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VINÍCIUS FERNANDES MACIEL INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CURITIBA 2008

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

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Page 1: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

VINÍCIUS FERNANDES MACIEL

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

CURITIBA

2008

Page 2: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

VINÍCIUS FERNANDES MACIEL

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

Monografia apresentada como requisito

parcial para a obtenção do grau de

Especialista em Ministério Público –

Estado Democrático de Direito, na área

de concentração em Direito

Constitucional, Fundação Escola do

Ministério Público do Paraná -

FEMPAR, Faculdades Integradas do

Brasil - UniBrasil.

Orientador: Prof. Dr. Alexandre

Coutinho Pagliarini.

CURITIBA

2008

Page 3: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

TERMO DE APROVAÇÃO

VINÍCIUS FERNANDES MACIEL

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista no curso

de Pós-Graduação em Ministério Público - Estado Democrático de Direito, Fundação Escola

do Ministério Público do Paraná - FEMPAR, Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil,

examinada pelo Professor Orientador Alexandre Coutinho Pagliarini.

_____________________________

Prof. Dr. Alexandre Coutinho Pagliarini

Orientador

Curitiba, 15 de dezembro de 2008.

Page 4: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

RESUMO

Este trabalho cuida da possibilidade do Ministério Público empreender, diante da nova

ordem constitucional instaurada a partir de 1988, investigações criminais de forma

direita. Tomando como ponto de partida a analise de sua evolução histórica, bem como

de suas conquistas relacionadas às suas prerrogativas e finalidades, procurar-se

sustentar de forma clara essa função atribuída ao Parquet. Em um segundo momento,

discute-se a mudança de posicionamento do Supremo Tribunal Federal que, negando

esse progresso histórico, retira do Ministério Público a possibilidade de realizar tais

investigações preliminares de forma direita. Por fim, tenta-se demonstrar o equívoco

desse posicionamento adotado pela Suprema Corte e propõe-se uma reafirmação do

valor institucional e das finalidades do Ministério Público em um Estado que pretende

manter o status de um Estado Democrático de Direito.

PALAVRAS CHAVE

Investigação criminal direta; Ministério Público; prerrogativas e finalidades

institucionais

Page 5: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

ABSTRACT

This work takes care of the possibility of prosecutors undertaken, before the new

constitutional order established since 1988, direct criminal investigations. Building on

the analysis of their historical development, as well as their achievements related to

their prerogatives and purposes, seek support is clearly the task entrusted to the

Parquet. In a second time, we discuss the change of position that the Supreme Court,

denying that historical progress, derives from the public prosecutor the possibility of

conducting such preliminary investigations so right. Finally, attempts to demonstrate

that mistake the position adopted by the Supreme Court and it is a reaffirmation of the

institutional and purposes of prosecutors in a state that wants to maintain the status of

a democratic rule of law.

KEY WORDS

Direct criminal investigation, prosecutors, prerogatives and institutional purposes

Page 6: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

SUMÁRIO

RESUMO...............................................................................................................II

ABSTRACT..........................................................................................................III

INTRODUÇÃO....................................................................................................05

I – O MINISTÉRIO PÚBLICO........................................................................... 08

1.1 Origens históricas ......................................................................................... 08

1.2 O Ministério Público no Brasil ..................................................................... 09

1.3 Visão sistêmica: o Ministério Público na Constituição de 1998.................... 14

1.4 O Ministério Público no direito comparado...................................................20

II – FUNÇÕES INSTITUCIONAIS PENAIS DO MINISTÉRIO

PÚBLICO CORRELATAS À INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA......... 25

2.1 O princípio da obrigatoriedade e a privatividade da ação penal pública ...... 25

2.2 Atribuição de expedir notificações nos procedimentos administrativos....... 27

2.3 Atribuição de requisitar diligências investigatórias e de instaurar

inquéritos policiais .............................................................................................. 29

III – SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS....................................................... 31

3.1 Sistema inquisitivo........................................................................................ 31

3.2 Sistema acusatório ........................................................................................ 34

3.3 Sistema misto ................................................................................................ 38

IV – PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.................... 39

4.1 Posição da doutrina pátria............................................................................. 39

4.2 A alteração de orientação no Supremo Tribunal Federal.............................. 50

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................. 60

Page 7: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

5

INTRODUÇÃO

O processo penal, como instrumento de concretização do ius puniendi, nem

sempre foi estruturado como hoje se conhece. Em um período histórico não muito

distante, vigorava um processo penal inquisitivo onde a figura do juiz e do acusador

confundia-se em uma única pessoa.

Pior do que isso, o princípio unificador do sistema inquisitivo firmou-se na

gestão da prova pelo órgão julgador. O juiz, ou melhor, o inquisidor, além de

concentrar em uma só pessoa as tarefas de acusar, defender e julgar, controlava, em

suas mãos, a produção das provas.

O processo penal servia, na realidade, não como um sistema de garantias do

indivíduo acusado, mas como procedimento legitimador de um juízo condenatório

preconcebido na mente do inquisidor.

O Estado, mediante a aplicação de penas injustas e desproporcionais, firmava-se

como um ente superior ao próprio indivíduo, como se quisesse a todo o momento

afirmar que o individuo existia para o Estado e não o contrário.

Após séculos de dominação e controle institucionalizado do indivíduo novas

idéias foram lançadas no seio da sociedade, idéias essas que foram apanhadas por nova

classe social que almejava a tomada do poder – a burguesia francesa - e acabaram por

fundamentar um novo discurso de poder.

Com o alvorecer da Revolução Francesa de 1789 – firmada no lema liberdade,

igualdade e fraternidade – o Ministério Público, já então incipiente na figura dos

procuradores do rei, ganhou uma estrutura mais adequada e a seus membros foram

asseguradas novas garantias, assemelhando-a ao Ministério Público atual.

As atrocidades cometidas durante o período em que o sistema inquisitivo

prevaleceu imbuíram no homem comum um pavor tão grande, que exigiu a elaboração

de um sistema penal em que as partes do processo fossem claramente distintas.

Durante mais alguns séculos de progresso histórico, entre idas e vindas, lutou-se

para definir os papéis que cada uma dessas partes deveria assumir no processo penal a

fim de que fosse concebido um verdadeiro sistema de garantia dos direitos

8

Page 8: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

6

fundamentais do indivíduo.

Até a atual conjectura do quadro mundial e, mais especificamente, diante do

novo cenário nacional, recém inaugurado com a Constituição Federal de 1988, muitas

discussões foram travadas até a consagração das funções atribuídas ao Ministério

Público ou, às Instituições que o valham nos Estados Democráticos de Direito.

A nossa Constituição Federal de 1988, em seu artigo 129, estabeleceu as

funções institucionais do Ministério Público e, juntamente com a legislação ordinária,

atribuiu-lhe, de forma privativa, a promoção da ação penal pública.

Todavia, o Supremo Tribunal Federal, ignorando séculos de árduo trabalho,

dificultou, data venia, o exercício de algumas funções institucionais no exato

momento em que, alterando seu posicionamento, vedou a possibilidade do Ministério

Público empreender investigações criminais de forma direta, investigações que muitas

vezes forneciam subsídios para o oferecimento de denuncias em situações que a

Instituição não contava com outro material indiciário confiável.

Assim, neste trabalho, procura-se reafirmar de forma clara as funções

institucionais atribuídas ao Ministério Público, em particular a que se refere à

possibilidade de instauração de procedimentos investigativos criminais de forma direta

para fundamentação da ação penal pública.

Mais do que isso, busca-se demonstrar o equívoco no posicionamento que

atribui a Polícia Judiciária o monopólio da investigação criminal, principalmente, em

casos que essa Instituição está comprometida com outros interesses políticos ou

internos que não os atribuídos pela Constituição.

Para tanto, este trabalho realiza uma análise mais atenta da doutrina pátria que,

na sua grande maioria, enumera os argumentos que autorizam o Ministério Público a

empreender investigações preliminares de forma direta não só para subsidiar a ação

civil pública, como querem os doutrinadores contrários a essa tese, mas também para

justificar a instauração da respectiva ação penal.

Na tentativa de propor ao leitor uma visão lógica das idéias que possibilitam

sustentar a prerrogativa do Parquet realizar investigações criminais de forma direta,

este singelo trabalho foi dividido didaticamente em quatro capítulos os quais não

encerram a pretensão de doutrinar ninguém, mas apenas de reforçar os fundamentos

Page 9: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

7

construídos pela melhor doutrina que sustenta referida possibilidade.

O Primeiro capítulo cuida da evolução histórica do Ministério Público desde a

sua origem mais remota até sua conformação atual na Constituição Federal Brasileira

de 1988. Reporta-se, ainda que de forma sintética, ao Ministério Público no direito

comparado, isso com o objetivo de realçar a configuração que a Instituição assumiu

durante a sua constituição.

Em um segundo momento, aponta-se algumas das funções institucionais do

Ministério Público correlatas à investigação criminal direta conduzindo o leitor para a

parte final da pesquisa em que os esforços se concentram no tema central desse

trabalho.

O terceiro capítulo faz um panorama com relação aos principais sistemas

processuais penais, quais sejam, o sistema inquisitivo, o sistema acusatório e o sistema

misto. O escopo desse capítulo é demonstrar que não há uma incompatibilidade entre o

sistema acusatório e a possibilidade do Ministério Público empreender investigações

criminais de forma direta.

No capítulo derradeiro cuida-se especificamente do tema concernente à

possibilidade do Ministério Público realizar investigações criminais de forma direita,

para isso enfrentam-se, de maneira crítica, os argumentos contrários a essa tese. Por

fim, destaca-se a alteração no posicionamento do Supremo Tribunal Federal e aponta-

se, data venia, o equívoco das teses ali levantadas.

Page 10: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

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CAPÍTULO I – O MINISTÉRIO PÚBLICO

1.1 Origens históricas

Não há entre os pesquisadores um consenso relativo à origem histórica do

Ministério Publico. O que os estudiosos fazem, quando buscam identificar a origem

remota da instituição, é identificar as funções de investigação de atos ilegais e de

acusação atribuídas a cargos de agentes do período analisado1.

Partindo dessa premissa, alguns doutrinadores citam como percussores da

Instituição os magiaí no antigo Egito. Registros datando mais de quatro mil anos

comprovam a existência de funcionários reais cuja principal função era denunciar as

práticas criminosas aos magistrados. Os magiaí ficaram conhecidos como “a língua e

os olhos do rei”2.

Outros pesquisadores atribuem à origem remota do Ministério Público à

Antiguidade Clássica. Os Éfores de Esparta, por exemplo, apesar de juízes, exerciam

uma função moderadora entre o poder real e o senado, além de exercer o papel de

órgão de acusação em alguns casos3.

Nesse período, há quem aponte, em Roma, os advocatus fisci e os procuratores

caesaris, aos quais incumbia vigiar a administração dos bens do imperador4.

De forma pacífica, a doutrina aponta a origem do Ministério Público, nos

moldes como hoje é concebido, a partir da ampliação dos poderes de intervenção do

Estado na esfera das liberdades individuais e indica como justificativa, sobretudo na

esfera penal, a necessidade de se suprir a vingança privada, bem como de se

jurisdicionar os conflitos sociais5.

Com o abandono do modelo acusatório privado, desenvolvido na Antiguidade

1 RANGEL, Paulo. Investigação criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 125.

2 Idem.

3 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 574.

4 Idem.

5 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 7 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte:

Del Rey, 2007. p. 385.

Page 11: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

9

Clássica, passou-se pela experiência do modelo inquisitivo, para se desembocar em um

sistema fulcrado em uma Justiça Penal Pública, tanto no que diz respeito à

jurisdicionalização dos conflitos, quanto na formulação da acusação6.

Essa conjectura de requisitos ocorreu em 25 de março de 1302, na França, de

Felipe IV. Sob o julgo desse monarca, foi promulgado a Ordenança de 1302, primeiro

diploma legal a tratar dos procuradores do rei. Com esse dispositivo legal, o rei

demonstrou, através dos seus atos, a vontade de se estabelecer um Ministério Público

independente da magistratura7.

Após a Revolução Francesa de 1789 conferiu-se uma estrutura mais adequada a

instituição e foram asseguradas novas garantias aos seus membros, assemelhando-a ao

Ministério Público atual. Foi justamente nesse período que surgiu a expressão

“ministério público”, uma vez que a função dos procuradores do rei foi considerada

como verdadeiro ministério em defesa dos interesses públicos8.

Como afirma Hugo Nigro MAZZILLI, embora possam ser buscadas a origem

histórica do Ministério Público no antigo Egito ou nos textos romanos clássicos, o fato

é que o Ministério Público, como hoje é conhecido, teve sua origem nos procuradores

do rei, e o Ministério Público brasileiro, por sua vez, nos procuradores do rei do

Direito lusitano9.

1.2 O Ministério Público no Brasil

Antes de analisar-se a configuração do Ministério Público na ordem

constitucional brasileira é preciso ressaltar que a presença dessa instituição está ligada

umbilicalmente ao Estado Democrático de Direito.

Dessa forma, para que se possa abordar a presença ou a ausência do Ministério

Público nas constituições brasileiras é fundamental a compreensão do processo

6 Idem.

7 RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 126.

8 LIMA, Marcellus Polastri. Ministério Público e persecução penal. 3. ed. rev. e atual. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 1-2. 9 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo:

Saraiva, 2002. p. 35.

Page 12: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

10

histórico, político, social e cultural no qual a sociedade da época analisada está imersa.

Na realidade, de acordo com os ares democráticos ou ditatoriais será maior, menor ou

até nenhuma a presença do Ministério Público nas constituições10

.

Isso ocorre por fatores óbvios, em uma sociedade ditatorial o Ministério Público

atuaria de forma contraria aos interesses emanados das forças políticas dominantes,

uma vez que essas têm como pratica usual a redução das liberdades individuais com o

objetivo de se manter o regime de opressão.

Nos dizeres de Paulo RANGEL “ditadura e Ministério Público é um binômio de

combinação incompatível em uma sociedade, pois, quando o Estado adota o regime

ditatorial, repele a presença do Parquet, que seria seu inimigo público n° 1.”11

Torna-se necessário, ainda, fazer uma breve menção às codificações que

estruturaram a ordem normativa brasileira, mais especificamente as Ordenações

Afonsinas (ano de 1446), Manuelinas (ano de 1521) e Filipinas (ano de 1603), uma

vez que nas duas últimas surge à figura do promotor de justiça12

.

É nas Ordenações Manuelinas que se faz, pela primeira vez, menção a figura do

promotor de justiça e se rascunha as delimitações funcionais do Ministério Público.

