem segregadas e com especialização e há a colaboração de elementos exteriores à organização, nomeadamente, políti-cos, magistrados, polícias e homens de negócios. Ao funcionamento das atividades ilegais juntam-se o exercí-cio das legais, funcionando assim, am-bas, em perfeita discrição na vida em sociedade. Os elementos fundamentais relativa-mente ao crime organizado identifi-cam-no, como diz SANTOS49, em mol-des empresariais, de organizações estruturadas e racionalizadas. Desses elementos distingue-se o crime orga-nizado do crime organizacional e per-cebe-se que o crime organizacional pode ser mais abrangente que o “cor-porate crime” e o “white-collar crime”.

39 Ibidem.

40 SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 76; Coimbra Editora (2001).

41 Apud BRAITHWAITE JOHN, “White-collar crime”, in Anual Reviw of Sociology, 1985, cit. por SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 75; Coimbra Editora (2001).

42 ALMEIDA, Maria Cândida, Textos introdutórios: “Breves reflexões sobre uma obra de combate à corrupção”, in Corrupção e Direito Penal, Coimbra Editora, 2007.

43 SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 78; Coimbra Editora (2001).

44 CRUZ, José Neves; “O Crime de Colarinho Branco: complexidades de definição do objeto de estudo”, p. 17, Criminologia, Universidade do Porto, Faculdade de Direito (2010).

45 Crime relacionado com o exercício de uma profissão.

46 Crime organizacional, que engloba o crime empresarial, associativo e ou outro tipo associativo de origem privada ou pública.

47 CRUZ, José Neves; “O Crime de Colarinho Branco, complexidades de definição do objeto de estudo”, p. 7, “Criminologia”, Universidade do Porto, Faculdade de Direito (2010).

48 ABADINSKY, Howard, “Organised Crime”, Chicago, 1990 e SCHNEIDER, Hans, “Recientes investigaciones criminológicas sobre a criminalidad organizada”, 1993, in SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 86 e ss., Coimbra Editora (2001).

49 SANTOS, Cláudia Cruz - “O Crime de Colarinho Branco”, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, p. 86, Coimbra Editora (2001).

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aNáliSe VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 23

Como diz GODINHO50, a criminalidade económica é uma realidade que con-forma um universo muito amplo: abar-ca desde formas de criminalidade da empresa51, passando pelas mais com-plexas formas de criminalidade de em-presa52, até ao mais grave fenómeno da empresa ilícita53.Como se pode entender, a criminali-dade económica e financeira passa na maioria das vezes pela existência de uma estrutura empresarial e, em cú-mulo, com a aparência de legalidade. Compreende-se que a atuação da cri-minalidade organizada não se limita à criminalidade económica e financeira. A primordial questão que se coloca no âmbito do direito penal económico, de forma autónoma daquela da responsa-bilidade penal das pessoas coletivas, é a de levantar o véu de uma pessoa co-letiva, para averiguar quem, de entre os seus membros, se apoiou na estrutura organizativa complexa e hierarquizada que constitui a empresa para o cometi-mento de numerosos atos puníveis com o menor risco possível.Num estudo realizado54 na antiga Re-pública Federal da Alemanha pelo Max Planck Institut, entre 1974 e 1985, che-

gou-se à constatação que 80% da cri-minalidade económica foi cometida no seio de uma empresa, o que demonstra a prevalência da empresa e correlativa estrutura organizativa neste tipo de cri-minalidade. Como conclui GODINHO55, a empresa não é só lugar onde ou por onde a criminalidade económica se pode desencadear, ela é fundamental-mente o “topos” de onde a criminalida-de económica pode advir.Em Portugal, na realidade social de 2007, para efeitos estatísticos, há gran-des dificuldades em encontrar fontes de informação sobre a criminalidade eco-nómica e financeira. Como foi referido no “Diário de Notícias”56 sobre o aban-dono da estatística, é afirmado que os péssimos resultados que Portugal tem para mostrar em matéria da repressão da corrupção têm a investigação crimi-nal como um dos principais problemas. Segundo esta fonte, a organização do Ministério Público, com maus métodos de trabalho e de direção, está desajus-tada às exigências da investigação do crime económico-financeiro, o que se reflete numa estratégia de política cri-minal inconsequente, nebulosa, por ve-zes paradoxal.

No estudo57 sobre a economia não re-gistada em Portugal (ENR) é referido que o peso da ENR no Produto Interno Bruto (PIB) oficial evoluiu desde 9,3%, em 1970, até 24,2%, em 2009. Esta in-formação é relevante para perceber que existem muitos crimes que expli-cam este elevado peso na economia da ENR, principalmente o crime de fraude e evasão fiscal, que além de provocar desigualdades sociais e distribuição in-justa da riqueza, lesa de forma direta o erário público. Na atualidade, tem havido grandes pre-ocupações em atacar o crime econó-mico58. Várias notícias da comunicação social têm dado muita importância ao fenómeno da criminalidade económica, referindo-se essencialmente ao prejuí-zo que a mesma causa ao erário públi-co59. De várias notícias, que têm vindo à opinião pública, relacionadas com a criminalidade económica e financeira, destacamos o caso mediático da Câma-ra Municipal de Oeiras60, pelo facto de haver em concreto decisões judiciais. No acórdão foi confirmada a condena-ção do arguido dos crimes: abuso de poder, fraude fiscal, branqueamento de capitais, de que resultou a condenação

50 GODINHO, Inês Fernandes, “Temas de Direito Económico” - Coordenação de José de Faria Costa - “A atuação em nome de outrem em direito penal econó-mico: Entre a narrativa e a dogmática ou o outro lado do espelho”; p. 205 e ss.; Coimbra Editora (2005).

51 Que podem assumir conotações exclusivamente individuais.

52 Entendendo por tal a inserção de condutas ilícitas no contexto de uma atividade e de uma política de empresa no restante lícitas.

53 Entendida como empresa heterodirigida por uma estrutura criminal e a ela submetida.

54 GODINHO, Inês Fernandes, “Temas de Direito Económico” - Coordenação de José de Faria Costa - “A atuação em nome de outrem em direito penal econó-mico: Entre a narrativa e a dogmática ou o outro lado do espelho”; p. 209; Coimbra Editora (2005).

55 Ibidem.

56 Edição internet de 27 de março de 2007; HENRIQUES, João Pedro e LIMA, Carlos Rodrigues; in www.dn.pt, Sociedade: Não há um único preso por corrup-ção na política.

57 Nuno Gonçalves, “Economia não Registada em Portugal”, p. 30; Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF), Edições Humus in www.gestao-defrude.eu (2010).

58 Ver estudo sobre a proteção penal do sistema financeiro: âmbito, caracterização e lacunas, promovido pela PGR/BP/CMVM, onde se divulga, embora pouco expressiva, estatística de casos julgados para a tutela penal do sistema financeiro; in www.pgr.pt; Lisboa (2010). Ver também Relatório Anual da Segurança do Observatório de Segurança de outubro de 2008, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), onde os inquiridos manifestam alguma insegurança em relação à criminalidade económico-financeira e também em relação à criminalidade organizada. A esmagadora maioria dos inquiridos sente segurança em relação a esta criminalidade, o que já não acontece na criminalidade violenta.

59 Como exemplo, no caso da condenação dos 38 arguidos por crimes económicos do negócio dos metais e sucatas, o Ministério das Finanças anunciou que o Estado foi lesado em 65 milhões de euros entre 2002 e 2007; in www.publico.pt ; 24 de maio de 2010.

60 Processo 712/00 relativo ao Presidente em exercício da Câmara Municipal de Oeiras com decisão no acórdão de 27 de abril de 2011 do Supremo Tribunal de Justiça.

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aNáliSeVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201124

no pagamento à Administração Fiscal da quantia 463 mil euros.No nosso trabalho, como já o referimos, vamos focar a conexão da criminalida-de económica e financeira às atividades perpetradas por instituições organiza-das, ou seja, vamo-nos centrar no cri-me organizacional praticado por pes-soas coletivas “corporate crime” e, dado que o objetivo pela obtenção do lucro se identifica com o fim da constituição das sociedades comerciais, é nestas que vamos no ponto seguinte, estudar a sua responsabilidade penal dentro do regi-me de sancionatório das pessoas cole-tivas conforme previsto no Código Pe-nal (CP), no Código do Processo Penal (CPP) e leis avulsas com disposições pe-nais.

2.4 - CaSoS PrátiCoS Para reflexão, dentro da matéria que aqui damos à estampa, vamos expor dois exemplos que coincidiram com a realidade portuguesa de 1970 a 2010 e que se identificaram com os interesses organizacionais locais e regionais.

CaSo 161

A sociedade comercial A, com ativida-de comercial do setor têxtil, com uma oportunidade de negócio, que acon-teceu em meados da década 70, ad-quiriu uma extensa quinta que até aí contribuía para a economia com gran-des produções agrícolas. Esta grande área agrícola enquadrava-se na reserva agrícola nacional. Passado algum tem-po, não superior a um ano, a sociedade A inicia trabalhos de construção nos terrenos da quinta com a pretensão de instalar uma ampla unidade fabril. Sem qualquer autorização da gestão do Mu-nicípio, a construção acelera em grande ritmo. Qualquer cidadão daquela época que conhecesse esta realidade não via qualquer mal naqueles factos, pois o proprietário adquiriu os terrenos, “pa-gando-os, pode fazer-lhes o que bem lhe apetecer”.

A informação que passou para a coleti-vidade local é que um dos gestores do Município, da Câmara Municipal, incom-patibilizou-se com a Administração da sociedade A. A realidade, diferente da maioria dos casos daquele Município e de outros circundantes, levou, de for-ma excecional em relação a outras si-tuações semelhantes, ao embargo das construções no meio da quinta integra-da em zona agrícola. Toda a comunida-de local se espantou com a decisão da Câmara Municipal, pois a atitude nor-mal da gestão dos Municípios daquela época era deixar construir à vontade, era um “laisser-faire” de construção li-vre e sem controlo. A edificação esteve paralisada até ao início da década de 90. Durante esse tempo, a edificação esteve suspensa, não houve qualquer ordem de demolição para a reposição paisagística nem qualquer levanta-mento do embargo para que as obras pudessem prosseguir. A produção agrí-cola também cessou desde os anos 70. A censura das pessoas mais influentes no local, algumas com formação supe-rior, diziam, “como se pode desperdiçar tanto dinheiro em tanta construção que não serve para nada”. Continuando no mesmo exemplo práti-co que serve de reflexão à matéria que estamos a expor, no início da década de 90, quando ninguém esperava qualquer alteração dos factos atrás descritos, apa-rece uma sociedade comercial B que adquire, de forma aparente, os terrenos agrícolas e rústicos da referida quinta, incluindo, em termos materiais e não formais, as construções e edificações que lá se encontravam. Esta empresa B tinha como atividade a construção civil e negócios imobiliários. A sua represen-tação era feita por administradores bem posicionados e referenciados no poder local, os quais, junto da administração local e regional, conseguem alterar toda a realidade atrás descrita. A partir desta época, de 1990, já nin-guém se lembrava, pelo menos de for-ma manifesta, que os terrenos eram

agrícolas, porque materialmente dei-xaram de o ser, e que a gestão do Mu-nicípio não autorizava construções e edificações para aquele local. A partir daquele momento tudo se sub-verteu. A sociedade B, além de con-seguir levantamento do embargo da esquecida fábrica têxtil, também con-seguiu loteamento industrial para a construção de muitos pavilhões indus-triais. Alguns dos indivíduos que repre-sentavam o poder municipal eram os mesmos de há 20 anos atrás, alguns ha-viam dito que naquele sítio nunca seria instalada uma fábrica têxtil. A grande fábrica foi acabada de construir e a sua atividade industrial foi licenciada pelo Ministério da Economia com as devidas autorizações prévias de caráter indus-trial e ambiental.Deixando de lado a construção de um parque industrial em lugar de uma zona agrícola, a principal fábrica têxtil foi de novo transmitida aos proprietários da sociedade comercial A. A sociedade B teve os seus ganhos pelas mais-valias geradas da vantagem de estar em rela-ção privilegiada com os representantes das entidades públicas locais e regio-nais. Entretanto, a sociedade B desapa-receu da cena da atividade económi-ca. No meio desta descrição de factos, acresce que grande parte da construção que já estava materializada nos anos 70 foi formalizada em papéis e procedi-mentos administrativos e contabilísti-cos, por forma a obter fundos estrutu-rais vindos da designada Comunidade Económica Europeia (CEE).

CaSo 262

A Sociedade P, a fim a alterar as suas ins-talações para fora de um grande centro urbano, onde se encontrou instalada até ao final da década 80 do século XX, ad-quiriu um conjunto de terrenos rústicos e agrícolas integrados numa conhecida quinta Y. Quase de imediato, no início da década de 90, inicia trabalhos de cons-trução da unidade fabril do setor têxtil.

61 Fonte de informação obtida por relatos orais.

62 Fonte de informação obtida por relatos orais.

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Todos os trabalhos de construção e in-fraestruturas foram realizados por várias fases até ano de 2005. A par das sucessi-vas construções, foram instalados vários equipamentos industriais e máquinas de grande porte. As instalações e edifí-cios só mereceram licenciamento indus-trial e municipal entre 2008 e 2010. Estes sucessivos investimentos de dezenas de milhões de euros63, muitos deles do-cumentados e quantificados de forma virtual, foram financiados64 por fundos estruturais da designada Comunidade Económica Europeia e outros já da de-signada União Europeia. Aconteceu que da atividade económica da empresa, ao longo desses 20 anos, expressa nas demonstrações financeiras relatadas, nunca foram manifestados resultados operacionais nem resultados corren-tes positivos.Os resultados líquidos eram positivos porque havia reposição dos subsídios ao investimento que eram relevados como resultados extraordinários. Em suma, percebia-se, pela análise compa-rativa de resultados, que a empresa era, aparentemente, dependente de subsí-dios. Também se soube que os admi-nistradores da empresa faziam, em pa-ralelo à atividade aparente, designada por canal 2, mais de 20% das vendas reais sem qualquer registo contabilís-tico. Debitavam grandes quantidades de produção sem qualquer registo e recebiam os valores dos clientes, que não entravam nos registos da empresa. Em termos relativos, esta situação dos negócios paralelos não foi constante, o seu peso foi aumentando ao longo do tempo, tendo-se agravado quando se iniciou a crise do setor têxtil. O mais gravoso veio a acontecer a seguir. No início de 2010, os administradores da empresa, todos originários, vendo que já não haveria mais subsídios oriundos do Estado, resolveram requerer ao Tri-bunal da Comarca, onde se situavam,

declaração de insolvência com mani-festa intenção de liquidar a sociedade. Antes uns dias de o Tribunal Judicial de-clarar a insolvência, os administradores, em representação da Sociedade P, em conluio com a Sociedade Imobiliária Q, vendem parte dos terrenos agrícolas, onde se encontram instalações sociais, administrativas e industriais, pelo preço de determinada quantia monetária. Este ato de compra e venda foi formalizado por escritura pública que foi, de imedia-to, registado na competente Conserva-tória do Registo Predial. Antes uns dias, as mesmas partes, as duas sociedades, P e Q, haviam feito um contrato promes-sa de compra e venda da totalidade dos terrenos, com inclusão de instalações, pelo preço global sete vezes superior ao que foi concretizado na escritura pública. Embora o contrato de compra e venda fosse parcial por um sétimo do preço prometido, a redução do preço foi muito desproporcional em relação à redução da área transmitida. Caso esta operação não venha a ser considera-da inválida pelos Tribunais Judiciais, os credores da Sociedade P (insolvente) serão fortemente lesados. A agravar a isto, algum tempo antes da declaração de insolvência, cerca de seis meses, os administradores aceleraram fortemente o volume de transações sem qualquer registo contabilístico. Este volume de transações sem qualquer pagamento de impostos mais que duplicou. Como se pode constatar, nestes exem-plos da realidade económica e social em Portugal, que são dois casos no meio de outros, há uma série de danos causados à economia e ao ambiente que nos deve preocupar a todos, pois, além de ser uma das causas do retrocesso económi-co do país, houve fraude que prejudicou o bem comum em favor dos interesses individuais que se concretizou de forma premeditada e bem organizada. Que se saiba, até hoje, para qualquer dos casos

expostos nunca houve qualquer inqué-rito tendente à indiciação de quaisquer ilícitos criminais.O que se sabe é que muitas pessoas fo-ram lançadas para o desemprego em consequência de uma ganância pelo dinheiro fácil por parte de alguns in-divíduos que não olham a meios para atingir os seus fins.

3 - o reGiMe SaNCioNatÓrio daS PeSSoaS ColetivaS

3.1 - o reGiMe da reSPoNSaBilidade PeNal

Como diz GODINHO65, as questões que se colocam no que respeita à imputação e à responsabilidade penal surgem mais complexas quando se fala em crimina-lidade de empresa, uma vez que, rela-tivamente à criminalidade na empresa, estas podem ser resolvidas com recurso a teoria geral do crime do direito penal clássico, porque o agente, neste último caso, não atua por conta ou em repre-sentação de outrem.Vamos focar o nosso trabalho na cri-minalidade de empresa, tal como dis-semos atrás, ela materializa-se, de for-ma esmagadora, por pessoas coletivas, principalmente sociedades comerciais.Pegando nas palavras da autora, a cri-minalidade de empresa refere-se aos crimes sócio-económicos cometidos no âmbito das atividades do tráfico jurídi-co e económico de uma empresa. Esta criminalidade de empresa, como ana-lisámos atrás, por intermédio de uma atuação para uma empresa, lesam-se bens jurídicos e interesses externos, in-cluindo os bens jurídicos e interesses próprios dos colaboradores da empresa.Para efeito de imputação da responsa-bilidade penal temos o facto incontor-nável que as pessoas coletivas atuam por intermédio de pessoas singulares. Como a seguir vamos ver, sendo a pes-soa coletiva a portadora da qualidade

63 Após conversão para a moeda atual em circulação.

64 Grande parte dos fundos estruturais foram a fundo perdido e outra parte, os mais recentes, a partir de 1995, eram subsídios reembolsáveis.

65 GODINHO, Inês Fernandes, Temas de Direito Económico - Coordenação de José de Faria Costa - A atuação em nome de outrem em direito penal económi-co: Entre a narrativa e a dogmática ou o outro lado do espelho; p. 210 ss.; Coimbra Editora (2005).

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exigida pelo tipo legal, é uma pessoa singular que atua em seu nome. Como diz FARIA COSTA66, a pessoa coletiva, para que se assuma como tal, tem de atuar necessariamente através de ór-gãos ou representantes.Na ideia clássica do Direito Penal não há responsabilidade sem culpa. Uma pessoa coletiva é desprovida de inte-ligência e vontade próprias, logo é in-capaz de, por si, exercer uma atividade, necessitando de intermediários, ou seja, do concurso de pessoas singulares que lhe sirvam de órgãos, possibilitando à pessoa coletiva exprimir a sua vontade.GREEN67 considera que muitos dos cri-mes económicos e financeiros são de origem organizativa, nomeadamente de empresas, ou por indivíduos inse-ridos em complexas estruturas institu-cionais, onde as responsabilidades são partilhadas por muitas pessoas, indivi-duais ou coletivas, internas ou externas à organização, o que torna tarefa difícil a imputação do tipo legal de crime. Atualmente, alguns autores68 entendem que só as sociedades comerciais deve-riam ser responsabilizadas pelos crimes praticados no seu seio e decorrentes da sua atividade porque os administrado-res, atuando funcionalmente ao serviço da sociedade que administram, não ma-nifestam uma vontade própria; a von-tade no crime é da sociedade, gerada pelos seus órgãos. Como afirma MAR-QUES DA SILVA69, a lei é relativamente clara, há responsabilidade cumulativa, concorrente, ou paralela das socieda-des e dos administradores tal como diz o art. 11º do Código Penal (CP) e art. 7º do Regime Geral das Infrações Tributá-rias (RGIT) e legislação penal secundária.

O princípio da responsabilidade cumu-lativa está consagrado no art. 11º-7 do CP e também no art. 7º-3 do RGIT, os quais dispõem que a responsabilida-de criminal das sociedades não exclui a responsabilidade individual dos res-petivos agentes. Por regra, só as pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade crimi-nal (art. 11º-1 do Código Penal). Exce-cionalmente, após a revisão pela Lei nº 59/2007, de 4 de setembro, o Código Penal admite a responsabilidade das pessoas coletivas e entidades equipa-radas para os crimes enumerados de 2 a 11 do seu art. 11º. Nos termos do nº 2 do art. 11º, a responsabilidade das pes-soas coletivas pressupõe que os crimes sejam cometidos por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança, por quem aja sob a autoridade das pesso-as que nelas ocupem uma posição de liderança em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem. O nº 4 do mesmo art. 11º do CP esclarece o que se deve entender por posição de liderança, que diz que os órgãos e representantes da pessoa coletiva e quem nela tiver auto-ridade para exercer o controlo da sua atividade. Como esclarece MARQUES DA SILVA70, a parte final do nº 4 do art. 11º dispõe que se deve considerar po-sição de liderança para efeito de impu-tação dos seus atos à pessoa coletiva quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da sua atividade. Continua o autor dizendo que a fórmula empregue na al. b) do nº 2 visa a responsabilização das entidades coletivas quando os fac-tos puderem ser imputados a qualquer pessoa que na empresa tenha poder

de controlo, seja ou não titular do ór-gão ou representante do ente coletivo, desde que o facto seja praticado em ra-zão da omissão dos deveres de vigilân-cia ou controlo que lhes incumbe. Aqui responsabiliza-se a pessoa coletiva pela omissão de quem nela tem poderes de autoridade e tem o dever de fazer tudo que esteja ao seu alcance para que não se pratiquem factos criminosos. Estas pessoas individuais têm por função pro-teger os bens jurídicos que podem ser ofendidos com as atividades da pessoa coletiva que representam.Dentro da previsão das referidas normas do art. 11º, os crimes cuja responsabili-zação se pode estender às pessoas co-letivas e que terão maior interesse para o nosso estudo, crimes contra a econo-mia, serão as burlas, falsificação de docu-mentos e falsificação de moeda e outros valores, crimes de perigo comum, asso-ciação criminosa, tráfico de influência, favorecimento pessoal, branqueamen-to e corrupção. A possibilidade de res-ponsabilização das pessoas coletivas já era admitida no direito penal secundá-rio71. O Decreto-Lei nº 28/84 já previa a criminalização e punição das atividades delituosas contra a economia nacional e teve como novidade a consagração da responsabilidade penal das pessoas co-letivas e sociedades, a que algumas reco-mendações de instâncias internacionais, como o Conselho da Europa, se referiram com insistência. Tratando-se de um tema polémico em termos de dogmática jurí-dico-penal, nem por isso se ignorou, já nessa época, as realidades práticas, pois se reconhece por toda a parte que é no domínio da criminalidade económica que mais se tem defendido o abandono

66 Apud FARIA COSTA, José; cit. por GODINHO, Inês Fernandes, Temas de Direito Económico - Coordenação de José de Faria Costa - A atuação em nome de outrem em direito penal económico: Entre a narrativa e a dogmática ou o outro lado do espelho; p. 212 ss.; Coimbra Editora (2005).

67 CRUZ, José Neves; O Crime de Colarinho Branco: complexidades de definição do objeto de estudo, p. 24, Criminologia, Universidade do Porto, Faculdade de Direito (2010).

68 MARQUES DA SILVA, Germano, Direito Penal Tributário - Sobre as responsabilidades das sociedades e dos seus administradores conexos com o crime tri-butário, pág. 294 e ss.. Universidade Católica Editora (2009).

69 Ibidem

70 MARQUES DA SILVA, Germano, Conferência no Centro de Estudos Judiciários: Responsabilidade Penal das Pessoas Coletivas, 2007

71 Infrações contra a economia e contra a saúde pública definidas no Decreto-Lei nº 28/84; Infrações tributárias contidas no Regime Geral das Infrações Tri-butárias (Lei nº 15/2001, de 5 de julho).

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do velho princípio “societas delinquere non potest”. Em todo o caso, o princípio da responsabilidade penal das pessoas coletivas foi consagrado com prudência: exigiu-se, tal como foi referido no preâm-bulo da lei, sempre uma conexão entre o comportamento do agente (pessoa singular) e o ente coletivo, já que aque-le deve atuar em representação ou em nome deste e no interesse coletivo. E tal responsabilidade tem-se por exclu-ída quando o agente tiver atuado con-tra ordens expressas da pessoa coletiva. Dado que o nosso tema em análise pas-sa pela criminalidade organizada, torna-se relevante focá-lo em termos de direi-to processual penal. Como diz DIAS72, o conceito de criminalidade organizada tem vindo a ser submetido a um proces-so de juridificação um pouco por toda a Europa e também em Portugal. Nas defi-nições legais previstas no art. 1º do Códi-go do Processo Penal (CPP) está previsto, na alínea m), o conceito de criminalidade altamente organizada, onde se conside-ra as condutas que integrarem crimes de associação criminosa, tráfico de pessoas, tráfico de armas, tráfico de estupefacien-tes ou de substâncias psicotrópicas, cor-rupção, tráfico de influência ou branque-amento. Segundo o autor, a definição do CPP para a criminalidade altamente organizada apenas se baseou num catá-logo objetivo de crimes, enunciado sem preocupações de proporcionalidade. Acrescenta que se abre o espaço à per-gunta sobre como será tratada no CPP a criminalidade simplesmente organizada.

Como diz, e bem o autor, na definição do art. 1º-1 da Lei73 que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira tanto se consti-tuem casos de criminalidade organizada como de criminalidade altamente orga-nizada. Disso convinha esclarecer como aplicar as medidas gravosas a crimes co-metidos de forma singular e fora de qual-quer contexto organizado. A via alterna-tiva a seguir, como sugere FIGUEIREDO DIAS74, é separar, porque são diferentes, a participação em organização ou asso-ciação criminosa da criminalidade orga-nizada enquanto conceito instrumental que liga a aplicação de certas conse-quências jurídicas de ordem processual e sancionatória a determinados crimes previamente tipificados.Dado que o nosso tema se centralizou na criminalidade económica e financei-ra, a qual nasce expressivamente de for-ma organizada, e se motiva, essencial-mente, em pessoas coletivas, vamos, no ponto seguinte, falar das penas típicas do Código Penal a imputar às pessoas coletivas pelas regras gerais do mesmo código e a aplicação de outras leis pe-nais. Vamos ainda ver como imputar às pessoas coletivas os crimes cometidos pelos seus órgãos ou representantes em seu nome ou no interesse coletivo.

3.2 - aS PeNaS aPliCáveiS ÀS PeSSoaS ColetivaS

A partir de 2007, o Código Penal passou a consagrar a responsabilidade criminal

das pessoas coletivas75. Este passo que se deu, onde se assumiu, ao contrário de outros76, o princípio geral da responsa-bilidade criminal das pessoas coletivas, onde se deu por adquirida a capacida-de de ação, de culpa e de punibilidade das pessoas coletivas e se tomou nítida consciência das instantes necessidades político-criminais da responsabilização penal das pessoas coletivas na socieda-de contemporânea e futura77.No diploma da criminalização das infra-ções antieconómicas e contra a saúde (Lei nº 18/84 de 20 de janeiro) adotou-se, no entanto, um vasto elenco de san-ções acessórias, que a experiência mos-tra serem as mais adequadas ao particu-lar tipo de agente de que se trata e que permitem uma correta individualização. Cumpre referir, a propósito, que as san-ções acessórias suscetíveis de implicar privação de direitos, nomeadamente profissionais, nunca são previstas como efeito necessário da pena principal, em consonância com o nº 4 do artigo 30º da Constituição da República Portuguesa. A sua aplicação dependerá das circuns-tâncias de cada caso e ficará ao critério do julgador. A responsabilidade penal das pessoas coletivas impôs a previsão de penas principais especialmente ade-quadas. Como continua no preâmbulo da Lei das Infrações Antieconómicas, das penas principais cumpre destacar a pena de dissolução, que, pela sua gravi-dade, é reservada para hipóteses muito restritas: quando o ente coletivo se te-nha constituído, exclusiva ou predomi-

72 DIAS, Augusto Silva, 2º Congresso de Investigação Criminal - Criminalidade Organizada e Combate ao Lucro Ilícito, p. 23 e ss., Almedina (2010)

73 Lei nº 52/2002, de 11 de janeiro, com redação do art. 1º, nº 1 - A presente lei estabelece um regime especial de recolha de provam, quebra do segredo pro-fissional e perda de bens a favor do Estado relativa aos crimes de: a) Tráfico de estupefacientes; b) Terrorismo e organização terrorista; c) Tráfico de armas; d) Corrupção passiva e peculato; e) Branqueamento de capitais; f ) Associação criminosa; g) Contrabando; h) Tráfico e viciação de veículos furtados; i) Leno-cínio e lenocínio e tráfico de menores; j) Contrafação de moeda e de títulos equiparados a moeda.

