246
Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário ANO VII – Nº 39 – JUL-AGO 2017 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Portaria CONJUD nº 610-001/2013 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Portaria nº 04, de 31.05.2012 – Registro nº 27 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Portaria nº 942, de 13.08.2013 – Ofício – 1528443 – GPRES/EMAGIS Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Informação nº 001/2013-GAB/DR EDITORIAL SÍNTESE DIRETOR EXECUTIVO: Elton José Donato GERENTE EDITORIAL: Milena Sanches Tayano dos Santos COORDENADOR EDITORIAL: Cristiano Basaglia EDITOR: Cristiano Basaglia EDITORIAL IEM – INSTITUTO DE ESTUDOS MARÍTIMOS DIRETORES: André Benevides de Carvalho CONSELHO EDITORIAL Adolpho Bergamini, André Benevides de Carvalho, Benjamin Gallotti Beserra (in memoriam), Demes Britto, Edison de Oliveira Vianna Júnior, Luiz Leonardo Goulart, Marcelo David Gonçalves, Murillo de Moraes Rego Corrêa Barbosa, Osvaldo Agripino de Castro Júnior, Rodrigo Fernandes More, Vicente Marotta Rangel, Welber de Oliveira Barral, Wilen Manteli COMITÊ TÉCNICO Ana Luiza Becker Salles, Augusto Fauvel de Moraes, Benjamin Caldas Gallotti Beserra, Claudio Ribeiro Huguet, Felipe de Assis Serra, Henrique Santos Costa de Souza, Kelly Gerbiany Martarello, Maria Augusta Paim, Mateus Soares de Oliveira COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Ana Luiza Becker Salles, Felipe de Assis Serra, José Flávio Commandulli, Leatrice Mendonça Bez de Oliveira Gomes, Marcelo de Lucena Sammarco, Paulo Henrique Cremoneze, Ricardo Deo Sipione Augusto, Voltaire Marensi ISSN 2236-5338

ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RevistaDireito Aduaneiro,

Marítimo e PortuárioAno VII – nº 39 – Jul-Ago 2017

ReposItóRIo AutoRIzAdo de JuRIspRudêncIA

Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Portaria CONJUD nº 610-001/2013 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087

Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Portaria nº 04, de 31.05.2012 – Registro nº 27 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Portaria nº 942, de 13.08.2013 – Ofício – 1528443 – GPRES/EMAGIS

Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Informação nº 001/2013-GAB/DR

edItoRIAl sÍntesedIRetoR executIVo: Elton José Donato

geRente edItoRIAl: Milena Sanches Tayano dos Santos

cooRdenAdoR edItoRIAl: Cristiano Basaglia

edItoR: Cristiano Basaglia

edItoRIAl IeM – InstItuto de estudos MARÍtIMos

dIRetoRes: André Benevides de Carvalho

conselho edItoRIAlAdolpho Bergamini, André Benevides de Carvalho,

Benjamin Gallotti Beserra (in memoriam), Demes Britto, Edison de Oliveira Vianna Júnior, Luiz Leonardo Goulart,

Marcelo David Gonçalves, Murillo de Moraes Rego Corrêa Barbosa, Osvaldo Agripino de Castro Júnior, Rodrigo Fernandes More,

Vicente Marotta Rangel, Welber de Oliveira Barral, Wilen Manteli

coMItê técnIcoAna Luiza Becker Salles, Augusto Fauvel de Moraes, Benjamin Caldas Gallotti Beserra,

Claudio Ribeiro Huguet, Felipe de Assis Serra, Henrique Santos Costa de Souza, Kelly Gerbiany Martarello, Maria Augusta Paim, Mateus Soares de Oliveira

colAboRAdoRes destA edIçãoAna Luiza Becker Salles, Felipe de Assis Serra, José Flávio Commandulli,

Leatrice Mendonça Bez de Oliveira Gomes, Marcelo de Lucena Sammarco, Paulo Henrique Cremoneze, Ricardo Deo Sipione Augusto, Voltaire Marensi

ISSN 2236-5338

Page 2: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

2011 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE e do IEM – Instituto de Estudos Marítimos.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos aduaneiros, marítimos e portuários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 2.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário. – Vol. 7, n. 39 (jul./ago. 2017)- . – São Paulo: IOB, 2011- . v.; 23 cm.

ISSN 2236-5338 Bimestral.

1. Direito aduaneiro. 2. Direito marítimo. 3. Direito portuário. CDU 347.79 CDD 342.29

Bibliotecária responsável: Nádia Tanaka – CRB 10/855

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com

Page 3: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Carta do Editor

A trigésima nona edição da Revista SÍNTESE Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário traz no seu Assunto Especial um tema da maior relevância para os armadores e transportadores marítimos, bem como para os donos de carga: o “Seguro Marítimo”.

O primeiro artigo da seção é de autoria do Advogado especializado em Direito do Seguro e no Direito dos Transportes, Professor de Direito do Se-guro da Fundação Escola Nacional de Seguros, Paulo Henrique Cremoneze, assíduo colaborador deste periódico, que analisa neste seu trabalho importante decisão judicial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, envolvendo as companhias Evergreen Line e Asia Shipping Transportes Internacionais Ltda., e a seguradora Tokio Marine. A seguir, José Flávio Commandulli, Consultor em Regulação de Avarias e Sinistros de Transporte Nacional e Internacional, Certificado pela Escola Nacional de Seguros Funenseg – ENS-Funenseg, Comis-sário de Avarias com Registro FenSeg – Federação Nacional de Seguros Gerais, Pós-Graduado MBA em Gestão Empresarial pela Sociesc/FGV e Bacharel em Direito pela ACE/FGG, Faculdade de Pedagogia pela ACE/FEJ, apresenta em seu artigo intitulado “Seguro de Transportes Nacional e Internacional e Regulação de Avaria Simples ou Particular”, a história do seguro, seus aspectos contratuais, além de um caso prático de regulação de avaria simples ou particular. Encerra a doutrina do Assunto Especial, artigo intitulado “O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Marítimos nas Ações de Regresso”, no qual Voltaire Marensi, Advo-gado, Professor, Consultor Jurídico no Ministério da Justiça, Assessor no Supe-rior Tribunal de Justiça, além de Doutrinador e Membro da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP), e Leatrice Mendonça Bez de Oliveira Gomes, Advogada com formação em Gestão de Operações Portuárias, com atuação na assessoria de informações jurídicas na Procuradoria-Geral do Estado des-de 2007 e Membro da Comissão de Direito Portuário e Marítimo da OAB/SC, sustentam a importância do contrato de seguro marítimo bem elaborado em consonância com as normas regulamentadoras, e com a devida observância à prescrição nas ações de regresso. Completa o Assunto Especial a tradicional seleção de ementas, além de importante acórdão sobre o tema.

Na Parte Geral deste volume Ana Luiza Becker Salles, Advogada Espe-cialista em Direito Administrativo pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), trata em seu artigo da importância do Contrato de Uso Temporário (CUT) para a atração de cargas e investimentos aos portos organizados, além de anali-sar se a normatização do CUT desbordou da competência normativa da Antaq. A seguir, a “A Inconstitucionalidade do Decreto Que Institui o Conselho Nacio-nal para Assuntos de Praticagem (Decreto nº 7.860/2012)” é o assunto abordado por Ricardo Deo Sipione Augusto, Técnico em Gestão Portuária pelo Instituto Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário no direito constitucional, uma vez que se trata de um ato normativo do Poder Público que gera influências no

Page 4: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

sistema portuário. Fecha a Doutrina da Parte Geral texto do Advogado Marcelo de Lucena Sammarco, Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Universida-de Metropolitana de Santos, Árbitro no CBAM – Centro Brasileiro de Arbitragem Marítima, Diretor de Marketing da ABDM – Associação Brasileira de Direito Marítimo e Professor do Curso de Pós-Graduação em Direito Marítimo e Portuá- rio da Universidade Católica de Santos (UNISANTOS), em que o autor analisa a legalidade da cobrança de “THC2” realizada pelos operadores portuários em face dos terminais retroportuários em decorrência de serviços de segregação e entrega imediata de contêineres nas operações de importação.

Na Seção Especial “Acontece”, Felipe de Assis Serra, Advogado atuan-te na Área de Direito Portuário desde 2008, Membro da Comissão de Direito Portuário e Marítimo da OAB/DF e Pós-Graduando em Direito Marítimo e Por-tuário na Maritime Law Academy, detalha em seu texto as principais alterações ocorridas nos termos do Decreto nº 8.033/2013, o Decreto dos Portos.

Aproveite este interessantíssimo conteúdo e tenha uma ótima leitura!

Milena Sanches Tayano dos Santos André Benevides de Carvalho

Gerente Editorial Diretor do IEM

Page 5: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto EspecialSeguro MarítiMo

DoutrinaS

1. Análise de Decisão Judicial – O Direito Marítimo por Quem o FazPaulo Henrique Cremoneze .......................................................................9

2. Seguro de Transportes Nacional e Internacional e Regulação de Avaria Simples ou ParticularJosé Flávio Commandulli..........................................................................47

3. O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Marítimos nas Ações de RegressoVoltaire Marensi e Leatrice Mendonça Bez de Oliveira Gomes ................75

JuriSpruDência

1. Acórdão na Íntegra (STJ) ...........................................................................832. Ementário ...............................................................................................103

Parte GeralDoutrinaS

1. A Validade do Contrato de Uso Temporário (CUT)Ana Luiza Becker Salles .........................................................................109

2. A Inconstitucionalidade do Decreto Que Institui o Conselho Nacional para Assuntos de Praticagem (Decreto nº 7.860/2012)Ricardo Deo Sipione Augusto ................................................................125

3. Da Legalidade da Cobrança Realizada pelos Terminais Portuários sob a Rubrica “THC2”Marcelo de Lucena Sammarco ...............................................................144

JuriSpruDência JuDicial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Regional Federal da 1ª Região ..................................................1582. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1623. Tribunal Regional Federal da 3ª Região ..................................................1684. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ..................................................173

ementário

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................176

Page 6: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Seção Especialacontece

1. Análise Jurídica sobre as Alterações Promovidas no Decreto dos PortosFelipe de Assis Serra ...............................................................................221

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................242

Page 7: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi- cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preencher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastrodeauto-res e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Page 8: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário
Page 9: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Assunto Especial – Doutrina

Seguro Marítimo

Análise de Decisão Judicial – O Direito Marítimo por Quem o Faz

PAULO HENRIQUE CREMONEZEAdvogado, com atuação no Direito do Seguro e no Direito dos Transportes, Pós-Graduado e Mestre em Direito Internacional pela Universidade Católica de Santos, Professor de Direito do Seguro da Fundação Escola Nacional de Seguros, Professor de Direito Marítimo do Curso de Direito da Unisanta, Membro Efetivo do IASP e da AIDA, Membro Consultor da Comissão de Direito Marítimo da OAB/SP. Autor de livros jurídicos.

Sabemos todos que as fontes do Direito são imediatas e as mediatas.

São fontes imediatas a lei e os usos e costumes e as mediatas são a dou-trina e a jurisprudência.

Não se nega a primazia da lei, sobretudo em um sistema jurídico como o brasileiro, romano-germânico, mas é a jurisprudência a principal estrela dessa constelação.

Gosto de pensar que a jurisprudência está para a lei assim como a Tradi-ção para a Bíblia. Por mais que a Bíblia prescinda de qualquer fundamentação, senão a Si mesma, é a Tradição quem confere sentido ao seu Divino conteúdo. Igualmente, quem aplica a lei e dá sentido prático ao seu enunciado é a juris-prudência.

Por isso tudo, costumo dizer que a jurisprudência é o Direito por quem o faz!

Daí meu especial apreço por essa fonte do Direito.

A doutrina é importante? Sem dúvida, mas sua verdadeira importância reside não no academicismo estéril, e, sim, no seu aproveitamento pelos juízes para a formação da jurisprudência.

Isso porque a doutrina não é um fim em si mesmo, mas a jurisprudência é.

Ouso imaginar, deflagrando um pequeno imbróglio conceitual, que só a jurisprudência é derradeiramente um fim em si mesmo, pois a lei somente terá essa qualidade se plenamente respeitada no tecido social. Ora, como esse respeito pleno, direto, é impossível, necessária se faz a jurisprudência para que a lei seja devidamente interpretada e aplicada.

Page 10: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

10 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Muito interessante a dinâmica instaurada pelo Código de Processo Civil de 2015 no sentido de se prestigiar os precedentes judiciais e exatamente por isso o estudo da jurisprudência ganhou especial dimensão.

Eu também admiro pensar a jurisprudência como um organismo à parte dentro do corpo geral do Direito.

Ainda no plano das comparações, ao melhor estilo do jogo dos vasos comunicantes, convém comparar a jurisprudência como o coração do corpo jurídico, sendo que o conceito de coração não é, para o caso, o biológico, mas o teológico, judaico-cristão, que considera o coração não só o centro das boas emoções, mas o orientador da razão.

Assim, a jurisprudência é o coração do Direito, a fonte mediata que orienta a imediata, o exercício pleno, caminho da Justiça, na medida em que promove a superposição dos planos ideal e fático.

Estudar a jurisprudência é estudar o Direito em exercício!

Por isso, meu especial apreço por essa fonte, invulgar e, em termos efeti-vamente práticos, importantíssima.

Trago ao estudo uma decisão muito significativa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que confirmou a sentença que condenou o transporta-dor marítimo ao ressarcimento em regresso da quantia que o segurador havia indenizado o proprietário da carga e embarcador.

A decisão contém elementos de direito material e de direito instrumental, temas recorrentes nos litígios judiciais envolvendo o assunto mais importante do direito marítimo: a responsabilidade civil do transportador.

Eu trabalhei no caso concreto como advogado, postulando em favor de segurador estrangeiro da carga avariada pelo transportador.

Por isso, e dada a natureza do litígio, a gama de matérias nele presente, resolvi compartilhar a decisão colegiada, com comentários posteriores.

Um breve resumo do caso faz-se necessário.

A empresa Mitsubishi Corporation, detentora de uma apólice internacio-nal de seguro de transporte com a Tokio Marine & Nichido Fire Insurance Co. Ltd., contratou as empresas transportadoras marítimas Asia Shipping Transpor-tes Internacionais Ltda. e Evergreen Marine Corporation Ltd. para o transporte de uma remessa ácido ribonucleico.

A remessa foi embarcada no Brasil em perfeito estado geral, mas foi de-sembarcada no Japão avariada.

Constatado o dano e o respectivo prejuízo, a seguradora indenizou o proprietário da carga, segurado, sub-rogando-se em sua pretensão original con-tra os responsáveis pelo sinistro.

Page 11: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������11

Ajuizou, portanto, ação regressiva de ressarcimento em face das duas empresas transportadoras marítimas.

As empresas contestaram alegando: 1) incompetência da jurisdição bra-sileira; 2) ausência de caução processual por parte do segurador estrangeiro; 3) decadência por ausência do protesto do art. 754 do Código Civil; e 4) ausên-cia de culpa.

Todos os pontos em destaque foram enfrentados pelo segurador em ré-plica.

Considerando tratar-se de um caso informado pela responsabilidade civil objetiva por inexecução imotivada de obrigação contratual de resultado, o juiz houve por bem julgar antecipadamente a lide, reconhecendo a pretensão de ressarcimento em regresso do segurador e condenando as transportadoras marí-timas ao reembolso do prejuízo indenizado, devidamente atualizado e acresci-dos de juros moratórios e demais encargos sucumbenciais.

Inconformadas, as transportadoras marítimas apelaram da decisão, basi-camente repetindo os argumentos da contestação, acrescentado da alegação de cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide.

O segurador, vencedor do litígio em primeiro grau de jurisdição, defen-deu a sentença e sugeriu a falta de dialeticidade da pretensão recursal, justa-mente por manter a linha de ataques à petição inicial e, não, como deveria, aos fundamentos da sentença.

Sobreveio o julgamento do recurso de apelação, que, como já se disse, ratificou os termos da sentença, confirmando a vitória do segurador.

Eis o voto do relator que formou o acórdão:

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1033909-57.2015.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que são apelantes Asia Shipping Transportes Internacionais Ltda. e Evergreen Marine Corporation Ltd, é apelado Tokio Marine & Nichido Fire Insurance Co. Ltd.

Acordam, em 15ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento aos recursos. V.u.”, de confor-midade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Lucila Toledo (Presidente) e Jairo Oliveira Junior.

São Paulo, 30 de maio de 2017.

Mendes Pereira – Relator Assinatura eletrônica

Page 12: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

12 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Voto nº 13786

Apelação Cível nº 1033909-57.2015.8.26.0562

Apelantes: Evergreen Line; Asia Shipping Transportes Internacionais Ltda.

Apelada: Tokio Marine

Comarca: Santos

15ª Câmara de Direito Privado

Cerceamento de defesa. Tradução juramentada. Juntada não submetida a contra-ditório. Documentação apresentada em língua estrangeira. Natureza do negócio que faz com que os envolvidos tenham conhecimento dos idiomas de trabalho. Prejuízo que teria lugar se houvesse terceiros na relação, o que não foi o caso. Rés que, dizendo que o conteúdo dos documentos lhes foi danoso, tinham ciên-cia prévia de seu conteúdo para alegar prejudicialidade. Precedente. Preliminar afastada.

Competência internacional. Alegação de que, por serem as empresas estrangeiras e a obrigação teve seu cumprimento no Japão, a justiça brasileira é incompeten-te. Ainda que houvesse cláusula de eleição de foro, a competência, contudo, concorrente, à luz dos arts. 88, II, do CPC de 1973 (art. 21, II, do NCPC) e 12 da LINDB, uma vez que as empresas todas tinham filiais no Brasil. Preliminar afastada.

Caução processual. Necessidade. Autora que, embora transnacional, tem filial no Brasil. Dispensa da exigência do art. 835 do CPC de 1973 (art. 83 do NCPC). Preliminar afastada.

Protesto. Contrato de transporte. Previsão no art. 754 do Código Civil. Merca-doria descarregada no Japão, onde não há incidência, nem mesmo por previsão contratual, da norma brasileira. Prova, contudo, de que houve insurgência con-tra as avarias, apresentando o notice of claim (aviso de reclamação). Preliminar afastada.

Ação de regresso. Seguro. Transporte marítimo de mercadorias. Ácido ribonu-cleico. Provas que atestam não só os danos havidos com a carga, quando já em poder das transportadoras, em virtude da infiltração, que a inutilizou, bem como o pagamento ofertado pela seguradora à empresa segurada, que se sub-rogou em seus direitos. Recursos desprovidos e, por ser a sentença publicada já na vigência do NCPC, são majorados os honorários advocatícios de 10% para 15% do valor da condenação (art. 85, § 11, do NCPC).

A r. sentença de fls. 252-254, cujo relatório é adotado, em autos de ação de re-gresso fundada contrato de seguro para transporte marítimo, julgou procedente o pedido para condenar as rés ao pagamento de R$ 254.285,21, valor a ser corrigi-do a partir de 22 de abril de 2015, além de juros incidentes a contar da citação. Arcarão, ainda, com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários, esses fixados em 10% do valor da condenação.

Recorrem as corrés.

Page 13: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������13

A corré Evergreen Marine, a fls. 256-278, diz que a r. sentença é nula por cercea-mento de defesa, uma vez que, após a apresentação da réplica, a autora apre-sentou nova petição, requerendo a juntada de tradução juramentada de parte dos documentos que instruíram sua inicial. Tais documentos deveriam ter sido apresentados no início da ação, servindo para a condenação e sobre aqueles a re-corrente não pode se manifestar. Sustenta que a justiça brasileira é absolutamente incompetente, uma vez que a obrigação deveria ser cumprida no Japão, o que atrai a aplicação do art. 12 da LINDB. Não houve juntada da apólice de seguro ou comprovante de pagamento a título de indenização à segurada. Era necessária a caução, pois a figura do representante não se confunde com a do representa-do. No mérito, sustenta que a segurada da Tokio nunca teve nenhuma relação comercial com a Evergreen. Assim, a responsabilidade por eventuais avarias era exclusivamente da Asia Shipping. As avarias foram ocasionadas por possível ina-dequação de acondicionamento da carga pelo exportador. A responsabilidade da Evergreen, transportadora marítima, foi cumprida, cessando sua responsabilidade no ato da descarga.

Por seu turno, a corré Asia Shipping, a fls. 283-292, sustenta que houve desres-peito ao contraditório e à ampla defesa, uma vez que os documentos estavam em língua japonesa e, após a juntada da tradução, não lhe foi dado manifestar-se sobre ela, considerando que tais provas foram importantes na formação da con-vicção da autoridade judiciária. A autora é domiciliada no exterior e constituiu diretamente os patronos, inclusive, sem ter representação no território nacional, o que demandaria a caução processual. Além disso, decaiu a parte contrária do direito de protestar pela inércia. No mérito, diz que a autora não faz prova de seu pedido, não conseguindo identificar documentalmente os atos praticados pela Asia Shipping e a prova do pagamento ao seguro que lhe garantiria, em tese, o direito de regresso.

As contrarrazões vieram a fls. 309-325, nas quais a autora Tokio Marine alega que não houve cerceamento de defesa, uma vez que apresentou recibo de pa-gamento de indenização com tradução juramentada que foi submetido ao con-traditório. Os documentos acostados comprovam os danos noticiados nos autos. Acerca da caução, embora seja empresa transnacional japonesa, tem filial no Brasil, de modo que tal garantia pode ser dispensada. Não há falar em decadên-cia do protesto porque, cuidando-se de exportação, não se pode esperar que o ordenamento jurídico estrangeiro confira ao protesto do recebedor o mesmo tratamento que o sistema legal brasileiro. A justiça brasileira é competente à luz do art. 88, II, do CPC de 1973 (art. 21, II, do NCPC). No mérito, assevera que não houve prova de qualquer excludente de presunção de responsabilidade pela inexecução imotivada da obrigação de resultado. As recorrentes, assim, valeram--se de questões secundárias para tentar escapar às próprias responsabilidades. Os recursos foram processados regularmente.

É o relatório.

Assim se apresenta o caso dos autos: a autora, ora apelada, Tokio Marine regride em face de Asia Shipping e Evergreen Marine, uma vez que celebrou contrato com a empresa Mitsubishi Corporation para transporte de ácido ribonucleico

Page 14: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

14 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

destinados ao Japão. No desembarque, a carga sofreu avarias, havendo a Tokio pagado a indenização à pessoa jurídica segurada. Agora, requer o pagamento da quantia em questão das transportadoras.

As questões apresentadas podem ser assim descritas: cerceamento de defesa em vista da juntada tardia da tradução juramentada, incompetência da justiça brasi-leira, necessidade de caução, decadência por falta de protesto das avarias, com-provação do pagamento, e responsabilidade pela avaria.

Passa-se a eles.

Cerceamento de defesa em vista da juntada tardia da tradução juramentada

Em uníssono as recorrentes afirmam que houve cerceamento de defesa porque não puderam se manifestar acerca da tradução juramentada de documentos que a recorrida acostou a fls. 234-250, os quais teriam sido cruciais para o êxito da autora.

Pois bem.

Os documentos em questão, que tinham sido apresentados a fls. 19, 20, 25 a 28 e 34 a 50 em idiomas originais (inglês e japonês), apresentam o seguinte: relató-rio de chegada de carga, notificação da reclamação e relatório de inspeção de cargas. Se não há dúvida de que tais provas descrevem a remessa da carga, as avarias e as respectivas, reclamações, por outro lado, pela natureza da relação havida só existiria efetivo prejuízo pela falta de tradução juramentada se houves-se terceiros envolvidos, o que não é o caso. Tanto as recorrentes compreendem o conteúdo dos documentos que puderam afirmar que sua apreciação lhes foi prejudicial, dado que, por óbvio, a decisão foi desfavorável. Ademais, a ausên-cia de tradução juramentada não foi óbice ao exercício da ampla defesa ou do contraditório pelas partes, as quais não sofreram qualquer prejuízo, prevalecen-do, na espécie, o princípio da instrumentalidade das formas ante o caráter dos documentos coligidos.

Esta Corte, observe-se, enfrentando precedente símile, assim entendeu:

“Ação de cobrança. Sobre-estadia de contêiner. Demurrage. Preliminar de cerce-amento de defesa. Inocorrência. Matérias de fato e de direito que foram demons-tradas de forma que permitiu o correto julgamento da lide. Entrega dos contêine-res vazios em 4 de junho de 2014 e a data da distribuição da ação é 22 de agosto de 2014, não decorrendo o prazo de 5 anos. A sobre-estadia caracteriza des-cumprimento obrigacional, constituindo, assim, indenização previamente ajus-tada pelas partes contratantes. A ocorrência de documentos em inglês não tendo a tradução juramentada não é irregularidade insanável, haja vista que ambas as partes tem uma compreensão meridiana. Recurso improvido.” (Ap. 020358-44.2014.8.26.0562, Santos, 23ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Marcos Gozzo, J. 10.08.2016)

Incompetência da justiça brasileira

Dizem as recorrentes também que, por serem empresas estrangeiras e a obriga-ção ter sido cumprida também fora do Brasil, que a autoridade judiciária brasi-

Page 15: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������15

leira é incompetente para conhecer e julgar da demanda. Sustentam que seria aplicável ao caso não o art. 88, II, do CPC de 1973, vigente ao tempo da prolação da r. sentença, mas, sim, o art. 12 da LINDB, que assinala ser “competente a au-toridade judiciária brasileira quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação”.

No caso dos autos, a competência internacional é concorrente, e, assim, relativa, ainda que haja cláusula de eleição de foro em território alienígena.

Acrescente-se que, embora sediadas no exterior, as empresas envolvidas na pre-sente demanda têm escritórios em território brasileiro, o que, reitere-se, torna a autoridade judiciária brasileira como concorrente para conhecer e julgar a pre-sente demanda.

A esse respeito, assim se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:

“Processo civil. Cláusula de eleição de foro. Competência internacional. Art. 88 do CPC. Notas taquigráficas. Intimação. Preclusão. Embargos de declaração. Acolhimento, sem efeitos modificativos. 1. A cláusula de eleição de foro estran-geiro não afasta a competência internacional concorrente da autoridade brasi-leira, nas hipóteses em que a obrigação deva ser cumprida no Brasil (art. 88, II, do CPC). Precedentes. [...] Embargos de declaração acolhidos. (EDcl-EDcl-REsp 1.159.796/PE, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 15.03.2011)

A doutrina, por seu turno, não discrepa acerca da competência concorrente da autoridade judiciária brasileira:

“Cabe destacar que se reputa domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou recursal (CPC, art. 88, parágrafo único), norma que se encontra em consonância com o art. 75, § 2º, do Código Civil, que reza que, ‘se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela correspon-der’. A Súmula nº 363 do STF acrescenta que ‘a pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no domicílio da agência, ou estabelecimento, em que se praticou o ato’.” (PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado. 4. ed. Salvador: JusPodivm, 2012. p. 660-661)

Necessidade de caução

Dizia o art. 835 do CPC de 1973 (similar ao art. 83 do NCPC), aplicável quando do sentenciamento, que “o autor, nacional ou estrangeiro, que residir fora do Brasil, ou dele se ausentar na pendência da demanda, prestará, nas ações que intentar, caução suficiente às custas e honorários de advogado da parte contrária, se não tiver no Brasil bens imóveis que lhes assegurem o pagamento”. Tal dispo-sitivo manteve-se no art. 83 do NCPC, com algumas modificações.

Na situação em julgamento, a recorrida atestou que, embora seja empresa trans-nacional japonesa, tem filial no Brasil, havendo, assim, dispensa da garantia em questão.

Esta Corte, julgando precedente símile, assim entendeu:

Page 16: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

16 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

“Apelação cobrança. Transporte marítimo. Sobre-estadia de contêineres (demurrage). Preliminar. Ausência de prestação de caução por empresa estran-geira. Descabimento, quando esta possui representante no país. Irregularidade que pode ser sanada a qualquer tempo, não se justificando a extinção do feito, ainda mais porque a falta de caução não prejudicou o processo, nem causou dano à parte adversa. Inteligência do art. 835 do Código de Processo Civil. Pre-liminar. Prescrição. Não ocorrência (art. 206, § 3º, V, do Código Civil). Termo inicial: data da devolução dos contêineres. Mérito: sobre-estadia que não cons-titui cláusula penal. Previsão contratual expressa. Comprovação da culpa. Des-necessidade. Períodos livres (free time) de 14 (quatorze) ou 21 (vinte e um dias) devidamente informados nos conhecimentos de transporte. Sentença mantida. Recurso não provido.” (Ap 0000769-88.2011.8.26.0562 – Santos – 11ª Câmara de Direito Privado, Relª Desª Denise Andréa Martins Retamero, J. 25.04.2013)

Decadência por falta de protesto

Sustenta a recorrente Asia Shipping que, por não haver apresentado protesto por possíveis avarias, na forma do art. 754 do Código Civil1, que a recorrida decaiu de seu direito, uma vez que no prazo decendial não se manifestou. A bem da verdade, nem poderia, dado que em território japonês, além de não incidir a norma pátria, tomou providências para apresentar a notice of claim (aviso de reclamação, em tradução livre), versão local da manifestação de protesto em face das avarias.

Por oportuno, veja-se julgado que calha perfeitamente com a situação própria da seguradora:

“Apelação. Ação de regresso. Transporte marítimo de mercadorias. Propositura pela seguradora em face da transportadora, visando ao ressarcimento do valor pago ao segurado em razão de avarias e danos nos produtos transportados pela requerida. Sentença de improcedência, reconhecendo a decadência do direito, nos termos do art. 754 do Código Civil. Recurso da seguradora. Responsabili-dade objetiva da transportadora, nos termos do art. 750 do Código Civil. Provas produzidas até o momento nos autos demonstraram aparente nexo causal entre a conduta da transportadora e o dano ocorrido aos bens transportados. Quanto à decadência, o art. 754 do Código Civil referiu-se ao destinatário final da merca-doria, nada consignando acerca dos direitos decorrentes do contrato de seguro. Direito da seguradora, em razão da sub-rogação, apenas poderia ser afastado se atingido pela prescrição de um ano, consoante Súmula nº 151 do STF. Ausência do protesto previsto no art. 754, parágrafo único, do Código Civil não isentou a transportadora da responsabilidade pelos danos causados, mormente em face da seguradora. Possibilidade do reconhecimento da ocorrência dos danos por intermédio de outras provas, ainda que o destinatário não tivesse formalizado o protesto em 10 dias. Precedentes deste egrégio Tribunal de Justiça. Reforma da

1 “Art. 754. As mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a quem apresentar o conhecimento en-dossado, devendo aquele que as receber conferi-las e apresentar as reclamações que tiver, sob pena de deca-dência dos direitos. Parágrafo único. No caso de perda parcial ou de avaria não perceptível à primeira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o transportador, desde que denuncie o dano em dez dias a contar da entrega.”

Page 17: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������17

sentença, com o afastamento da decadência, viabilizando a análise do mérito. Feito julgado, em primeiro grau, logo após a réplica, sem a produção das demais provas pretendidas pelas partes. Tribunal, em apelação, possui a faculdade de apreciar o mérito, podendo determinar o prosseguimento do feito, analisadas as peculiaridades do caso concreto. Jurisprudência do STJ. Prematuro o julgamento nesta sede, devendo o feito retornar à origem para o prosseguimento da instru-ção. Precedente desta Corte. Sentença anulada. Recurso provido, com determi-nação. (Ap 1016245-13.2015.8.26.0562, Santos, 24ª Câmara de Direito Privado, Relª Desª Silvia Maria Facchina Esposito Martinez, J. 01.12.2016 – grifos nossos)

Vencidas as preliminares, passa-se ao mérito.

Comprovação e da celebração do contrato de seguro do pagamento e a respon-sabilidade pela avaria a fls. 65 (com tradução juramentada a fls. 248) figura co-municação endereçada pela Mitsubishi Corporation à Tokio Marine dando conta da celebração do contrato de seguro, o qual assegurou indenização decorrente de prejuízos oriundos de danos em mercadorias por ela importadas. Esse mesmo documento indica ter havido o pagamento, a tal ponto que indica que a Tokio fica sub-rogada nos direitos que seriam da Mitsubishi.

Esse pagamento deveu-se, destaque-se, pelos danos causados em virtude da in-filtração causada no interior do contêiner, que danificou a carga de ácido ribo-nucleico, e que ocorreu quando a carga estava sob a custódia das recorrentes. Assim o atesta o laudo de fls. 27, traduzido a fls. 241, ao afirmar que “o contêiner era uma van de aço de 20 pés que estava seca, produzido em janeiro de 2013, e estava externamente intacto, sem qualquer quebra/defeito que poderia ter per-mitido a entrada de água. Mas papel kraft foi colocado em todo o contêiner, e o papel ao lado das paredes tinha vestígios de ter sido molhado em toda parte infe-rior, em até no máximo 30 cm de altura. Além disso, o papel no fundo e o fundo do contêiner ainda estavam molhados e mofados [... a partir da situação, nós consideramos que o contêiner deve ter sido inundado com água fresca durante o transporte”. Indo além a fls. 28 (fls. 242, tradução), acerca das condições da car-ga, “o ácido ribonucleico ‘RNA’ estava em sacos de 3 camadas de papel com 2 sacos de vinil internos amarrados com uma tira elástica, cada um contendo 10kg. Na hora da descarga, os sacos foram encontrados guardados e 6 fileiras x 22 ou 23 fileiras e as 2 fileiras que estavam embaixo se encontravam profundamente molhadas e quebradas e o conteúdo fragmentado e mofado”.

A r. sentença, por fim, foi prolatada na vigência da norma revogada, mas publi-cada quando em vigor o novo Código de Processo Civil. Nessas condições, diz o Enunciado Administrativo nº 7 do Superior Tribunal de Justiça que, “somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do NCPC”. Destaque-se que tal majoração é automática, não de-pendendo, assim, de requerimento das partes, como já tem entendido esta Corte (inter plures, Ap. 100754298.2014.8.26.0604, Sumaré, 31ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Adílson de Araújo, J. 23.08.2016). Assim, os honorários advo-catícios ficam majorados de 10% para 15% do valor atualizado da condenação, nos termos do dispositivo legal citado.

Page 18: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

18 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Ante o exposto, nega-se provimento aos recursos, majorados os honorários ad-vocatícios de 10% para 15% do valor da condenação (art. 85, § 11, do NCPC).

Mendes Pereira – Relator

O voto em destaque, indutor do acórdão, é digno de elogios e merece ser devidamente estudado.

Evidentemente que não abordarei todos os excelentes pontos da decisão colegiada, mas destacarei alguns, tidos como mais importantes.

Pois bem!

Antes de comentar alguns dos principais aspectos da decisão em desta-que, muito aproveita reproduzir o memorial encaminhado aos desembargado-res componentes da turma julgadora dias antes da sessão de julgamento, uma vez que seu conteúdo antecipa em grande medida os comentários.

Memorial

Tribunal de Justiça de São Paulo

15ª Câmara (Direito Privado)

Recurso de Apelação: 1033909-57.2015.8.26.0562

Procedimento: Comum

Processo Digital

Julgamento originalmente pautado para 16.05.2017 (terça-feira), 13h30

Pauta: (172)

Sessão de julgamento cancelada: ataque cibernético

Nova sessão designada para o dia 30.05.2017 (terça-feira), 13h30

Turma Julgadora:

Desembargador Mendes Pereira (Relator)

Desembargadora Lucila Toledo (1º Juíza)

Desembargador Jairo Oliveira Junior (2º Juiz)

Dados de origem do processo

Ação originária: Regressiva de Ressarcimento

Comarca: Santos

Juízo: 12ª Vara Cível

Autor/apelado: Tokio Marine & Nichido Insurance Co. Ltd.

Réus/apelantes: Asia Shipping Transportes Internacionais Ltda. e Everegreen Marine Corporation (Taiwan) Ltd.

Page 19: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������19

Memorial da apelada

Excelência,

A Apelada encaminha o presente memorial a fim de contribuir com o julgamento do recurso de apelação, fazendo-o de forma absolutamente sumária.

Desde logo, agradece a gentil atenção de Vossa Excelência e espera sinceramen-te que este memorial se vos possa ser útil.

A saber:

Trata-se de um caso de sinistro de transporte marítimo internacional de carga.

A carga, segurada pela apelada, foi confiada às apelantes para transporte, desde o Brasil até o porto japonês de destino.

No porto de destino, a carga foi desembarcada avariada, conforme amplamente comprovado nos autos do processo.

Mais: uma das apelantes foi a responsável direta pela estufagem da carga no in-terior do contêiner protagonista do sinistro.

Amplamente caracterizada a inexecução imotivada da obrigação contratual de transporte devida pelas rés.

E com a inexecução, a presunção legal de responsabilidade pelo descumprimen-to de obrigação de resultado, além da culpa em sentido estrito, tipificada pela inobservância da cláusula de incolumidade e do dever geral de precaução.

Tudo isso foi muito bem reconhecido pela r. sentença.

As apelantes insistem nos mesmos e inconsistentes argumentos utilizados nas suas contestações, fazendo de suas pretensões recursais alvos fáceis de contra-riedade.

Quais os pontos principais e que merecem destaque neste memorial?

Do alegado cerceamento de defesa por ausência de traduções juramentadas de alguns documentos

Não há que se falar em cerceamento de defesa por ausência de traduções jura-mentadas.

Os documentos originalmente confeccionados em língua estrangeira e que não foram acompanhados de traduções juramentadas são aqueles que servem apenas para a demonstração dos vínculos jurídicos da empresa segurada da apelada às apelantes, nada aquém, nada além.

Logo, documentos amplamente conhecidos das apelantes, revelando-se até certa má-fé a insistência em tal arguição.

O recibo de pagamento da indenização de seguro – prova da sub-rogação – encontra-se acompanhado da tradução juramentada, tornando ainda mais sem sentido tal alegação.

Page 20: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

20 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Da alegada carência da caução

Embora a apelada seja, de fato, pessoa jurídica estrangeira de direito privado, acertou o ilustre Magistrado ao dispensar a exigência de caução.

Isso porque a apelada integra um dos grupos seguradores mais importantes do mundo, a transnacional japonesa Tokio Marine.

E essa transnacional tem no Brasil uma das suas mais importantes unidades, a Tokio Marine Brasil Seguradora S.A., a quinta maior do país.

Logo, além de ser amplamente líquida e solvável por si mesma, o fato de ser co-nectado a um grupo empresarial que tem no Brasil um poderoso braço é mais do que suficiente para se ver dispensada a caução.

Entendimento, aliás, que não é da Apelante, mas do próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme amplo acervo jurisprudencial listado nas con-trarrazões recursais.

Da alegada decadência

As apelantes insistiram que o direito da apelada decaiu pela suposta ausência do protesto do recebedor, de que trata o art. 754 do Código Civil de 2002.

Ledo engano!

A uma: não se pode exigir a aplicação da regra do art. 754 do Código Civil em um sinistro ocorrido e identificado no exterior. Com efeito, o Código Civil bra-sileiro produz, a rigor, efeitos jurídicos no Brasil. Referida regra legal, portanto, diz respeito aos transportes de cargas nacionais ou internacionais destinados ao Brasil, jamais aos casos envolvendo processos de exportação.

Demais, a regra não pode ser exigida ao segurador sub-rogado na pretensão do segurado. Se, porventura, fosse o caso de eventual ausência do protesto do rece-bedor por alguma falha do segurado em tal sentido, jamais o segurador poderia ser prejudicado no pleno exercício do seu direito de regresso, sobretudo quando robusto o acervo probatório contra o transportador (no caso, entenda-se, o con-sórcio formado pelas apelantes).

Tanto assim que a apelada, por oportuno, reproduz a ementa de um importante acórdão desse egrégio Tribunal, da 23ª Câmara de Direito Privado, Recurso de Apelação nº 0063637-70.2010.8.26.0002, de relatoria do ilustre Desembargador Sérgio Shimura:

“Ação regressiva proposta pela seguradora contra transportadoras. Transpor-te multimodal. Compra de produtos químicos. Prazo decadencial previsto no art. 754 do Código Civil. No contrato de transporte, o prazo decadencial de 10 dias previsto no art. 754, parágrafo único, do Código Civil, refere-se à reclama-ção pela perda parcial ou avaria da carga, isto é, à denúncia do evento danoso na relação contratual entre a empresa contratante e a transportadora contratada. Este prazo (decadencial) não se confunde nem interfere no direito à indenização pelos prejuízos causados. Seguradora que, ao pagar a indenização à empresa segurada, sub-roga-se nos direitos desta contra as transportadoras (art. 786, CC) – Instituto

Page 21: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������21

da decadência que não se confunde com o da prescrição Afastamento da deca-dência e julgamento do mérito da causa (art. 515, § 3º, CPC) Conjunto probatório que demonstra que as avarias se deram por conta da atividade das transportado-ras e armazém Responsabilidade objetiva e solidária – Ação procedente em parte Recurso provido em parte.”

Além disso tudo, é certo dizer, conforme amplo entendimento jurisprudencial, que documentos e instrumentos outros podem substituir perfeitamente o protesto do recebedor, fazendo suas vezes nos casos concretos. Assim, o instrumento de-nominado notice of claim, datado de 5 de fevereiro de 2015, coligido aos autos e devidamente apreciado pelo Douto Juízo a quo, é, na melhor forma de Direito, verdadeiro protesto do recebedor.

Da alegada incompetência absoluta da Justiça brasileira

Outra arguição descabida das apelantes.

A jurisdição brasileira é a única cabível ao caso concreto.

A obrigação de transporte foi contratada no Brasil e também no Brasil se deu o início da execução da obrigação de transporte.

Por isso, aplicável o art. 88, II, do antigo Código de Processo Civil, então em vigor.

Independentemente disso, a norma contratual que dispõe sobre a jurisdição es-trangeira é nula de pleno Direito ou, no mínimo, inválida e ineficaz.

Explica-se: no conhecimento de transporte marítimo internacional, o contrato que vincula as apelantes ao segurado da apelada, existe uma norma dispondo sobre o foro estrangeiro de “eleição”.

Coloca-se a palavra eleição entre aspas porque não houve de fato uma eleição de foro, mas imposição unilateral e em sede de contrato de adesão por partes das apelantes.

Elas impuseram, repita-se por necessário, o foro estrangeiro ao consignatário da carga, segurado da apelada, não existindo no caso a autonomia da vontade, um dos princípios-vetores de todo e qualquer contrato saudável.

Por isso, a jurisprudência desse Tribunal e do Superior Tribunal de Justiça sempre considerou esse tipo de cláusula contratual como sendo hardship e, portanto, abusiva, incapaz de produção de efeitos jurídicos.

A abusividade e, portanto, a invalidade se revela ainda maior quando a parte interessada é alguém como a Apelada, uma seguradora que sequer foi parte no negócio jurídico e, muito menos do que o próprio segurado, externou de algum modo sua vontade e aquiescência com a imposição de foro estrangeiro.

Por fim, o bem da vida do caso concreto

No que tange à questão de fundo, pouco há o que dizer, pois a sentença, em seus fundamentos, disse tudo.

Page 22: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

22 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

A verdade que salta aos olhos é que as apeladas, em parceria comercial e uni-dade operacional, receberam a carga segurada em perfeito estado geral, mas a entregaram avariada no lugar de destino.

Descumpriram obrigação de resultado e não foram capazes, mediante inversão do ônus, de provar a existência de alguma causa legal excludente de responsa-bilidade em seu favor.

Pelo contrário. As provas presentes nos autos, algumas de ordem técnica, atestam que as apeladas agiram com manifesta desídia operacional, desde a estufagem do contêiner até seu transporte entre o Brasil e o Japão, passando pela estivagem a bordo do navio transportador e as operações de estiva e desestiva.

Existem, Excelência, laudos técnicos atestando que a umidade que afetou a carga se deu durante o transporte marítimo, não se desprezando que o contêiner prota-gonista do sinistro pertencia e pertence à uma das apelantes, também responsável por sua estufagem.

As apelantes descumpriram obrigação de resultado e são responsáveis pelos pre-juízos destacados na petição inicial.

Daí o acerto digno de aplausos da r. sentença.

Agradece a atenção do ilustre Desembargador e informa que sustentará oralmen-te suas razões no dia do julgamento.

Com os cordiais cumprimentos.

Como antes mencionado, o memorial ora reproduzido antecipa em gran-de medida os comentários sobre o voto em estudo, mas, mesmo assim, convém dizer um pouco mais.

Dos cinco pontos ementados no acórdão, três são os que merecem aten-ção neste modesto exame, a saber: 1) competência internacional, 2) protesto (do recebedor) e 3) ação de regresso.

Vejamos:

A jurisdição brasileira é sempre competente para tratar das ações fun-dadas em direito marítimo quando uma das partes litigantes for brasileira ou quando a obrigação de transporte tiver sido iniciada (ou concluída) no Brasil.

É muito importante ter isso sempre em alça de mira.

Pouco importa qualquer outra circunstância.

Ora, no caso concreto, o autor da ação era um segurador estrangeiro e as rés, igualmente, empresas estrangeiras. Além disso, o evento danoso foi conhecido no exterior. Por conta desse conjunto de fatores, as transportadoras entenderam que a jurisdição brasileira não era competente.

Ledo engano, como bem demonstrou o acórdão.

Page 23: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������23

O ilustre relator do voto indutor da decisão invocou o art. 88, II, do an-tigo Código de Processo Civil porque a ação foi ajuizada sob sua égide, e o fez muito bem.

Mas, mesmo que a ação houvesse sido distribuída já sob o agasalho do Código de Processo Civil de 2015, a jurisdição brasileira permaneceria compe-tente porque ainda subsistem os critérios do lugar de celebração ou de início do cumprimento da obrigação contratual e, ainda, o da existência de filial da empresa estrangeira no Brasil.

Vale um adendo especial ao direito marítimo, qual seja, a figura do agente.

O agente marítimo não se confunde com o agenciado, o transportador, mas com ele guarda profunda intimidade, de tal sorte que, na condição de mandatário comercial, representante para atos empresariais, é legalmente equi-parado à filial. Tanto assim o é que o agente recebe citações, notificações e intimações em nome do transportador marítimo.

Algo que muito chamou atenção na referida decisão foi a seguinte fun-damentação: “Ainda que houvesse cláusula de eleição de foro, a competência [...]”.

E não chamou a atenção à toa, porque o contrato internacional de trans-porte marítimo de carga, um típico contrato de adesão, informado por cláusu-las unilaterais ditadas e impostas pelo transportador, costuma conter a referida cláusula, em flagrante descompasso à legislação brasileira.

Em verdade, o descompasso não se constata apenas em relação à lei, mas também à jurisprudência, uma vez que o Poder Judiciário no Brasil rotula tal cláusula como abusiva e, portanto, ineficaz e/ou inválida.

Considerando a importância do tema e a especial circunstância de esse tipo de alegação clausular ser muito comum, quer me parecer relevante tecer considerações mais robustas a respeito.

A saber:

Em termos gerais, podemos afirmar, com segurança, que se tem por invá-lida e ineficaz, nula de pleno direito, toda cláusula adesiva dispondo como foro de eleição aquele ditado ao alvedrio do transportador marítimo.

Os transportadores (quaisquer que sejam os países de origem) fixam como foros competentes os de Londres e o de Nova York, impondo ônus exces-sivo ao embarcador ou ao destinatário final do transporte de cargas.

Com efeito, imaginemos o caso de um importador brasileiro, destinatá-rio final do serviço de transporte de uma carga, que se vê forçado a litigar em Londres, com custo extremamente elevado e com um sistema legal desconheci-

Page 24: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

24 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

do, muito provavelmente equipado para proteger, com certo exagero, os trans-portadores.

Isso porque, sendo o transporte de cargas atividade vital para a economia de um país, as nações mais desenvolvidas sempre se ocuparam em considerar o ramo como estratégico para suas pretensões globais, armando seus acervos legais com regras de proteção (muitas vezes exageradas e desequilibradas) aos transportadores marítimos.

Por isso é que não se podem emprestar, a rigor, à cláusula de eleição de foro a estampa e a proteção do pacta sunt servanda. Bem ao contrário, essa cláusula, como dissemos, é nula, tendo-se para a fixação do foro competente outros critérios, ditados pelo sistema legal brasileiro.

Com efeito, o lugar de cumprimento de uma obrigação de transporte é o critério legal normalmente utilizado para os casos de importação. Já em se tra-tando de exportação, a fim de tutelar o interessado brasileiro, tem-se como cri-tério legal o lugar em que a obrigação de transporte foi celebrada. Outro critério válido é o do lugar dos fatos ou da apuração dos fatos. Todos esses critérios, ditados pela lei, sobrepõem-se ao draconiano foro de eleição.

Se o autor da ação for um segurador legalmente sub-rogado, a situação é ainda mais confortável em termos de inibição de qualquer arguição de validade da cláusula de foro de eleição, pois o segurador não foi parte do contrato de transporte.

Ora, se a cláusula não é capaz de prejudicar o celebrante do contrato de transporte, com mais razão não poderá atingir o segurador legalmente sub--rogado.

Por isso, seguimos convictos em afirmar que, em princípio, salvo ca-sos muito excepcionais, a jurisdição brasileira será sempre a competente para apreciação da disputa judicial de direito marítimo, desprezando-se, assim, as cláusulas impressas no conhecimento marítimo.

Não estamos afirmando que o foro de eleição não pode aparecer num dado negócio jurídico, mas que, ao menos em relação ao contrato de transporte marítimo, até por sua natureza adesiva, realmente não pode viger e produzir efeitos jurídicos.

O foro de eleição, em sentido amplo, foi mantido no direito processual brasileiro pelo art. 111 do Código de Processo Civil, estabelecendo a possibi-lidade de as partes alterarem convencionalmente a competência em razão de valor e do território, com a correspondente eleição do foro onde devem ser propostas as ações pessoais e, em algumas hipóteses, até as reais (art. 95 do CPC). Assim, com exclusão das ações relativas a imóveis e do inventário de bens situados no Brasil, cuja competência internacional é adstrita aos órgãos

Page 25: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������25

judicantes brasileiros, é viável a eleição de foro estranho à jurisdição nacional pelas partes interessadas.

Mas é preciso que se ressalte bem a força da expressão “convenção”. Em contrato de adesão, a ideia de convenção não subsiste, principalmente se o autor da ação, caso específico do segurador sub-rogado, sequer tenha figurado no corpo do instrumento contratual.

Por isso mesmo, o posicionamento jurisprudencial tem sido no sentido de que tal “convenção” se mostra, na maioria das vezes, abusiva, tendo-se em conta que traz vantagens apenas para um dos contratantes, o transportador.

Logo, nos contratos de adesão, a cláusula de eleição do foro tem decla-rada ex officio sua nulidade.

No mesmo, temos ainda que repudiar a cláusula que impõe a arbitragem.

Não porque não tenhamos apreço pela arbitragem, muito pelo contrário.

Trata-se de uma forma salutar de solução de conflitos e que precisa ser incentivada e praticada no Brasil.

Mas por causa da forma como a arbitragem é imposta no cenário das relações contratuais maritimistas.

Ela vem quase sempre a reboque da cláusula de imposição de foro estran-geiro, não competindo à parte interessada qualquer manifestação de vontade.

Além disso, a cláusula que a dispõe é irregular aos olhos do sistema legal brasileiro.

Com efeito, a lei de arbitragem brasileira dispõe que a cláusula que prevê a arbitragem num contrato de adesão tem que ser redigida em letras garrafais, destacada do texto geral e com expressa assinatura sobre seu conteúdo da parte supostamente interessada.

Outro modo é a previsão da arbitragem no texto apartado e anexado ao contrato de transporte.

Nada disso é observado pelo transportador marítimo.

Ele simplesmente se limita a impor a arbitragem na mesma cláusula que determina a eleição do foro estrangeiro, o que a faz manifestamente ilegal, in-válida e ineficaz.

Há de se considerar, ainda, que o contrato de transporte é uma estipu-lação em favor de terceiro, de tal modo que o consignatário da carga, embora parte da obrigação de transporte, não participou da celebração do contrato, muito menos o seu segurador, o que torna ainda mais sem efeito a cláusula de arbitragem.

Page 26: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

26 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Por tais razões e outras tantas que não consideramos válidas e eficazes cláusulas de eleição de foro e/ou de arbitragem em transportes marítimos inter-nacionais, informados por contratos de adesão por excelência.

Demais, o sistema legal brasileiro é inteligentemente construído no senti-do de prestigiar a autoridade judiciária nacional, que se revela hábil para tratar da maior parte dos casos de direito marítimo.

Mas, desde 2015, pode-se dizer que o tema ganhou novo colorido, recla-mando especial atenção.

O novo Código de Processo Civil introduziu mudanças significativas no sistema processual brasileiro, exigindo um novo olhar por parte dos protagonis-tas do Direito.

Algumas dessas mudanças impactam diretamente no direito marítimo.

Pode-se dizer que os impactos são, em princípio, positivos.

Todavia, reclamam especial atenção para que essa visão otimista não seja manchada por erros interpretativos.

Se a boa hermenêutica consubstanciar-se e não abandonar o exercício cotidiano do Direito, as mudanças somente gerarão coisas boas; todavia, even-tuais descuidos serão potencialmente lesivos e prejudiciais não somente aos atores do direito marítimo, mas à própria economia do país e ao conceito de Justiça.

Um dos temas que mais reclamará a boa hermenêutica e o mergulho constante na tradição jurídica já consolidada pela jurisprudência é o que trata da cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no contrato internacional.

Uma novidade normativa é verdade, mas que se conecta intimamente à tradição já consolidada do Direito brasileiro no que tange ao repúdio às cláusu-las contratuais abusivas presentes nos contratos de adesão.

Com efeito, embora a regra nova reconheça a validade e a eficácia da cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no contrato internacional, ela não abre mão da regularidade estrita dessa cláusula, tanto formal, como subs-tancialmente, de tal modo que a regra processual não será hábil se a cláusula contratual não refletir negócio jurídico perfeito.

A cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no contrato interna-cional só será efetivamente reconhecida e aplicada se o seu conteúdo corres-ponder perfeitamente aos pressupostos de validade do negócio jurídico, bem como for imantada da inafastável voluntariedade.

Qualquer ofensa ou, mesmo, mitigação do princípio da autonomia da vontade tornará a referida cláusula inaplicável perante a nova ordem jurídico--processual.

Page 27: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������27

Dentro desse contexto, portanto, tem-se, por exemplo, que nenhuma cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no contrato internacional im-posta unilateralmente em contrato de adesão será objeto da nova regra pro-cessual.

Ora, considerando que todo contrato internacional de transporte marí-timo de carga é um contrato de adesão, formatado exclusivamente pelo trans-portador, sem qualquer espécie de anuência do consignatário da carga, muito menos do seu segurador, não há que se falar no reconhecimento da cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro nele presente, até porque há muito a jurisprudência rotulou esse tipo de disposição contratual manifestamente abu-siva e ilegal.

Outra coisa que não pode ser ignorada é a questão da primazia da Justiça sempre que reclamada sua participação, conforme garantia fundamental cons-titucional expressa.

Logo, mesmo uma cláusula eventualmente válida, voluntária plenamen-te, poderá ser deixada de lado quando houver concreta lesão ou ameaça de lesão com o afastamento do acesso à jurisdição.

Vê-se que o tema é, paradoxalmente, simples e complexo, palco para dúvidas práticas e concretas, as quais reclamam estudos mais detidos.

Vejamos:

O art. 25, caput, do novo Código de Processo Civil, em vigor desde 18 de março de 2016, ao tratar dos limites da jurisdição nacional, dispõe que:

Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação.

A autonomia da vontade é imprescindível para o aperfeiçoamento do negócio jurídico e, nunca é demais repetir, condição inafastável para a validade e a eficácia da cláusula em estudo, sob pena de abusividade e grave prejuízo.

Isso porque a validade e a eficácia da norma legal não são passíveis de discussão, mas, as da cláusula que forma sua hipótese de incidência, sim.

Para que a regra do art. 25, caput, possa se subsumir a um dado negócio jurídico, há de se constatar a absoluta legalidade deste.

Assim, a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro somente será alvo de pleno alcance da regra do art. 25 se a sua forma e o seu conteúdo se ajustarem perfeitamente ao ordenamento jurídico brasileiro, sem qualquer vício ou abusividade.

Page 28: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

28 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Chama especial atenção o item “b” [“(b) as declarações de vontade, ori-ginando-se não de contrato de adesão, não impliquem abuso (art. 25, § 2º, c/c art. 63, § 3º, ambos do NCPC)”], pois não só enfatiza a já comentada questão da voluntariedade, ligada ao aperfeiçoamento do conceito de “autonomia da vontade”, como faz expressa menção ao contrato de adesão, como sendo in-compatível com a regra do art. 25, caput.

Isso é especialmente relevante para o caso específico do direito maríti-mo, ramo que guarda muitos pontos de contato com o direito internacional e que é preponderantemente informado por relações jurídicas negociais instru-mentalizadas por contratos de adesão.

O contrato internacional de transporte marítimo de carga é um típico contra de adesão, no qual uma das partes impõe sua vontade, por meio de cláusulas impressas, ao passo que a outra é obrigada a aderir, aceitar tais impo-sições, sob pena de não efetuar o transporte desejado.

Essa natureza adesiva é condicionante e é a base da afirmação que cláu-sula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no contrato internacional de trans-porte marítimo de carga não se ajusta ao conteúdo do art. 25, caput, do novo Código de Processo Civil.

E não se ajusta porque é: 1) contrato de adesão; 2) contrato com vício da plena autonomia da vontade de uma das partes da relação jurídica; 3) contrato com base em normas e convenções internacionais não reconhecidas pelo or-denamento jurídico brasileiro; 2) contrato com cláusulas manifestamente abusi-vas; e 5) contrato de simetria entre as partes.

No conhecimento marítimo de transporte, o instrumento do contrato in-ternacional de transporte marítimo de carga, a cláusula de eleição de foro, não é aquela que merece a chancela da cabeça do art. 25 do novo Código de Pro-cesso Civil, mas a que abraça o conceito de cláusula hardship.

Exatamente por isso que a jurisprudência nunca reconheceu as alegações feitas em lides forenses pelos transportadores marítimos no sentido de as referi-das cláusulas serem reconhecidas e aplicáveis aos casos concretos.

Muito pelo contrário: os tribunais brasileiros sempre enxergaram nessas cláusulas formas abusivas e incompatíveis com o Direito brasileiro, sobretudo no que tange à soberania da jurisdição nacional.

O direito processual civil mudou, mas o contrato internacional de trans-porte marítimo de carga, não; em sendo assim, tudo o que valia antes continua valendo hoje e continuará a valer doravante, sem qualquer alteração significa-tiva.

Em síntese, é possível afirmar que uma cláusula de eleição de foro ex-clusivo estrangeiro somente será válida e eficaz se: 1) for respeitado o princípio

Page 29: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������29

da autonomia da vontade; 2) não for inserida em contrato de adesão; 3) res-peitar todos os pressupostos essenciais do negócio jurídico perfeito; 4) carecer de qualquer ilicitude, ainda que apenas segundo a ordem moral; e 5) não for abusiva.

Diante dos itens enumerados e destacados, tem-se como certo que o contrato internacional de transporte marítimo de carga – por ser típico contrato de adesão – não pode ver como válida e eficaz sua cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, porque eivada do vício da voluntariedade e, a reboque, rotulada – conforme amplo entendimento jurisprudencial – como cláusula abu-siva, nula de pleno direito.

Convém muito insistir que o tema sempre recebeu tratamento especial pelo Poder Judiciário brasileiro, antes mesmo da incidência do art. 25 do novo Código de Processo Civil, diante da insistência do mercado dos transportadores marítimos em alegar a validade de uma cláusula imposta unilateralmente, de forma abusiva, em contrato de adesão, com a resposta jurisprudencial pela sua invalidade e sua ineficácia, senão o reconhecimento de nulidade:

Recurso especial. Contrato de transporte marítimo. Ação de regresso. Sub-roga-ção. Cláusula de eleição do foro. Matéria processual. Inoponibilidade ao sub--rogado. Ausência de insurgência em relação a todos os fundamentos do v. acór-dão recorrido. Incidência, por analogia, do Enunciado nº 283 da Súmula/STF. Recurso não conhecido. I – O instituto da sub-rogação transfere o crédito ape-nas com suas características de direito material. A cláusula de eleição do foro estabelecida no contrato entre segurado e transportador não opera efeitos com relação ao agente segurador sub-rogado. II – Acórdão assentado em mais de um fundamento, sem que todos tenham sido objeto de impugnação. Aplicação, por analogia, da Súmula nº 283/STF. III – Recurso especial não conhecido. (STJ, REsp 1038607/SP, 2008/0052074-1, 3ª T., Rel. Min. Massami Uyeda, DJ 20.05.2008, publ. 05.08.2008)

Destaca-se, pois, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Agravo Regimental interposto no Agravo de Instrumento nº 459.668/RJ (2002/0076056-3), julgado em 16 de dezembro de 2002, em que figurou como relator o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito:

Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Contrato. Transporte marí-timo. Competência. Cláusula de eleição de foro estrangeiro. 1. O acórdão re-corrido, de forma expressa, afirmou que não enfrentaria o mérito da questão da sub-rogação. Sendo assim, a ausência de prequestionamento do tema contido no art. 988 do Código Civil, em seu mérito, revela-se evidente, o que impede o seguimento do especial quanto ao ponto. 2. Dispôs o acórdão recorrido que “uma cláusula de renúncia de direitos com tão graves consequências como a cláusula de eleição de foro estrangeiro não pode reputar-se aceita tacitamente, sem que haja qualquer evidência, por mínima que seja, de que o consentimento da parte foi específico e resultou de uma negociação consciente” (fls. 43). Esse

Page 30: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

30 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

fundamento do acórdão, suficiente para sua manutenção, não sofreu impugna-ção, quer com base na alínea a, quer na alínea c do permissivo constitucional. Os paradigmas versam apenas sobre a validade da cláusula de eleição de foro em contrato de adesão, sem, contudo, tratar da situação específica verificada na hipótese destes autos, cláusula de eleição de foro estrangeiro, ofensa à ordem pública e à jurisdição brasileira, não havendo, portanto, a necessária identidade fática entre os julgados. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg-AI 459.668/RJ, 2002/0076056-3)

Pois bem!

A situação torna-se ainda mais complexa quando se leva em considera-ção a realidade prática do direito marítimo no âmbito judicial.

A maior parte das ações envolvendo os contratos internacionais de trans-portes marítimos de cargas é demandada por seguradoras, não pelos consigna-tários de cargas, segurados.

A dinâmica é mais ou menos a seguinte: o consignatário de carga (às vezes, o embarcador e exportador) contrata seguro do ramo de transporte inter-nacional para cobrir os riscos de uma viagem marítimo. Diante de um sinistro, falta ou avaria, parcial ou total da carga, o segurador indeniza o segurado, pro-prietário da carga sinistrada, e sub-roga-se na pretensão original deste contra o transportador marítimo que não cumpriu fielmente a obrigação contratual de resultado. Por conta da sub-rogação e o direito de regresso, o segurador veste-se com o manto da legitimidade ativa ad causam e é ele quem deflagra a disputa judicial mediante provocação formal do Estado-juiz. Ora, não pode esse segura-dor abraçar um ônus de uma relação contratual da qual ele não foi parte.

A cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro no corpo do conheci-mento marítimo é considerada abusiva, portanto, nula, relativamente ao segu-rado, embarcador e/ou consignatário da carga; e, em sendo assim, é igualmente nula relativamente ao segurador. Se o é para o mais, também o é para o menos.

Em outras palavras: não pode o segurador legalmente sub-rogado na pre-tensão do segurado ser obrigado a obedecer à disposição de um negócio jurídi-co do qual não foi parte em sentido estrito, muito menos anuiu.

A ilegalidade, abusividade, flagrante em relação ao aderente do contrato, revela-se ainda mais perniciosa e indevida ao segurador – quem, nunca é de-mais repetir, sequer foi parte da relação contratual original.

E nem se diga que a sub-rogação é via de dupla mão. Ledo engano. A sub-rogação transmite legal e legitimamente direitos, mas não todos os deveres, sobretudo aqueles chancelados com os signos dos vícios, dos defeitos jurídicos e das ilicitudes.

Page 31: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������31

Ora, em se tratando, num dado litígio forense, de autora seguradora le-galmente sub-rogada na pretensão do segurado (embarcador ou consignatário da carga), a eventual aplicação da cláusula se revelaria, como se revelavam e revela ainda mais errada, daí a precisa e justa resposta jurisprudência, uniforme e muito consistente, bem representada no julgado abaixo destacado:

(AI 0031172-14.2007.8.19.0000, 2007.002.17947, 8ª C.Cív., Desª Ana Maria Oliveira, J. 28.08.2007)

Agravo de instrumento contra decisão que rejeitou exceção de incompetência apresentada pela agravante na ação regressiva de ressarcimento que lhe move a agravada perante a 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital. Agravante que pretende o reconhecimento da competência de Cingapura, ou, caso assim não se entenda, das Comarcas de Contagem ou de Santos. Seguradora que busca o res-sarcimento do valor de cobertura securitária paga em razão de inadimplemento de contrato de transporte marítimo internacional, sub-rogando-se no direito da segurada. Sub-rogação que não abrange a cláusula de eleição de foro pactuada em contrato do qual não participou. Precedentes do TJRJ. Competência que deve observar a regra geral do foro do domicílio do réu, tendo a agravante filial na Co-marca do Rio de Janeiro. Inexistência de prevenção do Juízo no qual tramitou o protesto interruptivo da prescrição. Desprovimento do agravo de instrumento. (AI 0006273-83.2006.8.19.0000, 2006.002.14243, 13ª C.Cív., Des. Carlos Santos de Oliveira, J. 08.11.2006)

Seja para a parte efetivamente aderente do conhecimento marítimo (con-trato internacional de transporte de carga), seja, com mais razão ao segurador sub-rogado na pretensão do mesmo aderente, segurado de seguro de transporte internacional de carga, não há que se falar em subsunção à cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro porque em flagrante descompasso com a ordem jurídica vigente, uma vez que inserida unilateralmente em contrato de adesão e marcada com a estampa incurável da abusividade, isto é, ilegalidade. Logo, impossível submeter essa cláusula ao comando da cabeça do art. 25 do Código de Processo Civil.

Curioso que, além de tudo o que foi disposto neste trabalho, tem-se que o próprio art. 25 contém mecanismos de calibragem contra possíveis injustiças, negando vigência aos abusos.

Fala-se, pois, da regra do § 2º, cuja dicção é a seguinte: “Aplica-se à hi-pótese do caput o art. 63, §§ 1º a 4º”.

O § 3º diz expressamente: “Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo de foro de domicílio do réu”.

Ora, a mesma norma que autoriza o reconhecimento da cláusula de elei-ção de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional faz remissão à outra

Page 32: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

32 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

norma que apresente antídoto contra a cláusula que se mostrar abusiva, incom-patível com a ordem jurídica.

Nem poderia ser diferente, na medida em que o Direito não pode se pres-tar ao torno, tampouco promover, ainda que às avessas, a injustiça.

Reconhecida a natureza abusiva, o juiz poderá, mesmo sem ser provo-cado, declarar sua nulidade e remeter os autos do processo ao juízo de foro de domicílio do réu, lembrando que, em relação ao domicílio do transportador marítimo de carga, estrangeiro, tem-se como domicílio o lugar onde ele for re-presentado por um agente marítimo, mandatário comercial, no Brasil.

A importância dessa regra é demasiada, uma vez que enfatiza, com o peso da legalidade, a impossibilidade de a dita cláusula ser abusiva, ilegal, des-pida de elementos vitais como a plena voluntariedade.

Com a regra em destaque, tem-se a certeza, também por lei, de que a abusividade, muito comum em sede de contrato de adesão e ainda mais no cor-po de todo e qualquer contrato internacional de transporte marítimo de carga, não tem cabimento no sistema legal brasileiro e não permite a incidência do art. 25 do novo Código de Processo Civil.

Concluindo, é possível afirmar de forma muito clara, objetiva e sumari-zada que:

1) A regra do art. 25, caput, do novo Código de Processo Civil só atin-ge a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro que constar de contrato absolutamente harmônico com o sistema legal brasilei-ro, sem qualquer vício ou abusividade.

2) Há que se apurar o irrestrito respeito ao princípio da autonomia da vontade, um dos maios importantes pressupostos contratuais. A ausência da voluntariedade de uma das partes fere mortalmente a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, tornando ineficaz.

3) Tem-se por nula de pleno direito ou, no mínimo, despida de vali-dade e de ineficácia, a cláusula de eleição de foro exclusivo estran-geiro disposta em contrato de adesão, sobretudo em relação à parte que foi obrigada a aderir.

4) No caso específico do conhecimento marítimo (instrumento do contrato internacional de transporte marítimo de carga), corpo de um contrato de adesão, formado por cláusulas impressas e dispostas unilateralmente pelo transportador marítimo (armador), a cláusula de eleição exclusiva de foro estrangeiro é ineficaz, nula, porque manifestamente abusiva, sendo tradicional e praticamente pacífi-co entendimento jurisprudencial, não sendo de se cogitar qualquer

Page 33: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������33

mudança de orientação por conta da entrega em vigor do novo Có-digo de Processo Civil e do art. 25 em especial.

5) Além da inteligência sistêmica do Direito brasileiro, o próprio art. 25, no seu § 2º, faz remissão à poderoso antídoto contra a abusi-vidade, ou seja, o § 3º do art. 63; embora orientado ao réu, referido artigo pode e deve ser também aplicado ao autor de ação envolven-do questão relativa ao descumprimento do contrato internacional de transporte marítimo de carga.

6) De qualquer modo, válida ou não, eficaz ou não, abusiva ou não, a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato in-ternacional de transporte marítimo de carga não atinge o segurador que se sub-rogou na pretensão original do embarcador ou do con-signatário de carga (segurado), vítima de conduta danosa do trans-portador e emitente do instrumento contratual, uma vez que não foi, tampouco é, e jamais será parte da relação negocial, não sendo possível a atribuição de um ônus completamente estranho à forma-ção de sua livre vontade.

Diante disso tudo, é que ora se defende que, em relação ao contrato in-ternacional de transporte marítimo de carga, adesivo, a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro não será hábil para a projeção dos efeitos jurídicos pretendido, porque desde há muito tida como cláusula abusiva, portanto fora da hipótese do art. 25, caput, do novo Código de Processo Civil.

Ao menos em relação a importante tema do direito marítimo, nada mu-dará relativamente à melhor inteligência contratual e ao novo Código Civil na parte que trata da jurisdição nacional, inegavelmente primaz e aplicável, sob pena, mesmo, de ofensa à garantia constitucional de acesso à Justiça e de even-tual prejuízo à própria economia nacional.

Aproveitando a amplitude do tema, interessante equiparar o vício da ine-xistente eleição de foro em contrato de adesão com outro muito próximo, o do suposto compromisso arbitral no mesmo negócio jurídico.

Isso porque, ao se falar da cláusula de compromisso arbitral no contra-to internacional de transporte marítimo de carga, fala-se, automaticamente, na ausência da voluntariedade e desrespeito à própria Lei de Arbitragem do Brasil e, portanto, na completa invalidade, para não dizer nulidade, do seu conteúdo.

Na mesma linha de raciocínio, não há de se falar na validade e eficácia do compromisso arbitral, tal e qual constante em todo e qualquer conhecimento marítimo (internacional) de transporte de carga, na medida em que a cláusula que o impõe é de ordem adesiva e unilateralmente redigida, ao arrepio da pró-pria Lei de Arbitragem brasileira e desnuda do elemento voluntariedade; logo, não se harmoniza ao conteúdo do sistema processual civil em vigor.

Page 34: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

34 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

A cláusula de compromisso arbitral presente no conhecimento marítimo, o instrumento do contrato (internacional) de transporte marítimo de carga é manifestamente abusiva, porque alheia ao princípio da autonomia da vontade, relativamente à parte que foi obrigada a aderir às normas contratuais impostas pelo transportador.

Além disso, essa mesma cláusula, imposta unilateralmente, não segue a forma expressamente disposta pela lei de arbitragem brasileira para o compro-misso arbitral em contrato de adesão.

Por tais e outras importantes razões, não há de se falar no caso concreto em eventual preferência do procedimento arbitral, segundo o art. 3º, § 1º.

Logo, antecipa-se a conclusão deste breve estudo e afirma-se que, em re-lação ao direito marítimo, sobretudo quando interligado ao direito do seguro, o novo Código de Processo Civil não mudou, tampouco mudará algo, seguindo--se, pois, a orientação jurisprudencial de décadas.

Acrescente-se às sobreditas razões uma outra, absolutamente fundamen-tal: a suposta convenção de arbitragem não é, a rigor, nos contratos internacio-nais de transportes marítimos e/ou aéreos de cargas, levada a efeito segundo a lei de arbitragem brasileira.

Com efeito, além de ser outra imposição presente num contrato de ade-são, referida disposição atenta frontalmente contra a própria lei especial sobre a matéria.

Vale lembrar que o mesmo Código de Processo Civil reconhece a pos-sibilidade e a validade da arbitragem desde que expressamente observada a forma legal, conforme dispõe o § 1º do art. 3º: “É permitida a arbitragem, na forma da lei”.

O que se infere da parte final do referido enunciado é simples e não comporta muita ilação a respeito, senão a óbvia: se a lei não for rigorosamente observada, não há que se falar em arbitragem!

E nos litígios relativos ao direito do transporte, a convenção de arbitra-gem não é uma verdadeira convenção, mas outra inaceitável imposição dos transportadores em geral.

Em se tratando de contrato de adesão, a convenção de arbitragem tem que ser disposta num termo à parte, específico, anexo, assinado pelas partes e/ou disposto no próprio corpo do contrato, mas com letras destacadas e com a assinatura da parte aderente sobre o texto respectivo.

Se o contrato de adesão não obedecer fielmente às disposições da lei de arbitragem, não haverá o que se falar em validade e eficácia da respectiva con-venção, sendo nula de pleno direito a cláusula respectiva.

Page 35: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������35

Mesmo antes do novo Código de Processo Civil, o assunto já consumia nossa atenção, por conta do exercício profissional cotidiano.

Isso porque havia e há em curso uma tendência de se querer ampliar os efeitos jurídicos e práticos da cláusula de arbitragem, atingindo quem dela não é parte legítima e interessada.

Entendemos que essa tendência é equivocada e não terá força para seguir adiante, até porque o posicionamento jurisprudencial é claro e praticamente uniforme no sentido de a cláusula de arbitragem não projetar efeitos para quem dela não tomou parte voluntariamente.

Não se pode deslembrar que a voluntariedade é a qualidade por excelên-cia da arbitragem, sem a qual ela não se fez meio legítimo de solução de litígios, mas imposição arbitrária e inconstitucional

No campo do direito dos transportes e, em especial, do direito marítimo, notadamente na parte que ele se justapõe ao direito do seguro, o tema assume especial relevância e merece ser abordado com seriedade.

A melhor forma de se evitar um erro inoculado de grave injustiça é com-batê-lo no seu nascedouro, na fonte de sua gênese.

Falamos, especialmente, do seguro de transporte de carga, do próprio transporte marítimo de carga e da sub-rogação, sendo que tudo aquilo que cabe ao modal marítimo de transporte cabe, como já se disse, com igual simetria, ao modal aéreo.

A seguradora sub-rogada nos direitos e ações de um segurado, consig-natário de carga, vítima de uma relação contratual de transporte frustrada pelo armador, transportador marítimo (e/ou pelo transportador aéreo), não pode ser obrigada a aderir ao procedimento de arbitragem imposto unilateralmente no corpo do conhecimento marítimo, o instrumento que configura o contrato de transporte marítimo de carga.

Existem razões de sobra para não se admitir a amplitude indevida da cláusula de arbitragem e elas serão expostas com certa riqueza de detalhes pelos autores doravante.

Nem mesmo a nova regra processual poderá impor isso, ao menos quan-do cotejada com os contratos de transportes marítimos e aéreos de cargas.

Muito aproveita enfatizar que, no caso específico da cláusula de arbitra-gem presente no contrato de transporte internacional marítimo (no contrato de transporte aéreo, tal imposição é bem menos comum) de carga, existem duas razões fundamentais para sua não aplicação, sendo uma geral e outra própria para o caso da seguradora sub-rogada.

Page 36: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

36 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Ei-las: a primeira e geral: a cláusula de arbitragem constante no anverso do conhecimento marítimo é redigida em dissonância com a Lei de Arbitragem do Brasil, razão pela qual é nula de pleno Direito. Mesmo o consignatário da carga, parte no contrato, não pode ser obrigado à obedecê-la porque mani-festamente abusiva e ilícita. Já a segunda causa, relativamente à seguradora sub-rogada, reside no já comentado atributo da voluntariedade, uma vez que a seguradora não é parte da relação contratual de transporte, não se lhe poden-do, portanto, impor um ônus convencional, ainda que este fosse harmônico à lei da arbitragem. Ao contrário do que se ventila por aí, existem limites para a sub-rogação e estes são bem esquadrinhados pelo sistema legal como um todo.

O segurador legalmente sub-rogado não se vê, portanto, obrigado a res-peitar normas contratuais assumidas ou unilateralmente impostas ao seu segu-rado e consignatário da carga.

Por mais que possa parecer aos olhos menos acostumados ao universo do seguro uma via de mão única, a verdade juridicamente defensável é que a sub-rogação se opera amplamente para os direitos e ações, mas de forma abso-lutamente restrita no que tange aos eventuais deveres e ônus.

Assim, além de considerações outras relativamente aos abusos contidos nas cláusulas unilaterais e adesivas dos contratos de transporte marítimo de carga, bem como nos próprios do modal aéreo, o segurador não se vê obrigado a observar as cláusulas de eleição de foro e de arbitragem, porque personalíssi-mas e somente ligadas ao embarcador e ao consignatário da carga2.

Com efeito, se o segurador não tomou parte no contrato de transporte, não é justo e devido que ele seja eventualmente obrigado a aceitar as cláusulas do contrato de transporte, na medida em que sua manifestação de vontade não se viu em momento algum convolada na efetivação do contrato. Isso é especial-mente evidenciado no caso da disposição arbitral, na medida em que a figura da voluntariedade não se faz presente.

Nos conhecimentos marítimos em geral, e, em especial, em alguns co-nhecimentos aéreos de transporte, a cláusula de arbitragem caminha lado a lado, de mãos dadas e almas, na mesma estrada do dirigismo contratual, do absoluto desrespeito ao elemento da voluntariedade.

Diante das razões e fundamentos aqui colocados, parece-nos correto o entendimento jurisprudencial de não submeter de maneira compulsória os ca-sos de ressarcimento ao crivo da arbitragem.

2 Importante: não é o objeto do presente estudo, mas tem-se também por abusivas e, portanto, ineficazes as cláusulas limitativas de responsabilidade do transportador, mesmo no caso do modal aéreo, influenciadas pela Convenção de Montreal. Toda e qualquer cláusula considerada abusiva não projeta efeitos nos contratos de adesão, unilaterais.

Page 37: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������37

Trata-se de algo manifestamente ilegal, uma vez que a arbitragem pre-vista no conhecimento de transporte marítimo de carga, como visto detalha-damente nas considerações de ambos os autores, é uma cláusula unilateral, disposta num contrato de adesão, sem aquiescência do consignatário da carga, segurado, quanto mais da seguradora, e redigida ao arrepio das formalidades substanciais exigidas pela Lei de Arbitragem brasileira.

Mais do que algo ilegal, a eventual aplicação da cláusula de arbitragem para a seguradora sub-rogada que busca o ressarcimento em regresso contra o transportador marítimo que inadimpliu obrigação de transporte seria, será e é um grande e grave erro, suscitando até mesmo arguição de inconstitucionalida-de, por ofensa à garantia fundamental de acesso à jurisdição.

Por mais que a arbitragem possa ser um procedimento inteligente, saudá-vel, afeto aos direitos disponíveis e de índole empresarial, como os que tangem ao transporte marítimo de carga, ela jamais se revestirá da dignidade que só a função jurisdicional do Estado tem e nunca poderá ser aplicada sem o signo da voluntariedade. Obrigar, por exemplo, alguém que não aderiu voluntariamente ao procedimento de arbitragem a dele tomar parte é algo perigoso e que põe dúvida quanto à lisura do próprio instituto.

Conforme debatido, a adesão para resolução da lide via arbitragem deve ser voluntária e com expressa manifestação de vontade das partes. É necessário frisar que nenhuma crítica é feita ao sistema de arbitragem em si; muito pelo contrário, trata-se de medida eficiente e com grande valor na condição de au-xiliar do Poder Judiciário, porém entendemos que seu aceite sempre será uma prerrogativa das partes anuentes, não podendo, sob hipótese alguma, ser com-pulsória ou determinada, seja pelo Judiciário, seja mesmo por meio de cláusula em contrato de adesão com manifestação unilateral a respeito da matéria. Trata--se de medida que visa a trazer segurança jurídica plena e absoluta para todos os players do transporte marítimo de cargas, com condições claras e objetivas para que todos atuem com o menor número de conflitos possíveis.

Também nos cabe frisar que a possibilidade de cláusula de “oferta de arbitragem” deixa a possibilidade de escolha para todas as partes envolvidas, seja o transportador, dono da carga e também a seguradora, para que decidam qual o caminho mais célere, economicamente viável e mais interessante para as partes aderirem quando ocorrer lides envolvendo o transporte marítimo.

Ora, diante de todo exposto, afirmamos, sem constrangimento algum ou temor, que a regra relativa à preferência da “convenção” de arbitragem não é aplicável aos contratos (internacionais) de transportes marítimos de cargas, porque:

1) disposta unilateralmente, por meio de cláusula impressa, no corpo de um ins-trumento contratual adesivo;

Page 38: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

38 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

2) despida da livre manifestação de vontade da parte aderente;

3) há flagrante desconformidade com a própria lei de arbitragem;

4) a seguradora legalmente sub-rogada sequer foi parte no contrato, não podendo ser obrigada a suportar os ônus pesados nele impostos.

