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Seminário sobre Paredes de Alvenaria, P.B. Lourenço et al. (eds.), 2007 157 INOVAÇÃO NAS ARGAMASSAS DE CONSTRUÇÃO PARA ALVENARIA Carlos M. DUARTE Engenheiro Químico- Industrial, FEUP, 1968. Presidente da APFAC, Associação Portuguesa dos Fabricantes de Argamassas de Construção Lisboa [email protected] SUMÁRIO Apresenta-se o historial das argamassas fabris em Portugal, com dados estatísticos e perspectivas de desenvolvimento, referindo ainda o modo de fabrico e as vantagens da sua aplicação face às argamassas tradicionais. Aborda-se a questão das argamassas destinadas à utilização em paredes de alvenaria, tipos de fornecimento e de aplicação em obra. Por fim tecem-se considerações sobre o futuro das argamassas em Portugal. 1. INTRODUÇÃO As primeiras argamassas fabris em Portugal foram produzidas durante os anos 70/80 do século XX, resumindo-se ao fabrico de Colas de Construção, vulgarmente conhecidas por cimentos- cola.

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Seminário sobre Paredes de Alvenaria, P.B. Lourenço et al. (eds.), 2007 157

INOVAÇÃO NAS ARGAMASSAS DE CONSTRUÇÃO PARA ALVENARIA

Carlos M. DUARTE Engenheiro Químico-Industrial, FEUP, 1968. Presidente da APFAC, Associação Portuguesa dos Fabricantes de Argamassas de Construção Lisboa [email protected]

SUMÁRIO Apresenta-se o historial das argamassas fabris em Portugal, com dados estatísticos e perspectivas de desenvolvimento, referindo ainda o modo de fabrico e as vantagens da sua aplicação face às argamassas tradicionais. Aborda-se a questão das argamassas destinadas à utilização em paredes de alvenaria, tipos de fornecimento e de aplicação em obra. Por fim tecem-se considerações sobre o futuro das argamassas em Portugal.

1. INTRODUÇÃO As primeiras argamassas fabris em Portugal foram produzidas durante os anos 70/80 do século XX, resumindo-se ao fabrico de Colas de Construção, vulgarmente conhecidas por cimentos-cola.

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O nosso país teve sempre uma ancestral tradição de colagem de azulejos e, provavelmente devido à influência de emigrantes portugueses em França, que no seu regresso à pátria foram trazendo novas técnicas de construção e novos produtos, o recurso ao cimento-cola preparado em obra foi cedendo posição ao produto com origem fabril. De França vieram, igualmente por meio da importação, as monomassas, ou seja rebocos com cor na massa, muito utilizadas naquele país. Não se pode esquecer que a França constitui em muitas áreas e em particular na Construção, uma referência para Portugal.

2. PERÍODO ATÉ 2000 Além da actividade fabril relativa ao cimento-cola, e ainda durante os referidos anos 80, uma empresa registou uma marca de reboco hidráulico e fez algumas experiências de aplicação em obra com reboco ensacado. O desenvolvimento das argamassas fabris veio a assumir importância durante os anos 90, com especial importância para os rebocos, as monomassas, os cimentos-cola e as juntas em cor. Aliás, foi durante esta década que a preparação de cimento-cola em obra praticamente desapareceu. Entretanto, a obra da Exposição Mundial que teve lugar em Lisboa em 1998 (Expo’98), transformou a zona oriental da cidade num imenso estaleiro, em 60 hectares até então ocupados com empresas ligadas à refinação de petróleo, terrenos de uso militar e portuários. A qualidade exigida para os edifícios, a imposição de cumprimento rigoroso de prazos e algum desafogo orçamental, constituíram um impulso notável na aplicação de técnicas de construção e de utilização de novos produtos. A seguir à Expo’98 e nos terrenos situados ao longo do rio Tejo que foram infra-estruturados, desenvolveu-se uma intensa actividade de construção de habitação de elevado nível, que começou a recorrer em exclusivo a argamassas fabris, assistindo-se ao aparecimento dos primeiros silos em obra, alimentados com argamassas a granel. No resto do país, em especial nas zonas urbanas do Porto, do Algarve e de outras cidades, assistia-se desde o início da década de 90, a um crescimento desenfreado da construção nova, criando excedentes de oferta que ainda hoje se fazem sentir, em detrimento da Reabilitação de edifícios antigos dos núcleos urbanos, cada vez mais desertificados na sua função habitacional.