74 Apud FIGUEIREDO DIAS, j.; cit. por DIAS, Augusto Silva, 2º Congresso de Investigação Criminal - Criminalidade Organizada e Combate ao Lucro Ilícito, p. 25 e ss., Almedina (2010)

75 Revisão do Código Penal pela Lei nº 59/2007 de 4 de setembro.

76 Em termos de direito comparado, o direito alemão vigente não conhece qualquer forma de punibilidade penal das pessoas coletivas e das associações de pessoas. No direito espanhol discute-se ainda se as chamadas consequências acessórias aplicáveis às pessoas jurídicas constituem ou não autênticas san-ções criminais e assim comportam ou não uma previsão de responsabilidade penal das pessoas coletivas. Em Itália, há na doutrina e na jurisprudência uma crescente propensão para ver aí uma verdadeira e própria responsabilidade criminal das pessoas coletivas.

77 NUNO BRANDÃO; Conferência no Centro de Estudos Judiciários: Responsabilidade Penal das Pessoas Coletivas (2007).

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aNáliSeVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201128

nantemente, para a prática de certos crimes previstos neste diploma ou se tenha desviado do seu objeto ou dos seus fins para os cometer. Trata-se de uma pena prevista em algumas legisla-ções europeias e recomendada, como “ultima ratio”, para casos de excecional gravidade, a utilizar sempre com a de-vida prudência78.À semelhança da estrutura sancionató-ria estabelecida para as pessoas físicas no Código Penal e na linha do regime contido no Decreto-Lei nº28/84, tam-bém no art. 90º-A e ss. do CP se preve-em três categorias de penas aplicáveis à pessoas coletivas, as principais, as aces-sórias e as de substituição. São penas principais as que, encontran-do-se expressamente previstas para sancionamento dos tipos de crime, po-dem ser fixadas pelo juiz na sentença independente de quaisquer outras79. Quando se trata da responsabilidade penal das pessoas individuais, a pena, para definir-se como principal, deverá em regra encontrar-se tipificada no pró-prio tipo legal de crime. Já na aplicação sancionatória das pessoas coletivas o le-gislador optou pela introdução de uma cláusula geral, no art. 90º-A, nº 1, que diz, pelos crimes previstos no nº2 do ar-tigo 11º, são aplicáveis às pessoas cole-tivas e entidades equiparadas as penas principais de multa ou de dissolução.Estão previstas como penas de substi-tuição, a pena de multa, a admoesta-

ção (art. 90º-C), a caução de boa con-duta (art. 90º-D) e a vigilância judiciária (art.-E). Diversamente do que sucede no Decreto-Lei nº 28/84, a admoesta-ção não figura aqui como pena prin-cipal, mas antes como pena de substi-tuição da pena de multa. Dada a baixa eficácia preventiva da admoestação, o legislador na reforma do Código Penal, ao considerar a admoestação só como pena de substituição da pena de multa (art. 90º-C) e que fica sujeito ao poder discricionário do juiz, está a valorizar a prevenção, tanto geral como especial. As penas acessórias dos arts. 90º-G a 90º-M, são a injunção judiciária, a proi-bição de celebrar contratos, a privação do direito a subsídios, subvenções ou incentivos, interdição do exercício de atividade, o encerramento de estabe-lecimento e a publicidade de decisão condenatória80.Das penas principais, multa e dissolu-ção, aquela que já se assume e conti-nuará certamente a assumir maior im-portância é a pena de multa. Com al-guma frequência há criticas dirigidas à aplicação da pena de multa às pessoas coletivas, pois o gasto em multas que uma pessoa suporta com a prática de delitos pode ser ponderado com o be-nefício que se poderá obter pelos efei-tos dessa prática delituosa81. Como acima referimos, as penas princi-pais são aquelas aplicadas pelo juiz na sentença condenatória independente-

mente de quaisquer outras. Também foi referido que na responsabilidade penal das pessoas singulares, a pena, para de-finir-se como principal, deverá encon-trar-se tipificada no tipo legal de crime, nas pessoas coletivas, o legislador optou pela inserção de uma cláusula geral (art. 90º-A1). Embora seja objeto de críticas, tendo em vista o cumprimento das fi-nalidades das penas82-83, interessa saber se a pena de multa a aplicar às pessoas coletivas vai ao encontro das finalidades das penas, nomeadamente a prevenção. De acordo com o art. 90º-B, a pena deve ser determinada de acordo com o siste-ma dos dias de multa, devendo formar-se a moldura geral abstrata: em primei-ro lugar deverá o juiz verificar se, para o crime em causa, a lei prevê aplicação de dias de multa e, se sim, aplicar-se-á a pena respeitante ao tipo e, caso o crime seja só punível com a pena de prisão, a moldura abstrata será determinada pe-las regras de determinação da medida da pena84 com referência à pena de prisão prevista para as pessoas singulares85. A medida concreta da pena de multa deve-rá ser fixada em dias, com base nos crité-rios normais previstos no art. 71º-1 e art. 40º-1 do CP, ou seja, em função da culpa e das exigências de prevenção. No que respeita ao quantitativo diário da pena de multa, o nº 5 do art. 90º-B indica que um dia de multa correspon-de ao montante mínimo de €100 e má-ximo €10 00086, que o tribunal fixa em

78 A pena de dissolução sé será decretada depois de cumpridos requisitos alternativos do art. 7º-6 da Lei nº 28/84.

79 FIGUEIREDO DIAS, Jorge, Direito Penal Português: As Consequências Jurídicas do Crime, 2ª reimpressão, Coimbra Editora, 2009, §78.

80 Para desenvolvimento dos conceitos sobre penas acessórias escreve PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE - A responsabilidade criminal das pessoas coletivas ou equiparadas, Revista da Ordem dos Advogados, 2006, Ano 66, Vol. II - setembro - Doutrina - www.oa.pt/Conteúdos/Artigos

81 RODRIGUES Anabela Miranda e outros, Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários: O Regime Sancionatório das Pessoas Coletivas na Revisão do Código Penal, Coimbra Editora, 2009, p. 464.

82 Como diz FIGUEIREDO DIAS, Jorge, obra já citada, §55, a prevenção geral assume o primeiro lugar como finalidade da pena.

83 As finalidades da punição a atingir em sede de escolha da medida da pena são essencialmente preventivas: Prevenção geral sob a forma de satisfação do sentimento pela ofensa ao bem jurídico protegido pela sociedade; Prevenção especial sob a forma de atingir a ressocialização.

84 Art. 71º-1 do CP:”A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de preven-ção”; art. 40º-1 do CP:”A aplicação de penas ... visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.

85 Art. 47ºdo CP: “A pena de multa é fixada em dias ... sendo, em regra, o limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360 dias”; Art. 90º-B2 do CP: “Um mês de pri-são corresponde, para as pessoas coletivas e entidades equiparas, a 10 dias de multa”.

86 Este limite máximo é o dobro do previsto no art. 7º-4 da Lei/84 (Infrações antieconómicas e contra a saúde) e no art. 15º-1 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).

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função da situação económica e finan-ceira do condenado e dos seus encargos com trabalhadores.O limite máximo de €10 000 diários para a pena de multa confere a esta pena uma amplitude que poderá responder às necessidades preventivas pelo crime cometido pela pessoa coletiva. Para a re-alidade portuguesa em que a esmagado-ra maioria das empresas são de reduzida dimensão, parece-nos que se pode abrir um risco sério de transformar a multa numa pena sufocante, convertendo-a assim num instrumento de confisco87. Para as empresas de grande dimensão, que são em Portugal em número mui-to reduzido, poderão as penas de multa aplicadas não terem peso significativo nos seus orçamentos. Com isto quere-mos dizer que os fins das penas poderão não ser atingidos quando está em causa delitos de grandes grupos económicos.Quanto à pena de dissolução, tal como está previsto na Lei das Infrações Antie-conómicas, a mesma, que é pena capital, será de aplicar a situações extremas e de especial gravidade e com pressupostos muito rígidos, em casos de instrumenta-lização da pessoa coletiva nas condições referidas pelo art. 90º-F88, ou seja, quan-do a empresa foi constituída com o pro-pósito de praticar condutas criminosas e ou pratica de forma reiterada esse tipo de delitos, é razão de lhe aplicar a pena de dissolução. No Direito Penal Tributário89, para as pes-soas singulares, o regime aplicável aos crimes tributários prevê as penas priva-tivas de liberdade (prisão até 8 anos) e de multa de 10 a 600 dias. Para as pessoas coletivas90, no mesmo regime dos crimes

tributários, está prevista a aplicação da pena de multa de 20 a 1920 dias. Nesta agravação de pena às pessoas coletivas em relação às pessoas individuais, junta-se que os limites, mínimo e máximo, das penas de multa previstas nos diferentes tipos legais de crimes são elevados para o dobro sempre que sejam aplicadas a uma pessoa coletiva, sociedade, ainda que irregularmente constituída, ou outra entidade fiscalmente equiparada. Da aplicação das normas jurídicas do Código Penal que imputam a responsa-bilidade penal às pessoas coletivas ain-da não se encontra muita jurisprudência nesse sentido, pois a alteração é de finais de 2007. Na jurisprudência consultada91, a grande maioria que refere a imputa-ção de crimes a pessoas coletivas está relacionada com a prática de crimes fis-cais, nomeadamente o crime de abuso de confiança fiscal. Sobre a imputação de crimes contra a economia e saúde às pessoas coletivas, a jurisprudência exis-tente é pouco frequente. Como exem-plo, o acórdão92 confirmou a imputação ao gerente e à sociedade o crime contra genuinidade, qualidade ou composição de géneros alimentares e aditivos ali-mentares avariados.

4 - CoNCluSÃo

Este trabalho constitui um modesto con-tributo para a sensibilização geral dos cidadãos da necessidade de se prevenir e dissuadir a criminalidade económica e financeira. Como foi referido, a prática significativa deste tipo de delitos consti-tui um fator de desigualdade da vida dos cidadãos em sociedade. Segundo a ONU,

o crime económico e financeiro pode cau-sar uma ameaça séria à credibilidade do próprio Estado de Direito, pois a sua prá-tica contínua e reiterada faz desacreditar as empresas e as instituições de um país, afastando por isso o investimento direto estrangeiro e provocando um impacte negativo no desenvolvimento susten-tável. Assim sendo, justifica-se porque é que o fenómeno desta criminalidade deve preocupar e diz respeito a todo e qualquer cidadão.De uma forma ampla, conectamos a prá-tica destes delitos económicos e finan-ceiros às organizações que, na sua maio-ria, são pessoas coletivas, principalmente sociedades comerciais. Vimos que estes delitos provocam nas pessoas e na comu-nidade danos de forma difusa e abstrata, que na prática se tornam difíceis de iden-tificar, mas que exige de qualquer Estado de Direito Democrático a tutela dos direi-tos fundamentais dos cidadãos.Depois de termos relacionado a prática dos delitos económicos e financeiros a sociedades comerciais, que são um exem-plo de pessoas coletivas, fizemos uma breve abordagem, dentro do direito pe-nal português, código penal e leis penais dispersas, à imputação da culpa e da res-ponsabilidade penal das pessoas coleti-vas, atendendo aos fins das penas – pre-venção geral e prevenção especial – para prevenir e dissuadir condutas criminosas.Para concluir, tendo em conta que a maté-ria é muito extensa, dispersa e complexa, achamos, como desejamos, que demos um pequeníssimo contributo para a sen-sibilização da matéria, e para a prevenção e repressão da criminalidade económica e financeira.

87 RODRIGUES Anabela Miranda e outros, Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários: O Regime Sancionatório das Pessoas Coletivas na Revisão do Código Penal, Coimbra Editora, 2009, p. 466.

88 Com redação: “a pena de dissolução é decreta pelo tribunal quando a pessoa coletiva ou entidade equiparada tiver sido criada com a intenção exclusiva ou predominante de praticar os crimes indicados no nº 2 do artigo 11º, ou quando a prática reiteradas de tais crimes mostre que a pessoa coletiva ou entidade equiparada está a ser utilizada, exclusiva ou predominantemente, para esse efeito, por quem nela ocupe uma posição de liderança”.

89 Regime Geral das Infrações Tributárias da Lei nº 15/2001, de 5 de junho.

90 Já no Regime Jurídico das Infrações Fiscais não Aduaneiras (RJIFNA) do Decreto-Lei nº 20-A/90, de 15 de janeiro, estava prevista, apenas, a aplicação de pena de multa (art. 9º-2) às pessoas coletivas e entidades equiparadas.

91 Exemplos de acórdãos dos Tribunais de 2ª Instância (TR): TR Lisboa de 23-10-2007, processo 6245/07; TR Porto de 24-03-2004, processo 0342179, de 27-06-2007, processo 0742535, de 27-5-2009, processo 47/02, de 12-01-2011, processo 243/05, de 30-03-2011, processo 88/08; TR Coimbra de 10-11-2010, processo 67/07.

92 TR Coimbra de 11-03-2009, processo 109/07.

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MarCaSVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201130

iMitaÇÃo de MarCaS – concorrência desleal(Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15/12/2011)

SuMário: i - A marca DOLPIRINA foi concedida para assinalar produtos da classe 5ª, os quais são também parte dos assinalados pelas marcas ASPIRINA”, ASPIRINA DIRECT ou ASPIRIN, no que se reporta a medicamentos.ii - Por ser assim, quanto a esses produtos a clientela alvo é a mesma, donde se conclui necessariamente que haverá concorrência.iii - Contudo, o facto de haver concorrência não significa que seja desleal, sendo só a possibilidade desta vir a ocorrer o que a lei quer evitar. iv - A questão da potencialidade de concorrência desleal, embora ligada com a confusão de marcas, tem a ver essencialmente com a captação da clientela da marca concorrente relativamente aos produtos comercializados de entre os assinalados, mas desde que através de qualquer “ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade económica”.v - Tendo-se concluído que não se verificam os requisitos de imitação, ou seja, que não há possibilidade de erro ou confusão, bem assim que nem tão-pouco há risco de associação, na ausência de qualquer outro facto que possa evidenciar algo mais em abono da posição da recorrente, impõe-se concluir que não está demonstrada a existência de concorrência desleal.

acordam no tribunal da relação de lisboa:

relatÓrio:A… com sede em …, Alemanha, veio interpor recurso do despacho do Senhor Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que concedeu o registo da marca nacional nº 409 164 “DOLPIRINA”, pedindo que se revogue o despacho recorrido e se ordene a recusa da proteção concedida.Fundamenta a sua pretensão, em síntese, no facto de ser titular das marcas “ASPIRI-NA” e “ASPIRIN”, confundíveis com a marca concedida.Foi cumprido o disposto no art. 43º do Cód. Propriedade Industrial de 2003A parte contrária apresentou contes-tação, dizendo que não se verificam, relativamente às mencionadas marcas, os requisitos de imitação.Saneados os autos, foi proferida sentença que decidiu negar provimento ao recurso apresentado por A… e, consequente-mente, mantém-se o despacho do Sr. Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que concedeu proteção à marca internacional

nº 409 164 “DOLPIRINA”, para assinalar os produtos pretendidos.Inconformado com o teor de tal decisão, A…, veio interpor recurso, concluindo as suas alegações da forma seguinte:a) A sentença recorrida julgou impro-

cedente o recurso interposto para o Tribunal do Comércio de Lisboa do despacho que concedeu o registo à marca nacional nº 409 164 DOLPIRINA;

b) Essa marca foi requerida a registo para assinalar, na classe 5ª da Classificação Internacional, medicamentos, produtos farmacêuticos e parafarmacêuticos, especialidades farmacêuticas de venda livre, alimentos dietéticos para uso me-dicinal, preparações de complementos nutricionais à base de oligo-elementos (nºs 2 e 3 da o nº 1 da Factualidade assente);

c) A ora Recorrente é titular de vários registos prioritários de marcas que incluem o elemento PIRIN- e PIRINA-, designadamente das marcas ASPIRINA, ASPIRINA DIRECT, ASPIRIN, SANIPIRINA, SANIPIRINE, SANIPIRIN e BAYASPIRINA (nºs 4 a 15 da Factualidade assente);

d) A sentença reconheceu que os registos das marcas invocadas pela Recorrente

são anteriores ao pedido de registo da marca recorrida e que existe afinidade entre os produtos que assinalam tais marcas, mas considerou que não exis-tiria semelhança relevante ou suficiente entre tais marcas que justificasse a recusa do registo à marca ora em causa;

e) Porém, a marca nacional nº 409 164 DOLPIRINA apresenta um elevado grau de semelhança, tanto de ordem gráfica como fonética com as marcas prioritá-rias ASPIRIN e ASPIRINA que pertencem à Recorrente e que essa semelhança é suscetível de causar erros ou confusões entre os consumidores ou de criar um elevado risco de associação;

f) Ao invés do que diz a sentença recorrida, não se pode concluir que DOLPIRINA e ASPIRINA apenas tenham semelhanças quanto à parte final como se apenas uma ou duas letras da terminação de tais palavras fossem comuns!

g) DOLPIRINA e ASPIRINA são expressões que oferecem escrita e leitura muito próximas, porque das nove letras que formam a palavra DOLPIRINA seis são comuns e têm exatamente a mesma colocação de seis letras de ASPIRINA:

h) Tais semelhanças são agravadas pelo

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MarCaS VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 31

facto de em ambas as expressões o acento tónico recair sobre a parte final – PIRINA que é comum a tais palavras;

i) A reprodução desse elemento - PIRINA pela marca recorrida DOLPIRINA é tanto mais gravosa quanto é certo que ASPIRINA ou ASPIRIN são marcas muito antigas e conhecidíssimas no mercado, tanto a nível mundial, como concreta-mente em Portugal;

j) A marca ora em causa reproduz ou usurpa todas as letras e todos os sons da marca da ora Recorrente à exceção das duas letras iniciais AS -.: DOLPIRINA ASPIRINA

k) A leitura das marcas em confronto reve-la que em qualquer das duas o acento tónico recai sobre esse elemento que lhes é comum: DOL PIRINA AS PIRINA

l) Basta ler em voz alta a marca em causa para facilmente se constatar que a parte que melhor se ouve não é o elemento – DOL - , mas sim a parte terminal - PI-RINA que é comum às citadas marcas da Recorrente;

m) Na marca nacional nº 409 164 DOLPI-RINA, as sílabas - PI - RI - e - NA - que são os comuns à palavra são sem dúvida as prevalentes, as que mais claramente se ouvem, pelo que é indiscutível que as diferenças existentes entre tais marcas em confronto não podem afastar o elevado grau de semelhança existente entre o conjunto de elementos que as caracterizam.

n) O aparecimento no mercado de produtos assinalados com a marca DOLPIRINA, quando já são conhecidos produtos semelhantes assinalados com a marca ASPIRINA da Recorrente, seria naturalmente interpretado como a introdução de uma variante ou nova gama de produtos da Recorrente Bayer;

o) A coexistência das marcas em con-fronto permitiria a ocorrência de atos suscetíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os pro-dutos da Recorrente, em clara violação do disposto na alínea a) do artigo 317º do Código da Propriedade Industrial;

p) A marca nacional nº 409 164 DOLPI-RINA constitui imitação das marcas ASPIRIN e ASPIRINA da ora Recorrente.

q) A sentença recorrida desrespeitou

o disposto, entre outros, nos artigos 239º, nº 1, alíneas a) e e), 245º, nº 1, e 317º alínea a), todos do Código da Propriedade Industrial.

Conclui no sentido de o presente recurso de apelação ser julgado procedente e, em consequência, revogada a sentença recorrida e recusado o registo à marca nacional nº 409 164 DOLPIRINA.Não houve contra-alegações.Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

QueStÃo a deCidir:-Saber se a marca nacional nº 409164 DOLPIRINA constitui imitação das marcas ASPIRIN e ASPIRINA de que é titular a Recorrente.

fuNdaMeNtaÇÃo:a) de faCto:Face à prova documental produzida, en-contra-se assente a seguinte factualidade:1 – Por despacho datado de 15 de dezembro de 2006, o Sr. Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional de Propriedade Industrial concedeu a marca nacional nº 409 164 “DOLPIRINA”, pedida em 15 de dezembro de 2006 por B…, tendo o pedido sido transmitido a Labialfarma – Laboratório de Produtos Farmacêuticos e Nutracêuticos.-2 – A mencionada marca destina-se a assinalar na classe 5ª “medicamentos, produtos farmacêuticos e parafarma-cêuticos, especialidades farmacêuticas de venda livre, alimentos dietéticos para uso medicinal, preparações nutricionais à base de oligo-elementos”.-3 – A mencionada marca é constituída pela palavra “DOLPIRINA”.-4 – A recorrente é titular da marca “AS-PIRINA”, pedida em 19 de dezembro de 1928 e concedida por despacho de 24 de janeiro de 1931.-5 – A mencionada marca é constituída pela palavra “ASPIRINA”.-6 – A referida marca destina-se a assinalar produtos da classe 79.-7 – A recorrente é titular da marca nacio-nal nº 308 995, “ASPIRINA DIRECT”, pedida em 10 de abril de 1995 e concedida em 01 de abril de 1996.-8 – A referida marca é constituída pelas palavras “ASPIRINA DIRECT”.-

9 – A mencionada marca destina-se a assinalar, na classe 5ª “medicamentos”.-10 – A recorrente é titular da marca inter-nacional nº 312 632 “ASPIRIN”, registada internacionalmente 29 de abril de 1966, gozando de proteção em Portugal por despacho de 20 de março de 1967.-11 – A mencionada marca é constituída pela palavra “ASPIRIN”.-12 – A referida marca destina-se assinalar, na classe 5ª “Un produit pharmaceuti-que”.-13 – A recorrente é titular da marca internacional nº 324 979 A, “ASPIRINA”, registada internacionalmente em 07 de novembro de 1986, gozando de prote-ção em Portugal por despacho de 20 de outubro de 1967.-14 – A mencionada marca destina-se a assinalar produtos nas classes 1 e 5, respetivamente: 1ª “produits servant à conserver les aliments” e 5ª “Medicaments pour hommes et animaux, produits chi-miques por la mediciné et l`hygiène, dro-gues et preparations pharmaceutiques, emplâtres, étoffes pour pansements, produits pour la destruction d`animaux et de végétaux, désinfectants”.-15 – A recorrente é ainda titular das marcas: Sanipirina, Sanipirine, Sanipirin e Bayaspirina.-

de direito:Tendo presente que a legislação aplicável aos autos é o Código da Propriedade In-dustrial, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº36/2003, de 5 de março, dado que o pedido de registo da marca foi apresentado antes das alterações entretanto introduzidas pelo Decreto-Lei nº 143/08, de 25 de julho, as quais entraram em vigor em 1 de outubro de 2008, conforme resulta dos arts. 4 e 16 deste diploma, salienta-se desde logo que o citado Código, quer na versão tida por aplicável quer na atual, não contém qualquer norma que ofereça uma defini-ção do que se deve entender por marca. A lei elucida-nos é sobre como pode ser constituída a marca, dispondo o 222º, sobre a epígrafe “Constituição da marca”, que a “A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente

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palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”, bem assim que “(..) pode, igualmente, ser constituída por frases publicitárias para os produtos ou serviços a que respeitem, desde que possuam caráter distintivo, independen-temente da proteção que lhe seja reco-nhecida pelos direitos de autor”.A doutrina e a jurisprudência desenvolve-ram em construção teórica o conceito de marca, considerando de forma uniforme que “marca é um sinal distintivo de produ-tos ou serviços, visando individualizá-los no mercado, perante o consumidor e em relação aos demais, com os propósitos de assegurar e potenciar a clientela, simul-taneamente protegendo o consumidor do risco de confusão ou associação com marcas concorrentes”.Neste sentido, remete-se para o recente Acórdão do STJ, de 11-01-2011, Procº 627/06.7TBAMT.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase, no qual se faz invocação do conceito de mar-ca dado pelo eminente Professor Ferrer Correia (Lições de Direito Comercial, Vol. I, pag 253).Conforme decorre do art. 224º, nº1, o direito de propriedade de determinada marca é conferido através do seu registo. A concessão do registo está sujeita a determinadas restrições, dependendo, desde logo, de que o pedido satisfaça as condições para poder constituir uma marca (arts. 222º e 223º), bem como da não verificação de qualquer um dos fundamentos de recusa, nomeadamente, os gerais previsto no artigo 24º ou, para além desses, os previstos nos artigos 238º (Fundamentos de recusa do registo), 239º (Outros fundamentos de recusa), 240º (Imitação de embalagens ou rótulos não registados), 241º(Marcas notórias) e 242º (Marcas de prestígio); e, pressupõe a ob-servância de um procedimento próprio (arts. 233º e seguintes) a correr junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, entidade a quem a lei atribui competência para esse efeito. Em regra, o registo “é concedido a quem

primeiro apresentar regularmente o pedido com os elementos exigíveis” (nº1 do art. 11º), ou seja, detém a prioridade para adquirir o direito de propriedade sobre determinada marca aquele que primeiro requeira o respetivo registo, para esse efeito observando os procedimentos próprios e instruindo o pedido com os elementos que a lei exige.O titular da propriedade industrial dispõe das garantias estabelecidas por lei para a propriedade em geral, para além de bene-ficiar dos regimes especiais de proteção, estabelecidos no CPI e demais legislação e convenções em vigor (art. 316º). Assim, obtido o registo e conferido o direito de propriedade, o seu titular passa a dispor do exclusivo da “marca para os produtos e serviços a que esta se destina” (mesmo nº1 do art. 224º). A proteção legal concedida ao titular da marca prioritária traduz-se, também, no direito de se opor a que outrem a use sem o seu consentimento, bem como a impedir que o seu uso possa ser con-fundido ou associado àquela que lhe pertence, semelhança essa que pode ser gráfica, fonética ou figurativa [cfr. Ac. STJ, de 13-07-2010, Procº 3/05.9TYLSB.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase]. A atribuição deste direito insere-se no âmbito da função da propriedade indus-trial, assinalada no art. 1º do CPI, onde se lê que é a de “ (..) garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza”.O sentido da proteção atribuída por lei, vem desde logo evidenciado no pre-âmbulo do Decreto-Lei nº 36/2003, de 5 de março, onde se refere o seguinte: “É conhecida a importância do sistema da propriedade industrial para o processo de desenvolvimento económico, nome-adamente quando associado ao desen-volvimento científico e tecnológico e ao crescimento sustentado e sustentável da economia, inspirando e protegendo os resultados das atividades criativas e inventivas.Constituindo um dos fatores competiti-vos mais relevantes de uma economia

orientada pelo conhecimento, dirigida à inovação e assente em estratégias de marketing diferenciadoras, a propriedade industrial assume-se, igualmente, como mecanismo regulador da concorrência e garante da proteção do consumidor. O sistema da propriedade industrial está, assim, ligado, mais do que nunca, aos vetores essenciais de políticas macroeco-nómicas ou de estratégias empresariais, modernas e competitivas, condicionadas por uma sociedade de informação e por uma economia globalizada”.É justamente aquele direito de oposição que a recorrente, enquanto titular do di-reito de propriedade industrial da marca “ASPIRINA” pretende exercer, para obstar à concessão do registo e consequente proteção legal da marca “DOLPIRINA” que no seu entendimento deveria ter sido recusado.Assim, no que ao caso importa, sendo registo concedido e, consequentemente, conferido o direito de propriedade e o exclusivo da marca para os produtos e serviços a que se destina, essa posição prioritária confere ao titular proteção legal, que se manifesta, desde logo, por obstar à aceitação do pedido de registo de outra marca que a reproduza ou imite, total ou parcialmente, desde que se des-tine a produtos ou serviços idênticos ou afins e possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada. Com efeito, conforme resulta do dispos-to no art. 239º al. m), do CPI, constitui fundamento de recusa do registo de marcas, o facto de a marca cujo registo se requer conter, no todo ou em parte, “Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada”. Para além deste fundamento, mas igual-mente prendendo-se com a proteção do direito ao uso exclusivo da marca para os produtos e serviços a que se destina, decorrente da prioridade na aquisição do direito de propriedade sobre a mesma, a lei prevê ainda outros fundamentos de