Posteriormente, com as Ordenações Filipinas fixam-se a função fiscalizatória e

acusatória do parquet13

.

Todavia, no Brasil Colônia, os Procuradores da Coroa – percussores dos

promotores de justiça – eram simples agentes do rei, sem qualquer autonomia ou

garantia que lhes possibilitassem a defesa dos interesses do povo. Somente com a

promulgação da Constituição do Império em 1824 e, mais exatamente, com o advento

do Código de Processo Penal do Império de 1832 foram numeradas as atribuições do

Ministério Público14

.

Destarte, devido ao momento histórico vivido no Brasil Império, não há como

se falar em um Ministério Público dotado de independência funcional. Na realidade, a

Constituição de 1824 faz menção apenas aos procuradores da Coroa e Soberania

Nacional, fato este estritamente coerente, uma vez que a Constituição do Império fora

10

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 128. 11

Ibidem, p. 136. 12

Ibidem, p. 126. 13

Ibidem, p. 127. 14

LIMA, Marcellus Polastri. Op. cit. , p. 7.

Page 13: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

11

outorgada pelo monarca, não sendo vontade desse conceder à sociedade da época um

Ministério Público que a defendesse15

.

A Proclamação da República apesar de representar uma ruptura com a ordem

até então vigente, poucas mudanças trouxe para o Ministério Público. A segunda

Constituição brasileira promulgada em 1891 relegou um papel secundário ao

Ministério Público escondendo-o em um capítulo destinado ao Poder Judiciário. Nesse

sentido leciona Paulo RANGEL.

A segunda Constituição brasileira é inspirada no modelo norte-americano, inaugurando a

República Federativa liberal e sendo promulgada em 24 de fevereiro de 1891, porém apenas

tratando, quanto ao Ministério Público, da nomeação do Procurador Geral da República pelo

Presidente da República, dentre ministros do Supremo Tribunal Federal, no título referente ao

Poder Judiciário (art. 58, § 2°), sem tratar de sua institucionalização16

.

Na ordem infraconstitucional o Decreto n° 848, de 1890, da autoria do Ministro

Campos Sales, deu ao Ministério Público os contornos de uma verdadeira Instituição.

Mas só a Constituição de 1934 elevou o Ministério Público ao status de Instituição,

uma vez que reservou um capítulo a parte para o seu tratamento, fixou garantias e

impedimentos destinados aos seus membros e organizou, ainda, os Ministérios

Públicos Militar e Eleitoral17

.

Mas o cenário político mundial e as pressões internas no país não eram

favoráveis à solidificação de um regime democrático e, por conseqüência, a

consolidação de um Ministério Público atuante. A ascensão de Mussolini na Itália, de

Stálin na União Soviética e de Hitler na Alemanha, bem como as constantes greves no

quadro nacional, os movimentos no ocorridos dentro do exército brasileiro e, por fim,

a Aliança Nacional Libertadora liderada por Carlos Prestes foram a justificativa para a

instalação de outro regime ditatorial que ficou conhecido como Estado Novo18

.

Esse regime ditatorial imposto pelo governo de Getúlio Vargas exigiu a

elaboração de uma nova Constituição a qual sustentasse a nova política implantada.

Desta feita, em 1937 foi promulgada a quarta Constituição brasileira na qual, como

15

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 130. 16

Ibidem, p. 131. 17

LIMA, Marcellus Polastri. Op. cit. , p. 7. 18

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 134.

Page 14: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

12

não poderia deixar de ser, o Ministério Público teve sua previsão constitucional

reduzida quase à zero. Foram feitas breves menções a Instituição no capítulo destinado

ao Poder Judiciário, sendo abolidas as garantias destinadas aos seus membros19

.

O fim da Segunda Guerra Mundial e o retorno das tropas brasileiras que haviam

com combatido os regimes ditatóriais de Hitler e de Mussolini aceleram o processo de

redemocratização do país o que culminou com a realização de eleições livres. A

reabertura política exige uma nova Constituição e a reestruturação do Ministério

Público quanto defensor das garantias individuais. Paulo Rangel enumera de forma

clara conquistados no âmbito do Ministério Público.

Em 18 de setembro de 1946, surge a quinta Constituição brasileira, dando novos contornos ao

Ministério Público, pois, diante do novo quadro político existente, restabelecendo a

democracia no país, a presença da instituição era indispensável. Os arts. 125 a 128 davam

título próprio à instituição, disciplinando sua organização; a escolha do Procurador Geral da

República; o ingresso na carreira mediante concurso público e garantias de estabilidade a seus

membros; legitimou o Procurador Geral da República a representar pela inconstitucionalidade

de leis e atos normativos e deu competência ao Senado para aprovar a escolha do procurador

geral20

.

Esse clima de relativa segurança jurídica não suportou as sucessivas crises

políticas vividas no país as quais acabaram por justificar o golpe militar de 1964. Esse

novo quadro político instalado pelo regime militar necessitava de uma nova

Constituição a qual veio a ser promulgada em 1967. Diante desses acontecimentos, o

Ministério Público foi condenado a outro retrocesso institucional, retornando a sua

condição de subordinação ao Poder Judiciário21

.

O golpe final dado contra a esperança de uma reabertura política e o

restabelecimento de um regime democrático ocorreu com a edição do Ato Institucional

n° 5 o qual suspendeu de vez a vigência da Constituição de 1967. Selando,

definitivamente, a postura adotada pela linha dura do exercito foi promulgada a

extensa emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro de 1969, considerada por muitos

doutrinadores como a sétima Constituição brasileira, tão profunda as mudanças

19

MORAES, Alexandre de. Op. cit. , p. 576. 20

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 137-138. 21

Ibidem, p. 140.

Page 15: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

13

impostas22

.

Mais uma vez, torna-se oportuno colacionar as palavras lapidares de Paulo

RANGEL.

Na Constituição de 1969 (Emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro), o Ministério

Público foi retirado do capítulo referente ao Poder Judiciário e colocado no capítulo do Poder

Executivo sem uma posição constitucional própria que pudesse delinear seu verdadeiro perfil.

Com a Constituição de 1969, o Ministério Público perdeu duas grandes conquistas: a isonomia

de condições de aposentadoria e vencimentos dos magistrados e a perda de sua independência

funcional, já que estava subordinado ao Poder Executivo23

.

A tão almejada reabertura política só ocorreu no final da década de 80 com a

pressão exercida por diversos movimentos sociais dentre os quais o movimento das

Diretas Já. Os anseios da sociedade consubstanciados na figura de um Estado

Democrático de Direito desabrocharam com a promulgação da Constituição Federal de

1988. O salto democrático foi tão grande que até hoje a atual Constituição recebe o

título de Cidadã.

Diante das inúmeras garantias atribuídas constitucionalmente aos indivíduos o

Ministério Público assumiu uma posição de destaque e firmou-se, nesses quase vinte

anos de Constituição, como verdadeira Instituição, permanente e necessária à defesa

da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais

indisponíveis. MAZZILLI define bem o perfil do atual Ministério Público.

É órgão do Estado (não do governo, nem do Poder Executivo), dotado de especiais garantias

para desempenhar funções ativas ou interventivas, em juízo ou fora dele, em defesa dos

interesses da coletividade, com a promoção da ação penal ou civil públicas, a defesa do meio

ambiente, do consumidor, do patrimônio público e social. Em suma, zela por interesses

indisponíveis ou de larga abrangência social24

.

Se não resta cristalizado o exagero de se reconhecer no Ministério Público um

quarto poder, está claro a intenção do legislador constituinte em conferir à Instituição a

função de fiscalizar as atividades dos três poderes. Isso se torna nítido no exato

momento em que o legislador constituinte consagra um capítulo a parte para

disciplinar o Ministério Público – Das funções essenciais à justiça – não o inserindo

22

Ibidem, p. 140-143. 23

Ibidem, p. 143. 24

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. , p. 33.

Page 16: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

14

nos tradicionais poderes de Estado25

.

Constantes e árduas foram as lutas sociais e da própria Instituição para que o

Ministério Público assumisse sua configuração atual. Mas essa luta está longe de

acabar, ao contrário, ela se renova todo momento, sempre que nos deparamos com

novos interesses sociais e individuais indisponíveis que por algum motivo estão sendo

desrespeitados.

Deveras, não há como se conceber um Estado Democrático de Direito sem o

seu maior guardião, bem como não há um Estado totalitário dotado de um Ministério

Público forte e atuante, pois, nesse caso, ou a Instituição sede aos interesses dos que

controlam o poder ou é calada pela voz do autoritarismo.

1.3 Visão sistêmica: o Ministério Público na Constituição de 1988

Embora a Instituição do Ministério Público tenha sido objetivo de previsão

constitucional nos textos que antecederam a Constituição Federal de 1988, conforme

alhures mencionado, até aquele momento histórico o Parquet não havia encontrado

terreno fértil para consolidar suas funções institucionais, sua posição institucional, bem

como suas garantias e prerrogativas.

Mas o atual texto constitucional que cuida do Ministério Público não foi

produto de geração espontânea, ao contrário, resultou de um árduo esforço que

mobilizou, talvez, pela primeira vez, a Instituição como um todo. Esse trabalho de

síntese, que antecedeu ao texto promulgado na Constituição de 1988, tem um

panorama bem delineado.

Com as eleições presidenciais indiretas de 1984 e a consagração de Tancredo

Neves como presidente da República colocou-se um ponto final no ciclo de governos

militares, representantes da ditadura militar no Brasil.

O povo vivenciava um momento de euforia que - mesmo abalado com a morte

do recém-eleito Presidente da República – recebeu nova injeção de ânimo com a

nomeação da Comissão Constituinte, conhecida como Comissão de Notáveis. A

25

LIMA, Marcellus Polastri. Op. cit. , p. 9.

Page 17: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

15

função desta Comissão era elaborar um anteprojeto de texto constitucional que

refletisse o anseio democrático do povo e preparasse o país para uma reabertura

democrática.

Diversos setores da sociedade se reuniram para apresentar suas respectivas

sugestões ao pretenso anteprojeto constituinte. O Ministério Público, por sua vez não

ficou alheio a esse movimento. Algumas mobilizações da Instituição contribuíram

efetivamente com a redação definitiva do atual texto constitucional e merecem ser

mencionadas.

Em junho de 1985 realizou-se, em São Paulo, o VI Congresso Nacional do

Ministério cujo escopo era elaborar propostas a serem encaminhadas aos trabalhos da

Comissão Constituinte no que se referia a Instituição do Ministério Público. Logo em

seguida ao VI Congresso Nacional do Ministério Público, em outubro de 1985, a

Conamp enviou inúmeros questionários aos membros do Ministério Público com o

objetivo de receber sugestões que poderiam enriquecer os trabalhos já desenvolvidos.

Como resultado da pesquisa ficou claro o desejo dos membros do Ministério Público

de ver consagrado no texto constitucional um capítulo a parte que trata-se da

Instituição e fixasse suas principais garantias e funções institucionais26

.

Como movimento paralelo, no início de 1986, o então Procurador-Geral da

República, José Paulo Sepúlveda Pertence, membro da Comissão de Estudos

Constitucionais, elaborou sua proposta de texto referente ao Ministério Público,

acolhendo algumas sugestões feita pela Conamp27

.

Todavia, a Conamp, com pretensões mais audaciosas, desejava entregar um

projeto que harmonizasse todos os trabalhos realizados até então. Na expectativa de

obter uma proposta nacional que deveria ser entregue a Comissão Constituinte, a

Conamp agendou o Primeiro Encontro Nacional de Procuradores-Gerais de Justiça e

Presidentes de Associações de Ministério Público o qual se realizou entre os dias 20 a

22 de junho de 1986, na Cidade de Curitiba, e teve como resultado a elaboração da

26

MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise do Ministério Público

na Constituição, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, na Lei Orgânica do Ministério

Público da União e na Lei Orgânica do Ministério Público paulista. 5. ed. rev., ampl. e atual. São

Paulo: Saraiva, 2001. p. 115-116. 27

Ibidem, p. 117.

Page 18: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

16

Carta de Curitiba28

.

Segundo MAZZILLI, a importância da Carta de Curitiba está no fato de ser o

primeiro texto de consenso do Ministério Público nacional, bem como na circunstância

de ter inspirado diversos dispositivos da Constituição29

.

A Constituição Federal de 1988 acabou por inserir o Ministério Público no

Capítulo IV “Das Funções Essenciais à Justiça” que integra o Título IV “Da

Organização dos Poderes” de forma a atender as sugestões propostas na Carta de

Curitiba. Essa disposição espacial do Ministério Público no texto constitucional deixa

claro que a Instituição não integra nenhum dos três Poderes. Outra não é a lição de

Emerson GARCIA “os alicerces da Instituição, não obstante dispostos no mesmo

Título dos demais Poderes, o foram em Capítulo distinto, o que determinou por afastar

a falsa concepção de que o Ministério Público integra o Poder no qual sua disciplina

fora encartada” 30

.

Destarte, isso não confere ao Ministério Público o status de um quarto Poder.

Embora exista respeitável posicionamento doutrinário que defende a elevação do

Ministério Pública a categoria de um quarto Poder, essa conclusão não pode ser

retirada do texto constitucional. A Constituição, ao estabelecer no seu artigo 2° que

são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo

e o Judiciário, não consagrou o Ministério Público como um de seus Poderes.

Ao tratar da estrutura administrativa Hely Lopes MEIRELLES estabelece uma

classificação dos órgãos públicos na qual separa os órgãos independentes, autônomos,

superiores e subalternos. Os órgãos independentes são conceituados pelo autor como

aqueles originários da Constituição e representativos dos Poderes de Estado –

Legislativo, Executivo e Judiciário – colocados no ápice da pirâmide governamental,

sem qualquer subordinação hierárquica ou funcional, e só sujeitos aos controles

constitucionais de um Poder pelo outro31

.

Heley Lopes MEIRELLES acaba incluindo nesta classe de órgãos

28

Ibidem, p. 118-119. 29

Ibidem, p. 130. 30

GARCIA, Emerson. Ministério Público: Organização, atribuições e Regime Jurídico. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 36. 31

MEIRELLES, Heley Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed. São Paulo. Malheiros,

2004. p.70.

Page 19: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

17

independentes o Ministério Público, e os Tribunais de Contas da União, dos Estados e

dos Municípios, os quais, embora não sejam órgãos representativos de nenhum dos

Poderes, são funcionalmente independentes e seus membros verdadeiros agentes

políticos, inconfundíveis com os funcionários das respectivas instituições32

.