3. PERÍODO APÓS 2000 No início do século XXI já existia em Portugal um conjunto razoável de empresas nacionais e multinacionais, modernas e bem equipadas, que sentiram a necessidade da criação de uma Associação.

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Em consequência, no ano de 2002, pela iniciativa de cinco empresas, criou-se a Associação Portuguesa de Fabricantes de Argamassas de Construção, APFAC [1], que rapidamente duplicou o número de associados, tendo iniciado um conjunto importante de actividades de divulgação das argamassas fabris. Hoje, a APFAC conta com 15 associados fabricantes de argamassas, que representam mais de 80% do mercado (em Euros). Desde a sua fundação e em representação de Portugal, a APFAC filiou-se na EMO, European Mortar Industry Organization [2], que é a Federação Europeia de Fabricantes de Argamassas, com sede em Duisburg, na Alemanha. Sendo conhecida a existência de um dicionário europeu de termos relacionados com as argamassas, por iniciativa da EMO, designado por EMODICO [2], utilizando os idiomas alemão, espanhol, francês e inglês, a APFAC efectuou a sua tradução para português, tendo a EMO adoptado esse trabalho, passando assim a nossa língua a integrar o referido dicionário, que se encontra disponível nos sítios internet da APFAC e da EMO. 4. SITUAÇÃO ACTUAL DO SECTOR EM PORTUGAL Os quadros seguintes descrevem a situação do sector das argamassas em Portugal, com dados relativos aos anos de 2003 a 2006, sendo os dados da responsabilidade da APFAC, que os recolhe anualmente, recorrendo a estimativas na sua ausência.

Quadro 1: Sector das Argamassas em Portugal (valores de 2006. Fonte: APFAC) Número de empresas Cerca de 30, sendo 15 associadas da APFAC Argamassas fabris Secas 1 196 720 toneladas Argamassas fabris Estabilizadas 85000 m3 (equivalentes a 152 717 toneladas

de argamassas fabris Secas ETICS 185000 m2 Valor da produção Acima de 101 milhões de Euros Estimativa da produção de argamassas em estaleiro (método tradicional)

Entre 3 a 5 milhões de toneladas

As Argamassas fabris Secas são fornecidas em saco e/ou granel (destinadas a silos colocadas em obra), necessitando da adição de água para realizar a amassadura. As Argamassas fabris Estabilizadas são fornecidas a granel (destinadas a tinas colocadas em obra), nas condições de aplicação, conservando-se utilizáveis por períodos em geral até 36 horas.

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Quadro 2: Produção de argamassas fabris (secas e estabilizadas) em Portugal. Fonte: APFAC

Anos Quantidade, toneladas 2003 860 000 2004 1 006 000 2005 1 195 000 2006 1 349 437

Conforme se pode observar pelo Quadro 2, as argamassas fabris têm tido um crescimento sistemático, apesar de no período considerado se ter observado uma redução significativa de actividade na construção nova.