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recusa do pedido de registo de marca, atendendo ao facto de a marca a proteger ser notória (art. 241º) ou marca de pres-tígio (art. 242.). No primeiro caso “É recusado o registo de marca que, no todo ou em parte essencial, constitua reprodução, imitação ou tra-dução de outra notoriamente conhecida em Portugal, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se ou se, dessa aplicação, for possível estabelecer uma associação com o titular da marca notória” (nº 1 do art. 241º). E, no segundo, estabelece-se que “o pedido de registo será igualmente recusado se a marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem identidade ou afinidade, constituir tradução, ou for igual ou semelhante, a uma marca anterior que goze de prestígio em Portugal ou na Comunidade Europeia, se for comunitária, e sempre que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do caráter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los”.Além do exposto, importa ainda atentar ao disposto no artigo 245º, onde consta o conceito de imitação ou usurpação, dis-pondo que “A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente: a) A marca registada tiver prioridade; b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto”. É ainda de assinalar que na interpretação e aplicação daquele conceito, deve ter-se em conta o disposto nos nºs 2 e 3, respetivamente, a propósito dos produtos que podem ou não ser con-siderados afins, e do uso de denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada.Nesta breve incursão sobre as normas a considerar para a apreciação do pre-sente recurso, deve ainda referir-se que, requerido o registo de determinada marca, a entidade competente deve

recusá-lo, desde logo, quando se verifique algum dos fundamentos gerais de recusa enunciados no nº1 art. 24º, entre eles o constante na alínea d), que consiste no “(..) reconhecimento de que o requerente pre-tende fazer concorrência desleal, ou de que esta é possível independentemente da sua intenção”. Por seu turno, a noção de concorrência desleal encontra-se no artigo 317º, consistindo em “ (..) todo o ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade económica”, nomeadamente os logo de seguida enunciados nas alíneas a) a f), entre eles “Os atos suscetíveis de criar confusão com a empresa, o estabe-lecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio empregue” (al. A).Presentes estas considerações teóricas cabe analisar a situação dos autos.A primeira questão a resolver, consiste, desde logo, em saber se a marca DOLPI-RINA é suscetível de ser confundida com a marca “ASPIRINA”, para o efeito tendo em conta o disposto na al. m), do art. 239º e nºs 1 e 2, do art. 245º. Pedido o registo de determinada marca, este deve ser recusado quando aquela contenha a “Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada” (al. m) do art. 239º).Esse princípio deve ser aferido à luz do dis-posto no art. 245º, que por sua vez enun-cia o conceito de imitação ou usurpação de marca. Do disposto no nº1, resulta que para haver imitação devem verificar-se, cumulativamente, três requisitos: 1º A prioridade da marca registada;2º A identidade ou afinidade dos produ-tos ou serviços marcados;3º A semelhança gráfica, figurativa, fo-nética ou outra da marca posterior com a marca anteriormente registada que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distin-guir senão depois de exame atento ou confronto ou crie um risco de associação.No que concerne aos dois primeiros requi-sitos não existe discordância por parte do

recorrente, acolhendo-se o teor da sen-tença objeto de recurso quando refere:Analisemos então cada um destes ele-mentos, tendo em atenção o caso em concreto.---No que respeita ao primeiro e conside-rando o disposto no art. 11º do Código da Propriedade Industrial concluímos que as datas de concessão das marcas invocadas pela recorrente são anteriores à da marca concedida à recorrida.É pois de concluir que as marcas da re-corrente têm prioridade relativamente à marca considerada obstativa.---Quanto ao segundo requisito, teremos de ter em atenção no que respeita à afi-nidade, que está em causa o facto de os produtos ou serviços serem concorrentes no mercado, tendo a mesma utilidade e fim, mas também a natureza (estrutura) dos produtos ou serviços e os circuitos e hábitos de distribuição dos produtos e serviços (cfr. Luís M. Couto Gonçalves, Direito das Marcas, págs. 133 e 134).---Vejamos:Analisando os produtos que as marcas assinalam, verifica-se estarem em causa produtos idênticos e afins, no que respeita aos produtos assinalados na classe 5ª, podendo em muitos casos, os produtos assinalados pelas marcas da recorrente e recorrida, nesta classe, terem a mesma utilidade e fim e circularem nos mesmos canais de distribuição e consumo.-Verifica-se assim igualmente este segun-do requisito do conceito de imitação.---Continua a sentença objeto de recurso:Quanto ao terceiro requisito, importa ter em atenção que cabe fazer a comparação entre marcas nominativas.-Vejamos: ---Fazendo o confronto entre as palavras, im-porta considerar que efetivamente existe a coincidência na parte final das palavras que compõem as marcas no que respeita às palavras “DOLPIRINA” e “ASPIRINA”.-No entanto, essa coincidência não é o suficiente, em nosso entender, para considerarmos uma aproximação que permita concluir pela possibilidade de erro e confusão por parte do consumi-dor. O som e a grafia das palavras surge claramente diverso, o que permite, face à clara impressão diversa, desde logo

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do início da palavra, que o consumidor distinga as marcas.-Não se encontra assim verificado, em nosso entender, este último requisito de imitação.-É quanto a esta conclusão que a recorren-te começa por se insurgir. Vejamos então se lhe assiste razão.Assim, não estando em causa que as marcas da recorrente são prioritárias relativamente à marca da recorrida bem assim que os produtos que assinalam são idênticos ou afins, o passo seguinte, consiste em verificar se é de concluir, ou não, pela verificação do terceiro requisito do conceito de imitação ou usurpação.A marca tem hoje uma função essencial de distinguir e garantir que os produtos ou serviços se reportam a uma pessoa que assume em relação aos mesmos o ónus pelo seu uso não enganoso (função dis-tintiva), uma função derivada de garantia indireta de qualidade dos produtos ou serviços marcados por referência a uma origem não enganosa, e uma função complementar da função distintiva que é a de contribuir, por si mesma, para a promoção dos produtos ou serviços que assinala (função publicitária) (Luís Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, Almedina, 2008, pp. 197-198).Na apreciação relativa à verificação, ou não, do terceiro requisito de imitação ou usurpação, a questão que se coloca é a de saber se a marca “DOLPIRINA”, pela semelhança dos seus elementos – gráfica, figurativa, fonética ou outra - com o da marca “ASPIRINA”, é suscetível de induzir “facilmente em erro ou confusão o con-sumidor, não podendo este distinguir” aquela primeira, destas últimas, “senão depois de exame atento ou confronto”; ou, se a semelhança dos seus elementos cria “um risco de associação”.Aferir se há semelhança entre as marcas, de tal modo que possa induzir o consu-midor facilmente em erro ou confusão, ou ao risco de associação, pressupõe que se confrontem as marcas na perspetiva des-se mesmo consumidor e que se observem determinados critérios.Recorrendo à doutrina e à jurisprudência, vejamos algumas posições sobre o méto-do a observar.

Há um conjunto de critérios de aprecia-ção comuns relativamente consensuais na doutrina: “o primeiro é o dever de apreciar as marcas no seu conjunto, só se devendo recorrer à dissecação analítica por justificada necessidade, quando não resultar da visão unitária um resultado claro, o segundo é o da irrelevância no conjunto da apreciação das marcas das suas componentes genérica ou descritiva e o facto de se assemelharem unicamente em relação aos sinais gráficos genéricos ou descritivos não é determinante; o terceiro é o de que nas marcas complexas (constituídas por mais de um elemento nominativo), se dever privilegiar sempre o elemento dominante e, por último, é o de que quanto maior for a notoriedade da marca maior o risco de confusão com uma marca posterior; há ainda a referir que nos termos do art. 245/1/c, parte final o risco de associação, passa a fazer parte do conceito de imitação” (Luís Couto Gonçalves, op. cit, pp. 278 – 279).Quanto à apreciação do caráter distinti-vo da marca, Carlos Olavo defende que deve ter-se em conta “ (..) por um lado (..) os produtos e serviços a que se destina (..)”, e, por outro, a “(..) perceção que dela tem o público relevante, normalmente informado e razoavelmente atento e ad-vertido” (Propriedade Industrial - Noções Fundamentais, 2005, pp. 82).Em Acórdão do STJ de 02-10-2003, de-fende-se que “No juízo comparativo das marcas, para efeito de se verificar se existe imitação ou usurpação, devem seguir-se, segundo o entendimento jurisprudencial e doutrinal corrente, as seguintes regras ou princípios:- o juízo comparativo deve ser objetivo, apurando-se se existe risco de confusão tomando em conta o consumidor ou utilizador final medianamente atento;- para a formulação desse juízo relevam menos as dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores isoladamente do que a semelhança que resulta do conjun-to dos elementos componentes, devendo ainda tomar-se em conta a interligação entre os produtos e serviços, por um lado, e, por outro, os sinais que os diferenciam”.(Proc. nº 03B2236, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj. OpenDatabase).

Esta posição é igualmente mantida na jurisprudência mais recente, como re-sulta do sumário do Acórdão do STJ, de 13.07.2010, já antes invocado, no qual pode ler-se o seguinte:II- “Esse confronto não demanda, da parte do consumidor, especiais qualidades de perspicácia, subtileza ou atenção, já que, no frenético universo do consumo, o padrão é o do consumidor médio, razoa-velmente informado, mas não particular-mente atento às especificidades próprias das marcas”.III- Daí que, no juízo a fazer acerca da imitação, se deva ter em conta uma im-pressão de conjunto e não de pormenor das marcas ou produtos, sendo relevantes os elementos que, essencialmente, as distinguem por serem os dominantes.IV-É assim o critério do consumidor médio, o relevante, para diante dos ele-mentos gráficos, fonéticos ou figurativos (sobretudo nas marcas mistas) de certo produto de uma marca, poder ou não, ter a perceção de que pode confundir essa com aqueloutra, ou associá-la a uma já existente, não sendo de exigir que, se tivesse a possibilitar de as confrontar, logo as suas dúvidas pudessem ser dissipadas.V-A distinguibilidade das marcas nomina-tivas relaciona-se primordialmente com o seu aspeto fonético e gráfico e deve ser apreendida por um consumidor abstrato do produto a que a marca se destina e não à massa dos consumidores; na sociedade de consumo não é ousado afirmar que cada cidadão é um consumidor, daí que o critério de diferenciação das marcas não deve fazer apelo ao consumidor concreto”.Do conjunto dos critérios expostos re-sulta que, no juízo comparativo a fim de indagar se existe imitação ou usurpação, devem observar-se os critérios seguintes:- O critério de apreciação deve ser obje-tivo e corresponder ao do consumidor médio e abstrato do produto a que a mar-ca se destina, ou seja, considerando-se a perspetiva do consumidor normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, de entre aqueles a quem o produto é dirigido.- As marcas em confronto devem ser apre-ciadas, atendendo à impressão global do

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conjunto dos elementos que integram, o que se justifica pelo facto de em circuns-tâncias normais do quotidiano ser essa a perspetiva do consumidor e aquela visão unitária a que lhe causa maior impressão.- Relevarão menos as diferenças de por-menor entre as marcas em confronto, por-que estas apenas serão mais percetíveis através dum exame mais pormenorizado, não sendo razoável esperar que o consu-midor esteja normalmente em condições, ou até disponível, para a realizar.Façamos agora o confronto entre a marca prioritária “ASPIRINA” e a marca “DOLPIRINA”.Ambas as marcas são constituídas por uma palavra, escrita em letras maiúsculas.Daqui se retira que no confronto entre estas marcas, o elemento em comum é a terminação gráfica “PIRINA”.Contudo, quanto ao elemento fonético, entendemos que no caso da marca prioritária o enfoque tónico está na sua terminação “PIRINA”, enquanto que na marca objeto de recurso, a prioridade tó-nica se coloca na expressão “DOL”…pirinaAceitando que numa impressão de con-junto relevam os elementos dominantes, consideramos que, enquanto na marca prioritária o elemento dominante é a sua terminação “PIRINA”, na marca recorrida o sinal apelativo à impressão do destina-tário coloca-se na expressão inicial “DOL”.No conjunto das duas expressões, en-tendemos que o consumidor com as características descritas não confundirá as duas marcas.Daí que não se possa concordar com a recorrente, quando defende que neste confronto o elemento “PIRINA”, existente em ambas as marcas, é o que causa maior impacto e, logo, é o dominante.O elemento fonético é no caso dos autos particularmente apelativo ao consumidor e esse é o elemento que claramente dis-tingue as duas marcas.Na marca recorrida o elemento “DOL” tem uma carga fonética acentuada que faz diluir o termo da expressão “PIRINA”.Mas também o elemento gráfico é distin-to, não existindo confusão possível entre as três letras “DOL” e as duas letras “AS”, letras estas distintas entre si.Concluímos assim que o elemento domi-

nante, quer graficamente quer fonetica-mente não é o elemento “PIRINA”. Em suma, feito o confronto entre a marca prioritária “ASPIRINA” e a marca “DOLPIRI-NA”, conclui-se que não existe “semelhan-ça gráfica, figurativa, fonética ou outra” desta última com aquela primeira, que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor médio, a quem os produtos em causa são dirigidos, ou que crie um risco de associação.Por conseguinte, quanto a esta parte, bem andou a sentença ao concluir que não existem entre as duas marcas em confron-to os requisitos cumulativos exigidos pelo legislador para se considerar que aquela primeira imita estas últimas. Inexiste, pois, por esta via, fundamento para a revoga-ção do despacho que concedeu o registo a marca “DOLPIRINA”.Quanto ao invocado requisito da noto-riedade, é o seguinte o teor da sentença recorrida:Quanto às restantes marcas que a recor-rente invocou com inserção das letras “PIRINA”, apenas referimos que, para além de não conhecermos quais os produtos assinalados pelas mesmas, não podemos concluir, face a essa titularidade, que a re-corrente se poderá apropriar do vocábulo “PIRINA”.-Face ao supra referido, importa considerar que a concessão do registo em apreço foi correto, cabendo manter o mesmo.-Dispõe o nº 1 do art. 241º que “ “É recusa-do o registo de marca que, no todo ou em parte essencial, constitua reprodução, imi-tação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Portugal, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se ou se, dessa aplicação, for possível estabelecer uma associação com o titular da marca notória”.O CPI não adianta uma noção de marca notória, importando assim saber o que se deve entender como tal. Procurando responder a essa questão, Luís Couto Gonçalves escreve: “A marca notoriamente conhecida é entendida como a marca conhecida de uma grande parte do público consumi-dor como a que distingue de uma forma imediata um determinado produto ou serviço.

Uma forte corrente doutrinária e jurispru-dencial distingue ainda duas hipóteses: se o produto ou o ou serviço for de consumo específico, a marca deve ser conhecida de grande parte do público interessado nesse produto ou serviço. A marca notoriamente conhecida deve ser notória no país onde se solicita a espe-cial proteção – pois é nele que, obviamen-te, se haverá de dirimir o conflito entre a marca a registar e a marca notoriamente conhecida – embora não careça de nele ser usada de modo efetivo.” (ob. cit, pp. 278 – 279).Na jurisprudência podemos ver o Acórdão do STJ de 15.02.2007, onde se defende que para que uma marca se qualifique como notoriamente conhecida «não é necessário que “o conhecimento a marca e de que ela pertence a certa entidade” constitua facto público e notório, com as características que a esta fórmula se atribui na nossa legislação processual. A opinião dominante é no sentido de que a marca pode assim ser qualificada desde que alcançou notoriedade ou conheci-mento geral no círculo dos produtores ou dos comerciantes ou no meio dos consu-midores mais em contacto com o produto a que respeita a marca; basta que se tenha divulgado de modo particular no círculo de pessoas que é uso designar por “meios interessados”» (Revista nº 200/07, http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabas).Na apreciação no sentido de se saber se a marca “ASPIRINA”, deve ser considerada, ou não, marca notória, deve ter-se presen-te que, necessariamente, a mesma deve ser feita tendo em conta em atenção à factualidade fixada nos autos.Ponderando a fatualidade considerada provada onde nada consta a propósito de tal notoriedade, sufraga-se o que refere a sentença objeto de recurso ao referir que, “No que respeita à aflorada notoriedade das marcas da titularidade da recorrente, a mesma não trouxe para os autos quais-quer factos ou elementos de prova, que permitam ao tribunal concluir por essa notoriedade e, consequentemente, con-ceder às mencionadas marcas a proteção acrescida concedida às marcas notórias.-Não se provaram factos que permitissem extrair aquela conclusão da notoriedade

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em correlação com outros dados gerais relativos a este mesmo segmento de mer-cado e, logo, ao universo de consumido-res, ou seja, ao tal círculo dos produtores ou dos comerciantes ou no meio dos consumidores mais em contacto com o produto a que respeita a marca que é uso designar por “meios interessados”.Recaia sobre a Recorrente o ónus de alegar e provar os factos impeditivos da concessão do registo da marca “DOLPIRI-NA”, nos termos do art. 342º, nº 2, do CC, o que não logrou fazer.Desconhece-se em absoluto qual o vo-lume de vendas global neste segmento de produtos, para assim se ter ideia da quota de mercado da recorrente, o que revelaria o grau de penetração e aceitação da marca no mercado e, logo, permitiria ter alguma ideia sobre o reconhecimento da marca junto dos mesmos.O tribunal não dispõe assim de dados que permitam concluir que a marca “AS-PIRINA” era, à data em que foi concedido o registo à marca “DOLPIRINA”, nesse conjunto de marcas a considerar, uma marca notória.Daí que se conclua, tal como na sentença, que os factos provados são insuficientes para se concluir que a marca “ASPIRINA” é notoriamente conhecida em Portugal.Por último, resta apreciar se estão verifi-cados os requisitos para se concluir pela possibilidade de ocorrência de situações de concorrência desleal.Resulta do disposto no nº 1, al. d), do art. 24º do diploma em apreciação que o registo deve ser recusado quando se reconheça “que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou de que esta é possível independentemente da sua intenção”. A noção legal de concorrência desleal consta do art. 317º, (invocado pela recor-rente), o qual refere que “Constitui concor-rência desleal todo o ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade económica, nomeadamente…, procedendo, nas alí-neas a) a f), a uma tipificação, não taxativa, de vários tipos de atos que constituem concorrência desleal. Quanto ao tipo de atos de concorrência desleal, a doutrina distingue as modalida-

des de atos de concorrência desleal, atos de confusão, atos de descrédito, atos de apropriação e atos de desorganização, a estes acrescendo ainda, para alguns, a concorrência parasitária. Para o caso importa atender ao disposto na al. a), que, conjugada com a parte introdutória do artigo, leva a concluir constituírem concorrência desleal, por representarem um ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade económica “Os atos suscetíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produ-tos ou os serviços dos concorrentes, qual-quer que seja o meio empregue” (al. a)). Assim, conjugando agora esta norma com a referida al. d), do nº1 do art. 24º, o que poderia estar em causa era se a recorrida, ao requerer o registo da marca DOLPIRI-NA, com os elementos que o compõem e para assinalar os produtos da classe 5.ª, pretendeu intencionalmente criar condi-ções de confundibilidade relativamente às marcas “ASPIRINA”, ASPIRINA DIRECT ou ASPIRIN, da classe 5ª e aos seus produtos, para captar a clientela por estas angariada relativamente aos produtos assinalados; ou, então, se independentemente da sua intenção, tal acaba por ser possível. Nas palavras de Luís Couto Gonçalves, “procura-se prevenir a atribuição de um direito privativo a um concorrente, que de um modo intencional ou não, de-sencadeia ou pode desencadear com o seu pedido uma situação objetivamente desleal (um ato contrário às normas e costumes honestos de qualquer atividade comercial” (Op. cit., pp. 299).Salienta-se desde logo que a existência de uma atuação intencional da titular da marca “DOLPIRINA” não está provada nos autos.Assim, o que importa é apenas indagar se, em face dos factos assentes e, também, das conclusões a que já se chegou, se deve concluir que a concessão do registo da marca “DOLPIRINA” pode desencadear a possibilidade de verificação de uma situação objetivamente desleal.Não olvidamos que a marca DOLPIRINA foi concedida para assinalar produtos da classe 5.ª, os quais são também parte dos assinalados pelas marcas ASPIRINA”,

ASPIRINA DIRECT ou ASPIRIN, no que se reporta a medicamentos.Por ser assim, quanto a esses produtos a clientela alvo é a mesma, donde se conclui necessariamente que haverá concorrência.Contudo, o facto de haver concorrência não significa que seja desleal, sendo só a possibilidade de esta vir a ocorrer o que a lei quer evitar. A questão da potencialida-de de concorrência desleal, embora ligada com a confusão de marcas, tem a ver es-sencialmente com a captação da clientela da marca concorrente relativamente aos produtos comercializados de entre os assinalados, mas desde que através de qualquer “ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade económica”.É esse o fulcro da questão.Porém, tendo-se concluído que não se verificam os requisitos de imitação, ou seja, que não há possibilidade de erro ou confusão, bem assim que nem tão-pouco há risco de associação, na ausência de qualquer outro facto que possa eviden-ciar algo mais em abono da posição da recorrente, impõe-se concluir que não está demonstrada a existência de con-corrência desleal. (Em sentido idêntico, cfr. Ac. da RL de 20/10/2011, Proc. nº 393/07.9TYLSB.L1-6, Relator Desembargador Jerónimo Freitas, publicado in www.dgsi.pt)Improcede também o recurso com tal fundamento.Em consequência do exposto, impõe-se julgar a apelação improcedente e manter na íntegra a sentença objeto de recurso.

deCiSÃoEm face do exposto, Acordam os Juízes da 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recur-so de apelação, mantendo na íntegra a sentença objeto de recurso.Custas a cargo da recorrente.Transitado cumpra-se o disposto no art. 35º nº 3, aplicável ex vi art. 47º CPI.

Lisboa, 15 de dezembro de 2011Maria Amélia AmeixoeiraCaetano DuarteFerreira de Almeida

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CoMeNtário: No âmbito do presente recurso coloca-se a seguinte questão:- Saber se a marca nacional nº 409164 DOLPIRINA constitui imitação das marcas ASPIRIN e ASPIRINA de que é titular a Recorrente. A doutrina e a jurisprudência são unânimes em considerar que “marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços, visando individualizá-los no mercado, perante o consumidor e em relação aos demais, com os propósi-tos de assegurar e potenciar a clien-tela, simultaneamente protegendo o consumidor do risco de confusão ou associação com marcas concorrentes”.O direito de propriedade de deter-minada marca é conferido através do seu registo, tal como decorre do art. 224º, nº1, do CPI. Em regra, o registo “é concedido a quem primeiro apresentar regularmente o pedido com os elementos exigíveis” (nº1 do art. 11º), ou seja, detém a prioridade para adquirir o direito de propriedade sobre determinada marca aquele que primeiro requeira o respetivo registo. O titular da propriedade industrial dispõe das garantias estabelecidas por lei para a propriedade em geral, para além de beneficiar dos regimes especiais de proteção, estabelecidos no CPI (art. 316º). Assim, obtido o registo e conferido o direito de pro-priedade, o seu titular passa a dispor do exclusivo da “marca para os produ-tos e serviços a que esta se destina”. A proteção legal concedida ao titular da marca prioritária traduz-se, também, no direito de se opor a que outrem a use sem o seu consentimento, bem como a impedir que o seu uso possa ser confundido ou associado àquela que lhe pertence, semelhança essa que pode ser gráfica, fonética ou figurativa. No caso em apreço é justamente esse direito de oposição que a recorrente, enquanto titular do direito de propriedade industrial da marca “ASPIRINA”, pretende exercer, para obstar à concessão do registo e

consequente proteção legal da marca “DOLPIRINA” que no seu entendimen-to deveria ter sido recusado.Conforme resulta do disposto no art. 239º al. m), do CPI, constitui funda-mento de recusa do registo de marcas o facto de a marca cujo registo se requer conter, no todo ou em parte, “Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada”. A lei prevê ainda outros fundamentos de recusa do pedido de registo de marca, atendendo ao facto de a marca a proteger ser notória (art. 241º) ou marca de prestígio (art. 242.). No primeiro caso (marca notó-ria) “É recusado o registo de marca que, no todo ou em parte essencial, constitua reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente co-nhecida em Portugal, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se ou se dessa aplicação for possível estabelecer uma associação com o titular da marca notória” (nº 1 do art. 241º). E, no segundo (marca prestí-gio), estabelece-se que “o pedido de registo será igualmente recusado se a marca, ainda que destinada a pro-dutos ou serviços sem identidade ou afinidade, constituir tradução, ou for igual ou semelhante, a uma marca anterior que goze de prestígio em Portugal ou na Comunidade Europeia, se for comunitária, e sempre que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do caráter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los”.Importa atentar ao disposto no artigo 245º, onde consta o conceito de imita-ção ou usurpação, segundo o qual “A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente: a) A marca registada tiver prioridade; b)

Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c) Tenham tal semelhança grá-fica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa dis-tinguir senão depois de exame atento ou confronto”A entidade competente deve recusar o registo, desde logo, quando se veri-fique algum dos fundamentos gerais de recusa enunciados no nº1 art. 24º, entre eles o constante na alínea d), que consiste no “(..) reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou de que esta é possível independentemente da sua intenção”. A noção de concorrência desleal encontra-se no artigo 317º, consistindo em “ (..) todo o ato de con-corrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de ativi-dade económica”, nomeadamente os logo de seguida enunciados nas alíne-as a) a f ), entre eles “Os atos suscetíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio empregue” (al. A).No caso em apreço, a primeira ques-tão a resolver consiste, desde logo, em saber se a marca DOLPIRINA é suscetível de ser confundida com a marca “ASPIRINA”, para o efeito tendo em conta o disposto na al. m), do art. 239º e nºs 1 e 2, do art. 245º.Do disposto no nº1 do art. 239º re-sulta que para haver imitação devem verificar-se, cumulativamente, três requisitos: 1º A prioridade da marca registada;2º A identidade ou afinidade dos pro-dutos ou serviços marcados;3º A semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra da marca posterior com a marca anteriormente registada que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distinguir senão depois de exame

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MarCaSVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201138

atento ou confronto ou crie um risco de associação.No que respeita ao primeiro requisito e considerando o disposto no art. 11º do Código da Propriedade Industrial, conclui-se que as datas de concessão das marcas invocadas pela recorrente são anteriores à da marca concedida à recorrida.É pois de concluir que as marcas da recorrente têm prioridade relativa-mente à marca considerada obstativa.Quanto ao segundo requisito, teremos de ter em atenção, no que respeita à afinidade, que está em causa o facto de os produtos ou serviços serem concorrentes no mercado, tendo a mesma utilidade e fim, mas também a natureza (estrutura) dos produtos ou serviços e os circuitos e hábitos de distribuição dos produtos e serviços.Analisando os produtos que as mar-cas assinalam, verifica-se estarem em causa produtos idênticos e afins, no que respeita aos produtos assinalados na classe 5ª, podendo, em muitos casos, os produtos assinalados pelas marcas da recorrente e recorrida, nesta classe terem a mesma utilidade e fim e circularem nos mesmos canais de distribuição e consumo.Verifica-se assim igualmente o segun-do requisito do conceito de imitação.Quanto ao terceiro requisito, impor-ta ter em atenção que cabe fazer a comparação entre marcas nomina-tivas. Fazendo o confronto entre as palavras, importa considerar que existe a coincidência na parte final das palavras que compõem as marcas no que respeita às palavras “DOLPIRINA” e “ASPIRINA”.-No entanto, essa coincidência não é o suficiente para considerarmos uma aproximação que permita concluir pela possibilidade de erro e confusão por parte do consumidor. O som e a grafia das palavras surge claramente diverso, o que permite, face à clara impressão diversa, desde logo do início da palavra, que o consumidor distinga as marcas.