Os vícios contratuais nos instrumentos que corporificam os transportes internacionais marítimos de cargas são muitos para serem premiados com as incidências de regras processuais não aplicáveis ao caso concreto.

O mesmo Codex, por sua vez, contém norma fundamental que cabe como luva à mão a todo e qualquer litígio fundado em problema com o contra-to de transporte marítimo de carga: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

Referido artigo dispõe sobre a “primazia da decisão de mérito”.

As partes têm o direito público subjetivo, agora elevado ao status de nor-ma fundamental, garantia processual-constitucional, a decisão de mérito.

E por mérito entenda-se, preponderantemente, o bem da vida de um lití-gio, seu núcleo.

Ao enveredar pela eleição de foro e/ou pela arbitragem em casos nos quais essas mesmas figuras são, no mínimo, duvidosas, senão manifestamen-te indevidas e ilegais, depõe-se contra a norma fundamental da primazia da decisão de mérito e em muito se prejudica o jurisdicionado e, reflexamente, a própria soberania da Justiça brasileira.

De todo modo, o que se tem que ter em alça de mira tanto num caso como no outro é a presença (ou melhor, a ausência) da voluntariedade.

Ora, se a eleição de foro estrangeiro e/ou a de procedimento arbitral não forem absolutamente voluntárias, não haverá que se falar nos seus eventuais reconhecimentos, sob pena de ofensa do Direito.

No caso específico da seguradora sub-rogada legalmente, a situação, como exaustivamente exposta, é ainda mais justificável, sendo inaplicável qual-quer norma ou convenção contratual firmado entre seu segurado e um transpor-tador sem sua prévia, formal e expressa anuência.

E tudo isso com muito mais razão em se tratando de contrato de adesão, caracterizado por cláusulas impressas e algumas manifestamente abusivas.

O respeito ao procedimento arbitral é algo correto e desejável, algo a ser contemplado e defendido pelo Direito em exercício, mas esse respeito pas-sa, necessariamente, pela via da voluntariedade. Sem a voluntariedade, sem a concordância ampla, irrestrita e juridicamente perfeita, o respeito perde seu manto e passa a vestir outro, negativo, costurado com as linhas do abuso e do

Page 39: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������39

desequilíbrio contratual. Somente a voluntariedade autoriza o conceito de pact sunt servanda.

O contrato de adesão, por razões de ordem moral e de ordem jurídica, razões ontológicas mesmo, sempre foi interpretado e aplicado restritivamente pelo sistema legal brasileiro, constituindo essa forma de inteligência verdadei-ro mecanismo de calibragem e benfazeja tradição jurisprudencial. Não temos motivo algum para acreditar que a situação mudará com o novo Código de Processo Civil, até porque sua gênese conecta-se ao fim do formalismo pelo formalismo, da visão literal da regra legal, premiando o Direito enquanto instru-mento da Justiça e do bem comum.

Finalizando a abordagem deste tema tão importante e aberto com a parte da decisão judicial em estudo que reconheceu a primazia da jurisdição nacio-nal, muito aproveita tratar das cláusulas de eleição de foro e de compromisso arbitral relativamente ao segurador legalmente sub-rogado em Juízo, por se tra-tar do principal protagonista das ações de ressarcimento contra os transporta-dores marítimos.

Destacamos dentro do tema um ponto muito importante e que merece especial atenção: o da seguradora legalmente sub-rogada na pretensão original do embarcador ou do segurador de carga.

E destacamos porque, a rigor, são as seguradoras que demandam em Juízo contra os transportadores marítimos por faltas e avarias.

Normalmente, um embarcador ou um consignatário de carga é detentor de apólice de seguro de transporte de carga.

Diante de um sinistro, do inadimplemento de obrigação de resultado do transportador, a seguradora, após a regulação do sinistro, paga ao segurado a in-denização securitária devida e, consequentemente, sub-roga-se em seus direitos contra o transportador, causador do sinistro.

Daí o ajuizamento da ação regressiva de ressarcimento em face do trans-portador e que é a principal modalidade de ação dentro do contexto geral do direito marítimo.

A sub-rogação faz transferir ao segurador os interesses, direitos e ações do segurado contra quem de Direito, mas não impõe obrigações contratuais da qual não foi parte originalmente ou sequer anuiu de forma expressa.

Ora, ainda que as referidas disposições contratuais não fossem, como são, manifestamente abusivas e contrárias ao sistema legal brasileiro, elas não poderiam, de forma alguma, submeter a seguradora ao cumprimento.

A eleição de jurisdição estrangeira, assim como o compromisso arbitral, exige, entre outras coisas, como pressupostos de validade e de eficácia que se-jam aceitos, acolhidos e abraçados pelo eventual interessado.

Page 40: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

40 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Em nenhum dos casos a Seguradora costuma expor sua expressa anuên-cia, razão pela qual não pode ser obrigada a observar. A jurisprudência, aliás, bem se orienta em tal sentido.

Pois bem, exaurido por completo o tema sobre a jurisdição nacional, tem-se o segundo destaque do decisum” em exame, qual seja, o protesto do recebedor.

Tentaram as transportadoras emplacar a tese da decadência do direito de cobrança (ressarcimento) do segurador por suposta ausência do protesto previs-to no art. 754 do Código Civil.

Tese fulminada não só pela antítese, bem exposta no memorial reprodu-zido mais acima, mas, principalmente, pela síntese (dupla síntese, aliás, mono-crática e colegiada).

Fundamentou bem a Turma Julgadora o assunto à luz dos fatos, conforme exposto na ementa: “Mercadoria descarregada no Japão, onde não há incidên-cia, nem mesmo por previsão contratual, da norma brasileira”.

De fato, o art. 754 só é exigível – e mesmo assim de forma calibrada e segundo as particularidades de um caso concreto – para os transportes de cargas ocorridos no Brasil e/ou terminados no país.

Logo, um caso como o concreto jamais poderia enveredar pelo caminho tortuoso da eventual falta do protesto do recebedor.

Não obstante, dada a importância do tema, pensamos ser muito útil e interessante comentar um pouco mais a seu respeito, uma vez que constitui, em termos práticos, um dos que mais chamam a atenção no casamento entre o direito do seguro e o direito dos transportes.

Desde 2002, o protesto do recebedor é regulado pelo art. 754 do Código Civil.

Referida regra legal revogou a antiga, de natureza instrumental: o art. 756 do Decreto-Lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939 (antigo Código de Proces-so Civil), então mantido em vigor pelo art. 1.218 do antigo Código de Processo Civil de 1973, que vigeu até março de 2016.

Quando o art. 754 do Código Civil entrou em vigor, houve alguma dis-cussão em termos de conflito aparente de normas com o art. 756, acima deta-lhado.

Prevaleceu, como não poderia deixar de ser, o entendimento favorável ao art. 754 do Código Civil.

Mas, se alguma dúvida ainda pairasse no ar, a promulgação em 2015 do novo Código de Processo Civil pôs fim, definitivamente.

Page 41: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������41

Com a nova ordem instrumental, a antiga deixou de existir e, com ela, o comentado art. 756, que se mantinha em vigor apenas por conta do anterior Código de Processo Civil, em seu art. 1.218.

Hoje, apenas e tão somente o art. 754 é qualificado para regular o pro-testo do recebedor.

Entende-se como tal o instrumento importante para a caracterização da responsabilidade do transportador marítimo em caso de inadimplemento con-tratual (contrato de transporte de carga).

Trata-se do primeiro passo a ser tomado, pelo interessado, para a tipifica-ção da inexecução da obrigação de transporte.

Diz o art. 754 do Código Civil:

Art. 754. As mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a quem apre-sentar o conhecimento endossado, devendo aquele que as receber conferi-las e apresentar as reclamações que tiver, sob pena de decadência dos direitos.

Parágrafo único. No caso de perda parcial ou de avaria não perceptível à pri-meira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o transportador, desde que denuncie o dano em dez dias a contar da entrega.

Infere-se do enunciado do caput da regra legal que não existe uma forma específica para a apresentação do protesto do recebedor.

Logo, qualquer meio idôneo para o registro do inconformismo do interes-sado é válido e eficaz para configurar o protesto do recebedor.

Não há uma forma específica determinada pela lei. O protesto, portanto, pode ser uma ressalva no verso do conhecimento marítimo, uma carta registra-da, um expediente eletrônico, enfim, qualquer meio hábil para atestar proble-mas com o cumprimento da obrigação de transporte marítimo.

Se o transportador não quiser receber o protesto, em nada alterará sua validade e eficácia.

Muito pelo contrário, a recusa do transportador deporá contra ele mes-mo, pois será um indício a mais da sua responsabilidade.

Por transportador entenda-se qualquer um que fizer as suas vezes; assim, não apenas o armador do navio será legitimado para figurar no protesto do re-cebedor, mas também o agente marítimo ou o P&I Club.

De igual modo, em se tratando de um transporte multimodal ou, mesmo, sucessivo, a efetivação do protesto contra um dos protagonistas da obrigação de transporte aproveita a todos os demais.

Na mesma toada, em um transporte encabeçado por um agente de car-gas bastará ao interessado formular o protesto apenas contra o agente e toda a cadeia logística dar-se-á por devidamente protestada.

Page 42: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

42 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Vale a pena repetir essa ideia: seja um agente de cargas, seja algum par-ticipante de um transporte multimodal ou sucessivo, o protesto apresentado a um dos atores implica juridicamente todos os demais, tendo-se estes por devi-damente protestados.

O único rigor do art. 754 reside na sua eventual ausência. Segundo o parágrafo único, se o dano, falta ou avaria não for denunciado em até dez dias, haverá decadência do direito do interessado em relação ao transportador desi-dioso.

Dado o rigor do texto legal, o tema ausência de protesto e decadência de direito merece especial destaque e este será feito por meio de afirmações sumárias e muito objetivas.

A uma: o protesto do recebedor só se faz necessário em casos de avarias ou per-das parciais de cargas. Nos casos de perdas totais, não haverá necessidade de sua apresentação, por presunção lógica.

A duas: o protesto do recebedor encontra-se regulado na parte do Código Civil que disciplina o contrato de transporte; logo, só é exigível contra os transporta-dores em geral. Não haverá necessidade de sua apresentação se o dano ocorrer em um terminal portuário ou depositário de qualquer natureza.

A três: o protesto do recebedor é exigível apenas no território nacional, em trans-portes de navegação de cabotagem ou internacionais com desembarques de car-gas no Brasil, não nos transportes internacionais com desembarques no exterior. Não se pode pretender que a lei brasileira seja aplicável em território estrangeiro.

A quatro: entende-se por “recebedor” qualquer pessoa com mínimo interesse no transporte de uma carga. Dessa forma, não se faz necessário que o consignatário da carga seja o emissor do protesto, até porque muitas vezes ele não tem contato com ela senão depois de bom tempo. Qualquer pessoa que externar problemas com a carga desembarcada de bordo de uma embarcação tem a qualidade de “recebedor” por justa equiparação legal.

A cinco: o protesto do recebedor pode ser perfeitamente substituído por outros instrumentos formais que se lhe façam as vezes, como o termo de faltas de avarias do depositário portuário ou o boletim de ocorrência.

O destaque quinto convém ser melhor explicado, até porque ele se con-funde, em alguma medida, com o terceiro.

A jurisprudência brasileira, mesmo antes do Código Civil de 2012, sem-pre se orientou pela possibilidade de substituição do protesto do recebedor por qualquer documento capaz de noticiar avarias e faltas parciais.

O mais comum desses documentos era e é o termo de faltas e avarias dos terminais portuários.

Toda carga transportada pela via marítimo, sobretudo em transporte in-ternacional, passa necessariamente pelas mãos de um terminal portuário, espe-

Page 43: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������43

cialmente quando o navio que a transportou empreendeu uma viagem interna-cional.

No caso do transporte internacional, essa passagem faz parte do chama-do processo de nacionalização da carga ou desembaraço aduaneiro, previsto no Regulamento Aduaneiro.

Até mesmo para se proteger legalmente, um terminal inspeciona a carga quando do seu recebimento em regime de depósito obrigatório e faz as anota-ções restritivas necessárias e relativas ao seu estado, como divergência de peso, amassamentos, furos, sujidades etc.

Tais anotações são válidas e eficazes para a conformação do art. 754 do Código Civil, delas fazendo proveito qualquer interessado.

Como muitas cargas são contêinerizadas, mesmo as chamadas ressal-vas genéricas e praxiastas, preferencialmente acompanhadas, depois, de algum outro meio de prova, são válidas para a materialização do inconformismo e, evidentemente, do protesto do recebedor.

Ora, se a jurisprudência já se posicionava assim, com mais razão have-ria, como de fato tem mantido, seu entendimento após a entrada em vigor do Código Civil de 2012.

A boa lógica do Direito e o princípio da razoabilidade, bem como o da proporcionalidade, comungam em tal sentido.

A norma legal endureceu, criou uma causa decadencial de Direito, faci-litou e muito a situação jurídica do transportador marítimo, sendo necessários, portanto, mecanismos de calibragem.

O entendimento anterior, ou melhor, o de sempre, ganhou novo e vital fôlego e se fez ainda mais necessário, firme e valioso. Assim, mais do que nun-ca, a substituição do protesto do recebedor por qualquer outro meio de prova hábil, idôneo, é salutar e perfeitamente válido.

Dos possíveis documentos substituíveis, nenhum é mais presente no coti-diano do direito marítimo do que o termo de faltas e avarias. Por isso, sem pes-tanejar, ancorados nas máximas de experiência, na jurisprudência consolidada e na melhor inteligência do sistema legal em exercício, afirmamos que esse documento faz as vezes do protesto do recebedor e tem o fito de caracterizar o inadimplemento contratual e a responsabilidade civil do transportador marítimo que causou danos a uma carga confiada para transporte.

Pois bem, isso explicado muito aproveita tratar de uma questão de direito do seguro que circunscreve o direito marítimo e pousa na dinâmica do protesto do recebedor.

Page 44: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

44 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Não é impossível que, em um dado caso concreto, o consignatário da carga e titular de apólice de seguro de transporte não formule o protesto do recebedor e não tenha em mãos algum documento substitutivo. Em tese, o transportador valeu-se do benefício da decadência. O segurador, contudo, re-conhecendo a ocorrência de um risco de transporte, em máxima boa-fé, houve por bem efetuar o pagamento da indenização ao seu segurado, respeitando o clausulado e sequer invocando, para evitar discussão a respeito, a cláusula geral que dispõe que o segurado não pode prejudicar seu direito de regresso contra o causador do dano.

Pois bem, perguntamos: pode o segurador, legalmente sub-rogado na pretensão do segurado, ser prejudicado por conta de um problema que não deu causa?

Perguntamos ainda: é correto impor ônus ao segurador que agiu de boa--fé, cumpriu sua obrigação contratual, atuar de forma exemplar, sendo que ele sequer era parte direta na relação de transporte?

E a reboque das duas perguntas, uma terceira: é justo o transportador beneficiar-se de uma questão formal, ainda que prevista em lei, e não reparar o dano do ilícito civil cometido, sendo premiado pelo erro?

Pensamos, com base nas três indagações, que ao segurador não se pode exigir a apresentação do protesto do recebedor em um litígio judicial contra um transportador marítimo, sob pena de esvaziamento inaceitável do conceito de sub-rogação legal e do próprio Enunciado de Súmula nº 188 do Supremo Tribunal Federal.

Existem precedentes judiciais a respeito.

O assunto é polêmico, não negamos, e constitui uma tese, mas é alimen-tado por fortes argumentos jurídicos.

Um segurador somente pagará uma indenização após rigoroso proces-so de regulação de sinistro. O dossiê desse processo pode não conter em seu bojo o protesto do recebedor, mas certamente conterá muitas provas acerca da responsabilidade civil do transportador marítimo; afinal, sem a caracterização inequívoca do risco de transporte, um segurador não pode pagar uma indeni-zação, sob pena de levar a efeito o indevido pagamento ex gratia e ferir o prin-cípio do mutualismo. Diante disso tudo, não é justo, tampouco moral, que ele se veja prejudicado no pleno exercício do ressarcimento em regresso contra o verdadeiro causador do dano por conta da ausência de um documento que ele mesmo não tinha qualquer gestão quando do calor dos fatos.

Exatamente por isso é que nos sentimos seguros em afirmar que o se-gurador não pode ser prejudicado diante da eventual ausência do protesto do recebedor.

Page 45: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������45

Retornando ao tema em seu sentido amplo e não mais apenas no que concerne ao casamento com o direito do seguro, podemos terminar o presente item com o seguinte resumo:

1) O protesto do recebedor, desde 2012, é regulado apenas pelo art. 754 do Código Civil.

2) Sua ausência, segundo a lei, implica decadência; não obstante, dado o rigor legal, já existem entendimentos doutrinários e jurisprudenciais atenuando a decadência diante da apresentação de outros meios de provas.

3) O protesto há de ser apresentado em até dez dias da data do recebimento da carga por quem de Direito, apenas para os casos de avarias ou perdas parciais. Para perdas integrais, não há necessidade de apresentação do protesto.

4) Não se exige protesto do recebedor contra terminais de cargas, depositários em geral, mas apenas contra os transportadores.

5) O protesto só tem cabimento no Brasil, não sendo necessário, ao menos se-gundo os termos do art. 754 do Código Civil, em sinistros ocorridos no ex-terior.

6) O protesto apresentado contra o agente de cargas aproveita todos os partici-pantes da cadeia logística de transporte.

7) Nos transportes multimodais ou sucessivos, o protesto formulado contra um dos atores é válido e eficaz contra todos os seus protagonistas.

8) Não há uma forma específica para o protesto do recebedor, sendo válido e eficaz todo e qualquer meio hábil, idôneo e razoável, tais como cartas, notifi-cações, expedientes eletrônicos.

9) O protesto do recebedor pode ser substituído por qualquer documento ou instrumento que se lhe faça devidamente as vezes, especialmente o termo de faltas e avarias do terminal portuário que recebeu a carga em regime de depósito obrigatório.

10) Em litígio judicial cujo autor é segurador sub-rogado, a eventual ausência do protesto do recebedor não poderá importar decadência do direito, porque este não pode ser prejudicado por uma questão formal-documental da qual não tinha e tem qualquer ingerência ou domínio.

Também exaurido o tema do protesto do recebedor, o conteúdo da de-cisão colegiada em destaque somente merece elogios, uma vez que aplicou corretamente a legislação relativa à responsabilidade do transportador marítimo por inexecução da obrigação de resultado.

No caso concreto, as transportadoras não cumpriram fielmente a obriga-ção consorciada de resultado assumida perante o dono da carga, uma vez que permitiram sua avaria no curso da viagem marítima internacional.

Page 46: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

46 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Incapazes de, mediante inversão do ônus, provar a existência de alguma causa legal excludente da presunção de responsabilidade pelo inadimplemento contratual, responderam pelos prejuízos causados.

E responderam integralmente, sem se lhes aproveitar qualquer alegação de mitigação dessa responsabilidade por conta de ilegal tarifação de responsa-bilidade, até porque essa figura contratual, abusiva, fere o princípio da repara-ção integral, previsto no art. 944 do Código Civil, e a garantia constitucional fundamental da reparação civil ampla e total.

Não raro, demonstra a experiência cotidiana, um transportador que não cumpre a obrigação contratual de resultado também incide em culpa em senti-do estrito, tanto por não observar os deveres objetivos de guarda, conservação e restituição do bem confiada para transporte, como por inobservância do cha-mado dever geral de cautela e transgressão à cláusula de incolumidade, todos inerentes aos riscos do negócio de transporte.

Isso tudo, aliás, ficou bem claro na ementa do acórdão:

Provas que atestam não só os danos havidos com a carga, quando já em poder das transportadoras, em virtude da infiltração que a inutilizou, bem como o pa-gamento ofertado pela seguradora à empresa segurada, que se sub-rogou em seus direitos.

De se notar que a decisão ainda homenageou, mesmo que muito indire-tamente, a força da figura legal da sub-rogação e, igualmente, a do enunciado de Súmula nº 188 do Supremo Tribunal Federal.

Por fim, é de bom tom registrar que a decisão ainda fez questão de ob-servar a nova dinâmica processual relativamente aos recursos, impondo a sa-lutar majoração dos honorários advocatícios de 10% para 15% do valor total, atualizado e acrescido, da condenação, segundo o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015.

Quanto mais o Poder Judiciário aplicar essa regra, mais ele ajudará a necessária mudança de mentalidade das partes e dos seus procuradores, a fim de que a transação venha a ser constantemente buscada em meio aos litígios, evitando-se os agravamentos desnecessários dos encargos das derrotas.

Como inicialmente exposto, esta é, sem dúvida, uma decisão muito im-portante, senão paradigmática, ao menos emblemática, porque imantada de valiosos conceitos jurídicos e muito viva, incandescente de temas próprios do direito dos transportes e do direito do seguro em juízo.

Page 47: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Assunto Especial – Doutrina

Seguro Marítimo

Seguro de Transportes Nacional e Internacional e Regulação de Avaria Simples ou Particular

JOSÉ FLÁVIO COMMANDULLIConsultor em Regulação de Avarias e Sinistros de Transporte Nacional e Internacional, Certifi-cado pela Escola Nacional de Seguros Funenseg – ENS-Funenseg, Comissário de Avarias com Registro FenSeg – Federação Nacional de Seguros Gerais, Pós-Graduado MBA em Gestão Empresarial pela Sociesc/FGV, Bacharel em Direito pela ACE/FGG, Faculdade de Pedagogia pela ACE/FEJ.

RESUMO: O presente artigo objetiva discorrer sobre o seguro de transportes nacional e internacional e os aspectos jurídicos da regulação de avarias simples ou particular no comércio exterior, e será di-vidido em três capítulos. O Capítulo 1 tratará da história do seguro; o Capítulo 2 abordará os aspectos contratuais de seguro de transporte e o Capítulo 3 apresentará caso prático de regulação de avaria simples ou particular. No final, serão feitas as conclusões.

PALAVRAS-CHAVE: Direito marítimo; seguro de transportes; regulação de avaria simples ou parti-cular.

ABSTRACT: This article deals with domestic and international transportation insurance, and the legal aspects of the regulation of simple or particular faults in foreign trade. It will be divided into three chapters. Chapter 1 will deal with the history of insurance. Chapter 2 will address the contractual aspects of transport insurance and Chapter 3 will present a practical case of simple or private failure regulation.

KEYWORDS: Maritime law; transportation insurance; regulation of simple fault.

SUMÁRIO: Introdução; Capítulo 1: Aspectos históricos do seguro e conceitos relevantes; 1.1 Origem das avarias; 1.2 Etimologia da palavra avaria; 1.3 Avarias simples ou particular; 1.3.1 Avaria dano e despesa extraordinária; 1.4 Da avaria simples ou particular; 1.4.1 Conceito de avaria simples ou particular; 1.5 Avaria grossa ou comum; 1.5.1 Conceito de avaria grossa ou comum; Capítulo 2: Se-guro de transporte; 2.1 Seguro de transporte; 2.2 Proposta; 2.3 Apólices e averbações; 2.4 Endosso; 2.5 Franquia e participação obrigatória do segurado (POS); 2.6 Moeda do seguro; 2.7 Condições gerais do seguro de transporte; 2.8 Cláusulas e riscos; 2.9 Início e fim dos riscos; 2.10 Riscos não cobertos neste seguro; 2.11 Coberturas básicas; 2.12 A cobertura básica restrita “C”; 2.13 Cober-tura básica restrita “B”; 2.14 Cobertura básica ampla “A”; 2.15 Coberturas adicionais e específi-cas; 2.16 Critérios de taxação; 2.17 Importância segurada (IS) ou limite máximo de garantia (LMG); 2.18 Liquidação ou pagamento da indenização; Capítulo 3: Regulação de avaria simples ou particular; 3.1 Regulação de avaria; 3.2 Protesto – Ressalva – Termo de falta e avaria (TFA); 3.3 Regulação de

Page 48: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

48 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

avarias e sinistros; 3.4 Das vistorias, e do laudo de vistoria particular; 3.5 Casos práticos; 3.5.1 Caso 1 – Furto de lingotes de alumínio importados da China; 3.5.2 Caso 2 – Avaria de vidros especiais importados da Espanha; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A regulação de avaria simples ou particular tem origem há mais de 4.500 anos, com o surgimento do seguro de transporte de carga por caravanas de camelos nos desertos da Babilônia e região. O registro do comércio marítimo e da legislação sobre avarias descrito no Código de Hamurábi demonstra a im-portância da atividade, mas, infelizmente, é completamente desconhecido no comércio nacional.

Essa regulação de avaria particular, por meio administrativo, similar a um inquérito, delimita a responsabilidade do segurador, do transportador multi-modal ou das autoridades portuárias na cadeia logística, entre outros atores do comércio exterior. Consegue, assim, provas robustas para o deslinde do caso concreto, independente de haver ou não seguro envolvido, medida esta que é demandada pelos advogados.

CAPÍTULO 1: ASPECTOS HISTÓRICOS DO SEGURO E CONCEITOS RELEVANTES

Segundo Alexis Cavicchini, o seguro atual teve início cerca de 2.500 anos antes de Jesus Cristo, e seu registro fundamental está no Código de Hamurábi1, na Babilônia, com seus 282 artigos, que abordam diferentes assun-tos como direito marítimo, seguros, responsabilidade civil, penal e comercial etc.

Ele se deu em face de um sistema atuarial limitado a uma só caravana de camelos no deserto da Babilônia, Mesopotâmia, Fenícia, que transitava nos desertos da região transportando mercadorias e pessoas. Assim, ao perceber-se que muitos camelos não voltavam com vida, ou a carga era perdida, e devido aos constantes prejuízos, porque a morte do camelo, ou perda da carga, era pre-juízo (chamado de sinistro e avaria), instituiu-se uma formula mutualista para amparar o companheiro prejudicado.

Desta forma, o seguro se dava mediante um acordo financeiro, por meio do qual as perdas ocorridas durante a expedição seriam rateadas entre todos (se-gurados e segurador), ou seja, a parte do dono dos demais camelos, outra parte das pessoas transportadas e outra dos donos das cargas transportadas. Desta ma-neira, ocorria a indenização ao dono do camelo morto, ou da carga perdida. Os

1 SIQUEIRA, Alexis Cavicchini Teixeira de. A história dos seguros no Brasil – 1808-2008. COP, 2008. p. 16-19.

Page 49: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������49

navegadores fenícios e hebreus também rateavam os prejuízos ocorridos duran-te as suas viagens marítimas, principalmente no Mar Egeu e no Mediterrâneo.

No século XII, surgiu uma modalidade de seguro chamada contrato de dinheiro a risco marítimo2, em que um financiador emprestava ao navegador o dinheiro no valor da embarcação. Se a embarcação se perdesse, o navegador não devolvia o dinheiro emprestado, mas, se a embarcação chegasse intacta ao seu destino, o dinheiro emprestado era devolvido ao financiador, acrescido de juros.

No mesmo século XII, o Papa Gregório IX proibiu a realização do men-cionado contrato e, em consequência, surgiu uma forma similar de seguro, de-nominada Feliz Destino3. Assim, um banqueiro comprava a embarcação com a previsão de recompra pelo vendedor. Se a embarcação chegasse sem sofrer qualquer sinistro, a cláusula de recompra era acionada e o banqueiro vendia a embarcação ao proprietário original por um valor maior. Se a embarcação e/ou a carga se perdesse, o dinheiro adiantado pelo banqueiro correspondia à indenização pelo sinistro.

Em 1318, foi localizado o mais antigo documento de seguro marítimo, que surgiu em Gênova, Itália, e publicou-se a “Ordenança de Pisa”, que consti-tuiu a primeira legislação conhecida sobre seguros4. Com emissão da apólice de seguro, que apareceu num Brevê do Porto de Cagliari, segurando o transporte de mercadorias entre as cidades de Pisa e Sardenha. A partir dessa data, o termo “assecuramento” surge em diversos documentos de Gênova, que denominava este instrumento de “assecuramento de polizzia” – ou apólice, como é deno-minada hoje.

Os genoveses foram pioneiros em adaptar e aplicar, aos seguros maríti-mos, uma técnica já desenvolvida pelos banqueiros de Florença, que combina-va empréstimos, seguro e garantia de câmbio. Na prática, foram estes os criado-res do seguro moderno, definindo o objeto do seguro, a apólice e a divisão do trabalho entre seguradores e corretores de seguros.

Em Portugal, por Carta Régia de 15 de outubro de 1529, é criado o cargo de escrivão de seguros. Esse cargo foi ocupado por Brás Eanes, tesoureiro do rei e escrivão da fazenda. O escrivão detém o monopólio dos registros de todos os contratos de seguro e respectivas apólices. Cabia-lhe também a escrituração de todas as dúvidas e diferenças (possíveis litígios), constituindo a primeira ação fiscalizadora, sendo também na altura a primeira instituição com funções de arbitragem5.

2 PORTO GENTE. Disponível em: <https://portogente.com.br/portopedia/72900-seguro-maritimo-transportes>. Acesso em: 27 jun. 2017.

3 SIQUEIRA, Alexis Cavicchini Teixeira de. Op. cit., p. 16/19.4 NASCIMENTO, Luiz Coelho. Op. cit. Acesso em: 27 jun. 2017.5 NASCIMENTO, Luiz Coelho. Op. cit. Acesso em: 27 jun. 2017.

Page 50: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

50 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

No século XVII, na França, foi criada uma associação de seguro denomi-nada Tontinas, cujos membros contribuíam durante um período determinado e, após essa fase, distribuíam os recursos apurados entre os sobreviventes.

No Brasil, em 1808, com a vinda da Corte portuguesa e do Rei Dom João VI, príncipe regente de Portugal para o Brasil, que, nos primeiros atos em solo brasileiro, assinou alguns decretos, entre os quais a abertura dos portos às nações amigas. Mencione-se que os ingleses escoltaram a Corte até Salvador, e tiveram a autorização para a fundação de duas companhias de seguros, pois a demanda à época era simples: um dos principais negócios de Salvador era o tráfico de escravos, que exigia o seguro de vida deles e a cobertura dos navios6.

Ou seja, os negros cativos da época não passavam de meras mercadorias, com manifesto ou conhecimento de embarques. A primeira seguradora a fun-cionar no país foi a Companhia de Seguros Boa Fé, fundada em 24 de fevereiro de 18087. O Brasil, como colônia do Reino de Portugal, seguia a legislação comercial portuguesa até 1822, quando se tornou independente, que tinha forte influência francesa à época.

Para a época, o panorama daria um salto em qualidade e respeito aos direitos e garantia comercial e securitário, afastando-se das leis portuguesas que vigoravam, com a promulgação da Lei nº 556, de 25 de junho de 1850, o Códi-go Comercial brasileiro8. Embora exista hoje o Projeto de Lei nº 1.572/2011, no Congresso Nacional, para modernizá-lo, a segunda parte do Código Comercial ainda está em vigor e regula parte do transporte e seguros no Brasil; contudo, está desatualizada. Apesar dos avanços, o Código proibia expressamente o se-guro de vida para homens livres, já que essa modalidade de seguros era consi-derada imoral e antiética. Interessante notar que o seguro de vida de escravos era liberado, pois estes eram considerados propriedade e, portanto, seguráveis.

Um dos decretos mais importantes para o mercado de seguros no Brasil, o Decreto-Lei nº 73/1966, que reformulou a política de seguros no Brasil e criou o SNSP – Sistema Nacional de Seguros Privados, que inclui os seguintes órgãos: (i) Ministério da Fazenda; (ii) CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados; (iii) CRSNSP – Conselho de Recursos do Sistema Nacional de Seguros Privados, de Previdência Privada Complementar Aberta e de Capitalização; (iv) Susep – Superintendência de Seguros Privados; (v) IRB-Brasil Resseguros S/A; (vi) socie-dades autorizadas a operar em seguros privados e capitalização e as entidades

6 SUA PESQUISA.COM. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/historiadobrasil/vinda_familia_real.htm>. Acesso em: 24 jun. 2017.

7 Estatuto Companhia Boa Fé. Disponível em: <file:///C:/Users/recep1/Downloads/chy_estatuto_-_companhia_de_seguros_boa-fe.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.

8 PLANALTO. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L0556-1850.htmCompilado.htm>. Acesso em: 27 jun. 2017.

Page 51: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������51

de previdência complementar aberta; e uma das funções mais importantes para o consumidor, as (vii) corretoras de seguros9.

A cronologia do mercado segurador teve grande avanço com a promul-gação do atual Código Civil brasileiro, Lei nº 10.406/2002, que incorporou parte do Código Comercial, tratando de seguro e transporte. Em 2015, com a promulgação do novo Código de Processo Civil, NCPC, Lei nº 13.105/2015, em especial os arts. 149 e 707 em diante, houve equiparação do regulador de avarias com os auxiliares da justiça, perito, administrador, contador etc., com direitos e obrigações que atuarão em avaria grossa ou avaria particular. Na avaria grossa descrita no Código, sempre haverá avaria particular para regular conjuntamente ou separada. Dessa forma, o objetivo deste artigo é identificar a forma de regular a avaria particular.

1.1 Origem das avarias

A avaria nasceu com o direito marítimo, seja repousando em usos e costumes comerciais com força de lei, seja regulada por leis precisas corres-pondendo aos interesses da navegação. Entre os testemunhos escritos, cita-se a Bíblia, na qual se fala em alijamento da carga e de aparelhos do navio. No antigo testamento, há referência a uma viagem que fazia o navio Tharsis. So-brevindo uma grande tempestade, foi alijada ao mar toda a carga para aliviar o navio de seu peso10.

De igual forma, no Novo Testamento, consta nos Atos dos Apóstolos, Capítulo 27, versículos 8-34, a seguinte passagem: “Quando costeava Creta, o navio que conduzia o apóstolo Paulo teve alijado a carga e os aparelhos em virtude de forte tormenta que agitou o mar”11.

A avaria também consta nos Rolos de Oléron (ou Julgamentos de Oléron); eram também uma coleção de costumes marítimos de autor desco-nhecido. Tratava-se de “julgamentos redigidos em pergaminhos e conservados enrolados, derivados da Ilha de Oléron, nas costas do Atlântico, na França, sede de um amplo comércio de vinho e sal”. Grande parte dos capítulos dos Rolos de Oléron foram reproduzidos em diversas ordenanças e regulavam matérias como alijamento, acidentes da navegação, busca e salvamento, responsabilidades do capitão e da tripulação em relação à carga durante a viagem12.

9 CONSELHO NACIONAL DE SEGUROS PRIVADOS. Disponível em: <http://cnseg.org.br/cnseg/mercado/estru-tura/sistemas-nacionais/>. Acesso em: 27 jun. 2017.

10 SANTOS, Theophilo de Azeredo. Direito da navegação (marítima e aérea). Rio de Janeiro: Forense, 1964. p. 356.

11 PETERSON, Eugene H. Bíblia em linguagem contemporânea. São Paulo: Vida, 2011. p. 1585. 12 SILVA, Sarah Elizabeth Nunes. Avaria grossa e as regras de York e Antuérpia. Disponível em: <https://www.

univali.br/Lists/TrabalhosGraduacao/Attachments/848/sarah.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.

Page 52: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

52 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

No Brasil, antes de entrar em vigor o Código Comercial, essa matéria foi disciplinada pelo Regulamento das Avarias, aprovado pela Resolução Régia de 30 de agosto de 1820, por Dom João VI. O Código Comercial brasileiro, segun-da parte, Título XII, Capítulo I, define a natureza e a classificação das avarias, desde os arts. 761 ao 766, e regula os casos previstos de avarias, em especial as marítimas.

Atualmente no NCPC, Lei nº 13.105/2015, os arts. 149 e 707 em diante tratam também dos critérios de regulação de avarias.

1.2 etimOlOgia da palavra avaria Sobre a etimologia da palavra avaria, há opiniões distintas. Segundo

Santos, os pontos de vista são os mais controvertidos possíveis:

a) Gluck deriva a palavra de hajten, porto, ou haben, ter; b) Vicq retira-a da pa-lavra hebréia habar, consorciar; Boxhorn dá-lhe origem árabe; c) Van Weytsen remonta-a ao grego, do bopos, pêso, de onde a gapos, sem pêso; d) Delabore vê nas palavras aver, haver, avere empregadas pelas línguas meridionais da Idade Média; e) Jonhson vê sua raiz no radical saxônico healp, half, metade; f) Govare liga-a ao vocábulo latino averare.13

No que tange à definição de avaria, segundo Georges Ripert, é um termo muito amplo:

La palabra avarias tiene um sentido muy general, indica los daños y todas las pérdidas que pueden sobrevenir durante la expedición marítima, tanto la perdida total como el daño material sufrido por el buque o la mercancía. no se puede pues oponer aqui, como a propósito de la responsabilidad o del seguro, la avaria o la perdida.14

Por sua vez, a palavra avaria tem um sentido muito geral, indicando to-das as perdas e danos que possam surgir durante a expedição marítima, enquan-to que a perda total como os danos materiais sofridos pelo navio ou carga.

No mesmo sentido, Osvaldo Agripino de Castro Junior descreve que, no direito marítimo, avaria significa despesas ou danos extraordinários concernen-tes ao navio ou à carga15.

Por fim, mas não divergindo do anteriormente dito, Martins descreve que avaria significa as despesas ou danos no navio ou carga, e é conceituada no art. 761 do Código Comercial brasileiro16. Muito se tem discutido acerca da

13 SANTOS, Theofilo de Azeredo. Op. cit., p. 355.14 RIPERT, Georges. Compendio de derecho martitimo. Buenos Aires: Tipografia Editora Argentina (TEA), 1954.

p. 341.15 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de (Org.). Direito marítimo: made in Brasil. São Paulo: Lex, 2007.

p. 285.16 MARTINS, Eliane Maria Octaviano. Curso de direito marítimo. São Paulo: Manole, v. II, 2008. p. 1.

Page 53: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������53

etimologia da palavra, e a maioria dos autores, conforme leciona Gilbertoni, inclina-se para habar, do hebreu, ou awar, do árabe17.

Atualmente, o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda traz a seguinte descrição:

Avaria: 3ª pessoa do singular presente do indicativo de 2º pessoa singular imper-feito de Avariar. Causar avaria a. I. Sofrer avaria. II. Estragar-se. III. Tresloucar.18

No ramo securitário, quando se faz um laudo, utilizam-se os seguintes termos e abreviaturas das avarias: arranhado (AR): tipo de avarias que não chega a atingir a estrutura da máquina, apenas a tinta e o fundo dela; amassado (AM): avaria que afeta a peça/estrutura do equipamento; com mossa (CMO): peque-nos danos inferiores a 3cm, como batida de tampa, porta, pedras etc.; com ondulação (CO): lataria ondulada, devido a reparo mal executado, ou batida, deixando a lataria sem alinhamento; com ferrugem (CF): local da lataria afetada por abrasão (desgaste por oxidação), sem que ela tenha sido perfurada; com corrosão (CC): local da lataria afetado por abrasão (desgaste excessivo por oxi-dação), sendo que ela está perfurada pela corrosão; rachado (RA): aparecimento de trincas/cortes, a qual a peça encontra-se inteira, não faltando pedaços; trin-cado (TR): mesmo que rachado, mas em menores proporções; quebrado (QB): onde a peça danificada por quebra não está integral, falta parte dela; rasgado (RG): normalmente aplicado a tecidos do equipamento; riscado (RI): apenas riscos superficiais, com danos apenas na pintura; com massa (CMA): aplicação excessiva de massa plástica para recuperação de uma peça, utilizar fita mag-nética de imã para detectar; mal reparado (MR): com lataria sem pintura, tipo fundo, verniz fosco ou sem acabamento19.

Assim, nos casos de danos na mercadoria, máquina ou equipamento, tra-taremos de avaria simples ou particular, ou simplesmente de avarias – perda ou dano que ocorre involuntariamente, ou seja, provocado por acidente inevitável.

1.3 avarias simples Ou particular

1.3.1 Avaria dano e despesa extraordinária

Avaria dano e despesa extraordinária dão a impressão de significados di-ferentes; no entanto, são diferentes no que concerne ao tipo de avarias, mas não deixam de ser avarias conforme já visto, e neste item demonstra essa diferencia-ção, que tanto pode se enquadrar nas espécies de avarias simples ou particular.

17 GILBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 210.

18 HOLANDA, Aurélio Buarque de. Disponível em: <https://dicionariodoaurelio.com/avaria>. Acesso em: 29 abr. 2017.

19 VARANDA, José Antonio Menezes. Conceitos básicos de seguro. Rio de Janeiro: ENS-Funenseg, 2005. p. 7-11.

Page 54: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

54 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Esta é um tipo característico de avaria em que o particular suporta o prejuízo, ou se enquadra, e que neste trabalho científico será tratado conforme preceitua o art. 766 do Código Comercial, Lei nº 556/1850, com um elenco exemplificativo de avarias simples, e em avaria grossa ou comum, em que a co-munidade envolvida na aventura marítima, a grosso modo, contribui para fazer frente às despesas e indenizações de um sinistro/avaria.

Conforme Martins, avarias dano e avarias despesa são assim definidas:

a) Avaria dano, ou avarias deteriorantes, average los, são motivadas, essencialmente, por faltas náuticas, ou seja, houve algum erro que decorreu a inavegabilidade. No contexto dos danos, enquadram--se os danos materiais, decorrentes da inutilização ou estrago da coisa, navio ou carga, e os danos imateriais, dos quais resulta ape-nas redução no valor da coisa, como, por exemplo, produtos que diminuem sua cotação no mercado mundial, ao longo do percurso de transporte, ou seja, commodity, que, ao sair do porto, valem $ XX e, ao chegar no porto de destino, valem $ X; b) avaria despesa, ou expressivas, average expenditures, são geralmente causadas por elementos de força maior (acts of God), ou seja, atos de Deus, e se consubstanciam em desembolsos de caráter excepcional necessá-rios para que o navio complete a expedição marítima com segu-rança ou que a carga efetivamente venha a chegar, com a mesma segurança, a seu destino.20

Tanto avarias dano como avarias despesa podem ser classificadas, quan-to à causa, em avaria grossa ou comum e avarias simples ou particular, clas-sificação de maior relevância no que concerne às avarias, conforme dispõe o art. 761 ao art. 771 do Código Comercial brasileiro de 1850, assim como dos arts. 186 e 187 do Código Civil brasileiro, e art. 5º, V, da Constituição Federal, na qual destaca que é assegurado o direito de indenização por dano material, moral ou à imagem.

1.4 da avaria simples Ou particular

Na doutrina há diversos tipos de avarias, dentre as quais avarias fortui-tas, avarias necessárias, avarias miúdas, avaria recíproca ou de mútuo prejuízo. Outras divisões de menor importância são reconhecidas: avaria maior e menor, própria e imprópria, ordinária e extraordinária, voluntária ou mista.

O Direito brasileiro reconhece duas espécies principais de avarias: as avarias simples ou particular e avaria grossa ou comum, mas depende de cada situação fática para definir se é avaria simples ou avaria grossa, embora em toda

20 MARTINS, Eliane Maria Octaviano. Op. cit., p. 4.

Page 55: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������55

avaria grossa exista parte de avaria particular excluída do cálculo, mas que não deixa de existir.

Neste sentido, avaria simples ou particular é o dano ou despesa extraor-dinária, ou dano ou despesas ordinários, mas, devido a causas extraordinárias, acontecidas à coisa durante o tempo dos riscos.

Para Daniel Gomes, são requisitos da avaria simples: I – ser involuntária; II – ser individual; III – a que recai somente sobre a coisa que a sofre e só afeta ao dono da coisa avariada; IV – a vontade humana não interfere para resguar-dar interesses relativos ao navio ou à carga. Decorrem de casos fortuitos ou de força maior, de culpa (negligência, imperícia, ou imprudência), ou de dolo (por parte do comandante, equipagem ou mesmo empregados do armador, ou até terceiros). Tendo seus requisitos da avaria simples: I – perigo particular que comprometa o navio ou a carga; II – despesa extraordinária; III – ausência de vontade comum dos interessados no ato que provocou o dano21.

As avarias simples derivam, essencialmente, de fortuna do mar, vício pró-prio do navio ou da carga, fatos da tripulação e fatos do transportador ou arma-dor. As avarias simples afetam o navio ou a carga separadamente e abrangem as avarias ocorridas com o navio parado, durante o embarque, desembarque ou ainda em terra, em algumas circunstâncias.

Nas avarias simples, o valor é suportado pelo particular afetado, isto é, só pelo navio ou só pela coisa que sofreu o dano ou deu causa à despesa; para fins didáticos e sem prejuízo de análises específicas a respeito das espécies de avarias, evidenciam-se, em suma, em elementos diferenciados das avarias ma-rítimas quanto à causa.

1.4.1 Conceito de avaria simples ou particular

Para Martins, avarias simples ou particular estão assim definidas.

Avaria simples ou particular são despesas extraordinárias que são inerentes e respeitam, unicamente, ao objeto – navio ou carga – separadamente. Ademais, as avarias simples derivam, essencialmente, de: i) fortuna do mar; ii) vício pró-prio do navio e ou da carga; iii) fatos da tripulação; e vi) fatos do transportador/armador. Infere-se, portanto, que as avarias simples caracterizam-se por: a) fato isolado, oriundo de fortuna do mar, ou ilícito determinante do dano ou despesa; b) prejuízos a serem suportados pelo particular afetado – navio ou carga. As ava-rias simples ou particulares são suportadas, ou só pelo navio, ou só pela coisa que sofreu o dano ou deu causa à despesa. No Direito brasileiro, o art. 766 do Código Comercial adota o sistema da enumeração, formulando cinco grupos de avarias simples.22

21 GOMES, Daniel. Acidentes e fatos da navegação marítima. Disponível em: <http://trimearbi.blogspot.com.br/p/avaria.html>. Acesso em: 27 maio 2017.

22 MARTINS, Eliane Maria Octaviano. Op. cit., p. 32.

Page 56: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

56 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

É aplicável às avarias o regime de direito comum, como dispõem os arts. 761 e 766 do Código Comercial copiando disposições do art. 1818 do Código do Comercio Português de 1833, sem prejuízo das ações de responsa-bilidade que competem ao titular do interesse afetado.

O conceito fundamental da avaria particular é o suum cuique, segundo o qual cada um sofre o dano ou a despesa a que foi exposta a própria coisa; casum sentit donus é a consagração do corrente princípio res perit domno. Para finalizar, é de suma importância ressaltar que o art. 766 não tem caráter taxati-vo, ou seja, as avarias simples não se limitam aos itens enumerados no artigo, pois estes são simplesmente demonstrativos.

Ainda no art. 766, na última alínea, conclui-se que são avarias particu-lares, “em geral, as despesas feitas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos”. No rol de acidentes marítimos que geral-mente resultam em avaria simples, enquadram-se a colisão, o abalroamento, a água aberta, o incêndio e a explosão, entre outros. No entanto, enquadram-se em sede de avaria simples, sem exceção, os acidentes de naufrágio, borrasca e encalhe, “posto que incompatíveis com os 23 pressupostos indispensáveis para caracterização das avarias grossas”23.

1.5 avaria grOssa Ou cOmum

Superadas as peculiaridades da avaria simples ou particular mencionadas nos itens anteriores, o presente capítulo volta-se ao estudo do instituto jurídico da avaria grossa ou comum. Para que se possa tratar de sinistro e avarias, é fundamental saber apenas o conceito de avaria grossa, que será tratado mais a fundo em outro artigo.

1.5.1 Conceito de avaria grossa ou comum

Avaria grossa é resultante de qualquer sacrifício ou de despesas extraor-dinárias incorridas de forma intencional e racional para a segurança geral, no intuito de preservar do perigo maior a propriedade de todas as partes envolvidas na aventura marítima, que se apresenta como a ação na qual o proprietário de um bem possa incorrer em responsabilidade a uma terceira parte devido a um perigo marítimo.

Desta feita, a avaria grossa afeta conjuntamente o navio e a carga, mas sempre tendo como objetivo minimizar as possíveis perdas. Portanto, seus cus-tos são repartidos por todas as partes interessadas na expedição marítima, no

23 SILVA, Sarah Elizabeth Nunes. Op. cit. Acesso em: 27 jun. 2017.

Page 57: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������57

caso o armador e os proprietários, embarcadores ou consignatários das merca-dorias avariadas ou não24.

Saraceni vai além, descrevendo que:

De acordo com o Ato de Seguro Marítimo de 1906, quando existir perda por avaria grossa, a parte sobre a qual tal perda recair é devida, desde que de acor-do com as condições impostas pelo direito marítimo, contribuição rateada en-tre as partes interessadas (contribuição de avaria grossa). O valor de cada uma dessas contribuições é calculado pelo ajustador de avaria (Regulador de Avaria, arts. 149, 707 e seguintes do NCPC – Lei nº 13.105/2015). Para que o ajuste da avaria ocorra de acordo com as Regras de York/Antuérpia de 1994 (2004, e atual 2016), é necessário que conste do contrato de afretamento (ou do conhecimento de embarque) uma cláusula estabelecendo sua adoção.25

A avaria é empregada em perda ou dano, ou abrangendo as duas moda-lidades.

Se as avarias grossas surgem “desde a carga e partida, até o retorno e des-carga”, é porque se relacionam ao transporte, e se as avarias surgem “durante o tempo dos riscos”, é porque se relacionam ao dano26.

Resulta daí que, enquanto as avarias grossas ocorrem durante a viagem, as avarias particulares podem verificar-se estando o navio parado, durante o embarque e desembarque, e até mesmo em terra27.

Superado o tema avarias do Capítulo 1, passa-se à analise dos aspectos do contrato de seguro propriamente dito.

CAPÍTULO 2: SEGURO DE TRANSPORTE

2.1 segurO de transpOrte

A necessidade de proteção contra o perigo, a incerteza quanto ao futu-ro e a possibilidade de perdas dos bens e da receita da família e do indivíduo acompanham o ser humano em sua evolução. Daí nasce a necessidade de ter seguro com a finalidade específica de reestabelecer o equilíbrio econômico perturbado, sendo vedada, por lei, a possibilidade de se revestir do aspecto de jogo ou de dar lucro ao segurado. Ou seja, contrato pela qual uma das partes

24 SARACENI, Pedro Paulo. Transporte Marítimo de Petróleo e Derivados. Rio de Janeiro: Interciência, 2006, p. 30.

25 Idem, ibidem.26 CAMPOS, João Vicente. Da Avaria Particular no Direito Nacional e Internacional. Rio de Janeiro: Forense.

1954, p.12-13.27 Idem, ibidem.

Page 58: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

58 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

se obriga, mediante cobrança de prêmio, a indenizar outra de um perigo ou prejuízo eventual28.

As condições do contrato que definem o risco devem ser objeto ou coisa segurável, possível, futuro, incerto, e independer de vontade das partes contra-tantes; por fim, devem resultar de sua ocorrência um prejuízo, e ser mensurável.

Tem-se como características no contrato de seguro os princípios nortea-dores, como, por exemplo, ser nominado – porque é regulado por lei, Código Civil e Código de Defesa do Consumidor; ser de adesão, porque as condições da apólice são padronizadas; bilateral, pois gera obrigações para as duas partes; oneroso, pois implica ônus e vantagens econômicas; aleatório, porque depen-de exclusivamente de um evento futuro e incerto; formal ou solene, pois a lei obriga à formalidade; e de máxima boa-fé recíproca, conforme os arts. 765 e 766 do Código Civil.

Assim, cabe destacar, neste capítulo, a definição de alguns itens, dentro do universo do transporte marítimo e comércio exterior, entre os quais quem é o segurador de transporte e as principais nomenclaturas utilizadas no ramo securitário, com suas regras e termos contratuais, que definirão uma possível indenização, ao se cumprir o contrato.

Em nosso ordenamento jurídico, a definição legal de segurador encontra--se nos arts. 1º, 2º, 3º do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, que assim o define:

Art. 1º Todas as operações de seguros privados realizados no país ficarão subor-dinadas às do presente decreto-lei.

Art. 2º O controle do Estado se exercerá pelos órgãos instituídos neste decreto-lei, no interesse dos segurados e beneficiários dos contratos de seguros.

Art. 3º Consideram-se operações de seguros privados os seguros de coisas, pesso-as, bens, responsabilidades, obrigações, direitos e garantias.29

Portanto, por definição legal, podemos conceituar a sociedade segura-dora como a pessoa jurídica sob forma de sociedade anônima, especializada e pré-qualificada pelas entidades governamentais em pactuar contrato, por meio do qual assume a obrigação de pagar ao contratante (segurado), ou a quem este designar, uma indenização, no caso em que advenha o sinistro no risco indica-do e temido, recebendo, para isso, o prêmio estabelecido.

A estrutura basilar entabulada pelo Decreto-Lei nº 73/1966 consiste no CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados30, conforme sua Resolução

28 VARANDA, José Antonio Menezes. Op. cit., p. 7-11.29 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/menu/atos-normativos/legislacao-basica-1>. Acesso em:

16 jun. 2017.30 BANCO CENTRAL. Disponível em: <www.bcb.gov.br/pre/composicao/cnsp-asp>. Acesso em: 10 abr. 2017.

Page 59: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������59

nº 12/198831, que trata deste assunto e é vinculado ao Ministério da Fazenda, e pela Susep – Superintendência de Seguros Privados.

Para a sociedade seguradora operar na atividade securitária, e/ou garan-tias de coisas, bens, pessoas, responsabilidades, obrigações, direitos, ou seja, no caso em tela, de cargas destinadas à exportação ou provenientes do exterior, importação, no transporte marítimo, terrestre, ferroviário, aéreo, dentro do ter-ritório nacional ou fora dele, é preciso observar as normativas do CNSP e da Susep, conforme a Circular nº 354/2007, entre outras:

Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) – órgão responsável por fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados; é composto pelo Ministro da Fazenda (Presidente), representante do Ministério da Justiça, representante do Mi-nistério da Previdência Social, Superintendente da Superintendência de Seguros Privados, representante do Banco Central do Brasil e representante da Comissão de Valores Mobiliários. Dentre as funções do CNSP estão: regular a constitui-ção, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercem atividades su-bordinadas ao SNSP, bem como a aplicação das penalidades previstas; fixar as características gerais dos contratos de seguro, previdência privada aberta, capita-lização e resseguro; estabelecer as diretrizes gerais das operações de resseguro; prescrever os critérios de constituição das Sociedades Seguradoras, de Capitali-zação, Entidades de Previdência Privada Aberta e Resseguradores, com fixação dos limites legais e técnicos das respectivas operações e disciplinar a corretagem de seguros e a profissão de corretor”. “CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados, Resolução nº 12/1988: Art. 1º Aprovar as Condições Gerais e Tarifa para o Seguro de Responsabilidade Civil do Transportador Intermodal – Carga, na forma das normas anexas a esta Resolução”. “Susep – Circular nº 354/2007 – Su-perintendência de Seguros Privados. Empresa (seguradora) autorizada pela Susep a funcionar no Brasil e que, recebendo o prêmio, assume os riscos descritos no contrato de seguros.32

Outro ponto importante é delimitar sua responsabilidade no tocante à garantia de cargas asseguradas e à pulverização do risco, em trânsito, dentro ou fora do navio, porto organizado, armazéns etc., o que está delineado no art. 4º do Decreto-Lei nº 73/1966, que assim dispõe:

Art. 4º Integra-se nas operações de seguros privados o sistema de cosseguro, res-seguro e retrocessão, por forma a pulverizar os riscos e a fortalecer as relações econômicas do mercado.33

Esse seguro é calculado na própria seguradora pelos sistemas, que, para esse cálculo, elaborou um questionário que o cliente deve responder. Através

31 MINISTÉRIO DA FAZENDA. Disponível em: <www.fazenda.gov.br/cnsp>. Acesso em: 10 abr. 2017.32 DELOITTE. Circular Susep nº 354. Disponível em: <http://www.deloitte.com.br/publicacoes/2007all/122007/

Susep/cir354.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.33 PLANALTO. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0073.htm>. Acesso em:

27 jun. 2017.

Page 60: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

60 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

das informações contidas nesse questionário, a seguradora analisa a aceitação ou não do seguro solicitado.

O cliente, por sua vez e ótica, avalia as propostas e, se for conveniente, contrata o seguro, então assina a proposta, com as regras básicas.

2.2 prOpOsta

Este documento é o cálculo do seguro propriamente dito; é por meio dele que o cliente saberá o valor do seguro e as devidas responsabilidades da segu-radora, conforme determinam o art. 759 do Código Civil e a Resolução CNSP nº 12, de 1988, nos termos do art. 1º:

Art. 1º Aprovar as condições gerais e tarifa para o seguro de responsabilidade civil do transportador intermodal – carga, na forma das normas anexas a esta resolução.34

2.3 apólices e averbações

A apólice é o documento que representa o contrato de seguro realizado entre as partes intervenientes e que tem valor jurídico, sendo considerado con-trato de adesão. Pode ser apólice simples ou avulsa, aberta ou de averbação, ou anual com prêmio fracionado. Por sua vez, as averbações são os lançamentos de embarque individual na apólice de seguro aberta.

Existem cinco tipos de averbações: diária, simplificada, provisória, pro-visória única e definitiva. Importante salientar que, a partir do momento em que o segurado opta pela sistemática do averbamento por meio de relação de embarques, ele se obriga a incluir no relatório todos os embarques realizados, sob pena de ver cancelado o presente benefício e perder o direito a eventual indenização.

2.4 endOssO

É um documento com o qual se procede a qualquer alteração numa apó-lice de seguros, por exemplo, em virtude de alterações de rota, ou do meio de transporte etc.

2.5 Franquia e participaçãO Obrigatória dO seguradO (pOs)Nos seguros de transporte, aplica-se a franquia para algumas modalida-

des e, em outra, utiliza-se a participação obrigatória do segurado nos prejuízos

34 SUSEP. Disponível em: <http://www2.susep.gov.br/bibliotecaweb/docOriginal.aspx?tipo=1&codigo=17499>. Acesso em: 16 jun. 2017.

Page 61: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������61

(POS). Para os seguros de transportes internacionais, quando exportação, não existe franquia nem participação obrigatória do segurado.

Quando é importação para qualquer modal de transporte, é utilizada franquia sobre o valor da importância segurada, individualizado por item, e valor especificado no documento, aplicando-se um percentual sobre este bem entre 1% e 3%. Para os seguros nacionais em viagem de transporte terrestre, aplica-se o POS no caso de roubo de algumas mercadorias mais visadas defini-do pelas companhias, podendo chegar a 25% do embarque.

Em viagens aquaviárias, utilizam-se franquias sobre o valor total do embarque, variando conforme o tipo de mercadoria, embalagem, tipo e ano da embarcação, individualizando cada bem e valor indicado na invoice ou proforma35.

2.6 mOeda dO segurO

O seguro de importação, por envolver relações com outras nações, ofe-rece ao segurado a opção de escolher tanto a moeda nacional quanto a moeda estrangeira, mas, em geral, aplica-se a moeda estrangeira.

2.7 cOndições gerais dO segurO de transpOrte

As condições gerais do seguro de transporte internacionais são as mes-mas com algumas variáveis a ser consideradas no seguro de transportes nacio-nais, e devem seguir a Circular Susep nº 354, de 2007; Circular Susep nº 461, de 2014; Circular Susep nº 513/2015; Resolução CNSP nº 123, de 2005; Resolu-ção CNSP nº 219, de 2010; Resolução CNSP nº 247, de 2011, entre outras, com suas alterações. Aplica-se sempre que não contrariem as condições adicionais e/ou cláusulas específicas, integrantes da apólice.

O início e o término da cobertura, a entrega de averbações e a dedução de franquias são disciplinadas por condições adicionais e especiais a cada caso. O pagamento do prêmio e a liquidação de sinistro obedecem às regras previs-tas, algumas nas condições gerais e outras nas condições especiais e/ou adicio-nais e outras nas cláusulas especificas. O que determina o tipo de condições gerais é o meio de transporte, ou seja, existe um modelo de condições gerais marítimas, um modelo aéreo e um modelo terrestre.

2.8 cláusulas e riscOs

Nas cláusulas de coberturas, são definidos os riscos que serão cobertos e os que não terão cobertura securitária, e onde se deve ter atenção redobrada.

35 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/download/menubiblioteca/SegRCOTMC.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2017.

Page 62: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

62 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Existem três tipos de cobertura no transporte internacional: as básicas, as adicio-nais e as especiais, e cobrem riscos marítimos, aéreos e terrestres.

As combinações entre essas cláusulas possibilitam ter variadas opções, e no seguro transporte existem três tipos de modalidades (coberturas “A”, “B e “C”), que serão descritas sucintamente para melhor compreensão.

2.9 iníciO e Fim dOs riscOs As coberturas “A”, “B” e “C” são do tipo porta a porta. Portanto, o seguro

contratado com essas coberturas vigora a partir do momento em que a merca-doria começa a ser carregada no lugar mencionado na apólice ou na averbação para o começo do trânsito e termina da seguinte forma: ao fim de (60) sessenta dias, após completada a descarga da mercadoria no porto de destino final; ao fim de (30) trinta dias, após completada a descarga da mercadoria no aeroporto de destino; ao fim de (30) trinta dias, após a chegada do veículo terrestre à loca-lidade de destino; com a venda ou transferência de direitos do objeto segurado, após a entrega da mercadoria no lugar de estocagem de destino indicado.

2.10 riscOs nãO cObertOs neste segurO

O segurado deve ter ciência das cláusulas que não cobrem o seguro con-tratado, posto que gera transtorno na hora da regulação, pois deve ser analisado o caso concreto, como as perdas, danos e despesas consequentes direta ou indiretamente de: (i) atos ilícitos do segurado, beneficiário e/ou de seus repre-sentantes; (ii) vazamento comum, perda natural ou diferença natural de peso ou de volume e desgaste natural do objeto segurado; (iii) insuficiência ou inade-quação da embalagem; (iv) falta de condições de navegabilidade; (v) poluição, contaminação e perigo ambiental, causados pelo objeto segurado; (vi) danos morais; (vii) multas ou obrigações fiscais, jurídicas ou tributárias; (viii) danifica-ção ou destruição voluntária do objeto segurado ou parte dele, por ato ilícito de qualquer pessoa, inclusive atos de má-fé, vandalismo e sabotagem; (ix) varia-ção de temperatura (quando carga resfriada ou refrigerada); (x) paralisação de máquinas frigoríficas ou motores de refrigeração por qualquer causa (quando a carga resfriada ou refrigerada); e (xi) transbordo e desvio de rota voluntária, entre outros36.

2.11 cOberturas básicas

Estas coberturas são representadas por três categorias com diferentes ní-veis de abrangência, que são: restrita “C”, restrita “B” e ampla “A”. Abaixo serão especificados os riscos garantidos por cada uma dessas coberturas, pois elas se diferenciam exatamente pela quantidade de riscos cobertos. “A” mais completa,

36 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/download/menubiblioteca/SegRCOTMC.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2017.

Page 63: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������63

“B” com coberturas moderadas e “C” com coberturas menos atrativas. A “A”, por cobrir mais riscos, é a mais elevada, “B” é intermediária, ou moderada, e “C” é a mais barata – consequentemente, com menos riscos cobertos.

2.12 a cObertura básica restrita “c”É a menos abrangente das três coberturas básicas e tem o objetivo de

cobrir perdas e danos causados às mercadorias transportadas ocasionadas ex-clusivamente por riscos de transporte, isto é, por acidentes restritos ao veículo transportador. Entre outras, essa cláusula “C” não cobre, ou será declinável, o roubo ou extravio das mercadorias que em nenhum meio de transporte será abrangido. Não oferece também cobertura para terremotos, erupção vulcânica, raio e sacrifício de avaria grossa e carga lançada ao mar.

Abaixo discriminaremos as garantias oferecidas por essa cláusula “C” conforme as classificações de transporte.

No transporte marítimo, a cobertura básica restrita “C” oferece garantia às perdas ou danos atribuíveis a: incêndio, raio ou explosão, encalhe, naufrágio ou soçobramento do navio ou embarcação, abalroamento, colisão ou conta-to do navio ou embarcação com qualquer objeto externo que não seja água, descarga da carga em portos de arribada, carga lançada ao mar, perda total de qualquer volume durante as operações de carga e descarga do navio, perda total decorrente de fortuna do mar e arrebatamento pelo mar.

O seguro cobre ainda sacrifício de avaria grossa e as despesas de salva-mento ajustadas ou determinadas de acordo com o contrato de afretamento, bem como despesas que o segurado venha a pagar ao transportador em caso de “colisão por ambos os culpados”, constante do contrato de afretamento.

No entanto, no transporte terrestre, as garantias oferecidas por essa cláu-sula “C” são de danos ou perdas causados por sinistro relacionados ou decor-rentes de tombamento ou descarrilamento de veículos terrestres, capotagem, colisão, incêndio, raio ou explosão. Por sua vez, no transporte aéreo, estão co-bertos por essa cláusula todos os prejuízos causados por queda ou aterrissagem forçada da aeronave, colisão, incêndio, raio e explosão.

2.13 cObertura básica restrita “b”Esta cobertura “B” cobre as mesmas perdas e danos relacionados na co-

bertura restrita “C”, acrescidos de algumas garantias, como: inundação, des-moronamento ou queda de pedras e/ou terras, terremotos e erupção vulcânica, transbordamento de cursos d’água, represas, lagos ou lagoas durante a viagem terrestre, entrada de água do mar na embarcação ou no navio ou local de arma-zenagem. Como na cobertura anterior, esta também não cobre roubo37.

37 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/download/menubiblioteca/SegRCOTMC.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2017.

Page 64: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

64 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

2.14 cObertura básica ampla “a”Esta é a mais abrangente das coberturas básicas e diferencia-se das outras

duas (restrita “B” e restrita “C”) porque garante todos os riscos e perdas ou dano material sofridos pelo objeto segurado, em consequência de quaisquer causas externas, salvo os riscos não cobertos, enquanto as cláusulas restritivas “C” e “B” cobrem apenas riscos decorrentes do transporte.

Devido à abrangência da cobertura declarada por essa cláusula, algumas restrições relacionadas às mercadorias específicas são adicionadas.

2.15 cOberturas adiciOnais e especíFicas

As coberturas adicionais estão ligadas à operacionalidade do seguro, re-gularizando ou estabelecendo os critérios das normas constantes das condições gerais e têm o objetivo de completar as coberturas básicas, mediante pagamen-to de prêmio adicional, incluindo outros riscos não cobertos ou que estejam ex-cluídos da apólice, quais sejam: cobertura adicional de frete e seguro, despesas, tributos, lucros esperados, risco de greve, prorrogação de prazo de duração de risco e adicional de roubo.

Por sua vez, as cláusulas específicas são usadas devido às particulari-dades de algumas situações que não se encontram inteiramente atendidas nas coberturas básicas e nem pelas coberturas adicionais. Assim, temos cláusula específica para bens usados, para embarque ao convés do navio, franquia para o seguro de transporte internacional e para mercadorias transportadas em con-têineres padrão ISO.

2.16 critériOs de taxaçãO

As coberturas básicas têm suas taxas previamente definidas – de acordo com o art. 2º da Circular Susep nº 354, de 30 de novembro de 200738. Assim como as coberturas básicas têm suas respectivas taxas proporcionais a cada meio de transporte, existe ainda uma infinidade de variáveis que podem agravar ou reduzir o preço do seguro e cada uma delas tem suas taxas correspondentes, como tipo de mercadoria, embalagem, origem e destino da viagem, coberturas adicionais, coberturas específicas.

2.17 impOrtância segurada (is) Ou limite máximO de garantia (lmg)É o valor máximo fixado na apólice, que a seguradora assumirá como

garantia, em cada viagem de um mesmo meio de transporte ou por acumulação de bens e/ou mercadorias39.

38 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/textos/circ354.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2017.39 SUSEP. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/textos/circ354.pdf>. Acesso em: 16. jun. 2017.

Page 65: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������65

2.18 liquidaçãO Ou pagamentO da indenizaçãO

É a etapa final de um processo de sinistro e consiste no pagamento da indenização ao segurado.

No contexto deste trabalho, ultrapassada esta etapa de termos técnicos securitários e regras contratuais do seguro de transporte com suas peculiarida-des, passaremos ao Capítulo 3, que trata do tema regulação de avarias simples, sendo este assunto a parte mais relevante no ramo de seguros de qualquer espé-cie. Ao final, apresentaremos casos práticos.

CAPÍTULO 3: REGULAÇÃO DE AVARIA SIMPLES OU PARTICULAR

3.1 regulaçãO de avaria

É abrangente e tem respaldo nos arts. 149, 707 e seguintes do CPC, que equipara o regulador de avarias ao perito auxiliar da justiça, além de usos e costumes há mais de 4.500 anos.

A regulação está definida, dentre outras legislações: as responsabilidades e indenizações pelos danos nos arts. 186, 187, 188, 402, 927 a 944 do Código Civil; da Lei nº 11.442/2007; do art. 5º da CF/1988; do Decreto-Lei nº 73/1966; do Decreto-Lei nº 37/1966; do Decreto nº 116/1967; do Decreto Aduaneiro nº 6.759/2009; do Decreto nº 4.543/2002; do Decreto nº 4.765/2003, da Lei dos Portos nº 12.815/2013, assim como a segunda parte do Código Comercial.

A regulação faz parte das Regras de York e Antuérpia, de 2016, das Ins-truções Normativas da Receita Federal, das Resoluções e Circulares da Susep e de regulamentos de cada caso concreto.

A regulação de avarias determina a responsabilidade pelas avarias, tipo de dano e extensão do prejuízo. O regulador pode ser penalizado judicialmente se não agir corretamente. Assim, tem a missão de coordenar e orientar o cliente em um processo administrativo de regulação de avarias e sinistros, semelhante à de um inquérito policial particular de avarias/danos/prejuízos, na busca pela verdade fática e análise contratual, pericial, laboratorial e jurídica, de forma imparcial.

A regulação trata de casos com seguro e sem seguro envolvido no aci-dente, e pode determinar, inclusive, a diferença do que não foi indenizado pela sociedade seguradora, após análise da apólice caso aja seguro, como os prejuízos não indenizáveis, por exemplo, impostos, despesas extras de frete, carga e descarga, estadia de motorista, lucro cessante ou esperado, sobrestadia de contêiner, demurrage etc., ou também resolver a cobertura técnica declinada (sinistro negado). Pode obter, assim, provas robustas e inequívocas da respon-

Page 66: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

66 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

sabilidade do causador do dano e da sociedade seguradora, o que demonstra a importância da regulação.

Ademais, por meio da regulação deve-se conseguir administrativamen-te a indenização junto à companhia seguradora, que mantém departamento especializado, ou diretamente de quem causou o dano, como os armadores e operadores portuários, que também possuem departamentos de avarias/danos especializados, o que é desconhecido pelos segurados, importadores, exporta-dores, transportadores.

3.2 prOtestO – ressalva – termO de Falta e avaria (tFa) Quando sua carga, embalagem ou contêiner apresentar um TFA – termo

de falta e avarias em zona alfandegada ou não, ou tiver qualquer indício de avarias, o segurado deverá avisar a seguradora imediatamente, e toda a cadeia logística deverá ser protestada, sob pena de perda de direito à indenização con-forme as Condições Gerais do Seguro Transporte – itens XVI, XXII, XXIV40.

A maioria das negativas de sinistros se dá por falta de ressalva/remarque no conhecimento rodoviário ou marítimo (B/L) Bill of Lading, ou documento equivalente. Evita-se o prejuízo quando se registra a ressalva/remarque ou se emita o competente protesto que tem o mesmo peso, e deve ser feito imedia-tamente quando detectado o dano, conforme descrito no Decreto Aduaneiro nº 4.543/2002, arts. 592 e 59341, que não foi alterado pelo Decreto nº 6.759, de 2009.

O prazo para protesto é de 10 dias, conforme o art. 754 do Código Civil, Lei nº 10.406/2002, quando o dano for oculto, como, por exemplo, uma carga dentro de um contêiner lacrado, ou caixa fechada.

O protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos. Os efeitos desse protesto podem constituir o devedor em mora, garantir o direito de regresso e interromper a prescrição, conforme o art. 202, I e II, do Código Civil, que revogou a Súmula nº 153 do STF. Ou seja, é um título de antecipação pelas avarias e/ou indícios de violação ocasionados às mercadorias. Importante frisar que os arts. 867 a 873 do novo CPC disciplinam os casos de protestos cautelares.

Pode ser feito até mesmo num papel de pão que terá a mesma validade. Para que surtam seus efeitos legais, deve ser coletado protocolo com assinatura, ou enviado por carta registrada ou Sedex, com aviso de retorno (AR), telegrama

40 COMMANDULLI, José Flavio. Cadernos de Seguro, ENS-Funenseg, a. XXXII, n. 172, p. 29, 2012.41 COMMANDULLI, José Flávio. Op. cit., p. 30-32.

Page 67: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������67

normal ou fonado, por via de cartório de títulos e documentos, reforçado por e-mail.

3.3 regulaçãO de avarias e sinistrOs

Deve-se fazer o trabalho completo ou destacar profissional habilitado para execução das seguintes atividades que irão embasar o relatório com provas consistentes, para o deleite dos advogados, em conformidade com as normas técnicas e legislação:

a) Prova pericial;

b) Exames laboratoriais;

c) Protestos & protocolos;

d) Coleta de documentos indispensáveis para o processo como os TFAs;

e) Convocação e gerenciamento de vistoria de diversas espécies, tais como:

i) vistoria preliminar – prévia;

ii) vistoria de prevenção de danos;

iii) vistoria de acompanhamento ou monitoramento de carga e des-carga;

iv) vistoria de avaliação/fixação de danos/prejuízo;

v) vistoria de responsabilização;

vi) vistoria aduaneira ou oficial (Revogada pela Lei nº 12.350/2010);

vii) vistoria particular conjunta;

viii) vistoria judicial;

ix) vistoria administrativa;

x) vistoria de acidentes da navegação – avaria grossa42 etc.

a) Parecer técnico e jurídico;

b) Análise de cobertura securitária;

c) Orientar notificação extrajudicial;

d) Sindicância e/ou auditoria;

e) Enfim, todos os itens que são pertinentes ao deslinde do caso.

42 ALONSO, Antônio. Técnicas e prática de vistorias. Rio de Janeiro: Funenseg, 2005. p. 15.

Page 68: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

68 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Para melhor compreensão sobre o tema, destacamos a importância das vistorias.

3.4 das vistOrias, e dO laudO de vistOria particular

Entende-se como vistoria o exame realizado em mercadorias ou bens como, por exemplo, o navio, o contêiner e a carga, com o objetivo de estabe-lecer o estado, as características e condições em que se encontram para contra-tação do seguro; ou determinar, em caso de sinistro ou evento danoso, faltas e danos, sua origem, causa e natureza e se foi no transporte, vicio de origem – má peação/amarração, se é vício próprio da mercadoria etc., para, assim, apurar a extensão de perdas e o consequente valor dos prejuízos, além de determinar as bases da responsabilidade pelas perdas. Os laudos de vistorias são necessários para que os interessados determinem o futuro ressarcimento se for o caso.

A avaria simples ou particular pode ocorrer em qualquer modal de trans-porte, e o transportador recorre à sua seguradora para a cobertura dos seus da-nos. Se houver qualquer tipo de dúvida, competirá ao regulador de avarias que representa o prejudicado, normalmente o segurado, ou importador/exportador, o estudo mais complexo, sensível e importante a ser feito em todo o caso con-creto, orientando ao seu cliente sobre a importância dela e urgência de indicar conjuntamente com o comissário ou perito expert na parte obscura da causa dos danos.

Por exemplo: pode-se citar perícia nos lacres, contêineres ou na merca-doria. Salienta-se, porém, que o comissário de avarias com registro na Fenseg – Federação Nacional de Seguros Gerais defende os interesses da seguradora, o surveyor defende os interesses dos armadores/transportadores através do P&I Club – Clube de Proteção e Indenização, seguro este dos armadores.

Assim, estes jamais defendem os interesses do segurado lesado na co-missão de vistoria que será instalada, onde geralmente não tem representante e deve contratar um regulador particular para representá-lo, ou aceitará a decisão da comissão, mesmo após negativa do sinistro, pois ninguém faz provas contra si, por isso o pouco uso deste dispositivo – vistoria particular conjunta – pelas sociedades seguradoras.

Sobre o tema, Correa Filho destaca:É o ponto básico para os trabalhos dos árbitros reguladores e lhes permitirá en-quadrar o sinistro em face da cobertura do seguro. Às vezes é muito difícil essa definição, competindo ao representante da seguradora proceder às diligências necessárias para a causa da avaria seja definida. Caberá ao regulador decidir so-bre as dúvidas, se existirem, baseados nas evidências colhidas, ou, se for o caso, providenciar novas diligências. O árbitro poderá, para isso, recorrer à consulta neutra de pessoal especializado.43

43 CORRÊA FILHO, Olavo Caetano. Avaria grossa de navio. São Paulo: Esplanada, 2001. p. 28.

Page 69: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������69

Após, o representante da seguradora ou regulador deve também elaborar seu laudo de regulação de avaria, com rapidez, para minimizar os danos. Assim:

[...] enquanto as evidências permanecem em condições de indicar as causas da avaria. A tônica dos laudos deve ser a clareza e a simplicidade; conter registros factuais e incluir, especialmente a extensão e a causa da avaria.44

Portanto, devem ser evitadas expressões vagas e de difícil entendimento como ocorrem no Poder Judiciário, com infindáveis termos em latim, linguagem desnecessária.

Em seguida, com a posse da documentação complementar enviada pelo armador, transportador, segurado, segurador, importador, exportador, o regu-lador de avaria particular ou comissário representante da seguradora deverá analisar as evidências do sinistro à luz dos termos e condições do seguro reali-zado. Geralmente novas evidências e/ou informações esclarecedoras, tanto do armador como do representante da seguradora, além de, em muitos casos, de outras fontes ligadas às avarias, aos seus reparos, ao navio, ao frete, à carga etc.

Aquele concluirá, assim, o relatório de regulação com base em todos os elementos fáticos e documentos, onde poderão ser cobrados os danos direta-mente do causador, ou responsável pela indenização por meio de seus departa-mentos especializados, ou via mediação e arbitragem por árbitro especialista e, por fim, pela via judicial, com provas robustas, se necessário.

3.5 casOs práticOs

A fim de melhor compreensão do tema, demonstraremos, a seguir, dois casos práticos de regulação de avarias simples ou particular, dentre os vários em que atuamos, há mais de trinta anos, envolvendo o comércio exterior e cargas no transporte marítimo internacional, nos quais obtivemos êxito como regulador de avaria.

3.5.1 Caso 1 – Furto de lingotes de alumínio importados da China

Um cliente de Santa Catarina importou da China 50.000kg de lingotes de alumínio para utilizar em sua fábrica. Ele nada ficou sabendo de anormalidade no percurso, mas, para seu desespero, após pagar todos os valores e impostos, algo em torno de U$ 200 mil, ao abrir o primeiro contêiner, constatou tratar-se de lajotas de meio-fio.

De imediato, fomos acionados e orientamos a não mexer no lote de duas unidades e a fazer o aviso de sinistro para a sociedade seguradora, além de emitir os protestos para toda a cadeia logística, exportador, transportadores ma-

44 Idem, ibidem.

Page 70: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

70 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

rítimo e rodoviário, zonas portuárias e intervenientes. Após convocação para vistoria preliminar, três dias depois, realizamos a primeira vistoria e coleta de documentos.

Solicitamos a presença de um policial por ter fé pública na quebra do la-cre e abertura do segundo contêiner, onde o mesmo fato ficou constatado – des-vio da carga. Percebemos que no interior havia um alicate, arame, e as lajotas estavam úmidas (fabricação recente e cheiro de amônia), com gotículas de suor no teto dos contêineres, o que nos levou a entender que não fazia muito tempo que o furto teria ocorrido, pois uma carga com 70 dias dentro de uma unidade Dry Box 40 pés não seria normal.

Para maior aflição do segurado, a sociedade seguradora, em 5 dias, por meio de seu corretor de seguros, enviou e-mail e negou/declinou da cobertura técnica do furto da carga, alegando vício de origem (lacres originais intactos), pois os contêineres estavam com os lacres originais, segundo o relatório do co-missário de avarias que representou a cia. de seguros.

Diante disso, foi acionada a Polícia Federal, que instaurou inquérito para apurar os crimes, de modo que solicitamos perícia técnica nos contêineres, nos lacres e na carga. Convocamos vistoria particular conjunta para toda a cadeia logística envolvida e fizemos notificação extrajudicial para a seguradora, que mandou representante e corretora de seguros.

Constatamos que a carga havia passado por dois portos na China e por três portos no Brasil. Localizamos os TFA – termo de falta e avarias, mas nada constava sobre diferença de peso; no entanto, na perícia ficou constatada a di-vergência para menos de 7 mil kg, para as duas unidades, número significante sem registro nos terminais e embarcação, sendo que eles ficaram 3 dias em um terminal portuário em Santos para o transbordo de navio.

Por incrível que pareça, na perícia, os peritos, após retirarem toda a carga para medição, pesagem e análise laboratorial das unidades, localizaram ras-treador dos contêineres, pacote de pão com endereço de Santos, cartão de visita de Santos, arame e alicate.

Com a conclusão inequívoca do laudo de perícia técnica criminal fe-deral, constatou-se tratar-se de furto da carga em solo brasileiro, pois os lacres apresentaram ter sidos abertos (violados) por uso do sistema antispinning (trava de rotação), que é aberto por uma furadeira em alta rotação chamada spinning, permitindo abertura das buchas dos pinos abrindo os lacres, que estavam danifi-cados (perícia tipo balística) e colados novamente para ter aparência de normal.