Quadro 3: Argamassas fabris secas em Portugal, por famílias, 2006. Fonte: APFAC

Famílias Norma Europeia Peso percentual Rebocos EN 998-1 41.6 Cimentos-cola EN 12004 22.9 Argamassas de Alvenaria EN 998-2 21.5 Monomassas EN 998-1 4.4 Pavimentos EN 13813 3.9 Juntas em Cor EN 13888 0,9 Outras argamassas Diversas 4,8

O Quadro 3 mostra as percentagens de cada família de Argamassas Secas e respectiva Norma EN aplicável (referem-se apenas as Normas nucleares, ou seja, aquelas onde constam as definições), destacando-se a importância dos rebocos, logo seguidos dos cimentos-cola, sendo esta importância devida à tradição nacional secular de uso de cerâmica como revestimento. Foi também no período pós Expo’98, que surgiram em Portugal os silos (geralmente de 20 m3 de capacidade, ou seja, capazes de armazenarem cerca de 25 a 30 toneladas de produto) destinados a argamassas a granel. De início, apenas as obras muito grandes recebiam silos, mas desde 2005 que o crescimento do número de silos foi muito elevado, estimando-se que no final de 2006 deveria haver mais de 800 silos activos em Portugal.

Quadro 4: Argamassas secas em Portugal, por tipo de fornecimento. Fonte: APFAC Fornecimento 2004 2005 2006

Granel 260.000 331.550 397.174 Saco 665.000 723.024 799.546

Total, Argamassas Secas, t 925.000 1.054.574 1.196.720 Como se pode ver, o crescimento dos fornecimentos a granel tem crescido a uma velocidade superior ao crescimento do produto fornecido em saco. Atendendo ao número estimado de silos activos, tomando o ano de 2006, a carga média por silo foi de 496 toneladas.

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Como em média cada silo admite 30 toneladas, isso significa que no ano de 2006, cada silo foi carregado 17 vezes. Ora, um silo deve ser, em média, alimentado uma vez por semana, donde a produtividade do uso de silo em Portugal ainda representa apenas 33% do seu máximo. Este valor modesto é admissível numa fase em que os silos, frequentemente, são um meio promocional do fabricante, pois ao permanecer numa obra urbana, por vezes em locais de eleição em termos de visibilidade, funcionam melhor que um “outdoor”, sem custos, nem licenças camarárias. Relativamente às quantidades de argamassas preparadas em obra (tradicionais, não fabris), uma vez mais não se conhecem com rigor as quantidades envolvidas no nosso país. Perante a falta de elementos fiáveis, a situação pode quantificar-se por um número que se situa entre 4 e 5 milhões de toneladas. Tem sido à custa desta quantidade notável que os fabricantes de argamassas têm vivido sem sentirem o decréscimo da construção nova, excepto no caso de argamassas de colagem. Com efeito, desde há muitos anos que os cimentos-cola são a 100% de origem fabril e por isso, os fabricantes que dependem dessas argamassas notam quebra de vendas devido à redução de actividade da Construção Nova. O mesmo não se passa relativamente às outras argamassas (de assentamento de alvenarias, de reboco, de pavimento) onde ainda hoje, maioritariamente, a origem é a preparação em obra. Assim, no gráfico 1, mostram-se as diversas variáveis em jogo:

Figura 1: Construção nova, reabilitação e crescimento das argamassas fabris em Portugal, no período de 2005 a 2015. Fonte: APFAC

No período de 2005 a 2015, o decréscimo na actividade de Construção Nova está instalado no nosso país, devendo estabilizar ao fim de alguns anos. Ao mesmo tempo, a actividade da Reabilitação tem crescido com ritmo assinalável (segundo o Euroconstruct, o valor em Portugal em 2005 é de 21%, quando o valor conhecido de há 5 ou 6 anos era inferior a 10%). Esse crescimento percentual não é apenas devido ao decrescimento da Construção Nova, mas também ao crescimento efectivo de m2 reabilitados. De igual forma, esse crescimento estabilizará, porventura em cerca de 40%, se o modelo europeu actual se aplicar a Portugal. No período de 2005 a 2015, a substituição das argamassas preparadas em obra por argamassas fabris manter-se-á activa e segundo a APFAC estima-se que no termo do período as