Não se encontra assim verificado este último requisito de imitação. Para se indagar se existe imitação ou usurpa-ção, devem observar-se os critérios seguintes:- O critério de apreciação deve ser objetivo e corresponder ao do con-sumidor médio e abstrato do produto a que a marca se destina, ou seja, considerando-se a perspetiva do consumidor normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, de entre aqueles a quem o produto é dirigido.- As marcas em confronto devem ser apreciadas, atendendo à impressão global do conjunto dos elementos que integram, o que se justifica pelo facto de em circunstâncias normais do quotidiano ser essa a perspetiva do consumidor e aquela visão unitária a que lhe causa maior impressão.No confronto entre estas marcas, o elemento em comum é a terminação gráfica “PIRINA”. No conjunto das duas expressões, entendemos que o con-sumidor com as características des-critas não confundirá as duas marcas.Daí que não assista razão à recorrente, quando defende que neste confronto o elemento “PIRINA”, existente em ambas as marcas, é o que causa maior impacto e, logo, é o dominante.O elemento fonético é no caso dos autos particularmente apelativo ao consumidor e esse é o elemento que claramente distingue as duas marcas.Na marca recorrida o elemento “DOL” tem uma carga fonética acentuada que faz diluir o termo da expressão “PIRINA”.Mas também o elemento gráfico é distinto, não existindo confusão possível entre as três letras “DOL” e as duas letras “AS”, letras estas distintas entre si.O Tribunal da Relação de Lisboa concluiu assim que o elemento domi-nante, quer graficamente quer fone-ticamente não é o elemento “PIRINA”. Em suma, feito o confronto entre a marca prioritária “ASPIRINA” e a mar-

ca “DOLPIRINA”, conclui-se que não existe “semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra” desta última com aquela primeira, que induza facilmen-te em erro ou confusão o consumidor médio, a quem os produtos em causa são dirigidos, ou que crie um risco de associação.Por conseguinte, quanto a esta parte, bem andou a sentença ao concluir que não existe entre as duas marcas em confronto, os requisitos cumula-tivos exigidos pelo legislador para se considerar que aquela primeira imita estas últimas. Inexiste, pois, por esta via, fundamento para a revogação do despacho que concedeu o registo a marca “DOLPIRINA”.Falta apenas indagar se se deve concluir que a concessão do registo da marca “DOLPIRINA” pode desen-cadear a possibilidade de verificação de uma situação objetivamente desleal.Antes de mais é necessário ter presen-te que o facto de haver concorrência não significa que seja obrigatoria-mente desleal. A questão da poten-cialidade de concorrência desleal, embora ligada com a confusão de marcas, tem a ver essencialmente com a captação da clientela da marca concorrente relativamente aos pro-dutos comercializados de entre os assinalados, mas desde que através de qualquer “ato de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade eco-nómica”.No caso dos autos, tendo-se concluí-do que não se verificam os requisitos de imitação, ou seja, que não há pos-sibilidade de erro ou confusão, bem assim que nem tão-pouco há risco de associação, impõe-se concluir que não está demonstrada a existência de concorrência desleal. Face ao exposto, o Tribunal da Re-lação de Lisboa decidiu em julgar improcedente o recurso de apelação, mantendo na íntegra a sentença ob-jeto de recurso.

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Resumos - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 39

A decisão do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 15 de dezembro de 2011, foi sumariada do seguinte modo: “I - No que toca à responsabilidade civil médica, não prevê a lei casos de respon-sabilidade objetiva ou de responsabili-dade por factos lícitos danosos, tão-só admite a responsabilidade contratual e a extracontratual ou aquiliana.II - Tendo-se o autor apresentado aos réus médicos a coberto de um contrato de seguro celebrado pela sua entidade patronal e tendo estes atuado no âm-bito de um contrato de prestação de serviços médico-cirúrgicos, previsto no art. 1154º do CC, que mantinham com a seguradora, o conteúdo da relação es-tabelecida entre o autor e os médicos está impressivamente contratualizado, encontrando-se no domínio da respon-sabilidade civil contratual.III - Se é inquestionável que a execução de um contrato de prestação de serviços médicos pode implicar para o médico uma obrigação de meios ou uma obri-gação de resultado, o corrente na práti-ca é o ato médico envolver da parte do médico, enquanto prestador de serviços que apelam à sua diligência e ciência profissionais, a assunção de obrigação de meios. Em regra, o médico a só isto se obriga, apenas se compromete a pro-porcionar cuidados conforme as “leges artis” e os seus conhecimentos pessoais, somente se vincula a prestar assistência mediante uma série de cuidados ou tra-tamentos normalmente exigíveis com o intuito de curar.

IV - Importa ponderar a natureza e ob-jetivo do ato médico para, casuistica-mente, saber se se está perante uma obrigação de meios ou perante uma obrigação de resultado.V - Assente que o autor foi submetido a intervenção cirúrgica à coluna e nada mais se tendo provado que ajude a qua-lificar com precisão a obrigação, desco-nhecendo-se como surgiu a opção da sua submissão à intervenção cirúrgica, por iniciativa de quem, qual o objetivo da operação, que tipo de compromisso médico foi assumido, se é que tal acon-teceu, nomeadamente com algum com-prometimento de resultado e qual, se foi informado dos riscos inerentes, resta então ser notório que, por regra, no caso de intervenções cirúrgicas, e muito par-ticularmente nas intervenções à coluna, não se assegura a cura mas a procura da atenuação do sofrimento do doente, estando cometida ao médico cirurgião uma obrigação de meios.VI - Sempre que se trate de uma mera obrigação de meios, que não de uma obrigação de resultado, incumbe ao doente o ónus de provar a falta de dili-gência do médico.VII - Tem o paciente/lesado de provar o defeito de cumprimento, porque o não cumprimento da obrigação do médico assume, por via de regra, a forma de cumprimento defeituoso, e depois tem ainda de demonstrar que o médico não praticou todos os atos normalmente tidos por necessários para alcançar a finalidade desejada.VIII - Feita essa prova, então, funciona a

presunção de culpa, que o médico pode ilidir demonstrando que agiu correta-mente, provando que a desconformi-dade não se deveu a culpa sua por ter utilizado as técnicas e regras de arte adequadas ou por não ter podido em-pregar os meios adequados.IX - Em termos gerais, ponto comum à responsabilidade contratual e à res-ponsabilidade extracontratual, ter o médico agido culposamente significa ter o mesmo agido de tal forma que a sua conduta lhe deva ser pessoalmen-te censurada e reprovada, pois, em face das circunstâncias concretas do caso, o médico devia e podia ter atuado de modo diferente.”Neste recurso interposto junto do Tri-bunal do Supremo Tribunal de Justiça discute-se a seguinte matéria:1- Saber se a responsabilidade civil mé-dica em causa é de natureza contratual;2- Saber se competia aos médicos réus demonstrar que as lesões que o autor apresenta, posteriores às cirurgias re-alizadas, não procedem de culpa sua.No que toca à 1ª. Questão e no que con-cerne à responsabilidade civil médica, não prevê a nossa lei casos de respon-sabilidade objetiva ou de responsabili-dade por factos lícitos danosos, tão-só admite a responsabilidade contratual e a extracontratual ou aquiliana.Hoje em dia, no comum das situações, a responsabilidade médica tem, em princípio, natureza contratual. Médico e doente estão, no comum dos casos, ligados por um contrato marcadamente pessoal, de execução continuada e, por via de regra, sinalagmático e oneroso. Segundo Miguel Teixeira de Sousa a responsabilidade civil médica “é con-tratual quando existe um contrato, para cuja celebração não é, aliás, necessária

responsabilidade médica- Cumprimento defeituoso

referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.12.2011fonte: site do STJ – www.dgsi.pt

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JuriSPrudêNCia - ResumosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201140

qualquer forma especial, entre o pacien-te e o médico ou uma instituição hos-pitalar e quando, portanto, a violação dos deveres médicos gerais representa simultaneamente um incumprimento dos deveres contratuais (…). Em con-trapartida, aquela responsabilidade é extracontratual quando não existe qualquer contrato entre o médico e o paciente e, por isso, quando não se pode falar de qualquer incumprimento contratual, mas apenas, como se refere no art. 483º, nº 1, do Código Civil, da vio-lação de direitos ou interesses alheios (como são o direito à vida e à saúde)”.Distingue-se a responsabilidade ci-vil em contratual, quando provém da “falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos, de negócios unilaterais ou da lei”, e extracontratu-al, também designada de delitual ou aquiliana, quando resulta da “violação de direitos absolutos ou da prática de certos atos que, embora lícitos, causam prejuízo a outrem”.O Código Civil sistematiza estas duas formas de responsabilidade em lugares distintos. A responsabilidade contratual nos arts. 798º e segs., e nos arts. 483º e segs. no capítulo das fontes das obri-gações. Às duas formas de responsa-bilidade interessam ainda os arts. 562º e segs.que fixam o regime próprio da obrigação de indemnizar. Dispõe o art. 798º que “o devedor que falta culposamente ao cumprimen-to da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”, e, de harmonia com o disposto no nº 1 do art. 483º, “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pe-los danos resultantes da violação”. São os mesmos os elementos consti-tutivos da responsabilidade civil, pro-venha ela de um facto ilícito ou de um contrato, a saber: o facto (controlável pela vontade do homem); a ilicitude; a culpa; o dano; e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. Em qualquer dos casos, a responsabi-lidade civil assenta na culpa, a qual é

apreciada “in abstrato”, ou seja, pela di-ligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso, conforme preceitua o nº 2 do art. 487º, aplicável à responsabilidade contratual ex vi nº 2 do art. 799º. No caso dos autos, está em causa a eventual violação ilícita de um direito de personalidade (a integridade física do autor), pelo que tal ilícito geraria sem-pre responsabilidade extracontratual. Dúvidas não existem de que entre o autor, por um lado, e os médicos réus, pelo outro, não foi ajustado de forma pessoal e direta um qualquer contrato. Não existindo essa relação contratual, a responsabilidade pelo ato médico, em princípio, assume exclusivamente natureza extracontratual.

É, contudo, facto assente que os cuida-dos médicos foram prestados ao autor na sequência de acidente de trabalho de que foi vítima, cuidados por sua vez relacionados (pressupostamente por contrato) com a seguradora da sua en-tidade patronal, e operados no réu Hos-pital de Santa Maria no Porto.O regime de responsabilidade civil em hospitais públicos ou em clínicas ou consultórios privados é diverso, sendo o réu Hospital de Santa Maria no Porto uma unidade de saúde privada. Inexiste na lei portuguesa um regime unitário no que respeita à responsabi-lidade dos médicos quando os serviços

são por si prestados em ambiente insti-tucional privado, pois que depende do que forem os factos de cada caso con-creto, sendo diferentes as modalidades contratuais em “função de combinações entre as diferentes qualificações das partes no contrato e das suas relações, diretas ou indiretas, com a participação em atos médicos”. É inquestionável que o autor nenhu-ma celebração contratual teve com o réu Hospital, fosse do que se entende por “contrato total” ou por “contrato dividido”.Deste modo, se o estabelecimento hos-pitalar não se comprometeu à prestação de cuidados de saúde propriamente ditos, não faz sentido responsabilizá-lo por um comportamento culposo dos

médicos (arts. 500º, nos 1 e 2, e 800º, nº 1, “a contrario”). A sua responsabilida-de confina-se aos atos praticados pelo seu pessoal envolvido na execução do contrato de internamento e dos atos conexos com as intervenções a que se comprometeu.Quanto aos réus médicos, a situação em apreço configura-se como suscetível da sua responsabilização civil suportada numa relação contratual triangular que se ajusta a um contrato a favor de tercei-ro, ou seja, como um “contrato misto em que a componente prestação de serviço (médico) é a mais relevante”.Ora, tendo-se o autor apresentado aos

Agir com culpa significa atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável, quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo”.

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Resumos - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 41

réus médicos a coberto de um contrato de seguro celebrado pela sua entidade patronal e tendo eles atuado no âm-bito de um contrato de prestação de serviços médico-cirúrgicos – previsto no art. 1154º, que mantinham com a seguradora, o conteúdo da relação es-tabelecida entre o autor e os médicos está impressivamente contratualizado, e, contrariamente à conclusão a que chegou o Tribunal da Relação, estamos no domínio da responsabilidade civil contratual. Assim, no que à primeira questão, en-tendeu o STJ em ser de não manter a fundamentação de direito seguida no acórdão impugnado.

No que à 2ª. Questão diz respeito, e es-tando assente que a responsabilidade médica é de natureza contratual, dú-vidas não subsistem sobre a especial gravidade dos danos invocados. É princípio básico o de que o devedor que falta culposamente ao cumprimen-to da obrigação se torna responsável pelos prejuízos ocasionados ao credor, quer se trate de não cumprimento de-finitivo, quer de simples mora ou de cumprimento defeituoso (cfr. arts. 798º, 799º, 801º e 804º). Como ensina Antunes Varela, “para que o facto ilícito gere responsabilidade, é necessário que o autor tenha agido com culpa. Não basta reconhecer que ele procedeu objetivamente mal. É preciso, nos termos do art. 483º, que a violação

ilícita tenha sido praticada com dolo ou mera culpa. Agir com culpa significa atuar em termos de a conduta do agen-te merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é repro-vável, quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo”.Outrossim, estabelece a lei, no nº 1 do art. 799º, uma presunção legal de cul-pa do devedor, a qual pode ser ilidida mediante prova em contrário (cfr. nº 2 do art. 350º). Portanto, sobre ele recai o ónus da prova. Se é inquestionável que a execução de um contrato de prestação de serviços

médicos pode implicar para o médico uma obrigação de meios ou uma obri-gação de resultado, o corrente na práti-ca é o ato médico envolver da parte do médico, enquanto prestador de serviços que apelam à sua diligência e ciência profissionais, a assunção de obrigação de meios. Pode dizer-se que, em regra, o médico a só isto se obriga, apenas se comprome-te a proporcionar cuidados conforme as “leges artis” e os seus conhecimentos pessoais, somente se vincula a prestar assistência mediante uma série de cui-dados ou tratamentos normalmente exigíveis com o intuito de curar. Mas não assegura, nem se obriga a curar o doente, uma vez que a cura também depende do concurso de outros fatores

independentes da vontade do médico e por ele não controláveis (ex. resistência do doente, capacidade de regeneração do seu organismo, estado anímico, etc.)Sendo assim, o médico erra não quan-do não atinge o resultado da cura ou da atenuação do mal ou do sofrimento do paciente, mas quando não utiliza com diligência, perícia e consideração as técnicas e conhecimentos reconhe-cidos pela ciência médica, para o con-creto caso clínico, que definem, em cada momento, as “leges artis”.Sempre que assim é, trata-se de uma mera obrigação de meios, que não de uma obrigação de resultado, incumbin-do, pois, ao doente o ónus de provar a falta de diligência do médico. Deste modo, se a intervenção médica não produzir o resultado terapêutico esperado, o paciente não poderá, por esta razão, exigir uma compensação pelos danos sofridos. Mas casos há em que o médico está vin-culado a obter um resultado concreto, constituindo exemplo de escola a cirur-gia estética de embelezamento, (mas já não a cirurgia estética reconstrutiva geralmente considerada como exemplo cirúrgico de obrigação de meios), a par da execução das manobras próprias de parto, no campo da odontologia, por exemplo, a simples extração de um dente ou colocação de um implante, e ainda nas áreas da vasectomia e exames laboratoriais.Importa, pois, ponderar a natureza e objetivo do ato médico para casuisti-camente saber se se está perante uma obrigação de meios ou perante uma obrigação de resultado. No caso em apreço, o autor guardou completo silêncio em torno do que ime-diatamente antecedeu a sua entrada, pela primeira vez, na sala da cirurgia, mais concretamente, como surgiu a opção da sua submissão à 1ª interven-ção cirúrgica por iniciativa de quem, de que médico se foi o caso, qual o obje-tivo da operação, que tipo de compro-misso médico, foi assumido se é que tal aconteceu, nomeadamente com algum comprometimento de resultado e qual, se foi informado dos riscos inerentes.

Quem invoca tratamento defeituoso como fundamento de responsabilidade civil contratual tem de provar, além do prejuízo, a desconformidade (objetiva) entre os atos praticados e as “leges artis”, bem como o nexo de causalidade entre defeito e dano”.

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JuriSPrudêNCia - ResumosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201142

Tudo isto relevava particular interesse para tal qualificação, mas o autor no referente a este particular campo, e tempo, limitou-se a alegar esse facto de modo indeterminado, vago e impro-fícuo. Nada mais alegado, e nada mais provado de útil que ajude a qualificar com precisão e de modo categórico a obrigação em causa, resta-nos então ser notório que, por regra, no caso de intervenções cirúrgicas, e muito parti-cularmente nas intervenções à coluna, não se assegura a cura, mas a procura da atenuação do sofrimento do doen-te. Ao médico cirurgião está cometida uma obrigação de meios, não respon-de pela obtenção de um determinado

resultado mas pela omissão ou pela inadequação dos meios utilizados aos fins correspondentes à prestação que se propôs prestar. Estamos, pois, perante uma obrigação de meios. Escreveu-se no Acórdão deste Supremo Tribunal de 28/09/2010: “Nas obriga-ções chamadas de meios não bastará…a prova da não obtenção do resultado previsto com a prestação, para conside-rar provado o não cumprimento. Não basta alegar a morte do doente ou a perda da ação para se considerar em falta o médico que tratou o paciente ou o advogado que patrocinou a causa. É necessário provar que o médico ou ad-vogado não realizaram os atos em que

normalmente se traduziria uma assis-tência ou um patrocínio diligente, de acordo com as normas deontológicas aplicáveis ao exercício da profissão”.Em tal tipo de obrigações terá o credor de identificar e fazer provar a exigibili-dade dos meios ou da diligência (ob-jetivamente) devida. «A presunção de culpa tende, portanto, a confinar-se à mera censurabilidade pessoal do de-vedor», isto é, a presunção reduzir-se-á à culpa em sentido estrito. Portanto, provado pelo credor que o meio exigível “ex contractu ou ex nego-tii” não foi empregue pelo devedor ou que a diligência exigível de acordo com as regras da arte foi omitida, competirá

ao devedor provar que não foi por sua culpa que não utilizou o meio devido, ou omitiu a diligência exigível. Neste sentido, mais restrito, é aplicável às obrigações de meios a presunção de culpa do art. 799º, nº 1, do CC ”. Significa isto que primeiramente tem o pacien-te/lesado de provar o defeito de cum-primento, porque o não cumprimento da obrigação do médico assume, por via de regra, a forma de cumprimento defeituoso, e depois tem ainda de de-monstrar que o médico não praticou todos os atos normalmente tidos por necessários para alcançar a finalidade desejada. “A presunção de culpa do devedor inadimplente estende-se ao cumprimento defeituoso (artº 799º, nº

1). Quem invoca tratamento defeituoso como fundamento de responsabilidade civil contratual tem de provar, além do prejuízo, a desconformidade (objetiva) entre os atos praticados e as “leges artis”, bem como o nexo de causalidade entre defeito e dano”.Feita essa prova, então, funciona a pre-sunção de culpa, que o médico pode ilidir demonstrando que agiu correta-mente, provando que a desconformi-dade não se deveu a culpa sua por ter utilizado as técnicas e regras de arte adequadas ou por não ter podido em-pregar os meios adequados. Em termos gerais, ponto comum à responsabilidade contratual e à res-ponsabilidade extracontratual, ter o médico agido culposamente significa ter o mesmo agido de tal forma que a sua conduta lhe deva ser pessoalmen-te censurada e reprovada, pois, em face das circunstâncias concretas do caso, o médico devia e podia ter atuado de modo diferente. No caso da responsabilidade civil dos médicos, o padrão do bom pai de famí-lia tem como correspondente o padrão de conduta profissional que um médico medianamente competente, prudente e sensato, com os mesmos graus acadé-micos e profissionais, teria tido em cir-cunstâncias semelhantes, naquela data. Em suma, o médico “deve atuar de acor-do com o cuidado, a perícia e os conhe-cimentos compatíveis com os padrões por que se regem os médicos sensatos, razoáveis e competentes do seu tem-po. Mas se porventura ele tem, ou se arroga ter, conhecimentos superiores à média, em qualquer tipo de tratamento, intervenção cirúrgica e riscos inerentes, poderá ser obrigado a redobrados cui-dados, embora nem por isso se possa dizer que ele assumiu a posição de ga-rante de um certo resultado.Face à conclusão de que, seja à luz da responsabilidade civil contratual ou ex-tracontratual, não está demonstrada a culpa dos réus, não se verificam os pres-supostos da obrigação de indemnizar.Face ao exposto, decidiu-se, no STJ, em negar o recurso, mantendo-se a deci-são recorrida.

O padrão de conduta profissional que um médico medianamente competente, prudente e sensato, com os mesmos graus académicos e profissionais, teria tido em circunstâncias semelhantes, naquela data.

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Resumos - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 43

A decisão do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 10 de janeiro de 2012, foi sumariada do seguinte modo: “I - A atividade de conservação e ma-nutenção de elevadores não é qualifi-cável, em si mesma ou por natureza, como atividade perigosa.II - Resulta do Decreto nº 513/70, de 30-10, com as alterações introduzidas pelo Decreto Regulamentar nº 13/80, de 16-05 – Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos –, que as portas de patamar deverão possuir disposi-tivos de encravamento seguros que permitam que todas elas permaneçam permanentemente encravadas com exceção daquela que esteja situada no patamar onde a cabina esteja estacio-nada e que deverão ser munidas de dis-positivos de controlo de encravamento e de fecho de portas de patamar que garantam quer o referido encravamen-to permanente, quer a impossibilidade de início de movimento se todas as portas não estiverem encravadas (cf. arts. 39º, nº 1, e 40º).III - Viola as regras de segurança o facto de a vítima ter tido a possibilidade de proceder à abertura da porta do as-censor num patamar sem que a cabine do ascensor ali estivesse estacionada, caindo na caixa do ascensor, existindo evidente nexo de causalidade adequa-da entre o incumprimento daquelas normas de segurança e o acidente.IV - Estando-se no domínio da res-ponsabilidade civil extracontratual, se daquele acidente, ocorrido em 24-08-2001, resultaram lesões físicas enqua-dráveis (à data) na prática do crime de

ofensas corporais por negligência, p. e p. pelo art. 148º, nº 1, do CP, sendo o prazo de prescrição do procedimento criminal de 5 anos, nos termos daquele preceito e do art. 118º, nº 1, al. c), do CP, tendo a ré sido citada a 03-04-2006, não decorreu o prazo prescricional do direito de indemnização, atendendo ao estatuído no art. 498º, nº 3, do CC, sen-do irrelevante o facto de as consequên-cias das infrações ao Regulamento de Segurança de Elevadores ser de natu-reza contraordenacional (uma coisa é a constatação administrativa dessas infrações e outras as consequências decorrentes para terceiros de aciden-tes provocados por essas infrações).”Neste recurso interposto junto do Tri-bunal do Supremo Tribunal de Justiça discute-se a seguinte questão:- Saber se existem pressupostos que fundamentem a responsabilidade civil (por factos ilícitos), a responsabilidade criminal[3], e se se verifica a prescrição do direito da A (recorrida) por inaplica-ção do prazo (excecional) previsto no nº 3 do artigo 498º.A recorrente argumentou que a legis-lação ao caso aplicável – Decreto-lei nº 110/91, de 18 de março, e Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos, aprovado pelo Decreto nº 513/70, de 30 de outubro, com as alterações intro-duzidas pelo Decreto Regulamentar nº 13/80, de 16 de maio – qualifica como mera contraordenação a violação das regras previstas nesses diplomas e que, por outro lado, não há lugar neste caso a responsabilidade criminal de pessoa coletiva (no caso ela R). Concorda-se com a realidade traduzida

no facto de o artigo 7º do DL 110/91 qualificar como contraordenação a violação de normas de segurança apli-cáveis, nomeadamente, a ascensores e monta-cargas (elétricos ou hidráu-licos). Todavia, não se pode deixar de tomar em consideração que: 1º - O artigo 3º do supracitado diploma legal diz expressamente que “os eleva-dores…deverão ser vigiados, conser-vados e reparados por uma entidade conservadora de elevadores (ECE) que assumirá a responsabilidade civil, soli-dariamente com o proprietário, pelos acidentes causados por deficiente con-servação ou não conformidade com a legislação aplicável”; 2º - Todas as normas de segurança constantes do Regulamento de Segu-rança de Elevadores Elétricos, aprova-do pelo Decreto 513/70, com as alte-rações constantes do Decreto Regu-lamentar nº 13/80, de 16 de maio, são normas indiscutivelmente destinadas à proteção e segurança de interesses alheios cuja violação pode gerar res-ponsabilidade civil por factos ilícitos (artigo 483º do CCivil). 3º - A contraordenação prevista é apli-cável às situações irregulares deteta-das pelas autoridades administrativas. Daqui se concluiu que a atividade de conservação e manutenção de eleva-dores como atividade (em si mesma ou por natureza) não é perigosa. O acidente dos autos ocorreu quando a trabalhadora da corré Santa Casa da Misericórdia de Fafe se dirigiu ao monta-cargas, transportando um car-rinho com lanche dos utentes, preci-pitando-se no fosso do monta-cargas por o mesmo não se encontrar nesse piso e ser ainda assim possível abrir a porta do mesmo. Os factos provados mostram, por ou-tro lado, com toda a evidência que o

responsabilidade contratual- Atividades perigosas – prescrição do direito à indemnização

referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10.1.2012fonte: site do STJ – www.dgsi.pt

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JuriSPrudêNCia - ResumosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201144

acidente sofrido pela trabalhadora da R apenas ocorreu porque, contra todas as regras de segurança, era possível proceder à abertura da porta do as-censor num patamar sem que a cabine do ascensor ali estivesse estacionada. De acordo com as normas mais rele-vantes constantes da legislação ao caso aplicável (Decreto nº 513/70, com as alterações introduzidas pelo Decreto Regulamentar nº 13/80 – Regulamento de Segurança de Elevadores Elétricos (adiante designado apenas por Regula-mento) - as portas de patamar deverão possuir dispositivos de encravamento seguros que permitam que todas elas permaneçam permanentemente en-cravadas com exceção daquela que esteja situada no patamar onde a ca-bine esteja estacionada (artigo 39 nº 1 do Regulamento). Igualmente deverão ser munidas de dispositivos de controlo de encrava-mento e de fecho de portas de patamar (artigo 40º do Regulamento) que ga-rantam quer o referido encravamento permanente (conforme o disposto no nº 1 do artigo 39º) quer a impossibili-dade de início de movimento se todas as portas não estiverem encravadas. No caso em apreço existe evidente nexo de causalidade (adequada) en-tre o incumprimento das (referidas) normas de segurança dos elevadores elétricos e o acidente aqui em apreço não se verificando qualquer elemen-to probatório que permita concluir que da conduta da vitima possa resul-tar interferência (total ou parcial) no desenvolvimento desse processo de causalidade considerado no seu todo, não se demonstrando sequer (como já referimos) que seria intenção da vitima entrar no monta-cargas. Resulta do exposto que, por um lado, e ao contrário do que defende a recor-rente, o acidente apenas ocorre por manifesta violação das normas legais acima referidas, as quais visam a prote-ção e segurança de interesses alheios e que, por outro lado, os danos produ-zidos se enquadram completamente dentro daqueles que essas normas pretendem prevenir.