O mais relevante, contudo, não é consagrar o Ministério Público como um

quarto Poder, mas sim compreender sua previsão constitucional como verdadeira

clausula pétrea. Ao levar-se em conta as atividades desenvolvidas pelo Ministério

Público, principalmente, no que tange a defesa da ordem jurídica, do regime

democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, a sua existência pode

se considerada como inerente ao rol dos direitos e garantias individuais (art. 60, § 4º,

IV, da CF)33

.

Tendo a Instituição o dever de zelar pelo bem-estar da coletividade e protege-la

dos arbítrios dos demais Poderes, constitui um direito de toda a sociedade a

preservação de um Ministério Público atuante e independente, não subordinado a

nenhum subordinado dos poderes e imparcial, o suficiente, para garantir uma atuação

justa.

Deveras, enquanto Instituição permanente e essencial a função jurisdicional do

Estado, qualquer tentativa do poder constituinte derivado reformador de,

indiretamente, anular a existência do Ministério Público, seja reduzindo as garantias e

prerrogativas dos seus membros, seja suprimindo sua autonomia financeira, será um

verdadeira atentado aos direitos e garantias individuais. É um direito de todo cidadão a

existência de um Ministério Público forte e atuante34

.

Mais do que isso, conforme ensina MAZZILLI, há uma estreita ligação entre

democracia e um Ministério Público forte e independente. Todavia, a existência de um

Ministério Público forte não é sinônimo de um Estado Democrático, caso àquela

Instituição não tenha independência e esteja subordinada aos interesses de um governo

totalitário.

Embora a história traga exemplos de Ministério Público forte (mas não independente) em

32

Ibidem, p. 71. 33

GARCIA, Emerson. Op. cit. , p. 41 34

Ibidem, p. 42.

Page 20: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

18

regimes autoritários, na verdade, um Ministério Público realmente votado à defesa dos

interesses da coletividade (e não do governo ou dos governantes) somente poderá vicejar e

produzir furtos para esta sob regime democrático, sob pena de prestar a servir à exceção e ao

arbítrio, não a coletividade35

.

Entretanto, para tornar concreto o mandamento constitucional de que o

Ministério Público está a serviço da defesa do regime democrático a Constituição

Federal teve que estabelecer alguns princípios institucionais – unidade, indivisibilidade

e autonomia, artigo 127, § 1°, da Constituição Federal – bem como algumas garantias

e prerrogativas para seus membros – vitaliceidade, inamovibilidade e irredutibilidade

de subsídios, artigo 128, § 5º, incisos I, “a”, “b” e “c”, da Constituição Federal – tudo

para resguardar uma atuação imparcial e independente.

Com relação aos princípios institucionais a unidade significa que os membros

do Ministério Público integram um único órgão e estão sob a direção de um único

chefe. Mas, ao contrário do que pode parecer, essa unidade mencionada no texto

constitucional só existe dentro de cada Ministério Público, não há unidade alguma

entre o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos dos Estados, bem como

não há unidade entre Ministérios Públicos de Estados diferentes ou entre os ramos do

Ministério Público da União36

.

A indivisibilidade significa que os membros do Ministério Público podem ser

substituídos uns pelos outros, desde que respeitada os requisitos estabelecidos em lei.

Isso quer dizer que o membro do Ministério Público que instaurou um Inquérito Civil

não será, necessariamente, o mesmo que poderá propor a respectiva Ação Civil

Pública, caso aquele não esteja mais na comarca em que o Inquérito foi instaurado37

.

Já a autonomia funcional, talvez o princípio institucional mais importante,

impede que seja imposto qualquer procedimento funcional a um membro do

Ministério Público por seu superior hierárquico. Ao contrário do Parquet francês, a

hierarquia no Ministério Público brasileiro só pode ser exercida no seu aspecto

meramente administrativo, o que impõe a obediência às decisões administrativas

tomadas pelos órgãos da administração superior. Na esfera de atuação funcional, os

35

MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público , p. 149. 36

Ibidem, p. 155-156. 37

Idem.

Page 21: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

19

órgãos superiores só podem fazer recomendações sem caráter normativo ou

vinculativo38

.

Com relação às garantias dos membros do Ministério Público, a Constituição

Federa estabelece no artigo 128, § 5°, I, “a”, que se adquire vitaliceidade após a

transcorrência do período probatório, ou seja, após dois anos de efetivo exercício do

cargo, tendo sido admitido na carreira, mediante aprovação em concurso de provas e

títulos.

A vitaliciedade assegura que a perda do cargo só poderá ocorrer por meio de

sentença judicial transitada em julgado, sendo impossível a produção antecipada de

efeitos, salvo o caso de afastamento cautelar dos membros do Ministério Público de

suas funções, fato este que não lhe suprime seus direitos, garantias e prerrogativas

inerentes ao cargo39

.

A inamovibilidade, prevista no artigo 128, § 5º, I, “b”, da Constituição Federal,

assegura que o membro do Ministério Público não poderá ser removido ou promovido,

unilateralmente, sem a sua autorização ou solicitação, salvo por motivo de interesse

público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público

(Conselho Superior do Ministério Público), por voto da maioria absoluta de seus

membros.

Esta garantia deve compreender não apenas o seu aspecto meramente físico, ou

seja, a simples vinculação do agente a determinado órgão. Deve englobar também as

características intrínsecas do cargo, valer dizer, as atribuições inerentes ao cargo não

podem ser suprimidas sob pena de esvaziamento do princípio da inamovibilidade40

.

Por fim, o artigo 128, § 5°, I, “c”, da Constituição Federal garante a

irredutibilidade nominal dos subsídios dos membros do Ministério Público, os quais

são fixados com parâmetro no artigo 39, § 4°, da CF. Essa garantia visa evitar que os

membros sofram qualquer espécie de intimidação ou mesmo retaliação, mediante

perdas financeiras, sempre que contrariarem os interesses dos detentores do poder41

.

Todo este desenvolvimento histórico, bem como a atual configuração

38

Ibidem, p. 156. 39

GARCIA, Emerson. Op. cit. , p. 390. 40

Idem. 41

Ibidem, p. 390-391.

Page 22: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

20

constitucional do Ministério Público, fruto de árduo trabalha, permitem que a

Instituição ocupe papel cada vez significativo na sociedade brasileira. Nesse vinte anos

de Constituição cidadã o Ministério Público se solidificou como defensor do regime

democrático, da ordem jurídica e dos interesses difusos, coletivos e individuais

indisponíveis.

1.4 O Ministério Público no direito comparado

Inicialmente, deve-se alertar que o objetivo deste tópico não é analisar de forma

exaustiva a Instituição do Ministério Público nos países que serão aqui mencionados.

A intenção é estabelecer uma analisa, um tanto quanto sumária, da sua atuação

enquanto órgão responsável pela investigação criminal e titularidade da ação penal.

Pode-se adiantar que no direito alienígena há uma forte tendência de se atribuir

ao Ministério Público à prerrogativa de conduzir investigações criminais de forma

direita, função essa que, via de regra, é realizada com o auxílio da Polícia Judiciária.

Na Espanha o Ministério Público recebe o nome de Ministério Fiscal e encontra

assento legal na Constituição de 1978. Embora haja algumas opiniões divergentes, o

Ministério Fiscal é parte integrante do Poder Judiciário e exerce a função de custos

legis42

.

O Código de Processo Penal Espanhol de 1882 estabelece a obrigatoriedade da

ação penal e divide o processo penal em três fases distintas. A primeira delas, a fase

sumária, e conduzida por um juiz instrutor e tem como objetivo preparar o juízo oral,

para tanto, averigua-se todas as circunstâncias que possam influenciar na classificação

do delito e da culpabilidade do investigado. Na fase intermediária realiza-se um juízo

sobre os indícios colhidos durante a fase sumária, prosseguindo-se ou não para a fase

derradeira. Na terceira e última fase, a fase oral, é que se vai realizar a instauração do

processo propriamente dito e a fixação do contraditório43

.

A investigação dos delitos na Espanha fica a cargo da Polícia Judiciária que por

42

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 149. 43

Ibidem, p.150-151.

Page 23: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

21

sua vez é auxiliar dos juízes e do Ministério Fiscal. Todavia, há uma tendência recente

na Espanha de se afastar os juízes da persecução penal e de se atribuir ao Ministério

Fiscal tal função44

.

Há, entretanto, apesar da tendência legislativa, uma séria dificuldade de se

implantar na Espanha a figura do promotor investigador haja vista a própria estrutura

do Ministério Fiscal espanhol. A instituição, na Espanha, não goza de independência

funcional, além do que está submetida a uma rígida hierarquia interna dinamizado por

um sistema de instruções vinculante – circulares de la fiscalía45

.

Já Ministério Público italiano tem uma fisionomia particular que favorece o

sistema do promotor investigador. Neste país, de um ponto de vista estrutural, a

magistratura está unificada e os magistrados distinguem-se entre si pelas funções que

cada uma assume (função julgadora e função postulatória ou investigatória). Assim, ao

Ministério Público é atribuído o gozo de todas as garantias orgânicas estabelecidas

para a judicatura46

.

A Instituição também possui previsão no artigo 107 da Constituição Italiana,

sendo a ação penal vinculada ao princípio da obrigatoriedade. O Código de Processo

Penal tedesco, por sua vez, adotou um sistema processual acusatória em que, em uma

primeira fase – investigações preliminares – o Ministério Público e a Polícia Judiciária

buscam indícios de autoria e materialidade para se instaurar o juízo oral, isso tudo sob

o controle de um juiz das investigações preliminares47

.

A fase de investigação preliminar na Itália, chamada de indagi preliminari,

sofreu forte influência do modelo adotado pela Alemanha em 1974. O Ministério

Público assumiu quase que por completo as funções exercidas na fase de investigação

preliminar, podendo, interrogar suspeitos, receber declarações de testemunhas,

determinar a realização de perícias, efetuar diligências de identificação de pessoas,

ordenar acareações, buscas pessoais e inclusive determinar a quebra de sigilo bancário,

mediante prévia autorização do Procuratore de la República ou do juiz competente48

.

44

Ibidem, p. 152. 45

LOPES JÚNIOR. Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo. 2. ed. rev. e atual. Rio

de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 221. 46

Ibidem, p. 239. 47

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 153-154. 48

LOPES JÚNIOR. Aury. Op. cit., p. 240

Page 24: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

22

A direção das investigações preliminares ficou realmente a cargo do Ministério

Público, sendo tal função delegada materialmente à Polícia Judiciária cujo papel é

assegurar as fontes de prova e identificar as pessoas investigadas. Ao Poder Judiciário

é relegada a tarefa de resguardas os direitos fundamentais dos investigados e atuar nas

medidas de caráter cautelar49

.

Na França, apesar da figura do juiz de instrução ser muito forte, a partir da

década de 90, o Código de Processo Penal passou a prever duas espécies de instrução

preliminar: a instruction préparatoire e a enquête préliminaire. A primeira é uma

autêntica instrução preliminar judicial, a cargo de um juiz instrutor, sendo obrigatória

para os delitos de maior gravidade e facultativa para os delitos de menor gravidade. Já

a segunda, consiste em um conjunto de averiguações realizadas pela polícia judiciária,

orientada pelo Ministério Público – procureur de la Republique - e está reservada aos

delitos de menor gravidade50

.

Importante destacar que o Ministério Público francês é considerado uma

magistratura especial. Seus membros, após cursar a Escola da Magistratura, podem

optar por serem juízes ou promotores51

. Assim, há os magistrats du parquet e os

magistrats du siège, segundo pertençam à carreira do Ministério Público ou a carreira

judicial.

Haja vista que esses dois órgãos pertencem ao Poder Judiciário pode-se afirmar

que a natureza jurídica das duas espécies de instrução preliminar será de um

procedimento judicial pré-processual. Não obstante, o que mais importa é a separação

entre a autoridade de investiga, instrui e julga no processo penal francês52

.

Portugal também atribuiu status constitucional ao Ministério Público em 1976.

Neste país as investigações criminais são dirigidas pelo Ministério Público o qual é

assistido pela Polícia Judiciária que, por sua vez, está sob sua orientação e

dependência funcional. A Instituição pode ainda realizar diretamente as investigações

criminais. Nesse sentido ensina Jorge de FIGUEIREDO DIAS.

49

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 154-157. 50

LOPES JÚNIOR. Aury. Op. cit., p. 234-235. 51

LIMA, Marcellus Polastri. Op. cit., p. 3. 52

LOPES JÚNIOR. Aury. Op. cit., p. 236.

Page 25: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

23

Como órgão encarregado de promover a perseguição das infrações, compete ao MP, antes de

tudo, proceder à sua completa investigação e ao seu possível esclarecimento. Para lhe permitir

a plena realização desta finalidade atribui-lhe a lei (art. 14 do DL n. º 35.007) a direção da

instrução preparatória, que o MP exercerá com observância das máximas que regulam a sua

actividade, nomeadamente o principio da legalidade e o dever de objetividade 53

.

Para dar efetividade à investigação criminal realizada de forma direita pelo

Ministério Público, Portugal criou um Departamento de Investigação Criminal

presidido pela Instituição, sem prejuízo das atividades realizadas pela Polícia

Judiciária54

.

De acordo com Jorge de FIGUEIREDO DIAS, o Ministério Público, em

Portugal, assume, no processo penal, uma posição jurídica de administração da justiça,

que não se confunde nem com a função executiva comum, nem com a função judicial.

O autor entende que o conceito de administração da justiça abrange toda atividade,

estatal ou não, que pela sua estreita relação com o direito está subordina aos valores da

verdade e da justiça e cujo fim precípuo é a realização daquele no caso concreto;

embora apenas uma parcela dessa atividade possa ser considera função judicial55

.

Todavia, embora possa empreender investigações criminais direitas, os

membros do Ministério Público português não gozam de algumas garantias

asseguradas aos membros do Ministério Público no Brasil, dentre as quais pode-se

citar a ausência de independência funcional.

Devendo o Ministério Público português adaptar suas funções processuais

penais às exigências impostas pela luta contra a criminalidade em diferentes contextos

se aceita que seus membros possam receber, dentro de certos limites, ordens de serviço

de suas instâncias superiores, bem como se admite que a Instituição esteja sujeita ao

controle externo do Ministro da Justiça, órgão do Executivo56

.