Determinaram que os meios-fios de concreto foram produzidos bem pró-ximos da data em que os contêineres estavam em Santos. Após novas pesquisas, o porto final nos apresentou declaração assumindo a divergência de peso. A última vistoria particular conjunta, assinada por todos os presentes, inclusive o

Page 71: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������71

representante da seguradora, e com provas robustas, não restou dúvidas de que o segurado teve reconhecido o direito ao recebimento do seguro de importação e dos danos não inclusos, sendo responsabilizados o armador e o terminal por-tuário final pela comissão de vistoria particular conjunta.

Pela demora da seguradora em fazer o pagamento, após apresentado todo o relatório de regulação de avarias com quase 500 páginas, acionamos a Susep e, mesmo assim, o segurado conseguiu receber o seguro da mercadoria somente um ano e dois meses depois, sem qualquer justificativa da seguradora ou da Susep.

Como o segurado/importador recebeu somente a importância segurada (IS) contratada em apólice, sem impostos, lucros cessantes, despesas com so-brestadia dos contêineres, demurrage, frete etc. Para esse caso, foi aberto pro-cesso judicial contra os prováveis causadores dos prejuízos, na qual ainda não houve decisão.

3.5.2 Caso 2 – Avaria de vidros especiais importados da Espanha

Trata-se de uma empresa de engenharia, a cargo do governo do Estado do Mato Grosso do Sul, que importou o maior aquário de água doce do mundo em diversas peças individuais. Num lote de vidros especiais triangulares de cobertura do aquário de grande porte, vindo da Espanha, infelizmente houve avaria nos vidros, transportados em 4 contêineres de 40 pés open-top.

A carga chegou quebrada com prejuízo avaliado em U$ 700 mil e, ao tentar acionar uma seguradora, constatou que não havia seguro, embora tenha pago pela garantia. Em regulação de avarias, de imediato, orientamos a fazer os devidos protestos e a não liberar os caminhões até as vistorias serem realizadas.

Formalizamos convocação para vistoria particular conjunta com o prazo mínimo de antecedência de 48 horas, como de praxe, convocando os transpor-tadores marítimo e rodoviário, operador portuário, exportador da carga, despa-chante aduaneiro e agência de obras do estado.

Com a posse da documentação completa, constatamos que o exportador recebeu pelo seguro da carga e não providenciou o pagamento, além da exis-tência de TFA – termo de falta e avarias de um terminal portuário de Santos que acusava os danos.

Na vistoria particular conjunta, ficou demonstrado, pela comissão, que os lacres estavam intactos e que a carga de vidro triangular estava com 2 metros e 70 centímetros de altura, enquanto o contêiner tinha apenas 2 metros e 55 centímetros, demonstrando altura superior incompatível entre 11 a 15 centíme-tros em média nas unidades.

Page 72: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

72 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

No exportador – diga-se origem –, foi necessário cortar parte das caixas de madeira para entrar a mercadoria onde ficava a ponta dos vidros para fora delas, deixando exposto também fora da unidade de contêiner open-top, que, por sua vez, rasgou a lona na movimentação por fricção, danificando a carga.

Ao abrir os contêineres, constatamos também que a carga estava mal embalada e solta dentro das caixas de madeira tipo estrado, sendo muito fraca para o peso da carga. Por fim, verificamos que as caixas vieram soltas dentro das unidades, demonstrando claramente a falta de amarração.

Desta forma, a comissão julgou que, nesse caso, houve o vício de origem no exportador com a falta de peação/amarração da carga e embalagem inade-quada. Nota-se que, mesmo que houvesse seguro da carga, seria declinado/negado o sinistro nessas condições pela sociedade seguradora, com razão.

Foi registrada, também, em ata, a responsabilidade do exportador, tendo em vista que a compra da carga se deu via Incoterms 2011 DDP, em que o ex-portador deveria fazer seguro da carga, mas não o fez, além de também entregar a carga no destinatário final sem avarias.

Ademais, verificou-se, por fim, que a compra conforme invoice foi dos vidros colocados, ou seja, como poderiam ser colocados? Após notificar extra-judicialmente o exportador sobre sua responsabilização, em ata, e embora não tenha comparecido nas vistorias, ele assumiu o prejuízo e, em menos de 30 dias, foi formalizado acordo com o importador.

CONCLUSÃO

Concluímos este trabalho enfatizando a importância da regulação de avarias em nível mundial; todavia, embora há milênios seja utilizada com efi-cácia, é ainda uma atividade desconhecida no Brasil, infelizmente, causando sofrimento e perdas desnecessárias.

Embora a navegação marítima esteja mais segura, com grandes carguei-ros e em conjunto com os portos em grande escala de atracação/desatracação, ambos altamente equipados e com tecnologias de última geração, ainda assim ocorrem muitos sinistros/avarias, e os conflitos de interesses são inevitáveis.

Assim, grandes acidentes são sanados principalmente pela via adminis-trativa. Dessa forma, as grandes corporações mantêm departamentos especiali-zados, justamente para que seus clientes estejam amparados por seu segurador e/ou causador do dano, tendo em vista que, no Brasil, 95% das importações/exportações são pela via marítima, e há o interesse em manter a boa ordem nas movimentações.

Page 73: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������73

REFERÊNCIASALONSO, Antônio. Técnicas e prática de vistorias. Rio de Janeiro: ENS-Funenseg, 2005.

BANCO Central do Brasil. CNSP. Disponível em: <www.bcb.gov.br/pre/composicao/cnsp-asp>. Acesso em: 11 abr. 2017.

CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de (Org.). Direito marítimo: made in Brasil. São Paulo: Lex, 2007.

CAMPOS, João Vicente. Da avaria particular no direito nacional e internacional. Rio de Janeiro: Forense, 1954.

COMMANDULLI, José Flavio. Cadernos de Seguro, ENS-Funenseg, a. XXXII, n. 172, p. 29-32, 2012.

CONSELHO Nacional de Seguros Privados. Disponível em: <http://cnseg.org.br/cnseg/mercado/estrutura/sistemas-nacionais/>. Acesso em: 27 jun. 2017.

CORRÊA FILHO, Olavo Caetano. Avaria grossa de navio. São Paulo: Esplanada, 2001.

DELOITTE. Circular Susep nº 354. Disponível em: <http://www.deloitte.com.br/publicacoes/2007all/122007/Susep/cir354.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 1995.

ESTATUTO Companhia Boa Fé. Disponível em: <file:///C:/Users/recep1/Downloads/chy_estatuto_-_companhia_de_seguros_boa-fe.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.

GILBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

GOMES, Daniel. Acidentes e fatos da navegação marítima. Disponível em: <http://tri-mearbi.blogspot.com.br/p/avaria.html>. Acesso em: 27 maio 2017.

HOLANDA, Aurélio Buarque de. Dicionário Aurélio. Disponível em: <https://diciona-riodoaurelio.com/avaria>. Acesso em: 29 abr. 2017.

MARTINS, Eliane Maria Octaviano. Curso de direito marítimo. Barueri: Manole, v. II, 2008.

MINISTÉRIO DA FAZENDA. CNSP – Resolução nº 12/1988. Disponível em: <www.fazenda.gov.br/cnsp>. Acesso em: 27 jun. 2017.

NASCIMENTO, Luiz Coelho. História do seguro no mundo. Disponível em: <http://www.edronline.com.br/seg_mundo.php>. Acesso em: 27 jun. 2017.

PETERSON, Eugene H. Bíblia em linguagem contemporânea. São Paulo: Vida, 2011.

PLANALTO. Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966. Disponível em: <www.plnalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del/0073.htm>. Acesso em: 27 jun. 2017.

______. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L0556-1850.htmCompilado.htm>. Acesso em: 27 jun. 2017.

PORTO GENTE. Disponível em: <https://portogente.com.br/portopedia/72900-seguro--maritimo-transportes>. Acesso em: 27 jun. 2017.

RIPERT, Georges. Compendio de derecho martitimo. Buenos Aires: Tipografia Editora Argentina (TEA), 1954.

SARACENI, Pedro Paulo. Transporte marítimo de petróleo e derivados. Rio de Janeiro: Interciência, 2006.

Page 74: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

74 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

SANTOS, Theofilo de Azeredo. Direito da navegação (marítima e aérea). Rio de Janeiro: Forense, 1964.SIQUEIRA, Alexis Cavicchini Teixeira de. A história dos seguros no Brasil – 1808-2008. COP, 2008.SILVA, Sarah Elizabeth Nunes. Avaria grossa e as regras de York e Antuérpia. Disponí-vel em: <https://www.univali.br/Lists/TrabalhosGraduacao/Attachments/848/sarah.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017.SUSEP. CNSP nº 12, de 1988. Disponível em: <http://www2.susep.gov.br/biblioteca -web/docOriginal.aspx?tipo=1&codigo=17499>. Acesso em: 27 jun. 2017.______. Circular nº 354, de 30 de novembro de 2009. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/textos/circ354.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017. ______. Condições gerais do seguro de transporte. Disponível em: <http://www.susep.gov.br/download/menubiblioteca/SegRC>. Acesso em: 27 jun. 2017.SUA PESQUISA.COM. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/historiadobrasil/vinda_familia_real.htm>. Acesso em: 24 jun. 2017.VARANDA, José Antonio Menezes. Conceitos básicos de seguro. Rio de Janeiro: ENS-Funenseg, 2005.

Page 75: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Assunto Especial – Doutrina

Seguro Marítimo

O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Marítimos nas Ações de Regresso

VOLTAIRE MARENSIAdvogado Sócio da Franco Advogados em Brasília, foi professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na Universidade de Brasília (UNB), na Centro Universitário de Brasília (CEUB) e na Escola Superior do Ministério Público (ESMP). Foi Consultor Jurídico no Ministério da Justiça, quando era titular o Ministro Paulo Brossard de Souza Pinto. Posterior-mente, exerceu sua atividade profissional no Superior Tribunal de Justiça, na qualidade de assessor do Ministro Athos Gusmão Carneiro. Doutrinador com livros publicados nas áreas de Seguros e Previdência Complementar. É membro efetivo do Instituto dos Advogados no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal. Também é membro da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP).

LEATRICE MENDONçA BEZ DE OLIVEIRA GOMESAdvogada Sócia da Franco Advogados em Florianópolis, com formação em Gestão de Opera-ções Portuárias. Presta assessoria de informações jurídicas na Procuradoria-Geral do Estado desde 2007, é membro da Comissão de Direito Portuário e Marítimo da OAB/SC e já presidiu a Comissão de Estudos Jurídicos e Legislativos da OAB/SC.

RESUMO: Este artigo visa a abordar a importância do contrato de seguro marítimo bem elaborado em consonância com as normas regulamentadoras, observada a prescrição nas ações de regresso.

PALAVRAS-CHAVE: Seguro; Seguro Marítimo; Prescrição; Direito de Regresso.

ABSTRACT: This article aims to address the importance of the well-prepared maritime insurance contract in line with regulatory standards, subject to prescription in return actions.

KEYWORDS: Insurance. Maritime Insurance. Prescription. Right of set off.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Operações securitárias marítimas; 2 Entidades regulatórias; 3 Espécies de seguros marítimos; 4 Prescrição na ação de regresso; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Considerando que o desenvolvimento da economia mundial tem evo-luído diretamente por meio das relações comerciais pelo transporte marítimo,

Page 76: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

76 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

torna-se recorrente a necessidade de regulamentação dos institutos, principal-mente no que tange à elaboração dos contratos de seguros.

Da mesma forma que o armador deseja que o navio esteja assegurado, o exportador e importador desejam pela mercadoria, além das instituições finan-ceiras pela segurança do crédito.

Com isso, as operações securitárias marítimas cresceram tornando-se empreendimentos de grande porte, que implicam uma série de organizações complexas com muito capital envolvido.

No Brasil, o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) estabelece as normas, e a Superintendência de Seguros Privados (Susep) responsabiliza-se pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro.

Além disso, numa expedição marítima há basicamente três tipos de segu-ros: o P&I Club, o seguro de casco e máquinas e o seguro de cargas, que serão conceituados neste artigo.

Ocorre que algumas situações de risco são de terceiros, cabendo o in-gresso da ação de regresso para se ressarcir do valor pago ao segurado.

Nessa seara, serão abordados os aspectos do prazo prescricional para o direito de regresso das seguradoras.

1 OPERAÇÕES SECURITÁRIAS MARÍTIMAS

O Código Comercial Brasileiro de 1850 regulamenta parte do direito ma-rítimo e, especificamente no Título VIII, dispõe tratamento sobre os seguros marítimos.

Nesse aspecto, dispensando grandes comentários acerca da revogação parcial do Código Comercial – por não ser o foco do presente artigo –, mas apenas para fins de registro, salienta-se que tramita, no Congresso Nacional, o PL 1.572, de 2011, para revogação do antigo e elaboração de um novo Código Comercial.

Sobre os contratos de seguros, o art. 757 do Código Civil vigente estabe-lece que é aquele pelo qual o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.

Sobre o contrato de seguro marítimo, está disciplinada a conceituação no Código Comercial no artigo 666, a saber:

O contrato de seguro marítimo, pelo qual o segurador, tomando sobre si a for-tuna e riscos do mar, se obriga a indenizar ao segurado da perda ou dano que possa sobrevir ao objeto do seguro, mediante um prêmio ou soma determinada, equivalente ao risco tomado, só pode provar-se por escrito, a cujo instrumento

Page 77: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������77

se chama apólice; contudo julga-se subsistente para obrigar reciprocamente ao segurador e ao segurado desde o momento em que as partes se convierem, as-sinando ambas a minuta, a qual deve conter todas as declarações, cláusulas e condições da apólice.

Portanto, o seguro marítimo possui a natureza jurídica de um contrato comercial, sendo de adesão, bilateral, consensual e oneroso, em que há interes-se do segurado, o risco, a estipulação do prêmio e a promessa de indenização.

De antemão, destacamos que, para obter a licença do transporte marí-timo, é necessário que se adquira o DPEM, que se trata de seguro obrigatório de danos pessoais causados por embarcações ou cargas, normatizado pela Lei nº 8.374/1991. Caso o proprietário não contrate o seguro DPEM, não obterá o licenciamento, acarretando-lhe inúmeras consequências, além da multa.

No entanto, embora a contratação seja obrigatória, a Susep informou re-centemente que não há seguradora que ofereça a DPEM e, por essa razão, não pode cobrar nas fiscalizações e registros de embarcações, estando a cobrança atualmente suspensa pela Circular nº 4/2016 da Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha do Brasil.

Ainda, sobre o contrato de seguros, como visto, o risco faz parte da ope-ração e, sobre essa temática, Sampaio de Lacerda destaca

que os riscos ditos marítimos não são somente aqueles que acontecem no mar, mas os que ocorrem por conta de uma expedição marítima, ou melhor, os que têm origem nos riscos do mar. Pode-se, inclusive considerar como risco marítimo aquele ocorrido em terra. À guisa de ilustração, cite-se o exemplo de mercadorias que, devido a acidente marítimo, são desembarcadas enquanto o navio que as transportava é reparado e, neste interregno, são furtadas ou avariadas.

Portanto, o contrato de seguro abrange toda a disciplina que envolve uma expedição marítima, seja no mar ou em terra, dadas as suas peculiaridades.

2 ENTIDADES REGULATÓRIAS

Com intuito de normatizar, regulamentar, controlar e fiscalizar as opera-ções de seguros é que se criou a Superintendência dos Seguros Privados – Susep e o Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP.

Enquanto o CNPS normatiza o mercado de seguros, a Susep controla e fiscaliza, e, ambos se acham vinculados ao Ministério da Fazenda.

A razão pela vinculação se dá pela afetação direta do mercado de segu-ros à economia do País, podendo restabelecer o equilíbrio econômico em casos de eventualidades.

Page 78: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

78 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

No próprio site do Ministério da Fazenda, é possível encontrar a respon-sabilidade do CNSP, a saber:

Fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados;

Regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exer-cem: atividades subordinadas ao Sistema Nacional de Seguros Privados, bem como a aplicação das penalidades previstas;

Fixar as características gerais dos contratos de seguros, previdência privada aber-ta e capitalização;

Estabelecer as diretrizes gerais das operações de resseguros;

Prescrever os critérios de constituição das Sociedades Seguradoras, de Previdên-cia Privada Aberta e de Capitalização, com fixação dos limites legais e técnicos das respectivas operações;

Disciplinar a corretagem do mercado e a profissão de corretor.

Por conseguinte, o CNSP define os padrões técnicos das operações e contratos para todas as ações de seguros no Brasil, sendo composto por repre-sentantes de variadas autarquias ligadas aos setores da economia e da socie-dade.

3 ESPÉCIES DE SEGUROS MARÍTIMOS

Numa expedição marítima, existem basicamente três tipos de seguros: o P&I Club, o seguro de casco e máquinas e o seguro de cargas.

O P&I Club aproxima-se muito ao mutualismo, sendo uma associação entre armadores e afretadores, sem fins lucrativos, pois recolhem os prêmios, os chamados calls, para um fundo específico que é gerenciado por meio dessas contribuições entre os membros.

Ao final de cada período, são calculados os gastos com as indenizações, retirando-se as despesas, aprovisionando um fundo de futuras indenizações, e, se houver sobra no caixa, pode retornar para os membros.

A criação do P&I deu-se pela necessidade de cobertura da totalidade do seguro casco, que cobria apenas 3/4 do prejuízo e, por essa razão, precisaria de maior segurança aos armadores.

A relação contratual entre o clubes e seus membros, além de mútua, costuma ter longa duração, divergindo da prática comum do seguro comercial, cuja renovação geralmente está condicionada ao oferecimento da melhor co-tação1.

1 P&I Clubs no mercado de seguros marítimos. Disponível em: <https://jota.info/artigos/os-pi-clubs-no-merca- -do-de-seguros-maritimos-17112015>.

Page 79: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������79

Já o seguro de cascos e máquinas é pertinente à indenização aos prejuí-zos da embarcação segurada envolvendo os cascos e máquinas (aparelhos e motores).

As coberturas deste seguro podem ser assim divididas: cobertura básica 1, para perda total, assistência de salvamento e avaria grossa; cobertura básica 2, que inclui todas as da cobertura 1 e responsabilidade civil por abalroação; e cobertura básica 3, que inclui todas as da cobertura 2 e a avaria particular.

Sobre o seguro de cargas, é a indenização de um dos incidentes que pode resultar em danos que envolvem as cargas, que podem ser divididas em simples, conhecida por particular e a avaria grossa, também denominada de avaria comum2.

As avarias são conceituadas no art. 761 do Código Comercial, como sen-do “todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, con-junta ou separadamente, e todos os danos acontecidos àquele ou a esta, desde o embarque e partida até a sua volta e desembarque, são reputadas avarias”.

A avaria particular de carga é aquela que atinge a carga de um particular afetando somente o dono da mercadoria, sendo por ele suportados os danos. Em contrapartida, a avaria grossa de mercadorias é aquela decorrente de um dano extraordinário intencional para evitar outro dano, visando à segurança do navio, sendo as despesas divididas entre os proprietários das cargas embar-cadas.

Sendo assim, o seguro que protege a carga contra os mais diversos tipos de riscos oferece coberturas básicas e adicionais, além de cláusulas específicas.

4 PRESCRIÇÃO NA AÇÃO DE REGRESSO

Como visto, o seguro é uma das formas de gerenciamento do risco na logística do transporte marítimo.

Em decorrência das inúmeras possibilidades de situações envolvidas nas operações marítimas envolvendo cargas, como furto ou roubo, avarias, conser-vação, extravio, atraso de entrega, entre outros, é que se torna necessário inves-tigar e delimitar a quem pertence a responsabilidade de indenizar.

Nesse caso, o conhecimento das regras por parte dos despachantes aduaneiros e segurados fará toda a diferença, podendo impactar significativa-mente na liquidação da indenização.

De outro giro, o segurado efetua o pagamento do prêmio que será inde-nizado pela seguradora em caso de ter o sinistro incluso na cobertura.

2 CREMONEZE, Paulo Henrique. Prática de direito marítimo – O contrato de transporte marítimo e a responsa-bilidade civil do transportador. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

Page 80: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

80 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Dessas operações surgem conflitos que podem ser discutidos pela media-ção e arbitragem na esfera extrajudicial e/ou no âmbito judicial, devendo, para tanto, ter o prazo prescricional observado.

Com o intuito de delimitar o lapso temporal para ajuizamento de ação de segurado e segurador, principalmente quanto à data do início da contagem da prescrição, é que o Código Civil incluiu dispositivo, com o acréscimo das alíneas a e b no inciso II do § 1º do art. 206.

A alínea a estabelece que, nos seguros de responsabilidade civil, o prazo inicia-se na data da citação para responder por ação de indenização proposta por terceiro prejudicado ou da data que for indenizado, com anuência do segu-rador, ao passo que na alínea b tem natureza residual, valendo ressaltar, ao azo, que os demais seguros têm o termo a quo contado da ciência do fato gerador da pretensão.

Na obra O seguro no Direito brasileiro, abordou-se a prescrição no seguro marítimo – tema, aliás, cuidado em sede de recurso especial, sob nº 29.904-8/RJ, no qual o eminente e saudoso Ministro Fontes de Alencar ressal-tou a “dicotomia que deve presidir o início da contagem do prazo prescricional nos seguros acobertados pelo Código Civil e regulados pelo Código Comercial”.

O prazo de um ano quanto à prescrição no direito marítimo contar-se-á do dia em que as obrigações forem exequíveis, pois continua a viger, vez que nessa modalidade não foi derrogado pelo novo Código Civil3.

Vindo ao encontro dessa linha de raciocínio nas ações de regresso foi que o STF editou a Súmula nº 151, que estabelece o prazo de um ano para a seguradora ajuizar ação de regresso contra o transportador, in verbis:

Prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga transportada por navio.

Sobre o termo inicial, o art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967 estabelece que “prescrevem ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador, as ações por extravio de carga, bem como as ações por falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga”.

No entanto, há posicionamentos distintos quanto ao tema, ao passo que, recentemente, em 17 de maio de 2017, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu na Apelação nº 10110573720138260068, sobre a prescrição na ação regressiva de seguro, a saber:

Prescrição. Ação regressiva de seguro. Mercadoria extraviada em transporte. Pres-crição ânua prevista no Código Civil de 2002 e na Lei de Transporte Multimodal que não se aplica ao caso. Prazo prescricional trienal, nos termos do art. 206,

3 MARENSI, Voltaire. O seguro no Direito brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 235/236.

Page 81: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������81

§ 3º, V, do Código Civil. Ademais, o prazo prescricional passa a fluir do dia em que a seguradora efetuou o pagamento do prêmio decorrente do contrato de se-guro. Prescrição afastada. Recurso provido. Ação regressiva. Transporte interna-cional marítimo. Improcedência. Extravio de mercadorias transportadas. Empresa ré responsável pelo transporte do contêiner lacrado. Desembarque do contêiner com avarias e sem lacre, conforme declaração de vistoria. Termo de avaria que é prova idônea para a responsabilização do transportador. Extravio das mercado-rias transportadas que causou prejuízos à importadora. Comprovação do paga-mento do prêmio devido decorrente do contrato de seguro. Direito de regresso reconhecido, já que a seguradora se sub-rogou nos direito de sua segurada. Ação julgada procedente. Inversão do ônus de sucumbência. Sentença reformada. Re-curso da autora provido, ficando prejudicado o recurso da ré.

No Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1169418/RJ, de 2014, o Ministro Relator Ricardo Villas Bôas Cueva asseverou que o STJ

Já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamento da indenização ao segu-rado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à rela-ção jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado. 2. No caso de não se averiguar a relação de consumo no contrato de transporte firmado, já decidiu esta Corte Superior que é de 1 (um) ano o prazo prescricional para propositura de ação de segurador sub-rogado requerer da transportadora o ressarcimento pela perda da carga. Precedentes.

Nesse sentido, o STJ decidiu, em novembro de 2016, no REsp 1297.362, que o início do prazo de prescrição para que uma seguradora possa ajuizar ação de regresso contra a transportadora para se ressarcir do valor pago ao segurado por danos causados à mercadoria no decorrer do transporte marítimo é da data do pagamento da indenização, mantendo ainda o entendimento do estabelecido no Código Comercial, Súmula nº 151 do STF e art. 8º do Decreto--Lei nº 116/1967.

Portanto, pode-se concluir que, nas ações de regresso, cabem os dois prazos prescricionais: o trienal, conforme o art. 206, § 3º, V, do Código Civil, quando envolver relação de consumo, equiparando-se ao previsto para o segu-rado contra o causador do dano, se não houvesse contrato de seguro; e o de 1 (um) ano, com espeque na sobredita Súmula nº 151 do STF.

CONCLUSÃO

O contrato de seguro marítimo vem sendo alterado constantemente e conforme a necessidade das situações modificativas de risco.

Há de se levar em consideração que, embora já esteja tramitando no Congresso Nacional um projeto de lei que visa à elaboração de um novo Códi-

Page 82: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

82 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

go Comercial, para o direito marítimo continuam em vigência os dispositivos do diploma legal de 1850, por não ter sido derrogado pelo Código Civil de 2002.

As entidades intervenientes, como o CNSP e a Susep, são responsáveis pela normatização e fiscalização, respectivamente. A atuação efetiva desses ór-gãos vinculados ao Ministério da Fazenda faz com que o mercado de seguro esteja acompanhando e impactando diretamente a economia no Brasil.

O seguro marítimo envolve uma série de riscos que devem ser calculados para delimitar o pagamento do prêmio e da indenização. Nessa modalidade, diga-se à exaustão, há três espécies de seguros: o P&I Club, que se trata de uma associação sem fins lucrativos, visando à participação de todos os envolvidos; o seguro de cascos e máquinas, que inclui o casco do navio e aparelhos e mo-tores; e, por fim, o seguro de cargas, que pode se dar por avaria grossa quando envolve o navio, ou por avaria particular diretamente na carga individual.

As controvérsias e conflitos podem ser resolvidos primeiramente no âm-bito extrajudicial por meio da mediação e arbitragem. Contudo, se partir para a esfera judicial, deve ser observado o prazo prescricional nas ações de regresso das seguradoras.

Há posicionamentos e entendimentos divergentes; todavia, dada sua análise, podemos concluir, em síntese apertada, que, na existência de relação de consumo, o prazo prescricional nas ações de regresso é de 3 (três anos), como prescreve o art. 206, § 3º, V, do Código Civil, e, nas demais, aplica-se o parâmetro previsto na Súmula nº 151 do STF com cômputo anual, sendo que o prazo iniciar-se-á a partir do pagamento da indenização.

REFERÊNCIASBRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.______. Código Comercial. Lei nº 556, de 25 de junho de 1850.______. Circular nº 4/2016. Diretoria de Portos e Costas da Marinha do Brasil.CREMONEZE, Paulo Henrique. Prática de direito marítimo – O contrato de transporte marítimo e a responsabilidade civil do transportador. São Paulo: Quartier Latin, 2009.LACERDA, J. C. Sampaio de. Curso de direito comercial marítimo e aeronáutico. 5. ed. São Paulo: Livraria Freitas Bastos S.A, 1963.MARENSI, Voltaire. Seguro no Direito brasileiro. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009. P&I CLUBS no Mercado de Seguros Marítimos. Disponível em: <https://jota.info/artigos/os-pi-clubs-no-mercado-de-seguros-maritimos-17112015>.VIANNA, Selma de Moura Galdino. Quais as espécies de avarias no direito marítimo. Disponível em: <https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2096747/quais-as-especies-de--avarias-existentes-no-direito-maritimo-selma-de-moura-galdino-vianna>. Florianópolis/Brasília, 26 de junho de 2017.

Page 83: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Seguro Marítimo

2813

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.297.362 – SP (2011/0294875‑7)Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas CuevaRecorrente: Hamburg Sudamerkanische DampfschiffahrtsAdvogados: Osvaldo Sammarco e outro(s) – SP023067

Marcus Sammarco e outro(s) – SP139612Recorrido: Unibanco AGI Seguros S/AAdvogado: Márcio Roberto Gotas Moreira e outro(s) – SP178051Interes.: Atrade Forwarding Corp.Repr. por: Atrade Cargo do Brasil Ltda.

ementaRECURSO ESPECIAL – JUÍZO DE RETRATAÇÃO – RECURSO – NÃO CABIMENTO – TRANSPORTE MARÍTIMO DE MERCADORIA – PERDA TOTAL DO BEM SEGURADO – CULPA DO TRANSPORTADOR – AÇÃO DE REGRESSO – SEGURADORA – PRAZO PRESCRICIONAL ANUAL – SÚMULA Nº 151/STF – AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO – TERMO INICIAL – PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO

1. Apresenta-se desprovido de conteúdo decisório e, assim, insusceptível de causar gravame às partes, o ato que, em juízo de retratação, recon-sidera anterior pronunciamento e determina inclusão do feito em pauta, não autorizando, por conseguinte, a interposição de nenhum recurso.

2. Discute-se nos autos, em essência, o termo inicial do prazo prescricio-nal para que a seguradora, em ação regressiva, pleiteie o ressarcimento do valor pago ao segurado por danos causados à mercadoria no decorrer do transporte marítimo.

3. Ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em razão de danos causados por terceiros, a seguradora sub-roga-se nos direitos da-quele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurí-dica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado.

4. No caso de não se averiguar a relação de consumo, observa-se o prazo prescricional de 1 (um) ano para propositura de ação de segurador sub-

Page 84: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

84 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

-rogado requerer do transportador marítimo o ressarcimento por danos causados à carga, nos termos da Súmula nº 151/STF e do art. 8º, caput, do Decreto-Lei nº 116/1967.

5. O termo inicial do prazo prescricional para seguradora sub-rogada propor ação de regresso é a data do pagamento integral da indenização ao segurado. Precedentes.

6. Embargos de declaração de fls. 731/736 não conhecidos. Recurso es-pecial conhecido e não provido.

acórdãO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, decide a Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencido quanto à fundamentação o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze (Presidente). Participaram do julgamento os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro.

Brasília (DF), 10 de novembro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva – Relator

relatóriO

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto por Hamburg Südamerikanische Dampfschiffahrts, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Cons-tituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado:

“RESPONSABILIDADE CIVIL – Ação regressiva da seguradora. Transporte ma-rítimo internacional. Hipótese de perda da carga, por equívoco no ajuste da temperatura do container devidamente comprovado por vistoria. Culpa grave e exposição ao risco pelas transportadoras. Obrigação de indenizar caracterizada. Responsabilidade solidária. Pedido procedente. Recurso de apelação e agravo retido improvido” (fl. 1.023).

A recorrente alega violação do art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967 ao ar-gumento de que a prescrição a ser considerada no caso é a anual, a ser contada do desembarque da mercadoria no Porto de Santos. Aduz que a aplicação do

Page 85: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������85

prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor – CDC viola as disposições específicas sobre o transporte marítimo.

Sustenta a existência de divergência jurisprudencial no tocante ao acór-dão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro nos autos da Apelação Cível nº 0094803-89.2008.8.19.0001, Rel. Des. Marco Aurélio Bezerra de Melo, DJ de 26.01.2010.

Oferecidas as contrarrazões, o recurso foi admitido na origem.

Às fls. 700/701, negou-se seguimento ao recurso especial.

Ao examinar o agravo regimental interposto, em juízo de retratação, a decisão agravada foi reconsiderada para futura inclusão em pauta (fls. 726/728).

A ora recorrida opôs embargos de declaração (fls. 731/736).

É o relatório.

vOtO

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator):

1 DA ORIGEM

Para melhor compreensão da controvérsia, apresenta-se pertinente tecer breve histórico da demanda.

Os autos revelam que Unibanco AIG Seguros S.A. propôs a presente ação regressiva de ressarcimento contra Atrade Forwardin Corp. e a ora recorrente, Hamburg Südamerikanische Dampfschiffahrts, em que, na condição de segu-radora, alegou ser credora, por sub-rogação, da indenização paga à Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Embraer – em razão de perda total da carga transportada pelas rés (peças de aeronaves) entre os Portos de Miami, localizado nos Estados Unidos da América, e de Santos/SP, porquanto foi acondicionada sem a observância da temperatura contratada de –18ºC (dezoito graus centígra-dos negativos).

A sentença julgou procedente o pedido para condenar as rés solidaria-mente ao pagamento da importância de R$ 162.004,29 (cento e sessenta e dois mil e quatro reais e vinte e nove centavos), atualizados desde a data do paga-mento da indenização, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. A verba honorária foi fixada no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (fls. 558/568).

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento aos re-cursos de apelação interpostos pelas rés. Rejeitou a preliminar de prescrição,

Page 86: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

86 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

ventilada no agravo retido, e assentou ser devido o ressarcimento, porquanto a vistoria “constatou que a perda da carga se deu por equívoco no ajuste da tem-peratura dos containeres (18 graus, aos invés de 18 graus negativos)” (fl. 641).

2 DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS CONTRA O ATO qUE RECONSIDEROU DECISÃO E DETERMINOU A INCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA

De início, constitui ato desprovido de conteúdo decisório e, assim, in-susceptível de causar gravame às partes, o pronunciamento que, em juízo de retratação, reconsidera anterior decisão e determina inclusão do feito em pauta, não autorizando, por conseguinte, a interposição de nenhum recurso.

Embora cuidem de agravo regimental e de pedido de reconsideração, e não de embargos de declaração, os seguintes julgados corroboram a compreen-são exposta: Pet-REsp 1.280.261/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., Julgado em 18.03.2014, DJe de 04.04.2014; AgRg-AgRg-REsp 887.243/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., Julgado em 18.10.2007, DJ de 06.11.2007, e AgRg-AgRg-REsp 1.088.970/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 13.10.2009, DJe de 04.11.2009.

Desse modo, não se conhece dos embargos de declaração de fls. 731/736.

3 DO MÉRITO

Discute-se nos autos, em essência, o termo inicial de observância do prazo prescricional para que a seguradora, em ação regressiva, pleiteie o res-sarcimento do valor pago ao segurado por danos causados à mercadoria em transporte marítimo.

Segundo a recorrente, deveria ser observada da data do término da des-carga do navio transportador, qual seja, 19.12.2004, de modo que já teria ocor-rido integralmente o prazo prescricional de 1 (um) ano em 29.12.2005, data em que proposta a presente ação regressiva. Aponta divergência jurisprudencial quanto ao acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Ja-neiro nos autos da Apelação Cível nº 0094803-89.2008.8.19.0001, Rel. Des. Marco Aurélio Bezerra de Melo, DJ de 26.01.2010, que ostenta a seguinte ementa:

“DIREITO MARÍTIMO – CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO ENTRE PESSOAS JURÍDICAS EXERCENTES DE ATIVIDADE EMPRESARIAL DE LUCRO – MERCADORIAS AVARIADAS E AMASSADAS – INDENIZAÇÃO – AÇÃO RE-GRESSIVA INTENTADA PELA SEGURADORA – PRESCRIÇÃO ANUAL CONFI-GURADA – APLICAÇÃO DO ART. 8º DO DECRETO-LEI Nº 116/1967 – NÃO INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR – INEXISTÊNCIA DE VULNERABILIDADE TÉCNICA A JUSTIFICAR PROTEÇÃO ESPECIAL – HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA CORRETAMENTE FIXADOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS” (fl. 662).

Page 87: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������87

Como se sabe, constitui obrigação do transportador entregar as cargas confiadas contratualmente em perfeitas condições. Caso não o faça, caracteri-zada está a sua responsabilidade pelo contrato inadimplido.

Em se tratando de transportes, é comum a contratação de seguro desti-nado a proteger o interessado pelo risco inerente ao deslocamento das merca-dorias.

Nessa espécie de contrato, o segurador assume a responsabilidade pelas consequências do risco mediante o pagamento do prêmio, que corresponde à contraprestação do segurado.

Preceitua o art. 757 do Código Civil de 2002: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legí-timo do segurado, relativo à pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

Sobre o tema, colhe-se a doutrina de Pedro Alvim (O contrato de seguro. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 114):

“[...]

O segurador assume sua obrigação perante o segurado ou seu representante. Ninguém poderá fazê-lo em seu nome, se não estiver autorizado por lei ou por mandato. Caso contrário, o estipulante de seguro de vida poderia revertê-lo em seu benefício. Tal contrato perderia suas características de seguro para tornar-se um contrato de jogo ou aposta.

A prestação do segurador é a razão de ser do contrato. Constitui seu objeto. Corresponde aos efeitos econômicos do risco. Embora suportado pelo segurado, pode ele transferir, porém, por via do contrato, suas consequências financeiras ao segurador. É a indenização nos seguros de dano e a soma prevista no contrato dos seguros de pessoa. Consiste, geralmente, num pagamento em dinheiro, mas pode ser também sob a forma de reposição, como acontece nos seguros de au-tomóveis.”

Nesse contrato, ocorrido o sinistro e o pagamento da indenização pela seguradora, esta sub-roga-se no direito do segurado, oportunidade em que lhe são transferidos todos os direitos e ações assegurados em relação ao devedor principal.

É o que se depreende dos seguintes dispositivos do Código Civil de 2002:

“Art. 786. Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor res-pectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano.

§ 1º Salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consangüíneos ou afins.

§ 2º É ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo.”

Page 88: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

88 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Dispõe, a propósito, o Código Comercial de 1850:

“Art. 728. Pagando o segurador um dano acontecido à coisa segura, ficará sub--rogado em todos os direitos e ações que ao segurado competirem contra tercei-ro, e o segurado não pode praticar ato algum em prejuízo do direito adquirido dos seguradores.”

Sobre o tema, ainda, a Súmula nº 188/STF: “O segurador tem ação re-gressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro”.

Cabe ressaltar que sub-rogação é “a substituição de coisa ou pessoa por outra coisa ou pessoa, sobre que recaem as mesmas qualidades ou condições dispostas anteriormente em relação à coisa ou à pessoa substituída” (ALVIM, Pedro. O seguro e o Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 136).

Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado.

“RECURSO ESPECIAL – TRANSPORTE MARÍTIMO – ARMAZENAGEM DE MER-CADORIA – AÇÃO REGRESSIVA DE COBRANÇA DE SEGURADO CONTRA SEGURADORA – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – SUB-ROGAÇÃO – LIMITES

1. Ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, mas nos limites desses direitos, ou seja, a ‘sub-rogação não transfere à seguradora mais direitos do que aqueles que a segurada detinha no momento do pagamento da indenização’ (REsp 1.385.142).

Portanto, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, a seguradora sub-rogada pode buscar o ressarcimento do que despendeu com a indenização securitária.

2. Recurso especial conhecido e provido.”

(REsp 1.505.256/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., Julgado em 05.05.2016, DJe de 17.05.2016)

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – RESPON-SABILIDADE CIVIL – DESEMBARQUE E TRANSPORTE DE MERCADORIA EM PORTO – AVARIA – INDENIZAÇÃO – PAGAMENTO PELA SEGURADORA – SUB-ROGAÇÃO – AÇÃO DE REGRESSO – PRESCRIÇÃO – PRAZO TRIMESTRAL – INAPLICABILIDADE AO OPERADOR PORTUÁRIO – LIMITAÇÃO A EMPRESA DE ARMAZÉM-GERAL – PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE

1. A seguradora, após arcar com a indenização securitária, sub-roga-se nos direi-tos do segurado, inclusive no que tange ao prazo prescricional, para poder buscar o ressarcimento do que despendeu.

Page 89: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������89

2. Ante o princípio da especialidade, o prazo prescricional de três meses previsto no art. 11 do Decreto nº 1.102/1903 aplica-se somente às pretensões indeniza-tórias dirigidas contra empresas de armazéns-gerais ou contra armazéns-gerais alfandegados (art. 53 da Lei nº 5.025/1966).

3. O prazo de prescrição trimestral do art. 11 do Decreto nº 1.102/1903 não pode ser estendido para as ações de indenização ajuizadas contra o operador portuário, visto que as regras jurídicas sobre prescrição devem ser interpretadas estritamente, repelindo-se a exegese extensiva ou analógica.

[...]

5. Agravo regimental não provido.”

(AgRg-AREsp 121.152/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., Julgado em 15.12.2015, DJe de 03.02.2016)

“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – SEGURADORA – SUB-RO-GAÇÃO – TERMO A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL – DATA DO PAGA-MENTO – AGRAVO NÃO PROVIDO

1. A seguradora, ao ressarcir os prejuízos ocasionados pelo acidente, sub-roga-se nos direitos do segurado, podendo ajuizar ação contra o terceiro. a sub-rogação, entretanto, não restringe os direitos sub-rogados, de modo que o prazo prescri-cional a ser aplicado deve ser o mesmo previsto para o segurado.

2. Com efeito, ‘Esta Corte já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamen-to da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo pres-cricional aplicável à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado’ (AgRg-REsp 1169418/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., Julgado em 06.02.2014, DJe 14.02.2014).

3. Agravo regimental não provido.”

(AgRg-AREsp 598.619/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 05.02.2015, DJe de 10.02.2015)

Com efeito, ao honrar integralmente com o pagamento da indenização devida por força do contrato de seguro, a seguradora assume o lugar do seu cliente e, em consequência, os direitos violados pelo prejuízo causado ao bem segurado pela transportadora.

No tocante ao prazo prescricional aplicável ao caso em exame, cabe ressaltar, de início, que, a despeito das alegações da recorrente, o acórdão re-corrido em nenhum momento fez referência ao disposto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor – CDC a fim de manter a sentença.

Ademais, não há direito consumerista na hipótese, porquanto a relação originária versa sobre contrato de transporte de mercadoria firmado entre a

Page 90: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

90 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

transportadora e empresa industrial do ramo da aviação, de modo que devem ser observadas as legislações cíveis e comerciais de regência.

A matéria em debate foi decidida com fundamento no Decreto-Lei nº 116/1967, regulamentado pelo Decreto nº 64.387/1969, que, ao dispor so-bre as operações inerentes ao transporte de mercadorias por via d’água nos portos brasileiros, dispõe:

“Art. 8º Prescrevem ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador, as ações por extravio de carga, bem como as ações por falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga.”

Ressalte-se, a propósito, a Súmula nº 151/STF, editada em 13.12.1963: “Prescreve em 1 (um) ano a ação do segurador sub-rogado para haver indeniza-ção por extravio ou perda de carga transportada por navio.”

Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, em interpretação à legislação de regência e observância à orientação firmada há longa data pela Suprema Corte, já decidiu que, no caso de não se averiguar a relação de consumo no contrato de transporte marítimo firmado, observa-se o prazo prescricional de 1 (um) ano para propositura de ação de segurador sub-rogado requerer do trans-portador o ressarcimento pela perda da carga.

Sobre o tema:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – TRANSPORTE MARÍTIMO DE MERCADORIA – SEGURADORA – COBRANÇA – PRESCRIÇÃO CIVIL – AU-SÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO

1. Esta Corte já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamento da indeni-zação ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicá-vel à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado.

2. No caso de não se averiguar a relação de consumo no contrato de transporte firmado, já decidiu esta Corte Superior que é de 1 (um) ano o prazo prescricional para propositura de ação de segurador sub-rogado requerer da transportadora o ressarcimento pela perda da carga. Precedentes.

3. Agravo regimental não provido.”

(AgRg-REsp 1.169.418/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., Julgado em 06.02.2014, DJe de 14.02.2014)

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – TRANSPOR-TE MARÍTIMO DE MERCADORIA – CONTRATO DE SEGURO – MERCADORIA AVARIADA – SEGURADORA – SUB-ROGAÇÃO – AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE O SEGURADO E A TRANSPORTADORA – PRAZO PRES-CRICIONAL ÂNUO – PRECEDENTES

Page 91: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������91

1. Nos termos da consolidada jurisprudência desta Corte, quando afastada pela instância ordinária a existência de relação de consumo entre o segurado e a transportadora, não incidirá o prazo prescricional previsto no Código de Defesa do Consumidor, prevalecendo o prazo prescricional ânuo estabelecido em legis-lação específica, neste caso o art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967. Precedentes.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(AgRg-AREsp 458.425/SP, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., Julgado em 17.11.2015, DJe de 23.11.2015)

Quanto ao termo inicial do prazo prescricional, o acórdão recorrido as-severou que, na presente hipótese, deveria ser observada a data da vistoria, oportunidade em que foi definida a exata extensão dos danos causados pelo inadequado acondicionamento da mercadoria transportada.

Do voto condutor do julgado transcreve-se o seguinte excerto, que bem demonstra essa compreensão:

“[...]

O agravo retido interposto tempestivamente às fls. 299/324 deve ser conhecido, mas não provido.

A coapelante pretende, por meio do agravo retido, que seja declarada a prescri-ção, a teor do art. 8º, do Decreto-Lei nº 116/1967, regulamentado pelo Decreto nº 64.387/1968, que prevê o prazo de 1 (um) ano de prescrição, contado a partir da data da descarga da mercadoria, que ocorreu em 19.12.2004.

A presente ação foi proposta em 29.12.2005.

Como muito bem observado pelo MM. Juiz a quo, mesmo considerando o prazo ânuo para a ação de regresso, este somente começou a fluir da data da apuração definitiva de seu alcance, oportunidade em que a seguradora passou a ter condi-ções de avaliar o que indenizar.

A vistoria encerrou em 24 de fevereiro de 2005 (fl. 52) e a ação foi ajuizada em dezembro do mesmo ano.

Somente a partir da vigência é que restou evidenciado o motivo da perda da carga.

Portanto, o agravo retido fica improvido” (fls. 640/641).

Muito embora a vistoria seja relevante no que se refere à constatação dos efetivos danos causados, não pode ser entendido como o termo inicial do prazo prescricional da ação regressiva a ser proposta pela seguradora.

De outra parte, menos plausível se mostra a tese veiculada nas razões recursais, perfilhada pelo acórdão apontado como paradigma, qual seja, a de que o prazo prescricional deve ser contado do desembarque da mercadoria no porto.

Page 92: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

92 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

O intérprete não deve se apegar simplesmente à letra da lei, mas deve perseguir o espírito da norma a partir de outras, inserindo-a no sistema como um todo, para extrair, assim, o seu sentido mais harmônico e coerente com o or-denamento jurídico. Além disso, nunca se pode perder de vista a finalidade da lei, ou seja, a razão pela qual foi elaborada e o bem jurídico que visa proteger.

A propósito, colhe-lhe a doutrina de Carlos Maximiliano:

“[...]

Toda prescrição legal tem provavelmente um escopo, e presume-se que a este pretenderam corresponder os autores da mesma, isto é, quiseram tornar eficiente, converter em realidade o objetivo ideado. A regra positiva deve ser entendida de modo que satisfaça aquele propósito; quando assim se não procedia, construíam a obra do hermeneuta sobre a areia movediça do processo gramatical.

Considera-se o Direito como uma ciência primariamente normativa ou finalísti-ca; por isso mesmo a sua interpretação há de ser, na essência, teleológica.

O hermeneuta sempre terá em vista o fim da lei, o resultado que a mesma precisa atingir em sua atuação prática. A norma enfeixa um conjunto de providências, protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exigências econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e assegure plenamente a tutela de interesse para a qual foi regida.

Levam-se em conta os esforços empregados para atingir determinado escopo, e inspirados pelos desígnios, anelos e receios que agitavam o país, ou o mundo, quando a norma surgiu. O fim inspirou o dispositivo; deve, por isso mesmo, também servir para lhe limitar o conteúdo: retifica e completa os caracteres na hipótese legal e auxilia a precisar quais as espécies que na mesma se enqua-dram. Fixa o alcance, a possibilidade prática; pois impera a presunção de que o legislador haja pretendido editar um meio razoável, e, entre os meios possíveis, escolhido o mais simples, adequado eficaz. O fim não revela, por si só, os meios que os autores das expressões de Direito puseram em ação para o realizar; serve, entretanto, para fazer melhor compreendê-los e desenvolvê-los em suas minú-cias. Por conseguinte, não basta determinar finalidade prática da norma, a fim de reconstituir o seu verdadeiro conteúdo: cumpre verificar se o legislador, em outras disposições, já revelou preferência por um meio, ao invés de outro, para atingir o objetivo colimado; se isto não aconteceu, deve-se dar a primazia ao meio mais adequado para atingir aquele fim de modo pleno, completo, integral.”

(MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 104-105 e 124-125 – grifou-se)

A sub-rogação não deve ser interpretada na extensão dimensionada pela recorrente, de modo a fazer com que, por força da transferência legal dos di-reitos e das ações do credor ao sub-rogado, imponha-se a observância, inclu-sive, do termo inicial do prazo prescricional previsto para a relação jurídica originária.

Page 93: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������93

Com efeito, a sub-rogação se concretiza com o pagamento da indeniza-ção securitária. Tão somente a partir desse momento pode-se atribuir ao segura-dor o direito de propor ação regressiva contra o autor do dano causado ao seu segurado.

Nesse sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO – EXERCÍCIO DE DIREITO DE REGRESSO – IMPUGNAÇÃO À EXECUÇÃO – NE-GATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA – PRESCRI-ÇÃO – TERMO INICIAL – PAGAMENTO INTEGRAL DA DÍVIDA – PRECEDEN-TES – DISCUSSÃO QUANTO AO TOTAL DA DÍVIDA EXIGIDA – INDICAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVO LEGAL INAPTO PARA AMPARAR A TESE RECUR-SAL – PRETENSÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DO PRÓPRIO TÍTULO EXECUTI-VO – AGRAVO IMPROVIDO

[...]

2. A contagem do prazo prescricional para o ajuizamento de ação regressiva tem início com o pagamento integral da dívida. Precedentes.

3. No caso, não é possível pretender o reconhecimento de prescrição parcial da pretensão regressiva sob a alegação de que haveria várias rubricas autônomas e independentes, pois o tema não foi examinado sob essa perspectiva. Falta, assim, nesse aspecto, o devido prequestionamento.

[...]

5. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(AgRg-AREsp 599.199/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª T., Julgado em 15.12.2015, DJe de 03.02.2016)

“Processual Civil e Civil. Recurso Especial. Seguro de Responsabilidade Civil. Celebração de acordo entre o segurado e o autor da ação de indenização por danos materiais. Parcelamento da dívida. Ação regressiva de cobrança de segura-do contra a seguradora. Prescrição. Termo inicial. Data de pagamento da última parcela do acordo.

I – O pressuposto lógico do direito de regresso é a satisfação do pagamento da condenação ao terceiro, autor da ação de indenização proposta contra o segura-do. Não há que se falar em ação regressiva de cobrança sem a ocorrência efetiva e concreta de um dano patrimonial.

II – O prazo prescricional subordina-se ao principio da actio nata: o prazo tem início a partir da data em que o credor pode demandar judicialmente a satisfação do direito.

III – Sob essa ótica, na ocorrência de acordo celebrado após trânsito em julgado de condenação judicial em ação indenizatória por danos materiais sofridos por terceiro, o termo inicial do prazo prescricional nas ações regressivas de cobran-ça de segurado contra seguradora é a data de pagamento da última parcela do acordo.

Page 94: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

94 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

IV – Somente a partir do adimplemento da obrigação, que ocorreu com o pa-gamento da última parcela, é que a recorrida, na condição de segurada, passou a ser credora da seguradora, surgindo daí o direito ao ressarcimento, contra a recorrente, do numerário que despendeu para adimplir a dívida.

V – Desse modo, tendo sido a última parcela paga em 23.07.2001 e a presente ação proposta em 01.04.2002, não se confere a prescrição. Inexiste, portanto, ofensa ao art. 178, § 6º, II, do CC/2016.

[...]

Recurso especial não provido.”

(REsp 949.434/MT, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., Julgado em 18.10.2010, DJe de 10.06.2010)

Desse modo, o termo inicial do prazo prescricional para seguradora sub--rogada propor ação de regresso contra o transportador marítimo por perdas e avarias na mercadoria transportada é a data do pagamento integral da indeni-zação ao segurado.

Nesse contexto, muito embora o acórdão recorrido não tenha atuado em perfeita harmonia com a legislação de regência e a orientação jurisprudencial desta Corte Superior ao estabelecer a data da vistoria aduaneira como marco inicial do prazo prescricional, não há campo para o provimento do recurso especial.

Com efeito, a vistoria aduaneira encerrou-se em 24.02.2005 (fl. 56). A seguradora, por sua vez, pagou a indenização ao segurado posteriormente, após constatar a extensão do sinistro, em 03.06.2005, conforme comprova o recibo de fl. 77. Desse modo, não havia transcorrido o prazo prescricional de 1 (um) ano quando foi proposta a presente ação regressiva, em 29.12.2005.

4 DISPOSITIVO

Ante o exposto, não conheço dos embargos de declaração de fls. 731/736 e conheço do recurso especial para negar-lhe provimento.

É o voto.

[...]

vOtO-vista

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze:

Cuida-se de recurso especial interposto por Hamburg Sudamerkanische Dampfschiffahrts fundamentado no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Consti-tuição Federal.

Page 95: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������95

Em suas razões recursais, a recorrente alega a violação do art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967 ao fundamento de que o prazo prescricional para a seguradora pleitear reparação do dano assegurado deve ser o mesmo previsto no referido dispositivo legal, ou seja, um ano. Assim, sustenta a prescrição da pretensão contra si dirigida em razão de danos causados a carga transportada, uma vez que, desde a descarga das mercadorias, teria decorrido o prazo pres-cricional ânuo.

Em contrarrazões, Unibanco AIG Seguros S.A., além de alegar óbices ao conhecimento, assevera que, ainda que se considerasse o momento do desem-barque como termo inicial do prazo prescricional, não teria decorrido o prazo prescricional ânuo até a propositura da ação. Ademais, afirma que o termo inicial é distinto para a seguradora, somente tendo seu curso estabelecido a partir do efetivo pagamento à empresa segurada, momento em que se perfaz a sub-rogação no direito ao ressarcimento dos danos.

Trazidos os autos ao julgamento desta Terceira Turma, o Relator Min. Ricardo Villas Bôas Cueva apresentou voto no sentido de negar provimento ao recurso, ao fundamento de que “[o] termo inicial do prazo prescricional para seguradora sub-rogada propor ação de regresso é a data do pagamento integral da indenização ao segurado”, na linha de precedentes mencionados no voto, inclusive de minha relatoria.

Por essa razão, pedi vista dos autos para melhor exame da controvérsia no que tange ao termo inicial do prazo prescricional relativo à pretensão decor-rente de sub-rogação.

De início, friso que no julgamento do AgRg-AREsp 599.199/SP, de mi-nha relatoria, esta Terceira Turma agasalhou o marco temporal do pagamento como termo inicial para se pleitear, via ação regressiva, o direito de regresso decorrente de uma relação de solidariedade na reparação de danos. É o que se verifica da síntese das razões recursais assim registrada no voto condutor do referido acórdão:

Afirmaram que o art. 283 do CC, ao contrário do que consignado no acórdão re-corrido, não exige que o devedor satisfaça a dívida por inteiro para depois exerci-tar seu direito de regresso. Segundo sustentaram, o pagamento parcial da dívida já permitiria o exercício do correspondente direito de regresso. Referida conclusão ainda mais se evidenciaria em hipóteses como a dos autos, em que o quantum total é composto por vários débitos autônomos. Por força de consequência, estaria prescrita a pretensão de regresso relativamente aos valores pagos há mais de três anos.

Desse modo, à toda evidência, não se tratava naquele julgamento de contagem de prazo prescricional decorrente de sub-rogação, mas de mero exer-cício de regresso do codevedor solidário, razão pela qual não compartilho do mesmo raciocínio na hipótese dos autos.

Page 96: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

96 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Com efeito, não se pode olvidar que o legislador, diferentemente da op-ção relativa aos contratos de seguro, acabou por afastar a existência de sub--rogação nos casos de solidariedade. Isso porque a ação de regresso prevista para o devedor solidário que quita a obrigação integralmente, somente poderá ter por objeto a pretensão de ressarcimento contra os demais codevedores pelas respectivas quotas-parte, dissolvendo-se entre eles o vínculo de solidariedade originário e revelando tratar-se de uma nova pretensão, absolutamente autôno-ma em relação à dívida solidária, ainda que dela sucessiva. É o que se depreen-de do art. 283 do CC/2002:

Art. 283. O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos codevedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do in-solvente, se o houver, presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os codevedores.

Situação outra é aquela nascida em decorrência das relações de contrato de seguro, em que por expressa disposição legal, a seguradora, ao pagar a in-denização, sub-roga-se nos direitos e ações do segurado (art. 786 do CC/2002).

Muito embora ambas as pretensões, a de sub-rogação e aquela de mero direito regressivo, se perfaçam pela via da ação regressiva, são pretensões onto-logicamente distintas, e essa distinção se faz presente inclusive no que tange ao marco temporal e ao prazo prescricional.

O instituto da sub-rogação encontra previsão legal em nosso atual Có-digo Civil sempre atrelado ao adimplemento de obrigação pelo pagamento. Assim, ao efetuar a quitação, total ou parcial, do débito de terceiro, ato que a priori extinguiria o vínculo obrigacional originário, o legislador optou por afastar a extinção ordinária da obrigação, impondo ao devedor originário a su-cessão de sua obrigação. Assim, aquele que quita a dívida é lançado, ex lege ou por contrato, à posição de credor da dívida originária.

Trata-se, pois, de evidente forma de transmissão de obrigação, na qual se dá a sucessão do credor, mantendo-se íntegros os exatos contornos iniciais da relação obrigacional. Noutros termos, transmite-se os direitos e as correspon-dentes ações, tal qual originalmente constituídas.

Muito embora o instituto fosse assim reconhecido no Código Civil de 1916, seu âmbito de aplicação aos contratos de seguro exigiam expressa pre-visão contratual em razão da inexistência de regra geral nesse sentido. Desse modo, sob a vigência do Código Civil revogado, sua aplicação ex lege em favor das seguradoras ficava restrita aos contratos de transporte marítimo, em razão da previsão do art. 728 do Código Comercial de 1850, ainda em vigor nos se-guintes termos:

Art. 728. Pagando o segurador um dano acontecido à coisa segura, ficará sub--rogado em todos os direitos e ações que ao segurado competirem contra tercei-

Page 97: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������97

ro; e o segurado não pode praticar ato algum em prejuízo do direito adquirido dos seguradores.

Esse cenário permitiu então a construção de que, a despeito da inexistên-cia de sub-rogação, seria cabível a ação regressiva como forma de recuperação do prejuízo e de responsabilização do causador do dano, em razão da despesa suportada pelas seguradoras, como forma de obstar o vedado enriquecimento sem causa. Daí a consolidação do Enunciado nº 188 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, editada em 1963, que expressamente reconhece a possibili-dade de utilização da ação regressiva como via processual ao ressarcimento da despesa efetivamente realizada.

Embora não revogado o enunciado jurisprudencial, mantido em vigor até hoje por não contrariar o atual sistema legal, o Código Civil vigente cuidou de dar solução expressa a esse antigo anseio das seguradoras de serem con-templadas pelo instituto da sub-rogação, assegurado inicialmente pelo Código Comercial de forma restrita.

Desse modo, a despeito de se utilizarem da via processual conhecida como ação regressiva, as ações propostas pelas seguradoras veiculam, atual-mente, nítida pretensão de direito creditório ou obrigacional a elas transmi-tida por sub-rogação. Ressalte-se que não há novação da relação creditícia, aproximando-se, nesse ponto, a sub-rogação da cessão de crédito – tanto que se lhe aplicam, subsidiariamente, as disposições legais referentes à cessão. De fato, a relação originária mantém todos os seus contornos, inclusive quanto à prescrição.

Nesse sentido, são os precedentes desta Corte Superior, embora sem en-frentar a questão posta nestes autos, relativa ao termo inicial da contagem do prazo prescricional (original sem grifos):

RECURSO ESPECIAL – TRANSPORTE MARÍTIMO – ARMAZENAGEM DE MER-CADORIA – AÇÃO REGRESSIVA DE COBRANÇA DE SEGURADO CONTRA SEGURADORA – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – SUB-ROGAÇÃO – LIMITES

1. Ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, mas nos limites desses direitos, ou seja, a “sub-rogação não transfere à seguradora mais direitos do que aqueles que a segurada detinha no momento do pagamento da indenização” (REsp 1.385.142).

Portanto, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, a seguradora sub-rogada pode buscar o ressarcimento do que despendeu com a indenização securitária.

2. Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 1.505.256/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 17.05.2016)

Page 98: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

98 ��������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

DIREITO CIVIL – RECURSO ESPECIAL – SEGURO DE TRANSPORTE DE MER-CADORIA – FATOS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002, QUE PASSOU A REGULAR O TRANSPORTE DE PESSOAS E COISAS – SINISTRO – INDENIZAÇÃO – SUB-ROGAÇÃO – SEGURADORA ASSUME A POSIÇÃO DA SEGURADA – RELAÇÃO MERCANTIL – INAPLICABILIDADE DAS REGRAS DO CDC

1. A seguradora, arcando com a indenização securitária, está sub-rogada nos direitos de sua segurada, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à rela-ção jurídica entabulada por esta, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam à segurada.

2. No entanto, a relação jurídica existente entre a segurada e a transportadora ostenta nítido caráter mercantil, não podendo, em regra, ser aplicada as normas inerentes às relações de consumo, pois, segundo apurado pela instância ordi-nária, “o segurado utilizou a prestação de serviço da ré transportadora como insumo dentro do processo de transformação, comercialização ou na prestação de serviços a terceiros; não se coadunando, portanto, com o conceito de consu-midor propriamente dito, mas sim pretendendo a exploração da atividade econô-mica visando a obtenção do lucro”.

3. O Código Civil de 2002 regula o contrato de transporte de pessoas e coisas nos arts. 730 a 756. No entanto, a referida relação jurídica era anteriormente regulada pelo Decreto-Lei nº 81/1912, aplicando-se a prescrição ânua, conforme dispunha o art. 9º do mencionado Diploma. Precedentes do STF e desta Corte.

4. Recurso especial não conhecido.

(REsp 982.492/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 17.10.2011)

Por sua vez, é relevante notar que, diferentemente da cessão de crédito, na sub-rogação o devedor originário não participa em nenhum momento do negócio que transmite a obrigação do credor originário ao sub-rogatário. Aqui, não se exige notificação ou ciência do devedor para a perfectibilização do ato de sub-rogação, ela se aperfeiçoa plenamente com o mero pagamento ao cre-dor original, ato privado, que refoge ao conhecimento ordinário do devedor da obrigação.

E nem se pode argumentar, nesses casos, que o devedor deveria conhe-cer a sub-rogação, tão somente por sua expressa previsão legal, uma vez que não se pode desconsiderar que os contratos de seguro são negócios igualmente privados e voluntários, de modo que não se tem como exigir do causador do dano o conhecimento prévio da existência do contrato de seguro, dos riscos cobertos e, menos ainda, do momento em que realizado o pagamento pela seguradora ao segurado.

Por outro prisma, não se pode negar a relevância jurídica do momento do pagamento. Nesse momento, como referido pelo legislador, ocorre a sub-ro-gação; a partir desse importante marco temporal, a seguradora passa a ser parte

Page 99: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �����������������������������������������������������������������������������������������99

legítima para todos os atos necessários a assegurar a realização da obrigação transmitida. Trata-se assim de nítida questão de legitimidade, ressaltando que, até o pagamento efetivo, compete ao próprio segurado a legitimidade decor-rente de sua posição credora. Por essa razão, impõe o legislador ao segurado o dever de não praticar atos que prejudiquem o direito da sub-rogação, o que, a priori, seria lícito por ser ele o credor exclusivo.

Todavia, acrescer ao momento do pagamento a função de marco inicial da prescrição ao pagamento é juridicamente inviável, sob pena de se deturpar tanto os limites do crédito transmitido e, por consequência, o instituto da sub--rogação, como a própria razão de ser dos prazos prescricionais.

Nesse diapasão, deve ter em consideração que o instituto da prescrição tem o importantíssimo escopo de pacificação social, agregando segurança jurí-dica e previsibilidade diante da inércia da parte quanto ao exercício de seu di-reito. Tutela-se, assim, a legítima expectativa gerada na parte ex adversa diante da inação por lapso temporal considerável e regulamentado legalmente. Assim, a prescrição não pode se sujeitar à vontade das partes, sejam elas beneficiadas ou prejudicadas pelo transcurso do prazo (CAHALI, Yussef Said. Prescrição e decadência. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 24).

Dito isso, deve-se concluir que utilizar o momento do pagamento como marco inicial do prazo prescricional corresponde a atribuir à seguradora o con-trole do início do prazo, situação inadmissível em nosso sistema jurídico. Isso porque a ela exclusivamente incumbe à decisão de pagar o segurado, de for-ma que a eleição desse marco temporal viabilizaria à prejudicada natural pelo transcurso do prazo liberatório o arbitramento no que tange a sua fluência, colocando o devedor numa posição de insegurança indefinida.

Ao assim se entender, ao invés de a prescrição consolidar a pacificação social, imbui-se no espírito dos jurisdicionados um sentimento de injusta sur-presa, oposta àquele mote de previsibilidade almejado, fazendo do processo quase que uma armadilha para as partes, que poderão a qualquer tempo serem surpreendidas pela exigibilidade de uma dívida antiga, que acreditavam legiti-mamente prescrita.

Por outro ângulo, a legislação impõe ao segurado, sob pena de perder o direito à indenização, o dever de comunicar imediatamente o conhecimento de sinistro à seguradora, nos termos do art. 771 do Código Civil de 2002:

Art. 771. Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba, e tomará as providências imediatas para minorar-lhe as consequências.

Esse dispositivo, somado às demais disposições relativas à sub-rogação, deixa clara a engenharia legal que traduz tratar-se a obrigação de reparação do dano uma única relação jurídica, a qual é transmitida pelo segurado e recebida

Page 100: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

100 �����������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

pela seguradora com todas as suas limitações, inclusive quanto ao prazo pres-cricional em curso. Conquanto não faça referência direta ao prazo prescricio-nal, deixa inconteste que o conhecimento do dano é fato relevante tanto para o segurado como para a seguradora, por tratar-se de inafastável marco temporal da prescrição, a qual se vincula objetivamente à pretensão, e não às partes.

Assim, a actio nata delimita o surgimento da obrigação e sua exigibilida-de no exato momento em que o segurado toma conhecimento da ocorrência do dano. E, uma vez que essa mesma relação obrigacional será transmitida à seguradora, deve o segurado, em respeito à boa-fé objetiva e aos postulados da eticidade, concretizados na referida norma legal, dar à seguradora seu imediato conhecimento. Nessa dinâmica, assegura-se à seguradora a possibilidade de quitar sua obrigação contratual, pelo pagamento da indenização contratada, e, sub-rogando-se na posição de credora, buscar a satisfação da reparação contra o causador do dano em tempo hábil.

Nesse sentido, também já se pronunciou a Quarta Turma desta Corte Superior:

RECURSO ESPECIAL – TRANSPORTE MARÍTIMO – PRESCRIÇÃO ÂNUA – APLI-CAÇÃO DO DECRETO-LEI Nº 116/1967 E SÚMULA Nº 151 DO STF – CARGA AVARIADA – RESPONSABILIDADE DAS DEPOSITÁRIAS – AÇÃO DO SEGURA-DOR SUB-ROGADO PARA RESSARCIMENTO DOS VALORES PAGOS

1. Nos termos do art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967, é de um ano o prazo para a prescrição da pretensão indenizatória, no caso das ações por extravio, falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga a ser transportada por via d’água nos portos brasileiros.

2. A Súmula nº 151 do STF orienta que prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga transportada por navio.

3. A seguradora sub-roga-se nos direitos e ações do segurado, após o pagamento da indenização securitária, inclusive no que tange ao prazo prescricional, para, assim, buscar o ressarcimento que realizou.

4. Recurso especial provido.

(REsp 1.278.722/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 29.06.2016)

No referido julgamento, o relator deixa expresso em seu voto tratar-se de caso em que aplicável o Enunciado nº 278 da Súmula do STJ, que estabelece que “[o] termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”, para, ao final, concluir pelo reconhecimento da prescrição da pretensão buscada pela seguradora contra a causadora do dano, mediante ação de regresso na qualida-de de sub-rogatária.

Embora não consista razão de decidir, acrescento que esse entendimento tem ainda o condão de induzir as seguradoras a não postergarem o cumprimento

Page 101: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ��������������������������������������������������������������������������������������101

de sua obrigação perante o segurado, uma vez que sobre elas também pesarão os efeitos de sua demora, ainda que pela via reflexa da prescrição, a fulminar sua pretensão contra o causador do dano. De outro lado, sua responsabilidade pelo pagamento da indenização ao segurado desidioso fica a salvo, prevenindo casos de eventual conluio ou mera inação imotivada do segurado e liberando-a do pagamento na hipótese de demora desarrazoada na comunicação.

Por fim, ressalto ainda que esse entendimento tampouco destoa daquele alcançado no julgamento do REsp 949.434/MT, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 10.06.2010, em que se discutia a ação de regresso do segurado em face de sua seguradora contratada e o marco inicial da prescrição desta pretensão, em que o próprio segurado havia sido o causador do dano a terceiro, distanciando--se sobremaneira do debate à luz da sub-rogação. É o que se depreende desde a leitura da ementa do acórdão:

Processual Civil e Civil. Recurso Especial. Seguro de Responsabilidade Civil. Ce-lebração de acordo entre o segurado e o autor da ação de indenização por da-nos materiais. Parcelamento da dívida. Ação regressiva de cobrança de segurado contra a seguradora. Prescrição. Termo inicial. Data de pagamento da última parcela do acordo.

I – O pressuposto lógico do direito de regresso é a satisfação do pagamento da condenação ao terceiro, autor da ação de indenização proposta contra o segura-do. Não há que se falar em ação regressiva de cobrança sem a ocorrência efetiva e concreta de um dano patrimonial.

II – O prazo prescricional subordina-se ao principio da actio nata: o prazo tem início a partir da data em que o credor pode demandar judicialmente a satisfação do direito.

III – Sob essa ótica, na ocorrência de acordo celebrado após trânsito em julgado de condenação judicial em ação indenizatória por danos materiais sofridos por terceiro, o termo inicial do prazo prescricional nas ações regressivas de cobran-ça de segurado contra seguradora é a data de pagamento da última parcela do acordo.

IV – Somente a partir do adimplemento da obrigação, que ocorreu com o pa-gamento da última parcela, é que a recorrida, na condição de segurada, passou a ser credora da seguradora, surgindo daí o direito ao ressarcimento, contra a recorrente, do numerário que despendeu para adimplir a dívida.

V – Desse modo, tendo sido a última parcela paga em 23.07.2001 e a presente ação proposta em 01.04.2002, não se confere a prescrição.

Inexiste, portanto, ofensa ao art. 178, § 6º, II, do CC/2016.

VI – Por fim, não se conhece do recurso especial com base na alínea c do permis-sivo constitucional, pois não há a comprovação da similitude fática entre os acór-dãos trazidos à colação, elemento indispensável à demonstração da divergência. A análise da existência do dissídio é inviável, porque foram descumpridos os arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ.

Page 102: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

102 �����������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Recurso especial não provido.

Em síntese, por todos os fundamentos expostos, reconheço como marco temporal inicial do lapso prescricional a data da ciência do sinistro, ou seja, dano à mercadoria transportada apurado na vistoria, conforme o acórdão recor-rido (e-STJ, fl. 641). Marco este que não se confunde com o momento em que a seguradora ingressa na relação obrigacional transmitida por sub-rogação, esta sim ocorrida apenas com o pagamento efetivo da indenização.

No caso concreto, verifico, todavia, que o Tribunal de origem observou a aplicação da teoria da actio nata, assentando que, desde a conclusão da vis-toria até a propositura da presente demanda, não havia transcorrido o prazo de um ano, conforme se extrai da fundamentação do acórdão recorrido (e-STJ, fls. 640-641):

A presente ação foi proposta em 29.12.2005.

Como muito bem observado pelo MM. Juiz a quo, mesmo considerando o prazo ânuo para a ação de regresso, este somente começou a fluir da data da apuração definitiva de seu alcance, oportunidade em que a seguradora passou a ter condi-ções de avaliar o que indenizar.

A vistoria encerrou em 24 de fevereiro de 2005 (fl. 52) e a ação foi ajuizada em dezembro do mesmo ano.

Somente a partir da vistoria é que restou evidenciado o motivo da perda da carga.

Assim, a despeito da divergência de fundamentação, acompanho o re-lator Min. Ricardo Villas Bôas Cueva quanto ao resultado do julgamento para negar provimento ao recurso especial.

É como voto.

[...]

Observação EditorialApós o voto do Ministro Relator negando provimento ao recurso especial, e do Ministro Marco Aurélio Bellizze no mesmo sentido porém com fundamentos diversos, pediram vistas o Ministro Moura Ribeiro e o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, que acompanharam o relator.

Page 103: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Assunto Especial – Ementário

Seguro Marítimo

2814 – Ação regressiva – seguradora – avarias – prazo decadencial de dez dias – inaplicabilidade – art. 27 do Código de Defesa do Consumidor – aplicabilidade – prescrição – afastamento – causa eficiente – má conservação dos contêineres – falha na prestação do serviço – in-columidade – violação

“Decadência. Ação regressiva proposta por seguradora. Prazo decadencial de dez dias. Aplicação tão somente à reclamação entre o proprietário da carga e o respectivo transportador. Preliminar em contrarrazões rejeitada. Prescrição. Ação regressiva proposta por seguradora. Mercadoria avariada. Transporte efetuado pela apelante. Relação de consumo. Hipótese em que a seguradora sub-roga-se no direito da segurada. Aplicação do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Prazo quinquenal. Prescrição afastada. Preliminar em contrarrazões rejeitada. Ação regressiva. Seguradora. Prova do pagamento da indenização relativa ao seguro no transporte marítimo. Sub-rogação válida. Avarias verificadas nas caixas que impossibilitaram a comercialização das mercadorias. Causa eficiente: má conservação dos contêineres da transportadora-apelada. Falha na prestação do serviço. Violação à incolumidade. Ação procedente. Recurso provido.” (TJSP – Ap 1004179-98.2015.8.26.0562 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. J. B. Franco de Godoi – DJe 28.06.2017)

Transcrição EditorialCódigo de Defesa do Consumidor:“Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhe-cimento do dano e de sua autoria.”

2815 – Avarias – ação regressiva – prescrição não caracterizada – prazo trienal do art. 206, § 3º, V, do Código Civil – decadência não caracterizada – art. 754 do Código Civil – inaplicabi-lidade – agentes de carga – solidariedade

“Ação regressiva. Pretensão da autora ao ressarcimento do valor pago à sua segurada em decorrência de avarias nos produtos comprados nos EUA durante o transporte para o Brasil. Prescrição não carac-terizada porque a ação foi ajuizada dentro do prazo trienal do art. 206, § 3º, V, do CC. Decadência não caracterizada pois o prazo do art. 754, parágrafo único, do CC se refere à ação do destinatário contra o transportador. Legitimidade passiva dos agentes de carga reconhecida, tendo em vista que são eles que escolhem a empresa transportadora e, por isso, respondem solidariamente pela obriga-ção de resultado. Autora que não comprovou que as mercadorias foram danificadas durante o trans-porte. Art. 373, I, do CPC/2015. Demanda improcedente. Recursos providos.” (TJSP – Ap 1126747-47.2015.8.26.0100 – 16ª CDPriv. – Rel. Des. Jovino de Sylos – São Paulo – DJe 08.06.2017)

Transcrição Editorial• Código Civil:“Art. 206. Prescreve:[...]§ 3º Em três anos:[...]V – a pretensão de reparação civil;”• Código de Processo Civil:“Art. 373. O ônus da prova incumbe:I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;”

Page 104: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

104 ����������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO

2816 – Carga avariada – ação regressiva – CDC – inaplicabilidade – prazo decadencial do art. 745 do Código Civil não transcorrido – prescrição – prazo ânuo – art. 8º do Decreto--Lei nº 116/1967 – interrupção – tempestividade – nexo causal – não comprovação

“Apelação. Transporte marítimo. Carga avariada. Ação regressiva ajuizada por seguradora. Sentença de rejeição do pedido. Confirmação, diante do exame da matéria de mérito. Fixados honorários recursais. 1. Qualificação jurídica do contrato de transporte em que se fundamenta a demanda. Típico con-trato empresarial. Inexistência de desproporção de forças entre os participantes do negócio. Ina-plicabilidade do CDC. Incidência, sim, do Código Civil. 2. Decadência. Prazo decadencial do art. 745 do CC não transcorrido. Inexistência nos autos de elementos a fazer concluir que a contra-tante do transporte/segurada teve conhecimento dos danos no equipamento transportado antes de o ter recebido no respectivo estabelecimento. Danos e respectiva extensão só constatados quando da montagem e instalação do aparelho, já em presença de técnico designado pelas transportadoras rés. 3. Prescrição. Prazo ânuo do art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967 não consumado. Interrupção verificada tempestivamente, quando do ajuizamento de medida cautelar de protesto interruptivo, por parte da seguradora (CPC/1973, art. 219, § 1º). Prazo prescricional assim interrompido que só voltaria a correr quando da efetiva verificação dos protestos, nos termos do art. 202, parágrafo único, do CC. Precedentes. Hipótese em que esta ação indenizatória foi ajuizada antes de con-cluídos os chamamentos na cautelar de protesto, atraso que se deu por motivos não oponíveis à requerente da medida. 4. Nexo causal. Elementos dos autos não positivando que a autoria do dano seja imputável às transportadoras marítimas. Cenário de provas em que não se pode descartar a hipótese de os danos terem sido produzidos no desembarque da carga ou no considerável período em que esteve ela armazenada no terminal portuário. Circunstância assentada no laudo da vistoria realizada por empresa constatada pela própria contratante do transporte/segurada. Sentença de rejeição do pedido confirmada por tal fundamento. Dispositivo: Negaram provimento à apelação.” (TJSP – Ap 1010129-85.2016.8.26.0002 – 19ª CDPriv. – Rel. Des. Ricardo Pessoa de Mello Belli – DJe 20.06.2017)

Transcrição EditorialDecreto-Lei nº 116, de 25 de janeiro de 1967:“Art. 8º Prescrevem ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transporta-dor, as ações por extravio de carga, bem como as ações por falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga.Parágrafo único. O prazo prescricional de que trata êste artigo somente poderá ser interrompido da forma prevista no art. 720 do Código de Processo Civil, observado o que dispõe o § 2º do art. 166 daquele Código.”

2817 – Transporte de mercadorias – avaria – relação de consumo – sub-rogação que se opera de pleno direito e em amplo caráter – indenização – limitação – convenções internacionais – impossibilidade

“Ação regressiva. Seguro. Transporte de mercadorias. Avaria. Relação de consumo. Autora (segu-radora) sub-rogada no direito de sua segurada, consumidora final do serviço de transporte. Sub--rogação que se opera de pleno direito e em amplo caráter. Indenização que, por decorrer de rela-ção de consumo, não está limitada a convenções internacionais. Prevalência do Código de Defesa do Consumidor. Indenização que deve ser integral. Responsabilidade civil da ré pelo transporte caracterizada. Todavia, ré que obteve êxito em comprovar que o valor pago pela autora à segurada e perseguido nesta ação não condiz com a quantia do prejuízo declarado no próprio laudo de vistoria da autora que, também, informou que os itens avariados não seriam destruídos, mas sim desmontados e sucateados. Ação julgada procedente em parte. Sentença reformada para reduzir o valor da condenação e apurar, em sede de liquidação, o valor dos salvados para dedução. Recurso

Page 105: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO �������������������������������������������������������������������������������������������������������105

provido em parte.” (TJSP – Ap 1023267-22.2016.8.26.0002 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. Paulo Roberto de Santana – DJe 23.05.2017)

2818 – Transporte marítimo – ação de regresso – decadência – art. 754 do Código Civil – inapli-cabilidade – Súmula nº 151/STF – prevalência

“Apelação. Ação de regresso. Transporte marítimo de mercadorias. Propositura pela seguradora em face da transportadora, visando o ressarcimento do valor pago ao segurado em razão de avarias e danos nos produtos transportados pela requerida. Sentença de improcedência, reconhecendo a decadência do direito, nos termos do art. 754 do Código Civil. Recurso da seguradora. Responsa-bilidade objetiva da transportadora, nos termos do art. 750 do Código Civil. Provas produzidas até o momento nos autos demonstraram aparente nexo causal entre a conduta da transportadora e o dano ocorrido aos bens transportados. Quanto à decadência, o art. 754 do Código Civil referiu-se ao destinatário final da mercadoria, nada consignando acerca dos direitos decorrentes do contrato de seguro. Direito da seguradora, em razão da sub-rogação, apenas poderia ser afastado se atingido pela prescrição de um ano, consoante Súmula nº 151 do STF. Ausência do protesto previsto no art. 754, parágrafo único, do Código Civil não isentou a transportadora da responsabilidade pelos danos causados, mormente em face da seguradora. Possibilidade do reconhecimento da ocorrên-cia dos danos por intermédio de outras provas, ainda que o destinatário não tivesse formalizado o protesto em 10 dias. Precedentes deste Egrégio Tribunal de Justiça. Reforma da sentença, com o afastamento da decadência, viabilizando a análise do mérito. Feito julgado, em Primeiro Grau, logo após a réplica, sem a produção das demais provas pretendidas pelas partes. Tribunal, em apelação, possui a faculdade de apreciar o mérito, podendo determinar o prosseguimento do feito, analisadas as peculiaridades do caso concreto. Jurisprudência do STJ. Prematuro o julgamento nesta sede, devendo o feito retornar à origem para o prosseguimento da instrução. Precedente desta Corte. Sentença anulada. Recurso provido, com determinação.” (TJSP – Ap 1016245-13.2015.8.26.0562 – 24ª CDPriv. – Relª Desª Silvia Maria Facchina Esposito Martinez – DJe 07.12.2016)

Transcrição Editorial• Código Civil:“Art. 754. As mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a quem apresentar o conhecimento endossado, devendo aquele que as receber conferi-las e apresentar as reclamações que tiver, sob pena de decadência dos direitos.Parágrafo único. No caso de perda parcial ou de avaria não perceptível à primeira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o transportador, desde que denuncie o dano em dez dias a contar da entrega.”• Súmula do Supremo Tribunal Federal:“151 – Prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga transportada por navio.”