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argamassas fabris representem mais de 80% do total de argamassas que deverá situar-se um pouco acima dos 3 milhões de toneladas por ano. Esse objectivo é realista, porquanto na Europa as argamassas fabris representam hoje mais de 80% do total, atingindo em países como a Alemanha, valores bem acima dos 90%. 5. VANTAGENS DO USO DE ARGAMASSAS FABRIS Muito se tem escrito e discutido sobre as vantagens do uso de argamassas fabris, situação que é um pouco estranha, pois o mesmo não sucede com outros Produtos da Construção, onde a origem fabril nem sequer é questionada. Com efeito, um edifício actual sujeito a regulamentos exigentes, envolvendo ferramentas de projecto e de execução tecnologicamente avançadas, utilizando produtos e sistemas sofisticados, dispondo de Ficha Técnica e de Ficha de Segurança, de elevado desempenho energético, não deve utilizar argamassas preparadas em obra, sob pena de não haver coerência na selecção dos produtos. A Directiva Europeia dos Produtos da Construção (89/106/EEC) que veio a dar origem às Normas EN que regulam as argamassas e por aplicação destas, a obrigar ao uso da Marcação CE em argamassas fabris, certamente não teve, na sua essência, a perversidade de dispensar as argamassas preparadas em obra da observância das Normas que se exigem às argamassas fabris. Naturalmente o espírito da Directiva prevê que o recurso a argamassas não fabris deve ser temporário, sendo rapidamente substituído por argamassas fabris, pois são esses produtos que podem ser controlados, registados, certificados, numa palavra, responsabilizados. O conjunto de vantagens das argamassas fabris sobre as argamassas tradicionais é vasto, inventariando-se de seguida as mais importantes:

• As composições são estudadas • As normas são cumpridas (no limite, pode ser exigido o seu cumprimento) • Os fabricos são rigorosos, acompanhados com registos, permitindo a rastreabilidade • As propriedades das argamassas são consistentes • Existe a possibilidade de fabrico à medida (segundo uma formulação específica) • Existe uma ficha técnica e uma ficha de segurança • Promovem a produtividade na aplicação • O desperdício é reduzido: nas matérias-primas, na energia e na aplicação • Contribuem para a organização e redução de espaço ocupado pelo estaleiro

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A última vantagem é muito importante do ponto de vista do estaleiro, em especial em obras que decorrem em ambiente urbano, em zonas de acesso e tráfego limitado nas cidades, pois é possível armazenar as argamassas no estaleiro minimizando a área ocupada. Adicionalmente, pode afirmar-se que as argamassas preparadas em estaleiro, sistematicamente, usam ligantes em excesso, facto que além de ter consequências no custo (contribuindo para o desperdício de energia e formação de CO2), pode originar patologias do tipo fissuração. 6. ARGAMASSAS FABRIS PARA PAREDES DE ALVENARIA A disponibilidade de argamassas fabris para as paredes de alvenaria é muito vasta:

1. Argamassas de assentamento de alvenaria 2. Argamassas de reboco e monomassas 3. Colas de construção e juntas de cor 4. ETICS

6.1. Argamassas de Assentamento de Alvenaria Na construção de uma parede de alvenaria (interior ou exterior), a ligação entre os tijolos ou blocos de cimento é assegurada por uma argamassa de assentamento de alvenaria ou simplesmente, como muitos fabricantes se referem, argamassa de alvenaria. Existe uma Norma (EN 998-2) [3] que obriga estas argamassas a terem Marcação CE [3], segundo o sistema 2+, desde Fev.2005. As argamassas de assentamento obedecem a classes que exprimem a sua resistência à compressão (as variedades correntes são M1, M2.5, M5, M10, M15 e M20, indicando o número o valor da resistência à compressão em N/mm2). Naturalmente, a selecção da argamassa a utilizar deve levar em conta a função da parede. Sendo apenas uma parede divisória, sem função estrutural, a prestação exigida à argamassa é menos exigente. No mercado nacional existem dois tipos de argamassas de assentamento: secas (ou prontas a amassar) e estabilizadas (ou prontas a usar). Estas últimas são fornecidas à obra em condições de aplicação imediata, mantendo-se utilizáveis durante um período que pode atingir as 36 horas, devido a aditivos estabilizantes que atrasam a presa do ligante. No entanto, as mais vulgares no nosso país são as argamassas de assentamento secas, fornecidas em saco ou a granel, sendo esta última destinada a silos colocados na obra. A aplicação é feita do modo tradicional (manual, com auxílio colher de pedreiro).