Na Alemanha, a partir de 1974, ficou estabelecido que as investigações

preliminares – ermittlungsverfahren e vorverfahren - ficariam a cargo do Ministério

Público, devendo o promotor averiguar não só as circunstâncias capazes de comprovar

a responsabilidade penal, como também aquelas capazes de exculpar o sujeito passivo

53

DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. Coimbra: Coimbra Editora, 2004. p. 395. 54

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 167. 55

DIAS, Jorge de Figueiredo. Op. cit. , p. 367-368. 56

Ibidem, p. 372-375.

Page 26: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

24

sobre o qual recaem as investigações57

.

A posição jurídica do Ministério Público dentro da estrutura política do Estado

alemão é alvo de muitas discussões. A Instituição é enquadrada como uma autoridade

da administração da justiça, não pertencente ao Poder Judiciário – uma vez que não

exerce atividade judiciante – nem pertencente ao Poder Executivo – haja vista que não

se trata de uma autoridade puramente administrativa. Apesar dessas características, a

investigação preliminar, a cargo do Ministério Público, pode ser classificada como um

procedimento administrativo pré-processual58

.

Na Inglaterra não há um Ministério Público como conhecemos. Devido ao

sistema do common law, o Attorney General – que faz às vezes do promotor de justiça

– é escolhido dentre advogados de notório saber jurídico pelo Primeiro Ministro e

nomeado pelo Parlamento Inglês59

. É a polícia inglesa que inicia, na maior parte das

vezes, a ação penal.

A Argentina atribui previsão constitucional para o Ministério Público em 1853,

mas o papel por ele assumido na investigação dos delitos é bem reduzido. As

investigações criminais são, na realidade, conduzidas por um juiz instrutor, restando ao

Ministério Público e a Polícia Judiciária o dever de auxiliá-lo. Findas as investigações

conduzidas pelo juiz instrutor o Ministério Público pode apenas requer a instauração

da ação penal ou a realização de novas diligências60

.

Talvez, tão importante quanto a possibilidade do Ministério Público

empreender investigações criminais de forma direta é assegurar uma separação clara

entre as atividades jurisdicionais e de persecução penal. Nos países em que o Poder

Judiciário controla a fase preliminar de investigação e ao final do processo concede a

tutela penal há um sério risco de se implantar um sistema penal inquisitivo.

Nos ordenamentos jurídicos citados pode-se notar uma tendência doutrinária de

se resguardar a atividade persecutória ao Ministério Público e a Polícia Judiciária, bem

como esforços no sentido de se atribuir ao parquet à possibilidade de instaurar

procedimentos investigativos de forma direita.

57

LOPES JÚNIOR. Aury. Op. cit., p. 245. 58

Ibidem, p. 246-247. 59

LIMA, Marcellus Polastri. Op. cit. , p. 3. 60

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 169

Page 27: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

25

CAPÍTULO II - FUNÇÕES INSTITUCIONAIS PENAIS DO MINISTÉRIO

PÚBLICO CORRELATAS À INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA

2.1 O Princípio da obrigatoriedade e a privatividade da ação penal pública

Diante das funções institucionais atribuídas pela Constituição Federal ao

Ministério Público pode-se perguntar qual seria o verdadeiro sentido do princípio da

obrigatoriedade da ação penal pública. O Ministério Público teria alguma

discricionariedade ou disponibilidade na sua atuação? Poderia, por razões de

oportunidade e conveniência, deixar de agir nas hipóteses em que o legislador previu

sua atuação61

?

Excluindo algumas exceções, como por exemplo, a possibilidade de se propor

transação penal nos crimes de menor potencial ofensivo – apontada por alguns

doutrinadores como atenuação do princípio da obrigatoriedade da ação penal – o

Ministério Público está obrigado a atuar sempre que se deparar com uma violação da

lei a qual está obrigado a tutelar. Nesse sentido, ensina Hugo Nigro MAZZILLI.

Assim, se o Ministério Público identifica a existência da lesão, em caso no qual a lei lhe

imponha a ação, não lhe é possível alegar conveniência em não propor ou em não prosseguir

na causa. Não é o Ministério Público livre para valorar se deve agir, depois de identificada a

hipótese legal que lhe torne exigível a intervenção. Entretanto, quando decide sobre a

propositura da ação, seja a ação penal, seja a ação civil, é livre para identificar se ocorre a

hipótese que lhe torne exigível a sua iniciativa62.

Ademais, como afirma FIGUEIREDO DIAS, a atividade do Ministério Público

no processo penal não pode ser compreendida como puramente administrativa, quer

porque ela se submete ao princípio estrito da legalidade, quer porque, se desenvolva,

durante todo o processo, vinculada não a considerações de oportunidade e

discricionariedade, mas sim subordinada à colaboração em um processo judicial63

.

Em um sistema penal acusatório como o nosso não há como se infligir uma

sanção penal sem que antes tenha se oportunizado ao réu o devido processo penal, com

61

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit., p. 230. 62

Ibidem, p. 231. 63

DIAS, Jorge de Figueiredo. Op. cit., p. 364-365.

Page 28: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

26

todas suas garantias e formalidades. A persecução criminal in judicio depende de um

requisito formal que é a propositura da ação penal, daí a obrigatoriedade de seu

oferecimento sempre que houver a violação de um tipo penal64

.

Nesses moldes, a obrigatoriedade da ação penal pode ser encarada como um

verdadeiro poder-dever, um munus público, concedido pela sociedade ao Ministério

Público para que esse exija do Estado-juiz a devida prestação da tutela penal65

.

Se o Estado retirou das mãos do particular o poder de impor a sua vontade para

que fosse possível a vida em sociedade, não há como o mesmo Estado furtar-se ao

dever de promover o devido processo sempre que haja lesão ou ameaça de lesão a um

bem juridicamente tutelado.

O que não pode ser confundido é a obrigatoriedade da ação penal com a

obrigatoriedade da propositura da ação penal. Para que a ação penal seja proposta o

Ministério Público deve contar com um mínimo de prova, deve ter a sua disposição

indícios suficientes de autoria e materialidade que viabilizem o oferecimento de uma

denúncia. Diante de um fato típico, antijurídico e culpável o Ministério Público não

tem discricionariedade para propor a devida ação penal66

.

O sistema acusatório, adotado por nós, exige a separação entre órgão acusador e

órgão jurisdicional. Não existe a possibilidade de se concentrar no mesmo indivíduo a

função de acusar e de julgar. Por isso, a necessidade de conceder a uma Instituição

imparcial e independente a titularidade da ação penal. No nosso sistema tal

legitimação foi conferida ao Ministério Público.

Com a promulgação da Constituição Federal 1988 e a adoção clara do sistema

processual acusatório não há como se conceber hipóteses em que o juiz ou a

autoridade policial possam dar início a ação penal de ofício. Completamente

teratológica é a visão de um sistema processual acusatório em que o órgão julgador é o

incumbido de exercer a função de órgão acusador, assim como não há espaço para a

figura do promotor ad hoc nessas condições 67

.

A necessidade de se garantir um processo penal justo faz com o Estado crie um

64

RANGEL, Paulo. Op. cit., p. 174. 65

Idem. 66

Ibidem, p. 174-175. 67

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit. , p. 229.

Page 29: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

27

órgão isento de qualquer outro sentimento que não o de justiça, independente

funcionalmente e apartado da função jurisdicional. Afinal, o Direito Penal e o Processo

Penal modernos não podem ser encarados como instrumentos de punição, mas sim de

garantia do cidadão68

.

Desta feita, a outorga da titularidade da ação penal pública ao Ministério

Público acaba por prestigiar o sistema acusatório e, concomitantemente, preserva a

imparcialidade do órgão jurisdicional, na exata medida em que afasta os

procedimentos penais de officio e a possibilidade de que o mesmo órgão de acusação

profira a decisão final no processo69

.

2.2 Atribuição de expedir notificações nos procedimentos administrativos

O artigo 129, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, atribuiu, dentro

outras, ao Ministério Público a função institucional de expedir notificações nos

procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e

documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva.

Hugo Nigro MAZZILLI faz uma pequena crítica à redação do dispositivo legal

e afirma que este é um instrumento de atuação do Ministério Público e não uma função

institucional como mencionado no texto constitucional70

.

A doutrina contrária a possibilidade do Ministério Público realizar

investigações criminais de forma direta sustenta que a prerrogativa da Instituição

expedir notificações restringe apenas aos procedimentos correlacionados à ação civil

pública, ou seja, àqueles realizados no âmbito do inquérito civil.

Destarte, como melhor ficará explicado adiante, referidas notificações podem

ser realizadas tanto na esfera civil quanto penal. Quando o inciso VI, do artigo 129, da

Constituição Federal refere-se à “procedimentos administrativos de sua competência”

aborda, com referida expressão, todos aqueles procedimentos inerentes às funções

68

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 173. 69

GARCIA, Emerson. Op. cit. , p. 223. 70

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit., p. 127.

Page 30: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

28

Institucionais do Parquet71

. Se outra fosse à intenção, bastaria à menção feita ao

inquérito civil e a ação civil pública feita no inciso III do mesmo dispositivo legal.

Conforme afirma Paulo RANGEL “a restrição do alcance da norma fere os

princípios comezinhos de hermenêutica jurídica, pois as normas que conferem direitos

não podem ter interpretação restritiva” 72

.

Ademais, importante relembrar que os incisos do artigo 129 da Constituição

Federal guardam relação de subordinação apenas com este e não entre si, com a

relação hierárquica estabelecida entre um artigo e seu respectivo parágrafo. Assim, não

contém relevância alguma o fato do inciso referente ao inquérito civil e a ação civil

pública preceder o inciso VI que menciona a possibilidade do Ministério Público

expedir notificações nos procedimentos de sua competência.

Está disposição espacial dos incisos não quer dizer que o inciso VI estaria

subordinado ao conteúdo do inciso III do artigo 129 e, assim, restringindo a

possibilidade do Ministério Público expedir notificações apenas nos inquéritos civis e

procedimentos correlatos à ação civil pública.

MAZZILLI ao referir-se à Lei Orgânica do Ministério Público da União e a Lei

Orgânica Nacional do Ministério Público relembra ainda que na hipótese do Ministério

Público expedir essas notificações o não comparecimento do intimado pode ter como

conseqüência sua condução coercitiva; que a requisição de informações, exame e

perícias pode ser feita a autoridades federais, estaduais e municipais, ou aos

respectivos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional; bem

como tais requisições podem ser dirigidas às entidades privadas73

.

Deve-se ter em mente, todavia, que a possibilidade de se determinar a condução

coercitiva deve ficar restritas àqueles casos em que o intimado, deliberadamente,

descumprir a notificação para comparecimento, não àqueles que foram surpreendidos

por uma notificação com prazo exíguo para apresentação e já estejam vinculados a

outros compromissos impostergáveis74

.

71

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 184. 72

Idem. 73

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. Op. cit., p. 128. 74

GARCIA, Emerson. Op. cit. , p. 295.

Page 31: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

29

2.3 Atribuição de requisitar diligências investigatórias e de instaurar inquéritos

policiais

A Constituição Federal, em seu artigo 129, inciso VIII, autoriza, ainda, o

Ministério Público a requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito

policial, desde que indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações

processuais.

Clássica é a diferenciação doutrinária feita entre requisição e requerimento.

Segunda a doutrina o conceito de requisição traz implícito a idéia de ordem, de

determinação legal que não pode deixar de ser atendida pelo órgão ou entidade

requisitada. Já o termo requerimento pressupõe a idéia de solicitação que pode ou não

ser atendida.

A partir desta diferença semântica e de outros postulados de hermenêutica

jurídica, os doutrinadores que sustentam a possibilidade do Ministério Público realizar

investigações criminais de forma afirmam que a prerrogativa de requisitar a realização

de diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial traz implícita a

faculdade de realizá-las de forma direita, pois, que pode o mais – que é o requisitar –

pode o menos – que seria realizar pessoalmente.

De forma clara, Paulo RANGEL sustenta este postulado, no sentido de que o

Ministério Público pode realizar investigações criminais de forma direita já que está

autorizado a requisitar a instauração de inquéritos policiais.

Seria um contra sensu, pelo menos assim nos parece, dar-lhes a legitimação para exigir que se

faça, mas negar-lhe o direito de fazê-lo, pessoalmente. Em outras palavras, é como se

disséssemos: “pode o Ministério Público fazer o mais, porém lhe é negado fazer o menos”.

Violaríamos as regras comezinhas de hermenêutica jurídica se assim pensássemos75

.

Um exemplo prático pode reforçar ainda mais essa interpretação. Imagine uma

situação hipotética em que um membro do Ministério Público, mediante informações

prestadas por um particular, tomasse conhecimentos de condutas criminosas praticadas

por policiais civis que compõe o auto-escalão da Policia Judiciária.

75

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 190.

Page 32: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

30

Nesta situação pouco, ou nenhum efeito teria a requisição feita pelo membro do

Ministério Público que tomou conhecimento do fato à autoridade policial responsável

pela apuração da conduta criminosa, sobretudo se essa mesma autoridade estivesse

envolvida na praticais de tais condutas.

O corporativismo, que não é de forma alguma privilégio da Polícia Judiciária,

impediria a realização de investigações eficientes e isentas de posturas tendenciosas.

Deixar, nesses casos, o monopólio da investigação criminal com a Polícia Judiciária é

tornar inócua a função institucional atribuída ao Ministério Público quanto a

titularidade privativa da ação penal e, mais do que isso, seria uma afronta ao interesse

social na repressão ao crime.

Page 33: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

31

III – SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

3.1 Sistema inquisitivo

O sistema inquisitivo teve sua origem no Império Romano, durante a cognitio

extra ordinem, como um procedimento destinado a apuração de uma classe especial de

delitos. Enquanto a persecução dos delitos comuns era relegada aos particulares, os

crimes consistentes em idéias políticas que questionassem os fundamentos do Império

eram levados ao conhecimento do imperador que concentrava o poder de julgá-los76

.

Cronologicamente o sistema inquisitivo sucede o sistema acusatório privado -

nesse, a persecução criminal, bem com a iniciativa da ação penal eram deixadas a

cargo dos particulares. Entretanto, o sistema acusatório privado era incompatível com

os objetos da Igreja que necessitava de um procedimento repressor capaz de garantir o

poder que vinha conquistando sem qualquer questionamento.

Assim, a justiça eclesiástica apropria-se e aperfeiçoa as praticas do processo

romano imperial com o fim de punir enérgica e eficazmente o pecado sem se importar

com a sorte do presumido pecador. Desta maneira, assim como o crimen majestatis

deu vida em Roma ao procedimento da cognitio extra ordinem, o crimen majestatis

divina determinou que a inquisição se convertesse em instrumento de dominação

política77

.