Numa primeira e definitiva conclusão existe responsabilidade civil da recor-rente e consequente obrigação de in-demnizar, inexistindo quaisquer razões de facto ou de direito que permitam qualquer redução ou limitação de tal responsabilidade. Ficou, por outro lado, demonstrado que a R. Misericórdia de Fafe outor-gou o documento, mediante o qual acordou em, além do mais, proceder à instalação, conservação e assistência técnica ao ascensor monta-cargas exis-tente no lar daquela em Cepães, Fafe, e que em cumprimento do referido, instalou o referido monta-cargas em 01-09-98, assumindo que a conserva-ção do ascensor referido seria feita uma vez por mês, compreendendo essa obrigação uma inspeção e a realização de trabalhos e reparações necessárias à segurança e continuidade do seu funcionamento, conforme art. 108° do Decreto nº 513/70, de 30/10, do regu-lamento de segurança dos elevadores. Nesta qualidade, e em segunda e de-finitiva conclusão, é a Misericórdia de Fafe solidariamente responsável (com a recorrente BB) pelos danos causados pelo acidente de acordo com o dispos-to no artigo 3º do Decreto-lei nº 110/91 (tal com o seria na vigência do Decreto nº 513/70 atenta a redação do artigo 2º deste diploma). Indo, agora e por ultimo, à suscitada questão da prescrição do direito da A (recorrida). Estamos no domínio da responsabi-lidade civil extracontratual (por fac-tos ilícitos) e o acidente ocorreu em 24/8/2001, tendo a BB sido citada em 3/4/2006 (para além do prazo de três anos previsto no nº 2 do artigo 498º CC, mas dentro do prazo previsto no nº 3 da mesma disposição legal, se ao caso aplicável). Os factos ocorridos, dos quais resulta-ram as lesões sofridas pela trabalha-dora da R Misericórdia de Fafe, enqua-dram a prática do crime de ofensas corporais por negligência, p. e p. pelo artigo 148º, nº 1 do Código Penal, sen-do o prazo de prescrição do procedi-mento criminal de 5 anos, nos termos

dos artigos 148º, nº 1, 118º, nº 1, alínea c), do Código Penal. Não discordando deste entendimen-to, afirma a recorrente que o prazo decorrente do artigo 498º, nº 3, CC se lhe não aplica porque, por um lado, a lei tipíca como mera contraordenação a violação das normas donde se pre-tende decorra a sua responsabilidade e, por outro lado, não pode enquanto pessoa coletiva ser criminalmente res-ponsável. O STJ considera destituída de qual-quer fundamento a argumentação que se defende nas alegações sobre as consequências da natureza contra-ordenacional das infrações ao Regu-lamento aqui em causa, uma vez que, repetimos, uma coisa é a constatação administrativa dessas infrações e ou-tra as consequências decorrentes para terceiros de acidentes provocados por essas infrações. Totalmente destituída de fundamento é igualmente o argumento relativo à inaplicabilidade do prazo do nº 3 do artigo 498º CC com fundamento no facto de a R (recorrente) ser uma pes-soa coletiva. Por outro lado, é elementar, e como tal indiscutido na doutrina e na jurispru-dência, que a aplicação do prazo alon-gado da prescrição previsto na disposi-ção legal supracitada depende apenas de o facto ilícito constituir crime (para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo). Em conclusão, a R (recorrente) “BB, Ele-vadores, Lda.”, foi citada no dia 3-04-2006, em data anterior ao termo do prazo de prescrição (de 5 anos) (fls. 40 e 43), daí resultando que não decorreu o prazo prescricional. Face ao exposto, decidiu-se, no STJ, em conceder (parcialmente) a revista, mantendo-se o acórdão recorrido na parte e nos termos em que no seg-mento decisório condena a R BB, Ele-vadores, Lda. a pagar à A AA Portugal a quantia de € 46 668,46, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a ci-tação até integral pagamento mas con-denando-se com ela solidariamente a R Santa Casa da Misericórdia de Fafe.

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aSSuNto: Prazo para a propositura da ação de impugnação de paternidade – caducidade do direitoreferências: Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17.1.2012fonte: site do TRC – www.dgsi.pt

Sumário:1. Não é inconstitucional o regime cons-

tante da alínea a) do nº 1 do artigo 1842º do Código Civil que fixa um prazo para a propositura da ação de impugnação de paternidade.

2. Assim, decorrido o prazo previsto naquele normativo, ocorre a caduci-dade do direito de propor a ação com vista ao reconhecimento do direito de impugnar a paternidade presumida.

acordam no tribunal da relação de Coimbra

A..., divorciado, residente na ..., propôs a presente ação ordinária de impugnação de paternidade, contra B..., divorciada e C..., menor, solteira, residentes na mesma morada, pedindo que se declare que a menor não é filha do Autor e que se ordene a retificação do seu registo de nascimento em conformidade no que diz respeito à paternidade e avoenga paterna.

Alega para tal que o Autor e a pri-meira Ré casaram um com o outro em 01/11/1983 e se divorciaram em 21/09/2001 e que a segunda Ré nasceu em 17/01/1995, mais constando como filha do Autor na certidão de nascimento. Alega ainda que a 2.ª Ré não nasceu do relacionamento sexual do Autor com a 1.ª Ré, que não manteve relações sexuais com a 1.ª Ré dentro dos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o nasci-mento da 2.ª Ré, recusando-se a Ré a

manter relações sexuais com o Autor, as quais, durante a vigência do casamen-to, ocorriam só amiúde, já que a 1.ª Ré mantinha relacionamento amoroso e sexual com indivíduo de nome E.... Mais alega que, confrontada a Autora com a situação, saiu de casa no início de 2001. Invoca também que é infértil, não poden-do gerar filhos.

Citadas, a Ré B... apresentou contesta-ção em seu nome e da menor invocando a caducidade da ação, já que a lei prevê, para o marido da mãe, o prazo de dois anos contados desde a data em que teve conhecimento da não paternidade, o que, segundo a petição inicial, ocorreu desde logo antes do nascimento, já que o Autor alega não ter tido relações sexuais com a Ré no período legal de conceção, bem como ainda quando confrontou a Ré com os factos, segundo a sua versão, em 2001, dizendo ainda que o Autor conhecia a sua infertilidade até antes do nascimento da Ré, invocando ainda o Ac. 589/2007 do Tribunal Constitucional em abono do seu argumento.

O processo foi com vista ao Ministério Público a fim de se pronunciar sobre o curador a indicar à menor, tendo o Mi-nistério Público indicado D..., o qual foi citado, bem como o Ministério Público.

Citado o Ministério Público, deduziu oposição aceitando os factos documen-tados (nascimento, casamento e divórcio) e impugnando os demais.

Com dispensa da audiência prelimi-nar, foi proferido despacho saneador, seleccionando-se a matéria assente e a que, estando controvertida, interessava à decisão da causa, de que reclamou o autor, por deficiência da matéria quesi-tada, reclamação que foi indeferida, cf. despacho de fl.s 132, relegando-se para

a decisão final a exceção de caducidade invocada.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 239 a 241, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

No seguimento do que foi proferida a sentença de fl.s 247 a 252, na qual se decidiu o seguinte:

“Por todo o exposto, julgando a ação improcedente, por verificação da excepção de caducidade, absolvo as Rés do pedido.

Custas pelo Autor.”. Inconformado com a mesma, in-

terpôs recurso o autor, recurso, esse, admitido como de apelação, com subi-da imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cf. despacho de fl.s 265), tendo sido o efeito do mesmo alterado para suspensivo, finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. O Ora Recorrente, ao propor a presente

ação pretende fazer valer um direito à verdade biológica, integrante do seu direito à identidade pessoal, que por sua vez integra todo o conjunto de direitos relativos à sua personalidade;

2. Tal direito encontra protecção constitu-cional nos artigos 25º, nº 1, da Consti-tuição da Republica Portuguesa;

3. E mais concretamente no artigo 26º nº 1, da Constituição da Republica Portuguesa;

4. Por outro lado, o Autor, ao pretender ilidir a presunção de paternidade, quer ver estabelecido o seu verdadeiro

iMPuGNaÇÃo de PaterNidade- Caducidade – inconstitucionalidade

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JuriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201146

“tronco familiar”, a sua real progénie; 5. Excluindo do seu círculo familiar ligado

por laços de sangue, quem na verdade a ele não pertence, fazendo assim valer o seu direito à constituição de família, no seu sentido negativo (de exclusão de quem não é família) inscri-to no artigo 36º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa;

6. E, assim sendo, estando estabelecido por via de prova pericial, que o Au-tor não é o progenitor da menor, a douta decisão, ao seguir a injunção normativa inscrita no artigo 1842º, nº 1, alínea a), do Código Civil, aplicando-a ao caso concreto, fê-lo, violando os preceitos constitucionais acima mencionados;

7. Devendo, assim, ser substituída por outra que declare inconstitucional o artigo 1842º, nº 1, alínea a), do Código Civil, quer na redação anterior, quer na redação da Lei 14/2000, de 1 de Abril;

8. Declarando que o direito a propor a presente ação não caducou pelo de-curso dos prazos ali referidos.

9. Dando provimento ao peticionado na ação.

JuStiÇa! Não foram apresentadas contra-

-alegações. Dispensados os vistos legais, há que

decidir. Tendo em linha de conta que, nos

termos do preceituado nos artigos 684, nº 3, e 690, nº 1, ambos do CPC, as con-clusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir: A. Inconstitucionalidade do artigo 1842º,

nº 1, al. a), do Código Civil, quer na redação anterior, quer na que lhe foi dada pela Lei nº 14/2009, de 1/4, e inerente caducidade do direito a que se arroga o autor e;

B. Se a presente ação deve proceder. É a seguinte a matéria de facto dada

por provada na decisão recorrida: A) O Autor e a 1.ª Ré casaram um com o

outro em 12.11.1983 (alínea A) dos Factos Assentes);

B) A 2.ª Ré nasceu em 17.01.1995 (alínea B) dos Factos Assentes);

C) Na certidão de nascimento da 2.ª Ré consta que esta é filha do Autor e da Ré (alínea C) dos Factos Assentes);

D) O Autor e a 1.ª Ré divorciaram-se em 21.09.01 (alínea D) dos Factos Assentes);

E) O Autor não manteve relações sexuais com a 1.ª Ré dentro dos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precederam o nascimento da 2.ª Ré (art. 1º da Base Instrutória);

F) – O Autor foi observado na consulta externa de Urologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra em 12/11/1990, por infertilidade, tendo já realizado anteriormente espermo-grama compatível com azoosperma e doseamento das hormonas sexuais, apresentando testículos hipotróficos, tendo sido proposto ao Autor que op-tasse pela adopção em data posterior a tal observação e anterior à referida em B) (resposta ao art. 10º da Base Instrutória). A. Inconstitucionalidade do artigo

1842º, nº 1, alínea a), do Código Civil, quer na redação anterior, quer na que lhe foi dada pela Lei 14/2009, de 1/4, e inerente caducidade do direito a que se arroga o autor.

Considerou-se na sentença em re-curso que, aquando da interposição da presente ação, já se encontrava caduco o direito que se pretendia exercer, por decorridos mais de três anos contados desde a data em que o autor sabia que não era o pai da menor e a respetiva pro-positura e que o artigo 1842º, nº 1, alínea a), do CC não sofre de inconstitucionali-dade, por se considerar prevalecente o direito à identidade pessoal da pretensa filha, ainda que não em conformidade com a verdade biológica, do que esta sobre aquela. A que acresce que a menor, querendo, estará em tempo, nos termos da alínea c) do mesmo preceito, para impugnar a presumida paternidade.

Como resulta das suas alegações e conclusões de recurso, o autor, aqui re-corrente, defende que o referido preceito do Código Civil padece de inconstitu-cionalidade ao fixar um prazo para ser

intentada por si a ação de impugnação de paternidade, com vista a afastar a paternidade presumida resultante de ser o marido da mãe da menor.

Como resulta dos factos provados (al. B), a menor C ... nasceu em 17 de Janeiro de 1995 e encontra-se registada como filha da 1.ª ré e do autor – cf. alínea C).

Por outro lado, como resulta de fl.s 8 dos autos, a presente ação deu entrada em juízo no dia 25 de Setembro de 2008.

Nesta data, como resultava da reda-ção que então era dada ao artigo 1842º, nº 1, al. a), do Código Civil, a ação de impugnação de paternidade podia ser intentada, pelo marido, no prazo de dois anos contados desde que teve conheci-mento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade.

Já no decurso da ação, através do artigo 1º da Lei 14/2009, de 1/4, o artigo 1842º, nº 1, al. a), do CC passou a ter a seguinte redação:

“1 – A ação de impugnação de pater-nidade pode ser intentada:

a) Pelo marido, no prazo de três anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade;”.

Ou seja, manteve-se redação igual à anterior, exceto no que respeita ao prazo, que foi alargado de dois para três anos.

Nos termos do artigo 2º desta Lei, a mesma entrou em vigor em 2 de Abril de 2009, aplicando-se aos processos pendentes, como resulta, expressamente, do seu artigo 3º.

Por outro lado, como resulta da factualidade provada e constante dos respectivos itens E) e F), o autor não manteve relações sexuais com a mãe da menor dentro dos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precede-ram o nascimento da menor e já havia sido observado na Consulta Externa de Urologia dos HUC, em 12/11/1990, por infertilidade, tendo já realizado anterior-mente espermograma compatível com azoosperma e doseamento das hormo-nas sexuais, tendo-lhe sido proposto que optasse pela adoção em data posterior a tal observação e anterior à do nascimento da C ....

Daqui resulta, pois, ter de se concluir

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JuriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 47

que o autor, ainda antes do nascimento desta, já estava de posse de todos os elementos que lhe permitiam saber que esta não era sua filha biológica.

Tinha conhecimento de que por razões endógenas não poderia ser o pai da C ..., logo que a sua mulher apresentou sinais de gravidez. Logo aí teve efetivo conhecimento de que a mesma não era fruto da prática de relações sexuais havi-das entre si e a mãe da criança, que inexis-tiram no período legal da conceção, para além do problema da infertilidade de que era portador, como resulta das referidas alíneas E) e F), dos factos provados.

Ora, atento a que a C ... nasceu em 17 de Janeiro de 1995 e a presente ação deu entrada em juízo em 25 de Setembro de 2008, como acima já assinalado, é indubitável que, aquando da propositura da presente ação, já tinham decorrido mais de três anos contados desde a data em que o autor teve conhecimento de que não era o pai da C ..., pelo que, efetivamente, já tinha decorrido o prazo de três anos referido na alínea a) do nº 1 do artigo 1842º CC, na redação que lhe foi dada pelo artigo 1º da referida Lei 14/2009, (bem como, claro está, dos dois anos mencionados em tal preceito, na an-terior redação), pelo que já o direito que pretendia exercer se encontrava caduco, nos termos expostos.

Assim, assente que se verifica caduci-dade de exercício do pretendido direito, pelo decurso do referido prazo de três anos, importa averiguar se a fixação deste prazo para a propositura da ação de impugnação de paternidade pelo marido da mãe da menor enferma de inconstitu-cionalidade, com o fundamento em que o mesmo possa estabelecer um limite desproporcional, irrazoável e/ou inade-quado tendo em vista o direito (quer do pretenso pai em afastar tal presumida paternidade, quer do filho em que se fixe a sua real paternidade, tradutora da verdade biológica) que se pretende exercer e que se prende com a fixação da paternidade biológica, no fundo, na salvaguarda do direito fundamental ao conhecimento da paternidade biológi-ca e ao estabelecimento do respetivo vínculo jurídico (que não são a mesma

coisa, cf. João Loureiro, in “Filho (s) de um gâmeta menor? Procriação medicamen-te assistida heteróloga”, in Revista “Lex Medicae”, ano 3º (2006), nº 6, pág. 26 e seg.s, e Rafael Vale e Reis, in “O direito ao conhecimento das origens genéticas”, pág. 108 e 109 – citados no Acórdão do Tribunal Constitucional, nº 401/2001, de 22/09/2011) e que cabem no âmbito de proteção quer do direito fundamental à identidade pessoal, consagrado no artigo 26º, nº 1, da CRP, quer de constituir família, plasmado no artigo 36º, nº 1 da mesma CRP.

No fundo trata-se de estabelecer a identidade pessoal, a qual se traduz no conjunto de atributos e características que permitem individualizar cada pessoa, que constituem o “eu” de cada um de nós, a “vivência pessoal”, a que se referem Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Consti-tuição Portuguesa Anotada”, Tomo I, pág. 609, 2.ª Edição, Coimbra Editora.

E em que assume particular relevo a identificação genética, a identificação física, o nome e a imagem mas também o interesse em cuidar da verdade bio-gráfica e da relação do indivíduo com a sociedade ao longo do tempo.

Ou, como o referem Gomes Cano-tilho e Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª Edi-ção revista, Vol. I, pág. 462 “… o direito à identidade pessoal, tal como está consa-grado no artigo 26º, nº 1, da Constituição, abrange, não apenas o direito ao nome, mas também o direito à historicidade pessoal, enquanto conhecimento da identidade dos progenitores, e poderá fundamentar, por si, um direito à investi-gação da paternidade e da maternidade.”.

No fundo, tudo se reconduz à ques-tão de que “saber quem sou exige saber de onde venho”, como refere Guilherme de Oliveira, in “Caducidade das acções de investigação”, Lex Familiae, 2004, pág. 8.

Toda a problemática da fixação e pro-cura da verdadeira paternidade biológica se prende com o direito constitucional-mente garantido que confere “o direito à identidade pessoal”- artigo 26º, nº 1, da CRP e do direito de constituir família em condições de plena igualdade – artigo 36º, nº 1, da CRP, os quais não podem ser

restringidos, como resulta do artigo 18º, nº 2 da Lei Fundamental.

No entanto, como acima já aflorado, importa ver se a fixação do prazo de três anos para que possa ser impugnada a pa-ternidade, por parte do marido, viola tais direitos constitucionalmente garantidos.

Como é sabido, o Tribunal Cons-titucional, através do seu Acórdão nº 23/2006, de 10 de Janeiro de 2006, in DR, I – A, nº 28, de 8 de Fevereiro de 2006, de-clarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 1817º, nº 1, do CC, na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do in-vestigante, por violação das disposições conjugadas dos artigos 16º, nº 1, 36º, nº 1 e 18º, nº 2 da CRP.

Na sequência de tal Aresto, em algumas decisões dos nossos Tribunais Superiores, passou a defender-se que ao caso previsto no artigo 1842º CC se deveria aplicar a mesma solução, uma vez que, se o filho pode impugnar a paterni-dade, sem limitação de prazo, também o presumido pai o poderá fazer, sob pena de discriminação de um dos elos da relação jurídico-filial, defendendo-se que o respeito pela verdade biológica sugere a imprescritibilidade não só do direito de investigar como do de impug-nar e tratando-se, tanto num caso como no outro, de estabelecer a paternidade biológica, aderindo-se, para tal, em traços gerais, à argumentação expendida no referido Acórdão 23/2006, do Tribunal Constitucional – neste sentido podem ver-se Acórdãos do STJ, de 31/01/2007, Processo 06A4303 e de 25/03/2010, Processo 144/07.8TBFVN.C1.S1, ambos disponíveis in http://www.dgsi.pt/jstj e o de 07/07/2009, in CJ, STJ, Tomo II, 2009, a pág. 168 e seg.s.

Em consequência do que, conside-rando que o prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 1842º do CC, é limitador, a todo o tempo, pelo presumido progeni-tor, da possibilidade de impugnar a sua paternidade, é inconstitucional, com o fundamento em que se trata de uma sal-vaguarda desproporcional dos valores de certeza e de segurança jurídica que visam

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evitar a manutenção de uma situação de pendência ou dúvida acerca da filiação, por períodos longos, face à defesa do direito à identidade constitucionalmente garantido, se defendeu a imprescritibi-lidade da possibilidade do exercício do direito conferido no preceito ora referido.

Por seu turno, a jurisprudência do Tri-bunal Constitucional tem sido unânime em considerar que a situação de impug-nação da paternidade presumida por parte do marido não tem equivalência com a de investigação de paternidade, tal como já decidido no Acórdão nº 589/2007, de 28 de Novembro de 2007, in DR, II.ª Série, nº 13, de 18 de Janeiro de 2008.

E tem-no feito com base no argu-mento de que, no caso de impugnação da paternidade pelo marido, “não estará em causa um direito à identidade pessoal entendida no sentido… de direito ao conhecimento da identidade dos pro-genitores (que tem apenas relevo para a ação de investigação de paternidade), mas o direito ao desenvolvimento da per-sonalidade na dimensão de um direito de autoconformação da identidade, que não poderá deixar de ser reconhecido em relação ao pretenso pai, quando este tenha motivos para duvidar da sua paternidade biológica e pretenda escla-recer a sua posição social e jurídica quer em relação ao filho presumido, quer em relação ao agregado familiar, quer ainda ao meio social em que se insere.

Há, no entanto, inevitavelmente uma diferença de grau entre a investigação de paternidade, em que patentemente está em causa o direito à identidade pessoal do investigante (e relativamente ao qual a imposição de um limite temporal pode implicar a violação do direito ao conheci-mento da identidade dos progenitores), e a impugnação de paternidade, em que o que releva é a definição do estatuto jurídico do investigante em relação a um vínculo de filiação que lhe é atribuído por presunção legal” – como se refere no Acórdão ora, por último, mencionado.

Contrapõem os defensores da tese da imprescritibilidade que, também, no caso de impugnação de paternidade é, sempre, o direito à identidade da

filiação, o direito a ter um pai, que está em causa, embora repartido pelo direito de o pretenso pai ilidir a presunção que sobre ele incide, mantendo-se válidas as razões, por contraponto à segurança das relações familiares, que consagram a prevalência da correspondência da paternidade com a realidade biológica, para além de que, se ao filho é concedi-da a possibilidade de, sem limitação de prazo, impugnar ou averiguar a paterni-dade, deve ser dada a mesma hipótese ao pretenso progenitor, sob pena de discriminação. Como em muitas das questões e matérias que, hoje em dia, se nos colocam, não há verdades absolutas e não podemos esquecer que estamos perante valores, todos eles, relevantes: busca da realidade biológica e direito à constituição do respectivo vínculo, por contraposição aos valores da certeza e segurança jurídicas, das relações fami-liares e da vida em sociedade.

Pelo que, com o devido respeito por opinião em contrário, nos parece que a solução se deve encontrar na fixação de um prazo que se afigure como razoável e proporcional a fim de não se limitar a possibilidade de impugnação da pater-nidade mas sem que daí derive a possi-bilidade de o ser a todo o tempo, como ao diante melhor tentaremos explicitar, no seguimento do que tem vindo a ser a jurisprudência firmada no Tribunal Cons-titucional acerca desta questão.

Efetivamente, na senda do Aresto 589/2007, acima referido, este Tribunal, reiterou a mesma decisão no Acórdão 593/2009 e posteriormente no 179/10, de 12 de Maio de 2010, ambos disponí-veis no sítio do Tribunal Constitucional, e ainda tendo por referência o prazo de dois anos previstos na pretérita redação do artigo 1842º, nº 1, al. a), do CC.

Nestes dois Acórdãos decidiu o Tribu-nal Constitucional pela conformidade à Constituição do referido artigo 1842º, nº 1, al. a), por o prazo nele fixado não ser li-mitador da possibilidade de impugnação da paternidade, naquele mesmo prazo.

Este Tribunal voltou a apreciar a questão em apreço, no seu Acórdão nº 446/2010, de 23 de Novembro de 2010, disponível no mesmo sítio dos

anteriores, agora, versando já sobre o referido artigo, na redação que lhe foi dada pela Lei 14/2009, de 1/4, e, de novo, se pronunciou no sentido da sua constitucionalidade.

Também neste Aresto se buscaram as razões já explanadas no 589/2007, designadamente a já acima referida di-ferença entre as situações consoante se trate de impugnação ou averiguação de paternidade, para além de que, no caso do direito de impugnação da paternida-de, este se encontra apenas na disponi-bilidade direta dos membros da família, no sentido de que só o marido, a mãe e o filho se encontram autonomamente legitimados a intentar a ação, podendo a discrepância entre a paternidade biológi-ca e a presumida manter-se sempre que nenhum dos legitimados a impugná-la o faça, como reflexo da proteção da família constituída, quer interna quer externamente.

No que se refere às posições sub-jectivas de cada um dos interessados, salienta-se que na ação de investigação de paternidade o eventual interesse do investigado em não assumir um vínculo de paternidade correspondente à realidade biológica não é merecedor de tutela, não devendo ser reconhecida “uma faculdade de o pai biológico se eximir à responsabilidade jurídica cor-respondente”, referindo-se, em abono de tal conclusão, a opinião expressa por Guilherme de Oliveira, in “Caducidade das ações de investigação”, obra acima já citada.

Ao invés, o interesse daquele que é tido como filho em manter esse estatuto não pode ser inteiramente desconside-rado, sobretudo quando tal vínculo se encontra enraizado nas relações fami-liares e sociais do agregado familiar em que se insere.

Por último, considera-se como re-levante o facto de o início do prazo da caducidade se contar a partir do efetivo conhecimento por parte do marido da mãe dos factos indiciadores da sua não paternidade.

Ali se referindo o seguinte: “Este regime autoriza a atribuir valor

significante à inércia do pai presumido,

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em sentido abdicativo do direito de a impugnar, ou, no mínimo, a dirigir-lhe uma imputação de auto-responsabili-dade. Com a fixação de um termo inicial subjetivo (logo, acolhedor das variáveis casuísticas) e a não consagração de um prazo máximo objetivo fica garantido, o que, pelo menos neste âmbito, é es-sencial: a concessão de uma oportuni-dade real ao pretenso pai de averiguar, pelos trâmites processuais adequados, se o vínculo corresponde à realidade biológica, e de se libertar dele, em caso negativo. Se lhe chegam ao conheci-mento (em qualquer momento) dados que lhe permitiriam duvidar seriamente da existência de um vínculo natural e ele nada faz, em prazo legal que só decorre a partir desse momento e possa ser tido de duração suficientemente adequada, “sibi imputet”, extinguindo-se por força desse comportamento conscientemente omissivo (não pelo decurso de um prazo objetivo), o direito de impugnar a presun-ção de paternidade.”.

Do que se conclui pela conformidade do regime plasmado na alínea a) do nº 1 do artigo 1842º do CC, com a Consti-tuição (referindo-se, inclusive, ser esta, também, a jurisprudência do TEDH, que se especifica).

De igual modo, se considera que o prazo concretamente nele fixado, “três anos contados desde que teve conhe-cimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade”, é razoável e adequado à ponderação dos

interesses em causa e que permitirá avaliar todos os fatores que podem condicionar a decisão do marido da mãe em impugnar a presumida paternidade, concluindo-se que “… o prazo de três anos é suficiente para garantir a viabili-dade prática do exercício do direito de impugnar a paternidade, não o impedin-do ou dificultando gravemente.”.

Pelo que, também, quanto à duração do prazo de caducidade estabelecido, a norma do artigo 1842º, nº 1, al. a), do CC não padece de inconstitucionalidade.

No mesmo sentido, se voltou a pro-nunciar o Tribunal Constitucional, nos Acórdãos 39/2011, de 25 de Janeiro de 2011, 449/2011, de 11 de Outubro de 2011, e 634/2011, de 20 de Dezembro de 2011, todos, como os anteriores, disponíveis no sítio do TC: http://www.tribunalconstitucional.pt/tcacordaos.

De resto, acrescente-se que mesmo para a hipótese de instauração de ação de investigação de paternidade, pelo filho, nos termos do nº 1 do artigo 1817º, o Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão nº 401/2011, de 22 de Setembro de 2011, disponível no mesmo sítio dos demais, decidiu-se pela constitucionali-dade do prazo de 10 anos para a propo-situra de tal ação, contado da maioridade ou emancipação do investigante, o que revela que neste Tribunal não se consi-dera como imprescritível o exercício do direito de investigação de paternidade, por se reputar que este prazo é suficiente para assegurar que não opera qualquer

prazo de caducidade para a instauração, pelo filho, de uma ação desta natureza.

Ora, volvendo, ao caso em apreço, como resulta das alíneas B) a F), e acima já dito, o ora autor, logo que soube que a sua esposa estava grávida, estava de posse de todos os elementos para saber que não era o pai da criança.

A partir do nascimento desta, dispôs do prazo de três anos para impugnar a paternidade presumida, o que não fez, só o vindo a fazer quando a C ... já tinha 13 anos, pelo que, tal como decidido em 1.ª instância, se verifica a caducidade do direito de propor a presente ação com vista ao reconhecimento do direito de impugnar a paternidade presumida, relativamente à menor em causa.

Poderia ter exercido tal direito no prazo de três anos, o qual, como vimos, se mostra suficiente, para que o pudesse exercer.

Consequentemente, improcede esta questão do presente recurso.

Pelo que fica prejudicado o conheci-mento da segunda questão que nos era colocada com o presente recurso.

Nestes termos se decide: Julgar improcedente o presente re-

curso de apelação e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida.

Custas pelo apelante. Os Desembargadores,Arlindo Oliveira (Relator)Emídio Francisco SantosAntónio Beça Pereira

aNotaÇÃo

Questão decidenda:O Tribunal da Relação de Coimbra, no

dia 17 de Janeiro de 2012, procurou dar solução definitiva às seguintes questões:

1- Inconstitucionalidade do artigo 1842º, nº 1, al. a), do Código Civil, quer na redação anterior, quer na que lhe foi dada pela Lei nº 14/2009, de 1/4, e inerente caducidade do direito a que se arroga o autor e;

2- Se a presente ação deve pro-ceder.