2819 – Transporte marítimo – ação regressiva – seguradora – produtos petroquímicos – contami-nação – responsabilidade da transportadora

“Apelação cível. Transporte marítimo. Ação regressiva. Seguradora. Contaminação dos produtos petroquímicos transportados. Responsabilidade da transportadora. Sub-rogação. 1. Dada a causa de pedir (pretensão da seguradora ao ressarcimento do valor pago à segurada em razão de sub--rogação), tem-se que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores. Esta a dis-posição do art. 349 do Código Civil, verbis. Dessa forma, não há dúvidas de que, sendo objetiva a responsabilidade do transportador, os direitos e ações em que a seguradora se sub-rogou são os mesmos que seriam dados à credora primitiva (proprietária da carga, grosso modo), se acionasse ela própria a empresa transportadora marítima pelos danos causados. 2. Responsabilidade objetiva do transportador. Na linha oposta daquela trilhada pela sentença, sendo objetiva a responsabilidade da ré, cumpriria à demandada a prova das excludentes de responsabilidade (ausência ou não compro-vação da relação de causalidade entre o dano e a conduta do agente, aqui se compreendendo como excludentes do nexo de causalidade a culpa exclusiva ou o fato exclusivo da vítima; a culpa exclusi-

Page 106: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

106 ����������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO

va ou o fato exclusivo de terceiro e o caso fortuito e a força maior, situações essas obstativas à exis-tência do nexo de causalidade), do que não se desincumbiu. Na situação sub judice, restringiu-se a objeção da ré a atribuir a responsabilidade do fato a terceiro (ao terminal transportador, a quem, em última análise, transferiu o dever de custódia da carga), o que não logrou comprovar. Diversamente do que advogou a ré, flagra-se que a obrigação de transporte contratada não se aperfeiçoou regu-larmente, na medida em que não se considera ‘terminada’ a obrigação contratual assumida pela transportadora, porquanto o produto embarcado e a ela confiado não foi entregue ao destinatário como previsto (estreme de avarias). Não poderá a ré safar-se da sua responsabilidade como trans-portadora mediante o argumento de que a carga foi desembarcada em perfeita ordem pela apelada, tendo o transporte terminado com o bombeamento do produto para terra, sendo único responsável o terminal recebedor, e o que aconteceu depois foge ao período do transporte marítimo. (sic). Como bem destacado pela apelante, a responsabilidade da transportadora é objetiva, caracterizada por uma obrigação de fim/resultado, fatiada em três deveres precisos: o de guardar, o de conservar e o de restituir (entregar) ao seu destinatário ou a quem de direito, no lugar de destino, a carga confiada para transporte, na mesma e perfeita condição recebida. Destarte, o desfecho que se dá à demanda é o da procedência do pedido, provendo-se o recurso da companhia seguradora apelante. Apelo provido.” (TJRS – AC 0333701-10.2016.8.21.7000 – 12ª C.Cív. – Relª Desª Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout – DJe 20.03.2017)

2820 – Transporte marítimo – armazenagem de mercadoria – ação regressiva – prazo prescricio-nal aplicável – relação jurídica originária – termo inicial – sub-rogação – limites

“Recurso especial. Transporte marítimo. Armazenagem de mercadoria. Ação regressiva de cobrança de segurado contra seguradora. Prescrição. Termo inicial. Sub-rogação. Limites. 1. Ao efetuar o pa-gamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, mas nos limites desses direitos, ou seja, a ‘sub-rogação não transfere à seguradora mais direitos do que aqueles que a segurada detinha no momento do pagamento da indenização’ (REsp 1.385.142). Portanto, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, a seguradora sub-rogada pode buscar o ressarcimento do que despendeu com a indeniza-ção securitária. 2. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ – REsp 1505256/SP – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 17.05.2016)

2821 – Transporte marítimo – avaria – cofre de carga – dever de reparação – falta de protesto – decadência – direito ao ressarcimento – existência – valor da indenização – BL – cláusula limitativa – inaplicabilidade

“Transporte marítimo. Acórdão que reconhece o dever de reparação em decorrência de avarias em cofre de carga. Alegação de que o acórdão é omisso com relação aos outros argumentos da defesa. Necessidade de decisão acerca de toda a matéria. Decadência decorrente da falta de protesto. A ausência de vistoria aduaneira ou protesto não retira da parte o direito ao ressarcimento junto ao transportador. Na hipótese, a vistoria foi realizada após o decurso do prazo legal, mas toda a pro-va conclui pela responsabilização do transportador e do armazém. Dano que não foi contestado, apesar do argumento de que a mercadoria teria sido avariada em outras circunstâncias que não a do transporte. Embargos rejeitados. Cláusula limitativa do valor da indenização no BL. Impossibili-dade de conferir validade a disposição contratual diante da extensão dos danos. Hipótese de dano de grande monta. Valores oferecidos que não conferem o real significado de ressarcimento. Frete recebido a menor por sugestão do transportador que tem interesse na reserva do dano. Embargos rejeitados. Impugnação ao valor pleiteado. Valor agregado ao indicado como sendo o principal não esclarecido na inicial. Oportunidade de esclarecimentos não aproveitada. Montante equivalente a mais de trinta mil dólares não esclarecido apesar do cálculo trazido aos autos. Embargos acolhidos parcialmente com efeito modificativo Condenação imposta a uma das rés. Ação promovida contra o transportador e o armazém. Procedência da ação contra ambas as rés de forma solidária. Embargos acolhidos com efeito integrativo.” (TJSP – ED 0045764-26.2010.8.26.0562 – 16ª CDPriv. – Rel. Min. Miguel Petroni Neto – DJe 22.02.2016)

Page 107: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO �������������������������������������������������������������������������������������������������������107

Comentário EditorialO acórdão ora em comento trata de recurso de Embargos de Declaração que teve como embargante/embargado a seguradora, e embargados/embargantes o terminal portuário e a transportadora ma-rítima.Os embargos da seguradora autora buscaram esclarecer a incidência da condenação, uma vez que o acórdão não havia apontado qual das rés seria a responsável pelo ressarcimento. Estes embargos foram integralmente acolhidos para esclarecer que a condenação atinge o terminal e a transportadora de forma solidária.Já o terminal portuário e a transportadora marítima sustentaram a necessidade da instancia se manifestar quanto à possível decadência decorrente da falta de protesto e a existência de cláusula limitativa do valor da indenização no BL, dentre outras questões.Quanto à decadência, foi decidido pela Camara Julgadora que embora a vistoria tenha se dado tar-diamente, esta foi suficiente a comprovar os danos. E mais, que a ausência do protesto ou da vistoria “não retira do prejudicado o direito de postular a indenização”, além do que não pode ser esta au-sência causa para afastar a responsabilização das rés, uma vez que comprovada a “relação de causa e efeito e o dano”.Merece destaque ainda a parte do julgado relativa à cláusula de limitação de responsabilidade.Neste quesito, embora os julgadores tenham citado a existência de precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que não há ilegalidade na cláusula limitativa – como no caso do REsp 267.550/RJ, também asseveraram que:“[...] a cláusula limitativa não mais equivale à cláusula de não indenizar, conforme tantas vezes já proclamou a jurisprudência, mas o que realmente importa ao caso, é que a limitação neste feito vem como forma de isentar o transportador da deficiente prestação do serviço”.E mais:“[...] que essa cláusula é praticamente imposta ou porque não dizer sugerida, em sedução, ao con-tratante, que pensa estar levando vantagem no frete, quando na verdade está restringindo seu direito de ser indenizado”. Prevaleceu, portanto, o entendimento de que o confronto entre o valor do dano e o contratual, autoriza a desconsideração da limitação, colacionando-se as seguintes referências doutrinárias:Já dizia a boa e antiga doutrina referida por Elcir Castelo Branco, que:“As cláusulas limitativas não se confundem com a cláusula de irresponsabilidade, porque não objeti-vam suprimir o elo resultante do dano, isentando uma das partes. Colimam a discriminação de certas obrigações ou a fixação de valores que compõem o dano.Quando observam o princípio da equidade e não assumem caráter potestativo, tendo respaldo legal, as cláusulas limitativas são aceitas, porque revelam um modo convencional de compor a obrigação. Quando as cláusulas limitativas importam em verdadeira lesão aos direitos do prejudicado, não são válidas pelo abuso que representam. Relacionando-se com o modo de calcular o dano em soma sistematicamente inferior ao mesmo, dissimula fraude, podendo reputarem-se nulas” (Savatier, Traité de la responsabilité civile, 1939, t. 2, p. 255, n. 665, Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 15, p. 67).Aguiar Dias, por sua vez, também deixou certo a reserva que deve ser feita à cláusula, in verbis:“Apesar da aceitação que lograram na doutrina e na jurisprudência, não temos dúvida em sustentar a sua nulidade quando a soma arbitrariamente fixada resulte em verdadeira lesão para o credor, princi-palmente quando se trate de transporte, cujo contrato geralmente é de natureza a excluir a liberdade de discussão por parte do interessado no serviço” (Cláusula de não indenizar. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 129).

2822 – Transporte marítimo – contêiner – infiltração de água – mercadorias – avaria – responsa-bilidade objetiva – seguradora – sub-rogação – Súmula nº 188/STF

“Ressarcimento de danos. Seguradora que se sub-roga nos direitos da segurada. Contrato de transporte marítimo. Mercadorias entregues com avaria ao destinatário. Objetos ‘mofados’ diante a infiltração de água no contêiner do navio. Responsabilidade objetiva da transportadora. Risco da atividade. Nexo causal comprovado. Dever de indenizar configurado. Valor da indenização. Correspondência à quantia total equivalente às avarias, limitada ao valor do seguro. Inteligên-cia da Súmula nº 188/STF. Manutenção da sentença. É parte legítima para figurar no polo ati-vo da ação de indenização a pessoa que suportou o prejuízo ou foi lesada no relacionamento com outra, seja patrimonial, pessoal ou moral o dano – assim como aquela que se sub-rogou nos seus direitos, a teor da Súmula nº 188 do STF e do art. 786 do CC. No contrato de trans-porte de mercadorias, em toda a sua evolução, desde a égide da Lei nº 7.092/1983, regulada pelo Decreto nº 89.874/1984, quando o Código Civil de 1916 nada tratou, passando pela Lei

Page 108: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

108 ����������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO

nº 9.611/1998 e seu respectivo Decreto nº 3.411/2000, até o Código Civil de 2002 (arts. 743 a 756) a responsabilidade civil do transportador é objetiva, somente podendo ser elidida se configurado caso fortuito ou força maior, inocorrente na hipótese. A responsabilidade pela avaria de mercadoria desde o momento do seu recebimento até a sua efetiva entrega é inerente ao contrato de transporte, razão pela qual a relação jurídica estabelecida entre o contratante e a transportadora encerra uma obrigação de resultado pelo zelo e guarda dos produtos transportados, pressupondo-se a entrega da carga em perfeitas condições no destino contratado. Recurso a que se nega provimento.” (TJSC – AC 0501094-32.2010.8.24.0033 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira – DJe 07.04.2017)

Transcrição EditorialSúmula do Supremo Tribunal Federal“188 – O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro.”

2823 – Transporte marítimo – mercadoria – perda total – culpa do transportador – ação de regres-so – relação de consumo – ausência – prazo prescricional anual

“Recurso especial. Juízo de retratação. Recurso. Não cabimento. Transporte marítimo de merca-doria. Perda total do bem segurado. Culpa do transportador. Ação de regresso. Seguradora. Prazo prescricional anual. Súmula nº 151/STF. Ausência de relação de consumo. Termo inicial. Pagamen-to da indenização. 1. Apresenta-se desprovido de conteúdo decisório e, assim, insusceptível de causar gravame às partes, o ato que, em juízo de retratação, reconsidera anterior pronunciamento e determina inclusão do feito em pauta, não autorizando, por conseguinte, a interposição de ne-nhum recurso. 2. Discute-se nos autos, em essência, o termo inicial do prazo prescricional para que a seguradora, em ação regressiva, pleiteie o ressarcimento do valor pago ao segurado por danos causados à mercadoria no decorrer do transporte marítimo. 3. Ao efetuar o pagamento da indeni-zação ao segurado em razão de danos causados por terceiros, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado. 4. No caso de não se averiguar a relação de consumo, observa-se o prazo prescricional de 1 (um) ano para propositura de ação de segurador sub-rogado requerer do transportador marítimo o ressarcimento por danos causados à carga, nos termos da Súmula nº 151/STF e do art. 8º, caput, do Decreto-Lei nº 116/1967. 5. O termo inicial do prazo prescricional para seguradora sub-rogada propor ação de regresso é a data do pagamento integral da indenização ao segurado. Precedentes. 6. Embargos de declaração de fls. 731/736 não conhecidos. Recurso especial conhecido e não provido.” (STJ – REsp 1297362/SP – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 02.02.2017)

Transcrição EditorialSúmula do Supremo Tribunal Federal:“151 – Prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga transportada por navio.”

Page 109: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Doutrina

A Validade do Contrato de Uso Temporário (CUT)

ANA LUIZA BECkER SALLESBacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Bacharel em Re-lações Internacionais pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), Advogada.

RESUMO: O contrato de uso temporário (CUT) é um importante mecanismo utilizado pelas adminis-trações portuárias para a atração de cargas e investimentos ao porto organizado. Tal instrumento foi normatizado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e, apesar de seus reconhe-cidos benefícios econômicos, em virtude de não decorrer de expressa previsão legal e possibilitar a utilização da área pública sem licitação, levantou questionamentos dos órgãos de controle. Assim, o presente trabalho buscou analisar se a normatização do CUT desbordou da competência normativa da Antaq.

PALAVRAS-CHAVE: Contrato de uso temporário; atividade portuária; agência reguladora; poder nor-mativo.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O surgimento do contrato de uso temporário; 2 A validade do contrato de uso temporário; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

Com a finalidade de fomentar utilização de área ociosas, atrair cargas com mercado não consolidado1 e possibilitar o apoio temporário para ativida-des offshore no porto público, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) normatizou um instrumento denominado contrato de uso temporário (CUT). Esse tipo contratual específico possibilita a exploração, em caráter ex-cepcional, sem exclusividade, de uma determinada área portuária, inserida na área da poligonal de um porto organizado2, por um prazo de até trinta e seis meses, quando se tratar de cargas novas, ou até sessenta meses, quando se tratar de um serviço decorrente de um contrato para atendimento de plataformas de

1 O art. 2º da Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de maio de 2016, conceitua carga com mercado não consolidado como: “VIII – carga com mercado não consolidado: mercadoria não movimentada regularmente no porto nos últimos 5 (cinco) anos, tendo demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mes-mo período”.

2 Porto organizado: bem público construído e aparelhado para atender a necessidades de navegação, de mo-vimentação de passageiros ou de movimentação e armazenagem de mercadorias, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob jurisdição da Administração do Porto.

Page 110: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

110 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

exploração offshore3, mediante o pagamento das tarifas portuárias pertinentes, inclusive aquela relativa à área disponibilizada.

Em virtude de não decorrer de expressa previsão legal e possibilitar a uti-lização da área pública sem licitação, muito se discute a validade e a legalidade desse instrumento contratual criado pela Antaq, órgão regulador da atividade portuária no Brasil. O CUT foi normatizado pela Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, e é atualmente regulado pela Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de maio de 2016.

Sob o ponto de vista econômico, é cediço que esse tipo de contratação fomenta a atividade portuária. Corroborando tal assertiva, um acórdão profe-rido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), nos autos do Processo no TC 046.138/2012-9 (nº 1.514/2013), apontou que, no Estado de Alagoas, os inves-timentos decorrentes de um CUT foram de cerca de 12 (doze) milhões de reais e geraram 800 (oitocentos) empregos diretos e indiretos. Uma operação realizada no Estado do Rio Grande do Sul com esse modelo de contratação, ainda nos moldes da Resolução nº 2.240-Antaq, foi responsável pelo aumento de arreca-dação da Superintendência de Portos e Hidrovias na ordem de 20% (vinte por cento) e gerou mais 2 (dois) mil empregos diretos e indiretos4.

Entretanto, mesmo sendo um instrumento de caráter precário e que não garante exclusividade na utilização da área, em setembro de 2014, como não se exige a realização de certame licitatório, o Ministério Público Federal (MPF) moveu uma ação civil pública em face da Antaq5 objetivando a declaração de nulidade dos artigos relativos ao uso temporário das instalações portuárias previstos na Resolução nº 2.240-Antaq. O MPF alega que a referida resolução cria forma de contratação com o Poder Público – uso temporário – median-te processo de seleção simplificada, ou seja, sem prévia licitação, violando o art. 37, XXI, da CF/1988, bem como o art. 2º da Lei nº 8.666/1993 e os arts. 1º, 4º e 8º da Lei nº 12.815/2013.

Em sentença, com eficácia erga omnes, a 4ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Espírito Santo julgou procedente a pretensão do MPF, reconhecen-

3 Atividades de apoio offshore ou serviços para atendimento de plataformas de exploração offshore são as atividades que apoiam a extração de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) nas plataformas localizadas fora da costa (offshore). Essas atividades muitas vezes necessitam de uma base localizada em uma instalação portuária para a movimentação e armazenagem de equipamentos que serão utilizados nas plataformas. Essa base de apoio costuma ser por um curto período de tempo, por exemplo, enquanto se está identificando a capacidade de determinado campo de petróleo.

4 A Superintendência de Portos e Hidrovias do Rio Grande do Sul possui cinco contratos de uso temporário firmados, quatro no Porto Organizado de Porto Alegre para atividades de apoio offshore e um no Porto Orga-nizado de Pelotas para a movimentação de carga não consolidada no Porto.

5 BRASIL. Seção Judiciária do Espírito Santo. 4ª Vara Federal. Ação Civil Pública nº 0006647-60.2014.4.02.5001, Ministério Público Federal, Agência Nacional de Transportes Aquaviários. Autuado em 02.10.2014.

Page 111: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������111

do a incompatibilidade dos dispositivos da Resolução nº 2.240-Antaq com a Lei nº 12.815/2013 e o vício de nulidade da norma infralegal.

A agência reguladora recorreu da decisão defendendo a total legalidade do diploma normativo, além da inadequação da via eleita e a perda do objeto da demanda em razão do advento da Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de maio de 2016 (que revogou a Resolução nº 2.240-Antaq). Em virtude da revogação, o MPF pediu desistência da ação. O recurso de apelação ainda está pendente de julgamento.

Apesar de ter sido proferida sentença julgando procedente a ação ajui-zada pelo MPF, os dispositivos relativos ao uso temporário foram mantidos no texto da Resolução Normativa nº 7-Antaq. Ou seja, permanece sendo relevante a discussão quanto à legalidade do instrumento. Esse fato ganha ainda mais importância considerando que o CUT constitui uma modalidade contratual que fomenta a atividade econômica e atrai investimentos, estando presente em di-versos portos do país, tendo sido autorizado pela Antaq em vinte um casos.

Questiona-se, portanto, se, ao criar a modalidade contratual do uso tem-porário, teria a Antaq desbordado os limites de sua competência normativa, editando ato normativo que não decorre diretamente de previsão legal, ou se tal ato seria o efetivo exercício do poder regulamentar das agências reguladoras, amparado pela sua competência técnica decorrente do fenômeno da deslegali-zação e por seu dever de incentivar o setor regulado.

1 O SURGIMENTO DO CONTRATO DE USO TEMPORÁRIO

Antes de tratar do instrumento contratual propriamente dito, avaliar o contexto em que foi criada a figura do contrato de uso temporário é relevante para a compreensão do assunto abordado neste artigo. Em 25 de fevereiro de 1993, foi publicada a Lei nº 8.6306, conhecida como Lei dos Portos ou Lei de Modernização dos Portos, que dispôs à época sobre o regime jurídico da explo-ração dos portos organizados e das instalações portuárias e teve por finalidade principal modernizar a atividade portuária no país e transferir a operação por-tuária, antes exercida exclusivamente pelas administrações portuárias, para a iniciativa privada (Beserra, 2005).

No que toca à exploração das áreas do porto organizado, o art. 4º da Lei nº 8.630/1993 passou a exigir a realização de prévia licitação para fins de cessão de exploração de área dentro dos portos organizados. Dita previsão contempla a realização de certame licitatório para o arrendamento portuário, modalidade contratual existente desde a edição do Decreto-Lei nº 5/1966, que possibilita a exploração da infraestrutura portuária na área do porto organizado.

6 Revogada pela Nova Lei dos Portos nº 12.815, de 5 de junho de 2013.

Page 112: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

112 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Em voto proferido no Acórdão nº 2.896/2009-TCU, Plenário, o Ministro Relator Walton Alencar esclarece a figura do arrendamento, deixando clara a relação existente entre exploração de bem público por particular, que, em con-trapartida, nele realiza investimentos:

Como mencionado anteriormente (§ 18), o arrendamento portuário é a moda-lidade de desestatização prevista na Lei nº 8.630/1993 para viabilizar a opera-ção portuária pela iniciativa privada. Não obstante todas as demais inovações trazidas pela Lei dos Portos, o setor já se utilizava do arrendamento de áreas e instalações desde a edição do Decreto-Lei nº 5/1966. Essa figura jurídica sempre esteve associada à exploração de bem público pelo particular que, em contra-partida, realiza investimentos. Dessa forma, como a prestação de serviço público está condicionada à transferência do bem público para o particular, não há como dissociar todo esse processo do preceito de prévia licitação, estabelecido no art. 4º, I, da Lei nº 8.630/1993. (Brasil, 2009)

Ocorre que o arrendamento portuário previsto em lei era insuficiente para atender a todos os objetivos e finalidades existentes para a ocupação das áreas portuárias.

Importante frisar que o art. 4º da Lei nº 8.630/1993 se referia à explora-ção exclusiva da infraestrutura das instalações portuárias, mas não dos serviços portuários operacionais, mesmo porque tal diploma legal transferiu os serviços portuários de movimentação e guarda de mercadorias nos portos organizados aos operadores portuários privados, que somente se habilitavam para realizar uma atividade que é econômica7. Portanto, o arrendamento portuário não con-cedia à iniciativa privada um serviço público, mas transferia a exploração do bem público, com a infraestrutura existente no porto organizado e atividade a ela inerente (Beserra, 2012).

O contrato operacional tinha por objeto permitir o exercício de determi-nadas operações portuárias, constituindo uma modalidade contratual específi-ca, com objetivo próprio, diferenciando-se assim do contrato de arrendamento. Assim, o contrato operacional regia o exercício dos serviços portuários realiza-dos por operadores que não possuíam arrendamento portuário, que necessita-vam de instalações portuárias terrestres não exclusivas, para a armazenagem das cargas movimentadas por eles. Beserra (2012, p. 107) aponta que:

Evidentemente, durante as operações de armazenagem, o período de depósito da carga atribui uma aparência de exclusividade, em face da permanência das mer-cadorias na praça de estocagem. Assim são todos os serviços de armazenagem, sem exceção. Nada a estranhar.

7 Para melhor compreensão do assunto, transcreve-se o conceito de operador portuário trazido pela Lei nº 12.815/2013 em seu art. 2º: “XIII – operador portuário: pessoa jurídica pré-qualificada para exercer as atividades de movimentação de passageiros ou movimentação e armazenagem de mercadorias, destinadas ou provenientes de transporte aquaviário, dentro da área do porto organizado”.

Page 113: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������113

Os serviços portuários de movimentação e guarda de mercadorias nos portos organizados foram transferidos aos operadores portuários, os quais, desde as en-tidades estivadoras, estão protegidos para poderem oferecer armazenagem para as cargas que movimentam.

Caso contrário, sem área de estocagem, estariam eles [operadores portuários] ex-cluídos das operações portuárias por não terem onde depositar a carga. Por esse motivo, sempre que uma lei era revogada, outra, sem solução de continuidade, mantinha ou restabelecia o contrato operacional.

O contrato operacional sempre desfrutou de amparo legal decorrente do Decreto-Lei nº 1.016, de 21 de outubro de 1969, que, em seu art. 1º, III, previa a assinatura de contrato operacional como uma das modalidades de requisição de serviços portuários. Por sua vez, a própria Lei nº 8.630/1993, em seu art. 12, previa que os operadores portuários sem contrato de arrendamento também detinham o direito a utilizar as instalações portuárias, inclusive recebendo o alfandegamento8 direto da autoridade aduaneira (Beserra, 2012).

Em auditoria realizada com a finalidade de analisar as condições para a modernização e expansão da infraestrutura portuária, ao observar os contratos operacionais à luz da Lei nº 8.630/1993, o Tribunal de Constas da União (TCU) concluiu que a previsão legal que subsidiava o contrato operacional havia sido revogada. A seguir transcreve-se o entendimento do TCU:

21. O art. 28 do Decreto-Lei nº 5/1966 previa, ainda, que a movimentação de mercadorias e a armazenagem das mesmas, dentro dos limites do porto, pode-riam ser feitas por “terceiros”, desde que observados os princípios definidos no parágrafo único. Merece destaque a exigência de que fosse firmado contrato para a utilização, total ou parcial, de instalações portuárias. Esse contrato poderia ser a prazo ou para operação de carga e descarga de navio. Depreende-se ser essa a origem dos contratos operacionais utilizados, ainda hoje, pelas autoridades portuárias para abreviar a contratação de operadores portuários.

22. É importante frisar, contudo, que essa previsão foi revogada quando da edi-ção da Lei dos Portos. A partir da definição contida no § 18, constata-se que somente o arrendamento é aplicável à exploração das áreas e instalações por-tuárias, de propriedade da União e localizadas nos limites do porto organizado. (Brasil, 2009)

Contudo, o TCU reconheceu as dificuldades sofridas pelas autoridades portuárias para desenvolver os processos de arrendamento e, quando efetiva-

8 De acordo com o art. 2º da Portaria RFB nº 3518, de 30 de setembro de 2011: “Entende-se por alfandega-mento a autorização, por parte da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), para estacionamento ou tran-sito de veículos procedentes do exterior ou a ele destinados, embarque, desembarque ou transito de viajantes procedentes do exterior ou a ele destinados, movimentação, armazenagem e submissão a despacho aduaneiro de mercadorias procedentes do exterior, ou a ele destinadas, inclusive sob regime aduaneiro especial, bens de viajantes procedentes do exterior, ou a ele destinados e remessas postais internacionais, nos locais e recintos onde tais atividades ocorram sob controle aduaneiro”.

Page 114: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

114 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

dos, para gerenciá-los durante a vigência do contrato. Também reconheceu a morosidade do processo licitatório frente ao dinamismo inerente ao setor por-tuário. Nesse sentido, pontuou o TCU que, a depender do tipo de carga mo-vimentada, principalmente em se tratando de cargas com mercado ainda não consolidado no porto, os procedimentos previstos para repasse da operação ao particular se mostraram de difícil implementação, principalmente em virtude da necessidade de elaboração dos estudos de viabilidade, ao processo de licitação, ao contrato de arrendamento e às alterações contratuais (Brasil, 20099).

Para a operacionalização de cargas em consolidação, resultantes de novos negócios e/ou de negócios passageiros, o tempo despendido durante o procedimento licitatório para arrendamento de área é incompatível com a dinâ-mica e as incertezas inerentes a esse tipo de operação. Por essa razão, o TCU recomendou à Antaq e à Secretaria Especial de Portos para, no âmbito de suas competências, avaliar a pertinência de desenvolver novas metodologias e pro-cedimentos para viabilizar a operacionalização das cargas em consolidação, resultantes de novo negócio e demandas temporárias no âmbito dos portos ma-rítimos (Brasil, 200910).

Nesse sentido, a Resolução nº 2.240-Antaq foi normatizada, com a finali-dade de aperfeiçoar os espaços ociosos dos portos brasileiros por meio da regu-lação da exploração de áreas e instalações portuárias sob gestão das administra-ções portuárias no âmbito dos portos organizados. Tratava-se de uma resposta da agência reguladora para regularizar tal exploração, dar mais dinamismo à gestão das administrações portuárias e preencher um espaço normativo deixado pela Lei dos Portos nº 8.630/2013.

2 A VALIDADE DO CONTRATO DE USO TEMPORÁRIO

A Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, teve por objetivo

disciplinar e regular a exploração de áreas e instalações portuárias operacionais e não operacionais integrantes da poligonal do porto organizado e sob gestão das Administrações dos Portos Organizados, nos termos da Lei nº 8.630, de 25 de fe-vereiro de 1993, da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, da Lei nº 10.233, de

9 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2.896/2009. Relator: Walton Alencar Rodrigues. Sessão de 2 de dezembro de 2009. Ata nº 51/2009. Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHigh Light>. Acesso em: 2 jan. 2017.

10 Nesse sentido, transcreve-se trecho do acórdão mencionado: “107. Não obstante a agilidade trazida pela in-versão das fases ao processo licitatório, permanece latente a necessidade trazida pelas autoridades portuárias de procedimentos que viabilizem a operacionalização de cargas em consolidação, resultantes de novo negócio e demandas temporárias. Segundo arguem, o tempo despendido durante o procedimento licitatório para ar-rendamento de área é incompatível com a dinamica e as incertezas inerentes à operação de tais cargas. Por essa razão, deve-se recomendar à Antaq e à SEP que, no ambito de suas competências, avaliem a pertinência de desenvolver novas metodologias e procedimentos para viabilizar a operacionalização das cargas em conso-lidação, resultantes de novo negócio e demandas temporárias no ambito dos portos marítimos” (Brasil. TCU, Acórdão nº 2.896/2009, Rel. Walton Alencar Rodrigues, sessão de 2 de dezembro de 2009, Ata nº 51/2009. Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHigh Light>. Acesso em: 2 jan. 2017).

Page 115: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������115

5 de junho de 2001, do Decreto nº 4.391, de 26 de setembro de 2002, e do De-creto nº 6.620, de 29 de outubro de 2008. (Art. 1º da Resolução nº 2.240-Antaq)

Dentre os instrumentos normatizados pela Resolução nº 2.240-Antaq11, está o contrato de uso temporário (CUT), criado pela Antaq com a finalidade de fomentar a utilização de áreas ociosas, atrair cargas com mercado não con-solidado12 e possibilitar o apoio temporário para atividades offshore no porto público.

Beserra (2012) aponta que o contrato de uso temporário cobre pratica-mente todas as necessidades operacionais dos usuários do porto, ajustando for-malmente a utilização de facilidades portuárias que dispensem certame licitató-rio, muito se assemelhando ao antigo contrato operacional.

O referido instrumento possibilita a exploração, em caráter excepcio-nal, sem exclusividade, de uma determinada área portuária, inserida na área da poligonal de um porto organizado13, por um prazo de até trinta e seis meses, quando se tratar de cargas novas, ou até sessenta meses, quando se tratar de atividade de apoio offshore, mediante o pagamento das tarifas portuárias perti-nentes, inclusive aquela relativa à área disponibilizada.

Conforme anteriormente abordado, a Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, foi editada para preencher uma necessidade do setor deixada pelos contratos operacionais que, com o advento da Lei nº 8.630/1993, foram considerados ilegais pelo TCU. Além da complexidade inerente à sua formali-zação, o objetivo do contrato de arrendamento não se adequava integralmente a determinadas demandas existentes nos portos organizados. Assim, a normati-va trazida pela Resolução nº 2.240-Antaq preencheu esse espaço e possibilitou a exploração de áreas e instalações portuárias mediante outros instrumentos, sendo esse o caso do contrato de uso temporário.

11 Além de normatizar o contrato de uso temporário e regulamentar o contrato de arrendamento, a Resolução nº 2.240-Antaq também tratou dos seguintes instrumentos: passagem, cessão de uso não onerosa, cessão de uso onerosa e autorização de uso. De acordo com Beserra (2012, p. 111) os instrumentos podem ser descri-tos da seguinte forma: contrato de cessão de uso onerosa, mediante prévio procedimento licitatório, visando à execução de empreendimento de cunho econômico e que tenha por finalidade apoiar e prestar serviços de interesse aos agentes e usuários que atuam no porto; contrato de cessão de uso não onerosa: a entidades da Administração Pública e seus órgãos, com vistas ao exercício de suas competências vinculadas às atividades portuárias; contrato de passagem: visando ao transporte interno sobre área de uso comum ou área já; ocu-pada por terceiros, pactuada mediante instrumento contratual oneroso junto ao interessado que desenvolva atividades de movimentação e armazenagem de cargas destinadas ou provenientes de transporte aquaviário; autorização de uso: visando à utilização, a título precário, de áreas portuárias sob gestão da Administração do Porto, localizadas dentro da poligonal do porto organizado, visando à realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional.

12 O art. 2º da Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de maio de 2016, conceitua carga com mercado não consolidado como: “VIII – carga com mercado não consolidado: mercadoria não movimentada regularmente no porto nos últimos 5 (cinco) anos, tendo demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mes-mo período”.

13 Porto organizado: bem público construído e aparelhado para atender a necessidades de navegação, de mo-vimentação de passageiros ou de movimentação e armazenagem de mercadorias, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob jurisdição da administração do porto.

Page 116: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

116 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

O normativo previsto pela Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, ainda assim teve que ser atualizado em virtude das alterações na legisla-ção de regência do setor portuário. A Lei nº 12.815/2013 e seu Decreto regula-mentador nº 8.033/2013 estabeleceram o novo marco regulatório para o setor portuário. Da mesma forma que a Lei nº 8.630/1993 e seu Decreto nº 6.620, os novos diplomas legais previram que a exploração de áreas e instalações portuá-rias localizadas no porto organizado somente ocorreria mediante: (a) concessão e arrendamento, em áreas e instalações portuárias localizadas dentro do porto organizado; e (b) por meio de autorização, para instalações portuárias fora do porto organizado, sendo que não trataram dos instrumentos previstos na Reso-lução nº 2.240-Antaq.

Com o novo marco regulatório, então, verificou-se que a Resolução nº 2.240-Antaq não se encontrava integralmente em harmonia com o que a Lei nº 12.815/2013 e o Decreto nº 8.033/2013 estabeleceram. Por exemplo, a celebração dos contratos de concessão e arrendamento no marco anterior era uma obrigação da autoridade portuária, assim como o de realizar o procedi-mento licitatório. A alteração legislativa concentrou tal atribuição nas mãos do poder concedente, exercido atualmente pelo Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, e o procedimento licitatório, que anteriormente cabia à admi-nistração do porto, passou a ser uma atribuição da Antaq. Desta forma, fez-se necessário adequar a Resolução nº 2.240-Antaq ao novo marco vigente.

Foi, assim, editada a Resolução Normativa nº 7, de 30 de maio de 2016, que possui o seguinte objeto:

Art. 1º Esta Norma tem por objeto disciplinar e regular a exploração de áreas e instalações portuárias delimitadas pela poligonal do porto organizado, nos ter-mos da Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013, da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e do Decreto nº 8.033, de 27 de junho de 2013, excetuadas aquelas nas modalidades de terminal de uso priva-do (TUP), estação de transbordo de cargas (ETC), instalação portuária pública de pequeno porte (IP4) e instalação portuária de turismo (IPTur).

No que tange ao uso temporário e ao objeto do presente artigo, o art. 2º da Resolução Normativa nº 7 traz as seguintes definições:

VIII – carga com mercado não consolidado: mercadoria não movimentada re-gularmente no porto nos últimos 5 (cinco) anos, tendo demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mesmo período;

[...]

XXVII – uso temporário: utilização de áreas e instalações portuárias operacionais sob gestão da administração portuária, contidas na poligonal do porto organiza-do, pelo interessado na movimentação e armazenagem de cargas com mercado não consolidado no porto, ou por detentor de contrato de prestação de serviços

Page 117: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������117

destinados às plataformas offshore, mediante o pagamento das tarifas portuárias pertinentes;

[...]

O contrato de uso temporário é regulamentado do art. 25 ao art. 35 da referida Resolução Normativa nº 7-Antaq. Como já previa a Resolução nº 2.240-ANTAQ, a administração do porto poderá pactuar com o interessado na movimentação e armazenagem de cargas com mercado não consolidado no porto, ou com o detentor de titularidade de contrato para atendimento de plata-formas offshore, o uso temporário de áreas e instalações portuárias disponíveis, contidas na poligonal do porto organizado, mediante o pagamento das tarifas portuárias pertinentes, inclusive aquela relativa à área disponibilizada.

Também está previsto no art. 25, § 2º, do referido diploma legal que, na hipótese de existir mais de um interessado na utilização de áreas e instalações portuárias e inexistindo disponibilidade física para alocá-los concomitantemen-te, a administração do porto deverá promover um processo de seleção simpli-ficada, para que seja assegurada a isonomia e a impessoalidade na utilização das áreas e para que seja escolhido o projeto que melhor atenda ao interesse público e do porto.

Neste ponto, importante observar que não se trata de um processo seleti-vo alternativo ao procedimento licitatório previsto na Lei nº 8.666/1993. Trata--se de um instrumento contratual que prescinde de licitação, em virtude de sua natureza jurídica. Conforme abordado no item anterior, a morosidade do proce-dimento licitatório está entre os motivos pelos quais o contrato de arrendamento portuário é insuficiente para atender a todos os objetivos e finalidades existentes para a ocupação das áreas portuárias14. Ademais, o instrumento trabalhado é precário e não assegura nenhum tipo de garantia ou contrapartida ao interessa-do pelos investimentos realizados. Entretanto, caso haja mais de um interessado em utilizar de forma temporária determinada área ociosa e a administração não possa alocá-los de forma concomitante, para que seja assegurada a isonomia e a impessoalidade, a norma prevê um processo de seleção simplificada.

O § 1º do art. 25 do preceito normativo inovou em relação à resolução anterior, prevendo que a administração deverá previamente divulgar a relação de áreas e instalações portuárias ociosas, disponíveis para uso temporário, tanto o processo de seleção simplificada quanto a divulgação prévia das áreas ociosas

14 O foco do presente trabalho não objetivou abordar a fundo a natureza jurídica do contrato de uso temporário, mas somente analisar sua validade. Entretanto, considerando as características do instrumento, observa--se que, em virtude de sua precariedade, de sua transitoriedade e do fato de que ele se limita a conceder a utilização de uma área e não o exercício ou exploração de uma atividade, considera-se que o contrato de uso temporário assemelha-se a uma autorização de uso privativo de bem público, que, de acordo com Di Pietro, é precária, porque pode ser revogada a qualquer momento e discricionária, sua expedição é facultativa e depen-de de um juízo de conveniência e oportunidade. Além de prescindir de licitação. (DI PIETRO apud MARRARA e FERRAZ (2014)).

Page 118: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

118 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

têm por objeto garantir e respeitar a publicidade e impessoalidade nos atos das administrações portuárias. Ainda, a norma manteve, no art. 26, a necessária submissão para a aprovação da Antaq do requerimento para a celebração do contrato de uso temporário, que, após a aprovação ou negativa da autoridade portuária, caberá à agência atestar o cumprimento dos requisitos e realizar o juízo de conveniência e oportunidade da contratação.

Quanto aos prazos, no art. 27, a norma preservou o prazo de até 18 (de-zoito) meses, podendo ser prorrogado uma única vez, no máximo por igual pe-ríodo, para as cargas que não possuem mercado consolidado no porto. Excep-cionalmente, quando comprovada a celebração prévia de contrato de prestação de serviço para atendimento de plataforma offshore, que justifique a ocupação de áreas e instalações portuárias em prazo superior a 18 (dezoito) meses, a ad-ministração do porto poderá, observado o interesse público, celebrar contrato de uso temporário com prazo de vigência máximo, improrrogável, de até 60 (sessenta) meses.

No que toca à utilização da área – ponto crucial nas discussões quanto à validade do contrato de uso temporário –, o art. 30 dispôs que a administração do porto designará, no âmbito do instrumento contratual de uso temporário, as áreas e instalações portuárias disponibilizadas ou passíveis de disponibilização ao contratado. Ademais, o parágrafo único do referido artigo prevê que a ad-ministração do porto poderá, a qualquer tempo e no interesse público, reaver a área ou instalação objeto do instrumento pactuado, designando nova área ao contratado, observados os prazos previstos no art. 27, o que demonstra a pre-cariedade do instrumento e a ausência de exclusividade sobre a área utilizada.

Outro dispositivo importante é o art. 32, que prevê que o interessado deverá dispor de equipamentos e instalações de fácil desmobilização de modo a preservar as condições iniciais do local e possibilitar a sua imediata desocupa-ção, ao término do contrato ou quando assim determinado pela administração do porto. Esse dispositivo ainda estabelece que os investimentos vinculados ao instrumento deverão ocorrer exclusivamente às expensas do interessado, mediante anuência da administração do porto, sem direito a indenização de qualquer natureza, ou seja, os investimentos ocorrerão por conta e risco do interessado, não ensejando nenhuma forma de contrapartida da Administração Pública.

De acordo com Beserra (2012), a atividade de movimentação e armaze-nagem de mercadorias de ou para navio (operação portuária) é uma atividade econômica, e não um serviço público. Portanto, a atividade objeto do contrato de uso temporário, dada sua natureza distinta do arrendamento (o uso temporá-rio caracteriza-se pela exploração de área por empresa e para as suas específi-cas atividades empresariais), trata-se de atividade econômica, e não de serviço público. Dessa forma, a regulação da atividade portuária deve observar todos

Page 119: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������119

os preceitos pertinentes, em especial o disposto no Capítulo I do Título VII da Constituição Federal, intitulado Dos Princípios Gerais da Ordem Econômica.

De todo modo, independentemente da caracterização da natureza da atividade, ao normatizar o contrato de uso temporário, a Antaq utilizou-se do exercício da legítima discricionariedade reservada às agências reguladoras, para permitir flexibilidade ao modelo de economia regulada, dentro dos espa-ços legais deixados pelo legislador.

Resta amplamente evidenciado que os artigos do uso temporário tanto na Resolução nº 2.240/2011-Antaq quanto na Resolução Normativa nº 7 estão em consonância com as Leis nºs 8.630/1993 (antiga Lei dos Portos – revogada), 10.233/2001 e 12.815/2013 (nova Lei dos Portos) e com a Constituição Federal em seu art. 174.

A Antaq foi criada pela Lei nº 10.233/2001 e seu art. 23 fixa como sua esfera de atuação os portos organizados e as instalações portuárias neles loca-lizadas – e a exploração da infraestrutura aquaviária federal. Da mesma forma, o art. 27, V, da mesma lei determina que cabe à Antaq elaborar e editar normas relativas à exploração da infraestrutura aquaviária, garantindo isonomia no seu acesso e uso e assegurando os direitos dos usuários e fomentando a competição entre os operadores.

Ademais, o art. 7º da Lei nº 12.815/2013 trouxe a lume a competên-cia já prevista no IV do art. 27 da Lei nº 10.233/2001, que permite à agência disciplinar a utilização de instalações portuárias por qualquer interessado, em caráter excepcional. A referida previsão normativa não é uma autorização le-gislativa em branco, que concede poderes ilimitados à Antaq; os standards e as balizas à atuação da agência para esse caso estão dispostos no art. 3º da Lei nº 12.815/2013, segundo o qual:

Art. 3º A exploração dos portos organizados e instalações portuárias, com o ob-jetivo de aumentar a competitividade e o desenvolvimento do País, deve seguir as seguintes diretrizes:

I – expansão, modernização e otimização da infraestrutura e da superestrutura que integram os portos organizados e instalações portuárias;

[...]

III – estímulo à modernização e ao aprimoramento da gestão dos portos organi-zados e instalações portuárias, à valorização e à qualificação da mão de obra portuária e à eficiência das atividades prestadas;

[...]

V – estímulo à concorrência, incentivando a participação do setor privado e as-segurando o amplo acesso aos portos organizados, instalações e atividades por-tuárias.

Page 120: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

120 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Assim, verifica-se que o instrumento contratual para uso temporário de instalações portuárias normatizado pela Antaq, inicialmente pela Resolução nº 2.240 e atualmente pela Resolução Normativa nº 7, não inova no ordena-mento jurídico ou contraria norma legal vigente, ao contrário do apontado pelo MPF na ação civil pública15. Na verdade, o CUT apenas disciplina o uso pro-visório, de caráter excepcional, por qualquer interessado, de instalações por-tuárias arrendadas ou concedidas, tendo por alicerce a competência normativa da Antaq. Ainda, o ato normativo editado teve um objeto definido e destinatá-rios determinados, para situações específicas, inseridas na esfera de atuação da Antaq.

Verifica-se, então, que, independentemente da vertente doutrinária adotada, a Antaq detém poder normativo/regulamentar para editar normas in-fralegais que regulam o setor portuário. Em especial, visto que, conforme ex-pressamente previsto na Lei nº 12.815, a Antaq detém a competência para re-gulamentar a utilização em caráter excepcional, por qualquer interessado, de instalações portuárias.

De todo modo, alinha-se aqui ao entendimento exposto por Serra (2015) e Aragão (2013), no qual se compreende que as lacunas objeto de regulação são espaço de legítima discricionariedade reservado às agências. A capacidade nor-mativa delas, portanto, preenche um espaço deixado pelo legislador, para que seja possível se adequar às necessidades do setor regulado, sempre observando os princípios e diretrizes constantes na lei de criação e de regência da respectiva entidade. É mister compreender que o preenchimento desses espaços pouco densificados coaduna-se com a decisão política de regulação da economia por intermédio de agências reguladoras independentes, em que deve existir espaço para decisões eminentemente técnicas. Exigir-se a reserva absoluta de lei para a edição de instrumentos contratuais para exploração de infraestrutura portuária não se compatibiliza com os fundamentos legitimadores das próprias agências reguladoras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto no presente artigo, conclui-se que, ao criar o instru-mento contratual denominado contrato de uso temporário, a Antaq transitou no espaço de discricionariedade reservado às agências reguladoras no uso das suas competências institucionais, um espaço intencionalmente com baixa densidade normativa positivada em leis, dando margem ao preenchimento pelas respec-tivas áreas técnicas competentes para tanto, onde há, nas palavras de Barroso (2003), uma “relativa” reserva legal.

15 Brasil. Seção Judiciária do Espírito Santo, 4ª Vara Federal Cível, Ação Civil Pública nº 0006647-60.2014.4.02.5001, Ministério Público Federal, Agência Nacional de Transportes Aquaviários, autuado em 02.10.2014.

Page 121: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������121

Ademais, observou-se que o contrato de uso temporário detém nítida submissão ao interesse econômico em virtude da contrapartida pecuniária que esse tipo de contratação trouxe aos portos que dele se utilizaram. Em diversas casos, o contrato aumentou a arrecadação e trouxe investimentos que, em vir-tude do tipo de atividade desempenhada, não seriam possíveis por meio do contrato de arrendamento portuário. Contudo, é de fundamental importância esclarecer que o objetivo do instrumento não é meramente arrecadatório, mas de efetivamente de utilizar o bem público para incentivar determinada ativi-dade, cumprindo os princípios constitucionais de incentivo e planejamento da ordem econômica previstos no art. 174 da Constituição Federal.

Por fim, resta evidente que, diante de uma necessidade do setor, a Antaq estabeleceu um instrumento válido, nos limites da própria lei que a criou e na lei que hoje regulamenta os portos no Brasil, compatível com os princípios e ob-jetivos da regulação da atividade portuária, dando uso, destinação a áreas ocio-sas, mediante pagamento de tarifas, sem exclusividade e em caráter precário.

REFERÊNCIASARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito adminis-trativo econômico. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

______. Princípio da legalidade e poder regulamentar no Estado contemporâneo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 225, p. 109-130, mar. 2015. ISSN 2238-5177. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/47568/44782>. Acesso em: 31 jan. 2017.

BARROSO, Luís Roberto. Agências reguladoras. Constituição, transformações do Estado e legitimidade democrática. In: Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo, Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, p. 174-188, 2003.

______. Agências reguladoras. Constituição e transformações do Estado e legitimidade democrática. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 229, p. 285-312, fev. 2015. ISSN 2238-5177. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/46445/45191>. Acesso em: 22 jan. 2017.

______. Estado e livre iniciativa na experiência constitucional brasileira. In: RIBEIRO, L. C.; FEIGELSON, B.; FREITAS, R. V. A nova regulação da infraestrutura e da minera-ção: portos – Aeroportos – Ferrovias – Rodovias, p. 21-30, 2015.

BESERRA, Benjamin Gallotti. Ensaio para um compêndio básico de direito portuário. O porto organizado e os regimes de exploração portuária. 1. ed. Brasília: Gráfica Alpha, v. 1, 2005.

______. O contrato operacional. Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário, São Paulo, v. 2, n. 8, p. 95-114, maio/jun. 2012.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília/DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.

______. Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990. Cria o Programa Nacional de Desestatiza-ção, e dá outras providências. Brasília: Presidente da República 1990. Disponível em:

Page 122: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

122 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8031impressao.htm>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre o regime jurídico da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias e dá outras providên-cias. (Lei dos Portos). Brasília: Congresso Nacional, 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8630.htmimpressao.htm>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997. Altera procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, revoga a Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências. Brasília: Presidente da República, 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9491.htm>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001. Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, e dá outras providências. Brasília: Presidente da República, 2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10233.htm>. Acesso em: 5 jan. 2016.

______. Decreto nº 6.620, de 29 de outubro de 2008. Dispõe sobre políticas e diretri-zes para o desenvolvimento e o fomento do setor de portos e terminais portuários de competência da Secretaria Especial de Portos da Presidência da República, disciplina a concessão de portos, o arrendamento e a autorização de instalações portuárias maríti-mas, e dá outras providências. Brasília: Presidente da República, 2008. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6620.htmim -pressao.htm>. Acesso em: 5 jan. 2016.

______. Medida Provisória nº 595, de 6 de dezembro de 2012. Dispõe sobre a explora-ção direta e indireta, pela União, de portos e instalações portuárias e sobre as ativida-des desempenhadas pelos operadores portuários, e dá outras providências. Brasília: Presidente da República, 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/mpv/595impressao.htm>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013. Dispõe sobre a exploração direta e in-direta pela União de portos e instalações portuárias e sobre as atividades desempenha-das pelos operadores portuários. Brasília: Congresso Nacional, 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/Lei/L12815.htm>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Decreto nº 8.033, de 27 de junho de 2013. Regulamenta o disposto na Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013, e as demais disposições legais que regulam a exploração de portos organizados e de instalações portuárias. Brasília: Presidente da República, 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011- -2014/2013/Decreto/D8033.htm#art48>. Acesso em: 5 dez. 2016.

______. Lei nº 13.341, de 29 de setembro de 2016. Altera as Leis nºs 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, e 11.890, de 24 de dezembro de 2008, e revoga a Medida Provisória nº 717, de 16 de março de 2016. Brasília: Presidente da República, 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/L13341>. Acesso em: 26 jan. 2017.

______. Agência Nacional de Transportes Aquaviários. Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, publicada no Diário Oficial da União, de 07.10.2011, Seção l.

Page 123: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������123

______. Agência Nacional de Transportes Aquaviários. Resolução Normativa nº 7-An-taq, de 30 de maio de 2016, publicada no DOU de 02.06/.2016, Seção I, retificada pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de junho de 2016.

______. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2.896/2009. Relator: Walton Alencar Rodrigues, sessão de 2 de dezembro de 2009. Ata nº 51/2009. Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHighLight>. Acesso em: 2 jan. 2017.

______. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1.514/2013. Relator: Aroldo Cedraz, sessão de 19 de junho de 2013. Ata nº 22/2013. Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/sagas/SvlVisualizarRelVotoAcRtf?codFiltro=SAGAS-SESSAO-ENCERRADA&seOcultaPagina=S&item0=476981>. Acesso em: 2 jan. 2017.

______. Seção Judiciária do Espírito Santo. 4a Vara Federal Cível. Ação Civil Pública nº 0006647-60.2014.4.02.5001, Ministério Público Federal, Agência Nacional de Transportes Aquaviários. Autuado em 2 de outubro de 2014.

BRODBEKIER, Bruno. Poder regulamentar da Administração Pública. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 233, p. 141-178, jul./set. 2003. ISSN 2238-5177. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45446/44997>. Acesso em: 27 jan. 2017.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Agências reguladoras e poder normativo. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (Redae), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 9, fev./mar./abr. 2007. Disponível em: <http://www.direitodoes- -tado.com.br/redae.asp>. Acesso em: 20 nov. 2016.

______. Manual de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

______. Manual de direito administrativo. 25. ed. rev., ampl. e atual. até a Lei nº 12.587, de 03.01.2012. São Paulo: Atlas, 2012.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, per-missão, franquia, terceirização e outras formas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999.

______. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

GOMES, Carlos Afonso Rodrigues. Da adequação do contrato de uso temporário ao regime jurídico dos portos públicos. Conteúdo Jurídico, Brasília/DF, 27 fev. 2013. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.42207>. Acesso em: 20 dez. 2017.

GONZAGA, Yara de Melo Miranda. Função normativa da administração: uma análise acerca do fenômeno da deslegalização. 12 de dezembro de 2014. 114 fls. Dissertação de Mestrado – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Direito. Belo Horizonte. 2014. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUBD-9XRFQJ/fun__o_normativa_da_administra__o_uma_an_lise_acerca_do_fen_meno_da__deslegaliza__o.pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 jan. 2017.

GUERRA, Sérgio. Tecnicidade e regulação estatal no setor de infraestrutura. In: RIBEIRO, L. C.; FEIGELSON, B.; FREITAS, R. V. (Org.). A nova regulação da infra-estrutura e da mineração: portos – Aeroportos – Ferrovias – Rodovias. Belo Horizonte: Fórum, p. 33-47, 2015.

HEEREN, Márcia Lopes Gomes. Mudança de competências e novas formas de explora-ção portuária. In: RIBEIRO, L. C.; FEIGELSON, B.; FREITAS, R. V. A nova regulação da

Page 124: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

124 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

infraestrutura e da mineração: portos – Aeroportos – Ferrovias – Rodovias. Belo Horizonte: Fórum, p. 137-156, 2015.JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. Finalidades e fundamentos da moder-na regulação econômica. Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte: Fórum, a. 9, n. 100, jun. 2009.MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo; FERNANDES, Luís Justiniano de Aran-tes. As agências reguladoras no Direito brasileiro. In: CARDOSO, José Eduardo Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. Direito Admi-nistrativo Econômico, São Paulo: Atlas, p. 1082-1134, 2011.MARRARA, Thiago; FERRAZ, Luciano. Tratado de direito administrativo. Direito ad-ministrativo dos bens e restrições estatais à propriedade. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. III, v. 1, 2014. 550 p.NUSDEO, Fábio. Fundamentos para uma codificação do direito econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.PAVANI, Daniela Elia. Regulação e agências reguladoras no Direito brasileiro. Disponí-vel em: <http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/13836047>. Acesso em: 5 jan. 2011.SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de; JURKSAITIS, Guilherme Jardim. Arrendamento portuário para fins não públicos. Revista Brasileira de Direito Publico – RBDP, Belo Horizonte, a. 10, n. 36, p. 37-46, jan./mar. 2012.SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. 1. ed. 3. tir. São Paulo: Malheiros, 2003.______. Direito administrativo para céticos. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.

Page 125: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Doutrina

A Inconstitucionalidade do Decreto Que Institui o Conselho Nacional para Assuntos de Praticagem (Decreto nº 7�860/2012)1

RICARDO DEO SIPIONE AUGUSTO2

Técnico em Gestão Portuária pelo Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), Acadêmico em Direito da FDV.

RESUMO: O presente trabalho traz consigo uma abordagem do direito portuário no direito constitu-cional, pois trata-se de um ato normativo do Poder Público que gera influências no sistema portuário. Com isso, é importante a familiarização quanto à área portuária e seu funcionamento local no estado do Espírito Santo abordado a priori neste artigo. Ademais, é abordado o pivô dessa relação portuá-ria, afetado pelo decreto sancionado pelo Poder Executivo, o prático; essa figura desempenha uma função regulamentada em lei específica, sendo ela o objeto para o Decreto nº 7.860/2012, o qual instituiu o CNAP. Nesse liame, será demonstrado como diversos pontos da constituição são feridos pelo simples advento de um decreto que versa sobre a praticagem e, além disso, os seus efeitos sobre a economia.

PALAVRAS-CHAVE: Praticagem; inconstitucionalidade; decreto.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O complexo portuário capixaba; 2 A praticagem; 3 Do prático; 4 A criação do CNAP; 5 A inconstitucionalidade, a ilegalidade e a irrazoabilidade do Decreto nº 7.860/2012; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃOO presente artigo tem como objeto o Decreto nº 7.860/2012, que pro-

duz efeitos sobre a praticagem nacional com o objetivo de diminuição do Custo Brasil. Essa análise é feita a partir do método de raciocínio indutivo por trazer dos pontos particulares como leis e decretos para um panorama mais amplo da cons-titucionalidade. Assim, por meio da leitura da legislação vigente e da realização de um trabalho hermenêutico, é possível chegar à conclusão da inconstituciona-lidade do ato normativo infralegal que dispõe sobre a profissão do prático.

A praticagem é um serviço oferecido e obrigatório na maioria das zonas portuárias do País. A obrigatoriedade deve-se à responsabilidade de atracar um navio com segurança em uma área de risco. Isso faz com que as operações por-tuárias possam ser efetuadas nas embarcações, o que faz então a economia girar.

As zonas portuárias são zonas econômicas de suma importância em uma região. Durante toda a história, as populações dependiam do porto para venda

1 Artigo científico orientado pelo Professor Mestre Sérgio Roberto Leal dos Santos e apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Direito de Vitória (FDV).

2 Endereço eletrônico: [email protected].

Page 126: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

126 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

e compra de produtos, inclusive de subsistência. Atualmente, a maior parte do comércio internacional é feito por via marítima pelo excelente custo-benefício e, dessa forma, o transporte marítimo é o principal para importações, exporta-ções e cabotagem.

O estado do Espírito Santo possui um dos maiores complexos portuários da América Latina, com uma intensa movimentação em todos os terminais da costa capixaba, onde entra e sai boa parte das mercadorias de demanda nacio-nal, gerando, assim, um fluxo logístico intenso e fonte de receita para a região em um âmbito estadual.

Toda a mercadoria e/ou passageiros vêm nas embarcações advindas de diversos locais do mundo. Esse meio de transporte necessita de atracação em um berço. Para que isso ocorra, o navio precisa percorrer da área da barra até o berço, e quem auxilia o comandante nessa manobra é o prático, profissional habilitado pelo órgão competente a exercer esse tipo de profissão.

A praticagem é de extrema importância e o profissional possui uma res-ponsabilidade enorme sobre seus ombros. Esse ofício possui fundamentos espe-cíficos na própria Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lei nº 9.537/1097 – Lesta), sendo que ela possuía disposição mais detalhada sobre a questão da praticagem na RLESTA; no entanto, essa parte foi revogada, sendo publicado o Decreto nº 7.8560/2012, instaurando o Conselho Nacional para Assuntos de Praticagem (CNAP), sendo essa medida fonte das divergências sobre o ponto da regulação feita pelo decreto.

Para o ingresso na carreira de praticagem, deve-se seguir um procedi-mento longo e complicado; para que a pessoa goze da habilitação de prático, serão exigidas diversas habilidades durante cada fase da formação. Para iniciar, o indivíduo deve se inscrever em um concurso; em caso de aprovação, dá-se início ao treinamento e provas; isso deságua na aprovação do cidadão a exercer a profissão de prático com segurança.

A CNAP, mencionada anteriormente, foi instituída com o objetivo de elaborar propostas sobre regulação de preços, abrangência das zonas de prati-cagem (ZP) e medidas de aperfeiçoamento relativas a esse serviço. Daí o ponto com maior divergência dentro do setor jurídico da praticagem. Sustentar-se-ão, neste trabalho, a inconstitucionalidade, a ilegalidade, a irrazoabilidade e a in-justificabilidade deste ato normativo secundário do Poder Público, mais espe-cificamente do Poder Executivo, por não contribuir para o combate ao Custo Brasil.

O Custo Brasil é uma expressão criada para ilustrar o alto custo embutido nos produtos até chegar no consumidor final. Vários fatores o compõe, como carga tributária, infraestrutura física, corrupção, burocracia estatal, política de juros, inadimplência e encargos trabalhistas; isso é claramente abordado com

Page 127: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������127

Sandra Bueno Cardoso da Costa e Augusto Hauber Gameiro em seu trabalho “Entendendo o Custo Brasil”.

Será exposto que a medida tomada pelo Poder Público não dispõe de sustentáculos jurídicos para existir e surtir efeitos, isso por quebrar importantes institutos que regem a sociedade brasileira. Desse modo, não há motivos para vigorar um instrumento normativo secundário que traz prejuízos à praticagem e a toda uma coletividade e ainda está em completo desacordo com o ordena-mento jurídico brasileiro.

1 O COMPLEXO PORTUÁRIO CAPIXABAO Brasil é um país com extensões continentais e uma área costeira privi-

legiada, o que favorece fortemente o comércio marítimo e portuário. O porto é uma área econômica de suma importância para um país, tanto que é o meio de transporte mais utilizado para exportação, haja vista que transporta um grande volume a baixo custo em relação aos outros meios. Na história das civilizações, o porto foi algo tão importante que países e cidades possuem a palavra “porto” em seus nomes, como Portugal e sua Cidade do Porto.

O estado do Espírito Santo possui uma região costeira com um dos maio-res complexos portuários da América Latina (Porto de Vitória, Porto de Tuba-rão, Porto de Praia Mole, Porto de Ubu, Portocel, Terminal Vila Velha [TVV] e Companhia Portuária de Vila Velha [CPVV]), o qual é responsável por 45% do PIB do estado, gerando renda para o governo por meio de impostos e a própria comercialização e gerando renda para a população através de empregos diretos e indiretos por consequência do comercio (inter)nacional envolvido nessa área.

A título de ilustração, no próprio site do governo do estado do Espírito Santo é possível vislumbrar os dados de que o complexo portuário é responsá-vel por 9% (nove por cento) do valor exportado e 5% (cinco por cento) do valor importado pelo país, com destaque para o Porto de Praia Mole, que é respon-sável por 50% da exportação de produtos siderúrgicos do país, bem como para o Portocel, que é responsável por 70% das exportações de celulose do Brasil.

Mesmo com a extrema importância da área portuária para um país, o Brasil não possui o melhor histórico de investimento na área portuária, quiçá o estado do Espírito Santo, o qual o principal terminal de movimentação de contêiner (TVV, operado pela empresa Login) possui penas 3 (três) portêine-res e 3 (três) transtêineres, o que claramente não é o suficiente para atender a embarcações muito grandes; no entanto, não deixa de ser destaque no país e no continente, o que põe em questionamento o potencial oculto por falta de investimento estatal.

Além da própria área portuária possuir uma infraestrutura defasada, toda a parte de acesso dos produtos aos portos é defasada, pois não há ferrovias para escoamento dos produtos diretamente para o porto, muito menos hidrovias. A

Page 128: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

128 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

movimentação interna de mercadoria é feita majoritariamente por transportes rodoviários, que formam gargalos nas vias de acesso ao porto, as quais também não recai investimento estatal o suficiente para desafogar o trânsito.

Então, em meio ao cenário nacional e estadual de uma área de comércio pelo modal marítimo é que surge o ponto chave da discussão. Uma estrutura tão importante, delicada e valorosa, que opera com investimentos altíssimos, neces-sita de cuidados em todos os pontos, inclusive quando se trata de movimentação da embarcação em um local imprevisível, com mercadorias de diversos clientes e pondo em risco todo o meio ambiente ali em volta. Sob o prático recai toda essa responsabilidade, um profissional que deve estar preparado para que diariamente possam entrar e sair centenas de embarcações de todos os portos do país.

2 A PRATICAGEM

Quando uma embarcação chega na área da barra, ela emite as docu-mentações necessárias para fins de cumprimento de seus objetivos neste local, ficando estabilizada e na fila para atracação em um dos berços, sendo que, na próxima vacância, a embarcação é notificada para dar entrada na área do porto. Então é nesse momento que o prático inicia seu trabalho, pois ele é um perito em navegação no canal de acesso ao porto, o qual (o canal) pode ser traiçoeiro, pondo em risco o meio ambiente, a economia, os interesses particulares, a efe-tividade das operações e, consequentemente, a sociedade.

Para que não haja risco, a praticagem é um serviço realizado por pro-fissionais habilitados, autônomos ou membros de empresas que oferecem tais serviços aos agentes marítimos ou armadores. Inclusive há obrigatoriedade do prático na maior parte das zonas de praticagem, sendo apenas 4 trechos facul-tativos para a utilização do prático, conforme Normam 12/2003.

qUADRO RESUMO DE SERVIÇO DE PRATICAGEM

Imagem 1 – Quadro resumido do serviço de praticagem nas ZP.

Page 129: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������129

Imagem 2 – Observações e legenda da imagem 1.

O ofício de prático é normatizado e está disposto no capítulo III da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lesta – Lei nº 9.537/1997), no qual, em seu art. 12, descreve o que seria a praticagem e sua importância para a livre e segu-ra movimentação de embarcações, possibilitando, assim, um comércio seguro.

Art. 12. O serviço de praticagem consiste no conjunto de atividades profissionais de assessoria ao Comandante requeridas por força de peculiaridades locais que dificultem a livre e segura movimentação da embarcação.

No intuito de que a praticagem seja feita de forma responsável e segura, é necessária uma formação de qualidade dos profissionais; dessa forma, é trazido no art. 13 da mesma lei (Lesta) a questão da habilitação para pessoas capacita-das a exercer a praticagem. É oferecido um concurso pela autoridade portuária a fim de recrutamento de pessoas interessadas em se habilitar como práticos, sendo que, após aprovação nos testes, é livre o exercício da profissão.

Art. 13. O serviço de praticagem será executado por práticos devidamente ha-bilitados, individualmente, organizados em associações ou contratados por em-presas.

§ 1º A inscrição de aquaviários como práticos obedecerá aos requisitos estabe-lecidos pela autoridade marítima, sendo concedida especificamente para cada zona de praticagem, após a aprovação em exame e estágio de qualificação.

§ 2º A manutenção da habilitação do prático depende do cumprimento da fre-quência mínima de manobras estabelecida pela autoridade marítima.

§ 3º É assegurado a todo prático, na forma prevista no caput deste artigo, o livre exercício do serviço de praticagem.

§ 4º A autoridade marítima pode habilitar Comandantes de navios de bandeira brasileira a conduzir a embarcação sob seu comando no interior de zona de pra-

Page 130: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

130 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

ticagem específica ou em parte dela, os quais serão considerados como práticos nesta situação exclusiva.

O instituto, para adquirir a licença e manter, como é mencionado no § 2º, será exposto no próximo item, que tratará especificamente sobre o pro-fissional prático, que é considerado protagonista de uma atividade essencial e deve sempre estar disponível nas zonas de praticagem, conforme o caput do art. 14. Ao seguir no mesmo artigo, verifica-se que é incumbência da autorida-de portuária assegurar o disposto nas conformidades das medidas dos incisos seguintes do parágrafo único.

Art. 14. O serviço de praticagem, considerado atividade essencial, deve estar permanentemente disponível nas zonas de praticagem estabelecidas.

Parágrafo único. Para assegurar o disposto no caput deste artigo, a autoridade marítima poderá:

I – estabelecer o número de práticos necessário para cada zona de praticagem;

II – fixar o preço do serviço em cada zona de praticagem;

III – requisitar o serviço de práticos.

A atividade da praticagem é aquela que possibilita à embarcação ter acesso à área do porto ou tirá-la desse mesmo espaço, fazendo assim uma troca de navios para receberem os serviços portuários, o que geram renda à região em que se localiza, inclusive pela movimentação de mercadorias, conforme a importância apontada outrora neste trabalho.

Por isso a praticagem preenche o rol de atividade essencial aonde o prá-tico deve sempre estar disponível em uma zona de praticagem e a autoridade portuária competente deve assegurar, às embarcações, o serviço de um profis-sional que passou por todo o processo até sua habilitação como prático, ou seja, um profissional competente para tal função, que, se falhar ou se omitir, pode gerar prejuízos incalculáveis aos agentes envolvidos direta e indiretamente nes-sa área.

3 DO PRÁTICOA Diretoria de Portos e Costas (DPC) possui um conjunto de dispositivos

que versam a respeito da praticagem no Brasil, a Normam 12, de 2003, a qual também dispõe a respeito da formação do prático, normatizando todo o proces-so seletivo e a manutenção de sua habilitação.

O processo seletivo ocorre para um preenchimento determinado de va-gas, pois a Marinha dispõe um número de vagas que não seja insuficiente para atender a demanda ou um número maior que o necessário para não prejudicar o ofício. Além disso, não se trata de cargo público, pois é um processo seletivo para o curso de formação, para fins de adquirir a licença para exercer a função.

Page 131: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������131

Para se inscrever no processo, é necessário, basicamente, ser brasilei-ro, com idade mínima de 18 (dezoito) anos, possuir curso de graduação, ser aquaviário da seção de convés ou de máquinas e de nível igual ou superior a 4 (quatro), prático ou praticante de prático e cumprir as normas e instruções estabelecidas para o processo seletivo. Todos esses requisitos estão elencados no item 202 da dita Normam 12/2003.

Então, após atendidos os requisitos, seguindo para o item 206, o processo seletivo para adquirir a habilitação de praticante de prático é constituído de qua-tro etapas, sendo: (i) prova escrita; (ii) apresentação de documentos, seleção psi-cofísica e teste de suficiência física; (iii) prova de títulos; e (iv) prova prático-oral.

Após a aprovação, é necessário o período de permanência nessa catego-ria de praticante de prático dentro do período mínimo de 12 meses e o máximo de 18 meses, como um programa de qualificação, para que [finalmente] possa fazer os testes a bordo para se tornar de fato um prático, ou seja, estar habilitado como prático, conforme dispõe o item 224.

Esse processo para habilitação de práticos ocorre em todo o país pelas autoridades portuárias com jurisdição na respectiva região, respeitando a lota-ção disposta pela DPC na Normam em voga, sendo que o Estado do Espírito Santo, nomeado como zona de praticagem (ZP) 14, possui uma lotação de 31 práticos. Essa lotação é um número mínimo que precisa ter. O número máximo não é posto, pois, senão, contrariaria a Constituição Federal.

Imagem 3 – Lotação de práticos por ZP, com destaque para zona 14.

4 A CRIAÇÃO DO CNAP

No dia 6 do mês de dezembro do ano de 2012, foi publicado e entrou em vigor o Decreto nº 7.860/2012 instituindo a Comissão Nacional para Assuntos de Praticagem (CNAP), órgão com funções específicas quanto à praticagem,

Page 132: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

132 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

sendo que seu principal ponto controverso encontra-se logo em seu art. 1º, I e II, que dispõe regulação e fixação de teto das taxas de praticagem:

Art. 1º Fica criada a Comissão Nacional para Assuntos de Praticagem, com o objetivo de propor:I – metodologia de regulação de preços do serviço de praticagem;II – preços máximos do serviço de praticagem em cada Zona de Praticagem;III – medidas para o aperfeiçoamento da regulação do serviço de praticagem em cada Zona de Praticagem; eIV – abrangência de cada Zona de Praticagem. Parágrafo único. As propostas serão submetidas à Autoridade Marítima para ho-mologação.

Desse modo, o prático, que antes negociava livremente o preço do seu serviço no momento do contrato com a empresa, agora deve se ater ao teto esta-belecido por zona de praticagem conforme tabela exposta no próprio site da co-missão. O arquivo de consulta pública de número 2 traz as zonas de praticagem 12, 14 e 16; o estado do Espírito Santo compreende a zona de praticagem 14.

De acordo com os documentos publicizados pela própria comissão, é possível consultar a definição das tabelas de preços máximos do serviço de praticagem, sendo que nas ZP 12, 14 e 16, compreendido no documento cita-do, debruça sua metodologia de regulação de preços do serviço de praticagem aprovada pela Resolução nº 3/CNAP, de 23.09.2013. A tabela de fixação de preços máximos possui a arqueação bruta do navio como variante condicional para estabelecer o preço máximo, conforme segue abaixo:

Imagem 4 – Detalhamento da ZP capixaba.

Page 133: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������133

Imagem 5 – Tabela de preços referente à imagem 4.

Imagem 6 – O cálculo para chegar aos preços estabelecidos na imagem 5.

Conforme acima demonstrado, a imagem 4 traz consigo a localização dos portos e a divisão da zona portuária do estado em 14.1 e 14.2, determinante informação para exauriente compreensão da imagem 5, sendo essa a tabela de preço máximo de cada zona de acordo com a arqueação bruta do navio, o qual o cálculo utilizado como critério está demonstrado na imagem 6 acima.

O decreto em voga traz consigo uma regulação controversa quanto à fixação de teto para o serviço de praticagem, a qual antes não havia limitação por autoridade portuária. Essa medida instaurada é defendida pelo governo e fortemente criticada pelos sindicatos, inclusive mandados de segurança têm sido impetrados contra o Conselho instaurado por esse decreto. No estado do Espírito Santo, não há registro de ações contra o decreto.

Page 134: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

134 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

5 A INCONSTITUCIONALIDADE, A ILEGALIDADE E A IRRAZOABILIDADE DO DECRETO Nº 7.860/2012

O decreto em questão instrumentaliza a aplicação da Lesta, citada ou-trora como a legislação específica para regulamentação da praticagem. Ocorre que o decreto é ilegal por ir além de uma lei, por ferir o princípio da legalidade no que tange à lei; é inconstitucional por versar sobre matéria de competência exclusiva de lei complementar, por criar órgão a partir de um decreto, por ferir diversos princípios constitucionais; é irrazoável por sua existência, seus objeti-vos e o modo pelo qual se deu não serem justificáveis.

Um decreto é, por definição, uma espécie normativa (um instrumen-to secundário) de competência exclusiva de Chefe do Executivo, conforme o art. 84, IV, da Constituição, destinados a prover situações gerais ou individuais, abstratamente previstas, de modo expresso ou implícito; no entanto, essa defi-nição é inaplicável aos decretos autônomos e legislativos.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

[...]

IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

[...]

São três modelos de decretos os quais o presidente dispõe, como (i) o decreto singular, que pode conter regras singulares ou concretas de nomeação, de aposentadoria, de abertura de crédito, de desapropriação, de cessão de uso de imóvel, de indulto de perda de nacionalidade etc.; (ii) os decretos regula-mentares são atos normativos subordinados ou secundários; e (iii) os decretos autônomos decorrem diretamente da Constituição, possuindo efeitos análogos ao de uma lei ordinária e limitam-se às hipóteses de organização e funciona-mento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos, e de extinção de funções ou cargos pú-blicos, quando vago (art. 84, VI, da Constituição). Não confundir o último com o decreto-lei, modalidade que não existe mais devido às medidas provisórias que possuem o mesmo efeito.

Para o presente trabalho, é essencial a análise sobre os decretos regu-lamentares, pois é nessa categoria que se encaixa o Decreto nº 7.860/2012, objeto deste trabalho. Sendo assim classificado como decreto regulamentar, portanto ato normativo secundário do Poder Público, logo está sujeito ao con-trole de constitucionalidade, conforme disposto na Constituição em seu art. 97 abaixo transcrito.

Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos mem-bros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucio-nalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

Page 135: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������135

Dando início aos pontos de inconstitucionalidade do Decreto nº 7.860/2012, ainda no liame do art. 84 da Constituição, no entanto agora em seu inciso VI, alínea a, traz consigo o teor de que compete privativamente ao Presidente da República dispor mediante decreto sobre a administração federal, desde que não implique a criação ou extinção de órgão públicos. O decreto aqui analisado cria um órgão público para regulamentação profissional e finan-ceira, que foi nomeado de Comissão Nacional para Assuntos de Praticagem. Portanto, pode-se dizer que o decreto não é o diploma normativo adequado para tratar o assunto; logo, é inconstitucional por ferir o dispositivo legal citado e abaixo transcrito ipsis litteris.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

[...]

VI – dispor, mediante decreto, sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;

[...]

Quanto ao exposto no artigo “Vale referir que a expressão ‘órgãos’ da fórmula deve ser entendida de maneira ampla, de modo a também abranger as entidades” (Amaral Junior, p. 2600 e 2601), ou seja, não há o que se dizer quanto a uma interpretação restritiva na Constituição ao referido termo “órgão” dizendo se tratar apenas de órgão de 2º grau, pois o texto constitucional traz, direta e claramente, que é vedada a criação de qualquer órgão público por de-creto. Tal ato do Poder Público deve-se utilizar da lei como meio.

Defender uma interpretação restritiva no que diz respeito à criação de órgão é um método errôneo, pois as interpretações restritivas da Constituição devem acontecer somente quando se trata de privilégios; nesse ponto diz o Professor Marcelo Azevedo Chamone, nos “Estudos sobre interpretação cons-titucional”:

b) a Constituição deve ser interpretada com um critério amplo, liberal e prático; nunca estreito, limitado e técnico, de modo que na aplicação de suas disposições se cumpram cabalmente os fins que a orientam e informam;

c) as palavras que a Constituição emprega devem ser entendidas em seu sentido geral e comum, a menos que resulte claramente de seu texto que o constituinte quis referir-se a seu sentido técnico, e em nenhum caso há de supor-se que um termo constitucional é supérfluo ou está demais, senão que sua utilização obede-ceu a um desígnio preconcebido dos autores da lei suprema.

Dessa forma, o primeiro ponto de inconstitucionalidade traçado a respei-to do decreto em tela deve-se ao alcance desse diploma normativo. A Constitui-

Page 136: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

136 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

ção dispõe sobre os decretos e pontua limitações da ação do Poder Público atra-vés desse modo; o limite estabelecido aos decretos no artigo supramencionado não é respeitado ao ser criado um órgão público para regulação da atividade econômica da classe dos práticos.

O segundo ponto de inconstitucionalidade é relacionado com o art. 174 da Constituição Federal, o qual dispõe que a regulamentação econômica far--se-á apenas por força de lei, sendo inviável qualquer outro método infralegal. Nesse caso, o decreto analisado é infralegal e dispõe sobre regulamentação econômica, pois, ao disciplinar o teto da praticagem, uma atividade econômi-ca, gera um efeito sobre toda relação comercial internacional do país, sendo assim uma intervenção na economia nacional.

Dessa forma, há uma regulação da atividade econômica através da dis-posição acerca dos preços da praticagem no Brasil; tendo em vista que o decre-to não possui status e nem força de lei para regulação econômica, não sendo, então, o diploma normativo adequado para a dita regulamentação. Logo, pela disposição do art. 1º do Decreto nº 7.860/2012, ele é inconstitucional por ferir a regra do art. 174 abaixo transcrito:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

É claramente perceptível então que, ao comparar o dispositivo constitu-cional acima com o advento da criação da CNAP, o Decreto nº 7.860/2012 está regulamentando o que na Constituição está determinado que seja feito através de lei, apenas por lei. Ocorre que, se há uma regulação por meio de decreto, uma espécie normativa secundária, infralegal, o que deveria ser por lei, então a determinação constitucional direta está sendo ferida.

Além do mais, um terceiro ponto, agora quanto ao princípio da legalida-de abarcada em seus arts. 5º, II e 37, ambos da CF/1988, prevê que qualquer inovação no ordenamento jurídico deve ser feita por meio de leis. Com esse decreto em voga, há aqui uma inovação no Ordenamento Jurídico sendo feita por meio de regulamento, por um decreto; então, esse regulamento fere uma medida principiológica da Constituição, podendo, assim, o decreto também inconstitucional nesse ponto ferir um princípio.

Ainda no que tange ao mesmo princípio, porém agora em relação à Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lesta), o princípio da legalidade é ferido quando se analisa que não há espaço para dispor por meio de decreto quanto ao que foi regulado pela lei, até porque não é necessário um conflito entre nor-mas neste ponto.

O espaço deixado pela lei foi em relação a uma exceção, quando estiver em risco a disponibilidade da praticagem, o que não ocorreu; ao criar a regula-

Page 137: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������137

ção dos preços como sugerido na lei, fez-se dessa sugestão em caso de exceção uma regra geral para a praticagem nacional; então, dessa forma, o princípio elencado é ferido na lei, defendendo-se então a ilegalidade na criação do CNAP pelo decreto por ferir o princípio.

Quanto à lei que dispõe sobre a praticagem e ao decreto que suposta-mente a instrumentalizaria, há uma dissonância no que tange à função de cada diploma normativo, pois o decreto que instrumentaliza a lei deve deixá-la mais clara e aplicável, nunca ir além do que ela dispõe; no entanto, o decreto vai além do que é disposto em lei, pois, como já mencionado, a abertura para regu-lação da praticagem dar-se-ia em casos excepcionais em que estaria ameaçada a disponibilidade do serviço. No entanto, ao iniciar tal regulação, o que seria exceção foi tomada como regra; com isso, a lei acabou sendo infringida por um decreto, sendo assim clara a ilegalidade.

Até então é notória a insustentabilidade jurídica do Decreto nº 7.860/2012, pois está em desacordo com a Constituição e com a Lesta. Sendo assim, esse ato normativo é inconstitucional e ilegal. Além disso, será defendido à frente que o decreto mostra-se tanto irrazoável quanto injustificável a respeito do seu propó-sito e o meio pelo qual se deu a criação do CNAP pelo Governo Federal – quem deve resguardar todos os princípios norteadores do sistema jurídico brasileiro, garantidos constitucionalmente.