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As argamassas de assentamento hidrofugadas são obrigatoriamente utilizadas sempre que a argamassa fica exposta, ou seja, sujeita à acção da chuva, para impedir que a água penetre na parede. Existem argamassas de alvenaria ditas de camada fina, aplicáveis na construção de paredes exigindo tijolos de grande regularidade geométrica, e um equipamento de aplicação que deposita a camada (fina) em cima da fileira de tijolos por meio de um bico de pato, mas não são ainda comuns em Portugal. Face às novas exigências no âmbito do isolamento térmico dos edifícios, os novos desenvolvimentos devem integrar a melhoria das propriedades térmicas destas Argamassas. As soluções (que já existem) de Argamassas que recorrem a espuma de poliuretano em substituição do ligante cimentício, embora possam exibir bom comportamento mecânico e de isolamento térmico, não garantem a resistência ao fogo e ao envelhecimento. 6.2. Argamassas de Reboco e Monomassas Os rebocos são as argamassas mais conhecidas e porventura as mais antigas que se conhecem. Entre nós há muitas variedades, destinadas a uso no interior e no exterior, em cinzento e branco, aplicados em camada simples ou dupla, com diversos tipos de textura, conforme o acabamento final previsto. A aplicação pode ser do tipo manual ou com máquina. Existe uma Norma (EN 998-1) [3] que obriga estas argamassas a terem Marcação CE, segundo o sistema 4, desde Jan.2005. As argamassas de reboco classificam-se em classes, segundo a sua resistência à compressão (CS I, CS II, CS III e CS IV), impondo a última classe um valor igual ou superior a 6 N/mm2. Tal como acontece com as argamassas de assentamento, face às novas exigências no âmbito do isolamento térmico dos edifícios, os novos desenvolvimentos devem integrar a melhoria das propriedades térmicas destas argamassas. Em Portugal, a maioria das argamassas de reboco são secas, requerendo a sua mistura com água na aplicação. Também existem argamassas de reboco estabilizadas que são fornecidas à obra nas condições de aplicação, ou seja, já misturadas com a água de amassadura. Essas argamassas têm aditivos estabilizantes que prolongam a sua vida útil durante 30 a 36 horas. Contrariamente às argamassas de reboco secas, com muitas variedades, as argamassas estabilizadas apresentam em geral uma única variedade. As monomassas são rebocos que apresentam cor. Trata-se de um produto com larga utilização em França e noutros países da UE. As monomassas são fornecidas apenas em saco. Curiosamente, apesar de em Portugal o consumo ser modesto, há exportação, com alguma expressão. As monomassas apresentam dificuldades de afirmação no mercado nacional devido a questões de preço elevado e de problemas resultantes da aplicação. Com efeito, estando disponível uma grande panóplia de cores, o recurso a cores fortes levanta frequentemente problemas de