Solução jurídica:

No que se refere à 1ª. questão colocada neste recurso, considerou-se na sentença recorrida que aquando da interposição da ação já se encontrava caduco o direito que se pretendia exercer, por decorridos mais de três anos contados desde a data em que o autor sabia que não era o pai da menor e a respectiva propositura e que o artigo 1842º, nº 1, alínea a), do CC não sofre de inconstitucionalidade, por se considerar prevalecente o direi-

to à identidade pessoal da pretensa filha, ainda que não em conformidade com a verdade biológica, do que esta sobre aquela. A que acresce que a menor, querendo, estará em tempo, nos termos da alínea c) do mesmo preceito, para impugnar a presumida paternidade.

O autor, aqui recorrente, defende que o referido preceito do Código Civil padece de inconstitucionalidade ao fixar um prazo para ser intentada por si a ação de impugnação de paternida-de, com vista a afastar a paternidade

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presumida resultante de ser o marido da mãe da menor.

A pessoa em causa nasceu em 17 de Janeiro de 1995 e a ação deu entra-da em juízo no dia 25 de Setembro de 2008. Nessa data, como resultava da redação que então era dada ao artigo 1842º, nº 1, al. a), do Código Civil, a ação de impugnação de paternidade podia ser intentada, pelo marido, no prazo de dois anos contados desde que teve conhecimento de circuns-tâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade.

Já no decurso da ação, através do artigo 1º da Lei 14/2009, de 1/4, o artigo 1842º, nº 1, al. a), do CC passou a ter a seguinte redação:

“1 – A ação de impugnação de paternidade pode ser intentada:

a) Pelo marido, no prazo de três anos contados desde que teve conhe-cimento de circunstâncias de que pos-sa concluir-se a sua não paternidade;”.

Ou seja, manteve-se redação igual à anterior, exceto no que respeita ao prazo, que foi alargado de dois para três anos.

Nos termos do artigo 2º desta Lei, a mesma entrou em vigor em 2 de Abril de 2009, aplicando-se aos processos pendentes, como resulta, expressa-mente, do seu artigo 3º.

Por outro lado, como resulta da factualidade provada e constante dos respectivos itens, o autor não mante-ve relações sexuais com a mãe da me-nor dentro dos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precederam o nascimento da menor e já havia sido observado na Consulta Externa de Urologia dos HUC, em 12/11/1990, por infertilidade, tendo já realizado ante-riormente espermograma compatível com azoosperma e doseamento das hormonas sexuais, tendo-lhe sido proposto que optasse pela adoção em data posterior a tal observação e anterior à do nascimento da C ....

Daqui resulta pois, ter de se con-cluir que o autor ainda antes do nas-cimento desta, já estava de posse de

todos os elementos que lhe permitiam saber que esta não era sua filha bio-lógica. Tinha conhecimento de que por razões endógenas não poderia ser o pai da C ... logo que a sua mulher apresentou sinais de gravidez. Logo aí teve efetivo conhecimento de que a mesma não era fruto da prática de relações sexuais havidas entre si e a mãe da criança, que inexistiram no período legal da conceção, para além do problema da infertilidade de que era portador.

Ora, atento a que a C ... nasceu em 17 de Janeiro de 1995 e a presente ação deu entrada em juízo em 25 de Setembro de 2008, como acima já as-sinalado, é indubitável que, aquando da propositura da presente ação já tinham decorrido mais de três anos contados desde a data em que o autor teve conhecimento de que não era o pai da C ..., pelo que, efetivamente, já tinha decorrido o prazo de três anos referido na alínea a) do nº 1 do artigo 1842º CC, na redação que lhe foi dada pelo artigo 1º da referida Lei 14/2009, (bem como, claro está, dos dois anos mencionados em tal preceito, na an-terior redação), pelo que, já o direito que pretendia exercer se encontrava caduco, nos termos expostos.

Importa agora averiguar se a fixa-ção deste prazo para a propositura da ação de impugnação de paternidade pelo marido da mãe da menor enfer-ma de inconstitucionalidade, com o fundamento em que o mesmo possa estabelecer um limite desproporcio-nal, irrazoável e/ou inadequado tendo em vista o direito (quer do pretenso pai em afastar tal presumida pater-nidade, quer do filho em que se fixe a sua real paternidade, tradutora da verdade biológica) que se pretende exercer e que se prende com a fixação da paternidade biológica, no fundo, na salvaguarda do direito fundamental ao conhecimento da paternidade biológica e ao estabelecimento do respectivo vínculo jurídico.

Como referem Gomes Canotilho

e Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª Edição revista, Vol. I, pág. 462 “… o direito à identidade pessoal, tal como está consagrado no artigo 26º, nº 1 da Constituição, abrange não apenas o direito ao nome, mas também o direi-to à historicidade pessoal, enquanto conhecimento da identidade dos progenitores, e poderá fundamentar, por si, um direito à investigação da paternidade e da maternidade.”.

Toda a problemática da fixação e procura da verdadeira paternidade biológica se prende com o direito constitucionalmente garantido que confere “o direito à identidade pesso-al”- artigo 26º, nº 1, da CRP e do direito de constituir família em condições de plena igualdade – artigo 36º, nº 1, da CRP, os quais não podem ser restringi-dos, como resulta do artigo 18º, nº 2, da Lei Fundamental.

O Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão nº 23/2006, de 10 de Janeiro de 2006, in DR, I – A, nº 28, de 8 de Fevereiro de 2006, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 1817º, nº 1 do CC, na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maiori-dade do investigante, por violação das disposições conjugadas dos artigos 16º, nº 1, 36º, nº 1 e 18º, nº 2 da CRP.

Na sequência de tal Aresto, em al-gumas decisões dos nossos Tribunais Superiores, passou a defender-se que ao caso previsto no artigo 1842º CC se deveria aplicar a mesma solução, uma vez que se o filho pode impugnar a paternidade, sem limitação de prazo, também o presumido pai o poderá fazer, sob pena de discriminação de um dos elos da relação jurídico-filial, defendendo-se que o respeito pela verdade biológica sugere a impres-critibilidade não só do direito de investigar como do de impugnar e tratando-se, tanto num caso como no outro, de estabelecer a paternidade

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biológica, aderindo-se, para tal, em traços gerais, à argumentação expen-dida no referido Acórdão 23/2006, do Tribunal Constitucional.

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem sido unânime em considerar que a situação de impugnação da paternidade presu-mida por parte do marido, não tem equivalência com a de investigação de paternidade, tal como já decidido no Acórdão nº 589/2007, de 28 de Novembro de 2007, in DR, II.ª Série, nº 13, de 18 de Janeiro de 2008. E tem-no feito com base no argumento de que no caso de impugnação da paternidade pelo marido “não estará em causa um direito à identidade pessoal entendida no sentido … de direito ao conhecimento da identida-de dos progenitores (que tem apenas relevo para a ação de investigação de paternidade), mas o direito ao desenvolvimento da personalidade na dimensão de um direito de auto-conformação da identidade, que não poderá deixar de ser reconhecido em relação ao pretenso pai, quando este tenha motivos para duvidar da sua paternidade biológica e pretenda es-clarecer a sua posição social e jurídica quer em relação ao filho presumido, quer em relação ao agregado familiar, quer ainda ao meio social em que se insere.

Há, no entanto, inevitavelmente uma diferença de grau entre a in-vestigação de paternidade, em que patentemente está em causa o direito à identidade pessoal do investigante (e relativamente ao qual a imposição de um limite temporal pode implicar a violação do direito ao conhecimen-to da identidade dos progenitores), e a impugnação de paternidade, em que o que releva é a definição do estatuto jurídico do investigante em relação a um vínculo de filiação que lhe é atribuído por presunção legal” – como se refere no Acórdão ora, por último, mencionado.

Contrapõem os defensores da

tese da imprescritibilidade que, também, no caso de impugnação de paternidade é, sempre, o direito à identidade da filiação, o direito a ter um pai, que está em causa, embora repartido pelo direito de o pretenso pai ilidir a presunção que sobre ele in-cide, mantendo-se válidas as razões, por contraponto à segurança das relações familiares, que consagram a prevalência da correspondência da paternidade com a realidade bio-lógica, para além de que, se ao filho é concedida a possibilidade de, sem limitação de prazo, impugnar ou ave-riguar a paternidade, deve ser dada a mesma hipótese ao pretenso pro-genitor, sob pena de discriminação.

No que se refere às posições sub-jectivas de cada um dos interessados, salienta-se que na ação de investiga-ção de paternidade o eventual inte-resse do investigado em não assumir um vínculo de paternidade corres-pondente à realidade biológica não é merecedor de tutela, não devendo ser reconhecida “uma faculdade de o pai biológico se eximir à responsabili-dade jurídica correspondente”.

Ao invés, o interesse daquele que é tido como filho em manter esse estatuto não pode ser inteiramente desconsiderado, sobretudo quando tal vínculo se encontra enraizado nas relações familiares e sociais do agregado familiar em que se insere.

Por último, considera-se como relevante o facto de o início do prazo da caducidade se contar a partir do efetivo conhecimento por parte do marido da mãe dos factos indiciado-res da sua não paternidade.

Do que se conclui pela conformi-dade do regime plasmado na alínea a) do nº 1 do artigo 1842º do CC, com a Constituição (referindo-se, inclusive ser esta, também, a jurisprudência do TEDH, que se especifica).

De igual modo, se considera que o prazo de três anos é suficiente para garantir a viabilidade prática do exercício do direito de impugnar

a paternidade, não o impedindo ou dificultando gravemente. Pelo que, também, quanto à duração do prazo de caducidade estabelecido, a norma do artigo 1842º, nº 1, al. a), do CC, não padece de inconstitucionalidade.

De resto, acrescente-se que mes-mo para a hipótese de instauração de ação de investigação de paternidade, pelo filho, nos termos do nº 1 do ar-tigo 1817º, o Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão nº 401/2011, de 22 de Setembro de 2011, decidiu-se pela constitucionalidade do prazo de 10 anos para a propositura de tal ação, contado da maioridade ou emancipação do investigante, o que revela que neste Tribunal não se con-sidera como imprescritível o exercício do direito de investigação de paterni-dade, por se reputar que este prazo é suficiente para assegurar que não opera qualquer prazo de caducidade para a instauração, pelo filho, de uma ação desta natureza.

Ora, no caso dos autos, o ora autor logo que soube que a sua esposa estava grávida, estava de posse de todos os elementos para saber que não era o pai da criança. A partir do nascimento desta, dispôs do prazo de três anos para impugnar a pater-nidade presumida, o que não fez, só o vindo a fazer quando a filha já tinha 13 anos, pelo que, tal como decidido em 1.ª instância, se verifica a caduci-dade do direito de propor a presente ação com vista ao reconhecimento do direito de impugnar a paternidade presumida, relativamente à menor em causa. Poderia ter exercido tal direito no prazo de três anos, o qual, como vimos, se mostra suficiente, para que o pudesse exercer.

Consequentemente, improcede a 1ª questão do recurso, ficando prejudicado o conhecimento da 2ª questão.

A Relação de Coimbra decidiu, assim, julgar improcedente o recurso de apelação e, consequentemente, manter inalterada a decisão recorrida.

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decisão do acórdão:A decisão tomada pelos Juízes De-

sembargadores acabou por ser suma-riada, no Acórdão, do seguinte modo:

1. Não é inconstitucional o regime

constante da alínea a) do nº 1 do arti-go 1842º do Código Civil que fixa um prazo para a propositura da ação de impugnação de paternidade.

2. Assim, decorrido o prazo pre-

visto naquele normativo, ocorre a caducidade do direito de propor a ação com vista ao reconhecimento do direito de impugnar a paternidade presumida.

o Que diZ a lei

Código Civil

artigo 1826ºPresunção de paternidade

1- Presume-se que o filho nascido ou concebido na constância do matri-mónio da mãe tem como pai o marido da mãe.

2- O momento da dissolução do casamento por divórcio ou da sua anulação é o do trânsito em julgado da respectiva sentença; o casamento católico, porém, só se considera nulo ou dissolvido por dispensa a partir do registo da sentença proferida pelas autoridades eclesiásticas.

artigo 1838ºimpugnação da paternidade A paternidade presumida nos ter-

mos do artigo 1826º não pode ser impugnada fora dos casos previstos nos artigos seguintes.

artigo 1839º

fundamento e legitimidade 1- A paternidade do filho pode ser

impugnada pelo marido da mãe, por esta, pelo filho ou, nos termos do artigo 1841º, pelo Ministério Público.

2- Na ação o autor deve provar que, de acordo com as circunstâncias, a paternidade do marido da mãe é manifestamente improvável.

3- Não é permitida a impugnação de paternidade com fundamento em inseminação artificial ao cônjuge que nela consentiu.

artigo 1840º

impugnação da paternidade do fi-lho concebido antes do matrimónio

1- Independentemente da prova a

que se refere o nº 2 do artigo anterior, podem ainda a mãe ou o marido im-pugnar a paternidade do filho nascido dentro dos cento e oitenta dias pos-teriores à celebração do casamento, excepto:

a) Se o marido antes de casar, teve conhecimento da gravidez da mulher;

b) Se, estando, pessoalmente pre-sente ou representado por procurador com poderes especiais, o marido con-sentiu que o filho fosse declarado seu no registo do nascimento;

c) Se por qualquer outra forma o marido reconheceu o filho como seu.

2- Cessa o disposto na alínea a) do número anterior se o casamento for anulado por falta de vontade, ou por coação moral exercida contra o marido; cessa ainda o disposto nas alíneas b) e c) quando se prove ter sido o consen-timento ou reconhecimento viciado por erro sobre as circunstâncias que tenham contribuído decisivamente para o convencimento da paternidade, ou extorquido por coação.

artigo 1841º

ação do ministério público 1- A ação de impugnação de pater-

nidade pode ser proposta pelo Ministé-rio Público a requerimento de quem se declarar pai do filho, se for reconhecida pelo tribunal a viabilidade do pedido.

2- O requerimento deve ser dirigido ao tribunal no prazo de sessenta dias a contar da data em que a paternidade do marido da mãe conste no registo.

3- O tribunal procederá às diligên-cias necessárias para averiguar a viabi-lidade da ação, depois de ouvir, sempre que possível, a mãe e o marido.

4- Se concluir pela viabilidade da ação, o tribunal ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério

Público junto do tribunal competente para a ação de impugnação.

artigo 1842º

Prazos 1 - A ação de impugnação de pater-

nidade pode ser intentada:a) Pelo marido, no prazo de três anos

contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir--se a sua não paternidade;

b) Pela mãe, dentro dos três anos posteriores ao nascimento;

c) Pelo filho, até 10 anos depois de haver atingido a maioridade ou de ter sido emancipado, ou posteriormente, dentro de três anos a contar da data em que teve conhecimento de circunstân-cias de que possa concluir-se não ser filho do marido da mãe.

2 - Se o registo for omisso quanto à maternidade, os prazos a que se referem as alíneas a) e c) do número anterior contam-se a partir do estabelecimento da maternidade.»

artigo 1846ºlegitimidade passiva

1- Na ação de impugnação de pater-nidade devem ser demandados a mãe, o filho e o presumido pai quando nela não figurem como autores.

2- No caso da morte da mãe, do filho ou do presumido pai, a ação deve ser in-tentada ou prosseguir contra as pessoas referidas no artigo 1844º, devendo, na falta destas, ser nomeado um curador especial; se, porém, existirem herdeiros ou legatários cujos direitos possam ser atingidos pela procedência do pedido, a ação não produzirá efeitos contra eles se não tiverem sido também demandados.

3- Quando o filho for menor não emancipado, o tribunal nomear-lhe-á curador especial.

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Sumários - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 53

arreNdaMeNto

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/9/2011Revista nº 22/2000.S1 - 7.ª SecçãoAssunto: Contrato de arrendamento - renda

I - Efetuou a reapreciação da prova em 2.ª instância o acórdão do Tribunal da Relação que apreciou os pontos da ma-téria de facto sobre que recaía o recurso, com análise dos depoimentos presta-dos e documentação junta, expondo as razões pelas quais não seria alterada a matéria de facto encontra-se.II - Não comete a nulidade de con-denação em objeto diverso do pedi-do – art. 668º, nº 1, al. e), do CPC – o acórdão que fixou os danos indemni-záveis condenando a ré a suportar as obras de reparação das deteriorações (que enumera) bem como a pagar a quantia mensal equivalente à ultima renda durante o período necessário à realização das referidas obras quando o pedido do autor era o de condena-ção daquela “em montante a liquidar em execução de sentença pelos pre-juízos causados pelo incumprimento de contrato de arrendamento” entre ambos celebrado.III - O art. 1043º do CC – que impõe ao locatário a obrigação de manter e resti-tuir a coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização em confor-midade com os fins do contrato – não se traduz apenas na entrega do prédio em bom estado de conservação mas permite a condenação na restituição do locado suportando as obras de repara-ção das deteriorações que ultrapassam o que seria compatível com uma utili-zação prudente.IV - Pedindo a ré – locatária – indem-nização por danos não patrimoniais, incumbia-lhe o ónus de alegar e provar, além dos prejuízos, a culpa da autora – locadora.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22/9/2011Revista nº 80/2002.C2.S1 - 2.ª secçãoAssunto: Contrato de arrendamento – casa de morada de família

I - A nulidade de acórdão por omissão de pronúncia [o art. 668º, al. d), do CPC], ocorre quando o juiz deixe de conhecer de todas as questões que lhe estão sub-metidas, entendendo-se como tal todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas aquelas que oficiosamente lhe incumbe apreciar, e já não quando não conhece de todas as “razões” ou argumentos invocados.II - Devem ser propostas por ambos os cônjuges, ou por um deles com o con-sentimento do outro, qualquer que seja o regime legal de bens do casal, as ações em que se discuta a titularidade ou um ato de disposição de direitos reais ou de direitos pessoais de gozo, designa-damente do direito ao arrendamento, sobre a casa de morada de família (arts. 1682º-A, nº 2 e 1682º-B, do CC, e art. 28º-A, nº 1, do CPC).III - São atos de disposição para os efeitos referidos em II a resolução, a denúncia, a revogação por mútuo consentimento, a cessão da posição de arrendatário, de subarrendamento ou de empréstimo da casa de morada de família.IV - Sendo o pedido formulado o de condenação no pagamento de indem-nização, cuja causa de pedir radica no incumprimento contratual por banda do réu (senhorio), o mesmo mantém-se dentro dos atos de administração ordinária, sendo o autor parte legítima, ainda que desacompanhado do côn-juge (arts. 1678º do CC e 26º do CPC).V - A menção da licença de utilização é elemento necessário do contrato de arrendamento.VI - A falta de licença de utilização fora dos casos em que é impeditiva da ce-lebração do contrato, por ser exigida a

sua celebração por escritura pública, é suprível nos termos gerais.VII - A falta de licença referida em VI é suprível nos termos gerais e, fora dos casos em que é impeditiva da celebra-ção do contrato, por ser exigida a sua celebração por escritura pública, dá azo às sanções estabelecidas no art. 9º, nos 5 a 7, do RAU, entre as quais o direito do arrendatário à resolução do contrato, com indemnização, nos termos gerais.VIII - Os recursos são meios destina-dos a obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores e não a criar decisões sobre matéria nova, a menos que se trate de questões de conhecimento oficioso.

Civil

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29/9/2011,Revista nº 65/2001.P1.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Usucapião – mera detenção

I - O STJ só conhece de matéria de direito o que significa referenciar as condutas à verificação dos pressupostos de pre-visão e de estatuição da norma jurídica infringida, porque houve erro na sua interpretação, na sua aplicação ou na sua determinação.II - A determinação dos factos que, no âmbito de determinada causa, se con-siderem provados e não provados com-pete às instâncias, maxime à Relação.III - A sindicância do juízo sobre factos com base em prova pericial, testemu-nhal e presunções judiciais está excluída da competência do STJ.IV - Indemonstrado o crédito invocado pelo obrigado à restituição, falece o pressuposto básico do direito de re-tenção que o garantia (art. 754º do CC).V - O registo definitivo constitui presun-ção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define (art. 7º do CRgP), pelo que quem tem a seu favor

SuPreMo triBuNal de JuStiÇa

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JuriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201154

esta presunção legal basta-lhe invocar e demonstrar a inscrição do registo do direito que invoca.VI - A imposição do ónus de alegação e de prova dos factos integradores da aquisição originária restringe-se aos casos de impugnação do registo funda-do em escritura de justificação notarial.VII - No caso dos autos, não tendo o registo sido efetuado com base em qualquer justificação notarial, não tem a autora que fazer prova de qualquer forma de aquisição originária, prevale-cendo a presunção do art. 7º do CRgP, enquanto não for produzida prova em contrário.VIII - O recorrente, como promitente comprador da fração autónoma, bene-ficiando da respetiva tradição, sempre seria, até à outorga do contrato definiti-vo de compra e venda, um mero deten-tor precário da mesma, aproveitando as utilidades por ela proporcionadas, sendo tal aproveitamento destituído do animus típico que preside à atuação do proprietário.IX - Assim, só por inversão do título da posse poderia converter a sua detenção em posse útil e adequada para a usuca-pião, sendo certo que não alegou factos para o efeito.

CoMerCial

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23/11/2011Revista nº 22/05.5TBPPS.C1.S1 - 6.ª SecçãoAssunto: Dissolução de sociedade

I - Estando provado que o autor, no exer-cício da sua atividade de industrial da construção civil, acordou verbalmente com o réu, na qualidade de legal repre-sentante da extinta sociedade X, Lda., a execução de vários trabalhos inerentes àquela atividade num prédio de que esta era proprietária, com aceitação dos réus – sem que se mostre provado, pelos réus (art. 342º, nº 2, do CC), que o pagamento respeitante aos trabalhos tenha sido satisfeito quer por si, quer pela sociedade –, e que a aludida so-ciedade foi objeto de dissolução por parte dos réus, que declararam, no

documento notarial a tal respeitante, a inexistência de qualquer passivo ou ativo para partilhar, considerando-a também liquidada, perante a existência de dívidas da sociedade para com o au-tor, a partilha dos bens sociais daquela, realizada pelos réus em simultâneo com a sua dissolução, não era legalmente admissível face ao preceituado no art. 147º, nº 1, do CSC.II - Dado que os gerentes respondem para com os credores sociais, quando, pela inobservância culposa das dis-posições legais destinadas à proteção destes, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos res-petivos créditos – art. 78º, nº 1, do CSC –, na situação em causa nos autos mostra-se integralmente preenchido o circunstancialismo fáctico atinente à aplicabilidade de tal responsabilidade pessoal.III - Constando da escritura lavrada que a sociedade, na decorrência e aprovação das respetivas contas, ficou sem quais-quer bens no seu ativo, de tal resulta a responsabilidade pessoal e solidária dos réus pelo pagamento da dívida que vem peticionada pelo autor, uma vez que, “encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios continuam responsáveis perante terceiros pelo pa-gamento dos débitos que tenham sido saldados, como se não tivesse havido liquidação” – arts. 997º, nº 1, e 1020º do CC, aplicáveis por força do estatuído no art. 2º do CSC.

CoNtratoS

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/9/2011Revista nº 6019/09.0TVLSB.L1.S1 - 7.ª SecçãoAssunto: Contrato de seguro – dever de informação

I - Ao celebrar contrato de seguro o le-gislador impôs ao segurado um dever de informação no qual: (i) tanto releva a afirmação positiva que não corresponde à realidade (declaração dolosamente inexata) como a omissão ou ocultação de elementos informativos (declaração reticente); (ii) o desconhecimento negli-

gente (elementos não conhecidos pelo segurado), enquanto não ultrapasse os limites da boa fé na execução do contrato (art. 227º do CC), não releva; (iii) só releva a inexatidão ou reticência que influam na existência ou condições do contrato, ou seja, que levariam a seguradora a não fazer o seguro ou a fazê-lo em condições manifestamente diferentes.II - A violação do dever de informação, nos termos referidos em I, importa a anulabilidade do contrato e não a sua nulidade.III - É pressuposto da invalidade do con-trato de seguro a existência de nexo de causalidade entre a inexatidão ou reti-cência e o sinistro ocorrido.

faMÍlia

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17/11/2011Revista nº 1766/05.7TBFIG.C1.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Divórcio – direito a alimentos

I - Nos termos do art. 2016º, nº 1, al. a), do CC tem direito a alimentos, em caso de divórcio, o cônjuge não considerado culpado, entendendo-se por alimentos tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.II - Tendo o autor sido considerado único e exclusivo culpado pela dissolução do casamento contraído com a ré e tendo resultado provado que (i) aquando do casamento a ré era trabalhadora estu-dante; (ii) trabalhava dependendo do rendimento do seu trabalho que anual-mente era de € 5.470,07; (iii) vive com o filho em casa arrendada, pela qual paga mensalmente € 400, (iv) foi a ré quem suportou sozinha, com algumas ajudas pontuais da mãe e amigos, as despesas referentes ao menor; (v) o autor é sócio gerente da sociedade G Lda., auferindo um vencimento por esse seu cargo; (vi) tem a ajuda pecuniária dos seus pais; (vii) coleciona relógios, apreciando e ostentando roupa de marca; todos estes factos apontam para a necessidade de alimentos por parte da ré, bem como para a possibilidade de os prestar por parte do autor.