As questões principiológicas asseguradas na Constituição oferecem uma estrutura e coesão ao edifício jurídico, segundo Nunes (2002, p. 40); além dis-so, o autor ainda conclui que os princípios constitucionais são o ponto mais importante de todo o sistema normativo, já que estes são os alicerces sobre os quais se constrói o ordenamento jurídico. Dessa forma, contrariar os princípios constitucionais fere todo o sustentáculo do ordenamento jurídico pátrio.

Como princípio, está disposto na Constituição que a liberdade e a justiça são os objetivos da comunidade, positivados esses objetivos no art. 3º, I, da Constituição. O decreto em questão traz consigo uma restrição à liberdade de livre exercício de um ofício; a justiça também é afastada pelo ato normativo quando ele não respeita o ordenamento jurídico e ainda assim produz efeitos que restringem os princípios constitucionais básicos, como analisado nesta pes-quisa.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

[...]

Diante do exposto, mais uma vez é notório que o Decreto nº 7.860 ca-minha contrário aos princípios e objetivos da sociedade quanto ao normatizado no dispositivo acima e ação tomada pelo decreto, ou seja, se o objetivo da sociedade é aquele assegurado no Constituição Federal e o decreto funciona contrariamente a esses objetivos, portanto ele é inconstitucional.

Page 138: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

138 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Em uma Constituição pós-ditadura, em que a liberdade é o princípio-mãe, trazida no art. 5º da CF/1988, abaixo transcrito, é assegurada a inviolabilidade do direito à liberdade. Esse artigo é um dos mais importantes da Constituição e abarca o maior número de princípios, nos quais todo o ordenamento jurídico nacional se baseia. Ao restringir a livre negociação da prestação de serviço, essa liberdade é ferida no seu âmbito profissional, pois o prático não possui o arbítrio de livre negociação do próprio preço do serviço a ser prestado por ele.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garan-tindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Ao resgatar outros pontos tratados outrora neste trabalho, não se pode eximir que os portos são de suma importância para toda uma nação. Dentro da área portuária, uma figura protagonista que faz a economia girar é o prático, pois ele realiza o acesso das embarcações ao porto com segurança.

Além disso, é notório que a carreira do prático é de difícil acesso e a responsabilidade depositada no profissional é enorme. Depois de tanto esfor-ço para conquistar a habilitação de prático, esse profissional recém-habilitado não pode exercer livremente seu trabalho por uma regulação que não dispõe, sequer, de sustentáculos jurídicos para justificar sua existência, trazendo então uma visão pós-positivista pelo fato de a justiça não estar próxima deste caso ao relacionar esses dois pontos.

Ao adotar uma visão pós-positivista, abarca-se a ideia de que o Direito não é um objeto da ciência, um núcleo isolado de qualquer outra matéria; reti-ra-se a ideia de um Direito puro, pois ele se mostra insuficiente para a sociedade atual. Então, traz-se a ideia de aproximação do Direito da Justiça e legitimidade, pois, desse modo, os diversos casos concretos podem encontrar amparos mais satisfatórios nos alicerces do Direito, mostrando essa visão a mais ajustada para solução das lides.

Ao relacionar essa visão com o caso, sustenta-se que não há amparo legal nas regras e princípios, bem como não há a questão de justiça assegurada, pois há uma dissonância dos requisitos para habilitação do prático e as restrições realizadas, promovendo, assim, a injustiça. Após sustentada essa como a visão mais acertada do Direito para o caso, o decreto atua contrário a qualquer apro-ximação da moral do Direito, podendo este trabalhar junto àquele quanto ao que é tido como ilícito pela sociedade.

A Constituição Federal de 1988 não é um instrumento apenas político; o novo constitucionalismo visa a uma aplicabilidade de seus institutos, sendo que o ideal é a Constituição Formal ser o mais próximo possível da Constituição Material. o Professor Lênio Streck expõe as características de uma forma pós--positivista no meio jurídico de se ver uma Constituição no trecho a seguir:

[...] tem como princípios a constitucionalidade, entendida como vinculação des-te Estado a uma Constituição, concebida como instrumento básico de garantia jurídica; a organização democrática da sociedade; um sistema de direitos funda-

Page 139: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������139

mentais individuais e coletivos, de modo a assegurar ao homem uma autonomia perante os poderes públicos, bem como proporcionar a existência de um Estado amigo, apto a respeitar a dignidade da pessoa humana, empenhado na defesa e garantia da liberdade, da justiça e solidariedade; a justiça social como meca-nismo corretivo das desigualdades; a igualdade, que além de uma concepção formal, denota-se como articulação de uma sociedade justa; a divisão de funções do Estado a órgãos especializados para seu desempenho; a legalidade imposta como medida de Direito, perfazendo-se como meio de ordenação racional, vin-culativamente prescritivo de normas e procedimentos que excluem o arbítrio e a prepotência; a segurança e correção jurídicas. (Streck; Morais, 2006, p. 97-98)

Dessa forma, deve-se sempre visar a uma aplicabilidade dos meios cons-titucionais na sociedade e vice-versa, para que a Constituição reflita, de fato, os anseios de uma sociedade e para que esse grupo de cidadãos seja refletido no Código. Sendo o Poder Público o principal responsável pelo zelo e cumpri-mento disso, não pode então contrariar disposições legais e princípios basilares da Constituição, pois deve buscar sempre essa aproximação fática da realidade como garantidora dos direitos basilares.

Baseado no que está acima defendido, quando uma lei, que busca seu fundamento de validade em normas hierarquicamente superiores, contraria a Constituição, então essa lei deve ser decretada inconstitucional. Dito isso, se uma Constituição impõe diplomas normativos com determinadas funções e li-mites, esses limites têm de ser respeitados, sob pena de ser declarado inconsti-tucional e, por consequência, ir contrário à sociedade regida pela Constituição nela baseada.

Diante do exposto, é claro que o Decreto nº 7.860/2012 mostra-se con-trário a diversos dispositivos constitucionais, tanto as regras quanto os princí-pios, sendo, dessa forma, inconstitucional em diversos pontos. Da mesma for-ma, esse decreto mostra-se ilegal ao contrariar e ir além da lei que supostamente seria instrumentalizada por ele, tanto em relação às regras quanto ao princípio geral da legalidade.

Ademais, essa medida mostra-se irrazoável a partir do meio que se dis-põe para alcançar o seu fim de regulação dos preços para eliminar o Custo Brasil, sendo assim também injustificável ao ter em vista que o Custo Brasil deriva de diversos outros pontos que não a praticagem. Sendo assim, esse ato normativo não dispõe de sustentáculos jurídicos, políticos e nem sociais para estar em vigor e produzindo efeito no Ordenamento Jurídico Nacional.

CONCLUSÃOA profissão do prático possui regulamentação legal por meio da Lesta e

possuía regulamentação específica por decreto pela RLESTA; no entanto, esse ponto da praticagem foi revogado, abrindo espaço para o decreto que é objeto deste trabalho, o Decreto nº 7.860, de 2012, o qual se propõe a regulamentar a lei de segurança do tráfego aquaviário, que dispõe sobre a profissão do prático.

Page 140: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

140 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Esse ato normativo possui o teor de criação de um órgão para assuntos de praticagem nomeado de CNAP, o qual possui funções de regulação da ordem econômica a partir do estabelecimento de tetos para o valor de praticagem a depender da zona, restringindo a liberdade dos práticos do livre exercício de sua função outrora garantida em lei específica.

Ocorre que esse decreto é inconstitucional, por ferir o art. 174 da Cons-tituição Federal quando regula economia (quando isso deveria ser feito apenas por lei) e por ferir o art. 84, VI, a, do mesmo Código, que veda a criação de órgãos por decretos de competência exclusiva do Poder Executivo. Até então, regras taxativas mostram que o decreto não cumpre os requisitos formais esta-belecidos e assegurados pela Constituição Federal de 1988.

Além de regras taxativas, o referido decreto também fere alguns princí-pios constitucionais, a começar pela liberdade ao restringir a atuação do práti-co. Há outros exemplos mais específicos, como o art. 1º, IV, da CF/1988, que põe a livre iniciativa como princípio basilar da República Federativa do Brasil, bem como o disposto como objetivos da comunidade no art. 3º, I, visando a uma sociedade livre e justa. Então, ao limitar uma atuação de uma função, não qualquer função, mas uma função importante como a do prático, os princípios anteriormente elencados são feridos.

No que tange ao art. 5º, em seu inciso XVIII, sendo esse artigo o que abar-ca o maior número de princípios, ou seja, todo o Ordenamento Jurídico Nacio-nal baseia-se nesse dispositivo, que põe a inviolabilidade do direito à liberdade de associações e cooperativas, vedando quaisquer interferências estatais sem seu funcionamento, dessa forma uma clara interferência no funcionamento da classe dos práticos. Outro ponto diz respeito ao princípio da legalidade, abarca-do em seus arts. 5º, II e 37, ambos da CF/1988, ao liame em que esse ato causa inovação jurídica sem ser por meio de lei, é notória a inconstitucionalidade referente a esses princípios.

Quanto ao princípio geral da legalidade, o decreto não se mostra apenas inconstitucional, mas também ilegal, ao ir além do que dispõe a lei própria. Isso se dá no ponto em que a exceção de falta ou risco ao exercício de praticagem, e a autoridade marítima competente poderia regular a atividade; no entanto, o decreto transforma essa exceção em uma regra. Logo, ele é juridicamente indefensável.

O Estado argumentou que a criação da CNAP e a regulamentação dos preços do serviço de praticagem são formas de combater o Custo Brasil para que os produtos tenham preços competitivos dentro do território brasileiro. Desse modo, o mercado nacional seria expandido. Mas isso é um argumento falacioso, pois esse termo no mundo dos negócios é verdadeiro, mas não há nada referente à praticagem. o Custo Brasil deve-se a inúmeras medidas, e não a praticagem; logo, o decreto mostra-se injustificável.

Page 141: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������141

A falha nesse discurso é: há medidas mais eficientes que poderiam ser to-madas e em outros setores, de forma a respeitar o Ordenamento Jurídico pátrio, inclusive, como, por exemplo, nos impostos sobre a importação, alavancar in-centivos às hidrovias e ferrovias para barateamento do frete; no que tange a esse ponto, para a promulgação desse decreto, houve o discurso de barateamento do frete, mas a praticagem não é raiz do problema do alto custo do frete e nem é o setor mais importante para esse assunto.

Além disso, mesmo que o argumento do Custo Brasil não fosse falacioso, o decreto mostra-se também irrazoável na medida em que ele defende uma me-lhoria na competitividade do mercado brasileiro no sistema mundial por meio de uma limitação em uma atividade primordial e que não é raiz de nenhum dos problemas. Logo, essa medida não solucionaria problema nenhum, assim se mostrando irrazoável, pois os meios não dispõem de adequação para os fins que se pretende.

O valor da praticagem no Brasil não influencia, pois está bem perto da média mundial, de acordo com o gráfico feito pela FGV em outubro de 2009 por meio de pesquisas conforme destacado abaixo, retirado do arquivo de per-guntas e respostas sobre a praticagem feito pelo Sindicato dos Práticos de São Paulo. Esse arquivo mostra que, mesmo diante da subvalorização do dólar fren-te à moeda brasileira na época, o que distorcia a comparação, os preços de praticagem no portos brasileiros encontram-se próximos à média internacional e são inferiores à maioria dos portos de referência.

Imagem 7 – Valor médio da praticagem mundial.

Logo, conclui-se que tal fato sugere que os valores de praticagem não representam qualquer entrave à exportação de mercadorias brasileiras para es-ses portos, ou seja, combater o Custo Brasil não pode envolver a limitação do

Page 142: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

142 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

trabalho dos práticos porque este não surtirá efeito algum naquele. Portanto, essa proposta do decreto mostra-se totalmente incongruente.

O decreto em discussão está em vigor desde 2012 quando promulgado pelo Poder Executivo, mas não dispõe de legitimidade, não dispõe de susten-tação jurídica, social ou econômica para que se mantenha um ato normativo secundário atentatório dessa forma ao sistema jurídico nacional. Este trabalho defendeu a inconstitucionalidade, a ilegalidade, a irrazoabilidade e a injustifi-cabilidade dessa medida conforme exposto.

REFERÊNCIASAMARAL JUNIOR, José Levi Mello do. Comentário ao artigo 84º, §§ VI. In: CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coord.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013.

ASSOCIAÇÃO Brasileira de Armadores de Cabotagem Syndarma (ABAC); Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima. Serviços de praticagem em águas jurisdicionais brasileiras visão das empresas brasileiras de navegação. Brasília, 1º de março de 2013. Disponível em: <http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/gestao/praticagem/comissao-nacional-para-assuntos-de-praticagem-2013-cnap/apresentacoes/apresentacao-syndarma.pdf>. Acesso em: 3 de março de 2016.

BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2007.

______. Decreto nº 2.596, de 18 de maio de 1998. Disponível em: <http://www.planal- -to.gov.br/ccivil_03/decreto/D2596.htm>. Acesso em: 16 mar. 2016.

______. Decreto nº 7.860, de 6 de dezembro de 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7860.htm>. Acesso em: 10 mar. 2016.

______. Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997. Disponível em: <http://www.planal -to.gov.br/ccivil_03/leis/l9537.htm>. Acesso em: 2 abr. 2016.

CARVALHO, Marcelo de. O decreto regulamentar como atividade legislativa do Poder Executivo. Disponível em: <http://www.al.sp.gov.br/repositorio/bibliotecaDigital/358_arquivo.pdf>. Acesso em: 13 mar. 2016.

CERVO, Fernando Antônio Sacchetim. A livre iniciativa como princípio da ordem constitucional econômica: análise do conteúdo e das limitações impostas pelo ordena-mento jurídico. Publicado em fevereiro de 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/26778/a-livre-iniciativa-como-principio-da-ordem-constitucional-economica>. Acesso em: 6 abr. 2016.

CHAMONE, Marcelo Azevedo. Estudos sobre interpretação constitucional. Revista Jus Navigandi, Teresina, a. 11, n. 1198, 12 out. 2006. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/9032>. Acesso em: 6 maio 2016.

CNAP. Minuta consulta pública tabela de preços máximos por manobra dos serviços de praticagem: Zonas de Praticagem: ZP-12, ZP-14 e ZP-16. Dezembro de 2013. Dis-ponível em: <http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/gestao/praticagem/arquivos/consulta-publica-2-2.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.

Page 143: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������143

CNAP; DPC. Regulação da praticagem: visão do armador, momento atual reunião. Rio de Janeiro, 17 de julho de 2013. Disponível em: <http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/gestao/praticagem/comissao-nacional-para-assuntos-de-praticagem-2013--cnap/apresentacoes/visao-centronave-regulacao-praticagem-cnap-17072013-v3.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2016.DPC. Normam-12/03. Portaria nº 348, de 16.11.2015. Disponível em: <https://www.dpc.mar.mil.br/sites/default/files/normam12.pdf>. Acesso em: 23 abr. 2016.FONSECA, Maurílio M. Arte naval. 5. ed. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação Geral da Marinha, 1989.INTERNATIONAL Convention on Tonnage Measurement of Ships. Londres, 23 de junho de 1969. Disponível em: <http://www.admiraltylawguide.com/conven/tonna-ge1969.html>. Acesso em: 3 mar. 2016.MORELLI, Alfredo Moro. Conheça a hierarquia das leis brasileiras e entenda as declara-das ilegais. Maio de 2009. Disponível em: <http://baraoemfoco.com.br/barao/noticias/marco2009/leis.htm>. Acesso em: 10 mar. 2016.NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002.SANTOS PILOTS. Perguntas (e respostas) sobre a praticagem no Brasil. Disponível em: <http://www.sppilots.com.br/arquivos/r21.pdf>. Acesso em: 13 mar. 2016.STRECK, Lenio Luiz; MORAIS, José Luis Bolzan de. Ciência política e teoria do Estado. 5. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

Page 144: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Doutrina

Da Legalidade da Cobrança Realizada pelos Terminais Portuários sob a Rubrica “THC2”

MARCELO DE LUCENA SAMMARCOAdvogado, Sócio da Sammarco Advogados, Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Uni-versidade Metropolitana de Santos, Árbitro no CBAM – Centro Brasileiro de Arbitragem Marí-tima, Diretor de Marketing da ABDM – Associação Brasileira de Direito Marítimo, Professor do Curso de Pós-Graduação em Direito Marítimo e Portuário da Universidade Católica de Santos (UNISANTOS). Autor de artigos e palestras sobre temas relacionados ao Direito Marítimo, Aéreo e Portuário.

RESUMO: Análise sobre a legalidade da cobrança de “THC2” realizada pelos operadores portuários em face dos terminais retroportuários em decorrência de serviços de segregação e entrega imediata de contêineres nas operações de importação.

PALAVRAS-CHAVE: Direito regulatório; serviços portuários; cobrança de “THC2”; segregação e en-trega imediata de contêineres; legalidade.

SUMÁRIO: Introdução; Regulamentação; Necessária distinção entre “THC” do armador e “THC2”; Inexistência de concorrência desleal; Comportamento da jurisprudência e conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O “THC2” (Terminal Handling Charge) ou “SSE” (Serviço de Segrega-ção e Entrega de Contêiner) é uma tarifa decorrente da prestação de serviço de segregação, transferência e entrega imediata de contêineres de importação, cobrada pelos terminais e operadores portuários junto aos terminais retropor-tuários.

De início, importa ressaltar que os terminais portuários e retroportuários possuem características totalmente distintas, razão pela qual são diferenciados pelas denominações “portos molhados” e “portos secos”, respectivamente.

Os terminais portuários, ou “portos molhados”, estão localizados na zona primária do porto, com acesso ao cais e ao canal de navegação, dotados de píeres para atracação de navios. Por essa razão, estão aptos a receber direta-mente os contêineres descarregados dos navios nas operações de importação, sem necessidade de intermediários.

Já os terminais retroportuários, também conhecidos como “portos secos”, estão localizados na zona secundária do porto organizado e não possuem aces-

Page 145: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������145

so ao canal de navegação e, portanto, não contam com estrutura para receber embarcações, de modo que não estão aptos a receber diretamente os contêine-res descarregados pelos navios nas operações de importação. Para tanto, neces-sitam dos serviços de segregação e entrega imediata de contêineres realizados pelos terminais e operadores portuários instalados na zona primária do porto.

Cabe mencionar que essa distinção reflete diretamente nos valores dos contratos de arrendamento das áreas portuárias. Isto porque o acesso direto ao canal de navegação e a estrutura para receber navios tornam as áreas destinadas aos terminais portuários mais valorizadas, na medida em que proporcionam mais possibilidades na exploração dos serviços portuários e maior rentabilidade nas operações. Consequentemente, os arrendamentos dos terminais situados na zona primária possuem valores mais elevados se comparados aos arrenda-mentos de áreas localizadas na zona secundária, destinadas aos denominados “portos secos”, que contam com uma gama mais restrita de serviços para explo-rar. Essa mesma situação é verificada nas áreas portuárias privativas, em que as áreas destinadas aos “portos molhados” são muito mais valorizadas.

Feita essa breve distinção, é importante ressaltar que, para prestar os serviços de armazenagem junto aos clientes importadores, os “portos secos” precisam, primeiramente, se servir da estrutura dos terminais e operadores por-tuários e dos serviços de segregação e entrega imediata de contêineres por estes realizados.

Na prática, os navios atracam nos terminais portuários para realizar a descarga de contêineres de importação. Na sequência, os “portos secos” solici-tam aos terminais portuários os contêineres que lhe são destinados, para fins de transferência em caráter prioritário (da zona primária para a zona secundária).

Feita a solicitação (que se dá por meio de sistema eletrônico integrado de terminais e mediante emissão de GMCI – Guia de Movimentação de Contêiner – Importação), os terminais portuários iniciam os serviços de segregação, movi-mentação e posicionamento logístico e estratégico dos contêineres destinados ao “porto seco” solicitante, para fins de entrega imediata das unidades, o que demanda emprego de pessoal e de aparelhos portuários, bem como uso de sis-temas integrados de monitoramento e fiscalização aduaneira.

A título de exemplo, um navio chega a descarregar em torno de 1500 (mil e quinhentos) contêineres numa única escala no terminal portuário, sendo que, deste total, cerca de 200 (duzentas) unidades são destinadas a um “porto seco” específico. Disso resulta a necessidade de segregação (separação dos contêine-res destinados especificamente ao “porto seco” daqueles destinados a outros terminais e usuários do porto) e posicionamento estratégico das unidades para fins de entrega prioritária ao terminal retroportuário solicitante.

Page 146: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

146 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Assim sendo, a segregação e entrega de contêineres, cuja operação não se confunde com a movimentação da carga e descarga de contêineres dos na-vios, caracteriza a prestação de um serviço portuário específico e individuali-zado, que gera custos operacionais e que implica a respectiva remuneração.

No entanto, o assunto tem demandado discussões acaloradas junto aos órgãos reguladores e tribunais brasileiros em procedimentos administrativos e ações judiciais promovidas pelos “portos secos”, que se insurgem contra a cobrança do “THC2” sob os argumentos de: (i) concorrência desleal entre ter-minais portuários e “portos secos”; (ii) inexistência de relação jurídica entre estes terminais; (iii) duplicidade de cobrança sob a alegação que os serviços de segregação e entrega de contêineres já estariam cobertos pelo “THC” cobrado junto ao armador, entre outras questões.

No início, as decisões proferidas pelos órgãos reguladores e tribunais eram conflitantes entre si, ora se entendendo pela impossibilidade da cobrança de “THC2”, ora pela legalidade da prática. Finalmente, após quase duas dé-cadas de discussões, os tribunais brasileiros parecem ter pacificado um enten-dimento jurisprudencial em torno desse tema. É o que se verifica, na medida em que as decisões mais recentes proferidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, Tribunal Regional Federal da 1ª Região e Tribunal Regional Federal da 3ª Região, convergem, todas, para um mesmo desfecho, conforme será analisado mais adiante.

REGULAMENTAÇÃO

A cobrança de “THC2” foi criada antes mesmo da Lei nº 8.630/1993, que estabeleceu a modernização dos portos. Na época, os terminais portuários eram explorados pelas autoridades portuárias, as quais exerciam a função de operadores portuários, realizando todas as movimentações dos contêineres e transferência destes para os terminais instalados na zona secundária.

No porto de Santos, essa função era exercida pela Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo), cuja autoridade portuária, responsável pelas operações portuárias nos portos do estado paulista, instituiu, em 14.07.1989, a cobrança da “Taxa nº 20 da Tabela M – Serviços Acessórios da tarifa no Porto de Santos”, para fins de remuneração em face dos serviços de “capatazia”, que era exatamente a segregação e entrega imediata de contêineres para os terminais e recintos alfandegados situados na zona secundária do porto.

Nesse contexto, algumas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo demonstram claramente que a “Taxa nº 20 da Tabela M” da Codesp foi criada para remunerar os serviços de segregação e entrega de contêineres para os terminais retroportuários, conforme se extrai dos arestos a seguir transcritos:

Page 147: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������147

Processual civil e tributário. Agravo regimental. Taxa de armazenagem portuária. Fixação de valor através de portaria. Legalidade. Precedentes. 1. [...] 2. Legali-dade da fixação de alíquotas da taxa de armazenagem portuária por meio de portaria ministerial, eis que se trata de preço público. Precedentes. 3. Agravo re-gimental improvido. (REsp 180.020/SP, Relª Min. Eliana Calmon, J. 06.06.2000, DJ 01.08.2000)

Repetição de indébito. Taxa M-20. Pretensão da autora referente à devolução de quantia paga a título de taxa M-20, devida para liberação de contêineres destinados aos terminais retroportuários alfandegados [...] possibilidade da Co-desp criar, após prévio juízo de oportunidade e conveniência, serviços especiais para agilizar a descarga direta de contêineres destinados aos TRAs [...] Tarifa aprovada pela Resolução nº 136/1989 cessando somente com a edição da Lei nº 8.630/1993, Lei de Modernização dos Portos, que ordenou a elaboração de nova estrutura de tarifária e retirou da ré os serviços de operação dos portos [...]. Recurso provido em parte. (1º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, Apelação nº 807.003-5, Rel. Joaquim Garcia, J. 20.09.2000)

Alguns anos depois, sobreveio a Lei de Modernização dos Portos (Lei nº 8.630/1993, revogada pela Lei nº 12.815, de 2013, que estabeleceu novos critérios para a exploração da atividade portuária), que estabeleceu o regime ju-rídico de exploração dos portos organizados e das instalações portuárias através de empresas privadas mediante contrato de arrendamento.

Com a modernização dos portos, as atividades até então desempenhadas pelas autoridades portuárias, como era o caso da Codesp no Porto de Santos, foram transferidas a empresas privadas, que assumiram a função de terminal portuário em regime de arredamento, passando a exercer as atividades de ope-rador portuário, controlando os píeres de atracação dos navios e ficando res-ponsáveis pelas movimentações de carga e descarga de contêineres, inclusive pelos serviços de segregação e entrega imediata destas unidades aos terminais retroportuários.

Posteriormente, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq, no uso das atribuições estabelecidas pela Lei nº 10.233, de 2001, editou a Re-solução nº 55-Antaq, de 16 de dezembro de 2002, conferindo às “autorida-des portuárias” a competência para regrar e arbitrar preços dos serviços por-tuários, zelar pela boa qualidade destes serviços, coibir práticas lesivas à livre concorrência na prestação dos serviços, entre outras atribuições (Resolução nº 55/2002-Antaq, Capítulo X, art. 44).

A Resolução nº 55/2002 foi posteriormente revogada, mas, em sucessivos atos normativos, a Antaq manteve a delegação de autonomia feita à autoridade portuária, atribuindo-lhe competência para fixar preços e fiscalizar a prestação dos serviços portuários, bem como os parâmetros regulatórios a serem observa-dos na prestação de serviços de movimentação e armazenagem de contêineres

Page 148: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

148 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

e volumes em instalações de uso público nos portos organizados, consoante os termos da Resolução nº 2389/2012, cabendo destacar o art. 9º:

Art. 9º O serviço de entrega de cargas na importação não faz parte dos serviços remunerados pela Box Rate, nem daqueles cujas despesas são ressarcidas por meio do THC, salvo previsão contratual em sentido diverso.

Parágrafo único. A Autoridade Portuária, quando for o caso, estabelecerá o preço máximo a ser cobrado por esses serviços.

Dessa forma, a Antaq delegou à autoridade portuária a competência para fixar preços e fiscalizar a prestação dos serviços portuários.

Tomando, por exemplo, o Porto de Santos, a Codesp regulamentou os valores relativos à prestação dos serviços de segregação e entrega de contêine-res, realizados pelos terminais portuários em favor dos terminais retroportuários naquele porto, consoante os termos da Direxe (Decisão da Diretoria Executiva da Codesp) nºs 371.2005 e 50.2006, cabendo transcrever termos da decisão Direxe nº 50.2006 para melhor ilustração:

A Diretoria Executiva da Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp, em sua 1219ª Reunião (ordinária) realizada em 31.01.2006; no uso da competência que lhe confere o art. 17 do Estatuto e ainda, considerando os termos da Decisão Direxe nº 371.2005, datada de 07.07.2005, bem como: 1) a Súmula Consad nº 184.2005, que revoga a Súmula Consad nº 112.2005, de 03.08.2005, que, deixou inclusive, a competência da matéria que trata do regramento referente à cobrança de “Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres” aos Terminais Retroportuários Alfandegados – TRAs, a critério exclusivo da Diretoria Executiva; 2) o parecer da Superintendência Jurídica – DPJ da Companhia, de 30.01.2006, ratificando o parecer jurídico datado de 05.07.2005, respaldado no art. 44, X, da Resolução nº 55, de 16.12.2002, da Agência Nacional de Transportes Aqua-viários – Antaq, com redação dada pela Resolução nº 126, de 13.10.2003, bem como a Lei nº 8.630/1993, notadamente no que se refere ao art. 4º, § 4º, VI; 3) o embasamento técnico contido na Folha de Informação de Diretoria Comer-cial e de Desenvolvimento – DC, datada de 18.01.2006, decide, por meio de Juízo Arbitral; a) determinar, “a partir desta data o valor máximo de R$ 123,03 (cento e vinte e três reais e três centavos), por contêiner, que poderá ser cobrado pelos Terminais Marítimos de Contêineres para transferência de carga conteineri-zada “não perigosa” para recintos alfandegados localizados na Baixada Santista, valor este que corresponde à atualização pelo IGPM acumulado no período entre 01.09.1995 a 31.05.2005, da “Taxa B da Tabela M”, cobrado pela Codesp e vigente no período de 01.09.1995 a 31.08.1996, podendo apenas ser somado a este valor o cálculo dos tributos inerentes à cobrança [...].

Com efeito, a regulamentação feita pela autoridade portuária, no caso do Porto de Santos pela Codesp, em relação à cobrança de tarifa de segregação e entrega de contêineres (“THC2”) representa ato jurídico perfeito, não havendo

Page 149: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������149

dúvidas acerca da legalidade da cobrança e dos valores praticados em relação a tais serviços.

Nesse aspecto, interessante destacar relevante trecho extraído de parecer elaborado pelo ilustre Professor Celso Antonio Bandeira de Mello, ao responder consulta sobre o tema em voga:

[...] se o operador portuário, por um serviço que realiza em prol de outrem, cobra valor módico, enquadrado dentro dos limites impostos pela própria “Autoridade Portuária” no exercício da competência que lhe é reconhecida com pertinente pela agência reguladora (Antaq), então é óbvio que está no exercício regular de um direito.

Isto tudo posto e considerado, às indagações da consulta respondo:

I – A Codesp tem competência para fixar a abrangência do SSE (tarifa de segre-gação) e o valor máximo de sua cobrança, a qual é, em si mesma, perfeitamente legítima.

NECESSÁRIA DISTINÇÃO ENTRE “THC” DO ARMADOR E “THC2”

Nas inúmeras discussões travadas nas esferas administrativa e judicial, os representantes dos interesses dos “portos secos” costumam alegar duplicidade na cobrança de “THC2” sob o argumento de que os serviços de segregação e entrega imediata de contêineres já estariam embutidos no “THC” cobrado junto ao armador do navio.

De primeiro, cabe registrar que uma confusão que se faz neste aspecto, na medida em que o “THC” cobrado junto ao armador refere-se unicamente às operações de carga e descarga de contêineres do navio. Ou seja, referem-se às operações de estiva e desestiva do navio. Já a cobrança realizada sob a rubri-ca “THC2” diz respeito aos serviços realizados pelos terminais portuários para segregação e entrega imediata de contêineres destinados aos terminais repor-tuários, o que, portanto, é um serviço individualizado, específico e totalmente destacado da operação de carga e descarga do navio.

Melhor esclarecendo, temos a seguinte distinção, quanto aos serviços relacionados ao “THC” do armador e aqueles que dão origem ao “THC2”:

THC = refere-se às operações de carga e descarga de navios e restringem-se às movimentações portuárias para retirada de contêineres do pátio do terminal por-tuário, mediante içamento da unidade através de aparelhos portuários, para em-barque no navio transportador. Isto ocorre também no sentido inverso, com a re-tirada de contêineres do navio transportador, mediante içamento, para descarga no pátio do terminal portuário de destino. Essa movimentação portuária de carga e descarga deu origem à tarifa denominada THC (Terminal Handling Charge), cobrada do carregador ou consignatário da carga pelo armador do navio. Trata-se de uma tarifa diretamente relacionada com o contrato de transporte.

Page 150: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

150 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

THC2 = nas operações de descarga, existem situações em que determinados con-têineres desembarcados de navios no terminal portuário de destino (“porto mo-lhado”) são requisitados por terminais retroportuários alfandegados – TRAs (“por-tos secos”), os quais, apesar de serem alfandegados, estão localizados fora da faixa do cais, e para onde devem ser trasladados. Embora esses contêineres sejam descarregados no terminal portuário em que o navio transportador foi atracado, estas unidades não permanecem armazenadas naquele local, pois são redirecio-nadas a um terminal retroportuário, onde permanecerão armazenadas até o res-pectivo desembaraço aduaneiro e efetiva entrega ao importador. Nesses casos, a cada de escala de navio, o terminal retroportuário faz um pré-agendamento para a retirada de contêineres no terminal portuário, indicando quantos e quais contê-ineres serão retirados. Para atender a tal solicitação, o terminal portuário executa o serviço de segregação (que consiste na separação e organização de contêineres de acordo com o terminal retroportuário que lhe é destinado), bem como realiza todos os procedimentos necessários para a entrega destes contêineres até a co-locação a bordo do caminhão do terminal retroportuário, o que implica presta-ção de serviços de movimentação interna das unidades através de equipamentos portuários, inclusive o uso de guindastes, controle e alimentação de sistemas de fiscalização de entrada e saída de unidades de contêineres naquele recinto alfan-degado, entre outros procedimentos. Estes serviços, inerentes à segregação, sepa-ração e entrega de contêineres gera a cobrança de tarifa denominada “THC2” ou “SSE”.

Neste sentido, já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:

[...] Com o advento de tais mudanças decorrentes da privatização das atividades desenvolvidas no Porto Organizado de Santos, a “taxa de capatazia” passou a ser denominada de THC (“Terminal Handling Charge”), também conhecida como “THC do armador”, e os serviços prestados pela Codesp, atinentes à segregação e entrega de contêineres aos terminais retroportuários, continuaram sendo pres-tados e cobrados pelos operadores portuários privados.

[...]

Verifica-se, com esses esclarecimentos fáticos, que o serviço de segregação de contêineres para outros terminais alfandegados não se confunde com serviços de capatazia.

[...]

Para imprimir essa celeridade, os terminais “molhados” passaram a prestar o ser-viço de segregação de cargas, entregando-as no terminal alfandegado contratado pelo importador, pois não podem esperar que ele retire os contêineres na data que quiser.

[...]

Por se tratar a segregação de uma nova etapa de trabalho, que requer dispo-nibilização de maquinário, mão de obra e tempo extra, criou-se a THC2 para remunerá-la, ou seja, uma taxa totalmente independente da THC paga pelo arma-

Page 151: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������151

dor. (TJSP, AC 9139157-20.2009.8.26.0000, 37ª CDPriv., negaram provimento ao recurso, v.u., DJe 26.03.2012)

Neste mesmo sentido é o posicionamento da Antaq a respeito da matéria, conforme se extrai do julgamento do Processo Administrativo nº 50300.00159/2002:

Trata o presente acórdão do exame do pedido de reconsideração requeri-do pela empresa Marimex Despachos, Transportes e Serviços Ltda., CNPJ nº 45.050.663/0001-59, com sede na Rua Xavier Pinheiro, nº 23, Macuco, Santos/SP, contra a decisão da Diretoria Colegiada que, em sessão pública rea-lizada em 17 de fevereiro de 2005, deliberou, por meio de acórdão datado de 17.02.2005, publicado no DOU 01.03.2005:

a) considerar que os serviços de segregação e entrega de contêineres pelos ope-radores portuários aos recintos alfandegados existem, geram custos adicionais não cobertos pela THC – Terminal Handling Charge do armador e, em conse-quência, sua cobrança afigura-se justificada;

b) não há na conduta descrita nos autos indícios de infração à ordem econômica, nos termos das Leis nºs 8.884/1994 e 10.233/2001; e

c) determinar o arquivamento do processo administrativo, dando-se ciência ao Conselho Administrativo de Atividade Econômica – Cade. (Antaq, Processo Administrativo nº 50300.00159/2002, DOU 10.05.2010)

Desse modo, não há que se falar em duplicidade na cobrança de tais ser-viços, porquanto o “THC” do armador e o “THC2” são tarifas relativas a serviços totalmente distintos, sendo que um começa onde o outro termina.

INEXISTÊNCIA DE CONCORRÊNCIA DESLEAL

Outro ponto que tem gerado bastante polêmica diz respeito a uma pos-sível concorrência desleal entre os terminais (portuários e portuários) em razão da tarifa cobrada a título de “THC2”.

Inicialmente, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) analisou o assunto em face de denúncia formulada por um terminal retropor-tuário sob a alegação de concorrência desleal decorrente da cobrança de “THC2” realizada pelos terminais portuários.

Na ocasião, decidiu o Cade que a cobrança de “THC2” configuraria con-corrência desleal entre os terminais, sob o entendimento de que tal prática cau-saria desequilíbrio na atuação destas empresas junto aos clientes, na medida em que os terminais retroportuários estão sujeitos ao pagamento de valores extras, incorridos com a segregação e entrega imediata de contêineres realizada pelos terminais “molhados”, conforme acórdão exarado nos autos do Processo Admi-nistrativo nº 08012.007443/99-17, no ano de 2005.

Page 152: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

152 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Com base nesse entendimento, o Cade houve por bem julgar ilegal e abusivo o “THC2”, determinando a suspensão imediata da cobrança sob pena de multa e outras penalidades.

Entretanto, mais recentemente, os Tribunais Regionais Federais da 1ª e 3ª Região decidiram que o Cade não está investido de competência para delibe-rar sobre tarifas portuárias, de modo que as decisões administrativas até então proferidas por aquele órgão administrativo são totalmente nulas, na medida em que invadiram a competência exclusiva da Antaq, cuja agência reguladora é a única responsável por deliberar sobre a matéria, bem como por fiscalizar e coibir eventual prática abusiva na cobrança de tarifas portuárias:

Administrativo. Tributário. Cade. Exigibilidade da taxa de segregação e entrega de contêineres (THC-2 – Terminal Handling Charge). Ilegitimidade passiva da União Federal. Condenação do assistente litisconsorcial em honorários sucum-benciais. Possibilidade.

[...] No caso do poder concedente, o certo é que, estando a Codesp a fiscalizar e fixar valores para esse serviço complementar, não é dado ao Cade efetivamente, como alinhavado pela recorrente autora, imiscuir-se em setor concedido, igno-rando fortemente a atuação da agência reguladora Antaq. (TRF 3ª R., Apelação nº 0014995-56.2005.4.03.6100/SP, Relª Desª Fed. Marli Ferreira, J. 16.03.2015)

Administrativo. Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade. Processo administrativo. Ofensa ao direito de livre concorrência. Porto de Santos/SP. Ope-radores portuários. Terminais retroportuários alfandegados. Serviços de segrega-ção e entrega de contêineres. Cobrança de taxa. Resolução Antaq nº 2.389/2012. Legalidade. Nulidade de decisão administrativa.

I – Na espécie, a pretensão recursal não merece prosperar, tendo em vista que restou demonstrado que não há ofensa ao direito à livre concorrência pela co-brança pela autora, na qualidade de arrendadora do terminal portuário nº 37 do Porto de Santos/SP, do serviço de segregação e entrega de contêineres (TSE – Taxa de Segregação e Entrega, TLC – Taxa de Liberação de Contêiner ou THC2 – Terminal Handling Charge 2) aos terminais retroportuários alfandegados, notada-mente porque tal serviço somente pode ser prestado pelos operadores portuários. Haveria possibilidade de concorrência somente quanto ao serviço de armaze-nagem e desembaraço aduaneiro, que pode ser prestado tanto por operadores portuários como por terminais alfandegados, desde que fosse cobrado mais caro dos recintos alfandegados pelo serviço de segregação e entrega, o que não se ve-rificou na hipótese dos autos, uma vez que, desde 2005, o serviço possui o preço tabelado. Ademais, restou caracterizado que o serviço de segregação e entrega é oneroso e autônomo dos serviços prestados pelos armadores, a justificar a co-brança da taxa questionada.

II – Não há que se falar, ainda, em violação à competência do Cade, nem mesmo em impossibilidade de anulação de sua decisão. Isso porque, na espécie, preva-lece a competência da Antaq (sem eliminar a do Cade), com a regulamentação que lhe é inerente, que autoriza a incidência da THC2. Por outro lado, inexiste

Page 153: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������153

qualquer impedimento ao conhecimento da matéria pelo Poder Judiciário, cuja atuação não está limitada à averiguação de nulidades no processo administrativo, mas também diz respeito ao exame do objeto do procedimento, na medida em que não é possível excluir da apreciação judicial lesão ou ameaça de lesão aos direitos da autora (Constituição Federal, art. 5º, XXXV). Não se trata de interferên-cia no mérito administrativo, conforme alega o Cade, tendo em vista que aquele se refere à margem de liberdade conferida pela lei, dentro da qual o adminis-trador, segundo critérios de conveniência e oportunidade, decide entre duas ou mais soluções admissíveis, o que não ocorre na espécie. No caso, a intervenção judicial é legítima porquanto a decisão administrativa se encontra em descom-passo com a legislação de regência.

III – No que tange à Resolução Antaq nº 2.389/2012, não prospera a alegação de que usurpa a competência do Cade ou que teve o condão de anular a decisão do Cade, uma vez que apenas estabelece, no âmbito de seu poder regulamentar, parâmetros regulatórios a serem observados na prestação dos serviços de mo-vimentação e armazenagem de contêineres e volumes, em instalações de uso público, nos portos organizados. O afastamento da decisão do Cade, por sua vez, fundamentou-se nos motivos anteriormente expostos, sendo que a referida norma legal foi utilizada como reforço argumentativo no sentido da legitimidade da cobrança da Taxa de Segregação e Entrega. Assim, não há que se falar em cobrança da THC2 somente a partir de 2012, haja vista que tal cobrança não está justificada apenas na Resolução Antaq nº 2.389/2012.

IV – Remessa oficial e apelação desprovidas. (TRF 1ª R., Apelação nº 2005.34.00.037482-6/DF, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, J. 21.10.2015)

Como se vê, a decisão administrativa proferida pelo Conselho Adminis-trativo de Defesa Econômica – Cade, no ano de 2005, foi declarada totalmente nula pela Justiça. De outro lado, na medida em que a Antaq, agência respon-sável por fiscalizar e coibir práticas abusivas na exploração das atividades por-tuárias, já regulamentou a tarifa em debate, não há de se falar em concorrência desleal decorrente da cobrança de “THC2”.

COMPORTAMENTO DA JURISPRUDÊNCIA E CONCLUSÃO

No início, a jurisprudência em torno do tema era bastante dividida, muito por conta dos reflexos produzidos pela decisão administrativa proferida pelo Cade no ano de 2005, aqui já comentada, que era totalmente contrária à co-brança de “THC2”, o que acabou por provocar algumas decisões judiciais no mesmo sentido.

Em 2008, por exemplo, a 29ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu pela ilegalidade da cobrança, em acórdão lastrea-do na então recente decisão proferida pelo Cade:

Apelação. Ação declaratória de inexistência de relação jurídica. Relação entre operadora de porto organizado e terminal retroportuário alfandegado (“terminal

Page 154: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

154 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

seco”). Inexistência de prestação de serviços. Os serviços que a operadora alega prestar ao “terminal seco” estão incluídos na atividade de “capatazia” e são re-muneradas pela THC (“Terminal Handling Charge”), que é paga pelo armador, o que age por conta do importador. Destinatário dos serviços realizados pela operadora portuária é o importador e não o recinto retroportuário. Ausência de manifestação de vontade, expressa ou tácita, que justifique relação obrigacional entre as partes. Recurso da autora provido, para declarar a inexistência de rela-ção jurídica entre a operadora portuária e o recinto retroportuário, prejudicado o apelo da ré. (TJSP, Apelação c/ Revisão nº 972736-0/1, 29ª CDPriv., Rel. Des. Pereira Calças, J. 24.09.2008)

Em 2012, no entanto, passaram a surgir decisões no sentido inverso, en-tendendo-se por inexistir duplicidade na cobrança e nem mesmo ofensa à livre concorrência. Neste sentido, a decisão mais emblemática foi proferida pela 37ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça paulista, que julgou legítima a cobrança praticada pelos terminais portuários sob a rubrica “THC2”. A decisão representa o primeiro contraponto ao entendimento manifestado pelo Cade:

Ação civil pública. Tarifa de segregação e entrega de contêineres – THC2. Não configuração de ofensa à livre concorrência, à ordem econômica e aos consu-midores. R. sentença mantida. Adstrito exclusivamente aos elementos constantes dos autos, infere-se que a cobrança da tarifa de segregação e entrega de con-têineres, conhecida como THC2, não configura ofensa à livre concorrência, à ordem econômica e aos consumidores. Cobrança que remete à período anterior à privatização do Porto Organizado de Santos, em que a Codesp atuava direta-mente na movimentação e entrega de contêineres aos recintos alfandegados, não se tratando, assim, de criação dos operadores portuários privados – autoridade portuária incumbida de coibir práticas lesivas à livre concorrência concebe a cobrança da THC2 como legítima, inclusive regulando e fiscalizando os preços cobrados dos recintos alfandegados. Não configuração de ofensa aos preceitos da Lei nº 8.884/1994, nem lesão a interesses difusos. R. sentença mantida. Recur-so não provido. (TJSP, AC 9139157-20.2009.8.26.0000, 37ª CDPriv., Rel. Des. Roberto Mac Cracken, negaram provimento ao recurso, v.u., J. 09.02.20125, DJe 26.03.2012)

Como já mencionado, mais recentemente, os Tribunais Regionais Fe-derais da 1ª e 3ª Regiões decidiram que a competência para regulamentar e deliberar sobre a matéria é exclusiva da Antaq e que as decisões proferidas pelo Cade sobre o tema são totalmente nulas. Na ocasião, os referidos tribunais decidiram pela legitimidade da cobrança:

Administrativo. Tributário. Cade. Exigibilidade da taxa de segregação e entrega de contêineres (THC-2 – Terminal Handling Charge). Ilegitimidade passiva da União Federal. Condenação do assistente litisconsorcial em honorários sucum-benciais. Possibilidade. (TRF 3ª R., Apelação nº 0014995-56.2005.4.03.6100/SP, Relª Desª Fed. Marli Ferreira, J. 16.03.2015)

Page 155: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������155

Administrativo. Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade. Proces-so administrativo. Ofensa ao direito de livre concorrência. Porto de Santos/SP. Operadores portuários. Terminais retroportuários alfandegados. Serviços de segregação e entrega de contêineres. Cobrança de taxa. Resolução Antaq nº 2.389/2012. Legalidade. Nulidade de decisão administrativa. (TRF 1ª R., Ape-lação nº 2005.34.00.037482-6/DF, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, J. 21.10.2015)

As decisões proferidas pelos TRFs da 1ª e 3ª Regiões lançaram uma ver-dadeira pá de cal sobre a hipotética competência do Cade para deliberar sobre a matéria e rechaçaram fortemente o argumento de duplicidade da cobrança e de concorrência desleal.

Demais disso, as decisões proferidas no âmbito da Justiça Federal abri-ram caminho para a consolidação da jurisprudência, o que se observa diante dos últimos julgamentos proferidos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em outubro de 2016, abril e maio de 2017:

Serviços de segregação e entrega de contêineres. Cobrança de tarifa denominada THC2. Tarifa que não se confunde com aquela denominada THC. Legitimidade reconhecida pelas autoridades regulatória e administrativa (Antaq/Codesp). De-cisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade, que determinou a cessação da cobrança, declarada nula pela Justiça Federal. Legalidade da tarifa reconhecida pela Justiça Federal e por esta egrégia Corte. (TJSP, AC 1001108-25.2014.8.26.0562, 23ª CDPriv., Rel. Des. Sebastião Flávio, J. 05.10.2016, de-ram provimento ao recurso da ré e negaram provimento ao recurso adesivo da autora, v.u.)

Ação declaratória de inexigibilidade de débito. Cobrança de THC2; tarifa de ser-viços de segregação, empilhamento e entrega de contêineres no porto seco. Ino-corrência de cobrança em duplicidade, abusiva ou violadora do direito da con-corrência. Tarifa gerada em razão de serviço adicional visando à celeridade no desembaraço aduaneiro. Precedentes. Recurso improvido. (TJSP, AC 1011405-91.2014.8.26.0562, 23ª CDPriv., Rel. Des. J. B. Franco de Godoi, J. 26.04.2017, negaram provimento ao recurso, v.u.)

Ação anulatória de atos normativos da Diretoria Executiva da Codesp. Serviço de segregação e entrega de contêineres. Decisões Direxe nºs 371.2005 e 50.2006 que limitaram valor máximo a ser cobrado de encargo denominado “THC2” (Terminal Handling Charge) pelos terminais portuários. Atividade confiada à autoridade portuária Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) por delegação da União Federal, cabendo à administração do porto e a implemen-tação de diretrizes advindas da agência reguladora (art. 21, XII, f, da CRFB e Lei nº 12.815/2013). Limitação de valor máximo a ser cobrado a título de movi-mentação de contêiner que é providência favorável aos próprios terminais retro-portuários. Competência regulatória da Codesp ratificada pela própria Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). Serviços prestados aos terminais retroportuários que se diferenciariam do atualmente remunerado pela THC, ou mesmo da atividade de capatazia. Serviços prestados pelos operadores portuários

Page 156: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

156 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA

entre a pilha comum e o portão do terminal indispensáveis para a liberação da carga (zona secundária). Art. 9º da Resolução da Antaq nº 2.389/2012. Decisões no âmbito da Justiça Federal que, além de reconhecerem a diferenciação do serviço, afastaram violação da livre concorrência. Existência de relação jurídi-ca entre as partes. Desnecessidade de contrato escrito. Serviço que é agregado ao transporte e inclusive repassado aos clientes. Resolução nº 2.389/2012 da Antaq vigente e aplicável à espécie. Impugnação administrativa regularmente exercida no âmbito da Antaq (Acórdão nº 13/2010-Antaq). Atos normativos da Diretoria Executiva que se encontram em perfeita harmonia com normatização sobre o tema, não estando eivado de qualquer nulidade. Recurso improvido, com autorização de levantamento pelas operadoras (assistentes litisconsorciais) dos depósitos já efetivados nos autos, nos termos do voto do eminente 3º Juiz Maurício Pessoa, conforme declaração de voto em separado. (TJSP, AC 0009820-26.2011.8.26.0562, 14ª CDPriv., Relª Desª Lígia Araújo Bisogni, J. 24.05.2017, por maioria de votos, negaram provimento ao recurso)

Como se pode ver, as decisões proferidas desde o ano 2015 até o pre-sente momento são uniformes, todas convergindo no sentido de que é legítima a cobrança de “THC2” para fins de remuneração dos serviços de segregação e entrega imediata de contêineres realizados pelos terminais portuários em favor dos terminais retroportuários instalados na zona secundária do porto. Assim, tendo em vista o entendimento reiterado no Judiciário federal e estadual, é pos-sível se dizer que a jurisprudência consolidou e pacificou entendimento de que é legítima a cobrança de “THC2”.

Em última análise, considerando a jurisprudência agora já pacificada nos nossos tribunais, bem como o posicionamento da própria Antaq, agência responsável por regulamentar e fiscalizar a tarifa, pode-se concluir segura-mente que: (i) é legítima a cobrança de “THC2” sob o amparo da Resolução nº 2.389/2012, da Antaq; (ii) não há duplicidade na cobrança, sendo que “THC” e “THC2” são tarifas totalmente distintas; (iii) a cobrança de “THC2” não impli-ca concorrência desleal entre os terminais portuários e retroportuários; (iv) há evidente relação jurídica entre os terminais, que solicitam, um ao outro, a trans-ferência de contêineres em caráter prioritário, independentemente de existir ou não contrato escrito; (v) as decisões proferidas pelo Cade são totalmente nulas, na medida em que extrapolam os limites de competência do referido órgão.

REFERÊNCIAS ANJOS, J. Haroldo dos; GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992.

AZEREDO SANTOS, Theophilo. Direito da navegação (marítima e aérea). Rio de Janeiro: Forense, 1964.

BRUNETTI, Antonio. Trattato di diritto marittimo. Versão espanhola de J. Gay Montellá. Barcelona: Bosch, 1950.

Page 157: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������157

CASTRO JÚNIOR, Osvaldo Agripino de (Coord.). Direito marítimo: temas atuais. Belo Horizonte: Fórum, 2012.

CREMONEZE PACHECO, Paulo Henrique (Coord.). Temas de direito do seguro e direi-to dos transportes. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2010.

DANJON, Daniel. Tratado de derecho marítimo. Madrid: Reus, 1931.

DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 11. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, v. 12, 1964.

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. 3. ed. São Paulo: Renovar, 2014.

JÚDICE, Mônica Pimenta. O direito marítimo no Código de Processo Civil. Salvador: JusPodivm, 2015.

OCTAVIANO MARTINS, Eliane M. Curso de direito marítimo. São Paulo: Manole, v. I, 2005.

______. Curso de direito marítimo. São Paulo: Manole, v. II, 2008.

______. Curso de direito marítimo – Contratos e processos. São Paulo: Manole, v. III, 2015.

______; OLIVEIRA, Paulo Henrique Reis de. Direito marítimo e portuário. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2017.

PIMENTA, Matusalem Gonçalves. Processo marítimo. 2. ed. São Paulo: Manole, 2013.

______. Responsabilidade civil do prático. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

PIPIA, Umberto. Trattato di diritto marittimo. Milano: Milano Soc. Ed. Libraria, v. I, 1901.

RIPERT, Georges. Compêndio de derecho marítimo. Trad. Pedro G. San Martén. Buenos Aires: Tipografia Editora Argentina, 1954.

ROCHA, Nara Rejane Moraes da. Responsabilidade civil do operador portuário. São Paulo: Aduaneiras, 2014.

SILVA FILHO, Nelson Cavalcante; WARDE JR., Walfrido Jorge; BAYEUX NETO, José Luiz (Org.). Direito marítimo e portuário: novas questões. São Paulo: Quartier Latin, 2013.

SAMMARCO, Osvaldo; SAMMARCO, Marcus Vinicius. A fenomenologia do direito marítimo: a unidade do direito marítimo. Visão Jurídica, Ceuban, a. 4, n. 4, 2003.

SAMPAIO DE LACERDA, J. C. Curso de direito privado da navegação. 3. ed. São Paulo: Liv. Freitas Bastos, v. 1, 1984.

SCIALOJA, Antonio. Corso di diritto della navigazione. [s.l.]: Soc. Ed. del Foro Italiano, 1945.

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

TALLEDA, Hector A. Schuldreich. Derecho de la navegación. 4. ed. Buenos Aires: Cooperadora de Derecho y Ciencias Sociales, 1963.

VERÇOSA, Fabiane. Arbitragem e seguros: transmissão da cláusula compromissória à seguradora em caso de sub-rogação. Revista Brasileira de Arbitragem, IOB, n. 11, 2006.

Page 158: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

2824

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoReexame Necessário nº 0012421‑11.2010.4.01.3200/AM

ementaADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA – ABANDONO OU APREENSÃO DE CARGA – RETENÇÃO DE CONTÊINER – DESCABIMENTO – LEI Nº 9.611/1998, ART. 24, PARÁGRAFO ÚNICO

1. Nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 9.611/1998, a unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.

2. Uma vez que a unidade de carga não se confunde com a mercadoria transportada, é indevida a retenção da primeira na hipótese de abandono ou apreensão da segunda.

3. Remessa oficial a que se nega provimento.

acórdãO

Decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do voto da relatora.

Brasília/DF, 3 de abril de 2017.

Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso Relatora

relatóriO

A Exma. Sra. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso (Relatora):

Trata-se de remessa oficial da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas, que concedeu a segurança impetrada por CMA CGM Societé Anonymé, para determinar à autoridade coatora que adote os procedimentos necessários ao esvaziamento das unidades de carga (contêineres) AMFU1415730, ECMU4384895, INBU5261074, ECMU1838633 e ECMU2236965, e sua imediata devolução à impetrante.

Page 159: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������159

O representante do Ministério Público Federal apresentou parecer pelo não provimento da remessa necessária.

É o relatório.

vOtO

A Exma. Sra. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso (Relatora):

O art. 24 da Lei nº 9.611/1998, que dispõe sobre o Transporte Multimodal de Cargas e dá outras providências, define como unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso. O parágrafo único do referido artigo, por sua vez, estabelece que a unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.

Defende a impetrante, com fundamento nos dispositivos acima transcritos, ser indevida a retenção de seus contêineres nas situações em que as mercadorias neles acondicionadas foram apreendidas pela autoridade alfandegária ou abandonadas pelo importador.

Acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que inexiste amparo legal para a apreensão de contêineres nas hipóteses de apreensão ou abandono de carga (REsp 1056063, DJe de 01.09.2010, REsp 1049270/SP, DJe de 22.09.2008, e AgRg-AI 949019/SP, DJe de 19.08.2008).

O mesmo entendimento tem sido adotado nos Tribunais Regionais Federais das 1ª, 2ª a 5ª Regiões, conforme se depreende dos seguintes julgados, cujas ementas transcrevo:

ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – ABANDONO DE CARGA – DESUNITIZAÇÃO DE CONTÊINER – ART. 24, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 9.611/1998 – POSSIBILIDADE

1. Nos termos do art. 24, parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998, a unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.

2. É indevida a retenção do contêiner do impetrante – em decorrência de abandono da mercadoria pelo importador –, pois sua finalidade é a realização de transporte de cargas, uma vez que não há identidade entre o contêiner e sua carga, tampouco a existência de relação de acessoriedade entre eles para fins de perdimento.

Page 160: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

160 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

3. Remessa oficial a que se nega provimento.

(TRF 1ª R., REENEC 0029922-07.2013.4.01.3900/PA, minha relatoria, 8ª T., e-DJE1 de 01.03.2017)

ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – ADUANEIRO – DESUNITIZAÇÃO DE CARGA E DEVOLUÇÃO DOS CONTÊINERES – APELA-ÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS

1. Cinge-se a discussão posta à baila quanto à legalidade do ato de retenção de contêiner de propriedade da Impetrante, tendo em vista o apreendimento/abandono das mercadorias contidas em seus interiores pelo Importador.

2. O contêiner não é acessório da mercadoria transportada, razão pela qual não se sujeita à pena de perdimento, a qual é aplicável somente à mercadoria abandonada. Dispõe o art. 24 da Lei nº 9.611/1998 que os contêineres enquadram-se no conceito jurídico-legal de unidades de carga.

3. Estando os bens sujeitos à pena de perdimento, a responsabilidade pelo acautelamento dos produtos abandonados pertence ao Poder Público, consoante previsão do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e Decreto nº 6.759/2009, não sendo cabível a transferência de tal ônus à transportadora, por prazo indeterminado, vez que para o regular desenvolvimento de suas atividades comerciais necessita do equipamento apreendido. Precedentes jurisprudenciais.

4. Cabe ao Poder Público a desunitização do contêiner, não obstante tenha delegado tal função à empresa contratada (TRF 2ª R., 8ª T.Esp., AC 201251010424477, Relª Desª Fed. Vera Lucia Lima, DJ 22.05.2013, unânime).

5. Não pode a Impetrante ter sua propriedade privada em decorrência de omissão do Importador, que não efetuou o despacho aduaneiro, visto que os óbices que recaiam sobre a mercadoria abandonada não podem atingir o direito de reassunção do contêiner pela empresa transportadora.

6. Apelação e Remessa Necessária desprovidas.

(TRF 2ª R., Ap-Reex 00882221320164025101, Rel. Des. Fed. Guilherme Diefenthaeler, e-DJF2 de 05.12.2006)

DIREITO ADMINISTRATIVO – DIREITO ADUANEIRO – PERDIMENTO DE CARGA – RETENÇÃO DE CONTÊINER – IMPOSSIBILIDADE

1. Consolidada a jurisprudência no sentido de que mera unidade de carga não se confunde com as mercadorias nela transportadas, sendo inviável a retenção de contêiner por fato relativo a procedimento de internação ou fiscalização aduaneira, por responsabilidade exclusiva do importador.

2. Agravo de instrumento provido.

(TRF 3ª R., AI 00108945420164030000, Rel. Des. Fed. Carlos Muta, e-DJF3 de 28.10.2016)

Page 161: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������161

TRIBUTÁRIO – ADUANEIRO – MERCADORIAS SUJEITAS AO PERDIMENTO – RETENÇÃO DE CONTÊINER – UNIDADE DE CARGA – IMPOSSIBILIDADE

Há expressa disposição legal (art. 24, e parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998) equiparando os contêineres a unidades de carga e, como tal, não podem ser confundidos com as mercadorias neles acondicionadas, pelo que não se submetem ao tratamento jurídico a elas conferido quando do desembarque no porto de destino. É que os contêineres prestam-se ao transporte de produtos, encerrando uma existência autônoma, e não uma relação de acessoriedade com aqueles. Precedentes.

(TRF 4ª R., Ap 200770080013906, Rel. Des. Fed. Eduardo Vandré Oliveira Lema Garcia, DJ de 11.11.2010)

ADMINISTRATIVO – MERCADORIA ABANDONADA EM PORTO PELA EM-PRESA IMPORTADORA – REQUERIMENTO DA EMPRESA TRANSPORTADORA DE DESUNITIZAÇÃO – CABIMENTO

Trata-se de remessa oficial e de apelação da Fazenda Nacional contra sentença que concedeu a segurança requerida para determinar que a autoridade coatora adote as medidas necessárias à desunitização e devolução dos contêineres nºs CMAU5068651 e CMAU6002068 pertencentes à empresa impetrante.

Nos casos em que uma empresa importadora abandona mercadoria, ao não iniciar o despacho de importação no prazo de 90 (noventa) dias após a descarga em recinto alfandegário (art. 642, Decreto nº 6.759/2009), não pode a empresa transportadora ser penalizada com a privação de seus contêineres, que devem ser utilizadas apenas para transportar a carga importada, não para armazenamento desta no depósito da Alfândega.

Caberia à autoridade alfandegária ter iniciado o procedimento para aplicação da pena de perdimento da mercadoria abandonada (art. 689, XXI, Decreto nº 6.759/2009), mais um motivo para considerar indevida a retenção das unidades de carga da empresa transportadora.

[...]

(TRF 5ª R., Ap-Reex 00117400620124058100, Rel. Des. Fed. José Eduardo de Melo Vilar Filho, DJe de 25.03.2013)

Uma vez que o entendimento adotado pela sentença não divergiu da expressa disposição da lei, nem da jurisprudência consolidada sobre o tema, nego provimento à remessa oficial.

É como voto.

Page 162: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

2825

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Criminal nº 2005.51.08.001024‑2Nº CNJ: 0001024‑97.2005.4.02.5108Relator: Desembargador Federal Antonio Ivan AthiéApelante: Ministério Público FederalApelado: Holger Bernd Warner‑MaglioliAdvogados: Carolyne Albernard Gomes e outroApelado: Wallace Leite NogueiraAdvogado: Adriano Cardoso CunhaOrigem: 1ª Vara Federal de São Pedro da Aldeia/RJ

ementaPENAL – APELAÇÃO CRIMINAL – OBSTACULIZAÇÃO DE AÇÃO FISCALIZADORA DO IBAMA – INOCORRÊNCIA – EXISTÊNCIA DE DETERMINAÇÕES CONFLITANTES DA MARINHA DO BRASIL E DA AUTARqUIA AMBIENTAL – RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO

1. A existência de conflito de competência entre a Capitania dos Portos e a direção da Reserva Extrativista Marinha (Ibama) levou a um cenário de incerteza sobre qual o procedimento a ser adotado, em razão das orien-tações divergentes emitidas tanto pela Marinha do Brasil quanto pela au-tarquia ambiental.

2. Essa controvérsia teve vulto suficiente para causar dúvidas, nos apela-dos, a respeito da eventual ilicitude de seus atos.

3. Recurso ministerial ao qual se nega provimento. Sentença absolutória mantida.

acórdãO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Membros da Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, em negar provimento ao re-curso, nos termos do Voto do Relator.

Rio de Janeiro, 31 de maio de 2017 (data do Julgamento).

Antonio Ivan Athié Desembargador Federal Relator

Page 163: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������163

relatóriO

Trata-se de apelação criminal do Ministério Público Federal, em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Federal de São Pedro da Aldeia/RJ, que absolveu os apelados Holger Bernd Warner-Maglioli e Wallace Nogueira, da imputação do art. 69, da Lei nº 9.605/1998, nos termos do art. 386, VI, do Có-digo de Processo Penal.

Segundo a exordial acusatória e seu aditamento, folhas 02-A/02-E e 176/177, Holger Bernd Warner-Maglioli, Capitão da Marinha Mercante Alemã no comando da embarcação “Sea Way Harrier”, e Wallace Nogueira, marinhei-ro, teriam obstaculizado uma ação de fiscalização do Ibama, em 19.08.2003, que visava verificar o livro de óleo do navio e a existência de bioincrustação no casco do barco.

Na ocasião, o segundo apelado, seguindo ordens do primeiro, informou a um dos fiscais do Ibama, pelo rádio, que “O Agente da Capitania dos Portos de Cabo Frio, o Capitão Tenente Luiz Alberto Campos da Silva, está esperando você vir a bordo para proceder sua prisão” (folha 37 do IPL em apenso).

Os fiscais do Ibama também foram impedidos de subir a bordo do “Sea Way Harrier” em 25.01.2005, quando o primeiro apelado, Holger Bernd Warner-Maglioli, agindo sozinho, impediu seu acesso à embarcação.

A denúncia atribuiu a Holger Bernd Warner-Maglioli (duas vezes) e Wallace Nogueira (uma vez), a conduta do art. 69, da Lei nº 9.605/1998.

Na sentença, folhas 481/493, o Juízo absolveu os acusados, nos termos do art. 386, VI, do Código de Processo Penal, por entender ter ocorrido erro de tipo, eis que agiram sem saber da ilicitude dos fatos.

Em seu recurso de apelação, folhas 497/501, o Ministério Público Federal sustenta que os denunciados obstaculizaram, de forma consciente e voluntária, a ação de fiscalização do Poder Público no trato de questões ambientais, ao não permitir a entrada dos fiscais do Ibama na embarcação, estando presentes a autoria e a materialidade delitivas. Pede a reforma da sentença, a fim de que eles sejam condenados.

Contrarrazões de Holger Bernd Warner-Maglioli e Wallace Nogueira, fo-lhas 504/506 e 507/510, pedindo o desprovimento do recurso.

A Procuradoria Regional da República, em seu parecer, folhas 522/525, opinou pelo provimento do recurso ministerial.

Corrija-se na autuação o nome da advogada do primeiro acusado, para “Carolyne Albernard”.

É o Relatório. À Douta Revisão.

Page 164: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

164 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Rio de Janeiro, de de 2017.

Antonio Ivan Athié Desembargador Federal Relator

vOtO

Conheço do recurso, eis que presentes seus pressupostos.

Depreende-se do depoimento judicial da testemunha de acusação Fabio Franco da Costa Fabiano, Fiscal do Ibama à época dos fatos, que a criação de normas prevendo o preenchimento prévio de um pedido de autorização para entrada e fundeio de embarcações no interior da Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo/RJ levou a um conflito de competência entre a Marinha do Brasil e o Ibama (DVD de folha 474).

A referida testemunha afirmou ser coautor dessas normas (veiculadas através do Ofício Circular nº 001/2003, de 24.06.2003 – folhas 115/116 do apenso III), o qual previa que as embarcações que desejassem adentrar a Re-serva Extrativista deveriam responder a um questionário, apontando qual a tinta usada na pintura da parte molhada da embarcação, para que fosse avaliado pela autarquia se aquele navio poderia adentrar ou não a Unidade de Conservação. Caso lhe fosse permitida a entrada, caberia ao Ibama efetuar, em seguida, o exame de bioinscrustação (acúmulo de micro-organismos, plantas, algas e ani-mais sobre as estruturas molhadas de embarcações, que estava causando danos à fauna e flora marinhas locais).

A referida testemunha também confirmou que a Capitania dos Portos sempre entendeu que a autorização de entrada na Reserva Extrativista era com-petência da Marinha do Brasil e não do Ibama. Acrescentou que diversas em-presas foram insufladas pela Agência Nogueira, a não respeitar a legislação do Ibama, “por ser competência da Marinha” (DVD de folha 474).

Não se questiona a competência do Ibama para realizar a fiscalização em embarcações adentrando Unidades de Conservação. No entanto, a criação de normas, mediante Ofício Circular, parece extrapolar a competência dos então responsáveis pela Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo/RJ, o que não passou despercebido pela Procuradoria Federal Especializada junto ao Ibama, em parecer cujo trecho transcrevo (folhas 182/183 do apenso III):

“Pois bem. A Reserva Extrativista de Arraial do Cabo/RJ, porque anterior a esse Decreto, não tem limites claros. Também não indica as atividades econômicas e de segurança nacional desenvolvidas anteriormente no local.

Page 165: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������165

* * *

Assim, os limites de atuação do Ibama, através da Reserva Extrativista de Arraial do Cabo, RJ, não podem concorrer com as referidas atividades, devendo se su-jeitar aos limites da Portaria nº 17-N/Ibama, de 18 de fevereiro de 1999, que estabelece seu Plano de Utilização.

Vale lembrar que, nos termos do art. 37, caput, da Constituição, a atividade da Administração Pública é, plenamente, vinculada à lei, significando isso dizer que só age se tiver autorização legal.

Ora, no caso essa autorização legal não existe, percebendo-se que a exigência da prévia autorização do Ibama, para o ingresso de embarcações não pesqueiras no local, extrapola as atribuições da Reserva Extrativista de Arraial do Cabo, RJ.

De fato, a matéria em questão se sujeita às regras do Direito Marítimo Interna-cional e, no campo do Direito Público Interno, às atribuições específicas recaem sobre a Autoridade Marítima, e não sobre o Ibama, conforme se depreende do art. 4º da Lei nº 9.537/1997.”

Anoto que a ementa dessa manifestação tem este teor (folha 180 do apen-so III):

“Atividade não referente à pesca. Inexigência de prévia autorização do Ibama para o ingresso de embarcações não pesqueiras dentro dos limites marinhos da Reserva Extrativista de Arraial do Cabo, RJ. Atividade não concorrente com os objetivos da Reserva Extrativista e afeta à competência da autoridade marítima. Falta de base legal para a autuação.”

Desse modo, longe de se tratar de mera irresignação das embarcações com a fiscalização ambiental, confirmou-se, na prática, a existência de um con-flito de competência entre a Capitania dos Portos e o Ibama, o que levou a um cenário de incerteza sobre qual o procedimento a ser adotado, em razão das orientações divergentes emitidas tanto pela Marinha do Brasil quanto pela au-tarquia ambiental.

Essa controvérsia teve vulto suficiente para causar dúvidas, nos apelados, a respeito da eventual ilicitude de seus atos. Acresça-se que, conforme restou fartamente comprovado nos autos, através dos ofícios da Diretoria de Portos e Costas ao Superintendente Regional do Ibama no Rio de Janeiro e à Procurado-ria da República (folhas 146/150 e 151/162 do apenso III), bem como do supra-mencionado parecer da Procuradoria do Ibama, os apelados estavam certos de o Ibama não ter competência para o ato que pretendia realizar, daí que a recusa em admitir o que não deveria ser admitido, não configura crime.

E como bem visto pela R. Sentença, às folhas 490/492:

“Em outro Despacho (fl.93, IPL 171/2006), a Autoridade Policial considera:

Page 166: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

166 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

‘3. Compulsando estes autos, esta Autoridade observou que se trata de uma situação em que há divergência entre as interpretações do Ibama e de em-presas que trabalham com navegação, quanto à atribuição para autorizar a entrada na Resexmar-AC.’

‘4. Em decorrência deste conflito, foram lavrados diversos Autos de Infração e instaurados um correspondente número de inquéritos policiais.’

Diante de todo o exposto, entendo que os Acusados agiram em erro de tipo e neste sentido temos o que escreveu Francisco de Assis Toledo (Princípios Básicos de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 267):

‘O segundo e não menos importante caminho percorrido pela dogmática pe-nal, na busca de solução para a problemática de que estamos tratando, con-sistiu na mudança do foco de incidência do erro, do fato ou da lei, para os próprios elementos estruturais do conceito de crime. Abandona-se qualquer pretensão de valorar, nesta área, a velha e superada oposição entre o fático e o jurídico. No lugar dessa falsa oposição, coloca-se a distinção, já bem elabo-rada doutrinariamente, entre tipo e antijuridicidade (ou ilicitude). Feito isso, percebe-se, sem qualquer dificuldade, que o erro jurídico penal relevante ora recai sobre (tem por objeto) elementos ou circunstâncias integrantes do tipo legal de crime (fáticos ou jurídico-normativos, pouco importa), ora recai sobre a antijuridicidade (ou ilicitude) da ação. Na primeira hipótese tem-se um erro sobre elementos ou circunstâncias do tipo ou, abreviadamente, “erro de tipo” (Tatbestandsirrtum). Na segunda hipótese, tem-se um “erro sobre a ilicitude do fato real” ou, abreviadamente, “erro de proibição” (Verbotsirrtum). Cone-xiona-se, dessa forma, a distinção entre tipo e ilicitude com a correspondente distinção entre erro de tipo e erro de proibição. Como ambas essas formas de erro são igualmente relevantes para o direito penal, a antiga autonomia que se criara entre elas cede lugar a uma distinção puramente conceitual, da qual não se podem extrair efeitos jurídicos opostos – a escusabilidade de uma e a inescusabilidade de outra. O certo será dizer-se que ambas podem, ou não, ser escusáveis, dentro de certos critérios. Não se trata – frise-se, para evitar equívocos – de uma substituição meramente terminológica, como se o erro de fato passasse a denominar-se erro de tipo e o de direito, erro de proibição. É muito mais que isso, pois o erro de tipo abrange situações que, antes, eram classificadas ora como erro de fato, ora como de direito. O erro de proibição, por sua vez, além de incluir situações novas, abarca uma série de hipóteses antes classificadas como erro de direito.’

O atuar dos Acusados foi movido sem o conhecimento da ilicitude do fato. Com isso, entendo que a conduta não visou a obstar a fiscalização do Poder Público, mas sim garantir que esta fosse realizada pela autoridade competente.

Como é cediço, para a conformação típica do art. 69 da Lei nº 9.605/1998 é imprescindível que a atividade pública a que se tenha imposto empecilho seja legítima.

O depoimento do analista ambiental do Ibama, Gilson Gobatto, como testemu-nha de acusação, confirma que havia conflito de atribuições entre a Marinha do

Page 167: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������167

Brasil e o Ibama em relação à fiscalização do óleo, afirmando a Marinha ser ela o órgão competente, conforme consta em mídia. (fl. 367, a partir do oitavo minuto em uma primeira gravação e em sequência outra gravação)

Da mesma forma, a testemunha de acusação Fábio Franco da Costa Fabiano, em seu depoimento, confirma o ‘embate’ de competência existente entre o Ibama e a Marinha do Brasil, conforme consta em mídia entre 1’40’’ aos 5 minutos e ao final de seu depoimento aos 15’30’’ em diante. (fl. 474)

Tem-se, assim, como acima demonstrado, real questão de atribuições, gerando compreensões distintas quanto à obrigação legal em atender ao órgão compe-tente à fiscalização, que para a Marinha era sua a competência e não do Ibama.

Não teriam, portanto, os acusados obstado ou dificultado a ação fiscalizadora do Poder Público, no caso a Marinha do Brasil.”

Ante o exposto, e por não estar, na ocasião, a embarcação desenvolven-do atividade referente à pesca, ou outra controlável pelo Ibama, nego provi-mento ao recurso.

É como voto.

Rio de Janeiro, 31 de maio de 2017.

Antonio Ivan Athié Desembargador Federal Relator

Page 168: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

2826

Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 04.05.2017Apelação/Reexame Necessário nº 0004558‑65.2010.4.03.6104/SP2010.61.04.004558‑0/SPRelator: Desembargador Federal Nery JuniorApelante: União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: SP000003 Julio César Casari e Claudia Akemi OwadaApelado(a): Aliança Navegação e Logística Ltda.Advogado: SP269531 Luciano Antonio da Silva Santos e outro(a)Remetente: Juízo Federal da 2ª Vara de Santos > 4ª SSJ > SPNº Orig.: 00045586520104036104 2ª Vr. Santos/SP

ementaAÇÃO ORDINÁRIA – ADUANEIRO – MERCADORIA EM TRÂNSITO DESTINADA AO PARAGUAI – EXTRAVIO – AUSENTE FATO GERADOR DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – PROCEDÊNCIA AO PEDIDO – IMPROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL1. De acerto a r. sentença ao flagrar comprometido o critério espacial da norma de incidência em questão, assim inviabilizando a pretensa co-brança por extravio de mercadoria, no qual ditos bens se punham sob regime de trânsito aduaneiro, rumo ao Paraguai.

2. Presente acordo internacional Brasil/Paraguai, a suprimir da condição de território nacional, para fins de imposto de importação, portos como o da pretendida flagrância autuadora, art. 40, Decreto nº 79.804/1977, e Decreto nº 50.259-A/1961.

3. Pacífica a questão desde a Suprema Corte, RE 95111, assim como também tratada a matéria pelo C. STJ, REsp 1139922/SP. Precedentes.

4. Equivoca-se a União, outrossim, ao invocar a responsabilidade do agente marítimo, figura esta sequer ostentada pela parte autora, que era a transportadora da carga, fl. 03, sendo que, ainda ocupasse aquela condi-ção, não seria responsável pelo tributo, Súmula nº 192, TFR. Precedente.

5. Destaque-se, de saída, que, na posição de transportador, também au-sente a responsabilidade imputada pela parte apelante. Precedente.

6. Honorários advocatícios mantidos, por observantes às diretrizes legais aplicáveis à espécie, sem qualquer excesso.

7. Improvimento à apelação e à remessa oficial, na forma aqui estatuída.

Page 169: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������169

acórdãO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, deci-de a Colenda Terceira Turma do Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto, que integram o presente julgado.

São Paulo, 19 de abril de 2017.

Silva Neto Juiz Federal Convocado

relatóriO

Cuida-se de apelação e de remessa oficial, em ação ordinária, ajuizada por Aliança Navegação e Logística Ltda. em face da União, aduzindo que o extravio de mercadorias, que estão apenas em trânsito aduaneiro para o Para-guai (constatação de violação no lacre do contêiner), não enseja incidência de imposto de importação.

A r. sentença, fls. 232/234, julgou procedente o pedido, asseveran-do que a mercadoria partiu de Miami/EUA e tinha como destino Ciudad Del Este/Paraguai, tendo ingressado em solo pátrio sob o regime aduaneiro de pas-sagem, não se caracterizando fato gerador do imposto de importação, em que pese o constatado extravio. Sujeitou a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, no importe de 10% sobre o valor da causa (R$ 65.474,14, fls. 12), além do reembolso de custas.

Apelou a União, fls. 242/247, alegando, em síntese, que o extravio pro-porcionou a entrada, no território nacional, de mercadorias, o que configura fato gerador do tributo, suscitando a responsabilidade do agente marítimo.

Não apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

Dispensada a revisão, na forma regimental (inciso VIII de seu art. 33).

É o relatório.

Silva Neto Juiz Federal Convocado

vOtO

De acerto a r. sentença ao flagrar comprometido o critério espacial da norma de incidência em questão, assim inviabilizando a pretensa cobrança por

Page 170: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

170 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

extravio de mercadoria, no qual ditos bens se punham sob regime de trânsito aduaneiro, rumo ao Paraguai.

Com efeito, presente acordo internacional Brasil/Paraguai, a suprimir da condição de território nacional, para fins de imposto de importação, portos como o da pretendida flagrância autuadora, art. 40, Decreto nº 79.804/1977, e Decreto nº 50.259-A/1961.

Por igual, pacífica a questão desde a Suprema Corte, RE 95111, assim como também tratada a matéria pelo C. STJ, REsp 1139922/SP :

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – FATO GE-RADOR – MERCADORIA EM TRÂNSITO – ACORDO BRASIL-PARAGUAI – MERCADORIAS EM TRÂNSITO PELO TERRITÓRIO NACIONAL, LIVRES DE TRIBUTOS, POR ACORDO INTERNACIONAL – FALTA DE MERCADORIA VE-RIFICADA, POR OCASIÃO DO TRANSBORDO, NO PORTO DE INGRESSO NO PAÍS – NÃO É POSSÍVEL PRESUMIR, DESDE LOGO, QUE A MERCADORIA TENHA SIDO ENTREGUE AO CONSUMO, QUANDO NÃO ESTAVA ELA SEN-DO IMPORTADA POR FIRMA BRASILEIRA, MAS, APENAS, DEVIA TRANSITAR PELO TERRITÓRIO NACIONAL, COM DESTINO AO PARAGUAI – INAPLICA-ÇÃO DO DECRETO-LEI Nº 37/1966 – SITUAÇÃO DISTINTA DO EXTRAVIO DE MERCADORIAS ESTRANGEIRAS ORIGINARIAMENTE DESTINADAS À ZONA FRANCA DE MANAUS – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (RE 95111, Relator(a): Min. Néri da Silveira, 1ª T., Julgado em 13.11.1981, DJ 11.02.1983, p. 00928, Ement. v. 01282-01, p. 00145, RTJ v. 00104-03, p. 01179)

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – ADUANEIRO – MERCADORIA EM TRÂNSITO PARA O PARAGUAI – EXTRAVIO – FATO GERADOR DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – INOCORRÊNCIA

1. É pacífico o entendimento nesta Corte de que, no caso de importação de mer-cadoria despachada para consumo, o fato gerador para o imposto de importação consuma-se na data do registro da Declaração de Importação.

2. Verificada a falta de mercadoria importada com destino ao Paraguai em trân-sito no território nacional, é indevida a cobrança do imposto de importação. Precedentes.

3. Recurso especial não provido.”

(REsp 1139922/SP, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Julgado em 22.06.2010, DJe 04.02.2011)

Por sua vez, equivoca-se a União, outrossim, ao invocar a responsabili-dade do agente marítimo, figura esta sequer ostentada pela parte autora, que era a transportadora da carga, fl. 03, sendo que, ainda ocupasse aquela condição, não seria responsável pelo tributo, Súmula nº 192, TFR:

“TRIBUTÁRIO – AGENTE MARÍTIMO – EXERCÍCIO DE ATRIBUIÇÕES PRÓ-PRIAS – EQUIPARAÇÃO A TRANSPORTADOR – RESPONSABILIDADE TRIBU-

Page 171: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������171

TÁRIA – INOCORRÊNCIA – SÚMULA Nº 192/TFR – TERMO DE COMPROMIS-SO – PRECEDENTES

1. Recurso especial contra acórdão segundo o qual ‘o agente marítimo é o repre-sentante comercial do armador em determinado porto ou área geográfica, não podendo ser responsabilizado pelas infrações sanitárias verificadas nas embarca-ções que o contratam’.