Destarte, o sistema inquisitivo só vai ganhar força em meados do século XI, a

partir das reformas implantadas pelo Papa Gregório VII. Nesse momento histórico, a

centralização, na figura do Papa, de todos os assuntos da Igreja, a sua organização

institucional e administrativa, bem como a atualização e codificação do direito

canônico, serviram como terreno fértil para instalação de um modelo de persecução

tão eficaz e repressor quanto o sistema inquisitivo78

.

No início, a repressão imposta aos indivíduos de uma comunidade surgiu com a

76

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Curso de investigação criminal. São Paulo: Juarez de Oliveira,

2002, p. 3. 77

Ibidem, p. 30. 78

Ibidem, p. 4-5.

Page 34: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

32

incursão dos “Obispos” às paróquias que componham a sua diocese. Em incursões

nessas comunidades, os Obispos tinha a tarefa de se informar sobre as práticas

religiosas e o comportamento moral dos indivíduos que a compunham e tinham o

poder der reunir algumas pessoas que sobre juramento deviam delatar qualquer tipo de

desordem79

. Na realidade, a “desordem” perseguida pela Igreja era aquela que

representasse qualquer forma de questionamento ao seu poder.

Nas palavras de Alfredo Vélez MARICONDE, a jurisdição eclesiástica aparece

primeiro como um instrumento de defesa dos interesses da Igreja e de subtrair dos

clérigos a jurisdição secular. Depois se torna um atributo de influência e dominação,

para menoscabo da própria autoridade real, em virtude de uma paulatina multiplicação

dos atos que se consideravam lesivos de tais interesses. O fundamento religioso que a

sustentou no começo fortificou-se com o político. É certo que, em um primeiro

momento, o próprio monarca incentivou o poder da Igreja com a esperança de que as

armas espirituais do Papa se sujeitassem aos nobres e favorecessem, assim, a sua

estabilidade; mas tarde se observa, diante da desmedida ingerência daqueles, uma

verdadeira luta entre os três poderes que disputavam a preeminência: real, senhoril e

eclesiástica80

.

Em meados do século XII, o poder eclesiástico conquista uma posição tão

privilegiada que se instaura a Justiça Eclesiástica. Num primeiro instante, a Justiça

Eclesiástica é criada para defender a fé e garantir os dogmas da Igreja, julgando com

exclusividade os delitos eclesiásticos. Ao longo dos séculos XIII, XIV e XV os

poderes da Igreja tomam dimensões tão grandes que a Justiça Eclesiástica estende seu

julgo aos demais delitos81

.

No processo inquisitivo os direitos e garantias dos acusados eram postos de

lado. A Igreja não estava preocupa em apurar com imparcialidade dos fatos, a única

preocupação era instaurar um regime de terror, suficientemente forte, para garantir a

manutenção do poder clerical através da manipulação da fé, nos moldes impostos pelo

alto clero. O processo inquisitivo, da maneira pela qual foi forjado, tornou-se muito

79

Ibidem, p. 29. 80

VÉLEZ MARICONDE, Alfredo. Scritti Giuridici in Memoria di Piero Calamandrei, apud

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Curso de investigação criminal, p. 5. 81

Ibidem, p. 5.

Page 35: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

33

mais um sistema de justificação do poder eclesiástico do que um instrumento de

garantia do acusado82

. Neste sentido, bem ilustrativas as palavras de MENDRONI.

O verdadeiro objetivo da batalha era a consciência do indivíduo, assim como o delito era o seu

pecado e a sanção a sua penitencia, sua confissão representava para a inquisição o preço da

vitória. Nada podia opor-se à consecução desse fim, que era a defesa dos interesses

vulnerados, e isso justificava todos os meios que então se praticava (...).

Assim, posta a sorte do processo na integridade do inquirido, a que se privava toda a defesa

pelo temor de que esta fosse um obstáculo ao descobrimento da verdade e, em conseqüência,

ao logro da finalidade que se tinha em conta, a investigação se realizava em ótimas condições

para assegurar a condenação e prevalecia o conceito de que mesmo inocente deveria morrer

sempre – para que o culpado não ficasse impune83

.

Para se compreender a sustentação do sistema inquisitivo por um período de

tempo tão logo e necessário ter em mente a ordem dos pensamentos vigente naquele

determinado momento histórico. O povo acreditava em uma ordem divina superior e,

na Igreja enquanto representante desta ordem na terra, bem como se enxergava como

uma engrenagem desta ordem, que por sua vez não poderia ser questionar.

Por isso, o sistema inquisitivo, implantado em todo o Continente Europeu,

apesar de ter assumido facetas diferentes em cada país, apresenta algumas

características marcantes que o distingue claramente do sistema acusatório.

Para que o processo inquisitorial fosse instaurado bastavam rumores públicos

da prática do delito; o juiz atuava de ofício durante o processo, sendo abolida a

acusação regularmente formalizada e a publicidade de todo procedimento; confundia-

se em uma única pessoa a figura do acusador e do juiz; buscava-se, a qualquer custo, a

confissão do acusado, para isso era submetido a todos os tipos de sevicias e torturas,

bem como privado de qualquer defesa; adotou-se o sistema da prova tarifada, em que

cada prova tinha um valor previamente fixado84

.

Com essas características, o processo inquisitivo perdeu um dos principais

atributos que eleva qualquer procedimento a dignidade de um verdadeiro processo: a

imparcialidade do órgão julgador. Extremamente distante do ideal concebido para um

Estado Democrático de Direito, o processo inquisitivo não atende os anseios de uma

sociedade moderna em que os direitos e garantias dos indivíduos são postos em

82

Ibidem, p. 6. 83

Ibidem, p. 30. 84

Idem.

Page 36: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

34

posição de destaque.

Os erros cometidos neste passado sombrio alertaram as gerações futuras para a

necessidade de separar a figura do órgão de acusação do órgão jurisdicional, com o

escopo de se garantir a imparcialidade nas decisões. Daí a criação e fortalecimento do

Ministério Público como titular exclusivo da ação penal pública.

Conveniente ressaltar que o nosso sistema processual penal, apesar de se

enquadrar no conceito de sistema acusatório, devido aos diversos dispositivos

constitucionais que salientam as características principais deste sistema, guarda um

ranço do sistema inquisitivo. Fato este suficiente para chamar a atenção dos

operadores do direito quanto à necessidade de se buscar um aprimoramento da nossa

legislação processual penal, bem como para a necessidade de se realizar uma

interpretação constitucional dessa legislação, como o objetivo de se garantir, cada vez

mais, os direitos fundamentais e a consolidação do Estado Democrático de Direito.

Pois, conforme alerta Aury LOPES JUNIOR a uma Constituição autoritária

corresponde um processo penal autoritário, utilitarista. Contudo, de uma Constituição

democrática como a nossa corresponde um processo penal democrático e garantista,

até porque a idéia de garantismo brota da Constituição como reduto intangível dos

direitos e garantias fundamentais orientadores de todo o sistema85

.

Garantismo este que só pode ser assegurado dentro de um sistema acusatório,

diga-se de passagem, estabelecido na própria Constituição, em que a gestação da prova

não é entregue ao juiz, mas às partes do processo.

3.2 Sistema acusatório

O sistema acusatório tem sua origem na antiguidade clássica no direito grego. A

Grécia, com sua vocação democrática, criou um sistema processual no qual havia a

participação direta dos cidadãos na acusação e julgamento dos delitos. A acusação

pertencia a todo cidadão e era considerada uma decorrência lógica da soberania

popular. O Império romano também viu florescer o sistema acusatório no período da

85

LOPES JÚNIOR. Aury. Op. cit., p. 4.

Page 37: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

35

república86

.

Todavia, em Roma o sistema acusatório era privado, fato este que legitima o

ofendido ou qualquer pessoa do povo a promover a acusação em face de quem

infringisse a lei. Além da indiferença do Estado no que tange ao conflito de interesses

instalado entre as partes, o sistema acusatório privado apresentava outros

inconvenientes graves, pois, muitas vezes, o ofendido não possui os recursos

necessários para promover a ação penal de modo satisfatório ou movia-se imbuído em

propósitos de vingança87

.

A fragilidade da acusação particular, embora com a vantagem de ser promovida

em contraditório, justificou a necessidade do Estado exercer a persecução criminal e a

instalação do sistema inquisitivo o qual aniquilou o actum trium personarum e reduziu

o acusado a condição de objeto de investigação88

.

O sistema acusatório dotado de um órgão de acusação público só nasceu no

século XVIII, com a decadência do poder eclesiástico e, consequentemente, do sistema

inquisitivo. A burguesia francesa, intelectualmente privilegiada e ávida por conquistar

um espaço na sociedade, passa a questionar os dogmas impostos pela Igreja e o que se

convencionou chamar de “fé pura e simples” 89

.

A burguesia, enquanto classe detentora do poder econômico e,

consequentemente, fadada ao controle político da sociedade da época, necessitava de

um sistema processual que garantisse maior liberdade aos seus membros e o mínimo

de segurança jurídica. Diante desse quadro, o sistema inquisitivo – o qual

impossibilitava o exercício da defesa em contraditório – não encontrava mais espaço

para prosperar. Paulo RANGEL sintetiza bem esse momento histórico.

O avanço e as conquistas sociais, no campo dos direitos e das garantias fundamentais, exigiu

uma nova postura do Estado, que deveria afastar o juiz da persecução penal, assegurando ao

acusado todos os direitos e garantias inerentes ao pleno exercício de sua defesa,

principalmente a imparcialidade do órgão julgador. Era o começo de uma nova era. Era a

instituição de um processo penal justo e independente da vontade e do interesse das partes. O

Estado continuava assim com a titularidade do ius persequendi in judicio, porém nas mãos de

86

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Op. cit. , p. 8. 87

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 197. 88

Ibidem, p. 197-198. 89

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Op. cit. , p. 8-9.

Page 38: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

36

um órgão criado para tal mister: O Ministério Público90

.

Portanto, o substituto escolhido para o sistema inquisitivo foi o acusatório,

marcado por uma acusação prévia e pela elevação do acusado ao status de sujeito de

direitos91

.

Seguindo o melhor caminho firmado nos Estados Democráticos de Direito, a

Constituição Federal de 1988 firmou um modelo penal claramente acusatório e

estabeleceu um rol considerável de instrumentos destinados a refrear o poder estatal

em face da liberdade individual que pode ser entendido como o conjunto mínimo de

condições necessárias para a estruturação de um devido processo penal92

.

Em um modelo acusatório, mesmo na fase de investigação preliminar, avultam

inúmeros instrumentos de garantia da liberdade individual, como, por exemplo, o

demoninado direito ao silêncio, pelo qual o suspeito deixa de ser considerado um

objeto de investigação e passa a ser considerado sujeito de direitos, o qual, não é

obrigado a produzir prova contra si mesmo. Nessa mudança de paradigma, qualquer

até que implique em restrição à liberdade do indivíduo, até um simples ato de

indiciamento, deve ser fundamentado pela autoridade competente93

.

A exigência de se informar ao preso em flagrante delito a identificação dos

autores de sua detenção também é um postulado da Constituição Federal de 1988. A

questão da identificação da autoridade responsável pela prisão em flagrante assume

um compromisso democrático na medida em que exterioriza um repúdio claro à

pratica ditatorial e policialesca das prisões que prevalecia no regime anterior a nova

ordem constitucional94

.

Nesse mesmo viés, o ordenamento constitucional brasileiro tratou de

regulamentar o tema do direito à informação quando da prisão ligando-o a informação

da acusação. A informação dos motivos que levaram a prisão deve ser feita tanto ao

preso, mediante a entrega da nota de culpa, como ao juiz competente e à pessoa

90

RANGEL, Paulo. Op. cit., p. 198. 91

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Op. cit., p. 9. 92

CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias Constitucionais na investigação criminal. 2 ed. ver.,

ampl. e atual. Rio de Janeiro: 2001. p. 29.

93 Ibidem, p. 30.

94 Idem.

Page 39: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

37

indicada pelo detido; uma vez que, somente a publicidade do ato de constrição da

liberdade pode evitar prisões arbitrarias e ilegais95

.

Há inúmeros outros instrumentos de garantia do indivíduo que se aplicam às

investigações preliminares em um modelo acusatório, dentre as quais pode-se citar

ainda a atenuação da regra do sigilo das investigações – que não pode mais ser

imposto ao advogado do investigado – a manutenção do princípio da inocência nos

casos em que não há uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado, bem

como a possibilidade de se constituir um advogado para acompanhar os procedimentos

investigativos preliminares. O mais importante, contudo, é perceber a clara mudança

de paradigma do modelo inquisitório – em que o investigado era tratado como objeto

de investigação – para o modelo acusatório – em que o investigado deve ser visto

como um sujeito de direito.

A reconstrução do sistema acusatório se deu, contudo, com algumas

modificações em relação ao modelo acusatório de iniciativa privada. A mais

significativa dentre elas talvez seja a criação de um órgão público de acusação: o

Ministério Público, titular da ação penal.

A atribuição dessa função a um órgão público, via de regra representado pelo

Ministério Público, encontra dupla justificativa: a primeira é a de garantir a afetividade

da persecutio criminis e a segunda é de reforçar a imparcialidade do órgão judicante96

.

O progresso social, nas mais diversas áreas, foi a causa de um incremento na

complexidade das relações intersubjetivas e por conseqüência na ampliação dos

direitos tuteláveis e dos conflitos sociais. Diante dessas condições, sentiu-se a

necessidade de se combater a criminalidade através de um órgão público e retirar das

mãos do particular a disponibilidade na propositura da ação penal.

Hoje, o Ministério Público, enquanto titular privativo da ação penal pública

incondicionada, está incumbido de promover não só a persecução criminal, como

também as investigação preliminares na área criminal, sem que se possa falar em uma

violação do sistema acusatório e sempre que o caso concreto assim exigir.

95

Ibidem, p. 31-33. 96

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Op. cit., p. 11.

Page 40: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

38

3.3 Sistema misto

O sistema misto é uma simbiose do sistema acusatório privado e do sistema

inquisitivo. Buscou-se retirar a persecução criminal das mãos dos particulares e

atribuí-la a um órgão público, via de regra, o Ministério Público, porém permitiu-se

que a investigação criminal ficasse sob o controle do Estado-juiz97

.