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Sumários - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 55

PeNal

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/08/2011Proc. nº 1/09.3FAHRT-F.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Prisão ilegal

I - O habeas corpus é uma providência excecional que visa garantir a liberdade individual contra os abusos de poder consubstanciados em situações de de-tenção ou de prisão ilegal, com suporte no art. 31º da CRP, que assim o institui como autêntica garantia constitucional de tutela da liberdade.II - O art. 222º, nº 2, do CPP enumera as situações que podem servir de funda-mento a habeas corpus com base em prisão ilegal, que são: ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompeten-te; ser motivada por facto pelo qual a lei não permite; manter-se para além dos prazos fixados por lei ou decisão judicial.III - Esta providência não constitui, as-sim, um recurso de decisões judiciais, uma espécie de sucedâneo «abreviado» dos recursos ordinários, ou mesmo um recurso «subsidiário», antes um meca-nismo expedito que visa pôr termo às situações de privação da liberdade que se comprove serem manifestamente ilegais, por ser a ilegalidade diretamen-te verificável a partir dos factos docu-mentalmente recolhidos no âmbito da providência.IV - A viabilidade do habeas corpus pressupõe, também, uma privação da liberdade que seja atual, não funcio-nando como mecanismo declarativo de ilegalidade de uma ultrapassada situação de privação da liberdade, nem como meio preventivo de uma eventual futura privação da liberdade.V - Por último, tem de ser atual a própria ilegalidade da privação da liberdade, ou seja, só é fundamento de habeas corpus a ilegalidade que existir ou perdurar ao tempo da apreciação do pedido, o que significa que qualquer ilegalidade veri-ficada em fase anterior do processo, que não persista quando o pedido é julgado, não pode servir como fundamento de habeas corpus.VI - Na situação em apreço, o funda-

mento do pedido de habeas corpus é o excesso de prazo, por os requerentes não terem sido ouvidos por um juiz no prazo de 48 h após a data em que foram (de novo) submetidos à medida de prisão preventiva (em 21-01-2011), na sequência da dedução de acusação, circunstância que foi reconhecida pelo Tribunal da Relação como uma irregula-ridade, ordenando a reparação do vício.VII - O facto de, posteriormente, ter sido efetuado o julgamento, tendo os requerentes sido condenados em penas de prisão (10 anos e 6 meses e 9 anos, respetivamente) faz com que, de acordo com essa nova fase processual, o prazo de prisão preventiva seja mais longo – 1 ano e 6 meses de acordo com o art. 215º, nº 1, al. d), do CPP – e ainda não tenha decorrido, o que significa que perdeu atualidade a ilegalidade (irregularida-de) cometida, ultrapassada que foi pela condenação proferida.VIII - Por seu turno, o tribunal efetuou a audição dos requerentes já depois da condenação, ato que foi por estes considerado inútil, precisamente por se ter realizado o julgamento, assim reconhecendo implicitamente a sana-ção do vício.IX - Assim, não se mostra preenchida a previsão da al. c) do nº 2 do art. 222º do CPP, pelo que se indefere a providência requerida.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/08/2011Proc. nº 911/11.8TXLSB-C.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Pena de expulsão

I - O habeas corpus é uma providência excecional que visa garantir a liberdade individual destinada a garantir a liber-dade individual contra os abusos de poder derivados de prisão ilegal. Não constitui um recurso da decisão judicial que decretou a privação da liberdade,mas apenas a pôr termo às situações de ilegalidade manifesta, diretamente verificáveis a partir dos elementos de facto recolhidos.II - O art. 222º, nº 2, do CPP, enumera as situações que podem servir de funda-mento a habeas corpus com base em

prisão ilegal, que são: ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompeten-te; ser motivada por facto pelo qual a lei não permite; manter-se para além dos prazos fixados por lei ou decisão judicial.III - Nos termos do art. 182º, nº 1, do CEPMPL, «tendo sido aplicada pena acessória de expulsão, o tribunal de execução das penas ordena a sua exe-cução logo que estejam cumpridos 2/3 da pena de prisão», o que consubstancia uma substituição ope legis da liberdade condicional pela execução da pena de expulsão.IV - Se, em cumprimento desse norma-tivo, o TEP, na própria data em que o requerente completou 2/3 da pena de prisão, ordenou a execução da pena acessória de expulsão, há que aguardar o trânsito em julgado dessa decisão, uma vez que a lei não determina a liber-tação do condenado até à execução da pena de expulsão.V - Se o requerente veio interpor recurso da decisão que ordenou a sua expul-são, recurso a que foi atribuído efeito suspensivo, posteriormente vindo a desistir do mesmo, não pode haver lu-gar à execução da ordem de expulsão sem que tenha transitado em julgado a homologação dessa desistência.VI - Perante estes dados, não ocorre qualquer ultrapassagem do prazo de prisão, porque o simples facto de o con-denado atingir o cumprimento de 2/3 da pena não determina a sua libertação, mas antes a sua expulsão do território nacional, a qual só não se concretizou pela razões indicadas.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/08/2011Proc. nº 92/11.7YRPRT-A.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Mandado de Detenção Europeu

I - Em cumprimento da Decisão-Quadro nº 2002/584/JAI do Conselho, de 13-06-2002, a Lei 65/2003, de 23-08, aprovou o regime jurídico do MDE, que veio a substituir o processo de extradição en-tre os Estados-Membros por um sistema de entrega entre autoridades judiciárias baseado no princípio do reconheci-mento mútuo das decisões penais, do

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JuriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201156

controlo adequado na decisão de exe-cução que é efetuada pela autoridade do Estado de execução, do elevado grau de confiança entre os Estados-Membros e da consagração do princípio da pro-porcionalidade e respeito pelos direitos fundamentais.II - O perigo de fuga há de ser aferido pelas circunstâncias concretas em que se move o arguido, sem esquecer a natureza dos ilícitos e a gravidade das sanções criminais previsíveis.III - Atenta a pena máxima cominada para os crimes atribuídos ao recorren-te (10 anos de prisão) conjugado com a circunstância de, pese embora ser cidadão português, ter grande facilida-de de deslocação para o estrangeiro, nomeadamente para França, onde tem familiares (pai), tornam insuficiente e inadequada qualquer outra medida de coação que não seja a manutenção da sua detenção.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31/08/2011Proc. nº 85/11.4YFLSB - 3.ª SecçãoAssunto: Cooperação judiciária internacional em matéria penal

I - O processo de habeas corpus traduz-se numa medida privilegiada contra o atentado ao direito à liberdade, enun-ciando a lei ordinária no art. 222º, nº 2, als. a), b) e c), do CPP, os pressupostos da sua concessão:- ter a prisão sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente;- ser motivada por facto pelo qual a lei não permite; e- manter-se para além dos prazos fixa-dos por lei ou decisão judicial.II - Por sua vez, o MDE, executado com base no princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais, para fins de procedimento criminal ou cumprimen-to de pena – como é o caso concreto –, mostra-se regulado na Lei 65/2003, de 23-08, em obediência à Decisão-Quadro nº 2002/584/JAI, do Conselho, de 13-06-2002, veio substituir o processo de extradição que se mostrou incapaz de, de forma agilizada, mercê da abertura de fronteiras e da livre circulação de

pessoas, responder aos problemas de cooperação judiciária entre Estados.III - Segundo o art. 30º, nos 1, 2 e 3, do citado diploma, a detenção da pessoa procurada cessa quando tiverem decor-rido 60 dias sem que tenha sido profe-rida decisão pela Relação, elevando-se esse prazo para 90 dias se for interposto recurso para o STJ, sendo os prazos ele-vados para 150 dias em caso de recurso para o TC.IV - Na interpretação deste preceito, o cumprimento do prazo fixado pelo legislador basta-se com a prolação de acórdão pelo STJ dentro de 90 dias so-bre a detenção, apreciando a questão de mérito, irrelevando o seu trânsito em julgado, a arguição de nulidades ou qualquer outra anomalia, sendo que, de outro modo, estava aberto o caminho a toda a sorte de expedientes, erguendo barreiras a que o trânsito se atingisse dentro desse prazo de 90 dias, invia-bilizando e pondo por terra a filosofia e o espírito do mandado de detenção, reduzindo-o a um frouxo instrumento de cooperação judiciária internacional ao nível europeu.V - Assim, tendo o requerente sido de-tido em 25-05-2011 e o acórdão do STJ proferido em 29-07-2011 (com decisão em 25-08-2011, de indeferimento de incidente de nulidade), ficam salva-guardados os prazos impostos pelo legislador, improcedendo, por falta de fundamento, a providência requerida.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/08/2011Proc. nº 5/10.3TELSB.D.S1 - 5.ª SecçãoAssunto: Prazo da prisão preventiva

I - Apesar de o aqui requerente da pro-vidência de habeas corpus não haver ainda sido constituído arguido à data da prolação do despacho que declarou o processo de excecional complexidade, não é por isso que este deixa de se lhe impor, enquanto não for invalidado ou revogado, pois refere-se ao processo como um todo, independentemente de quem era então arguido.II - Os prazos máximos de prisão preven-tiva são elevados em caso de excecional

complexidade do procedimento, na consideração de que esta previsivel-mente se refletirá na conclusão das várias fases processuais, determinando o seu retardamento.III - Se, eventualmente, não lhe foi dada oportunidade de impugnar a decisão que declarou a excecional complexi-dade, nisso mais não há que uma mera irregularidade (art. 118º, nos 1 e 2, do CPP), que deve ser feita valer por outra via que não a desta petição.IV - A prisão preventiva não se torna ilegal, designadamente por excesso de prazo, só porque não foi notificado ao requerente o despacho que declarou a excecional complexidade do pro-cedimento, na medida em que dessa eventual omissão não decorre a insus-tentabilidade dessa decisão e da con-sequente elevação do prazo máximo de duração da medida de coação, mas apenas a eventual possibilidade de a pôr em discussão.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7/09/2011Proc. nº 356/09.0JAAVR.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Homicídio qualificado – especial perversidade e censurabilidade

I - Não tendo a recorrente A sido ad-mitida a intervir no processo como assistente, em representação da sua filha B, visto que a paternidade desta, que atribuiu à vítima, ainda não está legalmente estabelecida, carece de legitimidade para recorrer da sentença na parte respeitante ao crime de homi-cídio perpetrado na pessoa do falecido, o que significa que não dispõe das con-dições necessárias para daquela recor-rer naquele concreto segmento – nº 2 do art. 414º – razão pela qual o recurso por si interposto em representação da sua filha tem de ser rejeitado – al. b) do nº 1 do art. 420º.II - O facto de uma decisão afetar o as-sistente, por si só, não basta para que tenhamos por admissível recurso por aquele interposto. A admissibilidade do recurso dependerá, ainda, da cir-cunstância de a decisão ter sido pro-ferida contra o assistente e de este ter

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Sumários - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 57

interesse emagir (arts. 69º, nº 2, al. c), e 401º, nº 2, do CPP).III - Decisão proferida contra o assisten-te, mais concretamente decisão final ou sentença (al. a) do nº 1 do art. 97º), visto ser o recurso da sentença que ora está em causa, é a decisão que, tendo em conta a acusação por aquele deduzida ou sufragada e as pretensões por ele formuladas no âmbito das suas atribui-ções, tendo em vista o julgamento e a decisão da causa, julga as mesmas im-procedentes, total ou parcialmente, isto é, em que o assistente fica vencido nas suas pretensões, total ou parcialmente, decisão que, por contrária ou não to-talmente favorável à posição assumida pelo assistente no processo, ele tem interesse direto em impugnar.IV - O interesse em agir, pressuposto ou condição do recurso, também co-nhecido por legitimidade objetiva ou interesse processual (“locus standi”), consiste na necessidade de que a de-cisão recorrida seja alterada para que a pretensão do assistente seja satisfeita, para que o direito que aquele exerce em juízo seja tutelado, obtenha vencimento ou ganho de causa, necessidade que se terá de traduzir na existência de um in-teresse material, juridicamente protegi-do, cuja não satisfação causa prejuízo ou desvantagem, constituindo o recurso o meio adequado para a sua obtenção.V - O interesse na correta aplicação do direito “tout court” nada tem a ver com a legitimidade processual e com o inte-resse em agir; trata-se de um interesse geral que todo e qualquer indivíduo, enquanto cidadão integrante do Estado de direito, tem ou deve ter, que não lhe confere direito a impugnar a decisão.VI - A diferente qualificação jurídico-penal dos factos assumida na sentença pelo tribunal recorrido (que qualificou os crimes como homicídios simples em vez de homicídios qualificados) conduziu a que o arguido tivesse sido condenado pelo cometimento de cri-mes menos graves, que traduzem e refletem, em termos jurídicos, ilicitude e culpa situadas num patamar inferior. Tal circunstância é suscetível de ter reper-cussões na esfera jurídica da assistente,

designadamente na decisão a proferir no pedido de indemnização civil por aquela deduzido contra o arguido, maxime na fixação da compensação e da indemnização devidas pelos danos morais e patrimoniais sofridos. Deste modo, há que concluir pela legitimidade e interesse em agir da assistente no que concerne ao crime de homicídio tenta-do perpetrado na sua pessoa e pelo qual o arguido também vem condenado.VII - No nosso ordenamento jurídico o crime de homicídio qualificado não é um tipo legal autónomo, com elemen-tos constitutivos específicos, consti-tuindo antes uma forma agravada de homicídio, em que a morte é produzida em circunstâncias reveladoras de espe-cial censurabilidade ou perversidade. A qualificação do homicídio assenta, pois, num especial tipo de culpa, num tipo de culpa agravado, traduzido num acentu-ado desvalor da atitude do agente, que tanto pode decorrer de um maior des-valor da ação, como de uma motivação especialmente reprovável.VIII - As circunstâncias constantes do art. 132º, nº 2, do CP são não só um indício, mas também uma referência. Circuns-tâncias que, não fazendo parte do tipo objetivo de ilícito, se devem ter por ve-rificadas a partir da situação tal qual ela foi representada pelo agente, pergun-tando se a situação, assim configurada, corresponde a um exemplo-padrão ou a uma situação substancialmente aná-loga; e se, em caso afirmativo, se com-prova uma especial censurabilidade ou perversidade do agente.IX - No caso em apreço, há a considerar o seguinte:- o arguido, no dia 09-08-2009, após se haver munido de uma arma caçadeira e de uma faca, dirigiu-se ao anexo da sua residência, local onde viviam, na quali-dade de seus inquilinos, a assistente e o seu companheiro;- depois de abrir a porta daquele anexo, de forma não apurada, nele entrou e dirigiu-se para o quarto onde aqueles se encontravam deitados;- encontrando-se já no interior do quar-to, frente a frente e a curta distância do A, que procurava levantar-se, o arguido

apontou a arma de fogo em direção ao mesmo e disparou um tiro, com o qual o atingiu na região mamária;- perante este comportamento do argui-do, temendo pela sua vida e integridade física, a assistente atirou-se para o chão, rebolando pela cama onde se encon-trava deitada, no entanto, no decurso dessa movimentação, o arguido efetuou um disparo na sua direção, atingindo-a na parte de trás do ombro esquerdo;- em seguida, o arguido aproximou-se do A, que caíra no chão devido ao dispa-ro que o atingira e, empunhando a faca de que munira, desferiu quatro facadas nas regiões do pescoço e tórax daquele;- depois, dirigiu-se para junto da assis-tente, que também se encontrava no chão, tendo desferido um golpe com aquela faca, com o qual a atingiu na parede lateral do tórax;- à data a assistente encontrava-se grá-vida, facto que era do conhecimento do arguido, o qual agiu motivado por desentendimentos existentes com aquela e o seu companheiro, resultantes de estes manterem um cão no pátio, de receberem pessoas no anexo que habi-tavam, com as quais faziam barulho até altas horas da noite, e de na noite ante-rior terem depositado no pátio peças de mobiliário.X - A expressão meio insidioso – al. e) do nº 2 do art. 132º do CP – tem de ser interpretada com sentido amplo, com ela se pretendendo abranger, como refere Teresa Serra, «não apenas meios materiais especialmente perigosos de execução do facto, mas também a elei-ção das condições em que o facto pode ser cometido de modo mais eficaz, dada a situação de vulnerabilidade da vítima em relação ao agressor».XI - O arguido, munindo-se de uma arma de fogo e de uma arma branca, introduziu-se na residência dos ofen-didos e entrou no quarto de dormir onde ambos se encontravam deitados, local onde disparou sobre ambos e em seguida os esfaqueou. O arguido procu-rou, pois, as condições em que os factos poderiam ser cometidos de modo mais eficaz, sem possibilidade de reação das vítimas, sendo que para executar

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JuriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201158

aqueles se muniu de meios materiais particularmente perigosos, fatores estes que colocaram as vítimas em situação de extrema vulnerabilidade. Agiu, pois, insidiosa e traiçoeiramente, assumindo comportamento merecedor de um juízo de especial censura ético-jurídica.XII - Pressuposto material da atenua-ção especial da pena é a ocorrência de acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção, sendo certo que tal só se deve ter por verificado quando a imagem global do facto, re-sultante das circunstâncias atenuantes, se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respetivo. Por isso, como defende Figueiredo Dias, a atenuação especial da pena do art. 72º, nº 1, do CP, só em casos extraordinários ou excecio-nais pode ter lugar.XIII - No caso do arguido, é patente não estarmos perante um caso extraordiná-rio ou excecional, quer no que concerne ao grau de ilicitude do facto, quer à intensidade da culpa ou à (des) neces-sidade da pena. Ao invés, o arguido agiu com elevadíssimo grau de culpa, sendo certo estarmos perante factos da maior ilicitude em que são patentes e acentu-adas as necessidades de punição, sendo de afastar liminarmente o instituto da atenuação especial da pena.XIV - Considerando, além do já referido, que o arguido tem 72 anos de idade, possui a 4ª classe, é bem comportado no meio social em que se insere e é considerado pessoa de bem e prestável, não lhe sendo conhecidos antecedentes criminais, fixa-se em 9 anos de prisão a pena relativa ao crime de homicídio qualificado, na forma tentada.XV - A pena aplicada em 1.ª instância ao arguido pelo crime de homicídio consu-mado, não obstante a agravação da quali-ficação do crime, não pode ser agravada, atenta a rejeição do recurso interposto pela assistente na parte que impugnou aquela e o princípio da proibição da “re-formatio in pejus”, pelo que essa pena se mantém em 12 anos de prisão.

XVI - Analisando os factos, verifica-se que os crimes em concurso foram come-tidos na mesma ocasião, encontrando-se estreitamente conexionados, visto que a ambos subjaz o mesmo quadro motivacional e circunstancial. O ilícito global, atentos os bens jurídicos em causa, assume especial gravidade. Não se mostra que o arguido seja portador de tendência ou propensão criminosa. Neste contexto, fixa-se a pena conjunta em 17 anos de prisão.

ProCeSSo Civil

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17/11/2011Revista nº 2190/07.2TBFAF.G1.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Inabilidade para depor

I - A lei não veda o depoimento, como testemunhas, de pessoas cujo conhe-cimento dos factos remonte a 50 ou a mais anos de distância, desde que tenham aptidão física e mental para de-porem sobre os factos que constituem objeto de prova.II - O regime jurídico que disciplina a prova testemunhal está legalmente fixado, mormente nos arts. 616º a 618º do CPC. Não tendo a Recorrente impug-nado a admissão de tais testemunhas, não pode deixar de se subordinar à demonstração da verdade dos factos obtida por esse meio de prova.III - É consabido que a prova teste-munhal, apesar de falível e precária, é aquela que, na prática, assume a maior importância, por ser a única a que pode recorrer-se na demonstração da reali-dade de muitos factos, como ensinava o saudoso civilista Professor Antunes Varela (Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 614).IV - O mesmo emérito Mestre de Coim-bra acrescentava que «se a vida moder-na, por uma questão de segurança, ten-de a documentar um número cada vez maior de atos jurídicos, continua a ser enorme o contingente dos factos impre-vistos e dos próprios factos previsíveis , com relevância para o julgamento dos litígios, em que o único meio de prova utilizável é o recurso ao depoimento das

pessoas (terceiros) que tiveram aciden-talmente perceção desses factos ou de ocorrências a ele ligados por qualquer nexo de instrumentalidade» (ibidem).V - O citado Professor rematava ape-lando ao particular cuidado – «o pru-dente senso crítico» – que o Tribunal, não podendo prescindir de tal meio de prova, deve ter no interrogatório e na ponderação do depoimento testemu-nhal, relembrando o vetusto brocardo do Digesto «testium fides diligenter examinanda».VI - Sendo um meio de prova sujeito à livre apreciação do julgador, não pode o Supremo Tribunal sindicar a sua apre-ciação.

ProPriedade HoriZoNtal

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6/10/2011Revista nº 6993/05.4TBALM.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Fração autónoma -Servidão de passagem

I - «Lapso» é um erro involuntário, ao fa-lar ou ao escrever, cometido por distra-ção, sendo que a sua retificação pressu-põe que seja evidente, óbvio, manifesto, ostensivo, revelado pelo contexto da declaração ou através das circunstâncias da mesma (art. 249º do CC).II - O que releva para a definição do es-tatuto jurídicodominial de um prédio é a escritura de constituição da proprieda-de horizontal e não o auto de vistoria da respetiva câmara municipal, cuja função se limita a verificar as condições e a con-formidade da construção do prédio com as normas legais da propriedade hori-zontal, mas sem definir as relações reais entre esse prédio e os prédios vizinhos.III - Se as frações autónomas devem ser distintas e isoladas entre si e constituir unidades independentes, suscetíveis de pertencer a proprietários diversos, então devem ter saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública, repugnando à natureza da propriedade horizontal a existência de uma fração autónoma «encravada».IV - A saída para a via pública, seja pró-pria e direta, seja através de uma parte

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Sumários - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 59

comum, logo indireta, é essencial e imprescindível ao aproveitamento autó-nomo, independente e exclusivo, subja-cente à suscetibilidade de pertencerem a proprietários diversos.V - Por esta razão a autonomia e inde-pendência de uma fração é incompatí-vel com o aproveitamento das respeti-vas utilidades através de outro prédio ou de outra fração do mesmo ou de outro prédio.VI - Emergindo dos factos provados que a fração D – correspondente ao anexo (ate-lier) – não é independente nem autóno-ma (uma vez que não dispõe de acesso direto ou indireto à via pública), tal facto acarreta a nulidade do título constitutivo por vício de objeto (impossibilidade le-gal) – art. 1416º, 280º e 294º do CC.VII - Prescrevendo o art. 1419º, nº 1, do CC que o título constitutivo da proprie-dade horizontal pode ser modificado por escritura pública, havendo acordo de todos os condóminos, é de concluir que a sentença judicial não é, pois, o meio adequado para operar tal modi-ficação, mesmo que na ação estejam todos os condóminos.VIII - A servidão de passagem pressupõe dois prédios pertencentes a proprie-tários diversos, dos quais um não tem comunicação com a via pública (ou tem-na de forma insuficiente).IX - Se os autores na petição inicial circunscreveram o facto genético da servidão de passagem à usucapião – silenciando a destinação do pai de fa-mília –, não podem agora, em sede de alegação de recurso, introduzir factos subsumíveis a esta outra (possível) cau-sa de pedir, não discutida, nem decidida na instância recorrida.

reSPoNSaBilidade Civil

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22/9/2011Revista nº 39/07.5TBCCH.S1 - 2.ª secçãoAssunto: Indemnização por perdas e danos – acidente de viação

I - No tocante à avaliação dos danos cor-porais a jurisprudência tem distinguido entre: (i) o dano corporal em sentido

estrito, ou dano biológico, que é um dano base ou dano central, presente em cada lesão da integridade físico-psí-quica, sempre lesivo do bem saúde; (ii) o dano patrimonial, que é um dano su-cessivo ou ulterior e eventual, um dano consequência, entendendo-se em tal contexto, não todas as consequências da lesão mas só as perdas económicas, danos emergentes e lucros cessantes causadas pela lesão; e (iii) o dano moral.II - A IPP é, de per si, um dano patrimo-nial indemnizável, quer acarrete para o lesado uma diminuição efetiva do seu ganho laboral (presente ou previsivel-mente futuro), quer lhe implique ape-nas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais (atuais ou previsivelmente futuros).III - Na fixação da indemnização pelos danos futuros: (i) a indemnização deve corresponder a um capital produtor de rendimento que a vítima não auferirá e que se extinguirá no período provável da sua vida; (ii) tem-se como critérios a teoria da diferença e a equidade, im-plicando o relevo devido às regras da experiência; (iii) as tabelas financeiras têm caráter meramente indicativo; (iv) deve ponderar-se que a indemnização será paga de uma só vez permitindo ao beneficiário rentabilizála; (v) deve ter-se em conta a esperança média de vida, atualmente em 78 anos.IV - Provado que o autor tinha à data do acidente 24 anos, auferia no exercício da profissão de montador a retribuição anual não inferior a € 9360; desempe-nhou funções de soldador; ficou impe-dido de exercer a profissão de montador de tetos falsos; no seu recibo de venci-mento constava a quantia de € 457,45; as sequelas determinaram-lhe uma IPP de 37,8%, reputa-se de ajustada a indemnização de € 100 000, a título de danos patrimoniais futuros decorrentes da IPP de que ficou a padecer.V - Apenas são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496º, nº 1, do CC), fundando-se a sua quantifica-ção na equidade (art. 496º, nº 3, do CC) e tendo em conta o grau de culpabilidade

do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art. 494º do CC).VI - Resultando dos factos provados que em 24-06-2004 o autor sofreu trauma-tismo craniano com perda de conhe-cimento; escoriações da face e ferida nasal; fratura e luxação do médio társico do pré esquerdo; fratura do pilão tibial (exposta) à direita e fratura do terço distal do perónio direito; foi submeti-do à imobilização dos dois membros superiores com talas gessadas e sutura da ferida nasal; foi transportado para hospital; ficou internado cinco dias a necessitar de cirurgia; foi submetido a intervenção cirúrgica urgente, com anestesia geral, em ambos os mem-bros inferiores, tendo-se procedido à redução e osteossíntese das fraturas do pilão tibial do perónio direito e da luxação médio-társica do pé esquerdo; após tal intervenção ficou internado 8 dias; foi transportado para a sua resi-dência com as pernas imobilizadas com talas gessadas; para se poder deslocar passou a necessitar do auxílio de uma cadeira de rodas durante 3 meses findos os quais passou a caminhar com o apoio de canadianas até janeiro de 2005; du-rante o tempo em que necessitou de cadeira de rodas necessitou do apoio de terceira pessoa para se deslocar e satisfazer as suas necessidades de higie-ne pessoal; foi assistido ao longo de um ano com tratamentos ambulatórios; fez 49 sessões de fisioterapia; voltou a ser submetido a intervenção cirúrgica para retirar material de osteossíntese, com alta hospitalar no dia seguinte; efetuou tratamentos, sofreu dores e dificulda-des de marcha durante um ano; sofreu angústias, aborrecimentos e tristeza; ficou, como sequelas, com rigidez da tíbio-társica direita e trofoedema do tornozelo e de um terço distal da per-na; ficou com cicatrizes e aniquilose/rigidez em posição funcional da tíbio- -társica e pé em posição funcional com compromisso de marcha; continua a ter dificuldades de marcha, a trabalhar em andaimes e a permanecer em pé muito tempo; sofre de dores no tornozelo e pé direito e usa uma meia elástica com

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JuriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201160

frequência; antes do embate era um jovem alegre, saudável e energético, com gosto em praticar modalidades desportivas, que contribuíam para o seu bem-estar, sendo atleta federado na Federação Portuguesa de Futebol e após o embate ficou impossibilitado de correr e praticar futebol, o que lhe causa tristeza, é ajustada para compensação dos danos não patrimoniais a quantia de € 45 000.

traBalHo

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8/6/2011Recurso nº 700/08.7TTMTS.P1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Contrato de trabalho – justa causa de resolução

I - O contrato celebrado entre um Pro-fessor Universitário e uma Universida-de Privada terá a natureza de contrato de trabalho subordinado quando, designadamente, o primeiro: - exer-ça funções em conformidade com os regulamentos e instruções, incluindo regime de faltas, prevendo-se para estas a perda da remuneração e a res-ponsabilidade disciplinar; exerça tare-fas administrativas, como as de direção de departamento e de relacionamento institucional com os outros departa-mentos; dirija e organize serviços, para as quais seja secretariado por uma pessoa sob a sua supervisão funcional hierárquica, contratada e remunerada pela entidade empregadora; receba dos órgãos da Universidade instruções e orientações quanto ao desempenho das suas funções e ao relacionamento com a mesma; cumpra horários defi-nidos pela empregadora, nomeada-mente assinar e preencher o livro de sumários; cumpra horários definidos pela empregadora, cujas faltas tenha que justificar; receba o pagamento mensal de uma quantia acordada, com subsídio de férias e um 13º mês e sejam feitas retenções e contribuições para a segurança social e imposto sobre rendimento, como trabalho por conta de outrem.