2. Estabelece a Súmula nº 192/TFR: ‘o agente marítimo, quando no exercício exclusivo das atribuições próprias, não é considerado responsável tributário, nem se equipara ao transportador para efeitos do Decreto-Lei nº 37 de 1966’.

3. O agente, rigorosamente, não medeia, nem intermedeia, nem comissiona, nem representa: promove conclusões de contrato. Não é mediador, posto que seja possível que leve até aí a sua função. Não é corretor, porque não declara a con-clusão dos negócios jurídicos. Não é mandatário, nem procurador. Donde a ex-pressão ‘agente’ ter, ao contrato de agência, sentido estrito. (Pontes de Miranda, in Tratado de Direito Privado Parte Especial, Tomo XLIX, 3. ed., 1972)

4. O Termo de Compromisso firmado por agente marítimo, assumindo responsa-bilidades outras que não as de sua competência, não tem o condão de atribuir--lhe responsabilidade tributária para responder por danos ou extravios de merca-dorias apurados, para ressarcimento de impostos e por outros ônus fiscais, tendo em vista o princípio da reserva legal.

5. Precedentes das 1ª e 2ª Turmas desta Corte Superior.

6. Recurso especial não provido.”

(REsp 724.295/PE, Rel. Min. José Delgado, 1ª T., Julgado em 05.04.2005, DJ 02.05.2005, p. 243)

Destaque-se, de saída, que, na posição de transportador, também ausen-te a responsabilidade imputada pela parte apelante:

“TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – MERCADORIA EM TRÂNSITO DESTINADA AO PARAGUAI – AVARIA OU EXTRAVIO – ISENÇÃO – IRRES-PONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR – PRECEDENTES

1. Não obstante o fato gerador do imposto de importação se dê com a entrada da mercadoria estrangeira em território nacional, torna-se necessária a fixação de um critério temporal a que se atribua a exatidão e certeza para se completar o inteiro desenho do fato gerador. Assim, embora o fato gerador do tributo se dê com a entrada da mercadoria em território nacional, ele apenas se aperfei-çoa com o registro da Declaração de Importação no caso de regime comum e, nos termos precisos do parágrafo único, do art. 1º, do Decreto-Lei nº 37/1966, ‘com a entrada no território nacional a mercadoria que contar como tendo sido importada e cuja a falta seja apurada pela autoridade aduaneira’. 2. A jurispru-dência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que: a) ‘indevido o imposto de importação sobre mercadoria importada, com destino ao Paraguai, quando verificada sua falta em trânsito no território nacional’ (REsp 171621/SP,

Page 172: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

172 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Rel. Min. Francisco Peçanha Martins); b) ‘no caso de avaria ou falta de merca-doria importada ao abrigo de isenção do tributo, o transportador não pode ser responsabilizado’ (REsp 22735/RJ, Rel. Min. Hélio Mosimann); c) ‘no caso de extravio de mercadoria importada ao abrigo de isenção (ou redução) do tributo, não é responsável o transportador pelo valor deste. O art. 60, parágrafo único, do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, estabelece que havendo dano ou avaria ou extravio, caberá indenização à Fazenda Nacional pelo que deixar de recolher. Existindo isenção, não há o que indenizar. É ilegal o art. 30, § 3º, do Decreto nº 63.431, de 1968, que manda ignorar a isenção ou redução se se verificar avaria ou extravio (Código Tributário Nacional, arts. 94, § 1º, e 99)’ (REsps 11428/RJ e 18945/RJ, Rel. Min. Demócrito Reinaldo); d) ‘o transportador não pode ser responsabilizado por tributo, em caso de avaria ou falta de merca-dorias, se toda ela foi importada sob o regime de isenção. É indevido o imposto de importação sobre mercadorias em trânsito pelo território brasileiro, destinadas ao Paraguai. Inaplicável, ao caso, o parágrafo único do art. 1º, do Decreto-Lei nº 37/1966’. (REsps 10901/RJ e 5536/RJ, Rel. Min. Garcia Vieira) 3. Precedentes do STJ e do STF. 4. Recurso não conhecido. ..EMEN: (STJ, REsp 200101295946, José Delgado, 1ª T., DJ Data:13.05.2002, p. 00161 ..DTPB:.)

Honorários advocatícios mantidos, por observantes às diretrizes legais aplicáveis à espécie, sem qualquer excesso.

Por conseguinte, em âmbito de prequestionamento, refutados se põem os demais ditames legais invocados em polo vencido, art. 32, parágrafo único, b, Decreto-Lei nº 37/1966, e arts. 128 e 124, CTN, que objetivamente a não socorrerem, com seu teor e consoante este julgamento, ao mencionado polo (art. 93, IX, CF).

Ante o exposto, pelo improvimento à apelação e à remessa oficial, na forma aqui estatuída.

É como voto.

Silva Neto Juiz Federal Convocado

Page 173: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

2827

Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5017721‑22.2015.4.04.7107/RSRelatora: Desª Federal Luciane Amaral Corrêa MünchApelante: União – Fazenda Nacional (Réu)Apelado: Pinceis Roma Ltda. (Autor)Advogado: Lucas Minor Zortéa

ementaTRIBUTÁRIO – BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS OCORRIDAS APÓS A CHEGADA AO PORTO – CAPATAZIA – INCLUSÃO INDEVIDA – SÚMULA Nº 92 DESTA CORTE

Conforme pacificado pela Súmula nº 92 deste Tribunal, “o custo dos serviços de capatazia não integra o ‘valor aduaneiro’ para fins de composição da base de cálculo do imposto de importação”.

acórdãO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de maio de 2017.

relatóriO

Trata-se de ação ordinária objetivando o reconhecimento do direito da parte autora à exclusão dos valores relativos à capatazia da base de cálculo do IPI-Importação, PIS-Importação e Cofins-Importação, bem como à repetição do indébito. A autora arguiu, em síntese, a ilegalidade da IN RFB 327/2007, por ampliar o conceito de “valor aduaneiro” previsto no GATT. Atribuiu à causa o valor de R$ 65.000,00.

A União contestou a ação.

Foi exarada sentença nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo procedente o pedido, extinguindo o feito com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), a fim de declarar (1) a ilegalidade do § 3º do

Page 174: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

174 ������������������������������������������������������������ RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

art. 4º da Instrução Normativa RFB nº 327/2003 e, por conseguinte e (2) a ine-xigibilidade do Imposto de Importação – II e do PIS/Cofins-Importação sobre os gastos com descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional. Condeno a União ao pagamento dos valores devidos nos cin-co anos anteriores ao ajuizamento da demanda, nos termos da fundamentação.

Os valores a serem restituídos deverão ser corrigidos monetariamente desde o pagamento indevido (Súmula nº 162 do STJ). Quanto aos índices a serem aplica-dos, consigno que incidirá a taxa Selic, a título de juros e correção monetária, na forma estatuída no art. 39, § 4º da Lei nº 9.250/1995.

Arcará a União Federal com o reembolso das custas processuais e com o paga-mento dos honorários de sucumbência, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação (art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC).

A Fazenda Nacional interpôs apelação argumentando, em síntese, que: a) Os custos com capatazia integram o custo do transporte internacional de-vendo, assim, compor a base de cálculo do imposto de importação; b) À luz do CTN e do GATT, verifica-se como base de cálculo de PIS/Cofins- Importação, quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro; c) A Ata Final que Incor-pora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multila-terais do GATT, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 30, de 15 de dezembro de 1994, foi promulgada pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994. O art. 8º, item 2, alínea b, da Parte I, desta Ata, facultou aos Países membros, ao elaborarem suas respectivas legislações, a inclusão ou exclusão no valor aduaneiro dos gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; d) O Decreto nº 6579/2009 encontra-se em harmonia com o texto da norma internacional e a IN SRF 327/2003 não discrepa do texto regula-mentar, de sorte que não há falar em ofensa ao princípio da legalidade; e) As despesas em questão ocorrem não “após” o desembarque, mas sim “para” o desembarque, não podendo ser considerado que a mercadoria tenha chegado até o recinto alfandegado antes de ser desembarcada.

Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

vOtO

Trata-se de hipótese de aplicação da Súmula nº 92 deste Tribunal, com o seguinte enunciado: “O custo dos serviços de capatazia não integra o ‘valor aduaneiro’ para fins de composição da base de cálculo do imposto de impor-tação”.

Em atenção aos arts. 926 e 927 do Código de Processo Civil, curvo-me ao entendimento da referida súmula e mantenho a sentença.

Page 175: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������175

MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA, NOS TERMOS DO § 11 DO ART. 85 DO CPC/2015

A sistemática do CPC/1973 não contemplava a fixação de verba hono-rária em sede recursal. O juiz fixava os honorários na sentença e o tribunal, a menos que houvesse recurso pleiteando a sua majoração, acabava por manter o valor fixado caso a sentença fosse mantida, ou seja, na hipótese de desprovi-mento do recurso. Logo, todo o trabalho desenvolvido pelo advogado na fase recursal era remunerado pelo valor dos honorários fixado na sentença.

A modificação trazida pelo CPC/2015, especialmente no § 11 do art. 85, alterou a sistemática anterior, ao dispor: “O tribunal, ao julgar recurso, majora-rá os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários de-vidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”.

Nesse sentido, já decidiu a 1ª Turma deste Regional, à unanimidade (Apelação Cível nº 5064499-71.2015.404.7100, Desª Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos Autos em resposta a: 02.09.2016).

Assim, atentando aos parâmetros legais preconizados no § 2º e seus inci-sos do art. 85 do CPC, majoro em 1% os honorários sucumbenciais fixados na sentença, nos termos do § 11 do art. 85 do CPC/2015, percentual que deverá ser acrescido uma única vez à verba honorária.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

Page 176: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Parte Geral – Ementário de Jurisprudência2828 – Acidente – carregamento – danos causados ao navio e à carga – operador do guindaste –

imprudência

“Agravo de instrumento. Ação ordinária de indenização. Acidente durante o embarcamento de tarugos de aço. Danos causados ao navio e à carga. Alegação de descumprimento do contrato, con-substanciado na violação do dever da contratante informar que o equipamento utilizado, produzido pela empresa corré, não era adequado ao fim pretendido. Demanda anteriormente proposta en-volvendo a agravante e a agravada, onde foi reconhecido que o acidente se deu pela imprudência do operador do guindaste. Preclusão pro judicato. Inocorrência. Coisa julgada que é pressuposto processual negativo. Matéria de ordem pública, insuscetível de preclusão. Identidade das causas de pedir próxima (responsabilidade civil) e remota (evento danoso) das ações. Configuração da coisa julgada em relação à agravada. Agravante que não alegou, enquanto ré na primeira ação, a matéria de defesa que agora fundamenta o pedido indenizatório. Aplicação do ‘princípio do dedutível e do deduzido’. Inteligência do art. 474 do CPC/1973. Eventual condenação que gabinete de desembar-gador demandaria fosse reconhecida a culpa da agravada pela ocorrência do acidente. Impossibili-dade. Respeito à res judicata. Honorários advocatícios recursais. Cabimento. Agravo de instrumento que extinguiu o processo, com resolução do mérito, em relação à parte agravada. Art. 85, §§ 1º e 2º do NCPC. Fixação em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa. Recurso conhecido e desprovido.” (TJPR – AI 0035791-53.2016.8.16.0000 – 9ª C.Cív. – Relª Desª Vilma Régia Ramos de Rezende – Unânime – DJe 14.06.2017)

2829 – Acidente de trabalho – atropelamento por empilhadeira – danos materiais e morais – de-ver de indenizar – ausência

“Direito civil e processual civil. Apelação cível. Ação de indenização por danos materiais e morais. Acidente de trabalho. Atropelamento por empilhadeira no Porto de Paranaguá/PR. Falecimento em decorrência de hemorragia interna e externa. Vítima que não observou os deveres de caute-la. Negligência, imprudência ou imperícia do motorista da empilhadeira não comprovada. Ônus probatório da autora, consoante art. 373, I, do CPC/2015. Culpa exclusiva da vítima. Ausência do dever de indenizar. Sentença mantida. Fixação de honorários recursais.” (TJPR – AC 0007732-18.2000.8.16.0129 – 9ª C.Cív. – Rel. Des. Coimbra de Moura – DJe 01.06.2017)

2830 – Aduaneiro – pena de perdimento – mercadoria encontrada oculta em contêiner – navio estrangeiro – efetiva origem, trajeto e destinação – não identificação – art. 105, I e IV, do Decreto-Lei nº 37/1966 – aplicabilidade

“Apelação em mandado de segurança. Aduaneiro: aplicação de pena de perdimento mercadoria encontrada oculta em contêiner transportado por navio estrangeiro que aportou em Santos/SP. Do-cumentos que não revelam a efetiva origem e destinação das mercadorias, menos ainda o trajeto realizado, permitindo a aplicação do art. 105, I e IV, do Decreto-Lei nº 37/1966. Impossibilidade de se afirmar, no mandamus, que a situação de fato era diversa daquela considerada pelas autori-dades aduaneiras (situação da carga que é altamente suspeita). Recurso desprovido. 1. A causa tem por objeto o encontro de peças de filtro de amina acondicionadas no contêiner CLHU 872.267-6 e retidas pela autoridade aduaneira por não ter sido a mercadoria devidamente declarada no siste-ma Siscomex, já que na ocasião a empresa Oceanus Agência Marítima S/A informou que o contê-iner encontrava-se vazio, através do manifesto de transporte eletrônico nº 1515502471641. Nesse manifesto (fls. 135/137) consta a informação que o transporte era realizado pela embarcação IMO 9252735 – Widukind, proveniente do Porto de Manzanillo (MEX) e com destino ao Porto de Santos (BR), com passagens no Porto de Manaus (BR) e no de Vitória (BR). A retenção foi motivada por o fato configurar infração passível da incidência da pena de perdimento, na forma do art. 105, I e

Page 177: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������177

IV, do Decreto-Lei nº 37/1966, art. 23, IV e § 1º, do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e art. 689, I e IV, do Decreto nº 6.759/2009. 2. Completa ausência de prova documental pré-constituída da escusa engendrada pela impetrante (a ausência de declaração da carga foi mero erro operacional, cor-rigido pelo manifesto eletrônico nº 1515B03033314). informou-se a baldeação das mercadorias no Porto de Santos, identificando o Porto de Houston como origem, o Porto de Manzanillo como local de carregamento, o Porto de La Guaira como destino, o navio Widukind como embarcação transportadora, bem como o conhecimento de carga nº SLD062735 como o documento referente à operação. 3. Porém, no conhecimento de carga (bill of lading) consta que a embarcação IMO 9320001 Frisia Loga realizou o transporte das mercadorias, tendo por origem o Porto de Houston e como destino o Porto de La Guaira (fl. 25), e isso evidencia que as informações prestadas pela impetrante às autoridades aduaneiras não são suficientes para se aferir o real trajeto realizado pela carga que se encontrava oculta no contêiner. Considerando os registros acostados aos autos, tem-se que a carga foi embarcada no Porto de Houston (banhado pelo Oceano Atlântico) e teve passagem no Porto de Manzanillo (banhado pelo Pacífico, na costa contrária) – o que per si já é muito estra-nho, apesar da existência do Canal do Panamá – e em portos brasileiros para ter como destino o Porto de La Guaria. Como asseverado pela autoridade impetrada, o trajeto apontado – e ainda há dúvidas quanto à identidade do navio – não faz qualquer sentido geográfico ou econômico, haja vista a distância entre o Porto de Houston e o Porto de La Guaria. 4. O imbróglio não se restringe a simples irregularidade quanto à omissão do devido registro no Siscomex. Muito pelo contrário, a situação fática do trajeto da carga encontrada oculta no contêiner é altamente suspeita, para dizer o mínimo; a espécie não revela o menor vestígio de ilegalidade do ato de retenção e posterior inci-dência da pena de perdimento, devendo-se confirmar a denegação da segurança já que a conduta das autoridades aduaneiras é, à vista dos documentos existentes, absolutamente correta.” (TRF 3ª R. – AMS 0000128-60.2016.4.03.6104 – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo – DJe 23.05.2017)

2831 – Afretamento marítimo – ISS – ilegalidade da cobrança – probabilidade do direito – exigi-bilidade da dívida – suspensão – possibilidade

“Agravo de instrumento. Afretamento marítimo. ISS. Ilegalidade da cobrança. Probabilidade do direito. Suspensão da exigibilidade da dívida. Medida que se impõe. Recurso desprovido. 1. Con-siderando que a atividade principal, o afretamento, não é passível de tributação pelo ISS, a medida adotada pelo julgador a quo deve subsistir, mormente por não identificar, na suspensão da exigi-bilidade da dívida, qualquer prejuízo significativo para o agravante, ao passo que para a agrava-da a adoção imediata de medidas tendentes à exigibilidade do crédito fiscal certamente traduzirá em danos que justificam a concessão da liminar em comento. 2. Recurso desprovido.” (TJES – AI 0007405-17.2016.8.08.0006 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Jorge do Nascimento Viana – DJe 19.06.2017)

2832 – Agente marítimo – auto de infração – art. 125 da Lei nº 6.815/1980, Estatuto do Estrangei-ro – infração administrativa – responsabilidade – ausência

“Direito administrativo. Agente marítimo. Auto de infração. Lei nº 6.815/1980. Estatuto do Estran-geiro. Art. 125. Infração administrativa. Ausência de responsabilidade. 1. Consolidada a jurispru-dência no sentido de que não há como se aplicar penalidade tributária ou administrativa ao agente marítimo, considerando a ausência de previsão expressa em lei, atribuindo-lhe responsabilidade pelas infrações cometidas pelo armador. 2. Apelação desprovida.” (TRF 3ª R. – AC 0005351-28.2015.4.03.6104 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos Muta – DJe 12.05.2017)

Transcrição EditorialLei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980:

Page 178: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

178 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

“Art. 125. Constitui infração, sujeitando o infrator às penas aqui cominadas: (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09.12.1981)

I – entrar no território nacional sem estar autorizado (clandestino):

Pena: deportação.

II – demorar-se no território nacional após esgotado o prazo legal de estada:

Pena: multa de um décimo do Maior Valor de Referência, por dia de excesso, até o máximo de 10 (dez) vezes o Maior Valor de Referência, e deportação, caso não saia no prazo fixado.

III – deixar de registrar-se no órgão competente, dentro do prazo estabelecido nesta Lei (art. 30):

Pena: multa de um décimo do Maior Valor de Referência, por dia de excesso, até o máximo de 10 (dez) vezes o Maior Valor de Referência.

IV – deixar de cumprir o disposto nos arts. 96, 102 e 103:

Pena: multa de duas a dez vezes o Maior Valor de Referência.

V – deixar a empresa transportadora de atender à manutenção ou promover a saída do território nacional do clandestino ou do impedido (art. 27):

Pena: multa de 30 (trinta) vezes o Maior Valor de Referência, por estrangeiro.

VI – transportar para o Brasil estrangeiro que esteja sem a documentação em ordem:

Pena: multa de dez vezes o Maior Valor de Referência, por estrangeiro, além da responsabilidade pelas despesas com a retirada deste do território nacional. (Redação dada pela Lei nº 6.964, de 09.12.1981)

VII – empregar ou manter a seu serviço estrangeiro em situação irregular ou impedido de exercer atividade remunerada:

Pena: multa de 30 (trinta) vezes o Maior Valor de Referência, por estrangeiro.

VIII – infringir o disposto nos arts. 21, § 2º, 24, 98, 104, §§ 1º ou 2º e 105:

Pena: deportação.

IX – infringir o disposto no art. 25:

Pena: multa de 5 (cinco) vezes o Maior Valor de Referência para o resgatador e deportação para o estrangeiro.

X – infringir o disposto nos arts. 18, 37, § 2º, ou 99 a 101:

Pena: cancelamento do registro e deportação.

XI – infringir o disposto nos arts. 106 ou 107:

Pena: detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e expulsão.

XII – introduzir estrangeiro clandestinamente ou ocultar clandestino ou irregular:

Pena: detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e, se o infrator for estrangeiro, expulsão.

XIII – fazer declaração falsa em processo de transformação de visto, de registro, de alteração de assentamentos, de naturalização, ou para a obtenção de passaporte para estrangeiro, laissez-passer, ou, quando exigido, visto de saída:

Pena: reclusão de 1 (um) a 5 (cinco) anos e, se o infrator for estrangeiro, expulsão.

XIV – infringir o disposto nos arts. 45 a 48:

Pena: multa de 5 (cinco) a 10 (dez) vezes o Maior Valor de Referência.

XV – infringir o disposto nos arts. 26, § 1º ou 64:

Pena: deportação e na reincidência, expulsão.

XVI – infringir ou deixar de observar qualquer disposição desta Lei ou de seu Regulamento para a qual não seja cominada sanção especial:

Pena: multa de 2 (duas) a 5 (cinco) vezes o Maior Valor de Referência.

Parágrafo único. As penalidades previstas no item XI, aplicam-se também aos diretores das entidades referidas no item I do art. 107.”

2833 – Área porto – posse – bem público – mera detenção – reintegração – impossibilidade

Apelação cível. Ação de reintegração de posse. Sentença de procedência. Reconvenção improce-dente. Assistência judiciária gratuita. Deferimento. Preliminar. Nulidade da sentença por cercea-mento de defesa. Inocorrência. Desnecessidade de realização de prova pericial. Oral. Documenta-ção que se revela idônea e suficiente para o julgamento antecipado da lide. Legitimidade ativa que decorre das atribuições da Appa como administradora dos Portos de Paranaguá. Reintegração de posse. Bem público. Mera detenção. Requisitos preenchidos. Impossibilidade de reconhecimento

Page 179: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������179

da posse de bem público que afasta o direito de retenção e indenização por benfeitorias. Recurso conhecido e parcialmente provido. 1. Nos termos do art. 99, § 3º, do CPC/2015: ‘O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos’. 2. Havendo declaração escrita e documentos que comprovem a hipossuficiência do agravante, impõe-se a concessão do benefício. 3. Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o julgador en-tender substancialmente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção probatória, por se tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado documentalmente’ (STJ, AgRg-AREsp 20543/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Órgão julgador: 4ª T., Julgamento: 18.08.2015, Pu-blicação: DJe 02.09.2015). 4. Quanto à legitimidade da Appa, esta decorre de suas atribuições re-lacionadas à fiscalização da atividade portuária de forma que o imóvel em análise, estando inserido na área do Porto Organizado de Paranaguá e de sua exclusiva administração, afeta diretamente as suas atividades, sendo parte legítima, portanto, para propor a presente demanda. 5. O agravado documentalmente demonstrou os requisitos elencados no art. 561 do CPC/2015. Sua posse é de-monstrada através do título de propriedade, eis que se trata de bem público, e o esbulho consoante notificação extrajudicial. 6. Torna-se irrelevante o fato do agravante ocupar o imóvel por vários anos, posto que sendo este público, sequer há de se falar em posse, mas em mera detenção. 7. Sen-do precária e indevida a ocupação de bem público, resta inviabilizada também a indenização por benfeitorias consoante já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, bem como esta Colenda Câmara Cível.” (TJPR – AC 0002790-15.2015.8.16.0129 – 18ª C.Cív. – Rel. Des. Marcelo Gobbo Dalla Dea – Unânime – DJe 10.05.2017)

Comentário EditorialTrata-se de apelação cível de pessoa física contra a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa). Na origem houve ação de reintegração de posse proposta pela Appa contra a pessoa física em questão.

A parte ré reconviu contra Appa, ficando sucumbente tanto em relação ao pedido da Autora como em relação aos pedidos feitos na reconvenção.

Na apelação requereu (i) o benefício da assistência judiciária gratuita, uma vez que foi condenada também em custas e honorários advocatícios, (ii) nulidade da sentença por cerceamento da defesa, requerendo apresentar provas testemunhal e pericial, (iii) ilegitimidade passiva do Apelado (por não ser proprietário do imóvel), dentre outros pedidos, como a necessidade de ser indenizada por obras comprovadamente realizadas no imóvel.

Registre-se, preliminarmente, que com a política anterior de ampliação da poligonal dos portos organi-zados na tentativa de abranger suas áreas de influência e não apenas a área objetivamente necessária ao seu funcionamento, várias administrações portuárias e Companhias Docas depararam e tiveram – como ainda têm – que lidar com problemas de ocupações irregulares, como a do caso concreto.

Um dos elementos importantes neste caso foi o julgamento antecipado da lide, tendo em vista o juiz a quo ter formado a sua convicção no sentido da suficiência das provas apresentadas pela Autora, a Appa.

O juiz, como destinatário da prova, deve exercer ativamente essa faculdade, levando em consideração tanto a suficiência da instrução processual, como a celeridade processual, devendo afastar os pedidos de produção de prova que sejam meramente protelatórios, ou simplesmente desnecessários. Por isso, a Turma manteve o entendimento adotado pelo juízo monocrático, que entendeu ser cabível e correto o julgamento antecipadamente da lide, conforme dispôs o Código de Processo Civil de 1973; hoje o assunto é tratado no CPC/2105 como julgamento antecipado do mérito, podendo haver o julgamento antecipado parcial do mérito também.

Ficou claro no voto condutor do Acórdão que a legitimidade da Appa, Apelada, decorre de sua atri-buição como Administração/Autoridade portuária cabendo-lhe a fiscalização da atividade portuária, exercendo jurisdição sobre os imóveis compreendidos na poligonal do porto organizado, que inclui o imóvel em tela.

Page 180: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

180 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

Tendo havido a delegação da União ao Estado do Paraná das atividades de administração e exploração do Porto, através da Appa, outrora uma autarquia estadual e hoje, desde 2013, Empresa Pública do Estado do Paraná com as de administração e exploração dos Portos de Paranaguá e Antonina, sendo, pois, responsável por garantir que os imóveis colocados sob sua responsabilidade cumpram a sua destinação.O Relator tece interessantes considerações preliminares, antes de adentrar o mérito propriamente dito, acerca da natureza da incidência do regime de direito privado ou público sobre os serviços públicos prestados pela empresa pública, concluindo que se esse é prestado fora do regime de mercado, não teria que incidir necessariamente o regime jurídico privado, próprio das empresas estatais (CF/1988, art. 173, § 1º, II).Nesse sentido, recupera julgados do STF, como o ocorrido no RE 610.392/PR, onde se reconheceu a imunidade tributária à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, por esta abarcar no seu objeto social a prestação de serviços públicos em regime de monopólio. Revisita o RE 577.511/PE em que foi reconhecida a imunidade tributária à Infraero (prestadora de serviços públicos em regime de monopólio), tendo o Relator percebido semelhanças entre as atribuições da Infraero e as da Appa, cada uma, obviamente, em seu respectivo modal, conforme reprodução, na sequência, da transcrição feita pelo Relator:“Estatuto da InfraeroArt. 4º A Infraero tem por finalidade implantar, administrar, operar e explorar industrial e comer-cialmente a infraestrutura aeroportuária e de apoio à navegação aérea, prestar consultoria e asses-soramento em suas áreas de atuação e na construção de aeroportos, bem como realizar quaisquer atividades, correlatas ou afins, que lhe forem conferidas pela SAC-PR.§ 1º A Infraero desempenhará sua missão diretamente ou por intermédio de subsidiárias e/ou de parcerias.§ 2º No desempenho de sua missão, a Infraero observará as normas emanadas dos órgãos que tratam das atividades de aviação civil e de controle do espaço aéreo.AppaDecreto Estadual nº 11.562/2014Art. 4º A Appa tem por objetivos:I – A administração e a atividade de Autoridade Portuária dos Portos Organizados de Paranaguá e Antonina;II – A administração das demais instalações portuárias públicas dentro do Estado do Paraná;Parágrafo único. Para o integral e fiel atendimento das exigências legais poderão ser desenvolvidas atividades afins, conexas ou acessórias, bem como administrar outras estruturas de vias navegáveis mediante regular autorização.”O Relator remete a outro julgado o RE-ED 842.996/DF em que STF estendeu à Appa as prerrogativas da Fazenda Pública para que execução contra ela siga o regime dos precatórios, para reforçar seu entendimento de que não necessariamente deveria incidir o regime de direito privado a todas as em-presas estatais, situando a Appa como exceção à regra constitucional.Recorde-se que o número anterior dessa Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário já, de modo preliminar, tratou dos RE 601720 e RE 594015 em que, respectivamente, a Barrafor Veículos Ltda. e a Transpetro não tiveram reconhecido o seu direito à imunidade recíproca, por claramente desen-volverem atividades econômicas com finalidades lucrativas, não se configurando a mesma situação fática e jurídica reconhecida para a Codesp no Acórdão paradigma produzido no RE 253472, em que o Ministro Relator, Joaquim Barbosa reconheceu a imunidade tributária à Codesp pelo desempenho, por esta, de uma instrumentalidade estatal.Esse caminho foi percorrido pelo Relator para lastrear sua decisão de entender cabível a extensão à Appa das prerrogativas da Fazenda Pública com a atribuição da qualidade de bem público ao imóvel em questão, impondo-se, consequentemente, o reconhecimento de sua posse jurídica pela entidade de direito público (Appa) como expressão de sua propriedade.Por fim, caracterizada a mera detenção da Apelante, não importam os anos durante os quais esta tenha ocupado o imóvel ou construções que tenha realizado, não lhe cabendo nenhum direito já que o que ocorreu para o Relator foi a indevida e precária ocupação de bem público na forma de detenção.

Transcrição Editorial• Código de Processo Civil:“Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:

Page 181: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������181

I – não houver necessidade de produção de outras provas;II – o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349.[...]Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:I – mostrar-se incontroverso;II – estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355.§ 1º A decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida.§ 2º A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto.§ 3º Na hipótese do § 2º, se houver transito em julgado da decisão, a execução será definitiva.§ 4º A liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser proces-sados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz.§ 5º A decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento.”• Constituição Federal:“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:[...]VI – instituir impostos sobre:a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;[...]Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econô-mica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”

2834 – Armazenamento – atividade portuária – Lei nº 12.815/2013 – poder concedente – Antaq – União – ilegitimidade passiva – competência – Justiça Estadual

“Agravo de instrumento. Aduaneiro. Custos de armazenamento. Atividade portuária. Lei nº 12.815/2013 (Lei dos Portos). Poder concedente. Ilegitimidade passiva da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e da União. Competência da Justiça Estadual. 1. A operadora portuária tem liberdade para fixar seus preços, dentro do âmbito de livre concorrência que deve nortear a exploração dos portos organizados e instalações portuárias, de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Lei nº 12.815/2013 (Lei dos Portos). 2. A Antaq realiza a fiscalização dos preços praticados pelo arrendatário de áreas e instalações portuárias sob o regime de livre pactuação. En-tretanto, não lhe cabe a fixação destes preços. 3. Portanto, o objeto da presente ação, ao envolver eventual excesso e abusividade no preço praticado pela parte demandada em desfavor da autora, não envolve discussão acerca de atos praticados pela Antaq dentro dos limites de sua atribuição. 4. Desse modo, não há razões que justifiquem a presença na lide do Poder Concedente, isto é, a União, ou mesmo da Antaq, autarquia responsável pela regulação e fiscalização dos serviços prestados. 5. É de se reconhecer, assim, a ilegitimidade passiva da União, já que o fato de figurar como poder concedente não resulta em sua legitimidade para todos os feitos em que se discutam os termos de contratos firmados por concessionárias de serviços públicos federais.” (TRF 4ª R. – Ag 5010146-70.2017.404.0000 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Jorge Antonio Maurique – DJe 01.06.2017)

Page 182: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

182 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

Transcrição Editorial• Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013:“Art. 3º A exploração dos portos organizados e instalações portuárias, com o objetivo de aumentar a competitividade e o desenvolvimento do País, deve seguir as seguintes diretrizes: I – expansão, modernização e otimização da infraestrutura e da superestrutura que integram os portos organizados e instalações portuárias; II – garantia da modicidade e da publicidade das tarifas e preços praticados no setor, da qualidade da atividade prestada e da efetividade dos direitos dos usuários; III – estímulo à modernização e ao aprimoramento da gestão dos portos organizados e instalações portuárias, à valorização e à qualificação da mão de obra portuária e à eficiência das atividades prestadas; IV – promoção da segurança da navegação na entrada e na saída das embarcações dos portos; e V – estímulo à concorrência, incentivando a participação do setor privado e assegurando o amplo acesso aos portos organizados, instalações e atividades portuárias.”• Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001:“Art. 11. O gerenciamento da infra-estrutura e a operação dos transportes aquaviário e terrestre serão regidos pelos seguintes princípios gerais:I – preservar o interesse nacional e promover o desenvolvimento econômico e social;II – assegurar a unidade nacional e a integração regional;III – proteger os interesses dos usuários quanto à qualidade e oferta de serviços de transporte e dos consumidores finais quanto à incidência dos fretes nos preços dos produtos transportados;IV – assegurar, sempre que possível, que os usuários paguem pelos custos dos serviços prestados em regime de eficiência;V – compatibilizar os transportes com a preservação do meio ambiente, reduzindo os níveis de polui-ção sonora e de contaminação atmosférica, do solo e dos recursos hídricos;VI – promover a conservação de energia, por meio da redução do consumo de combustíveis auto-motivos;VII – reduzir os danos sociais e econômicos decorrentes dos congestionamentos de tráfego;VIII – assegurar aos usuários liberdade de escolha da forma de locomoção e dos meios de transporte mais adequados às suas necessidades;IX – estabelecer prioridade para o deslocamento de pedestres e o transporte coletivo de passageiros, em sua superposição com o transporte individual, particularmente nos centros urbanos;X – promover a integração física e operacional do Sistema Nacional de Viação com os sistemas viários dos países limítrofes;XI – ampliar a competitividade do País no mercado internacional;XII – estimular a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias aplicáveis ao setor de transportes.[...]Art. 27. Cabe à Antaq, em sua esfera de atuação:I – promover estudos específicos de demanda de transporte aquaviário e de serviços portuários;I – promover estudos específicos de demanda de transporte aquaviário e de atividades portuárias; (Redação dada pela Medida Provisória nº 595, de 2012)I – promover estudos específicos de demanda de transporte aquaviário e de atividades portuárias; (Redação dada pela Lei nº 12.815, de 2013)II – promover estudos aplicados às definições de tarifas, preços e fretes, em confronto com os custos e os benefícios econômicos transferidos aos usuários pelos investimentos realizados;”

2835 – Armazém alfandegado – armazenagem – despesas – cobrança – direito de retenção – re-dução do preço – impossibilidade

“Depósito de mercadorias. Ação de cobrança. Mercadoria importada pela ré e estocada em arma-zém alfandegado da autora. Ausência de pagamento. Direito de retenção do depositário. Impossi-bilidade de redução do preço cobrado tão-somente com base nos valores praticados por empresas concorrentes. Ausência de elementos objetivos para comparação da qualidade do serviço e estabe-lecimento do equilíbrio custo-benefício. É o armador quem escolhe o terminal em que a atracagem será realizada. Presume-se que a escolha tenha por base dois fatores principais: preço e qualidade. Se o armador optou por atracar seu navio no terminal retroportuário administrado pela autora,

Page 183: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������183

depositando a carga em seus armazéns, é de se esperar que nele encontrou o melhor equilíbrio custo-benefício. Seria temerário reduzir o preço cobrado pela autora tão-somente com base em tabelas de valores divulgadas por empresas concorrentes, uma vez que não há nos autos elementos concretos e objetivos que permitam comparar a qualidade dos serviços prestados por elas e, com fundamento nessa comparação, estabelecer um equilíbrio empírico de preços. Ademais, a tabela de preços praticada pela autora é registrada na Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp, e é objeto de fiscalização pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários. Não bastasse isso, não cabe ao Poder Judiciário intervir como órgão regulatório, definindo os preços a serem cobrados pelos armazéns e terminais retroportuários, se não se vê o propalado abuso, ictu oculi. Apelação não provida.” (TJSP – Ap 1063054-89.2015.8.26.0100 – 12ª CDPriv. – Relª Desª Sandra Galhardo Esteves – DJe 29.05.2017)

Comentário EditorialTrata-se, na origem, de Ação de Cobrança ajuizada por arrendatário do Porto Organizado de Santos, em face de empresa que se utilizou dos serviços de armazenagem prestados pelo primeiro, porém não pagou o que deveria. Em específico, tratava-se de um contêiner, o qual, devido à falta de pagamento, ficou retido na área arrendada pelo arrendatário.

O Réu, em sua defesa, alegou que não havia contratado diretamente os serviços prestados pelo Ter-minal arrendado, mas sim os prestados pelo Armador. Ato contínuo, alegou que os preços cobrados pelo titular do terminal arrendado eram abusivos, muito superiores aos praticados por outros terminais e que a retenção do contêiner era ilegal.

No fim, o Réu foi condenado ao pagamento dos valores cobrados pelo Autor, por intermédio da Sentença proferida em primeiro grau. Na esfera recursal, a Sentença restou mantida nos termos do Acórdão aqui em comento.

Deste Acórdão sobressaem três pontos de suma importancia, os quais merecem ser comentados aqui.

O primeiro deles é relacionado à abrangência dos serviços que são prestados pelo armador e pelo titular do terminal portuário arrendado.

De fato, os usuários de serviços portuários costumam contratar diretamente um Armador ou então um Agente Marítimo. Estes ficam encarregados de oferecer todo um pacote de serviços, intermediando a realização do transporte da mercadoria de um porto para o outro por intermédio do transporte aqua-viário e a contratação do terminal portuário (arrendado ou não) para a realização de movimentação e armazenagem.

Na prática funciona como a contratação de uma Agência de Turismo para se realizar uma viagem. O consumidor se utiliza da agência para que esta última se encarregue de contratar, em nome do primeiro, a empresa aérea para realizar o transporte e o hotel para a hospedagem. Veja-se que não há muita distinção quanto à forma de contratação.

Tanto a Agência de Turismo, quanto o Armador ou o Agente Marítimo, apresentam ao usuário ou ao consumidor, o preço total pela prestação do serviço de intermediação e de contratação das empresas para a realização do transporte e armazenagem ou hospedagem, a depender do caso. Uma vez aceito e contratado pelo usuário ou consumidor, este deve arcar com o pagamento de todos os serviços.

Na esfera portuária, o usuário, por intermédio do armador ou do Agente Marítimo, contrata tanto o armador para a realização do transporte de sua mercadoria, como o titular do terminal portuário para a realização da movimentação e armazenagem da mercadoria. Em contrapartida, tanto o armador ou o agente marítimo, como o titular do terminal, devem indiscutivelmente ser remunerados pelos serviços prestados.

Logo, não há qualquer cabimento na tentativa do usuário de tentar se esquivar da obrigação de pagar o titular do terminal pelo fato de ter realizado a contratação do armador apenas.

No que concerne à alegação utilizada pela Ré, no sentido de que os valores cobrados pela Autora teriam sido abusivos, o Acórdão aqui em comento também acertou, na medida em que consignou que é de se esperar que o armador tenha encontrado o melhor custo-benefício e que, além disso, os preços praticados são sempre fiscalizados pela Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp e pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq. E mais, cumpre ainda comentar que, como dito acima, a Ré, ao escolher o armador, autorizou que este último contratasse o titular do terminal em seu nome, o que se faz presumir que a Ré aceitou arcar com todas as despesas incluídas no pacote oferecido.

Page 184: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

184 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

No que concerne à retenção do contêiner, não há qualquer ilegalidade quanto a isso. O Código Civil, em seu art. 644 prevê que “o depositário poderá reter o depósito até que se lhe pague a retribuição devida, o líquido valor das despesas [...]”. Foi com base nesse dispositivo legal que o titular do termi-nal portuário arrendado acertadamente reteve a mercadoria pertencente ao Réu.

2836 – Arrendamento portuário – serviços de abertura e fechamento dos portões – acesso ao cais – cobrança – inexigibilidade do crédito – repetição do indébito – impossibilidade

“Recurso de apelação. Ação e procedimento ordinário. Direito administrativo. Contrato de arren-damento. Cobrança de valores decorrentes da prestação de serviços de abertura e fechamento dos portões de acesso ao cais do Porto de Santos. Guarda portuária. Pretensão à inexigibilidade do crédito e repetição do indébito. Impossibilidade. 1. É indevida a cobrança dos valores questiona-dos nos autos, ante a inexistência de previsão legislativa e contratual. 2. A Tabela II, do contrato de arrendamento celebrado entre as partes litigantes, que institui a cobrança da Tarifa Portuária, prevê a utilização da infraestrutura terrestre, para o acesso ao Porto de Santos, sob responsabilida-de da Guarda Portuária. 3. Impossibilidade de cobrança de valores para a abertura e fechamento dos portões de acesso ao cais do Porto de Santos, pela Guarda Portuária, pois, já estão incluídos nas respectivas disposições contratuais. 4. Ação de procedimento ordinário, julgada procedente. 5. Sentença, ratificada. 6. Recurso de apelação, apresentado pela parte ré, desprovido.” (TJSP – Ap 0038611-68.2012.8.26.0562 – 5ª CDPúb. – Rel. Des. Francisco Bianco – DJe 20.06.2017)

2837 – Carga – presença – certificação equivocada – tributos – recolhimento indevido – ressarci-mento – danos materiais

“Apelação cível. Ação de indenização por danos morais e materiais. Prestação de serviços de rece-bimento, depósito e certificação de cargas em porto. Container recebido e certificado com presença de carga de matéria-prima importada pela empresa autora. Mercadoria que, na verdade, não havia sido transportada. Certificação equivocada de presença de carga que fez com que a autora recolhes-se tributos indevidamente. Falha na prestação de serviços demonstrada através da documentação anexada na inicial. Documentos que não foram contestados pelo réu. Danos materiais. Devido res-sarcimento da diferença de impostos recolhidos indevidamente e dos honorários de assessoramento para cancelamento de declaração de importação junto à Receita Federal. Não configurado o dano à honra objetiva. Súmula nº 227 do STJ. Prejuízos que não repercutiram na imagem da empresa autora perante os seus consumidores. Improcedência do pedido de indenização por dano moral. Sentença reformada em parte. Recurso de apelação parcialmente provido.” (TJPR – AC 0016118-46.2014.8.16.0129 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Sigurd Roberto Bengtsson – DJe 02.06.2017)

2838 – Carga retida – liberação – conhecimento de embarque – via original – apresentação – Instrução Normativa SFB nº 680/2006 – Instruções Normativas RFB nºs 1.356/2013 e 1.443/2014 – necessidade

“Obrigação de fazer. Liberação de carga retida em processo aduaneiro pendente de envio de dados eletrônicos pela transportadora marítima, a qual exige a apresentação do conhecimento de embar-que na via original pelo interessado no desembaraço. Pretensão julgada improcedente em primeiro grau de jurisdição, diante do convencimento da legitimidade da conduta da ré, nos termos do art. 754 do Código Civil. Irresignação recursal da autora sustentando que a Instrução Normativa nº 1.356/2013 da Receita Federal acabou com a exigência de apresentação da via original do co-nhecimento de embarque, sendo que o frete foi integralmente quitado. Conhecimento de transpor-te. Documento que representa a propriedade da carga pelo portador, passível de transferência por endosso, nos termos do art. 576 e seguintes do Código Comercial. Situação em que o depositário da carga deve liberá-la a quem apresente o original do conhecimento, nos termos do art. 754 do Códi-

Page 185: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������185

go Civil. Regime administrativo aduaneiro que não tem o condão de alterar o status jurídico entre o proprietário e o depositário da carga. Revogação, ainda, da IN 1.356/2013 pela de nº 1.443/2014, alterando a redação do § 3º do art. 55 da antiga IN 680/2006, restabelecendo a exigência da apre-sentação do original do conhecimento nos procedimentos por ela disciplinados. Pretensão negada. Sucumbência recursal. Nova disciplina do Código de Processo Civil que implica na cumulação sucumbencial em grau recursal, adotando parâmetros em função do proveito econômico obtido e do trabalho adicional dos advogados. Circunstância, no caso em testilha, que o recurso foi oposto contra sentença prolatada na vigência do Novo CPC, e o trabalho adicional dos advogados se re-sume na confecção de razões e contrarrazões, além do acompanhamento processual na instância, arbitrando-se honorários de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) em favor dos patronos da instituição de ensino, cumulável com a de primeiro grau (§§ 2º e 11 do art. 85). Sentença mantida. Apelação não provida.” (TJSP – Ap 1033121-43.2015.8.26.0562 – 12ª CDPriv. – Rel. Des. Jacob Valente – DJe 23.06.2017)

Transcrição EditorialInstrução Normativa SRF nº 680, de 02 de outubro de 2006:

“Condições e Requisitos para a Entrega

Art. 54. Para retirar as mercadorias do recinto alfandegado, o importador deverá apresentar ao depo-sitário os seguintes documentos:

I – via original do conhecimento de carga, ou de documento equivalente, como prova de posse ou propriedade da mercadoria; (Revogado(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1356, de 03 de maio de 2013)

II – comprovante do recolhimento do ICMS ou, se for o caso, comprovante de exoneração do pa-gamento do imposto, exceto no caso de Unidade da Federação com a qual tenha sido celebrado o convênio referido no art. 53 para o pagamento mediante débito automático em conta bancária, por meio do Siscomex;

III – Nota Fiscal de Entrada emitida em seu nome, ou documento equivalente, ressalvados os casos de dispensa previstos na legislação estadual; e

IV – documentos de identificação da pessoa responsável pela retirada das mercadorias.

Art. 55. O depositário do recinto alfandegado, para proceder à entrega da mercadoria, fica obrigado a:

I – confirmar, mediante consulta ao Siscomex, a autorização da SRF para a entrega da mercadoria;

II – verificar a apresentação, pelo importador, dos documentos referidos no art. 54; e

III – registrar as seguintes informações:

a) data e hora da entrega das mercadorias, por DI;

b) nome, número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e respectivo documento de identificação, com dados do órgão emitente e data de emissão, do responsável pela retirada das mercadorias;

c) nome empresarial e respectivo número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) da pessoa jurídica que efetue o transporte das mercadorias em sua retirada do recinto alfan-degado; e

d) placas dos veículos e número da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) dos condutores dos veí-culos que efetuarem o transporte referido na alínea c.

§ 1º Será dispensada a apresentação, pelo importador, do documento de que trata o inciso II do caput do art. 54, sempre que a consulta ao Siscomex, prevista no inciso I do caput deste artigo não indicar a necessidade de sua apresentação ou retenção.

§ 2º Fica vedada a exigência de apresentação do Comprovante de Importação ou de qualquer outro documento, diverso daqueles previstos no art. 54 ou necessário ao cumprimento dos requisitos esta-belecidos neste artigo, como condição para a entrega da mercadoria ao importador.

§ 3º O disposto no § 2º não dispensa o depositário de adotar medidas ou de exigir os comprovantes necessários para o cumprimento de outras obrigações legais, em especial as previstas no art. 754 da Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1443, de 06 de fevereiro de 2014)”

Page 186: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

186 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

2839 – Crédito-prêmio IPI – liquidação de sentença – valor “FOB” – base de cálculo – exclusão de benefício fiscal (drawback) e de comissão do agente ou representante no exterior – en-foque constitucional

“Processual civil. Recurso especial. Crédito-prêmio IPI. Liquidação de sentença. Valor ‘FOB’. Base de cálculo. Exclusão de benefício fiscal (drawback) e de comissão do agente ou representante no exterior. Necessidade de revolvimento do contexto fático-probatório. Súmula nº 7/STJ. Existência de valores a liquidar. Matéria decidida pela Corte de origem sob o enfoque constitucional. Impos-sibilidade de apreciação da matéria pelo STJ. 1. A análise dos autos denota que o recurso especial não merece conhecimento porque, em relação à alegativa de necessidade de decote do benefício fiscal drawback do valor ‘FOB’, o acórdão afirma categoricamente que a recorrente nem sequer alegou perante o Juízo de primeira instância que a liquidante estaria enquadrada em tal benefício, quanto mais comprovado essa situação. Para afastar o entendimento a que chegou a Corte a quo, de modo a albergar as peculiaridades do caso e verificar a possível existência do drawback em favor da parte recorrida, como sustentado neste apelo extremo, necessário o revolvimento do acervo fático--probatório dos autos, o que se mostra inviável em recurso especial, por óbice da Súmula nº 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’. 2. Quanto ao argumento de que seria necessário excluir do valor ‘FOB’ a comissão do agente ou representante do exterior, o Tribunal de origem, também à luz do contexto-fático probatório, concluiu que a sentença com trânsito em julgado decidiu pela ilegalidade das portarias ministeriais em que se baseia a Fazenda Nacional. Tal circunstância também atrai o óbice da Súmula nº 7/STJ, dada a necessidade de ana-lisar eventual contrariedade à coisa julgada. Precedentes. 3. No que se refere à alegação de ‘liqui-dação zero’, tem-se que a Corte a quo refutou esse argumento sob a perspectiva de inexistência de inconstitucionalidade nos decretos que deram suporte à alíquota de 15% impugnada pela Fazenda. Quando a controvérsia é solucionada com fundamento em princípios ou dispositivos constitucio-nais, o recurso especial é inviável, sob pena de usurpação da competência reservada pela Consti-tuição ao Supremo Tribunal Federal. 4. Recurso especial não conhecido.” (STJ – REsp 1483418/SC – 2ª T. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 14.06.2017)

2840 – Débito fiscal – ação anulatória – multa – art. 107, IV, c, Decreto-Lei nº 37/1966 – registro no Siscomex – agente marítimo – responsabilidade solidária – ausência

“Tributário, processual civil e administrativo. Remessa oficial que não se conhece. Apelação em ação anulatória de débito fiscal. Multa aplicada com base no art. 107, IV, c, DL 37/1966. Registro no Siscomex. Agente marítimo. Ausência de responsabilidade solidária. Art. 32, parágrafo único, b, DL 37/1966. Precedentes do STJ e desta Corte Regional. Manutenção da verba honorária. Re-curso improvido. 1. Remessa oficial que não se conhece, tendo em vista que o valor da causa não excede a sessenta salários mínimos, nos termos do art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da prolação da sentença. 2. Na hipótese dos autos, pretende a União Fe-deral a reforma da r. sentença que julgou procedente o pedido para cancelar o Auto de Infração nº 0817800/00069/04 e o respectivo processo administrativo de nº 11128.006376/2004-40, de modo a afastar a multa prevista no art. 107, IV, c, do Decreto-Lei nº 37/1966 e determinar a baixa da inscrição em dívida ativa de nº 80.6.11.089391-33, ao argumento de que legítimo o ato admi-nistrativo impugnado, por entender caracterizada a responsabilidade solidária do agente marítimo na espécie, nos termos do art. 32, parágrafo único, b, do Decreto-Lei nº 37/1966, na redação con-ferida pelo Decreto-Lei nº 2.472/1988. 3. De acordo com as normas que regem a matéria, compete ao transportador e não ao agente marítimo – este mero mandatário do armador ou proprietário do navio mercante –, realizar a inserção de dados relativos à exportação no Siscomex, não se podendo atribuir ao agente marítimo a condição de responsável solidário pelo cumprimento de obrigações relativas à organização do serviço aduaneiro, visto que ausente qualquer previsão legal nesse sen-tido. A responsabilidade solidária do agente marítimo, portanto, restringe-se ao pagamento do im-

Page 187: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������187

posto de importação, não cabendo à autoridade administrativa ampliar o alcance da norma onde o legislador não o fez. 4. Precedentes do STJ, em julgamento de recurso repetitivo, e desta Corte Regional. 5. Verba honorária que deve ser mantida tal como fixada pela r. sentença, à razão de 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º, conforme entendimento jurisprudencial desta Terceira Turma. 6. Remessa oficial não conhecida e apelação improvida.” (TRF 3ª R. – Ap-Reex 0003027-70.2012.4.03.6104 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho – DJe 12.05.2017)

2841 – Demurrage – contêiner – prescrição – art. 22 da Lei nº 9.611/1998 – inaplicabilidade

“Ação de cobrança. Sobrestadia de container. Magistrado que de ofício reconheceu a ocorrência da prescrição. Insurgência. Prescrição que não se consumou. Art. 449, do Código Comercial que foi revogado pelo novo Código Civil, não havendo que se falar, outrossim, em aplicação do art. 22 da Lei nº 9.611/1998. Aplicação, agora, do prazo fixado no art. 206, § 5º, inciso I, do indigitado Codex, que é de cinco anos. Extinção afastada. Recurso provido para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para regular prosseguimento do feito.” (TJSP – Ap 1024827-65.2016.8.26.0562 – 12ª CDPriv. – Rel. Des. Jacob Valente – DJe 23.06.2017)

2842 – Demurrage – devolução dos contêineres – data controvertida – cobrança – limitação – re-latórios do terminal portuário – apuração do valor em liquidação – nulidade da sentença – inocorrência

“Apelação cível. Contrato de transporte marítimo. Ação de cobrança de sobre-estadia (demurrage). Nulidade da sentença. Inocorrência. Pagamento das sobre-estadias. Obrigação da consignatária da carga. Franquia de free time extrapolada. Prorrogação dos prazos não comprovada. Devolução dos contêineres. Data controvertida. Ausente documento comprobatório da devolução. Limitação da cobrança com base nos relatórios do terminal portuário. Apuração do valor em liquidação de sentença. Nulidade da sentença. A fundamentação sucinta não se confunde com ausência de funda-mentação, bem como a utilização pelo magistrado de fundamentos deduzidos em outras demandas semelhantes, sendo estas adequadas ao caso em análise, não são causas de nulidade. Precedente do STF. Relegada a apreciação da inépcia da inicial, pela falta de juntada do relatório da entrega dos contêineres, quando da análise do mérito. Inépcia que não se verifica quando ausentes as hipó-teses previstas no § 1º do art. 330 e presentes os requisitos do art. 319, ambos do CPC. Do mérito. Evidenciada a responsabilidade do consignatário da carga transportada pelo pagamento do frete e demais despesas e ultrapassado o free time para a devolução dos contêineres, cabe ao importador o pagamento das sobre-estadias. Prazo free time e valor das diárias expostos no site da empresa trans-portadora, informação esta constante dos conhecimentos de embarque, não cabendo ao importador alegar desconhecimento. Ausência de prova da prorrogação do free time para 25 dias, ônus do apelante, mantido este como sendo de 10 dias, nos termos da inicial. Não demonstrada a data da devolução dos contêineres, ônus da autora, impõe-se a limitação do número de dias de sobre--estadias com base nas datas de entrada e saída dos contêineres do terminal portuário, conforme relatórios remetidos ao Juízo. Valor devido a ser apurado em liquidação de sentença observados os critérios estabelecidos no acórdão. Preliminar rejeitada. Apelo provido em parte. Unânime.” (TJRS – AC 0400886-65.2016.8.21.7000 – 12ª C.Cív. – Rel. Des. Pedro Luiz Pozza – DJe 27.04.2017)

2843 – Despesas de armazenagem – abandono da mercadoria – contraprestação – cobrança – União – legitimidade passiva – art. 31 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 – art. 647 do Decreto nº 6.759/2009 – apelação – desprovimento

“Processual civil. Tributário. Despesas de armazenagem. Cobrança. Legitimidade passiva da União Federal pelo pagamento. Exigência em caso de abandono da mercadoria. Apelação desprovida. 1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de ressarcimento de valor gasto com armazenamento

Page 188: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

188 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

de mercadoria abandonada em instalação portuária de uso público. 2. Preliminarmente, não assiste razão à União Federal quando sustenta sua ilegitimidade passiva. Isso porque a sua legitimidade ad causam decorre de expressa previsão legal, conforme art. 31 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e art. 647 do Decreto nº 6.759/2009, os quais dispõem que feita a comunicação dos bens abandona-dos dentro do prazo de cinco dias à Secretaria da Receita Federal do Brasil, cabe a este órgão efetuar o pagamento, ao depositário, da tarifa de armazenagem devida até a data em que retirar a merca-doria. 3. No mérito propriamente dito, o crédito postulado é uma consequência natural do ônus do depósito, considerando a prestação do serviço, in casu, pelo armazenamento dos bens importados. 4. A remuneração é destinada à cobertura dos custos operacionais envolvidos na prestação dos ser-viços, diante das responsabilidades assumidas pela sua guarda e preservação, os quais não se rela-cionam aos óbices e ao procedimento de importação em que houve a retenção dos bens pelo Poder Público. 5. Com efeito, é evidente que, no momento em que ocorre o abandono das mercadorias pelo importador/exportador, a responsabilidade pelos bens passam a ser da União Federal, a quem cumpre dar o devido destino aos bens. Trata-se de contraprestação a ser desembolsada por aquele que contratou os serviços, in casu, pelo Poder Público detentor do bem abandonado. 6. Ademais, como já mencionado acima, o dever de indenizar o apelado, ao contrário do que alega a apelante, decorre de lei (art. 31 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e art. 647 do Decreto nº 6.759/2009), e não de um contrato de concessão/permissão. Não resta dúvida que eventual irregularidade havida entre a importadora e o Fisco, que culminou com o abandono e perdimento da mercadoria, não pode ser alegado para a desoneração desse encargo, por ter a autora tomado todas as providências a seu cargo, conforme previsto no ordenamento aduaneiro. 7. Precedentes. 8. Por fim, observa-se que, não obstante a ré tenha questionado os valores cobrados, não impugnou o método de cálculo e nem sugeriu outro valor. 9. Apelação desprovida.” (TRF 3ª R. – Ap-Reex 0024344-44.2009.4.03.6100 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho – DJe 12.05.2017)

2844 – Despesas de armazenagem – terminal portuário – responsabilidade – Peca – apreensão de mercadorias

“Tributário. Despesas de armazenagem. Terminal portuário. Responsabilidade. Apreensão de mer-cadorias. Peca. Honorários. 1. Durante o período de retenção de mercadorias sujeitas à fiscalização aduaneira (do início ao final do Procedimento Especial de Controle Aduaneiro – Peca), quando a responsabilidade pelas mercadorias é do Estado, não cabe cobrar do cidadão despesas de armaze-nagem. 2. O recinto alfandegado, concessionário de serviço público, está obrigado a disponibilizar, sem custo para a RFB, instalações exclusivas à guarda e armazenamento de mercadorias retidas ou apreendidas, consoante Portaria RFB nº 3.518/2011. 3. Honorários advocatícios fixados em confor-midade com o disposto no art. 20, § 4º do antigo CPC.” (TRF 4ª R. – AC 5005899-92.2013.404.7208 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Amaury Chaves de Athayde – DJe 12.06.2017)

2845 – Direito antidumping provisório – Resolução Camex nº 10/2016 – espelhos não emoldura-dos – sobretaxa – cobrança – marco temporal – registro da declaração de importação

“Direito econômico. Mandado de segurança. Resolução nº 10/2016, da Câmara de Comércio Ex-terior – Camex. Direito antidumping provisório. Sobretaxa de espelhos não emoldurados, oriundos da República Popular da China e do México. Cobrança. Marco temporal. Registro da declara-ção de importação. Art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.019/1995. Precedentes do STJ. Segurança denegada. I – Mandado de Segurança impetrado, em 04.04.2016, contra ato do Presidente da Câmara de Co-mércio Exterior – Camex, o Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, consubstanciado na edição da Resolução nº 10, de 18.02.2016, da Camex, que aplicou o direito antidumping definitivo, por um prazo de até cinco anos, às importações brasileiras de espelhos não emoldurados, originárias da República Popular da China e do México. II – Na hipótese dos autos,

Page 189: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������189

pretende a impetrante liberar-se do pagamento do direito antidumping devido pela importação de espelhos não emoldurados, remanescentes de um total de vinte caixas, ao fundamento de que a expedição da licença de importação a elas relativa, bem como a sua colocação em regime de entreposto aduaneiro, ocorreram antes da vigência da referida Resolução nº 10, de 18.02.2016, da Camex, embora não tenha ocorrido o registro da Declaração de Importação referente às treze caixas remanescentes, que permanecem no regime de entreposto aduaneiro. III – Na forma da jurispru-dência, ‘salvo os casos de retroatividade, os direitos antidumping são devidos na data do registro da declaração de importação, sendo irrelevante a data em que ocorreu o embarque da mercadoria. Inteligência dos arts. 219 da CF/1988 e 7º, caput e § 2º, e 8º, caput e § 1º, da Lei nº 9.019/1995. Na espécie, as mercadorias importadas ainda não foram internalizadas, sendo a cobrança da medida antidumping por ocasião do registro da Declaração de Importação (DI) como condição para seu ingresso no território nacional’ (STJ, MS 20.481/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª S., DJe de 20.06.2014). Em igual sentido: STJ, MS 21.168/DF, Relª Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, DJe de 16.04.2015. IV – A licença de importação – mera autorização administrativa para impor-tação de determinado produto, conforme art. 550 do Decreto nº 6.759/2009, e que, no caso, foi expedida antes da Resolução Camex nº 10, de 18.02.2016 – difere da declaração de importação, cujo registro, no momento do desembaraço aduaneiro da mercadoria importada, torna exigível o pagamento de tributos e de outros ônus incidentes sobre a importação, inclusive o pagamento dos direitos antidumping e dos direitos compensatórios, os quais, na forma do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.019/1995, ‘são devidos na data do registro da declaração de importação’. V – Nos termos do art. 409, I, do Decreto nº 6.759, de 05.02.2009 (Regulamento Aduaneiro), somente após o prazo de vigência do regime de entreposto aduaneiro, com o despacho para consumo – que ocorre por oca-sião do despacho aduaneiro, iniciado com o registro da declaração de importação –, considera-se internalizada a mercadoria. VI – Assim sendo, o direito antidumping é devido na data do registro da declaração de importação, na forma do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.019/1995, sendo irrelevante o fato de a mercadoria encontrar-se em regime de entreposto aduaneiro antes da vigência da Resolução nº 10, de 18.02.2016, da Camex, pois não foi ela ainda internalizada, porquanto, durante a vigência do regime de entreposto aduaneiro, não há despacho para consumo – como se colhe do art. 409, I, do Decreto nº 6.759/2009 –, que se inicia com o registro da declaração de importação, conforme art. 545 do referido Decreto nº 6.759/2009. VII – No caso, estando as mercadorias, importadas pela impetrante, em regime de entreposto aduaneiro, quando do início da vigência do ato impugnado – Resolução nº 10, de 18.02.2016, da Camex, que aplicou o aludido direito antidumping definitivo, por um prazo de até cinco anos, às importações brasileiras de espelhos não emoldurados, originá-rias da República Popular da China e do México –, legítima a cobrança da medida antidumping, como condição de ingresso das mercadorias importadas no território nacional. VIII – Igualmente o fato de a Licença de Importação ter sido expedida e a Declaração de Importação ter sido par-cialmente registrada – relativamente a apenas seis das vinte caixas de mercadorias importadas – é irrelevante para excluir a impetrante da cobrança da medida antidumping, quanto à importação das caixas remanescentes entrepostadas, em relação às quais não houve o registro da Declaração de Importação. IX – Segurança denegada.” (STJ – MS 22.521/DF – 1ª S. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 08.05.2017)

Transcrição Editorial• Constituição Federal:“Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.

Parágrafo único. O Estado estimulará a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, bem como nos demais entes, públicos ou privados, a constituição e a manutenção de parques e polos

Page 190: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

190 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

tecnológicos e de demais ambientes promotores da inovação, a atuação dos inventores independentes e a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015)”

• Lei nº 9.019, de 30 de março de 1995:

“Art. 7º O cumprimento das obrigações resultantes da aplicação dos direitos antidumping e dos direi-tos compensatórios, sejam definitivos ou provisórios, será condição para a introdução no comércio do País de produtos objeto de dumping ou subsídio.

[...]

§ 2º Os direitos antidumping e os direitos compensatórios são devidos na data do registro da decla-ração de importação. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)

[...]

Art. 8º Os direitos antidumping ou compensatórios, provisórios ou definitivos, somente serão aplica-dos sobre bens despachados para consumo a partir da data da publicação do ato que os estabelecer, excetuando-se os casos de retroatividade previstos nos Acordos Antidumping e nos Acordos de Sub-sídios e Direitos Compensatórios, mencionados no art. 1º.

§ 1º Nos casos de retroatividade, a Secretaria da Receita Federal intimará o contribuinte ou respon-sável para pagar os direitos antidumping ou compensatórios, provisórios ou definitivos, no prazo de 30 (trinta) dias, sem a incidência de quaisquer acréscimos moratórios. (Incluído pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)”

• Decreto nº 6.759, de 05 de fevereiro de 2009:

“Art. 409. A mercadoria deverá ter uma das seguintes destinações, em até quarenta e cinco dias do término do prazo de vigência do regime, sob pena de ser considerada abandonada: (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, inciso II, alínea d)

I – despacho para consumo;

[...]

Art. 545. Tem-se por iniciado o despacho de importação na data do registro da declaração de im-portação.

§ 1º O registro da declaração de importação consiste em sua numeração pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, por meio do Siscomex.

§ 2º A Secretaria da Receita Federal do Brasil disporá sobre as condições necessárias ao registro da declaração de importação e sobre a dispensa de seu registro no Siscomex.

[...]

Art. 550. A importação de mercadoria está sujeita, na forma da legislação específica, a licenciamento, por meio do Siscomex.

§ 1º A manifestação de outros órgãos, a cujo controle a mercadoria importada estiver sujeita, também ocorrerá por meio do Siscomex.

§ 2º No caso de despacho de importação realizado sem registro de declaração no Siscomex, a mani-festação dos órgãos anuentes ocorrerá em campo específico da declaração ou em documento próprio.

§ 3º Os Ministros de Estado da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior determi-narão, de forma conjunta, as informações de natureza comercial, financeira, cambial e fiscal a serem prestadas para fins de licenciamento.”

2846 – DPEM – cobrança – acidente náutico – falecimento – indenização máxima – inadimple-mento do prêmio – recusa do pagamento da indenização – impossibilidade

“Recurso inominado. Ação de cobrança do DPEM. Acidente náutico. Aplicação seguro obrigatório da Lei nº 8.374/1991. Mesma finalidade do DPVAT, mas para acidente com embarcações. Faleci-mento. Indenização máxima. Aplicação da Súmula nº 273, STJ. A falta de adimplemento do prêmio não é motivo para a recusa do pagamento da indenização. Responsabilidade da participante do consórcio de seguradoras. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. Recurso conhecido e desprovido.” (TJPR – RI 0042837-85.2015.8.16.0014 – 2ª TRec. – Rel. Des. Rafael Luis Brasileiro Kanayama – DJe 15.05.2017)

Page 191: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������191

2847 – Drawback suspensão – âmbito federal – consulta administrativa – benefício da suspensão do ICMS e do seu crédito presumido – resposta negativa – segurança pleiteada – conces-são parcial

“Apelação cível. Mandado de segurança. Impetrante que pretende se beneficiar do regime de dra-wback suspensão no âmbito federal. Consulta administrativa perante o fisco a fim de confirmar a possibilidade de continuar usufruindo do benefício da suspensão do ICMS previsto no art. 615, I, do RICMS/PR (Decreto nº 6.080/2012) e do crédito presumido de ICMS previsto no item 46-A do Anexo III do RICMS/PR. Resposta negativa da autoridade fazendária. Possibilidade de aplicação dos benefícios da suspensão e do crédito presumido independentemente da utilização do regime de drawback isenção no âmbito federal. Existência de saída posterior da mercadoria do estabeleci-mento da impetrante. Exportação posterior, ademais, que caso venha a ocorrer, não prejudica a suspensão nem o crédito presumido de ICMS. Art. 29 § 2º da Lei nº 11.580/1996, arts. 72, inciso I e § 2º, 105, § 5º e nota 7 do item 46-A do anexo III do RICMS/PR. Recurso provido a fim de conceder em parte a segurança pleiteada. Ônus sucumbencial invertido.” (TJPR – AC 0000493-85.2016.8.16.0004 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Carlos Mauricio Ferreira – Unânime – DJe 09.05.2017)

Transcrição EditorialDecreto nº 6.080, de 28 de setembro de 2012:

“Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – RICMS

[…]

16. Até 30.06.2015, aos estabelecimentos fabricantes dos produtos classificados nos códigos da NCM a seguir relacionados, no percentual de sete por cento sobre o valor das operações interestaduais sujeitas à alíquota de doze por cento e no percentual de dois por cento sobre o valor das operações interestaduais sujeitas à alíquota de sete por cento:

a) 8471.90.19 – leitores magnéticos de cartões inteligentes;

[...]

Notas:

1. o benefício de que trata este item fica condicionado a que o beneficiário não utilize o crédito pre-sumido de que trata o item 46-A deste Anexo;

Nova redação dada à Nota 1 do item 16 pelo art. 1º, alteração 652-A, do Decreto nº 1.817 de 06.07.2015, produzindo efeitos a partir de 11.03.2015.

Redação original em vigor de 01.10.2012 até 10.03.2015:

1. o benefício de que trata este item fica condicionado a que o beneficiário não utilize o crédito pre-sumido de que trata o art. 615;

[...]

Art. 615. Fica concedida ao estabelecimento industrial que realizar a importação de mercadoria por meio dos portos de Paranaguá e Antonina, e de aeroportos paranaenses, com desembaraço aduaneiro no Estado, a suspensão do pagamento do imposto devido nessa operação, quando da aquisição de matéria-prima, material intermediário ou secundário, inclusive material de embalagem, para ser utili-zado em seu processo produtivo (Lei nº 14.985/2006).

§ 1º O disposto neste artigo se aplica também no caso de industrialização em estabelecimento diverso do importador.

§ 2º O estabelecimento importador deverá consignar no campo ‘Informações Complementares’ da nota fiscal emitida para documentar a operação a anotação ‘ICMS suspenso de acordo com o art. 615 do RICMS’.”

Observação EditorialO art. 615 foi acima transcrito na sua nova redação, instituída pelo art. 1º, alteração 643ª, do Decreto nº 1.790, de 03.07.2015, produzindo efeitos a partir de 11.03.2015. Indicamos que o texto com-pilado da norma seja consultado diretamente através do link: <http://www.sefanet.pr.gov.br/dados/sefadocumentos/106201206080.pdf>.

Page 192: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

192 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

2848 – Embarcação – acidente – meio ambiente – vazamento de mistura ácida – responsabilidade civil objetiva e solidária – indenização do dano

“Direito internacional, ambiental e processual civil. Acidente com embarcação. Vazamento de mis-tura ácida em manancial de água. Responsabilidade civil objetiva e solidária. Indenização do dano. 1. A despeito de ter sido celebrado em país estrangeiro, à luz de legislação alienígena, o contrato de seguro marítimo produz efeitos além das fronteiras, uma vez que a embarcação assegurada percor-re longas distâncias (cobertura internacional) e, consoante o disposto no art. 88, incisos II e III, do CPC/1973, é competente a autoridade judiciária brasileira, quando no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação e a ação originar-se de fato ocorrido ou de ato praticado no país. Além disso, o art. 337 do CPC/1973 (vigente à época) e o art. 12 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro permitem a aplicação de norma estrangeira a casos submetidos à jurisdição nacional, sendo com-petente a autoridade judiciária brasileira para o litígio, quando aqui tiver de ser cumprida a obriga-ção. E há, ainda, a alegação de que o vazamento de ácido sulfúrico no interior da embarcação teve início durante o trajeto Austrália-Brasil e culminou com o bombeamento de parte da substância química, misturada com metais pesados, para o canal de acesso a Lagoa dos Patos em território nacional. 2. A possibilidade de condenação direta e solidária da Companhia Seguradora ao paga-mento de indenização eventualmente devida é amplamente admitida na jurisprudência pátria, por-que o resultado desejado pelo direito material não é outro senão o de que a vítima do dano causado por acidente seja indenizada, efetiva e prontamente, e a Companhia Seguradora suporte, ao fim e ao cabo, os prejuízos experimentados pelo terceiro, no limite dos valores contratados pelo segura-do, depois de reconhecida a condição deste de causador do dano. 3. É firme na jurisprudência o entendimento no sentido de que, nos danos ambientais, incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981), sendo, por conseguinte, descabida a alegação de excludentes de responsabilidade, bastando, para tanto, a ocorrência de resultado prejudicial ao ho-mem e ao ambiente advinda de uma ação ou omissão do responsável (STJ, 4ª T., REsp 1374342/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Julgado em 10.09.2013, DJe 25.09.2013). 4. O derramamento de quantidade expressiva de substância química de alta toxidade e estranha ao habitat natural, mistu-rada com resíduos metálicos, em manancial de água (elemento essencial à vida), afetou e desorga-nizou o equilíbrio do ecossistema local, porquanto implicou interferência humana indevida no meio ambiente (daí a ilicitude do ato), o que dispensa prova de prejuízos in concreto, que se presu-mem (dano in re ipsa). Embora, do ponto de vista epistemológico, ‘impacto’ e ‘dano’ não sejam si-nônimos – até porque toda e qualquer atividade humana é capaz de alterar (impactar) o meio am-biente e as mudanças previsíveis e controladas de suas propriedades físicas, químicas ou biológicas são toleradas pelo ordenamento jurídico, desde que acompanhadas por medidas preventivas, miti-gadoras e/ou compensatórias impostas pela autoridade administrativa (princípio da prevenção – art. 225 da CF e Lei nº 6.938/1981), no caso concreto, houve uma lesão indesejada nos recursos ambientais, com consequente poluição prejudicial ao equilíbrio ecológico e à qualidade de vida (responsabilidade civil) – vale dizer, uma perda indevida à coletividade que deveria ter sido evitada. 5. Além de danos ao assentamento de indivíduos juvenis de organismos bentônicos, atestados por laudo emitido pela Furg, para que ocorra alteração ‘adversa’ das características do meio ambiente que prejudique a saúde, a segurança ou o bem-estar da população, crie condições negativas para as atividades sociais, afete desfavoravelmente a biota, as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente (art. 3º da Lei nº 6.938/1981), pouco importa a quantidade de produtos químicos lançada na lagoa ou no mar, que, por força da movimentação de correntes, espalha-se por longas extensões, atingindo a fauna, a flora e a qualidade da água, ou a inocorrência de mortandade de peixes ou outra espécime aquática (como se esse fosse o único dano possível), pois milita em favor da existên-cia de dano ambiental uma presunção hominis – é mais razoável supor, com base nas máximas de

Page 193: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������193

experiência, que o derramamento de mistura ácida provoque algum tipo de lesão ao ecossistema atingido, do que acreditar que a quantidade de substância nociva derramada na água tenha sido despercebidamente assimilada pela fauna e flora local. 6. A intensidade dos resultados danosos pode até influenciar a quantificação do valor indenizatório, mas não tem o condão de afastar o nexo de causalidade, porque a diferença entre as grandes e as pequenas agressões ao meio ambiente está na punição a ser imposta ao agente causador. 7. Afora os prejuízos causados ao ecossistema lacus-tre e marítimo em si, havia, ainda, o risco de explosão do navio e foi suspensa, temporariamente, a execução de algumas atividades laborais (tais como a pesca e as operações portuárias), com reflexos diretos na economia local e no bem-estar da população (que ficou apreensiva com os potenciais efeitos nocivos a sua saúde), o que, por si só, configuram danos que ensejam a responsabilização daqueles que, de algum modo, contribuíram para a ocorrência do evento lesivo ou dele se benefi-ciaram. 8. A responsabilidade civil por dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do agente, público ou privado, é de natureza objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princí-pios poluidor-pagador, da reparação in integrum, da prioridade da reparação in natura e do favor debilis (do qual se infere a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental). Em outros termos, todos os agentes que, direta ou indiretamente, obtiveram proveito da atividade que resultou no evento lesivo respondem objetiva e solidariamente pelos prejuízos causados ao meio ambiente, com fundamento na teoria do risco integral, previsto na legislação ambiental (arts. 3º e 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981), combinado com o art. 942 do Código Civil. 9. Estando em discussão a respon-sabilidade civil dos réus pelos danos ambientais e à saúde humana causados por acidente envolven-do a embarcação, e não a responsabilidade administrativa pela infração ambiental em si, o dever de reparação integral do meio ambiente degradado é atribuído a todos os que estão vinculados ao evento lesivo, independentemente de dolo ou culpa do agente (o proprietário e o operador (expor-tador) do navio, os donos da carga, o administrador do terminal portuário), enfim todos que se be-neficiaram diretamente da atividade lesiva. Se não tivesse sido realizada a importação do ácido sulfúrico, jamais teria havido o transporte, a descarga e, em última análise, a situação de risco. 10. A modalidade de contratação da operação de importação – cost and freight (custo e frete) – é irre-levante, porquanto se destina a regular a relação negocial em si, definindo a responsabilidade do exportador/transportador sobre a carga (art. 103 do Código Comercial então vigente), e não a de natureza extracontratual com assento legal. A responsabilidade do poluidor por danos ao meio ambiente é objetiva e decorre do risco gerado pela atividade potencialmente nociva ao bem am-biental, admitindo-se como responsável também aquele que aufere indiretamente lucro com o risco criado. 11. A União, o Ibama, o Estado do Rio Grande do Sul e a Suprg não podem ser elevados à condição de seguradores universais da integralidade das lesões sofridas pelo meio ambiente, por carecerem de onipresença. Tampouco é possível responsabilizá-los pela autorização de bombea-mento da mistura ácida, com monitoramento constante do pH da água, para a Lagoa dos Patos – providência que decorreu de decisão técnica do órgão ambiental competente –, uma vez que não restou comprovado que havia outra solução técnica factível, eficiente e potencialmente menos agressiva ao meio ambiente ao alcance dos envolvidos. O problema reclamava medidas urgentes (ou seja, providências eficazes, logisticamente viáveis e prontamente exequíveis), em razão do ele-vado risco de exploração do navio, decorrente da liberação de grande quantidade de hidrogênio resultante de reação da mistura ácida com metais de bordo, e da impossibilidade de retirada da mistura ácida da embarcação em tempo hábil por outra embarcação ou mesmo por transporte ter-restre. E, mesmo que assim não fosse, o nexo de causalidade deve ser aferido com base na teoria da causalidade adequada, adotada explicitamente pela legislação civil brasileira (art. 403 do Código Civil), o que significa que só existirá quando a ação ou omissão do agente for determinante e dire-tamente ligada ao prejuízo. 12. Em tendo a própria Companhia Seguradora admitido a existência de contrato de seguro para a cobertura de danos decorrentes do uso ou tráfego do navio N/T Bahamas,

Page 194: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

194 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

incluem-se, nesse espectro, os de natureza ambiental pela inerência aos riscos próprios da atividade que foi assegurada, sem exclusão expressa, no limite dos valores contratados pelo segurado. 13. Em virtude do tempo decorrido desde o acidente ambiental (em 1998), são, faticamente, inviáveis o monitoramento espaço-temporal contínuo na região afetada e a restauração in natura do bem lesa-do, remanescendo como alternativa o pagamento de indenização pecuniária, como medida idônea à reversão à coletividade do proveito econômico auferido pelos degradadores com a exploração ilegal dos recursos ambientais, sem necessidade de outras providências compensatórias. 14. O largo espectro dos pleitos deduzidos na inicial – a abranger não só o meio físico como também a saúde humana, o ambiente de trabalho e o bem-estar da população – permite a fixação de uma indeniza-ção que abarque os variados danos patrimoniais e extrapatrimoniais causados pelo evento lesivo, desde os decorrentes da interferência indevida no meio ambiente, que afetou a fauna e a flora local, além da qualidade da água, até aqueles relacionados ao comprometimento da segurança e do bem estar da população, em virtude do risco de explosão da embarcação, à proibição temporária da pesca, à restrição ao consumo de produtos oriundos do estuário, em face das incertezas quanto a eventuais danos à saúde, à redução na comercialização de pescados e à suspensão temporária das operações portuárias, que impediu o atracamento de navios durante o período em que persistiu o risco.” (TRF 4ª R. – AC 5006075-38.2012.404.7101 – 4ª T. – Relª Desª Vivian Josete Pantaleão Caminha – DJe 29.05.2017)

Comentário EditorialPassados quase 20 anos de acidente com embarcação que resultou no vazamento de mistura ácida em manancial de água na Lagoa dos Patos (RS), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (“TRF4”) proferiu acórdão condenando solidariamente a seguradora, a transportadora e a proprietária da carga ao pagamento de indenização por danos ao meio ambiente.

Primeiramente o TRF4 reverteu a sentença de primeiro grau no que tange à participação da segu-radora na condenação. Tal parte havia sido excluída da lide pelo fato de o contrato de seguro ser documento estrangeiro. O Tribunal superou tal questão sob o entendimento de que o contrato de seguro firmado no exterior produz efeitos no Brasil no momento em que os danos são verificados no destino do transporte marítimo, sobretudo porque o direito brasileiro permite ao juiz conhecer de direito estrangeiro e aplicá-lo no Brasil (art. 337 do CPC/1973 (vigente à época) e o art. 12 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Quanto aos demais pontos da condenação, o TRF4 confirmou a responsabilidade objetiva com ex-pressa previsão constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981), considerando a quantidade expressiva da substancia química derramada e a sua alta toxidade, prin-cipalmente pela sensibilidade ambiental do local do derramamento, qual seja, manancial de água. Assim, foram descartados os argumentos contrários no sentido de que: (i) não teria havido prova de desequilíbrio ambiental no local, seja no momento do acidente, seja em testes posteriores; (ii) a Fun-dação Unidade do Rio Grande teria mitigado os danos com o bombeamento controlado da mistura áci-da com água salgada para o canal de acesso da Lagoa; (iii) não teria ocorrida a mortandade de peixes e nem os pescadores da região precisaram interromper suas atividades. Para o Tribunal os prejuízos in concreto seriam presumidos, pouco importando os efeitos, “pois milita em favor da existência de dano ambiental uma presunção hominis – é mais razoável supor, com base nas máximas de experiência, que o derramamento de mistura ácida provoque algum tipo de lesão ao ecossistema atingido, do que acreditar que a quantidade de substancia nociva derramada na água tenha sido despercebidamente assimilada pela fauna e flora local”.