Esse sistema pode ser dividido em duas fases distintas: uma fase de instrução

preliminar e outra judicial. A primeira fase, inspirada no sistema inquisitivo, é

marcada por investigações prévias realizadas diretamente por um magistrado que em

tudo é auxiliado pela polícia judiciária; nesta há formação de um juízo prévio que recai

sobre os elementos justificadores da acusação penal e, em alguns países é chamada de

juízo de instrução. Na segunda fase surge a acusação propriamente dita, formulada por

um órgão distinto do órgão judicante; aqui o processo é público e o acusado possui

amplo direito de defesa, sendo respeitado o contraditório98

.

Apesar do avanço que representa em relação ao sistema inquisitivo, o sistema

misto não é a melhor opção quando se pensa em um processo como instrumento de

garantia do acusado. Apesar da segunda fase ser desenvolvida sob o crivo do

contraditório e a acusação ser feita por um órgão diverso daquele que vai julgar, o

ideal é que o Estado-juiz permaneça o mais distante possível das investigações,

preservando sua imparcialidade enquanto órgão julgador.

Pela analise dos diferentes sistemas acima mencionados pode-se notar com

facilidade que o modelo acusatório é aquele que mais se aproxima de um ideal de

justiça. Assim, se o sistema acusatório brasileiro relega ao Ministério Público a

titularidade da ação penal, por óbvio, garante também a possibilidade de coordenar as

investigações preliminares ou realizá-las de forma direta.

97

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 206. 98

Idem.

Page 41: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

39

IV – PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

4.1 Posição da doutrina pátria

A Constituição Federal de 1988 inaugurou uma nova fase no Ministério

Público. De simples órgão vinculado ao Poder Executivo o Ministério Público

passou ao status constitucional de instituição permanente, essencial à função

jurisdicional do Estado.

Em matéria criminal o legislador constituinte atribuiu não só a titularidade

exclusiva da ação penal, como também lhe resguardou o poder de expedir

notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando

informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva

(art. 129, inc. VI da CF), além da possibilidade de exercer outras funções que lhe

forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade99

.

Para assegurar o exercício dessas funções com autonomia e imparcialidade, o

legislador constituinte conferiu ao Ministério Público garantias institucionais e

garantias reservadas aos seus membros – vitaliciedade, inamovibilidade e

irredutibilidade de subsídio – sendo, essas últimas, equiparadas às garantias

asseguradas aos membros da magistratura.

Dentre as funções institucionais reservadas ao Ministério Público,

especificamente no que se refere às suas funções institucionais penais, a doutrina e a

jurisprudência pátria vêm atribuindo ao Parquet à prerrogativa de instaurar

99

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007.

Page 42: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

40

procedimentos administrativos não só para instruir ações civis públicas, como

também para justificar a ação penal.

A jurisprudência e a doutrina – entre progressos e retrocessos – vinham

firmando, com argumentos técnicos, a possibilidade do Ministério Público

engendrar investigação criminal de forma direta.

Não obstante, em recente decisão, a segunda turma do Supremo Tribunal

Federal, no RHC 81326, cujo relator é o ex-ministro Nelson Jobim, afirmou que a

Constituição Federal concedeu ao Ministério Público apenas o poder de requisitar

diligências e de determinar a instauração de inquérito policial, mas não a função de

inquirir diretamente pessoas suspeitas de terem praticado condutas delituosas.

Essa modificação na orientação do STF, impossibilitando a condução de

investigações criminais pelo Ministério Público, data venia, representa um

retrocesso nos quadros da doutrinária e da jurisprudencial pátria, bem como um

enfraquecimento da instituição a qual se atribui à defesa da ordem jurídica, do

regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Diante do novo status constitucional atribuído ao Ministério Público com a

promulgação Constituição Federal de 1988, assim como em virtude da posição que

a instituição assumiu no quadro nacional e nos demais países em que há um regime

democrático de direito solidamente estabelecido, torna-se elementar reafirmar os

argumentos que sustentam essa função institucional tão relevante.

A doutrina pátria que nega a possibilidade do Ministério Público conduzir

investigações criminais de forma direta apega-se, principalmente, em dois

fundamentos. Num primeiro momento, afirma que a atividade de investigação

criminal é exclusiva da Polícia Judiciária, para, logo em seguida, ressaltar que ao

Ministério Público é resguardado apenas a função de instaurar o inquérito civil

Page 43: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

41

público para justificar a propositura da ação civil pública e não de ação penal100

.

Para essa parcela minoritária da doutrina, a Polícia Judiciária deteria o

monopólio da investigação criminal, pois, o artigo 144 da CF/88 teria revogado o

parágrafo único do art. 4° do CPP. Assim, toda prova produzida pelo Ministério

Público na fase pré-processual estaria eivada de inconstitucionalidade, sendo, por

sua vez, nula101

.

Destarte, nem mesmo no campo da hermenêutica puramente gramatical não

há como se afirmar que o art. 144 da CF/88 reversa à Polícia Judiciária o monopólio

da atividade investigativa. Na realidade, a única menção feita à exclusividade no

exercício de funções da Polícia Judiciária diz respeito ao disposto no art. 144, § 1°,

IV, da CF, que garante à Polícia Federal o monopólio das funções de polícia

judiciária da União102

.

Todavia, a expressão “exercer, com exclusividade” apenas refere-se ao fato

de que as funções de polícia judiciária da União devem ser exercidas pela

denominada Polícia Federal, afastando as demais (polícia civil e militar), inclusive a

Polícia Rodoviária Federal. Essa interpretação foi firmada pelo Pleno do STF na

ADIn. 1.517 interposta pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia –

ADEPOL103

.

Outros doutrinadores dão uma interpretação diferenciada para o art. 144,

parágrafo único, IV da CF, no mesmo viés de se negar a exclusividade da atividade

investigativa a Polícia Judiciária. Esses autores fazem uma divisão entre as “funções

da polícia judiciária” e a atividade de “apuração de infrações penais”104

.

A exclusividade de que trata o art. 144 da Constituição Federal é mencionada

apenas no seu inciso IV e se refere às funções da Polícia Judiciária, dentre as quais

100

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo

Ministério Público. Curitiba: Juruá Editora, 2002. p. 93-107.

101 Ibidem, p. 94.

102 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 7 ed. rev. atual. e ampl. Belo

Horizonte: Del Rey, 2007. p. 62.

103 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 103.

104 FONTES, Paulo Gustavo Guedes. Investigação criminal. Disponível em: <http//www.jfse.gov.br/

noticiasbusca/noticias_2005/setembro/invest_crim.html> Acesso em: 17/11/2007.

Page 44: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

42

pode-se citar o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, a realização de

perícias e de outras diligências em colaboração com a atuação do Poder Judiciário.

Já a apuração das infrações penais é mencionada apenas no inciso I do artigo 144

que não faz qualquer referência à expressão “exclusividade”.

De fato, o sistema constitucional brasileiro adotou o que se convencionou

chamar de “princípio da universalização da investigação criminal”, não cabendo o

monopólio da investigação criminal à Polícia Judiciária. Esse princípio está em

consonância com os ideais de uma democracia participativa e com a maior

transparência dos atos administrativos estatais105

.

Ademais, a legitimação do Ministério Público para apuração de infrações

penais tem assento constitucional, conforme o disposto no art. 129, incisos I, VI e

IX da CF. O texto constitucional no art. 129, inciso I, afirma ser função institucional

do Ministério Público a promoção, com exclusividade, da ação penal pública.

Dessa maneira, do que valeria a previsão constitucional acima mencionada se

o parquet, titular exclusivo da ação penal, não pudesse intentar investigação

persecutória preliminar nos casos em que a situação fática exigir. Nas palavras de

Paulo Rangel, a atividade investigatória realizada pelo Ministério Público é inerente

à privatividade da ação penal pública, ademais quando a situação apresentada possa

impedir a apuração do delito pela ausência ou insuficiência de investigação da

Polícia Judiciária106

.

Neste mesmo sentido, leciona Rodrigo Régnier CHEMIM.

Cabe, então ao Ministério Público adotar providências para que possa exercitar plenamente

suas funções constitucionais, suprindo as omissões evidenciadas, pois como parte autora da

ação penal a ele incumbe provar o que alega em Juízo. E se é titular exclusivo da ação penal

pública incondicionada e tem o ônus de provar, nada mais justo que também possa produzir a

prova, quando a polícia não agir com a diligência necessária107

.

105

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 106

RANGEL, Paulo. Investigação criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 210.

107 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 99.

Page 45: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

43

A Constituição Federal não criou o Ministério Público para ser um órgão

inerte. Esse não é o perfil constitucional que a Carta Magna atribuiu à Instituição,

muito menos a vontade do legislador constituinte. Se o Ministério Público é o titular

exclusivo da ação penal pública e incube a ele a persecutio criminis não é razoável

que fique ao talante da autoridade policial, aguardando a conclusão do inquérito

para decidir se vai oferecer denúncia, requer o seu arquivamento ou a realização de

novas diligências. Ao Ministério Público não pode ser relegado o papel de mero

espectador das investigações, ao contrário, deve dispor de mecanismos técnico-

jurídicos que permitam a realização da persecução penal108

.

A prática mostra que não há outra posição a ser adotada, sobretudo nos casos

em que a apuração da infração penal envolve suspeitos diretamente ligados a

atividade da Polícia Judiciária. Nesses casos, o corporativismo pode anular o

interesse social na repressão de condutas criminosas e tolher o Ministério Público

na sua função de desempenhar o papel constitucional de defensor da ordem jurídica

e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Exemplo prático desse tipo de situação ocorreu em São Paulo, quando o

Ministério Público paulista, sob a direção do Procurador de Justiça Hélio Bicudo,

empreendeu, de forma direta, diversas diligências investigativas no caso que apurou

os crimes praticados pelo “Esquadrão da Morte” 109

.

Outro exemplo citado por MAZZILLI que autorizaria o Ministério Público a

conduzir investigação criminal de forma direta apresenta-se nos casos em que a

Polícia Judiciária não está em situação adequada para conduzir investigações contra

altos administradores ligados, principalmente, aos interesses do Poder Executivo110

.

Dada a sua condição de organismo subordinado ao Poder Executivo e à

administração, muitas vezes, a Polícia Judiciária está impedida de exercer uma

108

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 109

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1988. p.

144-145.

110 Idem.

Page 46: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

44

apuração isenta de qualquer conotação político-partidária111

. De fato, as autoridades

policiais não têm as mesmas garantias asseguradas aos membros do Ministério

Público, condição está que as deixam mais sujeitas as pressões externas.

Nesses casos, em que o Poder Executivo pode exercer direita influência

sobre o trabalho de investigação e impedir a apuração de crimes praticados por

pessoas influentes social ou politicamente, ou nas situações em que o

corporativismo pode afetar a diligência das investigações, alguns autores chegam a

afirmar que o monopólio da atividade investigativa pela Polícia Judiciária fere o

princípio da igualdade (art. 5°, caput e I da CF), uma vez que nem todos os

investigados seriam submetidos a investigações rigorosas112

.

Não se pode perder de vista que a investigação criminal, bem como a

persecução criminal são atividades de autodefesa da sociedade contra a prática de

infrações penais. Assim, quando esta não se desenvolve de forma adequada, devido

às peculiaridades do caso concreto, o Ministério Público deve interferir na fase

preliminar de investigação para garantir o sucesso da persecução criminal em

juízo113

.

Em um Estado Democrático de Direito a lei penal e o processo penal têm por

escopo tutelar os bens reconhecidos pela sociedade como dignos de proteção. Para

manter um equilíbrio social e garantir a aplicação da lei da forma mais imparcial

possível o Estado retira das mãos dos particulares, como regra, a possibilidade de

autotutela, enfim, de fazer justiça com as próprias mãos. Assim, a sociedade

depende da eficiência e da eficácia dos métodos praticados pelo aparato estatal para

ver seus bens mais relevantes protegidos e o Estado necessita ter a sua disposição os

instrumentos adequados para garantir a segurança dos seus administrados114

.

Assim, a segurança pública, enquanto dever do Estado, direito e

111

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 213. 112

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 113

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 114

JATAHY, Carlos Roberto de C. A investigação direta pelo Ministério Público: uma interpretação

institucional. Disponível em: <http//www.femperj.org.br/artigos/artigo_inv_direta.php> Acesso em:

17/11/2007.

Page 47: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

45

responsabilidade de todos, não pode ser prejudicada pelo espírito corporativista das

entidades encarregadas de realizar a apuração dos fatos delituosos ou pela pressão

política sob a qual estão subjugadas. O Ministério Público também integra o sistema

estatal de prevenção à criminalidade, daí sua prerrogativa de proceder investigações

criminais de forma direta115

.

Ainda, nessa linha de raciocínio, se cabe ao Ministério Público promover,

com exclusividade, a ação penal é evidente que a ele é atribuída todas as outras

prerrogativas para exercer essa função. Esta possibilidade vem assegurada na Teoria

norte-americana dos Poderes Implícitos, a qual é reconhecidamente passível de

aplicação no direito pátrio116

.

Deveras, o exercício da titularidade da ação penal pública apresenta grande

dependência com relação as investigações preliminares, de modo que o sucesso da

atividade fim (propositura da ação penal e persecução penal) está intimamente

vinculado a correta realização da atividade-meio (investigação preliminar)117

.

Complementando o inciso I do artigo 129 da CF, o inciso VI, do mesmo

artigo, menciona a possibilidade da instauração de procedimento administrativo

investigatório, atribuindo a lei complementar respectiva a tarefa de sua

regulamentação. É esse o rumo da melhor doutrina nacional.

Esta “lei complementar respectiva” referida, pode ser, como primeira ratio, a Lei Orgânica

Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/93); num segundo momento, a Lei Complementar

do Ministério Público da União (Lei 75/93), aplicada subsidiariamente aos Ministérios

Públicos Estaduais, de acordo com o art. 80, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público;

e, num terceiro momento, as respectivas Leis Orgânicas Estaduais de cada um dos Ministérios

Públicos dos Estados da Federação118

.

Por outro lado, não há como negar vigência, validade e eficácia a essas

normas infraconstitucionais (LONMP e LOMPU) como querem algumas

115

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 116

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 99. 117

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007. 118

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 100.

Page 48: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

46

doutrinadores. A vigência, quanto possibilidade temporal de aplicação da norma,

não pode ser negada uma vez que não há lei posterior revogando-as. A eficácia, no

que diz respeito à aptidão da norma de produzir seus regulares efeitos é extraída da

própria Constituição, no exato instante que esta fixa as funções institucionais do

Parquet. Por fim, a validade dessas normas, no que tange a sua perfeita adequação

aos preceitos da Lei Maior, salta aos olhos no momento em que se procede a

simples leitura do art. 129, inciso VIII, o qual estabelece, como função institucional

do Ministério Público, a prerrogativa de requisitar diligências investigatórias e a

instauração de inquérito policial119

.