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homogeneidade de cor final no edifício, porque a variação das condições climáticas durante a aplicação pode originar o aparecimento desse tipo de patologias. Outros aspectos delicados são a exigência de grande rigor em termos de mistura (a regulação da água tem de ser constante), de espessura aplicada e de acabamento da superfície. Essa situação é ainda agravada quando se utilizam no mesmo edifício lotes de fabricos diferentes, pois podem ocorrer – em especial com as cores fortes – desvios de tonalidade que ressaltam visíveis nas fachadas, sobretudo sob condições de forte iluminação. Finalmente, trata-se de uma aplicação muito exigente no que respeita à limpeza e aos cuidados na remoção de andaimes, que deixam vestígios nos locais de fixação. Tal como acontece com as argamassas de reboco, por se tratar de um acabamento final (com a agravante de ficar à vista), face às novas exigências no âmbito do isolamento térmico dos edifícios, os novos desenvolvimentos devem integrar a melhoria das propriedades térmicas das monomassas. 6.3. Colas de Construção e Juntas de Cor As colas de construção (vulgarmente conhecidas por cimentos-cola) são as argamassas fabris mais antigas em Portugal, sendo actualmente desprezável a preparação em obra. As colas de construção seguem a Norma NP EN 12004 [3] (existe a versão em português), que obriga estas argamassas a respeitar a Marcação CE, segundo o sistema 3, desde Abril de 2004. Em termos gerais, a Norma classifica as colas de construção nos três tipos seguintes: C: Cimentos-cola D: Adesivos em dispersão R: Colas reactivas E ainda nas classes seguintes, combináveis com os tipos anteriores: 1: Cola normal 2: Cola melhorada F: Cola de presa rápida T: Cola com deslizamento reduzido E: Cola com tempo aberto alongado Assim, a designação C1 corresponde a cimento-cola de presa normal, C2E é um cimento-cola melhorado e tempo aberto alongado e D2TE a um adesivo em dispersão melhorado com deslizamento reduzido e tempo aberto alongado. A Norma veio colocar ordem e clareza numa família de argamassas onde as solicitações na função são extremamente diversificadas: um produto para colar azulejos correntes num pavimento interior não pode ter as mesmas prestações de um produto destinado a colar cerâmicos pouco absorventes numa parede exterior sujeita a ciclos de insolação e de arrefecimento.

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As Juntas de Cor são argamassas coloridas (habitualmente com grande variedade de cores) que se usam na betumação da junta entre as peças cerâmicas. A disponibilidade de cor permite um arranjo com efeito estético, enquanto a junta desempenha a sua função técnica indispensável, absorvendo as tensões geradas nas peças cerâmicas pelas condições térmicas e outras que afectam o edifício. A norma que se aplica a estas argamassas é a EN 13888 [3], não havendo nesta data a obrigação de Marcação CE. No que se refere à espessura da junta, o valor típico para o interior será de 1 a 2 mm, enquanto no exterior as exigências poderão implicar valores superiores a 6 mm. 6.4. ETICS ETICS é o acrónimo de External Thermal Insulation Composite Systems. Não se trata de uma Argamassa, mas sim de um sistema complexo, composto por isolamento térmico prefabricado aplicado sobre um suporte e revestido por um reboco armado delgado realizado em uma ou várias camadas. Os ETICS não são regulados por Norma do tipo EN, mas sim por um documento designado por ETAG 004 (European Technical Approval Guide), emitido pela EOTA (European Organization for Technical Approvals) [3,4]. Face ao RCCTE, Regulamento das Características de Comportamento Térmico de Edifícios, aprovado pelo Decreto-Lei nº 80/2006, o desempenho energético dos edifícios assume importância máxima, na medida em que a climatização se perde notavelmente por falta de isolamento térmico. Repare-se que um edifício tem, em geral, uma vida de muitas décadas; a economia resultante de, na fase de construção, se negligenciarem aspectos relativos ao isolamento, é ridícula face ao valor acumulado de economias por se conseguirem consumos reduzidos de energia utilizada no condicionamento das habitações. Se o edifício além desse isolamento for inteligente no sentido de aproveitar (ou rejeitar) a insolação e usar a iluminação solar, então os ganhos serão maximizados. Assim, as soluções do tipo ETICS, que já existem há alguns anos na Europa e também em Portugal, estão a ter uma procura muito elevada pelo seu contributo no cumprimento do RCCTE, quer em Construção Nova, quer na Reabilitação de edifícios. 7. O FUTURO DAS ARGAMASSAS FABRIS EM PORTUGAL Alterações climáticas, construção sustentável, reutilização de materiais, valorização de resíduos, reabilitação, eficiência energética, etc., são conceitos que vêm desde os anos 80 do século XX.