O decurso do tempo desde o acontecimento do acidente em 1998 impediu o monitoramento espaço--temporal contínuo na região afetada e a restauração in natura do bem lesado. Todavia, a alternativa do pagamento de indenização pecuniária foi considerada possível, e no tocante o juiz manteve o expressivo valor de R$ 20.000.000,00, com base no faturamento da proprietária da carga no ano de 2009. O referido valor foi considerado suficiente para cobrir “o largo espectro dos pleitos deduzidos na inicial – a abranger não só o meio físico como também a saúde humana, o ambiente de trabalho e o bem-estar da população”, afetando “a fauna e a flora local, além da qualidade da água, até aqueles relacionados ao comprometimento da segurança e do bem-estar da população, em virtude do risco de explosão da embarcação, à proibição temporária da pesca, à restrição ao consumo de

Page 195: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������195

produtos oriundos do estuário, em face das incertezas quanto a eventuais danos à saúde, à redução na comercialização de pescados e à suspensão temporária das operações portuárias, que impediu o atracamento de navios durante o período em que persistiu o risco”. O acórdão em questão é um bom exemplo de como o Poder Judiciário brasileiro está tratando a lesão ao meio ambiente com seriedade e rigor. Fatores como o decurso do tempo ou a recomposição do meio não sensibilizaram o TRF4 ao aplicar indenização em quantia vultosa. Não é possível prever se instancias superiores irão manter tal entendimento, mas os riscos envolvidos certamente poderão influenciar diligência irrestrita de empresas em relação ao meio ambiente.

2849 – Estivador – motorista – exposição a agentes nocivos – tempo especial – acórdão – cumpri-mento imediato – decisão de eficácia mandamental

“Previdenciário. Tempo especial. Categoria profissional. Estivador. Motorista. Exposição a agentes nocivos. Lei nº 11.960/2009. Correção monetária e juros de mora. Fase de cumprimento de sen-tença. Diferimento. Tutela específica. 1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 2. A atividade de trabalhador avulso portuário (estiva e a armazenagem) é passível de enquadramento por categoria profissional, forte no código 2.5.6 (Estiva e armazenagem) do Decreto nº 53.831/1964, e código 2.4.5 do Decreto nº 83.080/1979 (Transporte manual de carga na área portuária. Estivadores (trabalhadores ocupados em caráter permanente, em embarcações, no carregamento e descarregamento de carga), arru-madores e ensacadores, operadores de carga e descarga nos portos). 3. No período anterior a Lei nº 9.032/1995 para o reconhecimento do tempo de serviço especial do segurado como motorista de ônibus, bastava o exercício de atividade profissional classificada como especial nos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979, com enquadramento no item 2.4.4 (transporte rodoviário) do Ane-xo ao Decreto nº 53.831/1964 e item 2.4.2 (transporte urbano e rodoviário) do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979. 4. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neu-tralização de seus efeitos nocivos. 5. Comprovada a exposição do segurado a agentes nocivos, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especiali-dade da atividade laboral exercida. 6. Concessão de benefício de aposentadoria por tempo de con-tribuição desde a DER. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implantar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/2015, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). 8. A forma de cálculo dos consectários legais resta diferida para a fase de execução do julgado.” (TRF 4ª R. – AC 5000684-53.2014.404.7127 – 6ª T. – Rel. Juiz Fed. Aux. José Luis Luvizetto Terra – DJe 22.05.2017)

2850 – Estivador – tempo de serviço especial – aposentadoria especial ou a revisão da aposenta-doria por tempo de contribuição – deferimento – mais vantajoso

“Direito previdenciário e processual civil. Ausência de pressuposto processual. Prescrição. Tempo de serviço especial. Estivador. Ruído. Frio. Poeiras minerais e vegetais. Deferimento da aposenta-doria especial ou a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição. Mais vantajoso. Termo inicial. Juros e correção monetária. Lei nº 11.960/2009. Critérios de atualização. Tutela específica. 1. Não há motivos para extinção sem resolução de mérito, por ausência de pressuposto processual, quanto a pedido não realizado pelo autor. Com relação ao pedido de atividade especial para o qual a parte autora não apresentou documentos indispensáveis à propositura da ação, a extinção do sem resolução do mérito é medida admitida. 2. Não há prescrição quinquenal, pois não transcorreu mais de cinco anos entre o requerimento administrativo mais antigo e o ajuizamento da ação. 3. De-

Page 196: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

196 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

monstrado o desempenho da atividade de estivador portuário, com exposição a ruído, frio, poeiras minerais e vegetais, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 4. Estando preenchidos os requisitos exigidos pela legislação previdenciária, tem direito a parte autora a concessão da Aposentadoria Especial, desde o primeiro requerimento administrativo, ou da Aposentadoria por Tempo de Contribuição, tanto do primeiro, quanto do segundo requerimento administrativo, bem como efetuar o pagamento das parcelas vencidas, de acordo com o benefício mais vantajoso. 5. Afastada a incidência do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/1991, sob pena de estar impedindo o livre exercício do trabalho. 6. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Fede-ral, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. 7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do art. 497, caput, do Código de Processo Civil.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5000975-90.2012.404.7008 – 6ª T. – Rel. Juiz Fed. Aux. Ézio Teixeira – DJe 13.06.2017)

2851 – ICMS – importação de mercadoria – desembaraço aduaneiro – Estados do Espírito Santo e Santa Catarina – recolhimento do tributo – destino das mercadorias – Fisco Paulista

“Agravo de Instrumento. Mandado de segurança. ICMS. Importação de mercadoria. Desembaraço aduaneiro nos Estados do Espírito Santo e Santa Catarina. Indeferimento da liminar. Segundo o disposto no art. 155, II, § 2º, IX, a da Constituição Federal, e dos arts. 10 e 11 do Regulamento do ICMS, o recolhimento do tributo deveria ter-se dado em favor do Fisco Paulista, pois o Estado de São Paulo era o destino das mercadorias, já que a agravante aqui tem domicílio. A agravante seria o sujeito passivo da obrigação tributária consistente no recolhimento do ICMS relativo às mercadorias ora em apreço. Por ora, essa a análise cabível, sendo que a verificação da legalidade do ato admi-nistrativo impugnado envolve o mérito da ação e não pode ser dirimida na estreita via do agravo de instrumento. O que se nota é que, sendo a questão ao menos discutível, vez que existe enten-dimento em favor do fisco paulista, não se pode ver na autuação combatida um ato patentemente irregular, situação que afasta a fumaça de bom direito invocada pela agravante e não lhe garante quer a liminar no mandado de segurança quer o efeito suspensivo ativo neste agravo. Recurso improvido.” (TJSP – AI 2019890-95.2017.8.26.0000 – 3ª CDPúb. – Rel. Des. José Luiz Gavião de Almeida – DJe 16.05.2017)

Transcrição Editorial• Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009: “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir:[...]II – adicional de até cinco por cento do que for pago à União por pessoas físicas ou jurídicas domici-liadas nos respectivos territórios, a título do imposto previsto no art. 153, III, incidente sobre lucros, ganhos e rendimentos de capital.[...]§ 2º O imposto previsto no inciso I, b, atenderá ao seguinte:[...]IX – incidirá também:a) sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, assim como sobre serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria ou do serviço;”• Decreto nº 45.490, de 30 de novembro de 2000:“Aprova o Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e Comunicação – RICMS[...]

Page 197: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������197

Art. 10. É também contribuinte a pessoa natural ou jurídica que, mesmo sem habitualidade (Lei nº 6.374/1989, art. I, na redação da Lei nº 9.399/1996, art. 1º, III):

I – importe mercadorias do exterior, ainda que as destine a consumo ou ao ativo permanente do estabelecimento;

II – seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior

III – adquira, em licitação, mercadoria ou bem importados do exterior e apreendidos ou abandonados;

IV – adquira energia elétrica ou petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos ou gasosos dele derivados, oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industria-lização.

CAPÍTULO II

DO RESPONSÁVEL

Art. 11. São responsáveis pelo pagamento do imposto devido (Lei nº 6.374/1989, arts. 8º, inciso XXV e § 14, e 9º,os dois primeiros na redação da Lei nº 10.619/2000, art. 2º, I, e o último com alteração da Lei nº 10.619/2000, art. 1º, VI):

I – o armazém-geral ou o depositário a qualquer título:

a) na saída de mercadoria depositada por contribuinte de outro Estado;

b) na transmissão de propriedade de mercadoria depositada por contribuinte de outro Estado;

c) solidariamente, no recebimento ou na saída de mercadoria sem documentação fiscal;

II – o transportador:

a) em relação à mercadoria proveniente de outro Estado para entrega a destinatário incerto em ter-ritório paulista;

b) solidariamente, em relação à mercadoria negociada durante o transporte;

c) solidariamente, em relação à mercadoria aceita para despacho ou transporte sem documentação fiscal;

d) solidariamente, em relação à mercadoria entregue a destinatário diverso do indicado na documen-tação fiscal;

III – o arrematante, em relação à saída de mercadoria objeto de arrematação judicial;

IV – o leiloeiro, em relação à saída de mercadoria objeto de alienação em leilão;

V – solidariamente, o contribuinte que promover a saída de mercadoria sem documentação fiscal, relativamente às operações subseqüentes;

VI – solidariamente, aquele que não efetivar a exportação de mercadoria ou de serviço recebidos para esse fim, ainda que em decorrência de perda ou reintrodução no mercado interno;

VII – solidariamente, as empresas concessionárias ou permissionárias de portos e aeroportos alfan-degados e de recintos alfandegados de zona primária e de zona secundária, definidos pela legislação federal, ou outro depositário a qualquer título ou outra pessoa que promova:

a) a remessa de mercadoria para o exterior sem documentação fiscal;

b) a entrega ou remessa de mercadoria ou bem originários do exterior com destino ao mercado interno sem documentação fiscal ou com destino a estabelecimento diverso daquele que tiver importado, arrematado ou adquirido em lici tação promovida pelo Poder Público;

c) a entrega ou remessa de mercadoria ou bem originários do exterior sem a cor respondente autoriza-ção do órgão responsável pelo desembaraço;

VIII – solidariamente, a pessoa que realizar intermediação de serviço:

a) com destino ao exterior sem a correspondente documentação fiscal;

b) iniciado ou prestado no exterior sem a correspondente documentação fiscal ou que vier a ser des-tinado a pessoa diversa daquela que o tiver contratado;

IX – solidariamente, o representante, mandatário, comissário ou gestor de negócio, em relação à operação ou prestação feitas por seu intermédio;

X – a pessoa que, tendo recebido mercadoria ou serviço beneficiados com isenção ou não incidência sob determinados requisitos, não lhes der a correta destinação ou desvirtuar suas finalidades;

XI – solidariamente, as pessoas que tiverem interesse comum na situação que tiver dado origem à obrigação principal;

XII – solidariamente, todo aquele que efetivamente concorrer para a sonegação do imposto;

XIII – o destinatário paulista de mercadoria ou bem importados do exterior por importador de outro Estado ou do Distrito Federal e entrados fisicamente neste Estado, pelo imposto incidente no desem-baraço aduaneiro e em operação subseqüente da qual decorrer a aquisição da mercadoria ou bem, ressalvado o disposto no § 2º.

Page 198: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

198 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

§ 1º Presume-se ter interesse comum, para efeito do disposto no inciso XI, o adquirente da mercadoria ou o tomador do serviço, em operação ou prestação realizadas sem documentação fiscal.

§ 2º A responsabilidade prevista no inciso XIII não se aplicará se o importador efetuar o pagamento, a este Estado, dos impostos ali referidos.”

2852 – ICMS diferido – importação – exclusão da responsabilidade – suspensão do ato coator – provimento

“Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Tributário. ICMS diferido. Importação. Exclusão da responsabilidade. Suspensão do ato coator. Há exclusão da responsabilidade pelo pagamento do ICMS diferido na importação, por estabelecimento industrial, de máquinas e equipamentos indus-triais destinados ao ativo permanente, desde que o desembaraço aduaneiro ocorra neste Estado e as mercadorias não possuam similar fabricado no Rio Grande do Sul, o que será comprovado median-te declaração emitida pela Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul – Fiergs. Hipótese em que estão presentes tais requisitos. Certeza e liquidez do direito alegado na inicial evidenciadas. Risco de ineficácia da ordem que decorre da retenção do bem pela Fazenda Estadual e da exigibilidade de tributo indevido. Agravo de instrumento provido.” (TJRS – AI 0028169-94.2017.8.21.7000 – 2ª C.Cív. – Relª Desª Lúcia de Fátima Cerveira – DJe 03.05.2017)

2853 – Importação – peça de automóvel – bagagem – descaracterização – má-fé – uso comercial – inocorrência – retenção da mercadoria – impossibilidade

“Administrativo. Tributário. Mandado de segurança. Importação peça de automóvel. Importação de bem comum. Descaracterização de bagagem. Autoridade administrativa. I – O desembaraço é atri-buição da autoridade administrativa que, no seu mister, aplicando o direito, deve enquadrar a mer-cadoria, dentro do atual regime aduaneiro, de modo a viabilizar uma posterior exigência tributária, caso a importação se dê de forma irregular. II – Nesse sentido, a r. sentença, observando a irregula-ridade do procedimento adotado ao analisar o pedido, entendeu que Termo de Retenção de Bens nº 081760016012530TRB01 de uma unidade de peças para automóvel – pára-choque de Merce-des-Benz modelo A63, foi inadequado uma vez que não restou demonstrada a má-fé do impetrante, tampouco o uso comercial ou industrial da mercadoria. Além disso, retrata que o valor do bem está dentro do limite de isenção não caracterizando fraude ao Erário punível com perdimento do art. 105 do Decreto-Lei nº 37/1966, mas sim importação de bem comum. III – O Decreto nº 6.759/2009 retrata a respeito da entrada de bagagem vinda do exterior, e o conceito de ‘baga-gem’, trazidas pelo Dicionário Aurélio, tem como significado que: Bagagem: ‘Conjunto de objetos de uso pessoal que os viajantes conduzem em malas, etc.; equipagem’. IV – Os atos de controle aduaneiro têm como objetivo o interesse nacional e se destinam a fiscalizar, restringindo ou limitan-do, a importação ou a exportação de determinados produtos. Nesse sentido a ‘bagagem’ mereceu tratamento especial do legislador, passando a gozar de tratamento diferenciado, considerando que os bens trazidos nesse contexto, para consumo no território nacional, estariam isentos de tributos. V – O Decreto-Lei nº 2.120, de 14.05.1984, definiu como bagagem: o conjunto de bens de viajante que, pela quantidade ou qualidade, não revele destinação comercial. O Decreto-Lei nº 1.455, de 07 de abril de 1976, por sua vez, regulamentado pela Instrução Normativa SRF nº 117, de 06 de outubro de 1998, ao dispor sobre o tema, disciplina no art. 2º, estar excluída ‘da isenção previs-ta no inciso III do art. 13 do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, com a redação do art. 1º do Decreto-Lei nº 1.123, de 3 de setembro de 1970, os automóveis, as aeronaves e as embar-cações, para o transporte de pessoas, de carga, de pessoas e carga, ou destinados a recreio, esporte ou competição, o qual já especificava em seu art. 5º que: ‘Os bens trazidos em bagagem de passa-geiro para os quais não esteja prevista isenção ou que não se conformarem às limitações do art. 3º, não se qualificam como bagagem, sujeitando-se ao regime de importação comum.’ VI – O novo

Page 199: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������199

Regulamento Aduaneiro, Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009 (Regulamento Aduaneiro), que assim dispôs sobre a matéria: Art. 155. ‘Para fins de aplicação da isenção para bagagem de via-jante procedente do exterior, entende-se por (Regime Aduaneiro de Bagagem no Mercosul, art. 1º, aprovado pela Decisão CMC nº 53, de 2008, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 2009): (Reda-ção dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). I – bagagem: os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar par seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação com fins comerciais ou industriais; (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). II – bagagem acompanhada: a que o viajante traga consigo, no mesmo meio de transporte em que viaje, desde que não amparada por conhecimento de carga ou documento equivalente; (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). III – bagagem desacompanhada a que chegue ao País, amparada por conhecimento de carga ou documento equivalente; e (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). IV – bens de uso ou consumo pessoal: os artigos de vestuário, hi-giene e demais bens de caráter manifestamente pessoal. (Incluído pelo Decreto nº 7.213, de 2010). § 1º Estão excluídos do conceito de bagagem (Regime Aduaneiro de Bagagem no Mercosul, art. 7º, incisos 1 e 2, aprovado pela Decisão CMC nº 53, de 2008, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 2009): (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). I – os veículos automotores em geral, as motocicletas, as motonetas, as bicicletas com motor, os motores para embarcação, as motos aquá-ticas e similares, as casas rodantes, as aeronaves e as embarcações de todo tipo; e (Incluído pelo Decreto nº 7.213, de 2010), II – as partes e peças dos bens relacionados no inciso I, exceto os bens unitários, de valor inferior aos limites de isenção, relacionados em listas específicas que poderão ser elaboradas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil. (Incluído pelo Decreto nº 7.213, de 2010). VII – O art. 2º da IN 1.059/2010, conceitua o que se entende por bagagem acompanhada, para fins do correto enquadramento aduaneiro – e, se o caso, tributário – dos bens estrangeiros trazidos por brasileiros do exterior. E o inciso II do art. 2º expressamente exclui, do conceito de ba-gagem acompanhada, os bens que pela sua quantidade, natureza ou variedade, permitiam presumir importação com fins comerciais ou industriais: ‘art. 2º Para os efeitos desta Instrução Normativa, entende-se por: [...] II – bagagem: os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar para seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação ou exportação com fins comerciais ou industriais; [...].’ VIII – Assim, resta inadequada a retenção da mercadoria uma vez que não restou demonstrada a má-fé do impetrante ou o uso comercial do bem importado, tratando-se de importação de bem comum. Desta forma, merece ser mantida a r. sentença em sua integralidade. IX – Apelação não provida.” (TRF 3ª R. – AMS 0003832-36.2016.4.03.6119 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho – DJe 03.05.2017)

2854 – Importação de medicamento – desembaraço aduaneiro sem prévio recolhimento de ICMS – admissibilidade

“Apelação cível. Mandado de segurança. Tributário. Importação de medicamento. Desembaraço aduaneiro sem prévio recolhimento de ICMS. Admissibilidade. Operação realizada após o advento da EC 33/2001. Inexistência de legislação infraconstitucional instituidora do tributo posterior ao advento da Lei Complementar nº 114/2002. Entendimento firmado pelo STF no RE 439.796/PR. Sentença que concedeu parcialmente a ordem, reformada. Recurso provido.” (TJSP – Ap 1025530-40.2016.8.26.0224 – 5ª CDPúb. – Relª Desª Heloísa Martins Mimessi – DJe 07.06.2017)

Comentário EditorialNeste caso de importação para uso próprio, sem fins comerciais, é aplicável a orientação firmada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no RE 346.2 e no RE 390.3, que afasta o fenômeno da “constitucionalização superveniente”.

Page 200: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

200 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

Ou seja, para ser constitucionalmente válida a incidência do ICMS sobre operações de importação de bens, as modificações no sujeito passivo da regra-matriz deveriam ter sido realizadas em lei posterior à EC 33/2001 e à LC 114/2002.

Portanto, não se pode aproveitar a norma da Lei estadual nº 11.001/2001, visto que editada anterior-mente à Lei Complementar nº 114/2002 razão pela qual o ICMS é inexigível.

2855 – IPI – contrato de arrendamento – aeronave estrangeira – fato gerador – desembaraço aduaneiro

“Tributário. IPI. Contrato de arrendamento. Aeronave estrangeira. Fato gerador: desembaraço adua-neiro. 1. O IPI incide sobre o bem de procedência estrangeira, sendo irrelevante a sua aquisição por compra e venda ou arrendamento (leasing) operacional, porquanto o seu fato gerador é o desem-baraço aduaneiro do produto, independentemente de haver ou não a transferência de propriedade. 2. ‘O STJ possui entendimento de que o fato gerador do IPI incidente sobre mercadoria importada é o desembaraço aduaneiro, consoante a dicção do art. 46, I, do CTN, sendo irrelevante se adqui-rida a título de compra e venda ou arrendamento, ainda que ocorra apenas a utilização temporária do bem’ (AgRg-AREsp 236.056/AP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 13.09.2013). (AgREsp 1149429, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 15.05.2015). 3. No mesmo sentido reconhece esta co-lenda Sétima Turma que: ‘Diversamente do que entende a Impetrante não há ressalva a afastar a incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI relativamente à operação de contrato de importação de aeronave, por meio de contrato de arrendamento operacional. A legislação não ampara a pretensão da Impetrante, e, no mesmo sentido, a jurisprudência é uníssona quanto à refe-rida incidência tributária’ (AMS 2009.38.00.005502-3/MG, Rel. Juiz Fed. Ronaldo Castro Destêrro e Silva (Conv.), 25.09.2015, e-DJF1 p. 1510). 4. Apelação não provida.” (TRF 1ª R. – AC 0064528-02.2015.4.01.3800 – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Hercules Fajoses – DJe 19.05.2017)

2856 – IPI – incidência – saída do produto do estabelecimento importador – art. 543-C do CPC/1973

“Tributário. Apelação cível. Desembaraço aduaneiro. IPI. Incidência na saída do produto do esta-belecimento importador. Art. 543-C do CPC/1973. EREsp 1403532/SC. 1. A incidência do IPI no momento da saída do produto importado do estabelecimento importador resulta em nova incidên-cia, mesmo que não tenha sofrido industrialização no Brasil. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, no EREsp 1403532/SC, acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ nº 08/2008. 2. ‘Interpretação que não ocasiona a ocorrência de bis in idem, dupla tributação ou bitributação, porque a lei elenca dois fatos geradores distintos, o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra de produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador equiparado a estabelecimento produtor, isto é, a primeira tributação recai sobre o preço de compra onde embutida a margem de lucro da empresa estrangeira e a segunda tributação recai sobre o preço da venda, onde já embutida a mar-gem de lucro da empresa brasileira importadora. Além disso, não onera a cadeia além do razoável, pois o importador na primeira operação apenas acumula a condição de contribuinte de fato e de di-reito em razão da territorialidade, já que o estabelecimento industrial produtor estrangeiro não pode ser eleito pela lei nacional brasileira como contribuinte de direito do IPI (os limites da soberania tributária o impedem), sendo que a empresa importadora nacional brasileira acumula o crédito do imposto pago no desembaraço aduaneiro para ser utilizado como abatimento do imposto a ser pago na saída do produto como contribuinte de direito (não cumulatividade), mantendo-se a tributação apenas sobre o valor agregado’ (EREsp 1403532/SC, Embargos de Divergência em Recurso Espe-cial nº 2014/0034746-0, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Ac. Min. Mauro Campbell

Page 201: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������201

Marques, Órgão Julgador: Primeira Seção, Data do Julgamento: 14.10.2015, Data da Publicação/Fonte DJe 18.12.2015) 3. Apelação provida.” (TRF 1ª R – AC 0037121-57.2015.4.01.3400 – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Hercules Fajoses – 7ª T. – DJe 02.06.2017)

Comentário EditorialEm que pese a decisão do STJ a discussão encontra-se pendente no STF em repercussão geral, através do RE 946.648/SCIsso porque cabe ao STF analisar se o CTN teria extrapolado o comando dos arts. 146, III. a e 153, IV da CF, pois a partir de interpretação da legislação de regência, no caso, o Código Tributário Nacional – arts. 46 e 51 –, cria-se, segundo o sustentado, situação de oneração excessiva do importador em relação ao industrial nacional.Este, ao produzir a mercadoria no País, sujeita-se ao Imposto sobre Produtos Industrializados ape-nas na ocasião em que o produto sai do estabelecimento, enquanto aquele está submetido em dois momentos distintos: quando do desembaraço aduaneiro e da revenda, ainda que não pratique ato de industrialização. A incidência do imposto deixa de equiparar o produto nacional ao similar importado e passa a criar verdadeira distorção entre eles.Assim, a questão é merecedora de pronunciamento pelo Pleno do STF através da repercussão geral indicada, ante o princípio da isonomia versado no art. 150, inciso II, da Carta da República.

2857 – Lei de Segurança dos Transportes Aquaviários – § 2º do art. 24 da Lei nº 9.537/1997 – depósito prévio do valor das multas – afastamento – orientação técnica da Diretoria de Portos e Costas (DPC) – auto de infração – anulação – impossibilidade

“Direito administrativo. Lei de Segurança dos Transportes Aquaviários. Auto de infração. Multas. Honorários advocatícios. O transporte de pessoas além dos limites da embarcação coloca em risco a vida de pessoas e a segurança da navegação. Inexistindo defeito a macular o ato administrativo consubstanciado no auto de infração impugnado, não há cogitar de sua anulação. A parte autora não apresentou recurso na esfera administrativa, asseverando que deixou de fazê-lo em razão da exigência de depósito prévio do valor das multas. Contudo, a prova produzida nos autos deu conta de que ainda que conste tal exigência no § 2º do art. 24 da Lei nº 9.537/1997, a Diretoria de Portos e Costas (DPC) possui orientação técnica no sentido de não exigir tal depósito em razão da Súmula Vinculante nº 21/2009 do Supremo Tribunal Federal. Ademais, a parte autora não apresentou qual-quer documento que comprove, efetivamente, tal exigência como condição para o processamento do recurso. Tendo a empresa autora praticado uma série de infrações, inclusive com reincidências, colocando em risco a vida dos usuários e a segurança da navegação, mostram-se razoáveis as multas aplicadas em seu limite máximo permitido para as infrações, pois caracterizadas circunstân-cias agravantes da conduta (art. 30, IV, Lei nº 9.537/1997). Honorários advocatícios majorados.” (TRF 4ª R. – AC 5001977-82.2014.404.7216 – 4ª T. – Relª Desª Fed. Vivian Josete Pantaleão Caminha – DJe 25.04.2017)

Transcrição Editorial• Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997:“Art. 23. Constatada infração, será lavrado Auto de Infração pela autoridade competente designada pela autoridade marítima.[...]Art. 24. A autoridade a que se refere o artigo anterior disporá de trinta dias para proferir sua decisão, devidamente fundamentada.[...]§ 2º Em caso de recurso contra a aplicação da pena de multa, será exigido o depósito prévio do res-pectivo valor, devendo o infrator juntar, ao recurso, o correspondente comprovante.”• Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal:“21 – É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.”

Page 202: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

202 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

2858 – Liberação das mercadorias – vedação legal – art. 7º, § 2º, da Lei nº 12.016/2009 – débitos tributários – art. 622-A, III, b do RICMS – benefício fiscal – necessidade de liberação

“Desembaraço aduaneiro. Liberação das mercadorias. A vedação legal. Art. 7º, § 2º, da Lei nº 12.016/2009. Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Tributário. Desembaraço adua-neiro. Decisão interlocutória que indeferiu liminarmente a liberação das mercadorias provenientes do exterior ante a vedação legal contida no art. 7º, § 2º, da Lei nº 12.016/2009. Retenção de mercadoria pelo fisco em razão da ausência de regular cumprimento de parcelamento dos débitos tributários. Ausência de exigência pela lei ou pelo RICMS ao que se considera regular parcela-mento por parte do contribuinte. Parcelamento ativo. Possibilidade de fruição do benefício fiscal esculpido no art. 622-A, III, b do RICMS. Necessidade de liberação das mercadorias descritas na DI 12/1096328-0. Confirmação da tutela anteriormente concedida. Recurso conhecido e provido.” (TJPR – AI 0028160-58.2016.8.16.0000 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. José Sebastião Fagundes Cunha – DJe 16.05.2017)

Transcrição EditorialLei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009: “Art. 7º Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:§ 2º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.”

2859 – Marítimo – ajudante de cozinha – cozinheiro – ruído – EPIs – hidrocarbonetos – Decreto nº 83.080/1979 – Decreto nº 53.831/1964 – aplicação conjunta – reafirmação da DER – aposentadoria especial ou por tempo de contribuição – indeferimento

“Previdenciário. Remessa necessária. Novo Código de Processo Civil. Tempo de serviço espe-cial. Ruído. EPIs. Hidrocarbonetos. Aplicação conjunta Decretos nºs 83.080/1979 e 53.831/1964. Ajudante de cozinha e cozinheiro. Trabalhadores de embarcação na parte da câmara. Marítimo. Categoria profissional até a Lei nº 9.032/1995. Reafirmação da DER. Indeferimento da aposenta-doria especial ou por tempo de contribuição na DER ou reafirmação da DER. Averbação do labor especial. Tutela especifica. 1. O art. 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil/2015, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público. 2. A Divisão de Cálculos Judiciais deste TRF4 informou que, para que uma condenação previdenciária atingisse o valor de 1.000 salários mínimos, necessário seria que a RMI fosse fixada no valor teto dos benefícios previdenciários, bem como abrangesse um período de 10 (dez) anos entre a DIB e a prolação da sentença. 3. Conside-rando tal critério, é possível concluir com segurança que o proveito econômico desta ação não atinge o patamar estabelecido de mil salários mínimos (art. 496, § 3º, I, do NCPC), impondo-se não conhecer da remessa necessária. 4. Demonstrada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a espe-cialidade da atividade laboral por ele exercida. 5. Quanto ao ruído excessivo, até 05.03.1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto nº 53.831/1964. Já a partir de 06.03.1997, deve ser observado o limite de 90 dB até 18.11.2003. O nível de 85 dB somente é aplicável a partir de 19.11.2003, pois o Superior Tribunal de Justiça, em precedente de observância obrigatória (art. 927 do CPC/2015) definiu o entendimento segundo o qual os estritos parâmetros legais relativos ao nível de ruído, vigentes em cada época, devem limitar o reconhecimento da atividade especial (REsp repetitivo 1.398.260/PR). 6. O uso de EPIs (equipamentos de proteção), por si só, não basta para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado. Seria necessária uma efetiva demonstração da elisão das

Page 203: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������203

consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro, durante toda a jornada de trabalho. 7. Os riscos ocupa-cionais gerados pela exposição a agentes químicos não requerem a análise quantitativa de concen-tração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa, considerada a potencialidade da agressão à saúde do trabalhador. Assim, ina-plicável, à espécie, a regra contida na NR-15, Anexo 12, do INSS. 8. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial, com enquadramento nos Códigos 1.2.11 (tóxicos orgânicos) do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, 1.2.10 do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/1973 (hidrocarboneto e outros compostos de carbono), 1.2.10 (hidrocarboneto e outros compostos de carbono) do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, e códigos 1.0.0., 1.0.7 e 1.0.19 (outras substâncias químicas) do Anexo IV do Dec. 2.172/1997 e do Dec. 3.048/1999. 9. Quanto aos hidrocarbonetos aromáticos, são considerados também os que compõem os óleos de cozinha, os chamados policíclicos, pois a maioria dos óleos de nozes ou à base de sementes contêm PAH, que têm pontos de queimaduras mais baixos do que os óleos vegetais. PAHs liberados pela queima no ar em grandes quantidades são consideradas como po-tencialmente cancerígeno. 10. Pelos ditames do Decreto nº 611/1992 que determina a aplicação conjunta dos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979, a exegese deve ser realizada da forma mais ampla para fins de enquadramento do labor em atividade especial. Nesse sentido julgamento em que foi relator o Exmo. Desembargador Federal Nylson Paim de Abreu, na AC 96.04.62676-0/PR, Data da Decisão: 31.03.1998, ao ser decidido que: ‘A aplicação conjunta dos Anexos dos Dec. 83.080/1979 e Dec. 53.831/1964 está prevista no art. 292 do Dec. 611/1992’. Por isso, a profissão de ajudante de cozinha ou cozinheiro no interior de embarcação, deve ser considerado como de marítimo, no transporte marítimo, fluvial ou lacustre, pois o Decreto nº 53.831/1964 ao incluir no código 2.4.2, os marítimos ocupantes de embarcação no setor de ‘câmara’, buscou abarcar os trabalhadores internos da embarcação, como os que laboram na cozinha. 11. A jurisprudência do TRF da 4ª Região admite a possibilidade de reafirmação da DER apenas em relação ao tempo de contribuição entre a DER e a data de ajuizamento da ação, conforme julgamento proferido no AC 2008.71.99.000963-7, 6ª T., Relª Vânia Hack de Almeida, DE 29.07.2015, e de forma excepcional. 12. Não preenchido o tempo de serviço mínimo para a aposentadoria especial, nem comprovado o tempo de serviço/contribuição comum suficiente para o deferimento da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição na DER ou na reafirmação da DER (ajuizamento da ação), somente cabe a averbação/registro do tempo de serviço especial em favor da parte autora. 13. Determinado o cum-primento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo de serviço especial, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do art. 497, caput, do Código de Processo Civil.” (TRF 4ª R. – AC 5000136-43.2013.404.7101 – 6ª T. – Rel. Juiz Fed. Aux. Ézio Teixeira – DJe 25.04.2017)

2860 – Mercadoria importada – apreensão – interposição fraudulenta – indícios – art. 68 da MP 2.158-35/2001 – art. 69 da IN SRF 206/2002 – manutenção da garantia após liberação das mercadorias – possibilidade

“Processual e tributário. Recurso especial. Apreensão de mercadoria importada. Indícios de inter-posição fraudulenta. Art. 68 da MP 2.158-35/2001. Art. 69 da IN SRF 206/2002. Prazo máximo de retenção: 180 dias. Excesso de apenas um dia. Súmula nº 7/STJ. Ausência de direito líquido e certo. Razoabilidade na demora. Manutenção da garantia após liberação das mercadorias. Possibilidade. 1. A controvérsia diz respeito à retenção de mercadorias importadas por suspeita de interposição fraudulenta de terceiro além do prazo previsto na Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal nº 206/2002. 2. O Tribunal de origem, soberano para análise das provas, afirmou que ‘o prazo de 90 dias para a conclusão do Procedimento Especial de Fiscalização em questão, prorro-gado por igual período, pertinente à DI 07/0729197-0 – registrada em 05.06.2007 –, exauriu-se

Page 204: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

204 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

em 30.12.2007, tendo, em 31.12.2007, sido concluído esse procedimento de fiscalização, cul-minando na aplicação da pena de perdimento, conforme informado pela autoridade impetrada às fls. 218-219’. 3. Para afastar o entendimento a que chegou a Corte a quo, de modo a albergar as peculiaridades do caso e verificar se o procedimento de fiscalização foi concluído após 31.12.2007, como sustentado na origem, é necessário o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, o que se revela inviável nas razões de recurso especial por óbice da Súmula nº 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’. 4. Partindo da premissa delineada pela instância ordinária de que o procedimento de fiscalização que culminou com a pena de perdimen-to se encerrou um dia após o prazo final para a retenção das mercadorias, não se mostra razoável admitir tal ato como violador do direito líquido e certo da recorrente, sobretudo considerando a hipótese concreta dos autos em que se constatou e se confirmou a existência de fortes indícios de interposição fraudulenta de terceiros. 5. Ademais, consta do acórdão de origem que as mercadorias foram liberadas mediante garantia (caução). Desse modo, considerando que as mercadorias foram liberadas, mediante o oferecimento de garantia, não há se falar em restituição dos valores corres-pondentes a essa cautela fiscal. Até porque, a pretensão veiculada na petição inicial do mandado de segurança consistiu apenas na liberação das mercadorias, o que diverge do pleito formulado no recurso especial. 6. Ademais, não há que se confundir liberação de mercadorias por excesso de prazo, com a liberação da garantia ofertada pelo contribuinte, já que essa deve ser preservada para fins de assegurar a efetividade da pena de perdimento. Precedente: REsp 1530429/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 30.06.2015. 7. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 1248720/PR – 2ª T. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 14.06.2017)

Transcrição Editorial• Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001:“Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria im-portada será retida pela Secretaria da Receita Federal, até que seja concluído o correspondente pro-cedimento de fiscalização.Parágrafo único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim as situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscaliza-ção, mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal.”• Instrução Normativa SRF nº 206, de 25 de setembro de 2002:“Art. 69. As mercadorias ficarão retidas pela fiscalização pelo prazo máximo de noventa dias, prorro-gável por igual período, em situações devidamente justificadas.Parágrafo único. Afastada a hipótese de fraude e havendo dúvidas quanto à exatidão do valor aduanei-ro declarado, a mercadoria poderá ser desembaraçada e entregue mediante a prestação de garantia, determinada pelo titular da unidade da SRF ou por servidor por ele designado, nos termos da norma específica.[...](Revogado(a) pelo(a) Instrução Normativa SRF nº 680, de 02 de outubro de 2006)”

2861 – Mercadoria importada – apreensão – subfaturamento – interposição fraudulenta – pena de perdimento – não cabimento – caução no valor do depósito aduaneiro da mercadoria – possibilidade

“Tributário. Agravo regimental. Apreensão de mercadoria importada. Subfaturamento. Interposi-ção fraudulenta na importação. Imposição de pena de perdimento. Não cabimento. Caução no valor do depósito aduaneiro da mercadoria. Decisão mantida. 1. Na esteira da jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça, este TRF vem entendendo que, em caso de suspeita de su-perfaturamento de mercadoria importada, a penalidade passível de ser aplicada é a multa equi-valente a 100% (cem por cento) da diferença, e não a pena de perdimento 2. O art. 33 da Lei nº 11.488/1997 estabeleceu pena mais branda (multa) para a interposição fraudulenta de terceiros,

Page 205: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������205

sem ressalvar a possibilidade de aplicação concomitante de outras penas já previstas em lei. Assim sendo, não se justifica mais a decretação do perdimento do bem unicamente com base nesse funda-mento (AC 0015301-26.2008.4.01.3400/DF, Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso, 8ª T., e-DJF1, p. 1190, de 28.03.2014, REsp 1144751/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 01.03.2011, DJe 15.03.2011). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AGA 0017360-21.2016.4.01.0000 – 7ª T. – Rel. Des. Fed. José Amilcar Machado – DJe 12.05.2017)

2862 – Mercadoria importada – liberação – caução – exigência – possibilidade

“Processual civil. Administrativo. Agravo de instrumento. Ação ordinária. Mercadoria importada. Liberação de mercadoria mediante caução. Possibilidade. 1. No caso das operações de comércio exterior cuja regularidade é contestada o art. 165 do Decreto-Lei nº 37/1966 faculta ao contribuinte que tem interesse em desembaraçar a mercadoria, a possibilidade de oferecer prévia garantia ou de depositar o valor dos tributos e de eventuais despesas e penalidades impostas pela autoridade aduaneira. 2. O art. 7º da Instrução Normativa nº 228, de 21 de outubro de 2002, da Secretaria da Receita Federal do Brasil admite o desembaraço ou a entrega das mercadorias apreendidas, median-te a prestação de garantia. 3. ‘Instruções Normativas que tratam da apreensão de mercadoria por suspeita de sonegação fiscal. Possibilidade de aplicação do art. 7º da IN/SRF 228/2002 que prevê a liberação das mercadorias mediante prestação de garantia’ (AgRg-REsp 1529409/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., Julgado em 16.06.2015, DJe 06.08.2015). 4. Como a mercadoria objeto da controvérsia é lícita, e se encontra em fase administrativa anterior à fase aduaneira, não vislumbrando nenhum óbice para sua a liberação no desembaraço aduaneiro, mediante o depósito de caução, em espécie, no maior valor aferido pela autoridade administrativa, o que bem atende ao princípio da equidade e da razoabilidade. 5. O perigo de dano irreparável ou de difícil reparação reside na possibilidade de obsolescência dos bens, corroborado, ainda, pelos custos relacionados à sua guarda, visto que, são mantidos em recinto alfandegado, onerando sobremaneira a opera-ção de importação. 6. Agravo de Instrumento parcialmente provido.” (TRF 1ª R. – Ag 0067207-89.2016.4.01.0000 – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Hercules Fajoses – DJe 19.05.2017)

Comentário EditorialFato comum é a retenção de mercadorias nos procedimentos de fiscalização. Ocorre que o procedi-mento especial de controle aduaneiro, está previsto no art. 68 da Medida Provisória nº 2.158-32, de 24 de agosto de 2001, havendo regulamentação do prazo máximo de retenção, bem como sobre as situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mediante a adoção das adequadas medidas de cautela fiscal (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 68, parágrafo único).

Além disso, a IN 1.678/2016 que passou a vigorar em 21.02.2017 trouxe mudanças para a IN RFB 1.169/2011 que “estabelece procedimentos especiais de controle, na importação ou na exportação de bens e mercadorias, diante de suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento” também possibilitando a liberação das mercadorias mediante caução.

A novidade trazida pelo art. 5º-A se refere à liberação das mercadorias mediante garantia durante o procedimento especial nos casos de “ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro” e “no caso de suspeita da existência de fato do estabelecimento importador, exportador ou de qualquer pessoal envolvida na transação comercial”.

2863 – Militar reformado – acidente em serviço – manutenção de equipamento náutico – negli-gência – responsabilidade civil do Estado – omissão – culpa – danos morais e estéticos – deferimento

“Administrativo. Militar reformado em razão de acidente em serviço. Responsabilidade civil do Estado. Omissão. Culpa pela negligência na manutenção de equipamento náutico. Indenização

Page 206: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

206 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

por danos morais e estéticos. Cicatrizes no rosto. Dano aparente de pronto e capaz de constranger. Pleito deferido. Cumulação possível. Montante fixado. 1. A fim de caracterizar os requisitos para a existência do dano moral, é necessária uma conjunção de circunstâncias, quais sejam: fato gerador e a ocorrência do dano, bem como o nexo causal entre a conduta e o resultado danoso. Contudo, nos casos de ato omissivo da Administração, doutrina e jurisprudência têm defendido que a res-ponsabilidade civil do Estado é subjetiva, sendo necessária, assim, a presença também do elemento subjetivo (dolo ou culpa) para sua caracterização, em uma de suas três vertentes – a negligência, a imperícia ou a imprudência. 2. No caso em tela, restou configurada a hipótese de ilícito admi-nistrativo ensejador da compensação por dano extrapatrimonial, devendo a União ser condenada à respectiva reparação, nos termos da Constituição Federal de 1988, eis que são inegáveis o abalo e sofrimento moral do autor, que resultaram da falha catastrófica das baterias de uma embarcação militar, o que provocou todos os transtornos físicos e psíquicos, relatados. 3. Quanto aos danos estéticos, podem ser cumulados com a reparação moral, porquanto os elementos afetados são dis-tintos. Segundo o caderno probatório, o demandante sofreu vários processos cirúrgicos, providos às expensas da administração, a fim de corrigir as cicatrizes apresentadas, sem pleno sucesso. Não se podem considerar como ‘pequenas sequelas’ curiais ou mesmo ínfimos os danos à própria face do Servidor. No número e extensão apresentadas, as marcas no rosto do autor são aferíveis e aparentes de pronto ao interlocutor, bem como são capazes de causar constrangimento ao mesmo. 4. Perti-nentemente ao valor arbitrado, deve ser o necessário e suficiente para proporcionar a recomposição moral do ofendido em sua integralidade, cumprindo sua função compensatória, além, é claro, de objetivar a inibição da ocorrência deste tipo de problema nas fileiras do Exército, evitando-se, com isso, que situações análogas voltem a ocorrer, em atendimento ao caráter punitivo e profilático da indenização. Dentro desta ótica, a quantia total (danos estético e moral) de R$ 100.000,00 (cem mil reais) atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, cotejando a jurisprudência desta Corte, em casos tais. Parcialmente provido o apelo da União, a fim de readequar o montante deferido.” (TRF 4ª R. – AC 5005904-81.2012.404.7101 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Fernando Quadros da Silva – DJe 26.04.2017)

2864 – Naufrágio de embarcação – morte – reparação por danos morais – responsabilidade obje-tiva

“Civil, consumidor e processual civil. Ação de reparação por danos morais. Naufrágio de embarca-ção. Morte da vítima. Preliminares. Cerceamento de defesa e sentença extra petita. Rejeição. Res-ponsabilidade objetiva. Ato ilícito. Trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Quantum indenizatório. Manutenção. Sentença mantida. 1. Tendo em vista a ocorrência da preclusão consu-mativa, decorrente da interposição do Agravo de Instrumento, a questão relativa ao cerceamento de defesa não pode ser apreciada sob as vestes de preliminar do recurso de Apelação, já que é defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclu-são (art. 473 do CPC/1973). A validade do indeferimento de produção de provas foi reconhecida pela Turma mediante acórdão que transitou em julgado. 2. A fundamentação adotada pelo Juiz a quo limitou-se a analisar o pedido inicial considerando o contexto fático dos autos para delinear os contornos da responsabilidade civil, entendendo, conforme a teoria da persuasão racional, pela existência de relação de consumo apta a atrair a incidência do Código de Defesa do Consumidor, norma de ordem pública cuja aplicabilidade pode ser reconhecida de ofício, motivo pelo qual não há falar em sentença extra petita, nos termos do art. 128 do CPC/1973. 3. Tendo sido a autoria e materialidade do fato devidamente apuradas no processo criminal e estando devidamente compro-vado o ato ilícito culposo praticado pelos Apelantes, bem como presumido o dano moral por rico-chete ou reflexo provocado pela morte de familiar dos Apelados, inconteste o dever de indenizar. Aplicação do art. 935 do Código Civil. 4. Levando-se em consideração as peculiaridades do caso

Page 207: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������207

concreto, em que ocorreu a morte do genitor e cônjuge dos Autores em decorrência de naufrágio da embarcação por ato ilícito dos Réus, o valor da condenação deve ser mantido, uma vez que foi arbitrado em patamar razoável e proporcional ao dano. Preliminares rejeitadas. Apelação Cível des-provida.” (TJDF – APC 20120111230890 – 5ª TCív. – Rel. Des. Angelo Passareli – DJe 29.05.2017)

2865 – Navio – arresto – pagamento – garantia – praticagem – caução em dinheiro – levantamen-to da ordem – liberação do trânsito

“Cautelar. Arresto. Prestação de serviços de praticagem de navio e antecipação de outras despe-sas. Pretensão de garantia do pagamento de valores, antes que a embarcação das rés deixe o país. Fumus boni iuris e periculum in mora. Tutela antecipada deferida, para que as rés prestassem caução em dinheiro, impedindo-se a saída do país até comprovação. Caução demonstrada. Le-vantamento da ordem e liberação do trânsito. Ação principal de cobrança. Julgamento separado e realizado por juiz distinto da ação cautelar. Inobservância do art. 809 do Código de Processo Civil de 1973. Documentos coligidos na medida cautelar não compartilhados no processo prin-cipal. Necessidade de reunião dos processos, para julgamento conjunto. Decreto de nulidade da conclusão de primeiro grau, com determinação de apensamento dos autos ao processo principal. Mantença, porém, da caução prestada. Recurso parcialmente provido, com determinação.” (TJSP – Ap 1001182-11.2016.8.26.0562 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. Sebastião Flávio – DJe 26.06.2017)

2866 – Navio – carregamento – acidente – shiploaders – avarias – decisão final do Tribunal Marí-timo – suspensão – indenização – perdas – lucros cessantes – liquidação por arbitramento

“Apelação. Ação de Indenização. Acidente quando do carregamento do navio Yusho Regulus, de propriedade e armado por Satsuma Shipping S/A. no ‘Berço 38 do Porto de Santos’. Avarias nos equipamentos ‘Shiploaders’ nºs 12 e 13.01. Preliminares: Nulidades da Sentença: a) Incompetência absoluta da Justiça Estadual: a.1) Competência da Justiça Federal para apreciar causas envolvendo Tratado Internacional. Convenção de Colisão de 1910. Acidente ocorrido em território nacional, envolvendo navio atracado e em operação de carregamento de soja Corredor de Exportação do Por-to de Santos/SP – questão de natureza nitidamente patrimonial, envolvendo empresas privadas, sem qualquer relação direta com Tratado ou Convenção Internacional a qualificar interesse da União. Teoria da tríplice identidade estabelecendo casos de jurisdição concorrente segundo qualidades atribuída a uma das partes (réu domiciliado no Brasil), ao pedido (obrigação a ser cumprida no país) ou à causa de pedir (relativa a fato ocorrido ou ato praticado em território nacional). Dicção dos arts. 88, inc. III do CPC/1973 e 21, inc. III do CPC/2015; a.2) Ação na Justiça Federal objetivando limitar sua responsabilidade civil com base em Convenção Internacional. Liminar indeferida em Conflito de Competência pelo E. STJ, considerando que as ações indenizatórias foram julgadas no Juízo Estadual de Santos, o que impede a reunião dos processos por conexão e sinaliza a inexistên-cia de risco de decisões conflitantes (Conflito de Competência nº 144.591/SP). a.3) Afastamento. b) Obrigatoriedade da juntada da decisão final do Tribunal Marítimo. Suspensão do processo em harmonia com a regra do art. 313, inc. VII do CPC/2015. Incidência na hipótese do mesmo regime jurídico dado pelos §§ 4º e 5º do aludido artigo. Processo que permaneceu suspenso por prazo superior a um ano. Pretendida suspensão afastada. c) Cerceamento de defesa. Inocorrência Embar-gos de declaração sem esclarecimentos sobre existência de prova de vídeo (pen drive – fl. 1207) relacionada com que os cabos de amarração não eram mantidos tesos. O Juiz não está obrigado a responder todos os pontos questionados nos embargos quando fundada a decisão em provas téc-nicas como na hipótese dos autos. Ademais, inexistente omissão a respeito antes as considerações da sentença. A necessidade da produção de prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do Magistrado (STF – RE

Page 208: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

208 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

101.171.8/SP). O Juiz é o destinatário da prova, cabendo a ele, de ofício ou a requerimento da par-te, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 130 do CPC/1973, art. 370 do CPC/2015). As provas constantes dos autos permitiam o julgamento da lide. Teoria da causa madura. Preliminares rejeitadas. d) Docu-mentos relacionados com novas provas produzidas no Tribunal Marítimo. Possibilidade de análise dos documentos quando do mérito e com o conjunto probatório dos autos, posto que atendido o contraditório com oitiva da parte contrária. 2. Mérito: 2.1 Responsabilidade do réu. Objetiva pelo risco da atividade configurada. Ainda que assim não fosse a conclusão do Laudo Pericial Direto, elaborado na ocasião dos fatos pela Marinha do Brasil (Capitania dos Portos de São Paulo), aponta como causas determinantes do acidente: a) estar a embarcação com a amarração folgada, ocor-rendo a ruptura dos cabos tributada à imprudência do Oficial encarregado da vigilância e de sua manutenção; b) ter o Comandante do navio, por negligência, ordenado máquinas adiante de forma desproporcional e dando causa a colisão. Culpa reconhecida. Documentos carreadas aos autos que não tiveram o condão de infirmar o bem elaborado Laudo Pericial da Capitania dos Portos, contemporâneo ao acidente, igualmente roborado por prova técnica de igual quilate. Manutenção da procedência das ações. 2.2 Incontroversos os fatos relacionados com a colisão do navio Yusho Regulus com os dois equipamentos do ‘Berço 38 do Porto de Santos’, os danos (lucros cessantes e danos emergentes) efetivamente experimentados pelas autoras, o nexo de causalidade, gerando o dever de indenizar. Culpa exclusiva da vítima não demonstrada. Adoção do princípio da reparação integral do dano o que afasta a tese da limitação da responsabilidade civil. 2.3 Indenização. Inicial contendo pedido certo e determinado, bem como genérico ligado às perdas e danos decorrentes do acidente. Reconhecimento da impossibilidade de mensuração total dos danos à época do acidente. Com base no que demonstrado nos autos correta a condenação ao pagamento de indenização correspondente ao valor de todas as perdas e danos (lucros cessantes) e danos emergentes) efeti-vamente experimentados pelas autoras e decorrentes do acidente observada, por óbvio, eventual cota parte de cada interessado considerando as peculiaridades das atividades portuárias. Entretanto, para melhor balizar a fase de cumprimento de sentença, desde já determino: 2.3.a) Os danos nos equipamentos deverão ser apurados em liquidação por arbitramento, baseando-se a perícia técnica nos documentos existentes nos autos e percentuais de cada quotista; 2.3.b) as perdas e danos (lu-cros cessantes e danos emergentes) deverão ser apurados em liquidação por arbitramento, limitada a perícia técnica prevista na sentença aos elementos concretos existentes nos autos e respectivos percentuais, quando for o caso; 2.3.c) Perdas e danos diretamente ligadas aos fatos dos autos e até o momento impossibilitadas de mensuração, que poderão ser exigidas, mas, por meio de liquidação de sentença pelo procedimento comum (CPC/2015, art. 509, inc. II – no CPC/1973 – liquidação por artigos), assegurado o contraditório e a ampla defesa. Registre-se que aqui se deve apenas ater-se ao quantum relativo a fato novo ligado ao dano reconhecido na fase de conhecimento e decorrente do acidente que deu origem à presente ação. Em todas as hipóteses a correção monetária será contada a partir de valores corrigidos e apurados à data do Laudo, calculando-se a partir de então pela Tabe-la Prática do Tribunal de Justiça. Cuidando-se de responsabilidade civil extracontratual os juros de mora de 1% ao mês serão devidos desde a data do acidente, nos termos da Súmula nº 54 do STJ. Da-nos de monta e culpa crassa a afastar a incidência das disposições do art. 944 do CC relacionadas com a redução equitativa da indenização por conta de excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano. 2.4 Pelos fundamentos expostos, ausentes omissões, contradições ou obscuri-dades na decisão guerreada. Pelas mesmas razões, não há que se falar em afronta ou contradição a textos constitucionais, legais ou entendimento jurisprudencial. 3. Decisão preservada, rejeitados pedidos principais e subsidiários. Preliminares rejeitadas. Recurso improvido, com determinação.” (TJSP – Ap 4007327-37.2013.8.26.056 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. Egidio Giacoia – DJe 06.06.2017)

Page 209: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������209

Observação EditorialForam julgados ainda no ambito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, os seguintes recursos relativos ao mesmo caso:

– 0043294-51.2012.8.26.0562, Apelação – Cautelar de Arresto e Caução para Liberação do Navio seguida de Ação de Indenização, apelante Satsuma Shipping S/A, são apelados Terminal XXXIX de Santos S/A e Caramuru Alimentos S/A;

– 0043296-21.2012.8.26.0562, Apelação – Cautelar de Arresto e Caução para Liberação do Navio seguida de Ação de Indenização, apelante Satsuma Shipping S/A, é apelado Louis Dreyfus Commo-dities do Brasil S/A;

– 3000501-12.2013.8.26.0562, Apelação – Cautelar Inominada objetivando Caução para Libe-ração do Navio seguida de Ação de Indenização por Perdas e Danos, apelante/apelado Satsuma Shipping S/A, é apelado/apelante Intergrain Company Ltd.

2867 – Navio – equipamento – contêineres – desunitização – retenção indevida – liberação – ca-bimento

“Ação cominatória. Desunitização de contêineres. Contêiner que não constitui acessório ou emba-lagem das mercadorias nele transportadas. Retenção que se mostra indevida, independentemente de a carga ter sido perdida, abandonada ou apreendida. Contêineres que devem ser liberados. Ação julgada procedente. Sentença mantida. Recurso improvido.” (TJSP - Ap 1017795-77.2014.8.26.0562 - 16ª CDPriv. - Rel. Des. Coutinho de Arruda - DJe 07.06.2017)

2868 – Navio-Sonda – meio ambiente – contratos de afretamento – prestação de serviços – indis-ponibilidade da embarcação – downtime – superação – rescisão – possibilidade

“Agravo de instrumento. Direito Processual Civil. Direito Civil. Meio ambiente. Petrobras. Navio--Sonda Carolina. Ação de tutela cautelar, requerida em caráter antecedente, na forma do art. 305 do CPC/2015. Rescisão unilateral de contratos de afretamento e de prestação de serviços pela Pe-trobras, por motivo de inadimplemento contratual, consistente na superação do prazo contratual de indisponibilidade da embarcação. Recurso contra a decisão concessiva da tutela de urgência que determinou a continuidade dos contratos até julgamento final da lide. Reforma que se impõe. Au-sência dos requisitos legais previstos no art. 300 do CPC/2015. 1. Conforme se depreende das cláu-sulas 11.1 e 11.1.12 do Contrato de Arrendamento (celebrado com a Commodore) e 11.1 e 11.1.15 do Contrato de Prestação de Serviços (celebrado com a Ventura), ajustou-se que, a cada período de seis meses, as Autoras poderiam contabilizar prazo de indisponibilidade de 54 dias (downtime), cer-ca de 30% do tempo de operação. Ultrapassado esse prazo, estabelecem os contratos que Petrobras poderia rescindi-los unilateralmente, por violação do limite máximo de indisponibilidade da em-barcação afretada. 2. O art. 300 do CPC/2015 estabelece os requisitos indispensáveis à concessão das tutelas provisórias de urgência, sendo eles, no caso da tutela cautelar, a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora). 3. No presente caso, a probabilidade da existência do direito não está suficientemente demonstrada no momento, exigindo cognição exauriente na fase de instrução probatória, quando será possível apurar se a rescisão unilateral foi motivada ou imotivada, resolvendo-se a lide, conforme o caso, em perdas e danos. O mesmo se pode afirmar em relação ao periculum in mora, pois, assistindo razão à tese das Autoras, a questão será resolvida em perdas e danos, o que esmorece a alegação de risco ao resultado útil do processo. 4. A manutenção da vigência do contrato até o desfecho da lide carece de sustentação jurídica, pois, nas relações paritárias regidas pelo Código Civil, ninguém pode ser obrigado a se manter vinculado a um contrato contra sua vontade. A extinção antecipada do contrato é um direito potestativo que assiste as partes, fruto da liberdade de contratar (autonomia da vontade), devendo ser observadas as regras contratuais e legais aplicáveis à hipótese. 5. No Su-perior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do AgRg-AREsp 291.995/BA, em que figurou

Page 210: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

210 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

como Relator o douto Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, restou consignado no abalizado voto de S.Exa. que ‘esta Corte tem entendido que, havendo manifestação de uma das partes no sentido de rescindir o contrato, não pode o Poder Judiciário, em regra, impor a sua continuidade, sob pena de flagrante violação do princípio da autonomia da vontade’. 6. Segundo lição doutrinária de Sílvio Venosa, ‘quando as partes estipulam no contrato que o descumprimento de qualquer de suas cláu-sulas autoriza a resolução dos contratos, estamos perante uma cláusula resolutória expressa, que legitima a resolução por iniciativa de uma delas’. 7. As Autoras que não negam que, desde o início da operação da referida embarcação (em 14.12.2011), o limite de 30% da taxa de indisponibilidade foi ultrapassado ‘em pelo menos outras quatro oportunidades’ (fl. 20). 8. Segundo manifestação da ANP, que integra o feito na condição de amicus curiae, ‘tanto o operador do contrato (concessio-nário) como o operador da instalação (proprietário da unidade de perfuração) podem demandar a subida do BOP (blowout preventor) quando diagnosticada uma falha/anomalia. E, em qualquer for-ma, a ANP pode determinar essa subida, quando discordar das conclusões firmadas nas avaliações de riscos realizadas por essas empresas’. 9. Em uma relação de direito civil, paritária e horizontal, deve ser respeitado o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda). Eventual falha no equipamento de segurança (BOP) pode resultar em consequências catastróficas para o meio ambiente, sendo certo que a responsabilidade por eventual acidente recairá, sobretudo, sobre a Petrobras. 10. Pode-se afirmar, em linha de princípio, que a subida do BOP representa paralisação da atividade de perfuração, resultando prejuízos não apenas para as Autoras, mas também para a Petrobras, em razão do atraso na prospecção de óleo e gás. 11. De mais a mais, considerando os elevados riscos inerentes à atividade exercida pelas empresas, deve-se atentar permanentemente para os princípios da prevenção e da precaução, diretamente ligados à proteção do meio ambiente. Importa dizer que, presumivelmente, a Petrobras não agiu de má-fé, como afirmam as Autoras, ao exercer seu direito de determinar a subida do equipamento de segurança, para manutenção. ‘A boa-fé se presume, a má-fé se prova’. 12. Provimento do recurso, tornando-se sem efeito a decisão agravada.” (TJRJ – AI 0051264-95.2016.8.19.0000 – 7ª C.Cív. – Rel. Des. Luciano Sabóia Rinaldi de Carvalho – DJe 10.05.2017)

Comentário EditorialO Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (“TJRJ”) decidiu agravo de instrumento em favor da Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras, pelo direito de rescisão de contrato de afretamento em razão do período de paralisação para manutenção de peça ter atingido os percentuais máximos de 30% do período do afretamento, conforme previsão contratual.

Inconformadas, as fretadoras de navio-sonda ajuizaram Ação de Tutela Cautelar Antecedente contra a Petrobras com o pedido de continuidade da relação contratual entre as partes, sob as alegações de que não haveria necessidade de manutenção da peça e pelo fato de que já teriam ocorrido paralisa-ções até o período máximo outras vezes, sem que tivesse dado ensejo à rescisão contratual.

A decisão de primeira instancia concessiva da tutela de urgência foi revertida pelo TJRJ. Isso porque foram acatadas as alegações da Petrobras de que a precariedade e a ineficiência das manutenção das peças é culpa das próprias fretadoras; tendo a Petrobras se limitado a aplicar as cláusulas contratuais pelo prazo de indisponibilidade. Para o TJRJ a questão sobre a motivação da manutenção de peças do navio-sonda somente pode ser resolvida por cognição exauriente, dependente de instrução probatória. De mais a mais, eventual responsabilidade da Petrobras poderá ser resolvida em perdas e danos. O TJRJ destacou a jurisprudência do STJ do AgRg-AREsp 291.995/BA no sentido de que “havendo ma-nifestação de uma das partes no sentido de rescindir o contrato, não pode o Poder Judiciário, em re-gra, impor a sua continuidade, sob pena de flagrante violação do princípio da autonomia da vontade”.

Por fim, reforçou o entendimento do TJRJ a manifestação da Agência Nacional do Petróleo – ANP, integrante no processo como Amicus Curiae, em que reiterou as falhas recorrentes na peça em questão que podem, em última análise, causar danos ao meio-ambiente no ato da perfuração de petróleo e gás. Assim, também pelos princípios da prevenção e da precaução, diretamente ligados ao meio-ambiente, o TJRJ concluiu que se faz necessária a negativa da tutela de urgência para que seja mantida a rescisão do contrato.

Page 211: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������211

2869 – Nepom – embarcação policial – atuação

“Direto penal. Contrabando de cigarros. Art. 334-A, § 1º, I, e § 3º do CP. Crime de resistência. Art. 329 do CP. Comprovação. 1. Da análise das provas colacionadas aos autos restou sobejamente demonstrado o cometimento do delito pelo acusado, haja vista que este foi contratado para trans-portar os cigarros contrabandeado, tendo plena ciência da natureza da carga. Deste modo, prestou efetivo auxílio ao transporte e trânsito das mercadorias introduzidas ilegalmente no país, incorrendo no crime tipificado no art. 334-A do CP. 2. A conduta do réu de jogar as mercadorias contrabande-adas intencionalmente sobre a embarcação policial, bem como de realizar manobras arriscadas em alta velocidade, perfaz todos os elementos do tipo do art. 329 do Código Penal. 3. A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. Incidência da Súmula nº 231 do STJ.” (TRF 4ª R. – ACr 5001449-92.2016.404.7017 – 8ª T. – Rel. Des. Fed. Leandro Paulsen – DJe 26.05.2017)

2870 – Ogmo – trabalhador portuário avulso – processo seletivo – experiência profissional – exi-gência – Justiça Comum Estadual – incompetência

“Processual civil e civil. Apelação cível. Ogmo. Processo seletivo. Trabalhador portuário avulso. Exigência de experiência profissional. Incompetência da Justiça Comum Estadual. Competência da Justiça do Trabalho. Segundo o entendimento recente do STF, compete à Justiça do Trabalho processar e julgar demandas que relativas à existência de eventuais conflitos de interesses ocorridos na fase pré-contratual da relação de trabalho, incluída a fase de seleção da vaga de emprego. Prece-dentes. Sentença anulada. Competência da Justiça do Trabalho reconhecida.” (TJES – Ap 0044014-47.2013.8.08.0024 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Samuel Meira Brasil Junior – DJe 23.06.2017)

2871 – Pena de perdimento – ação anulatória – empresa adquirente dos produtos importados – legitimidade ativa

“Processual civil. Ação anulatória. Pena de perdimento. Empresa adquirente dos produtos impor-tados. Legitimidade ativa. 1. Em se tratando de importação por ‘conta e ordem’ de terceiros, a empresa importadora Rhema Importação e Exportação Ltda. atua como mera mandatária da real adquirente Sinuta Brasil Antenas Parabólicas Ltda. por força de contrato previamente firmado (IN SRF 225/2002). 2. Embora Rhema tenha procedido à importação, o destinatário/proprietário da mer-cadoria é a agravante/Sinuta, tendo, assim, legitimidade para a ação de conhecimento proposta para anular a pena de perdimento do bem aplicada no PAF 12466.720642/2015-25. Ainda que assim não se entendesse, quem de alguma forma for afetado pelo ato administrativo, evidentemente, tem legitimidade ativa para postular a anulação. 3. Agravo de instrumento da autora provido.” (TRF 1ª R. – Ag 0028663-32.2016.4.01.0000 – 8ª T. – Rel. Des. Fed. Novély Vilanova – DJe 28.04.2017)

2872 – Pesca – Preps – Ibama – auto de infração – embarcação – equipamento de rastreamento – comunicado de desativação temporária – ausência – sancionamento

“Administrativo. Ambiental. Ibama. Auto de infração. Comunicado de desativação temporária do equipamento de rastreamento da embarcação. Sancionamento irregular. O auto de infração consti-tui ato administrativo dotado de imperatividade, presunção relativa de legitimidade e de legalidade. Apenas por prova inequívoca de inexistência dos fatos descritos no auto de infração, atipicidade da conduta ou vício em um de seus elementos componentes (sujeito, objeto, forma, motivo e fina-lidade) poderá ser desconstituída a autuação. O art. 81 do Decreto nº 6.514/2008 descreve como infração administrativa a seguinte conduta: Deixar de apresentar relatórios ou informações ambien-tais nos prazos exigidos pela legislação ou, quando aplicável, naquele determinado pela autoridade ambiental. Hipótese na qual a autuação não pode vingar, por tratar de fatos que não podem ser

Page 212: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

212 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

imputados ao autor e, ainda que se admitisse a extensão para após a data da aquisição da embarca-ção em questão, não há prova de que o autor tenha concorrido para a infração praticada. Apelação improvida.” (TRF 4ª R. – AC 5012184-33.2015.404.7208 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira – DJe 17.05.2017)

Transcrição Editorial• Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008:

“Art. 81. Deixar de apresentar relatórios ou informações ambientais nos prazos exigidos pela legisla-ção ou, quando aplicável, naquele determinado pela autoridade ambiental:

Multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).”

• Instrução Normativa Seap/MMA/MD nº 02, de 04 de setembro de 2006:

“Art. 1º Instituir o Programa Nacional de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras por Satélite – Preps para fins de monitoramento, gestão pesqueira e controle das operações da frota pesqueira per-missionada pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República – Seap/PR.

§ 1º É obrigatória a participação no Preps de toda a embarcação de pesca estrangeira permissionada pela Seap/PR.

§ 2º É obrigatória a participação no Preps de todas as embarcações pertencentes às frotas e moda-lidades relacionadas no Anexo I desta Instrução Normativa, respeitadas as condições e regiões de operação estabelecidas.

§ 3º É obrigatória a participação no Preps de todas as embarcações pesqueiras construídas e a serem construídas com Arqueação Bruta (AB) igual ou superior a 50 ou com comprimento total igual ou superior a 15 metros, incluindo as embarcações de pesquisa pesqueira, considerando os prazos e condições estabelecidos nesta Instrução Normativa.

§ 4º A participação no Preps de embarcações não previstas no Anexo I desta Instrução Normativa poderá ser exigida por ato normativo da Seap/PR ou do Ministério do Meio Ambiente, ouvidos os integrantes da Gerência-Executiva do Preps, no ambito de suas competências.

§ 5º Os responsáveis pelas embarcações pesqueiras participantes do Preps deverão instalar o equipa-mento de rastreamento e iniciar a transmissão das informações obrigatórias, previstas nos Anexos I e II desta Instrução Normativa, nos prazos e condições estabelecidos na mesma, ou em ato normativo especifico, contados a partir da data de divulgação da homologação das prestadoras de serviço de rastreamento, de que tratam o inciso XIII, do art. 2º, e o art. 5º desta Instrução Normativa.”

2873 – PIS/Cofins-Importação – constitucionalidade – base de cálculo – inclusão do ICMS – não cabimento – compensação/restituição – cabimento

“Processual. Tributário. PIS/Cofins-Importação. RE 559.607-STF. Constitucionalidade. Base de cálculo. Inclusão do ICMS. Não cabimento. Compensação/restituição. 1. Para as ações ajuizadas a partir de 09.06.2005, o prazo prescricional para a repetição ou compensação de indébito é quin-quenal, nos termos da orientação firmada pelo STF nos autos da Repercussão Geral no RE 566621/RS (RTJ 223/540) – ressalvado o entendimento da relatora. 2. É inconstitucional a expressão: acresci-do do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, contida no inciso I do art. 7º da Lei nº 10.865/2004 (RE 559.607, julgado no regime da repercussão geral, publicado em 17.10.2013). 3. Indevida a inclusão do ICMS e do valor das próprias contribuições na base de cálculo das contribuições para o PIS-Importação e para a Cofins-Importação. 4. Cabível a compensação/restituição de eventuais créditos relativos ao recolhimento indevido realizado nos últimos cin-co anos que antecederam o ajuizamento da ação, corrigidos monetariamente pela taxa Selic e observada a norma do art. 170-A do CTN. 5. Remessa oficial a que se dá parcial provimento.” (TRF 1ª R. – REO 0024537-89.2014.4.01.3400 – 8ª T. – Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso – DJe 02.06.2017)

Page 213: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������213

2874 – PIS e Cofins – sistema monofásico – aproveitamento de créditos – possibilidade – regime do reporto – extensão às empresas não vinculadas – cabimento

“Processual. Civil. Tributário. Agravo regimental no recurso especial. PIS e Cofins. Tributação pelo sistema monofásico. Aproveitamento de créditos. Possibilidade. Benefício fiscal concedido pela Lei nº 11.033/2004, que instituiu o regime do reporto. Extensão às empresas não vinculadas a esse regime. Cabimento. I – O sistema monofásico constitui técnica de incidência única da tributação, com alíquota mais gravosa, desonerando-se as demais fases da cadeia produtiva. Na monofasia, o contribuinte é único e o tributo recolhido, ainda que as operações subsequentes não se consumem, não será devolvido. II – O benefício fiscal consistente em permitir a manutenção de créditos de PIS e Cofins, ainda que as vendas e revendas realizadas pela empresa não tenham sido oneradas pela incidência dessas contribuições no sistema monofásico, é extensível às pessoas jurídicas não vinculadas ao Reporto, regime tributário diferenciado para incentivar a modernização e ampliação da estrutura portuária nacional, por expressa determinação legal (art. 17 da Lei nº 11.033/2004). III – O fato de os demais elos da cadeia produtiva estarem desobrigados do recolhimento, à exceção do produtor ou importador responsáveis pelo recolhimento do tributo a uma alíquota maior, não é óbice para que os contribuintes mantenham os créditos de todas as aquisições por eles efetuadas. IV – Agravo Regimental provido. (STJ – AgRg-REsp 1051634/CE – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – Relª p/ Ac. Min. Regina Helena Costa – DJe 27.04.2017)

Transcrição EditorialLei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004:“Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Con-tribuição para o PIS/Pasep e da Cofins não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.”

2875 – Porto seco – armazenamento em porto seco – temperatura – conhecimento de produto – declaração de importação – preenchimento incompleto – dever do importador – trans-portador e armazenador – ausência de culpa

“Recursos de apelação cível. Interpostos por ambas as requeridas. Agravo retido. Pedido de inclusão de ressegurador e cosseguradores. Via recursal inadequada. Precedentes. Lide principal. Contrato de transporte e armazenamento em porto seco. Bem armazenado fora da temperatura correta. In-formação não repassada pelo contratante. Conhecimento de produto e declaração de importação. Preenchimento incompleto. Dever do importador. Ausência de ato ilícito. Quebra de dever contra-tual não configurada. Ausência de culpa do transportador e armazenador. Agravo retido. Desprovi-mento. Apelos providos.” (TJPR – AC 0055196-48.2011.8.16.0001 – 12ª C.Cív. – Relª Desª Denise Kruger Pereira – DJe 14.06.2017)

2876 – Profissional marítimo – agentes nocivos – ruído – vibrações – oscilações – aposentadoria especial – concessão

“Direito previdenciário. Remessa necessária. CPC/2015. Inexistente. Ano marítimo. Cumulação tempo especial. Atividade profissional marítimo. Agentes nocivos. Ruído. Vibrações. Oscilações. Aposentadoria especial. Concessão. Correção monetária e juros de mora. Fase de cumprimento de sentença. Diferimento. Cumprimento imediato do acórdão. 1. Tomando como referência o montan-te previsto no dispositivo do novo CPC, bem como o valor total das parcelas devidas considerado na sentença, é forçoso concluir que o valor da condenação, acrescidos de correção monetária e juros, não excederá 1.000 (mil) salários-mínimos. Nesse caso, portanto, efetivamente não há falar em remessa necessária. 2. O tempo de marítimo embarcado permite a contagem diferenciada, até 16.12.1998 e não exclui a possibilidade de análise da atividade especial, por enquadramento

Page 214: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

214 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

profissional ou exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física. 3. A atividade de ma-rítimo tem enquadramento por grupo profissional, para fins de atividade especial, até 28.04.1995. 4. Comprovada a exposição a ruído, vibrações e oscilações, na atividade de marítimo, a atividade especial deve ser reconhecida. 5. Preenchidos os requisitos legais da carência e 25 anos de ativi-dade especial, o direito à aposentadoria especial é adquirido. O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo de aposentadoria. 6. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. 7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do art. 497, caput, do novo Código de Processo Civil, assegurado o direito à manutenção de benefício mais vantajoso, eventualmente já concedido na via administrativa.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5006217-42.2012.404.7101 – 6ª T. – Rel. Juiz Fed. Aux. Ézio Teixeira – DJe 13.06.2017)

2877 – Segurança de transporte fluvial – excesso de passageiros – princípio in dubio pro reo – prova técnico-documental – capacidade da embarcação – necessidade

“Penal. Processo penal. Atentado contra a segurança de transporte fluvial. Princípio in dubio pro reo. Materialidade. Insuficiência de provas. Apelação provida. 1. A imputação do crime do art. 261 (caput) do Código Penal (atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo), em razão do excesso de passageiros em embarcação fluvial, não dispensa a prova técnico-documental da capacidade de transporte pela embarcação, para a aferição do eventual transporte de carga e pessoas acima do limite técnico e, conseqüentemente, do perigo à incolumidade pública pelo viés da segurança do meio de transporte, não tendo a acusação se desincumbido desse ônus. 2. A sen-tença condenatória, arrimada apenas na prova oral, não se credencia à confirmação. Embora teste-munhos dêem conta do excesso de passageiros na embarcação ‘Kidiomara II’, no dia 22.06.2002, em Itacoatiara/AM, não houve prova pericial, mesmo requerida pela DPU, tampouco a juntada da documentação que atestasse a capacidade do barco. Na dialética processual penal, o ônus de prova incumbe a quem alega (art. 156, CPP). 3. Provimento da apelação.” (TRF 1ª R. – ACr 0000492-88.2004.4.01.3200 – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Olindo Menezes – DJe 01.06.2017)

2878 – Serviços de praticagem – cobrança – agência marítima – mandato – armadores – legitimi-dade – status assertionis

“Apelação cível. Apelação adesiva. Cobrança. Serviços de praticagem. Agência marítima. Mandato. Armadores. Legitimidade. Status assertionis. Instrução probatória. Apelo principal conhecido e pro-vido. Apelo adesivo prejudicado.” (TJES – Ap 0005809-75.2015.8.08.0024 – 1ª C.Cív. – Rel. Des. Jorge Henrique Valle dos Santos – DJe 22.06.2017)

2879 – TCU – relatório de auditoria – convênio – Dnit – Secretaria de Estado de Infraestrutura do Estado do Amazonas – licitação – contratação da construção do porto fluvial – sobrepreço – multa

“Sumário: Relatório de auditoria. Convênio entre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Secretaria de Estado de Infraestrutura do Estado do Amazonas. Licitação para contratação da construção do Porto Fluvial de Eirunepé. Sobrepreço. Serviços com qualidade

Page 215: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������215

deficiente. Audiência dos responsáveis. Análise das razões de justificativa. Rejeição. Acolhimento parcial. Multa.” (TCU – TC 029.512/2011-5 – AC 1187-20/17-P – Ata nº 20/2017 – Plenário – Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti – DOU 21.06.2017)

Transcrição Editorial• Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992:“Art. 43. Ao proceder à fiscalização de que trata este capítulo, o Relator ou o Tribunal:I – determinará as providências estabelecidas no Regimento Interno, quando não apurada trans-gressão à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, ou for constatada, tão somente, falta ou impropriedade de caráter formal;II – se verificar a ocorrência de irregularidade quanto à legitimidade ou economicidade, determinará a audiência do responsável para, no prazo estabelecido no Regimento Interno, apresentar razões de justificativa.Parágrafo único. Não elidido o fundamento da impugnação, o Tribunal aplicará ao responsável a multa prevista no inciso III do art. 58 desta Lei.”• Regimento Interno do Tribunal de Contas da União: “Art. 156. São etapas do processo a instrução, o parecer do Ministério Público e o julgamento ou a apreciação.§ 1º Na etapa da instrução, aplica-se aos servidores o disposto no inciso VIII do art. 39. § 2º Aplicam-se aos recursos, no que couber, o disposto no caput e no parágrafo anterior. Art. 157. O relator presidirá a instrução do processo, determinando, mediante despacho, de ofício ou por provocação da unidade de instrução ou do Ministério Público junto ao Tribunal, o sobrestamento do julgamento ou da apreciação, a citação, a audiência dos responsáveis, ou outras providências consideradas necessárias ao saneamento dos autos. § 1º O relator poderá, mediante portaria, delegar competência a titular de unidade técnica, para reali-zação de citação, audiência, diligência e outras providências necessárias ao saneamento do processo.§ 2º A delegação de competência a que se refere o parágrafo anterior, no caso de citação e audiência, poderá, a critério do relator, ter seu alcance restringido a responsáveis ou a valores indicados no instrumento de delegação.”

2880 – TCU – relatório de auditoria – obras públicas – construção de terminais fluviais – adianta-mento de pagamentos – fiscalização deficiente – recomendação

“Sumário: Relatório de auditoria. Consolidação de levantamentos. Obras públicas de construção de terminais fluviais na região norte. Preços referenciais. adiantamento de pagamentos. Fiscalização deficiente. Proteção contra acidentes. Determinação. Recomendação. Encerramento.” (TCU – TC 006.547/2012-5 – AC 1254-21/17-P – Ata nº 21/2017 – Plenário – Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti – DOU 23.06.2017)

2881 – TCU – tomada de contas especial – auditoria – molhes – prolongamento – indício de su-perfaturamento – contas irregulares – multa

“Sumário: Tomada de contas especial. Conversão em TCE a partir de processo de auditoria. Prolon-gamento dos Molhes da Barra do Porto de Rio Grande/RS. Indício de superfaturamento. Citação. Rejeição das alegações de defesa. Contas irregulares. Débito. Multa.” (TCU – TC 034.400/2013-3 – AC 1298-22/17-P – Ata nº 22/2017 – Plenário – Rel. Min. André Luís de Carvalho – Data da Sessão 21.06.2017)

Transcrição Editorial• Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992.“Art. 47. Ao exercer a fiscalização, se configurada a ocorrência de desfalque, desvio de bens ou outra irregularidade de que resulte dano ao Erário, o Tribunal ordenará, desde logo, a conversão do processo em tomada de contas especial, salvo a hipótese prevista no art. 93 desta Lei.Parágrafo único. O processo de tomada de contas especial a que se refere este artigo tramitará em separado das respectivas contas anuais.”

Page 216: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

216 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

• Regimento Interno do Tribunal de Contas da União:

“Art. 252. Se configurada a ocorrência de desfalque, desvio de bens ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário, o Tribunal ordenará, desde logo, a conversão do processo em tomada de contas especial, salvo na hipótese prevista no art. 213.

Parágrafo único. Caso a tomada de contas especial envolva responsável por contas ordinárias, deverá ser observado o disposto no art. 206.”