Outro argumento utilizado para tolher o Ministério Público da possibilidade

de proceder à investigação criminal de forma direta é no sentido de que a

Constituição Federal, no seu artigo 129, inciso VI, teria reservado ao parquet

apenas a possibilidade de requisitar informações e documentos para instruir

procedimentos administrativos de natureza civil, mais especificamente, aqueles que

embasariam a propositura da ação civil pública.

Todavia, os procedimentos administrativos mencionados no inciso VI do art.

129 não estão restritos ao inquérito civil, como faz pensar a doutrina contraria a

investigação direta pelo Ministério Público. Não estando adstritos às investigações

da Polícia Judiciária, resta aos membros do parquet à possibilidade da coleta direta

de elementos de convicção para elaboração da sua opnio delicti, sempre que o caso

concreto assim solicitar120

.

Destarte, se a intenção do legislador fosse conferir ao Ministério Público

apenas o poder de instaurar procedimentos administrativos de natureza civil,

bastaria a menção feita no inciso III, do art.129, da CF, ao inquérito civil, deixando

de mencionar os “procedimentos administrativos de sua competência”, no inciso VI.

A doutrina alerta ainda para o fato de que a legislação ordinária, sempre que

faz referência ao inquérito civil, utiliza a conjunção aditiva “e” para, logo em

119

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 214. 120

LIMA, Marcellus Polastri. Ministério Público e persecução penal. 3. ed. rev. e atual. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 90.

Page 49: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

47

seguida, mencionar a expressão “outros procedimentos administrativos”. Assim,

fica evidente que ao Ministério Público é resguardada a possibilidade de instaurar

procedimentos administrativos de natureza criminal121

.

Isso tudo, sem mencionar na Lei 8.429/92 (Lei de improbidade

administrativa), que em consonância com o artigo 129, inciso III da CF, autorizou o

Ministério Público a conduzir inquéritos civis para apurar atos de improbidade

administrativa. Nessas hipóteses, em que o Ministério Público investiga atos de

improbidade administrativa, caso o promotor de justiça encarregado a investigação

se deparasse com provas da prática de uma conduta delituosa estaria por acaso

impedido de oferecer a competente ação penal por ter colhido o material que a

embasaria? Neste exemplo, qualquer resposta afirmativa seria um completo

absurdo122

.

Relevante mencionar ainda que o art. 129, inciso IX da CF, garante ao

Ministério Público o exercício de outras funções que lhe forem conferidas, desde

que compatíveis com sua finalidade. Ora, uma das finalidades atribuída ao

Ministério Público é a persecução penal e o combate à criminalidade, para isso, é

preciso que a Instituição disponha dos meios adequados para cumprir seu papel

constitucional, dentre os quais pode-se citar a prerrogativa de empreender

investigações criminais de forma direita.

Esse dispositivo constitucional funciona como uma cláusula aberta e opera

uma abertura na esfera de atribuições do Ministério Público que fica potencializada

com a atuação do legislador ordinário. No nosso sistema normativo, essa atuação

complementar do legislador ordinário já está consagrada na Lei complementar

75/93 (Estatuto do Ministério Público da União), aplicável subsidiariamente ao

Ministério Público dos Estados-membros, e na Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional

121

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 107. 122

FONTES, Paulo Gustavo Guedes. Investigação criminal. Disponível em:

<http//www.jfse.gov.br/noticiasbusca/noticias_2005/setembro/invest_crim.html> Acesso em:

17/11/2007.

Page 50: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

48

do Ministério Público), citadas alhures123

.

Reforçando esses argumentos, observa-se que a Constituição Federal atribuiu

a outros órgãos a possibilidade de exercer diretamente a investigação criminal. Esse

é o caso das CPIs, utilizadas tanto pela Câmara dos Deputados quanto pelo Senado

Federal, com previsão expressa no artigo 58, § 3º, da CF124

.

A Lei 4771/65 (Código Florestal), em seu art. 33, também prevê a

possibilidade dos funcionários da repartição florestal e de autarquias com

atribuições correlatas instaurar procedimentos investigativos em casos da prática de

crimes previstos nessa lei. No âmbito do Poder Executivo, o Banco Central também

tem a prerrogativa de iniciar procedimentos para apurar delitos de sonegação

fiscal125

.

Levando-se em conta o contexto histórico em que a Constituição de 1988 foi

promulgada, principalmente no que se refere à quebra de vínculos com a ordem

política e jurídica anterior, seria, de todo ilógico, atribuir, com exclusividade, a

atividade investigatória a Polícia Judiciária. Definitivamente não há como se

compatibilizar uma hermenêutica constitucional principiológica com um sistema

que reservar o monopólio das investigações à polícia126

.

O monopólio ou a exclusividade da investigação criminal não serve a

questão da segurança pública, ao contrário sugere uma disputa de poder que só

prejudicaria a sociedade. Um Estado Democrático de Direito, orientado por um

sistema de freios e contrapesos, não deve concentrar funções dessa magnitude em

um único órgão, no caso a Polícia Judiciária, ainda mais quando esse órgão esteja

vinculado diretamente a um dos Poderes do Estado127

.

123

JATAHY, Carlos Roberto de C. A investigação direta pelo Ministério Público: uma interpretação

institucional. Disponível em: <http//www.femperj.org.br/artigos/artigo_inv_direta.php> Acesso em:

17/11/2007. 124

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 223. 125

JATAHY, Carlos Roberto de C. A investigação direta pelo Ministério Público: uma interpretação

institucional. Disponível em: <http//www.femperj.org.br/artigos/artigo_inv_direta.php> Acesso em:

17/11/2007. 126

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Op. cit. , p. 63.

127 VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007.

Page 51: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

49

Seria, no mínimo estranho, permitir-se que o Estado pudesse instaurar

processo crime com informações trazidas por particulares – notitia criminis – ou por

outros órgãos da administração, como no caso das CPIs, e fosse vedado ao titular da

ação penal colher essas informações de forma direta128

.

Argumenta-se, ainda, que uma investigação criminal levada a cabo pelo

Ministério Público pode afetar a imparcialidade do agente ministerial e ferir

garantias individuais atribuídas aos cidadãos129

.

Em primeiro lugar, mesmo que se admitisse a influência na imparcialidade

do membro do parquet, posicionamento esse de todo insustentável, bastaria uma

divisão, no âmbito interno da própria instituição, entre as funções de investigar e de

acusar, atribuindo a agentes diferentes estas tarefas130

.

Ademais, a imparcialidade que se quer impedir é aquela que leva o agente

para além das pré-compreensões presentes em todo ser humano. Todavia, uma vez

encerrada a investigação criminal direita, o Ministério Público pode tanto requerer o

arquivamento do procedimento administrativo como oferecer a denúncia, sendo

qualquer excesso solucionado pelos meios judiciais colocados a disposição dos

particulares131

.

Se não fosse assim, essa imparcialidade, que alguns autores dizem afetar o

Ministério Público, também poderia ser atribuída à Polícia Judiciária. É evidente

que a Polícia Judiciária não tem competência para iniciar a ação penal, uma vez que

a titularidade desta é do Ministério Público, mas, por outro lado, não há como negar

que os seus membros estão funcional e psicologicamente comprometidos com a

persecução penal132

.

Se for levado em conta o fato de que o inquérito policial é um procedimento

investigativo inquisitivo, no qual não é assegurado o contraditório, e que tal

128

RANGEL, Paulo. Op. cit. , p. 215. 129

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Op. cit. , p. 95. 130

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Op. cit. , p. 66.

131 Ibidem, p. 66-67.

132 FONTES, Paulo Gustavo Guedes. Investigação criminal. Disponível em:

<http//www.jfse.gov.br/noticiasbusca/noticias_2005/setembro/invest_crim.html> Acesso em:

17/11/2007.

Page 52: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

50

procedimento serve de fundamento para a propositura da ação penal, poder-se-ia

afirmar que a visão, muitas vezes distorcida do aparato policial, é repassada para o

Ministério Público, que só tem como parâmetro as informações contidas nos autos

do inquérito.

Outros doutrinadores criticam tal prerrogativa ministerial ao afirmar que as

investigações criminais levadas a cabo pelo Ministério Público não estariam

submetidas a um controle de legalidade. Destarte, esse argumento não pode

prevalecer. A própria Constituição, no seu artigo 5°, inciso XXXV, afirma que a lei

não excluíra da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, desta

maneira, sempre que o Ministério Público agir com excesso de poder, arbitrariedade

ou contra a lei caberá o controle judicial de seus atos mediante a impetração dos

remédios constitucionais, como, por exemplo, o habeas corpus e o mandado de

segurança133

.

Ademais, com a criação do Conselho Nacional do Ministério Público – EC

45/04, conhecida como Reforma do Judiciário – o controle interno da Instituição

passou a ser exercido por membros da sociedade civil, da magistratura e de

representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, fato este que implica uma maior

legitimação do Ministério Público na persecução criminal e na possibilidade de

empreender investigações preliminares de forma direta sem que se possa sustentar

qualquer ausência de controle na legalidade dos atos praticados134

.

Desta feita, quando se argumenta com a possibilidade de se garantir ao

Ministério Público a prerrogativa de realizar investigações criminais de forma

direta, não se pretende atribuir à Instituição a tarefa de presidir inquéritos policiais –

tarefa essa resguardada com exclusividade a Polícia Judiciária. Qualquer tentativa

em sentido contrário seria um completo absurdo, pois se estaria entregando ao

parquet a exclusividade de uma atividade que não se quer admitir seja conferida a

133

JATAHY, Carlos Roberto de C. A investigação direta pelo Ministério Público: uma interpretação

institucional. Disponível em: <http//www.femperj.org.br/artigos/artigo_inv_direta.php> Acesso em:

17/11/2007. 134

JATAHY, Carlos Roberto de C. A investigação direta pelo Ministério Público: uma interpretação

institucional. Disponível em: <http//www.femperj.org.br/artigos/artigo_inv_direta.php> Acesso em:

17/11/2007.

Page 53: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

51

qualquer outro órgão135

.

Apesar de toda essa argumentação técnica, o STF vem alterando sua

orientação no sentido de se vedar ao Ministério Público à função de conduzir

procedimentos investigativos de forma direta.

Essa mudança de posicionamento pode ser comprovada pela analise dos

julgados RE n. 233.072-4/RJ, RE n. 205.473-9/AL e no Inq. n. 1.828, fato este que

por si só justifica reafirmar os argumentos sustentados pela doutrina e pela

jurisprudência nesses quase vinte anos de Constituição Cidadã, no sentido de se

ressaltar as funções institucionais do Ministério Público enquanto instituição

permanente, essência à função jurisdicional do Estado, incumbida da defesa da

ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais

indisponíveis.

4.2 A alteração na orientação do Supremo Tribunal Federal

Neste subitem serão analisadas três decisões do Supremo Tribunal Federal,

mais precisamente, os recursos extraordinários 205.473-9/AL e 233.072-4/RJ e o

recurso ordinário em habeas corpus 81.326-7/DF, que bem evidenciam essa

mudança de posicionamento da Suprema Corte no que tange a possibilidade do

Ministério Público empreender investigações criminais de forma direita.

Partindo desses três casos concretos procura-se tecer algumas críticas

referentes aos fundamentos dessas decisões as quais têm como ponto em comum o

fato de negarem ao Ministério Público essa função constitucional. Data venia ao

posicionamento exposto no fundamento de tais decisões procurar-se-á demonstrar o

seu equivoco frente à nova ordem constitucional e ao papel do Ministério Público,

para isso, reforçar-se-á os argumentos já trabalhados no item anterior.

135

VIEIRA, Nedens Ulisses Freire. A investigação criminal pelo Ministério Público. Disponível em:

<http//www.mp.pr.gov.br/gabinete/indmp.html> Acesso em: 17/11/2007.

Page 54: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

52

A primeira decisão a ser analisada foi proferida no recurso extraordinário

205.473-9/AL, pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, cujo relator foi o

Ministro Carlos Veloso. Tal recurso foi interposto de uma decisão prolatada pelo

Egrégio Tribunal Federal da 5° Região que concedeu ordem para trancar inquérito

policial instaurado em face do então Delegado da Receita Federal em Alagoas.

Essa celeuma teve como causa uma requisição feita pelo Procurador da

República no Estado de Alagoas ao Delegado da Receita Federal, Ivaldo Hélvio

Pinto Rego, no sentido de que fornecesse o conteúdo de “diligencias

investigatórias” sobre a Organização Arnon de Mello, com vistas à apuração de

possíveis ilícitos fiscais.

Com o argumento de que tais “diligências investigatórias” estariam

centralizadas em Brasília, uma vez que a apuração dos fatos envolvia o caso PC

Farias e o então Presidente Collor de Mello, o Delegado da Receita Federal deixou

de atender a requisição do representante do Ministério Público, que por sua vez,

requisitou a Policia Federal a instauração de inquérito policial para que a conduta

omissiva daquele fosse apurada.

Instaurado o inquérito policial o Delegado da Receita Federal, Ivaldo Hélvio

Pinto, impetrou habeas corpus preventivo para trancar o mencionado procedimento

investigativo.

Nesse ponto, não se tem a pretensão de discutir a justiça da decisão que

deixou de conhecer o recurso extraordinário interposto pelo representante do

Ministério Público Federal contra decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª

Região que concedeu a ordem para trancar o inquérito policial, mas tão somente

criticar um dos fundamentos da mencionada decisão.

Um dos fundamentos levantados pelo relator do recurso extraordinário,

Ministro Carlos Velloso, para não reconhecer do recurso foi no sentido de que não

compete ao Procurador da República, na forma do disposto no art. 129, VIII, da

Constituição Federal, assumir a direção das investigações, substituindo-se a

autoridade policial, dado que, tirante a hipótese inscrita no inciso III do art. 129 da

Constituição Federal, não lhe compete assumir a direção de investigações tendentes

Page 55: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

53

à apuração de infrações penais, conforme interpretação extraída do artigo 144, §§ 1°

e 4° da Constituição Federal.

Conforme já analisado no tópico anterior, data venia a entendimento

contrário, tal fundamento não pode prosperar por pelo menos dois motivos. O

primeiro deles refere-se à possibilidade do Ministério Público empreender

procedimentos investigativos apenas para instruir inquéritos civis.