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Não se trata de terminologia de moda, passageira, pois todos já percebemos que o consumo da energia fóssil não pode ser mantido pelos padrões de outrora e que a prática de processos com libertação de CO2 tem de ser controlada, pois tem quotas e custos. Já se fala em edifícios a energia positiva [5], ou seja, edifícios que em vez de consumidores de energia são produtores (“bepos”, bâtiments à énergie positive) Genericamente, a construção é uma actividade que se caracteriza da forma seguinte:

• Utiliza produtos de elevado conteúdo energético (cimento e seus derivados, ferro e outros metais, vidro, etc.). Por outro lado, as construções devem ser duráveis (várias décadas, por vezes, séculos).

• Os edifícios construídos, seja na função habitação, seja em actividades terciárias, são (cada vez mais) grandes utilizadores de energia na climatização.

• A demolição de construções não reutiliza materiais de forma sistemática e significativa. Curiosamente, a reutilização de materiais por incorporação em novas edificações, foi um recurso de elevada importância e muito praticado na reconstrução de Lisboa, após o terramoto de 1755: as paredes foram construídas incorporando materiais que provinham do colapso dos prédios que sucumbiram aos abalos sísmicos. Por um lado economizava-se nos materiais, por outro evitava-se o trabalho na sua remoção.

É possível antecipar qual vai ser o desenvolvimento das argamassas fabris no nosso país, nomeadamente com base nas reflexões seguintes:

1. A substituição de argamassas preparadas em estaleiro por argamassas fabris vai (obviamente) continuar, porventura até num ritmo mais acelerado do que o admitido no ponto 4., por motivos decorrentes da regulamentação na construção de edifícios novos e na reabilitação.

2. Na formulação de argamassas, é decisiva a pesquisa sobre a possibilidade de integração de resíduos na sua composição, melhorando o comportamento do produto final (ou pelo menos, não o afectando), substituindo parte dos ligantes e dos agregados, que são as matérias-primas que exigem mais energia na sua fabricação. Desta forma reduz-se ao conteúdo energético das argamassas.

3. Os edifícios serão cada vez mais eficientes em termos energéticos, exigindo que as argamassas contribuam para esse desígnio, melhorando a sua formulação e desenvolvendo sistemas de elevada performance, como é o caso dos ETICS.

4. A reabilitação de edifícios tem igualmente de contemplar a eficiência energética, situação que não estava prevista (por motivos óbvios), aquando da construção inicial. As argamassas de reabilitação têm de melhorar a sua função no que respeita à contribuição para o balanço energético dos edifícios onde são aplicadas.

São estes os eixos de orientação para a I&D de argamassas que algumas empresas fabricantes de argamassas já estão a desenvolver. Como em todas as actividades industriais, é essencial a cooperação entre as Universidades e as Empresas, através de parcerias, para que o sector das argamassas fabris em Portugal, que embora sendo recente, encontra-se bem estruturado e com competências demonstradas, possa responder aos desafios dos próximos anos.

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8. REFERÊNCIAS A principal fonte de informação para a preparação deste artigo foi o acervo de conhecimento da APFAC. Além disso, citam-se as seguintes referências. [1] www.apfac.pt [2] www.euromortar.com [3] www.ipq.pt [4] www.eota.be [5] http://www.cstb.fr/bepos/animations.asp, http://webzine.cstb.fr/file/rub16_doc383_2.pdf