2882 – Terminal retroportuário – armazenagem – cobrança – início da contagem – livre armaze-namento – contratação – entrada do último contêiner

“Ação anulatória de duplicata, com pedido de exclusão do nome da autora do Serasa e indenização por dano moral. Indevida negativação do nome da apelada referente à duplicata mercantil sem las-tro. Demanda julgada procedente. Insurgência da ré sustentando que a cobrança de armazenagem seria devida a partir do 14º dia, com início de sua contagem desde a entrada de cada container. Descabimento. Mensagens eletrônicas trocadas entre as partes que evidenciam a contratação do livre armazenamento (free time) de 14 dias, cujo termo inicial de sua contagem se daria a partir da entrada do último container do lote a ser exportado. Débito declarado inexigível. Dano moral ca-racterizado. Verba indenizatória devida e quantum fixado em valor não exagerado (R$ 10.000,00). Precedentes da Câmara e do STJ. Ônus da sucumbência da ré. Incidência da Súmula nº 326 do STJ. Sentença mantida. Recurso desprovido.” (TJSP – Ap 1006249-25.2014.8.26.0562 – 15ª CDPriv. – Rel. Des. Mendes Pereira – DJe 03.05.2017)

2883 – THC2 – cobrança em duplicidade, abusiva ou violadora do direito da concorrência – ino-corrência – serviço adicional – possibilidade

“Ação declaratória de inexigibilidade de débito. Cobrança de THC2. Tarifa de serviços de segrega-ção, empilhamento e entrega de contêineres no porto seco. Inocorrência de cobrança em duplici-dade, abusiva ou violadora do direito da concorrência. Tarifa gerada em razão de serviço adicional visando à celeridade no desembaraço aduaneiro. Precedentes. Recurso improvido.” (TJSP – Ap 1011405-91.2014.8.26.0562 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. J. B. Franco de Godoi – DJe 03.05.2017)

Comentário EditorialTrata-se de apelação interposta pela empresa Transbrasa Transitária Brasileira Ltda. contra sentença que julgou improcedente a ação declaratória de inexistência de relação jurídica contra a Brasil Termi-nal Portuário S.A (BTP) em virtude da cobrança de THC2.

Importante esclarecer que THC é a sigla para a expressão inglesa “Terminal Handling Charge” serviço cobrado com o objetivo de remunerar os custos do manuseio de carga do navio no terminal portuário.

De forma prática, é o preço cobrado pelos procedimentos para transferência do cais do porto até uma pilha de contêineres no terminal portuário. Por sua vez, o THC2 é o serviço cobrado de forma suple-mentar ao THC, pela atividade operacional exercida pelo operador portuário na segregação de con-têineres ou de separação de mercadorias importadas que se destinam aos terminais retro portuários.

A Transbrasa alegou a cobrança do THC2 é abusiva e condenada pelo Cade e pelo Poder Judiciário; que a cobrança deve ser endereçada ao Armador no contrato de transporte; os operadores portuários realizam serviços de armazenagem idênticos aos dela; que a BTP emitiu, unilateralmente, fatura vi-sando tornar o contrato de transporte e importação mais oneroso; os serviços de operadora portuária são contratados pelo dono da mercadoria, pelo amador ou pelo seu preposto, inexistindo relação jurídica entre o terminal portuário e a operadora portuária; o Poder Judiciário vem declarando a impossibilidade dessa cobrança; a operadora portuária não presta nenhum serviço que deva ser remunerado pelo terminal retroportuário alfandegado; a cobrança implica numa ação de oligopólio; não há substrato material (prestação do serviço) para a formação do preço; inexiste o acordo de von-tades para o estabelecimento do valor a ser pago a título de THC2; há concorrência desleal; é ilegal a cobrança da THC2; inexiste relação jurídica entre as partes; os efeitos colaterais da cobrança, como a emissão de notas fiscais e negativação, são nefastos para sua atividade empresarial.

Page 217: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������217

A BTP respondeu alegando que há comprovação da legalidade da cobrança, que vem sendo efetuado

desde a administração da Codesp; está provada a efetiva prestação dos serviços; a decisão do Cade

está superada, restando válida esse tipo de cobrança; as decisões envolvendo a matéria são favoráveis

ao seu interesse; antes da privatização dos portos essa tarifa já era cobrada pela Codesp; a cobrança re-

presenta a prestação de serviço, consistente na colocação do container na pilha do terminal portuário;

de rigor a procedência da reconvenção.

Ao julgar o recurso de apelação a 23ª Camara de Direito Privado de Tribunal de Justiça de São Paulo

acompanhou o Relator que compreendeu que é infundada a alegação de cobrança em duplicidade

pelo mesmo serviço, restando apurado que o serviço prestado na área portuária (com cais) pelo

operador não se confunde com aquele prestado no terminal retroportuário alfandegado (sem cais).

Eis que o primeiro gera o THC e o segundo o THC2, que nada mais é do que uma prestação adicional

relacionada à alocação e empilhamento de contêineres visando à facilitação e liberação mais rápida

das mercadorias. Negou-se provimento ao recurso de apelação.

2884 – Transporte marítimo – mercadorias – liberação – condição – apresentação da via original do conhecimento de embarque master – descabimento

“Ação de obrigação de fazer. Transporte marítimo. Liberação de mercadorias condicionada à apre-sentação da via original do conhecimento de embarque master. Descabimento diante do controle aduaneiro informatizado da movimentação de embarcações e cargas. Hipótese de incidência do art. 18, § 2º, I, c, da Instrução Normativa nº 680/2006 da Secretaria da Receita Federal. Retenção admitida apenas quando devido o pagamento do frete ou de contribuição por avaria grossa (art. 7º do Decreto-Lei nº 116/1967). Litigantes que tiveram parte de suas pretensões rejeitadas. Sucumbên-cia recíproca, que afasta o pleito de majoração da verba honorária. Condenação no pagamento de honorários advocatícios mantida, tal como fixada na r. sentença, haja vista a vedação à reformatio in pejus. Recursos desprovidos.” (TJSP – Ap 1024414-23.2014.8.26.0562 – 15ª CDPriv. – Rel. Des. Mendes Pereira – DJe 21.03.2017)

2885 – Transporte marítimo – registro da carga – destempo – pena de perdimento – indenização – cabimento

“Apelação cível. Transporte marítimo. Ação de indenização por danos materiais. É incontrover-so que o registro da carga foi feito a destempo pela ré, ensejando a aplicação da pena de per-dimento das mercadorias à autora, impondo-se o dever de indenizar. Apelação improvida.” (TJRS – AC 0322490-74.2016.8.21.7000 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Bayard Ney de Freitas Barcellos – DJe 04.05.2017)

2886 – Trabalhador portuário – contratação com vínculo empregatício – negociação coletiva – recurso – pressupostos de admissibilidade

“Direito do trabalho. Trabalhador portuário. Contratação com vínculo empregatício. Negociação coletiva. Pressupostos de admissibilidade de recurso. Recurso extraordinário interposto sob a égide do CPC/1973. Eventual ofensa reflexa não viabiliza o manejo do recurso extraordinário. Art. 102 da Lei Maior. Agravo manejado sob a vigência do CPC/2015. 1. A controvérsia, a teor do já asseverado na decisão guerreada, não alcança estatura constitucional. Não há falar em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais. Compreensão diversa demandaria a análise da le-gislação infraconstitucional encampada na decisão da Corte de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. Desatendida a exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência desta Suprema Corte. 2. O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 598.365/MG, de relatoria do Ministro Ayres Britto, concluiu pela ausência de repercussão geral das questões

Page 218: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

218 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

atinentes a pressupostos de admissibilidade de recursos da competência de outros Tribunais. 3. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa a preceito da Constituição da República. 4. Ausente condenação anterior em honorários, inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015. 5. Agravo interno conhecido e não provido.” (STF – ARE 1021519-AgR – 1ª T. – Relª Min. Rosa Weber – DJe 15.05.2017)

2887 – Trabalhador portuário avulso – indenização – pagamento indevido – repetição de indébito – administração – interesse particular – Ministério Público – ilegitimidade ativa ad causam

“Direito processual civil. Ação civil pública. Pagamento indevido de indenização a trabalhador portuário avulso. Fundo de Indenização do Trabalhador Portuário Avulso (FITP). Arts. 58 e 59 da Lei nº 8.630/1993. Repetição de indébito. Interesse particular da administração. Ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público. Recurso extraordinário interposto sob a égide do CPC/1973. Eventual ofensa reflexa não viabiliza o manejo do recurso extraordinário. Art. 102 da Lei Maior. Agravo manejado sob a vigência do CPC/2015. 1. A controvérsia, a teor do já asseverado na decisão guerreada, não alcança estatura constitucional. Não há falar em afronta aos preceitos constitucio-nais indicados nas razões recursais. Compreensão diversa demandaria a análise da legislação infra-constitucional encampada na decisão da Corte de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofen-sa à Constituição, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. Desatendida a exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência desta Suprema Corte. 2. As razões do agravo não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 3. Em se tratando de ação civil pública, inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015. 4. Agravo interno conhecido e não provido.” (STF – RE 1005936-AgR – 1ª T. – Relª Min. Rosa Weber – DJe 08.06.2017)

2888 – Trabalho portuário – contratos temporários – autarquia estadual – regime estatutário do Estado – adicional de insalubridade – pagamento devido – adicional de risco – Lei nº 4.860/1965 – inaplicabilidade

“Administrativo. Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS. Contratos temporários de trabalho. Pretensão ao pagamento do FGTS durante a contratualidade. Recolhimento indevido. Autarquia estadual sujeita ao regime estatutário do Estado de Santa Catarina. Adicional de insa-lubridade. Servidor submetido a condições insalutíferas de trabalho no biênio anterior à rescisão contratual (12.04.2005). Constatação em laudo pericial realizado em juízo, sob crivo do contra-ditório. Pagamento devido, observada prescrição quinquenal. Adicional de risco previsto na Lei Federal nº 4.860/1965. Édito que se reporta aos servidores públicos da União. Verba não estendida ao autor, que, ademais, está vinculado ao Estatuto dos Servidores Públicos do Ente Estadual (Lei nº 6.745/1985), por força do disposto na Lei Estadual nº 10.034/1995, que autorizou a contratação de pessoal perante a administração do porto. Sentença de parcial procedência mantida por seus pró-prios fundamentos. Recursos de apelação desprovidos.” (TJSC – AC 0005480-83.2007.8.24.0061 – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Carlos Adilson Silva – DJe 23.06.2017)

2889 – Valor aduaneiro – despesas de capatazia – inclusão – impossibilidade – art. 4º, § 3º, da IN SRF 327/2003 – ilegalidade – precedentes

“Processual civil e tributário. Agravo interno. Recurso especial. Enunciado Administrativo nº 3 do STJ. Valor aduaneiro. Despesas de capatazia. Inclusão. Impossibilidade. Art. 4º, § 3º, da IN SRF 327/2003. Ilegalidade. Precedentes. 1. Ambas as Turma da Seção de Direito Público desta Corte já se manifestaram no sentido de que o § 3º do art. 4º da IN SRF 327/2003 acabou por contrariar tanto

Page 219: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������219

os arts. 1º, 5º, 6º e 8º do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994 (Acordo de Valoração Aduaneira) quanto o art. 77, I e II, do Regulamento Aduaneiro de 2009, ao prever a inclusão no valor aduaneiro dos gastos relativos à descarga no terri-tório nacional, ampliando ilegalmente a base de cálculo dos tributos incidentes sobre o valor adua-neiro, uma vez que permitiu que os gastos relativos à carga e à descarga das mercadorias ocorridas após a chegada no porto alfandegado fossem considerados na determinação do montante devido. Nesse sentido: REsp 1.239.625-SC, 1ª T., Rel. Min. Benedito Gonçalves, Julgado em 04.09.2014; e AgRg-REsp 1.434.650/CE, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, Julgado em 26.05.2015. 2. Recente julgado desta Segunda Turma seguiu essa orientação (REsp 1.528.204, Rel. p/ Ac. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 09.03.2017, DJe 19.04.2017). 3. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-AREsp 1066048/RS – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 30.05.2017)

Comentário EditorialConforme se pode verificar já temos posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça – STJ de-clarando a ilegalidade da IN 327/2003, no que previu a inclusão das despesas com descarga da mercadoria, já no território nacional, no conceito de valor aduaneiro, para fins de incidência do Imposto de Importação.

Isso porque, nos termos do art. 40, § 1º, inciso I, da atual Lei dos Portos (Lei nº 12.815/2013), o trabalho portuário de capatazia é definido como “atividade de movimentação de mercadorias nas ins-talações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário”.

O Acordo de Valoração Aduaneiro e o Decreto nº 6.759/2009, ao mencionar os gastos a serem com-putados no valor aduaneiro, referem-se a despesas com carga, descarga e manuseio das mercadorias importadas até o porto alfandegado. A Instrução Normativa nº 327/2003, por seu turno, refere-se a valores relativos à descarga das mercadorias importadas, já no território nacional.

A Instrução Normativa nº 327/2003 da SRF, ao permitir, em seu art. 4º, § 3º, que se computem os gastos com descarga da mercadoria no território nacional, no valor aduaneiro, desrespeita os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo Decreto nº 6.759/2009, tendo em vista que a realização de tais procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da embarcação, ou seja, após a sua chegada ao porto alfandegado.

Portanto, de rigor, não só a busca de liminar para Exclusão da capatazia da base de cálculo do impos-to de importação bem como a restituição dos valores recolhidos nos últimos 5 anos.

Transcrição Editorial• Enunciado administrativo do Superior Tribunal de Justiça:

“3 – Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC”.

• Instrução Normativa SRF nº 327, de 09 de maio de 2003:

“Determinação do valor aduaneiro

Art. 4º Na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os seguintes elementos:

I – o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou aeroporto alfandegado de des-carga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, descarga e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas, até a chegada aos locais referidos no inciso anterior; e

III – o custo do seguro das mercadorias durante as operações referidas nos incisos I e II.

§ 1º Quando o transporte for gratuito ou executado pelo próprio importador, o custo de que trata o inciso I deve ser incluído no valor aduaneiro, tomando-se por base os custos normalmente incorridos, na modalidade de transporte utilizada, para o mesmo percurso.

§ 2º No caso de mercadoria objeto de remessa postal internacional, para determinação do custo que trata o inciso I, será considerado o valor total da tarifa postal até o local de destino no território aduaneiro.

Page 220: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

220 ����������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

§ 3º Para os efeitos do inciso II, os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da respon-sabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada.”• Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009:“Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, artigo 8, parágrafos 1 e 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994; e Norma de Aplicação sobre a Valoração Aduaneira de Mercadorias, art. 7º, aprovado pela Decisão CMC nº 13, de 2007, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 4 de junho de 2009): (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010)I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de des-carga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; eIII – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.”• Decreto nº 2.498, de 13 de fevereiro de 1998:“Art. 1º Na aplicação do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994 (Acordo de Valoração Aduaneira) deverão ser observadas as disposições constantes do presente Decreto.[...]Art. 5º O exame preliminar do valor declarado consiste nos seguintes procedimentos:I – verificação da existência dos documentos justificativos do valor aduaneiro, conforme o método de valoração utilizado;II – avaliação da integridade dos documentos apresentados; eIII – cotejo entre as informações contidas na declaração de importação e aquelas consignadas nos respectivos documentos justificativos.Do exame conclusivoArt. 6º O exame conclusivo do valor declarado consiste na análise minuciosa desse valor, à vista dos dados constantes da declaração de importação, da declaração de valor aduaneiro e dos documentos que a instruem, bem como:I – na exigência de documentos ou informações adicionais que possam embasar o referido valor e seus respectivos ajustes, quando os elementos fornecidos não forem suficientes para sua aceitação;II – na realização de diligências, auditorias ou investigações, quando as circunstancias que envolvam a operação de importação assim o justificarem;III – na realização dos ajustes correspondentes, quando for determinado novo valor;IV – nas informações prestadas pela Secretaria de Comércio Exterior.[...]Art. 8º Nos casos de recusa do atendimento às exigências de que trata o artigo anterior ou quando as informações prestadas não forem suficientes para a aceitação do valor declarado como preço efeti-vamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas, ajustado de conformidade com o art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira, a autoridade aduaneira poderá decidir pela impossibilidade da apli-cação do método do valor de transação, e, em consequência, pela apuração do valor aduaneiro com base em método substitutivo, observada a ordem sequencial estabelecida (Decisão I do documento G/VAL/1 do Comitê de Valoração Aduaneira).”

Page 221: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Seção Especial – Acontece

Análise Jurídica sobre as Alterações Promovidas no Decreto dos Portos

FELIPE DE ASSIS SERRAAdvogado atuante na Área de Direito Portuário desde 2008, Membro da Comissão de Direito Portuário e Marítimo da OAB/DF, Pós-Graduando em Direito Marítimo e Portuário na Maritime Law Academy.

RESUMO: Análise jurídica sobre as principais alterações ocorridas nos termos do Decreto nº 8.033/2013.

PALAVRAS-CHAVE: Lei dos Portos; Decreto nº 8.033/2013; instalações portuárias autorizadas; ins-talações portuárias autorizadas.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Principais alterações do Decreto nº 8.033/2013; 1.1 Dentro das áreas dos portos organizados; 1.1.1 Alterações quanto ao prazo do arrendamento; 1.1.2 Alterações quanto às regras de prorrogação dos contratos de arrendamento ou de concessão: requisitos, critérios e procedimentos; 1.1.3 Alterações quanto às regras de prorrogação antecipada dos contratos de ar-rendamento; 1.1.4 Alterações quanto às regras de ampliação de áreas arrendadas; 1.1.5 Alteração quanto aos procedimentos visando à aprovação para realização de investimentos não previstos nos contratos de arrendamento; 1.1.6 Inclusão da possibilidade de o arrendatário realizar investimento amortizável fora da área arrendada; 1.1.7 Inclusão da possibilidade de substituição da área arrenda-da; 1.1.8 Alteração quanto à previsão de exploração direta ou indireta de áreas não afetas às ope-rações portuárias; 1.1.9 Inclusão da possibilidade de adaptação dos contratos de arrendamento que estejam em vigor; 1.1.10 Cuidado com os contratos de arrendamento próximos de seus respectivos termos finais; 1.2 Fora das áreas dos portos organizados – Autorizações de instalações portuárias; 1.2.1 Alteração quanto ao prazo para o início das operações; 1.2.2 Alteração quanto às exigências para obtenção de outorga de autorização para construção e exploração de instalação portuária de uso privado e consequente diminuição do tempo para a conclusão do anúncio público; 1.2.3 Inclusão da possibilidade de emissão de ato de autorização de instalação portuária com condição suspensiva com relação à apresentação da documentação a ser emitida pela Secretaria do Patrimônio da União – SPU; 1.2.4 Inclusão da autorização para a SPU destinar a cessão da área da União em favor do outorgado para construir ou ampliar a instalação portuária; 1.2.5 Eliminação da limitação de 25% para realização de ampliação de instalação portuária autorizada; 1.2.6 Eliminação da exigência para ob-tenção de prévia autorização para aumento de capacidade da instalação portuária sem ampliação de área; 1.2.7 Inclusão da possibilidade de ampliação de área sem a necessidade de prévia autorização do poder concedente; Conclusões.

INTRODUÇÃO

Após o advento da Lei nº 12.815/2013 e do Decreto nº 8.033/2013, o Go-verno Federal esperava que o setor portuário, enfim, se desenvolvesse a ponto de botar o Brasil novamente nos trilhos rumo ao crescimento da sua economia.

Page 222: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

222 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

Foi exatamente nesse sentido que a Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 595/2012 justificou a revogação da Lei dos Portos anterior, ora a Lei nº 8.630/1993 e, portanto, a publicação do então na época chamado “Novo Marco Regulatório do Setor Portuário”.

O que se viu na prática, contudo, foi um longo período de crise no Brasil, que acabou influenciando na ausência de investidores interessados em cons-truir, reformar, ampliar, modernizar a infraestrutura portuária.

Para piorar, mesmo diante dos propósitos do “Novo Marco Regulatório do Setor Portuário” de incentivar a realização de investimentos no país, o orde-namento jurídico vigente na época criava enormes barreiras que dificultavam o encontro de soluções para permitir que o investidor privado investisse com a segurança jurídica necessária.

Nos portos públicos, por exemplo, existia um grande entrave para os arrendatários e para o Governo Federal no que concerne aos arrendamentos portuários cujos contratos alcançavam seus respectivos termos finais de prazo.

Quando um contrato de arrendamento se aproximava do fim, o Governo Federal, por intermédio da Antaq e do poder concedente do setor, não conse-guiam realizar as licitações portuárias a tempo de garantir a continuidade dos serviços que vinham sendo prestados, mediante um novo instrumento contra-tual com prazo suficiente para possibilitar a amortização dos investimentos.

Assim, a alternativa que sobrava era a celebração dos chamados contra-tos de transição, na forma prevista na Resolução Normativa nº 7 da Antaq. Esses instrumentos contratuais não solucionavam os problemas, mas apenas evitavam que os serviços permanecessem sendo prestados na área anteriormente arrenda-da sem haver instrumento contratual vigente.

Eram os chamados “tapa-buracos”, que previam a possibilidade de o ar-rendatário, diante do termo final do prazo de duração de seu respectivo contra-to de arrendamento, permanecer nas áreas e instalações por um prazo adicional de 180 (cento e oitenta) dias, ou até que fosse realizada e concluída a nova licitação correspondente.

Acontece que, na prática, esse prazo sempre se demonstrou insuficiente para se realizar uma nova licitação. Consequentemente, o que ocorria era a celebração de sucessivos contratos de transição, até que um dia fosse possível realizar e concluir a licitação sucessora.

Diante dessa situação, o arrendatário, com toda a razão, realizava o mí-nimo de investimentos possíveis para a continuidade do desenvolvimento de suas atividades – tão somente aqueles que eram essenciais para permanecerem executando seus respectivos contratos.

Já os investimentos voltados à modernização das instalações portuárias e à ampliação das atividades desenvolvidas, os quais são de total interesse do

Page 223: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������223

país, eram deixados de lado, diante daquela situação provisória e tão precária ditada pelos contratos de transição.

No que concerne às instalações portuárias autorizadas, a situação não era diferente. Tais instalações, apesar de poderem ser exploradas perpetuamen-te em conformidade com a lei, possuíam limitações inexplicáveis quanto à rea-lização de investimentos, como aquela prevista no parágrafo único, inciso II do art. 35 do Decreto nº 8.033/2013, que impunha um teto de até 25% para a reali-zação de ampliações nas instalações portuárias, ou então como aquela prevista na Portaria nº 110 do poder concedente da época (SEP/PR), que impossibilitava a realização de ampliações quando as instalações portuárias se localizassem dentro das poligonais dos portos públicos.

Assim, entre 2012, quando adveio a MP 595, posteriormente convertida por intermédio da Lei nº 12.815/2013, até 2017, o sistema portuário nacional ficou engessado no que concerne à realização de investimentos.

Diante das necessidades do país, de gerar maior competitividade no setor portuário e o consequente crescimento da economia, o Governo Federal passou a estudar medidas para vencer a tão criticada burocracia.

Em 2016, sobreveio a extinção da Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR, passando o poder concedente a ser exercido pelo Mi-nistério dos Transportes, Portos e Aviação Civil. Em 2017, criou-se a Secretaria Nacional de Portos, um órgão dentro do referido Ministério que deverá agilizar as análises a serem realizadas sobre o Sistema Portuário Nacional.

Finalmente, em maio de 2017, sobreveio o Decreto nº 9.048/2017, res-ponsável por promover as alterações que tanto se ensaiou no sistema portuário nacional. Alteraram-se, a partir daí, os dispositivos do Decreto nº 8.033/2013, com a promessa de facilitar a realização de investimentos no setor portuário e de garantir maior segurança jurídica aos investidores privados.

1 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DO DECRETO Nº 8.033/2013Das alterações ocorridas no sistema jurídico-portuário, destacam-se as

que abrangem as instalações portuárias localizadas dentro e fora das áreas dos Portos Organizados, ou seja, as instalações arrendadas, as áreas não afetas às operações portuárias e as instalações portuárias autorizadas. Comenta-se cada uma delas nos tópicos e subtópicos específicos abaixo.

1.1 dentrO das áreas dOs pOrtOs OrganizadOs

1.1.1 Alterações quanto ao prazo do arrendamento

A primeira grande alteração que se verifica é com relação ao prazo do arrendamento portuário.

Page 224: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

224 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

Antes das modificações ocorridas, o Decreto nº 8.033/2013, em seu art. 19, previa que os contratos de concessão e de arrendamento teriam prazo de até vinte e cinco anos, prorrogável uma única vez, por período não superior ao originalmente contratado a critério do poder concedente.

Com as alterações ocorridas, o referido dispositivo legal passou a dispor que “os contratos de concessão e de arrendamento terão prazo determinado de até trinta e cinco anos, prorrogável por sucessivas vezes, a critério do poder concedente, até o limite máximo de setenta anos, incluídos o prazo de vigência original e todas as prorrogações”.

Observam-se, a partir daí, duas alterações de suma relevância.

A primeira delas é relacionada ao prazo originário do contrato de arren-damento e concessão, que passou do limite de 25 (vinte e cinco) anos para o limite de 35 (trinta e cinco) anos.

Já a segunda alteração é relacionada à limitação de prorrogações que poderão ocorrer, onde se eliminou aquela regra que dispunha que, para que o contrato de arrendamento ou de concessão fosse prorrogado, a prorrogação poderia ocorrer por apenas uma única vez, pelo período originalmente contra-tado.

No cenário anterior, se houvesse, por exemplo, um contrato de arrenda-mento ou de concessão cujo prazo de vigência era de 10 (dez) anos, o instru-mento contratual poderia ser prorrogado apenas por uma única vez em mais 10 (dez) anos.

Ainda neste exemplo, após atingir a limitação de prorrogação contratual, o poder concedente do setor portuário não tinha alternativa a não ser de licitar a área arrendada ou concedida.

No cenário atual, a limitação de quantidades de prorrogação finalmente se encerrou, desde que respeitado o prazo total de 70 (setenta) anos de um de-terminado contrato.

É possível atualmente, portanto, de acordo com as alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013, prorrogar um contrato de arrendamento ou de con-cessão por uma, duas, três, quatro, enfim, quantas vezes forem necessárias para se garantir a continuidade dos serviços que são prestados, desde que a soma dos prazos prorrogados com o prazo originário do contrato não ultrapasse o total de 70 (setenta) anos e que sejam observados os critérios estabelecidos no decreto.

Ademais, conforme prevê o § 2º do art. 19 do Decreto nº 8.033/2013, todos os prazos dos contratos de concessão e de arrendamento deverão ser fixados compativelmente com a amortização e a remuneração adequada dos investimentos, em observância às indicações do Estudo de Viabilidade, que de-verá preceder a licitação.

Page 225: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������225

1.1.2 Alterações quanto às regras de prorrogação dos contratos de arrendamento ou de concessão: requisitos, critérios e procedimentos

No que concerne às regras para a prorrogação dos contratos de arrenda-mento ou concessão, a primeira alteração que se verifica é quanto à previsão da antecedência mínima para formalização do pedido ao poder concedente.

A Resolução Normativa nº 7 da Antaq previa anteriormente a necessi-dade de se observar a antecedência mínima de 24 (vinte e quatro) meses com relação ao término do contrato de arrendamento, para se pleitear a prorrogação contratual.

De acordo com os novos ditames legais, em especial, com o § 4º do De-creto nº 8.033/2013 alterado, a antecedência mínima a ser observada passou de 24 (vinte e quatro) para 60 (sessenta) meses.

As alterações do Decreto nº 8.033/2013 inseriram ainda, em seu § 3º do art. 19, os requisitos básicos necessários para as prorrogações dos contratos de arrendamento ou concessão, dentre outros que poderão surgir em regula-mentação específica, no caso na Resolução que deverá futuramente revogar a Resolução Normativa nº7-Antaq. São eles:

I – a manutenção das condições de habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira, regularidade fiscal e trabalhista e cumpri-mento do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 7º da Constituição;

II – a adimplência junto à administração do porto e à Antaq, na forma do art. 62 da Lei nº 12.815, de 2013; e

III – a compatibilidade com as diretrizes e o planejamento de uso e ocupação da área, conforme estabelecido no plano de desenvolvimento e zoneamento do porto.

Além dos requisitos acima, o novo texto legal inseriu ainda qual deverá ser o critério de análise a ser adotado pelo poder concedente em face dos pe-didos de prorrogação. Segundo o § 1º do art. 19 do Decreto nº 8.033/2013, a partir de agora, as prorrogações de contrato de arrendamento ou de concessão deverão ser precedidas de análise, pelo poder concedente, sobre a vantagem de se prorrogar o instrumento contratual em relação à realização de nova licitação.

O poder concedente deverá, portanto, realizar uma análise comparati-va entre dois cenários, quais sejam: (i) promover a prorrogação do contrato e (ii) realizar nova licitação. O cenário que oferecer maiores vantagens nos aspec-tos técnicos e econômicos deverá ser o escolhido pelo poder concedente para motivar a prorrogação contratual ou a realização da nova licitação.

Quanto aos procedimentos visando à prorrogação do contrato de arren-damento ou de concessão, acredita-se que deverão provisoriamente ser aplica-

Page 226: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

226 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

das, no que couber e que, portanto, não conflitar com as alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013, as regras ditadas pelo art. 24 da Resolução Norma-tiva nº 7 da Antaq.

Assim, na prática, acredita-se que, após recebido o pleito, o poder con-cedente deverá se manifestar previamente sobre a conveniência e oportunida-de da prorrogação contratual, e, em caso de manifestação favorável, deverá encaminhar a solicitação à Antaq, para abertura de processo administrativo, realização de análise técnica e posterior emissão de parecer conclusivo voltado ao critério definido pelo art. 19, § 1º, do Decreto nº 8.033/2013.

Após a emissão do parecer conclusivo, caberá ao poder concedente aprovar ou não a prorrogação.

A Resolução Normativa nº 7-Antaq deverá sofrer alterações quanto a esse ponto, podendo, inclusive, ser integralmente revogada, devendo, neste caso, os requisitos e os procedimentos para a prorrogação de contratos de arrendamento modificarem também.

1.1.3 Alterações quanto às regras de prorrogação antecipada dos contratos de arrendamento

Alteraram-se também as regras para a realização de prorrogações anteci-padas dos contratos de arrendamento celebrados durante a vigência da Lei dos Portos anterior (Lei nº 8.630/1993).

A possibilidade de um contrato de arrendamento ser antecipadamente prorrogado pelo poder concedente surgiu com o advento da Lei nº 12.815/2013, em seu art. 57, que prevê o seguinte:

Art. 57. Os contratos de arrendamento em vigor firmados sob a Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, que possuam previsão expressa de prorrogação ainda não realizada, poderão ter sua prorrogação antecipada, a critério do poder con-cedente.

§ 1º A prorrogação antecipada de que trata o caput dependerá da aceitação ex-pressa de obrigação de realizar investimentos, segundo plano elaborado pelo arrendatário e aprovado pelo poder concedente em até 60 (sessenta) dias.

§ 2º (Vetado)

§ 3º Caso, a critério do poder concedente, a antecipação das prorrogações de que trata o caput não seja efetivada, tal decisão não implica obrigatoriamente a recusa da prorrogação contratual prevista originalmente.

Nesses termos legais, tem-se a concepção de que os contratos de arren-damento firmados sob a vigência da Lei dos Portos Anterior (Lei nº 8.630/1993) poderão ser antecipadamente prorrogados, desde que o arrendatário compro-meta-se a realizar investimentos não previstos originalmente no contratos.

Page 227: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������227

O texto originário do Decreto nº 8.033/2013 não fez qualquer menção quanto ao referido dispositivo legal, deixando de aproveitar a oportunidade para regulamentar esse instituto da prorrogação antecipada do contrato de ar-rendamento.

A regulamentação do referido dispositivo legal surgiu em 2014, quando a extinta Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR editou e publicou a Portaria nº 349, de 30 de setembro de 2014, dispondo, em sínte-se, a respeito das competências para a realização da análise dos pedidos de prorrogação antecipada, dos requisitos de admissibilidade, os critérios a serem observados e os procedimentos necessários.

Com as alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013, inseriu-se o art. 19-A, que, finalmente regulamentou por meio de uma legislação mais fir-me, como um decreto, o instituto da prorrogação antecipada do contrato de arrendamento, sem prejuízo da regulamentação que foi inserida pela referida Portaria da SEP/PR no que não conflitar com o novo texto legal.

Com as alterações do Decreto nº 8.033/2013, passou-se a considerar, na forma de seu art. 19-A, § 1º, prorrogação antecipada tão somente aquela que ocorrer previamente ao último quinquênio de vigência do contrato. Após esse período, subentende-se que a prorrogação deverá seguir o rito do art. 19 e não de forma antecipada.

Já os §§ 2º e 3º inseridos no Decreto nº 8.033/2013 não inovaram absolu-tamente nada com relação ao que já estava previsto na Portaria nº 349-SEP/PR, na medida em que previram que, além dos requisitos necessários à prorrogação ordinária, a prorrogação antecipada exige aceitação pelo arrendatário da obri-gação de realizar investimentos novos e imediatos, não amortizáveis durante a vigência original do contrato, conforme plano de investimento aprovado pelo poder concedente no prazo máximo de 60 (sessenta) dias.

Ademais, não houve qualquer dispositivo legal novo que conflite com as regras estabelecidas pela referida Portaria, razão pela qual se entende que esta última permanece sendo aplicada ao caso, somada com a regra do § 1º do art. 19-A acima verificada e dos §§ 4º e 5º, estes últimos dispositivos prevendo o seguinte:

a) possibilidade de os investimentos que o arrendatário se comprometer a realizar diante da prorrogação antecipada serem escalonados ao longo da vigência do contrato de arrendamento, conforme cronograma físico-financeiro que deverá estar previsto em Estudo de Viabilidade a ser apresentado;

b) possibilidade de o arrendatário formalizar novo pedido de prorrogação anteci-pada de contrato de arrendamento, em caso de indeferimento anterior, desde que apresente novas justificativas;

Page 228: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

228 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

c) possibilidade de revisão do cronograma de investimentos para melhor ade-quação do interesse público, em razão e evento superveniente, assegurada a preservação da equação econômico-financeira original, sem prejuízo da con-cepção de que, para a realização de prorrogação antecipada do contrato de arrendamento, devem-se realizar investimentos originalmente não previstos.

1.1.4 Alterações quanto às regras de ampliação de áreas arrendadas

As alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013 instituíram ainda novas regras gerais para a realização de ampliações de áreas arrendadas.

O texto anterior do Decreto nº 8.033/2013 limitava-se em prever que as ampliações seriam permitidas quando comprovassem a inviabilidade técnica, operacional ou econômica de realização de licitação de novo arrendamento e que implicariam a revisão de metas, tarifas e outros parâmetros contratuais, de forma a incorporar ao contrato os ganhos de eficiência.

O novo texto do referido decreto inseriu mais uma possibilidade para se justificar a realização ampliação nos termos e seu art. 24, I. Trata-se da hipótese e que a pretensão de ampliação restar devidamente justificada com comprova-ção de ganhos de eficiência à operação portuária.

Sobressaem, assim, duas justificativas que poderão ser utilizadas pelo arrendatário para pleitear a ampliação de área de seu arrendamento. São elas:

I – Comprovação dos ganhos de eficiência à operação portuária; ou

II – Comprovação da inviabilidade técnica, operacional ou econômica de reali-zação de licitação de novo arrendamento portuário.

Observa-se que as justificativas para ampliação não precisam ser neces-sariamente as duas acima. Basta haver uma delas para viabilizar a pretensão da ampliação.

Ainda sobre a ampliação de área arrendada, as alterações recentemente promovidas no Decreto nº 8.033/2013 trouxeram ainda, em seu art. 24, § 1º, os critérios necessários para se comprovar os ganhos de eficiência à operação portuária referentes ao item I acima. O referido dispositivo estabeleceu que tal comprovação ocorrerá por meio da comparação dos resultados advindos da exploração da área total expandida com os resultados que seriam obtidos com a exploração das áreas isoladamente, observados os aspectos concorrenciais e as diretrizes de planejamento setorial.

Por fim, para a realização da ampliação de área de arrendamento, não se pode dispensar, em regra, a necessidade de se recompor o equilíbrio econômi-co-financeiro do contrato de arrendamento, conforme regra ditada pela Portaria nº 499 da extinta Secretaria de Portos da Presidência da República.

Page 229: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������229

Todavia, com o advento do novo texto do decreto, o § 2º do art. 24 pas-sou a prever a possibilidade excepcional de se dispensar essa necessidade, no caso em que a expansão do arrendamento para área contígua não alterar subs-tancialmente os resultados da exploração da instalação portuária.

1.1.5 Alteração quanto aos procedimentos visando à aprovação para realização de investimentos não previstos nos contratos de arrendamento

Inseriu-se também, no cenário jurídico-portuário, a possibilidade de re-alização de investimentos imediatos e urgentes antes da realização da análise conclusiva que compete à Antaq, de modo a tornar mais célere a implantação das obras pelos arrendatários.

A regra geral é que, para o arrendatário que deseja realizar investimentos não previstos inicialmente no contrato de arrendamento e, ao mesmo tempo, ser amortizado por isso, é necessário submeter o pleito à Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq, que, por sua vez, nos termos do inciso II do art. 3º do Decreto nº 8.033/2013, deverá realizar a análise e submeter suas con-clusões ao poder concedente para a devida aprovação ou não.

Ocorre que toda essa análise gera tempo, o que dificulta, por um lado, o arrendatário que necessita da realização dos investimentos de forma urgente e imediata e, por outro, o atendimento do interesse público que gira em torno da necessidade de modernização da infraestrutura portuária para geração de ganhos de eficiência.

Anteriormente, caso o arrendatário realizasse um investimento não pre-visto em seu contrato de arrendamento sem a adoção dos procedimentos pré-vios necessários, ficaria ele literalmente a ver navios, sem qualquer direito de amortização, conforme previa o parágrafo único do art. 18 da Resolução Nor-mativa nº 7-Antaq, in verbis:

Art. 18. O prazo contratual do arrendamento deverá ser suficiente para amortiza-ção ou depreciação dos investimentos previstos no contrato a serem feitos pela arrendatária, e para lhe proporcionar adequada remuneração, conforme parâme-tros adotados no estudo de avaliação do empreendimento, respeitado o limite de vigência de até 25 (vinte e cinco) anos, prorrogável uma única vez, por período não superior ao originalmente contratado, a critério do poder concedente.

Parágrafo único. A realização de investimento não previsto no contrato de ar-rendamento e não autorizado previamente pelo poder concedente correrá por conta e risco da arrendatária e não ensejará nenhuma alteração do contrato de arrendamento ou direito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, sem prejuízo das penalidades eventualmente aplicáveis.

Não havia outra opção para o arrendatário, a não ser desistir do investi-mento, ou aguardar o tão demorado processo de aprovação prévia.

Page 230: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

230 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

O que o novo texto legal fez foi possibilitar a amortização futura de in-vestimentos realizados pelos arrendatários, ainda que não previamente aprova-dos, nas hipóteses de:

i) investimento necessário para o cumprimento de exigências de órgãos ou enti-dades integrantes da Administração Pública com competência para intervir nas operações portuárias;

ii) investimento necessário para restaurar a operacionalidade da instalação por-tuária em razão de fato superveniente que impeça ou dificulte a oferta de serviços portuários; ou

iii) investimento necessário para fins de aumento da eficiência operacional ou ampliação da capacidade da instalação portuária quando a medida for com-provadamente urgente para o atendimento adequado dos usuários.

Havendo pelo menos uma dessas hipóteses, o arrendatário deverá ape-nas submeter o pleito ao poder concedente, devidamente instruído do plano de investimentos a ser realizado, entre outros documentos que poderão ser exigi-dos conforme o caso.

O poder concedente, por sua vez, deverá avaliar se o pedido enquadra--se nas hipóteses acima elencadas e aprovar, se for o caso, o plano de inves-timento apresentado, autorizando, assim, a realização dos investimentos em caráter de urgência.

Em caso de aprovação dos investimentos, deverão ser adotadas as medi-das necessárias visando à realização do reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de arrendamento, de modo a possibilitar a amortização deles.

De qualquer forma, o arrendatário, antes de realizar os investimentos em caráter de urgência, deverá firmar um termo de risco de investimentos, no qual assumirá os seguintes riscos:

i) risco de rejeição do seu plano de investimento pelo poder concedente por incompatibilidade com a política pública, caso não tenha sido previamente apreciado;

ii) risco de ser determinada a revisão de seu plano de investimentos;

iii) risco de rejeição de seu estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental pela Antaq; e

iv) outros riscos possíveis.

1.1.6 Inclusão da possibilidade de o arrendatário realizar investimento amortizável fora da área arrendada

Outra novidade trazida pelas alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013 traduz-se na inclusão da possibilidade de amortização de inves-

Page 231: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������231

timentos realizados pelos arrendatários fora da área arrendada, nas infraestru-turas comuns dos portos públicos. Trata-se da previsão contida nos termos do art. 42-A do Decreto nº 8.033/2013, in verbis:

Art. 42-A. Nos casos de arrendamento portuário, o poder concedente poderá au-torizar investimentos, fora da área arrendada, na infraestrutura comum do porto organizado, desde que haja anuência da administração do porto.

Parágrafo único. Os investimentos novos de que trata o caput ensejarão recom-posição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato do proponente. (NR)

Para melhor compreensão do que se trata este artigo e do que mudou com relação ao cenário anterior, imagine-se a seguinte situação:

Um arrendatário Y é titular do arrendamento de um Terminal de Contêineres de 1000 m² situado dentro do porto público X.

Este mesmo arrendatário deseja promover obras de melhoria no berço de atraca-ção do porto público, de modo que as operações portuárias de movimentação e armazenagem de cargas em seu terminal sejam mais eficientes.

Como o berço de atracação é uma instalação de uso comum do porto público, podendo jamais ter destinação exclusiva a um ou outro arrendatário, não há como incluí-lo dentro de um arrendamento portuário. Logo, as obras que o ar-rendatário Y pretende promover não fazem parte de seu arrendamento. Não se encontram dentro do escopo do contrato de arrendamento. Trata-se, portanto, de obras de uso comum, que irão beneficiar a todos os demais arrendatários e usuários do porto público.

Diante deste exemplo, no cenário jurídico anterior, as obras pretendidas pelo arrendatário Y não poderiam ser amortizadas, em razão de justamente não fazerem parte da área arrendada.

A Antaq e o poder concedente do setor portuário consideravam que tais obras caracterizavam-se como doações, em que a amortização não seria cabí-vel. Com efeito, muitas das obras desta natureza deixavam de ser realizadas. Uma porque o porto público não possuía recurso suficiente. Outra porque o arrendatário poderia arcar com sérios prejuízos em seu arrendamento.

O cenário agora mudou. Como visto no art. 42-A supracitado, a amorti-zação passou a ser prevista para estes casos, bastando haver a prévia autoriza-ção do poder concedente para a realização dos investimentos.

1.1.7 Inclusão da possibilidade de substituição da área arrendada

O novo texto do Decreto nº 8.033/2013 inseriu ainda, a partir de seu art. 24-A, a possibilidade de se promover a substituição da área arrendada por outra não arrendada dentro do mesmo porto organizado, desde que observado o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto, desde que:

Page 232: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

232 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

I – a medida comprovadamente traga ganhos operacionais à atividade portuária ou, no caso de empecilho superveniente, ao uso da área original; e

II – seja recomposto o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Além disso, indispensavelmente a substituição da área deverá ser prece-dida de:

I – consulta à autoridade aduaneira;

II – consulta ao respectivo Poder Público municipal;

III – consulta pública;

IV – emissão, pelo órgão licenciador, do termo de referência para os estudos ambientais com vistas ao licenciamento; e

V – manifestação sobre os possíveis impactos concorrenciais do remanejamento.

O pleito de substituição de área poderá partir tanto do arrendatário, quanto do poder concedente, conforme previsão contida no § 1º do art. 24-A do Decreto nº 8.033/2013.

Quando o arrendatário não concordar com a decisão do poder conce-dente quanto à substituição de área, poderá solicitar a rescisão do contrato, sem se sujeitar a aplicação de qualquer penalidade em seu desfavor.

Entende-se que os procedimentos visando à substituição de área deverá em breve ser regulamentada pela Antaq, por intermédio de norma que deverá revogar a Resolução Normativa nº 7-Antaq.

1.1.8 Alteração quanto à previsão de exploração direta ou indireta de áreas não afetas às operações portuárias

Com relação à exploração direta ou indireta de áreas não afetas às opera-ções portuárias, anteriormente ao advento das alterações promovidas, o Decre-to nº 8.033/2013 previa o seguinte:

Art. 25. As áreas não afetas às operações portuárias e suas destinações serão pre-vistas no plano de desenvolvimento e zoneamento do porto.

Parágrafo único. Para a exploração indireta das áreas referidas no caput, a admi-nistração do porto submeterá à aprovação do poder concedente a proposta de uso da área.

Em 28 de novembro de 2014, a Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR publicou a Portaria nº 409-SEP/PR com o objetivo de regu-lamentar esse dispositivo legal.

Page 233: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������233

Nos termos dos arts. 2º e 3º da referida Portaria, criou-se a partir de então a concepção do que poderia ou não ser considerada como área não afeta às operações portuárias.

O art. 2º estabelece que

consideram-se áreas não afetas às operações portuárias aquelas destinadas a ati-vidades diversas da movimentação de passageiros e da movimentação ou arma-zenagem de mercadorias destinados ou provenientes do transporte aquaviário, incluindo as de caráter cultural, social, recreativo, comercial e industrial.

Ou seja, a partir do referido dispositivo legal, todas as áreas cujas ativi-dades não fossem voltadas à movimentação e/ou armazenagem de cargas deve-riam ser consideradas como não afetas às operações portuárias.

A exceção aplicava-se ao parágrafo único do referido dispositivo norma-tivo, que afastava a aplicação da Portaria nº 409-SEP/PR às áreas destinadas aos projetos de revitalização portuária.

Somado ao art. 2º, o art. 3º previa que “a caracterização de quaisquer das atividades previstas no art. 2º considerará a atividade fim desenvolvida na área”. Seu parágrafo único acrescia que “a movimentação de passageiros ou a movimentação ou armazenagem de mercadorias, destinados ou provenientes do transporte aquaviário, realizados de forma acessória à atividade fim desen-volvida na área não necessariamente a caracteriza como área afeta às opera-ções portuárias”.

Assim, de acordo com o referido dispositivo normativo, uma fábrica, por exemplo, quando localizada dentro do porto público, poderia ser considerada como área não afeta às operações portuárias por força da Portaria nº 409-SEP/PR, por mais que o referido empreendimento realizasse movimentação e/ou armazenagem de cargas provenientes e/ou destinadas do transporte aquaviário, desde que a atividade-fim fosse voltada à fabricação de produtos.

Com as alterações promovidas pelo Decreto nº 8.033/2013, nos termos de seu art. 25, § 2º, as áreas não afetas às operações portuárias passaram a ser conceituadas como

a área localizada dentro da poligonal do porto organizado que, de acordo com o plano de desenvolvimento e zoneamento do porto, não seja diretamente desti-nada ao exercício das atividades de movimentação de passageiros, movimenta-ção ou armazenagem de mercadorias, destinados ou provenientes de transporte aquaviário.

Entende-se aqui que o termo “não seja diretamente destinada ao exercí-cio das atividades”, extraído do dispositivo em comento, mantém a concepção trazida pela Portaria nº 409-SEP/PR, de que poderá ser considerado como área

Page 234: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

234 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

não afeta às operações portuárias aquelas que se enquadram tanto nos termos de seu art. 2º quanto em seu art. 3º.

1.1.9 Inclusão da possibilidade de adaptação dos contratos de arrendamento que estejam em vigor

Outra novidade trazida é a inclusão da possibilidade de adapta-ção dos contratos de arrendamento que estejam em vigor, aos termos da Lei nº 12.815/2013 e do Decreto nº 8.033/2013, já com as alterações.

Com a adaptação, os arrendatários ficarão possibilitados de prorrogarem seus respectivos contratos de arrendamento de acordo com os novos critérios legais, ou seja, por sucessivas vezes até o limite máximo de 70 (setenta) anos.

Para tanto, é imprescindível que os arrendatários manifestem seus res-pectivos interesses na adaptação, no prazo de até cento e oitenta dias contados da publicação das alterações do Decreto nº 8.033/2013, que ocorreu no dia 11.05.2017.

O ponto negativo quanto a esse ponto é com relação aos contratos de ar-rendamento firmados antes do advento da Lei nº 8.630/1993, os quais, segundo as alterações do Decreto nº 8.033/2013, não poderão ser adaptados.

Assim, os arrendatários titulares desses contratos permanecerão com situa ções indefinidas, apesar de aqui prevalecer o entendimento no sentido de que tal previsão legal é no mínimo discriminatória.

1.1.10 Cuidado com os contratos de arrendamento próximos de seus respectivos termos finais

As novidades trazidas preocuparam-se ainda com os contratos de arren-damento próximos de seus respectivos termos finais, cujos prazos de vigência estejam para se encerrar em até setenta e dois meses a partir do dia 11.05.2017 (data da publicação das alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013).

Os arrendatários que se encontram nessa situação deverão, além de pe-direm a adaptação de seus respectivos contratos de arrendamento, pleitear suas respectivas prorrogações até o dia 11.05.2018, na forma do art. 19, § 3º, do Decreto nº 8.033/2013, já comentado acima no tópico que dispõe a respeito das prorrogações contratuais.

1.2 FOra das áreas dOs pOrtOs OrganizadOs – autOrizações de instalações pOrtuárias

1.2.1 Alteração quanto ao prazo para o início das operações

Com relação às instalações portuárias autorizadas, situadas fora das poli-gonais dos portos organizados, a primeira alteração que chama a atenção é com

Page 235: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������235

relação ao prazo para o início das operações portuárias, que passou de 24 (vinte e quatro) meses prorrogável por igual período a critério do poder concedente para até 5 (cinco) anos, prorrogável por quantas vezes for necessário, a critério do poder concedente.

Essa alteração cuidou de permitir que empreendimentos já autorizados pelo poder concedente, mas que não conseguiram construir suas instalações portuárias a tempo, devido à crise econômico-financeira do país ou a outros fatores imprevisíveis que podem surgir após a emissão do ato de outorga de autorização, levem adiante os seus projetos, com um risco menor de perderem suas outorgas.

Acredita-se que a aplicação desse novo prazo é imediata e, portanto, engloba todos os empreendimentos autorizados pelo poder concedente, cujo cronograma das obras encontra-se atrasado.

1.2.2 Alteração quanto às exigências para obtenção de outorga de autorização para construção e exploração de instalação portuária de uso privado e consequente diminuição do tempo para a conclusão do anúncio público

Os procedimentos visando à obtenção de autorização do poder conce-dente para construção e exploração de instalação portuária de uso privado eram regidos pela Resolução nº 3.290-Antaq, que previa a realização de prévio pro-cedimento de anúncio público ou chamada pública, conforme o caso.

Os procedimentos eram divididos em duas fases para apresentação de documentos, sendo elas: I – fase de habilitação e II – fase para apresentação da documentação complementar.

Com base naquela norma, estimava-se que, entre a data da formalização do requerimento inicial até a data da emissão do ato de outorga de autorização pelo poder concedente, perdurava um período entre 6 (seis) meses a 1 (um) ano.

Era, portanto, tempo demais para obter uma outorga de autorização para a implantação de uma instalação portuária de uso privado. Assim, muitos aca-bavam desistindo de seus projetos, deixando o país, por sua vez, de receber novos investimentos.

As alterações promovidas no Decreto nº 8.033/2013 preocuparam-se com essa demora e reduziram significativamente os prazos para apresentação de documentos pelos interessados e de análise a ser realizada pela Antaq e pelo poder concedente.

Estima-se que, com as alterações, o prazo total em média para obtenção de outorga de autorização passou a ser de 3 (três) meses, quando, é claro, toda a documentação estiver em conformidade com as exigências legais e se não

Page 236: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

236 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

houver mais de um interessado em implantar uma instalação portuária de uso privado na mesma região geográfica.

1.2.3 Inclusão da possibilidade de emissão de ato de autorização de instalação portuária com condição suspensiva com relação à apresentação da documentação a ser emitida pela Secretaria do Patrimônio da União – SPU

Outro ponto que merece destaque é a inclusão da seguinte previsão con-dita nos termos do § 3º do art. 27 do decreto que prevê que,

na hipótese de ser admitido o processamento do pedido de autorização com base na certidão que trata o § 2º, o contrato de adesão poderá ser celebrado pelo poder concedente com condição suspensiva de sua eficácia à apresentação, pelo interessado e em prazo a ser estabelecido no contrato, da documentação que lhe assegure o direito de uso e fruição da área.

Para melhor compreender essa nova previsão legal, deve-se partir do pressuposto de que, dentre outros tantos documentos necessários para a ob-tenção de outorga de autorização para construção e exploração de instalação portuária de uso privado, destaca-se a necessidade de comprovar a propriedade da área onde se implantará o projeto ou o direito de uso e fruição dela.

Geralmente uma instalação portuária de uso privado é composta por áreas de propriedade privada (alodial) e áreas da União (terreno de marinha, acrescido de marinha e espaço físico em águas públicas).

Comprovar o direito de uso e fruição da área de propriedade privada (alodial) é simples. Basta que o interessado apresente os registros dos imóveis ou o contrato de locação, conforme o caso.

Todavia, para fins de comprovar o direito de uso e fruição da área cuja propriedade é da União, é necessário que o interessado esteja regularizado jun-to à Secretaria do Patrimônio da União – SPU para esse fim, para que aquele órgão promova a cessão, ocupação ou aforamento do terreno, conforme o caso.

Como a regularização junto à SPU não é tão simples e, portanto, requer tempo, muitos dos processos de outorgas de autorização ficavam praticamente paralisados na Antaq até que houvesse uma solução definitiva quanto a esse ponto.

Em 2012, a Secretaria do Patrimônio da União – SPU publicou a Portara nº 404-SPU com o objetivo de estabelecer procedimentos visando à cessão de espaços físicos em águas públicas de áreas da União.

Os procedimentos ditados pela Portaria nº 404-SPU foram adotados tam-bém para os interessados em regularizar também o terreno de marinha contíguo ao espaço físico em águas públicas onde se iria implantar o terminal, possibi-

Page 237: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������237

litando que a SPU, em um único processo, promova a análise dos projetos por inteiro.

Para fins de regularização dos projetos de implantação das instalações portuárias de uso privado junto aos demais órgãos que não fossem a SPU, o art. 12 da referida Portaria in verbis passou a prever a possibilidade de a SPU expedir uma certidão para fins de declarar a disponibilidade das áreas da União pretendidas:

Art. 12. A SPU/UF, quando solicitada, expedirá certidão declaratória acerca da situação de regularidade da área em terra sob o domínio da União, bem como se há disponibilidade do espaço físico em águas públicas, para que o interessado possa dar início aos demais licenciamentos.

No setor portuário não era diferente. Esse dispositivo normativo era ple-namente reconhecido pela Antaq e pelo poder concedente. Nos termos da Re-solução nº 3.290-Antaq, em específico, em seu art. 20, VII, a referida certidão era suficiente para a regularização junto à Antaq e ao poder concedente do setor portuário. Ou seja, se a referida certidão fosse apresentada em conjunto com os demais documentos exigidos, era possível obter outorga de autorização pretendida para a implantação e exploração da instalação portuária de uso pri-vado. Neste caso, caberia à parte se regularizar, em paralelo, junto à SPU, para implantar seu terminal.

Recentemente, em 18 de abril de 2017, antes do advento das modifica-ções promovidas no Decreto nº 8.033/2013, restou publicada, no Diário Ofi-cial da União – DOU, a Portaria Interministerial nº 01/2017 dos Ministérios do Transporte, Portos e Aviação Civil e de Estado do Planejamento, Desenvolvi-mento e Gestão, com o propósito de estabelecer procedimentos para cessão de áreas públicas da União, com vistas à implantação de instalações portuárias.

Nos termos do art. 3º da referida Portaria, a competência para promover a cessão das áreas públicas da União, nesses casos, permaneceu sendo da SPU, com a diferença de que, a partir de então, os procedimentos deverão tramitar também na Antaq e no Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, de forma coordenada e colaborativa, visando à célere e eficiente análise dos pro-cessos, conforme prevê o art. 6º.

Na prática, o processo de regularização das áreas da União para implan-tação de instalação portuária de uso privado deverá partir da Antaq, após a for-malização de pedido de outorga pelo interessado naquela Agência Reguladora.

A Antaq, por sua vez, deverá diligenciar junto à SPU para análise de disponibilidade do terreno da União e/ou do espaço físico em águas públicas, que, em seguida, deverá devolver o processo para a Antaq, para posterior en-caminhamento ao Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil para a formalização do contrato de adesão ou, se for o caso, termo aditivo.

Page 238: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

238 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

Quando celebrado o contrato de adesão ou o termo aditivo, o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil deverá encaminhar o processo de volta à SPU para a celebração do contrato de cessão com a definição dos preços pú-blicos a serem cobrados a título de retribuição à União.

O que o § 3º do art. 27 inserido no Decreto nº 8.033 aqui em comento passou a prever é exatamente para tornar compatível o que passou a ser previsto na Portaria Interministerial nº 01/2017, para que seja possibilitada a emissão do ato de outorga de autorização para construção ou ampliação de instalação por-tuária privada antes mesmo da regularização final das áreas da União, mediante celebração do contrato de cessão com a SPU.

1.2.4 Inclusão da autorização para a SPU destinar a cessão da área da União em favor do outorgado para construir ou ampliar a instalação portuária

Ainda sobre a regularização de áreas da União para fins de implantação de instalação portuária de uso privado, o Decreto nº 8.033/2013, com as alte-rações, passou a prever que

a seleção do empreendedor portuário pelo poder concedente, mediante a assi-natura do contrato de adesão, autoriza a Secretaria do Patrimônio da União – do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão a destinar diretamente ao interessado a área correspondente, tanto a parte terrestre quanto a aquática, independentemente de contiguidade, desde que observado o disposto no pará-grafo único do art. 42 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, quando se tratar de cessão de uso.

Essa inclusão reforça o que foi comentado acima, no sentido de que os procedimentos visando à cessão de áreas da União para implantação de insta-lações portuárias privadas deverão ocorrer de forma coordenada entre a SPU, a Antaq e o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil.

Isto porque, conforme dispõe o dispositivo aqui em comento, uma vez celebrado o contrato de adesão ou o termo aditivo que autoriza respectivamen-te a construção ou a ampliação da instalação portuária privada, a SPU estará automaticamente autorizada a celebrar o contrato de cessão das áreas da União correspondentes ao empreendimento com o outorgado.

Isso certamente evitará toda aquela demora que havia durante a análise dos procedimentos de cessão de áreas para implantação de infraestrutura portu-ária que tramitavam na SPU.

1.2.5 Eliminação da limitação de 25% para realização de ampliação de instalação portuária autorizada

Com relação às ampliações de área de instalação portuária autorizada, foi finalmente excluída aquela limitação que estava prevista no art. 35, parágra-

Page 239: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������239

fo único, II, do decreto e no art. 3º, caput, da Portaria nº 110-SEP/PR, que, em síntese, dispunham que as ampliações de áreas superiores a 25% deveriam ser precedidas de nova autorização, mediante realização de novo procedimento de anúncio público.

A nova redação do art. 35 prospera no sentido de que será dispensada a celebração de novo contrato de adesão ou a realização de novo anúncio públi-co na hipótese de ampliação de área da instalação portuária autorizada.

Assim, poderá o titular da instalação portuária autorizada realizar a am-pliação na porcentagem que entender conveniente, sem qualquer tipo de limi-tação legal, devendo este adotar os procedimentos necessários para tanto junto à Antaq e ao poder concedente.

Muito provavelmente o poder concedente ou a Antaq publicarão nova norma dispondo sobre os procedimentos de ampliação de instalações portuá-rias autorizadas. De qualquer sorte, entende-se que provisoriamente deverá ser considerada a aplicação das regras estabelecidas pela Portaria nº 110-SEP/PR, a partir de seu art. 5º.

1.2.6 Eliminação da exigência para obtenção de prévia autorização para aumento de capacidade da instalação portuária sem ampliação de área

As alterações do decreto refletiram também na exclusão da necessidade de obtenção e prévia autorização do poder concedente para a realização de aumento da capacidade da instalação portuária autorizada.

É o caso, por exemplo, de aquisição de um equipamento como uma RTG por um terminal portuário de uso privado, a qual traz mais eficiência para o em-preendimento e assim possibilita a ampliação da sua capacidade operacional.

Em casos como este, o cenário jurídico anterior exigia a prévia autoriza-ção antes da instalação de equipamentos desta natureza, o que acabava preju-dicando tanto o titular do terminal quanto o interesse público.

A dispensa da necessidade de obtenção de autorização prévia para esses casos encontra-se atualmente expressa nos termos do art. 35, § 5º, do decreto, que prevê que, “exceto quando vedado no contrato de adesão, o aumento da capacidade de movimentação ou armazenagem sem ampliação de área de-penderá de comunicação ao poder concedente com antecedência de sessenta dias”.

Portanto, a partir de agora, os titulares das instalações portuárias autori-zadas poderão realizar, a qualquer tempo e, em regra, sem autorização prévia, investimentos que aumentem a capacidade operacional de seus respectivos empreendimentos, desde que haja ampliação de área. Basta que o aumento da

Page 240: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

240 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

capacidade operacional seja comunicado à Antaq com antecedência de ses-senta dias.

1.2.7 Inclusão da possibilidade de ampliação de área sem a necessidade de prévia autorização do poder concedente

Como visto acima, para a realização de ampliação de área de uma ins-talação portuária autorizada, deverá haver antes a autorização prévia do poder concedente.

Todavia, essa regra possui uma exceção, que restou incluída pelas altera-ções do Decreto nº 8.033/2013. Trata-se da que se refere o § 2º do art. 35, que dispõe o seguinte:

Poderá ser dispensada a aprovação do poder concedente quando a ampliação de área não implicar a necessidade de novo exame de viabilidade locacional, na forma a ser estabelecida em ato do Ministro de Estado dos Transportes, Portos e Aviação Civil.

Ou seja, quando não houver necessidade de nova análise quanto à via-bilidade locacional da instalação portuária de uso privado, o seu titular poderá promover a ampliação sem a necessidade de prévia autorização para tanto.

Contudo, em que pese essa previsão legal já se encontrar vigente, enten-de-se aqui que sua eficácia é limitada, o que significa dizer que essa regra não pode ser aplicada desde logo. Conforme prevê o referido dispositivo legal, essa matéria deverá antes ser regulamentada por intermédio de ato do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil.

CONCLUSÕES

A análise aqui realizada destacou as mais significativas alterações ocorri-das com as alterações do Decreto nº 8.033/2013, tanto com relação as instala-ções que se localizam ou irão se localizar dentro das áreas dos portos públicos, quanto com as instalações autorizadas, fora das áreas dos portos públicos.

De modo geral, é possível concluir, com muito otimismo, que as alte-rações promovidas irão, de fato, permitir o alcance das metas traçadas pelo Governo Federal, que se resumem em atrair o máximo de investimentos para o país.

Resta apenas torcer que as licitações portuárias para os arrendamentos portuários ou, quem sabe, para as concessões portuárias ocorram de forma cé-lere e com eficácia, da mesma forma que os que prefiram explorar instalação portuária autorizada passem a acreditar cada vez mais no verdadeiro propósito dessa nova medida.

Page 241: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������������241

Ademais, para não se afirmar que ficou tudo perfeito, pode-se dizer que as modificações deixaram escapar a oportunidade de dar solução a algumas questões que já perduram a algum tempo, como, por exemplo, as situações dos contratos de arrendamento celebrados antes de 1993, ou então as situações dos empreendimentos portuários autorizados localizados dentro de áreas de portos públicos.

De qualquer sorte, nada impede que essas questões sejam futuramente solucionadas. É o que se espera e o que se acredita.

Page 242: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINAS

Assunto

Seguro MarítiMo

• Análise de Decisão Judicial – O Direito Marítimo por Quem o Faz (Paulo Henrique Cremoneze) ............ 9

•O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Ma-rítimos nas Ações de Regresso (Voltaire Marensi eLeatrice Mendonça Bez de Oliveira Gomes) ............. 75

• Seguro de Transportes Nacional e Internacional e Regulação de Avaria Simples ou Particular (JoséFlávio Commandulli) ................................................. 47

Autor

JoSé Flávio coMManDulli

• Seguro de Transportes Nacional e Internacional e Regulação de Avaria Simples ou Particular ................ 47

leatrice MenDonça Bez De oliveira goMeS e voltaire MarenSi

•O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Maríti-mos nas Ações de Regresso ...................................... 75

paulo Henrique creMoneze

• Análise de Decisão Judicial – O Direito Marítimopor Quem o Faz .......................................................... 9

voltaire MarenSi e leatrice MenDonça Bez De oliveira goMeS

•O Prazo Prescricional Relativo aos Seguros Maríti-mos nas Ações de Regresso ...................................... 75

JURISPRUDÊNCIA

Assunto

tranSporte MarítiMo

• Recurso especial – Juízo de retratação – Recurso – Não cabimento – Transporte marítimo de mer-cadoria – Perda total do bem segurado – Culpa do transportador – Ação de regresso – Seguradora – Prazo prescricional anual – Súmula nº 151/STF – Ausência de relação de consumo – Termo inicial –Pagamento da indenização (STJ) ......................2813, 83

EMENTÁRIO

Assunto

Seguro MarítiMo

• Ação regressiva – seguradora – avarias – prazo de-cadencial de dez dias – inaplicabilidade – art. 27 do Código de Defesa do Consumidor – aplicabili-

dade – prescrição – afastamento – causa eficiente – má conservação dos contêineres – falha na pres-tação do serviço – incolumidade – violação ..2814, 103

• Avarias – ação regressiva – prescrição não carac-terizada – prazo trienal do art. 206, § 3º, V, do Código Civil – decadência não caracterizada – art. 754 do Código Civil – inaplicabilidade – agen-tes de carga – solidariedade...........................2815, 103

• Carga avariada – ação regressiva – CDC – inapli-cabilidade – prazo decadencial do art. 745 do Código Civil não transcorrido – prescrição – prazo ânuo – art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967 – in-terrupção – iempestividade – nexo causal – nãocomprovação ................................................2816, 104

• Transporte de mercadorias – avaria – relação de consumo – sub-rogação que se opera de pleno direito e em amplo caráter – indenização – limi-tação – convenções internacionais – impossibili-dade ..............................................................2817, 104

• Transporte marítimo – ação de regresso – deca-dência – art. 754 do Código Civil – inaplicabili-dade – Súmula nº 151/STF – prevalência .......2818, 105

• Transporte marítimo – ação regressiva – segura-dora – produtos petroquímicos – contaminação –responsabilidade da transportadora ...............2819, 105

• Transporte marítimo – armazenagem de mercado-ria – ação regressiva – prazo prescricional aplicá-vel – relação jurídica originária – termo inicial –sub-rogação – limites.....................................2820, 106

• Transporte marítimo – avaria – cofre de carga – de-ver de reparação – falta de protesto – decadência – direito ao ressarcimento – existência – valor da indenização – BL – cláusula limitativa – inaplicabi-lidade ............................................................2821, 106

• Transporte marítimo – contêiner – infiltração de água – mercadorias – avaria – responsabilida-de objetiva – seguradora – sub-rogação – Súmulanº 188/STF .....................................................2822, 107

• Transporte marítimo – mercadoria – perda to-tal – culpa do transportador – ação de regresso – relação de consumo – ausência – prazo prescri-cional anual ..................................................2823, 108

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

contrato De uSo teMporário

• A Validade do Contrato de Uso Temporário (CUT) (Ana Luiza Becker Salles)......................................... 109

praticageM

• A Inconstitucionalidade do Decreto Que Institui o Conselho Nacional para Assuntos de Pratica- gem (Decreto nº 7.860/2012) (Ricardo Deo SipioneAugusto) .................................................................. 125

Page 243: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������243 terMinaiS portuárioS

•Da Legalidade da Cobrança Realizada pelos Ter-minais Portuários sob a Rubrica “THC2” (Marcelo de Lucena Sammarco) ............................................. 144

Autor

ana luiza Becker SalleS

• A Validade do Contrato de Uso Temporário (CUT) ................................................................................ 109

Marcelo De lucena SaMMarco

•Da Legalidade da Cobrança Realizada pelos Ter-minais Portuários sob a Rubrica “THC2” ................ 144

ricarDo Deo Sipione auguSto

• A Inconstitucionalidade do Decreto Que Institui o Conselho Nacional para Assuntos de Praticagem (Decreto nº 7.860/2012) .......................................... 125

ACONTECE

Assunto

Decreto DoS portoS

• Análise Jurídica sobre as Alterações Promovidas noDecreto dos Portos (Felipe de Assis Serra) ............... 221

Autor

Felipe De aSSiS Serra

• Análise Jurídica sobre as Alterações Promovidas noDecreto dos Portos .................................................. 221

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

aBanDono

• Administrativo e processual civil – Mandado de segurança – Abandono ou apreensão de carga – Retenção de contêiner – Descabimento – Lei nº 9.611/1998, art. 24, parágrafo único (TRF 1ª R.) ......................................................................2824, 158

apreenSão De carga

• Administrativo e processual civil – Mandado de segurança – Abandono ou apreensão de carga – Retenção de contêiner – Descabimento – Lei nº 9.611/1998, art. 24, parágrafo único (TRF 1ª R.) ......................................................................2824, 158

iBaMa

• Penal – Apelação criminal – Obstaculização de ação fiscalizadora do Ibama – Inocorrência – Exis-tência de determinações conflitantes da marinha do Brasil e da autarquia ambiental – Recurso ministe-rial desprovido (TRF 2ª R.) .............................2825, 162

iMpoSto De iMportação

• Ação ordinária – Aduaneiro – Mercadoria em trân-sito destinada ao Paraguai – Extravio – Ausente fato gerador do imposto de importação – Proce-dência ao pedido – Improvimento à apelação e à remessa oficial (TRF 3ª R.) .............................2826, 168

• Tributário – Base de cálculo do imposto de impor-tação – Valor aduaneiro – Despesas ocorridas após a chegada ao porto – Capatazia – Inclusão inde-vida – Súmula nº 92 desta Corte (TRF 4ª R.) ..2827, 173

EMENTÁRIO

Assunto

aciDente

• Acidente – carregamento – danos causados ao navio e à carga – operador do guindaste – impru-dência ...........................................................2828, 176

aciDente De traBalHo

• Acidente de trabalho – atropelamento por empi-lhadeira – danos materiais e morais – dever deindenizar – ausência......................................2829, 176

aDuaneiro

• Aduaneiro – pena de perdimento – mercadoria encontrada oculta em contêiner – navio estran-geiro – efetiva origem, trajeto e destinação – não identificação – art. 105, I e IV, do Decreto-Lei nº 37/1966 – aplicabilidade .........................2830, 176

aFretaMento MarítiMo

• Afretamento marítimo – ISS – ilegalidade da co-brança – probabilidade do direito – exigibilidade dadívida – suspensão – possibilidade ................2831, 177

agente MarítiMo

• Agente marítimo – auto de infração – art. 125 da Lei nº 6.815/1980, Estatuto do Estrangeiro – infra-ção administrativa – responsabilidade – ausência ......................................................................2832, 177

área porto

• Área porto – posse – bem público – mera detenção – reintegração – impossibilidade ...................2833, 178

arMazenaMento

• Armazenamento – atividade portuária – Lei nº 12.815/2013 – poder concedente – Antaq – União – ilegitimidade passiva – competência – Justiça Estadual ..............................................2834, 181

arMazéM alFanDegaDo

• Armazém alfandegado – armazenagem – despe-sas – cobrança – direito de retenção – redução do preço – impossibilidade.................................2835, 182

arrenDaMento portuário

• Arrendamento portuário – serviços de abertura e fechamento dos portões – acesso ao cais – cobran-

Page 244: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

244 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

ça – inexigibilidade do crédito – repetição do in-débito – impossibilidade................................2836, 184

carga

• Carga – presença – certificação equivocada – tri-butos – recolhimento indevido – ressarcimento – danos materiais .............................................2837, 184

• Carga retida – liberação – conhecimento de em-barque – via original – apresentação – Instrução Normativa SFB nº 680/2006 – Instruções Norma-tivas RFB nºs 1.356/2013 e 1.443/2014 – neces-sidade ............................................................2838, 184

créDito-prêMio

• Crédito-prêmio - IPI – liquidação de sentença – valor “FOB” – base de cálculo – exclusão de benefício fiscal (drawback) e de comissão do agen-te ou representante no exterior – enfoque cons-titucional .......................................................2839, 186

DéBito FiScal

•Débito fiscal – ação anulatória – multa – art. 107, IV, c, Decreto-Lei nº 37/1966 – registro no Sisco-mex – agente marítimo – responsabilidade solidá-ria – ausência ................................................2840, 186

Demurrage

•Demurrage – contêiner – prescrição – art. 22 da Lei nº 9.611/1998 – inaplicabilidade ..................2841, 187

•Demurrage – devolução dos contêineres – data controvertida – cobrança – limitação – relatórios do terminal portuário – apuração do valor em li-quidação – nulidade da sentença – inocorrência ......................................................................2842, 187

DeSpeSaS De arMazenageM

•Despesas de armazenagem – abandono da mer-cadoria – contraprestação – cobrança – União – legitimidade passiva – art. 31 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 – art. 647 do Decreto nº 6.759/2009– apelação – desprovimento ..........................2843, 187

•Despesas de armazenagem – terminal portuário – responsabilidade – Peca – apreensão de merca-dorias ............................................................2844, 188

Direito antiDumping

•Direito antidumping provisório – Resolução Ca-mex nº 10/2016 – espelhos não emoldurados – sobretaxa – cobrança – marco temporal – registroda declaração de importação ........................2845, 188

DpeM

•DPEM – cobrança – acidente náutico – falecimen-to – indenização máxima – inadimplemento do prêmio – recusa do pagamento da indenização– impossibilidade ..........................................2846, 190

DrawBack

•Drawback suspensão – âmbito federal – consulta administrativa – benefício da suspensão do ICMS

e do seu crédito presumido – resposta negativa –segurança pleiteada – concessão parcial .......2847, 191

eMBarcação

• Embarcação – acidente – meio ambiente – vazamen-to de mistura ácida – responsabilidade civil obje-tiva e solidária – indenização do dano ..........2848, 192

eStivaDor

• Estivador – motorista – exposição a agentes nocivos – tempo especial – acórdão – cumprimento ime-diato – decisão de eficácia mandamental ......2849, 195

• Estivador – tempo de serviço especial – aposenta-doria especial ou a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição – deferimento – mais van-tajoso ............................................................2850, 195

icMS

• ICMS – importação de mercadoria – desembaraço aduaneiro – Estados do Espírito Santo e Santa Ca-tarina – recolhimento do tributo – destino das mer-cadorias – Fisco Paulista ................................2851, 196

• ICMS diferido – importação – exclusão da respon-sabilidade – suspensão do ato coator – provimento ......................................................................2852, 198

iMportação

• Importação – peça de automóvel – bagagem – descaracterização – má-fé – uso comercial – ino-corrência – retenção da mercadoria – impossibili-dade ..............................................................2853, 198

• Importação de medicamento – desembaraço adua- neiro sem prévio recolhimento de ICMS – admis-sibilidade .......................................................2854, 199

ipi

• IPI – contrato de arrendamento – aeronave es-trangeira – fato gerador – desembaraço aduaneiro ......................................................................2855, 200

• IPI – incidência – saída do produto do estabele-cimento importador – art. 543-C do CPC/1973 ......................................................................2856, 200

lei De Segurança DoS tranSporteS aquaviárioS

• Lei de Segurança dos Transportes Aquaviários – § 2º do art. 24 da Lei nº 9.537/1997 – depósito prévio do valor das multas – afastamento – orien-tação técnica da Diretoria de Portos e Costas (DPC) – auto de infração – anulação – impossibilidade ......................................................................2857, 201

liBeração DaS MercaDoriaS

• Liberação das mercadorias – vedação legal – art. 7º, § 2º, da Lei nº 12.016/2009 – débitos tri-butários – art. 622-A, III, b do RICMS – benefí-cio fiscal – necessidade de liberação .............2858, 202

MarítiMo

•Marítimo – ajudante de cozinha – cozinhei-ro – ruído – EPIs – hidrocarbonetos – Decreto nº 83.080/1979 – Decreto nº 53.831/1964 – apli-

Page 245: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������245 cação conjunta – reafirmação da DER – aposenta-doria especial ou por tempo de contribuição – in-deferimento ...................................................2859, 202

MercaDoria iMportaDa

•Mercadoria importada – apreensão – interposi-ção fraudulenta – indícios – art. 68 da MP 2.158-35/2001 – art. 69 da IN SRF 206/2002 – manu- tenção da garantia após liberação das mercadorias– possibilidade ..............................................2860, 203

•Mercadoria importada – apreensão – subfaturamen-to – interposição fraudulenta – pena de perdimen-to – não cabimento – caução no valor do depósitoaduaneiro da mercadoria – possibilidade ......2861, 204

•Mercadoria importada – liberação – caução – exi-gência – possibilidade ...................................2862, 205

Militar reForMaDo

•Militar reformado – acidente em serviço – manu-tenção de equipamento náutico – negligência – responsabilidade civil do Estado – omissão – culpa– danos morais e estéticos – deferimento .......2863, 205

nauFrágio De eMBarcação

•Naufrágio de embarcação – morte – reparação pordanos morais – responsabilidade objetiva .....2864, 206

navio

•Navio – arresto – pagamento – garantia – pratica-gem – caução em dinheiro – levantamento da or-dem – liberação do trânsito ...........................2865, 207

•Navio – carregamento – acidente – shiploaders – avarias – decisão final do Tribunal Marítimo – sus-pensão – indenização – perdas – lucros cessantes – liquidação por arbitramento .......................2866, 207

•Navio – equipamento – contêineres – desunitiza-ção – retenção indevida – liberação – cabimento ......................................................................2867, 209

•Navio-Sonda – meio ambiente – contratos de afretamento – prestação de serviços – indisponibi-lidade da embarcação – downtime – superação – rescisão – possibilidade .................................2868, 209

nepoM

•Nepom – embarcação policial – atuação ......2869, 211

ogMo

•Ogmo – trabalhador portuário avulso – processo seletivo – experiência profissional – exigência – Justiça Comum Estadual – incompetência .....2870, 211

pena De perDiMento

• Pena de perdimento – ação anulatória – empre-sa adquirente dos produtos importados – legiti-midade ativa ..................................................2871, 211

peSca

• Pesca – Preps – Ibama – auto de infração – em-barcação – equipamento de rastreamento – co-municado de desativação temporária – ausência –sancionamento ..............................................2872, 211

piS/coFinS-iMportação

• PIS/Cofins-Importação – constitucionalidade – base de cálculo – inclusão do ICMS – não cabi-mento – compensação/restituição – cabimento ......................................................................2873, 212

• PIS e Cofins – sistema monofásico – aproveita-mento de créditos – possibilidade – regime do re-porto – extensão às empresas não vinculadas – ca-bimento .........................................................2874, 213

porto Seco

• Porto seco – armazenamento em porto seco – tem-peratura – conhecimento de produto – declaração de importação – preenchimento incompleto – de-ver do importador – transportador e armazedor– ausência de culpa .......................................2875, 213

proFiSSional MarítiMo

• Profissional marítimo – agentes nocivos – ruído – vibrações – oscilações – aposentadoria especial– concessão ...................................................2876, 213

Segurança De tranSporte Fluvial

• Segurança de transporte fluvial – excesso de pas-sageiros – princípio in dubio pro reo – prova téc-nico-documental – capacidade da embarcação –necessidade ...................................................2877, 214

ServiçoS De praticageM

• Serviços de praticagem – cobrança – agência ma-rítima – mandato – armadores – legitimidade –status assertionis ............................................2878, 214

tcu

• TCU – relatório de auditoria – convênio – Dnit – Secretaria de Estado de Infraestrutura do Estado do Amazonas – licitação – contratação da constru-ção do porto fluvial – sobrepreço – multa .....2879, 214

• TCU – relatório de auditoria – obras públicas – construção de terminais fluviais – adiantamento de pagamentos – fiscalização deficiente – recomen-dação ............................................................2880, 215

• TCU – tomada de contas especial – auditoria – molhes – prolongamento – indício de superfatura-mento – contas irregulares – multa ................2881, 215

terMinal retroportuário

• Terminal retroportuário – armazenagem – cobrança – início da contagem – livre armazenamento – con-tratação – entrada do último contêiner ..........2882, 216

tHc2

• THC2 – cobrança em duplicidade, abusiva ou vio-ladora do direito da concorrência – inocorrência– serviço adicional – possibilidade ................2883, 216

tranSporte MarítiMo

• Transporte marítimo – mercadorias – liberação – condição – apresentação da via original do co-nhecimento de embarque master – descabimento ......................................................................2884, 217

Page 246: ISSN 2236-5338 Revista - bdr.sintese.com 39_miolo.pdf · Federal do Espírito Santo (IFES) e Acadêmico em Direito da FDV, cujo trabalho apresenta uma abordagem do direito portuário

246 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 39 – Jul-Ago/2017 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

• Transporte marítimo – registro da carga – destem-po – pena de perdimento – indenização – cabi-mento ............................................................2885, 217

traBalHaDor portuário

• Trabalhador portuário – contratação com vínculo empregatício – negociação coletiva – recurso – pressupostos de admissibilidade ....................2886, 217

• Trabalhador portuário avulso – indenização – pa-gamento indevido – repetição de indébito – admi-nistração – interesse particular – Ministério Público – ilegitimidade ativa ad causam.....................2887, 218

traBalHo portuário

• Trabalho portuário – contratos temporários – au-tarquia estadual – regime estatutário do Estado – adicional de insalubridade – pagamento devido – adicional de risco – Lei nº 4.860/1965 – inapli-cabilidade .....................................................2888, 218

valor aDuaneiro

• Valor aduaneiro – despesas de capatazia – inclu-são – impossibilidade – art. 4º, § 3º, da IN SRF327/2003 – ilegalidade – precedentes ...........2889, 218