De fato, como dito alhures, se a intenção do legislador fosse conferir ao

Ministério Público apenas o poder de instaurar procedimentos administrativos de

natureza civil, bastaria a menção feita no inciso III, do art.129, da CF, ao inquérito

civil, deixando de mencionar os “procedimentos administrativos de sua

competência”, no inciso VI. O legislador ordinário não faria questão, de a todo o

momento, utilizar a conjunção aditiva “e” quando faz referência ao inquérito civil,

para, logo em seguida, mencionar a expressão “outros procedimentos

administrativos”.

Além do mais, não há como se desprezar a aplicação da Teoria dos Poderes

Implícitos. Ora, se cabe ao Ministério Público promover, com exclusividade, a ação

penal é evidente que a ele é atribuída todas as outras prerrogativas para exercer essa

função.

Assim, não estaria o Ministério Público restrito a requisitar diligências

investigativas e a instauração de inquérito policial como afirma o Ministro Carlos

Velloso. Tampouco, tais atividades são atribuídas com exclusividade a Polícia

Judiciária, como faz entender o Ministro Carlos Velloso quando menciona na sua

decisão o artigo 144, §§ 1° e 2° da Constituição Federal.

Outra decisão que merece atenção foi proferida no recurso extraordinário

233.072-4/RJ que teve como relator o Ministro Néri da Silveira e como recorrente o

Ministério Público Federal.

A questão chegou às portas da Suprema Corte tendo como ponto inicial

denuncia oferecida pelo Ministério Público Federal em face do então Delegado de

Administração do Ministério de Estado da Fazenda no Rio de Janeiro é de outros

Page 56: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

54

comerciantes, pela pratica em tese do delito tipificado no artigo 92 da Lei 8.666/93.

Conforme consta da exordial acusatória o Delegado de Administração do

Ministério de Estado da Fazenda no Rio de Janeiro, representando a União, teria

celebrado contrato administrativo, cujo conteúdo regulava a prestação de serviços

de segurança nos prédios do Ministério da Fazenda, com os outros co-denunciados.

Referido contrato foi precedido de um procedimento licitatório, o qual tinha

como uma de suas clausulas a exigência de que a licitante vencedora prestasse uma

garantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor do contrato em favor da

Delegacia de Administração do Ministério da Fazenda no Estado do Rio de Janeiro.

Os co-denunciados, vencedores da licitação, deixaram de prestar tal garantia

e, mesmo assim começaram a receber a contraprestação por parte do Estado, sem

que o Delegado de Administração tomasse qualquer atitude no sentido de resolver o

contrato. Esses fatos motivaram a denúncia oferecida pelo Ministério Público

Federal.

Todavia antes do oferecimento da denúncia o Procurador da República

intimou o denunciado, então Delegado de Administração do Ministério de Estado

da Fazenda no Rio de Janeiro, para prestar esclarecimentos sobre o caso. Mesmo

sem o comparecimento do denunciado a denúncia foi oferecida com base em outras

provas que estavam em poder do Ministério Público.

Diante dos fatos, o denunciado impetrou habeas corpus perante a Segunda

Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região para trancar a respectiva ação

penal, alegando que o representante do Parquet, sem motivação aparente, instaurou

inquérito administrativo que ele mesmo realizou, exorbitando sua competência legal

e o qual culminou com o oferecimento de denúncia abusiva.

Participaram do julgamento os Ministros Néri da Silveira, na qualidade de

relator, Nelson Jobim, Maurício Corrêa, Marco Aurélio e o Ministro Carlos Velloso.

O resultado da votação terminou em três votos a dois no sentido de denegar

provimento ao recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público.

Compondo o voto vencedor, posicionaram-se os Ministros Nelson Jobim,

Page 57: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

55

Marco Aurélio e Carlos Velloso no sentido de não conhecerem do recurso

extraordinário interposto pelo Ministério Público. Dentre esses Ministros, somente o

Ministro Nelson Jobim e o Ministro Marco Aurélio discutiram a possibilidade do

Ministério Público empreender investigações criminais de forma direita.

Fundamentado seu voto, o Ministro Nelson Jobim negou a possibilidade do

Ministério Público realizar investigações criminais de forma direta. Para tanto,

afirmou que, em passagens anteriores, primeiro quando da elaboração da

Constituição Federal de 1988 e depois com o projeto de lei complementar que tratou

do Ministério Público da União, o legislador constituinte e o legislador ordinário,

respectivamente, tentaram introduzir texto de lei que cuidava especificamente de

tema correlato a possibilidade do Ministério Público empreender investigações

criminais de forma direta, matéria essa que, segundo o Ministro, foi rejeitada nas

duas oportunidades.

Afirmou ainda o Ministro Nelson Jobim que o Ministério Público não tem

competência alguma para produzir inquérito penal, sob o argumento de que tem a

possibilidade de expedir notificações nos procedimentos administrativos. A única

competência assegurada ao Ministério Público seria no âmbito do inquérito civil

para a propositura de ação civil pública.

O Ministro Marco Aurélio, por sua vez, sustentou em seu voto que a abertura

de inquérito, sua condução, o ato de colher elementos dentro desse inquérito não é

atividade inerente à finalidade do Ministério Público. Os procedimentos

administrativos da competência do Ministério Público, segundo o entendimento do

Ministro, seriam aqueles destinados a propositura da ação civil pública.

Por fim, o Ministro Marco Aurélio afirma que as funções de policia

judiciária e a apuração de infrações penais incubem às policias civis e não ao

Ministério Público, para tanto, é citado o artigo 144, § 4° da Constituição Federal.

Importa ressaltar que o Ministro Maurício Corrêa, embora tenha conhecido e

dado provimento ao recurso extraordinário interposto pelo Ministério Publico,

deixou claro seu posicionamento no sentido de rejeitar a possibilidade do Parquet

realizar investigações criminais de forma direita enquanto não houver prévia

Page 58: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

56

normatização legal que regule tal atribuição.

Pode-se observar, pelos votos dos eminentes Ministros, que os argumentos

levantados para se negar a possibilidade do Ministério Público empreender

investigações criminais de forma direita se repetem e, data venia, não devem

prevalecer conforme demonstrado acima.

Se a intenção do legislador constituinte fosse conferir ao Ministério Público

apenas o poder de instaurar procedimentos administrativos de natureza civil, como

sustenta o Ministro Nelson Jobim, bastaria ter feito menção ao inciso III, do artigo

129, da Constituição Federal, que trata do inquérito civil, deixando de mencionar os

“procedimentos administrativos de sua competência”, no inciso VI, do mesmo

artigo.

Por outro lado, não há como se afirmar que a atividade investigava para fins

penais é função exclusiva da Polícia Judiciária como afirma o Ministro Marco

Aurélio. Pela simples leitura do texto constitucional pode-se perceber que a única

menção feita à exclusividade no exercício de funções da Polícia Judiciária diz

respeito ao disposto no art. 144, § 1°, IV, da CF, que garante à Polícia Federal o

monopólio das funções de polícia judiciária da União e não o controle da atividade

investigativa.

O argumento do Ministro Maurício Correa também não pode prevalecer. A

prévia existência de normatização legal, que supre com largueza essa necessidade,

pode ser atribuída, num primeiro momento, a Lei Orgânica Nacional do Ministério

Público (Lei 8.625/93); num segundo momento, a Lei Complementar do Ministério

Público da União (Lei 75/93), aplicada subsidiariamente aos Ministérios Públicos

Estaduais, de acordo com o art. 80, da Lei Orgânica Nacional do Ministério

Público; e, num terceiro momento, pelas respectivas Leis Orgânicas Estaduais de

cada um dos Ministérios Públicos dos Estados da Federação.

Interessa comentar uma última decisão proferida no recurso ordinário em

habeas corpus n.° 81.326-7/DF, cujo relator foi o Ministro Nelson Jobim, para se ter

uma visão panorâmica dessa inversão de posicionamento do Supremo Tribunal

Federal relacionado à realização de investigação criminal direita pelo Ministério

Page 59: INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

57

Público.

Referida decisão foi tomada por unanimidade de votos, sendo que os demais

Ministros acompanharam o voto do Ministro Nelson Jobim, sem acrescentar outros

argumentos relevantes ao voto do relator. Por isso, interessa, nesse ponto final,

comentar apenas os fundamentos exarados no voto do Ministro-relator Nelson

Jobim.

A discussão contida nesse processo chegou à Suprema Corte através de

recurso ordinário em habeas corpus interposto contra decisão denegatória de habeas

corpus substitutivo impetrado pelo paciente, em última instância, perante o Superior

Tribunal de Justiça.

De acordo com o relatório do recurso, o recorrente, Delegado de Polícia, foi

notificado pelo representante do Ministério Público do Distrito Federal, para

comparecer ao Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade

Policial, a fim de ser ouvido em procedimento administrativo investigatório

supletivo, mediante ofício.

Contra essa notificação, o recorrente impetrou ordem de habeas corpus

perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e depois, de forma substitutiva,

perante o Superior Tribunal de Justiça, sendo, tais pedidos indeferidos em ambos os

Tribunais.

Da decisão denegatória proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que

entendeu como válidos os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público, o

recorrente chegou às portas do Supremo Tribunal Federal.

No ponto referente à impossibilidade do Ministério Público instaurar

procedimentos administrativos investigatórios para fins de oferecimento de

denúncia, o Ministro-relator Nelson Jobim, mais uma vez, reforçou os seus

argumentos já explanados no recurso extraordinário 233.072-4/RJ.

O eminente Ministro se apoiou em argumento histórico para afirmar que a

legitimidade para a condução do inquérito policial e a realização das diligencias

investigatórias é de atribuição exclusiva da polícia, lembrando que em todas as

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passagens históricas em que se tentou formular uma alteração legislativa para

atribuir essa função ao Ministério Público não se obteve êxito.

O Ministro Nelson Jobim afirmou ainda que a Constituição Federal dotou o

Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração

de inquérito policial – artigo 129, inciso VIII – mas não contemplou a possibilidade

do mesmo realizar e presidir inquérito penal. Conclui seu raciocínio afirmando que

não cabe aos membros do Ministério Público inquirir direitamente pessoas suspeitas

de autoria de crime, mas requisitar tais diligências a autoridade policia.

Enfadonho repetir os argumentos – já exaustivamente trabalhados - que

contrariam esse posicionamento do eminente Ministro Nelson Jobim. Incube apenas

acrescentar uma pergunta: a quem interessa afastar o Ministério Público da

iniciativa de instaurar procedimentos investigativos quando o caso sob análise exige

tal postura?

Nas palavras da douta Procuradoria-Geral da República, em parecer que

propugnou pelo conhecimento do recurso extraordinário n° 233.072/4,

oportunamente mencionado, impedir ao titular da ação penal pública de exercer seu

mister em defesa da sociedade, sob a infundada alegação de que o fato não foi

investigado pela polícia é negar vigência ao preceito constitucional assecuratório da

titularidade da ação penal.

Em um Estado Democrático de Direito, no qual se afirma a essencialidade do

Ministério Público no desenvolvimento da função jurisdicional do Estado,

incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses

sociais e individuais indisponíveis, como se pode pensar em tolher a possibilidade

do Parquet empreender procedimentos investigativos de forma direita, ainda mais

quando se esta diante de uma situação em se constata um desinteresse ou

comprometimento das outras instituições responsáveis por tal tarefa.

Importa afirmar que ainda há uma esperança. Desde o desenrolar das

decisões acima mencionadas a composição do Supremo Tribunal Federal mudou

bastante. Hoje, a Suprema Corte é composta pelos ministros Ellen Greice, Gilmar

Mendes, Celso Mello, Marco Aurélio Mello, Antonio Cezar Peluso, Carlos Ayres

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Britto, Joaquim Barbosa Moreira, Eros Roberto Grau, Ricardo Lewandowski,

Cármen Lúcia e Carlos Alberto Menezes Direito.

Novos casos, referentes à mesma matéria, foram encaminhados ao plenário

da Suprema Corte. Espera-se, agora, que o Supremo Tribunal retome seu antigo

posicionamento e volte a consagrar as finalidades atribuídas ao Ministério Público

durante esses longos anos de construção histórica.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após essas breves considerações, tornar-se interessante refazer algumas

perguntas. A quem interessa retirar do Ministério Público a possibilidade de realizar

investigações criminais de forma direta? Quem mais se beneficiaria com a nova

posição adotada pelo STF? O sistema acusatório estabelecido na Constituição

Federal pode ser utilizado como argumento para impedir o Parquet de realizar tais

investigações?

Como de resto ficou claro, a Polícia Judiciária não detém o monopólio da

investigação criminal. Isso porque, em um Estado Democrático de Direito, seria um

risco a própria defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais

indisponíveis o monopólio de tal atividade.

Não há que se falar em usurpação da atividade da Polícia Judiciária, uma vez

que não se está defendendo a ingerência do Ministério Público em toda e qualquer

investigação criminal, mas tão somente naqueles casos em que a situação fática

exige.

Em determinadas hipóteses, a Polícia Judiciária, por ser uma instituição

vinculada ao Poder Executivo, perde muito de sua autonomia e realiza investigações

criminais contaminadas por forças político-partidárias extremamente prejudiciais ao

interesse primário do Estado.

Em outros casos, devido a um corporativismo exacerbado – o qual, diga-se

de passagem, não é privilégio da Polícia Judiciária – a investigação criminal não é

conduzida de maneira diligente. Nessas situações pode-se notar um claro

desinteresse em prosseguir com tais procedimentos investigativos.

Nesses casos, a vedação imposta ao Ministério Público só traria benefícios

aos altos cargos políticos e a uma parcela pequena da Polícia Judiciária que se

utiliza do sistema para alcançar interesses escusos, em muito apartados dos

objetivos buscados em um Estado Democrático de Direito.

Por fim, não se pode falar em uma afronta ao sistema acusatório, pois,

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conforme sustentado, é a própria Constituição Federal que assegura ao Ministério

Público a possibilidade de empreender procedimentos investigativos criminais de

forma direta, sem qualquer ofensa a imparcialidade de seus membros.

Além do mais, o que caracteriza efetivamente um sistema acusatório não é,

como afirmam muitos autores, a existência de partes distintas no processo, mais sim

o afastamento do juiz da gestão da prova. Isso, mesmo que se reconheça ao

Ministério Público a possibilidade de empreender investigações criminais de forma

direita, está muito longe de ocorrer.

Assim, se o escopo maior de um Estado Democrático de Direito for resguardar

os interesses sociais e individuais indisponíveis e reduzir, o quanto possível à

desigualdade entre os seus administrados, deve-se se concluir pela impossibilidade de

se manter monopólio da investigação criminal nas mãos de uma única instituição.

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