II - Não existe justa causa para a re-solução do contrato de trabalho por parte de Professor Universitário em relação a Universidade Privada em-pregadora, com alegado fundamento em diminuição da carga horária e da respetiva remuneração em relação aos anos letivos anteriores se no contrato celebrado a entidade empregadora não assumiu qualquer compromisso em garantir determinada carga horá-ria e se até a foi diminuindo ao longo dos anos.III - Como não existirá justa causa para resolução do contrato quando essa Universidade reduza a carga ho-rária para quatro horas semanais, na situação de o mesmo Professor já se encontrar vinculado com outro Esta-belecimento de ensino com uma car-ga horária letiva em regime de tempo integral.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8/6/2011Recurso nº 2957/03.0TTLSB.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Pensão complementar de reforma

I - Consistindo o pedido subsidiário for-mulado pelo autor no reconhecimento do direito a uma pensão vitalícia igual à diferença entre a pensão de refor-ma que lhe vier a ser atribuída pela Segurança Social e a que pela mesma Segurança Social lhe seria paga se a ré tivesse procedido à entrega das contri-buições e descontos a que, segundo o autor, estava obrigada em virtude do pagamento do denominado “subsídio de embarque”, no período compreen-dido entre 1992 e 2000, o crédito, assim reclamado pelo autor, não é emergente do contrato de trabalho, integrando, sim, o acervo de direitos constituídos na esfera jurídica do trabalhador, ul-trapassando a relação laboral entre as partes para relevar no âmbito de uma nova relação jurídica, agora no âmbito da Segurança Social.II - O direito assim peticionado destina-se a corrigir o montante da pensão de reforma que ao autor venha a ser atri-buído pela Segurança Social, tendo em conta que a ré não procedeu às con-

tribuições e descontos sobre parte da retribuição do autor em determinado período de tempo, pelo que o direito à pensão vitalícia reclamada tem a mesma natureza que a pensão de re-forma, não estando sujeito ao prazo de prescrição de um ano previsto no art. 38º da LCT mas ao estabelecido na al. g) do art. 310º do Código Civil.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/6/2011Recurso nº 141/08.6TTLRA.C1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Subsídios de férias e de Natal

I - Resultando os direitos aos subsídios de férias e Natal da existência do con-trato na data dos respetivos vencimen-tos e da lei, compete à entidade empre-gadora a prova do seu pagamento por se tratar de facto extintivo dos direitos reclamados pelo trabalhador.II - No domínio do Código do Trabalho de 2003, nos casos de mora no paga-mento da retribuição por mais de ses-senta dias, o trabalhador pode resolver o contrato, independentemente de culpa do empregador, cabendo-lhe a indemnização prevista no artigo 443º do CT, por força do que vem prescrito no artigo 308º da Lei nº 35/2004.III - Não tendo o A. alegado a existência de danos relevantes provocados pela rutura contratual, justifica-se que a in-demnização de antiguidade prevista no artigo 443º, nº 1, do CT seja fixada em 20 dias.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22/6/2011Recurso nº 71-A/1990.P1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Acidentes de trabalho e de viação – cumulação de indemnizações

I - No âmbito da Lei nº 2127, de 3 de agosto de 1965 [como de resto sucede na legislação que a substituiu], quan-do um acidente reveste a natureza, simultaneamente, de trabalho e de viação, as indemnizações a arbitrar aos seus beneficiários, por cada um des-ses títulos e destinadas a ressarcir os mesmos danos, não se cumulam, por serem complementares, assumindo a

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Sumários - JuriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 61

responsabilidade infortunística laboral caráter subsidiário.II - Com este regime pretende-se evi-tar que os beneficiários recebam uma dupla indemnização pelos mesmos danos, sob pena de se verificar um in-justo enriquecimento daqueles, como sucederia no caso de ser permitida a acumulação das duas indemnizações.III - Porém, a entidade responsável, no âmbito da ação emergente de acidente de trabalho, não deve ser desonerada do pagamento das pensões devidas aos respetivos beneficiários, por não estar demonstrada a duplicação da indemnização, quando, em sede da ação cível, os autores (beneficiários das indemnizações) reduziram o seu pedido para uma quantia global, com o recebimento da qual se deram por integralmente indemnizados de todos os prejuízos, patrimoniais e não patri-moniais, sofridos com o acidente de que foi vítima o sinistrado, sem proce-derem, no respetivo acordo, a qualquer discriminação dos montantes indem-nizatórios imputados a danos não patrimoniais e a danos patrimoniais e, quanto aos últimos, sem referirem se se reportavam a danos patrimoniais da vítima ou se a danos patrimoniais próprios e, em relação a estes, se se re-feriam a danos patrimoniais presentes ou se a danos patrimoniais futuros ou danos indiretos decorrentes da perda de alimentos; nem ainda, sem proce-derem a qualquer distinção do valor atribuído a cada um dos beneficiários.IV - A pretensão da entidade responsá-vel pelo pagamento da pensão fixada por acidente de trabalho, no sentido da desoneração desse pagamento, só poderia ser acolhida se, na ação cível, tivesse sido fixada uma indemnização a favor dos beneficiários por danos patrimoniais indiretos referentes à per-da de alimentos, pois que seria nessa vertente que se verificaria duplicação da indemnização.V - Compete à entidade responsável pelo pagamento da pensão de alimen-tos a fixar no âmbito da ação emer-gente de acidente de trabalho a prova dos factos constitutivos do direito que

invoca, ou seja, de os beneficiários te-rem recebido pelo acidente de viação indemnização respeitante a danos patrimoniais indiretos.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30/6/2011Recurso nº 2933/04.6TTLSB.L1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Contrato de prestação de serviço

I - No contrato de trabalho a prestação funcional é a atividade do trabalhador, a disponibilidade da sua força de tra-balho, que o empregador conforma, organiza e dirige; por contraposição, no contrato de prestação de serviço uma das partes, o prestador obriga-se a proporcionar à outra, não a atividade em si, mas um certo resultado do seu trabalho.II - Por nem sempre constituir tarefa fácil distinguir, através do objeto do contrato, quando se está perante um ou outro desses dois contratos típicos, é pelo relacionamento entre as partes – a subordinação ou a autonomia – que se alcança, em última análise, aquela distinção.III - Ainda assim – e porque em muitas situações decorrentes da diversidade dinâmica das relações da vida social, ju-ridicamente relevantes, há elementos comuns às duas figuras – despistagem do “quid” diferenciador só é alcançável, não raras vezes, com recurso ao cha-mado método indiciário ou de apro-ximação tipológica, impondo-se, em balanceamento final, um juízo global de todos eles, com vista à caracteriza-ção do caso concreto.III - É de qualificar como de prestação de serviços, o contrato pelo qual a autora ao serviço da ré ministrou, em instalações desta, aulas de natação, segundo horários predefinidos por acordo (atendendo, além do mais, às conveniências da autora, que, sendo professora numa outra entidade, não prestava a sua atividade em regime de exclusividade), mediante uma retri-buição fixa mensal, podendo fazer-se substituir, mas suas faltas, por outra pessoa, sem que tivesse que justificar

aquelas e sem que incorresse em res-ponsabilidade disciplinar.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30/6/2011Recurso nº 640/06.4TUGMR.P1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Acidente de trabalho – prestações por morte

I - Um documento exarado pela Au-tora, por si apresentado nos serviços da Segurança Social, em ordem à obtenção de prestações por morte – donde consta que o sinistrado faleceu de morte natural – consubstancia um documento particular que apenas faz prova plena, quanto à declaração ali corporizada, nas relações entre a de-clarante e aquela entidade, tratando-se de prova documental a ser livremente apreciada pelo Tribunal em relação à entidade patronal, conforme resulta do artigo 358º nº 4 do Código Civil.II - Resultando provados factos que determinam o funcionamento da presunção estabelecida no art. 12º, do Código do Trabalho de 2003, está garantido à Autora – enquanto viúva e beneficiária do sinistrado – o direito às prestações destinadas à reparação do acidente de trabalho que vitimou o sinistrado, pois que este, aquando do acidente, exercia as suas funções por conta da Ré, no local de trabalho por esta designado e no tempo em que estava a prestar-lhe trabalho.III - A ausência de prova da retribuição auferida pelo sinistrado implica que o respetivo cálculo se faça de acordo com o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços, a categoria profissional do sinistrado e os usos (art. 26º, nº 5, da LAT), sendo que, de todo o modo, a retribuição não pode, em caso algum, ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação coletiva.IV - Destarte, para efeito do cálculo das prestações emergentes do acidente de trabalho que vitimou o sinistrado, deve atender-se ao valor do salário mínimo nacional vigente à data da sua morte, na falta de outros elementos.

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leGiSlaÇÃo - SínteseVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201162

Ação executivaPort. nº 308/2011, de 21.12

- Terceira alteração à Portaria nº 331-B/2009, de 30 de março, que regulamenta vários aspetos das ações executivas cíveis

Arbitragem voluntáriaLei nº 63/2011, de 14.12

- Aprova a Lei da Arbitragem Voluntária

Cirurgia PediátricaPort. nº 306/2011, de 20.12

- Aprova o programa de formação da área pro-fissional de especialização de Cirurgia Pediátrica

Comarcas piloto – alteração dos quadros de pessoal das secretariasPort. nº 12/2012, de 13.1

- Primeira alteração à Portaria nº 170/2009, de 17 de fevereiro, que aprova os quadros de pessoal das secretarias das comarcas do Alentejo Litoral, Baixo Vouga e Grande Lisboa-Noroeste, procede à conversão de secretarias e transição de fun-cionários e procede à alteração dos quadros de pessoal dos Serviços do Ministério Público do Tribunal da Relação de Coimbra e da Secretaria dos Serviços do Ministério Público do Tribunal da Comarca de Loures

Comissão para a Eficácia das Execuções – acesso aos sistemas de informaçãoPort. nº 2/2012, de 2.1

- Regulamenta o acesso eletrónico da Comissão para a Eficácia das Execuções (CPEE) à informação disponível no sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais (Citius) e no sistema de informação de suporte à atividade dos agentes de execução (SISAAE), e a prática de atos pela CPEE nestes sistemas de informação

Custas processuaisPort. nº 1/2012, de 2.1

- Terceira alteração à Portaria nº 419-A/2009, de 17 de abril, que regula o modo de elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, processa-mento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades

Empreendedorismo e InovaçãoRCM nº 54/2011, de 16.12

- Aprova o Programa Estratégico para o Empreen-dedorismo e a Inovação

RCM nº 55/2011, de 16.12

- Determina a missão e as competências do Conselho Nacional para o Empreendedorismo e a Inovação

Estímulo ao arrendamentoRAR nº 158/2011, de 22.12

- Recomenda ao Governo que promova as medi-das de promoção da reabilitação como estímulo

ao arrendamento por parte da população, e em especial dos jovens

RAR nº 159/2011, de 22.12

- Recomenda ao Governo a avaliação e revisão do apoio ao arrendamento jovem e a promoção da «reabilitação urbana low cost»

Extinção de juízos liquidatáriosPort. nº 320/2011, de 30.12

- Extingue os Juízos Liquidatários dos Tribunais Administrativos e Fiscais do Porto, Coimbra e Sintra

Fundo de Garantia de DepósitosDL nº 119/2011, de 26.12

- Estabelece com carácter permanente o limite legal da garantia de 100 000 euros por parte do Fundo de Garantia de Depósitos e do Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, para o reem-bolso de depósitos constituídos nas instituições de crédito participantes no caso de se verificar a indisponibilidade dos depósitos

Fundos de pensões – empresas de seguroPort. nº 317/2011, de 30.12

- Fixa a taxa a pagar pelas empresas de seguros e entidades gestoras de fundos de pensões, a favor do Instituto de Seguros de Portugal, para o ano de 2012

Imposto sobre os produtos petrolíferos – atualização das taxasPort. nº 320-D/2011, de 30.12 (3ºSupl.)

- Atualiza as taxas do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP), aplicáveis no continente aos petróleos e aos fuelóleos, bem como dos produtos petrolíferos e energéticos que normalmente têm função lubrificante, do gasóleo de aquecimento e de outros combustíveis indus-triais, nomeadamente o carvão e coque, o coque de petróleo e os gases de petróleo usados como combustível, e estabelece a taxa do ISP aplicável à eletricidade.

Iniciativa “Portugal Sou Eu”RCM nº 56/2011, de 16.12

- Aprova a iniciativa «Portugal Sou Eu»

Lei do acesso ao direitoPort. nº 319/2011, de 30.12

- Terceira alteração à Portaria nº 10/2008, de 3 de janeiro, que regulamenta a lei do acesso ao direito

Medicamentos – direitos de proprie-dade industrial - composição de litígios Lei nº 62/2011, de 12.12

- Cria um regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de refe-rência e medicamentos genéricos, procedendo à

quinta alteração ao Decreto-Lei nº 176/2006, de 30 de agosto, e à segunda alteração ao regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos, aprovado em anexo ao Decreto-Lei nº 48-A/2010, de 13 de maio

Medidas de reforço da solidez financeiraLei nº 4/2012, de 11.1

- Procede à terceira alteração à Lei nº 63-A/2008, de 24 de novembro, que estabelece medidas de reforço da solidez financeira das instituições de crédito no âmbito da iniciativa para o reforço da estabilidade financeira e da disponibilização de liquidez nos mercados financeiros

Ministério Público – alteração aos quadros das secretariasPort. nº 309/2011, de 21.12

- Quarta alteração aos quadros das secretarias judiciais e dos serviços do Ministério Público, cons-tantes do mapa anexo à Portaria nº 721-A/2000, de 5 de setembro

Modelos e impressosPort. nº 311-A/2011, de 27.12 (Supl.)

- Aprova os modelos de impressos a que se refere o nº 1 do artigo 57º do Código do IRS

Port. nº 311-B/2011, de 27.12 (Supl.)

- Aprova a declaração Modelo nº 39 - Rendimen-tos e retenções a taxas Liberatórias - e respetivas instruções de preenchimento

Port. nº 311-C/2011, de 27.12 (Supl.)

- Aprova a declaração Modelo nº 37 - Juros e Amortizações de Habitação Permanente, pré-mios de Seguros de Saúde, Vida e Acidentes Pessoais, PPR, Fundos de Pensões e Regimes Complementares - e respetivas instruções de preenchimento

Negócios estrangeiros – tabela de emolumentosPort. nº 320-C/2011, de 30.12 (2ºSupl.)

- Aprova a Tabela de Emolumentos Consulares, a cobrar pelos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros

Opções do Plano para 2012-2015Lei nº 64-A/2011, de 30.12 (Supl.)

- Aprova as Grandes Opções do Plano para 2012-2015

OE para 2012Lei nº 64-B/2011, de 30.12 (Supl.)

- Aprova o Orçamento do Estado para 2012

Orçamento suplementar da ARRAR nº 160/2011, de 26.12

- Segundo orçamento suplementar da Assembleia da República para 2011

PriNCiPal leGiSlaÇÃo PuBliCada1ª e 2ª Séries do Diário da República de 10 de dezembro a 13 de janeiro de 2012

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leGiSlaÇÃo - Síntese VIDA JUDICIÁRIA - dezembro 2011 63

Orçamento do Estado para 2012 Lei nº 64-C/2011, de 30.12 (Supl.)

- Aprova a estratégia e os procedimentos a adotar no âmbito da lei de enquadramento orçamental, bem como a calendarização para a respetiva im-plementação até 2015

REGIÕES AUTÓNOMAS- AçoresOrçamento Açores 2012RALRA Açores nº 28/2011/A, de 30.12

- Primeira alteração do Orçamento Ordinário da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores para o ano de 2012

Açores – Orçamento para 2012DLR nº 3/2012/A, de 13.1

-Aprova o Orçamento da Região Autónoma dos Açores para 2012

- MadeiraFundo de Estabilização Tributária da MadeiraDLR nº 22/2011/M, de 26.12

- Procede a alterações no montante e condições de transferências de receitas para o Fundo de Estabili-zação Tributária da Região Autónoma da Madeira

IRS – IRC – taxas de impostoDLR nº 20/2011/M, de 26.12

- Define as taxas do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e do imposto sobre o ren-dimento das pessoas coletivas

Orçamento Madeira 2012RALRA Madeira nº 16/2011/M, de 28.12

- Aprova o Orçamento da Assembleia Legislativa da Madeira para o ano de 2012

Port. nº 314/2011, de 29.12

- Aprova a declaração modelo 10 do IRS e do IRC e as respetivas instruções de preenchimento.

IRS 2011 - sobretaxa extraordinária – pedido de inconstitucionalidadeRALRA Madeira nº 3/2012/M, de 11.1

- Pedido de inconstitucionalidade e de ilegalidade da norma contida no nº 4 do artigo 2º da Lei nº 49/2011, de 7 de setembro - aprova uma sobretaxa extraordinária sobre os rendimentos sujeitos a IRS auferidos no ano de 2011

Taxa - bonificaçõesAviso nº 24172/2011, de 19.13 (II série)

- Aprova a taxa de referência para o cálculo das bonificações (TRCB) a vigorar entre 1 de janeiro e 30 de junho de 2012, fixando-a a é de 2,199 %.

Taxa de juros comerciaisAviso nº 692/2012, de 17.1 (II série)

- Aprova a taxa supletiva de juros moratórios relativamente a créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas, em vigor no 1º semestre de 2012, fixando-a nos 8%

TRABALHO E SEGURANÇA SOCIALAssistência na doençaPort. nº 305/2011, de 20.12

- Regulamenta o direito de assistência na doença para todos os funcionários diplomáticos colocados nos Serviços Externos, cônjuge e descendentes que com ele vivam em economia comum

Regime da renda apoiadaRAR nº 151/2011, de 22.12

- Recomenda ao Governo que reavalie o atual regime de renda apoiada com base em critérios de maior sensibilidade social e que promova as medidas que se afigurem necessárias para minorar os efeitos da sua aplicação

RAR nº 152/2011, de 22.12

- Recomenda ao Governo que reavalie o atual re-gime de renda apoiada, aplicável a nível nacional, segundo um princípio de igualdade e justiça social

RAR nº 153/2011, de 22.12

-Revisão do regime de renda apoiada

Taxas moderadoras do SNS – condições de isençãoPort. nº 311-D/2011, de 27.12 (Supl.)

- Estabelece os critérios de verificação da condição de insuficiência económica dos utentes para efei-tos de isenção de taxas moderadoras e de outros encargos de que dependa o acesso às prestações de saúde do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Atualização das pensões mínimas do regime geral de segurança socialPort. nº 320-B/2011, de 30.12 (2ºSupl.)

- Estabelece, nos termos da Lei do Orçamento de Estado para 2012, as normas de execução da atualização transitória para o ano de 2012 das pensões mínimas do regime geral de segurança social, do regime especial de segurança social das atividades agrícolas (RESSAA), do regime não contributivo e regimes a este equiparados, dos regimes transitórios dos trabalhadores agrícolas e do complemento por dependência e das pensões mínimas de aposentação, reforma e invalidez atribuídas pela Caixa Geral de Aposentações, I. P

Pensões – setor bancáriosDL nº 127/2011, de 31.12

- Procede à transmissão para o Estado das res-ponsabilidades com pensões previstas no regime de segurança social substitutivo constante de ins-trumento de regulamentação coletiva de trabalho vigente no setor bancário

Revisão excecional do preço dos medi-camentosPort. nº 3/2012, de 2.1

- Autoriza a revisão do preço do medicamento a título excecional

Port. nº 4/2012, de 2.1

- Estabelece as regras de formação dos preços dos medicamentos, da sua alteração e da sua revisão anual, bem como os respetivos prazos

Contratos a termo – renovaçãoextraordináriaLei nº 3/2012, de 10.1

- Estabelece um regime de renovação extraordiná-ria dos contratos de trabalho a termo certo, bem como o regime e o modo de cálculo da compensa-ção aplicável aos contratos objeto dessa renovação

Tribunal de ContasLei nº 2/2012, de 6.1

- Procede à oitava alteração à Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, aprovada pela Lei nº 98/97, de 26 de agosto

Tribunais – serviço de turnosAviso nº 24722/2011, de 27.12 (II série)

- Aprova o regime de organização de turnos para assegurar o serviço urgente previsto no Código de Processo Penal, na Lei de Saúde Mental e na Lei Tutelar Educativa que deva ser executado aos sábados, nos feriados que recaiam em segunda- -feira e no 2º dia feriado, em caso de feriados consecutivos.

Valor médio de construçãoPort. nº 307/2011, de 21.12

- Fixa o valor médio de construção, por metro quadrado para vigorar no ano de 2012

ACÓRDÃOSSupremo Tribunal AdministrativoCategoria de professor titularAcórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº 3/2011, de 21.12

- Uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: no regime do concurso de acesso para lugares da categoria de professor titular, tal como se mostra vertido no Decreto-Lei nº 200/2007, de 22 de maio, as faltas por doença dadas pelos docentes nos cinco anos atendíveis relevavam na consideração do fator «assiduidade».

disponíveis em www.dgsi.ptaCÓrdÃoS do StJ

iNveStiGaÇÃo da PaterNidadeSumário:“i - O estabelecimento da paternidade insere-se no acervo dos direitos pessoalíssimos, entre os quais, o de conhecer e de ver reconhecida a verdade biológica da filiação, a ascendência e marca genética de cada pessoa.

ii - Contém, em si mesmo, por isso, o direito de investigar a maternidade ou paternidade.iii - Tal direito fundamental tem proteção constitucional, como vertente que é, do direito à integridade moral, à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade (arts. 16º, 18º, 25º, nº 1, e 26º da CRP).

iv - O Estado não pode, pois, restringir o assen-tamento da filiação/identidade pessoal, através de prazos de caducidade, sejam eles quais forem.v - O direito de investigar a paternidade ou maternidade é, portanto, imprescritível, não se justificando qualquer limite temporal para o seu exercício.

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leGiSlaÇÃo - SínteseVIDA JUDICIÁRIA - dezembro 201164

vi - O douto Ac. do TC nº 26/2006, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do nº 1 do art. 1817º do CC “… na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante”, apesar da aparente limitação do seu segmento decisório, contém em si a ideia de imprescritibilidade das ações que tenham por objeto o reconhecimento judicial da paternidade ou maternidade.vii - A redação atual do nº 1 do art. 1817º do CC, conferida pela Lei nº 14/2009, é também ela inconstitucional, por violação dos arts. 16º, nº 1, 18º, 25º, nº 1, 26º, nº 1, e 36º, nº 1, da CRP.”.(Proc. nº. 193/09.1TBPTL.G1.S1, de 10/1/2012).

PeNSÃo de SoBrevivêNCiaSumário: “i - À luz do regime instituído pelo DL nº 322/90, de 18-10, Decreto Regulamentar nº 1/94, de 18-01, e Lei nº 7/2001, de 11-05 (na redação anterior à Lei nº 23/2010, de 30-08) para que o membro sobrevivo de uma relação de facto tivesse direito às prestações sociais do regime geral da segurança social decorrente do óbito do companheiro(a) beneficiário(a), tinha de provar, cumulativamente, os seguintes requisitos, tidos como elementos constitutivos do direito: 1º que vivia com o beneficiário falecido há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges; 2º que o beneficiário falecido era pessoa, não casada, ou, sendo casada, se encontrava sepa-rada judicialmente de pessoas e bens; 3º que o companheiro sobrevivo carecia de alimentos; e, 4º que os não podia obter de nenhuma das pessoas referidas nas als. a) a d) do art. 2009º do CC, nem da herança do falecido companheiro, quer porque não existiam bens, quer porque, a existirem, eram insuficientes.ii - A Lei nº 23/2010 veio introduzir importantes alterações na Lei nº 7/2001, designadamente, mantendo o direito de acesso às prestações sociais em causa, estabelecendo que o mem-bro sobrevivo da união de facto tem direito à prestação por morte, segundo o regime geral ou especial da segurança social, independente-mente da necessidade de alimentos, bastando provar a união de facto há mais de dois anos à data da morte do beneficiário – cf. art. 6º da Lei nº 7/2001, na redação introduzida pelo art. 1º da Lei nº 23/2010.iii - O óbito do beneficiário é o elemento deter-minante do direito à atribuição da pensão de sobrevivência e subsidio por morte, não sendo elemento constitutivo desse direito. A Lei nº 23/2010 não restringiu o seu campo de aplicação ao estatuto pessoal de membro sobrevivo de uma união de facto dissolvida no seu domínio, ou seja, após o início da sua vigência.iv - A Lei nº 23/2010 regula diretamente este novo estatuto pessoal, abstraindo do facto que lhe deu origem: como é evidente, tal situação jurídica prolonga-se no tempo, independente-mente do momento em que se constituiu, i.e., da dissolução, por morte de um dos seus membros, da união de facto pré-existente. v - Há que distinguir entre a entrada em vigor e a produção de efeitos da Lei nº 23/2010: a) como não foi estabelecida qualquer vacatio legis na lei, ela entrou em vigor no 5º dia após a respetiva publicação; b) nos termos do art. 6º da Lei nº 23/2010, a aplicação da lei (nova) à situação concreta, implica que o direito às prestações sociais abrange apenas as prestações que se

vencerem a partir da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2011. (Proc. nº 1938/08.2TBCTB.C1.S1de 10/1/2012).

SoCiedade aNÓNiMa – aNulaBilidade de deliBeraÇÃoSumário:” i - Do conceito de “questões”, a que alude o nº 2 do art. 660º do CPC, que se relaciona com a definição do âmbito do caso julgado e com a nulidade por omissão de pronúncia, excluem-se as questões prévias ou prejudiciais ao conhecimento do mérito, mas, também, os raciocínios, argumentos, razões, considerações, pressupostos ou fundamentos produzidos pelas partes para a defesa dos seus pontos de vista que, podendo constituir “questões”, em sentido lógico ou científico, não integram matéria de decisão jurisdicional.ii - A anulabilidade da deliberação que rejeitou submeter a votação da assembleia geral a proposta de um acionista, determinando o seu desaparecimento da ordem societária, implica, consequentemente, que a assembleia fique subordinada ao assunto definido pela ordem do dia constante do respetivo aviso convoca-tório, com repetição dos trabalhos, que serão retomados com referência ao momento em que ocorreu o vício determinante da anulabilidade verificada, sem necessidade de uma delibera-ção substitutiva, nem de condenação expressa da ré-sociedade nesse sentido, observando a nova assembleia a ordem do dia, previamente, estabelecida, que se mantém, válida e regular.iii - Não podem ser excluídas do direito de voto as ações que, à data da deliberação social anulanda, faziam parte da carteira de títulos do acionista, alegadamente, impedido de participar na votação, sendo certo que só poderão discutir e votar na futura assembleia geral que vier a ser convocada, onde o eventual impedimento poderá ser deduzido, aqueles que detiverem o estatuto de acionistas, de acordo com a lei e o contrato social.iv - O impedimento do acionista em participar na votação de uma proposta não constitui inibi-ção do direito de voto do capital social por ele, anteriormente, detido, e cuja transmissão para outrem se operou, dada a natureza das ações ao portador que, na sua totalidade, o compunham.v - A votação da “coletividade dos sócios” que rejeitou submeter uma proposta a deliberação da assembleia é uma inequívoca deliberação dos sócios, e não uma mera decisão, sendo certo que inexistem decisões coletivas dos acionistas reu-nidos em assembleia geral que não se compre-endam no conceito de “deliberações dos sócios”.vi - A inutilização da deliberação negativa, através da ação de impugnação judicial, apenas conduz à restauração da situação anterior, sem que tal signifique, necessariamente, a conversão da deliberação negativa em deliberação positiva.vii - As menções do aviso convocatório não re-querem um grau de pormenor tão elevado como o que se exige para as propostas a apresentar à assembleia, sendo suficiente a identificação do thema deliberandum, de forma direta e acessível, de modo a permitir aos interessados os elementos mínimos de informação que lhes permitam conhecer, de modo satisfatório, a concreta questão sobre que se deverá deliberar.viii - A inclusão como ponto suplementar da ordem do dia da assembleia de uma proposta de declaração de anulação dos atos praticados

pelos administradores não extravasa o âmbito do assunto objeto da convocatória, que consistia na apreciação e posicionamento das iniciativas empreendidas pelo conselho de administração da sociedade, relativamente à execução de uma deliberação tomada em assembleia geral preté-rita, não constituindo, portanto, uma questão nova ou desprovida de clareza suficiente.iX - Só a impugnação judicial do conteúdo de deliberações substantivas da assembleia geral de uma sociedade e não a impugnação do procedimento de deliberações instrumentais aquelas conducentes constitui matéria da re-serva exclusiva dos tribunais. X - Não relevando na motivação da rejeição da proposta apresentada por um acionista à votação da respetiva assembleia um determi-nado fundamento, atento o teor da deliberação impugnada, não pode o mesmo relevar, em sede de recurso jurisdicional, por tal constituir violação do princípio da proibição do efeito surpresa das decisões.”. (Proc. n º 515/07.0TBAGD.C1.S1, de 10/1/2012).

Credor SoCialSumário: “i - O estatuto económico da sociedade co-mercial é fator decisório do crédito que lhe é concedido, não se limitando apenas ao capital social, mas também tendo em consideração o estofo patrimonial da empresa (sociedade) que possa «tranquilizar» os seus credores. ii - Aliás, há que ter em atenção que, como ensina o Prof. Pereira de Almeida, costuma-se dizer que o capital social é a garantia comum dos credores, carecendo tal afirmação de ser explicada. Na ver-dade, diz o citado Professor que «o capital social figura no balanço como «rubrica do passivo» e a garantia dos credores é certamente constituída pelo ativo», acrescentando, mais adiante, que «o capital social distingue-se do património, o qual constitui efetivamente a garantia geral dos credores ( artº 601º do C. Civil)». iii - Logo, as normas que tutelam a conservação ou promovam o aumento desse património têm também em vista a sua proteção, na expressão de Ilídio Rodrigues, na obra referida no texto deste aresto. iv - Só assim se entende que o legislador te-nha estabelecido o enlace normativo entre a inobservância culposa das disposições legais destinadas à proteção dos credores sociais e a insuficiência do património social para a satis-fação dos respetivos créditos, na previsão do nº 1 do artº 78º do CSC. v - Em conclusão, a diminuição do património social produzida pela inobservância de normas legais do direito societário, constitui um dano direto da sociedade, desde que se verifique o necessário nexo de causalidade e um dano indireto dos credores sociais, desde que essa diminuição se torne insuficiente para a satisfação dos respetivos créditos. vi - Consequentemente, as normas legais ino-bservadas, na medida em que da sua violação resultam danos (ainda que indiretos) para os credores da sociedade, visam igualmente evitar tais danos, logo, proteger também os referidos credores, e não somente lhes aproveitam. vii - Este é o critério teleológico-racional que se mostra mais ajustado, não só no plano jurídico-societário, como no aspeto da realidade sócio-económica e empresarial.(Proc. Nº 916/03.2TBCSC.L1.S1, de 12/1/2012)”.

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